Contador:
Finalizada em: 19/06/2021

Parte Um

next thing you’ll find
you’re reading about yourself on a plane (fame)


Eu odiava viajar de avião.
Mesmo assim, não era como se eu tivesse exatamente uma escolha, já que minha mãe tinha decidido que era uma boa ideia se mudar para o outro lado do mundo. O que, consequentemente, me obrigava a visitá-la todo feriado seguido. Se eu a ligasse comunicando que precisaria passar um feriado sem vê-la, era certo que eu ouviria um sermão por duas noites inteiras seguidas e isso não era algo que eu gostava de lidar. Eu prezava muito pela minha paz e sempre que eu pudesse evitar qualquer coisa que atrapalhasse isso, pode apostar que eu evitaria. Uma dessas coisas era sempre evitar que meus treinos se estendessem muito além do que era necessário. Eu só tinha aqueles dias específicos para ver os meus pais, então nada mais justo do que eu aproveitar. O problema era enfrentar a porra daquele avião. Por mais que eu estivesse acostumada com aquele meio de transporte, não significava que eu gostava.
Respirei fundo, verificando o relógio no meu pulso. Ainda tinha um bom tempo ali e eu tinha esquecido o meu fone, o que só tornava o meu humor ainda pior, uma vez que eu não tinha nada para suprir o tédio que eu estava sentindo. Precisava chegar em casa logo.
Desejava muito a minha cama, os meus últimos dias de férias, antes de Jane querer me arrastar debaixo das cobertas para o frio do gelo no rinque. Não dava para descansar na casa dos meus pais; eles queriam estar comigo o tempo todo, sempre batendo na tecla que eu vivia longe demais deles, mas ei! Eles quem tinham se mudado. Eu ainda estava na mesma cidade e na mesma casa em que eu cresci, mas claro que por causa da patinação. Eu duvidava que se não fosse por isso, eu provavelmente tinha ido com eles.
Ainda bem que minha carreira tinha dado certo. A única coisa que eu prezava mais do que a minha paz, era a minha independência.
— Você se importa? — uma voz masculina despertou a minha atenção.
Eu tinha esquecido que estava dividindo os assentos com alguém. Ao meu lado, estava um cara da minha idade, cujo sorriso era a parte mais atraente de seu rosto inteiro. Ele apontou para os meus pés, que eu mantinha sob a outra poltrona, impedindo a pequena porta-revistas de ser cutucada. Irritada demais para notar algo, eu também mal tinha percebido aquilo.
— Não — respondi.
Dei espaço para ele se inclinar. Eu conhecia aquele rosto de algum lugar, mas não estava conseguindo pensar em ninguém naquele momento. Ele pegou um jornal e encostou-se na sua poltrona novamente, parecendo bastante interessado nas notícias do jornal. Não deveria nem ser de hoje, mas, aparentemente, aquilo não importava para ele. Parei de encará-lo e balancei a cabeça, deixando um suspiro longo e cansado escapar dos meus lábios entreabertos, enquanto eu encostava a minha cabeça no meu assento, começando a cutucar os dedos contra o braço da poltrona. Eram três lugares ali, mas o da janela estava vazio, restando apenas eu e o garoto levemente conhecido.
Eu tinha certeza de que uma hora ou outra acabaria lembrando quem ele era.
— Essa não é você? — ele voltou a falar.
O sorriso irradiante não estava mais presente no seu rosto, mas ele me olhava com diversão nos olhos. Estendeu o jornal para mim, apontando para uma foto bem abaixo, na última parte da folha. Eu olhei para ele por um momento e em seguida para a foto que ele apontava, com o jornal ainda estendido na minha direção. Puxei-a para mim, passando os olhos pela notícia que seguia com a foto.

Prestes a iniciar a temporada de gelo, a patinadora artística parece estar mais longe do que perto na luta pela medalha de ouro, uma vez que uma fonte anônima revelou que atualmente ela está sem parceiro. A fonte também assegura que Toni Hopks, ex-parceiro da patinadora, recebeu uma proposta melhor e, por esse motivo, encerrou a parceria com a vice-campeã olímpica.


Logo abaixo, havia uma foto minha em um pódio de segundo lugar, sorrindo forçado e segurando a única medalha de bronze que eu tinha. Apertei o jornal com força entre os dedos, furiosa por aquilo ter sido vazado. Ninguém deveria saber daquilo, pelo menos não ainda, e agora estava estampado por todo o jornal nacional.
— Parece ruim para você — o garoto murmurou ao meu lado e lancei um olhar feio na sua direção.
Ainda com raiva, estendi o jornal de volta para ele, estampando o papel com força em seu peito, um pouquinho rude demais.
— Não é da sua conta — disse, ríspida. — Por que está sorrindo tanto?
Ele meneou a cabeça para o lado, alargando ainda mais o sorriso e movimentou os ombros na minha direção. Em seguida, pegou o jornal de volta e virou a página, encarando o que estava escrito.
— Pode estar ruim para você, esquentadinha — murmurou com bom humor. — Mas para mim, está mil maravilhas. Já leu sobre mim hoje? O melhor do hóquei de gelo.
Ah. Eu lembrava de onde o conhecia: aquele ao meu lado era ninguém menos que , a estrela da temporada do hóquei de gelo. Era tão seguro de si que chegava a ser irritante.
Nunca conversamos mais do que uma dúzia de palavras, como agora, mas seu local de treino era vizinho ao meu. Era inevitável dar de cara com os jogadores de hóquei no gelo de vez em quando. Eu tive um affair com um que, ainda bem, não tinha dado certo. Desde então, eu meio que preferia manter uma certa distância deles.
— Pelo menos alguém disse algo bom sobre você nessa droga de jornal — foi tudo o que eu respondi.
Não estava afetada pela diferença de notícias entre nós. Eu não gostava de virar notícia de qualquer tipo e sei que isso vai contra a vida pública que eu levava, mas, minha nossa, a privacidade pessoal era uma coisa que um humano decente deveria respeitar. Se eu descobrisse quem diabos era a fonte anônima, iria cometer um ato grave contra os direitos humanos.
, ao meu lado, riu e fechou o jornal, colocando-o de volta ao lugar que tinha pegado.
Todo mundo diz algo bom sobre mim — ele disse, frisando. — Eu sou um feito incrível da humanidade.
Arqueei uma sobrancelha na sua direção.
— Nem um pouco humilde, hein — cutuquei, balançando a cabeça descrente.
Sinceramente. Tanto lugar vago no avião com quem dividir o assento, por que um ser divino me faria passar por aquilo? Eu não estava afim de lidar com alguém que tinha um perfil completo de narcisista.
Ele deu de ombros, claramente não ligando nenhum pouco sobre se era humilde ou não.
— Você precisa trabalhar essa frustração — apontou, estreitando os olhos na minha direção, como se estivesse me avaliando. — Não posso carregar uma culpa de ser bom no que eu faço e você não.
Soltei uma risada, descrente com a sua cara de pau.
— Qualquer um pode ser bom no hóquei — rebati, mas eu sabia que aquilo era pura mentira. Eu só estava tentando afetar o ego daquele idiota. — Até eu posso calçar um patins e correr com um taco atrás de uma bola de borracha.
— Não é uma bola — ele corrigiu, sem parecer afetado. — É mais um disco pequeno de borracha.
Usando uma técnica de ioga que aprendi há muitos anos, mexi as minhas mãos na frente do meu rosto e puxei a respiração para depois soltá-la devagar. Me ajudava muito quando eu queria atacar algum adversário no rinque de patinação, porque eu simplesmente não tinha sangue barato para aguentar provocações. Eu tentava manter o meu temperamento bem tranquilo, mas as coisas à minha volta não colaboravam.
Tipo aquele jogador de hóquei.
— Além do mais, se você acha mesmo que é um esporte tão fácil — ele continuou a falar, o tom elevado em uma diversão sem fim —, vai aceitar o meu desafio para uma partida no rinque de gelo.
— Não vou, não — neguei rapidamente, verificando o relógio de novo. Não tinha passado sequer quinze minutos desde a última vez que eu olhei, e tínhamos decolado há uma hora. — Eu tenho mais o que fazer.
Eu queria ficar o mais longe possível dele. Precisava me lembrar que a distância entre mim e os jogadores de hóquei dentro do gelo era algo fundamental para manter a minha consciência sã. Eles me deixavam louca.
— Você não parece uma patinadora que recusa um desafio — alfinetou.
Pela primeira vez desde que ele iniciou aquela conversa, eu sorri. Eu parecia muitas coisas que não era mesmo, mas não ia cair naquele papo dele.
— E eu não sou — respondi, concordando. — Quando os desafios não são idiotas.
Ele colocou a mão sobre o peito, encenando um drama desnecessário e ajeitou a postura do corpo sobre a cadeira. Era a postura de alguém que não iria desistir de me infernizar até que eu aceitasse aquela droga de desafio.
— E se houver um prêmio para o vencedor? — tentou.
Lambi os meus lábios, dando de ombros.
— O único prêmio bom o suficiente em que consigo pensar ser adequado para esse desafio é evitar a humilhação em público — eu disse.
Ele me lançou um sorriso quase vitorioso, os cantos dos lábios repuxados. Que droga. Ele era tão bonito.
— Então você admite que não é boa? — provocou.
Mordi a parte interna da minha bochecha.
— Eu estava falando sobre a sua humilhação — retruquei.
É óbvio que eu estava falando de mim. Eu não era boa jogando hóquei de gelo — e muito menos de campo —, eu nem sabia por que eu tinha insultado o seu esporte. Se eu tivesse calado a minha boca, não estaria metida naquela pequena enrascada.
— Seu nome é , não é? — perguntou e eu assenti. — Você sabe que eu não vou desistir enquanto não aceitar o desafio?
Cruzei os braços, como uma garota teimosa.
— Por quê? — questionei. — Por que você é um ser humano muito irritante que não aceita “não” como resposta?
Ele não se abalou.
— Há uma visão muito errada sobre mim aqui — disse, apontando para si mesmo.
Não havia visão errada nenhuma, ele estava mesmo se mostrando um pouco irritante demais, insistindo naquela história de desafio.
— Você é um jogador de hóquei. — Descruzei os braços, respirando fundo. — Todos vocês são irritantes.
— Esse é um estereótipo muito chato também — discordou, cutucando o meu braço com o indicador. — Você se envolveu com um de nós?
Me remexi desconfortável contra o assento, encarando-o de perto, imaginando como diabos ele tinha adivinhado aquilo.
— Como você sabe? — indaguei, curiosa.
Era melhor que não soubessem que fui afetada demais por um jogador de hóquei qualquer.
— Não teria outro motivo plausível para você nos odiar tanto — explicou, mordendo a pele da bochecha por dentro.
Deixei cair um suspiro derrotado, batendo minha cabeça contra o meu assento.
— Não odeio vocês, só evito — murmurei. — É diferente.
Houve um silêncio entre nós, quase brevemente, e não ousei olhar para ele. Percebi que não era alguém que sabia ficar muito tempo calado quando tinha alguém ouvindo. E, mesmo eu também sendo um pouco irritante para ele, não desistiu de continuar a manter o papo comigo.
Ao menos, eu estava tendo uma distração naquela viagem.
— Quem foi? — ele perguntou.
Quando virei meu rosto na direção dele, não encontrei deboche ou diversão, apenas… curiosidade. Demorou um pouco, mas acabei optando por contar, afinal de contas, eu não tinha por que esconder nada mesmo.
Somente o meu histórico de fracassos em relacionamento.
— Albert Cook — eu finalmente disse.
Ele era carinhoso e muito bonito, mas não era muito inteligente. Nós sempre acabávamos brigando por alguma coisa em vez de aproveitar o tempo livre que tínhamos juntos, porque nossos treinamentos eram puxados, mas Albert preferia me fazer perder tempo discutindo coisas que não interferiam em nada no nosso pseudo-relacionamento.
— Ele é do time rival — observou, uma careta desgostosa surgindo em seu rosto. — Você não tem muito bom gosto.
Uma coisa em comum que eu finalmente concordava com ele.
— Eu não ligo para os times — comentei. — Vocês treinam o tempo todo do outro lado, somos praticamente vizinhos. Era inevitável esbarrar em alguns de vocês e o Albert esbarrava comigo o tempo todo de propósito. Resolvi dar uma chance.
Ainda bem que ele trocou o horário de treino, o que me poupou, e muito, de ter que esbarrar com ele o tempo todo de novo, depois de ter terminado o que quer que a gente tivesse. Ele ficou chateado, mas eu não me importei. Na verdade, eu me importei um pouquinho, a ponto de me humilhar chorando em casa sozinha, com um pote de sorvete de chocolate — o que era totalmente proibido na minha dieta —, quase como se eu estivesse protagonizando um filme clichê. Mas eu gostava do Albert, apesar de tudo. E superei tão rápido quanto tudo tinha começado e acabado.
— Que perda de chance — disse. E nem estava brincando. — Você tinha opções melhores lá dentro.
— Ah, é? — Pisquei os olhos para ele. — Tipo quem?
Ele sequer escondeu a própria preferência.
— Tipo eu — respondeu, umedecendo os lábios para mim. — Posso resgatar a sua fé em um jogador de hóquei.
Comecei a rir, de verdade, minha barriga quase doendo.
— Você é engraçado — disparei.
bufou, desfazendo a sua expressão divertida, indignado que eu não levei a sua proposta a sério. Ao menos ele tinha esquecido um pouco a história do desafio. Quando percebi que ele ia abrir a boca para reclamar da minha reação, o avião balançou muito forte, as máscaras caindo na frente do nosso rosto. Os líquidos dos copos postos à nossa frente derramaram nas minhas pernas, molhando parte do meu vestido.
Uma turbulência. Ótimo.
Eu também estava acostumada com aquilo, mas não significava que eu também gostava. Bem, eu duvidava que alguém gostasse daquilo.
Senhoras e senhores, estamos sofrendo uma pequena turbulência — uma voz no autofalante comunicou. — Por favor, permaneçam sentados em seus assentos e verifiquem se o cinto de segurança está devidamente colocado.
Seguindo a instrução, verifiquei se eu estava mesmo segura com o cinto, o avião ainda balançando. Eu esperava que o movimento não me deixasse enjoada, porque odiaria vomitar ali, sem tempo de correr até o banheiro. Senti o meu braço ser apertado por uma mão forte e quando me virei para reclamar com , ele estava totalmente parado, os dedos brancos apertando a minha pele.
? — chamei, mas ele mal respirava, balançando a cabeça de um lado para o outro.
A região da minha pele em que ele apertava estava ficando vermelha, mas resolvi ignorar a dor, percebendo que ele estava em pânico, ocasionado pela turbulência. Também notei que o cinto dele não estava devidamente apertado e me inclinei sobre ele, ajeitando-o. O avião balançou mais forte daquela vez, fazendo com que eu batesse a minha cabeça contra o meu assento. Resmunguei e voltei a prestar atenção no jogador de hóquei ao meu lado. Tirei a mão dele do meu braço, segurando-o com a minha, deixando-o apertar os meus dedos.
, preciso que você respire fundo — falei, tentando acalmá-lo de algum jeito. — Você consegue fazer isso?
Com muito esforço, ele balançou a cabeça em negação, os olhos levemente arregalados.
— Nós vamos cair, não vamos? — ele questionou, a voz quase falhando.
Ele se esforçou para respirar.
— Não — tranquilizei-o, mas eu não achava que estava passando muita convicção.
Ele me olhou como se eu estivesse mentindo e xinguei baixinho por não conseguir ser firme nem naquela situação.
O peito dele subiu e desceu em um ritmo muito rápido e o avião balançou mais uma vez.
— Ai, que droga, — murmurei. — Olhe para mim.
Eu precisava distraí-lo para que ele não focasse a sua atenção na turbulência, ou não ia conseguir cessar o pânico que estava sentindo. E eu só conseguia pensar em uma coisa para isso.
olhou para mim, como pedi, e segurei seu rosto com a minha mão livre, a outra ocupada para que ele apertasse os meus dedos, que, a essa altura, já estavam mais brancos do que o normal.
Sem pensar muito para que eu não desistisse, aproximei o meu rosto do dele e juntei os nossos lábios. Ele pareceu surpreso demais com a minha atitude, mas eu senti o seu corpo relaxando e ele afrouxou o aperto dos meus dedos, concentrando toda a sua atenção no beijo que eu tinha acabado de iniciar. Queria que ele esquecesse do mundo ao nosso redor e focasse somente nas nossas bocas unidas. moveu a cabeça em sincronia com a minha e sua língua tocou a minha, intensificando o beijo mais ainda. Ele tinha gosto de hortelã e, estranhamente, aquele sabor combinava com ele.
Aquele beijo ia contra todo o meu método de me manter longe de jogadores de hóquei no gelo, principalmente um que tinha como passatempo favorito me irritar.
Mas como estava funcionando e ele não estava mais tão em pânico, continuou bastante distraído em me beijar. Quando percebi que a turbulência tinha melhorado e o avião parado de balançar, eu afastei o meu rosto do dele, observando seus lábios inchados e vermelhos. Soltei o ar, engolindo a seco, quase sem fôlego.
Mais calmo, ele sorriu para mim.
— Você é muito boa em distrair alguém.
Revirei os olhos e puxei a máscara de oxigênio, empurrando contra o rosto dele.
— Cale a boca e respire.

