Postada em: 09/08/2020

Capítulo Único

“É o seguinte: você está apaixonado por uma versão de uma pessoa que você criou na sua cabeça que você está tentando, mas não pode consertar. A única pessoa que você pode consertar é você mesmo.
Eu te amo. Isso já foi longe demais. Já chega.
Eu estou dois quarteirões de distância. Eu estou chegando aí.’”


tinha certeza de que seus músculos iriam se atrofiar se ele tivesse que passar mais dez minutos sentado na cadeira dura que fazia parte do padrão da mobília da sala de aula. Ele já não aguentava mais escutar a voz do senhor Carter repetindo a mesma coisa desde a última aula. Ele estava contando os segundos que os ponteiros de seu relógio marcavam.
Sabia que deveria prestar atenção até na respiração de seus professores naquele semestre, mas hoje não era o dia que ele estava conseguindo focar em nada. Só ao pensar que, no fim de semana, o time de futebol, no qual ele exercia a função de Quarterback, entraria em campo contra o time de uma faculdade do Colorado deixava sua cabeça ainda mais avoada nas aulas.
Só que o real motivo de toda aquela falta de atenção que ele estava tendo era bem mais complexo do que tudo listado acima. , 30 anos recém-feitos, professora de Literatura Francesa, morena com cabelos cacheados e olhos castanhos que podiam decifrar sua alma em meros segundos. Ele tinha perdido todas as expectativas de ter um dia tranquilo quando falara com a mulher mais cedo. Sabia que ela não iria querer nenhum tipo de contato durante a manhã, mas, ainda assim, ele decidiu acordar junto com ela e tentar fazê-la passar um tempo a mais. Ela não daria as duas primeiras aulas, e ele não se importaria em perdê-las. Mas isso apenas resultou em uma breve discussão e ela deixando o apartamento dele após ambos terem aumentado o tom da voz.
Era óbvio que tudo o que fizessem deveria ser o mais sigiloso possível. Era extremamente proibido relacionamentos entre professores e alunos, como em qualquer outro lugar. Porém, na faculdade, as regras eram um pouco mais rigorosas. Todos os que estavam naquele ambiente já tinham idade o suficiente para tomarem suas decisões perante a justiça, e, por isso, a lei se aplicava dez vezes mais sobre eles. Muitos professores e alunos estavam quase na mesma faixa etária, o que era complicado, e, depois de inúmeros casos desse tipo relação, a direção decidiu proibir severamente.
Para manter as coisas escondidas, não era um problema muito grande. Desde que ele e começaram a se ver, ele soube que ninguém poderia saber de nada. O que estava o incomodando era o fato de estarem juntos há um ano e nunca terem agido como um casal normal. Era tudo no momento. Quando um precisava do outro, era só pegar o telefone, e eles passariam a noite juntos. No início, ele estava muito satisfeito com a forma com que aquilo acontecia, só que, conforme o tempo passou, ele já não queria ter tudo resumido há algumas horas de sexo e, depois, agir como se não conhecesse a mulher.
, por outro lado, estava começando a perder a paciência com o mais jovem. Ela havia deixado muito claro que não passaria daquilo e que aquilo não significava que seriam exclusivos um do outro. Ela disse explicitamente que não queria nenhum tipo de relacionamento sério, e ele havia concordado. Estava se tornando uma dor de cabeça ter que dar aula na turma dele, sabendo que tudo o que ele não faria era prestar a atenção no conteúdo. Não era mistério para ela que se relacionar com um de seus alunos seria complicado, mas havia algo em que fazia com que ela simplesmente não pudesse resistir. Soava ridículo, mas era a verdade. E, mesmo quando ele tirava toda a paciência dela, como naquela manhã, ela não podia evitar em pensar na forma com que as coisas eram com ele.
não se tornara aquela mulher desapegada que era hoje por vontade própria, não. Houve um homem antes, Jason Shelby, um de seus professores. Ele foi o primeiro homem com quem ela se relacionou. Todas as suas primeiras vezes foram com ele e, quando ela já se acostumava com a ideia de que eles iriam ter algo bem sério, ele simplesmente sumiu. Eles tiveram esses encontros por quase dois anos, e, numa noite, ele simplesmente não apareceu mais, e em nenhuma das outras também. A mulher, que, na época, tinha vinte um anos, ficou devastada e se fechou completamente para qualquer tipo de relacionamento que poderia ter. Tudo o que ela teve depois daquilo foram umas noites com pessoas aleatórias e nada tão fixo quanto o que havia tido antes.
