Finalizada em: 07/12/2019

Capítulo Único


20 de outubro de 2019
Domingo, 09:54


Been traveling in packs that I can't carry anymore
(Estive viajando em malas que não posso mais carregar)
Been waiting for somebody else to carry me
(Estive esperando por alguém que me carregasse)
There's nothing else there for me at my door
(Não há nada ali em minha porta para mim)
All the people I know aren't who they used to be
(As pessoas que conheço não são mais quem costumavam ser)
And if I try to change my life one more day
(E se eu tentar mudar minha vida por mais um dia)
There would be nobody else to save
(Não haverá mais ninguém para salvar)
And I can't change into a person I don't wanna be, so
(E não posso passar a ser uma pessoa que não quero, então)
Oh, it's Saturday night!
(É Sábado a noite!)


E lá estava ele, sentado despreocupado enquanto tomava um capuccino grande com dose extra de chocolate, sozinho em uma das mesas vazias daquele coffe shop. gostava da parte externa da cafeteria, pois graças a uma das grandes árvores plantadas na rua, fazia uma sombra muito boa no lugar em que ele estava sentado, sem precisar do guarda-sol que ficava no meio da mesa. O dia estava ótimo, sem muitas nuvens no céu para cobrir os raios de sol e pareciam ter mais pessoas na rua do que o normal para o horário já que ainda eram dez da manhã de um domingo. O suspirou dando ombros, também não ia tentar entendê-las, cada um tinha seus motivos para já terem levantado e talvez o dele fosse uns dos mais tristes de todos. Hoje fazia um ano desde que conseguiu escapar de um dos acidentes que, querendo ou não, acabou marcando a cidade de Los Angeles. Um incêndio. Um incêndio que começou do nada, como sempre. Ele soltou um riso sem humor, dando mais um gole em sua bebida que já começava a esfriar e passou os dedos meio nervoso entre os cabelos. Também fazia um ano desde que sua vida começou a ficar levemente mais estranha. Desde aquele acidente, sentia que algo havia mudado dentro de si, no começo ele achou que fosse aquele sentimento meio cliché que as pessoas sentem quando passam por experiências próximas da morte e começam a fazer promessas que acabam largando pela metade como frequentar mais as aulas de spinning, comer mais salada ou então parar definitivamente de fumar. Uma hora ou outra elas iriam desistir e voltar aos velhos hábitos. Mas não , ele começou a notar que estava muito mais forte do que o normal, do nível em que colocou quase todos os pesos disponíveis no supino e os levantou como se fosse duas penas, não haviam muitas pessoas na academia naquele dia, mas as que estavam presentes não sabiam se ficavam com medo ou então impressionadas; ou então os dois! Depois daquilo, ele mudou de academia, passando a frequentar uma do outro lado da cidade, mas de nada estava fazendo efeito, pois tudo ainda parecia leve demais. Ele também começou a ter visões bizarras e essas eram provavelmente as que mais fodiam sua cabeça. A primeira vez que aconteceu foi quando ele tocou no ombro de uma de suas colegas de trabalho, inicialmente para pedir uma pequena revisão em uma das milhares tabelas que ele fazia, mas acabou vendo flashes dela avançando na vida. Michelle havia ganhado uma promoção, mudou de filial e também assumiu um relacionamento sério. Quatro meses depois a promoção dela se concretizou, seguido de todo o restante. Apesar de estar tomando uma bebida quente, um arrepio gelado desceu por sua espinha ao lembrar daquele episódio e bufou frustrado, para ele essa era a pior parte. Não tocou mais ninguém por um bom tempo, mas as vezes acontecia involuntariamente. se perguntava várias vezes se a pessoa tocada também viu o que ele via mas nunca teve a coragem, ele sempre inventava uma desculpa e saia afobado, desconversava e tentava evitar tal pessoa ao máximo, torcendo para que não fosse questionado pelos corredores da empresa. Respirando fundo e soltando o ar devagar, o olhou para trás, sentia sua nuca formigar como se alguém estivesse o olhando por horas mas não encontrou ninguém ali, apenas o vai e vem normal de pessoas andando pela rua.
Mal sabia ele que de fato estava sendo observado. Na verdade, há bem mais do que apenas uma hora. Um ano, para ser mais exato. Ela estava lá, do outro lado da rua, invisível aos olhos dele e também de qualquer outro mortal. Os cabelos caiam longos pelos ombros e costas, contrastando com as roupas pretas dela e carregava firmemente a foice nas mãos. Suas asas não estavam totalmente abertas, mas também não seria problema se estivessem, não era como se pudesse ser vista. Ela sorriu com o pensamento bobo porém já estava ficando particularmente cansada desse caso, acompanhava o garoto há tanto tempo que já se sentia intima dele, mesmo que não a conhecesse, pois apareceu pouquíssimas vezes para ele de fato, em uma delas até trocaram algumas palavras, mas nada que a fizesse entender como ele tinha escapado daquele incêndio com vida. Era para ele estar morto! Morto!
O plano inicial era de apenas três vítimas, sem erros. Infelizmente era como as coisas tinham de ser, o curso natural da Terra, essas coisas… Mas ele ter fugido foi algo que a deixou furiosa. Ninguém são brincava com ela! No começo achou que fosse brincadeira ou então alguém que não estava aceitando seu destino, o que acontecia bastante, mas não. Ele literalmente tinha recuperado a consciência e saído correndo do local, os mortais chamaram de ‘verdadeiro milagre’ e por um tempo ela acreditou até que finalmente o encontrou, ainda em estado de choque, na casa dos pais em algum lugar da Flórida.
Foi nesse momento que descobriu que não era um mero mortal.

20 de outubro de 2018

Sábado


Sábado é sempre o dia mais esperado por praticamente todos os mortais, não é mesmo? Alguns até curtem a sexta, fazem um happy hour mais prolongado ou então vão dançar, cair nos flertes e amassos em alguma balada, mas o sábado... O sábado parecia ser sagrado! Mais sagrado que o domingo ainda.
Era o dia de finalmente acordar mais tarde, aproveitar o café da manhã por quase uma hora com a companhia do Netflix sem se preocupar em chegar atrasado, levar bronca do chefe e ficar sentado por oito horas na frente de um computador, fazendo conversinhas com seus colegas de vez em quando. E adivinha sobre o que eram as conversas? Isso mesmo, os planos para o final de semana.
A rotina era mesmo uma merda.
Até falar sobre quebrar a rotina já tinha virado rotina para . Ele tinha seus vinte e sete anos já completados e um namoro de quase três anos terminado por algumas "diferenças irreconciliáveis". Ele relevou alguns comportamentos irritantes da ex por tempo demais, tudo porque no fundo não queria ficar sozinho, odiava admitir o lado carente, doía em seu orgulho, mas ele gostava de viver na companhia de alguém. Era assim desde a faculdade, onde encontrou o melhor amigo Edward que depois virou seu colega de apartamento, mas infelizmente não durou tanto, Ed logo se mudou para a casa da namorada e foi justo ai que Patty entrou em sua vida.
Era quase a primeira vez em que ele estava completamente sozinho, ainda tinha seus amigos, claro, mas nunca tinha ficado só por mais de dois meses, que foi o tempo de Ed se mudar para seu dormitório e também para o apartamento que os dois dividiram. Provavelmente o máximo que passou aproveitando sua companhia foi antes de Pat se mudar definitivamente, pois antes ela adorava passar dias no apartamento do namorado.
Mas cá estava ele agora... Deitado, entediado no sofá enquanto alguma série passava na televisão apenas para ficar de fundo, já que ele rolava o feed do Instagram enquanto distribuía alguns likes. Seu celular vibrou com algumas mensagens de seus amigos combinando uma saída em grupo e pela primeira vez em semanas ele se sentiu animado para curtir a noite de sábado.

