Escrita por: Ana Mércia
Betada por: Brunna




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Capítulo I


13, fevereiro, 2011 – 07h00 AM.

Era terça-feira na enorme e tumultuada cidade de Nova Iorque, a maioria das pessoas acordava a esta hora. Uns, para o longo dia de trabalho; outros, para levarem os filhos às rigorosas escolas, e havia ainda os que iriam correr no grande e verde Central Parque. Mas nenhumas destas opções se encaixavam para e . Eles acabavam de chegar da longa e tubulada noite. Não, eles não estavam chegando de alguma festa ou qualquer coisa do tipo como alguns jovens da cidade. Suas vidas não eram tão simples assim, pelo menos não conseguiam imaginá-la ainda mais complicada do que já era, mas como tudo sempre pode piorar, eles preferiam não imaginar essa possibilidade.
Perigo... Esta era a palavra que mais os atraiam. Apesar do medo, era inacreditável a sensação que sentiam ao terminar mais uma noite de trabalho, era assim que chamavam. O frio na barriga, o suor, as dores no corpo e o sentimento de dever cumprido. Não, não é sobre sexo. Mas sim, sobre o que amavam e odiavam fazer. Perigo, sedução e sangue frio; era disso que viviam, era disso que necessitavam. O proibido era atrativo. O errado era melhor do que o certo, pelo menos em suas mentes, era dessa forma.

- Você viu a cara dele? – disse, enquanto ria de forma debochada. – A cada dia que passa eu amo mais isso, sabe? – assentiu, deixando o corpo cair sobre o sofá.
- Mas temos que admitir que está cada vez mais difícil... – Ele disse e ela assentiu, tirando os sapatos de salto dos pés e sentando-se no colo do namorado. – Dessa vez quase...
- Não, nem continua! – se levantou, descendo o zíper do vestido preto que usava. – Não foi quase, e nunca será, ok? – o homem assentiu, pegando um maço de cigarros dos bolsos e acendendo um deles. – É engraçado como nos tornamos frios com o tempo, não é? – o fitou – Nem parecemos aqueles dois...
- Nós não somos mais aqueles dois idiotas, . – Disse frio, entregando um cigarro na mão dela, que o levou à boca. – E nem vamos voltar a ser. – se levantou também, encarando-a. – Eles morreram, . – ela abaixou a cabeça, ouvindo seu antigo apelido. – Hein, por que começamos com esse assunto mesmo? – levou o dedo indicador ao queixo dela, erguendo-o. – Não temos que nos importar com o passado, temos que viver o presente. O agora. – sorriu confiante, selando os lábios nos dela.

27, janeiro, 2005 – 10h35 AM.

- É, eu não aguento mais, ! Não aguento mais minha família, minha casa, essa escola, essas pessoas! – esbravejou, chutando o grosso tronco da árvore que estava em sua frente, enfeitando o belo jardim do Yorkers High School.
- Foram seus pais de novo? – disse, olhando-a. Ela somente assentiu, com a visão parada. – E o Henry? Não fez nada?
- O que meu irmão pode fazer? - deu os ombros, sentando-se ao lado do fiel amigo. – Ele tenta segurar meu pai... Mas você sabe, quando ele bebe, fica incontrolável! – brincou com o pequeno graveto que estava ao seu lado.
- Se eu pudesse... – tocou no braço dela, que soltou um gemido de dor. – O quê... – ele olhou para o lugar que tocou e viu hematoma. James. – Quando foi isso? – ela mordeu o lábio inferior, desviando o olhar. – Responde, !
- Ontem, , ontem! – se levantou irritada. – Não importa mais.
- É claro que importa! Até quando você vai deixar esse cara fazer isso com você?! – ela desviou o olhar novamente. Ele se levantou, indo até ela e fazendo-a olhá-lo. – Você não pode viver num lugar como esse, ... Não pode continuar vivendo no lugar da sua mãe. É dela que ele tem raiva, é ela que merece tudo isso.
- Ela não é minha mãe. – suspirou, passando a mão nos braços, aquecendo-os. – Não é e nem nunca vai ser, ela é uma vadia que já deveria ter saído daquela casa pra ir, enfim, morar com os milhares de amantes que têm mundo a fora. – respirou fundo, tentando manter a calma. – A única pessoa que me importa na minha casa é o Henry, você sabe. Se não fosse por ele, eu... – fez uma pausa, mas a incentivou a continuar. – Eu sei lá! – deu os ombros, virando-se de costas.
- Você sabe que se dependesse de mim, já estaria há muito tempo fora daquela casa, né? – disse, tirando um maço de cigarros do bolso. – Eu sei que você não gosta, mas... – esticou a mão, segurando um cigarro entre os dedos, oferendo a droga para ela.
- Para com isso! – pegou o cigarro da mão dele e o jogou no chão, pisando em cima. – Como se já não bastasse os meus problemas, ainda tenho um amigo que aos dezessete anos terá um câncer de pulmão por fumar mais do que Bob Marley. – rolou os olhos, eles se encararam e deram risada. – É sério... – ainda rindo. – Você tem que parar com isso, .
- Não é só você que tem problemas, . – sorriu fraco. – É como minha válvula de escape, sabe? – acendeu o cigarro. Ela o abraçou de lado. – Vamos conseguir, . Um dia nós vamos. – beijou o topo de sua cabeça. Poucos minutos depois, o sinal tocou como um lembrete para que os alunos voltassem para suas respectivas aulas.

Mais três longas e cansativas aulas haviam se passado. O sinal anunciando o final das aulas tocou para a alegria de todos, ou quase todos, entre eles; e , que teriam de voltar à velha e maçante rotina. Eles se despediram como todos os dias, e cada um seguiu seu caminho, seguiu sua sina.
logo chegou em casa e demorou um pouco para abrir a porta, tentando encontrar as chaves dentro dos bolsos, que estavam cheios com papel de balas, isqueiro, um maço de cigarros e seus fones de ouvido. Nem ele sabia como tanta coisa poderia caber em um lugar tão pequeno. riu com a malícia que seus pensamentos tomaram, e logo abriu a porta, encontrando a mãe, Julie, sentada no sofá. Ele passou depressa, não queria vê-la tão cedo.

- Achei que seu pai tivesse lhe dado mais educação. – disse alto para que ele ouvisse. Ele respirou fundo uma, duas vezes. – Ficou mudo, garoto?
- O que você quer que eu te responda?! – voltou, descendo as escadas. – Eu já cansei de brigar, Julie! – a senhora rolou os olhos, voltando à atenção para a TV. – Você poderia estar naquele barco, não é? – ela o olhou. – Você tinha que ter morrido no lugar do meu pai. Você! – gritou, com o dedo em riste. Antes que ela falasse qualquer coisa, ele correu para seu quarto, seu refúgio onde passava boa parte dos dias. – Merda, merda, merda! – trancou a porta, foi até a escrivaninha e jogou todos os papéis que estavam em cima dela, no chão. Um retrato dele com o pai, pescando, também estava lá. – Ah, ótimo! – ironizou, pegando a foto. – Por que você tinha que me deixar, pai? – disse com a voz embargada. Odiava fraquejar. – Tudo seria tão mais fácil se você estivesse aqui... – respirou fundo, fechando os olhos. – Você não tinha o direito de me deixar! – jogou o retrato com força na parede, quebrando o resto do vidro que cobria a foto. Ele passou a mão pelos cabelos, descontroladamente. – Fraco. Você é um fraco, ! – fechou os olhos, deixando as lágrimas caírem sem aviso prévio.

Já anoitecia, lavava a louça de sua casa, enquanto Henry, seu irmão, trabalhava. Seu pai, James, bebia em algum bar da região, e sua mãe, Brittany... Só Deus sabia onde poderia estar aquela mulher numa hora dessas. Em seus devaneios, tomou um susto ao sentir dois braços envolverem a sua cintura.
- Há! Baixinha! – Henry riu, ao ver o susto que a irmã levou. – Tudo bem? – sorrindo, sentou-se à mesa.
- Estava até você chegar, não é? – brincou, mostrando a língua. Eles riram. – Pode me ajudar a colocar a mesa?
- Claro. – Ele deu os ombros, se levantando e indo até gaveta pegar a toalha de mesa. – E me diz, como foi o teu dia hoje? – tirou o vaso de cima da mesa e esticou a toalha.
- Bom... – suspirou. – Como todos os dias, né? – deu os ombros, mexendo o molho que fazia na panela. – Só falei com o o dia todo... Problemas e mais problemas, maninho. – sorriu fraco, virando-se para ele, que carregava um sorriso malicioso nos lábios.
- , não é? – ela abriu a boca, fingindo indignação com o olhar e o tom que ele usava. – Estou de olho, ! – tocou na ponta do nariz dela, fazendo-a rir.
- Você é um idiota, sabia? – colocou as mãos na cintura, fazendo careta. Ele riu, bagunçando seu cabelo.
- Sou o cara que você mais ama no mundo, pirralha! – piscou e ela riu, dando um tapa no braço dele. – E olha que nem sou seu namorado, viu?!
- Existe alguém mais chato do que esse meu irmão?! – rolou os olhos. Ele a pegou no colo, surpreendendo-a e ela gargalhou, batendo em suas costas para que ele a descesse. Eles ouviram um barulho na porta e logo se arrumaram. Lá vinha problema... Mais problema. – É o pai, não é? – disse baixo, Henry olhou pela porta e assentiu.
- Eu vou ver o que ele quer, fic... – antes que ele terminasse a frase, o senhor entrou na cozinha, totalmente alterado pelo álcool. – Pai... – entrou na frente de .
- Saia da minha frente, moleque! – gritou, irritado. – Onde... – olhou em volta, empurrando o filho. – Você. – disse, olhando . – Você se parece tanto com sua mãe! – ele ergueu a mão e lhe deu um tapa certeiro no rosto. Henry se recompôs e empurrou o pai.
- Já chega! Vá dormir, volte para o bar ou qualquer coisa do tipo, só saia daqui, pai, por favor! – suplicou, vendo a irmã com a mão no rosto. O homem saiu, cambaleando. – Como você tá? – virou-se para a irmã.
- Eu... Eu já me acostumei, Henry. Todos os dias é a mesma ladainha. – suspirou, fitando o chão. – Perdi a fome, vou para o meu quarto, ok? – o irmão acariciou seu rosto e ela sorriu fraco. – Está tudo bem, não se preocupe.
- Um dia isso vai acabar, . – ela assentiu, mesmo não acreditando naquilo.


e , dois amigos, duas histórias, mil motivos para sofrer, um para sorrir; o amor que sentiam um pelo outro. A vida não havia sido tão generosa com eles, não enquanto eram jovens; há seis anos. Seus destinos o fizeram chegar onde estão hoje. As situações os fizeram se tornar e . e não existiam mais... A não ser em seus corações e lembranças, lembranças essas não muito boas. Ela não era mais aquela garotinha fraca, de coração enorme e que amava ver os pássaros cantarem logo cedo em sua janela, ou então, a que adorava quando depois da chuva, um lindo arco-íris aparecia. , muito menos... Aquele adolescente que chorava todos os dias pelo pai, o mesmo adolescente que amava tocar guitarra em seu quarto e sonhava em formar uma banda, havia ficado somente em sua memória, no passado. Hoje, se pudessem escolher que caminho seguir, ou que destino escolher, ficariam em dúvida. Há anos, pediam aos céus uma forma de serem felizes sem poder prejudicar ninguém, somente serem eles mesmos. Uma casa, filhos e dois bons empregos já estariam ótimos... Isto, naquela época. Atualmente, não saberiam se esta vida cotidiana se adaptaria bem a eles. Talvez não fosse tão divertida. Controvérsias e mais controvérsias... Às vezes, e odiavam o que fazia, mas outras... Amavam.

- Bom dia... – disse, distribuindo beijos pelo abdômen de . Ele sorriu malicioso, puxando-a para si. – Opa! – riu com o susto.
- Dormiu bem? – ele disse, passando a mão pelas pernas dela.
- Na medida do possível, sim. E você? – disse e se esticou para pegar o maço de cigarros que estava no criado-mudo ao lado da cama de casal. assentiu, acompanhando os movimentos dela. – Está me olhando por quê? – rindo, ela acendeu o cigarro. – Hein?! – insistiu, colocando o cigarro na boca.
- Nada, não. – mordeu o lábio, subiu devagar as mãos que estavam em sua perna, para a barriga dela, apertando-a, ela sorriu maliciosa, sabia onde ele queria chegar. – Escuta... – se sentou na cama, com cuidado para que ela não saísse de seu colo. – O que acha de sairmos hoje? - pegou o cigarro da mão dela, colocando-o em sua boca.
- Para onde? Já são seis horas da noite, ... – passou a mão pelos cabelos dele, afagando-os. Ele deu os ombros. – Ei? – sorriu, acariciando o rosto do parceiro. pendeu a cabeça para o lado, olhando-a. – Você é um cara muito mau, sabia? – ele gargalhou, jogando a cabeça para trás.
- Eu? Mas por quê?! Sou um anjo! – selou os lábios aos dela, num beijo rápido.
- Só se for Lúcifer... – riu, sentando-se ao lado dele. – Estou com fome. – suspirou, pegando novamente o cigarro da boca dele.
- Eu também... – se espreguiçou e virou-se para o lado, colocando os chinelos nos pés. – Vou tomar um banho. Enquanto isso você pode ir comprar algo para comermos, o que acha? – deu os ombros, assentindo. – Certo, mas anda logo. – brincou e ela jogou o travesseiro em suas costas, ele riu, abrindo o guardarroupa e escolhendo uma roupa qualquer. Ela o observou... Primeiro as costas, enormes tatuagens estavam por ali. Tatuagem havia virado mais um dos vícios de com o passar dos anos; tribais, imagens aleatórias e até mesmo um nome: “John”. Seu pai. Nos braços, mais tatuagens. Depois de reparar em cada uma delas, focou em seu físico... Qualquer mulher em seu perfeito estado mental se sentiria encantada por ter um homem como este consigo. O porte atlético que carregava era de dar inveja a qualquer homem que vive trancafiado numa academia. Quando ia continuar sua analise sobre o homem que tinha ao seu lado, ele se virou, encarando-a.
- É impressão minha, ou estou sendo observado, ? – riu, cruzando os braços.
- Não é impressão! – sorriu, se levantando também e indo até ele. – Você é muito –, deu um selinho nele – muito –, outro selinho – muito –, outro – gostoso. – riu, por fim. Ele também riu, enlaçando os braços na cintura dela.
- Não sou eu que seduz as pessoas todas as noites... – sussurrou na orelha dela, mordendo o lóbulo da mesma. Ela se arrepiou e mordeu o lábio.
- É um trabalho árduo, ok? – mordeu o ombro de , que riu com o comentário. – Olhar em seus olhos e saber que logo... – ela respirou fundo, se afastando. – Eu vou comprar algo para comermos logo, ok? – ele assentiu, sorrindo fraco. – Não demora no banho pra comida não esfriar. – piscou, pegando suas roupas, uma toalha e entrou no banheiro. sentou-se na cama, respirando fundo, lembrando-se da noite anterior.

- Vinho ou champanhe, Drew? – perguntou, segurando as duas taças das bebidas.
- Champanhe! – o senhor disse, sorrindo malicioso para ela. – Quero comemorar esta noite tão... – fez uma pausa, analisando-a e tentando encontrar a melhor palavra para descrever. – Magnífica.
- Concordo... – ela disse, despejando o espumante em duas taças. – Essa noite será inesquecível. – sorriu, dando um gole em um dos copos.
- Tenho certeza que sim. – Drew caminhou até ela, pegando uma das taças, dando um generoso gole. – Mas venha, sem mais delongas... – sorrindo, puxou-a pela mão, fazendo-a sentar em seu colo. – Ainda queria saber o porquê de tanta coisa boa acontecendo comigo! O que fiz para ganhar uma noite com uma mulher tão incrível? – beijou o ombro dela.
- Não sei... Diga-me você, Drew. – se levantou, puxando-o para a porta, onde estava. – O que fez para merecer essa sina? – tombou a cabeça para o lado, encarando-o. O homem a olhou confuso. – Não sabe do que estou falando, não é? – ele negou.
- Aonde quer chegar com isto? Vamos logo para a cama. – tocou no braço dela, e ela deixou o corpo imóvel.
- Foi bom dividir o quarto com você esta noite, Drew. – sorriu e um alto barulho soou pela porta.


chacoalhou a cabeça, espantando as lembranças ruins de lá e se levantou, indo até o guardarroupa, pegando um vestido qualquer. Dois minutos depois lá estava ela, no portão de sua casa, encontrando com mais uma de suas vizinhas fofoqueiras e completamente insuportáveis. E não, ninguém sabia qual era a verdadeira identidade do casal e . Para todos, eram apenas mais um desses adolescentes que se casam. Sim, adolescentes. Como a maioria das pessoas daquele lugar eram senhores de meia idade, ter vinte e três anos era quase que como se fossem crianças de colo.

- Boa tarde, , como vai? – a senhora que provavelmente deveria ter uns quarenta anos, perguntou.
- Tudo bem, e com a senhora? – disse educada, com um sorriso clássico nos lábios.
- Tudo bem também, graças a Deus. – sorriu também.
fitou o horizonte, pensando naquela pequena frase: graças a Deus. Há muito tempo não conversava com Deus... Há muito tempo ele não se mostrava presente para ela. Talvez, hoje, até duvidasse realmente de sua existência. – Mas me diga, faz muito tempo que não vejo . Como ele está?
- Bem... – sorriu fraco, finalmente voltando a prestar atenção no pequeno diálogo com a Sra. Parker. – Me desculpe, mas agora tenho que ir... – a mulher assentiu. – Conversamos mais noutro dia.
- Sem problemas. – piscou, pegando as chaves de sua casa. – Até mais, querida. – entrou, assim que viu o sorriso e o aceno de cabeça de . A jovem rolou os olhos, voltando a andar e indo até o mercado que ficava no mesmo bairro. Ela passava pelas pessoas conhecidas e lhes dava um simples sorriso, quando alguém ameaçava vir puxar papo, ela logo fazia questão de se afastar. Havia virado uma total antissocial. Não confiava mais em ninguém, às vezes quem está ao seu lado é seu pior inimigo. Carregava esse lema consigo há seis anos, e se dependesse dela, o levaria para seu caixão.
Seu celular tocou e ela o pegou: número restrito. Atendeu depressa e logo reconheceu aquela voz.
- Oi. Sim, estou bem, o que quer? – perguntou ansiosa, não sabia o que poderia esperar dali. – Amanhã? Eu não sei... Vou falar com primeiro. – ela mordeu o lábio, já se sentindo nervosa pelo que poderia vir. – Não. Não vou adiantar nada. – respirou fundo. – Já disse que falo com e depois te ligo. – desligou, com vontade de jogar o celular no primeiro buraco ou lixeira que visse. Mas, ao contrário disso, optou por respirar fundo algumas vezes e seguir seu caminho até o mercadinho, que já estava na próxima esquina. Se dependesse dela, não iria mais, havia perdido a fome completamente. Mas, havia mais de uma boca para alimentar em sua casa.

Ela comprou três pacotes de macarrão instantâneo, três latinhas de refrigerante, uma barra de chocolate e seguiu para sua casa, onde, com certeza, já havia saído do banho e estaria mal humorado pela fome e por sua demora. Ao pensar nisto, quando deu o primeiro passo para fora do mercadinho, viu há poucos metros. Ela franziu o cenho, tentando enxergar melhor para ter a certeza de que era ele mesmo, afinal, o que ele estava fazendo ali? Para saber, deu uma pequena corrida até ele e pôde ver o quão irritado estava.
- Por que você demorou tanto?! Que merda, ! – pegou com força no braço dela, que não entendeu muito bem o que estava acontecendo.
- Para de me apertar, me solta! – tentou tirar o braço dentre os dedos de , sem resultado. – Por que está assim? O que eu fiz?
- Eu... – Disse, passando a mão descontroladamente pelos cabelos, visivelmente alterado. – Eu achei que tinha acontecido algo com você! – confessou, ainda sem sossego.
- Por que aconteceria algo comigo? – perguntou confusa. Ele não respondeu. – Fala, droga!
- Ele me ligou e... deu a entender que... Se não aceitássemos o que ele propôs algo poderia acontecer antes do que imaginássemos. – disse e estalou os dedos, soltando o braço dela.
- Ele também me ligou. – disse enquanto massageava o local dolorido. – Mas continuo sem entender o show em plena praça pública. – sorriu irônica.
- Vamos para casa e eu te explico. – disse, pegando as sacolas das mãos dela e andando na frente. Odiava tratar desta forma, mas às vezes nem ele mesmo era capaz de se segurar, era mais forte do que ele. Eram anos fingindo ser aquele personagem, sendo aquela pessoa fria, agressiva... Ele estava quase que virando esta pessoa 24 horas por dia. Todos os dias.
O caminho foi em silêncio para ambas as partes. Cerca de cinco minutos depois já estavam em casa, colocando sua comida numa panela qualquer. resolveu quebrar o silêncio e saber de uma vez por todas o que estava acontecendo.
- Certo, agora já pode me dizer, não é? – ela cruzou os braços, encostando-se ao balcão da cozinha e encarando o , vulgo seu namorado.
- Desculpa por isso – apontou para o braço dela, que deu os ombros. – Eu achei que já poderia ter acontecido algo com você! Você demorou tanto para voltar que... - ela ia interrompê-lo, mas continuou. – Que eu achei que ele pudesse ter te matado. – sentiu uma pontada em seu peito e mordeu o lábio, tentando passar tranquilidade. – E não adianta, eu sei que você tem medo, assim como eu.
- Eu to cansada disso. – negou com a cabeça, com um sorriso sarcástico nos lábios. – Estou cansada de tudo o que estamos fazendo... – respirou fundo, contando mentalmente até dez. – Eu perdi a fome. – disse e virou-se de costas.
- ? ?! – ela se virou novamente, encarando-o. – O que vamos fazer agora?
- Eu não faço a menor ideia. – deu os ombros. se aproximou dela.
- Vamos fazer o que ele está pedindo, ok? Não vai ser muito diferente de tudo o que já fizemos. – deu um singelo beijo na testa dela, ela assentiu, sentindo o carinho. – Nada que e não resolvam, hm? – piscou malicioso para ela, que riu. O celular de tocou e ele foi atendê-lo, um pouco afastado dela. Quando voltou, estava completamente exaltado, esgotado. – Ele não pode pedir isso! Ele pirou! – deu um soco na parede e engoliu seco.
- O que houve?
- Cinco. Pessoas. Inocentes. – disse pausadamente, vendo-a arregalar os olhos.
- O quê?! – foi atônica. – Mas isso foge completamente das nossas regras! Não, não, NÃO!
- O que quer fazer então? São eles, ou nós. – cruzou os braços, encarando-a.
- Maldita hora em que você nos meteu nisso! – ela passou as mãos pelos cabelos, completamente exaltada também. ficou incrédulo.
- Não, não... – riu irônico. – Eu nos meti nisso?! – negou com a cabeça, ainda rindo da mesma forma que há segundos. – Achei que você tinha aceitado isto quando decidiu fugir comigo... Há seis anos.
- Eu achei que poderíamos ter sido felizes, achei que teríamos outra oportunidade!
O tom de voz deles só aumentava.
- Que tipo de oportunidade um cara como eu poderia te dar, ? Por favor, você não era tão ingênua assim... – ela negou com a cabeça, ainda descontrolada. – Foi uma decisão nossa, e eu lembro exatamente daquele dia.
- Como poderíamos esquecer? – riu fraco, sentindo as malditas lágrimas começarem a querer cair pelos seus olhos.
- Você quis vir comigo, você sabia pelo que poderíamos passar e...
Ela o interrompeu, com um grito.
- Chega! Não diz mais nada! – colocou as mãos nos ouvidos, fingindo não ouvi-lo.
- Você escolheu isso comigo, !
- Não, . – ela tirou as mãos das orelhas. – Eu nunca escolhi isso. Eu nunca escolhi ser uma assassina!


Capítulo II


Música do capítulo.

- Nunca escolheu, ? – cruzou os braços novamente, encarando-a com um sorriso sarcástico.
- Não naquela época... – virou o rosto para o lado, fugindo do olhar dele. – Eu só queria ter uma vida normal.
- Mas acabou tomando gosto pela coisa, não é? – ergueu o queixo dela com o dedo indicador. – Nós nunca escolhemos isso, , mas aconteceu... E não saberíamos mais viver fora desse mundo. – ele aproximou o rosto do dela, ficando a milímetros de seus lábios.
- Perigo... – sussurrou e riu, levando os braços ao enlace do pescoço dele. – O frio na barriga... – sorriu maliciosa, mordendo o lábio. – Como você conseguiu fazer isso?
- Isso o quê? – disse, passando as mãos pela cintura dela e beijando seu pescoço.
- Me fazer gostar de assassinar pessoas. – ainda sussurrando, entrelaçou os dedos no cabelo dele e levou sua cabeça a seus lábios, num beijo cheio de segundas intenções.

e fugiram de suas casas há alguns dias. Estavam na casa de um grupo de amigos de , a casa ficava bem afastada da capital, portanto, seria mais seguro estarem ali. Apesar de que sabia que esses tais amigos não eram boas companhias, pelo contrário, mas, em vista do que ela havia acabado de viver, aquele lugar poderia ser considerado o paraíso... Pelo menos até o último minuto. fora comprar algo para comerem, ela esperava na sala com um dos amigos mal encarados dele.
- Você é namorada do ? – ele perguntou, olhando-a pelo canto dos olhos.
- Não, Aaron.
- Hm... Você está sozinha então? – disse malicioso, encarando-a. Ok, ela tinha que admitir, ele era bem bonito.
- Sim, acho que estou. – disse em dúvida, encarando-o também.
- E o que acha de... – disse baixo, se aproximando dela. – Nos divertimos um pouco antes do chegar? – sorriu e antes que pudesse negar, um forte barulho soou, era a porta que havia acabado de bater, chegando em casa e arrancando o, agora, ex-amigo pelo braço, acertando-lhe o rosto. gritou, mas não parou até ver o sangue escorrer pela boca de Aaron.
- E da próxima vez que chegar perto dela, eu te mato! – disse com o dedo em riste, uma veia já havia saltado na testa de , alertando o quanto ele já estava exaltado.
- Calma, ! - foi a vez de falar. – Estava tudo bem. – a encarou incrédulo, puxando-a pelo braço e levando-a para o quarto e trancando a porta. – Está me machucando! – disse e se soltou, olhando-o.
- Como assim “estava tudo bem”?! Enlouqueceu?
- Não... Só não precisava fazer isso. Aliás, por que se preocupou tanto? Nós somos só amigos... Não é? – perguntou em dúvida, riu irônico e a puxou pelo braço, lhe beijando. No começo ela estranhou, mas depois não hesitou em correspondê-lo. era um garoto muito bonito, se não fosse tão temperamental talvez seria um dos mais desejados pela garotas do colégio. Havia até pensado algumas vezes se pudesse existir algo entre eles, mas suas hipóteses foram logo esquecidas.
a prensou contra a parede, erguendo uma de suas pernas à sua cintura. Quando o ar foi ficando escasso, suas bocas se desgrudaram, mas diferente do que ela imaginou, não parou ali. Os lábios dele foram em direção ao pescoço dela, diversificando as carícias. Hora ele distribuía beijos ali, hora sugava, e outras mordia, fazendo-a morder os lábios com certa força. O desejo que sentiam um pelo outro havia chegado com força total, algo que nenhum dos dois fora capaz de descrevê-lo. Um pouco mais ousado, ele colocou os dedos nos botões da calça jeans surrada dela, desabotoando-os e descendo o zíper.
- O que... está... fazendo? – sussurrou, já com a respiração alterada. Ele não respondeu, descendo ainda mais a direção dos lábios. – ...? – disse, puxando o cabelo dele, fazendo com que pudesse olhá-la.
- O que quero fazer desde o dia que te conheci. – ele sussurrou, mordendo e puxando o lábio dela. – Tentei esquecer isso, mas foi impossível. É impossível. – acariciou as pernas dela, dando leves apertões pelo local. Ela continuava em choque, sem proferir uma só palavra. – E então? – perguntou, apreensivo. não respondeu, preferiu ações, puxando-o para outro beijo tão ou mais faminto do que o anterior.
Um ou dois minutos depois, ele já estava com ela nos braços, levando-a para a cama, que, neste momento, parecia estar mais longe do que tudo. Ao chegar à mesma, ele deitou a garota, ficando com as pernas em volta de sua cintura. Já sentindo o pesar daquelas roupas, ergueu o corpo, tirando depressa sua camiseta e jogando-a em qualquer direção. Ambos estavam ofegantes. separou seus lábios novamente para que pudesse se livrar de sua blusa também, e ela o fez com a ajuda dele, que mordeu o lábio sorrindo maliciosamente. Por um segundo, se sentiu envergonhada, escondendo o rosto no pescoço dele, que riu, beijando seu ombro. Já aproveitando a proximidade que estavam, levou as mãos até as costas dela e desabotoar seu sutiã, mas antes a olhou para ter certeza de que estava tudo bem. Ela assentiu, mordendo o queixo dele. Segundos depois aquele pedaço de tecido já estava fazendo companhia para a camiseta dos dois. Invertendo o jogo, e já sem tanta vergonha como estava há minutos, ficou por cima de , beijando seu tórax e abdômen, enquanto ele levava a mão para os seios dela, massageando-os. Sem aguentar mais provocações, voltou para a posição inicial e levou os lábios à barriga dela, distribuindo beijos e mordidinhas, fazendo-a rir. Ao chegar à altura de sua calça, ele a desceu junto da calcinha. mordeu o lábio e corou, puxando-o para cima novamente e o beijando. Ela habilidosamente levou os dedos ao fecho da calça dele, abrindo-o e a descendo rapidamente, terminando de retirá-la com o pé, logo depois fez o mesmo com a cueca boxer que ele usava. Os dois morderam o lábio ao ver a situação que estavam, o desejo era muito para esperar mais um só minuto. se posicionou entre as pernas de e olhou para ela, como se perguntasse se tinha certeza. Ela assentiu, sorrindo marota, e então ele o fez. Sabia que ela era virgem, por isso foi com calma, não queria machucá-la e nem nada do tipo. Quando ouviu o primeiro gemido dela, parou.
- Não para... - sussurrou ofegante, envolvendo seus braços em torno de e o puxando para si.
sorriu maliciosamente, rapidamente obedecendo-a e tornando suas investidas cada vez mais intensas. gemia num misto de dor e prazer, arranhando as costas de cada vez que ele a penetrava com mais força. levou seus lábios ao pescoço de , dando mordidas e chupões no local, deixando-a quase a beira da insanidade com suas provocações. Ela, por sua vez, gemia próximo a orelha dele, fazendo-o se excitar ainda mais. O corpo de vibrava de prazer com a profundidade em que se encontrava, e trazendo o rosto dele de volta ao seu, selou seus lábios calorosamente enquanto ele deslizava suas mãos pelo corpo de dela, acariciando cada curva do mesmo, até chegar em seus seios, onde os apertou com força, fazendo-a reprimir alguns gemidos entre o beijo.
- ... – ofegou, sussurrando entre uma mordida no lábio inferior dele. Os dois sorriram maliciosamente, trocando um olhar que transbordava desejo. Toda a dor que sentira, havia se transformado em puro prazer, em desejo de que aquele momento nunca mais acabasse. Ela envolveu suas pernas na cintura dele, o pressionando contra ela fortemente enquanto acrescentava cada vez mais força em suas investidas.
Ambos já sentiam seus corpos num completo estado de frenesi, quando soltou um gemido alto de prazer ao atingir seu orgasmo, rapidamente mordendo o ombro de com toda sua força, abafando seu grito ali. Seu corpo todo se arrepiou ao sentir chegando ao seu clímax dentro de si, ela apertou suas pernas em torno de e, sem poder se controlar, já fazia o mesmo. passou suas mãos nos cabelos suados de , e os dois trocaram um olhar intenso, que ambos sabiam o que queriam dizer. involuntariamente sorriu satisfeita, recebendo o melhor sorriso de , que logo a beijou apaixonadamente.


O dia amanheceu como todos os outros em Nova Iorque. e dormiam depois de uma longa noite de amor carnal, mais uma das inesquecíveis noites que tinham. O celular tocou, acordou assustada e virou-se para o lado, vendo no visor do aparelho: número restrito. Era ele.
Ela olhou para o lado, se certificando de que ainda dormia, e se deu o direito de pensar por mais alguns segundos no que faria, chegando à conclusão de que faria aquilo. Já havia sofrido demais para pensar nos outros novamente, ela já iria para o inferno de uma forma ou de outra... O que seriam mais cinco mortes para quem já tem um currículo extenso de seis anos? Tudo bem que das outras vezes era diferente, as pessoas mereciam esse destino, desta vez não. olhou mais uma vez para o lado, vendo dormindo calmamente, coberto apenas por um fino lençol branco. Ela respirou fundo, fechando os olhos e atendeu ao telefone.

- Oi. – ela rolou os olhos. – Estava dormindo, desculpa. – fez uma pausa, ouvindo o que o homem dizia. – Tá, tá, eu já sei o que vai acontecer se não fizermos o que quer. – disse já num tom mais alto, sentindo a raiva tomar conta de si logo cedo. – E pode ficar tranquilo, não precisará usar de seus meios. Nós vamos fazer isso. – o homem do outro da linha deu uma gargalhada, e ela rolou os olhos novamente. Como era patético. – Tudo bem, depois você nos explica tudo... É para quando? Tá bom, depois você acerta com o . – se levantou, surpresa. – Ok, tchau. – desligou.
- Era ele? – se assustou com a voz de e se virou depressa para a cama, olhando-o.
- Era... – disse e se sentou novamente, cobrindo-se com o lençol. – Eu disse que faremos o que ele quer.
- Você tem certeza disso? – perguntou, sentando-se na cama também. Ela somente assentiu.
- A mesma certeza que tenho de quando entrei para esse mundo. – sorriu fraco, olhando-o. Ele acariciou seu rosto.
- Ou seja...
- Nenhuma. – riu, com a cabeça baixa. – Lembra-se da primeira vez que “treinamos”? – riu com um pouco mais de ânimo dessa vez. Ele assentiu, também rindo. – Me sentia sendo uma das Panteras. – gargalhou da inocência dela, lhe roubando um selinho.
- E eu seria a japonesa, a loira ou a ruivinha? – brincou, e ela gargalhou também.
- A loirinha... É mais sexy. – mordeu o lábio, ajoelhando-se na cama e enlaçando os braços em seu pescoço.
- E hoje, Pantera , seríamos o quê? – ele perguntou, puxando-a para seu colo.
- Sr. e Sra. Smith. – sussurrou no pé do ouvido dele, mordendo-o logo após, fazendo-o sorrir malicioso.

Era o primeiro dia de treinamento de e . Ambos estavam revoltados com tudo e todos, precisavam de uma válvula de escape, e esta foi a primeira e melhor sugestão que tiveram. Estavam cansados de serem colocados para trás, de sofrerem... Estava na hora de mudar esse jogo.
estava numa aula de artes marciais e numa aula de tiros. No começo, tudo parecia divertido... Há duas semanas, se dissessem a ela que ela estaria assim, provavelmente riria da pessoa com a ideia tão absurda. Ela segurava uma arma calibre 38 e vestia um vestido decotado e curto. Ok, isso era totalmente absurdo também, mas eram as regras. Quando ela iria atirar mais uma vez, se aproximou e ela se assustou, quase atirando no namorado. Sim, namorado. Não havia tido um pedido oficial, mas era como se fosse.

- Com calma aí, senhorita mafiosa. – disse, com as mãos levantadas. Ela riu, abaixando a arma.
- Cuidado. – piscou, com um sorriso malicioso nos lábios, eles riram.
- Como está se sentindo? – disse, aproximando-se dela pelas costas, enlaçando sua cintura enquanto apoiava o queixo em seu ombro.
- Sinceramente? – ele assentiu. – Não é nada do que eu sonhei para minha vida. – riu fraco.
- Quer desistir?
- Não! – ela respondeu rápida, virando-se para ele. – Já estamos aqui, não estamos? – ele assentiu novamente, encarando-a. – Não somos mais e ... Seremos dois personagens a partir de agora, hm? Interpretando vinte e quatro horas por dia: e . – ele sorriu, fitando o chão e logo depois levantando o olhar.
- Como quiser, ... – sussurrou, roubando um selinho dela. Ela piscou, virando-se depressa para o boneco de papelão e atirando. Bem no alvo. Para brincar, ela ergueu a ponta da arma, assoprando-a como nos filmes de velho oeste.


De volta ao presente, treinava algumas técnicas de artes marciais, enquanto falava no telefone com seu mentor. Depois dali, eles finalmente saberiam o que teriam de fazer e poderiam acabar com isto de uma vez por todas.
- Falei com ele. – disse, se aproximando de , que dava socos e chutes num saco de boxe.
- E...? – o incentivou a continuar, parando de bater no tal saco e virando-se para ele.
- Antes daquelas cinco pessoas, temos outro caso. – ela assentiu, prestando atenção. – Algumas esposas da família Shneider que estarão num clube de mulheres amanhã... – gargalhou, jogando a cabeça para trás.
- Clube de mulheres? Ok, isso vai ser muito divertido! – ainda rindo, também riu. – Mas... pensando bem, o local é publico, não vai ser tão fácil quanto imaginei... Já tem algum plano?
- Esqueceu que sou ? – sorriu confiante. Ela rolou os olhos, impaciente com o ego do namorado. – Agora senta e me escuta.

(Podem dar play na música!)

A noite do dia seguinte logo chegou depois de muito acertarem os detalhes do plano para o pequeno massacre que aconteceria mais tarde. Sem muitas respostas concretas, conseguiram arrancar poucas, mas suficientes informações sobre as futuras vítimas. Três mulheres que pertenciam à família Shneider, chefes do tráfico atual. Plano simples, vítimas difíceis.
O ponteiro do relógio da marcava 19H54, às 20H00 o show começaria. Na verdade, dois shows. já estava aposto em seu lugar, vestia uma fantasia de policial. Outros homens estavam ao seu lado, dentre eles: bombeiros, índios e até mesmo um médico. Lógico, tudo figurativamente. servia algumas mesas e também usava roupas curtas, mas nada como uma fantasia, eram apenas roupas de garçonete.
Uma sirene tocou e pronto, o show estava começando. O primeiro a subir no palco foi o moreno que usava as roupas de bombeiro, as mulheres foram à loucura. Gritos e mais gritos histéricos. O rapaz fez alguns passos de dança e chamou algumas das mulheres que estavam ao seu lado e pronto, algumas notas de dez dólares já estavam em sua sunga. Mais cinco minutos e o brilho do rapaz se apagou, sendo ofuscado pelo belo policial, vulgo . Ao ver a cena, quis gargalhar... Era hilário vê-lo ali, fazendo uma dança sensual e tirando suas poucas vestes. Deixando-se olhar melhor, ela mordeu o lábio, queria gritar também quando ele arrancou suas calças. Certo, a gritaria ensurdecedora das carentes mulheres era ainda mais alta do que para o pobre bombeiro, que dançava timidamente no canto do palco. Talvez o dono da tal boate quisesse promover após aquela apresentação, que não estava nem próxima do final. Mais algumas batidas da música e a gravata do “policial” foi fazer companhia para a calça e a camiseta que estavam no chão. Uma senhora que aparentava ter lá seus sessenta anos já havia depositado uma boa quantia na sunga dele, o que fez rir ainda mais. Quando ela achou que a tal apresentação havia terminado, a maior surpresa veio, escorregou os joelhos no chão, como um rockstar, se aproximando ainda mais das expectadoras. O número havia acabado, por fim. Ou bem... Um dos números da noite havia terminado, o mais importante viria agora. Ele desceu do palco e caminhou até uma mesa onde três loiras estavam, as senhoras Shneider. Aquela era a deixa de , que deixou a bandeja com bebidas no balcão e seguiu para a sala, onde havia combinado com , que, por sinal, estava chegando acompanhado das três mulheres. Elas acreditavam que receberiam um número à parte... E realmente, aquele era um numero único.
estava escondida atrás de uma cortina escura, que ficava no canto do quarto, quase que imperceptível. colocou as vítimas sentadas em cadeiras e amarrou suas mãos numa corda, num nó firme.

- Na última vez que vim aqui, não existia isso... É algo novo? – a mais nova das mulheres perguntou, olhando para , que estava de costas, pegando algumas coisas na gaveta.
- É sim. – disse e se virou para elas, com um sorriso malicioso no olhar. – Na verdade, é uma estreia. – arqueou a sobrancelha, rindo.
- Hm... Não sei se estou gostando dessa ideia de estarmos amarradas, você pode nos soltar? – a loira de cabelos curtos falou.
- Mas já? Eu nem comecei ainda! – cruzou os braços, olhando para a cortina onde estava. – E sabe... Eu tenho reforços. – as loiras ficaram confusas.
- Ei! – disse animada, saindo da cortina e caminhando até elas.
- O que está acontecendo aqui?!
- A surpresa de suas vidas... Ou a última surpresa. – mordeu o lábio e olhou para , que continuava com as mínimas vestes. – Ei, policial, você foi incrível no palco.
- Gostou? Você também está incrível de garçonete. – piscou, puxando-a para um selinho rápido.
- Certo, já chega! Eu exijo que vocês me digam agora o que está acontecendo! Soltem-nos, andem. – e soltaram uma gargalhada.
- Você e sua família têm dívidas com alguém que conhecemos... Nada melhor do que quitá-la, não é? – Ele falou, vendo o semblante das Shneiders mudar completamente. Os jogos estavam começando.
- O que vocês querem, afinal?
- Suas vidas. – Foi a vez de falar, pegando a arma da mão de e apontando para uma delas.
- Espera, espera, por favor! – a loira do meio falou, assustada, encarando a mão de . – Nós fazemos qualquer coisa, mas não aperte esse gatilho!
“Não faz isso!” ouviu essa frase e largou a arma na hora, ela tinha certeza de que conhecia aquele timbre. Mas não era ele, não poderia ser ele. Aquilo era impossível.
- O que aconteceu? – perguntou, pegando a arma do chão.
- Meu irmão... – ela sussurrou, olhando em volta. – Você ouviu isso?
- Ouvi o quê, ?! Esquece isso, anda, faz o que você tem que fazer logo, antes que nos encontrem aqui. – lhe entregou a arma, ela a pegou e assentiu.
- Vocês vão se arrepender profundamente por isso! Vão lhes caçar até o inferno. – uma das Shneiders disse entre os dentes.
“Para com isso, ... Pare enquanto é tempo!” A voz soou de novo e dessa vez ela teve certeza, era ele. Era Henry.
- Sai daqui! – ela gritou e recebeu olhares confusos de e das Shneiders. – Você me deixou! – gritou novamente, completamente atordoada. – É tarde demais!

