Finalizada em: 11/04/2021

Capítulo Único

I got the music back inside of me♫❤




Os fones de ouvido estavam presos comigo como se fizessem parte do meu corpo enquanto eu observava o tráfego de carros passar pela minha janela e imaginava qual seria probabilidade de saltar daquele carro sem ter alguma contusão grave, e quando calculei que as chances eram pequenas, vislumbrei PJ me olhar desconfiadamente pelo maldito retrovisor assim que o sinal fechou.
— Qual é, você não acha mesmo que eu teria coragem? - respondi de forma cansada e recebi mais um olhar daqueles que dizem “eu tenho absoluta certeza que você faria isso”. — Tudo bem, tudo bem. Você venceu, eu não vou estragar esse rostinho lindo pulando de um carro em movimento.
— Assim eu espero, senhorita. - PJ proferiu e voltou seu olhar para o volante, começando a acelerar assim que o sinal abriu.
Peter Jr. era nosso motorista particular e filho de um dos funcionários mais antigos dos Colucci, minha família. Meu avô, Franco, contratou seu pai quando minha mãe ainda era uma garotinha e ele trabalhou conosco por um bom tempo, até se aposentar e morrer alguns anos depois que nasci, então, nada mais sensato do que ter seu filho conosco.
Percebi que o carro em que eu estava começou a desacelerar aos poucos e imediatamente eu soube que estava próxima ao meu destino, aquele em que modificaria não apenas o meu passado, como também, meu futuro. E, aquele que eu não estava nem um por cento de acordo.
Quando o barulho do motor do carro cessou, percebi que estávamos estacionando em frente a uma fachada de madeira escura com os dizeres "Academia Elite Way School” estampados em preto e eu soube que a partir daquele momento, não haveria mais volta.
A EWS era uma faculdade particular e um semi-internato, que por sinal, era muito procurado e prestigiado por jovens ricos do México, anos atrás ela era apenas um colégio, mas agora, além de ter ensino superior, se tornou uma academia de jovens artistas. O currículo da Academia Elite Way School ia muito além das disciplinas comuns. Aqui havia música, dança e muita arte. O único problema disso tudo era que eu não queria estar dentro dela, preferia estar a quilômetros de distância junto aos meus primos Nina e Lucca.
— Chegamos, senhorita. - a voz de PJ irrompeu dentro da SUV e me fez despertar.
— Tem certeza disso? - questionei e PJ apenas me lançou mais um de seus olhares reprovadores. Para um cara grisalho, ele ainda sabia bem como manipular as pessoas com um olhar. — Tudo bem, tudo bem... Eu só achei que deveria estar escrito “prisão” ao invés daquilo ali.
Apontei para os dizeres em preto e PJ rolou os olhos.
— Vamos lá, , quanto antes sair do carro, mais cedo voltará para casa. - proferiu e eu ponderei por alguns segundos antes de pegar meu smartphone e descer do automóvel. PJ abaixou o vidro e colocou os óculos escuros como em homens de preto.
— Deixarei suas coisas com o responsável. – agradeci, me curvando ironicamente, e eu tinha certeza que PJ estaria rolando os olhos debaixo daquele óculos escuros. — E, Colucci...
Voltei meu olhar para o motorista.
— Você sabe a quem ligar se precisar...
Eu sorri, no fundo PJ só tinha a camada externa durona, porque, por dentro, era firme e forte como uma gelatina, e com isso, vi a SUV se distanciar.

(...)


