Postada: 29/06/2017

Capítulo Único

- Será que você pode parar e me escutar por um minuto que seja? - gritei irritado, enquanto sentia que minha cabeça poderia explodir a qualquer minuto.
- Você tem noção de como eu me sinto, ? Consegue entender o quanto anda me magoando ultimamente? - notei as feições dela tomadas por um misto de raiva e dor, o que provavelmente não era diferente das minhas, porém eu não me abalei com o fato de ela sentir dor, não me abalei porque estava tão cego que só conseguia me importar com a minha própria.
- E você acha o quê? Que estou mergulhado em um poço de alegria, ? - soltei, indignado por ela falar como se fosse a única afetada por tudo aquilo.
- E de quem é a culpa? É você que anda um poço de frieza comigo, . É você que desliga essa porcaria de telefone quando está com seus amigos e sei lá mais quem. É você que tem me deixado sozinha todas as noites me perguntando o que foi que eu fiz de errado! - e as lágrimas escorreram pela bochecha dela, ressaltando o quanto estava magoada com tudo o que jogava na minha cara. - Eu repito então: de quem é a culpa?
- Você sempre soube como as coisas seriam, . Meu telefone não fica desligado porque quero evitar você, droga! Você sabe muito bem que eu tenho toda a minha carreira pra manter. Não posso te dar cem por cento do meu tempo! - respondi, de forma mais agressiva do que eu jamais havia falado com ela. E ao ver a mágoa nos olhos da minha eu percebi que havia passado dos limites e que tudo aquilo que havíamos construído tinha acabado de desabar como um castelo de areia.
- Sabe o que isso significa então, não é? Eu não quero dez por cento de você. Não é o suficiente pra mim. - ela disse, após soltar um longo suspiro.
- O que quer dizer? - ainda balbuciei, por mais que entendesse perfeitamente as palavras dela.
- Quero dizer que não dá mais, . Acabou. - seus lábios tremeram e outra lágrima escorreu pela bochecha dela. - Nós acabamos. - meu cérebro demorou para processar as palavras dela e quando me dei conta ela já havia atravessado todo o apartamento e abria a porta da sala.
- ! - chamei, ouvindo minha própria voz também soar trêmula e esganiçada enquanto um bolo se formava em minha garganta.
- Eu venho buscar minhas coisas quando você não estiver aqui - ela respirou fundo e secou as lágrimas de seus olhos.
- Não... - tentei impedi-la inutilmente.
- É o melhor pra nós dois - e sem me deixar convencê-la do contrário a porta se fechou, eu fui deixado sozinho naquele apartamento e meus pés estavam colados ao chão, me impedindo de correr atrás dela como meu coração gritava.
Não conseguia acreditar no rumo que aquela briga havia tomado, não depois de tantas semelhantes terem acontecido antes.
Nós sempre acabávamos nos braços um do outro, mas algo na forma como meu peito doía me dizia que dessa vez não teria volta.
Nós realmente havíamos acabado.
Em um baque que devia ser doloroso, meus joelhos se chocaram no chão e puxei meus cabelos com força enquanto deixava as lágrimas até então reprimidas caírem torrencialmente, encharcando meu rosto e tentando colocar para fora toda aquela dor que arrebatava meu coração.
Eu só conseguia pensar que se eu soubesse como sofreria, não teria ido até aquele maldito metrô.

* * *


Seis meses antes...

Estava deitado naquela cama de hotel, jogando Candy Crush Soda e ouvindo os caras berrarem vez ou outra.
John e Steven estavam disputando alguma coisa no Xbox enquanto Carter e Rick eram os espectadores. Provavelmente estavam revezando e o perdedor dava lugar para o próximo da fila.
Eu até poderia estar ali com eles, porque eu também era um viciado naqueles jogos, mas estávamos na quinta cidade de nossa turnê e eu já estava enjoado de ganhar de todos eles.
Candy Crush me relaxava.
Eu não sabia qual havia sido o tipo de macumba que o criador daquele jogo tinha feito, mas uma vez que eu começava, me sentia tão leve que não conseguia parar e eu sempre avançava umas boas fases antes de me dar conta que eu tinha uma vida social e precisava desgrudar do celular.
Na maior parte das vezes, o responsável por me desligar dessa realidade paralela era o empresário de nossa banda, a Stormtroopers.
A história da nossa banda era engraçada. Carter e Steven queriam participar do show de talentos da nossa escola. Rick, que é primo de Steven, resolveu dar uma força. John era o esquisito que sabia cantar e eu caí de paraquedas quando descobriram que eu sabia tocar guitarra.
Alguns meses depois, com nosso vigésimo vídeo publicado no YouTube, o milagre da viralização aconteceu e um produtor bacana resolveu apoiar nossa causa.
E anos mais tarde estavam os cinco em nossa terceira turnê, que sempre começava nos Estados Unidos e depois seguia para outros países.
Bendito seja o cara.
Mas voltando onde eu estava, aquele joguinho de satanás me deixava bem tranquilo, o único problema era que eu não queria isso e não era porque eu precisava usar drogas ou algo do tipo, aquele era nosso primeiro dia em New York!
Quem dispensa o primeiro dia naquela cidade jogando trancafiado num hotel? Eu é que não.
E foi por isso que levantei da cama onde estava esparramado e não me preocupei com casaco nem nada do tipo, já que era verão e estava quente pra caralho. O que eu precisava na verdade era do meu bom e velho disfarce, já que eu precisaria passar pelas fãs aglomeradas na frente do hotel.
Eu sei, nunca imaginei que uma coisa dessas pudesse acontecer. Quer dizer, eu imaginei sim porque vivia sonhando com essa coisa toda de rockstar, mas não deixava de me surpreender com o tremendo sucesso que a Stormtroopers havia conquistado. Sentia orgulho de mim mesmo e dos caras.
Com a peruca no melhor estilo Beatles e os óculos escuros, eu achava que parecia um daqueles motoqueiros de estrada, mas provavelmente estava enganado.
Encarei meu reflexo no espelho e enfiei o celular e a carteira no bolso da calça, nem me dando o trabalho de me despedir porque duvidava que os caras fossem me ouvir.

