CAPÍTULO: [Único]





08. Sunny Side Of The Street






Capítulo Único


havia acabado de se estabilizar na cidade. Nova York. O sonho de toda uma adolescência se tornou realidade e, nem mesmo as caixas para desempacotar, a poeira e o mofo que predominava nas paredes seriam capazes de desanimá-lo. Nem mesmo o barulho suave que transpassava o chão, vindo da lanchonete localizada no primeiro andar.
Mas ele não podia reclamar, tinha conseguido um bom preço por um apartamento que, ele tinha que confessar, era razoavelmente grande. O local também não era de todo ruim, estava longe de ser no centro da movimentada Nova York mas não deixava de ser um lugar bom.
vasculhou pelos cômodos do apartamento e, através de todas as paredes com tinta descascada e manchas visíveis, ele podia facilmente imaginar como desejava que o local ficasse no fim da reforma. O primeiro cômodo a partir da porta de entrada, provavelmente o maior cômodo do apartamento, seria pintado totalmente de branco e seria o santuário para todo seu equipamento. Seria seu tão desejado espaço para trabalho. Na lateral do cômodo havia outra porta, que levava ao resto do apartamento onde seria feita uma pequena sala e cozinha divididas apenas por um balcão, o seu quarto e o banheiro. Além da porta na lateral de seu estúdio, havia outra no fundo, um pequeno cômodo que poderia ser facilmente confundido com um quartinho. Talvez fosse estranho, mas o motivo para ter escolhido este local em especial, dentre tantos outros que Nova York oferecia, fora aquele quarto. Aquele pequeno quarto que, diferente do resto da casa, não havia nenhuma janela, nem o mínimo de brecha que possibilitasse a entrada de qualquer tipo de luz solar. O lugar perfeito para revelação de fotos. Ele quase já podia enxergar a luz vermelha artificial lançando a cor sobre as paredes e ele estava pronto para colocar estas imaginações em prática o mais rápido possível.
Enquanto separava a tinta e forrava o chão, escutou a porta da frente ser aberta, fazendo-o se virar rapidamente em direção ao invasor.
Uma pequena garota de dezoito anos o fitava no batente da porta. Ele a analisou por um momento, o shorts deixando à mostra suas pernas volumosas, a bata era de um pano fino e solto o suficiente para não deixar seu decote tão visível, os cabelos cacheados caíam sobre seus ombros finos e em uma de suas mãos havia uma sacola que ele rapidamente reconheceu como a da lanchonete abaixo.
- Seu pai sabe que você anda por aí assim?
Mia riu enquanto entrava, fechando a porta atrás de si.
- Talvez seja mais importante que ele saiba que o irmão dele está morando em um apartamento caindo aos pedaços.
estreitou os olhos para a garota, em uma tentativa de deixar claro o quanto se sentiu ofendido. Embora não se sentisse realmente desta forma. Ela estava certa, mas ele nunca admitira que seu apartamento era de todo mal. Patrick era seu irmão mais velho, sempre havia tomado conta dele e isso foi algo que nunca mudou. sabia que ele lhe chamaria para morar em sua casa uma vez que descobrisse que o caçula estava se mudando para a mesma cidade. se dava bem com sua cunhada, tanto quanto se dava bem com o irmão. Sua sobrinha, então, era toda a sua vida. Mas, embora sem motivos aparentes para negar o convite, ele o fez. O fato desconhecido era que ele estava cansado de ser cuidado e protegido. Estava na hora de seguir seu próprio caminho, tomar controle sobre algo.
- Não exagere – ele resmungou, voltando-se para a parede manchada e descascada. -, essa belezura só precisa de um pouco de tinta.
A voz de amaciou à medida que ele dava um tapinha na parede para deixar claro que por belezura ele se referia ao apartamento em si. Ele só não esperava que um pedaço médio da tintura e gesso da parede caísse com o seu contato abrupto.
Mia gargalhou.
ergueu as sobrancelhas para a sobrinha, de forma desafiante.
- Me respeite - ele apontou, tentando soar severo. - Tenho idade para ser seu pai.
- Você só é dez anos mais velho! - a garota retrucou, indignada.
- Uma década é muito, mocinha.
- Certo, velhote, você está aqui desde às quatro da manhã - ela informou, colocando um pano sobre o chão e sentando-se no mesmo. - Você precisa comer.
a fitou de forma abismada durante um longo momento, apenas o suficiente para que Mia conseguisse tirar todos os alimentos das sacolas para colocá-los sobre o pano que cobria o chão sujo de poeira e tinta fresca. não pôde conter um sorriso diante da cena. Mia sempre fora tão cuidadosa e ao mesmo tempo inocente. Ele estava feliz em ver que isto não havia mudado com seu amadurecimento.
O rapaz estava tão feliz com sua companhia que nem ao menos reclamou sobre a forma que ela havia o chamado. Ele apenas sentou-se no pano e comeu entre risadas e histórias. Como no tempo em que ele tinha quinze e Mia era uma criança apaixonada por piqueniques e facilmente surpreendida.
Quando já estava entardecendo, insistiu para que Mia fosse embora, pois não gostava da ideia da garota andar pela cidade à noite. Contra a própria vontade, ela concordou em ir se, em troca, seu tio prometesse dormir.
Então se despediu da sobrinha com um beijo em sua testa.
Já eram duas da manhã e parecia indisposto a dormir como havia prometido. Algo em sua mente o repreendia por não estar cumprindo a promessa feita a sua sobrinha, mas ele se reconfortava com o pensamento de que algumas horas sem sono não seriam prejudiciais. Pelo menos não tanto.
Então escutou um barulho, próximo, mas não o suficiente para ser demasiado alto. Era um som suave e contínuo. Não era nenhum tipo de melodia, nem ao menos era um instrumento. Era mais como uma leve batida que, aos poucos, criava uma forma na mente abruptamente sonolenta de . E, quando o rapaz menos esperou, ele caiu em um sono agradável que não lhe foi acessível durante longos meses.

***


mergulhou para dentro do corredor, quase indo direto para o chão se não fosse pelo seu rápido equilíbrio. Ele arfou em surpresa e irritação quando notou que o motivo para sua quase queda era a falta de luz que o impossibilitava ver que havia uma caixa cheia de papeis próxima a porta do elevador.
Havia um outro apartamento no mesmo andar que o de , ele soube disso assim que passou pela porta cujo o número 7 enferrujado pendia sobre. No início, ele pensou que o apartamento estava vago, embora Phill - dono dos imóveis - não tenha incluído aquele apartamento como uma possibilidade para . Talvez já estivesse reservado, mas sabia que ninguém vivia ali. Então, misteriosamente, as luzes do corredor começaram a se apagar. as ligava antes de sair e, quando voltava, já estavam apagadas. Ele chegou a perguntar ao Phill se era ele quem apagava, mas o senhor negou, com uma tranquilidade que deixou claro que ele sabia quem estava a apagar.
Bem, estava certo de que era seu vizinho, quem quer que fosse. Em outras circunstâncias, não se irritaria com coisas banais. Mas os últimos dias foram estressantes e ele não podia conter o impulso de pestanejar em voz alta enquanto acendia as luzes, não deixando de resmungar durante todo o caminho até a porta de número 7.
Demorou algumas batidas para que a porta fosse aberta, revelando, para a surpresa de , uma mulher de não mais que vinte e cinco anos.
Tão rápido quanto abriu, a mulher fechou a porta. O rapaz piscou os olhos para a porta fechada diante de seus olhos, chocado. Subitamente, a surpresa foi substituída por raiva. E, embora estivesse impressionado com o fato de seu vizinho mal educado e paranoico ser uma mulher, ele bateu na porta novamente.
A porta se abriu de novo. Dessa vez ela não foi fechada, permitindo que ele tivesse uma boa visão sobre a mulher em sua frente. E, se ele não estivesse tão nervoso, ele teria priorizado a beleza da mulher, acima de qualquer careta que ela estivesse fazendo diante de sua presença.
Mas ele estava nervoso demais para isso.
- Seria possível você retirar sua tralha do corredor? – o rapaz indagou, fingindo, miseravelmente, calma. Mas, embora seu rosto fosse neutro, sua voz deixava claro sua irritação.
A mulher piscou.
- E você é...?
Parecia uma pergunta simples, levando em consideração que ambos não tinham se visto ainda, mesmo que já tivesse se mudado há alguns dias. Mas, por algum motivo sem explicação, o tom de voz usado pela mulher aprofundou sua irritação.
- Seu vizinho que está pedindo para que você gentilmente tire suas coisas do corredor – respondeu, com um sorriso sarcástico que fez uma carranca surgir no rosto adorável da moça, que cruzou os braços.
- Não me importo se você mora aqui ou não, pagamos a mesma quantia para estarmos aqui. Acredito que temos direitos igualitários sobre o corredor.
ergueu as sobrancelhas, não contendo novamente sua surpresa. Não apenas pelo atrevimento da mulher, mas pela forma como seu pensamento foi expressado. Em outras circunstâncias, ele riria. Mas sua raiva gritava, impedindo-o de manter-se calmo o suficiente para notar o quão patético era a situação.
- O corredor é uma passagem, não uma propriedade – ele bufou. – Acredito que como uma passagem ela deveria estar vazia e clara.
Foi a vez da mulher erguer as sobrancelhas. Notando a confusão dela, ele decidiu por simplificar:
- Ao menos pare de desligar a luz!
virou as costas para a mulher e começou a andar em direção ao próprio apartamento, de forma que não viu a vermelhidão no rosto da mulher devido à raiva pelo tom usado pelo rapaz. Normalmente, ela não era briguenta, mas o olhar, a postura e o tom de seu vizinho a fez perder as estribeiras e ela nunca desejou tanto socar alguém.
Antes que pudesse alcançar a porta de seu apartamento, o corredor se afundou em escuridão, fazendo-o virar abruptamente em direção ao interruptor. Estava escuro, mas ainda era possível ver uma silhueta ao lado dos botões e, apesar de ser uma silhueta pouco familiar, ele já sabia quem era sem ao menos precisar de um foco de luz.
Ele rosnou, mas isso não pareceu afetar a mulher pois ela permaneceu no mesmo local, de braços cruzados. bateu o punho contra o batente de sua porta, exasperando em indignação enquanto soltava um:
- Louca!
O rapaz não permaneceu no corredor para saber a reação da mulher diante de sua exasperação, apenas entrou em seu apartamento, pisando firme e batendo a porta com uma força além do necessário.
Não demorou muito para que Mia surgisse na porta de , com uma animação e surpresa estampada em seu rosto arredondado e, subitamente, ele soube que ela estava prestes a vomitar diversas informações e perguntas. Mas então ela parou, o sorriso de seu rosto sumindo rapidamente quando viu a irritação no rosto do tio, que andava de um lado para o outro, falando pelo telefone. Ou melhor, gritando.
- Já faz três dias, vocês já deviam ter arrumado! – ele gritou, o rosto levemente avermelhado. Mia conhecia bem o tio, sabia que ele não se irritava facilmente e, quando o fazia, não gritava, apenas observava. Mas o fato dele estar aos gritos a fez pensar que algo a mais o havia irritado e, o que quer que fosse, ainda parecia o incomodar. – Não, eu não vou sair hoje – e então um longo minuto de silêncio. - Espero que você cumpra o que está falando.
Então ele desligou, o rosto suavizando ligeiramente diante da presença da sobrinha, que o fitava confusa, até vê-lo olhar de soslaio para o teto no canto do cômodo. Uma longa mancha escura e úmida cobria parte do teto e da parede. Parecia ser feio pois ele bufou diante da imagem.
- Não pergunte.
Mia maneou a cabeça, mordendo o lábio em uma clara tentativa de não lhe fazer perguntas sobre o claro vazamento. Então, como um flash, lembrou-se do assunto que a deixou tão entusiasmada a falar com seu tio. Antes mesmo que Mia abrisse a boca, pelo seu rosto, soube que não era algo bom.
- Adivinha só, vi o misterioso morador do apartamento 7!
- Infelizmente, eu também – ele resmungou, voltando sua atenção para a parede que ainda clamava para que a pintura fosse terminada, antes que os móveis e os equipamentos chegassem.
- O quê? – ela questionou, andando rapidamente e ansiosamente até o tio, que tentava fazer pouco caso. - Você não gostou dela.
não precisava olhá-la para saber que sua última frase era uma afirmação, não uma pergunta. Mas embora soubesse disso, se viu na obrigação de explicar, seja o que for que precisasse ser explicado.
- Eu nem a conheço – ele respirou profundamente, sabendo exatamente o caminho que a garota estava tomando.
- Ela é bonita – disse suavemente, como um comentário corriqueiro.
piscou, surpreso com a ousadia de sua sobrinha. Em outras circunstâncias, ele novamente riria por vê-la assumindo o papel de cupido. Mas ele ainda estava estressado e rir parecia ser algo sem cogitação uma vez que tudo parecia estar atrasado.
- Ela é a louca da luzes – ele exasperou, como se fosse um bom argumento para que ela tirasse aquela ideia de sua mente sonhadora e calculista, mas essa informação só a fez gargalhar.
- Ela merece ser parabenizada – ela exclamou, entre risadas. – Nunca vi alguém te deixar tão nervoso quanto ela conseguiu em apenas quatro dias!
- Mia – ele a repreendeu, com um olhar de súplica. Ela sabia o que aquilo significava, ele não queria que ela começasse a assimilar sua vizinha a ele como um futuro casal. Ele já estava ocupado demais tentando ajustar sua nova vida para pensar em relacionamentos. Quanto menos pensar em um relacionamento com aquela louca.
Ela fez um sinal simbólico com os dedos sobre os lábios, como se estivesse passando um zíper imaginário sobre eles. E, enquanto caminhava calmamente até o tio para ajudá-lo com as tintas e os jornais que cobriam o chão, ela não deixou de soltar algumas risadinhas.
- A louca das luzes e o louco da escuridão – ela zombou baixinho, o que não impediu de escutá-la.
Ele arfou, jogando o pouco de tinta que restava no pincel em sua mão no rosto de Mia que, automaticamente, parou de rir e choramingou.

