Finalizada Em: 31/05/2018

Capítulo Único

난 서있네
I’m standing here
네가 있을 것 만 같아서
Cuz it feels like you’ll be here too
난 서있네
I’m standing here
네가 없을걸 알면서도
Though I know you’re not here
난 서있네
I’m standing here
네가 너무 보고 싶어서
Cuz I miss you so much
이젠 아무것도 없는 텅 빈도로
Now I’m just on an empty road


Dezembro - 2018

— Há coisas na vida que são preciosas por não durarem.
expeliu um riso ácido e incrédulo após ouvir a voz do ator transcorrer pelo ambiente onde estava, não gastando um segundo de seu tempo para cogitar a ideia de ter soado desnecessário aos ouvidos de quem dividia o mesmo espaço que ele. A cafeteria estava vazia, mas ainda com certo fluxo de pessoas, cada qual passando tão rápido pelo recinto que ele não tinha tempo de assimilar suas feições ou ao menos se importar em memorizá-las.
Era mais uma madrugada de quinta-feira e o tic-tac batia próximo do horário da troca de turnos, algo em torno de 4:58 da manhã. Ele pousou os olhos nos ponteiros do seu relógio de pulso e suspirou fundo quando o minuto final tornou-se uma nova hora cheia. Mais sessenta novos minutos para ele fortalecer o seu psicológico e não fraquejar — ainda mais.
O filme “O retrato de Dorian Gray” era uma das coisas que não faziam sentido naquele hospital, tanto que tentava descobrir quem raios teve a ideia de passar um filme deprimente e desmotivador como aquele num ambiente que deveria ser tudo menos deprimente e desmotivador. Ponderou por tanto tempo que os segundos viraram minutos e os seus olhos se embaçaram na imagem do ator cravando as mãos no autorretrato e penando sobre sua existência. Naquele momento, não se via nada diferente daquele personagem — ambos enfrentavam a angustiante sensação de não reconhecerem mais quem haviam se tornado. Dorian Gray, vítima de sua própria ganância, estava experimentando a consequência de seus atos.
, vítima de seu próprio destino, estava experimentando a consequência dos infortúnios maldosos e cruéis da vida.
Seus pés se remexiam num agito típico, mas desabitual por causa do motivo. As mãos, agora trêmulas e suadas, percorriam pelos mais inusitados caminhos em torno de seus fios de cabelo e o gosto amargo do café forte que tomou há alguns minutos ainda trilhava um caminho desprazeroso em seu paladar — A única coisa que queria fazer naquele instante era tomar uma dose de cafeína que fosse capaz de despertar os seus sentidos e deixá-lo um pouco mais bem preparado para as longas horas seguintes do seu dia.
Quando estava prestes a encostar os seus lábios novamente na borda da xícara, o topete milimetricamente ajeitado do médico que estava no plantão daquela noite adentrou, eufórico como nunca vira, vasculhando pelo lugar alguém que visava encontrar. Seu coração encheu de um sentimento peculiar, algo que ele não tinha testemunhado até aquela circunstância. Embora estivesse lutando contra o seu subconsciente e tentando acalmar os seus ânimos, , de alguma forma, já soube o que aquilo significava.
endireitou as costas no estofado da poltrona e pousou a xícara de café na mesa. Suas mãos foram de encontro às beiras da bancada como se até elas soubessem que ele precisaria de apoio e seus olhos tremeram num sincronismo certamente descompensado. O seu universo parecia estar deixando de existir juntamente com as suas forças nas pernas. estava tentando entender por que diabos seu corpo estava reagindo daquela maneira, tão desproporcional e incabível para apenas uma miragem comum.
O olhar do Dr. Lee Chang encontrando o seu, finalmente, foi o suficiente para que ele compreendesse como que o universo parecia sempre antecedê-lo do que estava por vir.
sabia o que aquilo significava.
E a pior lhe atingiu realçando que, mesmo assim, ele não estava preparado.
Talvez nunca estaria.
Não porque ele era quem vivia sob a própria pele e quem deveria estar preparado para suportar aquilo, mas porque há coisas na vida que são preciosas por não durarem e estava se deparando com uma daquelas coisas.



Janeiro - 2019

Do lado de dentro das cortinas tudo estava escuro. Do lado de fora um mínimo vislumbre de luz solar provinha pelas frestas da janela, sorrateiro e brilhoso da forma que antigamente gostava de contemplar. O calor que emanava dos raios solares aqueceu o lado vazio da cama, onde ele costumava dormir. A marca de seu corpo ainda estava desenhada no estofado do colchão e as molas pareciam ter sido recém-testadas, mas não se lembrava da última vez que se repousou naquele extremo da cama.
O cheiro dela era a lembrança que não conseguia simplesmente desapegar de seu olfato. Onde quer que fosse, naquela casa, sentiria o doce aroma de vagar por entre as paredes, os móveis e as roupas. Cada minúsculo espaço físico daquele emaranhado de tijolos o remetia de volta ao cheiro da mulher que significou todo o infinito que ele teve.
A fronha do travesseiro de ainda cheirava a lavanda, sabão em pó e o vestígio de seu shampoo. O aroma era fraco e ao mesmo tempo forte, oscilando uma espécie de emoção que lutou para não se transformar em lágrimas. Os seus olhos encheram de ardência e ele grunhiu quase berrando em desaprovação pela reação automática que o seu corpo vinha tendo.
sentiu medo em tocar o travesseiro. Sentiu tanto medo que suas mãos mal conseguiram alcançar o objeto, posto ao lado de si, pronto para ser apalpado. Seus olhos latejaram e ele se pegou conformado pela sensação estar lhe consumindo e ele não esboçar nenhum pingo de preocupação. ajeitou-se no colchão e os seus ossos estralaram audíveis demais, praticamente um despertar sonoro que viria a ser assustador se ele ao menos estivesse em sã consciência.
O peso de seu corpo estava reduzido à densidade de uma pena, tão murcho e mole que se uma breve brisa passasse por si seria facilmente vista como um furacão e poderia lhe desmontar sem dó. sentia um incômodo pela região de seu apêndice, só que aquilo foi mais uma das coisas que ele preferiu encarar como insignificante desde que o seu mundo tornou-se este inferno preto e branco, esta realidade corrosiva e este universo podre, beirando ao castigo divino, como ele passou a aceitar.
Seu corpo foi conduzido por certa razão até o banheiro da suíte e quis de alguma forma arrancar seus olhos para fora das órbitas.
A quantidade de produtos de higiene e beleza espalhados pela pia do banheiro transformaram o estômago de em uma catapulta e tudo que restara dentro de si — um aglomerado relativo ao álcool e uma fatia de pão velho — foi arremessado para fora em direção ao o que deveria ser o centro do vaso sanitário, mas dominou todo o espaço físico do recinto e ele proferiu uma maldição mal elaborada. No fim desabou sob os próprios ossos e o impacto concluiu o seu trajeto.
As mãos voltaram a orquestrar um redemoinho em seus cabelos e ele fechou os olhos para fugir das lembranças, embora estas tenham invadido o seu subconsciente e incendiado as suas paredes. tentou inalar algum ar fresco, mas era difícil fazer isso quando todo o seu pulmão estava dominado pela sensação cruel de podridão. não era mais , então deveria aprender a sobreviver pelo tempo que perduraria sendo apenas a quantidade nojenta de moléculas que ainda habitava aquele planeta.
Como se ele estivesse delirando, ou só sonhando, o contato macio de uma mão tocou os seus ombros, firmando um empenho em levantá-lo. recusou-se a abrir os olhos, mas ao passo que ele mergulhava seu rosto em lágrimas, o aperto dos dedos contra a sua pele se intensificou e ele cedeu ao o que pareceu ser um estímulo para sair dali.
Ele abriu os olhos e encontrou o grande nada. As paredes continuavam iguais, o banheiro continuava sujo de vômito, os perfumes e itens de maquiagem continuam pela metade e, , continuava chorando.
O homem encolheu-se dentro dos próprios braços e chorou pelo o que duraria uma eternidade, só querendo que a dor terminasse e tudo que a sua vida significou até um mês atrás fosse transformado em uma memória. não queria que os últimos trinta dias de sua vida fossem postos em questão, queria deletá-los e, se possível, nunca mais passar por aquilo. Ele queria voltar no tempo, oh, Deus, como queria!
A verdade é que ele queria muitas coisas. Infinitos fins alternativos e impossíveis, infinitos meios e resultados que não eram mais cabíveis para serem transformados em realidade. queria apenas voltar e viver só mais um dia de sua vida sob a sensação que antigamente lhe habitava.
Ele se apoiou no batente da porta e esfregou a manga da camisa pelos lábios, limpando os vestígios de bile e marchando em direção ao corredor da casa. A última porta do ambiente estraçalhou o coração do homem e lhe machucou a cada segundo que ele gastava para se aproximar do cômodo.
Sua mão caiu na maçaneta e o contato gélido foi como um choque elétrico para ativar alguma válvula de seu coração. Lentamente empregava força para abrir a porta, fungando com fervor todas aquelas lágrimas que rolavam impiedosamente pelo seu rosto.
Quando as paredes impregnaram a sua visão, começou a perder a consciência. A cortina branca abriu-se ao passo que o vento adentrava no ambiente e ele quis poder fechá-la. tentou chegar até lá, mas a sensação de atravessar aquele cubículo era torturante. Ele não conseguiu desprender os pés do chão, era como se estivessem grudados por cimento, e seu corpo foi perdendo a vontade de permanecer em pé.
Ele amoleceu e, até o seu rosto encontrar novamente o chão, suplicou pela morte.
Deveria ser fácil e prático assim, não é?
Era injusto. Era injusto ser ele quem continuava respirando quando a única coisa que mais desejava em sua existência era mantê-la respirando por conta própria.
Era injusto não ter sido ele.
se apertou por dentro dos braços, fungando cada partícula de ar que o rondava, e sentiu o seu coração, mais uma vez, implorar por um fim.
Ele só queria acordar daquele pesadelo. Ele só queria voltar à estaca zero.
Seus olhos vagarosamente se fecharam no escuro e, apegando-se ao silêncio mórbido, implorou para encontrá-la só por mais um momento.
Apenas um.