O barulho foi alto, mas por sorte, o som da música do lado de fora havia abafado tudo. Alguns respingos de sangue voaram no corpo de e ela fechou os olhos, engolindo seco. Um coração fraco e sensível ainda batia em seu corpo, fazendo-a entregar a arma para que acabasse com aquilo sozinho. Mesmo sendo pessoas tão ruins ou até piores do que ela, eram vidas. Ela ficou de costas, encarando a porta enquanto deu mais alguns tiros, terminando por fim mais um de seus trabalhos. Porém, diferente do que pensaram, não havia acabado. Poucos segundos depois, três homens que mais pareciam armários apareceram, pondo a porta abaixo. Ela arregalou os olhos, encarando-os. É, era hora de pôr o treinamento em prática novamente. Os homens – que provavelmente seriam seguranças das loiras – olharam para as Shneiders e se encararam, teriam de acabar com aquele casal à frente.
olhou para e assentiram, começando uma sessão de pancadaria ali mesmo junto dos homens. deu um chute nas partes baixas do moreno e ele se ajoelhou com a dor, aproveitando a deixa, ela deu uma joelhada em seu rosto, pegando sua arma. se enfrentava com outro, e também estava tudo sobre controle. Quando ela achou que tudo estava ganho, foi tomada por uma surpresa. O terceiro rapaz a puxou para sua frente e encostou o cano da arma calibre 38 em sua cabeça, fazendo prestar atenção nela; amedrontado.
- Game over, bonitinha.


Capítulo III


Músicas do capítulo: I, II

E como um milagre, o que parecia impossível, aconteceu. Um tiro soou, mas por incrível que pareça, não era da arma de um dos comparsas das Shneiders, mas sim, de um dos policiais que entraram na pequena sala.
se livrou rapidamente dos braços do homem que a prendia, mudando quase que cem por cento seu semblante. O rosto trincado pela preocupação se transformou num cheio de inocência, com os olhos marejados.
- O que está acontecendo aqui? – Um dos policiais perguntou, com a arma apontada para os outros dois comparsas.
E numa fração de segundo, segurou a mão de para que ele pudesse sentir o que ela queria dizer a partir daquele toque. E sim, ele sabia.
- Nós estávamos aqui e nossa... Foi horrível! – a falsa inocente falou, levando a mão direita para o rosto, como se estivesse abismada com tudo o que acabara de ver.
- Mas o quê?! – Um dos comparsas falou, incrédulo. – Ela está mentindo! Eles mataram aquelas três mulheres, nós só queríamos protegê-las!
- Como ousa dizer algo desse tipo? – Foi a vez de falar, também com os olhos marejados. – Senhor, nós trabalhamos aqui... Eu trouxe as moças para cá porque pediram, estavam apontando a arma para minha esposa, assim como vocês puderam ver quando chegaram aqui. Eles queriam matá-las e logo depois nos matar também. Vocês salvaram nossa vida! – despejou tudo sobre o guarda. Aquela atuação poderia ser digna de um Oscar, segundo o pensamento de .
- Eu... Eu não sei o que pensar! Eu quero apagar tudo isso da minha mente! – a moça voltou a falar, colocando as mãos sobre a cabeça, bagunçando os cabelos.
- Está tudo bem, querida. Vamos levá-los à delegacia, mas vocês precisam prestar depoimento ainda, ok? – o policial disse, enquanto algemava um dos capangas, que estava incrédulo com a situação.
- Vocês não podem acreditar neles! Não veem o quanto estão sendo falsos? Eles são pessoas perigosas! – alertou.
- Pelo que eu vejo aqui, rapaz, o único perigoso é você.
chorava no ombro de , que afagava os cabelos dela, para que ela se acalmasse.
- Vamos levá-los para a viatura, vocês nos esperem aqui, certo? – O casal assentiu. – E, ah, qual é o nome de vocês?
- Clair Subbot e Jordan Mille. – mentiu, olhando o agente, que assentiu, acompanhado de seus colegas de trabalho, que levaram os outros, que continuavam incrédulos, tentando de todo modo convencê-los de que estavam errados.

Sem perderem tempo, assim que ouviram os passos dos oficiais ficarem mais longe; abriram a janela e pularam da mesma, a altura não era das piores, alguns espinhos nos braços não seriam nada comparados a anos de prisão, definitivamente não. foi o primeiro a pular, ajudando a namorada a descer o muro sem que se machucasse tanto, e ela o fez. Eles tiveram o maior cuidado possível para que não fossem notados por ninguém, o que parecia uma missão impossível, já que seus vestuários não eram nem um pouco comuns. Depois de atravessarem algumas ruas, pegaram um táxi. O motorista os olhou através do retrovisor e perguntou qual seria o destino, respondeu e o rapaz continuou a olhá-los pelo pequeno espelho do carro.

- Estamos voltando de uma festa à fantasia, não se preocupe. – disse, rindo logo depois.
- Fantasias exóticas. – foi o que o homem respondeu, levando o olhar para a estrada, finalmente.
e decidiram permanecer em silêncio, não gostavam de conversar com qualquer um por aí, nunca se sabe quem é o inimigo, afinal. Cerca de trinta minutos depois eles já estavam na porta de sua casa. pagou para o motorista e eles entraram na residência.
- Achei que nunca mais veria minha casa! – Ele falou rindo, enquanto derrubava o corpo pelo sofá. andava de um lado para o outro, parecendo preocupada. – Por que não se aquieta? O que você tem?
- Ele falou comigo, eu tenho certeza! – confessou, ainda andando inquieta. a olhou confuso. – O Henry; , ele falou comigo!
- O quê?! Certo, vou pegar um calmante pra você. – disse e se levantou.
- Eu não estou maluca. – ele continuou indo em direção à caixa de remédios. – Eu tenho certeza, ! Que merda.
- Você sabe que isso é impossível, não é? – parou, virando-se para ela.
- Eu nunca tive algum tipo de experiência espiritual, na verdade, até desconfiava que isso realmente existisse, mas... Eu tenho certeza, era ele. O cheiro, a voz... Ele estava ali. – disse, com a voz embargada e os olhos já marejados. – Era o meu irmão.
- Seu irmão morreu seis anos atrás, . – disse baixo, se aproximando dela. – Esqueceu?
- E tem como esquecer uma coisa dessas? – disse sentando-se no sofá, colocando o rosto entre as mãos e lembrando-se daquele dia. Daquele maldito dia.

Deem play na música I.

voltava de outro dia exaustivo no colégio, enquanto carregava sua pesada mochila, ela olhava seu bairro. Aquele era um lugar lindo para se viver. Ela poderia viver feliz assim, se tudo fosse diferente. Talvez se sua mãe nunca tivesse se tornado esta mulher fácil, talvez se seu pai não bebesse todos os dias e todas as noites... Suas hipóteses eram baseadas por um “talvez”. Um talvez que nunca se realizaria. Mais alguns passos e ela estava na rua de sua casa, porém, o lugar não estava tão vazio como normalmente. Três carros da polícia, uma ambulância e um círculo de curiosos estavam um pouco mais a frente. Ela sentiu seu coração acelerar, aquilo não poderia ser em frente à sua casa. Um nó se formou em sua garganta, antes mesmo de saber o que estava acontecendo em sua vizinhança. Duas mulheres voltavam da confusão, elas negavam com a cabeça, como se o crime cometido fosse o maior absurdo já visto.
- Desculpem... O que está acontecendo? – disse, apontando para a multidão de pessoas, policiais e paramédicos. Ao verem quem falava, as mulheres arregalaram os olhos.
- Você... Oh, Deus! – a senhora disse, colocando a mão sobre a boca, surpresa.
- Vocês podem me dizer, por favor? – repetiu, agora com a voz embargada.
- Seu pai, querida... – sentiu seu corpo se contrair. – Ele... Ele matou o seu irmão hoje logo cedo. Eu sinto muito.
Seu mundo havia caído, seu chão se desfeito. Ela não conseguiu proferir uma só palavra, apenas deu passos lentos até onde a ambulância estava. Um corpo coberto. Ela engoliu em seco uma, duas vezes, não poderia ser verdade. Henry não poderia tê-la deixado. Seu melhor amigo, seu companheiro, seu confidente, seu protetor, seu irmão. olhou para o lado e viu o pai dentro do carro dos policiais, certamente estava alterado pelo efeito do álcool. Uma lágrima solitária caiu, suas pernas bambearam, seu rosto queimou e sua garganta deu sinais. “NÃO!”. Foi o que ela gritou, deixando o corpo despencar sobre o chão, ficando de joelhos. Um policial se abaixou em sua altura e perguntou se ela estava bem, ela somente negou com a cabeça, colocando o rosto entre as mãos. “Posso te ajudar?” Ele perguntou e ela negou novamente. “O rapaz era seu parente?” Ela assentiu, mas ainda sem dizer qualquer palavra. O homem se afastou, vendo que ela não estava em condições de dizer uma só vogal.


- Ande, , não fique assim. – disse, sentando-se ao lado dela e segurando sua mão. – Prometemos não nos lembrar mais disso, não é? – ela assentiu. – Então... Nós cumprimos mais um dos nossos trabalhos, temos que comemorar, hm? – ela negou, suspirando. – O que está acontecendo? Não fraqueje desta forma, ! Você não é mais aquela garota frágil.
- Será que não? – disse enquanto chorava, aos soluços. Ela tirou a mão da dele, colocando-a sobre a própria perna. – Eu não estou enlouquecendo, . Eu tenho certeza, era a voz dele.
- E o que ele disse? – desdenhou, olhando-a.
- “Para com isso, ... Pare enquanto é tempo!” – repetiu a frase, respirando fundo e jogando a cabeça para trás. – Era o mesmo tom de voz... Eu senti a presença dele ali, eu senti o cheiro; , o cheiro dele!
- Deve ser a sua consciência ou sei lá. Talvez seja saudade.
- Saudades eu sinto todos os dias, . Todos os minutos, a cada momento da minha vida eu desejo a presença dele... Ele não merecia aquele fim.
- Você já teve a sua vingança, não teve?
- Tive. – suspirou, deixando um mísero sorriso abrir no canto de seus lábios. – É uma pena que isso não o tenha trazido de volta.
- Mas levou seu pai para um lugar do qual nunca deveria ter saído.
- Meu primeiro caso, meu primeiro assassinato... Meu pai. - disse cerrando o maxilar e apertando a própria mão com força.

Play na II!

Peruca loira, longa. Luvas pretas. Jaqueta de couro. Óculos escuros. Vestido vermelho e salto alto... Uma mulher que podia parar qualquer quarteirão. Ela não tinha nada daquela garota de um ano atrás, a doce e simples Em. cresceu e amadureceu em menos de um ano, se tornou uma mulher firme, forte, sensual, e de sangue frio.
Ela chegou à delegacia onde seu pai estava enclausurado e jogou seu charme para o delegado que estava lá, alegando ser uma amiga do senhor James. Logo conseguiu permissão para uma sala especial com seu velho amigo... Ou pai. Um dos policiais que estava no corredor foi logo chamar o senhor, que tinha uma feição fechada, séria. Estava apreensivo, nunca havia recebido uma visita desde... Um ano atrás, quando foi preso por matar o próprio filho. Ele entrou na sala e estava de costas, James a olhou de cima abaixo... Não conhecia aquela loira. Ou pelo menos pensava que não. A porta se fechou e a misteriosa mulher se virou, tirando os óculos do rosto e carregando um sorriso enigmático nos lábios.

- Sentiu minha falta, papai? – perguntou, sorrindo maliciosa, enquanto mordia a haste dos óculos.
- O quê... – olhando-a. – ?! – disse assustado, com os olhos arregalados. Olhou-a de baixo à cima novamente e ficou ainda mais incrédulo.
- A filhinha que você sempre amou e cuidou, ué... – riu, apoiando as mãos na mesa, encarando-o. – Não nos vemos desde o incidente com o Henry, não é? – disse séria, lembrando-se daquele maldito dia.
- Ele... Ele mereceu! Assim como você merecia que eu fizesse aquilo com você! – alterou a voz, falando num tom mais alto.
- Oh, claro... Me matar porque pareço a vadia da esposa que lhe traía, não é? – cruzou os braços, sorrindo maliciosa novamente.
- Por que está falando assim? Onde está aquela garota que era? – se levantou da cadeira e caminhou até ela. – Por que está vestida desta forma? Parece uma vadia! Está ainda mais parecida com sua mãe. – cerrou o olhar, encarando-a. – E sabe de uma coisa? – sorriu, fitando o chão. – Você não deve saber o motivo pelo qual eu matei seu irmão... – ela franziu o cenho. – Eu estava disposto a ir ao seu colégio e mata-la... – riu irônico. – Mas ele não deixou e acabou sendo a vitima!
- Incrível... – ela mordeu o lábio inferior, tentando manter a pose fria novamente. – Mas então, papai... As pessoas mudam. Onde está a antiga ? Morreu. Se foi junto do seu filho... – colocou a mão no bolso da jaqueta, deixando-a lá. – Eu vim lhe trazer um presente que te devia há muito tempo! – ele olhou na direção de sua mão. – Sabe o que me tornei? Vou te contar! – sorriu animada. – Uma mulher fria... Que não mede dificuldades para acabar com a vida de uma pessoa. – James deu um passo para trás, assustado. – Mas, calma... Eu nunca matei ninguém, só sou uma isca para elas... Mas como tudo tem uma primeira vez na vida, essa vez chegou! E adivinha só quem será minha primeira vitima? – ela tirou uma faca da jaqueta.
- Você sabe muito bem que não vai fazer nada! É uma fraca. – tentou ser firme e colocou a mão à frente, dando passos para trás. – Você está completamente louca! – gargalhou e secou a lágrima que caiu.
- Eu não estou louca, pai. Só chegou a hora de você partir... Assim como você tirou o que representava tudo pra mim, eu vou te tirar a merda da vida que tem. Será uma troca de favores, hm? – pendeu a cabeça para o lado, observando-o. – Sabe quando você me espancou um dia, por eu levar café em sua cama no dia dos pais? – ele assentiu fraco, olhando-a com medo. – E quando chegava em casa bêbado e me batia sem eu ao menos falar uma palavra?! Você era um monstro! – secou outra lágrima. – E como dizem por aí... Filha de peixe, peixinho é. Agora vamos adaptar isso... Filhinha de monstro...? – ele ficou calado, somente olhando para a faca. – Monstrinho é. – completou, com o mesmo sorriso perdido nos lábios. Ela se aproximou dele, ficando a milímetros de distancia. – Adeus, papai. – cerrou o maxilar e sua mão foi levada quase que inconscientemente à barriga dele. James arregalou os olhos e abriu a boca, ao sentir o golpe. – Nos vemos no inferno. – sussurrou, retirando a faca do corpo do homem, que caiu de joelhos, com a mão no local ferido. colocou os óculos novamente, largou a faca no chão e saiu, como se nada tivesse acontecido. Sua consciência não estava pesada, ela fez o que deveria ter feito há muito tempo... Talvez seu irmão estivesse aqui hoje. Ao se lembrar disso, ela respirou fundo e um sorriso se alojou em seus lábios. Havia se vingado, finalmente a vingança havia chegado. E o gosto dela? Doce como um pote de mel. Ao passar pela porta, encontrou dois policiais que estavam no corredor, ela assentiu para eles, que foram em direção à sala de visitas. tirou a peruca que estava nos cabelos, os óculos escuros, a jaqueta, abriu o zíper do vestido, ficando com um short leve e uma camiseta regatas, deu passos largos até a porta e pôde ouvir a correria de alguns policiais em busca da “loira assassina misteriosa”. a esperava do lado de fora da delegacia, com um carro esportivo preto. Ela entrou no carro e o namorado acelerou, sem deixar rastros ou pistas.


- Esqueça isso, sim? Independente do que tenha sido, já passou. – ela assentiu, esticando o corpo e dando um selinho no namorado. – Achei que morreríamos hoje. – disse, puxando-a para encostar a cabeça em seu ombro e afagando seus cabelos.
- Que eu morreria, né? – falou, dando ênfase na palavra “eu”. Ele riu. – É sério, poxa... Mas o importante é que acabou.
- Por hoje.
- É... Por hoje, sãos e salvos. – sorriu fraco, se levantando. – Vou tomar um banho, você vem comigo? – ergueu a sobrancelha esquerda, com um sorriso torto e cheio de malícia nos lábios. Ela riu, levando as mãos à cintura. – Não entendo a sua linguagem facial, não, .
- Não, é? – ironizou, levantando-se do sofá também e caminhando lentamente até ela, que negou com a cabeça, mordendo o lábio. – A propósito, eu já falei o quanto você ficou incrivelmente maravilhosa com essa roupa de garçonete? – disse e a prensou contra a parede, levando seus lábios ao pescoço dela, distribuindo mordidas no local.
- É? – riu, entrelaçando os dedos no cabelo dele. – Engraçado, porque eu achei o mesmo ao ver você de policial naquele palco... – riu abafado e subiu os lábios para a orelha dela, mordendo o lóbulo da mesma. – Senti até vontade de ser presa.
- Crimes não irão faltar na sua ficha. – sussurrou e ela riu, beijando-o.
Depois de um longo e relaxante banho, o casal se deitou e poucos minutos depois já caiam num sono profundo. Eles estavam física e mentalmente esgotados. Há anos não tinham uma noite de sono realmente confortável, uma noite calma e que os fizessem relaxar. conseguia ter um sono mais pesado por já estar acostumado com a vida que tinha.
não, sempre se remexia por um longo tempo até que pegasse no sono, e durante ele a mesma coisa. Hoje, pior do que todos os dias, ela se encontrava ali, inquieta, sonhando.

E de repente, caminhava por um lindo jardim esverdeado... Cheio de flores, como na primavera. O céu estava perfeitamente limpo, azul... Um azul tão incrível que ela jamais sonhou ser digna de ver em toda a sua vida. Talvez ninguém nunca sonhou em presenciar algo tão belo quanto aquilo. O único barulho que podia ser ouvido ali era o cantar dos pássaros e o barulho de água caindo sobre as pedras. Ao olhar para o lado pôde observar que uma cachoeira estava ali, era dali que o barulho tão calmo estava saindo. Ela ousou caminhar mais um pouco, não sabia se deveria. Afinal, ver algo tão inacreditável quanto isto deveria ser algo proibido para alguém tão cheia de pecados quanto ela. Mas, acabou optando por dar mais alguns passos, tentando se encontrar, saber aonde estava. Seu coração estava limpo, sem mágoas, sem dor, sem ódio, sem culpa. Era como se tivesse morrido e aquele fosse o céu, ou paraíso, ou o que mais quiserem chamar. Talvez fosse isso o que de fato havia acontecido. teria morrido enquanto dormia? Ou talvez um dos comparsas das Schneider tivesse resolvido acabar com sua vida mesmo. Mas, seus devaneios foram interrompidos assim que ela sentiu uma mão tocar seu ombro. Com o susto, ela se virou depressa e sentiu suas pernas cambalearem com o que viu. Certo, ela havia morrido.

- Hen-Henry? – gaguejou, sentindo sua voz embargar e seus olhos encherem-se de lágrimas. O rapaz sorriu, e aquele sorriso foi como se o mundo de ganhasse vida de novo, como se o chão voltasse a tocar seus pés e a luz voltasse a iluminar o seu caminho. – Vo-você...
- Onde já se viu gaguejar, maninha? – Ele disse e ela não aguentou. Pulou em seus braços dando-lhe um abraço apertado, e deixando, por fim, o choro vir à tona. – Eu senti saudades. – confessou baixo, afagando os cabelos dela.
- Meu Deus...! – disse, desfazendo-se do abraço dele e olhando-o. – Como... Como eu morri? – Ele riu e ela o olhou confusa.
- Você não morreu, . É um sonho, sim? – ela assentiu, ainda confusa. – O que afinal você está fazendo com a sua vida?!
- O quê... – disse baixo. – Você consegue “ver”? – fez aspas com os dedos e ele assentiu, cruzando os braços. – Eu só queria me vingar de tudo e todos, Henry.
- Principalmente do papai. – afirmou, lhe lançando um olhar desaprovador. Ela desviou o rosto.
- Ele te matou.
- Ele teria o que merecia, e isso não precisava ter sido feito por você.
- Agora já foi. – deu os ombros, voltando a olhá-lo.
- Eu sei disso... É tarde. Mas não é tão tarde assim para você parar com o que está fazendo! Uma assassina de aluguel? Minha irmã? , pare enquanto é tempo!
- Você sabe que eu já teria parado se dependesse de mim... Se eu e pararmos, nos matam.
- Como foi que você conseguiu se meter nisso, ? – perguntou, acariciando o rosto dela. Ela deu os ombros novamente, engolindo seco. – Escuta... – disse pegando as mãos dela. – Eu te amo, ok? Só quero que pare com isso. Você não pode continuar desse jeito, maninha. – ela o abraçou novamente, chorando em seu ombro. – Eu tenho que ir... – ela o apertou com força. – Não desobedeça ao seu irmão, hein? – se desfez do abraço, olhando-a e sorrindo. – Eu sempre vou estar com você, não importa onde. Saia disso agora, .
- Eu... Eu... – suspirou, fechando os olhos por alguns segundos. – Eu vou tentar. – sorriu fraco. – Eu te amo, Henry.
- Você vai conseguir. E eu também te amo, baixinha! – disse rindo e ela sorriu, com os olhos cheios de lágrima. – Logo você terá uma surpresa... Uma surpresa que vai mudar a sua vida.
- Surpresa? Mas que surpresa? – ele apenas sorriu, dando-lhe um beijo demorado na bochecha. E em alguns segundos, a figura de Henry ia desaparecendo.
- Henry? Henry?! – perguntou, tentando tocar no irmão, mas foi impossível. Ele já não estava mais ali. – Henry? Não... De novo não... – ela disse chorosa, olhando em volta, dando voltas. O céu começou a escurecer, o barulho dos pássaros e da cachoeira a sumir, entrou em pânico. Tudo apagou.

- ?! – chamou, chacoalhando-a na cama. Ela gritou, sentando-se. Seu rosto e corpos estavam cobertos de suor e ela tremia sem parar. – O que aconteceu, ? – perguntou, com os olhos arregalados ao vê-la naquele estado.
- Henry... O Henry... – gaguejou, olhando para o namorado.
- De novo essa história? – disse, colocando uma mecha do cabelo dela para trás da orelha.
- Eu sonhei com ele, ... Ele estava comigo, entende? Era um lugar tão lindo. – sorriu fraco, sentindo o choro voltar.
- Não, não chora. Eu acredito em você, ok? – mentiu. – Vou pegar uma água.
- Não! Não precisa. Fica aqui comigo?
- , pare. Estou vendo a de seis anos atrás aí, e eu não gosto nada disso.
- Eu desisto, . Eu vou sair dessa vida. – ele arregalou os olhos. – É, isso mesmo que você ouviu. Eu cansei.
- Você enlouqueceu? Quer morr... ? – interrompeu o que dizia, vendo apertar os olhos com força, colocando a mão na barriga. – ?! – disse e ela correu para o banheiro. foi atrás da namorada, preocupado. – O que foi isso? – ela não respondeu, já que estava com a cabeça no vaso sanitário. Alguns segundos depois, ela sentou no chão, levando a cabeça para trás, encostando-a na parede. – Está tudo bem? – ela assentiu.
- Foi só nervoso. – respirou fundo e olhou para ele. – Vamos dormir, pode ser? Não estou nada bem. – ele assentiu, ajudando-a a se levantar. Ela escovou os dentes e ele a esperou na porta do banheiro.
- Não quer ir ao médico?
- Já passei por coisas bem piores, . Uma delas foi há algumas horas, com um cara apontando uma arma pra minha cabeça. – sorriu sarcástica, dando os ombros. – Amanhã conversamos.
- Como você quiser. Qualquer coisa me chama. – ela assentiu, virando-se para o lado na cama e deixando o choro silencioso vir. Aquela noite foi longa, principalmente para , que só conseguia pensar nas palavras do irmão. Tudo parecia tão confuso. Ela precisava de uma solução, de um sinal.
O dia amanheceu e já estava de pé em sua sala de boxe, treinando um pouco. Optou por não acordar , a noite havia sido difícil para ela.
- Por que não me acordou? – Ela apareceu na sala, de surpresa, assustando-o.
- Você finalmente conseguiu dormir, e eu não ia te acordar, não é? Não temos nada hoje de manhã. – ela deu os ombros.
- Ele já ligou? – assentiu. – E o que disse?
- Que fizemos um trabalho “exemplar”. – riu sarcástica. – E olha só, uma notícia boa. Temos vinte dias de férias.
- Opa, vinte dias sem matar pessoas. Mas que maravilha!
- Não to entendendo o porquê de tanta ironia. Que mau humor é esse?
- Não sei. – foi grossa, cruzando os braços. – Vou à farmácia, ok?
- Quer que eu vá junto?
- Não sou mais uma criança que precisa de companhia para atravessar a rua. – disse e virou as costas, saindo.
- Santa educação! – disse, sozinho, rindo consigo mesmo. Pelo que se lembre, nunca havia visto tão grossa desse jeito. E o pior, nem sabia o porquê.
Cerca de vinte minutos passaram desde que chegara da farmácia e estava trancada no banheiro. fez algumas menções de derrubar a porta, mas ela não se importou, gritou que queria ficar sozinha. Respeitando a sua vontade, foi ver TV, colocou em uma série qualquer e tentou prestar atenção. Quando o seriado estava para terminar, abriu a porta e a encarou.
- Achei que você nunca mais fosse sair de lá.
- Pois é. – deu os ombros, pegando o controle remoto dele e sentando-se no sofá.
- Já chega. O que você tem hoje? Aliás, o que você tem nesses últimos dias?
- Nada, . Eu não tenho nada.
- Oh, não... Imagine. Eu que tenho, não é? – ela bufou, trocando de canal. – Será que dá pra parar?! – gritou, pegando o controle da mão dela com certa força. Ela ficou calada. – Odeio quando você fica com poucas palav...
- Eu to grávida, . – ele arregalou os olhos, se levantando num pulo. – É isso mesmo que você ouviu. Eu to esperando um filho seu.


Capítulo IV


- Um filho?! – ficou atônico, rindo nervoso. Ela assentiu, sentindo os olhos encherem-se de lágrimas. – Você só pode estar brincando... – ainda rindo. – Nós sempre nos protegemos.
- Oh, sim, sempre... Ontem mesmo, você se lembra de ter pegado algum preservativo antes de ir comigo pro banho? – ele negou. – Então, você sabe muito bem que muitas das vezes esquecíamos.
- Mas você não tomava remédio pra isso? Você tem certeza?
- Às vezes eu esqueço. E sim, eu tenho. Minha menstruação tá atrasada, meu humor tá uma merda, vivo sentindo tontura e agora esses enjoos. Acabei de fazer três testes. Todos deram positivos. – suspirou, colocando o rosto sobre as mãos. virou-se de costas, dando um soco na parede. sentiu o choro começar a dar as caras e o deixou vir. Enquanto ele repetia diversas vezes “merda, merda, merda!”. Ela chorava, ainda com o rosto entre as mãos. Sem mais saídas, ele viu que tudo já estava feito e não poderia mais voltar atrás. Virou-se e se aproximou dela, ajoelhando-se em sua frente e segurando suas mãos. Ela o fitou.
- Não chora assim... Não tem mais jeito, tem? – ela negou, ainda chorando. – Se fosse em outras circunstâncias, eu estaria extremamente feliz por isso, ... Temos uma boa casa, uma conta bancária razoável e já não somos mais adolescentes. Mas você sabe que não é assim, tem muita coisa envolvida.
- E você acha que eu não sei disso?! – soltou as mãos das dele, levando-as a sua barriga. – Sabe o que foi a primeira coisa que pensei quando vi um “positivo” no teste? Foi em sermos mortos quando nosso filho ainda fosse pequeno, e ele sofresse tanto quanto ou até mais do que sofremos. Foi em deixar ele em casa e irmos matar pessoas sofrendo o risco de sermos as vítimas. Eu não quero isso pra mim, . Não quero isso pra você. Não quero isso pra essa criança.
respirou fundo, com os olhos fechados por alguns segundos, parecendo estar pensando em algo. Ele se levantou enfim e abriu os olhos, soltando o ar devagar.
- Vamos fugir. – foi o que ele disse, fazendo-a arregalar os olhos. – Se ficarmos aqui, eles vão nos descobrir de qualquer jeito e nos matar. Vamos para outra cidade, outro país, tanto faz.
A primeira reação de foi arregalar os olhos, intercalando a boca aberta de surpresa e o sorriso estonteante. Ela franziu o cenho, ainda sem acreditar no que havia escutado. Seus olhos encheram-se de lágrimas e seu corpo inteiro começou a tremer, a gelar.
- Você tá falando sério? – ela sorriu fraco, se levantando. – Irmos embora, mesmo? – ele assentiu, colocando as mãos na cintura dela e sorrindo.
- Você não tá a fim de matar aquelas pessoas inocentes, ou está? – ela riu ainda surpresa, dando-lhe um tapa no braço.
- É claro que não. – disse, e um sorriso maior do que tudo tomou conta de seus lábios. – Você tá mesmo falando sério, não tá?
- Acho que é a coisa mais séria que eu já falei na minha vida. – sorriu, dando-lhe um selinho.
- Não brinca comigo, .
- Meu Deus, ! – se soltou dela, se afastando. – Se você disser mais uma vez algo do tipo, eu desisto mesmo, hm? – ela sorriu, correndo até ele e o abraçando. – Nós vamos ser felizes, . Nós três. – sussurrou, apertando-a.
- Uma vida como eu sempre sonhei?
- Como sempre sonhamos. – disse e virou seu rosto para o dela. – Eu vou enfrentar tudo e a todos por você. – ela mordeu o lábio inferior, emocionada. – Por vocês. – colocou a mão na barriga dela, acariciando-a.


- Já arrumou tudo? – perguntou, chegando ao quarto. Eles arrumavam as malas.
- Quase. Não vou colocar todas as roupas porque vai que ele vem aqui nos procurar? Pelo menos acha que estamos viajando.
- Foi o que eu disse pra ele.
- Disse que iriamos para onde? – falou, colocando outra peça de roupa na mala.
- Miami. – deu os ombros, ajudando-a com as malas.
- E para onde, de fato, iremos? – riu.
- Pelo mundo... Conhecendo lugares até que nos adaptemos em algum.
- Me parece uma boa ideia. – sorriu, lhe dando um beijo rápido. pegou uma das toalhas espalhadas pela cama e foi para o banheiro, tomar um banho.
se apoiou no guardarroupa e se pôs a pensar num passado distante.

O mundo de parecia ter desabado naquela tarde de quinta-feira ensolarada. O sol iluminava no céu, mas para ela, o tempo jamais pareceu tão nublado e triste. Ela estava sentada no sofá de uma de suas vizinhas, que lhe servia um chá para que ela se acalmasse. Há poucas horas havia recebido a notícia de que seu irmão havia morrido. Seu pai havia o matado. Ela se sentia sem chão... Era como estar num abismo com uma corda no pescoço e seu pior inimigo com a mão em suas costas, pronto para empurrá-la. O homem que os deu a vida, que os criou... Que demonstrava pelo menos um pouco de afeto há muitos anos, havia feito isso. Havia acabado com a vida de ambos. Sim, dos dois. Há semanas sua mãe não aparecia em casa, provavelmente havia fugido com algum milionário pronto para bancá-la. Tudo parecia perdido. O choro era intenso, ele não cessara desde que soubera da notícia. Sua vizinha falava palavras de conforto para ela, mas de nada servia. “Eu sinto muito”, “Ele está num lugar melhor”, “Era a hora dele”, “Tudo irá ficar bem”. Palavras gastas. Era como se entrasse por um ouvido e saísse pelo outro. Nada podia amenizar sua dor. Nada.
Ao sentir o celular vibrando, ela o pegou do bolso, olhou no visor e viu que era . Provavelmente ele ainda não soubera de nada. Optou por atender, ele era a única pessoa que lhe restava.
- ? ?! Te mandei diversas mensagens e você não me respondeu nenhuma! Tá sem crédito?
- Meu irmão morreu. – ela disse com a voz trêmula.
- O quê?! ? O que aconteceu? – disse também com a voz trêmula.
- Meu pai matou meu irmão, ... – disse chorosa, sentindo o choro voltar. Ele sussurrou um “Meu Deus”, e ela colocou o rosto entre as mãos. – Eu não to mais aguentando, !
- Espera, em dois minutos eu to aí, tá? Fica calma, por favor! – disse e desligou. A vizinha de passava a mão nas costas dela, em forma de carinho. Poucos minutos depois, ela saiu para o portão, esperando . Não foi preciso muita espera, logo ela o avistou no final da rua e o choro voltou com mais força ainda. Ele correu e a abraçou com força. – O que aconteceu, ? – ele sussurrou e ela se desvencilhou do abraço, olhando-o.
- Eu... Eu cheguei da escola e vi várias viaturas, e uma ambulância aqui, as minhas vizinhas me viram e vieram me contar o que tinha acontecido. Eu nem sei direito como foi. Só sei que foi ele, ; foi o James que fez isso. O meu próprio pai! – soluçou, ainda chorando.
- Eu não consigo acreditar nisso... Sei que você já deve ter cansado de ouvir isso, mas eu realmente sinto muito, . – disse e limpou depressa uma lágrima que rolou pelo seu rosto.
- Eu cansei. – disse respirando fundo e secando as lágrimas. – Cansei de ser a boazinha da história. A que sofre, a que se machuca, a pobre coitada. – franziu o cenho, estranhando a reação dela.
- Tomou algum calmante ou algo do tipo...? – ela riu sarcástica, respirando fundo.
- É tão difícil assim acreditar que eu possa ter mudado? – ele assentiu. – Só que chega uma hora que a gente cansa, . Chega uma hora em que é impossível aceitar essa medíocre vida que foi imposta a mim, entende? A pessoa que eu mais amava no mundo acabou de ser assassinada pelo meu próprio pai. E a minha mãe? Por aí, ninguém sabe onde e com quem. O que a vida me deu por ser tão boazinha assim? A vida só me deu na cara. Eu to esgotada. – despejou tudo, deixando o amigo sem palavras.
- Você tá com a cabeça quente, não... – ele ia continuar, mas ela o interrompeu, levando as mãos aos ouvidos, fingindo não ouvir. – Não seja infantil, ! – disse, tirando as mãos dela de lá.
- Eu estou sendo infantil, ?! – riu debochada. – Pelo contrário, eu quero crescer, quero amadurecer. E preciso da sua ajuda pra isso.
- Como?
- Amanhã, logo depois do enterro do meu irmão... – ela fez uma pausa, fechando os olhos e passando a mão nos cabelos. – Eu vou fugir.
- Fugir? Pra onde? Com quem?
- Com você. – disse e ele arregalou os olhos, confuso. – Eu não suporto mais essa vida, não suporto mais tudo isso. Quero ser outra pessoa, quero uma nova identidade, um novo endereço, qualquer coisa. Vem comigo? – ele respirou fundo, pensou por poucos segundos e sorriu.
- Pra qualquer lugar.


E quando menos viu, o rosto de já estava lavado por lágrimas. Lágrimas de saudade, de dor, e o principal: de arrependimento. Arrependimento por ter sido tão fraca e ter se deixado levar. Ter desistido da vida. Sim, da vida. Desde que entrara para o mundo do crime, todas as vezes que lhes impunham uma missão, ela tinha a plena consciência de que poderia não voltar viva.
Havia feito justiça? Sim. Nunca havia matado algum inocente, todos faziam parte do tráfico, mas mesmo assim, eram vidas... Vida como a dela.
Permitindo-se refletir um pouco mais sobre o que tivera feito com sua vida, ela se lembrou do dia em que foi a cadeia onde seu pai estava e fez justiça com as próprias mãos. Não tinha arrependimentos, mas também não mais se orgulhava daquilo. Sim, poderia ser culpa dos tais hormônios e sintomas que a gravidez estava lhe causando, mas agora ela tinha mais certeza do que nunca: não era mais isso que queria para a vida.
Voltando a olhar para o lado, ela abriu a gaveta do criado-mudo e encontrou uma arma lá, uma das de . Ela a observou e como num filme, várias imagens de seus crimes vieram à mente. Ok, talvez ela tivesse que se tratar com um psicólogo, mas ela realmente poderia ser bipolar. Há dois minutos estava se martirizando pelas vidas que havia tirado, e agora, até permitiu-se dar um sorriso tímido ao lembrar-se de alguns casos, como o senhor Willis, ou a senhora Houston, dona de uma companhia que trabalhava com tráficos de mulheres.
Seu chefe não era nenhum justiceiro ou qualquer coisa do gênero, pelo contrário, poderia ser tão ruim quanto às pessoas que mandava matar. Mas, é como dizem por aí, ladrão que rouba ladrão, tem cem anos de perdão. Não saberia dizer como isso se aplica ao seu caso, mas resolveu pensar assim.
sentiu um desconforto no estômago, como um começo de enjoo e se lembrou que agora carregava uma vida consigo. Ela não deixou de sorrir com isso, deixando-se acariciar sua barriga. Apesar dos contras desses seis anos, eles também lhe serviram para amadurecer, se apaixonar... E engravidar. Afinal, nem tudo havia sido tristeza. Talvez com a vida da simples e boazinha , ela não conseguiria chegar aonde e com quem chegou.

- Já tá tudo pronto? – disse, saindo do banheiro. Ela o olhou e sorriu involuntariamente com o que viu. Ele estava com uma toalha amarrada no quadril e outra menor na mão, secando os cabelos.
- Depende, se for eu... Sempre pronta pra você! – sorriu maliciosa, se aproximando dele, que riu.
- Tentador... – mordeu o lábio, puxando-a para um selinho demorado. – Mas o nosso voo é daqui a pouco, então... – ela rolou os olhos, voltando a guardar o resto das roupas. – Você vai assim, né?
- Pretendia tomar um banho. – disse, colocando a última peça na mala e a fechando.
- Esse banho vai durar mais de dez minutos? – ela cruzou os braços, com um olhar óbvio. – Então, não. – riu. – Desculpa, , mas temos horários...
- Blá blá blá. – rolou os olhos, sentando-se na cama. – ? – ele a olhou, terminando de vestir a camiseta. – Eu quero ir cemitério antes de viajarmos.
- O quê?! – foi atônico. – Eu acabei de dizer que...
- Eu sei, eu sei. Mas não posso ir sem antes ver o túmulo do meu irmão. – ele respirou fundo, assentindo.
- Certo, mas vamos logo com isso, ok? – ela sorriu, assentindo.

Cerca de cinco minutos depois eles estavam saindo de casa. Antes de partirem, se permitiram olhá-la por alguns segundos, lembrando-se brevemente de tantos momentos que passaram ali durante os cinco anos que moraram naquele lugar. Com um sorriso no rosto, entrou no carro, acompanhada de , que foi na direção. Ele acelerou e eles aumentaram o som do carro, colocando a música mais nostálgica que encontraram nas rádios. Um novo caminho começava. Uma nova vida. Uma nova história.
Ao chegarem ao cemitério, a pedido de , ficou no carro esperando-a. Ela prometeu ser breve. Como o tumulo de Henry estava próximo, não demorou até que ela chegasse lá. Sem nenhuma flor e alguma lapide digna, ela sentiu seus joelhos ficarem bambos novamente, deixando-a cair no chão.
- Ei, Henry... – ela sorriu fraco, sentindo a garganta começar a queimar e sua voz embargar. – Estou cumprindo com a minha promessa, viu? Sei que aquilo tudo pode só ter passado de um sonho, mas também sei que seria, de fato, o que você queria para mim. – uma lágrima rolou pelo seu rosto e ela respirou fundo antes de continuar. – Seis anos e estou aqui de novo... Tanta coisa aconteceu, não é? Coisas que eu não me orgulho nem um pouco... Mas já estão feitas, não há do que se arrepender. Eu prometo, maninho, prometo que larguei de vez isso tudo. Vou tentar ao máximo ser aquela garota que você viu crescer, a que ansiava uma vida normal e feliz. Que sonhava com uma família enorme e com uma carreira bem sucedida. Pode ser tarde, mas eu vou tentar com todas as minhas forças. Me ajuda? Me ajuda como você sempre fez? Eu preciso disso.
- ? Temos que ir. – disse, surpreendendo-a quando chegou. Ela assentiu, se levantando.
- Eu te amo, maninho, te amo pra sempre! – sorriu fraco, dando a mão para , que beijou a mesma.
- Pronta para o recomeço?
- Desde sempre. – sorriu, lhe dando um selinho.

Sete meses. Sim, sete meses haviam se passado desde a fuga de e . Mais de quatro países já haviam sido visitados por eles, diversas amizades feitas e o mais importante: sete meses de alegrias. Não haviam sido perseguidos ainda, já que todos os meios que comunicação que tinham com seu “chefe” havia ficado em sua casa. Portanto, a chance de serem encontrados era mínima.
Hoje, e estavam numa praia paradisíaca, eles apreciavam a vista que poderia ser considerada uma dádiva divina. A brisa do mar batia levemente nas folhas das altas palmeiras que estavam à beira mar, levando uma leve brisa para eles. O pôr-do-sol era um quesito ainda maior para que aquilo fosse chamado de paraíso. O que poderia ser considerado impossível há meses, hoje estava acontecendo. Suas consciências estavam tranquilas, limpas, sem se preocupar com o dia de amanhã.

