Sete dias

A televisão ligada passava um noticiário, éramos seis na sala, lareira acessa, um bacalhau com natas na mesa, copos de vinho na mão de todos. As meninas se abraçavam, no sofá estavam eu, Riemke e André. Rodrigo via tudo de pé com as mãos no casaco. O presidente americano finalmente começaria a falar.
“Boa noite. Hoje não venho aqui discursar para a América, não venho aqui discursar para o mundo, venho discursar como filho de Deus, por Deus, que me deu a missão de anunciar o Apocalipse. Sabe-se do fim há sete anos e, para evitar o caos, decidimos anunciar apenas sete dias antes, como manda o livro do Senhor. A erupção solar ocorrerá aproximadamente às 15h49min hora local de Washington DC, do dia 21 de dezembro de 2012. Deus abençoe a América, Deus abençoe toda a humanidade.”
– Caralho! O mundo vai acabar mesmo? – falara André.
– O presidente americano anunciou, acho que não é piada! – respondera Riemke.
– Vai acabar que dia? – perguntara Rodrigo.
– Dia 21 de dezembro. – respondera Riemke.
– Meu irmão, eu não tô acreditando não, se fosse acabar, como eles iam saber? – falara Rodrigo – Não chora, Debby, isso é conversa.
– Eu acho que não é, cara! – falara Riemke, firme.
– O que a gente vai fazer? – perguntara André.
– Agora, eu vou comer esse bacalhau aqui, André, o mundo não vai acabar não, rapaz! – falara Rodrigo rindo.
– Rodrigo, eu tô falando sério, o que a gente vai fazer? – repetira André.
– Não tem o que fazer, cara, acabou! – Riemke continuava firme.
André parecia desolado, não parara de olhar Debby. Rodrigo começara a comer, rindo e ironizando a situação, Debby chorava e Dandara estava com a mão na boca, sem saber o que falar. Riemke continuava sério e eu era o único a manter os olhos na tv, lendo as notícias que explicavam o porquê do fim.
Chequei o celular e a mensagem de já me emocionava.
“Tu viu a notícia? Eu te amo. Não acredito que não vou te ver mais, não paro de chorar, não paro de pensar em ti. Entra na internet! Preciso te ver urgente.”
Aquilo me doía. A ficha não caía rápido para mim, nunca caíra. Só agora começara a perceber que as pessoas mais importantes da minha vida estavam a um oceano de distância. Haveria de morrer só? Era esse o preço que deveria pagar por ter sido tão solitário a vida inteira?
Eu me sentia ausente do clima da sala, estava perdido em pensamentos e desesperos, não sabia afinal o que fazer do tempo que restara. Levantei-me e fui para o quarto sem falar com ninguém, até a fome passara.
Mandei uma mensagem pelo celular: “Entrando”.
Liguei o computador e entrei no facebook. Chamei a ligação por Skype e aguardei a chamada se estabelecer. estava em prantos, sua irmã Milly estava no seu colo também chorando. Começamos o chat.
, eu te amo.
Eu te amo.
Ela chorava sem parar.
Vai ficar tudo bem, . A gente vai morrer pensando um no outro, era isso o que merecíamos no final. Um amor, eu te amei, o fim do mundo não vai me tirar isso. Ela abrira um sorriso que me salvou de não chorar.
Eu não acredito que não vou te ver. É muita injustiça.
Eu vou morrer olhando pro Rio Mondego, me lembrando de ti. Vou levar o teu porta-retrato. Tua calça, tua blusa. Faz o mesmo, passa os últimos minutinhos pensando em mim?
Claro! Eu te amo, . Eu te amo.
Eu te amo, . , me deixa falar com meu pai um instantinho.
Ok!