Depois que a turbulência tinha passado, eu consegui dormir um pouco durante todo o restante do voo até, finalmente, o desembarque. Eu estava tão aliviada de poder colocar os pés em terra firme novamente que sequer me importei que estava me acompanhando pela área de desembarque de passageiros. Ele tinha me deixado em paz desde então e desconfiei que ele estava um pouco constrangido por ter entrado em pânico no avião.
— Ei, — ele chamou, parando ao meu lado.
Eu teria continuado a andar, porque embora eu tivesse o beijado, isso não significava que eu queria manter a sua companhia por perto. Se cada um seguisse o seu caminho e sua carreira em paz, eu não reclamaria disso. Estava mais do que ótimo para mim. Mas ele segurou o meu braço, insistindo.
— Você é chato até para se despedir? — perguntei.
Ele balançou a cabeça, um resquício de humor dançando por suas íris.
— E você é sempre tão esquentada? — rebateu.
Puxei o meu braço da mão dele e segurei a alça da minha bolsa contra o meu ombro com força. Eu ainda precisava buscar as malas e pedir um táxi até o meu apartamento para, enfim, poder desfrutar da minha cama pelos próximos dias restantes.
— Escute — ele continuou, antes que eu me virasse para ir embora e deixasse-o falando sozinho. — Eu só queria te agradecer por ter me ajudado quando a turbulência aconteceu. E dizer que, se não for pedir muito, você não contasse para ninguém o que rolou.
— Acha que eu vou sair por aí anunciando aos ventos que teve um ataque de pânico?
Ele coçou a bochecha, desconfortável.
— Não somos amigos — disse, defendendo-se. — Não pode me culpar por cuidar da minha imagem.
Eu não podia mesmo. Ele era uma figura pública tanto quanto eu. Sabia que qualquer coisa, por menor que fosse, se virasse notícia, podia arruinar a nossa carreira. Mas não precisava se preocupar com aquilo, porque um: ter medo de turbulência era a coisa mais normal do mundo, ninguém o crucificaria por aquilo; e dois: eu era a última pessoa do mundo que vazaria qualquer coisa de qualquer pessoa.
— Não se preocupe, — eu disse, despreocupada, batendo no braço dele levemente. — Eu tenho coisas mais importantes para priorizar.
Com um sorriso fechado e forçado, olhei para ele uma última vez antes de dar-lhe as costas, continuando a fazer o meu caminho que tinha sido interrompido por ele. Dessa vez, ele não me seguiu.
Seria muito fácil arrancar de mim que entrou em pânico com a turbulência do avião. O que seria difícil mesmo era me fazer admitir que eu o beijei para acalmá-lo. Eu negaria aquilo para qualquer pessoa, inclusive os jornais locais, que adoravam fofocas novas.
Não se esqueça do desafio, ! — ele gritou atrás de mim.
Ignorei-o por completo, fingindo que eu não tinha escutado nada do que ele estava falando, mas, de longe, eu pude ouvir a risada dele.
Se a primeira impressão era mesmo a que ficava, eu não tinha tido uma boa dele. Entretanto, ele foi o maior responsável por distrair a minha mente de pensar no desastre que tinha sido o meu reveillon e como eu tinha um trabalho enorme pela frente de tentar arranjar um novo parceiro a tempo da competição regional.

[flashback]


Meus saltos estavam me matando.
Eu estava tão acostumada a usar os patins no gelo que não tinha praticamente costume de usar nenhum outro calçado nos meus pés, exceto sapatilhas com meias, mas minha mãe era uma mulher bastante vaidosa e eu quase nunca vencia uma discussão com ela. Sendo a sua única filha, e precisando competir pelo look de fim de ano mais bonito entre as minhas primas, eu não tive outra escolha senão calçar aqueles saltos finos. Mesmo incomodada, havia um sorriso enorme no meu rosto. O vestido era leve e solto, mas brilhante demais para o meu rosto. Eu não reclamei de vesti-lo porque era feito de algodão e eu me senti confortável com ele.
Meu cabelo caía em ondas até os meus ombros, uma tiara branca com diamantes pequenos decorando o topo da minha cabeça. A casa dos meus pais era grande o suficiente para receber metade da nossa família. Nem todo mundo vinha, porque jovens como eu preferiam passar a festa com os amigos, mas como eu morava do outro lado do mundo, minha festa era ali.
— mamãe chamou, a voz fina e elegante. — , venha aqui. Hora da foto.
Terminei a minha taça de champanhe e fui até onde minha mãe estava. Algumas das minhas primas estavam envolvidas em roda, ao redor da mesa, e me juntei a elas, cumprimentando-as com um sorriso jovial. Infelizmente, dividimos o mesmo sangue, mas não tínhamos sequer um contato social próximo. Minha vida era muito diferente das delas e com o pouco tempo que eu tinha entre o treino, campeonatos regionais e entrevistas, não me sobrava muita coisa.
, você está linda! — uma delas disse e eu agradeci, tentando soar o mais sincera possível.
Céus. Eu odiava festas de final de ano. Mamãe não precisava chamar a família toda, pelo amor de Deus! E meu pai, que não era muito sociável, preferia manter-se em conversas limitadas com meus tios, obrigando-o a ficar tão quieto que quase parecia invisível. Quando parte da família se juntou para a foto e minha mãe sorriu para mim satisfeita, aproveitei o momento para dar o fora dali, pegando uma taça de uísque pelo caminho até o jardim.
O ar estava fresco e o céu escuro e cinzento. Mas havia uma paz ali que eu não encontrava no meio da sala, lá dentro. Respirei fundo, bebendo um gole do líquido forte, pensando que eu tinha que ficar um pouquinho alterada se quisesse conseguir aguentar aquela festa até o fim.
Senti o meu celular vibrar, indicando uma nova mensagem.
A notificação era de Toni, meu parceiro na patinação artística há dois anos. Abrindo a sua mensagem, imaginando que era mais uma felicitação de coisas novas para um ano novo que todo mundo dizia, eu estava prestes a responder desejando tudo em dobro, mas o conteúdo da mensagem era outro.
Fiquei encarando a tela tanto tempo que a contagem regressiva para a virada de ano e os fogos de artifício tinham começado e eu não percebi. 10, 9, 8, 7, 6, 5, 4...

Toni Hopks às 11:58pm: , eu sinto muito, mas estou interrompendo a nossa parceria. Assinei contrato com outra patinadora e com um patrocinador famoso. Nosso treino começa em dois dias. Eu te desejo tudo de mais maravilhoso na sua carreira Xx Toni.


Os fogos explodiram no céu, festejando o início de um novo ano. Ouvi alguém me chamar atrás de mim, mas não me virei. Virando todo o conteúdo do líquido, engolindo a bebida irritada, me senti traída por Toni. Nós tínhamos uma boa parceria há dois anos, ele não podia simplesmente ter me abandonado agora. Não quando tinha se comprometido comigo para competir no Campeonato Regional de Patinação. Limpei as lágrimas, furiosa com o conteúdo da mensagem e abri o teclado, digitando com os dedos rápidos.

às 00:03am: Feliz ano novo, babaca Xx .

