Finalizada em 21/08/2021

Alerta de gatilho, a fanfic aborda tema como suicídio. Caso não se sinta confortável sobre o assunto, aconselho que a história não seja lida.

Capítulo Único

Tão longe o sonho de se ver sendo alguém que realmente se encontrou, era assim que se sentia. Dentre os tantos trabalhos de meio período que se dividia, suas energias eram drenadas.

Tudo que ela queria era estudar.
Tudo que ela queria era trabalhar em apenas um trabalho.
Tudo que ela queria era conseguir respirar de verdade.

Foi por isso que foi até a ponte naquele dia.

Ela estava exausta, o dia estava cinza e chuvoso, assim como seu coração a anos, mas ela foi a seu último destino do dia no final da tarde, onde o sol sequer quis mostrar seus raios brilhantes para guiar seus passos que, a esse ponto, trilhavam rotas conhecidas e desesperadas escuridão adentro. Mesmo depois de ter dormido por uma hora no fundo da loja anterior, seu coração ainda parecia pesado.

Sonhos, eles nos iludem ou nos dão esperanças?

Esperanças demais as vezes, era sonhadora, ela sempre quis seguir os seus próprios passos, viver bem, trabalhar com o que amava, ela sempre quis escrever. Mas, parece que não tinha uma caneta mágica que fizesse com que as histórias extraordinárias que criava fossem verdade em sua vida, ou, que fizessem com que sua vida valesse a pena.

A realidade era que por muito tempo ela sabia que só estava viva, porque não se permitia morrer. Viver havia se tornado uma obrigação com o tempo, pelo menos desde que se deu conta que perdeu a família que tanto apreciou.

A verdade era que, desde que havia ficado sozinha nesse mundo, sua alma havia partido junto, ou, pelo menos era isso que ela sentia. Se esforçava para sobreviver nesse mundo cheio de pessoas que sequer mereciam o que tinham, e ainda sim, nada parecia ser suficiente.

Por isso seus passos eram descuidados.

Ela teve suas épocas, seus estágios. Seus passos já foram raivosos, já foram tristes, já até chegaram a ser leves, por pouco tempo. Mas de uns meses para cá, talvez anos, eles eram apenas descuidados, despreocupados com uma queda ou qualquer outra coisa, ela já não ligava mais para o que supostamente poderia acontecer.

Ela sequer se lembrava quem costumava ser antes dos seus quinze anos.

Com vinte e três sua identidade havia desaparecido, ela não sabia mais quem era.

Foi por isso que foi até a ponte naquele dia.


De início, era apenas para olhar a água passando abaixo, mas seus pensamentos pesaram, olhando para aquela água ela sentiu seus próprios pulmões encherem. Sua respiração não saia, mas ainda assim seus pulmões faziam o movimento como se estivessem trabalhando normalmente.

Qual era o problema dela? Quais pecados ela estava pagando para sentir tal dor? Ela não sabia. Cada vez que sentia as lágrimas passarem por toda a extensão de seu rosto, elas pareciam queimar.

Ouviu tantas coisas como “você deveria apenas fazer o que os outros te dizem” “você deveria tentar entrar em uma faculdade” “música não vai te dar um futuro” “você sequer tem como se sustentar, tente procurar um emprego, viver de favor não é legal” que acatou cada uma delas, ela queria realmente estudar, até havia conseguido, mas, depois de ter que se mudar da casa onde vivia, para um quarto minúsculo onde tinha que pagar pelo aluguel, ela não conseguiu mais, viver sozinha era duro quando teve que se criar sozinha.

Ela não via perspectiva.

Por isso, seus pulmões trabalhavam, mas nenhum ar saia, porque ela estava sufocada.

— E se eu não tiver mais motivos para realmente querer continuar? — ela disse depois de pegar o telefone que tinha ali perto do parapeito da ponte, justamente para esses tipos de ocasiões.
— Você deve pensar que seus planos podem não ser o que realmente deve acontecer, você veio ao mundo por um motivo — ela ouviu do outro lado da linha.
— Eu não consigo respirar — ela falou sufocada com o próprio ar, ainda chorando.

Com a visão turva, ela viu uma pessoa perto dela, camisa negra, boné escondendo seu rosto e desfocado por suas lágrimas, “Você consegue, eu estou aqui agora” foi a última coisa que ela realmente escutou enquanto sentia o toque quente e eletrizante de suas mãos, antes de acordar no hospital horas depois.