Fevereiro - 2018

estava sentada, por cima dos pés, encolhida em um aglomerado de almofadas e cobertores, segurando seu pote de porcelana recheado de sorvetes de avelã e ostentando uma expressão emburrada.
, esparramado no lado extremo do sofá, se distraía e brincava com um sorriso bobalhão nos traços de seu rosto, empurrando devagarzinho as cobertas para longe de , expondo as meias coloridas da esposa e fazendo com que a mulher olhasse estupefata para ele quando tentara arrancar a meia do seu pé direito.
— Mais um movimento e eu farei um estrago em você, ! — vociferou no pé do sofá, esticando a colher em direção ao rosto do homem e propiciando a ele uma experiência de que ele não se empenharia em viver se estivesse menos ridicularizado após ter perdido a partida de videogame para e recebido um tremendo soco no braço quando provocou a esposa, dizendo que ela havia trapaceado. — Você não tem medo de morrer, não é mesmo?
— Por que eu teria? — se aproximou mais um pouco, arqueando a sobrancelha e mordiscando os lábios, vendo girar os olhos nas órbitas e enfiar uma generosa e farta colher de sorvete na boca. — Por que você está me ameaçando com uma colher?
— Você parece bem seguro de si para um cara que não sabe nem usar os botões de um controle. — Ela rosnou. — Patética, , sua acusação foi patética!
alargou o sorriso, divertindo-se como uma criança em dia de excursão escolar. estava uma montanha-russa de emoções naquela semana em particular e ele era acostumado com os nuances que compunham o humor da esposa, mas ficou um pouco intrigado por ela ainda não ter desabafado o motivo.
— Você fica linda quando está irritada. — murmurou no ouvido de , roçando os lábios pela extensão da orelha da esposa e a observando estremecer sob a própria pele. Ele sorriu mais determinado a provocá-la até que a mulher resolvesse desabar as barreiras que nunca duraram muito tempo para serem destruídas e soltou um suspiro baixinho, resmungando algo sobre como conseguia ser irritante. — Vamos lá, meu amor, só um sorrisinho para o seu dengo?
Os lábios de incharam em um bico bufado, enchendo as suas bochechas até que não conseguisse conter a tentação de morder o rosto da esposa e distribuir vários beijos pelos contornos das suas maçãs. tentou afastá-lo, enquanto continha o riso manhoso e cedia de vez no momento em que os lábios quentes de chegaram de encontro aos seus, gelados pelas colheradas de sorvete.
— Oh, avelã, o meu preferido! — afastou minimamente as aberturas dos lábios dos dois para sussurrar a frase. sorriu amolecida, deslizando para baixo do sofá e abrindo espaço para deitar sob ela.
— Você quer, meu amor? — olhou para os glóbulos bem acesos e abertos do marido esperando que ele voltasse a encará-la. Os olhos do homem subiram dos lábios dela até os olhos cerrados e dóceis, sentindo todo o seu peito repercutir uma declaração apaixonada ao passo que reconhecera não ter palavras para definir a imensidão do amor que sentia por ela. — Você quer um pouco mais?
— De você? — selou os lábios de ambos por um momento. — Eu quero um pouco mais de você a todo segundo da minha vida.
fechou os olhos e deixou que a envolvesse em seus braços, acalorando o contato físico que era tão deles, íntimo e sublime, particular e reservado, o único casulo que poderia se prender e viver reclusa para todo o sempre que teriam. Era ali que ela queria ficar até que os sorrisos de se tornassem as suas últimas memórias e seus braços a sua última abrigada. Durante o bem e o mal, só queria ser dele.
— Isso é muito tempo. — Ela brincou acariciando os fios de cabelo de .
Ele gargalhou e o som foi como viajar pelas dimensões, encontrar o mundo das fadas, voltar para o solo e ainda assim se sentir em um conto. sorriu contra os lábios famintos de e ele abraçou a cintura da mulher.
— Uma vida inteira ao seu lado é um período pouquíssimo satisfatório em comparação ao tempo que eu precisaria ter para amá-la com todo o meu coração. — Ele olhou no fundo dos olhos da esposa. — O que só pode significar que nós seremos um do outro eternamente. — beijou o topo da cabeça de . — Além das leis da vida, eu irei te amar por quantas vidas eu viver. — Ele enxugou a lágrima solitária que descia pelas bochechas dela. — E por quantas eu precisar vagar para te encontrar.




despertara tão rápido quanto adormeceu. A primeira visão que contemplou foi das janelas fechadas, as cortinas tampando a entrada de claridade e o seu corpo integralmente coberto por lençóis que ele não via há séculos. Ele remexeu a cintura até que o corpo começasse a se acostumar com a falta de dormência e suspirou fundo uma vez, repetindo o mesmo ato por incontáveis segundos, começando a achar que voltaria a cair no sono. Sua têmpora estava pesada e ele sabia que precisava de uma aspirina, não porque ele queria enfrentar aquele dia com a consciência sã, mas porque dormir se tornava uma dificuldade dificílima quando o seu cérebro não contribuía para a missão.
Ao chegar à cozinha, ele não deixou de notar que as pilhas de louças sujas estavam perfeitamente lavadas e secas, apoiadas no canto extremo da pia. Ele franziu as suas ruguinhas de expressão e no exato momento em que se questionou de como aquilo aconteceu, a figura pequena e estreita de uma mulher à beira dos sessenta anos surgiu no campo de visão do rapaz, sorrindo sem mostrar os dentes ou simplesmente sem esboçar um humor verdadeiro.
— Você acordou. — Ela disse pousando a mão no ombro de e segurando as lágrimas que cutucavam as suas córneas. Ela fungou sorrateiramente, a ponto de quase sufocar o respiro nas narinas com o intuito de não chamar a atenção do homem.
Mas é claro que ele a conhecia bem. Teria como não quando a mulher diante dos seus olhos é exatamente a cópia da mulher de sua vida?
A mãe de alisou os ombros de , amolecendo um sorriso, agora um pouco mais recheado de graça e deslizando as palmas das mãos pelo rosto do jovem, retratando em sua mente a bela imagem daquele rapaz antes da desgraça ter assombrado sua vida.
— Sabe, , você anda precisando de um banho. — A mulher escapuliu o comentário ao ter ralado os dedos pelos cabelos do rapaz. Lembrara-se bem de como os fios do genro eram macios e sedosos, tanto que esse era uma das características que ela mais entendia impecavelmente; sua filha era mestra em enaltecê-lo em cada mínimo detalhe, fazendo com que todos conhecessem bem o porquê considerava o homem mais lindo de toda a humanidade.
A mulher engoliu em seco o choro preso em sua garganta no momento em que assimilou estar começando a pensar na imagem da filha no pretérito imperfeito. Se ela não estivesse prestando atenção nos olhos de , caídos e sustentados de uma dor mortal, ela poderia facilmente se iludir com a ideia de ver adentrar pela cozinha com uma expressão sonolenta, coçando os olhos e murmurando um “bom dia” baixo e um pouco mal humorado.
Os olhos de faziam a mulher se manter firme na realidade.
não havia voltado.
A mulher não se recordara de quantos qualificativos tinha ouvido no decorrer dos dias perante o quadro médico da filha. As expressões variavam desde “grave”, “complicado”, “desesperançoso” até “irreversível”. Todos os médicos que fizeram visitas no hospital para avaliar a situação de disseram a mesma coisa: poderiam remediar por quanto o corpo de indicasse que suportaria, mas eventualmente haveria um resultado que “lamentavelmente” — nas palavras deles — poderia ser inadiável.
não acreditou em nenhuma falácia que ouviu e talvez fosse por isso que ele ainda não aceitou o seu cérebro processar a maneira que a mãe de parecia ter se convencido, mas ainda é humano e sente a pancada que a forma passada da palavra podia estraçalhar o seu coração.
A sogra, em consequência do turbilhão de consternações em sua mente, se viu chorando. Só sentiu as lágrimas rolarem pelos seus olhos quando os dedos do genro limparam a quantidade exorbitante de líquido, fazendo-a voltar aos sentidos e tentar se recompor. Eles só se encaravam por um infinito angustiante de segundos e ela não se preocupou em fingir que estava só passando por aqueles minutos momentâneos que a avassalam com mais intensidade. entendia a sua dor. permitia que ela sentisse a sua dor desmesuradamente.
— Sabe, ela diria a mesma coisa se me visse nesse estado. — respondeu à sogra vendo um sorriso bobo surgir nos lábios da mulher após as lágrimas inundarem os seus glóbulos oculares a ponto de fazê-la perder o foco.
Oh, a mulher sentiu a fisgada atingir em cheio o seu coração. Ela quase chegou a rir pela menção da mania encabulada da filha em mandar o marido tomar um banho toda vez que via voltando de algum treino, ou de uma simples caminhada no parque porque achava que ele precisava se livrar da “sujeira do mundo exterior” e ficar cheirando a “pele de neném”. se divertia com as peripécias da esposa, achando até um tanto cômico como ela acreditava que as energias alheias poderiam impregnar em nossas peles e nos atrapalhar a desligar o mundo de fora de dentro de nossa casa. Na concepção da esposa, a família e o lar eram as coisas mais sagradas que um ser humano poderia ter. Tendo sua família segura e feliz, o seu lar precisava estar tão bem mantido quanto o vínculo entre eles.
suspirou com dificuldade, sua traqueia estava prestes a expelir um choro dolorido e a mãe de encontrou os ombros do genro, acariciando-o até que ele conseguisse voltar a respirar. Ele apoiou as mãos nos dois joelhos e afundou a cabeça entre os braços, querendo ao máximo manter sua sanidade nos trilhos, mas seu mundo não fazia mais sentido algum — ele precisava resistir, por céus, ele precisava sobreviver.
— Estão te esperando, . — A mulher trouxe a notícia com cuidado, gentileza e amor, vendo a mudança de contraste no rosto do genro. Ele mordiscou as pontas dos lábios e acenou em consentimento com a cabeça, tombando a mesma para o sentido contrário e firmando a palma da mão contra os lábios, suprindo toda angústia que teimava em se libertar mundo afora. — Posso te deixar sozinho por enquanto e depois nós nos encontramos. Não precisa ter pressa, só… Tente estar lá, tudo bem? — A mulher beliscou a mão de . — Você acha que consegue?
murchou um sorriso sem vida e despertou — um pouco mais — os tremores internos na sogra. Ela queria tanto vê-lo sorrindo cheio de benesse como antigamente, dominado pela euforia da juventude e da paixão alastrando o seu coração de ouro. Ela queria que pudesse se sentir vivo, da mesma forma que antes, para continuar em frente. Era isso que lhes restavam, era isso que precisavam.
— Eu preciso conseguir.