[flashback off]


Parte Dois

oh well, just keep looking, looking, looking

Uma semana depois


Deslizei pelo rinque com leveza, patinando em círculo com as mãos apoiadas na minha cintura, enquanto eu sentia o suor escorrer pelo meu corpo através da roupa colada que eu usava. Eu não tinha ideia de quanto tempo estava ali, mas voltei a treinar há dois dias.
O que não funcionava muito bem, uma vez que eu ainda estava sem parceiro para competir. Era difícil conseguir outro de maneira tão rápida. Eu teria sorte se conseguisse um antes da nova temporada.
Suspirei, totalmente desconcentrada e parei de patinar, deslizando até as arquibancadas. Eu deveria encontrar com a minha treinadora mais tarde, depois do almoço, para resolver algumas pendências e decidir o que eu deveria fazer dali em diante. Nova dieta, novo horário de treino, nova coreografia e… um novo parceiro.
— Você parece muito desanimada. — , minha única amiga naquele fim de mundo, apareceu de repente ao meu lado.
Levantei os olhos para ela, que estava vestida como se fosse uma animadora de torcida, o cabelo dividido em dois rabos de cavalo e o lábio pintado de um vermelho bastante chamativo. Comecei a tirar os meus patins dos pés e a encarei com confusão expressada muito bem no meu rosto.
, eu não sabia que era Halloween — observei-a inteira, não entendendo por que ela estava vestida daquele jeito.
e eu crescemos juntas no rinque de gelo. Ela também era patinadora, mas solo, e competia em categorias muito diferentes da minha, porque além de eu ser patinadora em dupla, também era da modalidade de dança. O que excluía alguns saltos da outra modalidade.
— Há há — ela forçou a risada. — Eu estou vestida assim por uma brincadeira dos meninos do hóquei. Eles estão treinando do outro lado. Um treino muito particular, mas como eu sou parte importante do Club Ice Skin, sou convidada especial.
Fiz uma careta para a resposta dela, me levantando do assento da arquibancada com meus patins na mão. Ao contrário de mim, gostava de assistir a alguns treinos dos jogadores, mas eu não sabia que ela era tão fiel a eles a ponto de se vestir de animadora de torcida.
— Você já foi melhor — murmurei, andando pelo corredor até o vestiário.
Eu não estava olhando-a, mas quando ela estalou a língua no céu da boca, eu soube que ela também tinha revirado os olhos para mim. Ela cutucou o meu braço com um pouco de força e olhei feio para ela, que não se importou.
— Você é muito ranzinza, — reclamou. — Precisa aprender a se divertir!
Empurrei a porta do vestiário e fiquei aliviada por estar vazio. Nossa, eu realmente prezava privacidade e paz. Paz, principalmente.
— Eu posso fazer isso sem envolver jogadores de hóquei — retruquei, andando até o meu armário.
O abri e coloquei os patins dentro, pegando a minha sapatilha e a minha bolsa pequena, resolvendo que eu podia tomar o meu banho quente em casa, antes de me encontrar com minha treinadora.
Quando fechei a porta do meu armário, estava me olhando com os olhos estreitos.
me contou que te desafiou — comentou e eu mordi o lábio, xingando-o baixinho por pensamento. — Você insultou o esporte dele?
— Foi sem querer — disparei.
começou a rir.
— Você nunca faz nada sem querer — me acusou e eu bufei, deixando meus ombros caírem, murchos. Ela tinha razão. — Podia ter me contado que vieram no mesmo avião.
— Por quê? — fiz pouco caso. — Não era uma novidade tão importante.
— Eu gosto de fofoca! — exclamou, batendo um pé contra o chão. — Você sabe disso. Além do mais, ele está espalhando que você arregou.
Pisquei meus olhos na direção dela, massageando a minha orelha, para verificar se eu tinha escutado bem mesmo. Apertei a alça da minha bolsa contra o meu ombro esquerdo.
— Ele o quê?
Ela mordeu o dedo indicador, mexendo os ombros. Se eu tinha aceitado a sua condição de não espalhar que aquele idiota tinha entrado em pânico na turbulência no avião, uma semana atrás, ele podia ter tido a decência de não espalhar mentiras sobre mim. Qual era o problema dos garotos em geral?
— Ele está aqui? — perguntei a .
— Sim — ela assentiu. — No outro lado do rinque.
Abri a porta do meu armário, colocando a bolsa de volta e a fechei com força, irritada. Ele queria que eu aceitasse o desafio? Ótimo.
Passei direto pela minha melhor amiga, que me acompanhou em passos rápidos. O outro lado do rinque era exclusivo para os jogadores de hóquei no gelo treinarem, mas três corredores ligavam a minha área de treino com a deles e era por isso que eu vivia esbarrando com vários deles. Empurrei a porta e desci as escadas pequenas que era um corredor direto entre as arquibancadas até o rinque de gelo de hóquei. Havia seis jogadores ali e algumas pessoas a mais que eu não conhecia, mas não chegava exatamente ao tamanho de uma plateia.
— Olha só quem resolveu dar o ar das graças — disse, girando no rinque.
Um sorriso dançava em seus lábios e eu tinha certeza de que ele estava enxergando a minha expressão irritada. O jogador patinou diretamente até a beira do rinque, onde eu estava.
— Eu vim aqui calar a sua boca — disparei contra ele, os dentes tremendo um contra o outro.
ficou cara a cara comigo, alternando seu olhar entre a minha boca e os meus olhos.
— Com um beijo? — ele arriscou, em um sussurro.
Ao menos ele guardava segredo daquilo.
— Nos seus sonhos, jogador — sussurrei de volta, alheia a tudo à minha volta. Nem o capacete protetor que ele usava diminuía um terço da sua beleza. — Eu estava me referindo ao desafio.
— Ah! — Seus olhos piscaram. — Resolveu aceitar?
Quando desviei os olhos dele, percebi que o restante da sua equipe tinha parado de fazer o que estavam fazendo para nos assistir. estava exatamente duas escadas atrás de mim, com os braços cruzados, bem satisfeita.
— Sim — a palavra saiu da minha boca antes que eu sequer pensasse no que estava dizendo.
Meu plano não era exatamente aceitar o embate contra ele, mas eu estava tão irritada que me deixava ser impulsiva àquele ponto.
— Na verdade — eu falei, querendo me esquivar daquela quando um sorriso vitorioso surgiu em seus lábios. — Eu estou sem patins.
Ele olhou para meus pés, calçados por uma sapatilha desgastada. Além do treino no rinque, ginástica e balé eram outra coisa que eu praticava. Aquela sapatilha tinha aguentado muita coisa.
lançou um sorrisinho esperto.
— Não tem problema — disse. — O Tyler deve ter o seu número. Tyler!
Ele se virou, chamando um dos jogadores da equipe com a mão. Tyler, que era um pouco mais alto que e loiro demais, se aproximou de nós dois. Sorri amarelo para ele, me xingando horrores em pensamento por estar ali. Eu podia muito bem ter ignorado a e ido embora para casa, diretamente para o meu tão amado banho quente, mas não, eu estava ali, buscando a minha humilhação.
— Você pode emprestar os seu patins para a nossa garota aqui? — pediu.
Tyler olhou para mim e acenou um cumprimento simpático, respondendo ao meu sorriso forçado. O loiro assentiu para e saiu do rinque de gelo, parando ao meu lado. Ele se apoiou contra o batente que nos separava do rinque e tirou os patins, entendendo-os para mim.
Meio sem graça, aceitei. Esperava que ele não tivesse mau cheiro, mas era meio tarde para voltar atrás. Se eu fizesse isso, iria estar mesmo amarelando, como aquele idiota do estava espalhando.
Me livrei das minhas sapatilhas e olhei rapidamente para , que me mostrou os dois polegares positivamente e eu balancei a cabeça em negação, mal acreditando que eu estava prestes a fazer aquilo mesmo. e Tyler me assistiram em silêncio e eu ajeitei a minha camisa longa no meu corpo. Tyler também me ofereceu o seu capacete, o qual aceitei e coloquei rapidamente.
— Atenção, pessoal! — gritou, assim que eu terminei de calçar os patins e atravessei o batente, me pondo dentro do rinque. — Acredito que saibam que essa aqui é a e ela é patinadora artística. Eu a desafiei para uma partida de hóquei, porque ela disse que o nosso esporte é fácil e qualquer um é bom, certo, ?
Senti um impulso enorme de chutá-lo. Sua equipe me encarou, olhares divertidos se misturando aos descrentes e eu me arrependi muito de ter aberto a boca no avião para insultar o esporte dele.
— Como é um esporte fácil, patinadora — se virou para mim —, acredito que você sabe o que fazer.
Eu não tinha ideia, e ele sabia disso.
Aceitei o taco que um deles me estendeu e me coloquei em posição, patinando até o meio do rinque, encarando as duas áreas de gol, uma de cada lado. Ok, eu só tinha que seguir os passos dele e me mover da mesma forma em direção ao disco. Todos eles ficaram em posição e eu inclinei o meu corpo, segurando o taco com firmeza. gritou o meu nome e eu quis que ela parasse com aquilo, porque aumentava a sensação de que eu iria ser duas vezes mais humilhada do que estava prevendo. Quando a partida iniciou, patinei com rapidez até o disco, tentando mover o taco contra ela, mas meu corpo esbarrou com um dos meninos e eu quase caí para trás, se não me segurasse pela cintura.
— Você parece meio perdida — me provocou.
Mordi a parte interna da minha bochecha e ignorei-o, patinando até um dos jogadores que estavam com o disco. Eles dificultavam o meu trabalho e eu estava mesmo um pouco perdida, mas não iria admitir aquilo para nenhum deles. era o que mais parecia estar se divertindo e eu estava me esforçando para tirar o sorriso irritante de seu rosto.
Quando consegui me aproximar do disco pequeno e estava prestes a empurrar o taco contra ele, tentando levá-lo para a área de gol, um deles passou por mim, me derrubando direto no chão. Caí de costas, e embora eu estivesse acostumada com tombos no gelo, aquilo doeu pra caramba. Minha visão ficou turva por um momento e eu tirei o meu capacete, jogando-o de lado, respirando fundo, sem me mover. apareceu ao meu lado, ajoelhado, uma ruga de preocupação surgindo em seu rosto.
— Está bem — me rendi, desistindo, antes dele dizer qualquer coisa. — Eu peço desculpas por ter insultado o seu esporte. Odeio hóquei.
Ele começou a rir gostosamente e se sentou no gelo ao meu lado, já que eu ainda me recusei a me levantar, sentindo minhas costas doerem.
— Não foi tão humilhante — mentiu.
Lancei um olhar feio na sua direção e ele levantou as duas mãos, como se estivesse se rendendo. O jogador que tinha me empurrado surgiu em seguida, tirando o capacete e me estendendo a mão.
— Você está bem?
Dispensei a sua mão estendida, sem coragem de me levantar.
— Estou tentando entender se você quebrou alguma costela minha — respondi e ele sorriu, culpado.
— Perdão.
, um pouco escandalosa, gritou o meu nome.
— Diga a ela que eu estou bem — avisei ao jogador que me empurrou. — Mas, eu já adianto. Ela vai flertar com você.
Ele riu, assentindo, e em seguida patinou direto para a minha melhor amiga. Tentei me levantar, mas gemi de dor e me ajudou.
— Sinto muito por isso, de verdade — ele disse.
— Tudo bem. — Abaixei a minha guarda por um momento, esticando as minhas costas. Eu tinha sofrido quedas piores. — Isso serve para eu aprender alguma coisa antes de insultar os esportes dos outros.
— Foi uma lição meio dura. E antes de um gol.
Empurrei-o com o ombro.
— Eu estou acostumada com quedas no rinque — comentei. — Não seria uma patinadora se não estivesse.
Algumas quedas me impediram de tentar vários saltos, inclusive. A minha sorte era que na modalidade de dança os saltos não eram obrigatórios e eu pude seguir sendo uma patinadora. Eu sinceramente não sei o que faria se não pudesse continuar praticando a única coisa em que eu era realmente boa.
tirou o capacete da cabeça e apertou os lábios um no outro.
— Vi alguns de seus vídeos dançando no gelo — ele disse. — Você merecia todas as medalhas de ouro.
Pisquei os olhos para ele, realmente surpresa com a sua confissão.
— Está sendo sarcástico? — me certifiquei.
Mas sua expressão estava serena e livre de qualquer coisa que eu considerasse maldade.
— Nunca fui tão sincero — admitiu, mexendo os ombros.
— Não acredito que andou pesquisando sobre mim — comentei, balançando a cabeça. Só tínhamos nos falado para valer uma vez.
— Você não fez isso comigo? — ele retrucou, dramatizando uma mão no coração. — Sinceramente, eu esperava mais.
— Eu disse que tinha coisa mais importante para fazer — rebati, dando de ombros.
Puxei a respiração e coloquei as minhas mãos no gelo, criando impulso para me levantar. Ele continuou sentado e me equilibrei em pé nos patins.
— Tipo um parceiro novo? — perguntou e eu assenti em resposta. — Modéstia à parte, eu patino muito melhor do que ele.
Ele não tinha nada de modesto. Coloquei as minhas mãos na cintura, erguendo uma sobrancelha na sua direção.
— Ah, é? — murmurei. — Nada mais justo que te devolver o desafio, então. Patine comigo, jogador.
abriu um sorriso enorme. Com o capacete preso no braço, ele se levantou.
— Ao contrário de você no hóquei, patinadora, eu sou mesmo bom em patinação artística.
Pior que acreditei naquelas palavras. Mesmo assim, segui adiante. Ele patinou até onde estava o restante de sua equipe e entregou o capacete, falando com um de seus amigos. Em seguida, Tyler pegou o celular e conectou uma música nos alto-falantes.
Os primeiros toques de Love Me, de The 1975 começaram a ecoar pelos sons e eu soltei uma risada, achando engraçado como aquela música combinava perfeitamente com ele, mas não reclamei. Se ele queria dançar com uma música de sua preferência, eu não podia contestar.
patinou de volta até mim e me estendeu a mão. Eu aceitei e ele ficou lado a lado comigo, mantendo uma mão na minha cintura e a outra segurando a minha. Por puro costume, usei a minha mão livre para pôr por cima da dele na minha cintura e nós começamos a patinar juntos, meio que no ritmo animado da música. Patinamos o rinque todo e de trás para frente, até que me soltou e nós dois giramos juntos, praticando um spin simples, na direção esquerda, com os dois pés no solo. Em seguida, ele parou atrás de mim, executando um dance lift com perfeição, segurando o meu corpo suspenso no ar, me tirando totalmente do gelo e aproveitou para adicionar outra sequência de spin, girando com o meu corpo, mantendo seus dois pés firmes no solo. me colocou de volta ao gelo e nós improvisamos uma coreografia qualquer, combinando com a música, explorando toda a extensão do rinque só para nós dois. Ele me encarava de frente com um sorriso pequeno nos lábios, a diversão disparando em seus olhos e eu percebi, um pouco incomodada demais, o quão combinávamos fazendo aquilo. Soltei ele e giramos em conjunto de novo, um dos meus pés apoiado na outra perna, realizando um quatro e, em seguida, nos abaixamos, esticando a perna para frente, a sequência entre nós dois jamais se perdendo, nos ligando a uma sincronia impecável.
Ouvi assobios e palmas vindos dos meninos e e me levantei, finalmente finalizando a dança ao som da música, que ainda tocava. Coloquei as mãos na cintura, parada no meio do rinque com as pernas esticadas e controlei a minha respiração, recuperando um pouco do meu fôlego.
— Tem algo que você não seja bom? — disparei a pergunta para ele.
não tinha mesmo mentido quando disse que era bom em patinar daquela forma. Eu só admiti para mim mesma o quanto fiquei impressionada com a destreza perfeita dos seus passos e como ele se encaixou comigo.
And love me — ele citou a letra da música, com um sorriso de lado e piscou um olho para mim, parando bem na minha frente. — Eu te disse. Eu sou bom em tudo.
Revirei os olhos, balançando a cabeça.
— Exibido — murmurei, dando as costas para ele e patinei de volta até as arquibancadas.
Eu estava louca para tirar aqueles patins pesados dos meus pés. Ele era muito diferente do que eu usava para patinar, mas não me impediu de deslizar sem dificuldades pelo gelo. A música parou de tocar e eu me sentei em um dos bancos livres, finalmente me livrando dos patins.
— Obrigada, Tyler — murmurei para o loiro, devolvendo para ele.
Tyler acenou, recusando o meu agradecimento gentilmente.
— Você é péssima no hóquei, mas é uma extraordinária patinadora — elogiou.
Eu sorri para ele e murmurei um agradecimento novamente, assistindo-o me dar as costas. veio logo em seguida.
— Caramba, ! — exclamou, totalmente eufórica. — Você tem uma puta química com o . E digo mais: ele é uma delícia!
Dei uma risada gostosa e dispensei o seu comentário maluco com um gesto exagerado de mão, calçando as sapatilhas de volta.
— Você tem um neurônio faltando — eu disse, resmungando para ela não ficar animada com aquilo. — Vamos embora, perdi tempo demais me humilhando aqui.
— Realmente — ela concordou. — Você é péssima jogando hóquei…
continuou falando, enquanto nós duas subimos as escadas de volta. Antes de virar o corredor, eu olhei para trás e estava olhando para mim. Quando me flagrou encarando-o, ele soltou um beijo no ar, jogando na minha direção.