- ? – chamou, e ele virou o rosto em direção ao dela. – Eu... – ela começou e logo parou de falar, com medo da reação dele. – Tem algum problema se voltarmos à Nova Iorque? – ele franziu o cenho, ainda sem compreender o que ela queria com aquilo. – Eu só queria que nosso filho nascesse lá, entende? Foi lá que recomeçamos... Foi lá que começamos um relacionamento.
- Você tem noção do quanto isso é perigoso, não tem? – ela assentiu, voltando a encarar o mar. – Sabes que eu gostaria disso, não é? Mas é uma questão de bom senso, .
- Tudo bem. – disse, acariciando a enorme barriga.
- Tá, tá. – rolou os olhos, e ela o olhou. – Nós vamos pra lá, ok? Nova Iorque não é tão pequena assim. – sorriu, dando-lhe um selinho. – Mas vamos logo. Marcamos uma cesariana ou sei lá como chamam aquilo e voltamos. Não podemos dar bandeira. – disse, enquanto pegava um maço de cigarros no bolso, acendendo um deles e levando-os à boca.
- Como quiser. – deu os ombros, suspirando e tossindo logo após. – Dá pra apagar esse cigarro? – ele revirou os olhos, ignorando-a. – Vai fingir não ter me ouvido mesmo? – ele deu outra tragada. – A convivência com você está cada dia melhor, ! – bufou, se levantando e caminhando até o hotel onde estavam. virou o rosto para ver onde ela ia e fechou os olhos, pensando.
Pensou em como sua relação com ela estava nos últimos dias. Uma hora, se adoravam. Mas outras, não suportavam a presença um do outro. Se pareciam mais amigos do qualquer coisa. Mais até do que da época em que eram, de fato, somente amigos.
Cerca de duas horas se passaram e continuava na praia, observando as pessoas e as ondas do mar, que agora eram maiores devido à ressaca. Enquanto pensava em tudo o que poderia ter sido feito de sua vida, foi tomado por um susto.
- ?
Uma voz masculina disse e ele engoliu seco, temia quem quer que fosse. Sua garganta secou e suas mãos gelaram na hora. Não tinha medo de morrer, mas se preocupava com e a criança que ela esperava. Ele se virou devagar e, certo, um de seus companheiros de “trabalho” estava ali.
- Eu não acredito nisso! – o rapaz riu surpreso. – Você sabe que o chefe te procura há mais de meses, não é?
- Sim, eu sei, Louis. – suspirou, cruzando os braços.
- E sabe que ele está oferecendo uma ótima recompensa para quem te levar a ele, não é? – o homem sorriu malicioso, arqueando uma das sobrancelhas.
- Imagino que sim. Mas não é você que vai ganhar essa recompensa, sinto muito.
disse, e na mesma hora, Louis levou a mão ao bolso da calça, tirando de lá uma arma, arma tal que fez questão de deixá-la voar com o chute que deu no pulso do outro. Quando o rapaz pensou em pegar a arma de volta, foi surpreendido pelas mãos de na gola de sua camiseta, que logo subiram mais para o pescoço dele, apertando-o. - Você realmente achou que eu fosse me entregar tão fácil assim, Louis? Oh, por favor... – ele riu irônico. – Achei que fosse mais esperto! – disse e apertou um pouco mais os dedos no pescoço dele. Com mais alguns passos, ele o prensou contra a parede de uma barraca, que já estava fechada.
- Uma hora vão te achar, ... – disse, com a voz fraca, enquanto segurava o pulso de , tentando fazê-lo soltar. contraiu o maxilar, seria capaz de matá-lo ali mesmo, tamanha a raiva que sentia. – Achar você e a vadia da sua companheira... – sorriu malicioso, enquanto sentiu o ar ficar ainda mais distante. A frieza que mantinha no olhar era invejável. – E acredite, vão fazer questão de matá-los lentamente...
E essas foram as últimas palavras dele. , com um movimento, quebrou seu pescoço. A força que usara foi tão grande que seria capaz de degolá-lo caso segurasse um pouco mais. Mas seria inútil, aquilo só tiraria ainda mais tempo. Ele se deu o tempo de respirar fundo e olhar para os lados, por sorte, ninguém havia visto o assassinato, já que o mesmo acontecera atrás de uma das barracas.
colocou toda a força que tinha nas pernas e correu, correu o mais rápido que pôde para chegar ao hotel em que estava hospedado com . Mais um segundo naquele lugar e eles seriam descobertos. Preferiu subir pela escada, já que estavam no terceiro andar. O elevador só tomaria ainda mais tempo. Ele abriu a porta e – que estava no sofá, assistindo televisão – tomou um susto, se levantando depressa.
- O que houve?!
- Pega qualquer muda de roupa e vamos embora daqui, agora, nos descobriram! – disse alto, indo até o quarto e colocando uma roupa o mais rápido que conseguia. continuava sem entender muita coisa, mas foi até o quarto também e pegou a mala e algumas roupas. – Mas que merda você pensa que tá fazendo, ?! – gritou e ela se assustou novamente. – Eu disse pra pegar uma muda de roupa, não tudo. Anda, mais um minuto aqui e somos presos ou mortos. O que você quer?
- Calma, merda! – disse alterada também, pegando um vestido e um conjunto de calça jeans e camiseta. – Eu vou no meu tempo, ok? Eu to quase parindo um filho teu, não me venha com isso, ok? Se for para sermos presos ou mortos, seremos em qualquer lugar. Agora se acalma! – ele sentou na cama, levando as mãos para a cabeça. – Isso. – respirou fundo. – Agora podemos ir.
Ele não disse sequer uma palavra, apenas foi na frente, segurando a muda de roupas. foi logo atrás deles. Para que passassem despercebidos, não foram pelo elevador, não queriam ser filmados. Ao passar pelo saguão, fingiram estar indo passear pela praia e, já que não seguravam nenhuma mala, não tiveram dificuldade ao fazer isso. Quando chegaram ao carro, respirou fundo, encostando a cabeça no banco.
- Agora você pode me explicar o que aconteceu? – perguntou, olhando-o. – Esse carro é novo, não vão segui-lo, você sabe disso. Acalme-se, por favor.
- Eu acabei de matar o Louis. – ele disse baixo, e ela arregalou os olhos. – Você sabia que estão oferecendo uma boa recompensa por nós? – ela negou com a cabeça. – Pois é... Ele queria nos levar. – riu irônico.
- Você tinha alguma arma?
- Não. – suspirou. – Vamos? Eu não quero mais falar disso. – ele disse enquanto secava uma tímida lágrima que escorreu pelo seu rosto. Louis era alguns dos únicos amigos que lhe restavam.
- Você está bem? – perguntou em dúvida, acariciando o rosto dele. Ele assentiu, ligando o carro. – Tudo vai dar certo, não se preocupe. – sorriu fraco. Ela tentava se convencer disso todos os dias, pena não conseguir.

Algumas boas horas de viagem e lá estavam eles. Na noite do dia 18 de dezembro de 2011. Chegando à Nova Iorque... A cidade que os acolheu, que era como uma moradia para eles. Eles estavam decididos a irem para o hospital hoje, teriam logo esse filho e iriam fugir novamente. Japão, Argentina, Egito... O lugar não importava naquele momento. Quanto mais longe; melhor. Antes de irem para a maternidade, optaram por passar em algum café próximo de onde estavam, estavam há muito tempo na estrada e precisavam se alimentar ou desmaiariam por ali mesmo. pediu uma fatia de torta e um suco. , apenas um café, precisava de energia.
- É estranho estar aqui de novo, não é? – ele assentiu, olhando em volta. Tinha que ter certeza de que estava seguro. – Sinto falta disso. – suspirou, dando uma garfada em sua torta. – E você? – deu os ombros, dando um gole no café. Ela bufou, entediada. – Como nosso filho vai se chamar? – ele deu os ombros novamente.
- O que acha de Aaron para menino e Kate para menina? – ela sorriu e ele riu fraco, vendo o quanto ela estava animada com aquilo. – Hein, ?! Droga, o que custa responder?!
- Desculpa. – sorriu fraco, pegando na mão dela e beijando-a. – São nomes lindos, .
- Assim como nosso filho vai se...
- Ora, ora... A família por aqui?
virou-se de costas e pôde ver quem era. Josh. Mas será que os empregados dele tinham que estar em todo o lugar? sentiu o corpo contrair. Estavam ferrados.
- Josh, por favor, vá embora! Não diga que nos viu... Eu to grávida, e...
- Não acham NY um lugar muito óbvio para se esconderem? – perguntou, levando a mão para o bolso. Percebendo o que iria fazer, lhe deu uma rasteira. se levantou depressa, pegando uma arma da bolsa e apontando para ele.
- Opa, opa... Se acalmem aí. – Josh estendeu a mão para que eles parassem. Vendo o que aconteceria ali, as poucas pessoas que estavam no café, incluindo as garçonetes e caixas, saíram correndo.
- Saudades, ! Que barrigão, hein? – uma mulher disse, andando com uma arma em direção a eles. Era Lucy, a namorada de Josh. – Como vai ser? Você apontando a arma pro meu namorado e eu para o seu namorado. E aí? Rola um acordo? – ela sorriu sarcástica, erguendo uma sobrancelha.
- Não. Não rola. – disse, sorrindo também. Ela atirou na mão de Lucy, que gritou com o susto e soltou a arma, que disparou na direção de Josh. – Na mosca! – ela sorriu, pegando a bolsa.
- Nunca me decepciona, . – sorriu, levantando-se depressa e puxando a namorada consigo.
- Não adianta, ! Ele já está atrás de vocês. – Josh disse, balançando o celular. Por azar, o tiro pegara apenas em sua perna. – Boa perseguição, amigão. – sorriu irônico e mostrou o dedo do meio, indo até o carro.
- Pronta pra emoção, parceira? – falou, colocando o cinto de segurança e acelerando o automóvel.
- Senti falta disso também. – sorriu, mordendo o lábio e tentando colocar o cinto, sem sucesso já que o mesmo estava emperrado. – Merda! Dane-se.
não sabia o que ele tinha, só não entendia o porquê de sempre os encontrar. Em menos de minutos, dois carros já estava às costas de seu carro.
- Merda! – falou, carregando a arma. – São dois carros, . Acabou, acabou!
- Não se eu conseguir chegar a alguma delegacia antes. – disse, acelerando ainda mais o veículo. abriu a janela e tentou atirar nos pneus do carro, tentativa frustrada.
- Não tá indo muito rápido não?
- Quer que nos peguem? – ela negou, ouvindo sirenes de polícia. Ok, agora seriam três carros atrás deles.
- Que droga, ! – disse chorosa, não estava com um pressentimento nada bom. – Para o carro, a polícia tá por perto, eles não vão poder fazer nada!
- Não confia em mim? – ela suspirou. – Vamos conseguir. – ele sorriu fraco, entrando em uma curva à direita.
Tudo aconteceu muito rápido. Ao fazer a curva, sentiu uma forte batida no carro e logo depois o mesmo capotar. Uma, duas voltas. Foi tudo o que ele conseguiu sentir antes de tudo ficar escuro.


Capítulo V


Música do capítulo!

ainda estava meio atordoado com o que acabara de acontecer. Quando se deu conta de que continuava de ponta cabeças no carro capotado, o pânico começou a tomar conta de si.
- ? , você tá bem? – ele sussurrou, dentre as ferragens. – ?! – disse num tom mais alto. Nada.
Seus olhos encheram-se de lágrima. Ao virar um pouco o pescoço, ele pôde ver , e comprovou o que não queria: ela estava desacordada, caída sobre o vidro quebrado. Ele voltou a fechar os olhos, tentando dormir e quando acordasse, visse que era apenas um pesadelo.
- Está tudo bem? – uma voz masculina falou e abriu os olhos, virando a cabeça devagar para a esquerda, vendo o policial.
- Eu acho que sim, comigo. Mas ela está desacordada. – disse com calma, havia aprendido a ter sangue frio em certas situações. – Ela está grávida, por favor, me ajude.
- Fique tranquilo. A ambulância já está vindo. Tente-se manter acordado.
- Onde estão os carros que estavam nos perseguindo? – perguntou.
- Fugiram. Quem eram?
- Antigos inimigos... – suspirou, sentindo uma forte dor no braço. – A ambulância já está chegando?
- Isso responde a sua pergunta? – o policial disse assim que ouviu a sirene se aproximar. se permitiu sorrir aliviado.
Depois de alguns minutos, conseguiu sair do carro, andando, por sorte só havia sofrido leves luxações. não teve tanta sorte, por não estar usando o cinto de segurança, ela bateu a cabeça no vidro, o que só complicava sua situação. Ao vê-la com a testa jorrando sangue, ele não aguentou, foi como se visse novamente aquela frágil. Aquela mesma que sempre lutou para ser feliz. As lágrimas já escorriam por seu rosto, lavando-o por inteiro.
- Eu quero ir na ambulância com ela! – disse alto, autoritário. O enfermeiro assentiu, fazendo os últimos ajustes na maca e colocando a mesma dentro da ambulância. Logo ele entrou, acompanhado de .
Enquanto a ambulância corria, só conseguia encarar o rosto de , que agora parecia mais frágil do que nunca. O enfermeiro tentava estancar o sangue de sua testa, mas nada parecia ajudar. Aquilo não era nada bom. Nada bom.
Quando o hospital estava próximo, abriu os olhos, meio desnorteada.
- ...? – disse com a voz baixa, falhada.
- Shh, eu to aqui. Não fala nada. Vai ficar tudo bem, ok? – disse, tentando fazer com que aquela frase fizesse sentido para ele também.
- Nosso filho... – sussurrou, levando a mão para a barriga.
- Shh, nosso filho está bem, hm? – sorriu fraco, fungando.

Finalmente a ambulância havia chegado ao hospital, tudo foi uma correria. desceu, segurando a bolsa de gelo que o enfermeiro lhe dera. Logo mais duas enfermeiras chegaram para ajudar a levar a maca de até a sala de cirurgia. Ela teria de ser operada agora ou o bebê não suportaria.
(Play na música!)

- , não me deixa... – disse enquanto passava pelo corredor, ele segurava sua mão firmemente.
- Ei, eu não vou te deixar. Está tudo bem, ok? – ele sorriu, tentando passar forças para ela. Forças essas que ele não sabia onde encontrar.
- Nosso filho... – ela disse novamente, com a voz falha e embargada. mordeu o lábio inferior, tentando segurar o choro.
- Você precisa passar naquela sala antes de entrar para a sala de cirurgia, senhor. – uma enfermeira disse e ele assentiu, sussurrando um “já volto” para , que assentiu, fechando os olhos.
Em menos de um minuto já estava com a roupa, touca e sapatos especiais para que entrasse na sala. Assim que estava tudo pronto, ele entrou no lugar, onde os médicos já estavam com todas aquelas parafernálias para que pudessem salvá-la e salvar o bebê. Um nó se formou na garganta de , ela tinha que se salvar. Seu filho tinha que se salvar. Ele caminhou até e segurou sua mão, olhando para seu rosto, que estava ainda mais pálido.
- Acabou, ... – ela sussurrou, ele a olhou confuso. – Meu tempo... Ele acabou.
- Claro que não! Não diz besteira, . Já passamos por coisas bem piores, não lembra? – ela assentiu, fechando os olhos e abrindo-os devagar. As lágrimas já estavam ali, escorrendo por seu rosto que ainda tinha marcas de sangue.
- Me promete... Me promete que vai cuidar do nosso filho caso algo acont...
- Não vai acontecer nada, ! Nós vamos cuidar desse filho, juntos! Juntos! – disse, com a voz embargada.
- Me promete, .
- ...
- Promete.
- Tá, eu prometo. Agora não pensa nisso... Logo tudo vai estar bem, ok? – ela assentiu devagar, com um sorriso breve no rosto. olhou para o lado e bem na hora pôde ver e ouvir. Ver e ouvir o choro de seu filho. Ele abriu a boca surpreso. Uma mistura de emoção, angústia e felicidade tomou conta de seu coração tão frio.
- Você foi o melhor amigo que eu poderia ter tido em toda a minha vida. Mesmo com seus erros e defeitos... Você foi o melhor. – disse baixo, dando um beijo rápido na mão de , que não sabia mais o que fazer com aquela situação. Ele estava a perdendo. – Eu fui só alguns capítulos da sua vida... Você ainda tem um livro inteiro para escrever, . – ele negou com a cabeça, olhando-a. A enfermeira mostrou o bebê para e ela sorriu. Era menino. – Você vai ter um ótimo pai, filho... – sorriu fraco, fechando os olhos com força.
Um barulho alto se iniciou, se assustou e tentou ver de onde aquele barulho saía. Quando viu o que era, sentiu como se mil facadas tivessem entrando em seu peito. O coração de estava parando.
- ?! , não me deixa! – gritou.
- Por favor, senhor, saia. – o médico falou, enquanto dois enfermeiros tentavam tirar da sala, sem muito sucesso. Outro enfermeiro se aproximou e finalmente conseguiram tirar da sala, fechando-a logo em seguida. Ele batia diversas vezes na porta, gritando o nome de . Quando se deu por vencido, sentou-se no chão, ao lado da porta, levando as mãos para os cabelos, bagunçando-os angustiadamente. As imagens de sorrindo não saiam de sua mente, suas gargalhadas... Aquela gargalhada alta, que todos os vizinhos eram capazes de ouvir. A imagem de dançando como uma adolescente ao som de Pink. Afinal, ela era uma adolescente em forma de adulta. Sua adolescência havia sido roubada. O jeito de como ela o fazia bem, o fazia feliz... Ela não podia tê-lo abandonado. Não podia tê-lo deixado assim, agora. As lágrimas já haviam secado no rosto de quando a porta abriu, fazendo-o sentir seu coração pulsar como nunca. Sua boca secou na hora, esperando o que o Doutor iria dizer.
- Bem... Nós fizemos tudo o que podíamos...
Certo. Aquelas palavras não eram nada boas.
- Mas, infelizmente ela não aguentou. A pancada na cabeça foi muito forte, causando uma forte hemorragia interna. Sinto muito.
não soube o que houve, só sentiu o peso faltar em suas pernas e, quando viu, já estava no chão. Depois das palavras: “ela não aguentou”, ele não ouviu mais nada. Sua havia partido, havia o deixado. Ele levou as mãos à cabeça, desesperado. Sentia-se sem rumo. Ela era tudo para ele. Sua melhor amiga, sua namorada, sua parceira...
Vários flashbacks de seus momentos com ela estavam passando como um filme em sua cabeça. Pensar que nunca mais veria um filme de terror com ela, pensar que quando acordasse ela não estaria mais do seu lado, que ela não estaria mais ali para pedir que ele parasse de fumar, para simplesmente dar uma bronca... Aquilo não podia estar com ele. Não com ele. Não com .
não sabe quanto tempo passou ao certo, mas quando “voltou” a realidade, foi chamado por um enfermeiro, pois no telefone do hospital, havia alguém querendo falar com ele. estranhou, mas foi até o mesmo.

- Ei, ... – o homem disse e cerrou o punho na hora. Era ele. – Já soube do que aconteceu com a pequena ... Vocês mereceram isso. Mas sinta-se em paz, não vou mais procurá-lo e nem mandarei meus homens para acabarem com você. Aposto que estar vivo e conviver com essa dor é muito pior do que morrer, não é? – ele riu debochado.
- Você. Vai. Morrer. – sussurrou, com um tom de voz que transbordava ódio. O homem que estava do outro lado da linha apenas gargalhou, desligando.

- Senhor ? – alguém disse e ele se virou para ver quem era. Algum dos Doutores de lá. tentou sorrir fraco, para parecer ao menos um pouco simpático. – Seu filho está no sexto andar, na maternidade... Você quer vê-lo?

Filho... havia se esquecido de que tinha um filho. Aquela seria a noite mais feliz de sua vida se não tivesse o deixado. Um filho foi sempre seu sonho. Mas, hoje, tudo aquilo parecia tão difícil. Não amava aquela criança como deveria ser, afinal, se ela não tivesse aparecido, estaria ao seu lado agora. Odiava pensar daquela forma, parecia um garoto marrento. Mas era a verdade. O que mais queria agora era pegar esse bebê e levá-lo para o primeiro orfanato que visse, mas sabia que se fizesse isso estaria quebrando a promessa que fez para , e a coisa que menos queria no momento era não cumprir o último pedido dela. Decidiu, por fim, ir até o andar onde o bebê estava. Chegando lá, foi direcionado ao berçário, onde pôde ver – mesmo pelo vidro, a figura de seu filho.

- O terceiro da direita. – o Doutor disse, e observou seu rostinho. Seu pequeno rostinho.
Os olhos de se encheram de lágrima na hora. Como queria amar aquela criança como ela merecia. Como queria estar com agora. Ela provavelmente estaria chorando como uma garotinha que teve pela primeira vez o coração partido.
- É lindo, não é? – o Doutor voltou a falar. O rapaz somente assentiu, desviando o olhar daquela criança de roupinha azul claro.
- Como ficaram os papéis da ? – ele perguntou, fugindo do assunto “bebê”. O médico suspirou pesadamente. Aquele era um assunto sempre muito difícil.
- O atestado de óbito já está sendo encaminhado.
Atestado de óbito. Era tão duro ter de ouvir algo assim, ainda mais quando esse atestado fosse de . E, pela primeira vez, se arrependeu de ter entrado na vida dela... De ter aceitado sua proposta de fugir. Talvez hoje ela tivesse encontrado o cara certo, teria uma família feliz e uma vida. Sim, uma vida.
Tudo parecia tão sem cor, sem sentido. Morrer já não seria mais um problema para ele. Talvez nunca tivesse, de fato, sido um problema para ele. Estar ao lado de seu pai sempre lhe pareceu mais agradável do que continuar nessa vida medíocre que tinha. Mas, pelo menos, tinha para lhe confortar, para conversar e dizer que tudo ficaria bem. O médico encarou por alguns segundos e viu o estado deplorável que ele estava, queria poder fazer algo para ajudar. Todos os dias – ou a maioria deles, dava notícias como essas à pacientes, mas hoje em especial, essa notícia parecia tão mais complicada. Via no fundo dos olhos daquele homem o quanto ele estava sofrendo. A visão parada... Observando o horizonte. Com certeza ele não estava mais nessa atmosfera, seus pensamentos estavam longe... Talvez num passado feliz.
- Bem, eu sei que parece clichê um médico falar isso, mas eu realmente sinto muito e...
- Eu... – o interrompeu, com a voz embargada. – Eu posso te abraçar? – o Doutor pareceu surpreso com o pedido. – Eu não tenho mais ninguém nessa vida... – ele repetiu, choroso.
- É claro que pode. – sorriu, abrindo os braços. o abraçou com força, odiava estar naquele estado tão... Gay. Odiava parecer fraco, derrotado. E era isso o que agora era. Quando se desvencilhou do abraço com o Doutor desconhecido, ele secou depressa as lágrimas e voltou a usar a mesma pose fria de antes.
- Obrigado. – sorriu fraco.
- Não há de quê. – sorriu também. – Como é o nome do garotão? – disse, apontando para o vidro, onde o filho de e estava.
- Não sei... – riu sem alegria. – disse algo sobre Aaron, não sei bem.
- Você terá um tempo para resolver isso. Tudo em seu momento, sim? – ele assentiu. – Bom, vou ver como tudo está, fique à vontade.

Assim que viu o Doutor entrar no elevador, caminhou com passos largos até a saída do Hospital. Não aguentava ficar mais um só segundo naquele lugar. Precisava respirar ar puro, precisava se acalmar... Ao colocar as mãos nos bolsos, viu que tinha apenas alguns dólares amassados lá. Dinheiro. Outro problema. Todo o seu dinheiro havia ido embora; no banco, tinha apenas alguns trocados – que não dariam nem para dois meses de sobrevivência. Como iria se alimentar? Como iria, principalmente, alimentar uma criança? Comprar fraldas, berço, roupas? Estava perdido. Mas, por hoje, não se permitiria pensar em mais nada. Correu até uma padaria próxima e comprou um maço de cigarros, imediatamente se lembrou das broncas de e o nó voltou a tomar conta de sua garganta.

- Eu sei que você não gosta, mas... – esticou a mão, segurando um cigarro entre os dedos, oferendo a droga para ela.
- Para com isso! – pegou o cigarro da mão dele e o jogou no chão, pisando em cima. – Como se já não bastasse os meus problemas, ainda tenho um amigo que aos dezessete anos terá um câncer de pulmão por fumar mais do que Bob Marley. – rolou os olhos, eles se encararam e deram risada.


Ele se permitiu sorrir, lembrando-se daquilo. Tirou um cigarro do maço e o acendeu, levando-o a boca e tragando o máximo de nicotina que pôde. Ao voltar à rua, olhou para cima, no céu... estaria ali agora? Ele riu fraco da hipótese. O céu estava estrelado como nunca, ou talvez nunca houvesse parado para observá-lo dessa forma. deu outra tragada no cigarro e voltou a encarar o céu.
- Eu juro, ... Eu vou me vingar de todos que te fizeram mal. – ele abaixou a cabeça e deu uma ultima tragada, soltando a fumaça devagar. – Eu juro. – suspirou, chacoalhando a cabeça e tentando manter a pose fria e dura de sempre. Não poderia sair do personagem que carregava há tanto tempo justamente agora. Não ia fraquejar.
Uma semana se passou desde que tudo aconteceu. O enterro de já havia acontecido e aquele fora de longe o pior dia da vida de . Hoje o seu filho ia ter alta da maternidade e estava arrumando tudo para buscá-lo. Nessa última semana, ele havia voltado para a casa que morava com antes de fugirem e a encontrou totalmente destruída. Com certeza ele havia mandado seus capangas para fazer isso. Porém, na situação em que estava, não teve sequer ânimo para entrar em outra discussão, apenas tentou arrumar o que restava. Com parte do dinheiro que tinha em sua conta, foi ao supermercado e comprou mantimentos essenciais para sua sobrevivência e com o resto, comprou fraldas, algumas roupinhas, mamadeiras e um berço. Não sabia que uma criatura tão pequena quanto esta lhe causaria tantas despesas. Em relação à alimentação do pequeno, ele ganharia leite materno doado por um hospital público da cidade, que tem esse serviço para pais que passaram o mesmo que ou outros casos.
Em uma semana tudo mudou tanto. Sua vida havia virado de ponta cabeça. Não um ponta cabeça bom, daqueles que você é o panaca da escola e acaba ficando com a loirinha gostosa líder de torcida. Mas da pior forma que poderia imaginar. Há sete anos, quando achou viver a pior época de sua vida, jamais imaginou que aquilo poderia piorar dessa forma. Mas, estava decidido, iria se reerguer... Ou pelo menos iria tentar. Talvez.
Ao chegar ao hospital, foi direto para a maternidade. Ele assinou todos os papéis possíveis e impossíveis também. Direcionado pela enfermeira chefe, ele entrou – pela primeira vez – no berçário.

- É a primeira vez que vai segurá-lo? – a moça disse, pegando o bebê com todo o cuidado do mundo. somente assentiu, não deixando de sorrir ao vê-lo se remexer todo. – Ele é lindo! – disse e o posicionou para que o pegasse. Ele tentou ser o mais delicado possível e esperou ter feito isso com sucesso. Meio desajeitado, ele tentou arrumar o filho no colo, para que ele ficasse mais confortável. Estava morrendo de medo de derrubá-lo ou algo do tipo, ele parecia tão frágil. Ele era tão frágil.
- Que medo. – disse, olhando para o bebê.
- Não tenha. – a enfermeira disse, sorrindo e fazendo um carinho na cabeça da criança. – Já escolheu o nome?
- Aaron. – sorriu, brincando com as mãozinhas do pequeno. – Aaron Smith . – repetiu o nome, mas dessa vez completo, com um sorriso ainda maior nos lábios.
- É lindo. – a enfermeira sorriu, olhando para , que suspirou, voltando à realidade. - Eu já posso ir?
- Ah, claro. – deu os ombros. – Tchau, pequeno. – deu um beijinho na mão da criança, que a observava. – Boa sorte! – exclamou e sorriu em agradecimento, saindo logo depois.

Depois de pagar o táxi, entrou em sua casa com o filho nos braços. Respirou fundo e sentiu os olhos queimarem e o um nó se formar em sua garganta. Queria pegar a primeira arma que encontrasse e atirar em si. Acabar com sua vida talvez fosse a melhor opção agora. Mas, interrompendo seus pensamentos obscuros, um chorinho foi ouvido e ele de imediato olhou para seu filho, que mexia as mãozinhas e os pezinhos. Deveria estar com fome, pensou. o colocou no berço e correu até a cozinha, pegando o leite que tinha reservado na mamadeira e o esquentou no micro-ondas, alguns segundos depois ouviu um barulho estranho e tirou o aparelho da tomada. Estranho. Bem estranho. Mas, por fim, resolveu pegar o leite morno e levou para a criança. O pegou no colo com cuidado e caminhou até o sofá, logo depois colocou a mamadeira com cuidado na boca do filho, que o fitava. olhou para o lado e viu um porta-retratos onde estava uma foto de , ele sorriu com aquilo. “Sinto tanto a sua falta, ”, sussurrou e tomou um susto quando sentiu Aaron se mexer em seu colo. Só então viu que ele estava engasgando.

- Ai, meu Deus! – disse assustado, tirando a mamadeira da boca do filho e o levantando, sem saber o que fazer. – A criança tá sufocando! – arregalou os olhos, e por impulso, segurou o nariz do bebê e colocou a boca sobre a dele, tentando sugar o líquido que tampava sua garganta. Com sucesso, a criança voltou a respirar e ele cuspiu o que havia ingerido. Ele respirou, aliviado, e levou uma das mãos à cabeça, respirando fundo. Aquela criança iria morrer em suas mãos. Ele a encarou novamente e o bebê continuava fitando-o. – Oi... – ele sorriu. – Eu sou seu pai, muito prazer. – disse e riu de si mesmo. – Que viadagem. – disse para si, rolando os olhos.

A campainha tocou e foi até a porta, surpreso, quem o procuraria? Quando a abriu, encontrou a senhora Parker com um sorriso um tanto assustador no rosto, ela segurava uma travessa que estava provavelmente com biscoitos ou algo assim.

- Olá, ! – a mulher falou, encarando-o. Ele franziu o cenho. – Eu... Posso entrar? – perguntou receosa e ele assentiu, sorrindo fraco. – Como vai, querido?
- Na medida do possível, bem. – disse, sentando-se no sofá e fazendo menção para ela que sentasse também. Ela o fez.
- Eu soube do que aconteceu com ... Ela era tão nova! – disse chorosa, colocando a travessa na mesa de centro. – Eu sinto muito.
- Obrigado. – ele disse, suspirando. – Eu também sinto. Demais.
- Imagino. – suspirou também. – E esta criança linda?! – sorriu, encarando o bebê. – É seu filho, não é?
- É, é sim. – sorriu fraco, olhando o filho também.
- Como está sendo cuidar dele? Digo, você tem alguma experiência com crianças? – ele negou com a cabeça, mordendo o lábio inferior. – Oh, céus! Já imaginava. – a mulher riu, estendo os braços para pegar o bebê. – Se quiser, eu posso te dar algumas dicas de como cuidar dele...
- Eu agradeceria muito. – o rapaz riu sem humor. – Ele quase morre engasgado com o leite agora pouco, eu to completamente perdido.
- Hm... – observou a mamadeira que estava na mesa de centro. – Isso é normal, você só precisa deixá-lo com o corpo um pouco mais alto, entende? – demonstrou, pegando a mamadeira morna e dando na boca da criança, que mexia os bracinhos. – Você, por acaso, não esquentou essa mamadeira no micro-ondas não, né? – franziu o cenho, olhando-a confuso e preocupado.
- Há algum problema nisso?
- Oh, céus... – a mulher disse, rindo. – Você não pode esquentá-la lá, querido. Tem que ser em banho-maria! – Ele cruzou os braços, olhando irônico para ele. Como iria saber que merda era “banho-maria”? – Ok, você não sabe o que é isso. – ela riu novamente. – Tem que deixar a água ferver e colocá-la numa forma, logo depois você pega a mamadeira com leite e coloca sobre a forma, entende? – ele assentiu ainda meio confuso. – Cuidar de uma criança não é nada fácil, querido, mas seu instinto de pai o ajudará, não se preocupe. E quando esses instintos não funcionarem muito bem, é só tocar a campainha aqui do lado. – ela piscou, fazendo-o sorrir verdadeiramente.
- Obrigado. – disse sincero e ela sorriu, dando os ombros.
- Como é o nome desse garotão lindo?
- Aaron. – a mulher sorriu novamente, brincando com os pezinhos da criança.
- Bem, querido, eu tenho que ir agora. Daqui a pouco senhor Parker chega e precisa jantar. – ela disse, entregando o bebê para , que o pegou com cuidado. – Já sabe, não é? Qualquer coisa é só gritar que eu venho!
- Obrigado. De verdade. – sorriu verdadeiramente, levando-a até a porta. – Boa noite, senhora Parker. – ela assentiu, entrando em sua casa. respirou fundo, olhando para o filho. – E aí, garotão, algum plano? – o bebê fez uma careta e desatou a chorar. – Esse não parece um plano muito bom, filho. – brincou, arrumando Aaron no colo e percebendo um cheiro... não tão agradável. – Oba! Primeira fralda, que excitante! – disse irônico, indo até o quarto e colocando-o na cama. Ele tirou a fralda suja e sentiu uma ânsia, mas prendeu a respiração e fez tudo aquilo o mais rápido que pôde. – O que você comeu para ficar tão podre assim, moleque?! – perguntou e Aaron levantou as perninhas, brincando. Certo, não gostar daquela criança estava ficando mais difícil do que pensava.

Depois de alguns minutos lutando contra o sono, finalmente conseguiu fazer Aaron dormir. Ele respirou e o colocou no berço, cobrindo-o com um leve lençol, já que fazia bastante calor.

- , ... Por que não usamos camisinha, hein? – Ele disse em tom brincalhão, olhando para o porta-retratos com a foto dela. – Você faz tanta falta, senhorita Smith. – suspirou, colocando as mãos na cabeça, passando a mão nos cabelos. – Como você se vai e me deixa aqui com esse bônus? – disse sorrindo fraco, já sentindo o coração bater mais forte por aquele pedaço de gente. – Vamos lá, ... Bola pra frente! – disse para si mesmo, pegando um jornal que estava na mesa de centro, junto com os biscoitos que senhora Parker havia trazido. Ele abriu na página de classificados de emprego e circulou com uma caneta vermelha tudo que lhe interessava. Já que não havia terminado o segundo grau, optou por coisas mais possíveis, tinha que começar de baixo. Enquanto procurava mais vagas, o celular antigo de tocou. Celular este que tinha deixado em casa quando fugiu com , mas como no acidente o que tinha se despedaçou, resolveu carregar o antigo e usá-lo. Sem olhar no visor, atendeu e sentiu seu corpo gelar ao ouvir a voz conhecida do outro lado da linha.

- Como vai, ? – o homem disse e se levantou, sentindo o sangue ferver.
- O que você quer? – perguntou entre os dentes.
- Saber como um dos meus antigos amigos está... – disse sarcástico, rindo logo depois. – Muita saudade da companheira? Imagino o quanto! E o filho? Aposto que não está ajudando muito, não é? Se quiser, eu posso dar um jeito nele por você... – O ódio, que antes era imenso, agora se transformara em algo mortal. Poderia queimá-lo vivo se o encontrasse na rua.
- Não ouse tentar nada contra o meu filho, tá ouvindo, seu covarde de merda?! – disse num tom mais alto, cerrando o punho.
- Calma, ... Foi só uma sugestão, ué. – disse, gargalhando do outro lado da linha.
- Ri... Ri mesmo, ria enquanto é tempo. Eu vou te matar, , eu vou te matar!


Capítulo VI


estava sentado no canto da sala, com os braços apoiados nos joelhos e a cabeça pendida para trás, encostada na parede. As lágrimas escorriam pela lateral de seu rosto e ele fungava baixo. Era um choro silencioso, conformado, dolorido. Odiava fraquejar, mas tudo parecia tão perdido agora. Ele estava sozinho, definitivamente sozinho.

Era tarde de sábado em Dallas, e John – seu pai – haviam saído para pescar, como sempre faziam pelo menos duas vezes por mês.
- Droga, não acredito que vai chover! – disse o garoto que acabara de completar seus quinze anos.
- Só espero que seja uma chuva rápida... Não quero que isso prejudique nossa pescaria, filho! – John disse, afagando os cabelos do filho.
- Mas é claro que não vai, pai! – disse confiante, enquanto colocava o boné que seu pai havia lhe dado minutos atrás. – Mas vamos logo, sim? – o senhor assentiu, rindo.
E ali foram. Risadas, música alta, e companheirismo marcou aquela pescaria. Mas o que nenhum dos dois esperava era que muitas lágrimas também marcariam aquele dia. Um trovão alto soou no céu e junto deles várias gotas grossas começaram a cair sobre o mar. Tudo aconteceu de forma muito rápida. O vento batia na água e as ondas começavam a se formar, fazendo com que o barco balançasse cada vez mais, o que fez John ligar para a guarda costeira; porém, apenas um pequeno bote estava por perto e ele logo chegou, mas o problema estava ali: o barco só teria lugar para uma pessoa.
- Nós vamos tentar chamar mais botes, algum de vocês precisa ficar aqui esperando! – o homem disse, olhando-os.
- Sem problemas. Vá com eles filho, logo eles virão me buscar, ok? – o homem disse, com um sorriso confiante no rosto.
- Não, pai! Eu quero ficar aqui com o senhor, eu não vou sem você!
- O que é isso, garotão? Não vai acontecer nada, não se preocupe, sim?
- Temos que ir logo, a chuva está aumentando! – um dos homens da guarda costeira falou, e John fez com que o filho entrasse no bote.
- Não, pai! – ele disse alto, com a voz embargada.
- Vá, filho, logo nos veremos! – o homem sorriu confiante novamente. Antes de sumir totalmente de sua vista, olhou para trás e viu o pai acenando. Mas a pior parte de tudo foi quando pôde ver um raio atingindo o pequeno barco, que se desfazia ali. Junto de seu pai.


E quando menos percebeu, estava aos soluços no canto da sala, lembrando-se daquele maldito dia em que perdeu a pessoa que mais lhe importava.
Junto de seu choro, pôde ouvir Aaron fazendo o mesmo. Ele rolou os olhos e se levantou com raiva, indo até o berço.
- Mas será que nem chorar em paz eu posso?! Que merda! – disse alto, chutando o pé do berço. No mesmo instante, ele olhou para o lado e viu o retrato de , sorrindo. Não poderia tratar uma criança daquela forma... Ainda mais seu filho. Ele não tinha culpa de nada do que estava acontecendo. – Ei, me desculpa...? – disse, pegando o filho no colo e balançando-o devagar. – Eu sei, eu sei... Só faz um dia que estamos juntos e eu já to desse jeito. – fungou, secando as lágrimas. – Prometo que vou tentar ser um pai de verdade, ok? – andou até a cozinha, colocando água para ferver. – Nós vamos dar a volta por cima, garotão. – sorriu fraco, arrumando-o em seu colo, fazendo com que ele o encarasse. – Você deve estar pensando: por que meu pai tá chorando? Homem não chora! – disse e riu logo depois, estava enlouquecendo. – E não chora mesmo. Temos que aprender a vencer todos os obstáculos que a vida nos impõe, não é? – sorriu, dando um beijinho na testa do pequeno. Ele pegou a água que já fervia e colocou numa forma, logo depois pegou uma mamadeira com leite e colocou sobre lá, assim como a senhora Parker havia dito. – Vai dar tudo certo, sim? – sorriu verdadeiramente, dando outro beijinho na testa do filho.
Um mês. Sim, um mês havia se passado desde que tudo aconteceu. Um mês de batalhas internas e externas. Há um mês procurava algum trabalho e ainda não havia encontrado. Há um mês tentava ser um pai de verdade – às vezes sem muito sucesso. Ele estava a ponto de entrar num colapso nervoso; seu dinheiro estava acabando e junto dele, sua paciência. Sentia-se minimizado por ser um “dono do lar”, sentia-se menos homem hoje. Sim, talvez fosse machismo, mas era o que ele sentia agora. Precisava voltar a ser o homem que era, ter a mulher que tinha. A saudade e a dor de ter perdido não havia terminado, pelo contrário, ela só parecia aumentar... Mas agora tudo estava mais brando, mais calmo. Talvez essa saudade nunca passasse, só o tempo lhe diria tal coisa, mas tinha a plena noção de que só vivesse em vão daquilo, iria acabar definhando e levando seu filho junto. Teria de provar para si mesmo de que era capaz de reconstruir a sua vida. A sede de vingança por não havia terminado, pelo contrário, ele só estava esperando a hora certa para dar o bote.
Hoje, havia deixado Aaron com a senhora Parker para que pudesse ter um tempo sozinho. Sentia que se ficasse mais um só dia naquela casa cuidando do filho, iria enlouquecer. Já era à noite, 21h33. caminhava tranquilamente pelas ruas de NYC, mesmo tendo apenas vinte e quatro anos recém completados se sentia um velho ao ver adolescentes indo para as boates ou bares, saber se perdeu a parte mais importante de sua vida não era fácil. Mais alguns passos e ele entrou numa esquina, onde viu ao longe como uma briga entre um casal. Ele se aproximou e pôde ver que o homem segurava o braço da mulher com força, gritando com ela, que falava chorosa.
- Acabou, garoto! Você não entende?! – ela gritava, tentando se soltar.
- Você vai pra casa comigo, ok? Lá conversamos!
- Me larga!
Ela disse e recebeu um tapa certeiro no rosto. correu até eles e empurrou o homem, encostando-o na parede. O rapaz arregalou os olhos com o susto e o encarou. A mulher se assustou também, dando alguns passos para trás.
- Não ouviu o que ela disse? – disse, com uma das mãos segurando o pescoço dele.
- Quem é você pra se meter na nossa conversa?! – o rapaz falou, tentando tirar a mão de de seu pescoço. Porém foi inútil, era muito mais forte.
- Sou alguém muito mais homem do que você, acredite.
- Me solta, velho! – o homem falou, já com medo.
- É bom ter alguém te segurando e te amedrontando, não é? – riu irônico e o soltou. – Agora, vai embora antes que isso piore.
- Você vai ver, meus seguranças vão te encontrar e vão acabar com a tua raça! – disse, saindo em passos largos e rápidos, quase como uma corrida.
- Playboyzinho de merda. – disse para si mesmo, enquanto ria.
- Ahn, obrigada.
A garota disse e se virou, lembrando-se finalmente de sua presença. Quando a olhou, sentiu tudo a sua volta ficar como um borrão. A garota era simplesmente linda, tinha os cabelos castanhos caídos sobre o ombro, os olhos com um brilho intenso e o sorriso fazia todo o conjunto ser mais perfeito ainda.
- Ah, por nada. – ele sorriu fraco, estendendo a mão para ela, que a tocou, cumprimentando-o também. – Você tá bem? – ela assentiu, ainda sorrindo para ele.
- Sim... Como posso te agradecer?
- O “obrigada” já está de bom tamanho. – disse sorrindo, colocando as mãos nos bolsos da calça.
- Mas um café você não recusa, né? – apontou para o outro lado da rua, onde havia um pub. – Aliás, qual é seu nome? O meu é . – sorriu verdadeiramente. O sorriso que até então tomava posse dos lábios de Nick, sumiu na hora. – Eu... disse algo errado? – perguntou, preocupada.
- Não, não... – suspirou. – Meu nome é , prazer. – E, bem, um café não faz mal a ninguém. – sorriu, entrando com ela no tal pub. Eles conversaram sobre assuntos aleatórios e quando o convidou para comer algo, ele resolveu ir embora.
- Eu ficaria mais, mas tenho que buscar meu filho. – coçou a nuca, meio incomodado em dizer aquilo. A garota arregalou os olhos.
- Filho?! Ai, que vergonha, juro que achei que você fosse solteiro!
- Ah, não se preocupa. – riu fraco. – Minha namorada morreu há um mês... Aliás, ela tinha o mesmo nome que você. – deu os ombros.
- Ahn, eu sinto muito. – mordeu o lábio inferior, meio sem graça.
- Obrigado. – sorriu fraco.
- Mas então, eu posso conhecer seu filho? – franziu o cenho, confuso.
- Mas a gente acabou de se conhecer... E se eu for um tarado? Um... Assassino? – disse, lembrando-se de que, de fato, era um assassino.
- Se você fosse alguma coisa dessa, não teria me salvado do mala do meu ex-namorado, não é? – falou enquanto ria alto. Certo, ela parecia feliz até demais.
- Correto. Eu acho. – disse em dúvida, rindo depois também. – Mas, tudo bem, se você quiser vir...
- Oba! Não tinha nada pra fazer hoje mesmo. – deu os ombros, sorrindo e caminhando ao seu lado. Por alguns segundos, a olhou pelo canto dos olhos, e aquele sorriso continuava ali. Não sabia se sempre fora depressivo desse jeito ou aquela garota era alguma esquizofrênica.
- Você não é nenhuma tarada ou assassina não, né? – perguntou em tom de brincadeira, e ela gargalhou, jogando a cabeça para trás.
- Não... Não que eu me lembre. – piscou, rindo e fazendo rir também.
- E também não é nenhuma louca, né? – brincou novamente, fazendo-a parar de andar e encará-lo.
- Por mais que as pesquisas digam que sim, minha psiquiatra afirmou que não. – disse, encarando-o. – Aliás, você viu o preço dos dinossauros para os feijões verdes que estão de jardim no beco dourado? – ele parou, olhando-a e tentando entender. Ela gargalhou novamente, assim que entendeu a brincadeira, riu também. Riu verdadeiramente, como não há muito tempo. – E seu filho, quantos anos tem? – voltou a andar, assim como ele.
- Um mês.
- Mas... Sua namorada...
- É, eu sei. – sorriu sem humor. – Ela morreu pouco depois do nascimento dele.
- Ahn... Desculpa tocar no assunto e...
- Não se preocupe. – sorriu, interrompendo-a. – Quantos anos você tem?
- Vinte! E você, ? – ele virou o rosto para ela, meio surpreso ao ouvir seu antigo apelido. – Ahn, desculpa, posso te chamar de ? – perguntou receosa, ele assentiu sorrindo.
- Vinte e quatro. É, um velho. – bufou, em tom de brincadeira.
- Oh, céus! Você tem idade para ser meu pai, como pode ser tão velho? – ironizou, rindo logo depois.
E de lá para a casa de não faltou conversa, eles pareciam se conhecer a anos. É, parecia uma garota meio... Maluca. E talvez realmente fosse, mas não era isso que via naquele olhar. Ele via inocência... Mas, ao mesmo tempo, via maturidade. Era como se tivesse várias personalidades, e isso, só pelo seu olhar e seu sorriso. Ao chegarem em casa, foi até a senhora Parker e a agradeceu por cuidar de Aaron.
- Ai, meu Deus! – exclamou, observando Aaron no colo de , que se assustou com o grito dela. – Que coisa mais gostosa!
- Puxou ao pai. – disse fazendo pose, e riu, indo até ele e pegando o pequeno no colo. – E a mãe. – apontou para o retrato de . De sua .
- Ela era linda, . – a garota disse, sorrindo verdadeiramente. – Você tem bom gosto. – o olhou e observou que ele a fitava. suspirou, sentando-se no sofá. – Eu sou meio inconsequente mesmo. – ela disse de repente e ele ficou confuso, olhando-a. – Isso... Eu mal te conheço e já venho na sua casa. Mas é o meu jeito, sabe? Eu não tinha nada pra fazer, ia ficar no meu apartamento mofando, então, nada melhor do que visitar novos lugares, né?
- Mas sabe que isso é perigoso, não é? – ela assentiu, mordendo o lábio inferior e olhando para Aaron, que não parava de mexer os pezinhos e as mãozinhas. – Mas, ahn, quer comer algo?
- Não, não, obrigada! Aliás, eu acho que já vou embora... – se levantou.
- Por quê? Se foi pelo que eu falei agora a pouco...
- Não, relaxa ! – sorriu fraco. – Mas você tem as suas coisas pra fazer, não posso ficar aqui empacando.
- E quem foi que te disse que você tá empacando alguma coisa? – cruzou os braços. – Pelo contrário, há muito tempo eu não ria assim... – ela sorriu. – Há muito, mas muito tempo mesmo eu não me sentia desse jeito.
- E olha que você só me conhece há umas duas horas! – disse convencida. – Imagina passar o dia inteirinho comigo? Você se apaixona! – ele sorriu fraco, encarando o chão. Ela arregalou os olhos na hora, se dando conta da burrada que tinha falado. – Ai, eu sou uma burra mesmo. Me desculpa? Sério, eu não falei por mal...
- Eu sei que não. Fica de boa! – suspirou, indo até ela e sentando-se à sua frente.
- Seu filho é a coisa mais linda do mundo. É Aaron, né? – assentiu, sorrindo. – Ei, príncipe! Você é lindo, sabia? É sim! – brincou com os pezinhos dele, que deu um breve sorriso. – Ai, Deus, ele sorriu!
- O quê?! – arregalou os olhos, correndo até ela. – Ele nunca sorriu! – disse, vendo o pequeno sorriso delineado dos lábios do filho. se ajoelhou ao lado de e brincou com as mãozinhas dele, e, quando menos viu, estava observando-a. Ela percebeu e sorriu tímida, sentindo as bochechas queimarem. Ele pigarreou e se afastou. – Incrível.
- Ele ter sorrido? – assentiu. – Eu tenho jeito com as crianças! – disse, dando os ombros, fazendo pose. Eles riram. – Argh, meu celular... – estendeu os braços para que ele pegasse o filho e ela atendeu o aparelho – Oi pai! Ahn, na casa de um amigo... Tá, tá. O que eu não faço pelo senhor, hein? – riu. – Beijo, amo você! – desligou. – Ei, , tenho que ir...
- Claro, sem problemas. – deu os ombros. – Nos vemos em breve?
- Sem dúvidas. – piscou, indo até ele e lhe dando um beijo na bochecha. – Tchau, neném! – deu um beijinho na testa do pequeno Aaron e caminhou até a porta. – Vou deixar um cartão com meu telefone aqui, ok? – assentiu, sorrindo. – Tchau, gente! – abriu a porta e saiu mandando beijos.
Quando ela saiu, ficou encarando a porta com um sorriso bobo no rosto, o cheiro dela permanecia ali... Aquilo era tão surreal. Tinha acabado de conhecê-la, e já estava tão... Tão surpreso. Ele olhou para Aaron e sorriu.
- O que foi isso, filho? – riu, levando-o ao berço. – Gostou dela, né, garotão? – foi até a cozinha e fez um café rápido, enquanto conversava com o filho sobre .
Quando fez o café, deu a volta no balcão e voltou à sala, vendo o retrato de , sim, a antiga , a sua eterna .
- Isso só pode ser coisa tua, né? – riu, negando com a cabeça. – Será que ela não era um anjo, não? Não foi você que mandou ela daí pra me fazer um pouco feliz, né? – fez uma pausa, percebendo o que estava fazendo. – Tá, eu to enlouquecendo. – riu, caminhando até a mesa onde ela deixara o cartão. – Onde já se viu falar com uma foto? – sorriu, pegando o bilhete e lendo-o:

– 222 43691234”

- ?! – gritou, e a xícara que estava em sua mão foi parar no chão, despedaçada.