Havia uma aglomeração em frente aos portões maior do que eu imaginava e uma centena de alunos vestidos como eu discorriam alegremente uns com os outros, alguns desciam apressados a escadaria para se encontrarem com algum colega antigo, enquanto outros apenas observavam perdidos toda aquela movimentação maluca naquela manhã de segunda-feira, enquanto eu tentava passar despercebida a qualquer custo.
Soube que falharia miseravelmente quando vislumbrei passos em minha direção.
— Colucci. - o garoto de cabelos bagunçados vinha em minha direção e usava camisa branca com os botões de cima abertos e a gravata vermelha estava frouxa no pescoço.
— Bustamante. – respondi, sem muita vontade, e esperei que ele fosse embora, mas no fundo, eu sabia que ele não iria. Por isso, comecei a andar.
Bom, dei três passos pelo menos.
— Qual é, . - ele veio ao meu encalço. — Vai mesmo me ignorar? Pelo menos uma vez na sua vida tem que fazer algo que não goste, barbie girl.
— Já não acha o suficiente ter que ver você todos os dias? - respondi e sorriu, aquele maldito sorriso que me irritava a cada festa de família e como se não fosse o bastante, agora me cercaria durante os dias no maldito internato.
Nem éramos parentes de verdade, porque tinha que aturá-lo tanto?
— Você bem sabe que sou o ponto alto desse internato, não é? - respondeu e eu rolei os olhos, me aproximando.
— Perfeitamente, Bustamante. - ironizei e cheguei perto o suficiente para que meus dedos tocassem sua gravata e meu lábio estivesse próximo de sua orelha. — Agora ajeite essa gravata e fique bem longe de mim.
Vi os pelos de sua nuca se arrepiarem e sorri por ter surtido o efeito esperado, e então, assim como me aproximei, me distanciei sem olhar para trás.
— São só três anos, barbie, e você não vai se livrar tão fácil de mim.
teve de proferir um pouco mais alto já que eu estava alguns metros de distância dele e eu não ousei me virar. Ignorar Bustamante era simples, já que desde o primeiro dia em que meus olhos ficaram presos aos dele, tive a certeza que ele me traria dor de cabeça, era fácil ficar longe de quem adorava quebrar regras.

(...)


