09. If I Got You

Fanfic finalizada.

Prólogo

’s Dream:

— Pai... Não!
Eu sabia que aquela era a minha voz, tinha certeza absoluta.
Estava num lugar esplêndido, de repente estava em queda livre. Tão rápido que meus cabelos se lançaram para cima tampando a visão que eu tinha das laterais, e meus braços estavam erguidos como se esperassem para serem puxados, mas não…

Celestial,
Espaço,
Escuridão,
Nuvens esbranquiçadas,
Mais nuvens;
Céu azul escuro;
Céu azul mais claro;
Terra,
E num estalar de dedos, tudo sumiu.

“Think I'm from space
Space soul fell down
I found the earth
Not leaving now”



Capítulo 01

’s Voice:

Por mais que eu tentasse fechar as mãos, elas pareciam dormentes o suficiente para que eu não as sentisse. Tentei me mexer, mas não consegui, parecia que algo me impedia. Tentei abrir os olhos, mas o local estava iluminado demais e algo estava em cima da minha boca, soltando uma fumaça um tanto salgada.
Forcei novamente os olhos, e aos poucos pude ver o teto branco. Fechei os olhos mais uma vez e voltei a abri-los, olhando para os lados, tentando identificar onde eu estava. Percebi que alguns cabos estavam ligados em meu peito e algo apitava atrás de mim. Assim como nos meus braços haviam agulhas e esparadrapos.
Tentei me sentar, mas algo me prendia naquela cama, assim como meus braços estavam amarrados nos braços da maca. Eu quis falar, mas o que estava no meu rosto estava me impedindo; eu estava no hospital? Por qual motivo?
Alguém entrou pela porta principal e me fitou, suspirando aliviada. A mulher estava com uma camiseta preta, uma saia jeans simples e tênis preto. Seus cabelos estavam soltos, e havia uma mecha nele que era branca, bem na parte da frente do seu cabelo. Ela era realmente linda, e eu me senti um lixo por estar naquele estado com uma pessoa tão linda.
— Olá — ela disse, e eu tentei responder, mas sem sucesso. Ela sorriu e andou até o meu lado. — Não precisa responder, mas você vai ficar bem. Andei conversando com o médico, e ele disse que você é um cara de sorte, e acho que realmente seja.
Fiquei fitando seus olhos, enquanto ela ficava em silêncio. Até que bateu a mão na testa e sentou-se ao meu lado na maca.
— Não me apresentei — disse, rindo. — Eu me chamo . Nome estranho? Talvez. Não sei o que minha mãe estava pensando, enfim... Eu encontrei você... Desmaiado. Te trouxe para cá, e já faz alguns dias que você está internado. Eu estava preocupada.
Puxei na memória o que havia acontecido, e então me dei conta que eu estava usando algumas drogas, e simplesmente desmaiei, não lembro onde estava, mas sei que estava sozinho, e não parecia ter um anjo desses comigo.
Me senti sortudo, porém ao mesmo tempo me senti envergonhado. O que ela deveria pensar de mim? Que eu era irresponsável, inconsequente e drogado? Bom, talvez ela não pensasse errado. Eu queria pedir para ela sair, porque estava constrangido. Eu não merecia atenção alguma vinda dela, afinal, eu era um lixo. Tentei falar, mas a voz estava muito baixa, até eu achei estranho.
Mexi as mãos e ela olhou-me solidária. Sorriu fraco, acariciou minha mão e eu fechei o punho. Seu toque era gelado, o que me deixou um tanto curioso.
— Vou ao banheiro, já volto.
Assim que ela passou pela porta do banheiro, o médico entrou pela porta do quarto, com uma prancheta na mão – acredito que com meu prontuário. A enfermeira vinha logo atrás dele, e em seguida minha mãe estava com os olhos inchados e atônitos. Em suas mãos ela estava segurando uma toalha de papel e ora ou outra passava no rosto.

Eu realmente era um lixo; odiava ver minha mãe daquela forma, mas aquela não era a primeira e nem a última vez. Eu não a merecia, mas eu não conseguia parar! E isso me deixava louco, fato que motivava ainda mais o uso de drogas injetáveis, e entre outras.
— Meu menino, — ela suspirou chorosa, e eu engoli seco. — Graças à Alah você está bem! Eu estive tão preocupada...
— Ele está bem melhor, Trisha — o médico disse, tirando do meu rosto aquela máscara horrível. — Teve uma overdose, algumas complicações, porém foi socorrido a tempo. Só que assim, rapaz — ele voltou-se para mim. — Você está por um fio. Chegou o momento de você decidir e fazer uma escolha: a vida ou a morte. Porque se você fizer uso de qualquer substância a partir daqui, você tem grande chance de não voltar vivo.
— Por Alah! — minha mãe chorou, olhando-me esperançosa.
Eu olhei para o sofrimento dela. Pensei em minhas irmãs. Meus fãs. Acho que eles não iriam querer me ver nessa situação, nessa quase morte; porém era mais forte do que eu. Simplesmente não conseguia parar, não conseguia. Tentei e sempre falhei.
— Acho que devemos deixá-lo pensar por alguns minutos — o médico falou. — Se você tomar a decisão correta, ou pelo menos a que esperamos que você tome, já tenho as clínicas para que você seja ajudado. Vai ser bom, meu rapaz. Ninguém quer o seu mal, a não ser esse tipo de coisa que você usa.
Então ele saiu do quarto, levando junto a minha mãe, falando sobre meu prontuário. Ele fechou a porta, e depois vi a porta do banheiro se abrir, revelando . Ela olhou para os lados e voltou-se para mim.

— Desculpa, não quis sair de lá enquanto eles estavam aqui discutindo sobre você, achei pessoal — fez uma careta, e eu sorri. — Enfim, você precisa tomar uma decisão, afinal, é a sua vida. Tem tanta gente no mundo que te ama, .
Balancei a cabeça confuso. Abri a boca para tentar responder, mas nada parecia sair.
— Água — resmunguei bem rouco.
Ela pegou ao lado da minha cama um copo com canudo e levantou a maca para que eu pudesse beber. Fiz isso, e senti um pouco de dor no nariz, e em toda minha cabeça. Era efeito da cocaína.
— Se você permitir, vou cuidar de você — falou, chamando minha atenção. Olhei para ela, que sorria terna, acariciando meu cabelo aquela altura. — Trabalho em uma das clínicas que o Dr. Conrado vai indicar. O nome é "Humanity", basta selecionar ela, e então vou poder ficar ao seu lado. Mas assim, ninguém precisa saber — ela sussurrou, e eu ri.
— Você — me arrisquei, e vi que estava melhor para falar. — Você me encontrou aonde? Eu lembro que estava caído, mas não sei aonde.
Ela arregalou os olhos e em seguida sorriu. Suas bochechas avermelhadas me cativaram, e não pude deixar de retribuir.
— Não sei. Talvez eu tenha vindo do céu e parado direto na sua vida.

Um riso sem graça surgiu em meus lábios pelo modo doce como havia mencionado ela mesma na situação. Meus olhos saíram dela e passaram para o teto, enquanto eu ainda sorria.

— É, talvez.

