Última atualização: Fanfic Finalizada

Prefácio

“Caro Leitor...

Queria poder dizer que esta é mais uma obra clichê de amor e felicidade, mas, sinto muito em dizer que o conteúdo que tem nas mãos pode ser bastante melancólico. Aqui conta a história de um adolescente com muita sorte, apesar das circunstâncias não serem tão positivas.
Logo no primeiro capítulo você percebe a capacidade que o coração humano tem de se apegar em lugares desproporcionais. A infelicidade segue os passos de como se fosse um ímã que atrai desgraça, porém, por outro lado acaba atraindo fé e esperança também. Nesta história o menino tem que lidar com um vilão de duração relativa, com um mingau frio servido como café da manhã, com noites mal dormidas e o mais importante: o nascimento do amor gratuito e genuíno.
Meu dever é pôr no papel essa história e torná-la imortal, mas não há nada que o impeça de a largar imediatamente e procurar outra leitura sobre coisas somente alegres e imaginárias, se é isso que você prefere. Todavia, se posso dar a minha opinião após ler a história de , posso dizer que o amor altruísta é capaz de salvar a vida de alguém de maneiras distintas… e talvez salve até mesmo à sua!
Respeitosamente,
L. A. LaChance.


Prólogo

Oh I feel your heartbeat.
And oh, you're comin' around, comin' around, comin' around
If you can love somebody, love them all the same.
You gotta love somebody, love them all the same.
I'm Singing, Oh, I Feel Your Heartbeat.


.


Passo meus dedos pelo contorno da carta do meu pai e sorrio ao ver o desenho minúsculo e mal feito nas páginas: era um projeto de pulmões com algumas pétalas de girassol florescendo de cada extremidade em uma explosão de azul-escuro, branco e um amarelo. E eu sei o que ele quis dizer com isso.
Às vezes eu me pergunto, como deve ser ter pulmões saudáveis, vivos e normais. Respiro fundo e ao fazer isso sinto o ar entrando com dificuldade e saindo do meu corpo com mais dificuldade ainda. Eu tusso e respiro mais uma vez, me inclinando para pegar a foto de nós dois na gaveta da cama. Nossos sorrisos são idênticos e nossos rostos mais parecidos que o normal, exceto pelo cabelo. Essa foto sempre me faz lembrar daquela sensação de embarcar em uma aventura com a meu pai e ver o mundo se expandindo à nossa frente como um livro aberto, momento normais de pai e filha. E ao olhar em volta sorrio ainda mais por ter feito meu trabalho, pelo menos uma parte. Eu passei a manhã tentando deixar esse quarto com a minha cara e menos cara de hospital e agora, olhando ao redor, observo as paredes e fico um pouco mais feliz.
O que falta?
O respirador! Ergo meus braços até a saída de oxigênio e checo quatro vezes se a pressão está correta, e tenho certeza ao escutar o sibilo estável do ar saindo. Passo a sonda em volta dos meus ouvidos e prendo as pontas da cânula nas minhas narinas. Suspira uma, duas, três, quatro vezes…
E tento me ajeitar no desconforto familiar do colchão do hospital. É, essa é a minha casa agora.
Mesmo que eu tente esconder, estou nervosa. Minha função pulmonar caiu para quarenta e cinco por cento bem rápido. E agora, além da febre e da dor de garganta, eu vou ter que ficar aqui por tempo indeterminado para fazer milhares de tratamentos para segurar a onda, enquanto os médicos tentam achar algo que faça o lúpus parar de tentar me matar. E matar a minha mãe, já que ela ultimamente está uma pilha de nervos. Claro que ela não diz isso, mas seu histórico no computador mostra. Infelizmente não existe uma cura para o lúpus, principalmente quando uma das lesões ataca seu pulmão e desenvolve uma nefrite lúpica, então o tratamento se reduz a como me dar mais tempo.
Isso me deixa com mais medo do que eu posso falar, mas não por mim; quando se tem lúpus, você se acostuma com a ideia de morrer cedo ou ao qualquer momento. Minha preocupação é a minha irmã, já que depois da morte do meu pai as coisas pioraram muito.
Essa linha de pensamento não é exatamente uma linha de pensamentos bons e que me façam bem, então decidi arriscar o número e me dar o luxo de ler algumas páginas das fanfics que eu gosto, as minhas preferidas para ler no leito de hospital; e eu espero viver o suficiente para que todas elas se tornem livros.
Mas, pouco tempo depois, eu também abandono as histórias e decido ficar deitada na cama mesmo, encarando o teto e escutando o sibilo ofegante da minha respiração e isso me chama atenção. Alguma coisa não está tão certa. Viro para o lado e despejo o líquido do remédio no inalador e máquina começa a zunir quando o vapor inunda o bocal.
Sento e encaro o teto, tentando manter a calma.
E inspiro e expiro.
Inspiro... e expiro.
E minha atenção é puxada quando alguém bate na porta e eu me viro para olhar, na esperança de que minha mãe não tenha contrariado a minha opção e vindo me visitar. A cada visita dela meu coração se parte mais um pouco. Afasto o inalador e sorriu, observando a enfermeira gentil na porta. Ela dá três passos e deixa uma máscara cirúrgica e um par de luvas em cima da mesa, e eu conheço aquele olhar.
- Paciente novo. Vamos?
Meu coração dispara e um sorriso vitorioso invade meus lábios. Me atrapalho com aparelho, mas dois minutos depois estou pronta com meu concentrador portátil de oxigênio. Paciente novo é como um parque de diversões, mas dentro do hospital.
Uma enorme vantagem de ter passado metade da vida nesse hospital se dá ao fato de eu conhecê-lo como a palma da minha mão, e isso faz com que eu me sinta mais em casa do que na minha própria casa.
Antes que Beau e eu chegássemos até o corredor, observei a porta do quarto aberta a nossa frente. A sensação de surpresa me deixou paralisada ao encontrar um garoto alto e magro que parecia ter saído de um clichê da Netflix. O cabelo cacheado e moreno caía sorrateiramente nos olhos e ele o tirava irritado. Tinha em sua frente uma tela branca e nas mãos uma paleta, pincéis e um carvão. Dei um passo para frente e observei mais atentamente o rosto sujo com a tinta, em seu pulso havia uma pulseira amarela da mesma cor que a minha… Seus olhos são de um tão profundo e formam ruguinhas enquanto ele pinta a tela concentrado. Mas não é a aparência, a arte ou os olhos que chamam minha atenção, é o sorriso dele. É charmoso, caloroso, verdadeiro e iluminado.
Nunca acredito nos clichês que falam sobre toques ou olhares magnéticos, mas eu estava completamente enganada.
O garoto virou o rosto e uma ruguinha adorável apareceu em sua testa quando me percebeu ali.
Oh droga, eu estou olhando demais.