***


escutou o barulho suave do elevador enquanto trancava a porta de seu apartamento. Ele estava ocupado demais nessa tarefa, tentando manter em mente que ele precisava urgentemente trocar a fechadura que já estava levemente enferrujada, para notar a presença de sua vizinha. Mas então um baque abrupto e alto o fez tirar os olhos da fechadura, varrendo o corredor com o olhar a procura da origem do barulho. Não demorou muito para que ele achasse, lá estava a mulher do apartamento 7, mais pálida do que ele se lembrava estar uma semana atrás, quando ele bateu em sua porta e iniciou uma discussão. Ela parecia embaraçada e cansada, talvez até um pouco estressada. Mas seu foco de estresse não era , ele sabia disto pois ela parecia não ter notado sua presença ainda, ocupada praguejando para as sacolas que antes estavam em suas mãos, mas agora jaziam no chão. hesitou, não por nutrir qualquer tipo de raiva pela mulher, pelo contrário, ele estava envergonhado por ter sido tão impulsivo. Bastou uma noite de sono ao som das suaves batidas que ainda adentravam sorrateiramente em seu apartamento para ele notar que havia errado. E ele estava disposto a pedir desculpas pelo seu comportamento infantil, mas ele não a viu nos dias seguintes e bater em sua porta ainda causava um estranho mal estar no rapaz, como se ele não fosse bem-vindo. Mas ali estava a mulher, ajoelhando-se diante dos produtos que pareciam querer escapar para fora das sacolas ainda caídas. Ele não podia ajudar a si mesmo, sentia-se envergonhado agora que a raiva havia passado. Então, o mínimo que ele podia fazer no momento para se redimir era ajudá-la. E foi o que ele fez.
A mulher ainda praguejava quando se aproximou e ela apenas notou sua presença quando ele se ajoelhou na sua frente. Inicialmente, ela saltou diante de sua sombra e, após erguer o olhar, a surpresa pareceu afundar-se mais ainda em sua expressão. Ele sorriu levemente, para tranquilizá-la e deixar claro que ele não estava ali para iniciar outra discussão, mas mesmo diante de seu sorriso, ela ainda parecia tensa e confusa.
- Deixe que eu te ajude – ele pediu suavemente, mais por educação do que por qualquer outra coisa, pois nem ao menos esperou uma resposta, sua mão deslizou os alimentos para dentro das sacolas com rapidez, ainda sobre o olhar incrédulo da mulher.
Quando terminou, ergueu o olhar para igualar-se ao da mulher, apenas para se certificar de que não havia passado nenhum limite ao intrometer-se e ao ver seus olhos grandes e curiosos mais suavizados, soltou a respiração que não havia notado estar segurando. Um cheiro adocicado e marcante o atingiu quando a mulher afastou os cabelos escuros de seu rosto delicado e, por um breve momento, desejou poder afundar seu rosto nos cabelos dela. Rapidamente, esse pensamento foi repreendido e o rapaz limpou a garganta, sentindo necessidade de dissipar o nó que se formou em sua garganta. Com a mesma rapidez que juntou as sacolas, ele as levantou sem ao menos esperar por qualquer permissão da mulher, que ainda o fitava.
- Eu... – ela pareceu finalmente respirar, sua voz suave parecia desconhecida para seus ouvidos uma vez que a única vez que a escutou ela estava carregada de indiferença. – Eu posso carregar.
- Eu sei que sim – disse, mas permaneceu com as sacolas na mão, esperando pela iniciativa da mulher que, após um longo segundo, suspirou e levantou-se.
tentou não respirar quando ela passou por ele, girando o chaveiro na mão, a procura da chave.
Mesmo depois da porta ser aberta, ele esperou por um sinal verde por parte da mulher, que parou ao lado do batente. Ele conseguia ser intrometido o suficiente para pegar suas compras, mas, até em seus dias mais atrevidos, ele tinha limites. E invadir o espaço de uma desconhecida que ele chamou de louca na semana passada parecia ser um limite extremamente rígido.
não sabia dizer se era algo bom ou ruim, mas para a mulher esse limite não parecia tão rígido, pois sem qualquer tipo de hesitação, ela maneou a cabeça para ele, permitindo claramente que ele adentrasse seu espaço. O rapaz, infelizmente, já não parecia tão confortável com a ideia, mas estava disposto a se redimir e largar as compras no batente de sua porta para ir embora não parecia muito educado. Entrar provou ser uma ideia pior quando ele finalmente esteve dentro. O cheiro que emanava da mulher parecia estar preso em cada canto daquele apartamento, era algo lógico e óbvio, mas extremamente entorpecedor.
A segunda coisa que ele notou foi a forma como os cômodos mergulhavam em uma suave escuridão, apesar de ainda ser tarde e o sol provavelmente estar ainda no céu. As janelas estavam todas cobertas com cortinas longas e escuras, as lâmpadas apagadas não ajudavam e o único ponto de luz era alguns abajures que brilhavam timidamente comparadas as lâmpadas de seu apartamento. A falta de luz não parecia impedir a mulher de qualquer coisa, ela andava com suavidade e destreza, desviando de mesinhas, sofás e o balcão. tentou segui-la sem quebrar nada, embora tenha quase derrubado um vaso, que por sorte conseguiu segurar antes de entrar em contato com o chão. A movimentação abrupta e a respiração pesada do rapaz despertou a atenção da vizinha, que rapidamente o olhou. Provavelmente era apenas uma impressão causada pela falta de luz, mas ele teve a impressão de ver um traço de divertimento na feição neutra da mulher.
- Desculpe – ele murmurou, voltando a segui-la quando ela recomeçou seu caminho.
- Tudo bem, nem todo mundo é acostumado com a escuridão.
A cozinha era, claramente, mais iluminada que os outros cômodos, mas ainda escura para os olhos desacostumados de . A mulher gesticulou para o balcão e ele fez seu caminho lentamente até o local indicado. Em outras circunstâncias ele seria mais rápido, mas colocar as sacolas sobre o balcão era sua única desculpa para manter-se perto dela enquanto reunia seus pensamentos em ordem sensata para poder se expressar.
- Eu estou pedindo desculpas pelo meu comportamento babaca da semana passada – ele esclareceu suavemente, colocando finalmente as sacolas sobre o balcão e virando-se para capturar o olhar firme da mulher, que cruzava os braços com despreocupação.
- Eu sei.
Duas palavras que foram o suficiente para silenciar pelo o que pareceu longos minutos, sua mente trabalhava arduamente para entender o que foi dito. E antes que pudesse ao menos compreender seus pensamentos para contê-los, sua mente começou a divagar sobre como Mia estava certa. Ela era bonita. Não o tipo de beleza planejada, era algo mais natural, inconsciente. Seus cabelos eram longos e abrigavam alguns fios rebeldes que provavelmente precisavam de um corte, seu rosto pálido deixava sua boca levemente rosada em um contraste incrivelmente chamativo. Ela vestia um vestido, um pouco acima dos joelhos, mas nenhuma pele era visível pois meias calças escuras e um cardigã se encarregavam de manter os olhos de longe de sua tez. Não era um dia de frio, pelo menos não o bastante para alguém se cobrir tanto. O rapaz tentou se agarrar a essa questão, mantendo sua mente ocupada o suficiente para parar de divagar sobre a mulher, que o fitava ansiosa.
piscou e limpou a garganta quando notou o constrangimento do silêncio.
- É melhor eu ir – ele gesticulou suavemente para a porta.
Ela acenou a cabeça silenciosamente e o seguiu suavemente quando ele se encaminhou em direção a porta. Antes que a alcançasse, para sua surpresa, ele pôde escutar a voz da mulher, clara e próxima demais para que ele se impedisse de respirar bruscamente.
- Obrigada pela ajuda...
a fitou por um longo momento, esperando que ela continuasse. Então, quando ela riu baixo, ele sentiu o rosto arder ao notar que ela pedia discretamente pelo seu nome. Xingando-se mentalmente pelo deslize, ele murmurou:
- .
- – ela repetiu, seu nome saindo estranhamente doce dos lábios daquela mulher. – Obrigada.
Ele a encarou profundamente e meneou a cabeça em reconhecimento, tentando parecer indiferente, mas falhando ao se apressar pela porta da moça. Ele xingou-se por isso até a metade do corredor, dando-se conta de que nem ao menos havia pedido pelo nome dela. Ele virou-se, prestes a voltar e bater na porta de número 7, apenas para tirar esse peso de curiosidade de sua mente já cansada. Mas, para sua surpresa, a mulher permanecia ali, apoiada no batente da porta. Os olhos observadores rapidamente se agitaram quando seu olhar entrou em contato com o do rapaz.
E, antes que ele pudesse dizer algo, ela gritou:
- Aliás, meu nome é !
continuou a sorrir, mesmo depois de entrar em seu apartamento e fechar a porta.