Capítulo VII


não podia acreditar no que acabara de ler. Era óbvio que havia muitas pessoas em NY que tinham esse sobrenome, mas seria coincidência demais. Ele olhou para o filho, que já dormia no berço, e pegou o telefone, discando aquele número.
- Alô? – a garota falou do outro lado da linha, e respirou fundo.
- Ei, ... É o . Tudo bom?
- Ei, ! Eu to bem, e você? Esqueci algo aí...? – perguntou receosa e ele riu fraco.
- Bem também, e não, não esqueceu nada. Eu só queria saber se nós poderíamos sair amanhã, sei lá...
- Amanhã? Hm... Deixa-me consultar minha agenda, espera aí. – brincou, rindo logo depois. Ele riu também. – Posso sim, ! Aonde iremos?
- Você escolhe.
- Hm... – fez uma pausa. – O que acha daquele restaurante da rua 38?
- Por mim está ótimo. Nos encontramos lá às 19h?
- Certo! – riu. – Até lá, . Beijos! Dá um beijo bem gostoso no Aaron.
- Pode deixar. – sorriu. – Até amanhã.

desligou o celular e olhou para o visor, encarando o aparelho. Amanhã enfim saberia se era parente de , ou apenas alguma coincidência de sobrenomes. A essa altura, não sabia mais o que queria. Se ela realmente fosse alguma parente, seria sua vingança perfeita. Matar um ente querido de seu pior inimigo seria bastante satisfatório. Mas, o que não deixava ficar cem por cento feliz, era o fato de ser tão amável, tão... Incrível. Como alguém tão terrível poderia ter alguém tão doce em sua convivência? Ok, talvez isso só fosse pura coincidência. É. Aquilo não passava de coincidência. Pelo menos era no que ele – no momento – queria acreditar.
As horas correram e, quando se deu conta, o ponteiro do relógio já marcava 18h30. Quando estava prestes a sair, a campainha tocou e ele correu até a porta. Provavelmente seria um daqueles caras chatos fazendo propaganda de cartão de crédito ou pesquisas para faculdades. Teria de dispensá-los logo, ou perderia a hora. Mas, diferente de tudo que pensou, quando abriu a porta quase caiu para trás. Ele franziu o cenho, analisando a mulher – que aparentava ter uns quarenta anos – que estava na porta. Ela tinha os cabelos claros, na altura do ombro, uma pele invejável e as roupas esbanjavam delicadeza, com certeza aquele casaco valeria mais do que a vida de . Depois de alguns segundos analisando-a mais, pôde chegar à conclusão de quem era, realmente, não queria ser taxado de louco por si mesmo. Mas era ela.

- Brittany? – perguntou, com os olhos arregalados.
- , não é? – a mulher perguntou, com um sorriso tímido nos lábios. Ele assentiu, ainda perplexo. – Eu... Posso entrar? Está um pouco frio aqui fora.
- Pode, pode, sim. – abriu espaço e ela passou, olhando tudo em volta. – Como você encontrou essa casa?
- Sou uma mulher influente, . – sentou-se no sofá. Um choro de bebê deu as caras e ela se levantou depressa. correu até o quarto e quando voltou, trouxe Aaron nos braços. – Esse é o meu neto? – perguntou receosa, olhando o pequeno.
- Não. Esse é meu filho e de . – a mulher rolou os olhos, sentando-se novamente. – E você sabe muito bem que ela nunca te considerou uma mãe.
- Eu era uma garota quando engravidei de Henry e, logo depois, dela. Eu precisava viver! – riu sarcástico, colocando Aaron no carrinho e sentando-se no sofá.
- Pensasse nisso antes de colocar duas crianças no mundo. Esse filho não era nem de longe algo que eu e queríamos, havia muita coisa envolvida. Mas ele está aqui agora, não está? E, olha, eu vou te confessar uma coisa, o vendo crescer agora... Tudo valeu a pena. – sua voz falhou e ele pigarreou. – Eu sei que ela não está mais aqui, mas sei o que ela pensava em relação a esse filho. Ele seria a coisa mais importante de sua vida, não importava a circunstância que ela vivia. – a mulher respirou fundo, desviando o olhar.
- Eu sei disso. Sei que nunca fui uma mãe presente, sei que fui uma péssima mãe.
- Você não pode nem se considerar uma mãe, Brittany, por favor.
- Você acha que não dói saber que seus dois únicos filhos morreram?! – disparou, olhando-o. Sua voz estava embargada. riu, sarcástico.
- Agora você se preocupa? Sinto muito. É tarde demais! – deu os ombros, se levantando. – Se você não se importa, eu tenho um compromisso...
- Eu não vou demorar mais, só quero saber de algumas coisas, por favor, garoto! – ele fechou os olhos, respirando fundo. – Há alguns anos eu me casei com um multimilionário... – negou com a cabeça, rindo. A mulher ignorou e continuou: - Sei que não fui presente para os meus filhos e nunca tive condições financeiras para dar tudo o que eles queriam...
- Eles só queriam um pouco de atenção, isso eu posso te afirmar que é de graça!
- Estou falando de coisas materiais. – suspirou, levantando-se. – Eu queria ajudar você e o meu neto... Sei que está sem emprego no momento, e não vejo outra maneira para me redimir, pelo menos um pouco, da minha culpa.
- Você realmente acha que eu vou aceitar seu dinheiro?
- Não precisa ser pra você. Mas para o meu neto... – disse e se aproximou da criança. – Quero que ele tenha todos os brinquedos que queira, a melhor educação possível...
- Ele terá tudo isso, não se preocupe.
- Pare de ser egoísta, garoto! – disse num tom mais alto, virando-se para . – É para seu filho, sei que está precisando agora. Vai deixar seu filho passar necessidades por um orgulho desnecessário? – fechou os olhos por alguns segundos, tentando pensar. Por fim, negou com a cabeça. – Obrigada. – suspirou, indo até a mesinha de centro para fazer um cheque, mas, ao chegar lá, encontrou uma foto de . – Ela era uma mulher linda... – disse sorrindo, segurando o porta-retratos.
- Por dentro e por fora. – complementou, olhando a senhora.
- Henry está cuidando dela. – sorriu fraco, colocando o retrato onde estava e pegando o talão de cheques.
- Como sempre fez. – disse, colocando as mãos nos bolsos. A mulher novamente ignorou o comentário e assinou o cheque.
- Eu posso voltar para vê-lo? – perguntou, apontando para o neto.
- Pode. – respondeu, respirando fundo. – Desde que não o abandone também.
- Eu não vou. – sorriu fraco, indo até a porta. – Se cuide, . – Ele assentiu, abrindo a porta para a mulher, que saiu acenando.
caminhou até a mesinha de centro e pegou o retrato de , seus olhos encheram-se de lágrima assim que se lembrou de uma conversa que tiveram há sete anos, na escola.

- Minha mãe é um saco. – disse, sentado no gramado verde do Yorkers High School.
- Eu queria que minha mãe me amasse. – disparou, com a voz embargada. Ele a olhou e se aproximou, abraçando-a de lado. – É tão estranho, sabe? Ver como as mães das garotas do colégio saem com elas, riem com elas... – respirou fundo, deixando uma lágrima cair. – Eu vejo a minha de vez em nunca. – deu os ombros, tentando controlar o choro. – O que eu faço de errado, ?
- Você não faz nada, ... Não diz isso, por favor. – Afagou seus cabelos. – Ela te ama do jeito dela, mas ama.
- Queria que isso fosse verdade. – fungou, levantando-se. – Mas não importa mais. – deu os ombros. – Eu devo estar de TPM, to muito boiola. – riu, enxugando as lágrimas. continuou sentado, observando o quão forte aquela garota poderia ser. A invejava.


Ainda distraído com seus pensamentos, somente despertou quando olhou para o relógio e viu as horas. 19h22.
- Merda! – depositou o retrato com cuidado na cômoda e pegou o celular no bolso, discando depressa os números de . – Alô?!
- Ei.
- ? É o ! Desculpe-me, eu me atrasei e...
- Eu percebi. – ela o interrompeu, rindo sem humor.
- Você ainda tá no restaurante?
- Não. Eu to indo pra casa, já.
- Posso ir para aí? – perguntou receoso, soltando uma risadinha nervosa logo depois. Ela riu fraco.
- Pode... Anota o endereço.

Cerca de trinta minutos depois, já estava no elevador em direção à casa de . Estava nervoso, não podia negar. Tudo estava acontecendo tão rápido. Ao descer do elevador, logo bateu na porta de , que a abriu prontamente. Eles se encararam por alguns segundos e sorriram. Ok, tudo estava acontecendo rápido até demais.
- Ahn, entra... – sorriu, dando passagem para ele.
- Seu apartamento é lindo. – disse, com as mãos nos bolsos.
- É arrumadinho. – riu, indo até o sofá e fazendo menção para que ele se sentasse também. – Meu pai sempre me diz que aqui é muito pequeno e blábláblá. – rolou os olhos, rindo. – Mas já disse pra ele, não quero dinheiro de ninguém. Quero construir cada pedacinho daqui por mérito meu, sabe?
- Sei, sim. – sorriu. - Então, me desculpa não ter ido no rest...
- Ei, não precisa me explicar nada. – sorriu, levantando-se. – Vou arrumar a mesa, tá? Fica à vontade.
- Quer ajuda?
- Não precisa. – sorriu agradecida, indo em direção à cozinha. se levantou e começou a caminhar pelo apartamento, observou cada detalhe dele. Ao olhar para o móvel que carregava a TV, sentiu algo prender a sua atenção. Um porta-retratos. Ao pegá-lo nas mãos arregalou os olhos e engoliu seco, sentindo seu corpo todo se arrepiar.
- É o meu pai! – exclamou, chegando de surpresa. quase derrubou o porta-retratos com o susto que tomou, se virou depressa, com os olhos arregalados. – Um amor ele, né?
- Sr. ... – sussurrou, observando a foto.
- Oi? Você o conhece?! – perguntou, confusa.
- Claro que não. – sorriu, olhando-a. – Mas seu sobrenome estava naquele cartão que você deixou seu telefone... Aí supus que o sobrenome dele fosse , acertei?
- Espertinho! – riu, pegando o retrato e colocando-o de volta na estante. – É uma pena que eu quase não o veja... – franziu o cenho, confuso. – Ele trabalha com comércio exterior... Viaja demais. – suspirou. quis rir, mas ficou quieto, somente assentindo. – Mas chega de falar do meu pai, né? Vamos comer! – comemorou, rindo logo depois e indo até a cozinha.
- Te peguei, chefe. sussurrou, com um sorriso malicioso no rosto, olhando para o retrato.
- Anda, ! – ela gritou da cozinha e ele despertou, correndo até lá.
Tudo já estava planejado na cabeça de . Iria se aproximar de , e logo depois, matá-la. Sim, matá-la. Aquela ideia parecia bem melhor do que uma simples e rápida morte para seu pior inimigo. Como ele lhe disse há um mês, não existe dor maior do que ver a pessoa que você mais ama no mundo morrer, e o pior, continuar vivo e sentir a dor da perda.
Há sete anos vive um personagem, por que não poderia vivê-lo novamente? Seria frio, sem sentimentos. Não tinha razões para arrependimentos, de um jeito ou de outro iria para o inferno; por que não comprar sua passagem com antecedência?

Um mês havia se passado desde então, desistira de procurar qualquer emprego, seria perca de tempo. Decidiu usar parte da quantia que Brittany lhe deixara no cheque – que, por sinal, seria capaz de sustentar Aaron e ele com ótima comodidade por pelo menos um ano. Os encontros que mantinha com eram cada vez mais frequentes, e por certas vezes temia o quão próximo estava dela. Mas então se lembrava de sua eterna e toda a frieza voltava ao seu coração.
Hoje, eles estavam num piquenique no Central Parque, Aaron fazia companhia para o futuro casal.

- O dia tá lindo hoje, né? – disse, assentiu, olhando-a. – Odeio frio... Sei lá, é tão depressivo. Sol me deixa animada, feliz, com vontade de viver. – riu. – Você não pensa assim?
- Não... – ele disse, suspirando logo depois. – Gosto de ficar em casa assistindo a um bom filme enquanto chove.
- Credo, ! – exclamou, rindo. – Você é muito sombrio. – pegou Aaron no colo. – Né, meu amor?! – sorriu, brincando com o bebê. – Tem que gostar de sol, gostar de felicidade! – o bebê sorriu. Por um segundo, os observou e respirou fundo. Teria de fazer aquilo o mais cedo possível, sabia que sua barreira de gelo estava derretendo a cada palavra daquela garota. – Você tá quieto hoje... Aconteceu alguma coisa?
- Não aconteceu nada. – sorriu fraco, desviando o olhar. – E aquela viagem que você disse que faria?
- Cancelei. Só ia me dar prejuízo. – deu os ombros. arrumou Aaron na toalha que estava sobre a grama e brincou com as pernas dele, fazendo-o sorrir. – Lindão da tia ! – riu, beijando sua barriga. – Gostoso!
- Você vai ser uma ótima mãe. – disse, sorrindo verdadeiramente. Ela o olhou, rindo.
No mesmo minuto, negou com a cabeça. Afinal, o que estava fazendo? Ela não seria uma ótima mãe, ela não teria um filho. Ele não deixaria que isso acontecesse... Ele não deixaria que ela tivesse uma vida.
- Falando em família... Quando é que você vai me deixar te levar pra conhecer a minha? – ela falou, interrompendo os pensamentos de , que arregalou os olhos.
- Já disse que ainda é muito cedo pra isso, .
- Blá blá blá. – rolou os olhos. – Meu pai é engraçado, aposto que você vai se divertir com ele!
- Aposto que iria. - Sorriu misterioso e ela franziu o cenho. – Ele deve ser um bom homem.
- Um homem normal. – deu os ombros, suspirando. – Eu o amo muito. É um pai incrível... Sou muito sortuda de tê-lo comigo. – sorriu sincera, pegando Aaron no colo. – Assim como Aaron será sortudo em ter você como pai. Vai ser tão incrível quanto o meu!
ia responder, mas parou por um segundo, olhando para o filho. Realmente, ele seria como ; um assassino. Um homem sem escrúpulos, que têm um cubo de gelo como coração e que ao menos tinha coragem de assumir que estava fazendo a coisa errada.
- Não me olha assim... – ela riu, colocando tudo dentro do cesto novamente. – Você anda muito estranho, senhor .

(Dêem play: Daughtry - Breakdown)

- Você gosta de mim, ? – perguntou, direto. Ela arregalou os olhos, surpresa, mas logo desviou o olhar, rindo sem graça. – Hein?
- Que tipo de pergunta é essa? – sorriu tímida, se levantando. Ele a acompanhou.
- Uma pergunta que eu quero que seja respondida. Preciso que seja.
- Jura que quer a resposta de uma pergunta? – Brincou, irônica, mas ele continuou com o semblante sério, encarando-a. – Ah, sei lá, ... Você é muito especial. – começou a andar, segurando Aaron nos braços. – Tem um lindo filho e é um ótimo amigo. – a puxou pelo braço, fazendo-a encará-lo, num susto.
- Amigo?
- Você tá assustando o seu filho. – Soltou-se, andando depressa até onde o carro estava. correu até ela, segurando a cesta do piquenique, meio desajeitado. Ela abriu a porta de trás do veículo e colocou Aaron em sua cadeirinha.
- Não fuja de mim. – disse, puxando-a novamente pelo braço, fazendo-a encará-lo. Ela o olhou nos olhos, assustada.
- Você está me assustando. – puxou seu braço, massageando-o. – O que deu em você?!
- É só uma pergunta. – deu os ombros, cruzando os braços. – Nós não temos mais quatorze anos para ficarmos fugindo um do outro ou pedindo para os nossos amigos nos perguntarem se queremos ficar um com o outro ou não. Nós somos adultos, .
- Até dez minutos atrás, sim, eu gostava de você. Mas depois disso, eu não sei mais de nada. – riu sarcástica, cruzando os braços.
- Não faz isso, ... – disse baixo, colocando uma das mãos em cima, no carro, prendendo a passagem dela. Ele se aproximou mais, suas respirações já eram quase que as mesmas. Ela respirou pesadamente, olhando-o nos olhos.
- Fazer o quê? – sussurrou.
- Gostar de mim... – sussurrou também, encostando os lábios nos dela. Ela fechou os olhos. – Eu não sou o cara que você sempre quis...
- Como você sabe que não? – ela abriu os olhos, observando aquele par de olhos que tanto a hipnotizavam.
- ... – ele sorriu fraco, irônico. – Você sempre desejou um príncipe... E eu sou o vilão.
- E quem disse que eu sou a princesa?
- É só olhar pra você. – sorriu debochado, dando um beijo no canto dos lábios de .
- Você nunca ouviu falar de a Bela e a Fera? – ele negou, roçando seus lábios nos dela novamente. – O vilão se transforma em príncipe e logo depois transforma a mocinha em princesa.
- Você ainda acredita em conto de fadas?
- Eu acredito em mim e em você, . – ele sorriu fraco, passando a mão nos cabelos dela. – Agora deixa de historinha e me beija logo.

entrelaçou os dedos nos cabelos dele e o puxou para um beijo, um beijo tão intenso como jamais um dos dois havia sentido em toda a vida. levou as mãos para a cintura dela e a apertou com força, precisava daquela mulher. Seus lábios tinham o encaixe perfeito, suas línguas tinham movimentos totalmente sincronizados, como num balé do teatro municipal. sentia como se toda a sua vida tivesse sido à procura de uma razão e finalmente havia encontrado essa razão. Era .
Ela desceu a mão que estava no cabelo de e a levou para a nuca, acariciando-a. A sensação que tinha era de que finalmente havia encontrado alguém para si. Alguém que se encaixava em sua vida maluca. Não era um príncipe num cavalo branco, não era um cavalheiro, não era o cara certo. E era isso que a atraía, ele não era o certo. Era o errado, assim como ela.
Quando o ar foi ficando escasso, eles se separaram com selinhos. o abraçou com força e ele respirou fundo, tentando pensar na merda que estava fazendo, mas, no final acabou retribuindo o abraço, que só teve fim ao ouvirem o choro de Aaron. Eles se olharam e riram.
- Que foi, filho? – perguntou, abaixando a cabeça e olhando para Aaron, que chorava mexendo os bracinhos. – Já vamos para casa, ok? – Sorriu, dando um beijo rápido na cabeça da criança. – Vamos? – perguntou, olhando para , que assentiu, sorrindo sem graça. Ele foi até o banco do motorista e guiou-os para a casa de , que deu um selinho nele antes de descer do carro. Ele respirou fundo antes de seguir novamente e olhou para o filho, que dormia. – Parabéns, , parabéns. – disse irônico, ligando o carro novamente e seguindo para casa.
Ao chegar em casa, ele pegou o filho com cuidado e o levou até o berço, deixando-o lá, ele foi para a sala e deu um soco com força na parede. Odiava-se.
- Trouxa! – gritou, com a cabeça ainda encostada na parede. – O que merda eu to fazendo?! – Passou as mãos nos olhos marejados. – Fraco! Fraco! – Disse para si mesmo, sentando-se no chão, com os braços encostados nas pernas e as mãos na cabeça, bagunçando seu cabelo.
Ele estava perdido. Completamente perdido. Como poderia estar se apaixonando tanto por ? Ele a conhecia há um mês, só um mês... Sendo que com quase dez anos de convívio com sua eterna ele nunca chegou a sentir metade do que sentia pela filha de seu pior inimigo. Aquela era a última garota pela qual ele poderia sentir algo a não ser repugnância. Tinha que se vingar de quem lhe tirou sua melhor amiga, sua companheira. Mas como poderia matar a pessoa que o fazia tão feliz? Como poderia matar a garota mais incrível que já conhecera em toda a vida? Agora já era tarde demais. Tarde demais para matá-la, tarde demais para se afastar... Tarde demais para contar toda a verdade.
Como sempre, fizera tudo errado. Como pensou que se aproximar dela seria a melhor saída? Teria que ter a matado no mesmo dia em que soube de quem era filha. Não teria mágoas, arrependimentos... Tudo seria tão mais fácil. Mas havia se enganado. De novo.
Ele pegou um maço de cigarros que estava nos bolsos e acendeu um deles, tragando o máximo de nicotina que cabia em seus pulmões e soltando toda aquela fumaça logo depois. Ele fechou os olhos, tentando imaginar algum plano ou qualquer coisa que o tirasse daquela situação. Que fosse sua salvação.
A luz da sala piscou duas ou três vezes e se levantou, franzindo o cenho.

- Que merda é essa? – perguntou, vendo a luz piscar mais duas vezes. Ele ouviu um barulho alto e se assustou, quando olhou para o lado viu que o retrato de havia caído e se assustou ainda mais. Seu corpo se arrepiou por inteiro. – O que é isso? – perguntou, olhando para todos os lados. – Eu hein. – deu os ombros, pegando o retrato de , mas assim que se abaixou para pegá-lo, o derrubou novamente ao ver uma mulher em sua frente. A imagem estava distorcida, mas a reconheceu na hora. Suas mãos gelaram e ele sentiu até seu último fio de cabelo se arrepiar. – ?!


Capítulo VIII


Música do capítulo.

continuava ali, extasiado com o que via. Não conseguia mexer um só centímetro do corpo. estava ali, parada em sua frente... Com a feição séria, brava, como sempre era. Ela usava uma espécie de vestido branco e tinha o cabelo perfeitamente penteado, estava incrivelmente linda.
A única coisa que podia sentir era uma grossa lágrima rolar pelo seu rosto, enquanto observava-a. Não se lembrara de ter bebido sequer uma gota de álcool hoje. Sabia que não estava dormindo... Aquilo tudo era real demais para ser apenas um sonho. Ou pesadelo.

- Bu! – disse, e pulou para trás, chacoalhando a cabeça. Ela riu, olhando-o.
- É um sonho, isso é só um sonho... – repetiu para si como um mantra, com os olhos fechados.
- Se o “sonho” for eu, pode ter certeza que não é, bobão. – disse, sorrindo. Ele abriu os olhos e finalmente a encarou. Seus olhos encheram-se de lágrima e suas mãos tremeram. – Eu senti tanto a sua falta.
- É você mesma, ? – ele perguntou receoso, aproximando-se um pouco da figura dela. Ela assentiu, sorrindo. – O que aconteceu? Eu... morri também?
- Não! Também perguntei isso quando vi o Henry, e adivinha só? A resposta foi positiva. – suspirou, sorrindo fraco. Ele a encarou mais, tentando observá-la. – Pode parar, , parece que nunca me viu. Eu continuo a mesma... Só que sem um corpo físico, entende? – ele negou. – É, imaginei. – rolou os olhos, rindo. – Enfim, o que raios você pensa que está fazendo com aquela garota? Aliás, ela tem um nome lindo! – riu, brincalhona.
- Você virou uma fantasminha muito engraçadinha. – sorriu irônico e ela gargalhou. – E... Você conhece a ?
- Muito obrigada, mas não sou fantasma. – se aproximou dele e ele deu outro passo pra trás. – Medroso. – rolou os olhos. – E é claro que conheço! Ou você acha que eu não vou querer te observar pra ver se você está cuidando bem do meu filho? – brincou, cruzando os braços.
- Nosso filho é lindo, não é? – Ele disse e ela sorriu verdadeiramente, assentindo. – Por que você me deixou, ? – perguntou, com a voz embargada.
- Era a minha hora, ... – suspirou, olhando para seu retrato. – E eu não quero que você me vingue.
- O quê?! – ele riu debochado, secando as lágrimas que teimavam em cair. – Não me peça o impossível, . Aquele otário do vai pagar pelo que fez, custe o que custar. Ele te tirou de mim!
- Não foi ele! – ela disse alto. – Era a minha hora, ninguém poderia impedir isso!
- Como você diz isso assim?! Você era a pessoa mais importante da minha vida, mulher! – ela sorriu, emocionada.
- E você era a da minha.
- Viu?! Eu tenho que acabar com a vida desse cara!
- Não tem, não! , por favor... Você está apaixonado por essa garota. Como você quer matá-la? É a primeira vez que sente isso! Matá-la por um capricho qualquer? Por uma vingança? O que você vai conseguir com isso?! Eu vou viver novamente? Não, eu não vou.
- Você ganhou algo matando o seu pai? – disparou e ela deu um passo para trás, surpresa pela facilidade que ele falou aquilo.
- Eu não ganhei nada. Pelo contrário... E uma coisa não tem nada a ver com a outra! Você está apaixonado por essa garota. Eu odiava meu pai.
- Eu odeio o .
- Ele vai ter uma punição, ! Mas não deixe que o dono dessa punição seja você. Não cometa o mesmo erro que eu cometi. Do que adiantou todo aquele ódio, aquela sede de vingança? Olha só no que deu! – ela apontou para si mesma. – Eu não quero que o seu fim seja como o meu foi, ...
- Como foi? – perguntou preocupado.
- Cheio de amargura... Raiva de mim mesma. Arrependimento... Você não vê que a vida está te dando uma nova chance de ser feliz? Ela é a garota que você merece, ! É a sua garota. Ela é a personagem principal do livro da sua vida.
- Você era...
- Não. Eu não era. – ela sorriu. – Eu era a sua melhor amiga, ... A sua companheira. O que nós tínhamos era só carnal. Nós nunca nos amamos como homem e mulher... Nós nunca fomos o “amor” um do outro. – ele a olhou e sorriu fraco. – Eu realmente queria ter tido a chance de me apaixonar como você está se apaixonando. Não estraga essa chance, ... Deixe-me descansar em paz. – ele franziu o cenho, confuso. – Ou você acha que colocando uma frase “Descanse em paz” na minha lápide vai me fazer descansar? – ela cruzou os braços e ele riu, fitando o chão. – Então... Seja feliz! Faça-me feliz. Faça o nosso Aaron feliz.
- Você volta? – perguntou, ignorando todo o texto que ela lhe falara antes.
- Talvez... Talvez eu seja uma fantasminha camarada. – brincou, sorrindo. – Você escolhe se me verá de novo. – ele a olhou confuso. – Cuida do nosso filho. Se cuida. Eu amo você.
E em dois segundos, a figura de havia desaparecido. olhou para os lados e não a encontrou.
- ?! ?! – disse alto, com a voz embargada. – Merda! – levou as mãos para os cabelos, bagunçando-os. – Eu também amo você. – disse, olhando para o retrato. – E sinto a sua falta mais do que qualquer coisa. – desabafou, secando a lágrima solitária que rolou por seu rosto.

A noite fora longa para ; quando o desejado sono chegara, Aaron caía no choro de todas as madrugadas. Enquanto colocava o filho para dormir, pensava em como poderia sair daquele abismo que a vida havia lhe imposto. Que ele havia imposto.
Sem saídas, acabou indo até seu celular e enviou uma mensagem à . Sim, às 03h07 da madrugada.

"Quero te encontrar amanhã. Vamos jantar naquele restaurante da rua 46?”

dormia tranquilamente quando ouviu seu celular apitar constantemente em sua cômoda. Ela se revirou, preguiçosa, e pegou o aparelho, digitando a senha e logo depois, lendo a mensagem. Ela sorriu involuntariamente. Sentou-se na cama e bocejou, ainda com o sorriso bobos nos lábios. Depois de alguns segundos pensando no que falaria, resolveu responder.

“Isso são horas de me mandar uma mensagem, ?! Sei que as garotas normais costumam gostar disso, de receber coisas assim no meio da noite, mas eu prefiro mil vezes continuar sonhando com o Brad Pitt. Tá, Brad Pitt não, mas nada como Leonardo DiCaprio em Titanic... hahaha. Ok, isso está parecendo mais uma carta do que uma mensagem. Enfim, vamos, sim! Você passa aqui? Beijos!”

Digitou tudo e enviou. Mas, quando se deu conta do quanto parecia uma tagarela dizendo tudo aquilo, tentou de todas as formas cancelar a mensagem. Foi inútil.
- Não sei por que colocam esse botão de cancelar nos celulares se eles não funcionam pra merda nenhuma! – disse, jogando o celular de qualquer jeito na cômoda. – Ele vai me achar uma chata que não para de falar e que está super entusiasmada com esse encontro. – rolou os olhos, jogando o corpo sobre a cama. – Eu deveria ter lido aquelas revistas adolescentes com dicas de como conquistar um garoto... – ela disse e na mesma hora caiu na gargalhada. Como estava parecendo idiota. Não sabia ao menos lidar com uma situação daquelas. parecia tão maduro, tão... Adulto. E ela? Uma pré-adolescente com um amor platônico. A diferença de idades não era tão grande, mas quando se tratava de personalidades: eram completamente diferentes. nunca havia se apaixonado em toda a sua vida. Claro, já havia gostado de muitos garotos, já havia até namorado uma vez. Mas nunca se sentira assim, tão viva, tão apaixonada. Tão dependente.
, assim que leu a mensagem, não conseguiu segurar a risada. Sentia-se um bobo apaixonado, e talvez fosse isso o que, de fato, era. Mas não assumiria essa paixão nunca. Nem quando fosse ver o tumulo de , depois que completasse seu plano. Maldito plano. Sua feição se tornou séria na hora em que se lembrou daquilo. Como uma mulher tão doce quanto aquela poderia ser filha de um monstro como ? Ela era incrível. Por vezes, questionava se o mesmo sangue que correra no corpo do inimigo, realmente era o dela. Talvez a mãe de tivesse dado uma pulada de cerca... Mas não, tinha que admitir que alguns traços dela lembravam . Por fim, decidiu responder a mensagem, não queria deixa-la acordada, esperando a resposta.

“Realmente, para digitar uma mensagem desse tamanho você não parecia estar com um pingo de sono... Leonardo DiCaprio? Sou muito mais eu. Pelo menos não fico igual a um bichinha tremendo depois do sexo. Ha!
E sim, passo aí amanhã. Às 18h00 está bom?”


recebeu a mensagem e ao mesmo tempo em que se sentiu envergonhada com a primeira parte da frase, sentiu-se excitada com a outra. Aquele homem expirava testosterona! Nunca havia – de fato – pensado em como seria transar com ele, mas, em plena 03h30 da madrugada, era impossível não pensar nessa possibilidade. Sem mais delongas, resolveu responder à provocação.

“Que eu saiba, é o personagem dele que fica assim depois do sexo, não ele... Enfim, como é que você fica então, ? E às 18h00 está ótimo!”

Ao receber a resposta, mordeu o lábio. Não poderia nem brincar com aquilo, havia meses que não tocava numa mulher, estava a ponto de bala. Sua melhor amiga há tempos era apenas sua mão. Envergonhava-se disso, mas era a verdade. E pensar na possibilidade de ter consigo era mais do que agradável. Seria rápido e direito na resposta:

“Não prefere que eu te mostre?”

, assim que leu a mensagem, foi até a cozinha tomar um copo de água. O tempo estava fresco, mas seu corpo pegava fogo. Não sabia o que responder, queria que ele lhe mostrasse aquilo o quanto antes, mas sabia que morreria de vergonha ao encará-lo depois disso. Respirou fundo e digitou:

“Talvez... É uma pena estar tão tarde para sair de casa, não é mesmo?”

leu aquilo e sorriu, seria sim capaz de sair àquela hora para encontrá-la, mas com quem ficaria Aaron? Teria que controlar seus instintos masculinos – que agora estavam mais aparentes do que nunca.

“Posso te ligar?”

Foi o que ele perguntou. No começo, ficou confusa e apenas respondeu: “Sim!”. tomou coragem e ligou para a garota, que atendeu logo.
- Ei, , seu safado! – ela disse, se arrependendo logo depois. Ele riu.
- Eu? Você que pergunta como eu fico depois do sexo, ué... – ela mordeu o lábio, sorrindo nervosa. – Queria estar com você agora. – confessou.
- E por que não está?
- Aaron...
- ? – ela sussurrou e ele murmurou um “sim?” – Sei que não tem nada a ver com o assunto, mas... Eu estou realmente gostando de você. – confessou, e sentiu todo um peso sair de suas costas. engoliu seco, sabia que aquilo era errado, apesar de saber de aquele sentimento ser totalmente recíproco.
- Acho que não foi uma boa ideia ter te ligado...
- Muito obrigada pela palavra recíproca, ! – disse, fechando os olhos e apertando-os, sentia vontade de chorar.
- Desculpa. – suspirou. – Eu... Só não sinto a mesma coisa. – mentiu, sentando-se no sofá.
- Estranho... Porque não foi isso que eu senti naquele beijo.
- Não é hora para conversar sobre isso, .
- E quando é hora? Às 16h00 está bom para você, meu amor? – ironizou, já sentindo o sangue subir à cabeça. – Porque, olha, você foi o primeiro cara que eu tive coragem de assumir meus verdadeiros sentimentos em toda a minha vida. Aliás, você é o primeiro cara pelo qual eu sinto isso. – riu sarcástica, já com aquele maldito nó na garganta. – Faz só um mês que nos conhecemos e acontece isso, o que acha que eu devo fazer? Ignorar essa merda de sentimento? Eu sei que posso parecer uma garotinha mimada e extremamente infantil, mas meus sentimentos são sinceros, , isso não basta? – despejou tudo, respirando ofegante logo depois de falar tudo aquilo. continuava parado em seu sofá, apenas digerindo tudo o que acabara de ouvir.
- Não, , não basta. – disse somente e desligou o telefone. Ele fechou os olhos e levou as mãos à cabeça. Teria de fugir novamente, ou... Ou consumir o crime que havia planejado há um mês.
Na casa de , ela ainda segurava o telefone, incrédula com o que acabara de acontecer. Como ele poderia ter sido tão duro e frio dessa forma? Tudo bem, ele poderia não sentir o mesmo, mas, às vezes, palavras machucam muito mais do que ações. E a falta delas poderia ser ainda pior.
Cerca de trinta minutos depois, – que ainda estava acordada – ouviu a campainha de seu apartamento tocar e foi até ela, estranhando aquilo. Ao abrir a porta, tomou um susto ao ver ali, parado, segurando Aaron – que dormia calmamente em seus braços.
- Você sabe que horas são? – perguntou, séria.
- Hora de pedir desculpas. – disse firme, com um sorriso fraco nos lábios. Ela desviou o olhar, sabia que se olhasse muito mais tempo para aquele sorriso, iria desabar.
- Entra... – deu espaço na porta e esticou os braços para pegar Aaron. – Vou colocar ele no quarto de hóspedes, já volto. – usou seu tom mais frio de voz e saiu, segurando o pequeno nos braços. Assim que chegou ao quarto, ela o colocou no meio da cama e, por medo de que ele caísse, colocou um travesseiro de cada lado de seu corpo. Por fim, respirou fundo cinco vezes antes de voltar à sala. – E então? – disse, indo até o sofá onde ele estava sentado.
- Eu errei. – ela riu sarcástica e ele continuou. – Fui um grosso filho da puta e você não merecia aquilo. – Ela o olhou, séria. – Eu gosto muito de você, , mas ficarmos juntos é uma coisa que não está em meus planos agora. Nós nunca poderemos ficar juntos, entende?
- Não, , eu não entendo. Por que não? – o olhou nos olhos, cruzando os braços, incrédula.
- E isso é uma coisa que você também não pode saber. – sorriu fraco, suspirando. Ela bufou, virando o rosto.
- Se era só isso, você já pode ir.
- Posso? – ela assentiu. – Ir embora... – virou o rosto, encarando-o, confusa. – Da cidade, se possível do país.
- Do que você está falando?
- Eu arrumei uma proposta de emprego em outro país e... – mentiu, testando-a.
- Não. Você não pode ir embora. – disse direta, encarando-o. – Vamos voltar de onde paramos antes daquela ligação, pode ser? – sorriu timidamente, odiando-se no próximo segundo por ser tão fraca e vulnerável.
- Na conversa sobre sexo? – ela riu, negando com a cabeça. – Eu também gosto de você, . Mais do que deveria até. – disparou, fazendo-a arregalar os olhos. – Aliás, você não sabe como eu queria gostar menos de você.
- Por que, ? Foi algo que eu fiz?
- Foi algo que eu fiz. – sorriu fraco e ela o olhou, confusa. – Você pode esperar um tempo? Tudo em sua hora, por favor.
- Posso. – sorriu. – Quando se sentir pronto você me diz, ok? Só não demora muito. – ele assentiu, sorrindo e se aproximando. – E enquanto isso você quer ficar comigo, é isso? – ele riu, mordendo o lábio e assentindo. – Quer me usar, ? – perguntou e ele parou, fitando-a, confuso.
- Não...
- Brincadeira! – riu, interrompendo-o. – Pode me usar, eu gosto. – mordeu o lábio e o beijou.
riu no começo do beijo pelo comentário de , mas logo se concentrou no que fazia. Ela, um tanto mais ousada, subiu em seu colo. tentou manter a respiração normal – o que era difícil – e levou as mãos para suas pernas, apertando-as. Quando a respiração ficou escassa, levou os lábios para o pescoço dela, alternando mordidas e chupões. Enquanto isso, ela arranhava seus braços e mordia o lóbulo de sua orelha. Subindo um pouco o rumo das mãos, ele as levou para a blusa de , subindo-a devagar, enquanto se dedicava a massagear os seios dela, mesmo que por cima do sutiã. , vez ou outra, soltava um gemido baixo na orelha de , que estava a ponto de explodir com tanta excitação.
Porém, antes que fossem mais além com aquilo, ouviram um choro alto vindo do quarto. Eles pararam na hora o que faziam e se encararam.
- É o Aaron... – disse, rindo fraco.
- Ele vai parar de chorar logo... – sussurrou, voltando a beijar o pescoço dela.
- Shh, vai lá ver o que seu filho quer. – sorriu, saindo de seu colo.
- Tá de brincadeira, né? – disse óbvio, apontando para o volume alto em sua calça jeans.
- Nós vamos ter tempo pra resolver isso, hm? O mundo não vai acabar amanhã. – piscou, dando um selinho nele, que se levantou, mesmo sem vontade.
Ao chegar ao quarto, encontrou Aaron, que estava vermelho de tanto chorar e se arrependeu por ter hesitado tanto. Era seu filho, mulher nenhuma seria mais importante do que seu pequeno.
- Ei campeão, me perdoa? – sorriu, pegando o filho no colo e balançando-o levemente. – Juro que não vou mais fazer isso, pode ser? – riu, indo até a bolsa que havia trazido com as coisas do filho e pegando uma mamadeira, que estava morna. – Tá com fome, né? – colocou-a na boca do filho, que parou de chorar na hora. – Pois é, seu pai também estava. – maliciou e pôde ouvir a gargalhada de repreensão de , que estava na porta. – Que susto. – exclamou, olhando-a e rindo.
- Isso lá é coisa de se falar ao seu filho?! – riu, se aproximando dos dois. – Vou chamar o juizado de menores, hm? – brincou, dando um selinho em . – Eu amo tanto ele.
- Ama? – ele perguntou, encarando-a.
- Como se fosse meu filho. – sorriu, dando um beijo na testa do pequeno, que estava com os olhos fechados enquanto se alimentava. ficou calado, apenas observando-a. – Odeio quando fica assim. – resmungou, cruzando os braços.
- Você é linda. – confessou, usando a mesma feição séria de segundos atrás.
- E odeio quando você me deixa egocêntrica assim. – sorriu, sentindo suas bochechas corarem. – Ele dormiu. – apontou para Aaron, que tinha a respiração pesada. tirou a mamadeira na boca do filho e sorriu, encarando-o. – O deixe aí e vamos dormir, o que você acha? – ele ergueu a sobrancelha direita, num gesto malicioso. Ela riu, negando com a cabeça. – Dormir, ok? Não faltarão oportunidades para ficarmos juntos, . – piscou, com aquele sorriso que ele tanto amava. Aquele sorriso que ele jamais seria capaz de esquecer nem que se passassem mil anos. O sorriso da mulher que o fez olhar o mundo de outra forma. O sorriso da filha de seu pior inimigo.