O que tornava as coisas ainda mais confusas para ela. Conseguia entender como ela ainda estava com . Tudo bem que ele era estupidamente bonito e tinha um charme de tirar o fôlego de qualquer uma, mas, ainda assim, ela não tinha nenhum apego sentimental em relação ao rapaz. Talvez ela tivesse se acostumado com a facilidade que era estar com . Talvez. A única coisa que ela tinha certeza era de que isso não poderia durar por muito mais tempo. estava se apegando, e, a cada dia, isso ficava mais claro. Ela não queria ter que lidar com os sentimentos de outra pessoa, não queria ficar com a consciência pesada por conta disso.
As aulas que ela daria aquele dia passaram relativamente rápido, e, quando menos esperava, já estava a caminho da sala dos professores para uma breve e necessária xícara de café e, em seguida, iria para sua casa, onde passaria o resto do dia com seu gato. Ao chegar na sala dos professores, ela pôde escutar leves risadas e algumas vozes trocando palavras. Ignorando a presença de quem fosse, ela se encaminhou até a cafeteira, que ficava em uma mesa no centro da sala, e logo já tinha a sua tão amada bebida em mãos. Não que ela fosse grossa e mal educada, simplesmente sabia o quão as conversas entre o corpo docente poderiam se alongar a partir de um simples “olá” e, hoje, ela realmente queria ir para casa o mais rápido possível.
Mesmo estando de costas para as pessoas que estavam ali, ela podia sentir um par de olhos fixos em suas costas e já estava começando a se sentir incomodada. Detestava quando aquele tipo de coisa acontecia. Por mais que fosse do jeito que fosse, ela odiava ser o centro das atenções e sabia que se tornara-o quando a sala ficou em silêncio. Decidiu não prolongar mais o grande elefante rosa que tomou posse do local e se virou para as outras pessoas. O que sentiu de imediato foi um grande choque e uma imensa falta de palavras para descrever o que via. Não era possível.
— Olá, senhorita . Já faz algum tempo. Como vai?
Ela jurou estar alucinando até ele falar. Claro que ela imaginou que isso poderia acontecer algum dia. No fim das contas, ele também era professor, mas, ainda assim, ela nunca imaginou que estaria preparada para que isso realmente se tornasse realidade. A cabeça dela estava prestes a explodir, e ela mal soube quando foi que conseguiu esboçar um pequeno sorriso e estender a mão ao homem.
— Eu estou muito bem, senhor Shelby. Realmente, faz um tempo. Como você está?
Por mais que as palavras soassem convincentes e ela aparentasse estar tranquila, Jason sabia que ela estava a ponto de ter uma síncope e que estava fazendo o possível para a terceira pessoa no ambiente não notar aquilo. Não seria uma boa aparência para ambos se algo fosse mal interpretado ali. Jason não planejava ser um babaca e fazer com que ela já tivesse que passar por esse tipo de coisa. Eles teriam tempo para se atualizar sobre o que aconteceu nos últimos anos.
— Muito bem, obrigado. Bom, eu vou indo. Preciso falar com Richard ainda sobre as aulas de amanhã e tentar me familiarizar com o local — ele disse e, com um último olhar para a mulher, se retirou da sala.
Ele estaria mentindo se dissesse que não ficou surpreso em vê-la ali, ficou e muito. Só não esperava que ela tivesse mudado tanto desde a última vez que se viram. Ele tinha essa ilusão de que ela permaneceria com o mesmo rosto e aparência inocente de quando tinha dezenove anos. Podia ver claramente que ela já não era nada perto da garota que ele conhecera anos atrás. Jason não era burro, sabia que o que fez com ela havia causado um grande problema na vida dela na época, mas não era como se ele fosse se importar com aquilo e deixar de seguir sua vida por conta de uma aluna. O problema era que ele não encontrou ninguém parecido com ela depois que partiu e sempre sentia que faltava algo, porém era orgulhoso demais para tentar contato com a mulher.