***


Apesar do pressentimento de que logo a veria, só viu novamente duas semanas após aquele dia.
passou pela porta de madeira de numeração 7. Como um maldito ritual, ele diminuiu os passos para que ele apenas saísse do caminho daquela porta no sétimo passo. Mas antes que ele alcançasse a fronteira que o levaria para fora do radar do apartamento de , ele pôde escutar um barulho abrupto e alto ecoar do outro lado da porta. Como se algo frágil se estilhaçasse no chão. Ele parou. Havia milhares de motivos para que ele ignorasse o som e voltasse para seu estúdio, afinal, daqui a alguns minutos sua cliente estaria ali e ele já deveria estar com todo equipamento preparado para a seção de fotos. Mas ele continuou parado ali.
Por um breve momento ele cogitou bater na porta para perguntar se ela precisava de ajuda. Mas ele já havia oferecido indiretamente, em seguida ficou duas longas semanas sem ao menos ver o rosto da moça. Parecia claramente uma rejeição.
Mia não concordava, no entanto.
Depois do pequeno surto de sua sobrinha, rapidamente arrependeu-se de contar-lhe sobre seu pedido de desculpas a louca das luzes. Ele mal podia conter uma risada ao lembra-se de como Mia parecia ter seis anos ao pular pelo seu apartamento, cantarolando súplicas para que ele chamasse a vizinha para um encontro. A ideia parecia mais patética do que a imagem de Mia, quase uma mulher, pulando e cantarolando por aí.
Ele tinha vinte e sete anos, pelo amor de Deus!
Ele havia acabado de se mudar, estava estabilizando-se e não tinha tempo para agir como um adolescente. Não colocaria todos seus sonhos e planos em risco por apenas um encontro e, talvez, eventualmente, uma transa ou um envolvimento emocional. No momento, era uma ideia absurda que rapidamente foi descartada.
Nem o bater agressivo da porta por parte de uma Mia furiosa mudaria sua ideia. Mais tarde, ele poderia se desculpar por gritar com sua sobrinha, mas ao menos a fez ver o quão absurdo era sua intenção de jogá-lo para qualquer mulher que atravessasse seu caminho.
Quatro dias depois, quando Mia já não carregava uma carranca para o tio, pegou-se pensando, ao som das batidas suaves que atravessavam as paredes e que pareciam já estranhamente familiares, melhor no pedido de sua sobrinha. Ele tinha vinte e sete anos, não oitenta. Por que diabos ele tinha de ser tão ranzinza? Talvez fosse por esse motivo que ele estava ali, em um apartamento vazio e dolorosamente silencioso.
Não que ele odiasse o silêncio, certos dias era algo agradável. Mas na maior parte do tempo era agonizante para seus ouvidos que imploravam por qualquer sinal de vida. Porque, para ele, era isso que o silêncio e a escuridão representavam. A morte.
estava a alguns passos de distância da porta de quando ela se abriu. O corredor estava mal iluminado, mas ele sabia que não era a falta de luz que a fez não notar sua presença. Sabia disto pois se lembrava perfeitamente de como ela se sentia confortável com a escuridão de seu apartamento.
Mas ele estava parado ali, fitando as costas contraídas da moça que mantinha um celular em punho, provavelmente a razão pela qual ela não havia o visto.
- Eu não consigo te ouvir – ela resmungou, sua voz ecoando pelo corredor enquanto ela arrastava os pés contra a mármore, procurando um lugar cujo o sinal não fosse tão ruim. – Mindy, fale mais alto - ela pediu, claramente ainda tendo dificuldade em escutar quem quer que estivesse do outro lado da linha. Em resposta, escutou um chiado do outro lado da linha, indicando que a tal Mindy deve ter cumprido seu pedido. - Eu sei e eu lamento por isso, mas eu não fiz isso propositalmente!
Uma pausa e trocou o peso do corpo para a outra perna.
- Quando você vai entender que não é tão simples?
não precisava ver o rosto da mulher, muito menos conhecê-la muito para saber que seu rosto estava vermelho, deixando clara a irritação que transbordava em sua voz trêmula.
- Então siga em frente com essa droga de conto de fadas que é a sua vidinha, mas saiba que não posso fazer parte disso. Minha vida não é assim, Mindy! O que você esperava? – o chiado do outro lado tornou-se mais alto e então se silenciou. - Lamento não ser o projeto idealizado que vocês sonharam.
Quando desligou, subitamente sentiu-se mal por ainda estar ali, ouvindo toda a discussão que, embora não fizesse nenhum sentido em sua mente, o deixou desconfortável. Ele sabia que mesmo que entrasse em seu apartamento e fechasse a porta, a voz de ainda seria audível pelas paredes finas, mas ele poderia ao menos ter tido a decência de fingir não ouvir.
O que não foi o caso e seu arrependimento apenas aumentou quando se virou e saltou de surpresa com a presença do rapaz. Ela apertou o celular em seus dedos trêmulos e ficou longos segundos sem reação. Então seu rosto perfeitamente delineado suavizou, não completamente, mas o suficiente para fazer o rapaz soltar a respiração.
- Desculpe, às vezes esqueço que agora tenho um vizinho – ela fez uma careta involuntária. – Você deve já ter percebido que o sinal não pega tão bem dentro dos apartamentos...
- Ah, sim, os chiados – ele concordou, sem graça. – Sem problemas, eu não deveria ter escutado...
- Isso? – ela gesticulou para o celular, suspirando. – Digamos que minha irmã não é muito compreensível.
ainda gesticulava, aproximando-se o suficiente para que finalmente notasse sua mão ensanguentada. Ele olhou pasmo para ela, que entendeu rapidamente o porquê de seu olhar.
- Foi um acidente – ela sorriu, por algum motivo, envergonhada.
- Quer ajuda? – ele ofereceu casualmente, embora não conseguisse disfarçar a preocupação.
- Obrigada, mas não é preciso – ela deu de ombros, segurando a própria mão para evitar que o sangue caísse no chão, uma tentativa não muito sucedida já que o sangramento parecia aumentar. Então ela rapidamente lhe deu as costas e entrou no apartamento.
Ele permaneceu fitando sua porta durante longos minutos, que pareceram horas. Questionando-se se não devia oferecer novamente sua ajuda, nem que para verificar se ela realmente estava bem.
- Qual é o seu problema? – bufou para si mesmo, balançando a cabeça para afastar esses pensamentos e indo para a porta do número 8.
Antes que ao menos pudesse abrir a porta, outra se abriu e ele não precisou olhar para saber quem era.
- Na verdade, - ele escutou sua voz tímida ecoar pelo corredor, chamando sua atenção. Dessa vez, ela parecia mais calma e sua mão esquerda estava enrolada em um trapo que um dia talvez tenha sido amarelo, mas agora reluzia o vermelho de seu sangue. – talvez eu precise de uma ajuda.
a fitou por um breve momento, mais por surpresa do que hesitação. Então virou-se para ela e, silenciosamente, a seguiu para dentro da escuridão que era seu apartamento. O rapaz piscou algumas vezes para adaptar-se a falta de luz, enquanto era guiado pela mulher até a sala, onde ela supostamente precisava de sua ajuda.
- Eu acho que tenho uma lâmpada extra por aqui...
Ela provavelmente estava falando consigo mesma, pois não esperou uma resposta dele para sair da sala, atrás da lâmpada.
Ele olhou para o suporte onde, supostamente, deveria haver uma lâmpada. Bem, o que havia ali era apenas a ponta de uma, abrigando alguns pedaços de vidro. observou, com cuidado, os cacos que haviam no chão, espalhados deliberadamente.
Ele ainda observava os cacos e uns respingos escuros no chão, que julgou ser sangue, quando apareceu com uma lâmpada na mão.
As sobrancelhas da mulher se franziram quando ela seguiu o olhar de .
- Foi um acidente - ela repetiu com indiferença, estendendo a lâmpada para o rapaz.
- Tem certeza? - segurou a lâmpada mas não a tomou para si, de forma que ambos ficaram ali, segurando o objeto frágil enquanto trocavam olhares.
O rosto de gradativamente ficou avermelhado, em tal ponto que se sentiu solidário ao pegar a lâmpada de sua mão trêmula e ignorar a mentira da mulher, que se afastou na defensiva.
no fim não precisou de escada, não por ser alto, embora fosse, mas o fato do teto ser baixo ajudava bastante. Ele tirou os cacos com cuidado, entregando a que já apanhava os que jaziam no chão. E, enquanto colocava a nova lâmpada, perguntou-se o porquê dela querer algum foco de luz, quando ela claramente não ligava as luzes com muita frequência. Mas ele já havia a constrangido o suficiente por um dia e não arriscaria testar os limites da vizinha.
Ele não podia evitar também o pensamento de que, mesmo que ela o tivesse procurado, ela o estava fazendo apenas pela necessidade do que por qualquer outra coisa. Ele definitivamente não devia se importar com isso e embora negasse para si mesmo, sentia-se desapontado.
Quando terminou o serviço, questão de poucos minutos, já havia jogado os cacos fora e agora o fitava, com um sorriso frágil nos lábios.
- Aceita uma cerveja como forma de pagamento? – ela ergueu as sobrancelhas e a cerveja que jazia em sua mão boa.
- Não aceitaria outra coisa além de cerveja – sorriu largamente para a mulher, tentando deixá-la mais confortável, o que pareceu surtir efeito até ele pousar os olhos novamente em sua mão, após um longo gole. – Parece ter sido feio.
- Eu estou bem – ela murmurou, tentando afastar a mão do olhar sinuoso do rapaz, que se apressou em segurar seu pulso.
Ela o fitou, desconfiada pela abrupta aproximação.
- Posso? – perguntou, embora já tivesse a mão ferida em seu alcance. Mas ele esperou, pacientemente, pelo aceno em confirmação de antes de largar sua garrafa de cerveja sobre a mesinha mais próxima, para ter as duas mãos livres para tirar o trapo da mão da mulher e ter uma boa visão do dano.
Obviamente, ele não conseguiu tirar nenhuma conclusão diante da falta de luz e pelo excesso de sangue que cobria sua palma da mão.
- Onde fica o banheiro?
- Eu agradeço, mas não é necessário, – ela desfez rapidamente, tentando puxar sua mão para si, mas falhando miseravelmente, o rapaz não largaria sua mão, não daquela forma.
- Não é um pedido, é uma pergunta.
apertou os lábios e franziu as sobrancelhas, esperando parecer tão intimidante quanto possível. Esse truque certamente funcionaria com sua irmã e até mesmo seus pais. Mas, incrivelmente, com não. E apesar dele estar arqueando as sobrancelhas para parecer destemido, por dentro ele estava se divertindo com a reação da mulher.
- Certo – ela resmungou para si mesma, dando-se por vencida. – Por aqui.
Ambos seguravam as mãos enquanto a mulher o guiava para o banheiro, nenhum deles pareceu ter notado aquele pequeno detalhe. E, se o fizeram, nada disseram.
Quando chegaram ao banheiro, soltou inconscientemente a mão da mulher e perguntou onde havia gazes, indicou com a mão boa uma pequena caixa que havia em uma prateleira alta e tentou arduamente não demonstrar desconforto quando o rapaz acendeu as luzes. Uma tentativa falha, pois quando a claridade atingiu sua pele, ela se encolheu e fechou os olhos.
- Você está bem? – perguntou, voltando-se para ela.