I pray for the wicked on the weekend
(Eu rezo pelos perversos no final de semana)
Mama, can I get another amen?
(Mamãe, posso escutar outro amém?)
Oh, it's Saturday night, yeah
(Oh, é Sábado a noite, sim!)
Swear to God, I ain't ever gonna repent
(Juro por Deus, nunca irei me arrepender)
Mama, can I get another amen?
(Mamãe, posso escutar outro amém?)
Oh, it's Saturday night, yeah
(Oh, é Sábado a noite, sim!)


Do outro lado da cidade, experimentava alguns looks enquanto as batidas de qualquer banda de rock ecoavam por seu flat, sem se preocupar muito se estaria incomodando os vizinhos. Ela raramente ficava lá, tanto que um dia quando esbarrou nas escadas com um deles quando estava visível, ele se atreveu a perguntar o que ela fazia da vida já que as vezes ninguém ouvia um piu se quer do apartamento dela e vezes em que o barulho era insuportável. apenas riu e deu ombros, saindo sem responder, claro que ela adoraria falar “oh, me desculpe, as vezes fico dias fora levando almas para o inferno e o paraíso, nem sempre consigo uma folga!” mas provavelmente iria assustar demais os mortais.
Rindo com seu pensamento bobo, ela perdeu os longos cabelos num coque para conseguir se arrumar melhor, já que nessa noite ela teria que ficar parcialmente visível aos olhos dos humanos, mas a risada logo se transformou em um suspiro pesado. Ela não gostava de ter que fazer seu trabalho em clubes, bares ou baladas. Não que se importasse com os mortais, não poderia dar mais a mínima, mas ela tentava pelo menos se colocar no lugar deles; Imagina só, você ter que ficar a semana toda no que eles chamavam de trabalho e o dia que tem para se divertir, você acaba morrendo! Por qualquer razão que seja. Péssimo, não é? Ela amava o que fazia, mas o mais importante, amava suas grandes asas negras. Talvez a vaidade fosse a real culpada do motivo dela não ter desistido do cargo de ceifadora, pois já passou por situações onde ela realmente questionou se tal humano devesse mesmo morrer, mas escolher quem ia ou ficava não cabia a ela, apenas pegar a alma e guiá-la para onde seria seu destino final. A balançou a cabeça, a fim de forçar sua cabeça a pensar em outra coisa e foi terminando sua maquiagem, outra coisa que amava do mundo dos mortais além das roupas. Aos poucos foi passando a entender os problemas da sociedade, do tal chamado ‘padrão de beleza’ e o porquê de ser uma indústria tão cruel que lucrava milhões em cima da insegura das mulheres. Mais uma vez, não entendia como quem estava no poder e no topo de tudo isso continuava vivo, se tivesse a chance, começaria os matando e depois daria continuidade a sua longa, longa lista. Ao longo dos anos que estava na Terra, ela experimentou vários estilos, mas o seu favorito da vez era uma pegada mais rock n’ roll, onde 98% das peças que possuía eram inteiramente pretas, então o look para o sábado não poderia ser diferente. Escolheu um top e uma calça de cintura alta junto de uma blusa de manga comprida toda transparente, finalizando com uma ankle boot não muito alta. Sua maquiagem contava basicamente com um delineado de gatinho bem puxado, um pouco de rímel, brilho na pálpebra e claro, um batom vermelho que ela tanto passou a amar. Antes de sair, soltou os cabelos do coque e apenas os bagunçou um pouco mais, gostava das ondas rebeldes caindo por suas costas e também pegou sua foice, essa jamais ficava a vista para os mortais, mas precisava levá-la para fazer sua ‘mágica’. Se olhou no espelho uma última vez e saiu do flat, deixando a chave da porta debaixo do tapete e desceu despreocupada as escadas do prédio, sua noite seria longa…