O som familiar que costumava ouvir com soou através dos alto-falantes do táxi no momento que ele adentrou no automóvel. O motorista de repente começou a falar com ele, mas não estava realmente interessado em respondê-lo.
E, pensou, lá estava ele realmente fazendo aquilo. Ele se ajeitou no banco apenas para tapar a visão parcial que o motorista parecia ter de seu miserável rosto, inspirou fundo toda a quantidade passível de adentrar em seus pulmões e lhe dar um pouco de estrutura para seguir em frente naquele dia. O clima estava absorto de nuvens sobrecarregadas e o céu começava a se fechar, numa coloração acinzentada, indicando que uma tempestade brava viria a ranger nas próximas horas. abaixou mais um pouco os óculos de sol que ironicamente não combinavam em nada com a ocasião e apoiou a cabeça na estrutura de metal que servia de apoio às mãos da porta. Sua cabeça alcançou a parte gélida e ele iria recuar, mas por um momento encontrou conforto ali — contracenava com o atual estado do seu coração: gelado.
Sem vida.
Ele fungou e inspirou novamente, num ritmo lento, até que a sua mente passasse a odiar a demora para o farol abrir e o motorista prosseguir no caminho. Havia dezenas de carros contornando a saída da cidade, aquela que chamou por tanto tempo de lar e que, hoje, soava desmesuradamente triste vê-lo tendo pavor de voltar para aquele lugar. Cada vez que ele saía de lá, e isso veio a acontecer cerca de incontáveis vezes no último mês, sentia uma espécie de conforto na alma como se ele estivesse se libertando de cordas invisíveis que o mantinham presos no alto depreciamento de sua mente, mas o seu destino final era sempre, também ironicamente, ainda pior.
amava Daejeon, este era o problema. A cidade tinha tudo que ele precisava para tornar a sua vida mais prazerosa, realizada e pacata. A ideia de mudarem para lá deveria ser creditada unicamente à — foi ela quem acordou em um belo dia achando que os dois deveriam sair do “habitat natural” e experimentarem a vivência em uma nova cidade. A distância da cidade até Seul era em torno de noventa quilômetros, nada que deixasse complicado a rotina do casal em emergências rotineiras que aconteciam na capital do país, mas o suficiente para desvinculá-los da correria insana de Seul. Eles chegaram a pensar em Busan e Daegu, pois havia nascido em Daegu e queria experiências novas, enquanto que passou alguns anos estudando em Busan, assim indo contra os planos de “ambientalização única e inovadora” que a esposa arquitetou. Foi num passeio pela capital que eles encontraram um panfleto anunciando a venda de uma residência em Daejeon. Aquela notícia caiu como pena no colo de : ela obrigou a dirigir até a cidade no mesmo dia e, depois disso, se viram assinando um contrato de compra e venda. Foi tudo rápido assim como gostava e eles poderiam ter se arrependido posteriormente, mas pela graça divina, ou pela potente crença que depositou na ideia de estar indo habitar um mundo encantado, tudo aquilo saiu maravilhosamente perfeito para o que eles buscavam.
Daejeon é também uma cidade turística, piorando a situação de , pois em cada ponto que ele passava se recordava das lembranças que criou com no decorrer do tempo em que moravam ali. A sensação era de estar vendo a esposa por cada viela, cada monumento, cada restaurante e cada rua daquele lugar. Os olhos de se bagunçaram com as informações visuais e ele notou que marejaram tão vagarosamente quanto as lembranças, estas tomaram a sua mente. Por um momento ele se deixou levar pela sensação de estar afundando no passado, depravadamente assolado pela controvérsia da vida: o presente era a única ocasião que ele poderia viver.
O homem riu, encabulado, lembrando-se de que passou grande parte de seus dias ansioso para viver o “futuro” com a sua esposa, mas agora, diante de tudo o que havia acontecido em suas vidas, a única coisa que ele queria era voltar para o passado. Se pudesse recapitularia todo o seu percurso como ser humano e estacionaria na data de seu casamento, o dia que é, de longe, o mais feliz da sua vida.
Uma doce memória do dia em questão atingiu em cheio a sua mente e, ao passo que fechava os olhos, sentindo a brisa da janela aberta tocar em seu rosto, ele se recordara do vento sereno daquele dia, o mesmo que o embalou no fim da tarde de primavera.

Julho - 2014

— Foi aqui onde pediram para eu trazer o orçamento gordo do casamento?!
Antes de a voz tomar sua devida forma sorriu largo em resposta, mal tendo paciência para esperar adentrar no quarto. Ele andou passos bem largos em direção ao melhor amigo que estava fora do país por um período de tempo frustrante e precisou se ausentar. A saudade era tamanha que ele não se importou se o amigo iria estranhá-lo agir daquela maneira.
— Seu pirralho, deixe-me dar uma olhada geral em você! — empurrou pelo ombro e lhe contemplou vestido no smoking. O amigo ia negar assim que uma pontada supérflua acionou os seus nervos e quase lhe fez chorar, mas ele já havia lutado contra a emoção desde o início da viagem, quando embarcou no avião, e sabia que seria uma questão de tempo para desabar no choro. — Não consigo acreditar que você vai realmente e finalmente casar! — gargalhou enxugando as lágrimas. — Digo, é claro que eu acredito que você vai casar com a , teria como ser outra pessoa?! — fungou as lágrimas e empurrou o amigo para longe em divertimento, tentando se recompor e não estragar toda a pintura que a sua irmã fez em seu rosto. — Mas, meu Deus, , até ontem éramos dois pirralhos apostando pagar um ramen para quem ganhasse a partida do LOL e olhe agora! Você vai casar com o amor da sua vida! — explodiu em nostalgia e choro quando finalizou a frase.
e eram amigos desde que o maternal. O pai de foi para a faculdade com o pai de e, depois dos rumos terem seguido caminhos alternativos, eles se encontram de novo quando e começaram a dividir a mesma sala na escolinha.
Não houve um único momento na vida de em que não esteve presente, testemunhando seus grandes — ou péssimos — feitos. foi e é o seu telespectador, o segundo protagonista de vários momentos na sua história como ser humano.
Os dois aprenderam a escrever juntos. Aprenderam a ler, a jogar futebol, a decorar tabuada, a como jogar videogame, a como nadar sem se afundar, a escolher a primeira flor que dariam para as garotas que gostavam, a como se barbear, a como escolher a roupa para o primeiro encontro, a como dançar na pista de dança do último baile, a como se matricular na faculdade e a como não se perder no caminho para a primeira festa como universitários. Aprenderam juntos a como se preparar para uma entrevista de emprego, a como beber socialmente sem causar nenhum constrangimento, a como decidir qual carro era o melhor para comprar e, agora, a como arrumar a gravata para o seu dia de casamento.
levou as mãos para o pescoço do amigo e firmou força para ajudá-lo a dar o nó na gravata. estava com as mãos trêmulas, talvez pela emoção de ter o seu melhor amigo presente naquele momento, ou porque mal conseguia conter o nervosismo ao imaginar que em breves minutos entraria na igreja para casar-se com a mulher da sua vida.
— Quando coloquei os meus olhos na , no dia em que você finalmente me apresentou a ela, eu soube. — tinha um sorriso bobo e nostálgico no rosto. Seus dedos trabalhavam no nó da gravata do melhor amigo enquanto que mantinha os seus dentro da calça do smoking, rezando para não desabar em mais lágrimas. — Eu estava sentado no banco do parque com três palitos de algodão doce nas mãos porque você me disse que ela gostava da sensação de estar sentindo as nuvens na ponta da língua. Eu escolhi especialmente o dela, na cor do arco-íris, porque achei que, por ela ser a namorada do meu melhor amigo, merecia um mimo especial. — fechou os olhos ao recordar-se da lembrança. — Levou alguns segundos para vocês aparecerem e, Céus, quando eu a vi pela primeira vez, eu soube. — afagou os ombros de . Com muito custo o noivo abriu os olhos, deixando que as pesadas lágrimas desabrochassem pelos seus glóbulos. — Eu soube, naquele exato momento, que você iria casar com ela um dia. — pressionou os lábios, mordiscando as pontas e alargando o sorriso, para manter-se firme diante da revelação do amigo. — Você se lembra do que ela tinha em mãos? — O riso escapuliu-se da garganta de . — Três balões. — olhou para a janela, embriagado com a lembrança, sentindo aquela lembrança tomá-lo por completo. — Ela trouxe três balões porque você disse a ela que eu gostava muito dos balões do parque. Quem diabos esperaria essa coincidência?! Aquele momento foi tipo um encontro de almas, meu irmão! Ela já concedi a minha aprovação no mesmo minuto!
— Você sempre foi um crianção. — brincou. riu e acenou em concordância. — Ela foi muito esperta na tática que encontrou para te agradar.
— E você sempre foi o meu melhor amigo. — respondeu. — Eu me sentia na obrigação de cuidar de você, mas quando conheci ... — sorriu amplamente. — Eu soube que havia encontrado uma boa companheira para me ajudar a não falhar nessa missão.




Respirando fundo, guiou os olhos até alcançar o céu e encontrar as nuvens. O sorriso amolecido e arrebatador se formou nos lábios enquanto que os seus olhos borravam pelo excesso de lágrimas.
se questionou se o sono profundo de a levou de encontro às nuvens. Queria saber se a esposa havia se sentido como uma criança em dia de passeio ao parque quando se sentou na primeira nuvem de verdade. Queria saber se sentiria saudade de comer algodão doce e olhar para o céu, em direção às nuvens para pensar que, com o doce se derretendo na ponta de suas línguas, ela estaria realmente próxima do céu.
As pontas de seus dedos tocaram a janela de vidro e sentia-se capaz de atravessá-la para roçar na espessura das nuvens. Aquele contato supérfluo aqueceu o seu coração, por mais banal que fosse, porque não estava tendo a oportunidade de comer um algodão doce naquele momento, mas tinha a sua forma sublime de sentir-se próximo das nuvens e, de certa forma, de .
— Como uma borboleta, meu amor, você sempre mereceu voar como uma borboleta. — inalou o ar puro da vegetação alastrando-se entre as brechas da janela. — Um dia te encontrarei no céu, minha borboleta. Um dia teremos a mesma nuvem como nosso novo lar.
O motorista olhou de soslaio sob o banco e observou o rapaz se debulhar nas próprias enigmáticas. Seu olhar pesou e ponderou o que o homem naquela idade poderia estar passando, mas como tão rápido questionou, mal teve tempo de se conter para fazer a bem intencionada — e mal colocada — pergunta:
— O que lhe aflige desta forma, jovem rapaz?
levou os olhos para o motorista e por um segundo acreditou que só poderia resumir a sua existência naquele ato. Não havia mais forças para compartilhar a desgraça que assombrava a sua vida, tampouco queria proferi-la, mas que culpa o homem poderia ter por tocar no seu ponto fraco, justamente quando ele estava esparramado no banco de seu carro, chorando abundantemente e parecendo estar perto de um colapso?
— A vida, senhor.
O mais velho assentiu com a colocação do mais novo, um pouco sereno e acanhado. As palavras irromperam no ar com uma agilidade brusca, carregadas de dor e desamparo, colocando-o em pés de quem não sabia reconhecer qual limite poderia ultrapassar para confortar o coração machucado daquele pobre inocente rapaz.
— Sabe, preocupe-se mais em levantar do que na queda que sofreu, pois todos nós caímos, mas nem todos se levantam.
arfou e, no próximo segundo, deixou-se cair por fim porque ele sabia que, após a queda, ele precisaria levantar-se.
esperava isto dele e ele não poderia decepcioná-la.
Não enquanto ele ainda tinha um longo caminho para seguir antes de se tornar a sua própria borboleta.
emaranhou-se nos braços e observou as pessoas transitarem no alto da ponte que dividia as cidades. Os olhos dele quase deixaram passar impune um detalhe, mas foi como se o seu coração houvesse o conduzido para aquela direção.
No minuto em que fitou um garoto de gorro amarelo correndo entre as pessoas, ele se encontrou naquela miragem, o momento em que o seu paraíso tornou-se o seu inferno.