mais tarde


— Desculpa o atraso, Janie.
Minha treinadora fez um gesto com a mão, dispensando o meu pedido de desculpas e pediu que eu me sentasse na cadeira à sua frente. Eu estava no escritório que ela tinha, cinco quadras de distância do Club Ice Skin, para termos a nossa conversa sobre a minha retomada de rotina e treinos. Depois de ter participado do desafio com , corri para casa, tomei um banho e comi uma coisa rápida, percebendo que eu não poderia tirar o meu cochilo, porque estava atrasada para o encontro.
— O Campeonato Regional de Patinação acontece em três meses — ela começou a dizer e eu mordi o meu lábio, ansiosa por estar tão perto. — E nós temos um problema.
Deixei meu corpo cair mole contra a cadeira, soltando um suspiro. Janie tinha xingado horrores o meu ex-parceiro, chamando-o de covarde por não ter tido a coragem de me dizer sobre a quebra de parceria pessoalmente. Ele teve que mandar mensagens e até hoje eu não sabia com quem ele estava fazendo a nova parceria. Não saiu nenhuma notícia e suas redes sociais não comunicavam nada — não que eu estivesse stalkeando-o, eu só queria estar muito bem-informada para o caso de… bem, de qualquer coisa.
— Nós tempo pouco tempo — murmurei, desgostosa e um pouco aflita demais. — Estou em desvantagens, em comparação com outras duplas.
Ela sabia disso, claro. Mas Janie não era o tipo de treinadora que me desmotivava diante de qualquer coisa, muito pelo contrário. Aquela mulher era uma luz na minha vida e cuidava de mim como se eu fosse a sua filha, ao que eu era totalmente grata. Nunca quis trocar de treinadora nem quando ela falou sobre se aposentar.
O problema de estar sem parceiro estava começando a me tirar o sono. Eu comia e dormia pensando sobre isso, sobre o que eu faria se eu não conseguisse um a tempo de treinar para o campeonato e quais eram as minhas chances.
, querida — Janie chamou, a voz contendo ternura e mais paciência do que eu podia contar comigo. — Não temos muitas opções. Você não pode seguir carreira solo. Suas opções são bastante limitadas: ou você consegue um novo parceiro até o final de semana, ou está fora do Campeonato.
Eu nunca perdi um Campeonato a minha vida inteira.
Abrir mão daquilo agora, àquela altura da minha carreira, não parecia viável.
Mas também, como eu iria conseguir um parceiro novo que fosse bom tão em cima? O fim de semana era dentro de dois dias.
Eu só tinha uma opção na mente e esperava que desse certo, porque ultimamente nem com a sorte eu estava podendo contar.
— Tudo bem. — Deixei meus ombros caírem e encarei a minha treinadora com a pior expressão de derrota possível. — Pode anunciar na página que eu estou à procura de um novo parceiro. Declare urgência.
Ela acenou e me deu um sorriso quase maternal.
Eu ainda não estava pronta para desistir tão fácil.


Parte Três

hey!
would you like to look outside sometimes?