Capítulo Único

We're on an open bed truck on the highway
Rain is coming down and we're on the run.
Think I can feel the breath in your body.
We gotta keep on running til' we see the sun.


.



Ignorei a vigésima ligação do meu pai e coloquei o celular sobre a bancada da repleta de remédios. Essa rotina era um saco, assim como esse hospital.
Olhei as tintas em cima da mesa e soltei um suspiro terno ao observar e admirar o trabalho que acabei de fazer ali; com bastante modéstia, ficou incrível. Já fazia algum tempo que eu exercia o hábito esquisito de pintar a minha companheira de hospital - que não me dá tanta bola assim - e esse hábito se revelou ao começá-la a pintar com as mais diversas rosas, que simbolizam os mais diversos significados. Mas essa pintura foi diferente, dessa vez eu pintei um extenso campo repleto de lírios sob um céu azul e limpo, eu conseguir pintar uma paisagem que parecia não ter fim, que trouxe um colorido especial para a tela que eu a daria de presente.
A tela estava secando e eu tentava combater meu nervosismo guardando o material de pintura. Não que fosse um grande desafio pintar, mas era um grande desafio fazer algo a altura de sem ser um idiota. , esperança. Foi exatamente isso que ela trouxe para os meus dias no hospital, esperança de que um dia, talvez um dia eu tenha um pouco de sorte e consiga ficar bem.

