02. Habit

Finalizada em: 13/07/2023.

Capítulo Único
Prólogo

Seul, 2018.

— Eu sei que as expectativas são criadas dos nossos próprios desejos. — se virou na cama, enrolando-se no lençol e acabando atravessada por cima do tronco de . Em resposta, ele apenas resmungou, continuando a tragar o cigarro entre seus dedos enquanto ela iluminava o próprio rosto com um sorriso, olhando para o teto. — Mas eu queria te pedir uma coisa. Uma única promessa.
— Se você vai me pedir, vai deixar de ser genuíno. Promessas devem partir de livre e espontânea vontade. — ele disse baixo.
— Não me interessa. Eu vou te pedir para prometer e você vai prometer, porque sou eu te pedindo. — ela riu, fingindo seriedade.
— Por livre e espontânea pressão, senhorita. — acompanhou o riso fraco, usando a mão livre para acariciar a cabeça de Maya. — O que você deseja?
— Muitas coisas. Mas a principal delas é que não importa o que aconteça, mesmo que a gente não acabe saindo disso aqui — gesticulou se referindo ao quarto. —, não vamos nos afastar.
— É um pedido muito melancólico. De onde vem isso? — o tom dele mudou.
— Da nossa rotina, . — suspirou, fechando os olhos.
— Não gosto dessa conversa. A garganta até secou.
— Isso é culpa do cigarro que você acabou de fumar. — revirou os olhos ao abri-los. — Estou falando sério, neném.
— Não tem como você falar sério sobre um término hipotético me chamando de neném, neném. — ainda sem dar asas à mais uma conversa desse porte, parou com a carícia para tocar a ponta do nariz dela, mas pelo o que ele disse, se levantou rapidamente, preocupada em se cobrir da visão dele ao se sentar.
— Para haver um término é preciso uma relação consumada.
— O que fizemos agora a pouco não foi consumar uma relação? Inclusive, fazemos isso há muito tempo.
— É exatamente isso, . — o encarou sem qualquer expressão. — Nós fazemos isso há muito tempo.
— Mar-
— Me prometa. Eu não tô te pedindo para não me deixar, ficar comigo, casar e ter filhos. Estou pedindo apenas para não se distanciar. — sendo rápida, o interrompeu. Dessa vez foi ela quem acariciou ele, no braço descoberto e agora todo arranhado por seus reflexos. — Posso lidar em ser apenas sua amiga. Mas não vou conseguir lidar com a sua ausência.
Silêncio. ficou em silêncio. Isso não seria incomum para ele, mas também não era algo completamente aceitável para ela, mesmo conhecendo-o a ponto de saber que era um pedido absurdo.
No fundo, esperava que ele entendesse o pedido, a sua última tentativa.


Seul, 2022.

