Última atualização: 12/07/2021

Capítulo Único

A ansiedade é muito abrangente, tudo pode se encaixar em um momento ansioso ou ser o gerador disso, em sua maioria dos casos. E algumas atitudes acabam se tornando comuns, incluindo até mesmo expressões corporais. O corpo fala, expressa e também grita aquilo que a mente está trabalhando. É irrefutável um nervosismo, que também pode se ter base no anseio, quando você está andando de um lado para outro numa sala enquanto está no telefone, falando com alguém. Pelo menos essa foi a análise de quanto ao que estava fazendo naquele momento em sua frente.
Estava sentada no pequeno sofá do escritório dele na enorme mansão no Tribeca, ouvindo-o falar com alguém no telefone que parecia ser de sua família, no seu idioma nativo. Foram poucas as vezes que ela ouviu falar com alguém em coreano e expressar tanto nervosismo e ansiedade daquela forma, além da preocupação evidente em seu tom de voz manhoso. O que a deixou alarmada, preocupada e ansiosa para saber o que estava acontecendo.
Em algum momento da conversa, os olhos de a miraram de forma incisiva, como se o assunto tivesse chegado a ser sobre ela. O fato de que ela não entendia o que ele dizia era o maior ponto para acender aquela queimação no peito, sabia como os pais dele eram extremamente conservadores devido à criação e cultura somados, então sua preocupação era evidentemente relacionada a até qual ponto sabiam sobre o filho.
Estavam conversando sobre a provável promoção que tinha chance de receber ainda no primeiro semestre do ano e que a levaria para chefiar todo um setor de pesquisas da nova filial que a Yhuzek Tecnologies iria abrir no Brasil. Era uma chance única e totalmente desejada por ela há anos, então assim que terminara sua aplicação e últimos testes na empresa naquele dia, correu para a casa do melhor amigo — este que era o CEO da antiga empresa que ela trabalhava. E no meio da conversa o telefone dele tocou com o nome de sua mãe brilhando na tela.
Quando ele finalmente desligou a chamada, sua feição suavizou, mas o corpo apoiado na mesa de tampo de vidro estava rígido. Ela podia ver as curvas delineadas dos músculos dos braços dele, assim como os ombros largos completamente duros e tensos por baixo da camisa azul bebê que usava. se levantou do lugar em que estava e se aproximou, tocando com cuidado o ombro direito de com sua mão esquerda e colocando a sua direita na mão dele.
— Está tudo bem com seus pais? — perguntou preocupada e com seu tom ameno de sempre.
apenas suspirou, fechando os olhos e assentindo levemente, para em seguida virar o rosto e a encarar diretamente nos olhos.
— Eles estão bem. — Se movimentou, virando totalmente de frente para ela, ficando apoiado na mesa com os braços cruzados.
— Se estão bem, então por que você está tenso? — questionou, também cruzando os braços em sua frente.
Novamente, ele suspirou.
— Minha mãe, meu pai e minha irmã virão para New York na próxima semana.
— Isso é incrível! Eles nunca vieram, , vai ser a primeira vez e ainda virão na semana em que você tem o coquetel comemorativo da empresa. — Ela juntou as mãos à frente do peito, animada com a informação.
— Pois é…
Desta vez quem respirou fundo e suspirou em seguida foi a mulher; estava nítida a decepção do amigo com aquela informação e ela se preocupou pela forma desanimada que ele estava agindo com a notícia de que seus pais iriam cruzar o mundo para o ver nos Estados Unidos pela primeira vez desde que ele havia saído de Seul cerca de quase dez anos antes.
Normalmente era ele quem viajava para Seul para ver a família e nunca o contrário.
— Ei… qual o problema? — o perguntou com seu tom mais sério e incisivo.
— Meus pais são conservadores, iniciou, passando as mãos do rosto até os fios de cabelo compridos e as retornando para as bochechas. — Eu não posso apresentar Gus a eles como a pessoa com quem eu planejo ter um relacionamento.
— Mas você não precisa. Não estão namorando.
— Sim, não estamos, mas meus pais acham que pela minha idade já está um pouco tarde para eu ficar postergando um relacionamento. — Levou as mãos para o tampo de vidro, deixando os braços para trás de seu corpo apoiado. — Segundo minha mãe, eu preciso começar a pensar em criar uma família, ter esposa e filhos.
— Espera… Você nunca os contou sobre sua sexualidade? — O vinco no cenho de foi sutil, mas seu tom continuava incisivo.
— Não.
Já conhecia há quase dez anos, o mesmo tempo que ele estava morando na tão famosa terra de tio Sam, mas eram raras as vezes que ele comentava sobre sua família, além de sua irmã mais nova. Dae-Jun tinha exatamente dez anos a menos que ele e era a pessoa que ele mais protegia e cuidava de tudo, mesmo estando longe. E ainda que pouco conhecesse da família , convivendo com em todos os dias da semana, ela sabia desse carinho imensurável do melhor amigo quanto à sua irmã mais nova.
Porém, poderia compreender o que tinha de errado.
— Olha, eu te conheço há tempo suficiente para saber que tem alguma coisa a mais te perturbando aí — disse, dando um passo à frente e movimentando a cabeça para que encontrasse o olhar baixo dele. — Não me faça partir para um método mais incisivo para arrancar a resposta de você.
— Mais incisivo que seu olhar não existe, senhorita Carlson.
riu fraco, dando a volta em sua mesa mais uma vez, se apoiando no vidro com as mãos espalmadas nele. Porém agora ele a olhava nos olhos e parecia menos tenso.
— O que você faria pelo seu melhor amigo em troca de uma viagem para as Maldivas? — a perguntou sorrateiro.
— Para de ser idiota, ! — Riu em resposta, revirando os olhos para ele. — Eu vou para as Maldivas quando quiser.
— É, mas gastando o seu dinheiro.
— Fala logo, você está soando patético assim. — Ela fingiu um bocejo, sentando-se na cadeira de frente com a mesa.
— Minha mãe perguntou quem era a moça que sempre aparece comigo nas fotos e eu mal pude dizer que você é apenas uma amiga, ela me jogou a conversa e se convenceu de que você é minha namorada. — coçou a nuca, esperando pela resposta de .