Novembro - 2018

estava sentado na mesa, as horas passando devagar à medida que o sol começava a se pôr no céu. Os olhos do homem percorreram pela costa da avenida e desceram até encontrarem um congestionamento no final do farol, um amontoado de pessoas tratando de se apressarem para chegarem a seus destinos finais ou, com sorte, estarem indo em direção aos seus motivos de sentirem-se de volta ao lar após o fim de mais um dia turbulento.
Encostado com os cotovelos na borda da mesa, sorriu derretido convencendo-se de que todo ser humano deveria experimentar a sensação que ele sentia, naquele exato momento, enquanto esperava pela sua maluquinha dos passos apressados e desengonçados atravessar a porta principal do restaurante e saudá-lo com o sorriso mais radiante, o beijo mais doce e o abraço mais confortante que já fora honrado de apreciar.
O homem olhou mais uma vez para o relógio, checou que não havia passado nem dois minutos desde que entrara naquela distração particular e passou a considerar que já deveria estar ali a essa altura. Ele bem se recordara do itinerário que a esposa compartilhou no início da manhã, contando a ele todos os afazeres que precisaria cumprir antes do tradicional jantar romântico que acontecia uma vez por semana, no mínimo, na agenda do casal. disse algo sobre como precisava respirar um pouco de ar fresco depois de ter passado a última semana enfurnada na casa e que queria andar pelas ruas da cidade com a sensação de estar recuperando o seu tempo antes que chegasse a hora. protestara por um momento, ou incontáveis destes, mas no segundo em que o homem subiu naquele altar, quatro anos atrás, sabia muitíssimo bem que estava se casando com uma mulher de temperamento forte e vontades incontestáveis e foi por isso que ele teve de aceitar a saída solitária da sua esposa pelo o que parecia ser um passeio descontraído.
E, ele pensou, que teria ligado para avisá-lo do motivo por estar atrasada. A mulher era do tipo que levava como sua missão de vida cumprir os horários marcados e perder a hora significava que algo estava fora do comum.
O homem suspirou ansioso, rebatendo os pés por baixo da mesa e coçando o topo da cabeça, desta vez começando a se sentir incomodado por estar vestindo a touca que mais odiava, só porque era a favorita de e ela abria o sorriso mais embasbacado de todos os tempos quando o via desfilando com aquele holofote amarelo na sua cabeça. Ele sorriu imaculado lembrando-se do dia em que ela o obrigou a comprar o acessório e cogitou a dúvida de quantas outras toucas ela poderia ter comprado naquela tarde.
Ele esperou um pouco mais, apenas o suficiente para ter certeza de que algo estava errado. Os seus olhos se guiaram novamente de volta à janela e, enquanto ele varria pela multidão em busca de um único rosto, o barulho do soar de seu telefone emergiu pelo ambiente, lhe deixando disperso por um momento. No entanto, ele não tardou para retirar o aparelho do bolso da calça e se deparar com um número desconhecido. Seus dedos rolaram interessados para aceitar a chamada e, antes que ele viesse a expressar qualquer saudação para cumprimentar o portador da ligação, uma voz berrou palavras um tanto incompreensíveis.
— Sr. ? — A voz masculina elevou-se ainda mais quando os barulhos em sua volta pareciam querer dificultar a sua missão de conversar com . O homem franziu os cenhos buscando lembrar se reconhecia aquele timbre vocal de algum lugar, levando um segundo para responder.
— É ele. Quem fala?
Um grito agudo despertou os sentidos de e ele aproximou o aparelho ainda mais, diligenciando compreender o que raios poderia estar acontecendo do outro lado da linha. Algumas vozes se misturaram e o homem que havia feito a ligação gritou novamente, mas desta vez não para .
— A pressão arterial está elevando rápido demais! — O homem berrou angustiado. — Sr. , é do Wooridul Spine Hospital… — A ligação falhou por uma fração de segundos e gastou esse minúsculo período de tempo sugando todo o ar à sua volta, cruzando o ambiente com uma velocidade felina e alcançou a maçaneta de saída no mesmo segundo em que a ligação se restabeleceu. — Algo aconteceu com a sua esposa. O senhor precisa vir para cá agora.




O tempo disparou celeremente enquanto coordenava as memórias dentro do seu vagão particular de sentimentos.
Ele não conseguia acreditar, perfeitamente, que havia passado tanto tempo desde que o médico lhe recepcionou com aquela pavorosa notícia. até mesmo ainda continua a ouvir a voz do homem emergir dentro do seu subconsciente e lhe atormentar durante as noites em claro. A impressão que tinha é de que aquele evento aconteceu em uma realidade paralela e ele só estava passando por uma turbulência temporária no percurso da sua jornada. A qualquer momento surgiria por qualquer canto que ele estivesse e lhe daria um chute forte na traseira, um abraço apertado pelo pescoço e cantarolaria alguma música chiclete que ouvira na rádio.
tinha a habilidosa capacidade de tornar tudo mais leve e exultante. Um detalhe nunca seria só um detalhe aos olhos da mulher, tampouco uma insignificante razão para não fazê-la desatar em risos e sorrisos deslumbrados. Ela gostava de dançar conforme o vento, gostava de se molhar embaixo da chuva, de cultivar flores no jardim, de ler profecias e de tornar todo o mundo ao seu redor um poema — a sua versão da vida.
O coração de esvaziou-se quando ele notou que existir depois do que lhe aconteceu seria a sua missão mais difícil. Qual sentido teria dançar, uma das coisas que ele mais gostava de fazer na vida, se ela não estaria ao seu escaldo rondando os braços pelo seu pescoço e lhe conduzindo na coreografia? Qual sentido teria se livrar das galochas de chuva e correr descalço enquanto a chuva o toma e o inunda, se não estaria brincando de estarem embaixo do chuveiro deles? Qual sentido teria plantar, cuidar e cultivar as flores, no jardim traseiro da casa, se não estaria lá, no despertar da manhã, para ver o trabalho minucioso e empenhado do esposo apenas com o intuito de lisonjeá-la e lhe fazer acordar com o sorriso da mulher que se sentia mais feliz em todos os quatros cantos do mundo?
Qual sentido teria a sua existência se uma parte havia sido bruscamente e maldosamente arrancada de seu coração?
Ele daria infinitas coisas para tê-la de volta. Ele usaria aquele estúpido gorro amarelo todos os dias, inclusive no verão, se fosse o preciso para que voltasse. Ele ficaria horas intermináveis parado de baixo do sol forte, ou da chuva tempestuosa, durante todos os dias de sua vida, para apenas encará-lo e ter a sua dose diária de inspiração, aquela que ela precisava para terminar os seus livros, se isso fosse o suficiente para tê-la de volta. cruzaria o mundo a pé, com montada em suas costas se isso fosse o suficiente para tê-la de volta. moveria montanhas, escalaria o Everest, mergulharia em um vulcão em ebulição, voaria sem pára-quedas no topo do céu de Dubai, cutucaria uma onça com a vara e resumidamente, gastaria todo e qualquer empenho de sua existência se isso fosse o suficiente para tê-la de volta. Droga, apenas faria qualquer coisa para tê-la novamente.
Ele sabia que aceitar a verdade não seria fácil, de longe o pior momento de sua vida. passou tanto tempo, no último mês, negando-se a aceitar o fato consumado pelo destino que, por um breve segundo, ele acreditou que talvez ele nunca fosse capaz de condescender.
O melhor a se fazer, então, era simploriamente sentir a dor corroer e estraçalhar o seu íntimo.
Foi isso que ele fez ao carro ter contornado o extremo da avenida, lembrando-se daquela estrada que ambos costumavam passar juntos durante os passeios pela cidade quando os dias se estendiam para um belo pôr do sol à noite. podia até mesmo olhar para o retrovisor do carro e ver o reflexo dos olhos sorridentes de , a fortaleza esculpida diante dos seus olhos que era responsável por lhe guiar durante todas as dezenas de viagens que os dois fizeram juntos.
O movimento vaivém nas águas tempestuosas das suas lembranças fez os olhos de marejarem e transbordarem de volta à vida e fazê-lo se apegar ao ímpar motivo que o embala a continuar o caminho através desta estrada vazia.

