História por Roby e Mah | Revisão por Taaci


Nunca poderei me esquecer daquele dia.
Nunca poderei me esquecer daquela canção.
Nunca poderei me esquecer da mais bela e letal criatura que já vira em toda minha vida.
Às vezes me pergunto se sobreviver a tal encanto, foi realmente algo bom.
.
A sereia de Wood.
Ela vive nas águas profundas da ilha de Louge, perto das grandes rochas de Petri. É conhecida por todos como a ‘Dama da Ilha’, a mulher mais bela dentre todas. A mais sedutora angelical e perigosa criatura conhecida pelo homem. Sua música atrai navios e tripulações inteiras, convidando-os à morte.
Muitos se aventuraram a atravessar a ilha, mas nunca nenhum voltou para poder contar a história.
Nenhum além de mim.

- Prontos para zarpar? – pergunto aos tripulantes com um sorriso confiante.
- Sim, capitão – respondem em uníssono, batendo continência.
- Ótimo! Puxar ancora, hora de seguir em direção ao horizonte, rapazes – digo, caminhando até a proa. Observo o mar calmo à nossa volta, o sol ardente sob nossas cabeças e a determinação inabalável de cada um dos homens ali. Nosso objetivo? Encontrar a tão famosa Dama da Ilha.
- Diga-me, Thomas, alguma vez já sentiu tal sensação? A brisa suave, o som do oceano, não é algo... Incomparável? – pergunto ao mais novo membro da tripulação.
- Com certeza, capitão – responde o menino ao meu lado, que mantém um olhar atento ao céu azul.
- Ansioso para conhecê-la, garoto?
- A sereia, capitão? Para dizer-lhe a verdade, eu não acredito nessas coisas, senhor. Para mim, tudo não passa de um bando de besteiras inventadas por bêbados que pensam que viram ou ouviram algo, mas que, na verdade, somente estavam um tanto fora de si. – ele disse, sorridente, ainda encarando a imensidão logo acima de nós. – Mas e o senhor, capitão? – pergunta, finalmente, me encarando, com um brilho um tanto curioso no olhar.
- Eu acredito que toda história tem seu ponto verdadeiro, Thomas. Nada pode ser inventado sem um ponto de partida, certo? – respondo, encarando o garoto que parece pensativo. Sorri de lado, dou dois tapas de leve em suas costas e caminho em direção ao centro do navio.
- É por isso que o senhor veio até aqui? Para... Descobrir se esta história toda sobre a Dama da Ilha é verdade ou não? – ouço a voz do garoto logo atrás de mim.
- Exatamente, meu caro rapaz! Quero desvendar este mistério, essa história tão comentada. Se há realmente uma sereia, então eu quero vê-la com meus próprios olhos. – digo, apoiando minhas mãos na madeira do barco e observo, então, o longo caminho que segue pela frente. Vou até a cabine do comandante para finalmente darmos início a uma aventura que poderia ser a última de nossas vidas.

*


Já passavam de 3 horas de viagem. Reúno todos os tripulantes para dar os avisos e dicas necessárias. Chamo Thomas e peço-lhe para que leve os algodões que eu pretendo entregar aos tripulantes.
- Rapazes, a partir do momento em que ouvirem o canto da sereia, não terão mais chances de sobreviver, por isso, ao meu aviso, coloquem esses algodões em seus ouvidos, assim não conseguirão ouvir a voz dela. – Entrego algodões a cada um deles, inclusive para Thomas, porém o algodão acaba antes de chegar a mim, me fazendo o único sem proteção contra a Sereia.


Em meio a toda a bebedeira e bagunça da viagem, mandei Thomas me amarrar na parte de dentro do barco, para que, quando ouvisse o canto de , não conseguisse sair; e avisei que não importa o que eu falasse, nem ele e nem ninguém poderia me tirar dali, de maneira alguma. A viagem continuou e logo já havia anoitecido, os homens cantavam alto, erguiam suas bebidas aos céus, alegres, animados, determinados a encontrar a tão famosa sereia.
Eu observava o céu noturno brilhando sobre nós. Lembro-me que a grande lua à nossa frente naquela noite, iluminava toda a extensão do navio e parecia nos guiar em direção à nossa tão esperada Dama da Ilha.
Eu não podia estar mais ansioso para vê-la. Desde pequeno, ouvi histórias sobre ela, sobre sua beleza incomparável, sua voz e sobre todas as tragédias que ela já havia causado. Muitos homens sonham em poder ouvir sua canção e eu era um deles. Algumas pessoas do meu vilarejo chamavam aquela melodia de “Canto do Anjo”, por ser uma música que trazia calma e paz a todos os corações, porém outros preferiam se referir a ela como “Chamado da Morte”, por enlouquecer os tripulantes e fazê-los por vontade própria jogarem o barco às pedras, ou simplesmente pularem eles mesmos ao mar aberto.
Não importava o que falassem, eu sempre quis ouvir aquela canção. E ainda me lembro claramente da primeira vez que pude ouvi-la. Diferente do que imaginei, a criatura na verdade não estava cantando, pelo menos não primeiramente, mas sim chamando meu nome, num doce e suave sussurro vindo do mar.