Inclinei o meu corpo para frente, puxando a minha perna para trás, tentando relaxar o meu corpo, enquanto me segurava na barra de ferro ao lado do espelho, na sala de balé. A aula tinha acabado uma hora atrás, mas eu ainda estava ali, praticando exercício físico sozinha. Meu celular apitou e eu respirei fundo, andando até a minha bolsa, jogada no chão no canto da sala.
Era uma mensagem de , me chamando para correr um pouco, já que ela odiava fazer isso sem uma companhia. Verifiquei o relógio, notando que ainda não eram nem onze da manhã, então respondi a mensagem de volta, aceitando o seu convite, pedindo que ela me encontrasse duas quadras depois do meu apartamento.
Vinte minutos depois, com roupas de ginástica e o cabelo preso, ela estava me esperando no ponto de encontro.
— Ei! — cumprimentei, beijando as suas bochechas.
— Ai, que bom que você aceitou vir comigo! — ela exclamou, animada. — O George quer que eu me mate de tanto treino.
Como eu, também ia competir no solo feminino de patinação na Competição Regional. Ela tinha uma rotina tão rígida quanto a minha, mas reclamava mais do que eu.
— Bom — eu disse. — Ao menos você vai competir.
fez um biquinho com os lábios, começando a dar pulinhos de aquecimento.
— Nenhum parceiro à vista ainda? — lamentou.
Mordi o meu lábio, estalando a língua no céu da minha boca, frustrada. bateu no meu ombro, tentando passar conforto e começamos a correr, lado a lado, a mesma distância que sempre percorremos, daquela esquina até o parque central.
— Estou com dificuldade de aperfeiçoar o tip toe disse. — Eu queria que você pudesse fazer saltos arriscados.
Olhei para ela de relance, diminuindo a velocidade da corrida para me manter ao lado dela. O suor já escorria pela minha testa e costas.
— Mesmo que eu pudesse, nunca fui boa nesses saltos — respondi, dando de ombros. — E você sabe que é questão de treino. Dedique-se um pouquinho mais.
Ela expressou uma careta nada alegre.
— Você está falando igual o George — disse. — Não é legal, sabia?
Soltei uma risada, balançando a cabeça, meu rabo de cavalo mexendo junto.
, você é muito boa — comecei. — Muito boa mesmo e sabe disso, porque não é nem um pouco modesta e a mídia local te ama. Mas você é muito preguiçosa para uma patinadora.
Ela gargalhou e me empurrou contra o ombro e eu cambaleei para o lado, tentando devolver o empurrão dela, mas não consegui.
— Eu me esforço o suficiente! — retrucou.
— Não o suficiente para um tip toe com perfeição — rebati, mostrando a língua para ela de um jeito muito infantil.
Eu estava tão concentrada em olhar para ela que não percebi que havia alguém vindo na nossa direção, e , tão distraída quanto eu, não conseguiu me avisar a ponto de evitar o esbarrão. Meu corpo se chocou contra outro e eu reclamei um "ai" baixinho, não caindo de bunda no chão por pouco. Quando levantei o rosto, prestes a pedir desculpas, encontrei um rindo pra valer.
— Você fez de propósito! — acusei-o, lançando um olhar feio em sua direção, escutando sua risada se intensificar mais ainda.
— Eu queria ver o quão distraída você conseguia ser — defendeu-se. — Oi, .
Ele também estava com roupa de corrida e tirou os fones do ouvido, soltando o ar pesado pela boca.
— Oi, respondeu. — Não sabia que você gostava de correr também.
— É. — Ele levantou um ombro, convencido. — Meus músculos não se criam sozinhos.
começou a rir. Arfei um pouco, respirando devagar.
— Eu estava mesmo precisando falar com você. — Ele se virou para mim, apontando na minha direção.
Pisquei os olhos para ele, tentando pensar sobre o que ele poderia querer falar comigo, mas não me vinha nada à mente. Não éramos amigos, eu não conhecia a sua vida e nem ele a minha. Não havia nada que ele pudesse querer comigo ou vice-versa, mas, mesmo assim, não pude deixar de me sentir curiosa. , ao meu lado, verificou o seu relógio rosa de pulso.
— Preciso ir — ela anunciou. — Marquei almoço com minha mãe.
Eu sabia que era mentira, porque a mãe estava viajando a trabalho, mas gostava de ser uma cupida nata, então entendi perfeitamente a sua intenção. Queria protelar, mas claro que ela sequer me deu opção para aquilo, estalando um beijo na minha bochecha e tornando a correr em seguida, me deixando sozinha com um cara que eu mal conhecia.
— Aceita um café? — sugeriu, acenando com a cabeça para o outro lado da rua, onde havia uma cafeteria.
Balancei a cabeça em negação.
— Não tomo cafeína — contei. — Mas posso aceitar um pouco de sorvete. E você paga.
Ele concordou, para a minha surpresa. Atravessamos a rua juntos e adentramos a cafeteria, escolhendo uma mesa bem perto da entrada do lugar, por causa da iluminação natural que vinha através do vidro. Apertei o elástico da minha blusa, fechando-a por completo, esperando que eu não estivesse exalando um mau cheiro devido ao suor. pediu um café preto sem açúcar e um sorvete de creme.
— Não consigo imaginar o que você quer comigo — comecei o assunto, querendo ir direto ao ponto.
Ele deu um sorriso esperto, colocando as duas mãos juntas sobre a mesa que nos separava.
— Então sua imaginação é limitada — respondeu. — Tenho mil e umas opções de coisas que eu posso querer com você.
Tive dificuldade para compreender se ele estava mesmo flertando comigo, mas não dei corda. Eu realmente tinha coisas mais importantes para me ocupar do que flertar com um jogador de hóquei.
— Direto ao assunto — disparei.
Ele soltou o ar, coçando a bochecha.
— Infelizmente, meu assunto é profissional — começou a dizer. — Vi o seu anúncio na sua página oficial. Sobre um novo parceiro.
— E por que isso interessa a você? — indaguei, curiosa. — Você não é patinador.
Ele levantou um dedo em riste.
— Tecnicamente, eu sou — corrigiu, a voz bastante firme. — Eu só escolhi usar esse talento em um esporte diferente.
— E bastante agressivo — acrescentei.
— O hóquei não é agressivo.
— Os jogadores são? — arrisquei.
sorriu.
— Bom ponto — admitiu.
Nossos pedidos chegaram e, enquanto ele testava a quentura do seu café, agradeci a atendente, experimentando o sorvete de creme. Eu estava indo contra a minha dieta, mas anotei mentalmente para compensar na academia depois. Um sorvete não me faria mal agora, fazia tanto tempo que eu não me dava ao luxo de tomar um. Unzinho sequer.
— Continuando... — ele retomou e eu resmunguei para ele continuar falando, concentrada demais no meu próprio sorvete. — Eu tenho um parceiro em mente para você.
Levantei os olhos na direção dele, realmente interessada no que ele tinha acabado de me dizer. Se ele tinha alguém em mente para mim, metade dos meus problemas estariam resolvidos e graças a ele. O que eu nunca pensei que fosse acontecer, para ser sincera.
— Por que eu sinto que isso não vai ser de graça? — perguntei, limpando o canto da minha boca.
sequer fingiu estar ofendido com a minha acusação, porque eu estava certa. Ele iria querer alguma coisa em troca e, se tratando do tamanho do meu desespero, eu estava disposta a aceitar qualquer termo.
— Estou salvando um pouquinho da sua vida. — Ele juntou o polegar e o indicador, deixando um espaço bem pequeno entre um e outro. — Mereço ser recompensado.
Mordi a parte interna da minha bochecha, estreitando os olhos na direção dele.
Eu acreditava que todo mundo nessa vida tinha alguém que te fazia pagar por cada pecado da vida passada. Não me restava dúvidas que o meu karma era .
Deixei o copo de sorvete sobre a mesa, lambendo a colher inteira.
— O que você vai querer em troca? — finalmente perguntei.
bebeu um gole longo do café, fazendo aquilo de propósito, apenas para prolongar o tempo que a minha curiosidade durava. Seus olhos não desviaram de mim nem mesmo por um momento, suas íris brilhando na minha direção.
— Um encontro — ele soltou.
Comecei a tossir baixinho, sendo pega de surpresa com o seu termo. Bati duas vezes devagar no meu peito e recuperei o meu fôlego de volta, percebendo que eu tinha entendido certo mesmo. Ele estava pedindo um encontro.
Comigo.
— Está me chantageando para sair com você? — indaguei, surpresa.
não estava nem mesmo abalado. Ele queria aquilo e era a sua forma de conseguir sem receber um não tão direto.
— Eu tinha planejado te chamar para sair antes — ele confessou, sem medo de admitir. — Mas você deve compreender o meu lado quando digo que você não facilita nenhum pouco, patinadora.
Lambi os meus lábios, segurando a colher com força e resolvi tomar mais uma colherada do sorvete de creme, espantando as ideias de assassinato da minha mente. Eu preferia não cometer nenhuma atrocidade contra os direitos humanos e nem desperdiçar o meu réu primário com uma coisa tão pequena e mesquinha.
Eu precisava de um parceiro e ele queria sair comigo. A conta era simples e eu podia pagar por ela.
— Quem você tem em mente? — questionei.
Se eu fosse sair com ele, era bom que eu tivesse certeza de que o parceiro seria pra valer. Não que eu duvidasse do , mas preferia não arriscar a minha carreira daquela maneira. Eu simplesmente não tinha tempo para brincadeiras e Janie estava falando sério quando disse que me colocaria fora da temporada.
— Leo — ele respondeu. — Meu irmão gêmeo.
Eu não esperava que ele tivesse um irmão, menos ainda que fosse gêmeo. Ao menos que ele fosse um pouquinho mais suportável.
— Seu irmão é patinador artístico?
assentiu.
— Sim, mas tirou um ano de férias — explicou. — Voltou para a cidade há uma semana e está querendo voltar para as Competições, só que não pode fazer isso sem uma parceira. Depois do seu anúncio, resolvi juntar uma coisa com outra.
Parecia bom demais para ser verdade, mas eu não tinha exatamente uma escolha, tinha?
— Leo me ensinou tudo o que eu sei sobre patinação — acrescentou. — É por isso que fui tão bom em patinar com você.
Fazia todo o sentido. Só não explicava a química que eu senti ao patinar com ele, mas eu preferia não pensar sobre aquilo naquele momento.
— E o Leo sabe que você está usando ele para ter um encontro comigo? — indaguei.
Contra a minha vontade, havia um sorriso pequeno nos meus lábios. Eu não acreditava mesmo que ele tinha feito aquilo, mas passada a irritação, era meio engraçado. Eu teria mesmo dito não se ele me chamasse.
— Um pequeno preço a se pagar — se defendeu, encolhendo os ombros. — O Leo aceita ser o seu parceiro, se é isso que está perguntando. É por isso que estou aqui agora.
Queria entender como tinha tanto poder sobre minhas emoções em relação a ele. Uma hora eu estava tão irritada que queria esganar o seu pescoço, e outra eu simplesmente poderia cair em seus braços e beijá-lo, como agora.
— Eu aceito qualquer coisa por isso — eu disse, aliviada. — Inclusive, sair com você.
sorriu tão lindamente para mim que nem reclamei pelas próximas horas seguidas.

Duas horas mais tarde, eu estava no rinque do Clube Ice Skin, me aquecendo. Havia umas garotas mais novas treinando por ali, mas não me importei, porque não era o meu horário fechado de treino. Eu só estava ali porque tinha pedido para levar o Leo e comuniquei à minha treinadora sobre o que tinha acontecido. Ela estava sentada na arquibancada, usando a mão para acenar quantas voltas eu ainda precisava dar em torno do rinque. Quando ela acenou mais uma vez na minha direção, avistei descer as escadas e patinei até a bancada que me separava do chão firme e atravessei, esperando ele descer até chegar perto de mim. Janie também se levantou.
Eu reconheci facilmente pelo sorriso fabuloso que ele sempre mantinha nos lábios, os fios dos cabelos sedosos bagunçados, mas era inevitável não o confundir com o seu irmão gêmeo, descendo ao seu lado. Os dois pararam diante de mim e fiquei encarando-os por algum momento, em total silêncio, buscando mais diferenças entre os dois, mesmo que fossem idênticos. Leo tinha uma pequena mancha em torno do pescoço que não tinha, enquanto tinha um sinal no meio da bochecha esquerda que Leo não tinha. E era só a primeira diferença que eu tinha encontrado, além do sorriso. Até o corte de cabelo era igual.
, esse é o Leo — me apresentou e o seu irmão me estendeu a mão, a qual eu aceitei prontamente, apertando firme. — Leo, essa é a . Sua futura parceira.
estava confiante que a nossa parceria daria certo.
— Espero que não seja tão irritante quanto o seu irmão — falei, soltando a minha mão da dele e Leo riu gostosamente.
— Eu sempre fui mais legal que ele, não se preocupe — me tranquilizou e eu fingi soltar um suspiro dramático e aliviado. — Obrigado por aceitar me dar uma chance, não parava de falar de você o tempo todo.
O jogador chutou o seu irmão discretamente na perna, mas eu percebi e segurei o riso. Pela primeira vez, ele pareceu constrangido em ser entregado daquela maneira.
— Bom, meninos, essa é a Janie — apresentei a mais velha ao meu lado, que assistia a tudo em silêncio. Ela acenou para os gêmeos. — Minha treinadora.
— Podemos conversar antes de você fazer o teste com a ? — Janie pediu a Leo, que concordou rapidamente.
Observei a minha treinadora levá-lo para algum escritório vazio. Não me preocupei tanto com aquilo, porque Janie só queria se certificar de que as coisas estavam certas antes de me firmar com uma nova parceria. Me sentei em um dos assentos livres e cruzei os braços, só me restando esperar.
— Sei que ele já agradeceu — murmurou, se sentando ao meu lado. — Mas obrigado mesmo por dar uma chance para ele. Leo estava precisando disso.
Assenti, aceitando o agradecimento. Era ele quem estava salvando a minha vida, na verdade, e não o contrário.
— Se ele for tão bom quanto você, não será um problema.
riu.
— Ele não é tão bom quanto eu, esquentadinha — rebateu. — Ele é melhor.
Estranhamente, aquilo me confortou.
— Então… Suponho que estou te devendo um encontro.
Ele me encarou fixamente, quase sem piscar os olhos.
— Sim — concordou. — E espero que seja o melhor encontro da sua vida.
Eu ri, balançando a cabeça. Era muito fácil me acostumar ao seu jeito, mas não às emoções que ele me proporcionava.
— Não tive muitos encontros na vida — confessei. — Cresci com uma rotina muito fechada e quase sem tempo nenhum.
balançou a cabeça, parecendo saber exatamente do que eu estava falando.
— Isso é ótimo — comentou. — Significa que eu tenho menos concorrência do que eu esperava.
Murmurei um idiota baixinho e antes que pudéssemos continuar o assunto, Leo e Janie tinham voltado. Só percebi agora que Leo estava vestido perfeitamente para uma tarde inteira de treino e só precisou pegar os seus patins na bolsa que carregava, calçando-os em seguida.
— Nós vamos testar a sua sincronia com ele, ok? — Janie se virou para mim e eu assenti, descruzando os meus braços e me levantando do assento. — Não precisam começar com nenhum elemento obrigatório, só patinem juntos.
Leo assentiu rapidamente e nós dois seguimos para o rinque de gelo, deslizando juntos. Eu patinei para o lado oposto ao seu e parei a uma certa distância dele, girando de frente para ele. Leo me encarou com um sorriso tranquilo e quando eu acenei, nós dois patinamos juntos na direção um do outro. Chegando perto o suficiente, nos colocamos lado a lado, como se eu fosse o espelho dele e vice-versa, sempre repetindo qualquer movimento, entrando em sequência. Nossos movimentos estavam sincronizados e realizamos uma sequência perfeita de spins, girando ao mesmo tempo no espaço do meio do rinque.
Nós continuamos patinando juntos por algum tempo ainda e quando finalizamos, com ele me segurando pela cintura de frente para ele, nossos rostos quase se tocando, percebi que eu estava satisfeita em aceitar ele como o meu parceiro.
A única coisa que me incomodava era que não senti nem mesmo um terço da faísca que eu senti ao patinar no gelo com .
E eu não sabia se deveria me preocupar com aquilo.