não disse nada, apenas meneou a cabeça em uma resposta positiva, porém duvidosa. Com um profundo suspiro, ela abriu os olhos para encontrar o olhar atento do rapaz sobre ela. Brilhando tanto quanto a luz da lâmpada que estava ligada. Deixando-a tão desnorteada e apavorada quanto a luz do sol. A diferença era que ela não queria fugir daquela luz, na verdade, ela queria justamente o contrário. E pela primeira vez na vida, ela se viu como uma traça. Sendo atraída pela luz, tornando-se cega com seu brilho, deixando-se ser queimada com seu calor.
E mesmo já sabendo seu fim, ela lhe deu sua mão.
A mulher tentou não demonstrar qualquer emoção enquanto o rapaz segurava firmemente sua mão embaixo da torneira da pia. Ela tentou fingir não escutar seu coração cavalgando contra seu peito enquanto ele acariciava delicadamente seu pulso com a ponta de seus dedos, esperando que a água corrente tirasse o excesso de sangue de sua mão. Quando as feridas na palma de sua mão se tornaram mais visíveis, ele fechou o registro e observou atentamente suas feridas.
- Você não sai muito – ele murmurou, pegando um pacote de gases. se distraiu por um momento pela forma que o rapaz cuidava dela, deslizando suavemente as gases contra sua ferida, tomando extremo cuidado para não machucá-la.
sabia que não lhe foi feita uma pergunta, mas, diante do silêncio, sentiu-se na obrigação de explicar:
- Não sou muito sociável.
Havia um tom de divertimento em sua voz e ela esperou que notasse isto e que soubesse que não era um detalhe que a incomodava, não de todo caso. Porque no fundo ela sabia que, apesar de não ser uma mentira, não era exatamente por aquele motivo que ela se trancava em sua casa. Era complexo e particular, nunca foi algo de se orgulhar, na verdade, ela odiava que outras pessoas soubessem daquilo. Mas, por um breve momento, tão breve quanto um suspiro, ela desejou contar ao rapaz. Ela estava disposta a dar de bandeja todos seus defeitos e neuras a um desconhecido. Então, em um piscar de olhos, ela voltou a sua sanidade, com a leve consciência de que, talvez, Mindy estivesse certa sobre ela precisar de novas consultas com sua psicóloga.
- É, acho que notei isso – ele sorriu torto para ela antes de voltar a atenção para o curativo que já estava por fazer com os materiais que havia encontrado dentro da caixa. – Posso fazer uma pergunta?
- Além desta? – ela brincou, embora seus lábios franzidos demonstrassem apenas curiosidade.
- Além desta – acenou, sorrindo para si mesmo.
- Vá em frente.
Ele não fez a pergunta e não o pressionou a fazer, mesmo que estivesse se moendo de curiosidade. Apenas permitiu que ele cumprisse seu tempo, entendeu que talvez não fosse uma pergunta simples. Do contrário, ele não hesitaria.
Ela pensou que talvez tivesse sido uma má ideia lhe dar carta branca para a pergunta, talvez ela não quisesse escutar. Talvez não devesse. Porque ambos não se conheciam, ele não sabia nada sobre ela e dificilmente entenderia quaisquer que fossem suas respostas. Nem mesmo sua família lhe entendia. Como ela poderia pensar que um estranho o faria? Mas ela já havia permitido, não havia mais volta. Claramente ela poderia mudar o rumo da conversa ou pedir-lhe que não fizesse perguntas, ele certamente respeitaria sua escolha. era deste tipo de homem, daquele que não ultrapassa limites alheios se não for de extrema urgência. Ou senão envolver uma mão cheia de cortes devido aos cacos de vidro.
- Qual é o problema com as luzes?
piscou pela surpresa.
Ela havia se encontrado com apenas três vezes, incluindo aquele momento que, sem dúvidas, foi o maior contato compartilhado entre ambos desde que se conheceram. Ambos só sabiam seus nomes e os números de seus apartamentos, nada mais. E, mesmo assim, parecia conhecê-la bem o suficiente para entender que havia algo de dramático sobre as luzes. O sentimento sentido minutos antes pareceu voltar com mais força, quase fazendo-a cuspir as verdades sobre sua vidinha neurótica.
Mas ela nada disse.
Quando terminou de enfaixar a mão da mulher, ergueu os olhos para ela, claramente esperando por uma resposta. puxou sua mão, agora enfaixada, e fitou a bandagem que cobria sua pele. Para , ela estava verificando a autenticidade de seu trabalho. Para , apenas uma distração e desculpa para não manter um contato visual com o rapaz.
- Eu deixei que você fizesse a pergunta, nunca disse que responderia.
Ela esperou qualquer reação do rapaz, desde raiva até determinação em fazê-la falar. Mas, ao invés disso, ele apenas acenou com a cabeça, sorrindo torto para a moça.
- Parece justo.
sorriu de volta para o rapaz, esquecendo-se completamente sobre a luz da lâmpada que aos poucos a queimava. Ou talvez fossem os olhos de , mais tarde a mulher ficou indecisa sobre isso. Antes que ela pudesse dizer qualquer coisa, um toque abruptamente alto cortou a seriedade que pairava no ar, dissipando-a em nada.
- Desculpe – ele murmurou para ela enquanto puxava o celular que estava no bolso de sua calça, atendendo-o.
acenou, embora soubesse que os olhos do rapaz estavam no chão, assim como os seus. Estando ciente de que estava invadindo a privacidade dele ao escutar sua tentativa de conversa, suspirou e saiu do banheiro, deixando-o a vontade.
Deixando-se inconscientemente confortável também, quando mergulhou na escuridão do corredor. E ela não sabia o quão tensa estava até ficar relaxada. Com um longo suspiro, encostou-se na parede e esperou pacientemente pelo rapaz. Paciência não era uma virtude de , de forma que ela agradeceu pela rapidez com que o homem surgiu no corredor, por um breve momento, procurando-a. Ela sorriu para si mesmo, sentindo-se interiormente quente com a sensação de afeto que corria em suas veias.
- Phill precisa urgentemente dar um jeito nessas redes – ele desabafou com humor quando a encontrou, guardando o celular. - Eu preciso ir.
Algo dentro dela murchou como uma bexiga e ela tentou ignorar aquele sentimento.
- Você não vai levar seu pagamento? – ela brincou, gesticulando para a cerveja que ele havia deixado para trás, ao se dirigir a porta. tentou não pensar que ela o estava atrasando, adiando sua saída, mas no fundo sabia que essa era sua intenção.
- Eu levaria, mas vou trabalhar – ele ergueu os ombros, desculpando-se. – Fica para a próxima.
sorriu com a possibilidade de se encontrarem novamente e, por algum motivo desconhecido, sentiu-se mais sossegada em deixá-lo ir. Ela alcançou a porta antes dele, segurando a maçaneta e hesitando por um instante. Rápido o suficiente para que não indagasse nada, mas não o suficiente para ele não notar cada músculo hesitante da mulher. Ele franziu as sobrancelhas, esperando pela reação de que, após um longo minuto, respirou fundo e girou a maçaneta, virando-se para enfrentar o rapaz, que a olhava com curiosidade.
- Para ser sincera, eu não te chamei por precisar da sua ajuda.
parecia surpreso, não pela confissão em si, mas pela sinceridade dela em lhe dizer aquilo que ele, embaraçosamente, não teria coragem de dizer em voz alta. E, assim como a surpresa, ele não conseguiu disfarçar o contentamento diante das palavras da moça. Não quando o pensamento dela o ter chamado apenas por necessidade lhe era tão amargo.
- Eu sei – ele murmurou em um ato de ajuda uma vez que ela parecia insegura sobre como continuar. – E eu fico feliz por você ter me chamado de qualquer forma.
andou suavemente até a porta, que foi totalmente aberta por , que o observava encostar-se ao batente. Ambos estavam próximos, a apenas um passo de distância e nada seria capaz de afastar o olhar atento e curioso que compartilhavam. A luz do corredor estava acesa e entrava em contraste com a escuridão do apartamento de . Um de cada lado, fitando-se com apreço e anseio. Se pudesse se duplicar, certamente conseguiria uma fotografia perfeita daquele momento. Mas ele era apenas um e, pela primeira vez durante toda sua vida, viver o momento parecia mais importante que recordá-lo em uma imagem.
- E eu ficaria mais feliz ainda se você aceitasse almoçar comigo.
Até mesmo ficou surpreso diante de suas próprias palavras. É como se Mia tivesse o controlando naquele momento, pois aquele não era ele. Não, ele não chamava mulheres para sair, não assim tão rápido e tão descaradamente. Se tinha uma coisa que Mia odiava em era sua timidez. Não era uma timidez normal, ela era apenas reservada para mulheres desconhecidas, das quais ele tentava manter distância e, consequentemente, ele não conhecia muitas mulheres. As poucas que ele já conversava tranquilamente sem gaguejar, enrubescer ou congelar foram frutos de um trabalho demorado e árduo. Normalmente, demoravam-se meses para que ele criasse coragem e autoconfiança o suficiente para chamar alguém para sair. Não dias.
Por um breve momento, ele repensou e ficou em dúvida se deveria ou não arrepender-se, mas então sorriu e todas as dúvidas se foram como em uma enchente. Ele não sabia se já tinha reparado, mas ela tinha um sorriso lindo. Principalmente nesta perspectiva onde a sombra proporcionada pela luz refletia em seu rosto pálido.
- Eu... – ela engasgou por um momento e repetiu a mesma coisa mais três vezes, silenciando-se logo em seguida.
curvou a cabeça, fitando-a com aqueles grandes e profundos olhos que a escaneavam e pareciam lhe ver melhor que uma máquina de raio x.
E, embora sua maior vontade fosse aceitar, mesmo diante daquele homem em forma de chantagem emocional, ela não poderia levar aquilo em frente. Não se não quisesse que o homem em pouco tempo a odiasse. Ela e toda sua merda paranoica.
- Você vai precisar se esforçar mais.
Ela sorriu antes de fechar a porta para o rapaz, que piscou em surpresa. Ele sabia que pelo seu tom, ela estava brincando, mas ele não podia conter seu orgulho ferido. Ele sabia que havia levado um fora e, em outras circunstâncias, ele iria querer enfiar a cara no chão e nunca mais voltaria a olhar em seus olhos novamente. Mas o rapaz nunca esteve tão mais disposto a ver o rosto da mulher novamente.
Mia estranhou o sorriso bobo nos lábios do tio quando ele chegou no apartamento, onde ela esperava com uma câmera na mão, andando de um lado para o outro. Ela parecia nervosa e ele supostamente deveria estar também, pois sua cliente já estava no estúdio, provavelmente sendo enrolada por Mia até que ele chegasse. Mas ele estava tão aéreo que nem ao menos notou a presença da segunda mulher no cômodo, já totalmente iluminado e organizado.
- Onde você estava? Eu arrumei tudo, mas... – Mia sussurrou nervosa para ele, dando-lhe sua câmera e sumindo com sua carranca quando notou que o sorriso brilhante se alargou no rosto de . – Você andou fumando?
- Obrigado, pirralha – o rapaz beijou o rosto da sobrinha, empunhando a câmera em mãos e caminhando até a modelo para apresentar-se e iniciar a sessão de fotografias.
Mia balançou a cabeça, balbuciando um “louco” enquanto limpava o rosto com a manga de sua blusa.