Outro mês havia se passado desde então. Um mês cheio de descobertas para ambas as partes. Sentimentos que jamais um dos dois pensou existir estavam ali; em seus corações. sonhava com o dia em que firmasse qualquer que fosse um compromisso com ela. sonhava com o dia em que encontraria a solução certa para seu destino.
Eram só dois meses de convivência, porém, dois intensos meses. Mais intensos do que a vida inteira de ambos. Mas, apesar das longas noites que passavam juntos, ainda não haviam chegado aos finalmente. Quando Aaron finalmente lhes dava sossego, a consciência de o impedia de continuar qualquer coisa. Queria esclarecer seus pensamentos antes de tudo. Sabia que era diferente, sabia que se fizesse qualquer coisa, se arrependeria amargamente no futuro.

(Play na música!)

- Sabe o que eu queria? – disse, enquanto estava com a cabeça encostada no ombro de . Eles passavam um final de semana na praia.
- Não. O que você queria? – perguntou num tom brincalhão e ela riu baixo, entrelaçando as mãos nas da dele.
- Me casar. – disse direta e arregalou os olhos, fazendo-a gargalhar.
- Casar?!
- É. Mas fica calmo! – rindo. – Só daqui uns anos... Não é algo que eu queira pra agora, entende? Eu sou nova, tenho muito ainda o que aproveitar.
- Eu nunca quis me casar. Sempre achei isso algo clichê. – deu os ombros, encarando o mar, que estava calmo.
- Clichê? – ele assentiu. – Mas o casamento é um clichê bom, não acha? – continuou calado, observando o horizonte. – Ali, numa igreja ou onde for, olhar para aquela pessoa e saber que é ela a pessoa que você sempre procurou. – sorriu, arrumando-se na areia e observando o horizonte também. – Saber que ela vai estar com você em toda e qualquer situação, seja boa ou ruim. Que quando você ouvir alguém falar sobre amor, logo a imagem dessa pessoa virá a sua mente. Ter a certeza de que ela é a “tampa da sua panela”. – disse e riu. a olhava. – Duas pessoas que aos seis anos só pensavam em quando iriam acabar a tal escola e virar um astronauta, participar de uma banda ou ser uma princesa... – olhou para a areia, rindo sem graça. – Que essas duas pessoas se encontraram por alguma peça do destino e estão ali hoje, se tornando um casal. Não são mais duas pessoas, são um casal. – terminou, suspirando.
- Você pareceu uma adolescente de quatorze anos que está à procura do seu príncipe encantado. – disparou, fazendo-a abrir a boca; incrédula. Ele gargalhou, recebendo alguns tapas nas costas e braços. – Que adolescente mais brava, meu Deus! – brincou, segurando os braços dela e puxando-a para um selinho demorado.
- Idiota. – rolou os olhos, voltando a se sentar ao seu lado. – Vai dizer que você nunca imaginou isso?
- Não com essas palavras. – sorriu, ainda observando-a. – Como você imaginava seu príncipe? – ela o olhou, confusa. – Aquele que quando você conversava com suas amigas vocês imaginavam, sabe? Sei lá, garotas deveriam fazer isso. – ela riu, olhando-o.
- Ahn, meu príncipe seria loiro dos olhos verdes, alto, forte, mas nem tanto. Ninguém merece um armário. – riu. – Ele seria rico, famoso e todas me invejariam por tê-lo comigo. Cavalheiro, romântico, carinhoso... Inocente, educado, inteligente... E que me amasse acima de tudo e todos. – sorriu, olhando aqueles olhos que ela tanto amava. Eles estavam num brilho intenso... Mas misteriosos, como jamais vira.
- E quando você acha que vai encontrar esse príncipe? – ele perguntou, sorrindo.
- Esse? Não, não. Ele não existe. – sorriu fraco, suspirando. – Aliás, atualmente eu o acharia um puta pé no saco. – riu, prendendo o cabelo num coque frouxo. – E a garota dos seus sonhos, como ela era?
- Hm... – murmurou, voltando a encarar o horizonte e rindo. – Loira, com os peitos enormes! – gargalhou alto, dando um tapa na perna dele. – Com uma bunda incrivelmente grande... – continuou, ignorando o tapa que havia ganhado. – Daquelas mulheres bem safadas, que querem sexo todo dia e toda hora...
- Você só pensava nisso, ? – interrompeu, rindo incrédula.
- Aos quinze anos é a única coisa que um garoto pode pensar. Principalmente quando se está sozinho em casa. Ou no banho. – assentiu e ela gargalhou alto novamente, dessa vez ele lhe acompanhou nas risadas. Merda, como ele amava ouvir aquela risada.
- Eu não sou nenhum pouco assim... E você não é nem um pouco como o meu príncipe. O que devemos fazer?
- Acho que você deveria procurar seu príncipe por aí. – sorriu, acariciando o rosto dela, que rolou os olhos.
- Qual parte do “atualmente eu o acharia um puta pé no saco” você não entendeu? – cruzou os braços, fazendo-o rir.
- Mas você quer ficar com o total oposto do seu príncipe?
- Esqueceu que você é meu príncipe fantasiado de Fera? – sorriu, sentando no colo dele, distribuindo beijos pelo seu rosto.
- Como esquecer, minha Bela? – selou os lábios aos dela, num beijo calmo. Eles não precisavam de pressa, não ali, não naquele momento. A língua de tocou lentamente os lábios de , pedindo passagem, e foi o que ela fez, a cedeu prontamente. Quando o ar ficou escasso, eles se separaram com selinhos.
- Eu nunca me senti tão feliz assim! – exclamou animada, enquanto ria.
- Se eu disser que também não, você acreditaria? – Ela assentiu, selando os lábios aos dele novamente. realmente não mentia. Jamais havia pensado se sentir tão completo quanto naquele momento. Esquecera-se de e de toda a vingança. Esquecera de todo o sofrimento que passara até chegar ali. tinha o incrível poder de fazê-lo esquecer de tudo o que era ruim. Era como uma pílula da felicidade, ou como quer que digam por aí. Uma dose diária era o suficiente para que seu coração se enchesse de um sentimento diferente, bom. Um sentimento que o fazia temer. Desconhecido. O melhor e, ao mesmo tempo, pior sentimento que já tomara conta de si em toda a sua vida. O amor.


Capítulo IX


- Você já teve vontade de largar tudo e sair por aí, sem responsabilidades, preocupações? – o questionou, enquanto dava mais um gole em seu drink, que estava encostado no balcão do bar onde ela e estavam.
- Quem nunca teve essa vontade? – riu, brincando com o guardanapo.
- Você já fez isso?
- Muitas vezes. – sorriu nostálgico, erguendo o rosto para encará-la. – E posso dizer uma coisa? É a melhor coisa do mundo! – ela sorriu, mordendo o lábio inferior.
- Me mostra o mundo, ? – ele franziu o cenho, confuso. – Me mostra como é tudo aí fora. Como são as coisas que os pais não nos mostram... – riu, gesticulando com as mãos. – Pode ser com todos os podres dele, mesmo. Drogas, bebidas... Não importa. É só por uma noite.
- Isso não é pra você, . – debochou, pegando seu copo de vodka. Mas, antes que ele tomasse um gole do líquido, tirou o copo de suas mãos e o virou em sua boca, de uma só vez. Ele arregalou os olhos, rindo. – Não é água não. – Ela rolou os olhos, colocando o dedo indicador sobre o peito dele, pressionando-o.
- Quando você vai entender que eu não sou uma garotinha mimada que só quer saber de conto de fadas e paixões adolescentes? Eu sou muito mais do que isso, ! Não é porque você “viveu” – fez aspas com os dedos – mais do que eu, que tem o direito de dizer o que é ou não pra mim. Já sou maior de idade e tenho plena consciência dos meus atos, eu sei muito bem o que é ou não é pra mim. Eu posso nunca ter me embebedado a ponto de cair na rua, ou nunca ter usado droga, mas isso não me faz uma princesinha que precisa de cuidados. Agora não me... – e antes que ela continuasse, a puxou pelo braço e a beijou.
Não era um beijo calmo como os outros, era bravo, com destreza. A mão direita de foi para os cabelos de , puxando-os com certa força; com a outra mão, ele apertava possessivamente sua cintura. Ela, um tanto surpresa com a atitude dele, somente levou as mãos para sua nuca, acariciando-a e arranhando-a de leve. Suas línguas brigavam como se pedissem por mais espaço na boca do outro, uma batalha em que as duas partes ganhavam. Quando o ar ficou escasso, eles se separaram com mordidinhas no lábio.
- Calou a boca agora? – ele disse, sorrindo malicioso. Ela bufou, sentando-se novamente no banco ao lado. – Fico muito agradecido. – riu, passando a mão na perna dela.
- Eu só queria que você entendesse que não sou uma menininha frágil. – suspirou, dando outro gole em seu drink. – Eu posso ser tão mulher quanto todas essas que estão aí. – apontou para as outras mulheres do bar. riu, olhando-a. Ela virou o rosto para ele, incrédula. – E você ainda ri?!
- Então é isso? Você tá assim por que quer me mostrar que é uma mulher madura? – sorriu, levantando-se do banco e passando a mão pelos cabelos dela. – , eu nunca duvidei que fosse. Aliás, às vezes te acho até mais madura do que eu mesmo. – ela o encarou. – O modo de como você sempre encontra um lado bom nas coisas negativas... De como está sempre feliz, mesmo quando nada dá certo. – sorriu verdadeiro, dando um selinho demorado nela, que sorriu também.
- Tá. Eu fico muito agradecida com isso. – sorriu – Mas, agora, será que... Você pode me levar pra dar uma volta? Só por essa noite, sim?
- Ahn... O que acha do Underworld?
- Underworld?! – arregalou os olhos, rindo. – Esse lugar tem uma péssima fama!
- E é por isso que eu amo lá. – sorriu, pedindo a conta para o barman. – E então?
- Posso ficar tranquila?
- Comigo ao teu lado? Sempre! – sorriu malicioso.

E ali estavam eles, estrada a fora, às 01h35 da madrugada, vivendo intensamente; , como sempre quisera viver. , como sempre vivera. A música tocada no rádio do carro era alta, rápida, talvez pudesse se caracterizar em techno pop, caso isso exista. Talvez David Guetta ou Calvin Harris. Não importava agora, a batida era suficiente para que os pensamentos de fossem para longe, ela não sabia aonde, mas era bem longe daquela realidade que ela vivia. também pensava longe, talvez até mais longe do que a própria . O motor alto que soava do carro, o fazia lembrar-se de um ano atrás, quando sentia o sangue ferver em seu corpo e sua adrenalina chegar à milhão. Querendo ou não, sentia falta da rotina que tinha.
- É engraçado como uma música nos faz sair completamente dessa atmosfera, não é? – indagou, olhando-o. Ele assentiu, olhando brevemente para a moça. – Eu quero viver, . De verdade, entende? É como eu te disse mais cedo, eu não quero mais ser a garotinha mimada do papai. A mesma garotinha que os pais colocaram num castelo de açúcar, e com qualquer chuvinha esse castelo pode desmoronar. Eu quero uma tempestade, . – sorriu, ainda encarando a estrada. – Desfaz esse castelo pra mim?
- É isso mesmo que você quer? – olhou-a brevemente.
- É o que eu mais quero.
- Ouviu isso? – ela negou, confusa. – Então... Eu acho que ouvi um trovão vindo dali. – disse, fazendo um trocadilho e apontou para uma boate que estava logo à frente. Underworld.

As enormes letras cursivas vermelhas do letreiro brilhavam aos olhos de . As paredes pintadas de preto estavam desgastadas, com falhas, mas isso não impedia que elas ficassem menos aparentes, pelo contrário. A música tocava alto, estrondando as paredes negras da boate. She Wolf, do DJ David Guetta, era a trilha sonora, deixando o lugar ainda mais movimentado. Várias pessoas estavam em volta da boate, algumas vomitavam na calçada, outras riam alto por efeito de álcool ou drogas; não sabia identificar qual dos dois. Underworld estava infestada por motos das mais variadas marcas, algumas delas pareciam mais camas do que o quê, de fato, eram. Casais se beijavam como se não houvesse amanhã, ali, em plena calçada na frente de todos. A única certeza que tinha no momento era que se o inferno realmente existisse, ele era ali: na rua 69, na Underworld.

- E então? – disse, despertando do transe. – Como é estar no inferno pela primeira vez? – riu, era como se ele tivesse ouvido seus pensamentos.
- Não é tão quente quanto eu esperei que fosse... – brincou, rindo.
Ao entrarem na boate, não deixou de sorrir; aquilo era loucura. O som era tão alto que os copos em cima das mesas tremiam. Algumas mulheres desfilavam com seus curtos vestidos, despertando olhares dos homens que estavam ali.
- Achei que lugares assim só existiam em filmes! – disse alto, para que ouvisse.
- Lugares como esses existem por toda a parte, . É só olhar para o lado e ali estão eles. – sorriu, enlaçando uma das mãos na cintura da garota.
Estar naquele lugar era loucura. As pessoas dançavam como se suas vidas fossem terminar no próximo minuto. Já sentindo a batida da música ecoar em seu corpo, começava a se balançar no ritmo Techno. a acompanhava timidamente, não era do tipo que subia em cima da mesa às 03h00 da manhã e tirava a camiseta.
- Anda, ! – disse, rindo.
- Vou pegar uma bebida pra gente, o que acha? – ela assentiu, ainda sorrindo.
As mãos de estavam no alto e se balançavam à batida da música; o corpo fazia o mesmo. Seus olhos eram fechados, sentindo a energia que aquele lugar lhe trazia. Enquanto dançava, sentiu duas mãos a puxarem pela cintura, ao pensar que fosse , ela sorriu com o toque, mas assim que abriu os olhos viu um estranho. Ele era alto, forte e mais parecia um armário. O cabelo semi-raspado era em tom loiro, os olhos castanhos como amêndoas e a pele clara, mas que agora estava avermelhada, talvez pelo calor do lugar. Seu sorriso branco esbanjava malícia.
- Com licença. – ela sorriu, tentando se desfazer dos braços fortes do homem. Ele riu debochado, apertando-a ainda mais. – Você pode, por favor, me soltar?!
- Por que faria isso, bonequinha? – sorriu, aproximando seu rosto do dela.
- Que merda, cara – esbravejou, virando o rosto e tentando afastá-lo. – Você tá me machucando!
E antes que ela continuasse falando qualquer coisa; sentiu um impulso vindo de trás, a única coisa que teve tempo de fazer foi fechar os olhos e respirar fundo. Ao abri-los novamente, viu com as mãos na gola da camiseta do fortão que a segurava. Seus olhos estavam saltados, esboçavam ódio e sua boca dizia coisas desconexas, que ela não soube identificar o que era. Ainda sendo surpreendida, ela viu quando a mão direita de foi em direção ao rosto do homem, acertando-o em cheio. Ela arregalou os olhos e levou a mão à boca, surpresa.
- Para, ! Vamos embora! – gritou em vão.
Outro chute foi dado, dessa vez nas partes baixas do tal homem. Um grupo de pessoas começavam a fechar uma roda em volta dos dois, que continuavam na sessão pancadaria. não sabia o que fazer, se gritava, se chorava, se ia embora ou se ria do azar que tinha. Ao analisar novamente a briga, percebeu que a sobrancelha do pseudo-namorado sangrava um pouco, isso a deixou ainda mais nervosa com a situação.
- Pelo amor de Deus, parem! – implorou, já sentindo a garganta queimar.
Poucos segundos depois, os seguranças da boate finalmente chegaram e ela pôde respirar pelo menos um pouco mais aliviada. Dois seguranças seguraram cada homem, que tentavam a todo custo se soltar.
- Me larga, porra! – esbravejou , limpando o sangue que escorria de sua sobrancelha.
- Quero os dois pra fora daqui! Andem, andem. – O segurança da boate ordenou, soltando e dando sinal para que soltassem o outro homem. Eles o fizeram. Ambos continuaram parados, se encarando. Alguns amigos do outro o chamaram, tentando apaziguar o clima.
- , por Deus, vamos embora? – disse, e se virou para encará-la. Só então se deu conta do que acabara de fazer. O rosto dela estava coberto por lágrimas, sua pele pálida e as mãos trêmulas. Ele somente assentiu, indo com ela direção à porta da boate. Eles saíram em silencio e entraram no carro. – Você é um filho da puta, . – disse, encarando-o, enquanto respirava fundo.
- Desculpa. É por isso que eu insisti em não te trazer em lugares como estes! É sempre a mesma coisa, . Sempre! Os mesmos tipinhos de pessoas sempre vão estar aí. E olha só no que dá! Você tá apavorada! – suspirou, jogando a cabeça para trás e apoiando-a no banco. – Eu nunca iria deixar ninguém fazer nada contigo.
- Eu não to apavorada por mim! Estou por você. – sussurrou. Ele franziu o cenho, virando o olhar para ela. – E se aquele cara sacasse uma arma e atirasse em você? Hein? Foda-se se ele ia me beijar, depois eu dava um jeito de sair dali! Você não tinha o direito de me deixar preocupada desse jeito, ! – esbravejou, com o dedo em riste. quis rir, mas esperou ela terminar. – Eu implorei pra você parar e você continuou lá, agora olha isso, seu rosto tá cheio de sangue! Eu to tremendo por sua causa, por medo de te perder ou sei lá... – suspirou, fechando os olhos. Ele sorriu estonteante, levando a mãos para o rosto dela e acariciando-o.
- Eu sei me cuidar, . E eu olhei muito bem a cintura dele antes de começar a brigar, sabia que ele não tinha uma arma. Não quero que sofra por mim nunca mais, huh? – sorriu, recebendo um sorriso fraco dela. – Urgh. – gemeu um pouco, sentindo uma pontada forte na cabeça.
- Ei... – sussurrou, preocupada. – Vamos cuidar disso, sim?
- Estou bem, . – ela rolou os olhos.
- Não é o que estou vendo. Anda, vamos para meu apartamento e me deixa cuidar de você. – ele sorriu, fitando o volante do carro. Como gostava daquela mulher.
- Você é quem manda. – deu os ombros, rindo e ligando o carro. Ela sorriu, olhando-o.

Cerca de quarenta minutos mais tarde, já estava sentado no sofá do apartamento de , que estava na cozinha, preparando os objetos para primeiros socorros. Ele encarava o porta-retratos em cima da estante de , lá estava ela com ; abraçados. Por que ela tinha de ser filha justo dele? Aquilo era inaceitável. Sempre que tentara parar de pensar nisso, a realidade voltava a bater sua porta. Aquilo era real. O que faria? Não sabia, não tinha ideia. Era tarde demais para qualquer coisa. Não se via matando , mas talvez tivesse de fazê-lo para estar em paz consigo mesmo. A memória de sua eterna era forte demais ainda em seu coração, ela tinha de ser vingada.
Antes que continuasse suas hipóteses do que fazer com seu destino, ouviu passos vindos da cozinha e respirou fundo, tentando esquecer tudo.

- E então, meu doentinho, como está? – brincou, sentando-se ao lado dele. Ela segurava uma bandeja com algodões, curativos, um potinho com água morna e todos os apetrechos que precisaria.
- Doente, muito doente, Doutora... – brincou também, fazendo-a gargalhar. Ela pegou um algodão e o molhou na água morna.
- Vamos lá, isso vai doer um pouco, ok? – ele assentiu, olhando-a. Ela prensou o algodão molhado sobre o machucado de , e ele gemeu um pouco, fazendo careta. – Mas que dengoso! – riu, dando um selinho demorado nele, que sorriu com o carinho.
- Você é a médica que eu sempre pedi a Deus! – riu, segurando a cintura dela.
- Para de me fazer rir, ! – gargalhou novamente, encostado a cabeça no ombro dele. – Quer me fazer te machucar ainda mais?
- Ok, deixamos isso pra depois. – sorriu, fechando os olhos.
- Muito grata. – mordeu o lábio inferior, continuando a limpar o corte. – Sorte sua que foi superficial, imagina só ter que dar ponto nisso? Que dor! – fez uma careta e ele riu, acariciando a cintura dela. – Espera aí que tá quase ok. – sussurrou, pegando uma gaze e colocando sobre o corte. – Juro que você vai receber um pirulito por ser um paciente tão bonzinho.
- Ah, um pirulito? Achei que eu que fosse te dar algo pra chupar... – maliciou, recebendo vários tapas no braço. – Ai, ai, ai! – riu, passando a mão no local.
- Seu tarado! – deu um último tapa em seu braço e saiu de seu colo. – Você é muito chato, credo. – disse, tentando segurar o sorriso.
- Tão chato que você tá morrendo de vontade de rir do que eu acabei de falar... – riu, roubando um selinho dela.
- Shh. Já cuidei de você, já pode voltar pra casa. Vá, vá. – cruzou os braços, encarando o teto.
- Para, amo... Para, . – pigarreou, arrumando o que iria dizer na mesma hora. Ela virou o rosto, surpresa.
- Você ia dizer “amor”?! – sorriu.
- Eu? Claro que não, por favor, . – suspirou, encarando a TV. – Vamos ver um filme?
- Sei, sei. – riu de como ele estava desconcertado. Ele iria chamá-la de amor. De amor. – E sei lá, não to a fim de assistir filme.
- Ahn, me deixa pensar em algo melhor então... – disse e, no próximo segundo, já estava em cima de . – Há!
- Epa, epa! – riu, levando os braços para as costas dele, acariciando-as. – Por que está me olhando assim? – sorriu, tímida, olhando-o nos olhos. Ele somente riu, negando com a cabeça. – Diz! – sorriu, roubando um beijo rápido do outro.
- Não é nada demais, mulher! – sorriu, passando a mão nos cabelos dela. estava deitada no sofá, com por cima de seu corpo. – Só estava observando o quanto você é linda, não posso?
- Claro que pode. O que é bonito é pra ser mostrado e apreciado! – brincou, fazendo pose. Ele riu novamente, levando os lábios para o pescoço dela e beijando-o. mordeu o lábio, entrelaçando os dedos no cabelo de , que continuava investindo nos beijos, que agora se tornavam mordidas. – , ... – sussurrou, repreendendo. Ele murmurou um “hm?” em resposta e ela fechou os olhos, levando uma das pernas à cintura dele.
ergueu a cabeça devagar; primeiro mordeu seu queixo, depois, subindo mais um pouco, roçou os lábios no dela, que fez questão de passar a língua nos dele, sugando-os. Sentindo o corpo já reagir, levou as mãos para a cintura dela, apertando-a com força, puxando-a para que colassem ainda mais seus corpos, se é que fosse possível. Aprofundando um pouco mais o beijo, ergueu a outra perna à cintura dele, fazendo com que ambas enlaçassem seu corpo. O calor do lugar só aumentou quando ambos sentiram o sexo um do outro, mesmo que por cima das roupas. O ar faltou e suas bocas se afastaram, eles respiravam ofegantes, sorrindo maliciosos. Respirando fundo, voltou a atenção para o pescoço e colo de , que mordia o lábio inferior com força. Quando as mãos dele subiram para seus seios, apertando-os levemente, ela puxou sua cabeça para cima, fazendo-o encará-la.
- Aonde você quer chegar? – ela perguntou, erguendo a sobrancelha esquerda.
- Tem certeza que não sabe? – sorriu malicioso, mordendo o lábio. Ela riu, lhe dando um selinho rápido.
- Não dá, desculpa.
- O quê?! Ah, , por favor... Já estamos juntos há dois meses e...
- Não, não é por isso. – riu, afagando os cabelos dele. – É que estou naqueles dias, entende?
- Sério? – ela assentiu e ele suspirou, sentando-se no sofá e puxando-a para se sentar também. – Certo então, o que você quer fazer?
- Que tal ver filme? – ele deu os ombros, assentindo. – Ah, , não é culpa minha, hm? – deu um beijo na bochecha dele. – Juro que queria isso tanto quanto você.
- Sem problema. – piscou, roubando um selinho demorado dela. – Tudo em seu tempo! – sorriu. – Agora, anda, vamos assistir a um filme, o que acha?
- Feito! Mas antes vou ao banheiro, me espera? – ele assentiu, ajeitando-se no sofá.
saiu, e poucos segundos depois, ouviu o celular da pseudo-namorada tocar. Ele pensou uma, duas vezes e decidiu atendê-lo. Mas, ao ouvir a voz do outro lado da linha, se arrependeu no mesmo segundo.
- Alô? – disse .
- ?!


Capítulo X


Era ele. Era , e ele havia reconhecido sua voz. Sem pensar duas vezes, desligou o celular e apagou a chamada. Seu peito subia e descia rapidamente, suas mãos suavam feito gelo derretendo. Ao olhar para o lado, viu voltando do banheiro.
- E aí, já escolheu algum filme para vermos? – ele negou, sorrindo. Ou tentando sorrir. Nunca atuar houvera sido tão difícil. – Ahn, que tal... – antes que ela completasse sua frase, ouviu o celular tocar. engoliu seco, olhando-a assustado. – Me deixa atender e a gente já escolhe! – sorriu, atendendo o aparelho. – Eu pai! Ué, eu não ouvi... Espera um segundo. – fez uma pausa, tapando o telefone. – O celular tocou, ?
- Não... Eu estava aqui o tempo todo e não ouvi nada. – sorriu, batucando os dedos na perna.
- Não tocou não, pai! O senhor deve ligar errado... Sim, eu tenho certeza, Sr. . – riu. – Tá tudo ótimo, e com o Senhor? Ah, fico contente. – sorriu, sentando-se no sofá. – Amanhã? Hm... Eu estava planejando de sair com um amigo. Pode ser no sábado? Ok, tudo certo! Beijos, eu te amo. – desligou.
- Sair com um amigo, é? – mudou de assunto, tentando manter a respiração normal.
- É! Meu amigo colorido. – sorriu maliciosa, levando a mão para o rosto dele, acariciando-o. – O que acha de irmos ao paintball amanhã? Você me levou ao seu lugar favorito hoje, e amanhã vamos ao meu. Ótima ideia, sim?
- Ótima. – riu, dando um selinho nela. – Amo tudo relacionado à arma. – apontou para frente, fazendo um arminha com a mão. – Pow! – riu.
- E isso tudo você aprendeu com seu avô?
- Hã? – disse, confuso.
- Ué, o seu avô não era do exército?
Essa era a história que havia inventado para . Os eram uma família clássica de Nova Jersey, conhecidos por suas empresas espalhadas pelo mundo, das quais cuidava pela internet, juntamente com alguns primos. Seu avô fora um Capitão aposentado do exercito, cujo serviço ao resto de sua vida foi construir uma empresa de peças mecânicas. Seu pai cuidara de parte das empresas quando era vivo, deixando uma boa herança de bens para o filho único.
Uma história digna de um livro, pensara ele. Uma pena sua realidade ter sido totalmente diferente de tudo aquilo. Nunca sequer conhecera o avô, que morreu por coma alcoólico. O pai sempre fora um trabalhador digno, um advogado que, mesmo com todas as dificuldades e com o escritório de quinta, sempre lhe orgulhava.
- É, essa paixão veio através dele mesmo. – sorriu. – Mas, , acho melhor voltar pra casa...
- São quase três horas da madrugada! – interrompeu, incrédula.
- Não acho bom deixar o Aaron com a senhora Parker, ela é muito generosa, mas tudo tem limite.
- E você quer bater na porta da casa dela essa hora? Agora eu que digo, tudo tem limite, .
- Ok, tudo bem. – suspirou. – Mas o que acha de dormimos? Ou não teremos coragem de sair amanhã.
- Hm, certo. – sorriu fraco. – Só vou tomar um banho antes, você me espera aqui? – ele assentiu, roubando um selinho dela. – Bobo. – riu, saindo.

- Eu vou ficar no time vermelho, pode ser? – disse, com um sorriso infantil no rosto. O casal já havia chegado ao paintball e agora vestiam os coletes protetores para que a “guerra” começasse.
- Como quiser, princesinha. – ironizou, fazendo-a rir. O time de ambos era formado apenas por crianças; já que eram as únicas pessoas que estavam no lugar.
- Muito bem, todos prontos? – o instrutor disse e todos gritaram um “sim”, inclusive e , que riram. – Ok. Mas antes, temos que testar a mira de vocês naqueles bonecos de madeira ali, certo, galera?! – disse animado. Todos concordaram novamente. E assim foi, um por um, na maioria das vezes as crianças atiravam mais fora do boneco, do que, de fato, nele. Chegou a vez de atirar e ela conseguiu atingir o braço do boneco na terceira tentativa.
- Há! – comemorou, rindo. – Sou praticamente uma atiradora de elite, por favor. – esnobou, gargalhando. – Anda, , me mostra do que você é capaz!
- Ahn, vou tentar...
E ali foi ele, mirou no ponto em vermelho e pronto. No alvo. No “coração”. Ele sorriu malicioso, ainda segurando a arma na altura do ombro.
- Oi? – questionou, olhando-o.
Pela segunda vez, no segundo alvo. Cabeça. Mira perfeita.
- ? – o chamou e ele a olhou, sorrindo. – Onde foi que você aprendeu a atirar assim?
- Sorte de principiante. – piscou e sorriu malicioso, como há segundos atrás. – Mas vamos brincar com as crianças, sim? – ela somente assentiu, rindo fraco. Aquilo era estranho. Muito estranho.
E o jogo começou. Algumas crianças já haviam saído do local por terem sido atingidas pelas tintas coloridas. decidira ir com um pouco mais de calma, se quisesse, já havia terminado aquele jogo. Porém, deixar suas habilidades tão aparentes seria um risco. Por poucos segundos ele se permitiu olhar para , que gargalhava enquanto atirava em seu penúltimo adversário. Pronto, somente o casal estava no jogo. Eles se encararam e correram até a bandeira, ao chegarem lá, se encararam. apontou a arma de plástico para , mas estava sem mais bolinhas de tinta. , então, apontou para ela e atirou. riu, mas ele não. Aquilo era mais do que uma partida de paintball. Era o futuro.
- Anda, seu bobo! Pega logo a bandeira, você ganhou. – sussurrou, sentada no chão e encarando-o. continuava parado, olhando-a, sério. – ?! – repreendeu, falando num tom mais alto. Ele finalmente despertou, chacoalhando a cabeça e pegando rapidamente a bandeira.

Algumas crianças comemoraram, vindo abraçá-lo. sorriu fraco, ainda observando , que agora se levantava.
- Você me paga, ! – brincou, roubando um selinho dele, que riu, fitando o chão. – O que foi? Você não parece muito feliz por ter ganhado. – sorriu, acariciando seu rosto.
- É claro que estou feliz, . – sorriu fraco, buscando a mão dela que estava em seu rosto e beijando-a. Ela riu, meio desconfiada. – Mas vamos embora logo? Aaron me faz falta.
- Ahn, vamos sim. – roubou outro selinho. – Mas você me deve uma explicação. – disse, com o dedo em riste. Logo depois, ela saiu, indo até o dono do local. respirou profundamente, fechando os olhos por alguns segundos, deixando-se pensar. Isso o levaria à loucura a qualquer segundo. Ele precisava de uma solução o mais rápido possível.

- É isso mesmo, Audy. é uma caixa de surpresas. Cada hora eu descubro um novo “eu” nele. – riu, arrumando-se no sofá com o pote de pipocas que segurava. Audrey, sua amiga, estava ao seu lado, numa visita surpresa.
- Eu preciso conhecer esse tal aí, . Você sabe que eu leio as pessoas, não é? – assentiu, rindo. – É sério, amiga! Eu preciso saber se ele é bom o suficiente pra você.
- Está aí outro problema. Ele nunca acha que é suficiente pra mim. – suspirou, jogando a cabeça para trás, escorando-a no sofá. – Horas ele é a pessoa mais egocêntrica do mundo, mas outras... Parece um garotinho indefeso.
- Não acha que está na hora de pular fora? Está cedo, você não vai...
- Seus conselhos são dispensáveis para mim, Audrey. – Interrompeu-a, virando o rosto para ela. Audy ergueu as mãos em sinal de inocência.
- Não precisa falar assim também, dona . – sorriu fraco, arrumando o coque frouxo no cabelo. – Você já transou com ele? – arregalou os olhos. – Eu sei, eu sei que você é virgem, mas...
- Não quer falar mais alto isso não? Que tal gritar aos quatro cantos do mundo? Ei, pessoal, a é virgem! – disse alto, irritada.
- Se eu soubesse que você estava de TPM, nem teria vindo aqui. – bufou, pegando algumas pipocas da bacia.
- Você que me irrita, Audrey. – suspirou, virando-se para ela. – Eu o amo.
- O quê?! – A amiga arregalou os olhos, jogando as pipocas que tinha na mão; na bacia. – Você tem noção do que acaba de falar, ?
- É claro que eu tenho. – fechou os olhos, negando com a cabeça. – E é por isso que estou assim! Como eu fui tão tola a deixar que isso acontecesse, Audrey? Me diz! Eu sei que estamos juntos, mas ele nunca me falou algo assim... Que me fizesse acreditar que esse sentimento fosse recíproco. – levou a mão à cabeça, massageando as têmporas. – Aquele homem me deixa louca, amiga! – Audrey sorriu fraco, olhando-a. – Você não tem noção do que eu sinto quando chego perto dele... Quando beijo ele. Parecem duas pólvoras que quando se encontram causam uma explosão, entende? E adivinha só, essa explosão é bem no meu coração idiota que falta pular do meu peito. Lembra quando conversávamos sobre o tal príncipe encantado, ou aqueles garotos perfeitos das revistas? Ele não existe. Não era aquele que eu queria. Eu queria alguém justamente igual aquele babaca do , ele é perfeitamente imperfeito. Ele é perfeitamente perfeito pra mim. – Respirou fundo ao terminar de falar, fechando os olhos e já esperando a conhecida bronca da melhor amiga.
- Eu posso chorar já ou você tem mais algo a dizer? – sorriu, buscando as mãos do rosto de e tirando-as dali. – Para de ser boba, ! Você é linda, é uma garota incrível. Duvido que ele não sinta o mesmo por você.
- Queria ter a mesma certeza que você. – sorriu fraco, encarando o horizonte. – Ele é tão fechado, sabe? Algumas horas eu o sinto longe... Como se estivesse em outra época, em outro mundo. Mas outras... – sorriu largamente – outras vezes ele me olha de uma forma que, não sei... É mágico. – riu de si mesma. – Sou uma ridícula, Audrey.
- Ih, quem foi que te disse isso?! – repreendeu.
- Você não vê o que está acontecendo? Eu to fazendo a mesma coisa que sempre critiquei. Sempre achamos ridículas essas garotas que dizem “eu te amo” pro primeiro que passar na frente.
- Ele não é o primeiro que passou na sua frente, . E você sabe muito bem disso.
- Você tem razão. – sorriu, virando-se novamente para a amiga. – Paixões como essas não devem acontecer muitas vezes na vida das pessoas, não é? – Audy negou. – Então... A vida é feita para errar e acertar. Viver! Como vou poder amadurecer sem nunca ter errado? Eu preciso aprender a acertar, Audrey. E quer saber? Eu vou deixar tudo acontecer. Não vou mais me preocupar se o que eu sinto é certo ou errado, bom ou ruim.
- Muito bem! – sorriu. – Agora podemos assistir, finalmente, a este filme? – fechou o semblante, ficando séria. gargalhou e assentiu, enchendo a mão com pipocas e jogando-as na boca.

- Não, não. Fugir seria uma péssima solução! Já tentei isso e olha só no que deu? Você órfão. – conversava com o filho, enquanto andava de um lado para o outro. A criança estava sentada em seu carrinho, brincando com seus ursinhos. – Enfrentar seria uma boa... Se eu quisesse cometer suicídio, claro. – suspirou, fechando os olhos. – Covarde! – deu um soco na parede. – É isso o que seu pai é, Aaron. Um puto covarde que não tem coragem de enfrentar quem for para ter o que quer. O que quer demais. – sussurrou a ultima frase, sentindo um nó se formar em sua garganta. – Quer mais do que qualquer coisa do mundo. – sussurrou novamente, encarando a parede.
Alguns segundos passaram enquanto refletia encarando a parede vermelha de sua casa, porém, o silêncio foi tomado por um choro conhecido de Aaron. A luz piscou três vezes e correu até o filho, vendo-o encarar o nada, enquanto choramingava.

- O que houve, filho? – se abaixou, encarando o bebê. – Tá tudo bem, a luz só deve estar queimando... – e a luz voltou a piscar. olhou em volta, sentindo um arrepio percorrer o corpo inteiro. Ao olhar novamente para Aaron, viu que ele encarava algo, ao olhar para a mesma direção, arregalou os olhos, engolindo seco. – ?! – disse, com a voz trêmula.
- Eu tentei te avisar, ! Eu tentei te avisar! – sussurrou, desesperada. Diferente das outras vezes, sua figura não era tranquila, equilibrada. Seu cabelo estava bagunçado, seu rosto molhado por lágrimas e a feição cansada.
- ... – tentou dizer algo, mas nenhuma palavra saía por seus lábios. Seus olhos logo se encheram de lágrima e seu peito apertou.
- Perdão... – sussurrou, erguendo a mão em sua direção. Ele franziu o cenho, negando com a cabeça. Não estava entendendo nada. – Perdão! – disse mais alto, levando a mão ao peito. – Perdo... – E antes que ela terminasse a frase, sua imagem se apagou. se levantou, meio atordoado. Por que queria o seu perdão?
Talvez aquilo não se tratasse de perdoá-la. Mas, sim, de perdoar alguém. .
Pensando mais um pouco sobre a breve aparição dela, se deu conta que uma frase havia sido dita antes: “Eu tentei te avisar”. Avisar o quê, afinal? não sabia. Mas temia o que quer que fosse.
Ao ouvir um barulho alto, despertou: o telefone tocava insistentemente. Após dizer o clichê “alô”, reconheceu logo a voz que estava por trás da linha. Era ela. Era .
- Ei, ! Como está? E que voz é essa? Aconteceu alguma coisa?
- Não, não... Eu só estava dormindo. – mentiu, pigarreando. – E você, como está?
- Com saudades! – sorriu, fazendo-o sorrir também. – O que acha de vir jantar aqui? Tenho uma surpresa!
- Surpresa, é? – riu, olhando para o filho, que continuava brincando em seu carrinho. – Me parece uma boa ideia.
- Então tá combinado! Às 19h00? – questionou.
- Às 19h00! – afirmou. – Beijos, .
- Beijos, beijos, muitos beijos, ! – disse animada, fazendo-o rir. Eles desligaram.
- Pronto, pai! – sorriu, olhando para o pai, que estava sentado no sofá. – Você finalmente vai conhecer o seu futuro genro! – riu, indo até e beijando seu rosto. – Você vai amá-lo, eu tenho certeza!
- Como posso não amar alguém que faz a minha princesa feliz? – sorriu acolhedor, beijando a testa da filha.


Capítulo XI


Música do capítulo.

acabara de estacionar em frente ao prédio de . Ele segurava uma cadeirinha, – onde seu filho estava – e uma bolsa com os pertences da criança. O porteiro, ao identificá-lo, logo o deixou subir. No espelho do elevador ele se encarava, primeiro notou como seus olhos estavam fundos e arroxeados, resultado das noites mal dormidas dos últimos meses, pensou. Ao focalizar os braços, viu que eles continuavam tão fortes como antes, mesmo não frequentando mais a academia e não praticando mais suas artes maciais. As tatuagens ali expostas já não eram tão vivas quanto antes, talvez estivesse na hora de retocá-las. Observando-se um pouco mais, viu um pequeno coração – que agora era quase imperceptível, já que outras tatuagens quase chegavam a cobri-lo – em seu bíceps. Ele sorriu e se lembrou do motivo por fazer aquilo: . Numa noite, há quatro anos, ambos estavam passeando pelas ruas escuras de Nova Iorque, quando avistaram um letreiro enorme com os dizeres: TATTOO. Inconsequentes como eram, logo decidiram fazer algo que simbolizasse o afeto que sentiam um pelo outro. Escrever seus nomes era muito clichê, além de ser totalmente fora de cogitação. Iniciais, pior ainda, nada soava mais desnecessário do que aquilo. Por fim, com a chantagem de , acabaram por fazer um pequeno coração.
Um sorriso brotou nos lábios de , que olhou para o filho dormindo tranquilamente em sua cadeirinha. Ele lembrava tanto ela. A boca em forma de coração, as bochechas proeminentes e os olhos pequenos e redondos. tinha ido, mas havia o deixado com o melhor presente que ele já ganhou na vida. Um amor que ele jamais sonhou sentir em toda sua existência.
O apito insistente do elevador anunciando sua chegada ao nono andar tocou, fazendo-o despertar. Ele suspirou, saindo do pequeno local e tocando a campainha do apartamento 92.