Horas depois de e sua turma terem chegado naquela boate, ele já se encontrava bastante alcoolizado e sem muita intenção de parar, ninguém era o motorista escolhido da noite então ele em particular não estava muito preocupado em medir as quantidades de álcool que estava ingerindo. Iria sentir muito mais no dia seguinte, isso era certeza, mas novamente, ele não estava ligando para o depois, queria apenas estar ali no momento. E nessa de ‘viver o momento’ ele acabou se soltando mais que o normal, arriscou flertes ousados demais até para seu próprio comportamento, alguns tiveram respostas muito positivas enquanto outras apenas rolaram os olhos e saíram de perto dele, não podia culpá-las, sequer imaginava como estava seu comportamento.
Em um certo momento da noite, se separou dos amigos para ir no banheiro, jogou um pouco de água no rosto e encarou seu reflexo completamente bêbado por alguns segundos e riu fraco, quando foi abrir a porta para sair, algo começou a despertar dentro dele. A porta tinha emperrado e do lado de fora podiam se ouvir o que parecia um burburinho junto com a música alta, seu peito começou a apertar e seu lado otimista começou a tomar parte dele, dizendo internamente que nada estava acontecendo e que alguém provavelmente tinha ganhado outra garrafa de whiskey pela alta consumação da noite.
Mas o desespero gritava dentro dele, raramente ele sentia o peito apertar e naquela situação, mal conseguia respirar. Em um pique de surto, ele respirou fundo com a mão firme na maçaneta e jogou com força todo seu corpo contra a porta de madeira, que se partiu logo de primeira. Ele mal sentiu a dor no corpo, provavelmente por conta de todo o álcool que corria por seu sangue.
Cambaleou ainda meio tonto pelo corredor e o cheiro de queimado começou a invadir seus pulmões assim como a fumaça que já tinha ocupado praticamente todo o andar debaixo. Cobriu sua boca e nariz com a camiseta, se apoiando na parede para tentar sair dali já que a energia do clube caiu quando o incêndio começou, mas todo seu corpo começou a ficar mole e ele tropeçou no que parecia ser outro corpo caído perto dele. engoliu a seco, estava tremendo dos pés a cabeça. Fizera inúmeros treinamentos na empresa em caso de exatamente acontecer isso, mas naquele momento parecia que ele tinha esquecido absolutamente tudo! Principalmente a parte de ficar calmo, que era a mais importante. Depois de tossir algumas vezes e finalmente conseguir sair do segundo andar, sentiu várias pessoas passar correndo por ele até que uma bateu fortemente em suas costas fazendo sua visão ficar turva e acabar caindo. Ele ouviu o baque da queda e não conseguiu fazer muito além de soltar um gemido, parecia que aquela queda era o que faltava para acabar com toda a energia que sobrava nele. se sentiu drenado, continuava suando frio, apenas torcendo para que não fosse pisoteado por quem ainda procurava um jeito de sair daquele buraco. Soltou o ar pela boca e piscou algumas vezes, as luzes de emergência estavam ligadas, mas nada que iluminasse cem por cento o lugar, deixando a pista com um tom até que bastante sombrio, mas o preparou para a cena que viu diante de seus olhos, como sua visão estava completamente embaçada, foi difícil diferenciar se estava acontecendo ou se era algo que sua cabeça estava criando com a ajuda da exaustão e do álcool, a poucos metros de sua frente, ele jurou ter visto um vulto preto com grandes asas. O vulto apenas andava, olhando as outras pessoas caídas com um cuidado que lembrava de uma mãe cuidando dos machucados de um filho. Sua espinha se arrepiou por completo quando seu olhar se encontrou com o que julgou ser um anjo e caramba, aquele anjo era lindo, tão lindo que não conseguiu sustentar seu olhar, os olhos de se reviraram e ele se entregou ao cansaço, desmaiando no meio do caos que estava aquela balada.
mordeu a boca, verificando se todos ali já estavam desacordados e ainda faltava que precisava de fato sair até que notou o rapaz a encarando. O problema era que ela não estava visível aos mortais... A não ser que de fato ele não fosse um e iria descobrir isso logo, logo. Ela esperou mais alguns minutos, indo até o segundo andar para ver se a casa já havia se esvaziado completamente por quem ainda estava consciente o suficiente para sair de lá e respirou fundo fazendo seu caminho de volta para a pista principal, onde estavam suas vítimas e bateu duas vezes sua foice no chão, fazendo um brilho branco sair dela e uma névoa começou a invadir o local. A se aproximou da primeira vítima, uma garota que parecia ter uns vinte e cinco anos, ainda estava desacordada, mas ao sentir o toque de em seu ombro, seus olhos abriram e aos poucos foram perdendo o brilho, aceitando o destino que estava traçado para ela. O anjo se ajoelhou ao seu lado, falando algumas palavras em latim de olhos fechados enquanto fazia um leve carinho nos cabelos pretos da mulher, ela também ouviu um leve soluço e abriu os olhos ao terminar sua reza, com a leveza de uma pena, passou a ponta da foice exatamente no meio do peito da morena. Era o caminho que abria no corpo para a alma seguir seu destino, fosse para o paraíso ou então visitar Lúcifer no frio inferno, a alma dela agora estava livre para ir onde estava destinada.
fechou as pálpebras da mulher agora já sem vida e se levantou, indo para o próximo corpo para fazer todo o ritual novamente até que antes de finalizar ela sentiu alguém despertar. Alguém que não deveria. De relance deu para ver que era o mesmo homem que encarou a diretamente antes de desmaiar, pois antes de sair correndo do salão, ele virou de costas e a encarou por mais alguns segundos, voltando a correr dali. Mas ela não teve muito tempo, já tinha feito o corte no peito da vítima, que agora era um rapaz, não tinha como largar tudo ali e correr atrás dele. A rosnou frustrada, apertando os dedos em volta da foice e a segunda alma seguiu seu caminho.
O anjo se levantou do chão ainda com raiva, andando de um lado para o outro, até pegou um copo de cima do balcão e tacou na parede como forma de descontar parcialmente sua raiva, pois se fosse se vingar completamente, todos que estavam caídos ali teriam sua jornada pela Terra encerrada antes do tempo deles. Puxou alguns fios de cabelo para trás e voltou a bater a foice no chão, a névoa dessa vez veio pesada, quase cinza e ela mal conseguia enxergar o lugar em que estava. Um novo gemido de resmungo foi ouvido e ela respirou fundo, se ajoelhando ao lado do corpo e fez um leve carinho no rosto de outro homem.