uma semana depois


Bocejei, sentindo o meu corpo inteiro reclamar de cansaço, depois de mais uma manhã inteira treinando a nova coreografia que Joe estava ensaiando conosco. Ele era o meu coreógrafo preferido e sempre sabia o que estava fazendo, então quando Janie acertou a minha parceria com Leo, pedi que ela também solicitasse o trabalho de Joe. Desde então, tínhamos começado uma semana intensa, já que estávamos atrasados, em comparação com outras duplas de dança.
— Eu estou liberado? — Leo surgiu ao meu lado, com uma garrafa de água na mão, estendendo para mim.
Resmunguei uma aprovação e aceitei a garrafa, girando a tampa e bebendo consideráveis goles, me molhando um pouco. Ele riu do meu desespero e eu olhei ao redor, procurando nossa treinadora e nosso coreógrafo, mas eles não estavam em lugar nenhum. Como era sexta-feira e eu não tinha balé e nem academia, optei por ter a tarde inteira livre para descansar.
— Sim — respondi a sua pergunta, passando as costas da minha mão para enxugar a minha boca. — Nós ainda temos treino amanhã, mas domingo é nossa folga, está bem?
Ele concordou com um aceno e fez um high-five comigo em despedida. Leo era muito diferente do irmão. Enquanto era mais engraçadinho e extrovertido, Leo era o total oposto. Gostava de ser deixado quieto em um canto, mas também gostava de conversar sobre tudo. Ele me fazia rir e nós tínhamos criado uma boa relação durante aquela primeira semana de treinos.
Era importante que nos déssemos bem ou isso seria levado para o gelo, o que acabaria atrapalhando a nossa performance. Tirei os meus patins, ficando descalça e comecei a subir as escadas, segurando os calçados em mãos, enquanto eu ia direto para o vestiário. surgiu um corredor depois.
— O que você vai fazer o resto da tarde? — ela perguntou, andando ao meu lado.
— Dormir? — arrisquei, sem saber exatamente o que eu iria fazer mesmo.
bufou.
— Eu te odeio — murmurou. — Vou ficar treinando o resto do dia. George anda muito exigente e preciso aperfeiçoar os meus saltos. E por falar em treino…
Atravessei a porta do vestiário, percebendo que não estávamos sozinhas daquela vez. Umas meninas mais novas também estavam presentes, mas não me importei. Eram adolescentes que não mexiam com ninguém.
— O Leo é um gato — ela completou.
Abri o meu armário e encarei a minha melhor amiga com uma sobrancelha arqueada.
— Isso implica em você achar o bonito também — observei.
Guardei os meus patins dentro do armário e tirei a minha bolsa, procurando o meu celular dentro. Quando o encontrei, havia diversas mensagens não lidas.
— Eu nunca disse o contrário, baby — me respondeu. — Então, eu posso investir no Leo?
Deslizei o meu dedo pela tela do celular, desbloqueando. Acessei a barra de notificações, ignorando as outras mensagens de grupos e abri a de . Nós tínhamos trocado os números alguns dias antes e às vezes ele mandava mensagens apenas para me provocar um pouco.
— Por que você precisaria da minha permissão para isso? — indaguei , ainda sem parar de encarar a tela. — E você não estava de flerte com o jogador de hóquei?
Ela tentou ver o que tanto eu mexia no celular, mas levantei os olhos na direção dela, fazendo-a me encarar. deu de ombros.
— Ele é seu parceiro, e eu flerto com todo mundo.
Comecei a rir, balançando a cabeça, porque nunca ouvi tanta verdade. Eu tinha parado de contar todos os caras com quem ela flertava, porque quando chegava a hora dela me contar alguma coisa, nunca era sobre o cara anterior; era sobre um novo que eu precisava me inteirar.
— Ser meu parceiro não significa que ele está comprometido comigo — expliquei o óbvio para ela, pendurando a alça da minha bolsa no meu ombro, o celular ainda na minha mão. — Ele está solteiro, .
Ela bateu na própria testa, como se lembrasse de algo importante.
— Ah, é. Esqueci que você está interessada no outro gêmeo — soltou.
Estapeei o seu braço levemente, fechando o meu armário e dei as costas para ela, por sempre falar tanta bobagem, mas eu ainda tinha que responder à mensagem de .
— Qual é? — Ela me seguiu, lado a lado comigo. — Eu vi a mensagem, ele está te chamando para jantar. Na casa dele.
Era impossível não sentir que ela estava sempre dando uma indireta.
— Bisbilhoteira — murmurei, em tom acusatório, mas ela estava certa.
Ele estava mesmo me chamando para jantar em sua casa, dizendo que eu ainda devia um encontro a ele, já que das outras vezes eu usava o treino e o cansaço como desculpa. Daquela vez, como Leo tinha saído mais cedo, ele encontrou a oportunidade perfeita para me encurralar.
— Você vai?
— Eu não sei — respondi, mordendo o meu lábio, insegura.
Tinha aprendido a gostar do , mas ele claramente tinha outras intenções que eu não sabia se queria suprir agora. Sim, ele era bonito, inteligente e… irritante. Mas, principalmente, era um jogador de hóquei. Eu devia me manter longe desses garotos.
— O que você tem para fazer? — questionou. — Ou melhor, o que você tem a perder? Provavelmente vai ser bom para você tirar as teias de aranha no meio das pernas.
! — exclamei, rindo.
Intimidade era uma merda e era a prova viva disso, sem nenhum filtro na boca.
— Bobagem — gesticulou exageradamente com as mãos e em seguida apontou para o meu celular. — Diga que aceita.
Sem saída dos dois lados, soltei um suspiro, deslizando o meu dedo para desbloquear a tela de novo. Abri direto na mensagem de e respondi.

diz, às 10:14am: Jantar na minha casa às oito? Você me deve um encontro, patinadora ;)

, às 13:01pm: Jantar aceito, mas só porque odeio te dever alguma coisa!


A resposta veio imediatamente.

Tuner diz, às 13:01pm: Vou te mandar o meu endereço, mas, por favor, não espalhe.


Bloqueei o celular de novo e guardei dentro da minha bolsa, me virando para .
— Satisfeita? — perguntei.
Ela bateu palmas irritantes e sorriu abertamente para mim, cruzando os nossos braços, me puxando para continuar andando.
— Agora, qual a chance de você adiar um pouco o seu sono para almoçar comigo? Minha mãe quer te ver.

Casa de — 20:03pm


Eu não era o tipo de garota que ficava nervosa com um encontro, mas fazia três minutos que eu estava parada na frente da porta de , sem coragem de bater. Nunca tinha tido um encontro tão particular, na casa de nenhum homem, mas é claro que me faria ter uma primeira vez para aquilo.
E, na verdade, a culpa não era dele exatamente. Era minha. Ele tinha me chamado muitas outras vezes antes, cobrando a minha parte do acordo, sempre pronto para me levar a algum restaurante, parque, o que fosse, mas não para a sua casa. Esse deveria ter sido o seu último recurso e eu só estava pagando pelas consequências das minhas escolhas. Sua casa era o seu lar, um lugar onde ele era totalmente ele mesmo, suas coisas pessoais estariam espalhadas por tudo que fosse canto.
Eu estava mesmo prestes a conhecer todo o seu lado pessoal e ele estava permitindo isso.
Suspirei, olhando o meu relógio de pulso, constatando que tinha passado mais dois minutos parada ali, fervendo os neurônios dos meus pensamentos. Me xingando baixinho, levei a minha mão em punho e bati três vezes firme contra a madeira da porta. Não demorou menos que um minuto para que abrisse, revelando-o inteiro, vestido de calça e camisa social preta, mas descalço, com o cabelo despenteado. Era possível que eu o achasse mais bonito do que da última vez que o vi?
— Confesso que estava esperando você amarelar — contou, com um sorriso no rosto, me dando espaço para entrar na casa. — Tire os sapatos, por favor.
Ele morava em um bairro tranquilo, sete quadras depois do meu apartamento. Estava frio pra caramba, então eu optei por usar um vestido leve, com mangas longas e uma sapatilha, com uma tiara fina de pedras brancas, decorando o meu cabelo solto. Como não tinha trazido nem bolsa e nem o meu celular, entrei e tirei as minhas sapatilhas, deixando-as de lado, perto da porta. fechou-a atrás de mim e eu passei o olhar ao redor, observando a sua decoração.
Era uma casa simples e bonita, com a cozinha ligada à sala. Havia um pequeno corredor que dava a três portas e imaginei que fossem os quartos e o banheiro.
— Sinta-se em casa — me desejou e eu assenti com um sorriso no rosto.
Ele andou até a cozinha, indo para trás da bancada e eu acompanhei os seus passos, sentindo um cheiro ótimo no ar. Olhei para todos os quadros pendurados na parede e não me surpreendi quando percebi que eram fotos somente dele. Ele no rinque de gelo, ele em algum lugar que não reconheci, ele bebê.
— Uau — eu soltei. — Você parece mesmo ter um complexo narcisista. Nenhuma foto da família?
Me virei para ele e olhou para mim.
— Aquele quadro ali — ele apontou para um quadro bastante pequeno perto da televisão, em comparação com os outros.
Comecei a rir e balancei a cabeça, chegando mais perto da foto, encontrei ele e Leo crianças, abraçados a uma mulher jovem e um homem sério.
— Você parece com sua mãe — murmurei.
— Obrigado — ele devolveu. — Ela teria gostado de você.
Umedeci os meus lábios, deixando as fotos de lado e andei até a bancada, me sentando em uma das cadeiras livres. Mordi o meu lábio, meio sem jeito.
— Sinto muito — murmurei novamente, me sentindo uma garota inconveniente.
continuou cortando um pedaço de cebola e balançou a cabeça, olhando para mim rapidamente, um sorriso tranquilo brincando nos lábios.
— Está tudo bem — ele me tranquilizou. — Eu tinha 10 anos.
Assenti devagar, mas tive dificuldade de continuar a manter o assunto. Eu não sabia como era para ele falar da mãe e preferia não forçar nada, então tentei ser o mais descontraída possível para que não ficasse um ambiente constrangedor entre nós.
— O que você está fazendo? — perguntei, observando-o coçar o nariz com o braço descoberto.
Ele fungou baixinho, afetado pela cebola.
— Pizza com recheio especial — ele respondeu, olhando rapidamente para mim. — Não vai demorar muito para ficar pronto e eu espero que você goste do molho.
— É molho secreto? — indaguei e ele assentiu, bastante misterioso. — Eu não sabia que você iria cozinhar. Achei que era bastante provável você pedir alguma coisa.
parou de cortar as cebolas e misturou-as a algum ingrediente na panela que eu não consegui ver. Mordi o meu lábio, percebendo só agora que ele estava usando um avental preto, deixando-o, se era possível, mais bonito do que já estava.
— Eu gosto de cozinhar — ele comentou. — Achei que seria ótimo começar o nosso primeiro encontro mostrando as minhas melhores qualidades. Não que eu tenha algum defeito, claro.
Ri, balançando a cabeça, nem um pouco surpresa com a sua falta de humildade. Não achei que ele estava com o dom de me irritar naquela noite, mas a verdade era que eu estava gostando do , o que não dava espaço para eu odiá-lo, nem mesmo um pouco, ou quase por alguns segundos. Ele me arrancava risadas leves.
— Posso começar a listar todos os seus defeitos aqui — falei, levantando uma mão e enumerando os dedos. — Você quer saber?
me olhou feio e eu apoiei as minhas mãos na altura dos ombros, me rendendo. Deixei-o quieto por um momento, sem querer atrapalhar a sua finalização do jantar e, aproveitando que ele estava ocupado, tomei a liberdade de colocar os pratos, talheres e copos na mesa, que ficava bem ao nosso lado. A casa era pequena, simples e muito bonita, um perfeito espaço para alguém que morava sozinho.
, você é a minha convidada. — se virou, tirando o avental depois de colocar a pizza no forno. — Solte esses talheres.
Não obedeci, terminando de finalizar a mesa. Ele balançou a cabeça na minha direção e parou atrás de mim. Eu não percebi que ele estava tão perto até sentir a sua respiração bater contra a minha nuca.
— Você é muito teimosa, patinadora — ele sussurrou.
Engoli a seco, estremecendo só um pouquinho com a sua proximidade. , ousado como era, tocou a pele do meu braço delicadamente e eu acompanhei os movimentos da sua mão com os olhos.
— Não tanto quanto você — rebati.
Ele subiu a mão mais um pouco, parando no meu ombro. Minha respiração estava um pouco ofegante, então eu me afastei dele e fiquei de frente para ele, encarando os seus olhos intensos sobre mim.
— Desculpe, não quero apressar nada — ele murmurou e eu, sem confiar em mim mesma para dizer alguma coisa, apenas assenti.
caminhou para trás da bancada e voltou com uma taça de vinho tinto. Ergueu a garrafa para mim e as duas taças na outra mão, apontando para o sofá.
— Enquanto a pizza não fica pronta — disse.
Concordei com um aceno e segui os seus passos até o sofá da sala, que comportava três pessoas, e me sentei perto do braço direito, enquanto ele ficou mais para o lado esquerdo, me servindo um pouco do vinho. Ainda me recuperando do momento quase íntimo de segundos atrás, não hesitei em tomar um gole imediatamente quando segurei a taça. riu.
— Você me beijou antes — ele lembrou. — Não precisa ficar nervosa dessa forma.
Umedeci os meus lábios, lembrando do beijo. Infelizmente, eu não lembrava qual era a sensação de beijá-lo, porque não fiz aquilo por querer. Fiz porque ele estava em pânico e foi a única maneira que eu achei de distraí-lo, para que ele focasse em respirar. Não o beijei por diversão ou prazer.
— Antes eu te odiei — respondi.
Segurei a taça com firmeza, o gosto do vinho ainda na minha boca.
— E agora?
— Leo fala o tempo todo sobre você — contei, mordendo a parte interna da minha bochecha. — Cheguei a pensar que você o tinha subornado para isso, mas ele te ama tanto que é espontâneo.
Ele acenou com a cabeça e sorriu sincero. Todas as vezes que eu e Leo tínhamos uma pausa do treino, nós conversávamos um pouco. Ele gostava de me contar coisas sobre a sua infância e sobre e como tinha sentido falta dele quando precisou morar tão longe.
— Depois da morte da nossa mãe, nós ficamos mais unidos — ele disse, suspirando. — Ele é mais velho apenas por alguns minutos, mas sempre pareceu novo demais.
Por ser filha única, eu não entendia sobre aquele laço de sangue.
— Eu acho a relação de vocês linda — comentei, sincera. — O mais próximo que eu tenho de uma irmã é a . A família dela é a minha e a minha é a dela.
— Eu acho importante não crescer sozinho — acrescentou, bebendo um pouco do seu vinho, extremamente calmo. — Eu amo o meu pai, mas Leo me segurou todos esses anos.
Fui salva de dizer alguma coisa com o alarme do forno apitando. deixou a garrafa de vinho e sua taça pela metade em cima de uma mesa pequena de vidro que ficava bem no centro do espaço. Ele se levantou e eu o observei andar até a cozinha, retirando a pizza. O cheiro estava ótimo e minha barriga reclamou de fome.
— Venha jantar — ele me chamou.
Deixei a minha taça de vinho junto da garrafa e me levantei, caminhando até a mesa, onde a pizza estava servida.
apontou para mim de um jeito engraçado, em seguida olhou para pizza.
— Vamos fazer um combinado — sugeriu. — Essa vai ser a melhor pizza da sua vida. Se não for, está me devendo um beijo.
Arqueei a sobrancelha na sua direção e me sentei na cadeira, fingindo pensar. Ele começou a me servir em silêncio e eu soube que, independente do que eu achasse sobre a sua pizza, aquela noite acabaria com um beijo.