Nem sempre tudo o que reluz é ouro. Nem em toda ocasião o que parece certo, de fato está. Um corpo é apenas uma casca para o que se esconde por dentro. E é possível esconder até de si mesmo o que realmente sente, como estão as perspectivas sobre tudo. havia aprendido que as chances tinham mais exatidão do que os raios, porque elas verdadeiramente não surgiam mais de uma vez no mesmo lugar.
Quatro anos se passaram desde que ele tinha visto sua última oportunidade passar por debaixo dos seus olhos, pela superfície de seus toques, e ele ainda não conseguia enxergar qual era o ponto em que estava o seu erro. O que havia acontecido por parte dele para que saísse por sua porta e nunca mais voltasse, ao menos não como das vezes passadas, considerando que o contato permaneceu, mas somente pelo fato de haverem amizades em comum.
Agora ele estava preso em sua própria consciência enquanto admirava cada detalhe do grande dia dela.
O casamento de .
Um casamento que poderia ser dele se tivesse tido sabedoria para aproveitar as oportunidades que teve.
Mas não haveria muito o que fazer, ela já tinha tudo pronto, ele não conseguiu nem mesmo se levantar quando foi dado a chance pelo celebrante de alguém dizer o que tivesse contra a união e agora ela estava oficialmente casada e com os votos trocados, aproveitando a festa chique, rica em detalhes que ele tinha total conhecimento fazerem parte do sonho dela.
Conhecia muito bem todos os gostos de , sabia que cada item foi selecionado pela exigência dela com a paleta de cores que combinariam, de acordo com as ideias em sua mente referindo-se ao grande sonho de sua vida. Sonho este que não pôde fazer parte, ao menos não da forma que ele — tardiamente agora — achava que deveria e que poderia ter sido se não tivesse sido tão vagaroso, acreditando que viveriam para sempre a mesma relação e que para ela seria o suficiente.
Embora tenha deixado muito claro que não seria.
! — a voz estridente de ecoou em seu ouvido. Ele abandonou o copo de uísque ainda com a dose cheia e, mantendo a outra mão no bolso fechada em um punho de nervosismo, se virou para o colega de profissão, ao lado dele estava o noivo. Segunkwan sorria entorpecido pelo seu momento. — Vamos tirar as cem pratas desse bolso, cirurgião?
Um riso escapou pelos lábios entreabertos de , mas não foi tão suave, saiu amargo como o uísque envelhecido que ele estava bebendo.
— Qual é, ? — passou o braço por cima dos ombros dele. — Sabemos o que você esconde nessa carteira, aí! — apontou com a mão que segurava seu copo de uísque, a bebida oficial dos solteiros naquele grande salão. — Você tem a maior receita daquele hospital, homem!
— Você é a esperança dos noivos. — insistiu, ele segurava a gravata de , que já estava bem picotada pela dinâmica inventada por um deles de vender os pedaços para os convidados, a fim de incrementar o saldo para a lua de mel em Bali.
Era o sonho de , ele sabia. Ela passava horas lhe dizendo o passo a passo de como seria sua estadia perfeita em Bali, na Indonésia. E realmente seria perfeito, ao menos agora ele sentia isso, ele queria isso, mas quem iria viver essa oportunidade era , o cirurgião geral que passaria a dividir o quadro de cirurgiões chefes do Madison Seattle Medical Center com ele, numa transferência de hospital a fim de ficar mais perto da (agora) esposa. Não bastasse sua falha em ter deixado passar, agora ele teria que conviver com aquele que foi capaz de levá-la dele.
— Vamos! Não vai doer como um bisturi de lâmina dez…
— Certo. — , se dando por vencido mais uma vez, sacou a carteira de dentro do paletó. — Mas eu não quero o pedaço disso aí. — colocou na bandeja quatro notas de cem dólares.
— Não! Não existe isso. — , quase trocando letras, pegou a tesoura para cortar o pedaço de pano em um tamanho grande. — O que é justo, é justo. — enfiou dentro do bolso da calça dele.
Então, felizmente, puxou para seguir adianta na caçada, infelizmente deixando um pedaço assombroso para segurar e sentir-se enojado. Talvez em uma outra hora ele iria usar isso como motivo para se lembrar do quão ingênuo havia sido em sua vida, mesmo que a memória de vestida de noiva fosse mais forte e dolorosa que um pedaço de pano — na verdade, tudo o que viesse seriam complementos para a sua tortura.