Conversamos mais um pouco sobre coisas que não envolvessem hospital e logo em seguida eu perguntei como ela tinha conseguido entrar ali já que não era da família, muito menos alguém próximo para ter consentimento, e ela desconversou. Depois, me lembrou que ela quem havia me achado e eles acharam justo que ela acompanhasse meu quadro, pois insistiu. Fiquei desconfiado, não sei porque.
Parou de falar e ergueu o dedo indicador, virou um pouco a cabeça para o lado e colocou uma mecha do cabelo atrás da orelha, enquanto olhava de canto para a porta. Parecia estar escutando algo do qual eu não fazia ideia, pois não ouvi nada.
— Algum problema? — questionei, em tom baixo.
Seus olhos voltaram-se para mim e um misto de mistério estavam sobre eles. Ela sorriu coisa de dois segundos e desfez o riso.
— Volto num minuto.
Levantou da poltrona que tinha ali e parou na porta, olhando de um lado para o outro, tomando a decisão de qual lado seguir, e assim seguiu pela direita.
Sai de meus devaneios quando ouvi a voz do médico ecoar na sala, daquela vez era apenas ele. Minha mãe deveria estar em algum outro lugar, pois eu tinha plena noção de que ela odiava me ver nessa situação e principalmente o quanto tudo isso causavam coisas ruins nela, e ainda assim eu me permitia passar por isso quase sempre. Consequentemente, atingindo quem mais se importava comigo.
— Como você está se sentindo? — parou próximo aos meus pés.
— Um lixo — fui sincero e ele apenas balançou a cabeça.
— Mas está sentindo alguma dor, ânsia ou incômodo?
— Eu estou bem. Um pouco incomodado por estar numa cama de hospital, apenas. Mas estou bem, obrigado.
— Caso você sinta qualquer outro sintoma, nos avise, certo? — acenei com a cabeça. — Agora vamos falar sobre a sua decisão, e espero que tenha escolhido a certa. Mas, seria muito decepcionante se a certa pra você, fosse a errada para nós.
Eu não tinha pensado em nada, nem sequer lembrei da questão da clínica. Apenas do nome que a havia mencionado, fora isso, nada havia passado pela minha cabeça.
— Certo. Pode falar.
— Torno a repetir: ou você se cuida ou joga tudo para o alto e espera a morte — direto e reto, era dos meus. — Se você optar por viver, tenho aqui os nomes de algumas clínicas de reabilitação — me entregou um panfleto cheio de nomes. — Basta que você escolha e me passe o nome. Aí, entrarei em contato com eles para que você possa começar o tratamento o quanto antes.
Fiz um barulho de "tsc" com a boca e o encarei.
— Não sei. Sou meio preocupado com a minha reputação, entende? O que irão pensar de mim? O que irão comentar de mim?: "Astro Malik está em tratamento em uma clínica de reabilitação por ser um viciado em drogas". Aonde a minha carreira vai parar?
Ele pareceu indignado com as minhas palavras e passou longe de entender o que eu disse.
— Então isso é um não? — perguntou, em tom indignado.
— Talvez — coloquei o panfleto em cima da bancada, próxima a jarra d'água vazia.
Balançou a cabeça e soltou um riso em escárnio. Abriu a boca para falar algo, mas desistiu. Porém, me encarou com certo desprezo.
— Descanse um pouco. Volto amanhã para ver se mudou de ideia.
Ergui e abaixei os ombros, enquanto curvei meu lábio inferior, não dando muita importância para a preocupação alheia. Eu já estava todo ferrado mesmo, pior não ficaria.
O médico saiu e trombou com uma enfermeira. Deixou a prancheta nas mãos dela, conversaram algo e ele apontou para o meu quarto. Os dois olharam para mim, mas ele tomou seu rumo assim que terminou de falar seja lá o que fosse e ela ficou estática me encarando, folheou o prontuário e logo desistiu, seguindo em direção oposta.
A cortina estava aberta, me permitindo ver que o sol já estava abaixando, deveria ser quase fim de tarde. Assustei com entrando no quarto e vindo na minha direção extremamente furiosa.
— Você é um benevolente e burro. O que você estava pensando ao dizer não?
— O que eu fiz? — arregalei os olhos, sem entender.
— Está mais preocupado com carreira do que com a sua vida?! Te deram uma escolha, e você não escolheu certo. Estão te dando uma segunda chance e você não está sabendo aproveitar. Está nas suas mãos e você não está tomando posse disso.
— Ah, claro. Estamos falando da reabilitação? — continuei encarando ela. — É uma escolha minha e particular. Aonde você estava que ouviu tudo, afinal? — estreitei os olhos.
— Escolha sua? Uma escolha burra, você quis dizer, né? Porque foi. É sério que você está mais preocupado com a questão de como será intitulado do que com a sua estabilidade? Porque se você sair daqui, sabemos que vai voltar a se drogar e dessa vez não terá volta. É caixão e vela preta. Aí, nem fama e nem nada. E você sempre será lembrado como o cara que teve uma overdose, porque de um jeito ou de outro irão falar, a única diferença é que, você pode aguentar isso estando vivo, ou nem sequer saber de nada enquanto está a sete palmos abaixo do chão. Escolhas, .
— É sério isso? Eu tenho vinte e seis anos e sei o que estou fazendo. Não preciso que você e nem ninguém me dê lição de moral. Aliás, eu nem te conheço.
Ela bateu palmas lentas e riu em seguida. Seu olhar era profundo e me incomodou um pouco. Deu alguns passos e se aproximou ainda mais de mim.
— Não, você não sabe. E sabe por que? Porque se soubesse, não estaria sendo um arrogante com escolhas estúpidas. Você precisa sim, que alguém te diga a verdade nua e crua, quer você goste ou não. As pessoas só querem o seu bem e você não está nem aí para isso. Está mais preocupado com o próprio nariz do que com o resto. E, se não fosse por mim, você nem estaria nesse hospital. Nem sei se seria encontrado com vida.
— Obrigado pela parte que me toca. Mas eu não preciso que você me diga algo como se me conhecesse.
— Eu conheço — soltou um riso. — E o pior é que eu conheço.
— É. Quem não, né?
— Não te conheço por ser famoso. Eu só... te conheço. E por isso digo: pensa bem na sua escolha, porque é a sua chance — apoiou a mão no meu braço e mais uma vez a sensação gelada me atingiu, me fazendo unir as sobrancelhas. — Eu não quero o teu mal, acredite em mim.
Umedeci os lábios e mordi o lábio inferior. Tentei desviar os olhos para outro canto, mas continuei focado na .
— Eu estou com medo — admiti.
Senti algo estranho passar pelo meu corpo e todos os meus músculos pareceram travar. Minhas vistas ficaram turvas e tudo o que eu enxerguei foram apenas borrões. O ar pareceu faltar e uma pontada no coração me fez fechar os olhos com todas as forças. De repente, tudo ficou escuro e num minuto depois, um clarão tomou conta da minha visão assim que abri os olhos.
Levantei e andei pela sala. Vi alguns médicos e enfermeiros tentando reanimar alguém. Andei até eles e parei ao lado da cama. Meus olhos arregalaram-se e eu dei passos para trás, trombando em alguém.
?
— Eu te disse — mostrou compaixão.
— O que está acontecendo? Existem dois de mim? O que está acontecendo? — me atropelei nas palavras, claramente todo desesperado.
— Não existem dois de você. Deus me livre, o universo não aguentaria tanta teimosia assim. Quero dizer, Alah. Seja lá quem quer que você acredite — olhou para frente.
— Então me diz o que está acontecendo.
— Não é óbvio? — olhou para mim mais uma vez. — Você está morrendo.
— O quê? Não pode ser. A gente estava... Mas... — olhei para a cama onde eu estava e olhei para ela. — Como eu estou te vendo? — ela apenas deu de ombros e eu voltei os olhos para o outro eu. — Eu não posso morrer.
— Escolhas.
Colocaram o desfibrilador no meu tórax e ouvi os médicos falarem algo como: "carregar em 200" e depois "afastar". Então meu corpo foi puxado para cima. Senti algo queimar em mim e coloquei a mão no peito.
— O que eu tenho?
— Você teve uma parada cardíaca e eles estão tentando te reanimar.
— O que é você? — encarei ela, um tanto assustado.
— Eu sou a .
— Não. Eu perguntei: O que e não quem.
Ficou em silêncio enquanto me encarava, e logo desviou para meu corpo na cama com as pessoas tentando me trazer de volta.
— Sabe, ... aqui neste hospital existem muitas pessoas com doenças terminais que dariam de tudo para viver se tivessem escolha e elas não tem. Enquanto você teve e não soube escolher.
— Mas eu posso fazer diferente, não posso? Eu escolho viver.
Senti outra fisgada no peito e comecei respirar freneticamente.
— Talvez. Promete pensar direito e mudar de opinião?
— Eu prometo o que você quiser. Não sei nem o que está acontecendo direito.
— Acredito em você — sorriu e se aproximou.
Estranhei sua proximidade, ainda mais quando seu rosto ficou bem próximo ao meu. Sua respiração bateu de encontro ao meu rosto e seus lábios gélidos entraram em contato com os meus. Se afastou e retrocedeu a mesma quantidade de passos que dera pra frente.
As fisgadas se tornaram frequentes e eu me ajoelhei por estar sentindo muita dor no peito. Aquilo doía de um tanto, que nem força eu estava tendo mais. As pessoas se tornaram borrões de novo e eu senti mais medo ainda.
? — procurei em volta, não vendo nada além de borrão. — ? — gritei e nada.
De repente, tudo ficou branco. Puxei o ar de uma vez até que preenchesse todo meu pulmão e até engasguei, tossindo em seguida. Minha vista se ajustou ao lugar e a luz era amena.
— Temos pulso. Ele voltou — escutei uma voz vindo do meu lado esquerdo.
Ouvi os sons dos aparelhos e até o "bip" dos meus batimentos cardíacos. Meus olhos encheram-se de lágrimas e senti quando elas escorreram pela lateral. Mexi apenas os olhos em todas as direções e fiquei confuso se estava mesmo vivo ou não. Ainda sentia medo.
— Está tudo bem, amigão — colocaram uma máscara de oxigênio na minha boca e nariz.
Tiraram toda a aparelhagem da sala e aos poucos as pessoas foram saindo, deixando o ambiente mais calmo. Uma enfermeira se aproximou e injetou algo no soro.
— Você precisa descansar, tá? Estou te dando remédio para dormir — explicou, após ver que eu estava olhando o que ela estava fazendo, e eu balancei a cabeça em negação.
Eu não queria dormir porque o medo que eu estava sentindo era sem igual. Nunca tinha sentido aquilo antes e não queria sentir de novo. Eu ainda não fazia ideia se estava mesmo vivo ou apenas alucinando. Não estava sabendo distinguir a realidade, acredito. Senti meus olhos arderem e uma poça se formar mais uma vez naquela região. Enquanto eu balançava a cabeça em negação, olhei para o outro lado e vi a em pé. Arregalei os olhos e senti tudo girar. Minhas mãos tremeram e eu tentei tirar a máscara de oxigênio, sendo vencido pela moleza causada pelo remédio.
— Vai ficar tudo bem. Descansa! — ela disse.
E num piscar de olhos, senti minhas vistas pesar e meu corpo relaxou.

{•••}


Abri os olhos vagarosamente e a primeira coisa que eu avistei foi o teto da sala. Senti a garganta seca e meu corpo todo dolorido. Depois, olhei em direção a porta e algumas pessoas transitavam para lá e para cá. Em seguida, olhei para a janela, já era noite. Abri um sorriso mínimo assim que vi minha mãe dormindo toda desajeitada na poltrona. Ela pareceu sentir que eu estava acordado, pois abriu os olhos e sorriu ao me encarar.
— Oi, sunshine. Como você está se sentindo? — veio até mim.
Apenas balancei a cabeça e fiz um aceno com o dedo, indicando estar bem. Embora eu não estivesse tanto.
— Eu fiquei com medo de te perder, filho. Alah sabe o quanto eu fiquei — segurou firme minha mão. — O médico disse que foi só um susto e que logo você ficará bem.
Puxei a máscara para baixo e ela me advertiu, colocando-a de volta em meus rosto.
— Estou com sede — eu disse, meio abafado, mas ela entendeu, pois começou a procurar pelo quarto.
— Eu vou buscar, volto num instante.
Na mesma medida que ela saiu, entrou no quarto e eu tentei sentar na cama. Eu tive um sonho muito estranho com ela, enquanto eu estava tendo aquela maldita parada cardíaca, que doía todo o meu tórax de tanta força que haviam feito para me reanimar.
— Isso é real? — disse, após tirar a máscara de oxigênio.
— É — ela sorriu e sentou na ponta da cama. — Por que não seria?
— Tive um sonho estranho, e você estava lá — falei um pouco mais tranquilo. — Eu estava realmente morrendo?
— Estava, .
— E por que eu te vi? — estreitei os olhos.
— O que você viu? — ela mordeu o lábio, e por um momento fiquei com vergonha. Eu não era de ser intimidado por mulheres.
— É... — vamos, , diga algo sem sentido, ela não vai saber se é mentira!
Ela ainda me encarava enquanto esperava uma resposta. De uma hora para a outra, ela se levantou e foi até a porta.
— Volto já — falou e assenti, relaxando na cama.
Em seguida, minha mãe entrou sorrindo, mas logo que me viu, tirou o sorriso do rosto, colocando o copo e o jarro na bancada ao lado.
, por que você tirou a máscara? — perguntou, enquanto voltava para meu rosto aquela droga.
— Estou conseguindo respirar sem ela, mãe — antes que pudesse tirar de novo, ela deu um tapa em minha mão, e eu ri.
Encheu um copo com água e me entregou. Sentou na beirada da cama e fez carinho na minha mão. Seus olhos eram piedosos e um certo temor tomou conta deles.
— Sonhei que estava morrendo — falei, e ela suspirou. — Foi horrível.
— Você teve algumas paradas cardíacas, querido — mamãe falou, e eu segurei sua mão com mais força. — Por favor, filho, eu não quero te perder. Seria uma dor imensurável, e eu não estou pronta para sentir isso. Pensa na mamãe, se não for pedir muito.
— Eu te amo — falei tentando segurar as lágrimas.
Ela assentiu, e desceu um beijo em minha testa, fazendo-me sentir amado e acolhido. Fazia tempo que eu não sentia esse tipo de carinho e acolhimento, até porque a droga fazia isso, dava essa falta que eu sentia de casa, da família. Era mais fácil em meio a tantos shows e ansiedade.
— E aí, . Como está? — ouvi a voz do médico vir de fora do quarto.
— Bem — respondi.
Pegou uma lanterninha e ergueu minha pálpebra superior, aproximando a luz do meu olho esquerdo, logo passando para o direito.
— Alguma alteração da percepção? — perguntou o doutor e dei de ombros.
— Não sei — olhei para todos os lados, e mais uma vez dei de ombros. — Quando vou poder ter alta?
— Ainda não sabemos. Aconteceu tudo muito rápido. Você teve uma overdose e um tratamento intensivo aqui. Acabou de ter uma parada cardíaca e quase não voltou. Vamos observar. Caso algo diferente aconteça, iremos te encaminhar para um outro especialista.
O médico disse mais algumas coisas e eu avisei que iria fazer o tratamento em uma das clínicas assim que escolhesse. Ele pareceu contente com a minha decisão.
— Eu sabia que você ia pensar melhor.
Na verdade, tinha sido minha experiência quase morte que havia me feito repensar. Eu tinha muito para viver ainda e aquela não era a hora de ir dessa para outro plano. tinha razão sobre eu estar sendo benevolente e teimoso demais. E teve mais razão ainda ao mencionar que muitas pessoas fariam de tudo para ter a chance que eu estava tendo, então, não custava fazer meu máximo para viver da melhor maneira possível.
Minha mãe se despediu e disse que voltaria na manhã seguinte. Depositou um beijo na minha testa e me encarou.
— Eu te amo, .
— Também te amo, mãe. E desculpa te fazer passar por tudo isso de novo. Prometo que as coisas irão mudar.
Sorriu compreensiva e me deu as costas, desaparecendo no corredor. Assim que a porta se fechou, abriu novamente e até achei que fosse minha mãe que houvesse esquecido algo, mas era a .
— Que dia, huh? — comentou.
— Nem me fale — suspirei, e tentei me levantar um pouco mais. — Você poderia me falar um pouco de você.
— Acho que você deveria descansar um pouco mais, porque o dia foi tenso — ela inclinou-se e beijou minha testa. Por um momento eu quis que aquele beijo tivesse sido em meus lábios.
Ela cheirava a café e baunilha. Sorri, e acabei adormecendo enquanto segurava sua mão fria.