* * *

Senti uma brisa agradável assim que coloquei meus pés do lado de fora do hotel, sorrindo de forma discreta e vitoriosa por ter conseguido passar despercebido pelas fãs da banda.
Não me entenda mal, não é que eu não goste delas ou seja daqueles artistas super mal agradecidos, eu só tinha aqueles momentos em que precisava sair sozinho para relaxar e organizar meus pensamentos.
E o remédio que era a verdadeira droga da minha terapia se resumia a algo tremendamente banal para quem vive em cidades grandes feito New York: andar de metrô.
Eu sei, pode soar bem esquisito, mas eu não me importava muito porque desde criança eu tinha uma fascinação inexplicável pelo que andava sobre trilhos. Trens e metrôs eram meus brinquedos favoritos.
Acho que se eu não fosse um guitarrista de uma banda famosa, provavelmente dedicaria a minha vida desenhando e criando novas versões daquelas belezinhas, tamanha era a minha paixão por elas.
Não me admirava nadinha que meus pés me guiassem exatamente para a primeira entrada subterrânea que encontrei, o que não era lá tão complicado porque eu estava em um hotel em Manhattan.
Só de ouvir o barulho dos veículos chegando e saindo em alta velocidade eu já conseguia sentir meu peito agitado de excitação.
Eu passaria horas ali só observando e depois embarcaria em um deles, viajaria até o final da linha e pegaria o metrô de volta para o ponto inicial.
Era como uma espécie de ritual que eu fazia em todas as cidades por onde passávamos nas turnês.
Se eu fazia isso na cidade onde eu morava? Pode apostar que sim.
Aliás, todos nós éramos de Chicago, Illinois, a incrível Cidade dos Ventos.
Eu amava Chicago e a achava mil vezes melhor que New York, mas não poderia deixar de ceder aos encantos e à agitação daquele lugar. Era incrível, eu não poderia negar.
Eu estava parado fazia uns bons minutos, com meus olhos vidrados na direção dos trilhos onde os metrôs passavam, quase um seguido do outro.
Não precisava de nicotina ou de álcool para me sentir relaxado, na verdade eu era xingado de careta porque não gostava de nada disso.
Tudo o que eu precisava estava bem na minha frente.
Me encostei a uma parede e mantive um meio sorriso em meu rosto, sabendo que provavelmente meus olhos brilhavam em admiração.
E foi naquele intervalo onde os metrôs sumiam que eu ouvi uma melodia familiar, mas não foi isso que chamou minha atenção.
O que me fez mudar todo meu foco foi a voz que entrou em destaque.

But there’s a hope that’s waiting for you in the dark¹
You should know you’re beautiful just the way you are

Me surpreendi pela beleza do timbre, pela intensidade e pelo sentimento que passava. Era como uma mensagem para cada pessoa que passava por aquele lugar.

And you don’t have to change a thing
The world could change its heart

Aquilo me fez sorrir. De um jeito que eu não sorria há um bom tempo, por mais feliz que eu julgasse estar.

No scars to your beautiful
We’re stars and we’re beautiful

De repente, eu senti necessidade de saber de quem era aquela voz e fiz uma careta quando o barulho do metrô voltou, dificultando um pouco a minha tarefa de seguir a melodia, o que me deixou confuso porque eu nunca havia achado ruim ouvir o som do metrô.
Me desencostei de onde estava e me pus a caminhar a passos apressados enquanto mantinha minha audição aguçada até encontrar a origem daquele belo cover.
Eu não tinha reconhecido de quem era aquela música, mas eu sabia que conhecia de algum lugar e...
Quem se importava com quem tinha gravado mesmo? Eu é que não.
Estava muito ocupado com o olhar completamente vidrado na moça sentada sobre uma almofada colorida no piso frio da estação.
Os cabelos dela estavam caídos para trás de seus ombros em belíssimos cachos e ela cantava de olhos fechados, imersa pela emoção.
Ela era toda cores, tocava um violão azul escuro com um dourado desenhado no braço e com uma expressão surpresa notei que vestia uma camiseta da Stormtroopers. Se não era uma fã, era uma admiradora da minha banda.
Isso me fez sorrir de novo enquanto não conseguia desgrudar meus olhos dela.
Parecia que sua pele reluzia, eu jamais conseguiria explicar direito, mas o jeito gostoso que sua voz soava a fazia transcender.
Eu estava admirado, paralisado, hipnotizado.
Não era de me surpreender com facilidade, mas a forma como ela cantava havia mexido comigo. Me fez sentir aquela vontade maluca de chorar que a gente só sente quando a voz de um artista consegue mesmo tocar nossa alma.
Então de observar os metrôs passando eu passei a observar ela, cantando tão imersa que mal havia notado a minha presença.
Algumas pessoas passavam, deixando dólares e moedas caírem na capa do violão estendida a poucos metros de onde ela estava e aquilo me fez admirá-la pela coragem de expor seu trabalho, recebendo tão pouco em troca.
Soltei um suspiro, passando a mão por meus cabelos e me afastei dali quando vi que o metrô para Coney Island chegaria em dois minutos.
Com uma sensação de que não deveria sair dali, eu embarquei e procurei um lugar para sentar, ainda observando a moça pela janela até que ela se tornasse um borrão.
Em nenhum momento ela havia olhado em minha direção.
Mas durante todo o meu passeio solitário eu pensei nela e em como as notas soavam verdadeiras em sua voz, com uma paixão incrível pela música, um amor que eu desejei que me tocasse.
Era até engraçado eu me sentir daquele jeito vendo uma artista de rua que provavelmente eu jamais encontraria novamente, mas não conseguia controlar. Era mais forte do que eu.