Eu nunca achei que fosse me apaixonar por alguém e isso incluía se apaixonar por alguém em um hospital, mas conseguiu mudar isso também.
Ela é linda de um jeito tão singular que fica difícil parar de olhar. O jeito que ela sorri é lindo e único. O jeito como ela olha para mim faz todo meu corpo procurar maneiras de ficar cada vez mais perto dela.
Parece que nada disso é real. Odeio usar frases feitas, mas a realidade é que eu nunca me senti assim por ninguém, nunca me permitir ficar assim por ninguém; o câncer não deixava, não abria espaço. A regra era clara: viver rápido, morrer rápido. Nunca tive tempo suficiente com alguém para realmente me apaixonar. Até ela aparecer.
Olhei ela de relance mais uma vez e sorri ainda mais ao observar a forma que seus olhos brilhavam olhando as pinturas. Os olhos dela não são castanhos, nem âmbar ou chocolate. são .
- Você é tão talentoso, cada coisa que você pinta me traz emoção…
Eu teria perguntado o motivo da pausa abrupta, mas nem precisei erguer os olhos para saber. A tela estava na parede direita do quarto, foi a minha primeira pintura dela.
Os segundos foram passando. Senti meu coração bater cada vez mais rápido em meu peito e tomei coragem para levantar os olhos e buscar qualquer que fosse o sentimento presente em seu semblante.
E fiquei paralisado.
Os olhos de estavam lacrimejando e ela passava os dedos finos carinhosamente pela tela sorrindo a cada toque.
- Eu pinto com meu coração. Cada parte dele está estampado nessas telas.
Ela fechou os olhos por alguns segundos e balançou a cabeça. Agora estava explícito em seus lábios um sorriso triste.
- Minha vida tem prazo de validade, , e eu não quero partir seu coração…
- Seria uma honra ter meu coração partido por você.

Eu gostaria de poder dizer que a minha vida é fácil ou pelo menos tranquila, mas aparentemente Deus tem seus favoritos e eu não ocupo um lugar de destaque. Mas só por hoje eu estou mantendo o pensamento positivo de que as coisas vão dar certo. Desligo o inalador e pulo da cama, tomando cuidado ao olhar o corredor e ver se a barra está limpa. Eu não posso dormir sem vê-la. Caminho silenciosamente pelo corredor, mas congelo igual a um idiota na porta do quarto de . Do outro lado da porta eu consigo ouvir nossa música tocando baixinho.
Heartbeat, do The Fray.
Então ela está pensando em mim!
Bato na porta duas vezes, da forma que combinamos um tempo atrás e espero impaciente. Ouço volume da música diminuir e seus passos se aproximando cada vez mais da porta.
Meu coração parte ao encontrar seus olhos tristes e inchados. Rapidamente acabo com toda nossa distância, com alguns passos para frente e me aproximo dela a envolvendo em um abraço apertado.
- O que está acontecendo?
respira fundo e seu corpo treme antes de começar a falar.
- A pele ao redor da minha sonda infeccionou. A doutora acha melhor fazer uma cirurgia para tirar a minha pele infectada e substituir a sonda. Vai ser amanhã de manhã.
Eu consigo escutar o som do meu coração batendo milhões de vezes por segundo.
- Vai ser anestesia geral - ela completa rápido e eu sinto uma lágrima escorrer de seus olhos.
- O quê? Anestesia geral? Quais são as chances de seu pulmão aguentar? - sinto a mão dela agarrando ainda mais a minha pele e me xingo.
Seguro seu rosto da forma mais delicada que posso e sorriu antes de dizer:
- Vai ficar tudo bem, linda.
continua me olhando em silêncio e antes que eu pudesse esboçar qualquer relação, ela gruda nossos lábios forte o bastante para grudar meu corpo no dela.
Foi neste exato instante, sentindo cada terminação nervosa do meu corpo gritar por ela, que eu senti medo. Um medo totalmente desconhecido que trazia uma dor ainda maior para meu peito.
Por favor, Deus, eu não posso perdê-la.
Sinto os lábios dela se distanciando e quando estou pronto para responder ela me silencia.
- Te vejo amanhã, .
E fecha a porta.
Devagar, eu me aproximo e apoio a mão contra a madeira, pois eu sei que ela está bem ali, do outro lado, com medo de manhã. Respiro fundo mais uma vez, ainda totalmente paralisado com o beijo, apoio a cabeça na porta e forço para que minha voz não saia tão preocupada.
- Vai ficar tudo bem, linda.



.