O auditório ficava do lado oposto dos dormitórios da academia e minha missão de passar despercebida estava fluindo particularmente bem, já que a ideia de deixar para visitar o dormitório por último e se esgueirar por entre os corredores do internato até o auditório havia sido feito com maestria.
Enquanto acadêmicos veteranos circulavam de um lado para o outro, preparando a decoração de "boas-vindas'', eu me limitei em apenas colocar meus fones de ouvido e circulei o vasto e vazio auditório até achar um lugar confortável ao fundo, o qual continha apenas dois lugares, e deixei que meus olhos percorressem sobre a pequena movimentação do local, pois tanto do lado de fora como o de dentro, os veteranos ocupavam um tipo função, trabalhando de forma árdua.
Fazia alguns minutos que observava todo aquele cenário de vai e vem, aguardava sentada sobre uma poltrona azul marinho e tateava o smartphone passando musicais aleatoriamente, e pelo horário que a tela do mesmo indicava, demoraria mais alguns minutos até o evento começar de fato. Foi aí que a melodia e a batida calma vindas do meu fone de ouvido tomaram conta do meu ser e eu simplesmente cai em um total e profundo sono.
Bom, pelo menos por alguns minutos.
— Droga! - o urrar de raiva me fez despertar e assim notei que alguém havia acabado de tropeçar bem ao meu lado. Provavelmente foi minha culpa. Espiei de canto de olho e tentei fingir que ainda estava dormindo. — Eu vi que você abriu os olhos.
Merda. Fui pega. Apesar de estar com os fones de ouvido ainda, consegui ler nitidamente seus lábios.
— Você tropeçou no meu pé e me fez acordar... – resmunguei, tirando os fones, e fixei meu olhar no rapaz à minha frente. Ele tinha a pele clara e olhos estupidamente verdes, daqueles que nos hipnotizam e que a gente sabe que tem que desviar para não ficar completamente rendidos a ele. — Pensou mesmo que eu não fosse abrir os olhos?
Ele me olhou de forma significativa e eu recuei o meu olhar.
— Bem, então estamos quites, não é? - ele perguntou e eu ponderei por alguns segundos, lembrando que de fato estávamos, já que apesar de considerar que o rapaz em minha frente tinha um certo grau de cegueira, ele ainda havia tropeçado nos meus pés.
— Justo. - respondi e me ajeitei na poltrona, vendo que um porção considerável de estudantes começava a chegar no local, mas para a minha surpresa “o senhor olha menos e anda mais” sentou-se ao meu lado. Olhei para ele por alguns segundos e vi que o mesmo remexia seu smartphone sem dar muita importância de estar perturbando a minha paz. — Cof, Cof...
— Precisa de alguma coisa? - ele jogou seu olhar de canto e indiferença para mim, e sim, eu quis matá-lo por ainda estar sentado ao meu lado. O que uma garota precisava fazer naquela escola para ter um pingo de paz?
— Muito perceptivo, agora, vai mesmo continuar sentado aí? – perguntei, deixando óbvio que sua presença (ou de qualquer outra pessoa) era um grandíssimo incômodo.
Não me entenda mal, não sou antissocial ou algo do tipo, minha mãe era Mia Colucci e introversão não fazia nem de longe o nosso forte. Era apenas todo aquele ambiente. Depois de tudo, eu não queria estar na Elite Way School e nem criar laços dentro dela.
Me tirando de qualquer tipo de concentração, vi o rapaz ao meu lado balançar a cabeça em afirmação. Arqueei uma sobrancelha e comecei a me ajeitar para levantar. Se ele não fosse sair dali, eu o faria.
Hasta la vista, então. - comecei a me movimentar e parei quando senti um toque singelo no meu braço. Me virei apenas para dar de cara com o mesmo incômodo.
— Receio que você não tenha mais escolha. - ele apontou para frente com a cabeça. E de fato, eu não tinha. Em questão de segundos, o auditório tinha ficado lotado. Achar um lugar naquela altura seria como procurar agulha em um palheiro.
— Vamos lá, vamos começar de novo, afinal, é o mínimo que devemos fazer já que vamos passar mais de uma hora sentado juntos.
Dei de ombros e me sentei novamente enquanto o rapaz esticava sua mão em minha direção.
— Eu sou , de la Riva. - ele sorriu. — E você seria...
— Eu... - ponderei por alguns segundos, relutante se deveria ou não dizer quem eu era e então estendi a mão até a dele. — Eu sou Colucci Arango.
Ele franziu o cenho.
— Mas é claro! A semelhança com seus pais é nítida. - respondeu de forma singela e eu simplesmente soube o que viria a seguir. — O que aconteceu com eles foi... Quero dizer, sinto muito por...
