03. You give love a bad name

Finalizada em: 25/10/2020

Capítulo Único

Para , o amor tinha nome e sobrenome: .
E esse nome dava ao sentimento uma péssima reputação.

Alguns romances começam no verão, à beira mar, sob a luz da lua ou com o sol como testemunha, mas com ele tinha sido totalmente diferente. Ele tinha conhecido na igreja que as famílias de ambos – e consequentemente os dois – frequentavam, e a vira pela primeira vez em um dia de inverno rigoroso, pouco antes do Natal.
Ela parecia ser como ele: do tipo que tira boas notas, dorme e acorda cedo, ajuda nas tarefas de casa e nunca contraria as recomendações dos pais.
Como a maior parte das jovens que iam ao local todos os domingos, usava roupas discretas em tons pastel, não se pintava, falava pouco e baixinho, sentava-se juntos aos pais e o irmão com uma postura ereta, mas tímida.
Mas ele a achava a mais bonita de todas, e algo no sorriso dela era diferente, fazendo com que ele quisesse sorrir junto e ser o motivo do sorriso. Era um sorriso de anjo.
Já o seu jeito de andar… bom, é preciso dizer: o seu jeito de andar o fazia olhar para o corpo dela de uma maneira que ele tinha aprendido que era desrespeitosa e errada, e ele sempre se sentia muito culpado por isso.
Durante muito tempo, ele apenas a observou de longe. Depois começou a cumprimentá-la e, aos poucos, a puxar algum assunto sem importância. Somente no inverno seguinte ele tomou coragem para convidá-la para comer com ele em uma lanchonete, após o culto.
Nesse primeiro encontro, eles não conversaram sobre nada muito pessoal. Passaram a maior parte do tempo falando sobre a igreja e os outros fiéis, e depois o assunto mudou para esportes.
Foi uma boa surpresa saber que uma menina também podia conhecer tanto de futebol americano, beisebol e basquete! E um alívio ter sobre o que conversar e não acabar em um silêncio constrangedor.
Na semana seguinte, eles foram tomar um sorvete e caminhar no parque. Ele falou algumas coisas sobre a escola e os amigos. Ela falou um pouco sobre o irmão mais velho, que tinha se mudado para estudar na Universidade de Nova York, e sobre cachorros, que eram uma das paixões da família (eles tinham oito em casa!).
No final desse segundo encontro, foi ela quem o beijou pela primeira vez e ele adorou, é claro, mas também ficou muito assustado. A atitude dela foi ficando diferente, na medida em que eles iam conversando e se conhecendo melhor, e o beijo foi o ápice disso.
Eles continuaram saindo juntos, sempre após a missa, para comer alguma coisa e conversar. Era agradável estar perto dela, falar sobre os jogos, fazer piada e vê-la rindo com vontade. E eles sempre acabavam se beijando na despedida, inclusive com ele tomando a iniciativa, o que era a melhor parte.
Porém ela não falava muito de si mesma. Quando uma coisa ou outra começou a escapar, ele descobriu que ela tirava notas altas (confirmando parte da tese dele), porque os pais dela “a matariam” se tivesse notas vermelhas, mas achava a maior parte dos professores uns chatos e queria poder escapar das aulas. E que ela detestava ter que fazer tarefas de casa, como ficar de babá do irmão mais novo, quando os pais tinham algum compromisso.
Então ele começou a perceber que ela não era exatamente como ele imaginava, e que talvez fossem muito diferentes para serem alguma coisa além de amigos. No entanto, era tarde demais! Ele pensou em se afastar, mas percebeu que não conseguiria: já estava apaixonado. Baleado no coração!
Assim, quando percebeu, eles já estavam namorando. As famílias não somente aprovaram como ficaram animadíssimas! Acabaram até se aproximando e se encontrando também fora da igreja, em churrascos na casa dela e jantares na dele. As mães passaram a fazer compras juntas, os pais a ver os jogos do Cincinnati Reds.
Quanto mais o tempo passava, mais ele percebia que ela era uma pessoa totalmente diferente na frente dos familiares e longe deles. E isso só piorou quando ele entrou ainda mais no mundo dela, conhecendo finalmente seus amigos e saindo com eles.
Ela usava roupas nada discretas, coloridas e mostrando mais do corpo (uma vez trocou no banco de trás do carro dele), se maquiava e pintava até as unhas de vermelho sangue!
Não chegava muito tarde em casa, pois queria (e sabia) manter a imagem de santinha aos olhos dos pais, mas curtia cada minuto do tempo em que podia ficar fora. Bebia cerveja e depois chupava pastilhas para tosse extra fortes de menta para tirar o odor do álcool da boca.
Ela era uma pecadora e o estava ensinando a pecar também, não só por ter que omitir tudo que via, mas porque ele a desejava ardentemente, ainda mais quando ela estava com batom rosa choque, decotes profundos e saias curtas, indo contra tudo o que sempre tinha considerado correto.
E, como se isso, por si só, já não fosse motivo suficiente para deixá-lo preocupado e receoso, ele ainda ficava se perguntando se ela gostava mesmo dele e também o queria.
Não tinha certeza se uma garota como ela seria capaz de desejar um rapaz como ele, ou se ela estava brincando com ele e usando seus sentimentos apenas para se divertir.