* * *

Me perdi nas horas, encarando o horizonte, caminhando sobre a areia próxima ao oceano enquanto pensava em tantas coisas, não me surpreendi ao imaginar qual seria a história daquela garota, e quando dei por mim o dia escurecia e eu sabia que precisava voltar ou a polícia nova iorquina estaria atrás de mim.
Um tanto exagerado, eu sei, mas meu empresário era um cara bendito e maluco.
Dei risada disso e voltei a pegar o metrô, incomodado por ter que colocar meus pés sujos de areia dentro dos sapatos, mas eu sabia que teria os dedos esmagados por alguém se não o fizesse. Além de um enjoado, eu era bem distraído.
A viagem de volta sempre era mais rápida que a da ida e um dia eu esperava encontrar algum gênio da ciência que me explicasse o porquê, mas por hora eu estava bem cansado e só queria desmaiar na cama, embora eu soubesse que meus amigos idiotas jamais fossem permitir.
Eles sempre passavam o dia todo com o rabo na frente do videogame, depois me arrastavam pra alguma festa.
Não que eu não gostasse, eu curtia demais, só que no momento eu queria ficar mais um pouco aproveitando meu momento antissocial.
Talvez eu tivesse cochilado, porque de repente ouvia falarem o nome da minha estação e meus olhos se abriam assustados enquanto eu levantava com pressa e me lançava para fora do metrô antes que as portas se fechassem em cima de mim.
Eu sabia que não fechariam, mas vai que acontecia alguma coisa no maior estilo daquele filme Premonição?
Tropecei em meus próprios pés e quase deixei a peruca cair de minha cabeça, o que seria uma cena maravilhosa, mas meu primeiro instinto foi segurá-la, então eu estava seguro.
Me ajeitei, esperando que ninguém tivesse notado, então meus olhos foram para a direção onde ela deveria estar só para o caso de, de repente, ela não ter ido embora.
Eu poderia beijar todos os anjos no exato momento em que vi que era exatamente o que havia acontecido.
Ela havia parado de tocar e se ajeitava para partir, virada de costas para onde eu estava. Então, em um impulso, eu me aproximei, puxei uma nota de cem dólares da carteira e coloquei na capa do violão.
Me afastei um pouco e me encostei numa parede a alguns metros, observando-a e sorrindo de canto quando percebi as feições de surpresa no rosto dela ao ver a nota.
Rapidamente, a moça olhou em volta, certamente procurando quem poderia ter feito tão generosa doação e eu me afastei mais um pouco. Por algum motivo que nem eu mesmo entendi, não queria que ela soubesse que eu havia sido o autor da doação.
Como para me contrariar, meu celular começou a tocar de forma escandalosa, atraindo a atenção dela para mim.
Seus olhos pousaram na minha direção e eu precisei me conter ao ver que eles brilhavam de uma forma que não consegui decifrar bem.
Mas o telefone continuava a tocar e eu sabia que precisava atender, então quebrei o contato visual com ela e saí dali de uma vez, resmungando ao atender a ligação.
- , onde foi que você se meteu, caralho? - John, sempre tão delicado.
- Fui dar umas voltas pra espairecer, não enche - disse, em tom mal humorado, subindo as escadas da estação e fazendo uma careta ao avistar o hotel a duas quadras dali.
- Confessa logo que tu dá essas saídas pra fumar umas maconhas. Você não engana ninguém, cara - ouvi o tom de zoação, seguido pelas risadas de meus outros amigos e aquilo me fez revirar os olhos.
- Vocês sabem que eu não gosto dessas coisas, otários. To aqui na frente do hotel, já vou subir - nem esperei resposta e desliguei, caminhando rapidamente e voltando para a minha “casa” durante aqueles dias.

* * *

O segundo dia em New York havia sido basicamente um inferno.
Nós estávamos cheios de compromissos e eu não tive tempo de sair para ir até o metrô porque nosso show seria à noite, então por alguma razão eu me sentia bastante irritadiço.
Me mantive mais calado perto dos caras e agradecia por eles não me cutucarem naqueles momentos. Gostava do respeito que compartilhávamos por mais que a zoeira sempre existisse.
O show havia sido maravilhoso. Toda a irritação foi embora por algumas horas e a música dominava cada célula de meu corpo, me dando mais certeza de que eu havia nascido para ser quem eu sou.
No final do espetáculo, porém, eu me senti frustrado e só quando deitei a cabeça no travesseiro para dormir que entendi o porquê.
Eu havia procurado por ela no meio da multidão e não havia encontrado.
É claro que ela não estaria, provavelmente ela vivia do dinheiro que conseguia tocando nas ruas.
Tinha recusado sair com os caras naquela noite e descobri depois que havia sido uma sábia decisão.
O sono me permitiu observá-la mais uma vez em meus sonhos.

* * *

No terceiro dia nós tínhamos umas entrevistas pra fazer de manhã, mas a tarde estaria livre para que descansássemos, já que no quarto dia teríamos outro show.
Eu amava quando vendíamos todos os ingressos, mas que artista não ama?
Steven e Rick estavam planejando ver a Estátua da Liberdade e até me chamaram para ir com eles, mas eu não queria, só conseguia pensar em voltar à estação de metrô.
Será que ela estaria lá?
Provavelmente eu estava ficando louco, desejando tanto ver uma garota que eu ao menos conhecia, mas algo tinha me intrigado nela, algo que me instigava a me aproximar novamente e observá-la por diversas horas se fosse preciso.
Então lá estava eu, andando feito um tonto enquanto tentava ouvir alguma música e de repente senti um solavanco engraçado no estômago ao reconhecer a voz dela.
Dessa vez foi mais fácil encontrá-la, talvez porque minha mente tenha revisitado a primeira cena diversas vezes, mas mesmo assim ouvi-la foi diferente de tudo o que eu já havia experimentado na vida.
Quem precisava de drogas ou de Candy Crush com uma garota daquelas cantando lindamente daquele jeito?
Caramba!
Que tipo de feitiço ela tinha feito comigo?
Por um segundo, eu tive a impressão de que os olhos dela pousaram em minha direção, mas quando foquei no rosto dela estava imersa na música, exatamente como eu a havia visto pela primeira vez.
Então mais uma vez longos minutos se passaram, talvez horas, mas eu continuava ali, encostado na parede enquanto a ouvia cantar.