A gargalhada que ela soltou era alta o suficiente para que todos os empregados da casa escutassem, mas ela não demorou muito rindo, logo quando notou a seriedade na feição dele, parou e se ajeitou meio desconfortável na cadeira.
— Você não está brincando, está? — Arqueou a sobrancelha ao perguntá-lo.
— Gostaria de estar.
Mais um suspiro fora dado naquele escritório, sendo em sintonia, tanto a mulher quanto o homem.
— Me desculpa, mas ela realmente criou isso e quando minha mãe coloca algo na cabeça dela, não há nada que o tire mesmo que a gente tente — notando o silêncio da amiga, ele justificou.
Levou um certo tempo para associar como aquilo poderia ser mesmo sério. Quando o fez, cruzou as pernas e enrijeceu o corpo ereto na cadeira. As mãos suadas foram passadas pelas coxas cobertas pelo tecido grosso da calça social de cor grafite que usava e os dedos trêmulos ali descansaram.
— Pelo jeito eu devo presumir que não vai ter como contar para ela que não é uma nora que ela tem…
— Me desculpa. — O sussurro de a clareou mais ainda nos pensamentos.
— Eu nunca achei que fosse viver o papel da antagonista de uma comédia romântica, — suspirou, massageando as têmporas. — Quanto tempo eles ficarão aqui? E como vai ser a nossa história de casal? Eu faço pesquisas, não sou autora de romances, a criatividade é toda sua.
A gargalhada da vez foi de , enquanto ele dava a volta na mesa novamente. Agachou ao lado da cadeira em que ela estava sentada e pegou em sua mão, entrelaçando os dedos de ambos, enquanto sua destra foi para o encosto do móvel, recebendo o olhar lateral da amiga.
— Será só por alguns dias, mamãe não fica muito tempo longe de casa. Eles chegam na próxima segunda-feira e devem ir embora na outra seguinte — a disse baixo. — Fico te devendo uma ida a Vegas.
O sorriso sorrateiro de cresceu devagar e ela virou todo o rosto para ele.
— É bom você me tratar extremamente bem como sua namorada. Quero flores no trabalho e jantar à luz de velas.
— Anotado, senhorita. — Ele sorriu abertamente para o comentário de , o típico sorriso que fechava seus olhos.
— E nós nos conhecemos em Vegas — continuou o que estava ditando com absoluta certeza. — Não vamos ser um casal totalmente conservador. Estamos em um país americano, tem que ter algo a mais.
— Flores, jantares e Vegas. Algo mais?
— Sem apelidos carinhosos ou eu coloco “It’s Britney bitch” como toque do seu celular e te ligo na frente deles.
— Sua idade mental acabou de sair dos trinta para descer aos quinze. — estava se divertindo e sua feição mais suave quando se levantou.
— Fala duvido que eu faço pior, amor. — Ela também se levantou, indo na direção contrária a dele.
— O que aconteceu com apelidos carinhosos?
apenas o lançou o dedo antes de pegar sua bolsa e ir para a porta de saída, jogando um beijo no ar para antes de sair.


Se alguém perguntasse a Marie Carlson porque aos 30 anos ela ainda não havia se aberto para relacionamentos, não conseguiria dizer exatamente. Mas seu pensamento correria direto a apenas um rosto em específico e este seria o do seu melhor amigo: .
Quando ainda era estagiária no setor de pesquisas de desenvolvimento de softwares na Yhuzek Tecnologies, chegou para trabalhar na divisão do financeiro da unidade, também sendo apenas um estagiário. Acabaram se conhecendo no refeitório do prédio, envolvendo uma bandeja e um copo de suco de uva derramado na camisa branca dele. nunca havia se encantado tanto com a educação e aura serena de alguém na vida antes de se esbarrar com naquele dia.
Como em todo o lugar do mundo, na Yhuzek também não foi diferente, e sofreu muito no início por ser asiático. A xenofobia com ele era tanta que mal conseguia se encarar no espelho por vergonha alheia do que faziam com ele. E , bem, ele aceitou e muito por tanto tempo, já que não queria abaixar a cabeça ou desistir de seu sonho de se tornar um grande CEO.
O irônico de tudo era que a empresa tinha sido fundada no Japão e não era o primeiro coreano a ser transferido para a unidade estadunidense em New York.
No fim, a amizade dos dois se tornou importante em vários pontos.
Entretanto, havia o porém, a linha tênue. fazia de um tudo para ele, sim, não importando o esforço, só que não seria certo colocar somente na conta da amizade que tinham, para ela era algo muito a mais. Ultrapassava a barreira de um companheirismo e alcançava um ponto muito mais íntimo de afeto. Ela fazia e faria qualquer coisa por em nome do amor que sentia por ele desde a primeira vez que os olhares cruzaram.
Tanto faria que ali estava, parada na sala de desembarque da primeira classe do JFK, esperando com ele os pais que estavam desembarcando. Era abraçada de lado pelo nervosismo dele e estava dentro daquele papel de namorada de para que o senhor e a senhora , assim como Dae-Jun, acreditassem naquela mentira criada para proteger a verdade sobre o filho mais velho deles.
Mesmo que seu inconsciente gritasse para que não caísse naquilo, se bloqueou, tirando toda e qualquer realidade sobre querer, na verdade, que quem estivesse em seus braços fosse August Cyrus.
— Sua mão está molhada de tanto suor, já disse para se acalmar, temos tudo bem controlado.
— Quanto mais você tenta me acalmar, menos calmo eu fico — a respondeu, formando um bico em seus lábios, ainda olhando para a porta de desembarque com seus olhos cobertos pelos óculos de sol.
— Você é um homem de trinta e quatro anos que quase faz xixi nas calças por causa dos pais. — Ela riu fraco, tentando colocar humor à conversa. — Relaxa, são seus pais, não ditadores.
virou o rosto lentamente, não a soltando e nem afastando-se, e disse:
— Minha mãe demorou uma vida para aceitar que Dae não irá se casar virgem.