— Como está se sentindo, senhorita Park? — ainda com a visão turva, escutou uma voz vinda da porta.

A figura alta e elegante usava um jaleco branco que descia até o meio de suas pernas, sua expressão era vazia ou fria, não soube distinguir. Ele trazia um dourado óculos de grau em seu rosto junto de uma prancheta nas mãos e atrás dele, algumas pessoas a olhavam curiosas. Algumas com suas expressões cansadas, outras tediosas e uma muito mais intrigante do que deveria ser.

Todos estavam vestidos com uniforme cirúrgicos e seus jalecos brancos, também com pranchetas em mãos, a expressão divertida no rosto daquele que estava mais distante de todos, chamava sua atenção. Ela sentia que o conhecia de alguma forma, mas, era como se sua mente não quisesse se esforçar o suficiente para se lembrar de onde ou como.

A voz e a proximidade do doutor

— Algum sintoma? — ele disse analisando a dosagem do remédio que estava conectado a sua veia.
— Dor de cabeça — ela disse depois de alguns minutos em silêncio, afinal, ainda se perguntava como havia parado ali — como — ela deixou a frase morrer ali, respirou fundo e recuperou sua força para falar — como vim parar aqui?
— O senhor a trouxe ontem pela noite — o doutor disse aumentando a dosagem do soro que também tomava — a senhorita estava muito desnutrida e seu corpo estava colapsando de exaustão — ele não continuou, se falasse mais alguma coisa será totalmente antiprofissional de sua parte — mas graças ao senhor que a encontrou em meio a uma forte e perigosa chuva, a senhorita pode ser socorrida.
— Senhor ? — ela perguntou confusa, não se lembrava de nada precisamente além da figura que vestia preto à sua frente — ah, deve ser ele — ela disse para si mesma — onde ele está? Necessito agradecê-lo, preciso ir trabalhar.

O doutor olhou para um dos rostos ao fundo daqueles que observavam a cena mas ela não notou. Lá estava ele, de início ele havia ido para checar se ela estava bem, estava preocupado e sua mente não deixava com que ele trabalhasse naquele dia sem pensar um minuto sequer naquela cena que havia presenciado. Mas também não queria que ela se sentisse pressionada ou envergonhada de alguma forma por ter passado por uma situação tão extrema. Por isso balançou a cabeça negativamente para o mais velho, implorando com os olhos para que ele não dissesse nada.

A verdade era que ele passou por todo o plantão noturno entre seus atendimentos na emergência e visitas ao quarto em que ela estava, para checar os sinais vitais dela, que queimava em febre desde que ele havia chego com ela desmaiada — e encharcada pela chuva, assim como ele — em seus braços.

Ele realmente entrou em pânico quando a viu naquela ponte, de início sequer a reconheceu, apenas observou de longe, ele havia decidido por alguma razão voltar ao hospital naquela noite caminhando, sentia vontade de olhar tudo a seu redor e pelo mesmo motivo sabia que haviam muitas pessoas que estavam fazendo o mesmo, afinal, era uma noite agradável. Então acabar achando que pudesse ser, apenas mais uma pessoa com o álcool falando mais alto em seu sistema — algo que era comum em sua cultura — acabou sendo seu primeiro pensamento.

Algo que mudou quando a viu pegar o telefone de emergências e principalmente quando ele viu uma de suas mãos nervosamente sendo passada por seus longos fios de cabelo, expondo seu perfil, sua consciência retornou no mesmo momento, porque afinal, ele nunca esqueceria aquele rosto mesmo depois de anos.

— Ele passará mais tarde para vê-la — disse o doutor fazendo com que o mais novo arregalasse os olhos — você precisa passar mais algumas noites aqui em observação por falta de vitaminas, então terá tempo suficiente para agradecê-lo, você tem alguém que gostaria de avisar que está aqui.

Ela odiava perguntas como aquela, nunca tinha alguém, ela poderia ter alguns amigos aqui e ali mas também odiava incomodá-los, odiava se sentir um peso quando eles tinham sua própria vida, ela sentia que não era presa a ninguém além dela mesma nesse mundo. Por isso apenas sacudiu sua cabeça negativamente enquanto seu olhar permanecia nos lençóis sobre si.