Observou a saída dos colegas de trabalho, bêbados demais a ponto de fazê-lo rezar para que nenhuma emergência surgisse e fosse necessário todo o corpo cirúrgico do hospital. Deixou o copo em cima da primeira bandeja que passou em sua frente, mesmo com conteúdo, e logo que sua vista ficou livre novamente, viu o sorriso de em sua direção.
O sorriso mais lindo que ele já tinha visto.
O sorriso mais lindo que um dia foi direcionado a ele, mas de uma forma diferente em relação àquele instante.
O sorriso mais lindo que ele tardiamente deu valor.
Sentiu seu estômago embrulhado, o coração acelerado e a vista um tanto embaçada — não diria que eram lágrimas presas.
— Olha só para você! — chegou, por fim, bem perto. — Eu acabei de te ver devolver um copo com uma dose cheia de uísque! O que está acontecendo?
— Você muda vidas. — ele riu ao devolver uma resposta. As duas mãos jamais sairiam dos bolsos, em que um ele segurava com ódio o pedaço de pano, e na outra apenas fechava o punho nervoso. Se as tirasse dali, com certeza cometeria uma loucura e levaria para o mais longe possível.
— Que bom saber que ao menos um cirurgião importante está de resguardo.
— Seu sexto sentido está dizendo alguma coisa? — fez um bico, lembrando-se que conseguia pressentir quando algo grande chegava no hospital.
— Não. Felizmente não. Mas de qualquer forma, é bom que ao menos algum de vocês esteja bem.
A troca de sorrisos foi automática, abrindo o vácuo em olhares que diziam muito, mas que nenhuma palavra seria capaz de sair. Pelo menos não sairia primeiro dele.
— Obrigada por vir, . — ela agradeceu, não sendo o discurso prático que vinha dizendo toda a noite para seus convidados. Para ele seria diferente, claro.
— Eu não tinha outra opção a não ser te ver casar… — ele sorriu quase que imperceptivelmente.
— Você sempre teve. — desta vez ela escondeu o sorriso. — Mas obrigada por ter vindo. Jamais seria a mesma coisa sem você.
, eu-
— Você está aí! — e a irmã dela interrompeu, surgindo desesperada atrás da noiva. — Temos que fazer a cerimônia do buquê agora, ou você e sairão tarde e irão perder o voo!
o encarou diferente, ele conhecia o olhar de quando ela tinha mais o que falar e queria o fazer.
— Vai lá. — foi capaz apenas disso.
— Obrigada. Por tudo. — sorriu aberto, cheia de dentes, da forma que fazia seus olhos se espremerem pelas bochechas tão erguidas. — Eu te vejo quando voltar. Vou te trazer o chaveiro mais brega que existir. — riu fraco, se aproximando muito mais para deixar um beijo na bochecha dele antes de partir, sendo arrastada pela irmã.
Vendo ela sumir para dentro de algum ambiente reservado, não sem deixar de compartilhar um beijo rápido com quando se encontraram no meio do caminho, sentiu o peito apertar. Ao mesmo tempo que a boca dela tocou na do noivo, agora marido, ele sentiu o toque na dele e a mão, assim como estava fazendo, em seu rosto. A memória mais breve e flagelada que ele teria.
E era uma memória carregada de história, embora fosse como um raio — o que caiu apenas uma vez em sua vida. chegando no Madison, nova, cheia de sonhos, recém formada em enfermagem e pronta para tudo no centro cirúrgico. Pronta até mesmo para viver com ele as aventuras mais malucas entre plantões, entre ocasiões estressantes, entre a correria, mas não entre os termos dele. Termos estes que agora não faziam o menor sentido a não ser pela dor que estava causando nele em ver o amor de sua vida casando com outro.
Tão breve que entrou, saiu, subindo ao palco montado e ganhando a atenção de muitos. Enquanto começaram a se posicionar no centro para o buquê, sentiu o aperto em seu peito ser correspondido no telefone que vibrou dentro do bolso de seu blazer. Era um chamado do hospital.
Ao mesmo tempo que ela se virou de costas para o aglomerado de pessoas, ele fez o mesmo para seguir em direção à saída, se arrastando com as mãos ainda presas de si, o corpo entorpecido pelas lembranças do que um dia havia sido hábito em sua vida. A garganta seca de jamais o deixaria esquecer que um dia o cenário foi diferente, agora ele vivia o que passou tempos tentando ao chamá-lo e insistir.
Assim como ele queria fazer agora, mas não poderia.


FIM



Nota da autora: Sem nota.






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