Ela apenas murmurou algo que ele quase não entendeu, mas deu por encerrado o assunto. Seu celular logo começou a vibrar em seu bolso e, se afastando para pegar o aparelho, pôde ver o nome de Gus com um coração ao lado brilhando na tela. Sentiu o aperto comum no peito, mas se manteve no lugar, voltando a encarar a saída do desembarque.
Nesse mesmo momento pessoas começaram a sair por ali.
— Você vai atender? — perguntou para ele, torcendo os lábios em ansiedade.
— Melhor não. Para estar me ligando agora, deve ser alguma coisa na empresa, não posso dar atenção nesse momento. — abaixou os ombros enquanto digitava algo em seu celular, guardando o aparelho logo em seguida.
se lembrava do rosto da senhora por inúmeras razões, mas as principais eram do tanto que frequentava a casa de e também por querer fixar os traços dela em sua memória, queria estar afiada para qualquer interação. Portanto, quando viu o tal rosto bem delineado por entre as pessoas desembarcando, sentiu o frio na barriga gelar o seu corpo todo. A elegância da família de era inenarrável.
— Está pronta? — a perguntou, segurando em sua mão.
— Tanto quanto para receber meu Oscar.
Os dois se olharam e sorriram juntos, cúmplices. Um coração refletia nervosismo e o outro preocupação, mas ambos em contextos diferentes.
Eom-ma! Abba! a soltou, indo de encontro aos dois e dizendo o que ela não entendeu, mas diria que era como chamavam os pais na língua nativa dele.
Ficou por poucos segundos fora daquele círculo, enquanto se abraçavam, cumprimentavam-se e diziam coisas em coreano. Observou a forma carinhosa como abraçou a irmã e a mãe, como foi extremamente educado e cordial ao abraçar o pai, demonstrando todo seu respeito. Se perdeu naquela cena, se aprofundando em pensamentos aleatórios que nem ela mesma conseguiria colocar em ordem.
Estava tão imersa no que presenciava no momento, que mal notou quando os quatro pares de olhos se direcionaram sobre si, acompanhados do sorriso mais sereno e acolhedor que com certeza nunca tinha visto antes.
— Então esta é a adorável ? — a senhora disse em inglês, mantendo o sorriso para ela.
— Sim, mãe, essa é a . — , que estava com seu braço direito nos ombros da mãe, em uma espécie de abraço ladino, também manteve o sorriso. — , estes são meus pais e minha irmã.
Como se alguém tivesse apertado algum botão na americana, ela saiu do lugar, dando dois passos para se aproximar mais do grupo. Ao parar, curvou-se rapidamente e voltou com o corpo ereto, exibindo seu melhor sorriso.
— É um prazer imenso conhecer os senhores — disse, olhando um a um. — E a senhorita — afirmou para Dae-Jun.
— Oh, querida… Não é necessário essas formalidades! Não precisa se esforçar por nós. — A senhora aumentou mais o sorriso, como se achasse não ser possível, e estendeu os braços para abraçar a mais nova. — É um prazer imenso conhecer a mulher que faz o meu filho feliz! — disse no ouvido dela.
Por cima do ombro da mais velha, olhou com os olhos arregalados para , mordendo o lábio no sorriso fechado, enquanto o pai dele a irmã riam de algo, demonstrando como estavam mesmo à vontade e achando graça na forma como a mãe de agia.
— Imagina, o prazer é todo meu, senhora ! — se afastou, sorrindo abertamente de novo e recebeu um cumprimento distante dos outros dois recém-chegados.
— Você é muito mais linda do que nas fotos que posta naquela rede social. — Senhora manteve as mãos nos ombros de , analisando-a de cima a baixo e olhou para o filho. — Espero que esteja valorizando, !
Os olhares de e cruzaram-se, de forma intensa, claro. E por mais que para os demais aquilo carregasse um fardo sobre tantas coisas, que julgadas seriam consideradas erradas, para a família dele foi como se estivessem conversando daquela forma, em silêncio e carregados por uma ligação de amor. Tudo em nome do amor.
Um amor falso.
— Eu estou, mamãe.
Ele disse por fim, quebrando o contato visual e olhando para qualquer ponto que não fosse nenhum deles.
Não demoraram mais ali, foram direto para o estacionamento e dirigiu com destino à ilha de Manhattan, onde tinha sua residência.
Durante o caminho, ouviu de tudo um pouco sobre a infância de , achando uma graça com a mãe dele soava animada e encantada por estar ali com o filho — parecia que não se viam há anos, mas no Natal anterior havia ido para Seul e voltou apenas depois da virada do ano de 2017 para 2018. A senhora a lembrou muito de sua mãe, que estava em New Jersey, e isso a deu um lembrete de que deveria retornar as ligações de Alexia ou depois não teria direitos de reclamação.
Às vezes parecia tão acostumada com sua solidão que mal se lembrava de si.
Ela ajudou a descer as coisas do carro e deu total espaço para que Dae-Jun ficasse ao lado do irmão, não parecia que a irmã mais nova estava querendo demarcar um território ou com algum tipo de ciúmes, ela só queria aproveitar o tempo com o irmão e para isso não tinha problema algum. Afinal, era a família dele.
Ficou quieta a maior parte do tempo, mas porque estava adorando o clima com todos ali e se sentiu muito acolhida pelo fato de dialogarem em inglês por ela, usando bem pouco de termos do próprio idioma nativo.
Estava saindo da cozinha, quando foi recebida na sala pelos quatro pares de olhos mais uma vez a encarando incisivamente.
— Mamãe quer que você fique com a gente hoje, ainda não anoiteceu, mas estão planejando o jantar e-
— Eu não vou aceitar que a minha nora não passe esse tempo comigo, — a senhora cortou , caminhando para perto da recém-chegada.
— Mas… Eu… — Olhou para o amigo, tentando encontrar alguma dica do que fazer, mas falhou na conversa por olhar. — Eu preciso ir cedo para o trabalho amanhã e também não quero atrapalhar o momento de vocês…
— E quem disse que vai atrapalhar? Meu bem, você faz parte da nossa família agora e queremos conhecer mais de você. Durma aqui, sei que isso não é nenhuma novidade para os dois. — O olhar que lhe foi lançado carregava muita influência e um pouco da malícia de sua última fala.