As coisas começaram a esquentar entre eles, depois que ela percebeu que ele não tinha se assustado tanto com quem ela realmente era. Ao menos não a ponto de fugir.
Sempre que ficavam a sós, ela o provocava com beijos no pescoço, mordidas na orelha, carinho por dentro da blusa. Ficava um pouco frustrada quando ele não avançava muito, mas não queria pressioná-lo. Eles eram diferentes, afinal.
Alguns de seus amigos estranharam sua escolha por um garoto tão almofadinha e certinho, mas eles felizmente sabiam quando podiam ou não se meter.
Nunca ninguém o tratou mal ou forçou a barra para que ele mudasse, pois sabiam que ela não gostaria disso.
E foi por isso que ela levou um susto naquela noite, quando ele apareceu no drive-in abandonado em que o grupo dela gostava de se reunir para fumar maconha e beber, ouvindo música alta, e estava com uma aparência bastante diferente.
Nada de camisa ou calça social, nada de suéter ou mocassim, e nem mesmo do óculos! Eles estava usando tênis, um jeans rasgado, camiseta branca e um casaco de couro preto.
Algo não se encaixava e, depois que ele cumprimentou todo mundo, ela o puxou para longe de seus amigos, para ficarem sozinhos.
— O que aconteceu, ?
— Como assim? — Ele perguntou, mesmo que imaginasse do que se tratava, pois esperava outra reação dela.
— Que roupas são essas? Cadê seus óculos?
— Você não gostou? — Ele ficou decepcionado.
— Não é que eu não tenha gostado, . Você tá lindo…
— É? — Ele agora estava inseguro.
— Sim, você tá. Mas você também fica lindo com as roupas que você usa sempre.
— É? — Ele repetiu, franzindo a testa, e ela teve vontade de revirar os olhos. Insegurança nunca tinha parecido ser algo de que ele sofria.
— Claro que sim! Você é meu namorado. É claro que eu te acho lindo. Qual é o espanto?
— Sei lá… eu… Eu achei que talvez você preferisse que eu me vestisse assim. Do jeito como eu me visto normalmente eu não combino muito com você e os seus amigos.
— Você não precisa combinar com ninguém, no seu jeito de vestir. Você tem que se vestir como você se sentir melhor — ela assegurou. — E eu te conheci usando aquelas roupas e escolhi namorar você. Porque eu ia preferir que você mudasse?
— Eu também te conheci usando gola alta e saia no joelho! — Ele deu de ombros e ela suspirou.
— Isso é verdade, mas… É melhor a gente ir embora daqui, pra um lugar onde a gente possa conversar melhor. Eu vou pegar minhas coisas. — Ele apenas assentiu e ela voltou para o lugar em que o pessoal estava concentrado, pegando a bolsa e se despedindo.
Entraram no carro e ele deu partida, saindo do terreno do velho drive-in em silêncio.
— Pra onde a gente vai? — Perguntou, algum tempo depois.
— Não pode ser pra sua casa, nem pra minha — ela falou. — É melhor que não seja nenhum lugar público também, com gente em volta…
A resposta dela não ajudou em nada e ele só dirigiu, sem direção.
— Para ali — ela pediu, quando estavam chegando a um supermercado. — A gente fica no carro mesmo.
O rapaz não respondeu nada e fez somente o que ela tinha sugerido, preocupado com a conversa que ela queria ter. Talvez a tentativa dele de agradar tivesse mostrado para ela que ele era tão devotado que não merecia ser usado, e ela tivesse resolvido colocar um ponto final em tudo. Essa perspectiva o deixava nervoso demais para falar.
Já no estacionamento do Kmart, ela respirou fundo, tirando o cinto de segurança e se virando de lado no banco do carona, para olhar para ele.
— Você nunca me perguntou porque eu me visto totalmente diferente e me comporto totalmente diferente, quando eu não to com meus pais.
— Eu não achei que precisasse — ele explicou, dando de ombros. — Longe deles, você faz o que tem vontade. Na frente deles, você é como eles preferem que você seja.
— Você tá certo, mas não completamente. Eu não finjo ser uma pessoa que eu não sou pra agradar os meus pais. Eu finjo porque não tenho alternativa! Porque eles não me deram escolha! — Esclareceu. — Quando eu tinha uns doze anos, uma tia minha me deu um batom, sabe? Coisa de criança… batom rosinha, nada demais! Mas, quando o meu pai viu o batom nos meus lábios, ele esfregou até minha pele ficar irritada. A minha mãe quebrou o batom e disse que era pra garantir que eu não pegasse ele de volta do lixo! Quando eu tinha uns quatorze, uma garota da minha turma foi fazer um trabalho lá em casa e chegou de short jeans. Meu pai disse que não queria filha dele andando com piranha e muito menos levando piranhas pra nossa casa, e a minha mãe me deu uma surra de cinto porque me viu falando com a mesma menina, um tempo depois, quando foi me buscar na escola. Logo que eu fiz dezesseis, eu fiquei uns dias de babá do filho de um colega de trabalho do meu pai. Não tinha nenhum pagamento combinado, mas a mulher dele quis ser agradável e meu deu um dinheiro de presente. Eu comprei uma calça jeans e, quando eu vesti, toda feliz, meu pai disse que eu estava desagradando a Deus, sendo uma menina má. Minha mãe me acompanhou até o quarto e me fez assistir, enquanto ela cortava a calça em pedacinhos. Eu acho que nunca chorei tanto quanto naquele dia!