- Desculpe, meu bem... - começou, encarando a feição confusa do rapaz no chão, ele até tentou se levantar, mas ela forçou seu corpo no chão com a ponta da foice, vendo o mortal arregalar os olhos em desespero – Realmente não era para ser você hoje – suspirou, desviando o olhar dele e passou o polegar da mão livre pelos lábios secos do homem. – Mas me pediram três almas e nunca está no plano uma delas fugirem. – sentiu seu tom mais irônico do que esperava e mordeu a boca novamente, raramente ficava nervosa. – De qualquer forma... Tenho certeza que irá para um ótimo lugar, eu consigo sentir. – deu um meio sorriso para ele, tentando tranquilizá-lo e pareceu dar certo, pois ele agora tinha uma expressão quase que calma e os olhos já estavam fechados. Provavelmente ele poderia ter voltado a dormir. Ela passou a ponta da foice no peito dele, liberando sua alma e assim que ela seguiu seu caminho, se pôs de pé e saiu quase voando, literalmente, de dentro daquela balada. Muitos dos desmaiados já começavam a recuperar a consciência, chamar por seus amigos, ajudar quem estava mais debilitado... O corpo de bombeiros também estava descendo e havia inúmeras viaturas do lado de fora. O anjo olhou para o céu ainda escuro, mas não viu nenhuma estrela, pois estava bastante nublado, apesar da temperatura estar bem quente para uma madrugada. Ela balançou a cabeça e seguiu seu caminho para ir embora dali, mas não sem antes tentar dar mais uma espiada naquele mortal que estava destinado à ela, mas conseguiu escapar. E ninguém escapava dela.
estava sentado na calçada com uma garrafa de água nas mãos enquanto um de seus amigos abanava seu rosto e o outro ainda estava meio sem reação e sem saber o que fazer. O terceiro amigo que estava com eles tinha ido embora antes de toda aquela confusão acontecer. Sorte dele, pensava a praticamente cada segundo.
Ele ainda estava assombrado, não muito pelo incêndio já que aparentemente não houvera tantas mortes, apenas três pessoas não sobreviveram e o restante tinham leves ferimentos de acordo com os bombeiros que estavam ajudando os outros no local, mas sim pelo o que ele viu naquela pista de dança. Ele tinha acordado a tempo de ver, o que agora tinha quase certeza que era um anjo ou então qualquer criatura que não fosse daquele mundo, falando algo no que ele identificou ser latim e um brilho surgir do longo objeto que ela carregava, e então, uma luz sair do corpo da pessoa que estava no chão do lado do anjo e seguir seu curso. Ele assistiu tudo aquilo em silêncio, tremendo no chão frio do clube, mas quando sentiu que ela estava terminando com a segunda vítima, algo dentro dele gritava para que ele saísse de lá já que estava consciente. Foi quase como um choque.
não pensou direito, tirou forças que só Deus sabe de onde e se pôs a correr, até que se arrependeu profundamente de ter se virado para dar uma última olhada no que estava acontecendo. O ambiente estava com a iluminação baixa, pois somente as luzes de emergência estavam ligadas e a fumaça do incêndio parecia que ainda estava rodando o ambiente, mas ele jurou que o anjo o encarou de volta com uma expressão raivosa então ele apenas engoliu a seco e lhe deu as costas, saindo o mais rápido de lá.
E agora que tudo aquilo tinha acabado, ele estava quase sem rumo. Nunca tinha passado por uma experiência de quase-morte e não estava conseguindo lidar com aquele sentimento estranho que crescia dentro de seu peito.
Talvez devesse fazer mais doações para a caridade? Adotar um cachorro? Ir mais para a igreja?
Não.
Nada parecia o suficiente.
Seus amigos até tentavam puxar um assunto para tentar distrai-lo enquanto ainda não conseguiam ir para casa, mas estava alheio a tudo. Será que ele realmente teria sido a próxima vítima do anjo se não tivesse tido aquele choque momentâneo de força? O suspirou frustrado, sentindo os olhos encherem de lágrimas e largou a garrafinha no chão, afundando o rosto nas mãos e as deslizou pelos cabelos, permanecendo assim por longos minutos. Até sentiu as mãos dos amigos afagando suas costas e escutou palavras como 'calma, cara, você ta aqui' e também 'você conseguiu sair, tudo vai ficar bem'! mas mesmo assim, ele não conseguia se sentir bem. Talvez realmente fosse algo do momento e conforme os dias fossem passando, o aperto do peito fosse passando, mas ali, sentado na calçada, não conseguia sentir nada.
Ele levantou a cabeça, limpando o fino rastro de lágrimas de sua bochecha e soltou o ar de seus pulmões enquanto passava os olhos pelo local. Logo se arrependendo e jurou ter cometido o segundo erro da noite, o primeiro tinha sido sair de casa naquele sábado. Ele viu o anjo, que agora viu ter a forma de uma mulher com longos cabelos , e todo seu corpo voltou a se arrepiar, o deixando sem reação mais uma vez. Ela não tinha uma expressão muito amigável, as asas estavam abertas e em uma das mãos carregava, o que ele conseguiu identificar agora que já estava sóbrio, uma foice.
encarava com os olhos cerrados, tentando esconder a raiva que tinha dele. Estava a uma distância segura dele e também em uma posição estratégica, visível apenas para o homem naquele momento. Ela procurou por ferimentos aparentes no corpo dele, mas tudo o que encontrou foi um pequeno corte na testa e o que parecia ser o começo de um hematoma no antebraço direito. Não conseguia parar de pensar que aquele mortal ridículo tinha conseguido estragar seus planos e fugir repentinamente, mas, ao mesmo tempo, queria saber exatamente como ele tinha conseguido. Ela sentiu que era ele. A alma dele! Sentiu o maxilar travar e deu uma última encarada nele, que não havia desviado o olhar em momento algum, e virou de costas, sumindo o mais rápido daquele local.
No momento em que piscou os olhos e o anjo havia sumido, engasgou e tossiu até sentir os tapas em suas costas, seu rosto esquentou e ele levantou rápido demais do chão, ficando até meio tonto e precisou se apoiar no ombro de seu amigo. A confirmação de que ele seria o próximo a morrer veio quase como um tapa na cara dele, caso contrário, o anjo em pessoa não faria questão de visitá-lo mais uma vez naquela noite. Não conseguiu ler muita coisa da expressão dela por causa da distância, mas sentiu que não era nada boa. A visão certamente era linda, as roupas e as grandes asas pretas com os cabelos pareciam se complementar perfeitamente, mas apesar de linda, o anjo também era assustador e era exatamente aquela cena dela o encarando que iria assombrá-lo muito tempo.