[...]


Era aproximadamente sete da noite quando escutou leves batidas em sua porta e, em um pulo, ele se levantou e foi até ela, pois ele já sabia quem estava subindo. Como sempre, estava na porta com algumas bolsas de papel de algum fast food e tinha um leve sorriso nos lábios. Rapidamente, ele deu passagem para que ela entrasse em seu pequeno apartamento, e ambos foram para a cozinha.
Já havia se passado alguns dias desde que eles tiveram aquela discussão e, como sempre, disse que seria legal se ela desse uma passada no apartamento dele aquela noite. , que não tinha nada para fazer durante aquela noite, concordou e disse que estaria lá no horário de sempre. Não era como se ela quisesse colocar alguma coisa na frente disso, se ela fosse honesta. Realmente não queria passar a noite sozinha, e , apesar de tudo, era uma boa companhia. A conversa entre eles sempre era fácil e sempre trocavam boas risadas quando estavam juntos.
Ao terminarem de comer e conversar um pouco, sugeriu que seria legal se eles assistissem alguma coisa, e logo ambos já estavam no sofá bege que fazia parte da mobília do rapaz. O episódio de Peaky Blinders foi se tornando cada vez mais desinteressante conforme as mãos de começaram a passear pelos braços descobertos de , e logo o seriado foi ignorado pelos dois. foi ágil ao passar as mãos pela cintura da mulher e colocá-la sentada sobre seu colo. Em questão de segundos, os lábios deles já estavam em contato, e as mãos da mulher faziam leves carícias na nuca dele, o que nunca falhava em deixá-lo arrepiado. As mãos de permaneceram na cintura dela e, conforme ela se mexia, ele sabia que logo teria uma ereção, e ela parecia bem ciente deste fato também.
No momento em que as roupas começaram a se tornar uma leve bagunça no cômodo organizado, eles já estavam respirando pesadamente, e o aquecedor já não era mais necessário para mantê-los aquecidos. Tudo foi um borrão a partir dali, e, muitos minutos depois, ambos caíram cansados e completamente suados no sofá.
Aquilo havia sido uma justificativa de que tudo estava bem e que o que aconteceu não importava mais. Mas, ainda assim, podia dizer que algo estava a incomodando, só que ele não sabia como tocar no assunto com ela. As coisas foram boas demais para que sua curiosidade estragasse tudo daquela vez. Deixaria as coisas como estavam, e, se ela se sentisse confortável o suficiente, poderia se abrir e dizer o que estava em seus pensamentos.
já não tinha mais tanta certeza do que queria. Sabia que gostava de como as coisas eram com , mesmo que se desentendessem às vezes, mas, desde que viu Jason, vários pensamentos começaram a embaraçar sua visão, e ela já não conseguia ter certeza de como as coisas seriam dali em frente. Ao ver Jason Shelby aquele dia, ela pôde notar que ele estava diferente, e não só fisicamente. Algo dentro do homem havia mudado, mas ela não sabia dizer o que era. Ela tinha em mente que nunca pôde decifrar o homem antes e não seria agora que o faria, mas, mesmo assim, ela podia ver alguma diferença ali.
Depois de anos, ela entendeu que Jason apenas a usou para alimentar seu próprio prazer e ego, e, quando aquilo já não era mais o suficiente, ele logo a chutou como um cachorro de rua, mas isso não significava que ela tivesse doído menos ao saber daquilo. Ela tinha certeza de que havia se tornado piada entre os professores que tinham conhecimento daquilo, e isso só tornou as coisas mais difíceis. Porém, ainda assim, ela não conseguia ignorar tudo o que o homem a fez sentir todos aqueles anos atrás. realmente desenvolveu sentimentos profundos por ele, e, ao vê-lo, foi como se um balde de água fervendo fosse virado em sua cabeça, já que, no momento em que os olhos dela se encontraram com os dele, ela sentiu como se estivesse pegando fogo de dentro para fora.
, você quer ir lá pro quarto? A gente pode tomar um banho e ficar deitado depois – perguntou o rapaz com um tom de incerteza, tirando-a de seus pensamentos.
— Claro, tudo bem — ela disse e logo já estava de pé, recolhendo as suas peças de roupa que encontrava.