- ... – Ouvi alguém chamar meu nome logo atrás de mim, como um simples murmuro das ondas, que batem incansavelmente no casco do velho barco de madeira. – , venha até mim... Não é isso que você sempre quis? – De um modo estranho, aquela voz me soa familiar, e não demoro muito a descobrir que, na verdade, eu realmente a conheço. Eu já a ouvira milhões de vezes, em meus mais profundos sonhos e fantasias com a bela criatura da ilha de Lourge.
O barco se move rápido, os tripulantes ainda parecem sãos. Eu procuro pela dona da voz incansavelmente, até que finalmente a encontro.
Um pouco à frente de onde o barco se encontra, há o tão conhecido amontoado de rochas de Petri, o lugar onde vários homens já foram atraídos e mortos pela mesma criatura que agora eu vejo com meus próprios olhos, sentada em uma das pedras, com um semblante calmo e gentil.
Seus olhos são tão brilhantes quanto as estrelas que iluminavam o céu naquela noite. Seus cabelos, longos e , caem livremente sobre seus ombros e rosto, cobrindo levemente um de seus olhos e seus seios. Seus lábios tem um tom vermelho e formam um lindo e angelical sorriso. Seus braços estão esticados, apoiados na pedra, suas mãos espalmadas sobre ela também. Seu tronco debruçado sobre os braços, e como em todas as lendas que já ouvira sobre a ‘mulher’ à minha frente, ao invés de pernas, uma linda e longa calda num tom azulado (quase da mesma cor que o mar) balança devagar para frente e para trás inúmeras vezes, tocando de leve a água à sua volta.
Eu a encaro por alguns segundos, completamente encantado. Ela é linda, como todas as histórias diziam, até mais. Uma beleza inimaginável e até sobrenatural.
A criatura então ainda sorrindo, deita completamente seu corpo sobre a pedra, apoiando seu rosto em seus braços. Sua calda se dobra ficando inteiramente fora da água, e seus lábios se abrirem levemente, num calmo e baixo suspiro, mas que mesmo eu consigo ouvir.


Num único sopro de consciência, gritei para que os homens colocassem os algodões. Eu sabia o que estava por vir, mas nunca pensei que fosse acontecer daquela maneira.

A tripulação me encara. Todos com expressões assustadas e confusas. É como se, de repente, toda a alegria e determinação tivesse sumido.
E é junto a uma brisa gélida e repentina, que a linda canção da morte pode ser ouvida.
A música transmite tranquilidade, domina meu coração e minha mente. Eu encaro a bela criatura não muito longe de onde eu estou, e ela sorri, movendo os lábios conforme a melodia.
Eu quero ir até ela, quero tocá-la, quero vê-la frente à frente, essa sensação de necessidade cresce dentro de mim, me fazendo a cada instante, querer mais e mais estar ao lado daquela tão perfeita criatura, tão próxima, mas tão distante.
- Thomas, Solte-me – eu grito para o garoto que me olha em um misto de pena e seriedade. – Eu mandei soltar-me! Eu sou seu capitão, você deve me obedecer!
- Mas eu estou te obedecendo, capitão. Você me mandou não te soltar, não importa o que ocorra, e estou o fazendo. – O garoto virou-se, e logo percebeu que todos os outros tripulantes tamparam os ouvidos com força. – O que está acontecendo?
- O algodão... não está funcionando! A música... eu posso ouvi-la... eu - Jeff, o cocapitão do navio, disse logo antes de soltar um longo e alto grito. – , devemos encontrá-la – fala, se levantando junto com toda a tripulação, e caminha em direção ao timão do navio, na intenção de levar o mesmo até as pedras onde a linda sereia descansa.
- Jeff, pare! – Thomas grita, tentando impedir o amigo de se aproximar do Leme e levar a todos dali à morte certa.
Tento puxar meus braços para o lado, eu preciso sair dali, preciso ir até ela! As cordas estão firmes, mas eu não desistirei assim tão facilmente! Começo a me balançar de um lado para o outro na intenção de afrouxar o aperto, mas nada acontece.
- SOLTEM-ME! É UMA ORDEM, SOLTEM-ME! – eu grito enquanto vejo todos os tripulantes caminharem até o leme e tentarem virá-lo. Thomas, mesmo com a pouca idade, luta bravamente com todos eles, impedindo-os de chegarem perto do objeto.
Eu quero me soltar, eu quero sair dali, eu preciso sair dali! Rápido, antes que ela se vá, não ela não pode ir sem mim, não, isso não!