Eu balancei a cabeça para interrompê-lo. Já havia presenciado aquele olhar de piedade diversas vezes e secretamente, aquilo já não mais me importava, eu simplesmente não queria que as pessoas continuassem a sentir pena de mim e que relembrassem a cada segundo da tragédia que aconteceu. Em um ato involuntário, coloquei a mão na cabeça, sentindo a pequena cicatriz que marcava o dia do acidente e como em um passe de mágica o som da voz dela preencheu meus ouvidos e tive que me concentrar para não deixar que meus olhos marejassem.
— Bom dia, eu sou Alice Salazar, a diretora da academia. Gostaria de desejar um bom dia para todos e iniciar com alguns avisos paroquiais. Como bem sabem, nessa instituição a cada início de ano, forma-se uma nova geração de alunos. - a voz aguda vinha do palco do auditório me fez concentrar a minha atenção na mulher que estava nele. — Esses alunos não só aprendem disciplinas do continuando de uma faculdade normal, como também aprendem com disciplinas voltadas à artes e exatamente por esse motivo que suas rotinas serão rígidas...
Alice era uma mulher magra de estrutura média e provavelmente tinha a mesma idade que minha avó, Alma, porém, bem diferente de Alma Rey, ela esbanjava confiança com seus cabelos grisalhos. conhecia Alma tão bem quanto conhecia sua mãe, Mia, e sabia que qualquer uma das duas daria um chilique ao ver um fio branco.
A diretora apresentava o corpo docente ao discente e, com uma meia dúzia de slides, mencionava os aspectos positivos da academia assim como o porquê da mesma ser o local de ensino mais procurado de toda a Cidade Del México. Eu permanece entretida com o meu celular, ignorando o discurso motivacional, e, é claro, o garoto ao meu lado, sentindo que aquilo tudo era uma grandíssima perda de tempo, até que algo me chamou atenção.
— ... Apresentação essa em que todos os novos acadêmicos têm o dever de participar. Afinal, será a partir dela que descobriremos seus talentos e se realmente são merecedores de estudar aqui, porque mais que um internato, a Academia Elite Way School é uma escola de jovens artistas e vergonha não fazem parte do nosso conceito. - ela sorriu mesmo que soubesse que seu discurso não era um dos melhores. — Então, formem seus grupos ou criem suas técnicas individuais, mas se preparem para o grande dia!
— Belo discurso, não acha? - murmurou próximo ao meu ouvido como se estivéssemos fofocando sobre o cabelo de alguém. — Lindo, poético e um pouquinho assustador.
Eu dei um breve suspiro. Ele estava tentando puxar assunto e algo me dizia que não desistiria tão fácil, respondê-lo não podia fazer tanto mal assim, não é mesmo?
— Eu diria que foi um tanto apavorante e inspirador. - murmurei de volta e começamos a rir discretamente.
Passamos o restante da apresentação do corpo docente conversando sobre coisas aleatórias de nossas vidas, como por exemplo, o fato de ser o segundo ano de na conceituada Elite Way e até arriscamos uma “rodada relâmpago" com perguntas e respostas rápidas de coisas que gostávamos e De la Riva além de confessar que comia sorvete em qualquer hora do dia, também tinha uma irmã gêmea que estudava ali. Tivemos certa cautela para não atrapalhar ninguém, mas toda aquela discrição não foi o suficiente para não recebermos olhares irritados sobre nós do banco da frente e eu estaria sendo uma completa hipócrita se dissesse que éramos totalmente discretos.
Percebi que estava ficando boa de verdade em me esgueirar pelos corredores da Elite Way quando, quase ao final da palestra, desci as escadas e sai pela porta sem que ninguém do corpo docente percebesse o ato. Provavelmente o fato da porta do local estar aberta e a pouca iluminação do ambiente haviam colaborado para que isso acontecesse, mas eu jamais admitiria aquilo.
Assim que cheguei na ala de dormitórios femininos, verifiquei no smartphone a numeração correta do meu quarto e segui pelo corredor, não demorando muito para encontrar a porta de madeira clara com a numeração preta indicando que eu estava no lugar certo. Sorri por ele não ser o último daquele extenso corredor e quando estava prestes a girar a maçaneta, alguém abriu a porta primeiro, pregando-me um susto.
— Hey, me desculpe, não sabia que você estava aí. - a garota na minha frente tinha a voz serena e os seus olhos claros eram brilhantes como uma noite cheinha de estrelas. Ela tinha os cabelos escuros soltos com ondulações que caiam como cascata sobre o seu ombro. A garota era maravilhosamente linda e eu tinha certeza que ela despertava inveja naqueles corredores. — Que péssimos modos os meus, desculpe por não me apresentar, eu sou Goycolea e você deve ser a minha colega de quarto, certo?