Junho - 2018

procrastinou no sofá por um momento após ele e terem voltado para casa. O casal passou a manhã e à tarde em Seul, revirando as infinitas lojas no centro, vasculhando por tudo que a esposa considerava extremamente necessário para colocar na casa. Ela estava agitada desde que ele havia lhe feito a proposta de irem à cidade para algumas compras, mas não esperava que ela, nos ânimos físicos e emocionais, poderia ter reservado tanta euforia e energia para uma simples ida ao shopping.
O aroma de chá de camomila viajou pelo corredor ao passo que se aproximava do quarto do casal. A porta estava semiaberta e ele empurrou ligeiramente para ter uma visão de parada em frente ao espelho, se encarando e tocando. apoiou o peso do corpo no batente da porta e cruzou os braços, fissurado pelos entretons que a esposa exalava num lampejo de luz, gradativa e envolvente, o seu verdadeiro sinônimo de beleza.
— Estou enorme.
— Você não está enorme, amor, você está grávida.
resmungou algum comentário desdenhoso e remexeu os lábios impacientemente diante do espelho, encarando a barriga que crescia com o passar dos dias.
— Não tem muita diferença. — Ela ponderou, humorada, enquanto avaliava o seu perfil de frente ao espelho. — Estou enorme e grávida. Estou enorme porque estou grávida. — decidiu no minuto final de sua autoanálise. Ela esfregou os dedos pela barriga. — Tenho duas traseiras e meus seios parecem duas melancias prontas para explodir. — começou a remoer pensamentos paranoicos em sua cabeça e, antes de pronunciá-los, sorriu de lado sabendo bem o caminho que seguiriam. — Você acha que é saudável minha barriga estar crescendo tão rápido assim em um curto período de tempo? — olhou para o casulo do seu mundo, protegido pelo corpo de , a mulher da sua vida, e só pôde sorrir com toda a emoção que cabia em sua expressão.
— Você está perfeitamente bem, meu amor. Você e a nossa pequena borboleta que cresce dentro do casulo cada dia um pouco mais. — suspirou fundo, concordando com o marido e voltando a encarar o seu retrato. Sua barriga cutucava com determinação as pontas das camisas e ela já não podia vesti-las completamente como antes da gravidez. Lembrou-se de que precisaria comprar urgentemente roupas de grávida, cintas, elásticos para firmar a barriga, suportes para a coluna, porque sabia bem que suas costas não iriam aguentar por muito tempo o peso da barriga, que já se tornava aparente. Todas essas coisas que estendiam a sua lista mental e lhe faziam ter dores de cabeça intermináveis.
Enquanto isso encarava a esposa pelo espelho, observando as suas reações humoradas lhe tornarem a criatura mais linda que ele já vira.
Depois de viajar pelas dúvidas abrangentes de seu universo particular, despertou do breve momento atônito e encarou lhe sondando milimetricamente com um sorriso de ponta a ponta, respirando rente aos seus ouvidos e aquecendo a dobradura de seu pescoço. Ela esfregou as mãos pelos braços do marido, deixando-a bem quente dentro do afeto e quis memorizar aquela cena em seu subconsciente. Ali, diante do novo futuro que se iniciava em suas vidas, tinha a certeza incontestável que estava vivendo o momento mais belo de sua existência. Tinha , o homem que se resumia ao seu tudo particular, e, agora, tinha uma espécie de ser humaninho habitando o seu corpo, criando suas próprias singularidades e se desenvolvendo com base no seu mantimento, na sua genética e no seu amor. , finalmente, acreditou ter assimilado tudo aquilo que andava acontecendo — ela se tornaria mãe.
Por céus, ela se tornaria uma mãe! Ela seria a fonte principal de sobrevivência de um pequeno projeto de pessoa, precisaria se dedicar compassivamente, durante cada segundo do seu dia, para prover a melhor forma de existência para aquele ser que vinha a residir no mesmo mundo que ela unicamente por sua causa. Finalmente estaria vivendo o seu sonho que, por sorte, não precisaria mais ser prorrogável; ela estava se tornando uma mãe.
As lágrimas desabaram de seus olhos sem pedir permissão, detalhando o que aqueles pensamentos estavam causando nas suas emoções. subiu os olhos para o rosto encharcado de sentimentos de sua esposa e riu anestesiado pela beleza que ela conseguia exalar até mesmo quando seu humor era uma metralhadora desferindo cargas perigosas.
— E se algo sair errado, ? E se eu não for capaz de mantê-lo ou mantê-la bem?
murmurou um chiado manso e encostou o seu dedo indicador nos lábios da esposa, indicando que ela não deveria ao menos cogitar aquela hipótese. Ele encostou a testa no pescoço dela e fechou os olhos, ouvindo os batimentos cardíacos da esposa atingirem até mesmo os seus tímpanos. Beijou superficialmente cada ângulo da pele da mulher, assegurando que cada poro do seu corpo fosse contemplado com o seu amor.
— Você está se saindo incrível, meu amor. Nosso bebê está bem, saudável e seguro, sabe por quê? — Ela demora a respondê-lo, estimulando a sorrir mais largo e continuar sua argumentação. — Porque é você a mãe desse minúsculo protótipo de ser humano, . Essa pessoinha tem tudo do que precisa.
fechou os olhos em êxtase à medida que esfregava o seu nariz pela despida de seu pescoço. O coração dela saltou, sambou, orquestrou um musical, explodiu e renasceu, tudo ao mesmo tempo, ao sentir o amor que o seu marido nutria por ela, tão real e explícito. Ela abriu seus grandes glóbulos oculares e se deparou com lhe fitando vidrado com um sorriso retraído e dócil enquanto suas mãos brincavam de tocar em cada lateral do seu corpo.
— O que você está pensando? — Um riso fraco desprendeu-se de sua garganta no momento em que beliscou com os dentes a sua orelha.
— Estou pensando que você está grávida. — Ele disse contornando a extensão dos braços da esposa com os seus, firmando as mãos com as dela e a fazendo ficar de frente com a sua imagem no espelho. Os dois encaram um ao outro, ao passo que um sorriso encabulado distinto preenche as emoções de cada. — Que você está carregando a minha criança. — Ele falou. — Você me tornará um pai. — beijou a bochecha de . — Nós seremos pais juntos e essa é a coisa mais incrivelmente fantástica que conseguiremos fazer na nossa vida.
Uma das mãos de se locomoveu até o estômago da esposa, depositando um carinho amoroso, circulando formas aleatórias e enchendo o coração de com paixão.
— Sabe o que eu vejo quando olho para você? — negou minimamente com a cabeça. — Eu vejo o quão feliz você está. — Ele sussurrou pressionando os lábios contra a bochecha quente de . — Eu vejo você tocando a sua barriga todo o momento para ter certeza se está tudo aí dentro. — Ele indicou com a cabeça para a área onde o seu universo parece se tornar mais colorido. chorou mais algumas lágrimas. — murmurou enquanto escorria sua mão por dentro da camisa de e deixava a sua barriga exposta a olho nu. — E eu também vejo você conversando com ele ou ela. — Ele provocou. — Vejo você contando tudo para ele, desde o seu dia até… — limpou a garganta para prender o choro emocionado que estava prestes a se tornar evidente. — Até sobre o quão ansioso eu estou para tê-lo em meus braços e conhecê-lo. Eu vejo a mulher da minha vida mudando a minha vida, amor. — beijou novamente a bochecha de . — Eu vejo você me provando que consegue ser, ainda mais, absurdamente magnífica.
mordeu os lábios para prender o suspiro e as mãos de subiram de sua barriga para os seios despidos. Ele apalpou com cuidado e educação a extensão de cada um deles, respeitando a sua sensibilidade e não deixando de demonstrá-la o quanto ele ainda conseguia sentir prazer por ela, ainda mesmo enquanto acha que está sofrendo os efeitos permanentes da gravidez.
— Você está grávida, meu amor. — repetiu mais uma vez. — Não enorme. Está linda, incrivelmente linda… Sustentando a maior preciosidade que fizemos nos últimos meses… — Ele apertou levemente os bicos dos seios de e ela gemeu sob a própria respiração, fechando os olhos após o contato prazeroso. a encarou com os olhos derretidos de adoração, sorrindo sem fôlego ao vê-la se entregar em seus braços. — E vai existir alguém que precisará usar e muito as suas melancias explosivas, mas é esse o propósito da coisa, não é? — gargalhou baixo.
— E você? — Ela abriu os olhos para contemplar a vasta densidade de suplícios que realçava. — Você precisará fazer uso das minhas melancias explosivas?
soltou-a de seus braços apenas para poder a virar de frente a ele e enaltecer, com os olhos de águia, a imensidão da beleza de sua esposa. Ela murmurou um estímulo entre os lábios avermelhados e o homem soube que não precisaria de muito mais para ceder aos seus entraves.
— Apesar de ser muito benevolente… — Ele encostou a boca na clavícula de , despejando beijos molhados. — Acho que precisarei ser egoísta vez ou outra para me aproveitar delas também.
— Então aproveite enquanto pode. — respondeu. — Elas ainda são todinhas suas.
— Com todo o prazer, amor.
agradeceu pela sua barriga estar grande porque lhe facilitava na escolha de roupas com elastano e algodão, as mais fáceis para se livrar em situações oportunas como aquela.
quase rosnou impaciente quando as mãos de se atreveram a se afastar do abdômen dele. Ela sorriu sacana, empurrando o corpo do marido para longe, só para ver o efeito que causava no homem e não teve tempo de fazer nada a mais porque a puxou de volta para os seus braços e os lábios dos dois brincaram de traçar uma gincana para descobrir qual deles levaria o maior tempo sem ar.
Os gemidos aguçados e fundidos em martírio de distraíam do seu objetivo e ele se sentiu mais frustrado por perder o rumo das coisas quando resolvia provocá-lo naquela forma.
Ele ajudou-a até chegar à cama e, quando as costas dela encontraram o conforto do colchão, se suspendeu por cima de , evitando que o peso de seu corpo machucasse a barriga dela com o intuito de conseguir alcançar novamente os seus lábios e dar continuidade às chamas que controlavam os seus sentidos.
percorreu pelos lábios de , traçou um caminho pelo pescoço, alcançou os seios e gastou um empenho interminável para satisfazê-la com vigor. Ele sabia que ela andava demandando muita energia naqueles dias, ainda mais quando ela conseguia gozar tão rápido com pouco estímulo, duplicando a sua motivação para deixá-la realizada com a dosagem de tesão e sexo que ela precisaria para não entrar em abstinência ou surtar.
enxergava uma beleza exótica e envolvente naquela curiosidade que ela agregara no período da gravidez — nos dois primeiros meses de gestação a esposa só conseguia sentir-se um pouco, digamos, imprópria para o sexo, porque seus sentidos estavam bagunçados e, sua euforia, mal chegava a fazer presença. Após ter entrado no quarto mês, se via como uma constante máquina de produção; a mulher tinha a vontade quase necessária de transar, em diversos momentos, e lugares, deixando que o homem criasse uma espécie de ânimo anormal, praticamente animalesco.
Quando sentiu o líquido escorrer por entre as suas pernas, de forma não planejada ou sem preparação, ela se sentiu de volta ao seu antigo “eu”. Seu corpo andava domado de uma sensação tão conturbada e descompassada que, estar sentindo o prazer nu e intenso, como era tipicamente comum em dias antes da gravidez, fez com que ela retomasse seus desejos sem achar que era só por causa do efeito da influência que o estrógeno exercia balançando a sua libido.
Ela quis por mais, mesmo quando já estava desmontado ao seu lado e recuperando a respiração instável. baixou os olhos para o corpo nu do marido e gargalhou ao ver que a ereção de continuava erguida diante de seus olhos, saudando a mulher como se quisesse que ela voltasse a ajudá-lo a se acalmar. Ela buscou apalpá-lo, mas olhou ultrajado para ela, divertindo-se.
— Você não cansa? — Ele gemeu alto quando os dedos de perambularam pelo seu membro. — Céus, estou casado com uma ninfomaníaca!
— Não enquanto você não estiver satisfeito também, amor. — arriscou se erguer em cima de , equilibrando o seu peso ainda não acostumado sob o corpo do marido, observando os olhos dele examinarem cada centímetro de seu corpo e checar se estava tudo bem. Era adorável, e irritante, digamos desta forma, a preocupação profunda de pelo estado de saúde da mulher enquanto ambos se aventuravam na cama. Ela sabia que precisava de cuidados para o ato, mas seus hormônios andavam tão desestabilizados que depois de dois ou três rounds ela não sentia que poderia causar algum malfeito para o bebê, principalmente porque havia passado pela médica incontáveis vezes só para refutar aquela dúvida.
Os ombros de afundaram no colchão e ele esticou o queixo para alcançar os lábios de mais uma vez. Ela desabou o corpo com mais confiança e deixou que ele a rodasse com os braços fortes e firmes, protegendo o impacto dos corpos quando a barriga dela cutucou o abdômen dele.
endireitou em seus braços, ajudando ela a ficar sentada por cima dos pés e se inclinou em sua direção. Ele conseguiu se erguer, depois do fôlego ter escapulido de suas paredes e abraçado o corpo da esposa, escorregando para trás e podendo se projetar de frente para a barriga dela.
Ele encarou aquele corpo como se fosse o seu portal para o Paraíso. Seus olhos vagaram pela pele lisa e cheirosa da esposa, seus dedos brincaram de acariciar suas medições e ouviu o suspiro apaixonado e abobalhado do marido preencher todo o cômodo como uma melodia de ninar.
Os lábios de encontraram de forma imediata a barriga de e a sensação foi de veludo roçando contra a sua pele. Ela sorriu esfregando as mãos pelo couro cabeludo do marido e depositando ali a maior magnitude de seu amor.
— Oh, meu Deus. — Ele rapidamente disparou enquanto se ajeitava na cama em um pulo surpreso. Ele cruzou as pernas sentando-se de frente a ela e encarando o rosto de com ansiedade e incredulidade. — Você sentiu isso?
— Você está parecendo um pouco assustador agora. — brincou olhando duvidosa e manhosa para o marido, esperando que ele voltasse a beijar a sua barriga como antes. No entanto, continuava com o sorriso largo aberto. — Do que está falando? Por que você está me olhando assim? — Ela insistiu.
— Deixe-me tocar na sua barriga de novo. — segurou em cada lado da barriga de e compenetrou o seu olhar por longos segundos, ansiosamente intermináveis e provocativos ao seu ver. Ela olhou impaciente para o marido, não entendendo o porquê da súbita reação dele.
— O que você pretende fazer com isso? — perguntou ao ver brincando de manusear a sua barriga como uma bola de basquete.
— Quero esfregar a sua barriga! — respondeu estonteante, rindo aos ventos e mordendo os lábios para não soltar um grito de euforia. entortou o cenho, acreditando que o marido estava passando por aquelas situações de surtos momentâneos. Ela expeliu um riso mínimo, se ajeitando no colchão para dar mais espaço ao marido.
— Minha barriga não é uma bola de cristal para você esfregar assim. — Ela deu tapinhas repreensivas nas mãos de . — Ela não irá te contar o futuro.
arreganhou a expressão mostrando a língua para a esposa e tombando a cabeça na altura de sua barriga. Ele sorriu instigado, sussurrando algumas coisas que ela não conseguiu ouvir, mas significaram o mundo inteiro para si. A devoção do marido recheava a sua alma com alegria e emoção, deixando-a ainda mais convicta de que não poderia haver nenhum outro homem para ser o pai de sua criança se não fosse .
Ele beijou novamente a barriga de e, desta vez, ela sentiu uma pontada definida repercutir uma sensação de alguém a cutucando. Seus olhos rodaram nas órbitas e ela respondeu ao carinho do marido com um sorriso chocado.
— O que foi? — Ele arqueou a sobrancelha, em expectativa, esperando que o respondesse. Enquanto isso, ela só conseguiu levar as mãos para a boca, tampando a passagem de ar e fala, deixando com que ficasse ainda mais impaciente, mas crente de que agora ela havia sentido o mesmo que ele sentiu minutos atrás.
— Quando você beijou a minha barriga eu senti um chute.
— Você sentiu? — Ele levou os olhos para a barriga novamente e intensificou os carinhos, deixando um par de lágrimas escorrerem pelos seus olhos. — E como é a sensação?
gargalhou alto, esfregando as suas mãos por cima das mãos de e ensaiando em conjunto o carinho depositado. Os dois se pegaram encarando a barriga da mulher, acariciando-a e a protegendo.
— Como se eu tivesse sido chutada dentro da minha barriga. — Ela levantou a sobrancelha caçoando da colocação do marido e ele riu brincalhão, ficando ainda mais animado e feliz.
— Oh, meu pequeno artilheiro! — comemorou. — Ou então a minha pequena artilheira! — sorriu. — Pegue leve com a sua mãe, ela está muito emotiva nos últimos dias, daqui a pouco irá achar que você está a detestando aí dentro.
deu um tapa na nuca de e ele gargalhou mais alto, repousando a cabeça na barriga dela. apoiou as costas na cabeceira da cama e abriu as pernas para que se acoplasse e se acolhesse confortavelmente em seu ninho. Ela abraçou o tronco dele até onde pôde e cercou o corpo dela com os braços, ouvindo os barulhos que provinham da barriga da esposa, a existência do seu filho nascer através das paredes de proteção que construía para mantê-lo vivo.
— Ele ainda está chutando. — comentou. O sorriso de se alargou concordando em resposta e apertando o ouvido contra a barriga dela. — Está te cumprimentando, amor.
— Papai está aqui, anjo. — murmurou. — E estarei aqui quando você vier fazer parte do mundo que estamos construindo para você. Venha logo, meu amor, eu mal posso esperar para você conhecer o rostinho da sua mãe, a mulher mais linda das nossas vidas. — Depois de sentir o leve tapa que deu em sua cabeça, sorriu acometido pela sensação de imaginar o rosto da criança que habitava a barriga de sua esposa. — Eu aposto que você vai ser tão lindo, ou linda, quanto ela. — Ele sorriu. — Mas não a deixe ouvir, sua mãe irá se exibir na cara dura por causa disso.