Falar com o meu pai não fora nada fácil também, nem com meus irmãos, irmãs, nem a voz chorando da minha mãe no telefone. Tudo me emocionara, minhas roupas, meu baixo, a ficha caíra enfim. Haveria de querer sobreviver até o fim, deveria ter meios para isso. Voltei à sala e falei:
– Precisamos estocar comida, acho difícil alguma coisa abrir amanhã. Vou ao supermercado antes que seja tarde. Alguém vem comigo? Os táxis não devem estar funcionando, precisaremos trazer as coisas a pé.
– Eu vou contigo. – Riemke se levantara prontamente.
– O que eu preciso comprar, Debby? – ela sempre sabia o que a casa precisava.
– Eu vou com vocês também. Não vai comer nada? – ela enxugara as lágrimas, mas o vermelho do olhar permanecia.
– Vamos todo mundo, não quero me separar de vocês. – André falara com um olhar perdido.
Compramos tudo que precisávamos, um táxi ainda funcionara e trouxe as compras enquanto parte do grupo voltava a pé. Tínhamos comida, bebida e álcool suficiente para passar um mês. Cheguei a casa e me mantive conversando com até não aguentar e querer dormir, nove da manhã do dia seguinte. Rodrigo, André, Riemke e Dandara saíram para alguma festa. Debby se trancara no quarto e chorava. e eu vimos filmes juntos e conversamos sobre muita coisa. Sobre como seriam os nossos planos futuros, como seriam nossos filhos, nossos cachorros, casa. Era tudo tão bom de sonhar, era a vida perfeita, que se eu pudesse vivê-la faria valer cada segundo dela.

Seis dias

San, acorda – Rodrigo me balançava.
– Que horas são?
– Não interessa, doido, o mundo vai acabar, sai dessa cama!
– Porra, Rodrigo, meio dia, fui dormir às nove da manhã.
– Eu nem dormi ainda, levanta, cara, tem que viver.
– Vocês receberam o e-mail? – André entrava no quarto, cambaleando de bêbado.
– Que e-mail? – eu falava com a voz rouca.
– Tem avião pra quem quiser voltar pro Brasil. Meu voo sai de Lisboa amanhã às nove da noite.
– Me deixa ver o meu e-mail.
Pelo celular, chequei o e-mail. Todos os participantes do programa de intercâmbio ganhavam passagem de volta. O meu voo saía do Porto no outro dia, às 3 da tarde, e chegaria a Recife. Como eu iria pro Porto? Como iria pra Fortaleza?
– Como eu vou pra Lisboa? Não tem trem funcionando! – falava André.
– Rouba um carro. – respondera Rodrigo.
– Eu não sei dirigir.
– Vê com alguém que tá indo no mesmo voo, dá-se um jeito, cara. – eu respondia.
– Será que vai ter problema levar erva? – André perguntava.
– Lógico que não, eles vão te prender por isso? – eu respondia, já sem paciência.
– Rodrigo, tu vai voltar? – eu perguntara.
– Macho, depois de ontem à noite, eu não boto um pé fora de Coimbra. Estão rolando as festas mais iradas da minha vida. Ontem teve orgia no NB.
– Fortaleza deve tá igual cara, lá tem tua família.
– Eu vou pra Madrid amanhã de carro com duas espanholas que eu conheci. De lá vou pra Barcelona, vamos terminar em Amsterdã. Se eu for morrer, quero morrer onde eu fui mais feliz na vida.
– Faz sentido, eu vou voltar. Quer que eu leve alguma coisa pros teus pais?
– Quero, vou fazer um vídeo.
– Eu não sei se quero voltar pro Brasil. – falara André – Tem vaga pra eu ir?
– Acho que não, André, mas posso ligar e perguntar. – dissera Rodrigo.
– Não sei, minha mãe só tem a mim, mas como eu vou chegar a minha cidade?
– Rouba um carro! – respondera Rodrigo.
