Finalizada em: 29/06/2021

Capítulo Único

, por favor, não faz isso. – Eu falei, tentando me colocar entre a porta e ela.
, por favor, me deixa passar. – Ela me respondeu, sem olhar nos meus olhos. Aquilo doeu mais do que eu poderia imaginar.
, por favor...
– Não adianta insistir. – Ela me cortou. – Você me ouviu. Ninguém nos quer juntos. Pra que insistir em algo que não vai dar certo?

Eu queria ter o que falar para impedi-la, mas eu não pude dizer nada. Nada. E, por causa desse erro de fração de segundos, eu a vi sair do quarto.
Naquele momento eu percebi o imenso erro que eu havia cometido.
E pensar que mal havia um mês que eu conhecera . Eu estava hospedado no hotel em que ela trabalhava no serviço de quarto. Um pedido entregue em uma noite e desde então todas as noites eu arrumava um motivo para trazê-la ao meu quarto, até que eu a convenci a ficar. Não pude deixar de me sentir atraído pela mulher linda que ela era, mas, aos poucos, comecei a me sentir cativado com seu jeito de ser, tão diferente do meu.
Enquanto era uma trabalhadora que lutava pelo que era seu e bancava a durona para conquistar seu espaço, ela tinha um lado manhoso e sensível e, sem que eu pudesse evitar, ela foi me cativando.
Mas eu sabia que nossas realidades eram opostas. Meu pai era um deputado rico e, desde que eu me entendia por gente, me criava para seguir seus passos, mesmo que eu nunca tenha me mostrado favorável a isso. Em contrapartida, eu me abstive muito e deixei meu pai levar essa situação adiante.
Agora, dali a dois meses, eu oficialmente seria um candidato a deputado para as eleições. E era literalmente a última coisa que eu queria pensar porque aquilo arruinara tudo.
Naquele dia, havia dormido comigo, como nos anteriores, mas tinha que acordar cedo para trabalhar. Eu oferecia que ela usasse o despertador do meu celular, já que o modelo mais antigo dela às vezes desligava sozinho.
Quando o despertador enfim tocou, ela se levantou disposta e resignada, enquanto eu me espreguiçava na cama e meu olho ameaçava fechar novamente.

– Meu bem. – sussurrou no meu ouvido e ali eu me senti muito desperto, o coração acelerado e o corpo na expectativa. Aquele era o efeito dela sobre mim.
– Hm. – Eu resmunguei em resposta, puxando-a para cima de mim. Ela soltou uma das suas maravilhosas risadas, antes de se desvencilhar.
, me ouve. Seu pai te mandou um áudio. Pode ser sério.

Bufei, irritado. Eu queria que não fosse algo assim. Queria que ela pudesse ficar comigo e não que eu tivesse que lidar com algum almoço chato que ele provavelmente marcara. Mas a realidade fazia com que trabalhasse e eu frequentasse almoços ridículos.

– Pode clicar pra ouvir, por favor? A voz irritante dele vai me ajudar a acordar.
– Você é um mimado. – Ela replicou, dando um beijo de leve na minha testa, antes de colocar o áudio no volume máximo.

“Garoto, o Paolo acabou de me contar que você faltou o jantar com a família do prefeito. Que porra é essa, ? Tá achando que é sacanagem isso aí? Que tá aí só de férias? E tudo por causa de uma criadinha? Você sabe que eu nunca te impedi de se divertir por aí, mas vai deixar uma pobre putinha qualquer acabar com seu futuro, seu inútil? Come ela outro dia, garoto, não na hora dos compromissos. É bom isso não voltar a acontecer.”

Meu corpo inteiro estava tenso. Qualquer doçura presente no momento anterior havia se desmanchado em completa raiva. Eu já estava acostumado com meu pai pegando pesado comigo. Estava acostumado em ser chamado de inútil, mimado, idiota e termos muito piores.
Mas ele não tinha o menor direito de falar sobre .
Para piorar, quando ergui meu olhar para ela, percebi seus olhos arregalados contendo algumas lágrimas. E aí a raiva virou simplesmente dor porque ela de jeito nenhum merecia aquilo.