[...]


Todas as semanas que se seguiram a partir dali foram bem complicadas. O jogo de naquele fim de semana foi um sucesso, trouxe outra vitória para a Winston University e foi o assunto por vários dias. Não que o outro time não tivesse jogado bem. Eles fizeram um jogo incrível, e por isso a vitória dos locais foi tão bem comemorada. já não conseguia ter tempo para mais nada que não fosse estudar e tentar gravar o máximo que podia de cada matéria para a semana de provas, que se aproximava. Desejava tanto que fosse como no ensino médio, que tudo era mais simples e não era a vida dele que estivesse realmente em jogo ali.
, por sua vez, tinha que aguentar os olhares que Jason sempre direcionava a ela quando estavam no mesmo ambiente. Não, ela não havia feito nenhum esforço para falar com ele desde que o vira e não pretendia fazer nada. Mas o homem parecia não desistir de tentar chamar a atenção dela e não foram poucas vezes que ele tentou falar com ela a sós, mas ela nunca comparecia. Sempre arrumava alguma desculpa para que não pudesse estar com o mesmo.
O que era algo que o homem já estava começando a perder a paciência. Ele sabia que seria complicado tentar ter qualquer tipo de contato com ela, mas, ainda assim, tentava a todo custo. Realmente, ela havia mudado. A que ele conhecia não esperaria mais de dez segundos até ir atrás dele como um animalzinho treinado. O orgulho de Jason estava ferido num nível absurdo. Nunca imaginou que precisaria fazer isso para chamar atenção de alguém que ele já teve aos seus pés. Felizmente, ele já havia arrumado a oportunidade perfeita para que ela fosse até ele, e, desta vez, ela não poderia ignorar. Ele havia conseguido o número dela com a desculpa de que queria manter contato com todos, e não foram necessários mais que alguns sorrisos para a secretária para que ele conseguisse o que queria.
Passaram-se alguns dias até que ele decidisse como colocaria seu plano em ação. A mensagem digitada por ele não foi muito longa ou detalhada, mas ele sabia que a atingiria de uma forma que ela não poderia ignorar e logo estaria na frente dele:

“Olá, . Está sendo realmente difícil encontrar com você, mas, desta vez, você virá, ou o seu segredinho será assunto dos professores por alguns meses. Você não quer ter sua reputação tão suja por puro ego, certo? Estou te esperando na minha sala em dez minutos.”