Capítulo 02

’s Voice:

Foi difícil ter que deixar ele, mas era preciso. O que mais me doía era o tempo; pois ele passava diferente no paraíso, e eu não sabia quanto tempo eu estaria de volta para o . Talvez em dez minutos, dez horas, dez dias, dez meses, ou dez anos.
As ruas eram realmente como eram descritas na Bíblia: de ouro e de cristais. A paz reinava naquele lugar, e vez ou outra, eu cumprimentava outro anjo que passava dando glórias à Deus. Ele havia criado aquilo tudo perfeitamente do gosto dEle, e mesmo que eu O adorasse, tinha receio de qual seria a sua reação ao pedir para voltar para a terra, ainda assim eu sabia que teria um preço a ser pago.
Me aproximei do seu palácio e fui anunciada, na qual entrei com as asas tampando meu rosto e meus pés. A presença era muito forte, o brilho era intenso, por isso ajoelhei-me, adorando-O.
? — sua voz reverberou pelo ambiente em que estávamos. — Você tem certeza sobre o que quer fazer?
Ela já sabia. Ele era Deus.
— Sim, Senhor — falei, ainda ajoelhada em sua presença. — Preciso voltar à terra, não sei se aqui é o meu lugar. Eu sei que... posso ajudar lá debaixo.
— Você está renunciando algo muito sério, — Ele disse, fazendo minhas asas coçarem na base. — Você era um dos meus melhores anjos, e você me traiu.
— Não! — gritei, sem levantar os olhos. Era impossível ver sua face. — Eu não O traí, eu só... Senhor, não quero ter Sua justiça. Quero ter Seu amor.
— Pai — ouvi a voz de Jesus ao seu lado, e meu coração acelerou. Ele sempre era mais bondoso, e conversava com Deus sobre os problemas celestiais. Era como se ele fosse o apaziguador e olhava para todos com olhos doces. — Reconsidere seu pedido.
— Você me traiu — Deus continuou, e senti as asas queimarem. — Seu objetivo era tirar aquele homem do fundo do poço em que estava, e você se apaixonou por ele. Por isso, irei exila-la do céu. Você será lançada na terra.
— Mas, Senhor...
— Aparta-te de mim!
Então ouvi um trovão muito forte, e o vento me carregou para trás. Eu estava caindo em queda livre, assim como havia acontecido com Lúcifer. Uma queda sem fim. Senti medo, pois minhas asas foram sumindo aos poucos, quando notei, elas tinham ido. Senti uma ardência muito forte no topo das costas e gritei a plenos pulmões. Até que senti uma dor dilacerante porque meu corpo se chocou com algo, parecia que tudo tinha quebrado. Acabei desmaiando.


{•••}



Mexi as sobrancelhas enquanto meus olhos faziam o trabalho de se esforçarem para abrir, o que foi uma tentativa falha por minutos, pois minha vista estava tentando se adaptar com o lugar. Suspirei fundo e abri vagarosamente os olhos, olhando em volta. Mexi os globos oculares tão rápido que senti minha cabeça pesar. Escutei sons bem próximos, ao mesmo tempo que eram conhecidos também eram estranhos e eu não sabia o que pensar ao certo. Eu não fazia a menor ideia de onde estava, muito menos o que estava acontecendo, e eu estava tentando a todo custo lembrar o que tinha acontecido.
Ao tomar conhecimento de onde estava, sentei bruscamente na cama e minha respiração se tornou pesada, um tanto descompassada. Haviam alguns fios ligados em meus braços, arranquei todos e corri para fora do quarto, vendo algumas pessoas passarem as presas para lá e para cá. Andei apressadamente e sem rumo numa direção qualquer, sem ter noção de onde o caminho poderia me levar, somente segui. Era nítido que eu estava num hospital. Mas por quê? O cheiro daquele lugar me dava náuseas.
Avistei uma porta gigantesca de vidro que abriu automaticamente assim que um grupo de jovens passaram por ela. Então eu soube que bastava eu me aproximar para que ela também abrisse para mim. Escutei uma agitação e olhei para o lado, vendo um grupo de médicos vindo em minha direção, me apressei para passar pela porta, que não demorou em me dar passagem.
Sem intenção alguma, acabei trombando em várias pessoas na tentativa de me afastar do lugar. A claridade me fez levantar as mãos e tentar cobrir os meus olhos o máximo possível. O chão estava quente e meus pés descalços estavam pedindo arrego. Andei mais depressa procurando por uma sombra e parei debaixo de um toldo em um lugar que eu não fazia ideia do que era. Notei que algumas pessoas me olhavam de cima a baixo e cochichavam entre si, me deixando ainda mais sem entender o que estava acontecendo. Olhei para mim mesma e percebi que estava com vestimentas de hospital – um vestido branco com detalhes azuis. Senti um ar nas minhas costas e levei a mão até lá, percebendo que aquela parte era toda aberta. Apressei-me em puxar o máximo de pano possível para que eu estivesse totalmente coberta na parte posterior.
Dei uma pequena corrida novamente para fugir do sol assim que decidi andar mais um pouco, e minha boca começou a ficar seca, passando a sensação para a garganta. Minha respiração se tornou parte crucial naquele momento, pois parecia que meus pulmões iam explodir. Minha cabeça começou a girar e uma sensação de peso começou a tomar conta da região. As pessoas ainda trombavam em mim, pareciam não me ver, mas eu sabia que estavam me vendo, pois os olhares não eram discretos.
— Oi, você poderia me ajudar? — eu perguntei para uma mulher que me olhou torto e fez questão de apressar o passo.
Tentei parar mais algumas pessoas, mas todas não me davam ouvidos. E embora todas fizessem questão de me medir, nenhuma tinha a deiscência de me ajudar.
Me senti sem rumo no meio da multidão que ia e vinha. Estava como num beco sem saída ou um labirinto onde não fazia ideia em qual direção seguir. Girei várias vezes sentindo o pânico me consumir e o espaço pareceu menor. Algo começou a sair dos meus olhos, era transparente e parecia água. O que era aquilo? Fiquei mais assustada ainda. Tudo estava girando e os sons pareceram ficar mais aguçados, me fazendo levar as mãos até os ouvidos, tampando-os. Ouvi buzina, gente conversando, gente rindo e por fim, um som agudo mais parecido com um zumbido. Parecia que meus tímpanos iam estourar.
Curvei um pouco o corpo e a água dos meus olhos se tornaram cada vez mais frequentes, aumentando a quantidade também. Num piscar de olhos, soltei um grito a plenos pulmões, e a poucos metros dali escutei vidro se estilhaçando. Senti dormência nas mãos e nos lábios, e logo minhas costas começou esquentar, tive a sensação de algo estar escorrendo naquela região. Algumas pessoas começaram apontar e saíram correndo aos gritos. Uma pontada aguda invadiu minha cabeça, me fazendo bater os joelhos no chão de uma vez. Juntei uma mão de cada lado do meu crânio e o pressionei, na tentativa de diminuir a dor, falhando miseravelmente. Cerrei os dentes e apertei os olhos, gritei mais uma vez e senti meu corpo ceder para trás. Porém, não senti o concreto abaixo de mim, o que eu senti estava muito longe de ser o chão. Mesmo com as vistas embaçadas, vislumbrei uma silhueta masculina e uma voz ecoada um tanto perto e ao mesmo tempo distante.
— Vai ficar tudo bem — disse. Então, desmaiei.