Minha cabeça estava dominada por um sentindo obsessivo. Uma obsessão que eu jamais havia tido em nenhum momento de minha vida, uma obsessão por ela, pela tão bela criatura que antes eu ainda considerava somente fantasia.
O sentimento era agonizante, o desejo de poder me soltar daquelas cordas e não poder era algo terrível.

Meus braços começam a doer, olho de relance para ambos e vejo as marcas vermelhas de sangue na corda, imagino que de tanto me mexer para afrouxar este tão bem feito nó, acabei machucando meus braços, mas isso não importa! Não importa a dor que eu sinta para isso, eu tenho que sair daqui, tenho que desamarrar essas cordas de meu corpo e tenho que ir até ela. Minha linda espera por mim.
Eu grito, imploro para que me soltem, para que me deixem livre, mas nenhum dos homens me dá ouvidos, muitos deles passam a se jogar no mar, tentam nadar até onde a criatura se encontra, mas são puxados para baixo por algo que eu não consigo reconhecer ou sequer ver, na realidade.
Thomas se aproxima, olha-me nos olhos.
- Solte-me agora, garoto, isso é uma ordem! – grito em frente a seu rosto que mantém uma expressão tranquila.
- Amanhã irá me agradecer por isso, capitão. – ele diz antes de novamente se afastar, para poder observar a doce mulher.
Eu novamente me balanço, a essa altura não sinto mais meus braços, minhas pernas batem no chão com força, minhas curtas unhas arranham o chão de madeira, minha mente não pensa em mais nada além dela.
, , , , , , , , , , vá até .
Meus olhos estão arregalados, eu estou suando frio. Meu coração bate forte, minha respiração está completamente descompassada, minha visão passa a ficar embaçada e minha boca ainda grita por socorro, por ajuda, por qualquer um que possa me livrar daquelas cordas.
- Não se esqueça de mim, meu amor, pois, algum dia, eu ainda voltarei para lhe buscar. – ouço sua voz soar em meus ouvidos logo antes de perder a consciência.

*


Abro meus olhos com dificuldade, o sol ardente dentro do quarto ilumina quase todo o cômodo. Minha cabeça dói, a noite passada vem como um clarão em minha mente. A agonia, a loucura, os machucados feitos por mim mesmo em meu próprio corpo.
Como num impulso, olho para meus braços, que estão devidamente enfaixados, assim como minhas unhas e parte de minha mão.
Levanto-me com dificuldade, a sensação é de que meus pés cederão ao peso de meu corpo, mas resisto e passo a caminhar firmemente para fora da cabine.
A vista que tenho do barco é apenas aquela imensidão azul à nossa volta. Não posso acreditar... Conseguimos! Conseguimos mesmo! Passamos pelas rochas, passamos por ela... Pela criatura que, até então, ninguém conseguira passar. Minha felicidade é imensa, me sinto vitorioso! Preciso agradecer Thomas, por cumprir minhas ordens e salvar minha vida!
Procuro-o por todo o navio, quando ouço sua voz na parte de trás.
- O que houve? Está bem? Seu navio naufragou? Deixe-me ajudá-la. – Ele pergunta, conversando com alguém. Não entendo muito bem, pelo que me lembro, todos os tripulantes do navio se jogaram na água, então com quem ele poderia estar... Ah não. Não pode ser.
Corro o mais rápido que posso até o local de onde escuto sua voz, e o encontro, apoiado na madeira, estendo a mão a algo fora do navio, dentro do mar.
- Thomas, não! – Grito alto, recebendo um olhar do garoto, que logo é puxado para as profundezas do oceano.


Thomas era um garoto especial, mas tinha um coração mole, sempre queria ajudar a todos, e foi isso que acabou o matando. Devo minha vitória e minha vida àquele menino, que simplesmente, por não acreditar, conseguiu ser imune ao tão poderoso encanto, que levou todos nós à loucura naquela noite...
E que até hoje me enlouquece.
Me pego pensando se realmente foi o certo ter sobrevivido. No dia seguinte e nos primeiros meses após minha volta com vida ao vilarejo, contei a todos sobre minha história, me sentia vitorioso! Mas isso não durou muito tempo.
A cada noite eu sonhava com ela. A cada dia o desejo de estar ao seu lado se tornava cada vez maior. Seus olhos, sua boca, sua voz torturavam minha cabeça mais e mais a cada instante que se passava.
E hoje, exatos dez anos após minha sobrevivência, ainda torturo a mim mesmo, lembrando-me de cada detalhe daquela tão perfeita Dama da Ilha.
- Deseja mais alguma bebida, ? – Mary, a dona da taberna, perguntou sorrindo como sempre.
- Não, obrigado, já estou de partida. – Respondi, depositando meu dinheiro no balcão e caminhando até a saída.