- Eba! – exclamou, se levantando e correndo até a porta. – Shh, hein, pai? – o homem assentiu, sorrindo com a animação da filha. Ela abriu a porta. – ! – sorriu, dando um selinho nele, que a puxou para um beijo mais longo, mas ela se afastou, puxando-o para dentro do apartamento. – Aí, amor, a surpresa que te falei! Meu pai! – sorriu, apontando para o sofá.
Não. Não podia ser. Ele se negava a acreditar no que via. Aquele era só mais um dos pesadelos que atormentavam desde a morte precoce de . Não poderia ser à sua frente, encarando-o. Oh, céus, a quem ele queria enganar? Era ele. Era o seu pior inimigo. Tudo havia acabado... Com sua vida, com a vida de seu filho. Ao lembrar-se de seu filho, suas mãos bambearam, sem pensar duas vezes, ele deixou a cadeirinha no chão e deixou seu corpo imóvel. Somente analisando a situação. Sua pele, provavelmente, estaria tão branca e pálida que talvez ele pudesse ficar quase invisível para fugir daquele lugar. Seus olhos arregalados e suas mãos e pés gelados. Seu corpo tremia tanto, que ele sentia que teria uma convulsão a qualquer momento.
Tudo estava perdido. Seu romance ao menos começara e já acabara. Havia se aproximado demais, havia perdido todas as razões ao se apaixonar por ela. Ali estava ele, parado em frente à porta, encarando o velho . Tinha exatamente dez segundos para decidir sua vida. Matar ou morrer. Grande destino de merda havia traçado para si, pensou. Matar, afinal, não seria tão ruim, seria? Fizera isso por seis anos de sua vida. Morrer também não lhe parecia má ideia, a não ser pelo fato de Aaron. Aaron. Sempre ele. Ao virar um pouco o rosto, pôde ver o filho dormindo calmamente. O que seria feito daquela pobre criança caso algo acontecesse com ele? Iria parar em qualquer um desses orfanatos e seria infeliz e amargurado pelo resto da vida. Já se matasse , Nicholas levaria uma culpa consigo pelo resto da vida, jamais se esqueceria de seu sorriso. Oh, céus. Aquele sorriso que o fazia ir do inferno ao céu em um segundo. Aquele sorriso que parecia ser a salvação e solução de todos seus problemas.
- Ei, vocês?! – não entendia nada, apenas encarava os dois, que pareciam mais duas estátuas. Por fim, decidiu agir normalmente, seis anos de atuações para policiais deveriam servir para algo. E além do mais, sabia que aquele velho não iria fazer nada. Não com a filha ali. – Bem... Já que vocês não falam nada, eu falo! Pai, esse é o , meu... Amigo colorido! – disse brincalhona, apontando para ele.
- Como vai, senhor ? – disse, com um sorriso misterioso nos lábios. O homem continuava calado, encarando-o.
- Pai?! – repreendeu.
- Bem. – respirou fundo, ainda encarando-o com certo espanto.
- Fico feliz com isso. – continuou com o tom irônico e o mesmo sorriso nos lábios. Ele estava mexendo com fogo... E sabia que se queimariam em breve. – É um prazer finalmente conhecê-lo.
- Estou surpreso com tanto cavalheirismo. – disse, entrando no jogo. – Surpreso é definitivamente a palavra.
- Eu imagino! – sorriu. – Mas não sabia que o senhor estava na cidade...
- Vim tratar de negócios... Sabe como é, não é, ? Negócios sempre em primeiro lugar.
- Sempre, senhor ! – sorriu sarcástico. – Aliás, me disse que você trabalha com comércio exterior... É um ramo muito cansativo.
- Nem tanto. Tenho empregados que fazem um trabalho muito bem feito para mim. – sorriu também, usando o mesmo tom de . – E essa criança linda? me disse que você tinha um filho...
cerrou o punho e trincou o maxilar. Com seu filho, não.
- Sim, ele é. – disse entre os dentes, tentando sorrir.
- Já vi que se deram bem, fico feliz por isso. – sorriu, indo abraçar o pai. – Bom, vou fazer um café pra gente. Esperem-me aqui, sim? – eles assentiram, ainda sem desviarem o olhar um do outro. Ela saiu, indo até a cozinha.
- Então era isso, ? – riu, cruzando os braços. – Eu quase acreditei que você não sabia que ela fosse minha filha... Pensei até em te perdoar! – negou com a cabeça, com o mesmo sorriso sarcástico de minutos atrás. – Qual era o plano? Aliás, como foi que você a conheceu? – franziu o cenho, fechando o semblante.
- , ... – sorriu irônico. – Esqueceu o monstro que você criou? – riu, colocando as mãos nos bolsos. – Foi fácil, fácil. Aliás, você deveria ter ensinado sua filha a não falar com estranhos... – o outro trincou o maxilar. – No começo, eu não sabia que ela era sua filha, não. Parece que o destino resolveu me ajudar, não é? Seria a vingança perfeita! Aproximar-me da filha do meu pior inimigo e depois matá-la... Melhor até mesmo do que matar você. É como me disse quando se foi... “Aposto que estar vivo e conviver com essa dor é muito pior do que morrer, não é?” – sorriu sem humor. – Você estava certo, , é muito pior.
- E aposto que achou que sairia impune por isso, não é? – sorriu irônico, cruzando os braços. – Você tem muito ainda o que aprender, criança. Se envolver com ela por meses, sem consumir o plano? Estava esperando o quê? Eu descobrir tudo e te matar?
- Não seria difícil, não é? – riu sem humor, negando com a cabeça. – O que seria matar um de seus capangas para quem já matou centenas de pessoas?
- Você mexeu com a pessoa errada, . Seu joguinho acab...
Um barulho alto ecoou pelo cômodo e os dois olharam para a direção do corredor. As xícaras estavam no chão, que já estava sujo pelo café derramado.
- O quê...? – disse baixo, com o rosto paralisado e os olhos cheios de lágrima.
- Filha? – gaguejou, encarando-a assustado. – Há quanto tempo você...
- O suficiente. – disse, com a voz embargada, interrompendo-o. Suas mãos tremiam, seu corpo estava completamente arrepiado. Era como se uma tonelada fosse jogada em seus ombros, ela não tinha força suficiente para as pernas.
- Não, filha, não é o que você está pensando... – disse, sorrindo nervoso.
- Não é, ? – cruzou os braços, encarando-a. – Já tá na hora da sua filha saber quem é seu pai, não é? – sorriu fraco, olhando para , que continuava paralisada. – Seu pai é chefe de uma quadrilha, . Eu trabalhava para ele e... – suspirou, antes de continuar – Me aproximei de você pra te matar, seria a vingança perfeita para quem matou a pessoa que eu mais amava na vida. – disse diretom e o olhou, incrédula, somente deixando algumas lágrimas caírem.
- Cala a merda da sua boca, ! – disse, com o dedo em riste.
- Eu to mentindo, ?! – disse alto, se aproximando do homem. – Você não é essa pessoa que eu acabei de descrever? Seja homem, assuma o que faz! Assuma o que é!
estava atordoada, ela olhava para os dois, incrédula. Aquilo não poderia estar acontecendo. Aquele parecia mais um de seus sonhos malucos... Mas não era. Era real. As lágrimas caíam rapidamente dos seus olhos, embaçando-os e deixando tudo aquilo ainda mais sombrio. Ela olhou para os dois, que agora discutiam em voz alta.
- Chega! – gritou, tapando os ouvidos. Ambos a olharam, assustados. – Já chega... Pelo amor de Deus! – levou as mãos ao rosto, chorando alto. sentiu um nó se formar em sua garganta ao vê-la daquele jeito. Queria poder pegá-la no colo e dizer que tudo ficaria bem. – O que vocês querem fazer comigo? – os encarou, desesperada. – Por que, pai? – o olhou, negando com a cabeça. – Por que, ? – o olhou também, mordendo o lábio inferior, tentando segurar o choro maior que estava por vir. Ela não conseguia processar uma frase sequer naquele momento, as palavras lhe faltavam.
- Filha...
- Me deixa em paz! Sai da minha casa! – apontou para a porta.
- Meu anjinho, eu...
- Sai... Por favor! – disse, ainda apontando para a saída.
- Eu vou te matar, . – sussurrou, com o dedo em riste.
- Ninguém vai matar ninguém aqui! – se pronunciou novamente, fungando. – Vai embora, pai, pelo amor de Deus! – O homem então saiu, esbarrando de propósito no ombro de . Ao bater a porta com força, acabou acordando Aaron, que chorou alto.
- , eu...
- Eu não quero ouvir nada, . – disse fria, encarando-o.
- Eu me arrependi. – disse somente, pegando a cadeira do filho e suas coisas e saindo.
não era burro. Sabia que o esperaria na saída daquele prédio e acabaria com sua vida em segundos. Sabendo que o prédio tinha três saídas, resolveu optar pela mais óbvia e saiu por lá, pegando o primeiro táxi que viu pela frente. Ele respirou, aliviado por um lado, mas, por outro, seu coração estava desolado. Tudo, enfim, tinha acabado. Ele não estava feliz com isso... Nem um pouco. Não havia conseguido completar seu plano e agora corria risco de vida, assim como seu filho.
- Você conhece o hotel da rua 37? Pode me deixar lá, por favor. – ele disse para o taxista, que logo assentiu. Nicholas sentia um nó imenso na garganta, mas ele não podia chorar ali, num carro, na frente de um homem desconhecido. Ele respirou fundo, olhando para o filho que agora também o encarava. Ele tinha que tirar forças de algum lugar, e sabia, aquele – apesar de pequeno – era seu maior porto seguro.

estava sentada, com os braços apoiados nos joelhos e as mãos segurando as mangas de sua camiseta longa. As lágrimas escorriam lenta e silenciosamente por seu rosto, deixando rastros. Seu coração doía, assim como a cabeça, que estava a ponto de explodir. Mudando a direção de sua visão – que encarava a televisão desligada –, ela encontrou o porta-retratos onde estava com seu pai, numa festa de família. Ela se levantou depressa, pegou o retrato e o encarou com raiva.
- Assassino. – disse, entre os dentes. O porta-retratos, que até então, estava em suas mãos, agora se quebrava contra a parede.

(Play)

Sem pensar, ela saiu pela porta, não aguentaria ficar mais um só minuto presa naquele lugar. Entrando no elevador, ela encarou sua figura no espelho. Seu rosto estava coberto por lágrimas, seu cabelo bagunçado e seu semblante desesperado, assustado, amargurado. Ao sair de seu prédio, sentiu o vento forte em seu rosto, o que parecia fazer com que sua dor aumentasse ainda mais. Levando as mãos aos bolsos da calça, deixou-se guiar pela direção do vento... Não tinha um destino, só queria andar, andar até que suas pernas não aguentassem mais o peso de seu corpo e até que seu coração parasse de doer. Até que acordasse e visse que aquilo não passava de um maldito pesadelo.
As lágrimas corriam pelo seu rosto, não dando tempo nem para que sua respiração voltasse ao normal. Ela não sabia o que pensar, não tinha ideia do que faria agora. Havia sido traída pelo seu próprio pai e pelo seu pseudo-namorado. Assassinos. Era isso que eles eram. Traidores e assassinos.
Saber que fora usada por para a merda de um plano de vingança era terrível. Saber que todas as palavras, sorrisos e risadas foram falsos. Ela só não entendia uma coisa: por que ele não acabara com tudo aquilo antes? Por que esperar meses para se vingar? seria tão frio ao ponto de fazer se apaixonar perdidamente por ele, para depois ser o culpado por sua morte?
E quanto ao seu pai? O pai que sempre a mimara, que sempre a amara. O homem que lhe incentivava a estudar para tornar-se uma grande mulher com valores. O mesmo homem que lhe contava uma história de conto de fadas todas as noites, em sua infância; um assassino? O chefe de uma quadrilha de assassinos de aluguel? queria morrer. Eram facadas demais em seu peito. Quando finalmente achou que poderia ser feliz, quando achou ter encontrado o sonhado homem de sua vida, descobriu que tudo não passava de um plano. De uma farsa. Isso doía, doía demais, uma dor quase que insuportável. Estava revoltada, magoada, incrédula. Provavelmente se encontrasse alguma faca ou arma no chão, tiraria sua própria vida. Ela nunca, em hipótese alguma, havia pensado em se suicidar, mas a dor era tanta, que a possibilidade de dormir para sempre parecia ser uma ótima ideia. Uma ótima saída. Era isso, uma saída, era tudo o que precisava.
Andando mais um pouco sobre as ruas escuras de Nova Iorque, avistou ao longe um casal, eles pareciam apaixonados. A garota ria alto, enquanto observava o namorado fazendo palhaçadas. mordeu o lábio, sentindo o choro vir mais forte. Por que não poderia ter sido feliz assim também? Qual grave pecado havia cometido para ganhar esse castigo? Estaria ela pagando pelas dezenas vidas que o pai havia tirado? Doía pensar nisso. Doía saber quantas vidas haviam sido roubadas pelo seu pai. O homem que sempre lhe pareceu tão integro, cheio de valores... Sentia nojo daquela pessoa. Nojo de saber que o amava mais do que tudo em sua vida.
Ela respirou fundo, tentando manter o último fio de calma que tinha em seu corpo. Ao olhar novamente para o casal feliz, viu que eles se beijavam. nunca fora uma mulher invejosa, mas agora sentia. Sentia inveja daquele beijo, dos sorrisos, das risadas altas, do amor que aquele casal tinha um pelo outro. Amor esse que ainda sentia por . Odiava-se por isso, mas não podia evitar. Se dependesse dela, enfiaria a mão em seu peito e arrancaria de seu coração todo e qualquer sentimento por ele. Tola. Era isso o que era. Uma garotinha tola, inocente, burra e que servira de chacota para ele todo esse tempo.
Suas pernas pesaram ao lembrar-se de como foi ingênua e ela deixou o corpo cair sobre a calçada áspera. Ela levou as mãos para o rosto, tentando amparar o choro alto e desesperado. nunca fora o garoto certo. Não era nem um pouco cavalheiro, educado ou carinhoso. Nunca lhe dera flores ou chocolates. Era um grosso, antissocial, só se importava consigo mesmo, e que era perfeitamente perfeito para . Agora tudo fazia sentido... O dia anterior no paintball, as habilidades de , o vilão. Então ele realmente era o vilão da história de .
Ao sentir a garganta apertar, ela não aguentou: o grito de desespero veio à tona. As pessoas que passavam por ela a olhavam como se fosse algum tipo de aberração. E realmente, ela era... Era um brinquedo que estava em jogo todo esse tempo. E não, não fora só por dois meses... Fora por toda a vida.

- Andem, olhem! – disse alto, olhando para as pessoas que continuavam a encarar. Ela continuava ajoelhada. – É divertido, não é? É divertido ver as pessoas como loucas... – disse mais baixo, encarando o horizonte, com a visão perdida. – Por que é assim que a sociedade é, não é? Observa apenas o que lhe convém. – ela se levantou, devagar. – Aposto que estão pensando em como será legal contar isso para os amigos amanhã, dizer que encontrou uma louca gritando e chorando na rua. É só isso o que vocês veem, não é? – as pessoas continuavam ali, atentas. Uma até filmava a situação com um celular. – Mas saibam que por trás de toda aparência há uma história. Por trás de toda lágrima há um motivo... – fungou, cruzando os braços e encarando a câmera do celular do garoto. – Por trás de toda loucura, há um motivo, há uma verdade. Uma verdade que precisa ser ouvida antes de julgamentos. Antes de pré-conceitos. – ela colocou o rosto entre as mãos novamente, sentindo o choro voltar com força. Algumas pessoas sussurravam entre si. Uma das mulheres que observavam, sussurrou: “Isso é drama. Deve ter sido largada pelo namoradinho.” – E é por causa pessoas como você, que essa sociedade é assim. – disse, surpreendendo a mulher. – E eu tenho nojo de gente como você. – disse com o maxilar trincado. Ela fechou os olhos novamente e pensou no que estava fazendo. Estava dando um show para as pessoas que passavam por ali. Ninguém a entenderia, ninguém poderia ajuda-la. Estar ali era humilhação demais. E mais uma humilhação seria muito para a cota dela, que agora já estava mais do que esgotada. Em silêncio, ela saiu por entre as pessoas, colocando a mão nos bolsos da calça jeans e mordendo o lábio inferior, tentando segurar aquele maldito choro.
Ainda desnorteada, , mesmo sem querer, não conseguia parar de pensar no que estava acontecendo. Parecia muito para sua pobre concepção de entendimento. Ao pensar que chegou a se apaixonar de verdade por aquele homem, chegou a amá-lo, sentiu vontade de colocar tudo o que comeu na lixeira que estava logo à frente. Sem controle de seus próprios pensamentos, a imagem de seu pai traçando planos para matar pessoas era nojenta demais. Seu estômago apertou e ela correu para a lixeira, deixando tudo o que a incomodava ali. Ao erguer a cabeça novamente, ela limpou a boca com a manga da blusa e voltou a andar. Ela precisava de um ombro amigo o mais rápido possível. Precisava desabafar.

Sem pensar duas vezes, andou até a casa de Audrey, como não era muito longe dali, ela logo estava tocando a campainha.
Audrey abriu a porta e arregalou os olhos na mesma hora, nunca vira a amiga não fragilizada como naquele momento. não aguentou, a tontura tomou conta de sua cabeça e quando se deu conta, tudo havia apagado.

Um cheiro forte tomou conta de suas narinas e ela sentiu a vida puxá-la de volta. Infelizmente.
- Pelo amor de Deus, ! O que aconteceu? – a amiga disse, assustada. estava sentada no sofá, já sem os tênis. – , por Deus, me diz logo! – ela não conseguia dizer uma só palavra, a voz lhe faltava. O ar lhe faltava. – Eu vou chamar seu pai, espera.
- Não! – gritou, sentindo uma força se aproximar. – Audrey, me ajuda, por favor! – mordeu o lábio inferior, sentindo o choro voltar. Mais forte do que nunca.
- Ei, amiga... – a abraçou, afagando seus cabelos. – Está tudo bem... Só me diz o que aconteceu, por favor? Eu quero te ajudar.
- Eu não consigo... – sussurrou, soluçando. – Eu só quero que me diga que isso é um pesadelo, por favor, Audrey. Me diz que a qualquer momento eu vou acordar com você me batendo e dizendo que já tá na hora de ir para o colégio. – fungou, ainda chorando.
- Isso não vai acontecer, . – suspirou, desfazendo-se do abraço da amiga e encarando-a. – O que acha de ir tomar um banho, colocar roupas quentes e tomar um chá comigo? Você vai se sentir melhor. – negou, sentindo o choro voltar ainda mais forte. – Certo , eu estou muito preocupada, me diz logo o que aconteceu? Por favor... Eu quero te ajudar, amiga. – o silencio tomou conta do lugar, novamente. – Você quer que eu faça o que, pelo amor de Deus? Eu não aguento de ver assim! Me diz quem é que eu tenho que matar? – sorriu fraco, olhando para a amiga. – Não vou mais pedir pra você me falar o que aconteceu, ok? Só quando estiver pronta. Sem pressões. – afagou as costas dela, num gesto de carinho. – Mas vai tomar um banho, sério. Você tá gelada, toda acabada... E não aceito um não ou um choro como resposta, é uma ordem. – sorriu. – Enquanto isso, eu vou preparar umas roupas e algo para tomarmos.
- Obrigado. – sussurrou, com um sorriso fraco nos lábios. Audy piscou, como se dissesse que não há problema.
se levantou e foi até o banheiro da casa da amiga. Audrey estava preocupada, nunca vira a amiga tão desgastada quanto estava. E o pior: não fazia ideia do motivo. Nicholas teria terminado o que nem havia começado direito com ela? Não, conhecia a amiga e sabia que por maior que fosse o amor que sentisse por ele, jamais ficaria daquele jeito.
Enquanto Audrey pensava no que deixava a amiga naquele estado, terminava de tirar a ultima peça de roupa que estava em seu corpo. Ao ligar o chuveiro, sentiu a fumaça quente começar a tomar conta do ambiente, deixando-a mais relaxada. Sem pensar muito, ela entrou na água e sentiu as gotas quentes queimarem sua pele. Jogando um pouco a cabeça para trás, pensou se podia se afogar com um chuveiro, mas no mesmo tempo desistiu da ideia. Aquela não parecia uma morte muito digna. Querendo esquecer um pouco de todos os problemas, ela começou a pensar no ultimo filme que vera; um besteirol americano como os outros. Talvez aquilo a distraísse. Mas, interrompendo suas tentativas frustradas de pensar naquele filme, duas batidas na porta a despertaram. “Está tudo bem?” Disse Audrey. “Está” foi somente o que ela respondeu. Decidida a sair logo daquele banho, ela chorou tudo o que pôde no momento e desligou o chuveiro e saiu do banheiro, enrolada por uma toalha.
- Você tem algum pijama por aí, Audy? – disse, chegando à sala.
- Eu já separei uma roupa pra você, amiga. Tá lá no meu quarto, em cima da cama. – sorriu fraco, recebendo um meio sorriso em agradecimento.
encontrou lingerie e um conjunto de veludo em cima da cama, que logo estava em seu corpo, esquentando-a. O cabelo – já penteado – estava enrolado numa toalha, em cima da cabeça. Quando voltou para a sala, encontrou duas xícaras na mesinha de centro e sorriu involuntariamente. Audrey era incrível.
- Obrigada por tudo isso. – sorriu, pegando uma das xícaras e dando um beijo no rosto da outra, que sorria de volta.
- Não se preocupe. – suspirou. – E aí, tá melhor?
- Tentando ficar. – deu um gole no chá, suspirando logo em seguida.
- Eu nunca te vi assim, ... Nem quando o Elvis morreu. – Elvis era o cachorro que tinha desde os 2 anos, e que ficara com ela até os 16.
- Quem dera meu maior problema fosse a morte de um cachorro. – debochou, rindo sem humor. – O planejava me matar, Audrey. – a encarou.
- O quê?! – gritou, incrédula. – Como assim “te matar”? Esse cara é louco ou o quê? Já chamou a polícia? Esper... – disse, pegando o telefone.
- Por vingança... Vingança ao homem que matou a pessoa que ele mais amou no mundo. Meu pai. – mordeu o lábio, sentindo um nó se formar em sua garganta.
- O que... O que você tá falando, ? – sussurrou, deixando o telefone cair de suas mãos.
- Meu pai é chefe de uma quadrilha... – disse, com a visão parada, encarando o horizonte. – Nicholas era como um assassino de aluguel, ou sei lá como se chamam isso. – fechou os olhos, respirando fundo antes de continuar. – Eu não sei o que aconteceu, mas meu pai matou a e Nicholas prometeu vingança. Qual vingança seria melhor do que matar a filha do seu inimigo? – sorriu sem humor, sentindo as lágrimas rolarem silenciosamente pelo seu rosto. Audrey estava boquiaberta.
- Eu... Eu não sei o que falar.
- E você acha que eu sei? Descobrir que meu pai é um assassino, ou melhor, CHEFE de uma quadrilha... Descobrir que a pessoa que eu amo só me usou pra me matar... Descobrir que minha vida é uma farsa! Você acha que é fácil?
- Eu queria poder dizer algo pra te amparar, mas eu to tão chocada quanto você.
- Não precisa dizer nada, eu só quero desabafar isso que tá aqui engasgado.
- É claro que pode. – sorriu fraco. – Mas, espera... – se levantou, indo até a cozinha. Alguns segundos depois ela voltou, segurando dois pratos. – Aqui, eu já vi isso na TV e soube que é ótimo pra descontar a raiva. Finge que esse é o Nicholas. – ergueu um dos pratos – E esse é o seu pai. – ergueu o outro. – riu fraco, erguendo a mão para pegar os tais pratos.
- Ahn... – pegou um dos pratos. – Eu... – suspirou. – Isso é constrangedor. – respirou fundo, fazendo uma pausa.
- Faça isso, . Chore tudo o que quiser hoje. Xingue, negue, se desespere hoje. Por que amanhã você vai acordar nova e vai dar a volta por cima. – assentiu, ainda encarando o tal prato.
- Sabe o que é pior, pai? – começou, deixando o choro voltar com força. – Saber que toda a minha vida foi uma farsa! Uma farsa causada por você... Por você! Por que você não me deixou ir morar com a minha mãe? Por quê?! – gritou. – Pra me ver sofrer assim, não é? Você não tem um coração, pai! Você nunca teve. O que você tem aí dentro? Gelo? Matar pessoas por dinheiro? Céus! Por que todas aquelas lições de moral e papinho de ser uma pessoa de valor? Oh, sim... Valor. É só isso que você quer. – soluçou, deixando o corpo cair sobre o chão, de joelhos. – Eu te odeio! Eu te odeio com todas as minhas forças, senhor ! – jogou o prato na parede com toda a força que podia. Logo depois, ela levou as mãos ao rosto, chorando compulsivamente. – Por que, pai? Por que você não é aquele que me chamava de princesinha e me dizia que a vida era um conto de fadas? Por que você mentiu? – soluçou, recebendo afagos de Audrey, em suas costas. – Por que você não pode me colocar no colo, me levar para a cama e dizer que tudo ficará bem e depois trazer uma Barbie pra mim? Onde está o pai que me trazia café da manhã da Starbucks, mesmo estando atrasado para o trabalho? Cadê o homem que todo sábado de manhã me levava para fazer um piquenique no Central Park? Eu o quero! Eu quero o meu pai! – deixou seu corpo inteiro cair sobre o tapete da sala. Audy se ajoelhou ao seu lado, chorando também. – Era tudo um personagem, Audy? Ele me enganou todo esse tempo?
- É claro que não, meu amor. Ele te ama demais... Ele pode fazer o que for pra conseguir dinheiro, ou sei lá, mas quando ele está com você, eu tenho certeza, ele é esse pai que você acabou de descrever. Verdadeiramente.
- Tá doendo, amiga. – ergueu o corpo, encostando a cabeça no ombro da outra. – Tá doendo tanto.
- Eu sei que está, eu sei. – suspirou, afagando os cabelos dela. – Tá doendo em mim também ver a minha melhor amiga assim.
- Me diz como eu fui me apaixonar tanto por alguém em só dois meses? Me diz?
- Quer falar sobre ele?
- Não... – fungou, respirando fundo. Ela se desfez do abraço da amiga. – Eu não quero falar sobre ele, Audrey. Aliás, eu não quero nem lembrar que ele existe... Ele não merece uma só lágrima minha, não é? – Audy assentiu, sorrindo fraco. – Nem eu to me reconhecendo mais. – olhou para cima, tentando fazer com que as lágrimas que estavam em seus olhos não rolassem por sua face. – Qual é Audy, eu vou superar. – se levantou, pigarreando. – Eu só o conhecia há dois meses, vai ser fácil esquecê-lo. – cruzou os braços. – Vai ser fácil. – sussurrou para si mesma, tentando fazer-se acreditar naquilo. Mas sabia, seria uma tarefa árdua. Talvez a mais difícil por qual já passasse em toda a vida.


Capítulo XII


Música do capítulo. Já podem dar o play.

18, janeiro, 2012 – 05:05 AM.

A lua brilhava como nunca no céu que jamais pareceu tão estrelado quanto naquela noite. Ali estavam eles, como uma família feliz: , e . O jantar à luz de velas, na areia da praia, era só um complemento para a felicidade que todos os presentes sentiam. As risadas eram inevitáveis quando fazia uma de suas piadas antigas e ria somente para agradar o sogro. quase não prestava atenção na conversa dos dois, já que estava muito ocupada em observá-los. Observar o quão eram parecidos e compatíveis. Estava orgulhosa da escolha que tinha feito para si, um genro melhor para seu pai não podia existir no mundo. era a pessoa certa. Ela sorriu ao pensar nisso, nunca fora uma garota que fez a escolha correta sempre. Pelo contrário... A maioria de suas escolhas foram erradas. Todas as suas escolhas eram erradas. Pela primeira vez havia acertado, e em cheio. não só era o correto para genro, mas como namorado, como pai e quem sabe até como marido. Ela saberia isso em breve, já que seu casamento estava marcado para daqui três meses.
Ainda dopada pela felicidade que tinha dentro de si, observou a feição de seu pai mudar para as sobrancelhas fechadas, as veias de seus pescoços e testas saltarem, mostrando o ódio que sentia. Ela então despertou, encarando-o. Poucos segundos depois, os risos haviam se transformado em gritos e xingamentos.
- Eu vou te matar, ! Você está prestando atenção? Eu vou te matar! – Esbravejou, puxando a toalha da mesa, derrubando tudo o que havia nela.
- Não se eu não lhe matar primeiro, ! Não se eu matá-la primeiro! – apontou para , que já estava de pé, incrédula.

O que estava acontecendo ali? Onde estavam os risos bobos e os sorrisos sinceros? Onde estava a paz e harmonia que aqueles pareciam sentir a minutos?
sentiu sua camiseta subir e sentiu a ventania que havia tomado conta da praia. O céu que há poucos minutos estava estupidamente lindo, agora estava coberto por nuvens escuras e um vento tão forte que os pratos e talheres começavam a voar em direção ao mar. Um raio clareou todo o ambiente por um segundo e logo depois o barulho do trovão tomou conta de tudo, até mesmo dos altos gritos que eram reproduzidos por seu pai e seu noivo. Eles se encararam em silêncio. Silêncio esse que não durou mais de cinco segundos, já que uma tempestade começara ali. Porém, diferente do que pensara, não foi água que encharcou seus corpos. A tempestade não apenas estava mais forte do que qualquer outra que ela já vira, mas, para completar, no lugar de água, aquelas nuvens carregadas derramavam sangue. Surpresa, ela olhou para frente e viu que e mal ligavam para aquela tempestade digna de um filme de terror, ao invés disso, eles discutiam cada vez mais alto. Gritos, ventania, trovões e o barulho das ondas altas era a única coisa que conseguia ouvir. Sem saber o que fazer, ela levou as mãos às orelhas, tapando-as, como uma criancinha que tem medo do barulho de bexigas estourando. De nada adiantou, tudo só parecia mais assustador. Fechar os olhos foi o próximo passo, mas as gotas fortes da chuva não deixavam com que ela ficasse assim por muito tempo. Para sua maior surpresa, ainda não havia acabado. Quando se deu conta, seu pai já tinha uma arma em punhos e apontava para , que continuava discutindo, como se simplesmente não visse o que o outro segurava.

- Parem, por favor! Parem! – gritou, mas foi em vão. Ela parecia estar num mundo paralelo a eles, já que nada parecia adiantar para chamar-lhes a atenção. destravou a arma e ela gritou novamente. – Eu o amo, pai!
E o que parecia impossível, aconteceu. A declaração surtiu resultados, já que ambos a olharam, surpresos.
“Eu o amo!”, “Eu o amo!”, “Eu o amo!”, “Eu o amo!”, “Eu o amo!”, “Eu o amo!”. E essa pequena frase foi dita no mínimo mais dez vezes, mas não pela voz de , não aquela que estava viva. Ao olharem de onde a tal voz vinha, se depararam com o mar. Em vez de ondas bravas, encontraram uma mulher em cima das ondas, era ela. Era Smith.
Como se tudo aquilo não bastasse, a pior parte começou: a ventania que antes parecia forte, agora mais parecia um furacão. foi tomada por ela. Quando a velocidade dos ventos aumentou, sentiu-se puxada pelo mar, que agora era vermelho sangue, assim como a água que caía do céu. Ela tentou se desvencilhar, tentou correr, mas foi inevitável, o vento era muito mais forte do que sua pequena força.
e apenas a olhavam com pena, paralisados, sem moverem um só centímetro do corpo. Ela tentou pedir ajuda, mas foi em vão, sua voz havia sido tomada pelas mesmas forças que a puxavam agora para o mar. Ao virar o rosto para trás, pôde ver novamente, ela mantinha um olhar perdido, ainda sussurrando a frase que dissera há pouco. “Eu o amo”.
- Venha minha princesinha, eu vou te ajudar! – gritou, esticando a mão para ajudar a filha. – Segure minha mão, filha! Venha!
- ! – disse, chamando a atenção dela. – Me perdoa! Eu também te amo – e aquelas palavras pareceram soar como a salvação para , que mesmo sendo puxada, sentiu um mínimo sorriso aparecer em seu rosto. – Mas isso não basta. O ódio é maior do que o amor... Desculpe. – o sorriso fechou, transformando-se em lágrimas. – Adeus, .
E acabou. O mar havia a engolido, tudo estava escuro.


se sentou depressa na cama, com a respiração descompassada e o suor em seu rosto. Ela passou a mão na testa, certificando-se que não veria sangue ali, e estava certa, fora um pesadelo. E por mais que quisesse que tudo naquela noite houvesse sido somente um pesadelo bobo, sabia que parte dela havia sido real. Infelizmente.
Sabendo que não iria mais conseguir dormir, ela se levantou e foi à cozinha beber um copo d’água, tentando acalmar-se. Alguns segundos depois, ela voltou para o quarto e abriu a janela. O dia estava amanhecendo, provavelmente não fosse mais do que 06h00 AM.
- Bom dia. – sorriu sem humor, observando a quão linda era aquela paisagem. As nuvens alaranjadas começavam a tomar forma e a ocupar o céu, que agora estava num azul um pouco mais claro do que minutos atrás. Aquele, sem dúvida, seria um dia ensolarado. Sol... Era tudo do que ela precisava.

“- O dia tá lindo hoje, né? – disse, assentiu, olhando-a. – Odeio frio... Sei lá, é tão depressivo. Sol me deixa animada, feliz, com vontade de viver. – riu. – Você não pensa assim?
- Não... – ele disse, suspirando logo depois. – Gosto de ficar em casa assistindo a um bom filme enquanto chove.
- Credo, ! – exclamou, rindo. – Você é muito sombrio. – pegou Aaron no colo. – Né, meu amor?! – sorriu, brincando com o bebê. – Tem que gostar de sol, gostar de felicidade!”


- Sombrio é, com certeza, a palavra. – assentiu, lembrando-se na cena. Fechando os olhos e sentindo a brisa do nascer do dia, ela permitiu lembrar-se de outro momento.

“- Não faz isso, ... – disse baixo, colocando uma das mãos em cima, no carro, prendendo a passagem dela. Ele se aproximou mais, suas respirações já eram quase que as mesmas. Ela respirou pesadamente, olhando-o nos olhos.
- Fazer o quê? – sussurrou.
- Gostar de mim... – sussurrou também, encostando os lábios nos dela. Ela fechou os olhos. – Eu não sou o cara que você sempre quis...
- Como você sabe que não? – ela abriu os olhos, observando aquele par de olhos que tanto a hipnotizavam.
- ... – ele sorriu fraco, irônico. – Você sempre desejou um príncipe... E eu sou o vilão.”


E quando se deu por si, seus olhos já estavam marejados novamente. nunca imaginou o quão vilão ele era, ou poderia ser.
- Por que eu tenho que gostar tanto de você, ? – disse, como se ele estivesse ali para ouvi-la. – Você foi um erro. O maior deles. – levou a mão ao coração, fechando os olhos e deixando o choro tomar conta de si novamente.

Há alguns quilômetros dali, também estava acordado, e por coincidência também olhava para o céu. era a dona de seus pensamentos e das singelas lágrimas que agora rolavam por seu rosto. Como pôde se apaixonar por aquela mulher? Ele não podia. Havia errado. Mas olhar para seu sorriso todos os dias e não desenvolver nenhum sentimento era impossível, aquela mulher era inacreditável. Nem em anos encontraria alguém parecida com ela. era única.
Despertando-o de qualquer pensamento, o choro de Aaron se tornou mais alto e correu até ele, pegando-o no colo.
- Ei, campeão... Bom dia. – sorriu fraco, beijando a testa do filho. – E aí, como dormiu? Bem? Fico feliz, pois eu não preguei o olho um só minuto. – suspirou, sentando-se na cama. – E pensar que dois meses atrás o meu maior problema era você... – riu sem humor.
estava hospedado num dos hotéis baratos da cidade, voltar para casa agora seria suicídio. Um plano tinha que ser formulado o mais rápido possível em sua cabeça, fugir seria a decisão mais sensata... E covarde. Agora seria tudo ou nada. Ou acabaria de vez com tudo aquilo, ou morreria. Nenhuma dessas possibilidades lhe parecia muito agradável.
- E aí, garotão. Algum plano? – riu, buscando a mamadeira que estava em sua bolsa. – Opa... O que é isso? – disse, ao ouvir um barulho vindo do saguão do pequeno hotel. Ele caminhou até a janela novamente e viu dois carros parados. – Merda! – xingou, dando um soco na parede. conhecia aqueles carros, e, principalmente, conhecia as duas pessoas que estavam à frente deles. e Garcia, o mais fiel de seus comparsas. – Como eles chegaram aqui?! – disse para si mesmo, já pegando o filho que estava em sua cadeirinha e levando-o ao banheiro, colocando-o na banheira vazia. – Eu já volto, ok? Eu amo você, filho. – sussurrou, dando um beijo na testa do pequeno. Ele correu ao quarto novamente e buscou uma arma dentro da bolsa do filho, por sorte, nunca tirara dali. No próximo segundo, ele abriu o zíper na lateral da bolsa, num bolso falso, e tirou de lá as balas. Calibrou as armas o mais rápido que pôde e foi para o lado da porta, ficando de tocaia por lá. Ele fechou os olhos, tentando imaginar a confiança de ali, junto dele, como anos atrás. Poucos segundos depois, ele ouviu alguns passos lentos no corredor e respirou fundo, era a hora.
A porta foi arrombada e atirou na primeira mão que viu pela frente. Um. Ele correu até a frente da porta e encontrou segurando uma arma também, ele respirou fundo, encarando-o.
- Você não vai querer apertar isso, . – sorriu irônico, vendo segurar a arma.
- Você não tem ideia do quanto eu quero. E vou. – trincou o maxilar, sentindo sua respiração ofegante.
- Tem certeza? – olhou para o lado de , e, quando ele se virou, viu que Garcia segurava Aaron nos braços. Maldita janela aberta. fechou os olhos e negou com a cabeça, se abaixando e colocando a arma no chão. Logo após ele ergueu os braços, em sinal de rendimento.
- Bom garoto. – sorriu, ainda com a arma em punhos. – Ei, você – apontou para um de seus comparsas. – Leve-o daqui. – disse, se referindo ao homem ferido pelo tiro de .
- Como você me encontrou aqui?
- Eu disse que você ainda tem que aprender muito comigo, ... – riu debochado, fazendo sinal para um de seus comparsas, que logo trouxe a bolsa de Aaron nos braços. – Tá vendo isso daqui? – apontou para um pequeno dispositivo que a bolsa tinha. bufou, rolando os olhos.
- Chip de rastreamento. – disse, incrédulo com como poderia ser tão burro em não ter visto ou imaginado aquilo antes.
- Corretíssimo. O coloquei assim que esbarrei em você ontem à noite... Logo depois daquela merda que você fez. – ficou sério, encarando-o.
- Por que adiar mais isso, ? Sem mais conversas. Diga logo o que quer e faça logo, sim? Mas lembre-se de que eu sou o único culpado de tudo. Aaron é só um bebê. Poupe-o, por favor.
- Olhe só quem está com medo... – riu, travando a arma e cruzando os braços. – É ruim ver que seu filho está em perigo, não é? Aliás, o que você tinha na cabeça ao pensar que mataria e sairia imune? Por favor, , você já foi mais esperto...
- Eu não iria matá-la. Não mais. – abaixou os braços, cruzando-os também.
- E você espera que eu acredite nisso? – rolou os olhos, ainda rindo debochado. – Mas, enfim, , vou ser rápido... – fechou os olhos. – Não vou matar você e nem seu filho. – Ele abriu os olhos, surpreso.
- Não?
- Não. Por enquanto, não. – disse, sério. – Não quero que minha filha me odeie mais do que já está, e além do mais, não vejo proveito nenhum em te matar agora. Isso não me deixaria satisfeito, você iria fácil demais para o lado de sua querida Smith. – rolou os olhos, voltando a falar: – Agora... Você tem que sair do país o mais rápido possível. Eu não quero mais nenhum contato seu com a minha filha, entendeu bem? – engoliu seco, sabendo que aquilo doía tanto quanto um tiro em seu peito. – E caso você se esqueça disso... – descruzou os braços e apontou a arma para o lado de , onde Garcia segurava Aaron. – Ele morre.
- Certo, . Parece que você venceu.
- Eu sempre venço. – sorriu malicioso, erguendo a sobrancelha esquerda. – Andem, vamos. – disse, se referindo aos outros homens que continuavam no quarto. Garcia deixou Aaron nos braços de . – Espero não vê-lo nunca mais, . Você já me tomou muito tempo e paciência. – trincou o maxilar, indo até ele e pegando sua arma que estava no chão. – Isso não é brinquedo de criança, não. – rodou-a nos dedos. – Tchau, pequeno Aaron! – brincou com as mãozinhas de Aaron, que o encarava. mantinha a feição séria, a respiração ofegante e o maxilar trincado. – Vamos. – fez um sinal com a cabeça para que todos saíssem do quarto. – Por sinal... Tem umas pessoas trancadas na despensa, se quiser soltá-los... – se referiu aos funcionários do pequeno hotel, que provavelmente barraram a entrada deles. – Nenhum contato.
continuou em silêncio e saiu com o mesmo sorriso debochado que entrou.
soltou o ar que estava preso em seus pulmões e respirou aliviado. Ele fechou os olhos e ergueu um pouco os braços, para dar um pequeno beijo na testa de seu filho. Amar era mais do que um fato concreto, mas hoje, ao ver o filho nas mãos de Garcia, teve mais certeza do que nunca que Aaron era o dono de seu coração. De sua vida. Ele amava mais aquela criança do que si mesmo, ela era definitivamente tudo em sua existência.
- Eu não falei que ficaria tudo bem? – sussurrou, abrindo os olhos e olhando para o filho. – Nós vamos nos mudar e ficará tudo ainda melhor. – sorriu, erguendo os braços, fazendo com que o bebê risse. – Tudo vai ser como a sua mãe queria que fosse. – olhou para cima, como se pudesse ouvi-la falando “Eu avisei...” – Você avisou, meu bem. – riu, mesmo com os olhos marejados. Se afastar de seria muito mais complicado do que pensava.

permanecia acordada na casa de Audrey, que ainda dormia. O relógio marcava 08h30min e lá estava ela, sentada no sofá junto de sua xícara de café bem forte. O celular estava logo ao seu lado, e mesmo lutando contra sua honra e orgulho, ela esperava que ele tocasse o mais rápido possível. Por mais que sua mente pedisse que ela jogasse aquele celular no lixo mais próximo para que uma de suas ligações com terminasse, seu coração a impedia de todas as formas. Ela havia se envolvido mais do que pensava. De alguma forma, sabia que no fundo, bem no fundo talvez, sentia algo por ela. Um afeto que fosse. Todas as palavras, os sorrisos e carinhos não poderiam ter sido falsos, não poderiam. Os olhos dele, apesar de misteriosos, diziam que seus sentimentos eram sinceros. Mas por que não contar-lhe toda a verdade antes?
Ao passar a mão pelo rosto, viu que ele estava úmido. Lágrimas. De novo.
- Uma vingança... – suspirou, fechando os olhos. Ela pegou o aparelho nas mãos e o encarou por alguns segundos, mas, ao sentir um aperto no coração, uma falta, ela decidiu teclar aqueles malditos números. Ela precisava de uma resposta.

já estava em sua casa fazendo suas malas para sua mudança. Austrália ou Canadá seriam os destinos escolhidos. Enquanto ele colocava uma de suas camisas sociais na mala, ouviu seu celular tocar. Ele franziu o cenho, confuso, não esperava a ligação de ninguém. Ao buscar o aparelho, arregalou os olhos, assustado com o nome em seu visor: .
Ele pensou uma, duas vezes e quando se deu conta, seu dedo indicador já apertara o botão de chamada.
- ? – foi o que disse, com a voz baixa, calma. Ele a ouviu fungar, estava chorando. – Estou te ouvindo... – Sem responder, ela continuava a chorar. conseguia ouvir seus suspiros e ofegos. – Não precisa falar nada se não quiser, mas não chora, não...
- Por quê? – disse somente, com a voz embargada. – Por que você fez isso, ? – soluçou, e ele fechou os olhos, sentindo aquela maldita vontade de chorar.
E antes que pudesse responder algo – que não fazia ideia do que seria – ele ouviu uma voz feminina no fundo da ligação dela: “O que você pensa que tá fazendo, ? Enlouqueceu?” – e a voz ficou mais perto, como se ela tivesse pegado o telefone das mãos da outra – “Ele queria te matar! Para de ser idiota!” – pelo modo de como ela continuou a falar, provavelmente achou que tivesse desligado o aparelho. sentou-se na cama para ouvir, ele precisava ouvir aquilo, de certo modo sabia que seria bom. – “Eu sei o quanto você está sofrendo, amiga, mas ligar para aquele otário não é a solução. Você tem que esquecê-lo! Esquecê-lo, ok? Olha só como você está... Ele só te fez mal. E além do ma...” – ela fez uma pausa, provavelmente havia derrubado o aparelho, já que o barulho denunciava isto. Mudo. A ligação havia sido encerrada.
Ela tinha razão.
Ele só a fazia mal.
Ela tinha razão.
Ele era um otário.
Ela tinha razão.
Ele precisava deixa-la esquecê-lo.
- Viu, ? – riu, amargurado. – Você só a fez mal e a única forma de se redimir disso é indo embora. Sumindo da vida dela, assim como ela pediu ontem à noite... – fungou, chacoalhando a cabeça, tentando afastar o choro. – Vai ser melhor pra todo mundo. – respirou fundo, voltando a arrumar as malas.