– Eu não sei dirigir, caralho! – André se estressara.
Entrei em contato com o meu pai, falei do voo, o alívio dele foi enorme. Meia hora depois ele me retornou com ótimas notícias. O primo dele de Recife, Luís Henrique, me traria em seu carro para Fortaleza, toda a família iria se reunir em Canoa Quebrada para passar os últimos dias e ele decidira vir junto com a parte da família que morava em Recife.
Eles eram os primos mais próximos, eram praticamente irmãos. Perguntava-me como Patrícia, sua esposa, aceitara passar os últimos dias longe dos pais. Percebi que iria passar por uma situação semelhante com . Éramos muito próximos das nossas famílias, como resolveríamos com quem passar os momentos finais?
Que importava afinal? Eu iria revê-la. Finalmente revê-la. Abdicaria de qualquer coisa por isso, passaria os últimos segundos em qualquer lugar se ela estivesse fisicamente ao meu lado. Percebi que ela era mais importante que minha família.
Metade dos problemas locomotivos estava resolvida, só conhecia uma pessoa que podia me ajudar se tratando de ir para o Porto. Liguei para Celso, o vocalista da minha banda, ele falou que a banda estava toda reunida no café Aviz. O point dos músicos brasileiros de Coimbra. Encontrei-me com ele lá e expliquei a minha situação.
Senti inveja vinda das outras pessoas, mas todos se emocionaram com a minha sorte. Celso pediu uma última noite da banda, aquela noite, seria a nossa despedida, a banda inteira. Havia até local marcado e ele prometeu que depois da festa acabar me levaria para o Porto.
Aceitei a proposta, seria bom de fato tocar com eles uma última vez. Ir a uma festa pela última vez. Arrumei minha mala, falei com menos que gostaria, mas a felicidade era tamanha que quase não acreditávamos que em 30 horas iríamos finalmente nos encontrar.
Tomei banho e fui tocar, havia bebida e drogas à vontade. Com menos de uma hora de show, a loucura tomou conta do lugar. Pessoas quase transavam em todos os lugares, Celso beijava uma mulher enquanto tocava e uma Belga estava acariciando o percursionista durante a apresentação.
Rodrigo, Riemke, André, Dandara e Rick chegaram ao meio da noite ao bar em que estávamos. Estavam bêbados, drogados e felizes vieram falar comigo.
San, entra na putaria! O mundo tá acabando, aproveita pra comer todo mundo, usar todas as drogas, tá liberado! Vou acender um baseado aqui ó. – Rodrigo dizia bêbado.
– Eu amo, Rodrigo, eu amo! Prefiro escrever as páginas dos meus últimos dias com o amor que sinto, não com o vazio de sexo casual. – Abrira um sorriso para minimizar a situação.
– O cara tá certo, Rodrigo! – dizia Rick.
Dandara e Riemke ficavam num canto, meus amigos se inseriram mais intensamente na festa. Contei comigo nove pessoas que se mantinham reservadas. Aproveitei minha última apresentação para me exceder no álcool. Que diferença fazia, afinal?
Após a banda encerrar a apresentação, Celso dormiu um pouco no bar, passamos na minha casa e peguei minha mala. Despedi-me dos amigos que fizera em Portugal, e Riemke aproveitou a carona para o Porto, o avião dele sairia às 6 da noite, levamos comida pronta que Debby fizera.
Liguei para o meu pai e para avisar que estava indo viajar, a incerteza era grande, mas a esperança também. Voos já tinham saído com os estudantes e parecia prioridade do governo brasileiro devolver os jovens cientistas para o país.