Novamente, olhou para , mas desta vez recebeu o sorriso dele, como se quisesse dizer que estava tudo bem e que ficasse.
— Bem, se a senhora está me pedindo. Não vejo por que não ficar. — Ela sorriu para a mulher em sua frente, recebendo uma comemoração animada.
— Vamos nos divertir muito.
Não conseguiu pensar em outra coisa a não ser pelo aperto em seu peito ao ver a mãe de tão animada e aprofundada, interessada naquela relação e em se dar bem com ela, querendo a conhecer daquela forma. Não queria ser o tipo de pessoa que quebraria o coração e a confiança de uma mulher tão educada e com uma aura tão boa, mas também não conseguia se esquivar daquilo mais. E ainda estava apenas no começo.


— Todos dizem isso — suspirou, colocando o hashi dentro de seu pote de macarrão típico que a família pediu para que ela experimentasse.
— Mas é verdade, . — a beijou na bochecha, estando ao seu lado direito. — Você consegue influenciar qualquer um só pelo olhar.
Estavam em volta da mesa de centro da sala, sentados no chão para aquele jantar que, de repente, se tornou uma sessão de descrição de . Senhora dizia suas primeiras impressões e ia concordando com alguma coisa ou outra; incrivelmente ela estava quase certa sempre, na visão dele, claro. E naquele momento estava se defendendo do comentário que havia feito sobre ela ser uma pessoa completamente influenciadora.
consegue influenciar, de uma forma motivacional, qualquer um à escolha só de olhar!”, foi o que ele disse.
Talvez até fosse, mas ela não se notava uma pessoa assim.
— Então vamos ver qual dos dois está certo… — Dae disse, chamando a atenção sobre si dos quatro pela primeira vez desde que havia chegado. até esteve um tanto preocupada sobre como deveria agir para que a suposta cunhada lhe desse uma abertura, já que ela parecia ser de difícil acesso.
— Ah, obrigado por nos dar o ar de sua graça, senhorita . O planeta a qual estava era interessante?
esperou um pouco para rir e o fez quando Dae deixou o sorrisinho escapar por seus lábios, jogando um sachê de molho no irmão por seu comentário.
— Idiotices à parte… . — Olhou diretamente para a mulher. — Eu preciso decidir sobre uma coisa, não direi o quê, apenas que tenho essa primeira opção em que eu não preciso sair de Seul e essa segunda, que me leva para Austrália. Ambas são do mesmo nível, por isso a dúvida.
prestou atenção em cada sílaba dita, tomando cuidado para não associar nada errado ou confundir-se. Quando Dae finalizou, ela se ajeitou no lugar, passando as mãos nas pernas e umedecendo os lábios, sendo analisada por todos.
— Bem, mesmo que duas coisas tenham resultados iguais, elas trazem consequências diferentes — se direcionou à irmã de , olhando-a diretamente nos olhos. — Você precisa equilibrar isso na hora da escolha. O futuro é como desenvolver um software, você vai em camada por camada, até ter seu resultado para funcionamento.
— Mas isso é básico, o famoso para toda ação, uma reação.
— Sim, portanto você já sabe como fazer sua escolha. — tentou evitar o sorriso ladino. — Se não escolheu ainda, não é porque tem dúvidas, é porque falta coragem. E isso a gente não ganha de conselhos ou por influência alcoólica, o efeito disso uma hora passa. — Levou a mão até a mesa, circulando os dedos ali, se segurando para não ser um pouco menos filtrada nas palavras. — A coragem a gente só ganha na prática, Dae-Jun.
Sorriu para a outra, esperando que não levasse sua fala para o lado pessoal e fizesse daquilo um motivo de desavença. Até porque não havia sido ela a começar aquele papo no meio do jantar, estava muito bem enquanto comia seu Jjajjangmyun e se deliciava com o sabor de algo que nunca havia comido.
O silêncio durou um tanto, fazendo com que se atentasse, sabia que sua irmã por vezes era um pouco ignorante e que sabia ser direta quando não encontrava paciência; pediu naquele momento, mentalmente, que a personalidade das duas pudessem se complementar e não o contrário.
Para alívio dele e de seus pais, Dae sorriu, levantando-se e apontando para , dizendo um tanto aleatória:
— Você gosta de mímica?
— Adoro — respondeu, sorrindo sincera.
— Então vamos jogar, o jantar dos nunca é o mesmo sem terminar em mímica.
Ela saiu em direção ao interior da mansão, talvez indo pegar algo em suas coisas e enquanto isso os quatro restantes ficaram no mesmo lugar.
— Obrigada, .
— Pelo quê? — Ela ficou confusa pela pergunta do senhor .
— Dae-Jun está com dúvidas sobre ir para a Austrália-
— E ela insiste em dizer que ficar em Seul teria o mesmo efeito. Mas não tem — Senhora o cortou, ela parecia um pouco esperançosa. — Diferente de , ela tem dificuldades de se desprender de nós dois.
saiu de casa muito fácil e sem olhar para trás direito — o pai dele continuou. — Enquanto Dae tem essa dificuldade de passar uma noite fora na casa de alguma amiga ou família.
— Claro, vocês a criaram assim — mal notou quando abriu a boca e disse, pois fez isso no mesmo instante que levou mais macarrão para dentro dela. — O que foi? Dae-Jun é mais mimada e foi criada mais próxima de vocês do que eu, principalmente da fase da adolescência em diante.
apenas ouvia, não sentia que deveria se posicionar ou algo do tipo. Então pediu licença para ir ao banheiro e fez o caminho pelo longo corredor, parando na suíte de . Entrou tranquilamente e fez o que precisava fazer, porém, sentindo-se extremamente cansada, caiu na cama quando estava voltando e ali ficou.
Seu corpo estava tão pesado que mal notou o sono em que caiu, acordando apenas quando sentiu-se ser tocada firmemente nos ombros e na cintura. Abriu os olhos, vendo o rosto de tão próximo ao seu, sentindo a respiração dele bater em sua pele e o hálito pelos lábios entreabertos esquentar a região de seus lábios.
— Olá, dorminhoca…
Ele riu fraco, sorrindo abobado. Ela fechou apenas um olho e manteve o outro aberto.