I'm tryin' to put it all back together.
I've got a story and I'm tryin' to tell everybody.
I've got the kerosene and the desire.
I'm trying to start a flame in the heart of the night


Não entre em pânico. Não entre em pânico. Não entre em pânico…
Aperto com ainda mais força o esparadrapo contra meu pulso e olho para a ponta da cama. Minha mãe continuava me olhando do mesmo jeito maternal e preocupado de sempre, esboçando um sorriso nervoso nos lábios.
Odeio ter lúpus.
Respiro fundo e começo a contar de 100 até 0, ignorando qualquer coisa ao meu redor. A enfermeira bate na porta e entra com uma touca, protegendo seu cabelo ruivo, e luvas azuis em suas mãos. Ela também me esboça um sorriso nervoso no rosto, mas isso não me tranquiliza. Minha mãe se levanta em silêncio e chega mais perto, segurando minhas mãos e deixando vários beijos por meu rosto.
- Te encontro daqui a pouco, meu amor. Eu te amo! - minha mãe diz e me abraça forte, por mais tempo que o normal.
Eu sinto uma dor enorme no peito e uma falta de ar insuportável, mas reprimo tudo isso porque não quero soltá-la. Pode ser a última vez.
Quando minha mãe me solta, sinto um vazio tão grande que sinto medo, medo do que pode me acontecer, medo do que pode acontecer com a minha mãe se eu morrer, medo de tudo e de todas as coisas. Tudo que eu mais queria neste momento era que estivesse aqui comigo para segurar a minha mão e cantar minha música preferida.
Fecho os olhos bem forte e sinto o enfermeiro travando as travas da cama, começando a me arrastar pelo corredor.
Não posso entrar em pânico. Não posso morrer.
Eu costumo a dizer que tenho uma chave na cabeça que consigo ligar e desligar a hora que eu quiser, para me isolar do mundo ao meu redor. E foi exatamente isso que eu fiz até sentir a porta abrir devagar e o cheiro de invadir o local, mas essa lembrança é tão distante que eu continuo de olhos fechados.
Ouço o estalo alto de sua língua no céu da boca - do mesmo jeito que faz sempre que quer chamar minha atenção - e abro os olhos mecanicamente. está usando o mesmo uniforme branco, máscara e luvas brancas que os cirurgiões usam, mas o cabelo está desgovernado, como sempre, por baixo da touca cirúrgica.
Meu olhar cruza o dele e eu solto a respiração, surpresa e mais aliviada.
- ? O que você está fazendo aqui? - ele sorri e chega ainda mais perto, entrelaçando nossas mãos.
- É a sua primeira cirurgia sem seu pai, eu sei disso… - a voz dele vacila por alguns segundos e há algo por trás desses olhos preocupados que não consigo decifrar. Não é a expressão irônica e alegre de sempre.
Engulo em seco algumas vezes, tentando conter as lágrimas que começam a ferver dentro de meus olhos e aperto ainda mais nossos dedos.
- Como você…
- Estou apaixonado por você, … - eu sinto que o ar em meus pulmões não é suficiente. - Mas respondendo sua pergunta, sua mãe me contou quando eu pedi a sua mão em namoro para ela…
- VOCÊ O QUÊ?
solta uma risadinha nervosa e suas covinhas ficam ainda mais visíveis quando ele abaixa a máscara e beija minha mão de forma carinhosa. Eu queria conseguir dizer todas as coisas que sinto por ele, mas ambos sabemos que essa relação não dará certo, então apenas fico quieta e deixo que ele termine.
- We're on an open bed truck on the highway, rain is coming down and we're on the run… Think I can feel the breath in your body, we gotta keep on running til' we see the sun…
Ele começa a cantar baixinho e eu suspiro, enxugando as lágrimas com o dorso da mão, enquanto ele balança a cabeça, descrente.
- E eu achando que sua única arte era a pintura...
É a música. É a nossa música. É a música do meu pai. está cantando a música. Seria impossível não observar aqueles olhos concentrados no pedaço de papel, a boca sussurrando as palavras tão atentamente e se moldando às variações da música, o jeito que ele alterna o olhar e me encara, buscando a aprovação que minhas lágrimas dão enquanto escorrem pelo meu rosto, sem que eu consiga contê-las.
Sinto como se meu coração fosse explodir de tantas coisas que estou sentindo ao mesmo tempo por ele.
- Eu achei que fosse a nossa música, mas devo dizer que seu pai tinha um ótimo gosto musical...
A risada de me deixa um pouco mais calma e eu sorrio acompanhando o carinho terno em minha mão. O olhar dele encontra o meu, meu coração salta tão rapidamente dentro do peito e o bipe do monitor apita cada vez mais rápido, me denunciado. ergue a sobrancelha e um sorriso convencido aparece em seu semblante, me lembrando a primeira vez que eu o vi.
- Você vai ficar bem, linda.
A voz dele é profunda, suave, preocupada, mas ainda sim confiante. É nesse momento eu sei que mesmo que eu morra hoje, eu vou poder dizer com todas as letras que me apaixonei perdidamente por alguém.
- Você promete?
Ele assente e estica o braço, entrelaçando o dedo mindinho no meu e beija o local, selando a promessa.
E agora sim posso dizer que medo se foi totalmente.
À medida que os passos no corredor aumentam, eu me preparo para me afastar dele. sorri mais uma vez e sai pelo outro lado da cortina, antes da Drª entrar.
- Pronta, querida? - ela pergunta com um sorriso enorme no rosto.
aparece atrás dela sorrindo e eu retribuo o sorriso sussurrando.
- Eu aceito!
Ele paralisa por um tempo, seus olhos se arregalam rapidamente e depois um sorriso enorme e brilhante aparece em seus lábios, antes dele enfim sumir do meu campo de visão.
Sim! Vai ficar tudo bem.
- Podemos começar!
- Dez. - digo olhando do anestesista para o teto e meu coração dá um pulo.
As flores. Os pulmões. Os livros.
A pintura de .
Como?
Mas eu sei como, é claro. .
Sempre ele me salvando de todas as formas. Uma única lágrima cai do meu olho e eu continuo contando com um sorriso ainda maior.
- Nove. Oito. - o desenho começam a mesclar, o amarelo do girassol, o rosa, o branco, o azul do desenho se misturando e virando um borrão. As cores atravessam o papel e se aproximam de mim. - Sete. Seis. Cinco. - então o desenho ganha ainda mais vida, as estrelas brilhando e se embaralham com as flores preenchendo tudo ao meu redor. Tudo dança e cintila acima da minha cabeça, tão perto que eu consigo tocar.
Escuto uma a voz do meu pai cantarolando ao longe.
- Quatro. Três. Dois... - sussurro e não sei se ainda estou falando em voz alta ou não. E eu o vejo. Vejo meu pai bem na minha frente, a imagem borrada, mas então nítida. O cabelo liso do meu pai, o sorriso enorme e seus os olhos que eu herdei. Mas eu não posso ir agora.
- … eu preciso de mais tempo, pai.
- Um.
E então a escuridão.