23 de outubro de 2016
Domingo, 11:54


And every morning when I wake up
(E todas as manhãs quando eu acordo)
I wanna be who I couldn't say I'd ever been
(Eu quero ser quem eu não poderia dizer que fui)
But it's so much more than I ever was
(Mas é muito mais do que algum dia eu já fui)
If every night I go to sleep knowing
(Se toda noite eu for dormir sabendo)
That I gave everything that I had to give
(Que eu dei tudo que poderia dar)
Then it's all I could've asked for
(Então isso é tudo o que eu poderia pedir)
I've been standing up beside everything I've ever said, but
(Eu tenho defendido tudo que eu sempre disse, mas)
Oh, it's Saturday night, yeah
(Ah, é sábado à noite, sim)


Ele realmente estava aproveitando o tempo que tinha para tomar aquele grande cappucino e já estava impaciente, quem demorava tanto para tomar um café?! E talvez também aquela fosse a última oportunidade que conseguiria do homem desocupado, já que desde as férias ‘pós-traumática’ que havia tirado, tudo o que ele sabia fazer era se encher de trabalho. A teoria do anjo era que o trabalho ocupava todo espaço possível na mente dele, não dando brecha para qualquer outro pensamento invadir, como os acontecimentos de um ano atrás.
A suspirou, se dando por vencida e se tornou visível aos mortais, entrando pelas portas da frente daquele café e antes de seguir para a parte externa, comprou um chá preto gelado.
- Posso me sentar aqui? – Ela apoiou a mão na cadeira vazia na frente de onde estava sentado, esperando por sua resposta com um sorriso leve no rosto, como se não quisesse ter o matado ano passado. , que estava com a cabeça baixa olhando no celular, deu um pulo em sua cadeira ao reconhecer a mulher, ou melhor, anjo parado em sua frente. Ele gaguejou algumas vezes, ficando cada vez mais nervoso e olhou para os lados já que havia mais pessoas sentadas perto dele apenas para confirmar se eles também estavam vendo a ali parada. – Pode ficar calmo, eu não vou fazer nada – levantou as mãos como uma oferta de paz. Ele engoliu a seco, apenas assentindo devagar e ela se sentou, deixando o chá gelado em cima da mesa e juntou as mãos ali em cima também, encarando o homem que agora estava tão pálido quanto uma das nuvens do céu. quis rir. Claro que ele iria reconhecê-la, só esperava que não fosse uma reação tão extrema, apesar que não o culpava, a última vez que deixou que ele a visse, ela estava com uma expressão completamente puta da vida.
- Ahm… - ele disse rouco e deu um pigarro antes de se pronunciar novamente. – O-O que­­–
- O que eu sou? – o cortou rapidamente, dando um gole na bebida gelada, ainda com uma expressão de tédio e o viu confirmar devagar, ainda intimidado. Talvez devesse tentar ser um pouquinho mais gentil, ganharia a confiança dele, pensou. E parte dela estava certa. – Desculpa, eu também não estou acostumada a ter esse tipo de conversa, mas quero ser direta e dizer que não precisa ter medo de mim. O que aconteceu no passado, fica no passado... Mas respondendo sua pergunta, eu sou um anjo. Um anjo ceifador – deu um meio sorriso ao falar aquelas palavras, teria até mostrado a foice e suas asas, mas ai sim, assustaria todos os mortais ali presentes. – Muitos acabam me associando a morte já que sou eu mesma que corto a relação da alma com o corpo dos mortais, mas isso é conversa para outro dia – piscou um olho e apoiou os cotovelos na mesa. – Eu não vim para falar exatamente de mim e sim de você, .
O homem sentiu seu corpo todo arrepiar ao escutar seu nome sendo pronunciado pelo anjo. Ele engoliu a seco e passou os dedos pelos cabelos, bagunçando-os levemente enquanto ainda procurava as palavras para respondê-la. Ele nunca tinha conversado com um anjo, tinha medo de falar qualquer coisa atravessada e ela o matar.
– Por que você está aqui? Você tem um nome? E como me achou?! – acabou disparando de uma vez em tom nervoso e deu mais um longo gole no cappucino, o último gole.
- Woah, calma lá, garotão – riu fraco das perguntas e se ajeitou na cadeira. – Meu nome é , mas eu também gosto de … Desde o acidente naquela balada eu mantenho você no meu radar, pois quando você escapou acabou me despertando uma curiosidade extrema, foi algo que eu não conseguia entender – desviou o olhar para os lados, as outras mesas já estavam se esvaziando. – Mas fique calmo, eu não te observava todo dia e isso junta com o porquê de eu estar aqui. Vim te dizer o que você é.
- Como assim, o que eu sou?
- Bom, posso adiantar e dizer que você não é um mero mortal como todos ao redor de você. Não, não, não, meu querido , mas também não chega a ser um anjo como eu, é um processo mais complicado – brincou para tentar descontrair, mas ele parecia não estar para brincadeirinhas então ela apenas continuou. – Você um nefilim… A cria de um anjo caído com uma mortal, que acabou originando esses híbridos. Eles possuem alguns dons como uma força além de humana e também uma habilidade de ver o futuro de algumas pessoas.
Assim que ela foi listando, imediatamente foi dando um check naquilo que já tinha acontecido com ele, era impossível ser só coincidência. Ele lembrava de tudo. Sua cabeça começou a girar e seu peito voltou a apertar, apoiou a testa em uma das mãos e fechou os olhos, tentando organizar seus pensamentos até que sentiu o toque do anjo em seu pulso, quase fazendo-o pular da cadeira. – Tente ficar calmo… Na verdade não é algo ruim – a tentou tranquilizá-lo.
- Se não é algo ruim, por que eu era um dos escolhidos para morrer naquela balada? – ele foi direto. Aquela dúvida já o assombrava por exatamente um ano, ele só queria ficar em paz consigo mesmo.
- Bom… Na verdade não sou eu quem decide isso, como te falei, eu apenas corto a relação da alma com o corpo. É me passada a alma de quem eu preciso caçar, quando chego perto consigo sentir e identificar quem é quem – coçou a nuca e deu ombros antes de encarar o homem que agora já tinha uma expressão mais suave, porém muito confusa. – Naquela noite eu precisava de três e quando eu cheguei perto de você… Era quase como se você valesse por todas elas – engoliu a seco, desviando o olhar dela. – Mas então você escapou e naquele momento eu soube que tinha algo diferente ai dentro. Nenhum mortal em suas condições teria escapado. Cheio de álcool no sistema sanguíneo, tonto pela fumaça e por toda a situação, era impossível. Alguns até tentaram, acredite – ela revirou os olhos, lembrando da cena. – Mas era coisa de ficar em pé por cinco segundos e logo desabafar no chão. Porém não julgo, notei que é algo normal nos mortais negar a morte e lutar com tudo o que lhe restam para permanecer vivos, me encanta de certa forma – riu baixo, tomando um pouco mais do chá enquanto o continuou em silêncio. – Eu quis deixar você por último, pois senti que seria até mais prazeroso fazer todo o ritual em uma alma tão forte. Me cansaria um pouco depois, mas seria incrível… Enfim, confesso que demorei algumas semanas para te achar novamente. – bateu a ponta dos dedos na mesa, chegando um pouco mais perto dele. – Eu vi que você também passou a ter dúvidas das coisas que estavam acontecendo, certo? – ele apenas assentiu, ainda meio assustado, mas estava até que feliz de ouvir tudo aquilo, ele realmente não estava louco. – Pois bem, era isso. Eu já tinha ouvido falar de nefilim que descobriam seus poderes mais na idade adulta ou então algum evento pós-traumático, que é quando a adrenalina realmente nos acerta e as chances dos poderes desabrocharem são altíssimas! E no seu caso acabou sendo os dois.
- O que... O que vai acontecer comigo agora? – perguntou com um tom de voz baixo, respirando fundo.
- Bom, você pode continuar treinando seus poderes para se desenvolver melhor – deu ombros. – Uma forcinha a mais é sempre bom.
- E referente à minha alma?
mordeu a boca e coçou a nuca antes de voltar a falar. – Essa parte é um pouquinho mais complicada, meu bem, de fato eu recebi que precisava levá-la, mas assim você fugiu, uma outra já veio no lugar… Eu fiquei bem confusa também, geralmente meus superiores não erram – ela aponto de forma metafórica para o céu. – Se é que você me entende, talvez tenha sido um grande deslize ou então o que os mortais chamam de “milagre”… Sei lá, eu não fui questionar e também não fui questionada, então você está livre para viver sua vida, .
- … - a corrigiu. – Pode me chamar de .
- – o anjo repetiu com um leve sorriso. – Desculpa mesmo pelo susto, sei que muitos esperam sempre o melhor de um sábado a noite, mas é o meu trabalho – entortou os lábios e tomando o resto do chá que tinha no copo. – E se eu não cumprir com o que é me pedido, perco minhas asas… Isso para mim é pior que cair do céu – quem se arrepiou agora tinha sido , ela nem sonhava com esse dia. – Bom, é melhor eu ir, tenho assuntos para resolver ainda – brincou e quando fez a menção de se levantar, algo dentro dele vibrou, não queria que ela fosse embora tão rápido.
- Espera! – ele segurou uma de suas mãos. – Você não poderia ficar e ahm… Me explicar um pouco mais sobre tudo… Isso? – gesticulou com as mãos, apontando para eles dois e o anjo sorriu levemente com o pedido. Ela sentiu que não tinha nenhuma maldade de fato na intenção dele e apesar de realmente ter algumas almas para guiar, ela quis ficar.
- Claro… Claro! – voltou a se sentar, cruzando as pernas e voltou a se apoiar na mesa, assim como ele, começando a contar tudo sobre como ela tinha conseguido as asas que tanto amava e também a versão comprida da origem dos nefilims. E ele ouviu tudo atentamente, parando de vez em quando para perguntar alguma coisa ou outra. Eles até tomaram outra rodada de cafés e chás gelados. A verdade era que estava amando ouvir aquela criatura, aquele ser falar sobre coisas que eles jamais imaginou, lendas que foram confirmadas serem verdades… Ele estava completamente encantado por e não precisava nem pensar muito para saber que ela seria um problema na vida dele já que ela era um verdadeiro anjo!