sentia-se fracassado e no nível mais deplorável da humanidade. O ar levado para dentro ou expelido pelos seus pulmões indicava que ele estava desesperado por uma breve respiração que pudesse fortalecer o seu organismo e não fazê-lo fraquejar quando constatou a tenebrosa realidade: Ele se convencia que estava falhando. Cada minuto um pouco mais.
Não era tão crente em devoções quanto antigamente, mas preferiu dar a oportunidade de acreditar nas palavras que lhe oferecia nos momentos de pavor e insegurança, algo sobre ter um destino traçado para alcançar grandes coisas, como se ele fosse uma espécie de protegido por Deus ou quem quer que esteja o cuidando. Na época aquele pensamento fazia pleno sentido para um garoto de dezenove anos, repleto de sonhos, expectativas e anseios, mas agora soava mais como uma consequência dolorosa que teria de pagar em troca de seus desejos. No final, quando a vida lhe dá algo, certamente te tirará algo da mesma importância. É a consequência, convenceu-se.
Não estar mais aqui para acompanhar os momentos em vida de seu filho poderia ser a consequência que para oferecê-lo o melhor presente que alguém poderia lhe dar. Seus olhos percorreram por cada fragmento novo que a atmosfera da cidade apresentava, buscando em sua memória se aquelas peculiaridades já existiam na última vez que veio ao local ou se ele apenas estava descobrindo como apreciar simples coisas que antigamente não lhe pareciam importante. Mesmo entretido com a dúvida, permitiu-se a vê-las desta vez com um olhar diferente.
Os postes proporcionavam uma enfraquecida iluminação para aqueles que caminhavam pela rua do estabelecimento e por isso não notou a chegada no lugar onde estava suposto a ir. Ele agradeceu ao motorista, entregou a quantia devida pela corrida e desviou o seu olhar quando o homem pareceu penar sobre como a sua figura aparentava uma aura deprimente demais. Pôs certa força para empurrar a porta pesada ao ter parado atrás da divisória, desgastada nas juntas por ser antiga, parando para cumprimentar quem lhe retribuía com uma mesura. Juntou as mãos até a boca para aquecê-las e procurou por alguém que conhecia. Não demorou mais de três segundos para que ele esbarrasse seu olhar sob , no canto distante dos bancos, um tanto encolhido em seus quilos de roupas. Ele não sorriu, embora quisesse.
— Estão te esperando. — inspirou o ar que tanto estava habituado, mas agora não parecia mais o mesmo. Seus olhos varreram a dimensão do hospital e ele não viu nada de diferente no ambiente, ainda que seus olhos fingissem não estarem mais acostumado com os cômodos. A última vez que estivera lá foi no fim da semana, mas a linha temporal pareceu se tornar um inimigo perigoso para combater. Os segundos se tornavam décadas, os minutos séculos e as horas milênios. Depois de poucas horas distante daquele lugar, já se sentia afastado por uma eternidade. — Você está pronto?
Aquela foi a primeira vez em que genuinamente sorriu. Entristecido e tomado de dor, mas ainda sim um sorriso.
— A questão não é estar pronto, é ser obrigado a estar. — puxou com angústia para os seus braços. O melhor amigo fechou os olhos com hostilidade e se forçou a não falar nada que sufocasse além do fardo que ele carregava no peito, mas o amigo estava desmoronando sob os seus próprios pés. Ele quis chorar, torturar-se pela dor que o consumia, mas não havia escolha; prometeu à que seria ele quem continuaria cuidando de daqui em frente. Precisava cumprir com as suas palavras. Por ela e pelo amigo. — O que você escolheu fazer? — se pronunciou depois de achar que já não estava mais presente naquele plano.
mexeu vagarosamente a cabeça para ambos os lados, elevando e desabando os ombros em um ritmo lento. Ele não parecia realmente questionar algo que o fizesse afundar em incertezas. Aquela era uma característica que admirava no melhor amigo.
— O mesmo que eu sempre disse que faria. Não irei aceitar a proposta deles. – não ia citar “a proposta” com todas as palavras, pois sabia que sabia bem sobre o que ele se referia. Com um breve aceno concordou, não sendo capaz de esconder a consternação em ver o amigo determinado a, obstinadamente, não ouvir o que os médicos lhe aconselharam. levantou o olhar novamente, agora com mais determinação e certeza oscilando pelos olhos. esperou que ele compartilhasse algo a mais, embora estivesse se preparando para dar procedência ao seu suporte sem comprometer a escolha do amigo. Tinha sido difícil trazê-lo até esta altura do tratamento, não poderia vacilar ou piorar o turbilhão de sentimentos que rondavam .
— Você tem certeza? — A pergunta não era de toda forma inocente. dedicou várias horas nos seus últimos dias para pesquisar e compreender o porquê os médicos aconselharam a tomar aquela hipótese. Ele estava perdido, por céus, não fazia ideia de como ajudar com aquela escolha, mas procurou entender os dois lados da balança para no mínimo se suster na situação.
— Se eu tenho certeza de que não quero desligar os aparelhos que continuam mantendo a minha esposa viva?! — não quis responder com um teor amargurado na sua voz, mas instintivamente o fez, arrependendo-se quando notou o contraste magoado no rosto de . Ele sabia que o amigo jamais queria que ele optasse por aquilo, tampouco alguém em toda a humanidade, mas ele estava uma pilha de nervos com toda aquela pressão em cima de seus ombros e ele se fartava a cada segundo que passava. — Definitivamente sim, , eu tenho certeza.
— Sabe, , o que eu quis dizer é se... — procurou estruturar o seu pensamento. — Se você não tem certeza de que talvez quisesse que você fizesse isso. — Ele engoliu o nó quando o amigo levou o olhar até o seu acanhado corpo. — Talvez deseje que você deixe-a partir.
Foi só isso que precisou para afundar-se nos braços do melhor amigo. Não trocaram mais nenhuma palavra; o peso daquelas lágrimas gritavam por elas próprias. Imaginar onde poderia estar era talvez a parte mais dolorosa para ele — estava em algum lugar inalcançável. Inalcançável para os seus braços, para os seus ouvidos e para a sua presença completa. Naquele momento, sentia-se desamparado. Desprotegido. Abandonado. Sozinho.
Na maior parte das noites rezava para que voltasse para casa. Ele rezava para tudo, mas também para nada. Ele rezava para se levantar todas as manhãs, para fazer o básico, para continuar existindo, por mais que aparentasse estar prestes a evaporar. Ele não sentia mais vontade de ver mudanças à sua volta, de ser a mudança, porque sabia que de qualquer forma, em nenhuma hipótese, ele poderia voltar para aquela tarde e impedir que as coisas acontecessem da forma que aconteceram.
Pensando agora, percebeu que naquele dia ele não estava apenas perdendo , mas também a si mesmo. Enquanto provavelmente tornava-se um anjo no céu, o seu antigo eu voava para longe, bem longe.
De uma vez só o homem descobriu que não seria invencível para sempre – na verdade não seria em nenhum momento de sua vida. A vida lhe venceu, no final das contas.
Agora é ele quem chora porque realmente lamenta muito pelo o que ele e foram obrigados a passar. Mais uma vez ele chora porque não conseguiu protegê-la e livrá-la daquele destino. Mais profundamente, a ferida só ficava ainda mais profunda. Como pedaços de um vidro quebrado que não pode reverter, mais profundo e doloroso, é apenas desta forma que seu coração se machuca todos os dias.
O que mais ele poderia dizer ou fazer senão aceitar a verdade? Este é e será o seu estigma eterno. Doloroso como cacos de vidros rasgando sua pele, seu estigma se tornava cada mais vez profundo.
A voz de ecoou em sua mente como um xeque-mate. Ele negou-se a ouvir, mas a decisão já havia sido feita; seu coração não iria amparar aquela frase. Não poderia, por ela, mas não conseguiu prevenir o soar das palavras vagarem entre a sua mente e torná-lo mais miserável dentro de sua própria pele.

Deixe-a partir, .