***


O relacionamento deles mudou, ou melhor, começou a partir daquele dia. soube disto quando, no dia seguinte, a mulher bateu em sua porta por volta das onze da noite para pedir açúcar. Ele soube instantaneamente que era uma desculpa esfarrapada. Mais tarde, quando ambos estivessem sozinhos, ririam disto. Mas, no momento, a neutralidade predominava em seus rostos que compartilhavam olhares divertidos. Com receio de estragar as coisas, não a questionou e apenas entregou uma xícara cheia de açúcar, ignorando o quão suas mãos estavam úmidas quando a mulher tocou seus dedos, propositalmente.
Alguns dias se passaram, sem que ambos ficassem sem se ver por um dia sequer. A desculpa esfarrapada mantinha o mesmo propósito e inutilidade, era desde um carregador de notebook emprestado até sal de cozinha. sempre lhe dava tudo que era pedido, mesmo sem saber se realmente seriam necessários para ela. O que ele poderia fazer? Apreciava a disposição da mulher em manter contato, ele não era tolo ao ponto de não ver o tamanho de esforço que isso exigia dela. não parecia gostar de sair do conforto e segurança de seu apartamento, ele notou isto após observá-la tantas vezes. Ela hesitava no batente da porta e parecia repensar se era uma boa ideia sair ou não, então respirava fundo e mantinha os olhos baixos e os passos rápidos até a porta do rapaz, onde não insistia em prolongar.
Então, depois de dias, quando ela sumiu, o rapaz deduziu que as desculpas haviam acabado e isso incrivelmente o causou um desconforto.
Após três dias, movido pelo desconforto crescente, ele foi até a porta de número 7. Para sua surpresa, a porta estava entreaberta.
Era tarde e não deixaria a porta aberta, ele sabia disto. Então, mesmo não sendo certo, ele se viu adentrando o apartamento escuro, com o coração batendo contra seus ouvidos em uma clara preocupação com a mulher, que não respondia aos seus chamados.
O cômodo parecia mais escuro sem para guiá-lo.
Então ele escutou um arrastar de pés atrás de si e, antes que pudesse se virar para enfrentar o invasor, foi atingido nas costas. recebeu mais dois golpes antes de conseguir se afastar, praguejando em voz alta enquanto tropeçava nos próprios pés.
- Ow! – ele gemeu, virando-se para encontrar uma surpresa, com um taco de beisebol nas mãos trêmulas. – Qual é o seu problema?
O barulho ruidoso do taco se chocando contra o chão ecoou pelo apartamento, mas não teve tempo para pensar sobre isso, não quando a mulher rapidamente e abruptamente se aproximou dele. Suas mãos gélidas e delicadas pousaram sobre seus ombros, o toque de preocupação em sua feição e voz eram claras demais para serem ignoradas.
- Desculpe, eu não... – ela gaguejou, varrendo o corpo do rapaz com o olhar atento, a procura de qualquer ferida que talvez tivesse causado. – Meu Deus, eu te machuquei?
Suas costas doíam, tanto que ficar em pé parecia ser uma péssima ideia. Mas ele nada disse. Os olhos profundos da mulher ainda o fitavam, mais fixamente do que nunca. E ele gostava desse olhar, gostava da sensação de calor por dentro e da incontrolável vontade de sorrir para ela. Ele não queria preocupá-la. Não mais do que ela já aparentava estar.
- Eu estou bem – ele sorriu fraco para ela, tentando tranquilizá-la, afastando-a em uma distância segura para ambos. Respirar parecia extremamente dificultoso com ela o tocando.
- Tem certeza? – ela fez uma careta, aceitando a distância como um aviso de que ele precisava de espaço, embora sua maior vontade fosse tocá-lo. – Eu te acertei com muita força?
- Digamos que você desmente a teoria de que mulheres são fracas – brincou, ajustando sua postura e tremendo violentamente com a dor que atravessou sua coluna.
- Você entrou aqui sem avisar, no meio da noite e eu só pensei que fosse um desconhecido... – tentou se explicar, parecendo extremamente envergonhada e adorável aos olhos franzidos de dor do .
- Sua porta estava aberta, precisava verificar se tudo estava ok – ele espalmou suas costas, atrás de qualquer ferida.
- Eu estava esperando minha irmã... – ela suspirou, parecendo não querer falar sobre este assunto, pois rapidamente focou-se no rapaz novamente. – Posso ver?
O rapaz poderia dizer que estava bem, mas os olhos inquisidores da mulher pareciam controlá-lo, pois mesmo estando hesitante ele respondeu:
- Sim.
Ele não sabia o que estava pensando quando deu as costas a mulher e puxou a sua camisa pelo seu pescoço, com uma facilidade que deixou levemente tonta. Ou talvez fosse a visão extremamente e estranhamente carnal de suas costas nuas ali a disposição de sua vontade. Por um momento, ela se encontrou desejando passar suas unhas curtas contra a extensão de sua pele, de beijar cada pedaço avermelhado, hematomas estes que ela foi culpada. E não teria reclamado caso ela seguisse suas vontades, na verdade, ele ansiava pelo contato da mulher que respirava profundamente, ainda sem reação.
Mas nenhum dos dois expressou suas vontades.
passou a ponta dos dedos contra sua pele, contornando levemente os hematomas e, apesar de ser um contato leve, se encolheu.
- Desculpe – ela repetiu, puxando o ar abruptamente e encolhendo sua mão antes que o contato se prolongasse. pareceu sentir o clima embaraçoso, pois rapidamente colocou a camisa, limpando a garganta. – Eu... Tem algo que eu possa fazer?
- Está tudo bem, foi minha culpa – a luz fraca que vinha de uma luminária na cômoda ao lado do sofá iluminou razoavelmente o sorriso torto do rapaz. Sorriso este que, após um segundo pensamento, se alargou. – Na verdade, tem algo...
não hesitou em incentivá-lo:
- Diga.
- Seria muito babaca da minha parte se eu usasse isto como uma chantagem emocional para convencê-la a ter aquele almoço comigo? – ele sorria genuinamente, embora sua voz e postura demonstrassem sua ansiedade.
- Você seria um completo babaca – ela respondeu com sinceridade. Porque era uma verdade, assim como era verdadeiro o sentimento de incapacidade que ela sentia diante daquele sorriso. Ela não deveria, ela sabia disto. Não por teoria, mas na cruel prática. Ela não havia tido muitos relacionamentos mas os poucos em que se envolveu, arrependeu-se. Ninguém seria capaz de conviver com ela, nem sua própria família era. E, mesmo sabendo que não deveria, não parecia uma opção dispensar aquele sorriso. – Mas eu aceitaria.
pareceu surpreso, tanto quanto ela. E ela se arrependeria disto, afinal, ele não a conhecia e, quando o fizesse, iria embora. No fim, ela se machucaria. Mas como ela poderia se arrepender disto agora, diante daqueles olhos e daquele sorriso largo que parecia lhe queimar mais do que nunca?