Baby²
There’s something tragic about you
Something so magic about you
Don’t you agree?

A letra da música parecia ecoar meus pensamentos e eu cheguei a me perguntar se ela não teria alguma espécie de dom especial de ler minha mente.
Eu sorria bobamente, também imerso pela música e quando me dei conta, murmurava a música baixinho.

Baby
There’s something lonesome about you
Something so wholesome about you
Get closer to me

Eu não era nenhum cantor super foda como o John, mas fazia a segunda voz junto a Steven e até que dava pro gasto quando arriscava algo no violão.
Mas perto da voz daquela garota, eu sabia que não era nada.
Ela parecia um anjo cantando. Um anjo que tinha me deixado rendido aos pés dela.
O negócio é que a realidade é uma coisa chata e a consciência é ainda mais insuportável porque te cutuca nas horas mais inconvenientes para lembrar que contos de fadas não existem no mundo dos adultos.
Ainda que eu conseguisse desgrudar meus pés dali e fosse falar com ela, eu só tinha mais quatro dias em New York, no máximo poderia atrasar minha partida por mais uns dois ou três dias. Depois disso nós seguiríamos para Baltimore e o restante dos Estados Unidos.
Nunca daria certo.
Talvez o melhor fosse eu pegar o metrô até a Estátua da Liberdade e encontrar com meus amigos lá.
É... era isso que eu faria.
Soltei um suspiro derrotado e me aproximei devagar da garota, que ainda cantava e tocava como se sua vida dependesse disso.
Puxei a carteira, exatamente como da outra vez, e puxei a nota de cem dólares, estendendo a mão para jogar o dinheiro dentro da capa do violão.
Então senti segurarem meu braço.
- Foi você - ela havia interrompido a música e o movimento que eu havia feito para doar dinheiro a ela.
Subi meu olhar do lugar onde ela me segurava pelo braço e foquei em seus olhos, brilhantes daquele mesmo jeito e fixos no meu rosto, esperando algum tipo de explicação.
Eu estava disfarçado novamente e provavelmente ela não me reconheceria, mas eu sabia que se ela fosse fã da minha banda reconheceria a minha voz.
Nem isso me impediu de respondê-la.
- Foi - soltei, dando de ombros e sentindo ela soltar meu braço e empurrar minha mão para longe da capa do violão.
- Eu não posso aceitar tanto dinheiro, moço - franzi o cenho, surpreso pela atitude dela e teimei em lhe dar o dinheiro, mas ela foi firme em recusar.
- Por que não? - questionei intrigado.
- Por que você está dando uma quantia dessas para uma desconhecida? - ela respondeu com outra pergunta e eu senti vontade de rir, mas me contive.
- Porque você merece. Eu gosto de ouvir você cantar. Me faz sorrir. - fui sincero e percebi que dessa vez ela que estava surpresa. Ela pigarreou e afastou sua mão da minha, colocando uma mecha atrás do cabelo de uma forma que demonstrava nervosismo.
Que bom que eu não era o único, porque eu me sentia tremer.
- Hm, obrigada. Mas mesmo assim não posso aceitar - fez uma careta e voltou a me encarar. - É muito dinheiro para uma mera artista de rua.
- Você não é uma mera artista de rua. Tem um talento que eu nunca vi antes, sabe? Não que eu seja um gênio da música ou um profissional, é claro - emendei, com medo de que me entregasse ali porque até o momento ela aparentemente não havia me reconhecido.
- Acha isso mesmo? - vi um meio sorriso se formar em seus lábios, mas ela parecia realmente decidida a recusar meu dinheiro. - Ainda assim...
- Já sei. Não quer meu dinheiro... Acho que ele até ficou ofendido, viu? - brinquei, ouvindo ela rir baixinho. - E dar uma volta de metrô comigo, será que você aceita?
Aquele havia sido mais um impulso, por mais que minha consciência estivesse gritando que era loucura.
Provavelmente, ela tinha mais bom senso do que eu e iria recusar. Vamos lá, eu era um completo desconhecido que havia resolvido stalkeá-la e lhe dar notas de cem dólares.
- Vou aceitar só porque fiquei com peso na consciência. Não quero magoar seu dinheiro - a resposta dela me pegou de surpresa, mas eu ri que nem um idiota mesmo assim. - Eu só preciso dar um jeito nessas coisas aqui.
- Oh, eu ajudo você - me propus e ela sorriu com a gentileza.
Minutos depois, o violão dela estava guardado e nós estávamos prontos para pegar o próximo metrô.
- Para onde você que ir? - ela perguntou, curiosa.
- Eu não sei. Eu sempre pego o primeiro metrô que vejo e sigo até o fim da linha - confessei minha esquisitice e vi mais uma vez um sorriso lindo se formar em meus lábios.
- Soa ótimo para mim - ela deu de ombros, então ajeitou a alça do violão em um deles e estendeu a mão em minha direção, num cumprimento. - .
Hesitei, porque realmente não sabia como respondê-la. Acabei por inventar apenas o sobrenome, porque esperteza não era bem meu forte.
- Clark.