— Por quanto tempo eu dormi?
— Umas três horas, considerando que você saiu do nosso círculo de jantar e não voltou para o jogo. — se afastou, sentando-se no espaço ao lado dela na cama. — Desculpa, jogamos sem você. Mamãe não me deixou te acordar e Dae-Jun até me ameaçou te contar sobre minha fase namoradeira em Seul.
— Eu diria a ela que a tal fase não ficou só em Seul. — estava com a voz rouca e foi se sentando devagar, acostumando-se a ficar com os olhos abertos e a pouca luz do quarto pelo abajur do seu lado.
Porém, não conseguiu evitar franzir o cenho quando reparou que ele estava com outra roupa, diferente da do jantar e parecia ter tomado banho. estava vestido para sair.
— Vai sair? — perguntou baixo.
— Meus pais foram para o quarto já, eles só sairão de lá amanhã agora… Vou aproveitar para ver Gus — ele explicou animado. — Você sabe que pode ficar à vontade aqui, sim?
Ela apenas concordou com um aceno positivo de cabeça e ele beijou sua testa.
— Volto logo. Mas não me espere.
Enquanto o via sair, tendo apenas a visão das costas largas cobertas por uma jaqueta jeans, suspirou. Ela havia mesmo pensado que não iria até Gus naquela noite e ficaria com ela?


O restaurante era cheio de requintes e agradeceu por todas as aulas de etiqueta que foi obrigada a fazer por conta da necessidade de muitas reuniões de negócio, devido à sua colocação na empresa. Principalmente durante o período de seleção — ou bajulação, como gostava de classificar — para a vaga de chefia na unidade sendo aberta no Brasil. Para ela, todo esforço valia a pena. Chefiar todo um setor de pesquisas era seu sonho de realização profissional e pessoal.
Mas não era bem o ambiente que fazia tudo estar um pouco diferente e mais intenso para ela.
— Bem, já que estamos todos aqui tranquilos, posso dizer que… — a olhou profundamente e ela conhecia bem aquele olhar, era ele pedindo desculpas.
Senhora sorria abertamente, Dae-Jun tinha seu semblante descontraído e o pai de parecia estar o incentivando a algo apenas com o olhar. saiu da cadeira ao lado de e com delicadeza puxou a dela, afastando um pouco da mesa para ajoelhar ao seu lado.
O coração de parecia querer sair pela boca e ela estava perdida na maré alta de pensamentos. Sabia muito bem o que aquilo significava.
… — ele iniciou, puxando a mão dela de forma cordial. — Eu não sei de muitas coisas sobre o amor, mas sei que ele é como o céu. Às vezes está claro, às vezes escuro, mas sempre lá e com coisas que não podemos mensurar; e o que sinto por você é esse amor, é um céu. Tão vasto quanto.

A súplica de estava nas entrelinhas, mas ele não poderia saber, seu momento era banhado em uma mentira que ela mesma havia ajudado a crescer. não sabia o que fazer com aquelas palavras naquele momento, poderia ser verdade, poderia sim significar tudo o que disse, mas na conotação contrária. Aquilo que era dito, em um tom possível para todos no restaurante ouvirem, ainda mais pela calmaria do local, seria o que diria a Gus quando fosse pedi-lo em casamento.
apenas pegou aquela carruagem a 100km/h e tentava arrumar um lugar para se sentar.
Mas ela poderia ter esperado outra, uma mais lenta e que visse para ela com o destino certo, com seu nome na lista de passageiros e tudo. Porém, conscientemente ela se apressou e não quis optar por outra.
Ela queria , fosse como tivesse de ser, mesmo que doesse.
Marie, gostaria de ser a futura senhora ?
Era uma bigorna caindo em cima de seu corpo, os olhares, sorrisos e animação visível dos demais soavam como uma plateia ovacionando um discurso de dor. Para ela, não tinha nada mais constrangedor de forma pessoal do que emitir aquele sorriso imenso, para dizer um audível “Sim”.
Tão pesado quanto, foi o anel em seu dedo, somado ao beijo em seus lábios que fora dado por incentivo de uma mãe completamente animada.
tinha perdido o controle devido a um amor falsamente correspondido.


Os corredores da empresa pareciam distorcidos, sua sala nunca esteve tão longe do hall de entrada do corredor. caminhava sentindo-se perdida, mesmo que soubesse para qual direção seguir. Sua cabeça parecia estar implodindo com a quantidade de pensamentos que estavam lhe consumindo, como se fossem múltiplas rodadas de refrigerante de graça em alguma lanchonete no Queens.
Não saberia dizer posteriormente as pessoas que a cumprimentaram no caminho que estava fazendo, quem foi que lhe abraçou, os que apenas disseram alguma palavra de conforto, nem mesmo diria se lhe perguntassem como de fato estava se sentindo. Talvez a resposta correta seria dizer que estava apenas afogada.
Isso, sentia-se dentro de um tanque com água fechado. Usando uma bigorna nos pés, claro.
Quando alcançou a maçaneta da porta de sua sala, ouviu a assistente lhe dizer algo, mas apenas a deu um sinal com a mão, naquele momento ela não iria filtrar educação. Mal conseguia organizar as próprias ideias consigo. muito menos sabia em que ponto tudo começara a dar tão errado em sua vida, que não saberia viver presencialmente com ninguém. Por como se sentia, se fosse colocada dentro de um vidro e guardada para depois, daria graças aos céus.
Ficou paralisada no centro de sua sala, com as mãos na cintura e tentando controlar a própria respiração por aquele pânico iminente. As lágrimas começaram a sair e o grito ficou entalado na garganta. Como assim, depois de tantos esforços e estudos, horas trabalhando, pesquisas concluídas com excelência, ela não havia sido escolhida para a promoção? E desde quando Gus era o funcionário exemplar de toda a unidade?
A sensação de você perder algo por tanto que queria era algo do qual ela não tinha se preparado para vivenciar. Talvez fossem as últimas semanas vivendo com a família de sob aquela mentira de noivado que, pelo contrário, estava tão mais real do que tudo que ela já tinha vivido antes. De certo isso a afastou da própria realidade, não a preparando para não ser escolhida; porém, reconhecia o próprio potencial, a capacidade alta em âmbito profissional.