Cinco dias

– Por que tudo tinha de acabar assim? – perguntara eu para Riemke, já no aeroporto, a espera do voo.
– Cara, tinha de acabar de um jeito. As coisas acabam, é o ciclo natural. – ele respondera.
– Você tá triste? – ele não esboçava reação nenhuma, sempre.
– Pior que não, sinto pena de não ter feito tudo que queria. Paciência.
– Vai fazer o que nos últimos dias?
– Ouvir música, tomar uns vinhos portucalenses e cervejas holandesas com o meu pai e irmão. Fico muito feliz por ter essa oportunidade de voltar para casa.
– Ciclo natural das coisas, essa é a tua teoria então.
– Sim. Cara, tu já percebeu como tudo tá mais eficiente esses dias? Estamos maximizando nosso tempo, olha quanta organização nesse aeroporto, eu esperava um caos, mas não, todos estão compreensivos e dando o seu máximo para todos irem pro seu destino.
– E você quer concluir que a anarquia é mais eficiente que qualquer sistema que já vivemos?
– Olha em volta, a única parte boa do fim do mundo é o mundo experimentar a anarquia na sua plenitude.
– Não acredito que a organização esteja prevalecendo, esse é um aeroporto pequeno, aposto que há gente se matando para pegar um voo em outros lugares.
– Provavelmente sim.
– No fim, a humanidade se organizou à toa?
– Acho que não, cara, ela se organizou porque é natural. As coisas estão do jeito que estão porque deveria ser de alguma forma, é natural buscarmos um equilíbrio. Acho que esse sempre foi nosso erro, tentar equilibrar o que por nós sempre foi desequilibrado.
– Concordo que tudo deveria acabar, mas ontem eu vi tanta relação vazia naquele bar. Espanta tanta gente procurar na luxúria um bom jeito de passar os últimos dias.
– Qualquer coisa que você fizer vai ter um sentido mais especial por serem os últimos dias.
– No fim o Tommy Lee Jones estava certo no The Sunset Limited, éramos uma espiral sendo dragada por um poço sem fim.
– Somos. Mas não acho que o mal ganhou no fim. Quem perdeu com o fim do mundo foram aqueles que levaram uma vida vazia.
– Eu fico feliz com a vida que vivi.
– Eu também, cara.
– Deu minha hora, Riemke, foi um prazer ter te conhecido, nunca vou esquecer aquele momento na praça que tivemos em Amsterdã.
– Foi um prazer ter te conhecido, obrigado por ter me indicado filmes e livros tão bons. – nos abraçamos e eu preparei para embarcar.
Sentei ao lado de Ruth, uma menina que também fazia engenharia civil, ela era natural de Caicó, estava no mesmo voo para Recife comigo. Dei-lhe pouca atenção no voo, dormi maior parte dele.
Quando cheguei a Recife, Luís Henrique me esperava. O aeroporto de Recife estava um caos, prontamente lhe agradeci por estar ali e pegamos a estrada. Eu, Luís Henrique, Patrícia, sua esposa e Kim, sua filha. Conversei pouco e aproveitei para dormir o máximo que pude. Ele já era habituado a fazer o percurso em sete horas, sem o medo de multas fez em seis. Meu coração disparou quando vi que em poucos minutos estaria em casa, eram seis da manhã e um novo dia nascia.