20 de outubro de 2017
sexta-feira, 20:37

Naquela noite ele tinha preparado uma coisa especial, queria algo um pouco mais íntimo para os dois. Não sabia se anjos realmente comiam por necessidade, mas preparou um jantar simples porém saboroso, conseguindo vários elogios da . Até que a segunda garrafa de vinho foi aberta, logo caminharam para a terceira e nessa os dois já estavam bobos, trocando carícias no tapete da sala enquanto o anjo contava sobre o mundo divino até que as coisas começaram a esquentar ainda mais. Uma música de rock qualquer tocava pelo apartamento de apenas para dar um clima, mas nenhum dos dois prestava mais atenção na música, apenas no corpo um do outro. A janela do quarto estava aberta e uma brisa gostosa entrava, trazendo um equilíbrio na temperatura do ambiente.

I pray for the wicked on the weekend
(Eu rezo pelos perversos no final de semana)
Mama, can I get another amen?
(Mamãe, posso escutar outro amém?)
Oh, it's Saturday night, yeah
(Oh, é Sábado a noite, sim!)
Swear to God, I ain't ever gonna repent
(Juro por Deus, nunca irei me arrepender)
Mama, can I get another amen?
(Mamãe, posso escutar outro amém?)
Oh, it's Saturday night, yeah
(Oh, é Sábado a noite, sim!)


Ele distribuía longos beijos pelo pescoço da enquanto movia o quadril contra o dela, que tinha as pernas enroladas nele e se arrepiava cada vez que a boca dele entrava em contato com sua pele. Ela subiu uma das mãos pelas costas do homem, arranhando levemente enquanto fazia o caminho até sua nuca e enrolou os dedos pelos cabelos, beijando os dois cantos de sua boca antes de colar os lábios aos dele, segurando um gemido quando ele deu algumas estocadas mais fundas nela. se colocou por cima de , que não perdeu tempo em segurar firmemente sua cintura, guiando alguns movimentos enquanto ela rebolava em seu colo e também subiu as mãos para apertar os seios que balançavam conforme ela se movia. Os dois estavam extremamente perto de atingirem o ápice juntos mas não queriam parar. Estavam viciados um no outro. As asas de acabaram se abrindo, ela já não segurava mais e quando apoiou as mãos no peitoral de para conseguir subir e descer o quadril, acelerando o ritmo até que não demorou muito para que ela revirasse os olhos e sentir seu interior se contrair em um longo orgasmo. A visão que teve dela foi quase orgásmica, ele sentiu a um pouco mais relaxada então voltou a ficar por cima e com os braços dela ao redor de seu pescoço, começou a investir rapidamente também. Colou sua testa na dela e mordeu levemente seu lábio inferior, recebendo algumas carícias leves de até seu momento veio, gemendo alto com ela acompanhando enquanto gozava. Ele respirou forte, saindo de dentro dela com cuidado e beijou demoradamente seu ombro.
Os dois se arrumaram na cama, com deitada em seu peito e ele com algumas mechas s enrolada nos dedos, acabaram não trocando nenhuma palavra, mas tinham um sorriso bobo no canto da boca. Ele estava amando aquilo, estar com era diferente de tudo o que ele já havia sentido. E ela amando as novas experiências e sensações que seu corpo tinha quando estava com o nefilim. Não demorou muito para que adormecesse, afinal, ele tinha trabalhado o dia inteiro e bebido vinho demais, sem contar as brincadeiras sexuais que ele até perdeu a conta de quanto tempo havia sido, mas continuava acordada, até conseguir cochilar por alguns minutos, mas ainda estava agitada demais. Ela deu um leve beijo no canto da boca do homem e se levantou, vestindo a camiseta dele que estava jogada pelo chão e andou pelo apartamento, aproveitando para desligar o som que tinha ficado ligado. Ela riu baixo, negando com a cabeça. Pegou um pedaço da barra de chocolate e se apoiou no parapeito da grande varanda que ele tinha, a visão era incrível. Ainda era madrugada, mas diferente da última vez que realmente parou e olhou o céu, dessa vez conseguiu ver várias estrelas e também a lua que estava em sua fase crescente. Seu corpo se arrepiou por completo e ela suspirou, perdendo a noção de quanto tempo ficou ali observando a noite estrelada até que o cansaço começou a bater levemente e ela fez o caminho de volta para o quarto. Tudo teria seguido conforme o planejado, até que no meio do percurso ela olhou para o chão e travou. O corpo voltou a se arrepiar por completo, mas dessa vez não era por algo bom. Não mesmo. Sentiu os olhos encherem de lágrimas e precisou morder os lábios para segurar um soluço. Não era possível.
Burra, burra, burra!, ela gritava internamente.
se abaixou lentamente, pegando as três penas que haviam caído de suas asas e as lágrimas caíram ainda mais fortes. Claro que se envolver tão intimamente com um nefilim teriam consequências para ela e isso era apenas um aviso da próxima coisa que provavelmente viria. era um anjo ceifador!
Em que momento ela começou a se esquecer disso?
Bom, exatamente todas as vezes que estava embaixo e por cima de .
Ao mesmo tempo que amava estar com , amava ainda mais suas asas, gostava de como ele a admirava quando estava com elas abertas ou então quando elas resolviam aparecer nos momentos íntimos dos dois…
Estava completamente fodida.
O anjo não segurou o choro, se ajoelhou na varanda, encarando a lua e pediu perdão, mas sabia que aquela não seria a última noite com o nefilim. Os sentimentos dentro dela ainda estava confusos demais, em tantos anos como ceifadora, ela nunca passou por algo parecido.
Depois de se acalmar, ela beijou as três penas pretas e as jogou do alto do prédio que estava, vendo-as voar até perdê-las de vista. Fechou a varanda e limpou o rosto molhado, respirando fundo antes de entrar no quarto e se aninhar a mais uma vez. Apesar do estado sonolento do homem, sentiu o corpo quente do anjo voltar para o seu lado e a abraçou um pouco mais apertado, beijando sua testa antes de voltar ao seu sono profundo.