.



Oh I feel your heartbeat.
And oh, you're comin' around, comin' around, comin' around
If you can love somebody, love them all the same


3 horas de cirurgia. 1 parada cardíaca. Hemorragia… Mas o coração dela continua batendo.
Por favor Deus, não leve minha namorada.
Minha namorada.
Eu estou namorando… Eu ainda não acredito que depois de tanto tempo consegui. Eu não acredito que esperei ela passar por uma cirurgia para a pedir em namoro…


- É bem mais bonito daqui de cima.
Confirmo com um olhar e sinto ao meu lado contemplando a neve que cai devagar em seu cabelo e rosto. Era nosso passatempo subir para o telhado e admirar o céu.
- Isso estava na sua lista de coisas para fazer antes de morrer?
Ela ri e eu sei que é um sorriso sincero e feliz, apesar de tudo é o meu sorriso.
- Minha lista mudou desde que eu te conheci.
abre os braços, se joga no chão e me puxa junto de si, espalhando pelo ar vestígios de neve com o impacto. Fico encantado enquanto observo fazer um anjo de neve, e sorrio. Impossível não sorrir ao lado dela.
Estar aqui em cima com ela, olhando para o céu, com as mãos juntas e sorrindo… Isso é o paraíso para mim. As estrelas parecem tão perto que eu sinto uma vontade enorme de colocá-las em um buquê e entregar para , só para que eu consiga ver seus olhos brilhando todos os dias com o brilho delas.


Olho para o relógio de novo. Quatro horas. Já faz quatro horas que a levaram para a sala de cirurgia e tem uma hora que não temos notícia alguma.
Balanço as pernas, nervoso e sem perceber estou tremendo. A mãe de continua de mãos dadas comigo e sorri nervosa, tentando me deixar mais calmo - sem sucesso.
- Obrigada! - ela diz olhando nos meus olhos. - Você trouxe alegria para a vida de minha filha, para minha vida.
Faço que sim com a cabeça e ajusto a cânula do nariz, ainda mais nervoso.
- Eu… Bom… eu tenho quase certeza que amo sua filha.
O sorriso dela fica ainda maior.
- Só mais algumas horas.
Sorrio para ela e continuo em silêncio.