— Meu Deus, ! Eu sinto muito! Eu não podia imaginar. — Ele segurou a mão da garota, querendo confortá-la.
— Eu sei, . Você não podia — ela o tranquilizou. — Você tem uma irmã que sequer vai à igreja, porque seus pais são pessoas normais, que aceitam vocês, como vocês são. Os meus, não. Eles querem que nós sejamos a família perfeita! — Lamentou. — Eu acredito em Deus e me senti culpada, quando comecei a mentir pros meus pais, mas se eu não fizesse isso eu não ouviria nem as músicas que amava! Aos poucos, eu percebi que Deus não tá nem aí pro meu decote, pro tamanho da minha saia, pro ritmo das músicas que eu escuto, pra cerveja que eu bebo, e sim pro fato de eu ser uma boa pessoa. Na minha situação, sinceramente eu acho que Ele não vai me condenar ao inferno nem por eu ser uma mentirosa!
Quando disse isso, ela temeu que ele fosse ficar escandalizado, mas surpreendentemente o namorado concordou.
— Eu te contei tudo isso porque eu quero que você me conheça. De verdade! Mas eu te contei também porque, pelo que eu conheci de você e da sua família, até agora, eu acho que você é todo certinho e engomadinho simplesmente porque… você é! E não porque é obrigado ou porque quer agradar alguém.
— Eu sou — ele riu, ao concordar. — Eu sempre fui. A minha irmã sempre pegou no meu pé por isso!
— E eu não quero que isso mude — ela declarou. — E muito menos quero ser a razão dessa mudança! Eu sei o quanto é difícil e triste fingir e, além disso, eu me apaixonei por você do jeitinho que você é.
Ela olhou para seus dedos entrelaçados e sorriu. Ele levantou o queixo dela, com a mão livre, e deu um beijo em seus lábios.
— Sendo assim, eu acho que vou adotar os tênis, porque eu gostei realmente deles, e a camiseta, que eu achei bem confortável. Mas jeans rasgado não é pra mim, não! E eu vou continuar com meus óculos também, porque esse negócio de lente dá muito trabalho e eu podia estar enxergando melhor! — Riu. — E isso aqui vai voltar amanhã mesmo pra casa do Zuco — completou, tirando a jaqueta e jogando a mesma no banco de trás.
— Foi o Zuco que te emprestou? — Perguntou, surpresa, pois o melhor amigo dele não tinha jeito de quem usava aquele tipo de peça de roupa.
— Foi, sim. Foi ele quem me deu a ideia de fazer uma transformação no estilo Sandy Olsson. E ele contribuiu ainda, me emprestando a jaqueta que a mãe deu pra ele de aniversário.
— Como assim? Quem é essa Sandy? — Ela indagou, confusa.
— Do filme Grease — ele disse, mas percebeu que ela continuou sem entender. — É um filme antigo. Acho que é da década de setenta. É o filme favorito da mãe do Zuco. Inclusive ele se chama Zuco por causa do personagem principal.
— Entendi, mas qual é a dessa Sandy, afinal?
— Ah, ela é a protagonista e gosta do tal do Danny Zuco, mas ela é toda certinha e ele é bad boy. Então, no final da filme, ela aparece toda mudada e eles ficam juntos.
— Meu Deus! — Ela riu da situação. — Isso significa que eu sou uma bad girl.
— Um pouco — ele brincou. — Mas felizmente você não é tão parecida com o cara, porque eu acho que não levo muito jeito pra Sandy. Eu to feliz de poder ser eu mesmo — concluiu.
Naquela noite, no entanto, ele ainda teve mais um ato de rebeldia, ao perder a virgindade no banco de trás do carro, estacionado na parte mais escura do estacionamento do supermercado.
Ele não precisava mudar para agradar ninguém, mas na vida a gente pode e deve estar aberto a conhecer coisas novas e a mudar de ideia sobre aquilo que pensamos conhecer.
Ele já não podia acreditar mais, por exemplo, que fazer sexo antes do casamento fosse um pecado gravíssimo, que o afastaria do caminho do bem.
Ele e se amavam, e se entregarem um ao outro não podia ser errado!


Fim



Nota da autora: A música merecia bem mais, mas a autora que vos falar insiste em entrar em muito projetos e depois acaba sem tempo para fazer algo que seja realmente legal. Só posso me desculpar com vocês que amam a música e estavam esperando uma história com mais desenvolvimento... Obrigada, se mesmo assim tiver lido até aqui! Beijos da Mari <3



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