RAINING IN PARIS
História por That


Recomendo que vocês coloquem essa música para tocar enquanto leem, podem deixar no repeat.


Até que ponto o ser humano pode suportar, tanto fisicamente quanto psicologicamente, a saudade?
Até que ponto é possível manter sua sanidade, enquanto sua mente está em outro lugar do mundo e seu coração preso a outro que pode parar de bater a qualquer minuto?
E será que esse em questão parar, o meu vai parar no mesmo instante?
Bem, eu espero que sim, porque eu não desejo estar num mundo onde não exista.


— UM MÊS —

For now I am alone
Por enquanto eu estou sozinho
I might always be alone
Eu poderia estar sempre sozinho



Eu passava a maior parte do meu tempo esperando por qualquer notícia, seja uma carta ou alguma novidade vinda do campo de batalha. Montava acampamento perto da janela e não saia de lá por nada. Com a maioria dos homens em combate, a cidade se tornou formada basicamente por mulheres e crianças e esses não frequentam cabarés. Ninguém sabia muito bem como seria o nosso futuro caso a guerra durasse muito tempo, a comida começaria a acabar e não entraria dinheiro para repor. As outras meninas deram algumas joias que ganharam de presente para que fossem vendidas, mas eu não podia cooperar. A única peça que eu tinha era um presente e o mais valioso que já tinha recebido.

terminava de se vestir e eu o assistia. Do lado de fora o sol nascia e ele trazia o nosso prazo final. Ele teria que ir embora e somente Deus saberia se ele voltaria. Eu não me permitia não olhar para ele, queria que meus olhos guardassem todo e qualquer traço de seu rosto: a cor singular de seus olhos, a forma que o seu cabelo teimava em não ficar no lugar, o fato do seu nariz ser um pouco mais torto para a direita e do seu sorriso se alargar mais para a esquerda. Era a sua própria forma de ser perfeito e com isso ser a minha própria forma de perfeição. Não havia nem ao menos um motivo que me fizesse compreender porque ele tinha que ir, nada no mundo deveria ser grande o bastante para ele se afastar de mim. se aproximou de mim, sentando na beirada da cama e acariciou levemente meu rosto.

- Não fique triste, meu bem. – ele pediu.
- Não tenho certeza se isso é, ao menos, possível. – tentei sorrir, mas minha expressão deve ter sido mais parecida com uma careta.
- Entendo, também me dói saber que eu estarei longe de você, mas eu já prometi e prometo de novo: eu vou voltar. – afirmou com tanta convicção, que uma pequena fagulha de esperança aqueceu meu coração.
- Eu vou esperar, vou contar os dias, horas, minutos, segundos...
- Vou lhe deixar algo mais concreto que uma promessa, deixarei um pedido. – ele disse ajoelhando em minha frente, antes de pegar uma pequena caixinha em seu paletó. – Case-se comigo. – senti minha garganta se fechar, as lágrimas inundarem os meus olhos e minhas mãos tremerem assim que ele a abriu. Era um anel simples, um solitário com uma pequena pedra transparente e o aro dourado. Era, de longe, a coisa mais linda que eu já tinha ganhado na vida. – Diga que você se casará comigo e eu voltarei, nem que seja daqui a mil anos.
- Eu me casarei com você. – sussurrei com o restante de força que me restava e ele deslizou o anel pelo meu dedo.
- Eu te amo. – disse firme e direto, olhando nos meus olhos.
- Eu te amo. – respondi, antes de sentir seus lábios nos meus mais uma vez.
E que poderia ser pela última vez.”


Apertei o anel contra o peito e tentei imaginá-lo perto de mim mais uma vez, o que não era difícil. Eu costumava passar grande parte do meu tempo isolada num canto qualquer e falando sozinha. Só que pra mim, eu não estava sozinha e nem nunca estarei. Pra mim continua perto de mim e qualquer palavra que saia de minha boca chegará aos seus ouvidos. Seja pelo vento, seja como for. Na minha cabeça isso não é loucura. Isso é amor.