* * *

Percebi que ao lado de o silêncio não tinha lado. Ela era espontânea e puxava assunto de uma forma tão simples que fez com que eu sentisse uma ligeira inveja, porque eu não era assim.
Não que eu fosse antissocial ou algo do tipo, eu só era o tipo de cara um tanto fechado que sempre pensava quinhentas vezes antes de dizer alguma coisa, com receio de soar idiota ou ofensivo.
Já havia ouvido de várias pessoas que aquele receio era uma merda.
Como se eu não soubesse disso.
- Você ainda não me disse no que trabalha, . Conhece meu emprego, mas eu não conheço o seu - despertei de meus pensamentos, olhando rapidamente para ela e me sentindo desprevenido. Eu realmente não tinha pensado em responder aquele tipo de coisa.
- Ah, bom... eu... - não consegui disfarçar e estava gaguejando feito um idiota, o que a fez estreitar os olhos para mim, desconfiada.
- Ih, você por acaso não vende drogas, ou vende? - abri a boca para responder, mas ela me interrompeu. - Não, espere! Você é um daqueles cafetões! Desculpa, mas eu não levo o menor jeito pro... serviço - as bochechas dela ficaram vermelhas e eu passei cerca de dois segundos olhando ainda mais surpreso para ela antes de cair na gargalhada, ouvindo a dela se juntar à minha logo depois.
Ela era tão espontânea, tão cheia de energia, tão... Linda.
E eu era um perfeito idiota por não dizer quem eu realmente era ou iludir a nós dois porque eu iria embora cedo demais.
- Relaxa, eu não quero olhar seus documentos, nem nada do tipo. - ela disse, com a voz ainda ofegante de tanto rir. - Só perguntei por curiosidade, mas se não quiser falar tudo bem - me senti até meio bobo com as palavras dela, mas logo depois a culpa já estava ali também.
- Eu tenho um negócio com meus amigos - acabei optando por dizer meia verdade, o que talvez fizesse eu não me sentir tão mal. - Pra falar a verdade, nós estamos apenas de passagem por aqui. Daqui a quatro dias já estamos de partida - soltei, encarando algum ponto à minha frente.
- É uma pena - ouvi ela dizer, o que me fez olhá-la rapidamente. - Gostaria de conhecê-lo melhor.
Aquilo me pegou de surpresa e eu descobri que estava gostando de ser surpreendido por ela.
- Também gostaria de conhecê-la melhor, . Você já me fez rir de um jeito que eu não ria há um bom tempo - confessei, sorrindo sincero para ela.
Ficamos nos olhando por alguns segundos e então ela pareceu despertar de algum transe antes de voltar a falar.
- Não consegue prolongar sua estadia? - por um segundo, achei que estava imaginando aquela pergunta, mas pelo jeito que ela arregalou os olhos logo depois eu tive certeza de que era bem real. - Esqueça que eu disse isso. Nós mal nos conhecemos! - ela desviou o olhar do meu, constrangida.
- Eu queria poder prolongar. Mas não posso, não o quanto eu gostaria - respondi mesmo assim, sorrindo para deixá-la menos desconfortável. Foi aí que uma ideia meio insana tomou conta de meu pensamentos.
- O que foi? - ela havia percebido a mudança brusca de humor em meu rosto.
- E se eu te prometer que irei até a estação todos os dias até a data em que eu precisar partir? Você acha que assim nós conseguiremos nos conhecer melhor? - desejei mentalmente que ela não me desse nenhum soco por aquilo ter soado como se eu sugerisse outras intenções. Não que eu não pensasse naquele tipo de coisa, mas eu estava curioso com ela, queria descobrir todas as faces de porque eu sabia que todas elas eram tão encantadoras quanto seus belos olhos.
- Eu acho que é um começo, . Vou gostar muito também - o sorriso em seus lábios era lindo e eu me peguei retribuindo de forma boba, encarando os traços de seu rosto por mais tempo do que seria recomendado.
- Ótimo, porque eu não vejo melhor maneira de passar esses dias aqui em New York - soltei, com sinceridade e pela primeira vez notei as maçãs de seu rosto ficar ruborizadas. Tão adorável. Tão linda.

* * *

Just stop your crying³
It’s a sign of the times
Welcome to the final show
Hope you’re wearing your best clothes
You can’t bribe the door on your way to the sky
You look pretty good down here
But you ain’t really good

Era meu sexto dia em New York.
Dessa vez eu estava sentado na areia, esquecendo completamente que me incomodava com a sensação de estar sujo pelos grãos. O sol estava se pondo e uma brisa fria batia contra meu rosto, fazendo com que minhas bochechas pinicassem.
Meus olhos estavam fixados na garota à minha frente, que entoava aquela canção enquanto encarava o horizonte. Os cabelos dela voavam com o vento, como numa daquelas cenas de videoclipes.
O violão de estava em meu colo e era eu quem tocava a melodia, percebendo que eu só podia ser um puta guitarrista por conseguir tocar alguma coisa direito enquanto estava ali tão hipnotizado por ela e pela voz dela.

We never learn, we been here before
Why are we always stuck and running from the bullets?
The bullets
We never lean, we been here before
Why are we always stuck and running from the bullets?
The bullets

Poderia ser meio precipitado de minha parte pensar desse jeito, mas enquanto eu ouvia aquelas palavras ecoando dos lábios dela eu só conseguia desejar ouvir a voz dela me embalando todos os dias. Eu poderia dormir e acordar daquele jeito sempre e estaria completo.
Completo.
Era essa a palavra.
Era essa a definição de como eu me sentia desde que ouvi a primeira nota ecoar naquele timbre tão único.
Mordi o canto da minha boca, notando que ela estava tão lindamente imersa, como se estivesse em um mundo particular, transcendendo outra vez.
.
Quem diria?