esticou a mão em minha direção e ainda mantinha um sorriso largo em seu rosto. Algo me dizia que eu iria gostar dela.
— Isso mesmo. - apertei sua mão. — Eu sou Arango Colucci, mas pode me chamar de .
— É um prazer conhecê-la, .
Percebi que Goycolea não havia mudado a forma como me olhava e aquilo era novo para mim, já que há muito não via as pessoas não se surpreendendo com meu sobrenome.
— É um prazer também, . - respondi de forma singela e ela me deu espaço para entrar. — Você não estava na apresentação?
— Eu? Ah, não. Já ouvi toda aquela baboseira no ano passado. Mas me diga, Alice ainda continua amedrontando os novatos?
— Você nem imagina. - respondi enquanto a se sentava sobre uma cama ao lado da porta recém fechada. Foi apenas naquele momento que pude perceber como o nosso quarto era grande, havia quatro camas distribuídas por ele, duas do lado da porta e outras duas em frente a essas, lençóis cor de rosas as cobriam e combinavam perfeitamente com a cor creme das paredes. Fiquei me perguntando qual delas era a minha e como se lesse os meus pensamentos, a voz da garota irrompeu
— A sua é aquela ali. - apontou para a cama em frente a sua, ela ficava ao lado da escadaria em espiral que, pelas minhas contas, levava direto para o nosso armário de roupas. Coloquei a pequena bolsa que havia carregado comigo naquela manhã em cima da cama e aproveitei para tirar os fones de ouvido e guardá-los dentro dela. — Usá-los foi uma boa ideia. - apontou para o fone. — Deveria ter pensando nisso no ano passado, seria bem mais vantajoso dessa forma, você sabe, ouvir música parece-me ser bem mais atrativo do que as declarações de Alice.
Eu sorri. A maneira como a garota falava era divertida e talvez tê-la como colega de quarto iria fazer meus dias na academia ser um pouco mais toleráveis.
— No início eu usei eles sim e confesso que foi tão reconfortante que cheguei a pegar no sono. - proferi e tirei uma sutil gargalhada da garota sentada à minha frente. — E isso seria perfeito, se não tivesse sido interrompida por alguém mais desastrado que eu. Eu poderia reclamar por ele ter me atrapalhado, mas acontece que ele magicamente se tornou útil como distração e quando eu vi, a palestra de Alice passou rapidamente. Poderia até arriscar que se ela propusesse uma apresentação musical dos professores, seria mais emocionante com ele ali. Eu só me esgueirei pelos corredores antes que isso acontecesse.
— Hum, então temos um amor à primeira vista, não? Ou seria melhor dizer “crush”? - mordi o lábio inferior com o comentário, porque mesmo que não houvesse cogitado aquela possibilidade, não poderia negar que De la Riva era absurdamente atraente, a começar por aqueles olhos que mais pareciam terem sido feitos exclusivamente para ele.
Seria insanidade dizer que não tive um pouquinho de atração por ele, isso é claro, depois que toda a raiva de ter me acordado passou.
O olhar de animação de fixo sobre mim me fez despertar.
— Definitivamente, não! Estou evitando problemas esse ano e com certeza aquele garoto é a definição disso. - proferi de forma afetada e começamos a rir.
— E qual seria o nome desse boy problema? - perguntou entre as risadas e eu me sentei ao seu lado.
De la Riva. - respondi quando finalmente conseguimos cessar a risada e vi o cenho da garota franzir automaticamente. Havia dito algo de errado? — O que aconteceu?
— Você, minha querida colega de quarto, está ferrada. - proferiu ainda com o cenho franzido, mas logo deu espaço a um sorriso bobo. Eu permaneci a observando de forma confusa, porque de fato aquela reação era totalmente novidade para mim e, novamente, como se tivesse uma bola de cristal que desvendasse o que eu pensava, a voz de irrompeu meus pensamentos.
— Não entenda mal, conheço o . Mas, sendo bem sincera, também conheço a irmã dele e se eu estiver certa quando pensei que você é uma pessoa legal, com certeza não irá gostar da garota, a menos que você seja daquele tipo de pessoa estilo masoquista, porque duvido muito que conviver com Pietra seja diferente disso, fora o ato sexual, conviver com ela é se entregar para dor física, ao sofrimento e a humilhação.
— Hum, tentador, mas passarei longe disso. - respondi e voltamos a gargalhar.