As horas continuam passando até que ouvimos a batida na porta e a médica aparece. Ela olha para nós segurando uma folha com os resultados da cirurgia e aquilo me paralisa. Seu olhar está inexpressivo.
A médica hesita e encosta na porta em silêncio. A mãe de levanta e me carrega junto de si.
- A cirurgia foi um sucesso, apesar dos contratempos.
Ah, meu Deus.
Por enquanto minha garota está bem. Isso que importa.
-
Mas? - a mãe pergunta ao meu lado. - Pode falar, doutora… O lúpus tomou mais algum lugar?
Encontro o olhar da médica e seu olhar é significativo. Eu sei o que aquilo significa. Eu recebi aquele olhar.
Não.
Não.
Puta que pariu.
-
Descobrimos que têm câncer no pulmão esquerdo…
A sala ficou em um completo silêncio. Senti o corpo da mãe de cair antes mesmo que eu pudesse segurar, senti meus pés cedendo como se eu estivesse pisando em areia movediça.
Câncer. Lúpus. Pulmão. Não. Minha garota não está a salva.
A última coisa que eu escuto é o choro doloroso da mãe de ao meu lado.



.



Oh I feel your heartbeat.
And oh, you're comin' around, comin' around, comin' around
If you can love somebody, love them all the same


Tentei abrir meus olhos, mas não enxerguei nada. Eu tinha a certeza absoluta que estava com os olhos abertos, mas mesmos apertando as pálpebras o máximo a minha vista continuava não me obedecendo.
Com calma e com o passar dos minutos, eu comecei a conseguiu ouvir os ruídos que vinham do meu lado. Senti a mão suave de minha mãe de um lado e o aperto forte de do outro.
Ótimo, estou viva.
Com muito esforço puxei o ar e sentir meu pulmão reclamando do ato, os apertos em minhas mãos ficaram mais fortes. As imagens começaram a ficar cada vez mais nítida.
- Mãe? ?
- Está se sentindo bem, querida? - a voz da médica chamou minha atenção no mesmo instante. Virei a cabeça de um lado para o outro e soube naquele instante que algo estava errado. - ?
- O que aconteceu?
Eles pareciam atônitos, os olhos lacrimejando e evitavam olhar para meu rosto por muito tempo.
- Doutora, como foi a minha cirurgia?
- Sua cirurgia foi um sucesso, apesar de algumas complicações. O problema é o seu pulmão…
- O lúpus tomou conta do outro?
A respiração da minha mãe falhou por alguns segundos e eu senti o rosto de tombar em cima da cama.
Meu coração batia tão forte que eu tinha certeza que dava para ouvir a quilômetros de distância.
- … descobrimos um tumor cancerígeno em seu pulmão esqueço.
- Quanto tempo?
- Não sabemos ao certo… Em torno de um mês.

Um mês. Trinta dias. Trinta dias é o que falta para eu morrer.

Eu não sei em qual momento minha mãe saiu do quarto, mas só consegui voltar a realidade quando a voz baixa de chamou minha atenção. Mas no momento o sentimento em meu peito era ódio. A cada minuto eu me odeio mais por tê-lo colocado nessa. Eu não sou capaz de dar uma vida incrível a ele e me odeio ainda mais. Eu sempre soube disso quando me envolvi. E agora além de arruinar a vida da minha mãe, ainda vou conseguir arruinar a dele.
Estúpida! Egoísta!
-
, você pode por favor me ouvir?
- O que você ainda está fazendo aqui?
- Linda, não faça isso...
- , por favor, precisa ficar longe de mim. Por que você tinha que gostar de mim?! - sinto as lágrimas rolando pelos meus olhos e não consigo segurar. - Eu te falei que tinha prazo de validade… um mês...
- Então me permita passá-lo com você... – ele disse. As lágrimas escorriam dos olhos dele e ali eu vi uma tristeza que nunca tinha visto em toda a minha vida. - Você acha que eu seria capaz de te abandonar? Linda, eu quero ficar com você até o fim, porque eu sei que minha memória não tem prazo de validade, assim como sei que vou me lembrar de você por todos os dias da minha vida… apenas me deixe ficar com você.
- Promete?
sorriu, mesmo seus olhos esboçando uma dor desconhecida por mim, seu sorriso ainda trazia uma paz enorme para meus dias. Ele levantou a coberta da cama e se deitou ao meu lado, me puxando para seus braços.
- Para todo sempre, meu amor…