- Desculpa, eu sei que fui uma idiota. Mas, por favor, pare com esse sermão, Audrey!
- Tudo bem, eu paro. Mas me prometa que nunca mais vai ligar pra ele? Que nunca mais vai sequer vê-lo?
- Eu o amo. – mordeu o lábio inferior, deixando as grossas lágrimas rolarem por sua face.
- Você vai esquecê-lo. – sorriu confiante. – Existem, sei lá, 9, 10 bilhões de pessoas no mundo, sendo 4 bilhões, pelo menos, homens. Você tem 4 bilhões de chances de ser feliz. Você é linda demais, ! O homem que você quiser vai te querer também, eu não tenho dúvidas disso. Você vai amar e ser amada, assim como merece.
- Você não entende. – negou com a cabeça, dando os ombros e riu sem humor. – Você nunca amou ninguém, Audrey.
- Então vai ser assim? Eu tentando te ajudar e você disparando coisas contra mim? Ótimo! – sorriu, incrédula. fechou os olhos e respirou fundo. – Eu posso até nunca ter amado ninguém, mas quer saber? Eu prefiro isso do que sofrer por um cara que tinha planos de me matar por uma vingança imbecil.
O silêncio tomou conta do ambiente e ambas fecharam os olhos, sentindo-se culpadas.
“Desculpa”, disseram num uníssono. Elas se encararam e sorriram.
- Isso tá horrível. – disse, logo após dar um gole em seu café já frio. – Eu vou comprar algo para comermos, ok? – suspirou, secando o rosto ainda úmido das lágrimas.
- Sim, senhora “eu sou bipolar e mudo de assunto como pisco os olhos”. – sorriu, dando um beijo no rosto da amiga. – É esse sorriso que tem que estar aí sempre. Até por que, se você derramar mais uma só lágrima, aposto que o Oceano Atlântico ficará com inveja do meu apartamento. – riu. – Oh, céus, isso é uma risada? Eu definitivamente sou a melhor amiga do mundo!
- Você é. – sorriu. Ela foi até a porta da casa e saiu. O vento bateu em seu rosto, levando toda alegria dele junto. A realidade estava ali, bem à sua frente. O mundo não iria parar por sua causa. Pelo contrário, ele continuava ali, as pessoas continuavam ali. As horas passavam e seu futuro havia de ser decidido. O tempo não iria esperá-la melhorar. Nem o tempo e nem ninguém.

- E aí, pequeno? Preparado? – sorriu, olhando para o filho. – E em pensar que da última vez que eu tive que abandonar essa casa foi por sua causa... – seu sorriso se desmanchou quando ele olhou para o retrato de . – E da última vez não parecia doer tanto quanto agora.

“- Pronta para o recomeço?
- Desde sempre. – sorriu, lhe dando um selinho.”


A luz piscou e ele pensou que veria novamente, mas não. Não era ela. fechou os olhos, mordendo o lábio. De alguma forma sentia que ela estava ali. Ela sempre estaria.
Ao abrir os olhos, encarou seu celular e foi à agenda do aparelho, vendo o número de lá. Sem pensar mais de uma vez, ele deixou sua mente o guiar e apagou o número. Aquele, definitivamente, era o fim.
- Vamos lá, , hm? – disse para si mesmo. – Ela era só uma garota... Uma de tantas outras que virão. – tentou ser firme. – Ergue essa cabeça e bola pra frente, cadê o bad boy que estava aí há alguns anos? – foi até o espelho, encarando seu reflexo. – Anda, você não tem coração, esqueceu? – sorriu amargurado. – Frio como gelo! – disse, por fim, vendo logo atrás o reflexo do filho dormindo em seu berço. – Ou quase isso. – sorriu.
E assim, ele pegou a mala que estava em cima da cama, outra pequena mala com as coisas do filho, uma cadeirinha onde Aaron estava e entrou num táxi rumo ao aeroporto.
Quanto à vingança? Não, ela não estava fora de cogitação e muito menos esquecida. poderia considerá-la adormecida, assim como amor que sentia por . E sabia que uma hora ou outra tudo viria à tona novamente, mas decidira dar um tempo para pensar, para colocar suas ideias em práticas. Uma calmaria, como uma leve brisa antes da tempestade que estava por vir. Aquele não era o fim. Era só o começo de um novo capítulo.


Capítulo XIII


Música do capítulo. Podem deixa-la no repeat até o final!

05, março, 2012 – 15h36 PM.

estava num supermercado da cidade e observava a prateleiras de vinhos.
- Precisando de ajuda na escolha? – Uma voz masculina disse, e se assustou. Ela virou-se para o lado para ver de onde a voz vinha. O homem era alto, moreno, com os olhos extremamente verdes e seu porte era atlético. E, ela devia admitir, tinha um sorriso incrivelmente lindo.
- Temos um enólogo aqui, então? – ela disse, em tom de brincadeira. O homem riu, negando com a cabeça.
- De jeito nenhum. Sou médico, mas aprecio vinhos. – sorriu, estendendo a mão a ela. – Mas, bem, nós nem nos apresentamos ainda. - coçou a nuca, parecendo sem graça. – Meu nome é Steve. E o seu, adorável moça?
- Você acaba de ganhar pontos comigo com esse “adorável moça”, doutor Steve. – sorriu, esticando a mão para cumprimentar o outro. – E o meu nome é . Prazer.

20, março, 2012 – 07h04 AM.

- Então é isso, senhor , suas aulas para nossos alunos de balística começam amanhã. Você está de acordo com todas as regras de nossa empresa, correto? – o senhor, que aparentava ter cinquenta anos, disse. havia, finalmente, conseguido um emprego. Iria dar aulas de tiro para os alunos de balística da Universidade do Canadá.
- Totalmente de acordo, senhor Paul. Será um prazer trabalhar aqui. – sorriu, erguendo a mão esquerda e cumprimentando o novo chefe.

27, março, 2012 – 20h45 PM.

- Certo, Steve, você é, definitivamente, o cara mais inteligente que eu conheço! – riu, deixando os talheres no prato e gesticulando com as mãos. Ela e Steve jantavam juntos num restaurante italiano, numa das ruas mais tradicionais de Nova York. – Vinte e oito anos e duas faculdades? Sendo uma delas medicina? Oh, por favor! – rolou os olhos, ainda rindo.
- Fico grato pelo elogio, , mas conheço várias pessoas por aí que tem duas pessoas aos vinte e quatro, vinte e cinco, vinte e oito anos... – abanou o ar – Aliás, você já ouviu falar de Bill Gates? – brincou, fazendo-a rir ainda mais.
- Só se forem cérebros como você, não é, senhor Albert Einsten?! – sorriu, dando uma garfada na lasanha que estava em seu prato.

06, maio, 2012 – 09h15 AM.

- Ahn, então é assim, ? – uma das alunas de disse, segurando uma arma de fogo. Nesse pouco tempo que ele trabalhara lá, ela, sem dúvidas, havia sido a que mais lhe chamara atenção. Ela teria, no máximo, vinte anos, os cabelos loiros, olhos azuis e corpo escultural. E o melhor: sempre que tivera oportunidade, fazia questão de se insinuar para ele.
- Exatamente, Ashley. – sorriu, indo atrás dela e erguendo seus braços um pouco mais. Ele sorriu abafado e ela se arrepiou ao sentir seu hálito quente em sua nuca. – Mas assim fica muito melhor. – sussurrou, sorrindo malicioso.
- Desse jeito eu vou me tornar a melhor aluna que você já teve, professor . – sorriu, atirando no boneco de madeira que estava à frente. No alvo.
- Eu não tenho dúvidas quanto a isso, senhorita Sparks. – piscou, se afastando dela.

30, maio, 2012 – 14h45 PM.

- Já verificaram se o não apareceu mais por Nova Iorque? – disse, enquanto batucava os dedos em sua mesa de vidro.
- Temos todos os dados dos voos do Canadá para cá e nenhum sinal dele, senhor.
- Ótimo, mas é bom sempre continuar de olho. Eu não posso sequer pensar em esquecer ele. Ele ainda é perigoso.
- Correto. Aliás, sua filha tem saído com um médico. – ergueu a sobrancelha, curioso. – O nome dele é Steve, tem duas faculdades: medicina e jornalismo. Tem vinte e oito anos e parece muito interessado em . – assentiu, sorrindo consigo mesmo.

17, junho, 2012 – 11h10 AM.

- ... Você nunca diz como foi que o seu pai morreu, por quê? – Steve disse, surpreendendo-a. Eles estavam num piquenique no Central Park.
- Porque eu não gosto desse assunto, Steve. – suspirou, colocando uma pipoca na boca. tinha mentido ao namorado sobre , o que, afinal, para ela, era de certa forma verdade. Seu pai havia morrido desde o dia em que descobriu toda a verdade. – Mas, ahn... Você sabe que dia é hoje, por acaso, meu lindo?
- Olha... Pelos meus cálculos, hoje faz cinco meses que estou com a mulher mais incrível do mundo! – sorriu, dando um selinho nela.
- Você é definitivamente um príncipe, amor. – riu, colocando algumas pipocas na boca do namorado. – Um príncipe, como qualquer mulher já sonhou. – sorriu fraco, deixando a visão parada, observando o horizonte. – Obrigada por ter chegado na hora certa.
- Oi? – confuso, franziu o cenho.
- Não, nada. – sorriu, voltando a olha-lo. – Eu só me lembrei de algo que não deveria ter lembrado. Nunca. – suspirou, acariciando o rosto dele.
- Então não se lembre. Devemos esquecer tudo o que não nos faz bem e seguir em frente com o que nos faz, certo? – segurou a mão dela, beijando-a.
- Certo, certíssimo, meu Doutor! – sorriu, se ajoelhando na grama e enlaçando os braços no pescoço dele. – Meu lindo! – o beijou.

23, agosto, 2012 – 18h08 PM.

- E então, como foi o seu dia, campeão? Dina cuidou bem de você? – sorriu enquanto falava com o filho, que estava em seu colo. Dina era a babá do bebê. – O meu dia foi bom também, mas senti a sua falta. – disse, dando um beijo na testa de Aaron. – O que você quer com...
- Papa! – Aaron disse, levantando os braços e sorrindo. arregalou os olhos, enquanto sorria bobamente. – Papa! – repetiu, e isso só fez o sorriso de aumentar.
- Você falou, filho? – disse, surpreso, emocionado. – E papai?! – riu. – Você ouviu isso, ? – olhou para o retrato dela, que estava em cima de sua estante. – Ele disse papai! – passou a mão nos olhos, espantando qualquer resquício de lágrima que estivessem ali. – Como eu amo você, meu amor! – sorriu, erguendo o bebê no alto e beijando sua barriga, fazendo-o gargalhar.

12, setembro, 2012 – 22h48 PM.

- Você tem certeza, não é, ? – Steve disse, enquanto beijava o pescoço dela. Ele desabotoava o sutiã dela.
- Eu... – respirou fundo, fechando os olhos por um segundo. – Eu tenho, Steve. – sussurrou, sorrindo fraco. – Eu quero ser sua. Inteiramente. – mordeu o lábio inferior, encarando-o.
- Você não vai se arrepender, pequena. – sorriu estonteante, beijando-a.
fechou os olhos e os segundos passaram rápido, quando se deu conta lá estava ela, nua, encarando um homem também nu em cima de si, pronto para torna-la inteiramente dele. Ela sorriu, selando os lábios aos dele e fechou os olhos, sentindo-o invadi-la por completo. Seu corpo estava ali, mas não ela. Sua mente estava em , era nele que ela queria que estivesse ali. Era ele o seu primeiro homem, mas sabia, seria impossível. havia sumido completamente do mapa.
Ao despertar de , sentiu um frenesi por todo o seu corpo e encarou Steve, ele também havia chegado ao seu ápice. Eles sorriram e ele saiu dela, deitando ao seu lado. Nenhuma palavra mais foi dita naquela noite.

15, outubro, 2012 – 18h05 PM.

- Parabéns pra você, nessa data querida, muitos anos de vida... Aaron, Aaron! – o coro de crianças cantava, assim como os pais e mães delas também. Aaron, hoje, completava seu primeiro aniversário. estava estonteante, há um ano ele descobriu o que era amor de verdade. Aquela também era uma data ruim, fazia um ano desde a morte de , mas ele preferia não se lembrar disso. Aquele era o dia de Aaron, e somente dele.
- Feliz aniversário, campeão! O papai te ama mais do que tudo. – sorriu, dando um beijo na testa do filho. – Agora, filho, assopra as velas! – disse, rindo o bebê que agora colocara a mão no bolo. – Não...! – fechou os olhos, ouvindo a gargalhada de todos ali. As crianças ali presentes eram da mesma escolinha de Aaron, o que fazia com que também se desse bem com os pais de tal.
- ‘Bôo’, ‘bôo’! – Aaron resmungou, levando a mão suja para a boca.
- Filho...! – Riu, tirando a mão do filho de lá. – Como quer deixar os seus colegas sem bolo? Que egoísta, Aaron! Não foi assim que o teu pai te ensinou. – fingiu dar uma bronca, mesmo com o sorriso no rosto. Aaron foi até ele e deu um beijo na ponta de seu nariz, sorriu, beijando a bochecha do pequeno. – Vai lá brincar com seus amigos que eu vou ver se mando comprarem outro bolo. – o colocou no chão, ele foi correndo até as outras crianças, que já estavam dispersas enquanto brincavam umas com as outras, com a supervisão dos pais.

22, outubro, 2012 – 18h08 AM.

- Eu não sei mais o que pensar, Audy! – disse, levando as mãos à cabeça, enquanto fechava os olhos e respirava fundo. – Eu não entendo, sabe? O Steve é o cara mais perfeito do mundo, ele me faz feliz. – sorriu, recebendo um sorriso da amiga de volta. – É carinhoso, educado, inteligente, lindo, extrovertido...
- Mas...? – Audrey riu, completando a frase de .
- Mas eu não consigo amá-lo. – bufou. – Eu to com o cara há oito meses, e eu o adoro, mas eu não consigo sentir aquela coisa que te deixa sonhando acordada, sabe? Aquele amor que... Que te faz sorrir até pro pedreiro do seu prédio. – Audrey gargalhou, recebendo um tapa na perna de . – É sério, idiota. – riu, abraçando a almofada.
- Ou seja, ele não te deixa com o te deixava. – disse simplesmente, fazendo arregalar os olhos, surpresa.
- Eu falei do ? Não, né? Então. E, além do mais, eu sou apaixonada pelo Steve, só ainda não o amo.
- Tá, mente pra mim que eu gosto, ! – sorriu. – Ele era um tremendo idiota, filho da puta, otário e tudo mais, mas era ele que você amava. Ou ama, nem sei de mais nada.
- Eu só fiquei dois, dois, dois! – repetiu, incrédula. – Dois meses com esse vagabundo e me sentia daquele jeito. Agora estou há oito com o Steve e não sinto nada parecido, me explica como?
- era o cara errado, . Steve é o certo. – ia dizer algo, mas Audrey continuou. – E é por isso que você o amava, ele não é um príncipe de conto de fadas. Ele era real, assim como você.

02, novembro, 2012 – 09h37 AM.

- Como você faz isso comigo, ? – Ashley estava incrédula, ela andava persistente atrás de . – Estou falando com você, !
- Professor , Sparks. E agora não é hora para conversar sobre nossa vida pessoal, tudo bem? – rolou os olhos, encarando-a. – Depois conversamos, quando as aulas acabarem, sim?
- Oh, claro, agora é meu professor, né? Na hora de me comer não era. – cruzou os braços, rindo sarcástica. arregalou os olhos, pegou no braço dela e a levou até o canto da sala. – Ei?! Tá me machucando! – disse atônica, puxando o braço.
- Enlouqueceu, garota?! – disse, incrédulo. Ela rolou os olhos, bufando entediada. – O que você quer? Que eu me case com você só porque transamos?
- Um compromisso já seria o bastante, qual é, ? Conhecemos-nos há meses... – sorriu maliciosa, passando os dedos pelo peito dele, delineando-o.
- Ashley, minha querida aluna Ashley... – riu irônico, tirando a mão dela de seu corpo. – O que tivemos foi só carnal... Hm? Nós dois queríamos, mas acabou. Ninguém merece mulher dando showzinho no seu trabalho.
- Você. É. Um. Otário. – e no próximo segundo, a mão dela estalava contra o rosto dele. Que fechou os olhos, tentando manter a calma. A mulher saiu, pisando forte no chão, mostrando o quanto estava brava. riu, negando com a cabeça. - Onde é que eu fui me meter?

07, dezembro, 2012 – 19:16 PM.

- Hm... – murmurou, recebendo beijos no pescoço, para que acordasse. Ela dormia na casa de Steve, depois de mais uma noite junto dele. – Que delícia ser acordada assim, Steve. – sorriu, virando o rosto e dando um selinho demorado nele. – E aí, como meu príncipe dormiu? – acariciou o rosto dele.
- Perfeitamente bem! Aliás, tem como dormir mal quando se tem você ao lado? – ela sorriu, mordendo o lábio inferior, encarando seus olhos. – Por que você ficou quietinha? – ela negou com a cabeça, dando os ombros. – Preguiça de falar, minha linda?
- Acho que sim. – suspirou, depositando um beijo na testa dele. – Por que você não chegou na minha vida três meses antes? – ele franziu o cenho, não entendendo. – Ahn, para passarmos ainda mais tempo juntos, você sabe... – mentiu, suspirando.
- Não importa, princesa. Nós temos toda uma vida pela frente! Não é? – ela assentiu, sorrindo fraco. – E essa carinha? Não, não, não gosto disso! – deu um selinho nela. – Tá sentindo alguma coisa?
- Estou bem, amor. Só cansada... – respirou fundo, acomodando-se no ombro dele. – Bem cansada, na verdade. – mordeu o lábio, sentindo o carinho dele sobre sua cintura.
- Vamos dormir mais um pouco, o que acha? – ela murmurou algo como um “sim” e ele beijou sua testa. – Dorme bem, minha linda. E descansa, tá?

24, dezembro, 2012 – 22h28 PM.

- Obrigado por ter vindo passar o natal com a gente, Dina. É muito gentil da sua parte. – disse, enquanto segurava o filho e encarava sua babá, que devia ter uns cinquenta anos.
- Isso não é nada, senhor ! Minhas filhas são adultas e estão com seus maridos... Além do mais, quem tem que agradecer aqui sou eu, é uma honra o convite. – disse, meio sem graça.
- Não se preocupe. – sorriu, brincando com as mãos do filho, que estava sonolento. – Ei, Aaron? – o pequeno o olhou, com a chupeta na boca. – Vamos dormir? – ele negou, piscando pesadamente.
- Eu vou ver como estão às coisas da ceia, senhor , com licença. – se levantou, indo até a cozinha.
- Fique à vontade, Dina. – riu, virando para o filho, que já cochilava. Ele o deitou no sofá, observando-o. – O campeão do papai... – sorriu fraterno. – , ... – disse, de repente, lembrando-se de sua garota. – O que você está fazendo agora? – riu, tirando os tênis do filho. – Ah, minha princesa... – sorriu fraco, negando com a cabeça. – Já deve ter encontrado seu príncipe, não é? – suspirou, colocando a cabeça sobre o sofá e fechando os olhos. Seu sorriso logo veio à sua mente. – Merda! – fechou o punho, abrindo os olhos e encarando o teto. – Que saudade! – trincou o maxilar, soltando o ar devagar pela boca.

24, dezembro, 2012 – 23h48 PM.

- E aquele dia na escola em que rolamos a escada, ?! – Audrey gargalhou, com uma taça de champanhe nas mãos. e Steve passavam o natal na casa de Audy, que recebia seu namorado Philip. – Foi hilário!
- Vocês deviam ter filmado essa cena, seria muito bom revê-la hoje em dia! – Steve disse, enquanto ria. – Ei, pequena? – o olhou, sorrindo. Ela estava na janela, olhando a vista. – Vem cá, a Audy tá contando histórias simplesmente hilárias de vocês!
- Estou ouvindo... – riu, indo até o namorado e sentando em seu colo. – E penso que o senhor deve estar se divertindo muito sabendo da desgraça alheia, correto? – cerrou os olhos, fingindo dar bronca. Ele ergueu as mãos, em rendição.
- Que drama... – riu, dando um selinho nela. – Você sabe que eu nunca riria da sua desgraça, princesa! – sorriu, tirando o cabelo do ombro dela. – Eu já contei pra vocês de um dia em que eu e meu melhor amigo de faculdade dormimos na calçada? – elas negaram, sorrindo. – Inesquecível! Tínhamos tirado a nota máxima numa prova e fomos beber num bar próximo à faculdade, era uma figura! – o sorriso de murchou na hora ao ouvir aquele nome. Aquele maldito nome.
- Ahn... – Audy pigarreou, vendo como teria ficado. – Esse natal está sendo ótimo! Não está, meu amor? – sorriu, dando um selinho demorado em Philip.
- É claro que está! Aliás, é melhor começarmos a preparar a mesa da ceia, não? Já é quase meia noite!

17, janeiro, 2013 – 18h50 PM.

- Como foi seu dia, filho? – disse, sentado no chão, enquanto conversava com o pequeno, que estava há mais ou menos um metro de distancia. – Aposto que foi melhor que o meu! Só comer, dormir... – riu, pegando um dos carrinhos que estavam no chão e encarando-o. Sem perceber, ao olhar para frente viu Aaron tentando se equilibrar em pé, ele sorriu estonteante. – Isso, filho! Vem cá, só um passinho... – ergueu os braços, vendo o pequeno dar um passo em falso, mas ainda se equilibrando no chão.
mordeu o lábio, sentindo um nó se formar em sua garganta. – Vem, campeão! – mais três passos, e ele caiu, sendo amparado pelo pai, que sorria feito bobo com a situação. – Você andou meu amor! – Aaron o olhou, sorrindo animado com quase todos os dentes já formados e os olhos arregalados. A luz da sala piscou uma, duas vezes e olhou para o retrato de . – Acho que estou fazendo um bom trabalho, . – sorriu, entregando o carrinho para o filho, que já começava a brincar novamente. – Nós estamos. – se corrigiu. Seu espirito não aparecera ali, mas ele sabia, ele tinha certeza que ela estava ali. Ela sempre estaria ali para lhe ajudar.

08, março, 2013 – 16h20 PM.

- Ei, Luize! Você sabe se o Doutor Steve está ocupado? – sorriu, falando com a enfermeira do hospital.
- Serve esse Doutor aqui? – Steve disse, colocando as mãos na cintura da namorada, surpreendendo-a. – Veio me visitar, meu amor?
- E eu lá perderia a oportunidade de ver o meu lindo ajudando as pessoas? Aproveitei a folga da gráfica e vim aqui, fiz mal? – mordeu o lábio, arrumando o jaleco dele.
- Você nunca faz mal. – sorriu, lhe dando um selinho rápido. – Na verdade, você chegou na hora certa! Não há mais ninguém no pronto-socorro que precise da minha ajuda.
- Não? E eu, meu pediatra? Como fico sem você em casa, por cinco longos dias? – colocou as mãos na cintura, fingindo dar bronca.
- Três plantões seguidos não são fácil, princesa. – suspirou, olhando-a nos olhos. – Mas hoje eu vou pra lá e prometo lhe recompensar. – afagou os cabelos dela. Ela sorriu, olhando para seus lábios.
- Ótimo! – puxou seu lábio, ganhando um sorriso dele. – Mas agora, se puder... Eu gostaria de ver aquela menininha que você disse que é uma fofa, a que caiu da escada.
- Oh, claro, a Marie! – buscou a mão de , começando a andar com ela. – Ela vai adorá-la! Aliás, tem como não te adorar?

20, maio, 2013 – 10h06 AM.

- Não, Willi, eu não já te falei sobre esse punho muito caído? – disse, indo até um de seus alunos. – Ergue mais, assim você vai ter uma melhor colocação da bala, entende? – o homem assentiu, atirando logo em seguida. – Viu? Sua mira já melhorou, um pouco mais de treino e ficará ótimo. – sorriu, indo até outra aluna.
- Jane, segure a arma assim. – pegou a arma dela, erguendo-a. – Se você deixar ela de lado, a mira vai para o lado totalmente oposto, entende? – a moça assentiu, prestando atenção na explicação. – Segure-a firme, você está fazendo o mesmo que o Willi. – suspirou, apontando para o alvo. – Punho firme, reto, seguro! – apertou o gatilho, vendo a bala ir exatamente ao ponto vermelho. Ele sorriu, vendo o quanto havia melhorado com aquilo. sempre fora melhor com a mira, ele sempre melhor com artes maciais. – Mas, enfim... Você entendeu como é, não?
- Vou tentar! – sorriu simpática. piscou, vendo-a atirar, melhor.
- Isso aí, Jane! – exclamou, contente.
- Ei, psiu? – olhou para o vidro, de onde vinha essa voz e encontrou Ashley, encarando-o. – Pôw! – fez uma arminha com as mãos, atirando nele. Ela sorriu maliciosa e ele rolou os olhos, voltando a prestar atenção em seus alunos.

13, julho, 2013 – 19h26 PM.

- Agora será que o Doutor Steve poderia me dizer o porquê de tanto mistério toda essa semana para esse jantar? – disse, sorrindo. Eles estavam num restaurante francês, que julgou ser o mais refinado que ela teria ido, em toda a sua vida.
- Olha, meu amor... – sorriu nervoso, buscando a mão dela e beijando-a. – Nós estamos juntos há mais de um ano e...
- Você vai terminar comigo?
- Não! – riu, acariciando sua mão. – Pelo contrário... Eu quero oficializar a nossa união. – Ela arregalou os olhos e abriu levemente a boca, surpresa. – Eu não vejo mais razões para que isso não aconteça logo, nós nos amamos, sempre nos demos bem, e eu tenho certeza que está na hora de dar um passo maior em nossa relação. Formar a nossa família... Eu não vejo hora melhor para nos casarmos e começarmos a tentar uma família. Eu sei que você é a pessoa pela qual eu sempre esperei, você é o amor da minha vida! – ela não deixou de sorrir emocionada. – Nós temos muitos anos pela frente, e eu quero que esses anos sejam vividos ao seu lado. Nós, juntos, para sempre. , você aceita se casar comigo?

25, agosto, 2013 – 19h05 PM.

- ‘Úpê man! – Aaron exclamou animado, ao ver o desenho do Super Man começar. estava com ele no colo. – Úpê man, papa! – apontou para a televisão.
- É, filho! Super Man. – sorriu, passando a mão nos cabelos ralos do filho. – Você gosta do Super Man, Aaron? – ele assentiu, sem tirar os olhos da tela. observava sua cria, que sorria constantemente para a TV. Como ele havia crescido! Em dois meses ele já faria dois anos, o tempo parecia voar. Ele olhou para os olhos vidrados do filho e viu o quão verdes eram, tinha deixado uma bela herança para ele.
- ‘Lá’, ‘lá’! – Aaron disse, ainda apontando pro desenho.
- O papai tá vendo, filho. – sorriu, dando um beijo no topo da cabeça da criança. Encarando agora o nada, se deu conta de como havia se esquecido nos últimos tempos. Ele não era mais , agora era o pai do Aaron.
- ‘Vum’! – exclamou, abrindo os braços como se estivesse voando, assim como mostrava no desenho. não deixou de rir, observando-o. – ‘Vum’, papa!
- Vrum, filho! – sorriu, se levantando com o pequeno nos braços. Ele o ergueu em seus braços, deixando-o numa altura boa. – Viu? Você tá voando como o Super Man! – sorriu ao ver a cara dele de animado. Seus olhos estavam arregalados e seu sorriso contagiante. – O Super Man do papai. – sussurrou, andando na sala com o pequeno em seu colo. “Voando”.

09, novembro, 2013 – 17h53 PM.

- O que você acha desse, Audy? – disse, saindo do provador com mais um modelo de vestido de noiva.
- Ótimo. Assim como todos os últimos sete que você provou. – sorriu sarcástica, ouvindo a gargalhada de .
- É o meu casamento, sua invejosa! Tem que ser o vestido perfeito. – mostrou a língua, indo até o espelho e vendo seu reflexo.
- Seu casamento é daqui oito meses, ... – bocejou, vendo-a no espelho. – E se você engordar?
- Olha o olho gordo, Audrey! – brincou, rindo. – E além do mais o vestido é a coisa mais importante, eu tenho que ver com bastante antecedência... – suspirou, colocando as mãos na cintura, ainda vendo seu reflexo. – Esse é lindo. – sorriu fraco.
- Lindo é seu noivo. – apoiou o queixo na mão e riu, virando-se para ela.
- Deixa só o Philip ouvir isso! – riu, chamando uma atendente. – Ei amor, esse é lindo, mas não é o meu ainda... Trás aquele que eu gostei, o de renda, calda de sereia... – a atendente assentiu, indo buscá-lo. – Próximo! – riu, entrando no provador.

22, janeiro, 2014 – 08h37 AM.

- Bom, professor , seus alunos estão esperando por você, portanto, pretendo ser breve. – Paul, o chefe de , disse.
- Claro. – sorriu, prestando atenção.
- Nós recebemos uma proposta de nossa filial em Nova Iorque – franziu o cenho, confuso. – E eles estão precisando de um professor assim como você. O senhor têm dados grandes frutos para nosso curso e é por isso que temos o prazer de lhe dar uma promoção. Porém, para isso, será preciso que você volte à Nova Iorque.
- Nova Iorque? – disse baixo, ainda tentando entender aquilo tudo.
- Você irá ganhar o dobro do que ganha aqui, além de, é claro, passagens, uma boa moradia e escola para seu filho. É uma oportunidade muito rara, professor ! Não foram muitos os professores de nossa corporação que receberam essa proposta. Na verdade, eu acho que você é o terceiro. – sorriu, cruzando as mãos, em cima da mesa. – A mesma carga horaria de trabalho e tudo mais! Sua transferência será daqui dois meses, caso você aceite, claro.
- Eu... – suspirou, chacoalhando a cabeça. – É uma grande proposta!
- Sem dúvidas, professor . É uma oportunidade única. E então, você aceita?


Capítulo XIV


Música do capítulo.

25, março, 2014 – 19h19 PM.

Então era isso, é como dizem por aí; o bom filho á casa torna. Lá estava , sentado na poltrona da janela dum avião com destino à Nova Iorque. Um filme passava por sua memória, o medo também era indispensável nessa volta. E se descobrisse sua chegada? E se reencontrasse ? E se tudo de ruim que havia ficado ali voltasse novamente? Seus pensamentos eram baseados num “e se” que não o abandonava desde o dia vinte e dois de janeiro, há dois meses.
“E então, você aceita?”
Essa era a razão por sua volta, e somente por ela. Aquela proposta era irrecusável e ele não seria burro em descarta-la. Seu filho estava crescendo e seu salário diminuindo, um aumento agora era mais do que vaidade, era necessidade.
Seus dedos das mãos batucavam insistentemente contra a mesinha que estava em seu colo, aquele barulho irritante parecia fazê-lo desviar seus pensamentos das angustias que sentia e temia. Nova Iorque era grande demais para encontrar ali, não era? Era. Tinha de ser. Ele tinha que acreditar nisso. não sabia como iria reagir caso encontrasse com aquela mulher em qualquer esquina por aí, apesar dos mais de dois anos que se passaram, ele continuara pensando nela. Casada, talvez grávida, ou quem sabe até nem morasse mais lá. Era nisso que ele precisava pensar em todos esses vinte e seis meses que ficou fora.
- Tá ‘péto’, papai? – Aaron perguntou, despertando do pesado sono que estava desde que saíram do Canadá.
- Só mais alguns minutos, filho. – sorriu fraco, afagando o cabelo do pequeno. - Fome! – exclamou, levando as mãos à barriga.
- Hm... – mordeu o lábio, apertando o botão ao lado da poltrona. Logo uma aeromoça veio até eles. – Você pode nos dar aquele lanche número dois do cardápio e uma coca-cola?
- Claro, senhor. Mais alguma coisa? – ele negou, com um sorriso simpático no rosto. A moça saiu.
- Pronto. – virou para o filho, que bocejava. – Quer assistir desenhos? – Aaron arregalou os olhos, sorrindo animado. riu, ligando a TV que estava nas costas da poltrona à sua frente. – Vamos ver... Que tal Bob Esponja?
- Bob! – exclamou animado, seu pai então colocou no tal desenho e levou os fones de ouvido ao filho.
- Quando a comida chegar eu te aviso. – sorriu, colocando os fones no pequeno, que assentiu sorrindo. voltou a encarar a janela, e, céus, como Nova Iorque era linda à noite. Sim, eles já estavam sobrevoando NY. Ele sentiu um frio correr sua espinha e engoliu seco, tudo estava tão próximo. Aquela cidade lhe trazia tantas lembranças, tanta saudade, tanta amargura. Esses meses no Canadá foram tão calmos, tirando o fato do furacão de sua aluna Ashley, claro.
- Senhor, o lanche que pediu... – a aeromoça disse, tirando a atenção de , que sorriu, pegando a refeição.
- Aqui, filho – entregou-o para Aaron, que mal tirou os olhos do desenho. – Come direito. – advertiu, recebendo um olhar zangado. – Ei?! – repreendeu, vendo o filho lhe dar um beijo na bochecha. riu. Como aquele ser tão pequeno podia ser tão esperto?
Ele olhou novamente para os prédios arranha-céu que agora pareciam tão pequenos. Tudo seria como no Canadá, calmo, sem lembranças e confortante. É. Era nisso o que ele tinha que acreditar ou enlouqueceria ali mesmo. Fraquejar não era da personalidade de e não seria agora que isso aconteceria. Ele aceitou essa proposta e iria em frente com ela, assim como em tudo o que fizera na vida.
Ou quase tudo.

“Atenção senhores passageiros do voo 4685, nós estaremos pousando na cidade de Nova Iorque em cinco minutos, peço que afivelem seus cintos e se aprontem para o pouso.”

Um sorriso não deixou de brotar nos lábios de . Lar doce lar.
- Ei, campeão? – tirou os fones de ouvido de Aaron, que cruzou os braços, nervoso. – Sem essa, nós chegamos.
- Chegamo? – arregalou os olhos. Seu pai assentiu. – Vamo! – fez menção de se levantar, mas o cinto o prendeu. riu e o pequeno pareceu não gostar, já que seus olhos se encheram de lágrima.
- Shh, desculpa, filho. – segurou o riso, passando a mão no rosto do pequeno. – Só podemos sair quando descermos por completo, ok? – o outro assentiu, com o rosto entre as mãos. – Desculpa, campeão. – beijou o topo da cabeça dele.
E no próximo minuto, o avião começou sua descida, ele virou de lado e Aaron deu um grito. olhou para o lado e viu o rosto da criança amedrontado.
- Pára vião, papai! – disse, aos prantos.
- Shh, Aaron, já tá descendo, hm? – segurou o corpo do filho, que tremia.
Mais alguns poucos minutos de descida e gritos – diga-se de passagem – e o avião pousou. desafivelou o cinto de Aaron e o pegou no colo.
- Ei... Shh, shh... – o balançou no colo, vendo-o o soluçar.
- Vião muito mau! – exclamou, ainda chorando.
- Já acabou, filho... – se levantou, vendo todos os passageiros irem para frente. Ele colocou a alça da bolsa de Aaron no ombro e segurou o pequeno nos braços também. – Viu? Já estamos em Nova Iorque! – sorriu, tentando acalmá-lo. Em vão.

- Você volta daqui uma semana sem falta, não é? – questionou Steve, que tinha uma viagem para palestras de medicina. Eles estavam na cantina do aeroporto de Nova Iorque.
- Sem falta! – sorriu, segurando a mão dela. – Ou você acha que vou deixar uma mulher como você, solta por aí? Jamais. – beijou sua mão, fazendo-a sorrir apaixonada. – Você sabe que estou indo só porque são palestras muito importantes, não é? – ela assentiu, suspirando. – Então. Prometo que em breve estaremos juntos. – sorriu, se levantando um pouco de sua cadeira e lhe dando um selinho demorado.

(Play)

já estava no saguão do aeroporto, ele havia acabado de buscar suas duas malas – que agora estavam em seu carrinho. Para alívio dele, Aaron já estava mais calmo e no chão. Cada pequeno metro daquele aeroporto trazia alguma lembrança para , já que ele e Smith já passaram muito por aquele lugar, pelas suas viagens a negócios ou passeios. Estar em Nova Iorque era, sem dúvida, ótimo, aquela cidade era e sempre seria sua casa. Mesmo depois de tudo o que passara, continuava a amá-la.
- Papai, papai! – Aaron disse, puxando sua mão. Ele e o olhou. – Quelo chocolate! – sorriu, enquanto pulava animado. Aquela criança era bipolar.
- Hm... Acho que tem uma lanchonete naquele corredor. O que acha?
- Oba! – comemorou e sorriu, empurrando o carrinho com suas bagagens.

acabara de pagar a conta na lanchonete e agora caminhava pelo aeroporto de mãos dadas com seu noivo, Steve.
- Bob Esponja! – Aaron exclamou, desfazendo-se da mão do pai e correndo até um casal que andara por ali. A mulher usava uma sapatilha com a imagem do desenho.
- Opa! – Ela riu, vendo a criança agarrar sua perna.
- Aaron! – exclamou, correndo até o pequeno. – Descul... – ele sorriu, erguendo o olhar.
Seus olhares se cruzaram e seus corações pulsaram, assim como seus corpos que tremiam mais do que qualquer coisa. Aqueles rostos... Eles reconheceriam aqueles rostos até no inferno. Em cem anos. Em outra dimensão. Em outras vidas.
Os olhos de se encheram de lágrimas, e engoliu seco, sentindo um nó em sua garganta.
- Ahn, não se preocupe... – Steve disse, interrompendo-os. o olhou e logo seu olhar se abaixou, vendo-o segurar a mão de . De sua maldita . – Você gosta do Bob Esponja, baixinho?
- Goto! – Aaron disse, levando o dedo para a boca.
olhou para o pequeno e mordeu o lábio, tentando segurar as lágrimas que teimavam em querer rolar por seu rosto. Céus, como Aaron havia crescido.
- Bom – chacoalhou a cabeça, tentando colocar as ideias no lugar. – Não vou atrapalhar mais vocês. – sorriu fraco. – Desculpem pelo meu filho. – suspirou, pegando na mão do pequeno. – Tchau. – disse, virando-se de costas.
- ! – disse alto, dando um passo à frente e erguendo a mão em sua direção, surpreendendo todos os presentes. Steve franziu o cenho, virando-se para ela. fechou os olhos e respirou fundo.
- Você... O conhece? – Steve disse e ela assentiu, vendo-o virar para encará-la. - Oi? – sorriu sarcástico, olhando-a nos olhos.
- Você... Você voltou para Nova Iorque?
- A trabalho. Mas como já disse, acho que sua companhia deve estar atrasada, não vou atrapalhá-los.
- Noivo. Steve é meu noivo. – o corrigiu e pigarreou, deixando a voz firme. Ele assentiu, rindo. – E o avião que ele irá embarcar acabou de pousar na pista, não é, amor? – virou para Steve, que assentiu.
Amor. Ela o havia chamado de amor. Ela havia chamado seu noivo de amor. Era muito para uma frase só.
- Mas, bem, eu tenho um compromisso ainda hoje e tenho que ir. – mentiu, sorrindo sem mostrar os dentes. – Foi bom revê-la, . Bom te conhecer, Steve.
deu os ombros e saiu, acompanhado do filho, que fazia manha pelo tal chocolate. Ele então decidiu pegar o pequeno no colo e leva-lo à força, definitivamente aquela não era a melhor hora para manhas.
- Eu não devo ficar com ciúmes. Devo? – Steve disse e o olhou, sorrindo.
- É claro que não, meu amor. – lhe deu um selinho demorado. – Ele é só um antigo amigo de faculdade. E, além do mais, ele já deve ter casado... Sem essa, tá? – mentiu, sabia que a mãe de Aaron havia morrido, mas talvez ele estivesse realmente se casado nesse tempo, não? acariciou o rosto do noivo. – Mas, anda, vamos logo antes que o chamem para o embarque.
acabara de entrar no banheiro masculino do aeroporto, ele precisava chorar, precisava gritar, precisava fazer qualquer coisa que tirasse aquele aperto de seu coração e de sua garganta.
Ele foi até a pia do ambiente e apoiou os braços lá, deixando as malditas lágrimas correrem por seu rosto. Maldita cidade. Maldita saudade. Maldito Steve. Maldita .
- Papai tá cholano? – Aaron disse, com os olhos arregalados.
não respondeu, apenas levou as mãos ao rosto, deixando o choro vir com força. Por sorte, o banheiro estava vazio – o que era totalmente raro num aeroporto tão movimentado quanto o de Nova Iorque.
A luz piscou.
De novo.
Três vezes.
destampou o rosto e olhou para o espelho, onde viu o reflexo de na outra parede.