— DOZE MESES —

So let it rain on me
Então deixe chover em mim
See my heart's on fire but I always got cold feet
Veja, o meu coração está pegando fogo, mas eu sempre tenho os pés frios



Quando a décima segunda carta voltou, eu realmente comecei a me desesperar. Ouvia as senhoras nas ruas dizendo que seus filhos, maridos e netos as respondiam, diziam que estavam bem e vivos. O único motivo para não responder que passava pela minha cabeça, era o pior de todos. Sempre que eu fechava os olhos eu via seu corpo ensanguentado largado em um canto qualquer e essa imagem passou a me atormentar por todos os momentos. Tomei coragem e fui até a casa dele, sendo recebida por sua mãe, que de alguma forma me conhecia. Ela me recebeu bem e depois de alguns minutos se segurando, desabou na minha frente. Ela estava apenas com a filha mais nova durante esse tempo, seu marido, seu filho mais velho e foram convocados. Assim como eu, ela tentava contato todos os meses e a primeira resposta tinha chegado há poucos dias. O marido a respondeu dizendo que o mais velho estava com ele fazendo trabalhos internos, mas que o tinha sido deslocado para as trincheiras há alguns meses e que ele não tinha mais tido notícias dele.
Quando essas palavras chegaram aos meus ouvidos, eu precisei reprimir o grito de dor que brotou em minha garganta. Era como se o meu coração tivesse sido arrancado do meu peito, sem nenhum tipo de misericórdia ou pena. A cena da minha cabeça se tornou mais real e parecia que a qualquer momento um oficial bateria na porta para entregar o telegrama anunciando sua morte. Eu não consegui ficar muito tempo ali, eu me apressei para sair e segui andando sem rumo pelas ruas de Paris. A chuva que caia se confundia com as minhas lágrimas. Era como se o céu chorasse junto comigo. Um choro louco, quase irracional. O choro de uma viúva. Uma viúva que nem chegou a se casar.

“- Por Deus, . – reclamei, passando as mãos pelo rosto e removendo qualquer vestígio de lágrima que ainda podia existir ali. – Não sabia se te veria novamente. Como eu poderia sequer pensar em me deitar com mais alguém? – balancei a cabeça lentamente, suspirando em seguida.
- ... – ele murmurou, colocando minha mão em rosto. – Minha querida. – Imediatamente pus a minha por cima e fechei os olhos, com um pequeno sorriso nos lábios. Eu adorava quando ele me chamava dessa forma, me sentia como uma jovem boba e normal, sem ter que carregar todo o fardo da minha profissão. – Você realmente achou que eu iria sem ao menos lhe dar um beijo de despedida? Não sou louco a esse ponto, quer dizer, a minha loucura é você. Tenho que alimentá-la antes de partir. Pode ser para sempre.
- Não, não diga isso. Não se atreva a dizer isso mais uma vez. – eu disse firme, colocando um dedo sobre os meus lábios. – Você voltará, . Voltará para mim. Prometa, por favor. – sussurrei a última frase, tentando segurar as lágrimas que teimavam em brotar em meus olhos.
- Eu prometo. – jurei, com meu olhar fixo ao seu.”


Ele havia prometido e nunca tinha deixado de cumprir uma promessa. Ele não me deixaria dessa forma, não me deixaria sozinha no mundo.
Deus, ele havia prometido.
E se ele havia prometido, ele voltaria.


— VINTE MESES —

And if the storm should stop
E se a tempestade parasse
I'd ask you to dance on some cliche mountain top
Eu pediria a você para dançar no topo de alguma montanha clichê
We'd share straws at your favorite coffee shop
Nós deveríamos dividir canudos em seu café favorito
But life it ain't no romance novel
Mas a vida não é nenhum romance



Não sei se tive dias tão ruins na minha vida como todos dos últimos oito meses. Eu estava convicta que estava morto, quase todas as mulheres que conheço e que tinham algum parente vivo na guerra já havia recebido alguma notícia. O pai dele já havia mandado mais algumas cartas para a esposa, até mesmo o irmão mais velho também tinha dado notícias. Essa dor avassaladora se abrigou em meu peito por mais de duzentos dias. Dias esses que eu andava pelas ruas sem rumo definido, tentando tirar todos os pensamentos medonhos que lotavam minha mente. Eu só consegui algum sossego num dia aparentemente normal, no qual eu cheguei em casa e havia uma carta em cima da minha cama. Corri até ela e meu coração quase não aguentou ao ver o carimbo do exército francês nela. Minhas mãos tremiam e tornava quase impossível abrir o envelope. Respirei fundo tentando me acalmar, era como se um calor irreal estivesse aquecendo meu coração que há muito tempo andava congelado. Abri a carta, puxando a folha com cuidado, mas antes que eu pudesse começar a ler, minhas lágrimas molharam o papel em diversos lugares. Vi que não conseguiria me controlar a ponto de conseguir ler a carta no momento em que meus olhos se depararam com a caligrafia simples e legível de .