— Doutor! — ela o chamou às pressas assim que ele ameaçou levar seus passos até a porta, o que fez com que ele retornasse o olhar de sua prancheta para ela — não posso ficar mais do que hoje aqui.
— Porque? — ele perguntou retirando seus óculos por um momento, odiava pacientes reinos que achavam saber o que era melhor para si.
— Não tenho — ela respirou fundo frustrada — não tenho como pagar e meu plano não cobre um quarto ou tratamento como esse, preciso voltar para o trabalho, talvez eles ainda me aceitem por ter faltado na noite passada e apenas descontam, assim tenho como pagar o que já utilizei até o momento.
— Não é necessário — ele disse colocando seu óculos outra vez, aquilo fez com que o mais novo sorrisse — O doutor tem um certo privilégio nesse hospital, o garoto sequer se formou ainda mas já tem muito mais que alguns por aqui, por isso, sua estadia neste hospital até o final de recuperação já está paga — ele disse respirando fundo — sobre seu emprego, recomendo que converse com eles, realmente não deve deixar esse hospital sem ter se recuperado por completo.

nunca havia contestado médicos antes, ela sabia que era errado por eles terem estudado tantos anos para cuidarem de outras pessoas. Eles sabiam o que era o melhor, mas a esse ponto, ela realmente se importava se estava bem ou não?

Naquele exato momento, não.


Três dias, foram os exatos dias que ela passou naquele quarto e nem um dia sequer saiu dele, uma bolsa de roupas — novas já que ninguém sabia que ela estava ali — foi colocada ali enquanto ela dormia na sua última noite, permitindo que ela usasse roupas diferentes da que havia entrado naquele dia.

nunca apareceu, pelo menos nunca nos momentos em que ela estivesse acordada. O que deixou ela um pouco decepcionada, já que realmente queria ver quem era aquela pessoa que disse que tudo ficaria bem, enquanto seus olhos escureciam da mesma forma que sua alma andava ultimamente.

O sentimento não havia partido mesmo com todo aquele tempo longe de seus inúmeros trabalhos e rotina. Quando voltasse seria tudo da mesma forma que antes, se não fosse pelo detalhe que agora seria uma pessoa desempregada.

— Você já está liberada — a recepcionista disse sorridente, não recebendo o mesmo entusiasmo da garota que trazia uma dor no estômago insuportável desde que havia sido avisada de sua alta.

Ela agradeceu, girou seus calcanhares em direção a saída e olhou para aquela enorme porta de vidro pensando o quanto longe ela estava, caminhando em sua direção.

Havia algum dinheiro guardado com ela e sem pensar duas vezes, sequer ponderou a ideia, apenas aceitou quando surgiu em sua mente.

Ela sairia dali para o bar mais próximo, mesmo sendo duas da tarde, beberia tudo que não bebeu durante toda sua vida e aceitaria que aquele realmente era seu karma, aquele que ela sequer sabia qual era.

Que tipo de preço ela pagava com sua vida? Havia errado tanto em sua vida anterior? Ela sequer acreditava naquilo, mas era uma de suas opções, ninguém sofre de graça.

Tudo era tão longe…

colocou o casaco que havia sido deixado em seu quarto durante a noite junto das outras roupas, ela achou aquele ato algo que poderia aquecer seu coração se ele já não tivesse quebrado em pedaços com o gelo que se havia formado ao redor dele. Ela não se importava com marca ou com nenhum tipo de luxo, uma vida digna e tranquila, talvez até mesmo feliz, era o que sempre havia desejado.

Uma família seria algo que faria isso com seu coração, mas ela nunca encontrou alguém com quem realmente havia pensado em ter uma, sequer tinha tempo para isso. Via seus colegas de escola crescerem de forma tranquila, onde se formavam, encontravam alguém de quem realmente gostavam e criavam uma família, lógico, ela sabia que nem sempre as coisas eram felizes mas pensava, porque todos seguem adiante e ela permanece presa no mesmo lugar?

“Everyone is running but why am I the only one still here?
So far away, if I had a dream
If only I had a flying dream
Don’t fall away, if I had a dream
If only I had a flying dream…”

antes de alcançar a porta lembrou-se como um dejavu, do sonho que tivera na noite anterior.
Ela passava por aquela mesma porta mas por um motivo completamente diferente, trazia um sorriso tranquilo em seu rosto e uma sensação tranquila em seu coração tão pesado. As mãos ocupadas com alguns sacos de papéis com o almoço daquele dia, as pessoas que passavam por ela e a cumprimentavam como se a conhecessem há anos. O casaco era o mesmo que usava ali naquele dia ou, extremamente parecido. A diferença era o pequeno papel em seu bolso que a fez sorrir minutos antes de decidir ir ao hospital naquele meio dia ensolarado.