Parte Quatro

and love me

duas semanas depois


, entra aqui!
Encarei por breves segundos, decidindo se eu iria mesmo atender o pedido dela, mas como eu já estava com os patins nos pés mesmo, deslizei pelo gelo até ela.
Eu estava no intervalo e Leo tinha me chamado para assistir um pouco do treino da minha melhor amiga e foi como eu descobri que os dois andavam saindo juntos. Eu não me importava. Leo era um cara bacana o suficiente para eu saber que não magoaria a com tanta facilidade e ele parecia estar — cada dia mais —, gostando dela pra valer. No entanto, era a primeira vez que eu via a minha melhor amiga tentar se comprometer com alguém.
— Nós poderíamos tentar um salto juntas — ela sugeriu, assim que eu cheguei perto.
Cocei a bochecha, encarando-a, com as duas mãos na cintura.
— Mas, … — comecei a falar. — Você sabe que não consigo.
Minha melhor amiga gesticulou exageradamente com as mãos.
— Faz muito tempo, — argumentou. — Não custa nada tentar. Nós gostávamos de fazer isso, lembra?
Ela tinha razão. Mesmo que eu tivesse optado por seguir a carreira de patinação em dupla, era uma tradição nossa tentar os melhores — e talvez mais difíceis —, saltos, simplesmente por diversão e para que ela se aperfeiçoasse cada vez mais. Apesar de ter dificuldades de executar alguns, era perfeita em executar um lutz e um salchow jump. Eu, por outro lado, sempre fui péssima.
— O George me deu vinte minutinhos de descanso — ela disse. — Podemos tentar um triple axel.
— Não tinha um salto mais fácil? — ironizei, recebendo um sorriso quase inocente dela.
Deixei escapar um suspiro e soltei as minhas mãos da cintura, assentindo para ela. soltou um yay feliz e eu balancei a cabeça, me perguntando se havia alguma coisa no mundo que aquela garota me pedia que eu não fazia. Com um aceno, nós duas começamos a patinar ao redor do rinque, preparando o nosso corpo para realizar o salto. Eu, principalmente.
Deixei os meus braços livres, ficando a uma distância segura dela e demos uma, duas, três voltas antes de finalmente criar um impulso firme e girar de costas. Quando tentamos executar o triple axel, rodopiando por alguns segundos fora do solo, conseguiu se manter de pé ao atingir o solo de novo, mas eu, como tinha adivinhado, caí direto no rinque, de bunda no chão. Eu não esperava mesmo conseguir realizar com perfeição, ou simplesmente conseguir, visto que eu não tinha prática daquilo há anos, principalmente depois do meu acidente.
Resmunguei frustrada e bufei, me levantando do chão, e passei as mãos na minha bunda, limpando qualquer sujeira.
— Desculpa, murmurou, culpada.
Suspirei baixinho e sorri para ela.
— Não foi sua culpa. — Dispensei o seu pedido de desculpas com um gesto de mão. — Nós duas sabíamos que eu não ia conseguir.
Ela encolheu os ombros como se realmente esperasse por aquilo, mas, para ela, valia a pena tentar. Tudo valia a pena para .
Nós patinamos de volta para a arquibancada.
— Eu não vim aqui só para assistir um pouco do seu treino — falei, me sentando em um dos bancos livres. — Preciso que me ajude a decidir a música do nosso programa.
— E quais são as opções? — questionou.
Eu estava prestes a responder, quando Leo surgiu atrás dela, com dois copos de café com leite. Ele me ofereceu um e eu murmurei um agradecimento, assistindo-o entregar outro para , depois de roubar um selinho dela.
— As opções são infinitas — Leo respondeu. — Sua melhor amiga é tão indecisa que não levou em consideração nem a opinião do nosso coreógrafo.
soltou uma risada divertida, conhecendo bem o meu histórico de ser indecisa.
— Cale a boca, Leo — murmurei, desgostosa, bebendo um gole do meu café favorito. — Você também não ajudou nenhum pouco. E é um inútil.
Ele balançou a cabeça.
— Ele também tentou te ajudar — defendeu o irmão.
Revirei os olhos.
— Não tentou, não — rebati. — Ficar me beijando ao invés de olhar a minha lista não conta exatamente como uma ajuda.
Desde o meu jantar com na casa dele — e depois da noite realmente ter acabado em beijo —, resolvi que eu podia dar uma chance a ele. Nem todos os jogadores de hóquei podiam ser babacas comigo e só tinha sido gentil até agora.
— Me dê essa lista — pediu.
Apontei para Leo, indicando o celular dele, já que eu sempre deixava o meu guardado no armário em horário de treino. Ele tirou o aparelho do bolso largo da calça de pano e destravou a tela. Em seguida, entregou o celular para minha melhor amiga.
— Minha nossa, — ela disse. — Vinte e cinco músicas?
Encolhi os meus ombros, sem defesa, ocupando a minha boca com o café.
— Vou precisar de pelo menos uma hora para analisar tudo — acrescentou.
Como eu sabia que ela iria realmente me ajudar a decidir, aceitei a sua condição. Me levantei do banco e chamei Leo.
— Se despeçam de uma vez — falei, revirando os olhos para os dois grudados. — Temos teste de figurino em dez minutos.
Fui na frente e deixei Leo para trás, aproveitando o restante do intervalo com a minha melhor amiga.

Gritos e mais gritos preencheram os meus ouvidos.
A arquibancada estava cheia e apesar de não entender nada do que estava acontecendo naquele jogo, eu simplesmente vibrava quando e Leo começavam a gritar junto com a torcida. Eu não entendia nada de hóquei no gelo. Só assistia eles patinarem pelo rinque correndo, atrás daquela pequena bola que deslizava pelo gelo até o gol.
Mas eu tinha um interesse específico naquele jogo. fazia parte dele e tinha me convidado pessoalmente para assistir à partida. Como às vezes ele se submetia a assistir o meu treino com seu irmão, nada mais justo que eu devolver aquela troca de atenção. A multidão vibrou de novo e Leo gritou o fim da partida, comemorando a vitória do time do irmão e me levantei junto a eles, comemorando aos gritos, lançando beijos para , que fingiu pegar para si.
Meu Deus. Eu me sentia patética. Tinha mesmo me tornado uma adolescente apaixonada que vibrava pelo cara em um jogo de hóquei a ponto de mandar beijos pelo ar para ele. A ponto de me sentir feliz por isso, de estar satisfeita ao encarar o seu sorriso vitorioso.
— Aí, disse um pouco alto ao meu lado, devido ao barulho. — Depois dessa, ele bem que merece um bom sexo daqueles, não é?
Ri tão alto que ninguém se importou. Empurrei a minha melhor amiga com o ombro e nós seguimos a multidão para sair da arquibancada.
Dez minutos depois, apareceu na saída, com a roupa trocada e o cabelo bagunçado, mas com um sorriso gigante no rosto, me agarrando pela cintura. Fui totalmente surpreendida com um beijo e sorri contra os seus lábios, segurando seu rosto com as duas mãos, ouvindo exclamações engraçadinhas de e Leo.
Me afastei de , mas ele não me soltou, me abraçando pela cintura.
— Como vamos comemorar a minha incrível e bela vitória? — indagou, olhando para nós três.
segurou o braço de Leo.
— Infelizmente, nós já temos planos — ela disse. — Vocês vão ter que comemorar sozinhos.
Estreitei os olhos na direção dela, não caindo nenhum pouco naquela conversa e muito menos no sorrisinho inocente que ela me lançou. Eu sabia muito bem qual era a sua intenção por trás do sorriso.
— E não voltarei para casa hoje, irmão — Leo acrescentou, bem sugestivo.
Apontei um dedo para os dois.
— Vocês ensaiaram isso? — questionei, sentindo morder levemente o meu ombro e depois rir.
Os dois deram de ombros.
— Quer ir lá para casa, patinadora? — sugeriu.
Revirei os olhos ao encarar a expressão intimidadora de .
— Divirtam-se — falei para e Leo.
Puxei a mão de , fazendo-o me soltar do abraço e começamos a andar juntos, de mãos dadas, até o seu carro estacionado do outro lado da rua. Eu tinha fuzilado por não ser nada discreta com suas ideias, mas queria mesmo ficar um pouco sozinha com .
Entrei no banco passageiro, enquanto ele entrou no motorista e deu partida logo em seguida.
— Quer comprar algo para comer? — ele sugeriu, mantendo os olhos atentos na estrada.
Olhei por um instante pela janela, ligando o aquecedor do carro.
— Achei que você fosse cozinhar.
sorriu de lado.
— Estou te acostumando muito mal — disse. — Você vai dormir lá em casa?
Senti um tom ansioso na sua voz. Parei de olhar pela janela e me virei para ele, mordendo o meu lábio, pousando uma mão em cima da sua coxa.
— Você quer muito isso, não é? — Esfreguei a minha mão na sua pele, por cima da sua calça jeans.
Ele soltou um suspiro contido. Faltavam apenas algumas quadras para que chegássemos à sua casa.
— Estou louco por você, .
Segurei a respiração, afetada por sua declaração. Beijei a bochecha de e apertei a sua coxa de propósito.
— Cozinhe para mim e eu durmo na sua casa — decretei. — E depois posso te dar a sobremesa.
Ele estacionou o carro bem na frente da sua casa. Desligou o motor e se virou para mim, os olhos intensos.
— Combinado.
Saí do carro primeiro que ele, pegando a chave que ele jogou para mim. Andei até a porta e coloquei a chave na fechadura, mas ela já estava aberta. Estranhando, franzi o cenho para .
— Você esqueceu a porta aberta? — perguntei.
parou ao meu lado.
— Não.
Com o corpo tenso, ele girou a maçaneta e abriu a porta, encontrando a luz acesa. De início, não havia nada estranho imediatamente: as coisas estavam no lugar e não havia nenhum sinal de roubo. Mas quando e eu entramos, encontramos uma garota da minha idade parada atrás do batente da cozinha, comendo um cereal. E notei duas malas grandes bem perto da mesa, no chão.
— O quê…? — comecei a dizer, mas parei.
A garota levantou os olhos na nossa direção.
— Louisa? — murmurou.
A garota deixou o prato de cereal para trás e saiu do batente, andando até um pouco perto de nós.
? — chamei, mordendo o meu lábio. — Quem é ela?
Ele olhou para mim, mas não disse nada. Havia surpresa em sua expressão. Louisa sorriu na minha direção e eu percebi que ela era muito bonita, principalmente quando o seu sorriso acentuava as covinhas do seu rosto, o cabelo caindo em fios cacheados até os ombros.
— Eu sou Louisa Palmer — ela respondeu, cinicamente. — Eu sabia que ele ia usar as garotas para me esquecer, mas não achei que fosse ser tão rápido.
Trinquei os dentes, irritada com aquelas palavras. Meu problema ali não era com ela, era com a situação.
— O que você disse? — sussurrei.
— Eu disse que você é muito bonita para se submeter aos joguinhos do — ela respondeu.
lançou um olhar feio na direção dela e eu estava prestes a ir embora, já que aquele idiota não dizia sequer uma palavra e eu não iria ficar ali ouvindo provocações e insinuações.
— Você não contou para ela sobre mim, não é? — Louisa questionou a .
— Cale a boca — ele mandou. — , eu…
Quem é ela, ?
Ele esfregou o rosto com as duas mãos e me encarou.
— Ela era a minha namorada — explicou e Louisa soltou um estalo com a língua, insatisfeita. — Nós terminamos algum tempo atrás e eu fiquei mal, eu achei que…
— Achou o quê? — disparei, furiosa, meu peito subindo e descendo com a respiração pesada. — Que eu fosse um bom passatempo para você esquecer ela?
— Não! — exclamou, agoniado. — , me desculpa. Eu sei que eu fui um idiota.
Balancei a cabeça, entregando a chave a ele.
— Não — murmurei. — Idiota foi eu de ter acreditado em você.
Puxei a respiração, impedindo que meus olhos lacrimejados virassem lágrimas descendo pelas minhas bochechas. Não deixei dizer mais nada e nem sequer olhei para Louisa quando dei as costas e passei pela porta de volta, deixando-os sozinhos.
Eu devia ter sido um pouco mais firme na minha decisão de não me envolver com um jogador de hóquei. Quem sabe assim não estaria lidando com mais um coração partido.