Estava tudo uma bagunça.
Além de sua vida profissional, a pessoal tinha aquele drama da mentira construída. a pediu em casamento porque, segundo ele, houve a pressão da família e ele não tinha como se esquivar. Obviamente ela se enfureceu por não ter tomado conhecimento disso antes e é claro que não negaria na frente de todo mundo; além de que ela precisaria negar, ainda naquele dia estava aguardando a resposta de sua aplicação. O que, no fim, acabou servindo para uma desculpa para não seguirem com aquela ideia de casamento.
Entretanto: não haveria promoção, não se mudaria para o Brasil e quem iria em seu lugar era Gus, aquele cujo anel em seu dedo era o destinatário futuro — já que amava-o.
Então teve toda essa confusão e agora ela não teria como sair daquilo. Mal se reconheceu vagando o pensamento pelos últimos dias, tão próxima e querida pela senhora , conseguindo a encarar como se não estivesse mentindo para ela; Dae-jun e as conversas sobre decisões importantes que ela gostaria de tomar e queria entender como ser mais corajosa. E tinha sua mãe… Alexia parecia bem atenta ao repentino noivado dos dois e mesmo que demonstrasse apoio, não soava tão convencida.
se sentia criando uma ladeira cada vez maior para si, tornando difícil a subida de volta à superfície.
O que ela tinha criado para a própria realidade?
Era isso que se tratava amar? Se tornar alguém que não é e nunca pensou ser, apenas para que o outro fosse feliz?
E por que ela não conseguia ser verdadeira e se abrir para ? Era medo de perdê-lo? De perder aquela mentira que ela mesma estava alimentando?
Havia algo em que escondia dela todas as próprias fraquezas que tinha. Ele a fazia sentir-se confortável, protegida e feliz. Era seu maior confidente e não existia uma memória dele a fazer sofrer, pelo contrário. E tudo o que estava fazendo era conscientemente.
Ou não, apenas movida pelo amor que sentia por seu melhor amigo.
Buscando uma forma de extravasar, apenas se moveu em direção à própria mesa, passando os braços ali e jogando tudo ao chão. As lágrimas deixaram sua visão embaçada, mas ela conseguia enxergar tudo o que estava destruindo. Naquele momento iria lidar apenas com a frustração pessoal, mesmo que sua reação estivesse um tanto influenciada pela comoção geral do momento de sua vida.
havia perdido o controle de algo que ela achava que poderia controlar. Mas ela se esqueceu que na vida não existe um volante do qual você possa dirigir tudo para a direção desejada.


— Está bom assim, querida?
— Sim, senhora Flick, está — suspirou em cima do pequeno quadrado em que estava, de frente ao enorme espelho, se encarando naquele vestido feito sob medida.
O vestido do seu casamento com que logo chegaria.
Logo não, dali a duas semanas.
— Uau…
Pelo reflexo do espelho, ela viu a senhora entrar naquela sala reservada, elegante como sempre e dona de uma aura sem igual. Os ombros relaxados e o sorriso de orelha a orelha que era capaz de acalmar qualquer tempestade interna alheia deram para um pontinho de alegria novamente.
— Senhora . — Se curvou levemente, cumprimentando-a cordialmente.
— Me desculpe o atraso… Dae-Jun me pediu para deixá-la em um lugar e nem eu e nem o motorista sabíamos que seria tão longe — ela se explicou, fazendo o caminho para se aproximar mais de onde estava. — Perdão pelos meus modos, como vai Alexia? — cumprimentou a outra educadamente.
— Estou bem. — Alexia se levantou, sorrindo. — Íamos te esperar, mas a senhora Flick tem mais outras noivas hoje e o horário está bem apertado.
— Ah, sem problemas! Fizeram bem em começar sem mim.
Senhora terminou o curto espaço que a distanciava de , olhando-a ali em cima tão admirada. Pegou na mão da mulher, com seu sorriso genuíno e cheio de esperanças, parando em sua frente.
— Você está linda, minha querida, e… — Olhou emocionada para Alexia. — Obrigada por uma filha tão… Linda de dentro para fora. — E sorriu.
Aquilo cortou o coração de em tantos pedaços, que somente um aspirador recolheria tudo sem deixar rastros, mas não os trazendo juntos, colocando em ordem novamente. O olhar da senhora encontrava nela uma verdade que ela sabia não estar entregando e isso a fez questionar o próprio caráter.
Como e quando ela iria ser honesta, não só com a família , mas com ela mesma?


O peito subia e descia em um ritmo fora do normal. se encarava naquele espelho, tentando encontrar a coragem que a tinha levado até ali, porque para estar naquele momento sentada, usando o vestido de noiva exclusivo que fora feito para ela, só mesmo um ato corajoso. Mas ela já estava ali há um tempo, um bom e demorado tempo, aliás.
Toda a equipe havia sido dispensada para que ela ficasse sozinha em seu próprio pedido por um momento a sós, sem nem mesmo seus pais. Ela precisava daquele instante para ter total certeza do que estava fazendo — um pouco tarde talvez?
A mansão alugada em Manhattan para receber a cerimônia e a festa do casamento estava cheia; familiares de haviam cruzado o mundo para que pudessem prestigiar o casamento, assim como os pais dele que não foram embora da vez que haviam chegado a New York pouco mais de cinco meses antes. Tudo tinha passado extremamente rápido e ela mal teve tempo de assimilar o que estava fazendo, apenas o fez quando passou a ser tarde demais dar passos para trás sem que ferisse alguém. Porque, afinal, como ela não iria ferir a senhora se desistisse naquele momento?
Não se tratava mais de proteger e por um lado ela deveria estar protegendo a si também. Mesmo que na pior das ações ela estivesse fazendo tudo sem qualquer resquício de maldade. Entretanto, na dor, na decepção, ninguém julga o outro sem levar isso em consideração.
Logo, estava protegendo a todos.
Olhava para o seu próprio reflexo quando a porta foi aberta de um modo bruto, saltando no próprio assento.