Just stop your crying
It’s a sign of the times
We gotta get away from here
We gotta get away from here
Just stop your crying
It will be alright
They told me that the end is near
We gotta get away from here

Antes que eu pudesse ter controle de mim mesmo, meus lábios se abriam e entoavam a canção junto com ela.
Seus olhos se abriram e então se fixaram aos meus, seus lábios se abriram em um sorriso genuíno e ela continuou cantando com toda aquela mesma emoção, exceto que agora eu sentia que me contagiava.
Sabe aquela vontade que eu comentei que sentia de chorar quando um artista conseguia tocar minha alma com sua voz? Eu ainda sentia, só que dessa vez ela era exprimida nas notas que ecoavam de minha boca.
Não tinha um dom maravilhoso para o canto, mas de uma forma impressionante a minha voz se combinou com a de .

Just stop your crying
Have the time of your life
Breaking through the atmosphere
And things are pretty good from here
Remember everything will be alright
We can meet again somewhere
Somewhere far away from here

Eu definitivamente queria ir com ela para algum lugar longe de todas aquelas preocupações com banda e a minha vida de famoso. Um lugar onde eu pudesse apenas sentar com ela ao meu lado, tocando o violão com o dourado enquanto nossas vozes ecoavam em sintonia perfeita.
Mas nenhum de nós podia, estávamos presos em nossas próprias realidades.
Era loucura que eu me sentisse daquele jeito em apenas seis dias, mas quem consegue entender realmente como as emoções humanas funcionam?
Não conhecia realmente, era verdade. E ela também não sabia nem meu nome verdadeiro, mas nós havíamos compartilhado mais coisas do que eu jamais imaginaria compartilhar com uma estranha durante aquele tempo que passei com ela.
Não podia negar o que estava perfeitamente claro, nunca fui o tipo de pessoa que se recusa a enxergar as coisas.
Eu, , o cara que era fechado pra tudo desde que havia perdido minha mãe por culpa de um motorista bêbado, não estava apenas encantado por .
Estava apaixonado por ela.
E a julgar pela forma como os olhos dela brilhavam em minha direção eu diria que pelo menos uma parte do que eu estava sentindo por ela era recíproco.

Stop your crying baby
It’s a sign of the times
We gotta get away
We got to get away
We got to, we got to run