três dias para a Competição Regional de Patinação Artística


Seguindo a coreografia, Leo tentou me segurar pela cintura antes de seguirmos a sequência de footwork para completar o dance lift com o curve lift, mas eu deslizei direto dos seus braços para o chão do rinque, caindo direto de bunda, com as pernas abertas em um V e comecei a xingar baixinho, ouvindo comentários de Joe e Janie, que resolvi ignorar.
Leo patinou ao meu redor e parou na minha frente, me oferecendo suas duas mãos estendidas. Aceite-as, deixando-o me levantar devagar e me coloquei de pé de novo, esfregando o rosto com as duas mãos, sentindo a minha cabeça latejar um pouco. Faltavam três dias para a nossa primeira apresentação no Campeonato e tínhamos tudo certo: coreografia, figurino, música. Tudo.
Mas durante aqueles treinos matinais, minha cabeça estava um pouco longe e eu acabava errando alguns passos fáceis, o que estava preocupando a minha treinadora.
— Pausa de dez minutos! — Janie gritou.
Observei-a suspirar e chamar Joe, saindo com ele pela porta que dava acesso aos corredores do segundo andar por uma escada. Patinei até a arquibancada, saindo do rinque, buscando minha garrafa de água direto.
— Você está um pouquinho distraída — Leo observou, sentando-se ao meu lado em um dos bancos livres.
Não olhei para ele. Mesmo que fosse muito diferente do irmão, os traços eram os mesmos e eu não queria lembrar do , a quem eu estava ignorando há dias.
— Só estou um pouco cansada. — Uma mentira que tinha o seu fundo de verdade, mas cansaço não era o meu problema.
Leo suspirou, tentando se conter para não me dizer algo, mas, no fim, não conseguiu se manter calado.
vem tentando te encontrar todas as vezes na esperança de te pedir uma chance para você ouvi-lo um pouco, mas como eu também observei, você é teimosa e orgulhosa — ele começou a dizer. — E como alguém que está assistindo os dois lados, eu sei que estão sofrendo por um mal-entendido. O nunca te usou. Ele jamais faria isso, não com você e com nenhuma garota, porque ele não é assim.
Pisquei os meus olhos, sentindo os batimentos do meu coração acelerarem e me virei, encarando Leo em silêncio, sentindo toda a sinceridade de suas palavras. Ali estava alguém que não aguentava estar de mãos atadas.
— Louisa é ex dele, mas ela era tóxica demais para o — continuou, percebendo que eu não iria interrompê-lo. — Ele duvidava de si mesmo diversas vezes por causa dela. E quando finalmente conseguiu pôr um fim no relacionamento, ele achou que não fosse superar o estrago que ela deixou. não estava te usando para esquecer Louisa, porque isso ele fez há muito tempo, . Você só o ajudou a se sentir confiante de novo.
Não percebi quando uma lágrima desceu rápido demais pela minha bochecha e limpei-a imediatamente.
— Não está dizendo isso porque ele é seu irmão? — indaguei.
Eu me sentia um pouquinho mal. Fui teimosa e orgulhosa, como ele tinha dito, mas eu não podia imaginar que a situação era totalmente outra. Que tipo de ex chegava na casa do cara com suas malas, e pior, tinha a chave da casa dele? Toda a situação tinha conspirado para eu pensar totalmente o contrário e não que a garota era problema.
— Também — Leo respondeu. — Mas estou dizendo principalmente como seu amigo.
Exibi um sorriso fechado de agradecimento. Leo balançou a cabeça e me puxou para um abraço, mesmo que fosse irritantemente tímido para isso.


Dia da Competição Regional de Patinação Artística


Mesmo depois da conversa com Leo, não procurei .
Entendi o seu lado através da defesa do seu irmão, mas, ainda assim, eu queria que ele tivesse confiado em mim o suficiente para me contar sobre aquela parte da sua vida. O orgulho e a mágoa ainda falavam mais alto e decidi que podia resolver os meus sentimentos depois da Competição.
Andei de um lado para o outro, mordendo a pele do meu polegar, totalmente nervosa.
, você vai acabar cavando um buraco desse jeito — Janie repreendeu com a voz baixa. — Fique quieta ou vão perceber o seu nervosismo.
Olhei-a meio desesperada.
— Como você quer que eu fique? — exclamei, no mesmo tom de voz. — O Leo não está aqui e somos a próxima dupla!
Ela respirou fundo, entendendo totalmente o meu estado. Era para meu parceiro ter chegado uma hora atrás, mas Leo sequer tinha aparecido.
? — minha treinadora chamou.
Minha melhor amiga voltou para o nosso lado, uma expressão nada boa no rosto.
— Ele não atende — contou, mordendo o lábio apreensiva.
Soltei um suspiro, sentindo que a qualquer momento eu teria um colapso nervoso, mas antes, eu mataria o Leo. Tinha todos os dias, durante semanas de treino, que ele poderia ter sumido. Mas tinha que ser justamente no dia da Competição, onde eu não podia sair para caçá-lo por aí. continuava tentando ligar para ele, mas sem sucesso algum. Ela até tentou o telefone de , mas estava dando desligado.
Olhei para o rinque, onde a dupla americana estava dançando e deixei meus ombros caírem. Se Leo não chegasse nos próximos dois minutos seguidos, eu não participaria da Competição. Estava fora.
Todos meus esforços teriam sido em vão.
Talvez eu voltasse para casa dos meus pais e ficasse um tempo lá, até passar o desgosto da minha carreira e voltar a tentar novamente o que eu vinha fracassando.
— Ai, murmurou, mais apreensiva do que eu. — Eu sinto muito!
Umedeci os meus lábios e assisti a dupla terminar a apresentação.
Leo sequer tinha aparecido.
Eu sabia que não era do feitio dele sumir daquela forma, mas eu imaginava que ao menos ele fosse mandar uma mensagem avisando, atender o telefone, qualquer coisa. Os não podiam me decepcionar em dupla dose daquela maneira. Não quando eu estava disposta a perdoar o .
Olhei para a minha treinadora desesperada e ela soltou um suspiro, sentindo-se derrotada, totalmente de mãos atadas. Não havia o que pudesse fazer se o parceiro de uma dupla tinha furado o compromisso.
Minha única saída era abandonar o rinque, tal qual um ator abandonando o palco.
Quando uma voz feminina anunciou meu nome e o de Leo através dos microfones, eu estava prestes a dar as costas e ir embora, quando uma voz conhecida me chamou.
!
Olhei na direção da voz, encontrando um ofegante.
— O que você está fazendo aqui? — disparei a pergunta, sem dar chance dele continuar dizendo qualquer coisa.
A plateia e os jurados ainda esperavam a dupla aparecer, mas eu sequer tinha movido os meus pés.
apoiou as mãos nos próprios joelhos e tentou controlar a respiração, erguendo o corpo inteiro de volta. Eu cruzei os braços, encarando-o com firmeza, esperando uma resposta.
— Leo sofreu um acidente — ele contou e eu me desarmei total, o espanto surgindo na minha expressão.
também ficou alarmada e ele percebeu a nossa mudança de expressão.
— Ele está bem, não foi nada grave, mas… — acrescentou mais para que para mim. — , Leo não pode patinar agora. Ele fraturou o tornozelo.
Minhas esperanças morreram por completo com aquelas palavras. A Competição Regional era o fim para mim naquele ano. Quando a voz anunciou os nomes da dupla novamente, e eu olhamos para o rinque.
— Me deixe patinar com você — ele disse.
— O quê?
Olhei-o como se ele fosse louco. Eu não podia mudar de dupla na última hora.
— Me escute — pediu, falando rápido demais. — Eu sei que sou a última pessoa que você quer ver agora e com razão. Vou passar os meus dias te pedindo desculpas por ter te magoado com uma coisa que eu poderia ter evitado. Vou ouvir todos os xingamentos que você tem para mim em silêncio — acrescentou. — Mas depois. Agora, você tem uma competição para participar. Leo está muito mal por te deixar na mão desse jeito e ele me implorou que eu aceitasse a ideia louca de me passar por ele como o seu parceiro.
Pisquei meus olhos, sem reação com a proposta. e Janie estavam bem ao meu lado, em silêncio, ouvindo tudo o que estava dizendo. Estavam tão surpresas quanto eu.
— Hm — resmungou. — Isso não é meio que um crime?
deu de ombros.
— A vale a pena — ele disse.
— Isso pode te custar a sua carreira — Janie alertou.
fez uma careta, como se só agora estivesse cogitando aquela possibilidade.
— Não tinha pensado nisso — confessou, um suspiro escapando dos lábios. Em seguida, ele voltou a olhar para mim. — Eu sei que essa ideia é uma loucura, mas é a única que temos. Só a gente vai saber disso. Ninguém vai desconfiar que não sou o Leo, a roupa esconde a nossa única diferença.
Ele apontou para o pescoço coberto, me fazendo reparar só agora que ele estava vestido com a roupa do figurino que eu tinha combinado com Leo. De longe, ninguém perceberia nenhuma diferença entre eles.
— Eu sei toda a coreografia — tentou me convencer. — Leo me ensinou cada passo.
Olhei para Janie, mas ela deu de ombros, jogando o peso da decisão para mim. fez um zíper com a boca, um gesto seu para dizer que aquele segredo ela guardaria a sete chaves.
Quando o microfone anunciou o meu nome e o de Leo uma terceira e última vez, me estendeu a mão, apontando com a cabeça para o rinque. Engoli a seco.
— Vamos patinar — disse.
Sem pensar, aceitei a sua mão e nós dois adentramos o rinque juntos.


obs: para quem quiser imaginar como foi a apresentação deles, é só clicar nesse vídeo, que foi a minha inspiração.


FIM



Nota da autora: Eu finalmente estou feliz de tirar essa ideia do papel, mas triste porque uma shortifc é muito limitada para o tanto que eu quero escrever sobre um casal, às vezes HAHAHHA De qualquer forma, muito obrigada por ler até aqui. Espero que tenham curtido e caso queiram saber mais novidades, segue o link abaixo. Um beijo!



Outras Fanfics:
In Dark (Criminal Minds/Em Andamento)
Operação Bebê (Originais/Em Andamento)
EXITUS (Criminal Minds/Em Andamento)
05. Break Free (Ficstape Perdidos #2/Originais)
07. Since We're Alone (Ficstape Perdidos #3/Originais)
12. What Makes a Woman (Ficstape Smile - Katy Perry)

Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.
Para saber quando essa fanfic vai atualizar, acompanhe aqui.


CAIXINHA DE COMENTÁRIOS

O Disqus está um pouco instável ultimamente e, às vezes, a caixinha de comentários pode não aparecer. Então, caso você queira deixar a autora feliz com um comentário, é só clicar AQUI.


comments powered by Disqus