, o que é isso? — A voz de era alta e ele fechou a porta, trancando-a.
— O quê? — se manteve no lugar, olhando-o pelo reflexo do espelho.
— Você… Já deveria estar se preparando para descer e está aqui, atrasada.
Ela suspirou, levantando-se. Juntou a saia do vestido, tomando cuidado com o véu, e parou próxima a ele.
, o quão sério você está levando tudo isso? — Não hesitou na pergunta.
— Oi?
Continuou o encarando, como se não se sentisse obrigada a dar a ele mais um fio de caminho para o que tinha de fazer. precisava encontrar sozinho as próprias respostas e encontrar soluções sem que fosse ela sempre a entregar para ele tudo de bandeja e pronto.
— O que você quer dizer? — Já o tom dele, sim, transparecia hesitação. E medo, claro.
— Você está levando isso como algo comercial ou uma coisa completamente séria, em que envolve toda a sua família que está lá fora junto com a minha? — soltou de uma vez, mantendo a mesma pose séria e firme. estava juntando toda sua frustração com as milhares de “paranoias” em sua cabeça para centralizar aquela conversa.
Que era extremamente necessária, sim.
— É claro que estou levando a sério, o contrato é justam-
— Ah, o contrato… Achei que disse estar levando a sério.
Ela riu amarga com aquele tópico. O contrato pré-nupcial que a pediu que assinasse apenas por “precaução” e formalidades. Dentre as cláusulas impostas, não poderia contar a ninguém a veracidade daquele casamento e teve que assinar, colocado por escrito, que aceitava o que vivia com Gus.
Porém, a parte de Gus, ela somente assinou por compaixão. Sendo a única vez da qual agiu por pena do melhor amigo.
— Mas eu estou. — passou a mão no rosto, firme, parecia cansado. — , por que isso agora? Você não quer algo que esteja nele? Achei que tínhamos entrado em um acordo comum. — A encarou novamente, cético daquela conversa.
— Na verdade, nós entramos, mas o tempo passou e isso aqui tomou uma proporção maior. Tem um vestido branco no meu corpo, eu estou com camadas e camadas de maquiagem e meu cabelo está completamente arrumado e pronto, tudo isso para eu subir no altar e me casar com o meu melhor amigo.
Enquanto o ditava, ela sentia o corpo tremer e a cada coisa enumerada, poderia jurar que saía de si com repulsa. Como se estivesse extravasando de fato toda sua confusão mental e decepção consigo.
— Só que a única parte realmente envolvida nisso tudo sou eu — completou quando notou que ele estava sem resposta.
— Para qual ponto estamos chegando? — deu mais um passo à frente, olhando-a nos olhos.
— No que eu te digo todas as verdades e desisto. — A resposta veio mantendo aquela troca de olhares intensa.
— E qual é a verdade?
— Eu tô cansada de viver esse amor — assim que proferiu o que veio à sua mente, sentiu o peito doer menos. Então continuou: — De fazer tudo por você e para você. Eu simplesmente tô esgotada, . Cheguei ao meu limite de esgotamento quanto às mentiras que crio para você.
… eu preciso de você, não faz isso — pediu manhoso, com o medo ainda transbordando em si.
— Não, você precisa de uma trouxa fazendo tudo para que você seja feliz. E uma trouxa que esteja completamente apaixonada por você, se anulando como eu tenho feito todos esses anos.
O silêncio aconteceu. se sentia leve, a bigorna, que por muito a segurou, tinha sumido. Se sentia firme no lugar e ainda sem qualquer resquício de hesitação, porém, ainda não encontrava em si alguma ideia de se movimentar para fora dali no sentido contrário ao altar.
Estava dando apenas um primeiro passo. Confessar era o que iria a tirar daquele martírio, sabia disso, então fazer isso pareceu certo naquele instante.
— Você não podia ter se apaixonado — sussurrou.
— Não? Então tá ok, a gente para com tudo agora. E eu vou viver outra vida, esquecendo você.
Vê-la se distanciar fez o coração de queimar. Não era o medo de perder aquilo que estava prestes a concluir, o casamento chegou a ser o menor de seus problemas se comparado a perder . Uma pessoa importante que ele estava negligenciando por uma indecisão e medo na vida, envolvendo-a em algo que ele precisava ter lidado sozinho desde o princípio.
Mas estava certa sobre coragem, isso sempre fora algo conquistado na prática. sabia que mesmo tendo conhecimento sobre o que era certo, ainda não conseguiria agir de acordo, entretanto, não poderia continuar maltratando . Ainda mais agora que sabia sobre o que ela sentia. Se fez tudo por ele em prol da amizade ou pelo outro sentimento, não fazia importante diferenciar, de qualquer forma ele teria que fazer diferente com ela.
Afinal, foi quem o fez se firmar na vida que vivia. Devia muito a ela, principalmente a gratidão.
— Eu não sei viver sem você, — iniciou, olhando-a de costas para si. — Não quer entrar naquele altar? Tudo bem, eu não vou te obrigar, mas pelo amor de Deus não me deixa. Não vai existir perdão suficiente se eu deixar você ir embora assim, sem tentar consertar todas as besteiras que fiz com você.
— Mas você vai ter que aprender a viver sem o Gus — disse sem pensar muito nas consequências. Mal se lembrando que não deveria tocar nesse assunto, já que ele ainda não sabia sobre a promoção do outro, porque o próprio não tinha contado.
E não seria ela a detentora da notícia ruim.
— Por-
— Uma hora a sua família vai pedir netos e o que vai dizer? Uma hora teremos compromissos com eles e Gus não vai poder te acompanhar. Uma hora teremos férias para passar em Seul. Em algum momento disso aqui, , as coisas terão que ser mais sérias e mais bem encenadas — justificou da melhor forma que pôde.
— E como tudo isso aconteceu? Sempre fomos apenas amigos e-
— Você escolheu se apaixonar pelo meu colega de trabalho, ? Você escolheu todas as suas paixões anteriores?
Ficaram em silêncio, se encarando.
— Eu sei que tudo saiu do seu controle, mas estamos tratando da vida real. Sentimentos reais.