Nossas vozes foram morrendo, a melodia foi acabando e nossos olhares ainda estavam conectados.
Meu sorriso puxou o dela e eu poderia simplesmente aproveitar aquele momento e tocar os lábios dela com os meus como de repente eu me peguei desejando ardentemente, mas não fiz isso.
Não fiz porque não poderíamos prometer nada um ao outro e talvez fosse melhor que tudo ficasse como estava, como meros passeios feitos por dois estranhos que se conheceram no metrô.
Minha vida era complicada demais, agitada demais para que eu fosse egoísta a ponto de querer arrastá-la para ela.
Talvez eu devesse ao menos contar a ela quem eu realmente era, ela merecia saber a verdade.
- Eu sabia que era você - escutei as palavras dela, despertando de meus pensamentos, mas não acreditando no que tinha ouvido.
- Como é? - perguntei, confuso com a expressão travessa que moldava suas feições. Eu deveria parecer um tremendo pateta naquele momento.
- Eu sabia que era você, - ela frisou o meu sobrenome e de repente eu me sentia desmoronar. Não de uma forma ruim, mas de surpresa.
Eu tentando imaginar como contar a verdade a ela e ela sabia desde o início.
- Você sabia? - balbuciei, imerso em confusão. - Como você soube? - indaguei logo depois, ouvindo uma risadinha esperta ecoar dos lábios dela.
- Eu sou fã da sua banda, você realmente esperava que não reconhecesse sua voz ou o jeito que você toca violão? - soltou, com a voz ainda risonha, o que me arrancou um sorriso abobado.
- Sempre achei que era um péssimo ator. Mas talvez você seja realmente fã da Stormtroppers pra ter sacado - eu disse, completamente embasbacado ainda com aquela situação.
- Você disse que queria me conhecer, não disse, ? Vou te contar a minha história - ela umedeceu os lábios e ajeitou sua postura, colocando uma mecha de seus cabelos atrás da orelha antes de voltar a falar. - Eu não sei de onde sou, também não sei se nasci aqui em New York mesmo ou se fui trazida para cá. Aqueles que me deram a vida me jogaram no orfanato da Sra. Bourbon e eu passei a minha infância e adolescência vendo crianças serem adotadas e ganharem uma família. Na única vez em que tive a esperança de poder chamar duas pessoas de pai e mãe eu fui tratada como bicho e voltei para o orfanato.
Ela fez uma pausa em sua fala e meus olhos estavam arregalados em sua direção, sua história me tocando de um jeito que me deixou de certa forma constrangido e com uma vontade enorme de abraçá-la para fazer toda a dor que ela sentia ir embora.
- Quando eu completei vinte e um anos, poderia continuar por lá e ajudar todas aquelas crianças a não sofrerem como eu sofri, mas com toda a dor que eu sentia, eu consegui me permitir sonhar. Começou com uma música tocada na rádio e que me deixou com vontade de ouvir repetidamente. Eu consegui arrumar um cd e quando dei por mim sabia todas as músicas de trás pra frente e quando eu sentia aquela dorzinha chata que me fazia sufocar eu apenas ligava meu rádio e ficava imersa no meu mundo paralelo. Então eu encontrei um violão velho no sótão do orfanato e me propus a aprender a tocar sozinha mesmo porque um dia eu queria ser que nem você, . Eu queria que todo mundo enlouquecesse quando eu fizesse um solo de guitarra. Eu queria fãs enlouquecidos gritando quando ouvissem a minha voz, do mesmo jeito que vejo quando o John entra no palco. Você me ajudou a passar pelos momentos mais difíceis da minha vida e eu decidi que eu ia vender minha arte no metrô de New York até o dia em que pudesse pagar pra ir a um concerto de vocês, onde eu poderia agradecer por tudo o que vocês fizeram por mim sem ao menos se darem conta disso. Queria agradecer por terem me feito ser quem eu sou.
E por longos segundos eu me peguei paralisado, olhando para ela sem acreditar que havia sido capaz de tanto na vida de uma pessoa.
Talvez eu tivesse uma noção básica do quanto um ídolo fazia a diferença na vida de um fã, mas não daquele jeito. Não com aquela intensidade.
Os olhos de estavam marejados e uma lágrima solitária escorregou pela bochecha dela, mas eu percebi que não era de tristeza, ela estava feliz por poder dizer tudo aquilo pra mim.
E eu nunca achei uma cena tão bela quanto aquela.
O sol já tinha praticamente ido embora, mas eu não liguei muito para a paisagem ao nosso redor.
Deixei o violão de lado e me aproximei dela, tocando sua bochecha com uma de minhas mãos e secando suas lágrimas.
- Obrigada, . Por ter mudado a minha vida - ela soltou, me encarando tão intensamente que eu não resisti.
Levei minha outra mão até sua cintura e a puxei para mais perto de mim, então meus lábios por fim entraram em contato com os seus.
O simples toque fez meu corpo estremecer, mas não era o bastante, porque de repente eu me sentia faminto.
Minha língua adentrou a boca dela, procurando pelo contato da sua e hesitou por um ou dois segundos antes de retribuir, enlaçando meu pescoço com suas mãos e pressionando seu corpo contra o meu.
Era como se eu tivesse esperado a minha vida inteira pelo gosto do beijo dela. Como se eu estivesse em completa abstinência porque nossas almas já eram conectadas em vidas passadas.
Quanto mais eu sentia as carícias dela, mais eu queria sentir, mais dela eu queria provar.
Um suspiro satisfeito ecoou de meus lábios e eu abri um sorriso triunfante entre o beijo, vendo ela sorrir lindamente para mim de volta antes de voltar a beijá-la, esquecendo completamente de tudo ao meu redor.
Então de repente as estrelas haviam tomado seu lugar no céu e ainda estávamos lá, viciados na paixão que emanava de nossos corpos.
Nos beijamos tanto que eu me sentia quase dormente e sabia que ela se sentia da mesma forma, mas não ligava pra isso, eu estava feliz, genuinamente feliz.
- Vem com a gente, - em outro impulso, as palavras haviam ecoado de meus lábios. Dei um selinho carinhoso nela, mas então notei seus olhos arregalados em confusão na minha direção.
- O que disse? - ouvi ela questionar, em tom de surpresa.
- Disse pra você vir com a gente. Eu não quero dizer adeus pra você amanhã. Quero você comigo aonde eu for. - meus olhos brilhavam em sua direção e pela primeira vez eu a vi perder a fala. - Por favor - eu ainda insisti, vendo ela balançar a cabeça de um jeito adorável para recobrar a habilidade de se comunicar.
- Eu... Você ficou maluco, ? - questionou, ouvindo uma risada rouca ecoar de meus lábios como primeira reação.
- Talvez eu tenha ficado maluco, mas eu nunca me senti desse jeito antes. Acho que estou apaixonado por você - soltei, com toda a sinceridade do meu coração.
- Como pode estar apaixonado por alguém que você mal conhece? - indagou, com uma sobrancelha arqueada, mas pelo brilho nos seus olhos eu sabia que ela estava contendo suas verdadeiras reações.
- Sinceramente? Eu não acreditava que isso fosse possível, mas é como eu me sinto e não estou disposto a abrir mão de você com facilidade - então ela sorria, soltando uma risada gostosa em seguida que acabou me contagiando.
- Não acredito que vou topar uma loucura dessas, mas eu aceito. Eu vou com você, . E você quer outra confissão? Você sempre foi o meu favorito e sempre fui apaixonada por você. - então lá estávamos nós com nossas bocas envolvidas em um beijo intenso e agora repleto de significados.
- Só não conta pros caras esse lance de eu ser o favorito, eles vão ficar morrendo de ciúmes - comento, entre o beijo, arrancando mais uma risada dela até que a senti paralisar, me olhando de uma forma adoravelmente radiante. - O que foi? - perguntei, meio confuso e risonho.
- Eu não acredito que vou conhecer a Stormtroopers.

* * *

Oito meses depois

Quando meus pés tocaram o solo do aeroporto eu deveria me sentir feliz por mais uma turnê finalizada. Longas férias me esperavam e dali a alguns meses começariam os preparativos para um novo álbum.
A Stormtroopers fazia mais sucesso do que nunca.
Eu estava até um pouco feliz, mas não estava completo.
A culpa sempre seria minha por isso.
Eu havia sido covarde e não a impedi de ir para longe de mim. Não tive coragem de pará-la quando ela tirou todas as suas coisas daquele quarto de hotel e partiu, levando com ela muito mais do que seu violão azul com o dourado.
Ela levou tudo o que sua presença na minha vida havia trazido.
Me sentia vazio, agia mecanicamente, mas disfarçava tudo com um belo sorriso como sempre fui capaz de fazer.
Desde o começo eu sabia como as coisas terminariam e ainda assim eu insisti naquele amor impossível.
Eu mesmo havia trazido aquilo para nossas vidas, eu merecia tudo o que estava passando, mas ela não, ela merecia ser a mulher mais feliz do mundo, merecia sair daquelas ruas e ser reconhecida por todo aquele talento.
Soltei um suspiro quando ouvi o toque de um teclado e fiz uma careta triste quando notei um rapaz tocando um cover de Let Her Go do Passenger. A ironia não poderia ser maior.
Meu peito se apertou de forma dolorosa e enquanto eu estava ali parado, absorvendo aquela melodia que era entoada, as lembranças me atingiram como a neve descontrolada em uma avalanche.
Tudo o que nós tínhamos vivido, todos os lugares por onde havíamos passado e todas aquelas promessas de eternidade que havíamos feito um ao outro.
Por que eu tinha jogado tudo aquilo fora? Por que havia deixado as obrigações da minha carreira tirarem o motivo que eu tinha pra sorrir todos os dias?!
A verdade era que, tarde demais, eu havia percebido que jamais conseguiria ser o sem outra vez.
Deixei uma doação ao rapaz que cantava e caminhei apressado para dentro do aeroporto outra vez.