precisou ler e reler aquelas palavras algumas vezes até seu cérebro realmente absorver o que elas significavam. Não era possível Jason saber algo sobre em tão pouco tempo naquele lugar e muito menos saber aquilo. Porém, ainda assim, ela sabia que não poderia arriscar e ele realmente ter descoberto algo. Aquilo a deixou muito intrigada. Ela era estritamente profissional dentro das dependências da universidade e nunca fora vista fora de lá com , não tinha como ele ter descoberto aquilo. Juntando suas coisas e as colocando dentro de seu armário, ela mal podia respirar ao caminhar para a sala de seu colega de trabalho. Quando ela chegou em frente à porta da sala dele, ela notou claramente que estava entreaberta e que ele estava apoiado na frente da grande mesa de madeira maciça. Com um grande suspiro, ela adentrou a sala e deixou seus olhos encontrarem os dele.
— O que você quer, Jason? — foi direto ao assunto, não desejava prolongar muito o que tinha que resolver ali.
— Então você realmente tem algo para esconder, — ele disse e tinha um sorriso cínico no rosto.
— Eu não sei do que você está falando, mas não vou aceitar que você invente qualquer tipo de história sem fundamento contra mim, Shelby — falou, irritada.
— Muito bem, . Você é melhor em esconder isso do que eu fui. Parabéns — ele disse e se aproximou da mulher. — Eu só quero saber como as coisas foram desde a última vez que nos vimos.
— Você quer dizer a última vez que você me deixou plantada na droga daquele restaurante por três horas? Ah, foram ótimas. Algum tempo depois, eu parei de chorar e me culpar por ter caído na sua lábia tão fácil — afirmou e já podia sentir seu rosto começar a esquentar.
— Ora, nós não precisamos ter nenhum tipo de rixa um com o outro, certo? Você sabia que hora ou outra aquilo aconteceria, querida — ele falou e colocou uma mecha de cabelo dela por trás de sua orelha.
— Jason, eu realmente não quero falar disto. Aconteceu e acabou. Ponto final. Agora, se era só isso, eu vou voltar para a minha sala — disse e estava ficando cansada da conversa do homem.
— Hm, não era isso que eu esperava quando te vi aquele dia, sabe? Eu esperava que você fosse agir como a mesma garota ingênua e fácil que eu conheci todos aquela anos atrás. Esperava tudo, menos toda essa indiferença. Eu não posso ter sido tão babaca assim, meu bem.
Um silêncio absurdo se instalou na sala do homem assim que suas palavras chegaram a um fim. sentiu como se tivesse sido socada no estômago por um lutador de MMA. Ela sabia que tinha sido tudo menos sensata quando se envolveu com ele, mas, ainda assim, escutar de uma pessoa que você teve sentimentos tão profundos que você havia sido ingênua e fácil não era a melhor das sensações. Por um momento, ela jurou que os olhos iriam lacrimejar e que perderia todo o controle que havia aprendido a ter em relação a Jason Shelby bem ali, mas ela respirou fundo e olhou nos olhos dele. Aquele era o momento que ela vinha esperando há algum tempo. Ela precisava pôr um fim naquilo.
— Eu realmente fui absurdamente burra de ter caído na sua conversa, Jason. Você não tem ideia do quanto eu me culpo por isso. Não sabe metade das coisas que aconteceram desde que você me largou. Eu realmente gostava de você, sabia? Eu não menti quando disse que meus sentimentos por você eram tão fortes quanto eu deixava transparecer. Você me usou da pior maneira possível e, quando eu já não era o suficiente para sustentar essa sua pose ridícula de macho alfa, foi procurar outro lugar pra manter seu pau molhado. Levou algum tempo para que eu pudesse ver que você estava simplesmente tirando qualquer tipo de dignidade que eu deveria ter naquela idade. E sabe o que é pior? — ela disse e limpou algumas lágrimas que começaram a escapar de seus olhos. — Eu achava que você fazia aquelas coisas porque gostava de mim e que aquilo seria bom para mim. Eu achava você o homem mais incrível do mundo, Jason. Mesmo quando a Lizzie me dizia que eu estava errada em acreditar nas coisas que você me dizia e que eu deveria tomar cuidado. Eu fiz tudo por você e, no fim das