“Você pode tentar fugir do seu destino, , mas ele sempre continuará com você”

Foi o que o reflexo disse num sussurro, deixando-o arrepiado por completo.
- Filho? – olhou para Aaron, que
continuava olhando-o. – Você viu isso?
- O quê, papai? – disse somente, com o dedo na boca.
- Nada, deixa pra lá. Vamos embora. – pegou o pequeno nos braços e saiu de lá.
- Quem ela a moça do Bob, papai? – se referiu à e sua sapatilha do Bob Esponja.
- Não importa. – respirou fundo, empurrando o carrinho.
- Moça bonita! – sorriu, encostando a cabeça no ombro de , que mordeu o lábio inferior.

Steve acabara de entrar na sala de embarque do aeroporto. continuava anestesiada, nada mais fazia sentido. Ela abraçava seus braços e sentia as lágrimas rolarem silenciosamente por seu rosto. ? Ali? Aquilo só poderia ser um pesadelo.
Ou sonho.
Ela fechou os olhos, tentando manter a ultima faísca de calma que tinha em seu corpo. voltou a andar e buscou o celular em sua bolsa, assim que o pegou ligou para Audrey.
- Oi, sua vaca! – Audy disse, rindo.
- Audrey... – disse, sentindo o choro voltar. Ela levou a mão à boca, tentando esconder o estado que estava para as pessoas que passavam à sua volta.
- ? Você tá chorando? – seu tom de voz agora era preocupado. – Aconteceu alguma coisa? Cadê o Steve?
- Ele voltou... – soluçou. – Ele voltou, Audrey!
- Ele quem? Quem voltou? , você não tá dizendo coisa com coisa...
- O ! Merda, Audrey, o voltou!
- Oi? Mas isso... Isso é impossível!
- Não é impossível, Audrey. Eu acabei de vê-lo, aqui, no aeroporto... – fungou, tentando controlar o choro. – Ele e o Aaron! Meu Deus, como aquela criança cresceu!
- Cadê o Steve? , você bebeu alguma coisa? rolou os olhos e desligou a ligação, sabia que insistir com a amiga seria perca de tempo.
Por que ela tinha que encontra-lo? Por que ele tinha de parecer ainda mais bonito do que antes? Por que seu coração estava batendo tão forte, como há anos não sentia? Por que ainda a deixava assim?
Ela continuou andando no aeroporto, mas, ao se aproximar do estacionamento do lugar, pôde ver chamando um taxi.
- ! – gritou, correndo até ele.
ouviu seu nome ser chamado e fechou os olhos, respirando fundo. Reconheceria aquela voz em qualquer lugar.
- , espera, por favor! – ela continuou. A voz se aproximou e ele deixou o taxi ir embora, sabia que não poderia fugir por muito tempo. – Obrigada. – ofegou, parando em frente a ele. franziu o cenho, confuso. – Por esperar... – suspirou, colocando as mãos no bolso do casaco.
- Sim, ? – ele disse, frio. Aaron estava no chão, com o dedo na boca, observando-os.
- “Sim, ?”! – repetiu, incrédula. – Você me deixa mais de dois anos sem notícias nenhuma, sai fugido de Nova Iorque e ainda diz “sim, ”? – riu sarcástica. – Acho que nós temos uma conversa que já foi adiada demais, não?
- E você quer ter essa conversa aqui, num aeroporto, em frente ao meu filho? – cruzou os braços, encarando-a.
- E você ainda fala assim comigo?! – riu, se negando a acreditar no que vira e ouvira. – Primeiro - ergueu o dedo indicador, enumerando –, isso. – e logo a mão que estava com o dedo levantado, foi parar no rosto de . Um tapa certeiro.
- Papai?! – Aaron disse, arregalando os olhos.
não sibilou uma só palavra ou ação, ele continuou com o rosto virado e os olhos fechados.
- Não bate no papai! – Aaron bateu na perna de , que o olhou, assustada. Aquele tapa não havia nem lhe feito cócegas, mas foi aí que ela se deu conta do que fizera.
- Desculpa. – falou, entre os dentes, como um sussurro. já havia voltado a encará-la, mas ainda em silencio. – Eu não devia ter feito isso na frente dele. – Ele assentiu devagar, ainda sério.
- O que você quer, afinal?
- Uma explicação. – suspirou, colocando uma mecha do cabelo atrás da orelha.
- Você terá. – pegou o filho no colo e beijou seu rosto, que continuava emburrado. – Você continua morando no mesmo endereço? - Continuo. Mas eu não quero que você me procure, sei que não vai. Vai ser um covarde como foi há dois anos.
Covarde. teve vontade de rir, mas não o fez. Então ele era um covarde por querer poupar a vida do filho? Não era assim que via.
- Me dá o seu celular.
- Oi? – franziu o cenho, confusa.
- Me dá o seu celular, . – estendeu a mão e ela o deu, mesmo sem vontade. Ele digitou algo nele e lhe entregou o aparelho novamente. Um taxi passou ao lado e ele deu sinal para que ele parasse.
- É o seu endereço? – ela perguntou ao ver o nome e número da rua.
assentiu, enquanto colocava as malas depressa no porta-malas do carro. Aaron entrou no banco do carona e ele virou-se novamente para .
- Não deixe ninguém saber que você me viu novamente, ok? Ninguém.
- Audrey...
- Ninguém. – disse, interrompendo-a. Logo depois ele entrou no carro, ao lado do filho. O carro partiu.
observou o carro andar, sua boca ainda estava entreaberta, surpresa com tudo o que havia acontecido. Como ele pôde ser tão frio? Grosso? Como ele pôde ser assim, sendo que a culpa de tudo aquilo era dele e somente dele?
Ela fechou os olhos por alguns segundos e negou com a cabeça, não poderia ter lhe dado aquele tapa agora. Não na frente de seu filho.
- Idiota. – sussurrou para si mesma, abrindo os olhos em seguida e sentindo o rosto voltar a queimar. Aquelas malditas lágrimas já estavam ali de novo. De novo.
Ela caminhou lentamente até o seu carro e sentou-se no banco do motorista, ela precisava pensar. Ao abrir a sua bolsa e encontrar um espelho, olhou-se no reflexo.
- Péssima. – sorriu sarcástica ao ver o quão acabada estava. Seu rosto estava inchado, principalmente os olhos, seu nariz e bochechas vermelhos e o cabelo ligeiramente bagunçado.
Por que a vida havia lhe colocado com ele de novo? Justo agora que tudo estava tão bem. Steve, seu casamento em quatro meses, seu trabalho, tudo. não havia a encontrado propositalmente, e então, por que o destino teria lhe colocado naquele aeroporto, no mesmo corredor, nos mesmos metros dela? Que destino de merda era esse, afinal?
Finalmente ela havia o esquecido – ou achava que sim, até vê-lo de novo – e agora ele estava ali, com Aaron, como há dois anos. Seus cabelos estavam ligeiramente menores do que antes e a barba mal feita tomara conta de seu rosto, o que o deixara ainda mais lindo do que antes. Mais homem. Mais seu do que já era.
- Por que você tinha que viajar justo nessa semana, Steve? – sussurrou, apoiando a cabeça no volante.
Ela queria poder apagar o endereço de de seu celular, mas sabia que não iria conseguir, não de novo. Ela precisava de uma explicação, de respostas.
Alguns segundos mais tarde, ela ergueu a cabeça e ligou o carro com destino à casa de Audrey. havia lhe falado para não comentar com ninguém a sua volta, mas já era tarde, e, agora, mais do que nunca ela precisava de uma amiga. Ela precisava conversar, espairecer, ajuda. Era disso que ela necessitava. Ajuda.
ligou o aparelho de som do veículo e colocou em qualquer estação de rádio, ouvir música talvez fosse uma distração para que ela conseguisse prestar, pelo menos um pouco, de atenção na estrada. Era aquilo ou um acidente de carro certo.
- Idiota, idiota, idiota! – esbravejou, batendo no volante. Ela respirou fundo ao ouvir a música romântica que começará, mas, ao invés de trocar a estação, preferiu continuar ali, fugir não era a melhor solução. Chorar agora talvez fosse o certo... Talvez isso lhe desse um alívio em seu coração, que agora estava mais apertado do que há minutos.

- Escuta ... – disse, enquanto afagava os cabelos de ; que estava com a cabeça em seu colo. Ele murmurou algo como “sim?” e ela continuou: – Sobre a ... – ele franziu o cenho, encarando-a. – A mãe do Aaron.
- O que tem ela?
- Como ela era? Você sabe... O jeito dela. – mordeu o lábio. Ela não viu, mas pôde sentir as bochechas ficarem rosadas.
- ? era incrível. – ele riu nostálgico. – Quando nos conhecemos no colegial ela era tão tímida... – sorriu, fechando os olhos. – Por fora, uma baixinha quieta, meiga... Mas, por dentro, uma rocha. – sorriu, prestando atenção no que ele dizia. – Ela foi a pessoa mais forte que eu já conheci em toda a vida. – se levantou, sentando-se ao lado dela. – Ela me faz muita falta.
- Eu imagino o quanto faz. – sorriu sem mostrar os dentes, suspirando. – Vocês deviam ser tão parecidos... Perfeitos um para o outr...
- Não. – a interrompeu. – Não éramos perfeitos um para o outro. – ela abriu a boca para falar algo, mas ele continuou: – Éramos parecidos, sim, até demais, e foi aí que encontrei o erro. Nós dois sempre fomos, juntos, a emoção. Razão. Quietos. Tagarelas. Frios. Quentes. Paz. Guerra. Ódio. Amor. Mocinhos. Vilões. O muito. O pouco. – disse, com pausas. – Não éramos como... Eu e você. – buscou a mão dela, acariciando-a.
- Não? E como nós somos, ? – sorriu tímida, mordendo o lábio.
- Você é a emoção, eu sou a razão. Você é a tagarela, eu sou o quieto. Você é o quente, eu sou o frio. Você é a paz, eu sou a guerra. Você é o amor, eu sou... o ódio. – suspirou, olhando-a nos olhos. – Você é a mocinha, eu sou o vilão. E, principalmente, , você é o muito, eu sou o pouco, mas o “pouco” diferente. O pouco que quando está com você, se torna muito. – beijou a mão dela. – E nós, assim, nos completamos.


- Mentiroso! – bateu no volante e ouviu uma buzina nas costas de seu carro, só então percebeu que o sinal já tinha aberto. Ela acelerou e passou uma das mãos no rosto, tentando secá-lo. – Mentiroso... – sussurrou, mordendo o lábio.
Cerca de trinta minutos depois, ela já estava tocando a campainha da casa de Audrey.
- ?! – Audy disse, abraçando a amiga. – Graças a Deus! Eu achei que tinha acontecido algo com você. – sorriu fraco, se afastando dela e dando espaço para que ela entrasse.
- Ele voltou. – riu sem humor, sentando-se no sofá. – Ele voltou, Audrey... – deu os ombros, encarando o nada.
- Você tem certeza de que era ele, ? Sei lá, vai que fos...
- Era ele. – a interrompeu, virando-se para ela e olhando-a nos olhos. – Eu falei com ele... Eu bati nele.
A outra arregalou os olhos, surpresa.
- Ok, me conta como foi isso?
- A parte do tapa ou quando eu o vi no aeroporto, antes?
- Desde o começo.
- Bem... – respirou fundo. – Eu estava na lanchonete de lá com o Steve, nós já estávamos saindo para o portão de embarque, na verdade. Aí, eu não sei direito, - gesticulou com as mãos, confusa – na hora fiquei meio perdida, mas o Aaron, o filho do , viu minha sapatilha do Bob Esponja e veio correndo até mim... – ela fechou os olhos, lembrando-se da cena. – O veio se desculpar e nós nos olhamos... – abriu os olhos, que já estavam marejados. – Aí... aí... – tentou falar, mas foi em vão. O nó de sua garganta impediu a fala.
- Aí...? – incentivou-a a continuar.
- Meu Deus, Audrey, por que ele tem que estar tão lindo? Tão... Incrivelmente maravilhoso? – disse, incrédula. A amiga riu, passando a mão no rosto dela, tirando as poucas lágrimas que haviam caído.
- O que o Steve disse? – mudou de assunto, suspirando.
- Nada. Só me perguntou quem era e eu inventei uma desculpa qualquer. – deu os ombros, jogando a cabeça para trás e encostando-a no sofá.
- E a parte do tapa, onde fica?
- No rosto dele. – riu baixo.
- Idiota. – deu um tapa em sua perna, rindo também.
- Ah, Audy... – suspirou, voltando a ficar séria. – Eu encontrei com ele no estacionamento do aeroporto depois e eu fui tentar uma conversa sociável. Mas ele foi um grosso, frio e filho da puta.
- Então, um tapa mais do que merecido, certo?
- Mais do que certo. Tirando o fato do filho dele estar no nosso lado e ter me dado um tapa na perna depois...
- Que gracinha. – ela riu, mas continuava séria.
- Eu não podia ter feito isso. – soltou o ar pela boca, devagar. – Eu pedi o endereço dele.
- O quê?! – Audrey disse alto, levantando-se. – Enlouqueceu, ?! Faltam quatro meses pro seu casamento!
- Eu só quero uma explicação.
- Você quer uma explicação? – assentiu. – Certo, eu lhe darei uma explicação: ele queria te matar porque você era filha do pior inimigo dele, que matou sua ex-namorada. Depois, fugiu porque é um covarde e não queria policia ou você na cola dele. Satisfeita? Tá explicado?
- Não. – olhou para as mãos. – Eu quero ouvir da boca dele que eu fui só um jogo, um plano barato. Eu quero ouvir da boca dele que o que tivemos foi mentira. Que ele sentiu completamente nada por mim em todo o tempo que ficamos juntos. Eu quero que ele me diga que não sentiu minha falta um só minuto nesses mais de dois anos fora.
- Certo. E se ele disser tudo isso que você quer ouvir, no que vai mudar? Você seguiu a sua vida e eu tenho certeza que ele também.
- Nada vai mudar – mudou a direção do olhar, passando a encarar a televisão desligada. – Eu só quero saber a verdade e depois vou voltar com a minha vida normal, como está sendo desde que ele foi embora. – prendeu o ar, sentindo a tensão em suas costas.
- Você sabe que não vai ser assim. Nós duas sabemos.
- Como não, Audrey? É claro que será! – se levantou, olhando-a.
- Não, . E sabe por quê?
- Por quê? – cruzou os braços, desafiando-a.
- Porque mesmo depois dele ter sido um filho da puta, de ter fugido por dois anos sem ter dado um só sinal de vida, de ter te usado para um plano de vingança, de querer te matar... – suspirou – Porque mesmo depois de tudo que ele lhe fez, você ainda o ama.


Capítulo XV


Música do capítulo.

“Você ainda o ama”. Aquela frase ecoava na cabeça de . Não, ela não o amava. Ela não podia aceitar o fato de ainda sentir algo por ele. Não por ele. Não estando com Steve ao seu lado. Ela se negava a sequer pensar na possibilidade de ainda amá-lo. Aquilo estava completa e totalmente fora de cogitação.
havia lhe deixado sem uma explicação sequer. havia traído sua confiança. iria matá-la. não passara de uma ilusão adolescente.
Quando ela sentiu a voz voltar à garganta, teve vontade de xingar a amiga até que sua boca secasse, mas ela não o fez.
- Você, definitivamente, não tem o direito de falar isso.
- Não? Por que não? – cruzou os braços também. – Se há dois anos eu não podia porque nunca havia amado alguém, agora eu posso. Philip é tudo para mim, e você sabe disso. – assentiu, desviando o olhar do dela. – E é por amá-lo que eu sei que você ainda ama o . - a outra voltou a olhá-la.
- Você não sabe o que está dizendo.
- Ah, eu sei... – sorriu, descruzando os braços. – E sei que por mais que o Philip fizesse algo parecido comigo, eu tenho certeza que iria me odiar por isso, mas continuaria amando-o. O amor perdoa, ... Por mais que o erro tenha sido grande, gigante, imenso, ele perdoa. – abaixou a cabeça, fitando o chão. – Eu me lembro da garota que você era quando estava com , e me lembro da que está com Steve. Não estou dizendo que ele não te faz feliz, porque estaria mentindo. Mas como ? Jamais. – sorriu sem mostrar os dentes. – Você viu o cara há algumas horas e olha como seu olhinho tá brilhando, amiga.
- Eu não posso, Audy... – ergueu a cabeça, ela estava com os olhos marejados. - Você não pode, mas sente. Você não quer, mas ama. – suspirou, passando a mão nos cabelos. – Eu não estou defendendo o , até porque não gosto dele e sei o quanto você sofreu. Mas o que eu quero que saiba é que não adianta, meu amor... Não se engane.
- O que eu faço? – sussurrou com a voz embargada. – Foi só olhar pra aquele otário de novo que eu to parecendo uma criança que acabou de ganhar um presente fora de época. – Audrey sorriu, abraçando-a. – Isso é tão errado! – a amiga lhe afagou os cabelos. – Steve é perfeito.
- Você não é a Barbie para amar o boneco Ken, . – riu, afastando-se dela e olhando-a nos olhos.
- Você é uma vaca. – disse, com o dedo em riste. Audrey arregalou os olhos, incrédula. – Era pra você me dizer algo como: “esquece esse idiota, olha só a beleza que você tem ao seu lado!” – sorriu fraco.
- E isso adiantaria? – ela negou, rindo. – Você vai vê-lo?
- Vou. – sentou-se novamente. – Você acha que ele tem alguém, Audrey?
- Eu não sei... – sentou ao lado dela, sorrindo. – Eu sei que você tem alguém, e eu não quero que nem você e nem esse alguém se machuquem.

acabara de chegar em sua nova casa. Aaron já estava em sua nova cama, dormindo, o dia havia sido muito cheio, não só para ele, mas para seu pai também.
O cigarro alternava entre os lábios de e seus dedos, aquele já era o terceiro desde que ele chegara à Nova Iorque. Ter visto fora uma surpresa muito grande, e ainda maior pelo fato dela estar com seu... Noivo. Um maldito noivado. Mas o que ele queria, afinal? Ela iria encontrar alguém e tinha plena consciência disso, só não sabia que iria doer tanto quanto estava doendo.
Ele caminhou até o sofá – já sem o cigarro nos dedos – e colocou o rosto entre as mãos, logo depois as subindo até seus cabelos e entrelaçando-as ali. Por que ela tinha que estar ainda mais linda do que antes? Seus cabelos agora eram na altura dos ombros, num loiro mais escuro, seu corpo continuara perfeitamente lindo. E seu sorriso... Oh, o sorriso de ! Aquele sorriso que lhe atormentara quase todas as noites desde que havia partido.
Pouco depois, se levantou e foi até o espelho, ao chegar lá viu a marca dos dedos de em seu rosto e não pôde deixar de rir amargurado, ele merecia mais do que aquilo e não tinha duvidas quanto à isto.
- Você conseguiu outra vez, ... Você sempre consegue. – sussurrou, olhando sua figura no espelho. Pensando então que não havia acabado com sua vida uma só vez, mas duas, três, quatro. Até sem querer, ele havia conseguido. Na primeira, ao chamá-los para fazer parte de sua quadrilha. Na segunda, quando matou . Na terceira, quando pôs a filha ao mundo. E, finalmente, na quarta, quando lhe mandou ir embora e deixá-la sozinha, sem alguma explicação.
Eram os fantasmas do passado atormentando seu presente. E, definitivamente, seu futuro.
Mais alguns minutos e ele estava no sofá, encarando o teto. Mas sua quase meditação foi interrompida pelo barulho da campainha, que tocava. estranhou quem poderia ser às 23h50 PM, mas logo correu até a porta e a abriu. .
- Eu acho que... Temos um assunto pendente. Há mais de dois anos. – disse ao vê-lo na porta.
- Eu não achei que você me procuraria tão cedo. – saiu de frente à porta, dando espaço para que ela entrasse. Ela o fez.
- Eu já esperei tempo demais. – respirou fundo, olhando-o fechar a porta. Ele apontou para o sofá e ela se sentou lá. – Eu tenho perguntas...
- E eu lhe direi as respostas. – foi até ela, mas se sentou na poltrona que estava à frente do sofá.

(Play)

Ela ia dizer algo, mas sentiu a garganta se apertar num nó. olhou para baixo, fitando as mãos. A voz não iria sair.
estalou os dedos, vendo que ela estava prestes a chorar. Sua maior vontade era ir até ela e abraçá-la, pedir perdão e beijá-la, mas não seria fácil assim. Aquilo era mais complexo do que qualquer caso que ele já tivera em mãos. Era mais complexo do que qualquer momento que ele já havia pensado em viver.
O silencio desconfortante tomou conta do ambiente, as únicas coisas se puderam ouvir ali eram os ofegos do choro quieto de .
- Você quer... Alguma coisa? Água? – ele disse, incerto.
Ela não disse nada, mas pôde ouvir seu próprio choro ficar mais alto.
não aguentou e caminhou calmamente até ela, parando em sua frente, de joelhos. estava com o rosto entre as mãos.
- Me perdoa... – sussurrou, buscando as mãos dela, que descobriram seu rosto. – Não chora assim... – passou a mão no rosto dela, secando-o. – Uma vez eu te disse que nunca queria te ver sofrendo por mim, e eu não quero. – ela continuou quieta, mas olhando em seus olhos. Grossas lágrimas ainda caíam sobre seu rosto. – ... – suspirou, sentindo sua voz embargar também. – Eu nunca quis te ver sofrendo.
- E me matar entra nessa categoria? – ela disse, finalmente. – Você pode não ter me matado com um tiro, uma facada ou sei lá como faria isso. – rolou os olhos, tentando se acalmar. – Mas doeu tanto quanto. – fungou, se levantando. Ele se levantou também. – Saber que tudo não passou de um plano, saber que todas as palavras e sentimentos foram ment...
- Não. – interrompeu-a. – Não foram mentiras. – ela riu incrédula e desviou o olhar. – É verdade, sim, que esse era o meu plano quando te conheci, mas depois... – suspirou, desviando o olhar também.
- Depois o quê? – olhou para ele.
- Eu fui um idiota, .
- Você foi mais do que idiota. Você foi um otário, filho da puta, traidor, me iludiu, se aproveitou de mim – disse, com o dedo em riste, se aproximando dele. – Mentiroso! – deu um tapa em seu rosto. Ele não disse nada. – Assassino! – outro tapa. – Covarde! – estapeou o peito dele. abriu os braços para que ela lhe batesse mais, mas ela recuou, sentindo o nó apertar novamente sua garganta. – Eu sofri que nem uma condenada por você! – passou a mão pelos cabelos, nervosa. – Você não tem coração, não?! – se afastou, sentindo o choro voltar com mais força. – Você só ama a você mesmo! Egoísta, é isso o que você é, , um egoísta! – levou a mão no rosto, tentando não mostrar o quanto estava sofrendo. – Enquanto eu estava contando pras minhas amigas o quanto te amava – ele abriu ligeiramente os lábios. – Você devia estar planejando como seria a morte da filha do ! Enquanto eu sonhava em quando Aaron me chamaria de “mãe”, você devia estar segurando uma arma e pensando quando finalmente iria poder usá-la comigo! – ele negou a cabeça, incrédulo com o que ouvia. Seus olhos já estavam marejados. – Enquanto eu... Imaginava como seria quando você fosse o meu primeiro homem... – ele franziu o cenho, não acreditando no que ouvira. Ela era virgem? – Você deveria estar numa cama de algum prostíbulo da cidade, rindo com alguma vadia... De mim. – apontou para si mesma, ela fungou alto.
- Agora, eu posso falar? – ela deu os ombros, virando-se de costas. – Eu me apaixonei verdadeiramente por você, mulher. – sussurrou, e ela se virou para encará-lo. – Como eu poderia matar alguém que eu... Gostava muito? – mentiu. Ele a amava. fitou o chão, suspirando. – Você não tem noção do quanto eu sofria todas as noites por não poder te contar a verdade... – pigarreou, tentando voltar a falar normalmente. – Na primeira semana com você, a única coisa que eu pensava era, sim, em como seria sua morte... Rápida, dolorosa? – ele deu os ombros, e ela o olhou, incrédula. – Com tiro? Talvez, não queria ver minha mais nova amiga sofrer tanto. – ela riu, sarcástica. – Mas depois... Conversando com você todos os dias, vendo seu sorriso, ouvindo a sua risada... Eu vi que não havia nada que eu fizesse que me impedisse te amar. – ela entreabriu os lábios, surpresa. – E merda, eu estava amando a filha do meu pior inimigo! – gesticulou com as mãos. Ela suspirou. – Como? Como eu fui deixar isso acontecer? Onde estava o meu coração frio? Você estava derretendo-o como um gelo no deserto. E enquanto você estava imaginando todas essas coisas, eu estava aqui sofrendo por não ter mais saída. Era tarde demais para te contar a verdade, era tarde demais pra te matar. Eu mal tinha coragem de lhe atirar uma bola de tinta no paintball, ... – ela sorriu fraco, e ele também.
- Por que você fugiu por mais de dois anos? – abraçou os braços, sentindo-se tão pequena naquela situação.
- Eu não fui um covarde como você disse, ... – deu os ombros, se aproximando dela. – No dia seguinte daquela “grande noite” – ironizou, sorrindo sem humor. – O seu pai me procurou... – ela o encarou, confusa. – Ele me ameaçou e isso não me preocupou, mas o Aaron...
- Ele fez alguma coisa com ele?! – disse, preocupada.
- Não, não sei como, mas não fez. – suspirou. – Ele me propôs uma coisa: se eu me afastasse completamente de você, ele pouparia Aaron. Eu não poderia... E nem posso – riu amargurado – ter nenhum tipo de ligação com você. Aaron é o alvo dele agora. E eu nunca, por mulher nenhuma, deixaria que fizessem algo com o meu filho.
ficou em silêncio, somente olhando-o. Então era isso? O seu grande vilão, na verdade, era um pai protetor? Seu assassino era alguém que era apaixonado por ela? Ela queria sorrir, mas não o pode fazer. E se ele estivesse mentindo novamente? Ela não poderia acreditar tão fácil. Talvez só estava querendo se poupar de uma denuncia futura. Além do mais, as amarguras pelas mentiras e pelas vidas que já assassinara continuaram ali, só não eram tão dolorosas como há dois anos.
- Como... Você o conhe – e antes que ela terminasse de falar, sentiu seu celular vibrar em sua bolsa. – Meu celular... – sussurrou e ele sentou-se no sofá.
- Fique à vontade.
buscou o aparelho na bolsa e o atendeu, sem ao menos olhar no visor.
- Alô? – respirou fundo, tentando deixar a voz menos embargada. – Oi, amor. – sorriu fraco, se afastando um pouco de onde estava. Ele riu sem humor. – Estou bem... Minha voz? Não, não, eu só tava dormindo, não se preocupe. – pigarreou. – E aí, já se acomodou no hotel? – ela olhou discretamente para e o viu fitando as mãos. – Fico feliz que esteja bem... Escuta, Steve, eu vou desligar, ok? – passou a mão no rosto, secando-o. – Só estou cansada, amor. – mordeu o lábio, impaciente. – Vou ficar. Nos falamos amanhã. Beijos, boa noite. – desligou, virando-se para , que agora a encarava.
- Parece que você encontrou o cara dos seus sonhos, finalmente. – sorriu sem humor, vendo-a se sentar no sofá em sua frente.
- Como você o conheceu? – mudou de assunto, mas ele não entendeu. – O meu pai, como você o conheceu?
- Não quer falar do Steve? – riu irônico e ela rolou os olhos.
- Não vejo necessidade disso, .
- Você tá com ele há quanto tempo? Quando se casam?
- Achei que quem fosse fazer as perguntas aqui fosse eu. – cruzou as pernas e estalou alguns dedos. Ele deu os ombros, ainda olhando-a. – Dois anos. – entreabriu os lábios, surpreso. – Você me deixou sem uma explicação, fugiu como se não quisesse mais ter nenhum contato comigo, a última coisa que soube de você foi que seu plano era me matar. Você queria que eu te esperasse? – sorriu sarcástica. – E além do mais, foram alguns meses depois que você sumiu. – suspirou, olhando-o. – Nos casaremos em quatro meses.
- Viva a noiva. – disse, irônico.
- E você... Não tem ninguém? – questionou, incerta. Ela temia a resposta.
- Não, . Eu não tenho ninguém. – respirou fundo, indo até a cozinha. – Eu vou fazer um café pra gente, não acho que a nossa conversa irá terminar logo. – ela franziu o cenho, confusa. – Você não quer saber como foi que eu conheci o ?
- Ah, sim... – sorriu fraco e seguiu até a cozinha.
“Eu não tenho ninguém.” quis sorrir, mas sua mente a impediu de fazer isso. Ele tentou te matar. Ele mentiu pra você. Ele é um assassino. Você está noiva. Steve, Steve, Steve. Você ama Steve.
Era nisso que ela precisava pensar, era nisso que sua cabeça não deixara de gritar desde que ela colocara o pé naquela casa.
Ela se levantou e caminhou um pouco pelo cômodo, que ainda estava cheio de caixas de mudanças. Onde será que havia morado nesses anos fora? Ao se abaixar na altura de uma caixa, viu o remetente: Canadá.
Canadá? Ele estava tão perto, então? Mas, o que fizera nesse tempo? Como trabalhara? Ela tinha tantas duvidas, mas sabia que nunca iria descobri-las. Nada mais que tivesse respeito a interessava a ela. Não era de sua conta.
Ao arrumar a caixa em seu lugar, viu um metal brilhando e descobriu um pouco o plástico bolha para ver do que se tratava. Uma arma. Ela tremeu e se afastou na hora. Como ela pôde pensar que ele não teria mais daquelas coisas em casa? amava aquilo.
- Ainda vou arrumar tudo isso. – Ele disse, segurando uma pequena bandeja com duas xícaras. se assustou e foi até ele para ajudá-lo com a bandeja. Ela pegou uma das xícaras e se sentou no sofá. fez o mesmo, mas sentou-se na poltrona.
- E então? – deu um gole no café e ele riu. – O que foi?
- Você... – riu, negando com a cabeça. – Mesmo sabendo que eu já quis te matar, toma uma xícara de café comigo, na minha casa... Não tem medo de estar envenenada?
- Acho que você planejaria algo mais emocionante para meu assassinato. Envenenamento é muito clichê. – eles riram fraco, mas logo voltaram a si. – Ahn, me diz... Como foi que você o conheceu?
- Pra começar, acho que você deve saber o que levou a mim e a querermos ter algum contato com gente como ele. – ela suspirou, dando outro gole em seu café. também o fez. – Eu a conheci no colégio, quando tínhamos dezesseis anos... – ele sorriu fraco, lembrando-se. – Ela sempre sofreu em casa. Seu pai era alcoólatra e a batia sempre que seu irmão não estava por perto para defendê-la. Ele era o seu herói. – deu outro gole, mas dessa vez maior. – Já eu sempre fui um garoto feliz, tinha meu pai como o melhor do mundo. O meu exemplo. – pigarreou, sentindo um nó se formar em sua garganta. – Ele morreu num acidente de barco, pra me salvar... – seus olhos se encheram de lágrima e segurou as mangas da camiseta cumprida, desconcertada com a situação. – Bem, eu nunca me dei bem com a minha mãe, mas depois que meu pai se foi, tudo só piorou. Nós nunca nos falávamos, e quando isso acontecia, era para brigar. Um inferno. – suspirou, encarando a xícara nas mãos. – Com não era muito diferente, sua mãe aparecia de vez em nunca em sua casa, ela só queria saber de sair com caras ricos e deixar os filhos com o pai bêbado. – riu sarcástico, ainda com a visão parada. – Resumindo: num dia de bebedeira do pai dela, ele tentou procurar pela filha para amenizar a raiva que sentia da esposa. Mas, quando o irmão de o impediu de ir ao colégio, ele o matou.
levou a mão à boca, surpresa. Seus olhos já estavam marejados também.
- Você deve imaginar como foi para ela... Ele era a única pessoa que a cuidava. Que a protegia. – uma lágrima escorreu por seu rosto, mas ele logo o secou. – Ela foi a pessoa mais forte que eu já conheci em toda a minha existência. Por mais que as coisas tivessem horríveis em casa, ela sorria e dizia que tudo ficaria bem. – sua voz embargou e ele parou de falar por um minuto. – Ela foi o meu chão, o meu porto seguro... – olhou para a outra, que chorava silenciosamente. – Mas nesse dia eu não a reconheci, ela estava péssima. A única coisa que ela queria era uma vida nova, uma nova identidade, novas pessoas, novas oportunidades. havia cansado. A única coisa que lhe prendia ali era Henry, seu irmão, e agora, sem ele, já não havia mais impedimentos.
- Foi aí que vocês o encontraram? – sussurrou, com a voz embargada. negou.
- Depois da morte do meu pai, eu nunca mais voltei a ser aquele garoto que era. Eu já fumava e conhecia alguns caras que não eram tão bonzinhos assim. – riu, sem humor. – Eu e decidimos fugir, e eu procurei por esses amigos que, por algum tempo, nos deixaram ficar na casa deles. Foi lá que eu e ela começamos a ver que o que tínhamos era mais do que amizade... – desviou o olhar, fitando a xícara, que agora estava em cima da mesinha de centro. – Bem, depois de alguns dias na casa desses amigos eles nos levaram ao “chefe” deles.
- Meu pai?
- . – assentiu.

- São eles, . – Carter, um dos colegas de , disse. e estavam sentados num sofá, inquietos. – São bem crus, mas tenho certeza que com um pouco de cuidado serão diamantes. – sorriu orgulhoso.
andou de um lado para o outro, na frente dos dois.
- Me deixe sozinho com eles. – parou de andar, encarando Carter, que assentiu e saiu. – Vejamos... e , correto? – eles balançaram a cabeça, em silêncio. – Vocês parecem tão... Bonzinhos. Não irão me dar prejuízo, irão? – levou a mão ao queixo, pensativo.
- Estamos dispostos a aprender tudo o que nos for ensinado, senhor. – disse, olhando-o.
- Tudo. – deu ênfase, erguendo o olhar para .
- Bom... Muito bom. – sorriu malicioso. – Acho que lapidando um pouco, vocês serão grandes diamantes, como disse seu amigo. – caminhou até sua mesa e sentou-se na cadeira. – Carter já deve lhes ter explicado, mais ou menos, como o meu negócio funciona, não é? – eles assentiram. – Basicamente, eu recebo em vidas o meu pagamento de dívidas. – respirou fundo. – Mas não se preocupem, minhas vítimas são tão criminosas quanto eu. É como um acerto de contas, entendem?
- Quanto vamos receber? - questionou e o outro gargalhou.
- Eu gosto disso, garoto! – riu, virando-se para ele. – Depende do caso, mas em média, dez mil por cabeça. No começo. – piscou, recebendo olhos arregalados. Era muito dinheiro.


- Dez mil?! – disse, incrédula.
- Éramos iniciantes... Quando já se tem experiência, um caso pode ser de até cem mil dólares.

- Carter disse algo sobre aulas de artes maciais, tiros... – disse, batucando os dedos na perna.
- Oh, claro! Vocês terão toda a estrutura precisam. Aulas de tiro, artes maciais, reflexo, teatro...
- Teatro? – perguntou, curiosa.
- É claro! Ou vocês acham que terão a mesma personalidade em todos os casos? Encarem isso como uma peça, onde em cada cena terão de fazer um personagem diferente. – sorriu. – Como dizia: teatro, etiqueta, e mais algumas coisinhas que descobrirão com o tempo. Eu vejo muito potencial em vocês, crianças. – se levantou, indo até eles novamente. – Vocês sabem que esse é um jogo sem volta, não é? – eles se olharam e assentiram. – Sabe... Eu me pergunto o que os trouxe aqui.
- A vida. – sussurrou, entre os dentes. – Chega uma hora que a gente cansa de ser pisado. Temos que pisar também.
- De nada adiantou termos sido tão bonzinhos até hoje. Talvez nos tornando... – procurou a palavra, mas não a encontrou. – Nos tornando espertos, isso mude.
- Essa amargura será boa, quanto mais sangue frio; melhor. – cruzou os braços. – Eu posso confiar em vocês, não posso, crianças? Vocês sabem o que eu faria caso traíssem a minha confiança, sim? – sussurrou, levando o dedo indicador ao queixo de , erguendo-o.
- Sabemos. – respondeu rápido. – Nós seremos a melhor dupla que já trabalhou para o senhor.

- É inacreditável. – deu os ombros e logo após apoiou o rosto nas mãos, pensativa. – É pior do que eu imaginei.
- Isso foi só o começo. – suspirou, arrumando-se no sofá.
- Como foi que aconteceu? A morte dela...
- Quando descobriu que estava grávida ficou perplexa, furiosa, confusa... Com medo. – fungou, passando a mão nos cabelos. – Não gostávamos mais tanto da nossa “profissão” – fez aspas com os dedos. – Mas, infelizmente, a ficha veio cair tarde demais... Ela me disse e depois de pensar muito, decidimos fugir. Passamos toda a gravidez dela fora, viajando pelo mundo... – sorriu nostálgico. – Nós tínhamos certeza que tudo havia mudado, definitivamente. Finalmente éramos felizes! – respirou fundo. – Não nos entediamos tão bem quanto há anos, não como homem e mulher... Mas como amigos, ora, éramos uma bela dupla. – sorriu fraco, observando-o contar tudo. – No final das nossas férias, ela teve a ótima ideia de voltar para Nova Iorque, queria que nosso filho nascesse aqui. - riu irônico. – E, como se tivesse que acontecer, no mesmo dia eu encontrei um dos mandantes do seu pai na praia. Eu... – desviou o olhar. – Bem, é uma parte desnecessária, então vamos pular. – ela franziu o cenho, curiosa. – Eu tive que voltar para o hotel onde ela estava e tivemos de fugir novamente, e como ela queria, voltamos para cá. – suspirou, voltando a encarar a outra. – Enfim, eles nos descobriram e aconteceu uma perseguição. – encarou o horizonte, lembrando-se da cena.

- Merda! – falou, carregando a arma. – São dois carros, . Acabou, acabou!
- Não se eu conseguir chegar a alguma delegacia antes. – disse, acelerando ainda mais o veiculo. abriu a janela e tentou atirar nos pneus do carro, tentativa frustrada.
- Não tá indo muito rápido, não?
- Quer que nos peguem? – ela negou, ouvindo sirenes de policia. Ok, agora seriam três carros atrás deles.
- Que droga, ! – disse chorosa, não estava com um pressentimento nada bom. – Para o carro, a polícia tá por perto, eles não vão poder fazer nada!
- Não confia em mim? – ela suspirou. – Vamos conseguir. – ele sorriu fraco, entrando em uma curva à direita.


Os olhos de já estavam cheios de lágrimas, seu queixo tremia, assim como a sua voz.
- Eu devia ter me entregado... – fungou, sentindo as lágrimas já rolarem por seu rosto. – Ela não podia ter morrido. – sussurrou, passando as costas das mãos no rosto, tentando seca-lo.
- Eu sinto muito. – sussurrou também, com a voz embargada.
- Nós fomos para o hospital... – mordeu o lábio, ignorando o comentário dela. – Aquele que era pra ser o momento mais bonito da minha vida, se tornou o pior. – soluçou, chorando.

- Você foi o melhor amigo que eu poderia ter tido em toda a minha vida. Mesmo com seus erros e defeitos... Você foi o melhor. – disse baixo, dando um beijo rápido na mão de , que não sabia mais o que fazer com aquela situação. Ele estava a perdendo. – Eu fui só alguns capítulos da sua vida... Você ainda tem um livro inteiro para escrever, . – ele negou com a cabeça, olhando-a. A enfermeira mostrou o bebê para e ela sorriu. Menino. – Você vai ter um ótimo pai, filho... – sorriu fraco, fechando os olhos com força.

E quando percebeu, seu rosto já estava sobre as mãos, escondendo-o. Os soluços e ofegos já eram altos, relembrar aquele momento doía tanto. Aquela seria uma ferida que nunca cicatrizaria. Nunca.
continuou imóvel no sofá, mas ela também chorava.
- Ela se foi nos meus braços... – tirou o rosto das mãos e olhou para os braços, ele ainda chorava. – Aquilo doeu mais do que qualquer coisa que fizessem a mim. O seu pai poderia me matar, podia me torturar... Nada se compararia àquilo. – fungou, tentando voltar a si. – Quando fugimos, aos dezessete anos, eu só queria dar a ela uma vida melhor, feliz. Se eu pudesse lhe teria dado tudo o que há de bom no mundo, mas, ao contrario disso, só lhe mostrei o que há de pior nisso aqui. – encarou , que estava com o rosto entre as mãos também, mas ela já não parecia chorar. – Ela era uma garota incrível! Tão forte... eu só não entendo porque ao invés dela, não fui eu? Eu também estava naquele carro, eu devia ter morrido. Ela tinha que ter sobrevivido e cuidado do Aaron... Ter dado a volta por cima. Aposto que ela aproveitaria muito mais isso do que eu.
- Não diz isso. – disse, erguendo a cabeça e olhando-o. – Se você está aqui, existe uma razão. Talvez você não tenha a encontrado ainda, mas existe...
- Talvez já tenha, mas eu não soube aproveitar. – sorriu amargurado. – Bem, depois de algum tempo que ela se foi, eu recebi uma ligação do seu pai.
- O que ele queria?
- Dizer que não me mataria mais. Mas, ao contrário do que pensa, isso foi pior do que tudo. Ele sabe muito bem como nos fazer sofrer... A morte seria muito fácil. – deu os ombros, secando o resto das lagrimas que estavam em seu rosto. – “Aposto que estar vivo e conviver com essa dor é muito pior do que morrer, não é?” – repetiu a frase que lhe dissera.
- Ele é um monstro! – disse, entre os dentes, se levantando e andando de um lado para o outro. – é pior do que eu pensei! – sentiu a garganta queimar novamente. – Eu tenho nojo de ter o sangue dele correndo nas minhas veias! – esbravejou, correndo até a caixa que vira há algumas horas. Ela pegou a arma e se levantou depressa, assustado.
- Como foi que você encontrou isso? Me devolve, . – correu até ela, mas ela deu um passo para trás e apontou a arma para sua própria cabeça.
- Se você der mais um passo, eu atiro. – ofegou. engoliu seco, também com a respiração alterada.
- O que você quer fazer? Para com isso, me dá essa arma.
E mais fácil do que pensara, caminhou até ele e lhe entregou a arma. Ele franziu o cenho e voltou a encará-la.
- Faça o que você tinha que fazer a dois anos. – sussurrou, olhando-o. – Dê ao a vingança que ele merece. Por favor.

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