Quatro dias


O portão do condomínio estava aberto, o porteiro devia ter abandonado o trabalho, com certeza. Percebi que muitos estavam acordados, empacotando coisas e colocando em carros. Todos deviam passar o fim do mundo em algum lugar especial. A luz de minha casa estava acessa e pude ver o carro de na porta. Ela estava lá, me esperando! Desci do carro e me deparei com ela. Enfim nos reencontramos.
correu chorando para me abraçar, meu coração disparou. Pude sentir o coração dela, forte quando encontrou o meu peito, ela usava minha camisa xadrez, o seu perfume e ficamos um bom tempo abraçados antes de nos olharmos.
– Eu senti tanto tua falta – nos beijamos e enfim me concentrei para dizer alguma coisa, não consegui dizer nada além do óbvio.
– Eu te amo, . – comecei a chorar também.
– Eu te amo, . – meu pai se aproximava e me separei de por mais que aquilo me doesse, ainda estávamos de mãos dadas quando abracei o meu pai, aos prantos.
– É muito bom te ver, filho! Eu te amo. – ele dizia chorando.
– Eu te amo, pai, cadê o Gabriel?
– Foi dormir com a Becca, deixou o quarto pra vocês, vocês tem muita saudade pra matar, certo? Fez boa viagem?
– Fiz sim. Vocês devem estar com sono, vão dormir. – eu falava – Vamos ajudar o Luís Henrique com as malas e vamos dormir.
O quarto de baixo tinha uma cama de casal agora, com tv e ar condicionado. Meu pai iria prepará-lo só para quando eu chegasse definitivamente de Portugal, ele conseguiu arranjar tempo para mobiliar tudo. Estava perfeito, do meu jeito. Beijei minha irmã, abracei a esposa de meu pai.
Enfim a sós no quarto com . O sexo de reencontro foi perfeito, fizemos tantas vezes quanto aguentamos. Trocamos olhares e dormimos abraçados, olhando um para o outro. Não continha minha felicidade. Estava com a mulher que amava. Eu me sentia enfim completo, após passar quatro meses pela metade.
Acordamos e tomamos café, haveria um churrasco lá em casa de noite e a família de iria. Engraçado as famílias se conhecerem a quatro dias do fim. Fomos para a casa de em seguida, abracei sua irmã Ella com muita força, eu a adorava. O pai de me chamou num canto, sabia o teor da conversa, era uma pena não ter conversado com ela antes, teria de tomar uma decisão sobre onde passar o momento do fim do mundo por nós.
– Bom. Você deve supor que nós vamos pra Lagoa, você vem com a gente? – ele começara sem rodeios.
– Meu pai vai para Canoa, ele deve ter lhe contado. Não conversei com a sobre isso.
– Nem vai conversar! Minha filha vai passar os últimos momentos com a família perto.
Conversamos mais um pouco e chegamos a um consenso. Ele pareceu apoiar a minha ideia e ficou muito satisfeito com ela, por fim me disse:
– Nenhum homem é suficientemente bom pra sua filha, pena você não poder entender isso. Até que um dia alguém o é. Fico feliz por vocês terem se conhecido. Você é um bom rapaz, .
– Obrigado por tê-la criado tão bem. – nos abraçamos e eu voltei para a minha casa, viria com a família mais tarde.
Cheguei a casa e reencontrei o meu irmão, Gabriel. Nos demos aquele abraço forte, de sempre. Não choramos como sempre prometemos fazer, desde criança. Ele deu notícia de que minha mãe chegaria ao outro dia e iria para o apartamento de meu vô, aquilo me alegrara. Iria ver minha mãe, não tinha esperanças disso.
Enfim os convidados chegavam pro churrasco, Becca, a namorada de Gabriel, e sua mãe. Meu tio Tomaz, minha tia Geisa e seus filhos Igor e Marcos, acompanhado pela namorada Tamara, a família de Tamara chegou mais tarde. Até que a família de chegou. Minha vó chegou mais tarde com Luís Henrique e minha tia Erli. Chegaram os amigos de meu pai, Serginho e Pompom com as suas famílias. Meu melhor amigo, Steven, também aparecera.
Tocamos, cantamos e rimos. Contei minhas histórias na Europa, contei sobre mim e e como tudo se desenrolara tão rápido. Minha irmã e as irmãs de brincavam, pareciam se conhecer há anos e alguns momentos me emocionaram.
– Meu filho, é uma pena eu não puder mais ver a Lita, minha filha vai morrer longe da mãe. – falara minha tia Geisa. Abracei-a e falei baixinho em seu ouvido.
– Calma, tia, talvez aqui ela não suportasse a ideia de ver vocês sofrendo. Sua filha te ama e sempre vai te amar. – ela pareceu aliviada apesar da sua cara estar mal de tanto ter chorado.
– Pensei que nunca mais ia te ver por morrer antes de você voltar, agora todos vão morrer. Adorei sua noiva, tão linda, uma pena vocês não terem tempo de dar o meu bisneto. – falara minha vó.
– Em quatro dias vamos reencontrar o vô, vozinha. E eu, minha vó. Todo mundo vai ter essa mesma festa, logo. Se Deus quiser. – eu não acreditava em Deus, mas era aquilo que ela precisava ouvir. O que haveria de falar diferente? Ela sorrira e me beijou.
– Branquelo, você sempre soube me animar! – o sorriso dela me salvara de não chorar de novo.
Conversei com o meu pai sobre a minha decisão de passar os últimos momentos, ele se emocionou, mas aceitou. Falou que tivera orgulho de mim, que eu era melhor que ele e que seria melhor pai que ele. Como? Meu pai era perfeito pra mim.
Dormi na casa de , no outro dia de manhã a família dela iria para a Lagoa, uma casa de campo de seus avós, decidi por acompanhá-los, almoçar por lá e voltar para pegá-la só à noite. Teria à tarde para ver minha mãe e o outro lado da família.
Enfim dormira no quarto de . Ela sempre me falara que isso nunca iria acontecer e se enganou no fim das contas. Era tão bom tê-la por perto, nem o fim do mundo abalara nossa felicidade de ter um nos braços do outro por uma noite.