Capítulo 03

’s Voice:

Estranhei a agitação das pessoas naquela tarde e parei de mexer no celular. Uns corriam para um canto enquanto outros pareciam estarem estáticos. Segui o fluxo onde algo parecia estar acontecendo e passei pela multidão que se aglomerava.
Uma moça com vestimentas de hospital estava ajoelhada no chão, com as mãos na cabeça enquanto gritava sem parar. Todo mundo estava parado e nem sequer tentaram saber o que estava acontecendo. Meu instinto falou tão alto que me senti no dever de ajudá-la.
— Pra trás todo mundo — empurrei algumas pessoas que me olharam estranho. — Vocês estão deixando ela sufocada. Se não vão ajudar, deem o fora.
Alguns murmúrios chegaram até mim, mas ninguém fez questão de mover um músculo. Me aproximei da mulher e vi seu corpo inclinar para trás, antes que ela batesse no chão, me ajoelhei às pressas e segurei seu corpo. Ela mexeu os olhos e me encarou, eu disse que tudo ia ficar bem, e então seus olhos se fecharam.
— Alguém chama uma ambulância? — gritei.
Rapidamente algumas pessoas pegarem seus celulares e discaram para a emergência, já outras apenas dispersaram como se nada estivesse acontecendo. Uma mulher se aproximou de onde estávamos e ajoelhou do outro lado, ficando próxima da mulher que estava em meus braços. Ela tirou um leque da bolsa e sorriu para mim de forma sútil, retribui o gesto e ela começou a abanar o objeto em direção a nós, principalmente na moça que apenas respirava lentamente, até parecia estar dormindo.
Olhei mais uma vez para ela e me permiti observar seus traços que pareciam ser tão angelicais. Minhas sobrancelhas uniram-se assim que notei uma mecha branca em seu cabelo, minha cabeça deu um nó. Segurei seu rosto delicadamente e o virei ainda mais para mim. Meu corpo inteiro travou, porque senti algo tão forte por dentro que era impossível explicar. Era uma sensação boa e trazia paz, há tempos eu não sentia aquilo.
Meu antebraço começou a esquentar, passando a sensação para a minha calça. Parecia que algum líquido tinha sido derramado em mim. Segurei o corpo dela com a outra mão e levantei o braço que estava debaixo de seu tronco, assustando ao ver uma grande quantidade de sangue presente em mim, mas eu sabia que não era meu. A mulher que antes nos refrescava, parou de agitar o leque e arregalou os olhos.
— Esse sangue é dela? — questionou.
— Eu acho que sim. Meu não é.
Virei o corpo dela e assustei com dois grandes rasgos bem em cima de suas escapulas. Sem contar no tanto de sangue que ela estava perdendo.
— Alguém conseguiu chamar socorro? — perguntei, extremamente desesperado.
— Liguei para alguns. Uns não tinham como mandar no momento, e outros estão nas ruas — um homem avisou.
— Droga — olhei para ela e seus lábios estavam começando a ficarem brancos. — Não vai dar tempo.
Passei um braço por debaixo da perna dela e o outro foi em seu pescoço. Esforcei o corpo para levantá-la e ajeitei-a em meus braços, fazendo uma força considerável para segura-la firme. Respirei fundo e passei por entre as pessoas.
— Aqui, vem aqui — o mesmo homem de antes chamou minha atenção. — Entra no meu carro e eu levo vocês.
O hospital mais próximo era há poucos quilômetros de onde estávamos, eu tinha pleno conhecimento daquilo, mas uma carona ia bem naquele momento, até porque ela estava sangrando muito e mesmo que eu tentasse ser rápido, ela estava pesando um pouco.
O homem abriu a porta traseira e deu passagem para que eu entrasse com ela. Bateu a porta e entrou do lado do motorista, arrancando com o carro em seguida.
Parou de qualquer jeito na frente do grande prédio e eu abri a porta. O homem gritou por socorro e me ajudou a sair do carro. Todos os pêlos do meu corpo se ergueram, porque eu conhecia aquele hospital, inclusive tinha pavor de entrar nele, porque foram longos dias deitado numa cama esperando minha recuperação que não foi nada fácil.
Nem percebi quando um grupo de médicos se aproximaram, só notei quando tiraram a mulher dos meus braços e a colocaram numa maca, sumindo com ela. Entrei no hospital e alguns enfermeiros disseram que iriam me examinar, por conta de todo o sangue presente em minhas roupas e membros.
— Eu estou bem — eu disse. — Esse sangue não é meu. Você sabe me dizer pra onde levaram a moça que eu trouxe? — questionei a um dos caras.
— Levaram ela para o centro cirúrgico.
— Você sabe se vai demorar?
— Não sei — disse. — Você a conhece?
Eu não sabia responder àquela pergunta direito, porque tinha a sensação que sim, mas tecnicamente era não. Fiquei em dúvida em qual resposta dar.
— Não, eu... — suspirei fundo. — Eu encontrei ela na rua.
— Certo — me mediu.
— Eu posso esperar por notícias aqui? Não é sempre que a gente vê essas coisas acontecendo, sabe? E quando a gente tem a oportunidade de ajudar, por que não ficar até o fim?!
O cara ajeitou o óculos de grau e formou uma linha dura entre os lábios. Pareceu entender o meu lado. Era confuso até para mim, que dirá para ele.
— Pode ficar. Sem problema — relaxou os ombros.
Acenei com a cabeça e mandei um sorriso sincero. Ele me deu as costas e parou no balcão para resolver o que quer que fosse, e eu procurei uma poltrona na sala de espera.
O homem que me deu carona sentou-se ao meu lado e relaxou o corpo na poltrona. Olhei-o pelo canto dos olhos.
— Será que ela vai ficar bem?
— Espero que sim.
Silêncio.
Ergui meus olhos até a TV que fazia barulho na sala – mesmo que mínimo, e não entendi nada do que estava sendo dito na notícia, apenas estava vendo para passar o tempo. Um local todo destruído passou na reportagem mostrada pelo helicóptero. Franzi o cenho e achei estranho. Parecia que algo tinha caído ali e estava longe de ser bomba ou qualquer outra coisa do tipo. Pedi para que aumentassem um pouco o volume e me foi concedido. O apresentador e repórter disse que ninguém tinha respostas sobre o que poderia ser aquilo e até fizeram um comentário zoando um possível ataque alienígena, o que me fez rir.
— Aí, você não é aquele cara famoso que passou na televisão?
Virei a cabeça na direção do homem.
— Depende.
— Aquele que teve uma overdose.
De início, o fuzilei com os olhos. Senti minha mandíbula travar e minhas têmporas ressaltarem. Mas depois relaxei os ombros, afinal ele e nem ninguém tinha culpa por algo verídico correr por aí.
— Infelizmente — falei, calmo. — Eu sempre serei lembrado por ser esse cara.
Segundos depois de eu ter dito o que disse, algo clareou na minha mente e eu senti um dejàvu. Como se já tivesse escutado aquilo em algum canto. Porém, não dei tanta importância.
Trocamos umas ideias e ele disse que seu nome era Thomáz, mas que preferia ser chamado de Tom. Acrescentou que entendia o que eu tinha passado. Confessou ter sido dependente químico por anos e até pediu desculpas pelo modo como se referiu a mim. Eu disse estar de boa com a situação, até porque já tinha passado daquela fase, embora não fizesse tanto tempo, mas já havia passado. Felizmente eu era um novo homem, com novos planos e uma nova consciência. Drogas não eram mais meu foco. Até que me senti bem por poder conversar abertamente com alguém a respeito desse assunto, ainda mais se tratando de um estranho.
Tom se despediu mais tarde e deixou seu contato para que eu desse notícias sobre a mulher da qual nem sabíamos o nome.
Um médico veio até a sala de espera e perguntou pela família da mulher, mas não disse nome algum. Me pus de pé e fui até ele.
— Eu estou com ela.
— É irmão dela?
Franzi o nariz e fiz uma careta.
— Não. Eu encontrei ela na rua. Posso saber do quadro dela, não posso?
Ele pareceu pensar sobre e logo desembuchou:
— Como não veio ninguém atrás dela até hoje, suponho que sim — sorriu amarelo. — Me acompanhe.
Seguimos por um corredor extenso e entramos num dos quartos. Ela não estava respirando por aparelhos, o que era bom. Mas estava recebendo sangue e ainda estava com os olhos fechados. Vários pequenos fios estavam ligados acima de seu peito, e seus batimentos eram normais. Faixas estavam enroladas formando um X das costas para frente, e uma coberta fina cobria seus membros inferiores.
— Quero agradecer por trazê-la de volta. Ela fugiu mais cedo.
— Como ela conseguiu fugir?
— Sempre tem imbecis em todo canto — sorriu com os lábios fechados. —, o segurança não estava onde era para estar e ela simplesmente saiu. Sorte que você a encontrou.
— É, mas ela não estava em uma boa condição. Que tipo de hospital deixa uma brecha dessa?
Ele apenas levantou e abaixou os ombros.
— Ela ainda está desacordada. Perdeu muito sangue e nós tivemos que ser bem cautelosos na cirurgia das costas. O ferimento era bem profundo e não sei como não atingiu os pulmões. Mesmo com tudo isso, acredito que a recuperação será boa.
— Obrigado, doutor — eu disse, baixo.
Ele se colocou para fora do quarto e me deixou a sós com ela. Andei até a cama e parei ao lado dela. Uma aflição passou por mim porque eu não podia fazer nada para que a situação melhorasse. Eu não sabia porque queria ajudar tanto, eu só queria.


Capítulo 04

’s Voice:

Estive no hospital por vários dias seguidos e o quadro da mulher parecia não ter mudança alguma. Fizeram o favor de colocar um papel escrito “Jane Doe” bem acima da cabeceira da cama onde ela estava, e eu arrancava todas as vezes, pois me incomodava. Ela não era uma Jane Doe. Ela deveria ter alguém esperando por ela, só não sabiam ainda. Ela deve ter nome, todos temos, e só era questão de tempo até descobrirem. Segundo eles, era pra identificar melhor a paciente. Mas para mim, não era. Todos os dias eu levava uma flor diferente para enfeitar o quarto e deixar o lugar menos pesado, aquela era a minha maneira de ajudar, mesmo que ela não estivesse vendo.
— Por que eu tenho a impressão de te conhecer? — eu disse, enquanto passava a mão pelos seus cabelos.
Num ato repentino, seus olhos abriram-se de uma vez e ela puxou o ar como se não soubesse o que era respirar, me fazendo levar um baita susto. Sentou na cama e segurou em meu antebraço.
— Me tira daqui, pelo amor de Deus — sua mão apertou fortemente meu antebraço. Ela me encarou e eu notei suas pupilas dilatadas.
Olhei rapidamente para a porta esperando que alguém passasse para que eu chamasse, mas o corredor estava vazio. Mirei os olhos da mulher mais uma vez e ela nem fez questão de desviar, apenas cravou o olhar sob mim também. Um arrepio percorreu todo meu corpo e eu puxei meu braço.
— Calma — eu disse, sereno. Observei sua respiração ficar descompassada e alertei-me. — Respira devagar. Nada vai te acontecer aqui. Fica calma.
Pareceu entender o que eu estava pedindo, e com certa dificuldade não estava conseguindo se controlar. Aparentemente, a calma não estava respondendo ao seu pequeno surto. Corri até a porta do quarto e chamei por alguém, não demorando em aparecer uma penca de gente. Ajudaram ela com o necessário e eu apenas fiquei de canto, antes que mandassem eu sair da sala.
Saíram um a um e o silêncio retornou ao quarto. Ainda deitada, a mulher mexeu os olhos na minha direção e piscou lentamente. Pigarreou e engoliu seco.
— Você está com sede? — me aproximei.
— Sede? — estreitou os olhos. — Como é ter sede?
Automaticamente minhas sobrancelhas se uniram e eu fiz uma careta. Soltei um riso frouxo por entre os lábios e tornei a ficar sério. Esperei que ela falasse que estava zoando ou apenas risse da minha cara, mas nada aconteceu. Ela ainda me encarava esperando uma resposta.
— Você deve estar zoando, não é? — eu ri, mais uma vez.
Ainda séria, ela tirou os olhos de mim para olhar os próprios pés. Ergueu um pouco a cabeça, deixando visível o pescoço por poucos segundos, apenas para que a saliva descesse mais rápido.
— Sim — forçou um riso amarelo. — Tenho sede — sua voz quase falhou.
Enchi um copo com água, coloquei um canudinho e o entreguei a ela. Devo acrescentar que fiquei atônito vendo ela encarar o copo como se tivesse medo do que poderia acontecer em seguida.
— Pode tomar. É água mesmo — puxei um riso de lado.
Ergui a maca para que ela bebesse água. Ela levou o canudo até os lábios e deu um mínimo gole no líquido transparente. Notou que não tinha nada de errado e fez uma careta após tomar grandes goles em seguida. Afastou o canudo da boca assim que começou tossir e eu me apressei para pegar o copo e colocá-lo longe.
— Vai com calma. Você ficou muitos dias sem tomar água, sua garganta deveria estar extremamente seca.
Ela não parecia ser alguém de muitas palavras e eu me contentei com aquilo, fiquei na minha. Tentei entender o processo todo mesmo que não soubesse o que realmente tinha acontecido. Mas não deveria ser nada fácil e muito menos normal ter dois rasgos imensos nas costas. Eu não queria saber o que tinha causado aquilo – talvez uma pequena parte de mim quisesse, mas só uma pequena parte mesmo, no entanto, sabia que era melhor deixar quieto. Ainda mais se fosse algo que mexesse com ela.
Faziam horas que eu estava sentado na poltrona do quarto enquanto a mulher nem sequer direcionava o olhar para mim. Sua cabeça estava virada para o lado da janela e não era possível que eu viesse um mísero detalhe de seu rosto. Não fazia ideia se ela estava dormindo ou não. Cruzei as pernas de uma forma desleixada e num ato de ansiedade comecei a balançar o pé rapidamente. Um barulho veio de onde ela estava e eu quis rir, pois ela virou o rosto rapidamente na direção do barulho e logo me encarou, assustada.
— O que foi isso?
— O quê?
— Esse barulho — apontou para a própria barriga que roncou mais uma vez. — QUE ISSO? — sentou de uma vez na cama e reclamou das costas.
De duas a uma: ou ela tinha batido muito forte com a cabeça, ou era louca. Porque eu estava ficando mais do que confuso com as perguntas dela, coisas simples. Mas tive paciência, porque o quadro poderia ter piorado.
— É seu estômago roncando. Quer dizer que você está com fome. Logo eles trarão o seu jantar e isso vai passar.
— Entendi — pareceu compreender.
Mais tarde, quando a comida dela chegou, eu a ajudei a se alimentar porque ela estava com dificuldade. Ela agradeceu e quando menos esperei, entramos numa conversa leve. Perguntei qual era o nome dela e ela paralisou, tentando se lembrar de algo e até ficou um pouco aflita pelo bug. Eu pedi para que ela relaxasse e que tudo bem não se lembrar, pois as coisas estavam recentes e sua respiração regularizou.
— Que tal te darmos um nome até você lembrar o verdadeiro?
— Me parece ótimo — sorriu. — Qual você sugere?
— Você não tem preferência? — ela apenas chacoalhou a cabeça. — Ãn... Ok. Que tal: ?
Ela alargou os lábios num sorriso encantador e eu acabei sorrindo junto.
— Tá aí. . Eu gostei.
— Prazer, . Eu sou o — estendi a mão até ela e seus olhos foram até aquela direção. — Agora você aperta a minha mão e diz: O prazer é todo meu, . Eu sou a — eu ri e ela me acompanhou.
— O prazer é todo meu, . Eu sou a — apertou minha mão e me encarou, sorrindo com os olhos. Juntou as sobrancelhas e mirou meus olhos. — Eu conheço seu rosto.


{•••}



Ninguém sequer apareceu por dias perguntando dela, apenas o Tom. E ficamos contentes em saber que ela estava próxima de receber alta. Só fiquei matutando para onde ela iria quando saísse do hospital e cheguei à conclusão que ela poderia ficar no meu antigo apartamento – já que ele estava parado há meses.
Um bom tempo depois, acabamos nos aproximando, pois eu sempre aparecia de surpresa para vê-la e ela parecia gostar da ideia, afinal, éramos apenas nós. Ela me acompanhava pela TV quando eu fazia entrevistas, shows etc e sempre dizia o quão bom eu era no que fazia. Percebi que algo estava mudando dentro de mim dia após dia, e não soube explicar quando meu coração quase saía pela boca em todas as vezes que eu estava na presença dela. Fazíamos quase tudo juntos e eu me apeguei a ela, ao ponto de fazer de tudo para vê-la bem e feliz. Até mesmo nos dias ruins, onde ela não estava bem com os acontecimentos recentes, principalmente por não ter lembrado seu verdadeiro nome e nem nada que viesse anteriormente do hospital. Não sabíamos se ela tinha família e muito menos se eles estavam procurando por ela, mas há julgar pelo tempo, concluímos que não.
Vez ou outra ela reclamava de dores nas costas e odiava que eu chegasse perto para ver como estava. Tinha vergonha das cicatrizes. E eu fazia questão de deixar claro o quão linda e incrível ela era, independentemente de cicatriz ou não, porque elas não alteravam nada na pessoa que ela havia lutado para se tornar. Muitas das vezes quando pegávamos no sono no sofá após vermos filme, eu acordava com ela se debatendo e gritando ao meu lado, falando nada com nada, uma língua estranha e sem sentido. Aí eu tinha que acordar ela e dizer que tinha sido pesadelo. Era raro ela não ter esse tipo de episódio e mesmo assim eu me assustava em todas as vezes. E sem que eu percebesse, ficava acordado vendo ela dormir apenas esperando algo acontecer, assim eu já estaria preparado e poderia zelar por ela.


Capítulo 05

’s Voice:

estava dormindo sereno no tapete da sala e eu me peguei o olhando. Sorri para mim mesma por ter tido o conhecimento do quão gentil ele estava sendo comigo há tempos – sendo que não tinha obrigação nenhuma. Eu sabia que tudo o que ele fazia, fazia por livre e espontânea vontade, e de certa forma me alegrava isso tudo. A bondade era visível e eu não sabia descrever em palavras o quanto me sentia completa na presença dele. Eu não tinha muito conhecimento sobre alma gêmea ou coisa do tipo, mas lembro de ter ouvido em algum lugar algo sobre isso. E se realmente fosse tudo verídico, o seria a minha outra metade. Sem sombra de duvidas.
Ele me fazia rir de um jeito que eu não sabia que era possível. Me fazia sentir segura, amada e até desejada. Qualquer outra pessoa não teria feito nem metade do que ele fez e fazia por mim – uma estranha até certo tempo, digamos.
Pisei devagar no chão e adentrei a cozinha para preparar o café da manhã. Sim, eu havia aprendido isso também, ou reaprendido, não sei. Às vezes me sentia como uma criança aprendendo a dar passo por passo, o que não era tão ruim, principalmente por ter quem eu tinha do meu lado: o cara mais incrível do universo todo.
Remexi os quadris enquanto cantarolava uma música baixinho, e colocava os ovos mexidos no prato. Coloquei pães na torradeira e voltei a frigideira para tostar os bacons. Um tremor passou pelo apartamento e logo o apareceu correndo até a cozinha.
— O que é isso? — perguntei, segurando um pegador.
— Foi semelhante a um terremoto, não?
— Será que é um?
— Espero que não — deu de ombros. — Vou escovar os dentes. Já venho te ajudar.
— Já estou acabando. Vou fazer um suco para nós.
— Morango com limão?
— Pode apostar que sim — sorri e ele mostrou os dentes impecáveis num riso perfeito, logo sumindo de minhas vistas.
Terminei de ajeitar a mesa e a campainha tocou, atraindo a minha atenção. O passou com a escova na boca e foi em direção a porta.
— Eu vejo quem é — disse, meio embolado.
Ele conversou com alguém e passou de novo no corredor, voltando para o banheiro. Na mesma medida, o Tom apareceu na cozinha e me cumprimentou. Logo menos o reapareceu e todos sentamos à mesa para tomar café.
Tom havia se tornado um baita amigão, tanto meu quanto do . E sempre ajudava no que estivesse ao seu alcance. Logo quando sai do hospital, eles me deixaram a par das situações e eu fiquei sabendo que se não fossem os dois, ninguém teria me ajudado. Também soube que os dois tinham algo em comum: superação de vícios. E quando mencionaram isso, senti como se já soubesse sobre o , mas deixei passar, porque não acreditei que seria útil mencionar tal coisa, já que havia passado tempos.
— Vocês estão sabendo que vai ter uma festa a luz negra hoje lá no salão Lanur? — Tom perguntou, tirando as bordas do pão tostado.
— Não. Aonde você viu? — perguntei, bebericando de meu suco.
— Uma amiga me convidou e eu estou chamando vocês. Vamos?
e eu nos entreolhamos. Ele levantou e abaixou os ombros.
— Eu topo — ergueu a mão.
Eu sorri com os lábios fechados enquanto os dois me encaravam.
— Tá. Vamos — desembuchei e eles comemoraram.