*


Não consegui pensar em mais nenhum lugar para ir a não ser a praia. Caminho sobre a areia encarando meus próprios pés. O dia está lindo!
Viro-me encarando o horizonte à minha frente e o reflexo do Sol nas águas calmas. Fecho meus olhos, prestando atenção no som das gaivotas, pairando sobre o mar, das pequenas ondas ao fundo, quebrando e chegando até meus pés, e, de repente, a voz de alguém, chamando meu nome.
Abri meus olhos no mesmo instante, vendo logo ali, à minha frente, a mulher com quem todos esses anos venho sonhando.
Seus cabelos balançam junto a leve brisa de verão. Ela usa um vestido longo, branco e brilhante sob a luz do sol. Ela é a mesma de dez anos atrás, somente com duas diferenças: a tristeza evidente em seus olhos e as pernas, aparentes apenas pela fenda do vestido, que substituem sua linda cauda. simplesmente esticou seus braços com lágrimas em seus olhos, e isso foi o bastante para que eu corresse em sua direção, abraçando-a, enquanto sentia a água batendo em meus joelhos e sua respiração calma na curva de meu pescoço.
Nos encaramos então por um bom tempo. Eu admirava seu rosto delicado e perfeito como se fosse a coisa mais valiosa que já tinha visto em minha vida! passou as mãos por meu rosto e encontrou meus olhos, sorrindo abertamente e, enfim, mostrando todos os dentes.
- Finalmente, te encontrei! – disse – Eu falei que voltaria para lhe buscar, mas eu não te achava! – a tristeza voltada em seus olhos e eu odiava aquilo, odiava vê-la infeliz.
Toquei seu rosto de leve, sorrindo.
- Agora você me encontrou, eu estou aqui – disse, encarando-a que, num único segundo, voltou a exalar felicidade.
- Sim, agora você está! E nunca mais irá embora, nunca.
- Nunca – assenti assim concordando com a cabeça e vendo-a sorrir ainda mais.
Nossos lábios se aproximaram um do outro e então se selaram.
passou então a caminhar para trás, e eu simplesmente a deixei que o fizesse. Eu nunca mais queria estar longe dela em minha vida. O beijo se partiu e ela me abraçou forte pelo pescoço. A água já batia em meu peito, e eu sabia que ela não pararia ali.
A mulher então se afastou, sem quebrar o contato visual, mergulhou no mar, voltando à superfície não muito longe de mim, já sem o vestido e com sua calda novamente, do mesmo jeito que a vira naquela noite. esticou seu braço direito, pedindo somente com o olhar para que eu fosse até ela, e nem por um único segundo eu cogitei a opção de não ir.
Lá estava eu, frente a frente com meu mais lindo sonho e súbito desejo. se aproximou novamente, segurando firmemente meu rosto, e me beijando pela última vez. Pude sentir sua calda envolvendo minhas pernas (que já não tocavam mais o solo) e não me permitindo mais nadar. Eu sabia o que estava por vir, mas, incrivelmente, não tive medo, simplesmente apertei sua cintura, deixando que nós dois afundássemos, iluminados pelos últimos raios de sol da tarde.
Depois de dez anos, finalmente, estamos juntos, agora... Para sempre!

“Eu os atraio para a morte e, se eles não atendem ao meu chamado, em forma de mulher eu os busco, para cumprir seus destinos junto a mim pela eternidade. Eu canto para guiá-los até seus inevitáveis finais; quem não morre, enlouquece, até que finalmente é trazido de volta para onde jamais deveria ter saído: ao meu lado. Estamos ligados pela morte, e apenas por isso.”

FIM


Nota da autora: Olá lindonas, tudo bem? Primeiramente MUITO obrigada por ter lido essa fic! E se você gostou ou já leu outra fic nossa, agora criamos um grupo no facebook \o/ o link está aqui ( https://www.facebook.com/groups/624756710986861/?fref=ts ) caso vocês queiram participar para conhecer as outras fictions ou mandar dicas e sugestoes <3 Beijos da Roby e da Mah
Nota da Beta e não da Autora: Encontrou algum erro de script/html/português? Avise-me através deste e-mail. Não use a caixa de comentário com essa intenção. Obrigada.
Agradecimentos sobre a fiction? Somente com a autora!

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