Epílogo

Por algum milagre era um dia de sol nessa época aqui no hospital. Parecia até que Deus resolveu sorrir e me colocar na lista de preferidos. Eu não me lembrei da última vez em que vi meus pais tão animados para comemorar o meu aniversário. Aparentemente completar mais um ciclo de vida era uma vitória, e dessa vez eu concordava.
- Feliz aniversário, meu tesouro. - antes que de poder agradecer os braços finos de minha mãe estavam ao meu redor. - Eu te amo!
Abri um sorriso mais animado e recebi um beijo de meu pai em minha testa. ele me abraçou mais algumas vezes, dizendo como estava orgulhoso e feliz, mas uma parte minha sentia falta de outra pessoa. Das palavras doces e irônicas, do olhar brilhante e curioso, da pele quente e macia…
Mesmo que eu pintasse inúmeros quadros, nenhum deles conseguia captar a beleza de . Tudo que eu sentia agora, era saudade. Ela não resistiu à doença, o câncer tomou conta de todo o pulmão antes que o lúpus pudesse pensar em matá-la. Ela começou a ficar ainda mais doente, mas ainda era ela. viveu trinta dias a mais do que estava previsto, nos provando que era a senhora do próprio destino.
Foi difícil, quase impossível, para mim na época aceitar que a perderia tão rápido e fácil, mas não me arrependo de nada. Hoje sou grato pelos oito meses que tivemos juntos, grato por ter entregue meu coração a ela. Grato!
Quase 6 meses tinham se passado desde então. No início eu não achei que conseguiria, mas eu fiz uma promessa e precisava cumprir.
- Eu tenho um presente… - a mãe de começou, chamando minha atenção. - Obrigada por trazer a felicidade de volta.
Srª ligou a TV e a imagem de apareceu. Meu coração se acelerou e no mesmo instante lágrimas quentes desceram por meus olhos.
- É meio óbvio que eu devo estar morta e posso dizer que quase seis meses se passaram…
O silêncio na sala era absoluto e até mesmo os médicos e enfermeiros olhavam concentrados.
- Eu gostaria de estar aí, meu amor... - os olhos dela lacrimejaram. - , eu já sinto tantas saudades de você, de ouvir você cantar, de ver seus quadros, suas telas, de sentir você ao meu lado...
Meus olhos encheram ainda mais de lágrimas e meu pulmão falhou no instante em que um engasgo passou pela minha garganta. A mãe de sorriu e colocou a cânula de oxigênio em minhas narinas.
- Você é a melhor coisa que aconteceu em minha vida, você trouxe alegria para os meus dias enumerados, . Eu fico muito contente em dizer que me apaixonei perdidamente antes de morrer, e te peço: Viva. Acima de tudo, amor, viva. Eu te amo, meu amor!
As lágrimas caiam descontroladamente em um misto intenso de sentimentos e eu juro que naquele instante pude sentir o toque delicado de em meus ombros.
- Ah. - a imagem dela voltou, me pegando de surpresa. - Feliz aniversário! Eu te juro de dedinho que jamais te esquecerei.
Sorri e respirei fundo, vendo o vídeo se apagar. Olhei ao redor e todas as pessoas da sala estavam da mesma forma que eu.
- Eu nunca te esquecerei, linda. - sussurrei e senti uma brisa suave invadir a janela do quarto e me envolver.


Fim



Nota da autora: Essa história tem um apelo emocional enorme para mim. Minha mãe tem lúpus e o câncer levou meu avô… Confesso que escrever essa história não foi tão fácil quanto eu gostaria. Pensei inúmeras vezes em escrever outra coisa, mas esse plot insistia em 100% do tempo na minha cabeça. Quando enfim decidi que iria escrever, eu percebi que não conseguiria fazer nada extenso o suficiente, pois iria me dar gatilho, então optei por trazer algo "pequeno", mas repleto de emoção. Meu coração e sentimentos literalmente estão nestas linhas e eu espero de coração que vocês gostem tanto quanto eu, pois escrevi com muito amor para esse álbum lindo do The Fray.
Aguardo os comentários de vocês!

Com amor e carinho, Analua.





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