Três dias

Acordamos, fizemos sexo e descemos para tomar café. Havia tapiocas feitas, o caseiro da casa da não abandonou a família e iria junto para a lagoa com eles. Arrumamos as malas e eu e fomos sozinhos no carro, não conseguíamos parar de rir e chorar. Ela havia feito um cd para me dar de presente de Natal, cada música uma emoção.
Chegamos à Lagoa e presenteei seu avô com um vinho do Porto. Ele pareceu feliz, fiquei em torno de duas horas lá até o almoço sair. Uma lasanha deliciosa. Minhas cunhadinhas brincavam na lagoa, felizes. Filosofamos um pouco e me despedi.
– Não demora, por favor. – ela suplicava com os olhos.
– Não vou demorar, . Venho dormir aqui, vamos ter um quarto só pra gente, né?
– Sim, minha vó fez questão de me garantir isso!
– Ok, me deixa ir pra me despedir de minha mãe.
– Eu te amo!
– Eu te amo! Pra caralho.
Peguei a estrada de volta só e enfim cheguei ao apartamento de meu vô. Lá ainda havia porteiro. O clima estava pesado lá. Meu vô estava bêbado de Uísque com o meu padrasto. Meu tio, desolado, chorando. Meu irmão estava lá com Becca e minha tia mal conseguia se mover. Meus irmãos brincavam na internet.
– Oi, mainha. – ela estava bem, apesar de tudo.
– Deus é mais, , uniu essa família que nunca conseguiu se entender!
– É sim, mainha. Foi boa a viagem?
– Foi tranquila. Tá um caos, a cidade, queria que tu visse.
– Eu imagino. Vocês vão ficar aqui?
– Vamos pra fazenda, tu não vem junto? – falara meu vô.
– Não, vô, decidi passar os últimos dias com a .
– Leve ela.
– Nós temos outros planos.
– Deixa, pai, o menino tá certo, a gente tem que passar os últimos dias com quem ama. – falara meu tio aos prantos.
– Tio Zé. Força, cara. Vai ver tua mãe logo, fica bem.
– Deus te ouça, , Deus te ouça.
– Eu vou com eles. – falara meu irmão.
– Eu entendo, Gabriel, você nunca conseguiu sair de perto da mãe. – eu respondia com um sorriso.
Fiquei a tarde lá, mostrei as fotos da Europa e aquilo os animou.
Foi triste me despedir de tanta gente importante da minha vida, desabei de chorar e dizer que os amava. Abracei Gabriel como nunca, tão forte. Estávamos tão fortes, tão lindos. Os irmãos mais unidos do mundo, pela última vez juntos, conversei com meu tio Zé e pedi-lhe um favor que ele me concedeu. Eles iriam para a fazenda logo, ajudei-os a arrumar os carros e vi-os partir. Fiquei com a chave de seu apartamento.
Voltei à minha casa e aproveitei para dar uma volta de carro com Steven, meu melhor amigo. Contei o que não contei pros meus pais sobre as aventuras de Amsterdã. Ele se sentiu triste por não estar com a Claire nos últimos dias. Incentivei-o a se abrir com ela e ele disse que ia fazer isso mesmo. Era estranho ver que no fim das contas era ela que ele amava. Meus melhores amigos juntos. Isso me deixava extremamente feliz.
Jantei com a família de meu pai. Passei na casa dos pais do Rodrigo e deixei o HD com as fotos e vídeos pros pais dele, eles estavam felizes. Felizes pelo filho deles estar feliz, estar onde gosta. Peguei a estrada de volta e tomei o rumo da Lagoa.
Cheguei lá a tempo de beber mais um pouco e conversar com a família de . Quando todos foram dormir, finalmente fizemos o tão prometido sexo na lagoa. Dormimos juntos e me abri com ela.
. Conversei com seu pai, se você quiser, você volta comigo hoje e vamos passar os últimos tempos juntos.
– A gente vai pra canoa com a sua família?
– Não. A gente vai almoçar aqui, jantar com a minha família e de noitinha eles vão pra canoa. A gente vai passar o último dia juntos. Só eu e você.
– Fechado. Vamos dormir, estou cansada.
– Vamos! Eu te amo, .
– Eu te amo, .