20 de outubro de 2018
Sábado, 20:26

O anjo começou a ficar abatido, mais triste que o normal. Ela já não passava a mesma energia gostosa que ele sentiu quando o abordou naquele coffe-shop a três anos atrás. sabia que tinha algo de errado, só não conseguia entender muito bem o porquê do anjo estar escondendo o real o motivo de sua tristeza dessa vez, já que ela realmente lhe contava tudo o que acontecia em sua vida.
Os últimos meses para tinham sido caóticos demais. Na verdade, o último ano por completo. Aquelas três penas caídas foram só o começo do seu pior pesadelo já que em uma das vezes, ela acordou e a cama estava completamente forrada com as penas dela, naquele dia ela infelizmente soube que não poderia continuar envolvida com o nefilim. Tudo aquilo eram apenas avisos de que se continuasse resistindo, ignorando os sinais e se rebelando contra a ordem, perderia suas asas e teria sua queda muito em breve. Ela também tentou esconder ao máximo de para que ele não ficasse preocupado e quando ele achava uma pena ou outra caída pelo apartamento dele, ela apenas brincava dizendo que era normal, mas lá fundo, seu peito apertava de preocupação e ansiedade.
- ? – a chamou assim que entrou em seu apartamento, deixando a mochila com vários documentos do trabalho no chão e trancou a porta – Está por aqui? – tirou os sapatos e caminhou em direção ao corredor até que ouviu uma pequena fungada vinda de seu quarto, ele abriu a porta para encontrar algo que quebrou seu coração em mil pedaços. O anjo estava encolhido perto da janela, com o rosto virado para o céu, a luz estava apagada deixando o ambiente ser iluminado apenas pela luz da lua cheia que vinha lá de fora, dando um ar bastante melancólico e sombrio para o ambiente, o chão estava com milhares de penas pretas espalhadas por ele e ela tinha suas asas abertas. Elas estavam murchas, quase que sem forças e a parecia tão fraca quanto eles.

If I had one more day to wish
(Se eu tivesse mais um dia para desejar)
If I had one more day
(Se eu tivesse mais um dia)
To be better than I could have ever been
(Para ser melhor do que algum dia já fui)
If I had one more day to wish
(Se eu tivesse mais um dia para desejar)
If I had one more day
(Se eu tivesse mais um dia)
I could be better, but, baby
(Eu poderia ser melhor, mas, querida)
Oh, it's Saturday night, yeah
(Ah, é sábado à noite, sim)



se apressou em se ajoelhar em sua frente e tomar o rosto em suas mãos, passando os polegares por suas bochechas, sentindo novas lágrimas molhar seus dedos. Ele apenas a abraçou forte, tentando passar o máximo de segurança que conseguia através daquele ato.
- N-… - ela soluçou e se afastou para conseguir encarar os olhos do homem que tanto amava, respirando fundo antes de continuar. – Não tem jeito fácil de dizer o que eu preciso te contar – passou as mãos pelo rosto num ato frustrado e mordeu fortemente os lábios. – Deu para notar que eu estou perdendo muitas penas, não é? – ainda conseguiu dar uma risada fraca enquanto ele apenas assentiu, vendo-a pegar uma delas do chão, passando o dedo com uma delicadeza que só ela tinha. – Primeiro eu achava que era apenas uma punição por ter me envolvido com um nefilim, mas contanto que eu continuasse com meus deveres de ceifadora, não seria problema… Certo? – levantou os olhos para ele, que não sabia o que responder então acabou balançando a cabeça. – Mas não é assim que funciona, … Primeiro foram algumas penas, depois notei uma queda muito grande na minha energia, até que chegamos a isso – ela abriu as asas e seus olhos voltaram a encher de lágrimas. Tudo o que sentia, rebatia para suas asas e ela jurou até ver algumas penas cinzas no meio das pretas. Era quase o fim para a ceifadora. – Aprendi da pior forma que nós não podemos conciliar relacionamento e trabalho como os mortais fazem… Eu bem que queria , eu queria tanto! – voltou a se jogar em volta do pescoço dele e sentiu os braços fecharem suas costas, com cuidado para não machucar as asas já fragilizadas.
- Tem algo que eu possa fazer? – perguntou ainda inseguro enquanto fazia carinhos leves na pele exposta pela regata branca que ela usava. – Eu juro que faço qualquer coisa para te ver melhor.
O suspiro veio pesado contra seu pescoço, fazendo o homem se arrepiar e ela se afastou devagar até levantar do chão. Andou de um lado para o outro dentro do quarto, pisando em algumas penas até que parou apoiada na janela, ele ouviu algumas palavras baixas em latim, mas antes que pudesse questionar, ela se voltou para – Infelizmente tem. E eu digo infelizmente pois seria a última coisa que eu gostaria de fazer.
-
- Não tem jeito fácil de te falar isso , mas se eu quiser continuar com as minhas asas e função de ceifadora, e-eu… - o anjo soluçou e ele voltou a se aproximar dela, segurando suas mãos trêmulas – , eu te amo com todo o meu coração, mas para que eu fique viva, eu preciso te matar.
não teve outra reação além de perder todo o ar que tinha nos pulmões, a visão ficou turva e ele deu um passo para trás, batendo a perna na cama e acabou por cair sentado ali mesmo.
- V-Você....
- Eu sei - o rastro das lágrimas marcavam as bochechas dela. - Tentei argumentar e até sugeri uma contra proposta. mas eles viram o quão envolvida eu já estou com você, então eles me deram isso como punição... A outra proposta deles era te deixar viver, mas em troca disso, eu teria a minha queda e perderia minhas asas para sempre - a garganta de deu um nó e ela escondeu o rosto nas mãos, virando para encarar o céu já que, de certa forma, estava extremamente brava com ele. - E ficar sem minhas asas é o mesmo que a morte para mim, . Eu não consigo me imaginar sem elas. Eu sei que teria você do meu lado, mas eu continuaria infeliz para o resto da minha vida mortal - respirou fundo, passando uma das mãos pelos cabelos e bagunçou fortemente os fios, tentando ainda colocar os pensamentos no lugar até que começou a sentir o peito apertar mais uma vez. - A terceira opção que me deram era me afastar completamente de você até eu me curar cem por cento, o que demoraria uns cinco anos.... Sei lá, , todas as alternativas que me deram eu continuo viva, até se me tornar uma mortal com a minha, levaria anos até finalmente chegar minha vez. Nada que fosse rápido ou instantâneo! - bateu as mãos num ato frustrado e ele voltou a se levantar da cama. O anjo continuou a falar por alguns bons minutos, estava nervosa com toda a situação, não conseguia controlar a tremedeira e nem o choro. Ela se sentia completamente perdida, finalmente entendendo a expressão que milhares de mortais usavam como “estar sem chão”. Ela estava sem chão, sem céu, sem ar, sem base nenhuma. Nunca tinha amado alguém tão intensamente assim, e querendo ou não, aquele amor iria matá-la caso não tomasse uma decisão logo.