         Minha ,

Não sei como começar a me desculpar, mas as coisas não eram as mais agradáveis para mim aqui, mas isso não é motivo para ficar durante todos esses meses sem lhe dar notícias. Encontrei meu pai por esses dias e ele me disse como estava a sua situação e de minha mãe. Eu só posso enviar uma carta, então transmita a ela minhas desculpas e diga que eu a amo. Durante todo esse tempo eu estive escalado para ficar nas trincheiras e eu precisava me focar em continuar vivo. Precisava me manter atento para cumprir minha promessa e voltar para você. Não sei o que seria de mim se não tivesse você para manter minha sanidade. Eu não consigo pensar, não consigo dormir. Não não consigo viver. Em alguns momentos eu me desligo de tudo, ignoro o som dos tiros e me imagino ao seu lado, lembro do seu sorriso, do brilho dos seus olhos, do doce gosto do seu beijo. E são nesses momentos em que eu vivo, vivo com você e vivo pra você. A certeza do nosso amor me faz continuar, me dá forças e me impede de desistir. Peço que continue a tentar me enviar as cartas, mas não darei certeza de resposta, minha presença no acampamento é temporária e eu já devo estar em combate novamente quando essas poucas palavras chegarem em suas mãos. Apesar de tudo, fique sabendo que a minha saudade é maior do que qualquer coisa nesse mundo. Minha vida está você, cuide dela, por favor.
Conto os dias para sair do inferno e voltar ao paraíso dos seus braços.
Eu te amo mais do que tudo no mundo.

Com amor,
Seu .




— TRINTA E SEIS MESES —

What good is a heart of gold
De que adianta um coração de ouro
With nobody to share it with
Sem ninguém para compartilhar isso?



Eu pensava que conforme o tempo fosse passando, eu aprenderia a conviver com a falta que me fazia, mas era exatamente o contrário. Os dias passaram, depois vieram as semanas, os meses os anos. Eu aguardava por suas cartas como se minha dependesse delas e quando elas chegavam, eu não desgrudava do papel nem mesmo para dormir. Apoiadas sobre o meu corpo, eu imaginava que aquelas poucas folhas eram ele e quase podia sentir seu cheiro, ouvir sua risada ou a forma doce como ele sussurrava que me amava. A dor era absurda, maior do que eu pensava que aguentaria. Mas eu teria que aguentar, por ele. estava em algum lugar do mundo, lutando não só por ele ou por mim, estava lutando por todo o país. Lutava com a mesma intensidade por pessoas que ele não conhecia, da mesma forma que lutava por sua família. Ele é, sem dúvidas, a melhor pessoa que eu conheço. A mais carinhosa, afetuosa, gentil e apaixonante. Ele fez com que eu me apaixonasse no primeiro olhar que trocamos. Devido à minha profissão, eu nunca era tratada bem, com gentileza ou cordialidade, os homens passavam como se eu não existisse ou fosse apenas um pedaço de carne. Mas com foi diferente desde o primeiro momento. Ele me olhou e sorriu de serena, sem desejo, sem luxúria, como se me conhecesse de uma vida inteira e pela primeira vez eu senti esperança. Esperança de uma vida diferente, com uma pessoa diferente. Alguém como , exatamente como .
E eu rezava a Deus, mesmo não sendo a mais religiosa das pessoas ou a mais correta, mas eu rezava. Porque naquele momento eu sabia que nossas vidas, nosso futuro estavam em suas mãos. Sempre me disseram que se você O procura com fé, ele te atende.


— QUARENTA E OITO MESES —


My heart is in the city of love
Meu coração está na cidade do amor
But it's raining in Paris
Mas está chovendo em Paris