Lembrava bem daquelas palavras escritas e desejou serem verdadeiras.


“Dream, I will be there for your creation
Until the end of your life
Dream, wherever you might be
It will be lenient
Dream, you will fully bloom
After all the hardships
Dream, your beginnings will seem humble
So prosperous will your future be…”

Independente de quem havia escrito aquelas palavras, a fez feliz. Era como uma prece para que seus sonhos se tornassem a melhor parte de si para o mundo externo. Foi a sensação que seu peito se encheu mesmo depois de já estar desperta, a suposta esperança que aquelas palavras trouxeram como um sinal para seu coração, basicamente faziam com que sua alma implorasse para que houvesse alguém com aquela força para apoiá-la em um futuro que ela só menos achava que teria, porque mais uma vez se lembrou.

Estava viva, porque não podia morrer.

Ela queria sair apenas sair daquele lugar, tomar todos os drinks que nunca experimentou é simplesmente esquecer que aquela era sua vida vazia.

— escutou uma voz não tão estranha assim chamar seu nome, quando ameaçou passar pela porta de saída, junto de uma tosse — digo, paciente , certo?

se virou assim que ouviu seu nome, do canto direito um médico, um pouco mais novo, aparentemente da sua vida vinha com pressa e um mínimo sorriso em seu rosto. Era o mesmo que estava com os outros em seu quarto na primeira noite.

” seu crachá dizia.

” sua mente reproduzia várias e várias vezes enquanto seus olhos encaravam com curiosidade, aquele rosto que se aproximava. Poderia ser ele? Mesmo com tantos ’s naquele hospital?

— Sim — ela disse balançando a cabeça positivamente — sou eu.

Ela já havia ouvido falar naquele nome, não era comum a seus ouvidos mas, também não se lembrava de onde.

— Doutor Park pediu para que checasse como você se sente antes que realmente fosse embora — ele disse coçando a nuca, um forte hábito de quando mentía.

Por algum motivo ela sabia disso.

— Diga a ele que estou bem, minha cabeça deixou de doer depois do remédio desta manhã — ela respondeu.
— Oh! — ele exclamou pela rápida e objetiva resposta, esperava que ela tivesse algo mais a dizer — certo, eu direi a ele.
— Agradeça ao doutor por mim também — ela disse fazendo com que os olhos dele, que estavam em seus sapatos neste momento por procurar algo mais em sua mente para sustentar aquela conversa, subisse aos seus — eu não tive a oportunidade de conhecê-lo enquanto estive aqui, agradeça-o por mim, por favor.

Ela estava sendo sincera, mesmo que fosse aquele que estava diante de si, ela queria mesmo agradecê-lo.

E então sem esperar uma resposta dele, ele a viu sorrir educadamente e dar as costas para ir em direção a porta mais uma vez,

Ele respirou fundo com seu olhar preso nela, não queria que aquela fosse a última vez, ele não entendia, mas depois de vê-la tão vulnerável naquela ponte — em meio a chuva e com pensamentos que não deveriam existir em sua mente naquela idade — ele quis protegê-la de todo mal que aquele mundo havia feito com ela, porque ele se lembrava.


Se lembrava o quão radiante era seu sorriso quando eram crianças.

— Me desculpe perguntar isso mas...— ele a viu se virar outra vez, ficando de frente para ele alguns passos mais afastada — existe alguma chance de já nos conhecermos?

Flashback

First Love

O primeiro amor da vida de havia sido o piano, ele a levava a lugares e momentos incríveis dentro de si.

O primeiro amor de , havia sido a algum ponto de sua vida.

Ambos se conheciam desde que eram crianças, eram vizinhos e de vizinhos passaram a dividir o mesmo espaço na sala de aula sendo colegas de mesa. Eram bons amigos, mas, era alguém muito brilhante para se manter apenas em uma ciclo de amizade, sim, eles iam para a escola juntos, brincavam juntos e conversavam muito, coisas que crianças de doze anos faziam.

Ele entendia porque ela não havia desenvolvido o mesmos tipos de sentimentos que ele, afinal, ela já tinha seu primeiro amor. A música, a arte, aquilo a fazia feliz sem ser obrigada, ela realmente desfrutava daquele momento em que realmente poderia se expressar.

Mal sabia ele que menos de um ano depois de sua mudança, nem mais a música a faria feliz e que ela sequer se lembraria como realmente era rir ou sorrir, como era sentir felicidade.