Dois dias

Acordamos, se dormimos quatro horas foi muito. Beijamo-nos e nos amamos no banho. Todo mundo já estava acordado no deck. Bebendo, rindo e comendo petiscos. Aproveitei para andar um pouco no barco do vô de com as suas irmãs, brincamos um pouco na lagoa e voltamos.
– Esse casório sai quando, Régis? – brincava um dos tios de .
– Tem que sair hoje! Não tem mais tempo. – ele respondera brincando.
– Eu nem tenho alianças! – respondi brincando – Mas eu gostaria de dizer umas palavras. Primeiramente, muito obrigado por terem me acolhido tão bem. Vocês são uma família linda e muito obrigado por terem criado tão bem a . Peço desculpas por ter de roubá-la, ela me roubou de minha família também. Eu amo a , com toda a intensidade. Bom, acho que só.
A avó de nos abraçara e pude ver os olhinhos lacrimejando de todos, tínhamos pouco tempo com eles, não queria ir logo. Almoçamos e ficamos até o meio da tarde. Eu tinha que me despedir da minha família. Ao se despedir todos foram para o portão. chorou muito ao se despedir da família. Sua irmã Milly foi a última a abraçá-la, Ella, a última a me abraçar, beijou-me o rosto e disse “te amo”. Alguns “juízos” ainda puderam ser ouvidos.
Despedir da minha família foi igualmente difícil. O jantar era alegre, no entanto. Meu pai não parava de me abraçar, ele conteve o choro como em toda a despedida que tivemos. Eu sabia que ele iria chorar só depois que eu fosse. No fim só me disse:
– Vamos pra canoa, o Gerson sempre soube que o mundo ia acabar, vai ver ele tá certo e só a cabana dele seja segura.
– Ele é abençoado, pai, qualquer momento perto do tio Gerson é de paz.
– Um beijo, filho. Deus te dê força pra aguentar o final.
– Pode deixar, pai! Eu te amo. Obrigado por tudo.
– Eu te amo.
Eles enfim foram embora, só restava eu e e ela finalmente me olhou e perguntou:
– Afinal, onde a gente vai passar os últimos momentos?
– Surpresa! Posso te vendar?
Ela aceitou e eu dirigi o carro até o destino final, de lá não sairíamos mais. No caminho pude ver um cachorro de rua, tirou a venda só o tempo de pegarmos o cachorro e colocá-lo no carro.
– Isso é o apartamento da praia? – ela perguntara quando chegamos ao apartamento.
– É! Sempre foi nosso sonho morar junto, pensei que poderíamos morar, nem que por um dia.
– Que perfeito, ! – ela abrira um sorriso e não parava de me beijar.
O apartamento era nosso, o favor que havia pedido para o meu tio eram seus quadros, que impressionaram e estavam dispostos na nossa sala. A mobília da sala era praticamente a mobília da sala de meu pai. A cozinha estava previamente mobiliada. Só equipei-a com um jogo de talher de minha vó. O meu quarto da casa do meu pai, era agora nosso quarto e todos os cartões postais que eu havia trazido decoravam a parede. O escritório tinha uma mesinha e uma estante cheia de livros e o meu violão e baixo estavam apoiados na parede.
, esse apartamento é nosso! Até tem um cachorro, que perfeito.
– Qual o nome dele?
– Rhaego, lógico!
O Rhaego, um dragão de pelúcia que eu tinha dado pra , estava lá. Ela finalmente me deu o presente de natal que tanto trabalhara e perguntara:
– Como tu conseguiu? O apartamento tá tão nosso.
– O Steven e o Gabriel me ajudaram, fiz tudo isso só no tempo que passei longe de ti.
– Foi assim que tu convenceu meu pai?
– Sim, tive que tirar fotos e mostrar pra ele na lagoa agora.
, eu te amo.
– Eu te amo, . Agora ajeita a sala, prepara a mesa que vamos ter convidados. Vou fazer uma carbonara, aceita?
– Lógico.
Chegaram pouco antes de o jantar ficar pronto. Steven e Claire de mãos dadas e o Henrique com sua nova namorada, Alicia. Convidei Amy, amiga da , e seu namorado. Queria convidar mais gente, mas não conhecia os amigos dela suficientemente.
Conversamos, bebemos, comemos e rimos. Eles adoraram o apartamento, estavam felizes e o mundo não parecia que ia terminar no outro dia. Foram embora pelas duas da manhã. Despedir dos amigos foi igualmente difícil.
Depois que eles foram embora, bebemos, conversamos e fizemos sexo em todos os lugares da casa. Estávamos felizes, completos. Se o mundo tinha que acabar, fizemos daquele momento o momento perfeito para ele.
– Obrigada, , eu não sei falar nada além do eu te amo.
– Eu também, . Eu te amo, é a única coisa que eu consigo dizer. Consigo dizer que o mundo não passa de um reflexo, só você me completa. Só você é verdade, 100% do tempo.
– Eu queria dizer que o mundo pode acabar agora! Eu nunca estive tão feliz na minha vida, felicidade não é nem a palavra certa, amor não é a palavra certa pelo que eu sinto por ti. Mas são as palavras que temos, então vamos usá-las.