***


incrivelmente não se sentiu surpreso quando não surgiu, no dia seguinte. Já eram duas da tarde e ele continuava sentado em uma mesa vazia, próxima a janela de onde ele tinha uma visão perfeita do prédio razoavelmente grande onde ele morava.
Ela deveria ter chegado ao meio dia. Isto o deixava decepcionado, não surpreso. Porque, em algum lugar de sua mente, ele já sabia que ela não apareceria. Não, não seria tão fácil assim.
Deu três horas da tarde e o sol que timidamente transpassava a janela, atingindo sua pele e queimando-a de uma forma insuportável, como se debochasse da sua cara, dizendo-lhe quão tolo era.
Com um longo suspiro, ele jogou algumas notas de dinheiro sobre a mesa e saiu calmamente do restaurante. O barulho da porta atrás de si o fez fechar os olhos e, por um momento, ele ficou parado ali na porta. Absorvendo a luz solar como um tipo de energia que o faria voltar a sua rotina normal.
Manter-se focado.
Foi o que ele tentou durante cinco dias e ele, incrivelmente, estava conseguindo. O fato de não ver ajudou bastante, embora ele sentisse uma fisgada e diminuísse os passos diante a porta de número 7. E, em algum momento, submerso na sala de revelação que ele tanto sonhou, revelando as fotos que sempre foram o objetivo de toda sua vida, ele até esqueceu-se da moça. Esqueceu do sorriso tímido, da risada alta, dos olhos brilhosos e do medo claro em sua feição. Ele até esqueceu-se da existência de sua encantadora e complexa vizinha.
Mas isto foi só até alguém bater em sua porta, até ele escutar a voz macia e hesitante da mulher, chamando-o. Ele poderia ignorar, estava ciente de que ela sabia de sua presença, mas também sabia que ela respeitaria seu silêncio, caso ele quisesse fingir não estar em casa. E, por um momento, ele desejou fazer isso. Ignorar sua voz até que ela não existisse mais.
já não o chamava mais quando ele afundou, inconscientemente, a mesma foto no líquido diversas vezes, deixando-a manchada.
- Droga! – ele praguejou, resgatando a foto quando notou seu erro. Então, com um profundo suspiro, ele notou. Mesmo que quisesse negar, ela já habitava novamente seus pensamentos, deixando-o completamente desatento e impaciente. queria prender-se ao pouco de amor próprio que havia sobrado, mas sabia que não conseguiria. Não sabendo que estava em sua porta, esperando qualquer resposta. - Entre – ele disse alto e claro, tentando inutilmente focar-se novamente nas fotos. Uma tarefa inusitadamente árdua uma vez que ao escutar a porta da frente abrir, ele focou-se na aproximação da moça. Uma aproximação que demorou longos minutos e que o levou ao pensamento de que talvez ela tivesse ido embora silenciosamente. Essa hipótese no momento parecia, abruptamente, decepcionante demais para ele. Então ele notou, ele queria falar com ela, ou melhor, queria que ela falasse com ele. – Estou aqui no fundo.
Mesmo após seu aviso, demorou algum tempo para que ele escutasse novamente os passos e a ideia dela ter ido embora se concretizava até que a porta do pequeno cômodo foi aberta. A luz que adentrou o quarto de revelação era tão forte e abrupta que obrigou a piscar diversas vezes para adaptar-se a claridade, que rapidamente foi interrompida por , fechando a porta. O rapaz piscou para a mulher, surpreso por ter conseguido se esquecer dos traços dela. Surpreso pela beleza das luzes avermelhadas sobre a pele pálida de e de como seus olhos estavam grandes diante de todos seus receios e medos. limpou a garganta, afugentando a vontade de tirar uma foto dela. Isso provavelmente a deixaria mais assustada.
- Belo estúdio – ela disse, sinceramente, após um longo momento constrangedor.
piscou novamente, erguendo as sobrancelhas diante da frase de . Ele a questionaria, o ácido do pouco de mágoa ainda ardendo levemente em sua garganta. Mas então ela se abraçou, olhando ao redor com olhos brilhosos. E ele notou. Ela estava tentando, apesar de parecer apavorada, ela estava tentando algo. Uma ponta de compaixão o fez sorrir torto para a moça.
- Então todo trabalho valeu a pena.
Ela murmurou uma confirmação inaudível, voltando seu olhar para os olhos fixos e o sorriso quente do rapaz.
voltou o olhar para as suas revelações, tentando manter as mãos, os olhos e talvez um pouco de sua atenção sobre seu trabalho, evitando quaisquer divagações inapropriadas.
o observou atentamente, a forma como seus ombros largos moviam confortavelmente e como seus dedos trabalhavam com cuidado, ele parecia tão habituado aquele lugar. Diferente dela que tremia a cada segundo que passava, ciente da luz que a cercava. Ciente da ardência quase insuportável em seu antebraço, como um lembrete do que ela poderia lhe causar.
- Qual é o lance com o número sete?
voltou sua atenção para a mulher, curioso.
- Como assim?
- Quando você bateu na minha porta pela primeira vez, bateu seis vezes e pareceu impaciente por eu ter aberto a porta antes da sétima vez. – ela respirou fundo, olhando para os próprios dedos por uma desculpa para fugir do olhar do rapaz. Ele provavelmente a olharia como se ela fosse uma louca. – Mesmo após ligar a luz, você passa o dedo sobre o interruptor sete vezes. Em seu chaveiro há sete chaves, embora você só use uma. Toda vez que você passa pela minha porta, você para, anda sete passos e então para por um momento antes de continuar seu caminho. E eu vi como você olha para minha porta. Eu...
arfou e se interrompeu, esperando por um surto do rapaz, mas ele nada disse, ainda a fitando de forma incrédula.
- Talvez seja tudo coincidência e eu seja apenas uma neurótica tentando juntar peças, mas acredito que se eu te conhecesse por mais tempo, teria mais evidências sobre outros setes... – ela puxou o ar, fitando-o com um olhar de súplica, quase implorando para que ele dissesse algo. – Não estou te julgando, eu só...
- Tudo bem – ele atendeu aos seus pedidos, sua voz falhando miseravelmente, embora. – Eu só nunca pensei nisso.
acenou, consciente de que ele precisava de um momento para pensar sobre o assunto. E ela respeitou isso, tentando ignorar a dor do desconforto que crescia em seu peito. respirou fundo, virando-se completamente em sua direção, seu corpo emanando o calor que parecia ser o fim para suas brasas. Ele cruzou os braços, parecendo pensativo por um momento, então hesitante e, por último, calmo.
- Quando eu tinha nove anos, fui diagnosticado com leucemia.
apertou os braços em torno de si mesma, analisando-o com cuidado e suspirando diante da informação.
- Eu sinto muito.
sorriu para ela.
- Não sinta, com nove anos eu nem sabia o que isso significava e o pensamento de ser tio, quando descobri que a esposa do meu irmão estava grávida, foi maior que qualquer outra notícia – ele riu levemente, fazendo-a admirá-lo por ser tão auto suficiente, mesmo diante de seu passado. – Mas eu estava ciente de que estava doente, e embora às vezes eu flagrasse minha mãe chorando, eu fiquei um bom tempo sem entender a proporção da minha doença. “Com doze anos a doença já tinha evoluído e eu tive que ficar internado no hospital durante longas semanas e durante esse tempo eu recebi visitas, às vezes até mesmo de parentes distantes. Todos sorriam para mim, diziam que eu melhoraria, mas eu sabia que era mentira. Sabia disto porque quando iam embora abraçavam minha mãe e murmuravam palavras de conforto. Acho que foi naquele momento que compreendi que eu morreria. Eu não disse nada, mesmo após voltar para casa. Mesmo depois de anos de esforços dedicados à procura de um doador compatível, mesmo com todo otimismo da minha família. Eu estava ciente de que poderia morrer a qualquer hora. Sabia que poderia ir dormir e não acordar mais e isso, incrivelmente, não me assustava. Aos quinze anos, minha mãe finalmente parou de fingir que não notava minha indiferença e me confrontou quando me neguei a ir para mais uma sessão de poliquimioterapia. O fato é que eu já estava na minha sexta tentativa falha de transplante de medula óssea e minha doença já havia avançado, eu sabia que os medicamentos não me salvariam e sempre estive ciente de que minha mãe também sabia disso, ela só não queria aceitar.”
- Porque ela te amava.
Era algo ridiculamente óbvio, mas se sentiu na necessidade de dizer aquilo em voz alta. Talvez porque quisesse que sua mãe fosse tão positiva quanto a mãe de ou apenas para amenizar o impacto daquelas informações. nunca imaginaria que aquele rapaz havia passado por uma doença como a leucemia, não quando ele bateu em sua porta furioso e determinado. Não quando depois ele a ajudou com suas compras e entrou em seu apartamento apenas para verificar se ela estava bem. Porque ele parecia ser tão forte, como se nada o tivesse atingido uma vez se quer. Como se a vida sempre tivesse sido tão bondosa com ele. Ela certamente o havia julgado errado e ela não suportava essa ideia. E o remorso apenas aumentou quando ele sorriu largamente para seu comentário, a fitando com uma profundidade que a fez se sentir nua. Fazendo-a esquecer-se totalmente da ardência em sua pele e do desconforto.
- Um mês depois ela me chamou para um piquenique – ele riu levemente, fazendo-a sorrir diante de sua risada, embora a ternura ainda a sufocasse. – Eu estava fraco e só queria ficar na minha cama, mas eu não queria que eles tivessem a imagem de um moribundo como recordação. Então eu fui. Foi a partir daquele dia que eu desejei viver.
- Por quê?
Era apenas uma pergunta que depois de reproduzida em voz alta, tornou outra forma na mente nebulosa de . Ela temeu que também entendesse da forma errada e estava apta a refazer sua pergunta quando o rapaz simplesmente respondeu:
- Minha sobrinha - ele sorriu, não o mesmo tipo de sorriso ao qual ela já havia visto, ela observou. Era o tipo de sorriso que a fazia se sentir quente e confortável, como se ela estivesse sendo abraçada mesmo que ele estivesse a alguns passos de distância. – Eu fiquei tanto tempo trancado no quarto que esqueci que havia uma criança crescendo fora daquelas paredes. E quando eu a vi correndo pelo parque, pedindo para que eu brincasse com ela, mesmo eu estando tão desgastado...
Ele balançou a cabeça e notou com afeição a comoção do rapaz.
- Eu supostamente deveria vê-la crescer, eu deveria estar na sua formatura, deveria ensinar-lhe a como entrar em boates com uma identidade falsa ou como estourar o cartão de crédito do pai dela sem ele descobrir.
- Ótimas heranças intelectuais – brincou, sentindo-se, logo em seguida, extremamente orgulhosa e satisfeita quando o rapaz riu.
- Eu também acho – ele balançou a cabeça, rindo levemente. – Mas meu irmão não pensaria o mesmo.
arrependeu-se de se pronunciar assim que o rapaz fez silêncio e permaneceu com ele pelo o que pareceu longos minutos. A mulher nunca foi de escutar muito, sua mãe costumava apontar isto como um defeito e ela sempre esteve ciente que sua mãe estava certa. Às vezes, quando sua irmã enchia-lhe os ouvidos com conselhos e incentivos, ela sentia-se mal por não dar ouvidos. Mas ela nunca diria isto em voz alta, não sendo tão orgulhosa quanto sempre foi. E agora ela ansiava por escutar a voz do rapaz que mantinha o silêncio. Era um tanto quanto cômico se ela visse a situação de um ponto de vista de fora.
- E onde entra o sete? – ela perguntou curiosamente, instigando-o a continuar.
- Aos dezenove anos, eu fiz novamente uma tentativa de transplante, a que me manteve vivo até hoje – ele sorriu divertido, diante da reação de , provavelmente. – Depois de seis tentativas falhas, achei que seria o mínimo considerar sete meu número da sorte.
suspirou e desviou o olhar, o fato é que ela estava cercada de fotografias então, mesmo que fosse invasivo ou errado, não pôde conter sua curiosidade em analisar as fotos que estavam no alcance de seus olhos ardentes. Ela se aproximou levemente de algumas fotografias penduradas em pequenos varais, fitando o talento e esforço de . Haviam fotos extremamente profissionais, mas, incrivelmente, as de aparência caseira foram mais chamativas para os olhos sensíveis da mulher. Todas as fotos eram de uma moça jovem, talvez apenas um pouco mais que ela, de cabelos da cor de caramelo e olhos , tinham olhos grandes que lembravam os de , mas um jeito brincalhão que certamente nunca teria. Ela parecia espontânea em todas as fotos e bem íntima de , uma vez que haviam fotos dela desde acordar até escovando os dentes. Então, se sentiu, subitamente, envergonhada.
Ela não deveria estar olhando para estas fotos.
- Eu tive problemas para dormir, mesmo após a doença – a voz profunda de confessou perigosamente perto e, diante de um pulo involuntário, o encontrou ao seu lado, fitando as mesmas fotos que a deixavam desconfortável, mas que parecia trazer paz ao rapaz. – Eu tenho até hoje. Eu simplesmente não consigo ir dormir, não consigo apagar a luz e ignorar o sentimento de incapacidade. Você sabe, eu apenas...
Ele respirou fundo, fitando-a com um pedido silencioso no olhar, um pedido ao qual ela estava habituada a pedir. Ele esperava que ela o entendesse. E ela o entendia, tão bem que sentia-se até mesmo satisfeita em saber que alguém também a entendia, mesmo que fosse errado, pois era um entendimento em sofrimento que ambos compartilhavam.
- Você sente como se nada tivesse mudado, como se qualquer dia você pudesse simplesmente deixar de existir – ela murmurou, tão baixo que se ele não estivesse tão próximo dela, ele não teria escutado. – Desculpe pelo bolo que te dei, não foi proposital.
a fitou com uma admiração clara que a deixou abruptamente e violentamente envergonhada. Ela empurrou os fios soltos para trás de sua orelha, seus dedos trêmulos deixando o trabalho levemente complicado e a fazendo se sentir cada vez mais embaraçada diante dos olhos e profundos de .
Ela sentiu o toque cauteloso dos dedos quentes de em seu queixo, fazendo-a erguer o olhar para procurar entender o que passava pela cabeça do rapaz, mas então, os lábios, também quentes, do rapaz se chocaram contra os seus, a fazendo mais confusa. E não é como se ela não tivesse gostado, pelo contrário, ela definitivamente havia gostado do contato e ansiava por mais. deixou isso bem claro quando emaranhou seus dedos trêmulos no cabelo perfumado e macio do rapaz que explorava sua boca com uma perspicácia invejável.
O fato é que não sabia o que estava fazendo. Quer dizer, ele a beijava pois queria, quis isso no momento em que viu a mulher abrir a porta para ele, desafiando-o logo em seguida ao desligar a luz com um olhar sarcástico. Ele não assumiria nem para si mesmo, mas ele soube que havia algo sobre ela assim que pôs seus olhos sobre a mulher. E ele não costumava ser intuitivo, principalmente quando se tratava de seu emocional. Mas ali estava ele, após chamar uma desconhecida para um encontro e contar-lhe sobre toda sua vida mesmo depois de tomar um bolo da moça, e agora estava a beijando. Simplesmente porque ele precisava. Porque almejava sentir o gosto de seus lábios. Porque pouco se fodia para o que ela escondia, para os motivos de ter deixado-o uma manhã toda a esperando, se é que havia realmente motivos para isso.
Mas em um canto de sua mente, entre todas as emoções fundindo-se, a razão pedia-lhe que conhecesse a mulher antes de qualquer envolvimento. E esse pensamento apenas se concretizou quando, para sua surpresa, a mulher rapidamente parou de respondê-lo e o empurrou.
Ele piscou, atordoado, e ela parecia da mesma forma, ou talvez pior. Ela parecia sentir dor, como se ele a tivesse empurrado, e não ao contrário. arfou e analisou, tentando entender a reação controvérsia quando parou os olhos sobre a mão esquerda enfaixada que segurava contra o corpo encolhido em defensiva.
- O quê...
E antes que o rapaz pudesse colocar quaisquer pensamentos em palavras, correu para fora do quarto, fechando a porta atrás de si tão rapidamente que nem deu tempo para a luz cegar novamente.
A confusão já o cegava o suficiente.