Ele não teria escolha. Ele precisaria deixar partir eventualmente.
descobriu da pior maneira que lidar com partidas seria a coisa mais difícil, dolorosa e perturbante que teria de encarar.
Então ele permitiu-se a enxergar o que lhe sobrara.
Ele também precisava partir.
Partir em frente.
Mas não enquanto eles ainda possuem uma última esperança.
ganhou ânimo nas pernas e correu desmedidamente pelos corredores do hospital. O caminho já era rotineiramente conhecido pelos seus instintos e ele se pôs firme em cada pesada forte e esbaforida que dava em direção à sala do médico. correu tanto que o mundo retardou-se diante de seus olhos e tudo carregava uma imagem borrada e distorcida, desregular e desalumiado.
— Eu preciso fazer uma última coisa. — irrompeu na sala do médico e o Dr. Lee Chang fitou estarrecido pela súbita presença do marido de uma de suas pacientes. O médico acenou atônito e chacoalhou a cabeça quando apoiou-se na porta e respirou fundo como se ele precisasse de só mais uma respiração para sobreviver. — Eu e o meu filho precisamos fazer uma última coisa.
Dr. Lee Chang guiou pelo caminho em direção à pediatria, no berçário, onde os bebês recém-nascidos ficam até estarem saudáveis e prontos para iniciarem as suas vidas fora daquelas paredes, no mundo real. O coração de se acelerou apertadamente no peito ao ver os primeiros adesivos da recepção e seus olhos varreram alarmados pelas incubadoras, atrás da única razão de ele ainda estar se mantendo são.
Won-Han, o seu pequeno pedaço de céu. O anjo que veio a Terra já tendo que persistir até o fim para sobreviver e mudar todo o percurso da existência de seu pai.
Os olhos de desataram em um choro deslumbrado ao notar o quão incabível é o seu amor pelo filho. sabia que WonHan seria a pessoa que ele mais amaria na sua vida e, ao tê-lo finalmente em seus braços, no dia em que nasceu, soube que era unicamente a esse fato que ele precisaria se apegar. WonHan precisaria de seu pai e, , precisaria ser um pai para o seu filho.
O filho carregava em seu nome o manto sagrado que conduziu de volta àquela estaca. Won, que significa esperança e, Han, que significa amanhecer, foi o conselho que quis deixar para quando contou a ele o porquê queria que o filho se chamasse assim.
Eles funcionavam como um navio à beira-mar. As águas serenas e tranquilas de seu coração iriam guiá-los de volta para casa, mas hora ou outra algumas tempestades viriam a derrubá-los. Quando isso acontecesse, saberia o que fazer porque, no final do dia, ele tinha apenas uma única certeza: o amanhecer traria a esperança de volta para o seu coração.
O filho deles era toda a esperança que precisava para continuar em frente.
Com WonHan no colo, abraçou a razão de sua existência perdurar. Os braços finos e frágeis do filho se apertaram no peito do pai, alinhando-se de acordo com a estrutura óssea do mais velho, balançando no ritmo que o coração de voltava aos trilhos. As jabuticabas grandes e brilhantes do filho fitavam os olhos apaixonados e encantados do pai, oferecendo-lhe uma dose estimulante de paz espiritual. sabia que o filho ainda não sabia sorrir, mas jurou que WonHan estava lhe cumprimentando com a leve elevação de bochechas e lábios que deu ao desferir beijos pelo rosto macio e quente do filho.
— Vamos, meu artilheiro, nós ainda temos uma longa estrada para seguirmos juntos. — murmurou quase inaudível próximo do ouvido do filho. Dr. Lee Chang estava logo à frente, pronto para abrir a porta do casulo de . assegurou que WonHan ficasse um pouco mais protegido entre os seus braços. Antes de adentrar no quarto, suspirou mais uma vez. — E como prometido irei te apresentar o rosto da mulher de nossas vidas.
A entrada mínima de luminosidade radiou precisamente onde o corpo de repousava. Os raios do nascer do sol adentravam timidamente pela dimensão do quarto e sentiu o calor aquecer os seus braços, trêmulos e suados, para não prejudicarem WonHan.
petrificou nos seus pés e deslumbrou , parecendo estar dormindo calmamente, respirar quase que ilusoriamente. Seus cílios fartos e extensos não remexiam em suas pálpebras e o seu nariz se suspendia de acordo que o aparelho que os ventiladores mecânicos lhe auxiliavam a continuar respirando. passou os olhos pelos cilindros de oxigênio ao lado das máquinas e ele suspirou fundo, fugindo daquela imagem enquanto ele ainda podia contemplar , tão linda e inexplicavelmente intocável, no seu leito. A camisola de renda branca que ele escolheu trazer para vesti-la deixava-lhe na perfeita ilustração de um anjo caído. Os cabelos fartos e que ainda ostentavam tamanho brilho caíam como cascatas pelos seus ombros e ele viajou as pontas de seus dedos livres pelas madeixas dos cabelos dela, apalpando aquela sensação que pontuava uma emergência sufocante. Os cabos das molas que controlavam a saúde do cérebro ralaram em seu polegar e ele reprimiu o arfo desdenhoso, evitando encarar os olhos do médico.
buscou alcançar a mão de , repousada ao lado de seu corpo, amolecida e friorenta. A aliança foi a primeira coisa que sentiu após a carga energética de borboletas no estômago ainda presentes em seu ventre lhe distrair. Mesmo depois de vários anos juntos, ele ainda provava da dormência na sua mão e um rubor em sua bochecha que o incendiava a todo momento. Oh, como ele era apaixonado por aquele toque, aquele minúsculo toque...
Ele alisou a extensão do pulso da mulher, chegando até a dobradura de seu braço, esbarrando os dedos com o medidor de pressão, a consequência que teve de carregar durante todos os dias após o parto quando a pré-eclâmpsia lhe tornou refém.
Na vigésima quinta semana de gravidez estava muito fraca. Foi naquele dia que ousou passear pela cidade em busca de objetos de decoração para o quarto do bebê. Foi no específico dia em que recebeu a ligação do Dr. Lee Chang, pedindo para que ele fosse diretamente ao hospital, e o dia em que tudo passou a mudar drasticamente.
A primeira convulsão pegou-os desprevenidos. Foi fraca, em comparação à segunda, mas indicou de que, os temores de , poderiam se tornar reais.
Dr. Lee Chang lhe deu alta duas semanas depois após constatar que ela poderia retomar ao ritmo da gravidez, mas apenas se estivesse acompanhada profissionalmente em sua residência. Nas outras próximas semanas, vendo que ela estava retomando ao seu estado normal e nada mais grave aconteceu na sua saúde e na do bebê, arriscou fazer uma caminhada ao ar livre, como ele aconselhou, para o seu corpo readquirir as voltas nas juntas e a sustâncias nos quadril, já que a barriga pesava a cada dia mais.
Depois daquela caminhada, que lhe resultou em uma segunda convulsão, não pôde voltar a andar. Seu repouso era unicamente feito na maca de sua cama no hospital, monitorada vinte e quatro horas por , sua família, e Dr. Lee Chang.
fungou as lágrimas e sorriu absorto na atmosfera, abraçando WonHan e balançando-o no ritmo que o ensinou durante os dias em que fizeram um curso online de “como saber cuidar de seu bebê recém-nascido sem derrubá-lo no chão ou sufocá-lo de amor”.
— Veja só, meu amor, até que me saí bem nas aulas teóricas, não? — brincou enquanto ninava o filho. — Ele é muito pesado! Consigo entender agora o porquê você reclamava que estava carregando um bebê de hipopótamo na barriga. — Ele finalmente riu prazerosamente depois de não conhecer mais o som do seu próprio riso. — Imagine o quanto gastaremos para mantê-lo com a barriga cheia! — A brincadeira veio sem aviso prévio e ele mal notou que ainda continuava fazendo planos com a volta da mulher para casa.
O médico remexeu-se nos próprios pés e limpou a garganta de forma insonora, lembrando-se do porquê odiava aquela parte do seu trabalho. Eles já haviam feito tudo o que era possível para trazer a mulher de volta do coma, mas o induzimento foi inevitável. Queriam zelar pela integridade do organismo da paciente, embora ela estivesse muito comprometida no momento do parto, apenas porque acima de médicos eles também são seres humanos e a esperança era a única coisa que o motivava a continuar fazendo o que fazia. Ele tinha o poder de reverter o quadro drástico dos pacientes, mas a sua esperança era a principal responsável por fazê-lo acreditar que ele era capaz de salvá-los.
Apesar de ele ter aceitado que bem possivelmente aquela esperança não exista para , Dr. Lee Chang não poderia tirar aquilo do marido dela. Não enquanto ele sustentava em seus braços a preciosidade que significava o mundo para o casal.
— Ele é lindo, meu amor. — olhou para o bebê, abobalhado pelas semelhanças visíveis. — Ele tem o contorno dos seus lábios, uma mistura dos nossos narizes e um pouco do seu olhar. — O homem se emocionou ao pontuar os detalhes perfeccionistas do filho. — Céus, meu amor, ele tem a janela dos seus olhos! Ele é tão você e tão eu que é como olhar para a perfeita junção de nós dois. — abaixou o rosto para enxugar as lágrimas no tecido de sua camisa e sorriu sobressaltado. — Ele foi o melhor presente que você poderia me dar, . Estou segurando nos meus braços o meu filho com você, a mulher da minha vida, descrente de que em algum momento da minha vida eu poderia receber tamanha dádiva. — olhou para . — Abra os olhos, meu amor. Deixe-o ver a constelação que você chama de olhar.
O silêncio ensurdecedor perdurou no ambiente pelos próximos segundos e não se importou — ao olhar para era como se ele estivesse, de algum modo, estabelecendo uma conversa sem diálogo com ela. Ainda que estivesse de olhos fechados, podia senti-la ali, olhando para ele com as suas enormes órbitas irradiando o brilho que o iluminava na escuridão. O seu holofote particular, o seu raio de sol e a sua fonte de vida estava ali, ele sabia.
puxou a poltrona ao lado da cama de e sentou-se, apoiando o peso dos cotovelos sob o colchão, esticando o filho para próximo da mãe para que ele pudesse sentir o seu calor, o seu toque, o seu relance energético que divaga só por existir. WonHan suspendeu os olhos em direção ao rosto de e prendeu o seu olhar nela, por segundos eternizados na mente de , remexendo os pezinhos de forma animada e abrindo a boca diversas vezes e soltando uma espécie de chiado sonoro. gargalhou e se ultrajou diante da cena, elevando o filho sob o peitoral de e o deixando tocá-la.
— Eu te falei que ele seria fã das suas melancias explosivas. — WonHan colocou as mãozinhas no peito esquerdo de e soltou um arfo, ainda olhando para o rosto dela. Ele parecia conectado como um ímã nos delineados detalhes da mãe e quis chorar, mais um pouco, por saber que não podia se deparar com o amor que ali se iniciava.
O apito do monitor cardíaco se prolongou e, na sequência, sobressaiu um tamborilar rituoso e espontâneo. As sobrancelhas de se vincaram e praticamente se unificaram em uma só quando o barulho notificou uma mudança na frequência cardíaca de , fazendo-o olhar diretamente para o médico e contemplá-lo angustiado. Dr. Lee Chang aparentava uma visível surpresa, não acostumado a ver os batimentos de cardíacos voltarem a ganhar energia depois dos últimos trinta dias, aproximando-se de e WonHan com uma calmaria digna de Oscar, se fosse parabenizá-lo por manter tanta mansidão naquela situação.
Dr. Lee Chang divagou o olhar pelos aparelhos em volta de e procurou o pico de alarde responsável por ocasionar a alteração dos batimentos cardíacos, mas tudo continuava em perfeita ordem — se fosse arriscar dizer, até mesmo o controle cerebral e a pulsão arterial estava mais estabilizado e voltando ao normal.
Estarrecido, o médico caiu em si ao perceber o que estava acontecendo. Ele pressionou a mão na boca, retraindo um suspiro emocionado, sustentando o olhar do outro homem na sala, aquele que o lhe metralhava de perguntas e pavores.
— Ela está respondendo aos estímulos, . — Dr. Lee Chang arquejou em êxtase. Essa , no entanto e sem dúvida, era a sua parte preferida do trabalho. — Fale com ela, faça-a continuar respondendo!
Os olhos de giraram nos eixos das órbitas e ele arfou incrédulo e surpreso, explodindo em alegria e crenças que agora combinavam tanto com o seu estado de espírito. Ele acariciou o topo da cabeça de WonHan, que agora o encarava, sorrindo em resposta para as piscadelas do filho.
— Eu sei que você está aí, em algum lugar, nos ouvindo. Eu sei que você sentiu o seu filho te abraçando. Eu sei, . — derramou as palavras pelos lábios, avulso ao espanto e cuidado milimétrico que o médico aplicava para checar os monitoramentos, apenas focado em fazer aquela oportunidade valer à pena. — Eu sei, meu amor, porque eu também sei que você não quer que eu desista. Não se preocupe, meu dengo, essa nunca foi uma hipótese questionável para mim. — aproximou seus lábios do rosto de e percorreu-os por todos os ângulos dela, beijando cada elevação e detalhe de sua fisionomia, sentindo a familiaridade que aquele ato trazia para o seu coração. Ele não iria desistir daquilo. — Eu jamais irei desistir de trazê-la para casa, . O seu lugar é ao lado do seu filho, ao meu lado, correndo atrás de WonHan pelo jardim, impedindo que ele destrua as suas flores e lhe dando uma bronca quando a chuva começar a arrear e ele não querer sair do quintal porque lembra das histórias que eu contava sobre a mãe ser apaixonada por dançar na chuva. — beijou a testa dela. — Ele vai pedir para você ensiná-lo a dançar porque quer ser um bom dançarino igual o pai para poder encontrar uma mulher como você. — Ele beijou a ponta do nariz de . — Você vai arfar em negação com a colocação dele porque quer ser a única mulher na vida dele e, eu, sensato como sou, irei puxá-la pela mão e conduzi-la para a dança que WonHan quer tanto assistir. — beijou a sua bochecha direita. — Nós vamos dançar conforme o ar, conforme as gotas de chuva e conforme os gritos extasiados e alegres de WonHan. Ele vai se enfiar entre o nosso abraço apertado e pedir para participar da dança. — sorriu, beijando a bochecha esquerda de . — E nós vamos embalá-lo em nossos braços e dançar embaixo das nuvens porque, meu amor, nós construímos o nosso próprio céu e não posso permiti-la a não fazer parte disso. — olhou compenetrante para os lábios de . — Volte para dançar comigo, meu amor.
WonHan remexeu-se nos braços do pai e ele desceu os olhos para o bebê, envolvido com a densidade absurda que o filho armazenava nos glóbulos bem abertos. inclinou a cabeça para tocar na testa de WonHan e o filho esticou as palminhas de mão para tocar o pai, ou para selar a proximidade entre eles, brincando com as pontas dos dedos no momento em que tocaram os lábios de . A mão do filho tocou no lábio de , apalpando os rastros dos lábios de , aparentando sorrir em resposta para o pai.
— Ele está querendo um beijo seu também, . — revezou o olhar entre WonHan e . — Acho que alguém herdou o gene ciumento da mãe.
aproximou o rosto de WonHan do de , observando o filho esticar as mãos agora para tocar novamente o rosto da mãe.
— Essa é a sua mãe, WonHan. Linda, não? — WonHan expeliu uma espécie de choramingo e rondou a expressão do filho. As pálpebras de seus olhos se abriram vagarosamente à medida que o brilho se alastrava. No próximo segundo, WonHan chorou.
Uma lágrima solitária se desprendeu dos olhos de WonHan e patinou no espaço-tempo que o separava simbolicamente de sua mãe. A gota, adquirindo total forma e decolando para pousar no rosto sereno de , causou um reboliço no coração de e ele não piscou — ele não quis perder sequer um segundo daquele momento.
Foi por causa disso que conseguiu ter a graça de observar a lágrima se estacar na ponta do nariz de e rolar até traçar os delineados de seus lábios.
Depois disso, a gravidade entrou em plano secundário e estacionou no espaço. As seguintes frações de segundos fundiram um universo paralelo e se jogou naquela brecha do tempo, navegando entre a galáxia infinita que os olhos de trouxeram de volta ao seu céu.
choramingou alto ao vê-la abrir os olhos, vagarosamente, lentamente e preguiçosamente até se acostumar com a luz provinda das frestas das janelas e encontrá-lo de vez.
Os monitores retomaram a funcionar de acordo com a lentidão que teve para vislumbrar os olhos de . Dr. Lee Chang murmurou algo parecido com “inacreditável”, mas não teve tempo de concordar com o comentário do homem.
Sua esposa estava finalmente voltando para casa.
, primeiramente, olhou para o alto para compreender a origem dos raios ensolarados. Ela se questionou o porquê parecia estar sendo banhada pelo sol, ao ar livre, e perfurou aquela dúvida até um rastro de sombras emergirem no seu campo de visão e lhe fazer olhar para a direção da janela.
Nesse percurso seus olhos se esbarraram com os de .
O seu coração acelerou e teve certeza disso, não só porque ele parecia estar prestes a atravessar a sua pele, mas porque o monitor cardíaco ao seu lado soou assustadoramente alto. repousou a mão livre no peito de e a ajudou a entender que aquela visão era real.
estava ali.
Sorrindo para ela com lágrimas pesando as suas pálpebras, parecendo ter passado pelas brasas do Inferno e caminhado sob um dilúvio no corredor da morte.
Ele estava ali, cumprimentando-a de volta à vida, amparando o seu coração com o mero toque de sua mão.
estava chegando naquele momento de comoção, a um pé de desabar em lágrimas por estar vendo o seu amor novamente, depois de parecer ter ficado eternidades separados.
— Eu sabia que você voltaria para nós, meu dengo.
A mão livre suspendida de fez com que seguisse o trajeto e encontrasse um pacotinho de cobertas quentes em seu braço. O topo de uma cabecinha um pouco cabeluda emergiu entre o tecido e, como se ele soubesse que a sua mãe estava despertando, WonHan remexeu-se no colo do pai, contribuindo para que finalmente conhecesse o seu filho.
A mulher não tinha forças na garganta para libertar em palavras o que estava sentindo — seus olhos perambulavam por cada friso no rosto do filho, o seu bebê, o seu pedaço de céu, o seu motivo por não ter cedido ao sono profundo.
selou o corpo dos três com urgência, envolvendo em seu abraço enquanto os braços da mulher almejavam tocá-lo como se pudesse atravessá-los, fundi-los e torná-los um só. Os cabos em volta de seus braços dificultaram a situação, mas sempre fora habilidoso. Ele cercou com todo o cuidado, zelando pelo corpo frágil de WonHan, permitindo que cada um deles pudesse manter os olhos presos em sintonia e em um vínculo sublime à eles.
beijou o topo da testa de e, nos desenrolar dos segundos, não levou muito para alcançar os seus lábios. acreditou que, se fosse capaz alguém alcançar ou tocar o infinito, seria especificamente ele. Os lábios de eram o seu portal e, bem, ele os arrombou com fervor e suplícios derramados pelos seus lábios que ardiam em decorrência da sequência de encontros bruscos e angustiantes. Eles se cumprimentavam novamente, despejando o choque energético que os prendiam naquele irresistível prazer nostálgico.
A atmosfera abaixou misturando o peso do ar sufocado que respirava com os suspiros que escorriam pelos centímetros de nossas bocas.
choramingou quando colocou WonHan em seus braços. O filho se adaptou prontamente ao acolhimento que os braços da mãe lhe proporcionaram e ele brincou de segurar uma de suas mechas de cabelo enquanto dedilhava cada traço do filho. WonHan estava eufórico no colo da mãe, tentando à todo custo tocá-la cada segundo que gastava em seu abraço e chutando o ar, determinado a esboçar a sua alegria em estar ali com ela.
— Eu realmente pari um artilheiro. — desatou na risada ao ouvir o comentário da esposa, mas voltou a chorar por ter realmente a ouvido novamente. sentou na borda da cama e segurou entre os seus braços, ninando-a como ela fazia com WonHan, beijando abundantemente a sua cabeça. levantou o olhar para vislumbrar , dando-lhe um beijo apaixonado nos lábios. — Eu precisei voltar, . O céu pode ser tão lindo quanto imaginei, mas o que temos em terra firme é o paraíso que construímos para nós. , eu te ouvi. Eu estava prestes a não continuar te ouvindo, mas... — Larissa desceu os olhos para WonHan. — Eu o senti. Eu senti vocês me guiando de volta para casa.
E foi naquele momento que se deu conta de uma coisa.
O Retrato de Dorian Gray estava certo.
Há coisas na vida que são preciosas por não durarem.
E, aquela coisa na vida de , tornou-se preciosa por não ter durado, graças ao amanhecer que trazia a esperança de volta para o seu coração.