. – Ela disse em um sussurro. – É melhor eu ir.
– Meu bem...
– E acho melhor eu não voltar essa noite.
Aquilo foi a gota d’água para desesperar meu coração.
, meu pai é um idiota, você sabe que eu nunca pensaria nenhuma dessas coisas de você e...
– Mas enquanto eu estiver aqui – ela me interrompeu –, você vai escutar isso direto. Eu não quero isso pra você. E nem pra mim.

Sua fala me deixou sem jeito. Eu poderia suportar aquela vida, mas era injusto fazê-la sofrer por causa disso.

– Vamos fugir. – Eu falei, subitamente.

arregalou os olhos e uma sombra de sorriso passou por seu rosto, se misturando a uma lágrima solitária.

, você não vai desistir da sua vida por uma funcionária de hotel. Você nasceu para o público.
– Eu não nasci para o público. Eu nasci para estar ao seu lado. Minha mala já tá pronta há semanas, é só você me chamar que eu fujo com você. – Eu disse, segurando suas mãos pequenas e calejadas entre as minhas, que nunca enfrentaram um serviço na vida. Uma das diferenças entre nós.

Ela pareceu pensar o mesmo.
– Eu não nasci para o seu mundo. E você não nasceu para o meu. Um de nós vai sempre acabar perdendo e a gente vai se machucar. A gente merece mais do que isso. Você sabe que isso não iria durar mesmo. – Ela falou, soltando suas mãos delicadamente das minhas. Eu senti uma parte de mim sendo levada junto com aquele toque.

Ela se virou em direção à porta e eu soube que estava a perdendo.

, por favor, não faz isso. – Eu falei, tentando me colocar entre a porta e ela.
, por favor, me deixa passar.
, por favor...
– Não adianta insistir. Você me ouviu. Ninguém nos quer juntos. Pra que insistir em algo que não vai dar certo?

E aquilo acontecera. Eu hesitara. E perdera o amor da minha vida.
Puta merda, justo quando ela ia embora, eu me dava conta de que a amava.
Me deitei na cama e fiquei enviando diversas mensagens para ela durante o dia, sem nenhuma resposta. O pior é que eu nem tive coragem de enfrentar meu pai.
Quando o horário do almoço estava se aproximando, Paolo entrou no quarto, já entornando informações sem sentido de compromissos fúteis, sem se importar com meu estado.

– A imprensa está lá embaixo no saguão. Querem falar com você. Eu preparei um discurso pequeno, vai ser bom para sua imagem. – O homem disse, completamente igual a qualquer outro dia.

Olhei para o meu assistente, incrédulo com sua falta de sensibilidade. Boa parte daquilo era culpa dele, ele contara ao meu pai do jantar idiota perdido. Ele era o único que sabia do meu caso com .

– Não vou a nenhuma entrevista de merda, seu traidor.

Paolo simplesmente suspirou, como se esperasse tudo isso.

– Você sabia que eu teria que contar ao seu pai. Você podia simplesmente ter encontrado a criada depois do jantar. – Ele falou, arrogante como sempre. Mas ele escolheu um péssimo dia para ser arrogante. Antes que eu percebesse, ele já estava prensado na parede.
– Ela não é uma criada. É uma funcionária do hotel. E não fique agindo como se você fosse superior a ela. Você tem tantos problemas na vida quanto ela, a diferença é que é uma mulher honesta e trabalhadora, enquanto você é um simples idiota. Se meta na minha vida ou na dela novamente e você vai se arrepender de ter nascido, estamos entendidos?

Nunca palavras tão raivosas tinham saído de mim e aquilo pareceu surpreender o homem da mesma forma que eu. Percebi seu pomo de adão subindo e descendo num gesto assustado antes que ele respondesse:

– Sim, senhor.
– Assim está melhor. – Eu disse, o soltando. – E quer saber? Eu vou descer para ver a imprensa, mas sem discurso nenhum seu. Vou com a minha própria sorte.
– Mas...