No dia 08 de novembro de 1914 a notícia de que a Alemanha havia se rendido chegou aos nossos ouvidos, a cidade inteira festejou. Nossos rapazes voltariam e as vidas poderiam seguir normalmente. Uma data foi marcada para a chegada dos sobreviventes e todos se aglomeraram nas estações de trem e nos portos. Na última carta que recebi, disse que estava perto da costa e que, provavelmente, voltaria de barco quando tudo acabasse. Então, sem nem pensar, me dirigi ao porto no dia marcado, dia 11 de novembro, assim que o sol deu seus primeiros sinais no céu. Me acomodei e me pus a esperar pelo o que parecia quase uma eternidade. Para quem havia esperado quatro anos, algumas horas deveria parecer segundos. Mas não, era como se o meu corpo estivesse ciente de que estava voltando e ele não aguentava mais aguardá-lo. E conforme as horas foram passando, minha alegria começou a se misturar com uma angústia. Ninguém tinha notícias, só comentavam que alguns rapazes já haviam chegado de trem. Os primeiros navios apareceram no horizonte e os nervos ficaram à flor da pele no continente. Minhas mãos tremiam e meu coração acelerou. A embarcação atracou e as pessoas se amontoaram próximos à saída. Eu encontrei um espaço e me alojei, procurando meu amado com os olhos. A tripulação começou a desembarcar e eu não o encontrava. Eu sabia que ele não havia passado despercebido, eu não cometeria esse erro.
Horas depois quase não havia mais ninguém esperando, só havia eu e mais duas senhoras. Um homem ia passando e eu o parei, perguntando se havia outro navio para chegar. E então ele me disse algo que fez meus ossos gelarem:
- Senhorita, todos os vivos já chegaram.

Eu não tinha certeza de como tinha chegado ao meu quarto. Parei próxima à janela e fiquei lá por um tempo, na esperança que eu conseguisse vê-lo chegar, porque eu sabia que ele chegaria. Meu coração tinha essa certeza, meu corpo também. Lá embaixo a música alta dominava o ambiente, os festejos da volta já haviam começado, mas eu não me atreveria a participar, não sem ele. Pra mim não existia comemoração, sequer alegria sem o . Ouvi passos no corredor e em seguida a porta se escancarando num rompante. Virei assustada e me deparei com o que parecia mais uma visão do que qualquer coisa. Meus lábios se repuxaram instantaneamente, mas algo parecia extremamente errado. A confusão me dominava, pois ao mesmo tempo que uma felicidade absurda começava a ganhar meu corpo, um sentimento estranho também procurava espaço. Minha mente parecia gritar que era uma visão como tantas que tive. Eu estava delirando mais uma vez. Aquele parado em minha porta era algo que minha cabeça criou pra acalmar meu coração dilacerado. Eu dei um passo incerto, sem saber se me jogava de vez naquela viagem ou se tentava me manter sã perante aquilo tudo. A incerteza que eu demonstrava não parecia existir para , que atravessou o quarto e me tomou em seus braços. Eu pude sentir seu cheiro, o calor de sua pele, o seu toque e tudo pareceu demais para que eu conseguisse aguentar, real demais para ser apenas um devaneio ou uma ilusão. Ele estava aqui. Ele estava bem. As lágrimas desciam sem cessar. Levei minhas mãos ao seu rosto, tocando-o levemente para dar ao meu coração a certeza que ele precisava. Deslizei-as passando por diversas partes do seu corpo, me certificando de que ele estava inteiro. Olhei em seu rosto mais uma vez e me deparei com seu sorriso. Aquele mesmo sorriso acolhedor que ele havia me dado anos atrás e era como se eu estivesse me apaixonando novamente. Da mesma forma que eu me apaixonei por ele todos os dias dos últimos quatro aos. Tracei o desenho dos seus lábios com meus dedos, deixando todas as minhas lágrimas – de alegria – descerem de vez. colocou minhas mãos entre as suas e olhou em meus olhos. Naquele momento eu senti que ele estava me devolvendo a minha vida, assim como estava pegando a sua de volta. Naquele momento eu voltei a respirar, voltei a sorrir, voltei a viver. Só não voltei a amar, porque isso eu estava fazendo desde o dia em que eu o vi. E agora será para sempre.

- Você voltou. – murmurei, reunindo todas as minhas forças para fazer a voz vencer o nó formado em minha garganta.
- Eu disse que voltaria. – respondeu, trazendo minhas mãos para perto do seu rosto e depositando um beijo nas mesmas. – Eu sempre voltarei por você, .



Nota da autora: Na primeira vez que eu ouvi essa música (maravilhosa), a continuação dessa história me pareceu obrigatória.
Não tenho muito para falar, só espero que vocês tenham gostado e que me perdoem por esse dramalhão nível Maria do Bairro que eu fiz para vocês, mas foi de coração, juro.
Até a próxima,
Bejos da That.

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