* * *

After all these wasted nights*
I can’t pretend that I’m doing fine
I’ve played it back a thousand times
But now I see it and I realize

A voz conhecida ecoou nos meus ouvidos e eu me senti como se a ouvisse pela primeira vez.
A sensação de encantamento estava de volta, mas com ela também veio toda a carga emocional que eu sentia vindo daquelas palavras.
Então eu também me senti sufocar.

That the damage is done and it’s obvious
We can’t never go back to the way it was
We’re drifting apart and it’s killing us
It’s killing us

Minhas mãos começaram a tremer e eu olhei em volta, procurando por ela feito um louco, mas ficando cego de nervosismo e não conseguindo encontrá-la em lugar nenhum.
Tateei o bolso da minha calça e puxei a carteira dali, buscando outra nota de cem dólares como se o tempo não tivesse passado, como se todo o estrago não tivesse sido feito.
Eu precisava daquilo, precisava voltar a vê-la pelo menos uma vez, precisava colocar um ponto em tudo aquilo.

Farewell
Didn’t mean to let you
Let you down, mess it up
We both knew we couldn’t last forever
It’s coming down, I’ve had enough
I guess we crumbled under all the pressure
Did my best for what it’s worth
And I gave you all this heart can give so
Farewell
Didn’t mean to let you down

Eu sentia como se ela cantasse cada uma daquelas palavras pra mim, como se esperasse que eu estivesse ali para ouvi-las e o jeito que sua voz foi estremecendo refletia que tanto quanto eu ela não queria tudo aquilo.
- - minha voz ecoou num sussurro, ficando desesperada em encontrá-la de uma vez, mas parecia que a multidão aumentava dentro daquela estação de metrô.
Então pela segunda vez na vida eu não apreciei os sons dos trilhos sendo arranhados pelo veículo de metal.
Quando consegui ouvir a voz dela de novo, eu saí correndo e estaquei, sentindo o ar faltar dos meus pulmões quando eu a avistei do mesmo jeito que a primeira vez em que a vi.
Sentada na almofada colorida, envolvendo o violão nas mãos e cantando de olhos fechados.
Só que ela não transcendia, parecia tão apagada quanto toda a minha sensação de estar completo.
As bochechas dela estavam brilhantes de lágrimas e eu comecei a caminhar em sua direção, parando diante dela e estendendo a nota de cem dólares na direção da capa do violão.
Como se aquilo fosse algum tipo de comando, abriu seus olhos e a música cessou quando ela parou meu braço, do mesmo jeito que havia feito meses atrás.
Seus olhos encontraram os meus, então seguiram para a nota, se estreitando quando notaram algo escrito em sua superfície.
Ela puxou o dinheiro de minha mão, sem dizer uma palavra sequer e lendo a frase que eu havia escrito minutos antes.
me olhou de volta, com seus olhos voltando a se encherem de lágrimas e ela soltou uma risada nervosa, me encarando com toda a saudade que eu também sentia por ela, levantou do chão e enlaçou seus braços ao redor do meu pescoço, literalmente se jogando.
Eu sentia uma falta tão absurda dela que gemi e comecei a rir logo depois.
- Meu amor. - soltei, num alívio emocionado.
- Você é maluco, . Completamente pirado - ela disse, se afastando apenas o bastante para me encarar.
- Pensei que já soubesse disso, - briquei, sorrindo maravilhado para ela. - Vai me deixar mesmo esperando tanto por uma resposta?
- Quem mandou me deixar esse tempo todo achando que nos perdemos um do outro?! - ela fez um bico triste.
- Responde, vai - insisti, sentindo que meus olhos brilhavam pra ela.
- Eu preciso mesmo? Porque você já deveria saber que a resposta é sim. E como prova disso vou aceitar os cem dólares - piscou na minha direção, me fazendo apertá-la forte contra meus braços e depois beijá-la tão intensamente que o mundo poderia explodir ao nosso redor.

“Eu fui um idiota, mas, por favor, casa comigo?”

A ideia havia vindo ali mesmo, no lugar onde eu havia lhe conhecido e talvez não fosse apenas coincidência. Era um sinal de algum lugar e eu não perderia aquela chance, não perderia aquela garota nunca mais.
- Eu amo você, - encarei seus belos olhos e lhe sorri radiante mais uma vez.
- E eu amo você, .


¹Scars to your beautiful - Alessia Cara.
²From Eden - Hozier.
³Sign of the Times - Harry Styles.
*Farewell - Simple Plan.





FIM



Nota da autora: Oi, gente! Olha só eu aqui escrevendo fic de romance. Quem diria, não? 2017 é o ano kkk.
Eu gostaria de dizer que escrever essa história foi um desafio porque essa música é a minha favorita de todos os tempos e Simple Plan é a banda da minha vida já faz uns 14 anos.
O resultado não poderia me deixar menos satisfeita porque eu fiquei apaixonadíssima por esse casal e por essa história, então espero que vocês também tenham gostado!
Obrigada a quem leu e aqui embaixo deixo meus contatos pra quem se interessar em ler mais do que escrevo.






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Nota da beta: Que amor!! Tem fanfic mais cara de fanfic que essa? Hahaha Adorei, to apaixonada nesse casal, minha meta da vida é isso aí. Nem to acreditando que Ste escreveu essa fic, achei que o romance era pegadinha e o metrô ia passar por cima dos dois hahaha Meus parabéns, Ste, arrasou. Apoio mais fics como essa no meu email, com certeza todo mundo amou essa e quer mais.
Ah e quero ver muitos comentários aqui embaixo e que todo mundo leia as outras fics desse ficstape que estão maravilhosas também. Xx-A

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