Fim.



Nota da autora: Com todo o prazer do mundo eu posso finalmente dizer: Estou em paz. Acho que esse foi o meu ficstape mais difícil de compor. Remoí dentro do mim o plot por um tempo interminável, estava quase largando de mão e desistindo dele, mas pelo Youngbae (e por mim) eu persisti. A dificuldade veio e empacou no meu caminho porque tô meio que passando por um momento de bloqueio literário, deve ser pela carga de trabalhos que me envolvi nos últimos meses, mas piorou porque eu designei um plot MUITO mais desafiador do que eu esperei. A ideia inicial era seguir a fic com um único rumo, certeiro e irrefutável, mas no andar dos dias eu percebi uma coisinha cutucando o meu coração e pedindo por um rumo alternativo. Não tive coragem de finalizar da forma que eu quis desde o início, mas acho que era esse o caminho que eu precisaria seguir para pelo menos estar em paz quanto ao final. Não fiquei 100% satisfeita com o desenvolvimento da fic (pq sou essa control freak que é muito perfeccionista e nunca acha que tá tudo consideravelmente bom), mas meu coração tá tranquilo em saber que eu tentei ao máximo conduzir com a música e honrar o meu desejo pessoal.
Tô mega realizada por fazer parte desse ficstape porque o Youngbae é um dos meus artistas favoritos de todo o mundo e eu precisava participar dessa dedicatória para ele. Antes que eu chore um pouquinho mais, quero agradecer ao espaço que o FFOBS sempre me dá e pelo carinho em proporcionar mais outra oportunidade. Obrigada, FFOBS! ♥
Agora, para você que chegou até o final dessa fic e está lendo isso: meus mais sinceros “obrigados”. Eu não tenho palavras para explicar o quanto isso significa para mim, obrigada por ter dedicado um tempo da sua valiosa vida para acompanhar a estória desses PPS. Espero não ter te decepcionado! Obrigada pela presença! ♥ Nos encontramos no próximo ficstape, na próxima fic ou pelos ‘corredores’ desse mundão do FFOBS! We are one! ♥
E também, quero agradecer especialmente a Carol Mioto, a beta da vez, por ter feito um trabalho tão incrível e ter me dado uma dose de encorajamento para a fic vir ao site. Se essa fic tá aqui, no site, é também por causa do trabalho da Carol e de sua contribuição para que eu pudesse compartilhar a estória. Mil vezes obrigada, Carol, por ter feito isso por mim e por todas nós do ficstape! YOU ROCK! ❤"



Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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