contas, você não hesitou em me tratar igual a um saco de lixo e ignorar a minha existência. Hoje, neste momento, olhando pra você, eu entendo que me apaixonei pelo que eu inventei de você. Eu criei esse cara incrível na minha cabeça, e ele tinha o seu rosto, a sua voz, seu jeito de andar e tudo mais. Estava tudo na porra da minha cabeça, e eu acreditava naquela merda toda. E, no fim do dia, por mais que tentasse te mudar, nunca aconteceria — ela sabia que estava colocando tudo o que guardou por todo aquele tempo para fora e não deixaria nada de lado, mas o olhar indiferente dele sobre ela só a deixava com mais raiva. — Eu não posso mudar alguém que não seja eu mesma. E eu não posso te culpar por algo que foi culpa minha. Eu sempre fui criativa pra caralho. Eu precisava acreditar em alguma coisa e, infelizmente, acreditei em você. E todas as vezes que você partiu meu coração, eu achava que era algo aceitável, sabe? Foi um inferno, Jason. Um verdadeiro inferno ter que ir para as aulas e ver os seus amigos trocarem olhares e risinhos quando eu passava, mas em momento algum eu deixei aquilo me afetar. A culpa não é minha se você sempre foge dos seus problemas. Eu achei que você fosse alguém que não é. Esse foi o meu maior erro.
Quando ela finalmente parou para respirar e limpar novamente os vestígios de que estava chorando, já se sentia vinte vezes mais leve. Havia guardado aquelas palavras por tanto tempo que nem podia acreditar que finalmente estava colocando para fora algo que ela ensaiou inúmeras vezes. O olhar de Jason já não era de prepotência. Estava vendo, em primeira mão agora, o que havia feito com a garota e estava se sentindo culpado. Não era como se ele achasse bonito o estado em que a mulher em sua frente falava das coisas que sucederam todo o relacionamento dos dois. Depois de alguns momentos, quando sua voz já não estava tão trêmula, ela voltou a falar:
— Você fez com que eu criasse a pior versão de mim mesma. Agora, qualquer tipo de relacionamento parece incerto demais, e eu nunca consigo ser sincera comigo em relação aos meus sentimentos, porque tudo o que vem na minha mente é o quão filha da puta você foi sabendo tudo o que eu sentia. Então, muito obrigada por ter fodido com o meu psicológico por todos esses anos, porque a sua imagem sempre permaneceu na minha cabeça como algo repulsivo e que eu deveria ter medo — quando ela terminou de falar, devido à pressão na sua garganta e às lágrimas que derramou, sentia uma leve dor de cabeça. Respirou fundo e fechou os olhos. — Agora, se você-
Ela não pôde terminar a sua fala, já que uma terceira voz se fez presente no local.
— Então é isso? Você fica com a imagem desse cara na sua cabeça e simplesmente assume que todo mundo vai te tratar da mesma forma? — , que estava parado na porta, questionou ao concluir tudo o que havia escutado.
Todo o ar pareceu deixar seus pulmões quando ela reconheceu a voz atrás de si. Parecia que tudo estava fadado a acontecer naquele momento. E ver a forma com que olhava para ela fez com que uma fisgada em seu estômago fosse quase insuportável.
, por favor, eu juro que te explico tudo — ela respondeu e se aproximou dele, que negou com a cabeça e se afastou da soleira.
— É, talvez mais tarde a gente converse — ele disse enquanto caminhava para longe dela, sem olhar para trás.
E, naquele instante, sentiu como se estivesse perdendo totalmente o equilíbrio e que o chão sob seus pés fosse feito de geleia. Ter a visão das costas de enquanto ele caminhava para longe dela naquela situação parecia tortura, e então ela finalmente entendeu o porquê dela ter ficado tanto tempo com o rapaz. Ela havia se apaixonado por ele. Não sabia quando e nem como, mas não havia nada mais claro que aquilo para ela no momento. A voz de Jason atrás de si já não era importante, e, logo, ela ia atrás do jogador. Depois de nove anos, deixava seu passado literalmente para trás. Ela realmente não se importava com qualquer coisa que Jason tivesse para dizer. A única coisa que ela queria era ter a atenção de por meros segundos para que pudesse explicar tudo.