{•••}



O dia pareceu passar se arrastando, ou talvez fosse apenas impressão por eu estar ansiosa para uma festa. Eu nunca tinha ido em uma – que eu me recorde. Fui em barzinhos e lanchonetes, apenas coisas mais calmas, não sei qual seria a minha impressão sobre uma festa e se eu curtiria a experiência.
Encarei o meu reflexo no espelho grande e olhei para o meu vestido vinho que chegava pouco acima do joelho. Puxei outro vestido que estava na cama e o estendi na frente do corpo. Torci o lábio, indecisa sobre qual deles usar. Girei um pouco o corpo e me senti insegura por conta das minhas cicatrizes estarem a mostra. Tornei a ajeitar a postura e soltei um suspiro pesado por entre os lábios. Joguei a cabeça para trás e fechei os olhos, sentindo uma energia não tão boa passar por mim.
A porta do quarto rangeu e eu olhei pelo espelho. entrou no quarto e parou atrás de mim.
— Eu não posso usar isso — eu disse, tristonha.
— E por que não?
Abri a boca, indignada e joguei o outro vestido em cima da cama.
— As minhas cicatrizes, .
— Não tem nada de mais nisso. São um charme — sorriu.
— Você só está dizendo isso porque é meu amigo.
Seu sorriso se desfez e ele pigarreou, colocando as mãos nos bolsos dianteiros da calça jeans. Olhou para o lado, mas logo voltou a me encarar pelo espelho.
— Eu posso ser seu amigo, mas eu jamais mentiria para você. Você está linda. Ou melhor, você é linda e nem se dá conta disso — se aproximou e retirou as mãos dos bolsos, apoiando-as na região próxima aos meus ombros. Deu leves apertos por ali, me fazendo relaxar os ombros. — Suas cicatrizes não são um problema, o problema está em você achar que elas fazem diferença. Além do mais, elas servem para te lembrar de que você é uma sobrevivente, mesmo que seja uma lembrança um tanto ruim. Ela te fortalece — sorriu fraco e parou de apertar a região onde estava apertando. — Você é uma mulher incrível, lembre-se sempre disso.
Meu coração bombeou mais rápido dentro do peito e notei meu peito subir e descer rapidamente. Minhas mãos estavam tremendo e minhas pernas pareciam que iam ceder a qualquer momento. Meu estômago pareceu congelar e um arrepio atingiu minha espinha de ponta a ponta. Tentei sorrir espontaneamente, mas falhei, o que o fez rir um pouco.
tirou uma caixinha pequena do bolso da calça e a abriu revelando um colar. Abri um sorriso e tampei a boca com as mãos. Ele o colocou em meu pescoço e sorriu. O pingente era de coração e carregava várias pedrinhas brilhantes, o que me deixou encantada.
— Uau — coloquei a mão sob o pingente. — É muito lindo. Uau. De onde você tirou isso? — sorri.
— É presente, . Geralmente não revelamos essas coisas — puxou um riso de lado.
Girei os calcanhares e fiquei de frente para ele.
— Obrigada. É lindo.
Me aproximei um pouco mais e passei meus braços pelo seu tronco. Deitei a cabeça em seu peito e ele afagou meus cabelos. Me senti segura. Me senti bem. Me senti única. Era tão bom estar em um lugar que trazia as melhores sensações possíveis. O cheiro dele era viciante e eu me permiti senti-lo o máximo possível.
Afastei um pouco a cabeça de seu tórax apenas para olhar em seus olhos. Mas acabei encarando seus lábios. Sem pensar muito, depositei um selinho ali e o tempo pareceu congelar, da mesma forma que flashes embaçados invadiram minha mente. segurou meus ombros e me afastou um pouco mais. Seu semblante era confuso, e eu me senti estranha.
— Desculpa. Eu... Desc... — fui calada com um beijo.
Seus lábios tocaram os meus de volta e eu levei os braços em torno de seu pescoço. me abraçou pela cintura e meu corpo se curvou para trás por conta da força que ele direcionou para frente. Suas mãos desceram mais um pouco e agarraram minhas coxas. Meus pés saíram do chão e minhas pernas rodearam a cintura dele, num ato desesperado. O nosso beijo passou de delicado para algo além do inocente. Senti minha respiração falhar em alguns momentos, mas não atrapalhou em nada nosso momento. Sua língua em contato com a minha faziam as coisas pegarem fogo e eu estava gostando da sensação que estava sentindo. Seria luxúria? Desejo? Ou apenas vontade? Talvez fossem três em um, ocasionando em meu pecado favorito.
Ele caminhou comigo até certo ponto e me deitou na cama, ficando em cima de mim. Meus dedos passeavam entre seus fios de cabelo e as mãos dele acariciaram minha barriga por baixo do vestido. Soltei um suspiro abafado por sentir arrepios e sorri no meio do beijo. Ele parou tudo o que estava fazendo apenas para me encarar e perguntar:
— Tem certeza? — procurou sinceridade em meus olhos. — Eu posso esperar até que esteja pronta.
— Tenho certeza!
Eu queria aquilo tanto quanto ele, e fazia um bocado de tempo. A ligação entre a gente era perceptível e muito indescritível. E eu queria fazer aquilo com ele! Aqueles olhos me tiravam o fôlego e aquele sorriso me fazia perder noção das coisas. Aqueles lábios estavam me levando à loucura. Aquele homem era o meu paraíso!
Puxou meu lábio inferior com os dentes e eu fechei os olhos. Passou para o meu pescoço e subiu para o lóbulo da minha orelha. Soltei um gemido abafado e escutei um riso sair de seus lábios. Puxou meu vestido para cima e eu fiquei apenas de calcinha, pois estava sem sutiã. Seus olhos estavam vidrados em mim e suas pupilas dilataram no momento.
— Você é perfeita! — comentou, aproximando do meu ouvido.
Desceu até meus seios e distribuiu beijos por toda a extensão do meu colo. Arqueei as costas involuntariamente e agarrei seus cabelos. Sua boca quente encontrou o bico do meu seio e o mordiscou de leve, roçando os dentes vagarosamente, me levando à loucura. Abaixei os olhos para ver o que ele estava fazendo e ele fez movimentos circulares com a língua em volta da aréola. Seus olhos cravaram-se nos meus e todos os meus pelos enrijeceram. Mordi o lábio inferior com força e ele passou a ponta da língua mais uma vez no bico enrijecido. Minha boca entreaberta permitiu um gemido sair alto e meus olhos se fecharam enquanto joguei minha cabeça um pouco para trás.
Ele abocanhou o seio esquerdo enquanto passava a mão pelo direito. Passou os beijos para a minha barriga e parou na bainha da minha calcinha. Ficou de joelhos na cama e eu o ajudei a tirar toda a sua roupa. Antes que eu tirasse sua cueca, notei o quão excitado ele estava. Puxei o pano para baixo deixando à mostra de uma vez por todas seu pênis totalmente ereto. Levei as mãos até ele e o apertei com uma força considerável, escutando um gemido sair de sua garganta. Fiz alguns movimentos e ele me parou, pediu para que eu deitasse e eu o fiz. Puxou minha calcinha vagarosamente para baixo e seus olhos brilharam. Se ajeitou no meio das minhas pernas e espalhou beijos pelas minhas coxas, até chegar onde queria. Sua respiração bateu em minha intimidade e mesmo que nada tivesse acontecido ainda, eu prendi a respiração, mordendo com força total meu lábio inferior. Sua língua tocou suavemente parte por parte da minha intimidade e eu estava delirando já. Senti seus dedos passarem para cima e para baixo, apenas para certificar-se de que eu estava lubrificada.
buscou por uma camisinha na gaveta do criado mudo e abriu a embalagem jogando-a em qualquer canto. Vestiu a proteção e se ajeitou entre minhas pernas. Tocou meus lábios com os seus novamente e forçou um pouco sua intimidade para dentro da minha. Fechei os olhos com força e finquei as unhas em suas costas. Ele afastou nossos lábios e olhou um pouco para baixo. Forçou mais um pouco e eu senti uma ardência incomodar minha região.
— Tá doendo? — perguntou, embargado de prazer.
— Ãrrã.
— Quer que eu pare? — pareceu preocupado.
— Não — adverti. — Só vamos com calma.
Ele concordou e sorriu. Mais umas investidas lentas e toda a ardência foi desaparecendo, dando lugar a uma sensação gostosa. Os movimentos se tornaram mais rápidos e eu não estava mais respondendo por mim. Estava totalmente entregue e à mercê de todo o prazer. entrelaçou os dedos pelos meus cabelos e o puxou um pouco para trás. Uma onda de calor subiu e desceu pela minha espinha, passando a sensação para a minha barriga, descendo até a minha intimidade. Ele acelerou os movimentos e eu gemi mais alto do que já estava, levantei o tronco e puxei ainda mais sua pélvis até mim. Minha respiração perdeu o ritmo e meus olhos viraram-se para cima. Minhas pernas começaram a tremer e cederam na cama. Tinha chegado ao meu ápice. A sensação de prazer durou coisa de segundos, mas pareceram horas, e eu queria sentir mais daquilo. grunhiu alto e foi desacelerando os movimentos, dando leves investidas até parar de vez. Saiu de dentro de mim e se jogou ao meu lado, respirando descompassadamente.
— Uau — comecei a rir por estar entorpecida ainda. — Uau!
— Uau mesmo — disse, entrecortado por tentar rir e respirar ao mesmo tempo.
Virou o corpo na cama e depositou um beijo no meu pescoço. Tirou a camisinha e a amarrou para jogar fora.
— Eu acho que era...
— Virgem? — me cortou.
— É.
— Tenho certeza disso — sorriu e depositou um selinho em meus lábios.
— O que é isso? Quero dizer... O que nós somos?
— Também não sei. Mas podemos descobrir juntos.
Alarguei os lábios num sorriso e ele mirou meus olhos.
— Eu topo.