Enviei um único olhar para ele e Paolo logo se calou, abaixando a cabeça. Odiava abusar da autoridade e sempre o havia tratado como um amigo, mas, no fim das contas, ele não podia evitar: se meu pai perguntasse qualquer coisa, era seu dever responder.
Enquanto eu descia para o saguão, percebi que não estava bravo com Paolo, que era apenas uma peça no meio de tudo aquilo, e sim com meu pai. Desde pequeno, ele estragara tudo para mim, mas eu sempre fiquei quieto e aceitei cada decisão. Mas não hoje. Hoje, ele conseguira tirar a única felicidade que eu sentira em anos e eu nunca mais ia deixá-lo interferir na minha vida. Toda a coragem que sumira ao tentar responder sua mensagem estava começando a aparecer agora.
Na hora em que o elevador se abriu, eu mal pude processar o saguão, visto que diversos flashes me cegaram. Apesar de tudo, forcei um sorriso e acenei para as câmeras e os repórteres. Me sentei em um sofá e o pequeno grupo se aglomerou ali. Alguns olhares curiosos também se detiveram no local com a cena.

– Senhor , por favor. – Um repórter chamou.
– Pode me chamar de . Senhor é meu pai. – Respondi, com o sorriso forçado, sabendo que eles gostariam de ouvir isso. Tive sucesso quando alguns repórteres ali riram.
– Senhor . – O mesmo homem se corrigiu. – Como se sente com a aproximação das eleições e sua candidatura que promete uma sucessão digna ao seu pai?

Aquela reposta. Eu tinha dezenas de frases feitas para aquela resposta e qualquer outro dia eu teria sorrido confiante e falado uma delas. Mas, naquele dia, eu só pude olhar para a mesa da recepção. não estava lá, mas ela estava por ali, em algum canto daquele hotel.
E meus pensamentos estavam todos fixados nela.

– Qual é o seu nome? – Eu perguntei para o repórter.

O homem levou um susto, mas logo me respondeu.

– Ahn, Carlos, senhor.
– Carlos, você sempre sonhou em ser jornalista? – Eu o indaguei, sinceramente.

Todas as pessoas ali pareciam estar confusas, mas nenhuma mais do que Carlos, que respondeu:

– Acho que pode-se dizer que sim.
– Fico muito feliz por você, Carlos. É muito bom poder fazer aquilo que se ama. Eu, por exemplo, nunca quis ser deputado.

O choque se espalhou imediatamente entre os repórteres. Antes que qualquer pergunta interrompesse o momento, eu tome coragem e continuei:

– Na verdade, quando eu era pequeno, eu queria ser veterinário. E hoje em dia eu sinto uma vontade imensa de ser professor. Sempre tive jeito com a fala, sabe? Mas por causa de um homem mesquinho que se preocupava mais com seus interesses do que comigo, eu nunca tive a chance.

Respirei fundo, procurando novamente, mas ela não estava ali. Eu queria que ela estivesse. Eu me sentiria seguro e confiante. Mas, sem ela, eu me forcei a continuar:

– Porém, eu não culpo totalmente meu pai por isso, até porque, se eu não tivesse vivido dessa forma, hoje eu não estaria nesse hotel, como parte de uma jogada política. E eu nunca teria conhecido a , minha namorada.

Os arquejos dos repórteres foram coletivos. Estavam ali por uma notícia pequena e sairiam com uma notícia que com certeza acabaria contra o meu pai. Mas eu não me sentia mal por ele, eu tinha que falar a verdade.

– Por isso, minha resposta é que eu me sinto indiferente às eleições como candidato porque eu não serei um. Agora eu tenho que ir. Sinto muito pela curta entrevista. Tenham um ótimo dia.

No momento em que eu me virei, todos vieram atrás de mim com câmeras e microfones, mas, com ajuda dos seguranças, entrei no elevador sozinho.
E desabei. Minha vida estava arruinada. Meu pai nunca mais ia falar comigo e nem . Como eu pude assumir um namoro que ela nunca aceitara? Mas não importava já que ela não me veria de novo nem para brigar comigo.
Pelo menos, eu poderia ter um recomeço. Ou algo assim.
Alcancei a porta do quarto sentindo minha respiração falha. A ansiedade me consumia por completo. Eu sabia que nada nunca mais seria igual a antes.
Quando eu abri o quarto, no entanto, pensei estar alucinando, pois a mais bela das visões me encarava com a boca entreaberta.
Nenhum de nós soube o que falar, mas as emoções e a tensão estavam palpáveis no ar.