***


Após duas noites sem conseguir dormir, desistiu.
Nem mesmo os baques que o deixavam tão sonolento seriam capazes de acalmar as emoções que insistiam em deixá-lo acordado, remoendo aquele dia.
E pela primeira vez em muito tempo sua insônia não se devia ao medo.
Era a pura inquietação de talvez ter cometido um erro. Ele não deveria tê-la beijado. E se ela não quisesse? Mas por que teria retribuído com tanto fervor? Ele não devia, mas ainda sentia o gosto doce e macio de em sua boca e ansiava por mais. Então, após longos minutos rolando na cama, ele se levantou. Eram por volta das duas da manhã e embora não fizesse nenhum sentido em sua mente, ele foi até a porta de , disposto a acordá-la no meio da madrugada para pedir desculpas por algo que claramente ela também queria. Mas que também parecia não querer.
Exatamente no sétimo toque, abriu a porta prontamente, como se estivesse esperando ao lado da porta pelo ritual de . Para a surpresa do rapaz, ela não parecia ter acabado de acordar e também não parecia estar furiosa. Mesmo assim, ele não esperou que ela dissesse nada, temia que ela mudasse de ideia e o mandasse embora. Então, rapidamente disse o que estava preso em sua garganta há dois dias:
- Desculpe.
colocou as mãos dentro dos bolsos do moletom e ergueu as sobrancelhas, curiosa. Mas se manteve em silêncio, tentando entender pela feição do rapaz pelo o que, exatamente, ele se desculpava. Durante este pequeno intervalo de silêncio e apenas olhares, se permitiu observá-la e notou o quanto sentiu falta de seu rosto com traços suaves, de seu jeito peculiarmente hesitante e dos olhos grandes e observadores.
- Está desculpado - ela escondeu um sorriso – seja pelo o que for, você deve estar se sentindo realmente muito culpado para bater na minha porta de madrugada apenas para pedir desculpas.
Ele aspirou ruidosamente o ar, dividido entre rir ou explicar-se, optando, após um longo minuto, pela segunda opção.
- O beijo – ele disse simplesmente e, após ver o desconforto da moça, acrescentou: - Eu não devia ter te beijado, foi babaca da minha parte beijar você sem ao menos perguntar se você queria.
já não parecia mais querer sorrir quando suspirou, abrindo caminho para , que a fitou confuso.
- Quer uma xícara de chá?
entrou sem hesitar.
Era a quarta vez que ele entrava em seu apartamento e parecia exatamente da mesma forma que as outras vezes em que ele esteve lá, os cômodos de difícil visibilidade por estarem afundados em escuridão. Desta vez, apenas um pouco de chama luminosa que escapava da pequena sala de jantar indicava ter apenas uma luz acesa e, embora curioso, ele não conseguiu ver o porquê daquele ponto de luz.
Ele seguiu fielmente a silhueta de , apesar de ainda ter uma vaga ideia de onde ficava a cozinha. Enquanto a seguia, notou o quão confortável ela parecia com seu moletom, acordada tão tarde. Aquele certamente foi o momento mais passível que ele obteve da mulher desde que a conheceu. Então ele pegou todos seus questionamentos, receios e vontades e os guardou em um lugar seguro de sua mente para apenas aproveitar da tranquilidade de , ciente de que era algo raro.
Não demorou para que uma xícara razoavelmente grande de chá quente fosse colocada sobre a bancada na sua frente, após se sentar na cadeira indicada por , que logo em seguida sentou-se ao seu lado, com sua própria xícara. tentou fingir não estar olhando de soslaio . Abafou sua admiração com o líquido quente enquanto ela afastava suas mechas e as colocava atrás de suas orelhas avermelhadas.
- Vá em frente – ela murmurou, após pousar a xícara sobre a bancada e flagrar o olhar do rapaz, deixando-o envergonhado por ter sido pego. – Pergunte.
Ele não precisou questionar para saber ao que ela se referia.
- Outro acidente? – ele gesticulou para a mão enfaixada da moça.
abaixou o olhar e aquilo foi o suficiente para que soubesse que ela não lhe responderia.
- Mais uma que você não prometeu responder, não é?
não quis soar inquiridor, mas foi provavelmente o que a sua vizinha escutou em sua voz, pois ela franziu as sobrancelhas.
- Não faço isso por divertimento.
- Eu sei – ele murmurou em um tom de desculpas oculto.
contou nove goles de para que ele construísse sua pergunta da melhor forma para que ela não pensasse que ele estava tentando invadir seu espaço, que parecia ser tão valioso. Mas ele não podia tomar o resto de seu chá que agora já estava menos que morno na sua xícara gélida e fingir que aquele silêncio não o constrangia tanto quanto aquela escuridão o intimidava e a presença da mulher o desnorteava.
- O que você estava fazendo acordada a esse horário?
o fitou por um instante, deixando-o receoso que tivesse passado do limite novamente quando ela abandonou a xícara já quase vazia sobre a bancada e levantou-se. Surpreendo-o quando o chamou com um aceno.
- Vem – ela pediu calmamente, sua voz ecoando em sua mente como uma prece que ele prontamente cumpriu, seguindo-a.
Ele estava ciente de que ela provavelmente queria provar que ele estava errado ao insinuar o quão reservada ela era, para mostrar-lhe que ela era capaz de compartilhar algo pessoal. Para o fim de sua curiosidade, ela o guiou até a sala de jantar. Não era um cômodo muito grande, fazendo com que a luz fraca que vinha do abajur sobre a mesa de madeira polida se propagasse por todo o cômodo como chamas imóveis. Alguns metros de distância, aparentemente bem calculados, havia uma máquina de escrever. Não parecia necessariamente a mais antiga, mas apenas o fato de ter uma máquina dessas ao invés de um computador comprovava o pensamento de sobre o quão antiquada era . não achava isso um defeito, pelo menos não em alguém como ela.
- Trabalho para uma coluna de uma revista – explicou calmamente, parada diante do batente para apenas observá-lo circular a mesa e aproximar-se curiosamente da máquina. – Normalmente escrevo à noite, é quando as ideais acordam.
Havia um tom brincalhão na voz macia de que fez o rapaz relaxar instantaneamente.
- Acho que alguém deveria te avisar que isso está um pouquinho ultrapassado – ele sorriu divertido para a mulher, apertando distraidamente uma das teclas.
piscou, pasmo, quando reconheceu o barulho que chegou aos seus ouvidos. Sua memória nunca foi uma das melhores, apesar de tudo, ele não descorava datas comemorativas, rostos e pior ainda sons. Esse nunca foi seu forte. Mas aquele era o tipo de som que ele reconheceria em qualquer lugar, afinal, como ele poderia ser capaz de esquecer do exato barulho que foi o motivo de seu sono tranquilo durante as últimas semanas? Não podia ser coincidência. Quantas pessoas no prédio poderiam ter uma máquina daquelas e utilizá-la todas as noites?
- Não gosto muito de tecnologia, você deve ter notado.
O rapaz a olhou, incerto se deveria dizer-lhe algo. Mas o que ele diria? A agradeceria pelas noites de sono ou diria que sempre a escuta digitar seus textos? Era patético e provavelmente soaria invasivo. Pensando assim, ele optou por manter-se em silêncio. Embora seu olhar de profunda gratidão falasse mais que palavras.
- O que foi? – ela questionou após um tempo em silêncio, trocando o peso do corpo de perna em uma clara evidência de desconforto por ser alvo do olhar profundo do rapaz.
- Nada, eu só – ele se interrompeu e com um longo suspiro, prosseguiu: - preciso ir.
parecia pensativa, embora não houvesse motivos para divagar. Era simples, ele precisava ir. Mas por algum motivo ele sentiu necessidade de esperar pacientemente por alguma resposta da vizinha, mesmo sabendo onde ficava a porta e podendo ir embora quando quisesse. Talvez ele apenas não quisesse. Todavia ele não divagaria para este lado do pensamento. A vizinha maneou a cabeça, por fim. O silêncio permaneceu até que chegasse na porta e, antes que ele tocasse a maçaneta gélida, a mesma que iniciou o silêncio congelante, o quebrou em um sobressalto:
- .
O rapaz parou.
Era seu nome, afinal, ele estava habituado a escutá-lo. Mas parecia diferente, a voz macia de e a entonação de necessidade tornava seu nome estranhamente singular ao seus ouvidos.
- Você estava enganado – murmurou sob o som alto de sua respiração, sentindo-se estranhamente envergonhada e febril diante dos olhos confusos de . -, sobre presumir que eu não queria o beijo, você estava enganado.
Talvez fosse a mente do rapaz pregando-lhe peças, mas teve o vislumbre da aproximação sutil e suave de e sua mente apenas distinguiu que era real quando ela já estava perto o suficiente para que ele sentisse o cheiro floral e marcante de seu perfume.
- Eu queria ser beijada naquele dia tanto quanto quero ser beijada agora.
apenas notou que sua mão tocava a pele do pescoço de quando sentiu a quentura de sua tez. E, antes que pudesse se impedir, sua mão suavemente viajou pelas veias de seu pescoço, calmamente e suavemente até que seu contato abrangesse o rosto de sua vizinha. fechou os olhos, relaxando diante de seu toque e procurando, inconscientemente, por um maior contato ao virar o rosto em direção a mão de .
Ele iria beijá-la.
Porque era algo que ele desejava e era algo sobre o que ele pensava frequentemente desde que a beijou pela primeira vez. E, acima de tudo, porque agora ele sabia que ela também queria. Ela deixou isso claro em palavras. Ele ignorou a falta de sentido no fato dela ter fugido após o primeiro beijo, assim como ignorou a questão das luzes e o braço enfaixado. Assim como seria capaz de ignorar todos os mistérios daquela mulher, até que ela achasse que não era mais necessário serem mistérios. Até lá, ele seria capaz de lidar com os segredos dela pois ele estava disposto a tentar. E ele não sabia que estava disposto a tanto até encontrá-la.
Seus lábios roçaram suavemente e simultaneamente, ambos suspiraram. Então, antes que o ato esperado se concretizasse, um barulho se arrastou pelo corredor e uma porta bateu-se.
- ?
fechou os olhos, cogitando a hipótese de ignorar sua sobrinha em seu apartamento e apenas fingir, novamente, que nada importava. Mas ele nem ao menos teve essa opção uma vez que , ao escutar a voz levemente distante de Mia, se afastou.
- ! – Mia elevou a voz, lembrando-lhes de sua presença a algumas paredes de distância.
- Eu... – sua vizinha apertou os lábios, o rosto levemente avermelhado deixava claro sua frustração e confusão. – Eu acho que alguém está te procurando.
Era uma desculpada esfarrapada e no fundo sabia disto, mas optou por mentir para si mesmo. Era Mia, no meio da madrugada, em seu apartamento. Talvez ela precisasse de ajuda, ele tentou convencer-se. Então, embora quisesse ficar, murmurou apenas um “desculpe” quase inaudível antes de sair pela porta e fechá-la atrás de si com um longo suspiro.
O rapaz esfregou as têmporas enquanto andava rapidamente até seu apartamento. Mia pulou ao som abrupto da entrada de , examinando-o com um olhar inquiridor.
- Onde você estava?
- O que você está fazendo aqui? – ignorou sua pergunta.
- Não venha com essa! – a garota o repreendeu. – Eu perguntei primeiro.
analisou a adolescente na sua frente. Os olhos inchados e avermelhados entravam em contraste com as bochechas enrubescidas, provavelmente por esforço, talvez ela tivesse pedalado até seu apartamento, uma dedução clara ao fazer a junção com a pele levemente brilhante pelo suor. O rapaz sabia que se arrumasse o cabelo desgrenhado de Mia, encontraria alguma folha ou graveto da árvore que ela usou para fugir de seu quarto. Novamente.
- Mia.
Era apenas o nome da garota, mas a entonação de repreensão e decepção evidente na voz de seu tio foi o suficiente para desarmá-la.
- Você não pode fugir de casa toda vez que tiver uma briga com seus pais – murmurou. – Muito menos de madrugada, você veio para cá sozinha. Se algo tivesse acontecido com você...
- Eles não se importariam – ela bufou, afastando a franja de seus olhos molhados.
- Não seja tão dramática, você sabe que eles te amam – ele sorriu com afeto para a sobrinha, que deu de ombros.
- Você está me expulsando? – ela choramingou, após um momento de silêncio.
- São três da manhã – ele anunciou ao olhar de soslaio para o relógio pendurado na parede próxima a garota que se abraçava, demonstrando os primeiros sinais de fraqueza diante do frio impiedoso da madrugada. – Eu não sou um tio tão irresponsável ao ponto de deixá-la voltar para casa de madrugada, embora eu quisesse.
Mia fez um beicinho diante de sua confissão e, com um longo suspiro de contentamento, ele deu o braço a torcer:
- Vamos – ele bagunçou os cabelos claros de Mia, ao passar por ela. -, vou fazer seu chocolate quente favorito.
Mia ficou em silêncio pelos próximos minutos e, mesmo após receber uma caneca grande de chocolate quente com marshmallows, ela nada disse. sabia que isso não era bom, e essa tese apenas se concretizou quando, enquanto lavava distraidamente sua própria caneca, Mia moveu-se abruptamente e bateu a própria palma da mão contra o rosto em exasperação.
- É isso! – ela disse em um resmungo para si mesma e soube que não poderia fugir quando ela direcionou sua voz orgulhosa diretamente para ele: - Você estava com ela!
- O quê?
- A louca das luzes – Mia explicou impaciente, enfiando um marshmallow em sua boca já cheia. –, você estava com ela.
poderia negar ou mudar de assunto, mas ele apenas fitou a sobrinha, em um silêncio que claramente o entregava.
- O que você está fazendo aqui? – a garota indagou exasperada, após um longo momento em silêncio.
- No momento, sendo babá da minha sobrinha rebelde – ele tentou distrai-la, pois sabia onde aquela conversa terminaria. E ele não queria fazer nada mal pensado, não de novo. Talvez ele precisasse de um tempo, tentou convencer-se, embora seus pensamentos frequentemente divagassem sobre o que estaria fazendo uma vez que ele saiu de seu apartamento e ele não escutava mais o barulho insistente das teclas da máquina de escrever da vizinha. Divagava sobre o que ela poderia estar pensando e esperava que ela não sentisse raiva.
Ele definitivamente não deveria ter saído daquela forma. O arrependimento crescia como uma figueira em seu peito.
- Vá – Mia disse, simplesmente. Como se estivesse a ler seus pensamentos hesitantes.
- Eu não acho que é uma boa ideia – ele murmurou, recebendo um olhar duro, em resposta.
- Acha? Sério, ? – a adolescente o fitou como se ele fosse uma criança que constantemente cometia erros. E era exatamente assim que ele sentia. – Você só vai saber se for lá e tentar. Eu estou cansada de vê-lo tão só. Eu sei que você diz que isso não lhe incomoda, eu acredito em você. Mas eu sinto como se você não fosse completamente feliz. Talvez já seja a hora de você pensar em você. É sua hora de ser feliz, mas para isso você precisa deixar que te amem.
fitou Mia, pasmo. Ele nunca a viu falar assim antes. Embora frequentemente o estimule a sair e divertir-se mais, ela nunca expôs seus pensamentos tão abertamente. Nunca deixou tão claro o porquê do receio e tristeza brilhantes em seus olhos toda vez que encontrava o tio e constatava que ele continuava sozinho.
- Está esperando o quê? – Mia interrompeu seus pensamentos e, quando lançou-lhe um olhar de hesitação, ela suspirou. – Eu já tenho 17 anos, . Vou apenas tomar meu chocolate quente, roubar alguns cookies que você esconde no fundo do segundo armário e dormir. Consigo fazer isso sem explodir sua casa.
É claro que ela conseguia. Mas, por algum motivo, ele não saiu imediatamente. E isso fez Mia bufar, já irritada com a lerdeza do tio.
- Vá logo! – ela levantou-se, empurrando-o em direção a porta da frente.
suspirou e, com um piscar, pareceu finalmente despertar. Ele afastou as mãos da sobrinha e antes que ela pudesse reclamar, ele a calou com um beijo que deixou gentilmente em sua testa. Era um agradecimento silencioso, Mia sabia disto e apenas meneou a mão sentimentalmente em direção ao , que já saía do apartamento.