[...]


Ela passou todos os dias da semana seguinte ligando e nunca teve uma resposta, sempre caía na caixa postal. Até mesmo nas aulas ele não havia comparecido e pediu para a coordenação que o dessem as provas em outro horário. Ela não sabia mais o que fazer. Sua única alternativa seria ir à casa dele, mas ela tinha medo de não o encontrar lá também. Nesses dias que se passaram, ela sentia como se algo estivesse a corroendo por dentro e logo não aguentaria mais segurar seu peso se não esclarecesse aquela história.
já havia escutado todos os recados que ela havia deixado em sua caixa postal, mas, ainda assim, não sentia que estava preparado para estar diante dela novamente. Ele sabia que precisava falar com ela e entender como tudo havia acontecido naquele dia. Ficou claro para ele, escutando apenas metade do que a mulher disse, que ela teve algum tipo de relacionamento com o novo professor, mas ele não conseguia entender o porquê dela nunca ter tentado nada novo. sabia que o que eles tinham era praticamente um relacionamento “sério”, mas, ainda assim, queria entender o que aconteceu de verdade para que ela ficasse daquela forma. Não era justo com ele que ela agisse como se todos fossem fazer a mesma coisa.
Os dias passavam para ambos como longas viagens de navio, e cada dia se tornava mais difícil. Não demorou muito para que Jason reportasse o que sabia à direção da faculdade, e logo foi afastada do cargo. Ela não tentou nem negar o que havia acontecido. Sabia que não seria afetado, então, assim que foi chamada por Richard, já sabia que seria afastada, o que tornou tudo mais difícil para que ela tentasse entrar em contato com .
Nos corredores da faculdade, o boato de que a professora havia sido afastada porque se relacionou com um aluno espalhou-se como lama e, enquanto alguns faziam piada com o assunto, outros achavam imensamente antiético, o que realmente era. O choque que foi para ao saber disso foi grande, mas ele não podia negar que já suspeitava que o senhor Shelby iria dizer algo para a direção. O cara era realmente um filho da puta.
A noite estava bem calma e tanto , quanto estavam presos em pensamentos. estava no aconchego de seu apartamento e caminhava pela rua da cidade, observando qualquer coisa que pudesse prender sua atenção. tinha o telefone em mãos e estava pensando em como começar a próxima ligação. Se ela não conseguisse nenhuma resposta, deixaria seguir a vida dele sem o incomodar mais. Seria o certo a fazer, ela sabia, porém rezava para que ele respondesse.
ainda estava pensando em como as coisas haviam acontecido quando viu a tela de seu celular acender e o nome da mulher que não deixava seus pensamentos mostrava uma ligação em curso. Ele ponderou por muitos segundos se atenderia ou não, e, quando a ligação estava para cair, ele deslizou o botão verde. Com um suspiro, levou o aparelho até o ouvido.
? — A voz dela soou fraca, e ele sorriu levemente ao imaginá-la como estaria no momento. Provavelmente com uma caneca de chocolate quente na mão e Fred, seu gato, aos seus pés.
— Oi, .
— Por favor, me deixa te explicar o que aconteceu naquele dia.
— Tudo bem, pode dizer — ele sabia que estava sendo um pouco duro, mas não tinha certeza se era o momento certo de se encontrar pessoalmente com ela.
Levou alguns minutos até que explicasse o que aconteceu e, durante aquele tempo, pôde escutar a voz dela ficar trêmula, e foi fácil notar que ela estava chorando. Depois que havia terminado de falar, suspirou fundo e levou a caneca até os lábios com a intenção de molhar a garganta, que, no momento, estava dolorida, devido ao esforço de falar entre as lágrimas. Respirando fundo, ela continuou.
— Eu realmente me arrependo de como as coisas foram até agora, . Mas eu não posso negar que gosto mesmo de você. Não me pergunte quando eu descobri ou comecei a me sentir assim, mas não estou dizendo isso só para você acreditar em mim. Eu estou sendo completamente sincera com você, gosto muito de você, e esses dias têm parecido um inferno, já que eu não tenho conseguido falar com você — ela disse e finalizou com um pequeno suspiro.
ponderou por um tempo as palavras que a mulher tinha acabado de dizer. Parecia surreal que aquilo houvesse realmente saído da boca dela. Ele não podia imaginar quantas vezes desejou escutar aquele tipo de coisa vindo dela. O frio que fazia perto do grande parque central já não importava, já que ele estava aquecido o suficiente pelo sentimento que tomou conta de seu corpo. Agora ele sabia que as coisas dariam certo como sempre quis. Então, com um sorriso nos lábios e coração acelerado, ele respondeu:
Eu estou indo até você.


Fim



Nota da autora: Sem nota.

Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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