— Me desculpa… — Ele deu um passo para trás, sentindo como se estivesse com uma âncora amarrada em sua perna. Precisava urgentemente rever todos os seus conceitos e como havia sido ridiculamente cruel com a pessoa que sempre o apoiou e deu amor sem pedir nada em troca. precisava encontrar um jeito de consertar tudo e se tivesse essa chance ele com certeza o faria.
— Ninguém precisa se desculpar aqui, você não me obrigou a fazer as escolhas que fiz, eu estava totalmente consciente; assim como eu não tenho culpa por ter me apaixonado por você.
deu os poucos passos à frente, quebrando novamente a distância. Sentia que poderia explodir a qualquer momento.
— Eu vou te esperar lá embaixo, independente da forma que for, no altar ou fora dele eu vou fazer diferente e… Não vou te fazer criar mais nenhuma mentira.
Não a deu tempo de responder, apenas deixou um beijo em sua testa e saiu, deixando-a sozinha.
deixou o corpo cair novamente na cadeira em frente à penteadeira com o espelho que tanto encarou durante aquele período de arrumação. Chorava como há muito não fazia, sentindo-se perdida de si, ainda sem aquele resquício de impulso para jogar tudo para o alto e ir embora, porém.
Não conseguia acreditar mais no que estava lhe prendendo ali. O que exatamente, porque eram tantas coisas.
Ouviu um barulho de descarga sendo dada e um pouco tempo depois a porta do banheiro da suíte em que estava foi aberta. Ergueu o rosto minimamente e sentiu o frio na espinha.
— A senhora estava aí… — disse à sua mãe, tentando limpar o rosto.
— Sim, eu não cheguei a sair. Quer conversar?
a olhou de baixo, revelando os olhos iluminados pelas lágrimas que queriam escapar. Pôde sentir na feição de sua mãe que ela sabia sobre tudo, mesmo que nunca tivesse sido colocada a par de toda a situação.
— Eu sinto que falhei com você em algum momento. — Alexia se aproximou, sentando-se ao lado da filha, em uma cadeira que puxou. — Você merece ser feliz, , por que não enxerga isso?
— Isso não tem nada a ver com a senhora ou o papai. E… bem, eu sou feliz.
— Como? Fazendo o outro feliz e você não? Como você fica nessa história toda, ? — O tom de sua mãe era completamente exasperado, como se estivesse sendo sufocada pela ideia de todo aquele fato envolvendo sua filha.
— Mãe… — a chamou, olhando diretamente em seus olhos. — O que a senhora não faria pelo papai? — O silêncio da mais velha foi longo. — Pois é isso, não tem nada que eu não faria. E eu não vou deixá-lo sozinho, a solidão é cruel.
— A família dele está aqui, os amigos e até mesmo o Gus.
— Gus vai embora, foi ele quem ganhou a promoção, não eu. — Sorriu fechado, apenas querendo que sua mãe acreditasse que estava tudo bem.
— Você tem certeza de que vai ficar bem assim, ? É a coisa mais dolorosa para uma mãe ver seu filho recolhendo restos de felicidade.
Mesmo que a fala de sua mãe estivesse sendo dura, ela não se sentiu colocada para baixo. Seu sexto sentido passou a gritar que aquilo seria a coisa certa, passando por cima de sua razão que há pouco fora exposta. A emoção queria que fugisse, que fosse para as colinas chorar e se lamentar, porém ela permaneceria ali e cumpriria com seu objetivo.
não tinha em sua vida uma ideia em que não estivesse ao seu lado e preferiu acreditar que continuar o que fazia, na analogia de regar uma planta que não iria florescer, seria uma forma de tê-lo. Uma hora, em sua cabeça, a insistência teria algum resultado e ela poderia colher finalmente o que plantava.
Se tratava de uma fé, não de sonhos.
— A senhora acha que consegue me apoiar? — Sentiu a lágrima solitária rolar pela lateral de seu olho e quando sua mãe sorriu para sua pergunta, o peso da bigorna em seus ombros esvaiu-se.
— Eu sou sua mãe, na saúde e na doença, na tristeza e na alegria, riqueza ou pobreza e nem a morte nos separa. Sempre estarei aqui por você, minha filha. É um casamento sem divórcios.
Então ela deixou que a enxurrada caísse por seus olhos novamente, deitando a cabeça no ombro de sua mãe e chorando tudo o que estava quebrado dentro de si. Mentalmente lidou com sua decisão, totalmente firme no que tinha ajustado em seu sistema e se preparando para o que a vida lhe traria em consequência da escolha feita.
— Acho que vou precisar refazer toda a maquiagem — disse, ao se levantar, passando os dedos abaixo dos olhos com cuidado. — Espero que a senhora não fique chateada por eu fazer do meu jeito.
— Ela não irá. Quando ver você linda desse jeito, parecendo ter saído de um conto de fadas, vai pensar em qualquer outra coisa…
riu com o comentário de sua mãe, soando mais “mãe” possível. Caminhou até a penteadeira que havia se arrumado mais cedo e começou a tirar a maquiagem borrada, enquanto continuava o trabalho mental de blindar-se novamente.
Podia não se lembrar mais como tudo aconteceu e como foi para chegar até ali, como se estivesse dentro de uma rota perdida, mas esconderia suas fraquezas e não iria mais fingir ser forte, ela passaria a ser de fato e diria sim naquele altar. Diria sim para a planta que um dia ela tinha fé que iria florescer.


FIM



Nota da autora: Olá! Obrigada por ler e, se possível, não esqueça de comentar. É muito bom saber o que você achou da história. Espero mesmo que tenham gostado! Por último, aqui tem o link onde você consegue acompanhar a autora pelo Instagram e entrar no grupo dos Leitores da May 🎈.



Nota da beta: Minha nossa, May. Eu fiquei tão imersa na leitura dessa história que no final eu até berrei com essa decisão da pp. Não sei como lidar com ela na real. Eu entendo super ela amar o pp a esse ponto, mas fiquei aqui implorando pra ela ter também um pouquinho de amor próprio. Eu honestamente adoraria ver uma continuação pra saber o que aconteceu depois desse casamento.
Enfim, você arrasou como sempre. Eu amei! <3

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