só se deu conta de que ainda estava falando quando sentiu os lábios de por cima dos seus, calando sua boca e prendendo seu ar. Ele fechou os braços por sua cintura e subiu uma mão para seu rosto, segurando firmemente em seu rosto enquanto a beijava, aos poucos conseguindo acalmar o anjo.
- Tente me escutar agora, okay? – ele encarou seus olhos assim que partiram o beijo e viu que ela já respirava com mais calma, recebendo apenas um aceno positivo com a cabeça dela. – Minha alma será sua, … Desde aquele dia do incêndio da balada eu era destinado a você. Talvez eu tenha conseguido escapar, mas tudo resultou para estarmos juntos aqui hoje, quem está fazendo isso com você, todo esse sofrimento e dor com a queda das penas, sou eu. É minha culpa , quebra meu coração que eu tenha feito tudo isso com você, nós dois estávamos cegos demais para notar que isso seria, provavelmente, de ambos – ele engoliu a seco, desviando o olhar para a lua que brilhava lá fora. – Minha alma sempre foi destinada a você, meu anjo, agora é a hora de você finalmente pegá-la… - ele beijou sua testa, logo descendo para seus lábios e sentiu ela se agarrar ao seu corpo quase como um ato de desespero.
Era isso. Infelizmente teria que ser feito. Não se negava o destino, você muitas vezes pode contorná-lo e atrasar os eventos, mas uma hora terá de acontecer o que precisa acontecer. Com o anjo ceifador e o nefilim não foi diferente. Por todos os anos que permaneceram juntos, eles estavam apenas postergando o que precisava acontecer de fato. assumia que a quase quatro anos atrás não queria morrer, lutou com todas suas forças para sair daquele clube, mas jamais teria imaginado que iria se apaixonar pelo próprio anjo da morte. Irônico, não?
Depois de finalmente acalmar totalmente , eles passaram um tempo conversando e trocando carícias, até se amaram uma última vez. Só Deus sabe o quanto ela iria sentir falta do corpo dele contra o dela, os toques, os beijos… Os olhos se enchiam de lágrimas só com o pensamento, e então passaram a arrumar o quarto de . Fizeram um cenário de como fosse um suicídio. Muitos frascos vazios de remédio para dormir, as poucas garrafas de whisky e vodka que ele tinha guardado também fizeram parte da armação. O se deitou na cama, com a camisa de botões totalmente aberta e respirou fundo encarando o teto. Um sentimento de inquietação passava por todo seu corpo, como uma corrente elétrica.

estava parada de pé ao seu lado e agora tinha sua foice nas mãos. Ela se inclinou para dar um último beijo nele, leve e delicado como uma de suas penas. Fechou os olhos e bateu duas vezes o cabo no chão, a névoa começou a invadir o quarto e teve um grande flashback do incêndio da balada, mas ele conseguiu limpar todos seus pensamentos enquanto ela fazia sua reza em latim. Em sua cabeça agora tinha apenas os melhores momentos que ele tinha passado ao lado do anjo, que também foram os melhores dias de sua vida inteira. Antes de , ele achava tudo comum demais, rotineiro demais… Mas com ela… Com ela um simples jantar se tornava extremamente especial, assim como uma caminhada pelo parque no pôr do sol. Ele a amava com todo o coração e sua alma, era só seu destino se entregar completamente a ela.
O anjo encostou a ponta da foice em peito, abrindo o pequeno corte – Obrigada por tudo, , você me mostrou que a vida ao seu lado seria incrível… Espero que um dia você me perdoe, mas saiba que eu te amo e sempre irei te amar! – deixou um soluço escapar ao pronunciar as últimas palavras e ouviu um baixo murmuro de ‘eu também te amo’ vindo dele antes de liberar totalmente sua alma do corpo. Um brilho intenso veio dele, quase a cegando e então seguiu seu caminho para o paraíso. A alma dele não tinha outro destino a não ser os céus, ele fora bom demais sua vida inteira, ele pertencia lá.
Assim que o ritual acabou, um trovão alto foi ouvido pelo anjo, arrepiando por completo todo seu corpo e logo um raio enorme e extremamente luminoso cortou os céus. Ela arqueou as costas, sentindo uma forte queimação nas asas e não segurou o grito, precisando segurar firmemente em sua foice para não desabafar no chão. As asas pareciam ter vida própria, se abriram violentamente, quebrando algumas estantes que tinham no quarto e também estavam duas vezes maiores. Ela olhou encantada para seu novo par de asas, agora mais forte e cheia de penas pretas que pareciam até brilhar. Sua garganta secou e se lembrou do motivo daquilo ter acontecido.
tinha os olhos fechados e uma expressão pacifica. Ele realmente tinha ido em paz, mas não aguentou ver aquela cena, voltando a desabar no choro e subiu na cama para abraçar seu amado enquanto aproveitava, de fato, os últimos momentos com ele já que conforme o combinado, um dos amigos dele iria entrar na casa e encontrá-lo apenas para tomar umas cervejas, mas acabaria o encontrando ali, morto. Ela não iria conseguir lidar com todos aqueles detalhes de funeral e coisas dos mortais. Respirou fundo e fez um carinho em seu rosto, colando os lábios no canto da boca dele.
- Eu sempre vou te amar, . Eu carregarei você comigo por toda a eternidade.
E com isso, apanhou sua foice e saiu voando pela própria janela do quarto dele, sem olhar para trás, caso contrário, jamais conseguiria ir embora.
Seu trabalho estava feito.

Ser um anjo ceifador nunca havia doído tanto nela quanto aquela vez, algumas vezes ela conseguia sentir a dor, magoa ou até mesmo alívio de muitas almas que cortou dos corpos, mas nada tinha a preparado para a dor que seria matar alguém que tanto amava. Um sentimento tão puro que doeu tanto em seu coração. Mas ela tinha uma certeza, ele seria o único homem que ela amaria, nenhuma alma se comparava à aquela, era único. E seria eternamente guardado na memória dela.





FIM.



Nota da autora: Sem nota.





Nota da beta: Lembrando que qualquer erro nessa atualização e reclamações somente no e-mail.


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