Um dia

Acordamos com o latido do Rhaego, quando fiz menção de colocar a roupa.
– Não, quero você nu. – ela dissera.
– Ok! Vou fazer omelete pra gente.
Comemos omelete e um pouco da torta da vó dela, chocolate realmente fazia a feliz, o último dia duraria apenas cinco horas, decidimos assistir o filme que mais nos emocionou e, curiosamente, encaixava perfeitamente na situação: Procura-se um amigo para o fim do mundo.
colocou o nosso cd pra tocar e nos deitamos na cama. Não queríamos sexo, queríamos amor, queríamos olhar pro outro, sentir o calor do corpo do outro, o suor, o cheiro e o gosto dos lábios suados.
No momento que pudemos ouvir um ruído enérgico, Wonderwall começou a tocar, como mágica. Era a música que tocava quando a pedi em namoro. O clarão aumentara e sorri espontaneamente, a última coisa que vi foram os olhos de . Aqueles olhos que me fizeram me apaixonar. Sussurrei “eu te amo” e o fim foi assim: Os olhos dela, o suor de seu corpo e um eu te amo baixinho, até onde sei, não passou filme na minha cabeça, só aquela cena e o que posso lhes contar é que foi aquele quadro sinestésico, uma obra prima, que ecoou na minha cabeça por toda a eternidade.

Nota da Teesh: Oi estrelinhas! Gostaram? Se estão lendo esta nota, é porque o mundo ainda não acabou! Oba!
Como eu falei no grupo, a ideia inicial era ter dois pontos de vista. O Khal escreveria o POV masculino, e eu faria o femino baseado no que ele tinha. Mas eu não fazia ideia que a história seria assim, não tive condições de escrever, mal consegui ler. Mas o outro POV é desnecessário, concordam? A história não poderia estar mais completa! Quem sabe, um dia, eu consiga ler e escrever a parte que me era devida.
Acho que não foi do mesmo jeito pra vocês, mas eu comecei a chorar no primeiro capítulo e não parei mais! Começo a chorar só de lembrar e/ou falar dessa história e tá sendo super complicado escrever essa nota! Um resumo do porquê:
Eu conheci um menino, a gente começou a sair. Eu não levava muito a sério porque era férias, ele nem mesmo estuda na minha cidade, mesmo sendo daqui, e o moço ia fazer intercâmbio de um ano. Dias passam, a gente se envolve muito, uns 15 dias antes de viajar ele me pede em namoro, acreditam?! No natal nós fazemos 4 meses de namoro, e mais de três meses que ele tá morando fora. Essa história ele escreveu com a gente, com nossos amigos, com nossa família, com nossa história, e isso mexeu muito comigo. Queria deixar tudo interativo pra ver se vocês sentiam o mesmo tipo de emoção, mas seriam muitas perguntas e ia todo mundo me odiar! HAHAHA
Bom, é isso, comentem, digam-nos o que acharam desse fim de mundo. Quem ainda não assistiu Procura-se um Amigo para o Fim do Mundo, assista! AGORA! Depois de comentar vocês podem correr pra ler as outras fics do Especial, tem umas MA-RA-VI-LHO-SAS que eu consegui espiar antes!
Um muitíssimo obrigada à Bianca e à Larissa, que leram antes e me ajudaram a revisar a fic, e à Gabe, por betar mais essa fic pra gente. (L)
E pra conhecer mais um pouquinho do trabalho do Khal, tem Quando o Dia Encontra a Noite (fics/q/quandoodiaencontraanoite.html) - Outros/Em Andamento e O Cavaleiro de Toledo (fics/o/ocavaleirodetoledo.html) - Especial de Halloween.
Muito obrigada, estrelinhas! E bom natal, fim de 2012, começo de 2013 e não fim do mundo para todos nós!


Qualquer erro nessa atualização é meu, só meu. Reclamações por e-mail ou pelo twitter.

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