(...)


Na segunda-feira da próxima semana, as aulas oficialmente começaram na prestigiada Elite Way. Eu tinha acordado cedo naquela manhã, meu despertador marcava seis horas e se fosse em outra ocasião, eu o jogaria longe. Porém, apesar das circunstâncias, naquela noite eu dormi bem e uma boa noite de sono, como minha mãe sempre dizia, era revigorante e extremamente necessário. Cocei os olhos e um bocejo rapidamente saiu da minha boca e ainda levei alguns segundos me espreguiçando sobre a cama até me levantar e percebi que como de costume, não.

Se existia uma coisa que eu tinha aprendido durante a última semana, era que a morena podia ter o sono bem pesado se quisesse, mas hoje era hora daquilo mudar. Peguei o celular de posto em sua cômoda e armei o despertador para tocar dali a alguns minutos, colocando-o em volume máximo e com a música mais desagradável que consegui escolher, e então, fui para o banho.
Provavelmente ela surtaria comigo mais tarde e o barulho de algo pesado caindo ao chão, seguido por um “Colucci, EU VOU MATAR VOCÊ” só afirmava isso, ainda assim, eu sabia que ela me perdoaria. Tinha feito aquilo por uma boa causa e ela sabia disso. A sensação da água caindo pelo meu corpo era revigorante, com os olhos cerrados, uma sensação de alívio passou por mim e então notei que minha colega de quarto havia colocado música, foi o estopim perfeito para que o chuveiro virasse meu palco particular.
Minutos depois, eu e já estávamos vestidas com o uniforme habitual e nos encontrávamos fora do dormitório, descendo as escadas do salão principal da academia em direção aos nossos armários, que impressionantemente, ficavam um do lado do outro. Depois do meu primeiro dia, descobri que os mesmos eram escolhidos de acordo com os quartos, por isso, ao nosso lado ainda havia dois armários vazios indicando que nosso quarto ainda não estava completo.
Prestes a fechar o meu, senti uma mão tocar sutilmente o meu ombro e estranhei porque sabia que estava com as suas duas ocupadas. Virei-me para ver a quem a mão pertencia e rolei os olhos quando identifiquei ser o Bustamante.
— Olá, raio de sol. - proferiu a mim de forma animada e eu permaneci com um cara nada amigável, afinal, a visão em minha frente não era animadora, e como se não bastasse, ela piorou ainda mais quando percebi virar para e envolvê-la em um abraço.
— Isso é sério? - vi minha boca deixar as palavras saírem com surpresa e cruzei os braços observando minha colega de quarto e o irritante garoto da minha família.
— Qual é, barbie girl, deu para sentir ciúmes agora? - Bustamante provocou e eu rolei os olhos.
— Você está delirando, , apenas fiquei surpresa. - dei de ombros. — Não esperava que vocês se conhecessem. Mas, suponho que a goste de fazer caridade...
A garota tentou reprimir um riso nasalado pelo comentário anterior, mas não se intrometeu na nossa discussão, provavelmente entendia que quando se tratava de apartar a briga entre e eu era uma guerra perdida.
— Nem todas as pessoas têm a cabeça fora do eixo e o coração gélido como você, sabe? Além disso, Goycolea é esperta demais e sabe escolher muito bem as melhores pessoas para ser amiga.
— Fora o fato de nossos pais serem amigos. - a voz da garota interrompeu e rolou os olhos.
— É, isso também. - deu de ombros. — Agora, , seja boazinha e venha cá. Ele abriu os braços e sinalizou com a cabeça para que eu fosse abraçá-lo, primeiro eu resisti, mas depois me dei por vencida e acabei abraçando-o de uma vez. — Viu, não foi tão ruim assim, foi? Se quisermos ser os próximos rei e rainha deste lugar, deve parecer que gostamos da companhia um do outro, mesmo que seja mentira. Agora me conte, Colucci, já decidiu o que vai apresentar na celebração de boas-vindas?
Bingo, sabia que a bomba estava armada, mais uma provocação e eu acabaria com a raça desse bonequinho.
— Oh, escolher? - ri ironicamente. — Eu nem mesmo vou apresentar, essa não é a minha praia. - vi e franzirem o cenho e Bustamante lançar um olhar duvidoso sobre mim. — Não me olhe dessa forma. Você me conhece, eu sempre fiz o estilo rebelde.
— Bem, de fato você faz e é. - proferiu. — Ainda assim, achei que ia gostar da oportunidade.
— Bem, você achou errado. – respondi, fechando a porta do armário com meus livros em mãos.