Capítulo 06 - Parte I

’s Voice:

Optei por não usar vestido. Coloquei um body underwear branco todo trabalhado na renda que ressaltou meus seios. O short jeans preto era cós alto e completei colocando um cinto fino – apenas para dar charme, o que marcou minha cintura. Achei viável colocar um kimono por cima e o fiz, deixando-o aberto. As botas nos pés com certeza eram mil vezes mais confortáveis do que saltos. Ajeitei o cabelo num rabo de cavalo desajeitado e passei uma maquiagem suave. Esborrifei o perfume nos pontos que mais gostava e peguei uma bolsa pequena.
O relógio bateu na casa das onze e eu escutei o me chamando da sala. Apressei o passo e fui até ele. Estava de costas mexendo no celular e virou, provavelmente porque ouviu meus passos.
— Caraca, você levou u... — parou de falar assim que me viu. — Caralho. Opa. Quero dizer: Caramba. Você está linda — sua expressão era a melhor.
— Estou, não? — girei nos calcanhares e fiz uma pose em seguida, arrancando um riso dele.
Se aproximou e passou as mãos pela minha cintura. Encostou os lábios nos meus e logo me encarou.
— Você sempre está.
Senti minhas bochechas queimarem e meu estômago remexeu. O olhei de cima a baixo e lancei um olhar sedutor para ele.
— Gostei da jaqueta — eu disse. — E também da calça. Na verdade, gostei do conjunto todo — mexi as mãos. — Principalmente do homem embaixo de tudo isso.
Ele abriu um sorriso de orelha a orelha e demonstrou vergonha.
Lembrei de horas mais cedo. Nós dois. Nus na cama. Criando mais intimidade. Oferecendo prazer intenso. Repetindo a dose – acho que havia viciado naquela droga. Tomamos banho juntos e eu não lembrava de ter sentido sensações tão boas desde então. Deu até tempo de tirarmos um cochilo para aproveitarmos a festa. Eu estava me sentindo nas nuvens e não queria sair dela de jeito nenhum.
usava uma calça jeans surrada, uma blusa também branca – só que lisa e estava sendo um pouco tampada por uma jaqueta vinho. O colar em seu pescoço estava dando um charme. Nos pés apenas um tênis. O cheiro que ele emanava era cítrico com uma mistura diferente, lembrava limão, porém também lembrava algo amadeirado.
— Precisamos ir. O Tom já me ligou umas cinco vezes.
— Tá.
Entrelaçou os dedos nos meus e meu coração acelerou. Batemos à porta assim que saímos e seguimos até seu carro.
Demoramos um pouco até chegarmos no endereço certo, já que havíamos errado o caminho pelo menos umas três vezes. Eu sempre considerei erros um aviso – depende também, mas quando algo dá errado mais de duas vezes, eu paro e penso se aquilo é realmente uma boa ideia. Confesso que estava animada para curtir com eles, mas algo dentro de mim estava me bloqueando de uma forma que não estava me permitindo ficar de boa. perguntou se estava tudo bem e eu disse que sim. Ele não pareceu acreditar muito, pois parecia me conhecer como a palma da mão dele.
Estacionou numa vaga e descemos seguindo em direção a tal festa. Era possível ouvir a música do outro lado da rua. Na porta haviam pessoas pintando outras e era possível ver algumas perucas parecendo neon. Chegado a nossa vez, perguntaram se queríamos ser pintados também e topamos na hora. Fizeram uns rabiscos em meu rosto e depois fizeram o mesmo com o . Ao passar da porta para dentro, as tintas se tornaram fluorescentes e eu achei um máximo de irado. Virei o corpo na direção do e comecei a rir.
— O quê? O que foi?
— Acho que fizeram uma caveira no seu rosto. Uau!
— Não está tão ruim, está?
— Está incrível. O que fizeram em mim? — quis saber.
— Tem várias coisas e eu não sei dizer o que é o que. Digo, acho que não é um desenho em si, tá mais pra arte mesmo — pensou mais um pouco. — Tem três riscos de cada lado da sua bochecha e várias bolinhas do início ao fim de cada sobrancelha. Ãn... também têm um risco no seu nariz. Tá fofo.
Descemos uns degraus de escada e passamos pelo meio da multidão que dançava agitada. Chegamos em um canto mais tranquilo e ele tirou o celular do bolso para ligar para o Tom.
— Aonde você está? — gritou, tampando um dos ouvidos. Fez sinal com a cabeça para mim e saiu andando na minha frente. Segurei em sua jaqueta e o segui.
Avistamos o Tom e ele ergueu a mão para que localizássemos melhor, e ambos desligaram o celular.
— E aí, cara — ele disse, fazendo um toque de mão com o . — Achei que vocês não fossem mais vir — virou-se para mim. — Oi, — cumprimentou com um beijo no rosto.
— Oi, Tom — sorri para ele, num gesto amigável.
A cada minuto que passava, o lugar parecia encher mais e mais. Fomos os três para o meio do pessoal e começamos a dançar. O estava com um copo de bebida em mãos, sendo acompanhado pelo Tom, enquanto eu optei por não beber. Conforme pulávamos, consegui sentir o suor descer pelo meio do meu seio, até porque mesmo com ar condicionado, ainda estava abafado – calor humano que fala, não é?
se aproximou de mim e juntou nossos corpos. Rodeei seu pescoço com meus braços e dançamos juntos, ainda que a música fosse agitada. Fui de encontro ao seus lábios e ele veio de encontro aos meus. Nos beijávamos como se não tivesse ninguém por perto e sequer nos importamos se alguém estava olhando torto ou não, até porque estávamos ocupados demais aproveitando o nosso momento.
— Eu vou buscar uma bebida pra mim. Você não quer mesmo? — disse, após se afastar por ter ficado sem ar.
— Eu vou aceitar dessa vez.
— Tá — me deu um selinho rápido. — Vai lá com o Tom — apontou para o homem sentado no banco próximo a parede.
Me aproximei do homem e sentei ao seu lado, abanando meu pescoço e nuca, enquanto assoprava discretamente para o meio do meu seio. Olhei para o lado e Tom estava rindo.
— Se eu soubesse que ia fazer tanto calor aqui dentro, nem tinha vindo de kimono.
— É que lá fora está gelado.
— Exatamente isso.
Ficamos em silêncio por alguns segundos, apenas deixando a música chegar até nossos ouvidos. Ouvi um ruído vir do Tom e o encarei. Ele abriu a boca para dizer algo e desistiu em seguida. Me encarou de um jeito estranho e eu senti meu corpo tremer, mas não era um tremor dos bons.
— O quê? — sorri sem graça. — Borrou a tinta? — apontei para o meu rosto.
— Não. Não é isso. É que... vai soar muito estranho isso aqui, mas eu preciso fazer algo.
— Você é um psicopata?
Ele franziu a testa e gargalhou, fazendo uma careta logo após.
— O quê? Não, . Meu Deus. Claro que não.
— Até porque se você fosse, você não iria falar.
— Meu Deus, não. De onde você tirou isso? — riu mais um pouco.
— Sei lá, cara. Você está me encarando com esse olhar estranho. Fiquei assustada. Vai saber.
— Eu não sou um psicopata — foi perdendo o riso. — Uma pergunta aleatória: Você acredita em anjos?


Capítulo 06 - Parte II

’s Voice:

Eu não fazia ideia onde ele queria chegar com aquele bafafá todo, mas decidi dar uma chance pra ver no que iria dar.
— Anjos tipo... anjos de verdade?
— Sim.
— Em ficção científica, talvez. De verdade, acho que não.
Ele pareceu pensar no assunto.
— Por que a pergunta? — fiquei curiosa.
— E se eu disser que eles existem?
O encarei e comecei a rir. Ele continuou sério, acompanhando todos os meus movimentos.
— Provavelmente você deve estar alucinando. Te deram alguma droga aqui dentro? Já viu na sua bebida?
Ele revirou os olhos.
— É sério, .
— Corta essa. Não mesmo. Jamais.
— E se eu provar pra você? — diminui a intensidade do riso e engoli seco.
Eu não disse nada, apenas o encarei atônita. Tom olhou de um lado para o outro e chegou mais perto, me fazendo arrastar o banco um pouco para trás.
— Você está me assustando. Cadê o ? — levantei o pescoço para procurar no meio da multidão, falhando miseravelmente.
— Não precisa ter medo de mim, sério. Eu não seria capaz de relar um dedo em você nem em ninguém. Pode acreditar.
Àquela altura meu coração já estava quase na garganta e minhas mãos estavam suando mais que o normal. Relaxei os ombros e voltei o banco até onde estava. Tom sorriu fraco e olhou mais uma vez para os lados.
— Promete não sair daqui?
— Não prometo nada.
, eu estou tentando te mostrar algo e preciso que jure lealdade para que eu possa seguir adiante com tudo que tenho para te dizer.
Respirei fundo e balancei a cabeça.
— Tá. Tá bom — comecei balançar as pernas freneticamente.
Tom inclinou o corpo para frente e ficou a poucos metros de mim. Fechou os olhos e respirou fundo. Abriu-os vagarosamente e eu dei um pulo do banco ficando em pé.
— Uow. Uow. Uow. Que porra é essa? — apontei com o dedo.
Seus globos oculares estavam brancos cintilante, pareciam uma luz extremamente forte. E eu fiquei apavorada. Tom os fechou tão rápido que quando os abriu novamente, eles estavam normais.
— Como você fez isso? Que merda foi essa, Thomáz?
— Shhh. Eu disse pra você não surtar — pegou em minha mão e me puxou para o banco.
— Como não surtar, cara? Os seus olhos ficaram brancos. Quem faz isso?
— Anjos! — disse, apenas.
— Isso é tudo, menos coisa de anjo. São lentes? Fez pacto?
Soltou um riso nervoso e balançou a cabeça.
— Anjos existem, . E eu preciso te contar algumas coisas.
— Como assim? — me ajeitei no banco e cruzei as pernas.
— Eu não sou o único aqui.
— É o quê? Para de zoar com a minha cara. Essas coisas não tem graça. Ainda quero saber como você fez isso nos olhos.
Tom bufou e levantou. Pediu para que eu o seguisse até o lado de fora e eu neguei imediatamente. Ele alegou que eu poderia confiar nele e eu joguei que gente louca fazia o mesmo. Ele riu e eu não. Depois de muito insistir, ele perguntou se poderíamos ir até o fundo do salão pelo menos – onde poucas pessoas estavam, e aparentemente eram os chapados em droga e álcool. Segui seus passos e paramos próximos a uma escada quase toda destruída. Os chapados nem pareceram notar nossa presença, mas permaneci atenta.
— Fica aí — me parou.
— Se acontecer algo ruim, Tom. Olha… Estou avisando, te dou uns murros — mexi as mãos e ele gargalhou.
— Para com isso — disse, entre risos. — Nada vai acontecer.