– Deixei meu celular aqui. – quebrou o silêncio, erguendo o velho aparelho para se justificar. Não pude deixar de sorrir e sentir uma enorme vontade de beijá-la. Mas então vi a televisão atrás dela. Ligada. E o saguão do hotel sendo transmitido ao vivo. Minha boca ficou seca.
– Sua namorada, hein? – Ela debochou, embora sua voz não aparentasse verdadeira raiva. Na verdade, parecia estar embargada. Eu sabia que havia passado muito dos limites.
, me desculpa... Você nem sequer me aceitou e eu... acabei de te assumir pro Brasil.

A mulher soltou uma risada que mostrava nervosismo.

, se isso for um jogo, saiba que eu...
– Meu bem, com você nunca é um jogo. Eu te amo. – Eu admiti. – Não sei por que, nem como aconteceu, mas é verdade e sei que isso só vai crescer. Eu nunca me senti assim e em menos de um mês você conseguiu mexer comigo... Me desculpa se isso for demais pra você, mas é a verdade. Minha vida política acabou. E não ouse se achar culpada por isso! – Acrescentei ao perceber que ela estava pronta para replicar. – Eu nunca quis isso para a minha vida e você só me deu a coragem de começar a vivê-la da maneira que me faz feliz, sem tentar agradar ninguém no caminho.

Eu sabia que eu havia falado muito e aquelas eram revelações sérias, por isso não me surpreendi com o silêncio, mas não pude deixar de ficar abalado também. Abaixei a cabeça, sem ter coragem de olhá-la nos olhos. O silêncio de novo preencheu o ambiente.

– Então... Você vai ser um professor?

Não pude deixar de sorrir, surpreso com a maneira dela de prosseguir o assunto. Ela não tinha ido embora. Ela não me rejeitara ainda.

– Bom, talvez. – Eu respondi, atordoado. – Minha tia tem uma casa perto daqui. Eu acho que ela me aceitaria. Eu poderia estudar para entrar na faculdade e, bom, trabalhar nas horas vagas. Se é que eu vou conseguir um emprego com a minha experiência terrível.
– É claro que você vai, você é capaz de tudo. – Ela respondeu, carinhosa, e meu coração disparou contra o meu peito. Me senti um adolescente apaixonado pela primeira vez.
– E, sabe, a gente poderia se ver mais. Você pode até morar comigo! Você deveria investir no seu futuro, sabe? Fazer uma faculdade de hotelaria, ter seu próprio negócio. Eu sei o quanto você sonha com isso, tá escrito em seus olhos.

Suas bochechas coraram de leve, mas como era teimosa, seu queixo se projetou para cima.

– Eu não preciso do seu sustento.

Eu ri de leve.

– É claro que não. Mas pode ter a minha ajuda, ou melhor, da minha tia, antes da gente achar um lugar para dividir com nosso dinheiro, igualmente. Quer dizer, isso se você aceitar namorar comigo.

Meu coração começou a bater em expectativa contra o peito. era uma pessoa muito racional e difícil de ler, por isso o alívio inundou meu peito quando ela respondeu:

– Acho que não ficaria feio recusar depois de o Brasil inteiro ficar sabendo.

Nós dois caímos na risada que logo morreu quando eu a puxei para um beijo. De repente, o pior dia da minha vida havia se transformado no melhor.

– Eu te amo. – disse e eu podia jurar que um sentimento de prazer genuíno se espalhava pelo meu peito, preenchendo cada parte do meu corpo com uma completa adoração por ela.
– Eu te amo. – Eu respondi com ela ainda em meus braços.

Ela sorriu para mim e me deu um leve beijinho. Então olhou rapidamente para meu armário e sorriu.

– Então... Vamos fugir?

Meu rosto doía de tanto que eu gargalhava de pura felicidade e não pude deixar de correr para o armário e pegar minha mala.

– Eu estava só esperando você me chamar.


Fim



Nota da autora: Enfim, estava lá essa fanfic, esperando alguém salvá-la, quando um plot doido me atingiu. Então tentei escrever, mas fiquei toda travada, até que eu apaguei tudo o que eu tinha feito e reescrevi tudo na mesma noite. E não é que até que eu gostei? E espero que você também tenha gostado! Não esqueça de comentar o que achou e me seguir no instagram @elena.n.stuff para saber mais sobre minhas outras histórias. É isso, beijinhos, obrigada por ter lido a minha história! <3





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