pensou que talvez já tivesse dormido, essa hipótese era bem convincente julgando o silêncio que predominava mesmo depois de se aproximar da porta da vizinha. Porém, seu pensamento se provou errado quando sua vizinha abriu a porta prontamente, logo após a segunda batida. piscou e apertou os dedos, desta vez ciente de seu ato de ansiedade e frustração.
Mas ali estava a mulher, curiosamente pronta para sua chegada, como se estivesse ao lado da porta, aguardando pela sua chegada e os olhos profundamente ansiosos de era a prova disto.
- Pensei que estivesse com visita – sua vizinha quebrou o silêncio quando deduziu que o rapaz não abriria pauta para a conversa. E, apenas da neutralidade que predominava em seu belo rosto, pôde reconhecer o sarcasmo oculto em sua voz.
- Visita? – franziu o cenho e, com um estalo, entendeu. – Ah, Mia. Ela não deveria estar aqui. O que posso fazer? Ela sempre foi assim, desde criança.
esbugalhou os olhos, fazendo repensar nas suas palavras, a procura do motivo pelo qual ela parecia tão surpresa. E então, ela simplesmente riu. não podia negar o quão encantador e cativante era o riso de e como ela parecia outra pessoa rindo, despreocupada e relaxada. Ele não tinha ideia do motivo por trás do surto dela e poderia até ser por algo que ele disse, mas ele não se sentia ofendido. Como poderia?
- O que foi? – indagou risonho, achando graça em o quão vermelha ela estava ao se apoiar no batente.
- Eu cometi um engano – ela sufocou o riso com um longo suspiro, escondendo o rosto avermelhado longe dos olhos atenciosos de . – Ou isso ou você tem um relacionamento incestuoso com sua sobrinha.
- O quê? – o rapaz indagou perplexo. – Você achou que eu e ela...
- Sim – ela meneou a cabeça, envergonhada. – Desculpe.
suspirou com alívio ao escutar a risada de , finalmente tirando as mãos do rosto para fitar o largo e luminoso sorriso do rapaz. Ele ainda estava no corredor, ela observou, sentindo-se culpada por não deixá-lo entrar. entrou quando deu-lhe espaço, como se ele fosse capaz de ler seus pensamentos. Enquanto fechava a porta, a moça pegou-se prendendo a respiração para fugir do cheiro atrativo da pele do rapaz ao seu lado. Pela primeira em muito tempo, passou os dedos receosos sobre o interruptor atrás de si. As lâmpadas acenderam-se com um estalo, provavelmente pela falta de uso. A luz atingiu a pele pálida da moça, fazendo-a encolher e a ardência em seu antebraço, agora sem bandagem, se fazer presente.
Como recompensa, embora, a mulher teve uma visão melhor e diferente sobre , que a fitava com admiração e curiosidade.
Parecia outra realidade, em que nem sua própria casa era o mesmo e pela primeira vez desde que se mudou, ela notou coisas que nunca foi capaz de ver antes, como a cor verde água que predominava nas paredes. Ocorreu-lhe que ela nunca parou para pensar sobre a cor das paredes ou como se parecia seus móveis. Ela esteve tanto tempo submersa na escuridão que havia perdido detalhes como esses e estar tão claramente diante deles agora era desnorteador.
E havia , o motivo pelo qual ela havia acendido as luzes. Os olhos do rapaz eram intensos, ela observou admirada. Sua pele branca e os cabelos escuros entravam em contraste. Se antes ela o achava atraente, agora ela nem ao menos sabia que substantivo usar.
- Onde paramos mesmo? – o rapaz sorriu torto, fazendo-a prender a respiração
respondeu-lhe com um beijo. estava surpreso diante do ato, mas era uma surpresa boa que rapidamente se dissolveu quando ele a segurou pela cintura, mantendo uma aproximação constante quando ambos partiram os lábios e aprofundaram o beijo.
Não era um beijo desesperado, embora ambos se sentissem dessa forma, com os corações acelerados e os corpos trêmulos. Era algo profundamente íntimo, como se compartilhassem segredos silenciosamente, como se estivessem a se conhecer, mesmo de olhos fechados. E eles estavam tão submersos no contato ilimitado e na profundidade de seus sentimentos diante da situação que apenas se tornaram cientes de seus movimentos quando se encontraram no corredor, onde deslizou as mãos furtivamente pelos braços de , empurrando sua jaqueta até que não a vestisse mais e, por um momento, ela se afastou. Seu rosto vermelho pela adrenalina, lábios inchados pelo beijo e cabelos desgrenhados a deixava incrivelmente atraente aos olhos atenciosos de , que a observou com devoção enquanto ela tirava sua própria camisa. Ela não permitiu que ele tomasse um tempo para apreciá-la, voltando rapidamente seus lábios aos seus, dessa vez mais urgentemente, abrindo a porta de seu quarto com a cintura e puxando o rapaz para dentro.
E naquele momento, enquanto suas peles entravam em um atrito deliciosamente complexo, não pensou em mais nada. Ela nem ao menos se importavam com o fato da luz do quarto cobrir toda a extensão de sua pele que era cuidadosamente beijada por , até mesmo as partes mais frágeis devido as cicatrizes que não foram questionadas. Ela se sentia livre. Como se finalmente pudesse respirar depois de tanto tempo. E os dois se agarraram um ao outro naquele momento, desejando que o sentimento de plenitude não sumisse jamais.

suspirou, tirando de seus devaneios e fazendo-o parar de mexer em seu cabelo devido a surpresa diante da consciência da mulher. Ela remexeu-se em seus braços e sentou-se silenciosamente, permitindo que o rapaz tivesse uma visão clara de sua anatomia, fazendo-o desejar ter sua máquina no momento apenas para perpetuar aquela visão adorável de descabelada, corada, suada e nua. Não apenas fisicamente, mas emocionalmente.
- Quando criança fui diagnosticada com um tipo de porfiria – ela suspirou, parecendo se sentir mais leve ao compartilhar aquilo com o rapaz. – É, basicamente, uma doença que me deixa hipersensível à luz.
a fitou, surpreso pelo seu desabafo e pelo sentido que suas palavras tinham. Rapidamente, seus olhos caíram sobre a braço antes enfaixado de . Ele notou, pela primeira vez, o inchaço e vermelhidão que predominava em sua pele normalmente pálida, parecia estar infeccionado, como um tipo de queimadura. Ele não era médico para saber ao que se implicava toda a coisa da porfiria, mas no pouco tempo em que conhece , tudo parecia se encaixar. Seu medo de sair de casa, a aversão a luz, a forma como parecia estar desconfortável no quarto de revelação e até mesmo o fato de ter fugido. O fato do ante braço não cicatrizado ser justamente o que compartilha espaço com o abajur quando ela está trabalhando. As cicatrizes que cobriam seu corpo. Um tipo de paixão encheu seu peito à medida que seu olhar confuso transformava-se em um olhar de admiração.
- Há tratamentos e medicamentos, sei que são eficazes pois é por causa deles que posso fazer caminhadas, acender algumas luzes ou até mesmo tomar um pouco de sol, coisas que eram impossíveis para mim a alguns anos atrás – ela o fitou, um sorriso torto e nublado pairando sobre seus lábios. – Minha irmã pensa que estou curada e eu continuo colocando lâmpadas pela casa achando que um dia vou acendê-las, mas isso não muda nada.
Haviam lágrimas nos olhos de e ela apertava o punho, parecendo decidida a não coçar a pele que ardia. Enquanto se esforçava a pensar que aquela dor era algo de sua mente. E o olhar cuidadoso e carinhoso de sobre ela apenas a confirmava que ela estava bem.
- Eu ainda sinto como se eu fosse sumir a qualquer momento.
Então era ali que as duas histórias se cruzavam. Ambos compartilhavam o propósito do passado doloroso que ainda se fazia presente e os dois podiam deixar aquilo para trás para tentar um futuro diferente. Aquele era o ponto em que tudo mudava e apenas dependia deles.
- Exceto quando estou com você – confessou ao sentir o afago da mão de sobre seu antebraço sensível, deixando sua pele dormente e seu peito mais leve. Ela sorriu fragilmente para ele. – E você ainda não fugiu.
a observou, sobrancelhas franzidas, olhos marejados, lábios apertados e corpo relaxado. Ele sorriu diante do pensamento dela. Ele não podia se impedir, o pensamento de abandoná-la parecia cômico e o motivo pelo qual ela achava que ele deveria fazer isto era ridiculamente improvável. Mas ela o entendia, afinal de tudo. Ele tinha seus próprios problemas, seu próprio passado e seus traumas, tomar os dela para sua vida e compartilhar os seus com ela, sabendo que ela também já tinha sua própria carga, era aterrorizante. Porém, vê-la ali diante de si, despida de toda roupa, de todos seus segredos, de seus traumas, de seu passado. Assim como ele. E ele estava disposto a mais. estava disposto a dar o máximo de si para entendê-la e fazê-la entende-lo também, queria ensiná-la a deixar o passado para trás e aprender isto também. Ele queria permitir amar e ser amado e, mesmo sobre o olhar silencioso de , ele sabia que ela queria o mesmo.
Então como ele poderia fugir do que parecia ser sua redenção e felicidade?
- Eu nunca faria isto – ele a puxou suavemente para retornar aos seus braços, o que ela fez prontamente de boa vontade. O cheiro suave e doce de atingiu seus sentidos quando ela o abraçou, suas peles intimamente próximas, respirações sincronizadas e sorrisos largos. O rapaz esticou a mão apenas para alcançar o abajur e desligá-lo, enterrando o quarto na escuridão. Aceitando a ideia de que, a partir de agora, haveria o tempo certo para a luz e para a escuridão. Eles aprenderiam a lidar com isso, juntos.
suspirou sonolenta quando o rapaz voltou-se para o conforto de seu ser e ele retomou com um sussurro confidencial:
- Não agora que finalmente te encontrei.



Fim



Nota da autora: Oi, meus amores! Se vocês leram até aqui, agradeço pela paciência porque essa short tá grandinha, confesso HAHAHAHA
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