, já faz um ano...- ele falou com cautela. — Eu sei que não é a mesma coisa sem seus pais, mas você tem que parar de se esconder e deixar que a música volte para a sua vida.
Respirei fundo, definitivamente não estava afim de adentrar naquele assunto.
— Sabe, acho que devo concordar com ele... - proferiu e eu rolei os olhos. Mais uma, não!
— Não me diga que está determinada a perpetuar com isso, ? - perguntei à garota, que mordeu o lábio, pensativa. — Sério mesmo, o que é isso? Uma intervenção ou algo do tipo?
Perguntei, irritada, e vi respirar fundo.
— Apenas nos preocupamos com você, entende? - falou. — E você não precisa agir de forma agressiva...
— Talvez a minha forma “passiva, agressiva” seja o jeito que tenho de fugir desse assunto. Aliás, aprecio a sua boa vontade, mas, estou dispensando-a agora, obrigada!
Finalizei, deixando meus dois amigos de lado e marchando de volta para o meu dormitório, afinal, depois daquela conversa, a aula não me atraia mais. Assim que cheguei ao quarto, coloquei os fones de ouvido e prontamente peguei no sono, não me importando que sentissem a minha ausência, mas, o cochilo durou apenas alguns minutos. Depois de estar desperta, fiquei em torno de uma hora fazendo absolutamente nada, até que ouvi alguém batendo à minha porta, mas é claro que não precisaria daquele ato, já que a pessoa que bateu era , ela tinha chave e eu tinha certeza que havia feito apenas por cordialidade
— Hey, você perdeu duas aulas... - sua voz era cautelosa e eu me senti um pouco mal por ter falado de forma grosseira antes. Mordi o lábio inferior e sinalizei para que ela se sentasse ao meu lado.
— Ei, me desculpe por ter falado daquele jeito com você...
— Tudo bem, aliás, falei que você estava com uma bela dor de barriga. - respondeu e eu arregalei os olhos.
— Por Deus, , me diga que você falou isso apenas para o professor? - perguntei de forma ansiosa e a vi concordar com a cabeça. Depois do susto inicial, começamos a rir. — Senti sua falta essa manhã.
— Também senti a sua. - proferiu. — Aliás, , também gostaria de me desculpar por antes, me contou o que aconteceu com os seus pais, eu realmente sinto muito e não queria magoar você. - a garota falou de forma singela e eu sorri fraco, mas em uma declaração de que estava tudo bem. De fato estava, era uma pessoa iluminada e sabia que ela não havia feito por mal, até porque eu devia confessar que tanto ela quanto queriam apenas o meu bem. — Ainda assim, gostaria que você visse isso.
Foi a primeira vez durante aquela conversa que percebi o envelope em suas mãos, ao qual ela esticou para mim.
— Abra. - proferiu e eu prontamente o fiz. Dentro do envelope continha uma foto de aparência antiga e com o estilo polaroid e nela havia três jovens adolescentes, todas usavam o uniforme da Elite Way e eram um pouco mais novas que eu e . A garota da esquerda tinha o cabelo loiro, curto e com as pontas rosas, enquanto a da direita não tinha o corpo parecido com as outras duas, mas ainda assim, era linda e a cor de seu cabelo pendia para o ruivo. Foi apenas olhando de forma mais atenta que percebi quem estava ao meio.
Mia Colucci, minha mãe.
— Como você... – comecei, mas não foi necessário continuar, já havia entendido.
— Encontrei essa foto no primeiro ano, quando estava guardando minhas roupas. - franzi o cenho sem entender direito o que aquilo significava. — , eu encontrei essa foto aqui, entendeu? Esse era o quarto de sua mãe.
Aquelas palavras serviram como um perfeito estopim para que eu voltasse à realidade ao qual me encontrava. Eu estava no quarto de minha mãe, na escola onde ela conheceu meu pai e viveu os melhores três anos de sua vida, mais que isso, foi aqui que ela solidificou seu amor por música, e agir da forma como eu estava agindo, fugia totalmente do que havia sido ensinada ser.
Deveria ser corajosa. Minha mãe era uma pessoa vaidosa, idealista, leal e compreensiva, e mais que isso, ela era uma pessoa extremamente determinada. Não deixaria que seus sonhos fossem interrompidos por medo ou tristeza. Eu teria que enfrentar minha realidade, sei que eles gostariam de me ver feliz, meus pais me amavam e o amor era a melhor coisa que se poderia ter e eu sempre teria o deles.
Instantaneamente a música que tanto ouvi minha mãe cantar pairou em minha cabeça. Era inútil lutar contra e como se todo o peso da frustração anterior saísse dos meus ombros, eu soube que só havia uma coisa a fazer.