— Temos que voltar logo, senão o não acha a gente — cruzei os braços.
Nem deu ouvidos para o que eu disse e perguntou:
— Preparada?
Vendo que eu fiz cara de poucos amigos, mexeu o pescoço de um lado para o outro e chacoalhou os braços. Revirei os olhos e bufei. Tom respirou fundo e abaixou um pouco a cabeça. Arregalei os olhos quando vi a sombra atrás dele. Levei a mão até a boca, totalmente indignada com aquela aparição. Asas imensas refletiram na parede e eu procurei seu olhar.
— Isso são... Caraca. Isso são asas? — gritei, apontando para trás dele, enquanto ria de nervoso.
E elas sumiram de uma vez.
— Agora você acredita? — andou até onde eu estava. — Eu não sou o único por aqui — quase sussurrou.
Demos a meia volta e eu não soube dizer uma palavra, mesmo com ele tagarelando ao meu lado.
— Ãn... Tom?
— Sim?
— Você disse que não é o único anjo por aqui, certo? Quem são os outros?
Ele parou de andar e consequentemente eu também parei.
— Tem o Mason, o Tuke. Ãn... a Aretha — fez contagem no dedo. — Tem também a Hoo. E você.
Me senti zonza por instantes e meu estômago embrulhou dando uma sensação de ânsia. Tudo pareceu ficar em câmera lenta e girar ao mesmo tempo. Minhas vistas ficaram turvas e escutei a voz de Thomáz bem de longe. Senti minha respiração descompassada e um desespero tomar conta de mim. De repente, tudo voltou ao normal, e eu me peguei rindo enquanto procurava pelo rosto do Tom.
Gargalhei tanto que minha barriga começou a doer. Andei na frente e achei o banco onde estávamos. Sentei e continuei rindo. Senti a presença do homem ao meu lado e o encarei.
— Eu? Um anjo? — ri mais um pouco. — Conta outra. Eu nem acredito que eles existam.
— Você acreditou em mim.
Ele tinha razão sobre aquilo. Duvidei dos olhos, mas as asas não tinham como negar, eram surreais. Fui perdendo a graça e franzi o cenho.
— Por que você está me contando só agora?
— Porque eu recebo ordens! — piscou um dos olhos. — Ãn... Você anda tendo sonhos estranhos ou ouvindo coisas que não entende?
Arregalei os olhos.
— Como você sabe disso?
— Isso se chama conexão com o céu. Você ainda tem, mas não lhe é permitido ter uma gota sequer de entendimento. Por algum acaso você parou pra se perguntar de onde vieram esses dois cortes nas suas costas?
— Nunca.
— Asas arrancadas — disse, neutro, como se fosse nada.
— Quê? Para. Isso é ridículo. Eu saberia se eu fosse um, afinal, você sabe.
— Anjos caídos não sabem.
Quê? Eu sou um anjo caído? — ele balançou a cabeça. — Mas o que eu fiz? Quero dizer... Por que eu sou um anjo caído?
— Bom... você se apaixonou.
— Por quem? — quase gritei.
— Pelo .
— Cala essa boca, Tom. Quem te pagou pra fazer essa brincadeira sem graça?
— Antes fosse brincadeira. O que você sente quando olha pra ele? — apontou na direção do bar e eu segui seu dedo.
estava sentado esperando algo, provavelmente era bebida e eu sorri involuntariamente. Meu estômago pareceu gelar e minhas pernas ficaram bambas – mesmo que eu estivesse sentada, passando a sensação para todo o meu corpo. Meu coração batia tão rápido que eu suspeitei de ter uma taquicardia. Meu ar também pareceu quase sumir e o mundo pareceu parar. Senti como se fosse apenas nós dois e nada mais importasse. Eu sentia algo bom ao olhar para ele, principalmente quando ele sorria e seus olhos quase fechavam. Eu amava observar cada traço dele, e me peguei fazendo isso nesse exato momento.
— Eu não sei dizer — disse, mas continuei olhando na direção dele. — Mas é bom.
— Isso tem um nome e sabemos qual é.
Voltei os olhos para o Tom e engoli seco.
Essa é a sensação de se apaixonar?


Capítulo 06 - Parte III

’s Voice:

Thomáz lançou um sorriso presunçoso e cruzou os braços. Ergueu uma das sobrancelhas e me encarou como quem diz: eu avisei.
— Com certeza essa é a sensação.
— Droga! — senti meus olhos arderem, mas não sabia o motivo. Talvez fosse medo do que pudesse vir a seguir. — Eu não lembro de nada.
— Nenhum anjo caído lembra da vida anterior. Deus não permiti que isso aconteça. Você fez uma escolha e tecnicamente escolheu uma outra vida. Não seria necessário ter outra em mente.
— Mas por que isso? Se eu sou mesmo um de vocês, eu caí por causa do amor? — ele chacoalhou a cabeça e formou uma linha dura entre os lábios. — Eu não entendo. Se Deus prega amor, não deveria me expulsar por isso. Não faz sentido.
— Até que faz. Você escolheu a Terra invés do Céu.
— Mas Ele fez tudo aqui — abri os braços.
— Foi dada uma missão a você e você desandou por causa dela. Quero dizer... você conversou com nosso Pai e confessou querer viver aqui, no meio dos meros mortais. Foi você quem renunciou a sua vida no Reino. Não O culpe por uma decisão que foi sua, Heaven.
— Eu renunciei? Eu jamais teria feito isso! E quem é Heaven?
— Acredite, você fez. E fez pelo . Você era o anjo da guarda dele e se apaixonou por ele. Deus permitiu que Ele te visse para que você ajudasse de uma melhor forma, mas não funcionou muito bem. E ah, seu nome não é , é Heaven. Na verdade, seu nome celestial é esse.
— Ai. Meu. Deus. Eu sabia que essa sensação de conhecer o rosto dele não era à toa. E eu tenho um nome celestial?
— Tem, mas já não pode usá-lo mais, entende? Você caiu — ergueu e abaixou os ombros. — Porém, o Pai pediu para que eu viesse pessoalmente ver como você está. Mesmo com tudo, Ele te ama e se preocupa com você. Você era uma das melhores.
— Como você sabe de tudo isso?
— As conversas correm no céu — piscou.
— Achei que anjos não fofocassem — eu quis rir.
— Até minutos atrás você não acreditava na nossa existência. Então… — ergueu e abaixou os ombros. — Mas enfim, agora que você já está a par de tudo, espero que tenha desfeito o nó que carregava dentro da cabeça. E embora eu tenha te contado, pode ser que suma de novo, decisão dEle.
— Ou seja, eu posso esquecer isso aqui também?
— Bingo!
— Qual é? Eu já não lembro de nada e ainda posso esquecer a única coisa que me trouxe respostas?
— Escolhas, baby Heaven. Escolhas.
Olhei em direção ao bar e o não estava mais lá. Tom disse que ia procurar por ele e de lá iria embora.
— Obrigada por tudo isso, Tom. Me sinto estranha, sabe? Muita coisa para assimilar, mas obrigada mesmo — forcei os lábios e sorri, terna.
— Disponha — deu um beijo no meu rosto e saiu, se infiltrando no meio da multidão.
Minutos depois, o apareceu bufando e extremamente estressado. Jogou-se no banco ao meu lado e eu o encarei. Fiquei longos segundos olhando para ele na esperança de ter alguma revelação celestial ou conseguir lembrar algo, mas nada me veio à memória.
— O que foi? — perguntei. — Por que você demorou tanto?
— A fila do banheiro estava imensa, desisti de esperar e fui pegar bebida, aí vi que a fila estava mediana e decidi enfrentar, mas ainda assim demorou para um caralho. Até esqueci de passar no bar de novo.
Tudo o que ele havia dito tinha entrado por um ouvido e saído por outro. Eu senti vontade de chorar e não sabia se era de alegria ou porque deu vontade mesmo. Porém, se tudo o que o Tom tinha me dito fosse realmente verdade, eu tinha deixado uma vida inteira para trás só para viver ao lado do cara mais companheiro que já vi. Ele olhou para mim e eu entendi o motivo de tudo. Eu estava apaixonada por ele. Até mais do que isso. Eu não sabia definir se o renunciamento seria relevante a longo prazo, mas naquele momento, onde eu tinha aqueles olhos fixados em mim e os lábios curvados em um riso, eu soube que tinha valido a pena, ainda que não lembrasse de nada. E eu daria de tudo para saber como tínhamos sido há tempos, mas me contentava com o pouco que tínhamos.
— O que foi? — perguntou de uma forma carinhosa.
— Você é o homem da minha vida, .
Ele fechou os lábios e sorriu assim mesmo. Ergueu o tronco e encostou os lábios nos meus. Segurei seu rosto com as mãos e lhe dei vários selinhos seguidamente, retribuindo o beijo que me dera antes.
— Você é a mulher da minha vida! — sussurrou em meus lábios.

“Anywhere, anywhere
Anywhere you go
Anywhere you go
Round the Universe
I'll be there, I'll be there
Wherever you go, wherever you go, babe”


— Eu sabia que precisava de você desde o momento que te vi naquela rua. Eu não sei explicar como, mas eu soube e senti a necessidade de te proteger. De algum modo você me completa e eu nunca senti coisas da forma que eu sinto com você e por você — ele disse, sereno. — Eu não sei o que temos, mas seja o que for, é bom e eu me contento com isso. Me contento em ter você ao meu lado desse jeito. Lembra quando a gente conversou sobre eu ter tido problemas antes de te conhecer e já estar bem a respeito daquilo? — balancei a cabeça. — Então, tive medo de ter recaídas, mas em você vi uma saída. Um apoio do qual não tinha. Alguém que eu pudesse contar verdadeiramente. Encontrei alguém por quem vale a pena fazer esforços e entregar o que eu tanto tinha medo: meus sentimentos. Se eu tiver você, faço qualquer coisa e vou para qualquer lugar sem pestanejar. Então sim, você é a mulher da minha vida.

“And it's my place now, if I got you”


— Meu lugar é onde você está! — eu disse. Senti poças se formarem em meus olhos e algumas caírem.
Tinha sim valido a pena entregar tudo por uma pessoa. Tinha sim valido a pena não olhar para trás pra viver a vida na Terra. E eu iria aproveitar da melhor maneira, porque ao lado dele, tudo se tornava melhor.
— Ãn, ... Eu descobri umas coisas sobre mim — eu disse, temerosa.
Enxerguei curiosidade em seus olhos, mas logo ele desviou para um ponto e voltou-se para mim.
— Sinceramente? Eu não quero saber sobre isso. Não me importo com o que você tenha feito ou deixado de fazer. Prefiro viver o agora, porque estamos juntos.

“I don't care, I don't care
Wherever you been
Cause now you with me
Floating through the night”


Se o que eu estava sentindo fosse realmente paixão, eu queria sentir aquilo pelo resto da minha vida, contanto que o estivesse ao meu lado para partilhamos do mesmo sentimento. Eu queria mais da gente e sabia que ele também. Ele me puxou para mais perto e apertou minha cintura. Selei nossos lábios num beijo fervoroso e soube que ali era meu lugar. Com ele e só com ele.
— Vamos dar o fora daqui — levantou e estendeu a mão para mim. Eu a segurei e ele passou o braço por cima dos meus ombros, levando-me para mais perto dele. Seu cheiro invadiu meu nariz e eu sorri.
— A noite é nossa — comentei, próxima de seu ouvido e ele riu.
Encostou o lábio no meu lóbulo e eu senti meus pelos erguerem de uma vez.
Feels like we're dancing. Is this the feeling? The feeling of falling in love? Cause I know that we met before, babe — cantarolou.
— Que música é essa?
— Ah, algo novo do qual estou trabalhando. Mas, já adianto que será dedicada a você.
O olhei pelo canto dos olhos e vislumbrei o sorriso de orelha a orelha que ele me retornava. Era bom demais sentir reciprocidade. E eu trocaria toda e qualquer vida por essa na Terra.
Aqui é definitivamente o meu lugar!




Fim!



Nota da autora: sem nota.

Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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