(...)


Inspira, respira, inspira, respira. Mentalmente eu repetia o mantra enquanto me direcionava para o pequeno e sutil anfiteatro da academia que eu havia descoberto em uma das minhas fugas da semana passada. Sabia que a caminhada até lá era longa e mantive cautela para não ser pega e, também, para verificar se o local estava vazio.
Comemorei por estar de fato sozinha e não demorei muito para me sentar ao piano que estava posicionado ao centro do palco e instantaneamente a música criou vida em minha cabeça.
A lembrança da voz da minha mãe cantando-a para mim serviu como um perfeito estopim e então torcia para que tudo desse certo, eu sabia aquela música de cabeça, e ao respirar fundo, coloquei em prática tudo aquilo que havia aprendido um dia.
Extrañarte es mi necesidad, vivo en la desesperanza desde que tú ya no vuelves más. - cantava suavemente enquanto a batida tomava conta de mim, fazendo com que minha mão se movesse com agilidade sobre o piano, a sincronização dos sons era tão bonita que fazia com que a música fosse perfeita para ser tocada sobre o piano. A música estava fixa em minha cabeça, como se a letra tivesse passado um milhão de vezes pelo meu cérebro, eu a sabia. — [...] Poco a poco el corazón, va perdiendo la fe perdiendo la voz.
Estava tão perdida ao ritmo da música que nem reparei que alguém havia chegado, e assim que o vi, cessei a música e, pela primeira vez, sorri, afinal, alguma coisa parecia ter mudado, eu finalmente tinha a música de volta dentro de mim.
— Você gostou? - perguntei de forma sutil, convidando-o para que se aproximasse.
— Se gostei? Isso me parece incrível, . - sua voz era animada. — Sempre soube que uma hora ou outra você ia me aceitar como a sua inspiração, barbie girl. - brincou e lhe dei um soco no ombro.
— Esse é o seu jeito de dizer que você é a coisa mais importante da minha vida? – questionei, o fazendo rir.
— Não tenha dúvidas. - respondeu e eu lhe dei a língua. — Está finalmente pronta para deixar a música voltar para a sua vida?
Eu sorri, balançando a cabeça em afirmação, e naquele momento, me dei conta que o sorriso de Bustamante era o mais bonito que eu já havia visto na vida.
— Vamos lá Colucci, toque para mim.
Ajeitei-me no banco e dei espaço para que Bustamante se sentasse ao meu lado, me posicionei com delicadeza os dedos sobre as teclas do piano e pouco a pouco as notas foram saindo. começou a se familiarizar cada vez mais com a melodia e não demorou muito para que nós dois estivéssemos cantando em uníssono.

Sálvame de la soledad
(Sálvame del hastío)
Estoy hecho a tu voluntad
(Sálvame del olvido)
Sálvame de la oscuridad
(Sálvame del hastío)
No me dejes caer jamás



Finalmente a música estava dentro de mim, mais forte do que nunca.



Fim!



Nota da autora: Sem nota.

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Nota da beta: Mas agora eu quero maisssssssssssssss! Ficar nessa vibe RBD é simplesmente INCRÍVEL, meu Deus! Sério, é tão bom sentir essa nostalgia e com personagens tão legais! Amei a relação com a música, os acontecimentos, tudo! Incrível 💙

Qualquer erro nessa atualização ou reclamações somente no e-mail.


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