Se recordar da despedida dela era doloroso, eles nem era tão próximos assim, mas ele chorou por dias e nem um dia sequer se esqueceu de seu rosto, afinal, ela sempre vinha visitá-lo em seus sonhos. Ele se lembra do branco carro que ela estava sentada observando sua casa, se lembrava dos dois camiões de mudança que ajudavam a transportar as coisas, se lembrava de seu pequeno e branco cachorro que olhava desolado para área igual a ela.

Ele se lembra do pequeno beijo triste que ela lhe deu antes de partir, junto de um aceno frouxo.

De alguma forma ele soube que ela não estava sendo feliz como deveria. Ele a procurou por anos, ele nunca encontrou uma pista sequer de onde ela poderia estar, mesmo com o avanço da internet e outros meios de comunicação que tinha contato, ele nunca conseguiu encontrá-la em outro lugar que não fosse em seus sonhos.

Ele soube que era ela e que a conexão deles era mais forte do que o ele imaginava, porque sempre ele a via, de alguma forma ela estava diferente. Era como se crescesse junto dele no sonho, foi assim que ela a reconheceu na ponte, seu perfil era o mesmo, suas pequenas mãos as mesmas e principalmente, ela usava o colar que a anos atrás, o qual ela havia comprado, declarando que “colegas de mesa” deveriam ter algo que os identificassem.

O colar com uma pequena peça de quebra cabeça que se ligava ao dela, andava com ele por todos os lados.

Mesmo que sendo perguntado inúmeras vezes, ele nunca deixou de usá-lo.

Ela também não.

Flashback off

— Já faz um tempo, — ele disse olhando para ela com os olhos cheios de emoções que nunca se foram, enquanto ela, o olhava com os olhos vazios que nunca imaginava ver.
— É realmente você — sua voz denunciava uma emoção curiosa, não sabendo decifrar se era tristeza ou alegria — minha peça de quebra cabeça — ela respirou fundo — a única que me restou.

A verdade era que o ponto de vista de era diferente do que sempre achou.

Ela sempre o observou de longe, sempre fez questão de mantê-lo por perto e quando se mudou — sem saber que sua vida viraria de cabeça para baixo — ela não o esqueceu. Pode ter se esquecido de como seu rosto era mas nunca de seu sorriso, pode ter esquecido de como seu nome era extremamente único — que sequer notou quando leu em seu uniforme — mas ela não esquecia seu conforto.

Seu coração acendeu por alguns segundos, mas os pensamentos pessimistas e exagerados tomaram sua mente, ela quase esqueceu o quão insegura era. Não podia se dar ao luxo de realmente sentir algo bom que fosse perder em breve também, mesmo que não de uma forma trágica.

— Você tem um tempo para mim? — ele perguntou com cuidado, tirando ela de sua imensidão de pensamentos negativos, ela naquele momento, deixou com que algo em suas palavras despertassem como um click dentro de si, realmente havia sido ele — meu turno termina daqui alguns minutos e nos...
— Desculpe, mas eu não preciso da sua pena e não quero te fazer perder mais do seu tempo — ela disse automaticamente ligando seu mecanismo de defesa, saindo pela porta com rapidez em seguida.
— Mas precisa do meu conforto — ele disse seguindo ela com pressa.
— Desculpe — disse chamando ele por seu apelido, fazendo com que seu coração disparasse levemente — mas, não somos mais as mesmas pessoas de antigamente.
— E não precisamos ser — ele disse se aproximando dela — o que aconteceu com você que a fez mudar tanto? A ponto de cogitar algo tão extremo?

Ele não pensou muito quando tocou no assunto, denunciando sua parte na história — mesmo que desconfiasse que a esse ponto ela sabia que ele quem havia ajudado ela naquele dia — ele não queria dizer alto e claro, não queria que ela se sentisse estranha perto dele.

— A vida aconteceu, ! — ela disse tranquila.

Uma chuva que começou e aumentou do nada enquanto ambos saíram para fora deixou a cena mais triste do que deveria ser.

Ele poderia ver a tristeza de seus olhos e sequer sabia distinguir as gotas da chuva das lágrimas da garota que a esse ponto, realmente chorava.

— Ela é boa com alguns mas, ela também pode ser ruim com outros — ela disse deixando um sorriso frouxo e triste escapar de seus lábios — às vezes ela te dá o gostinho da felicidade e em seguida tira tudo de você como se você não merecesse.
— Pelo menos você sabe que merece — ele disse baixo e ela apenas sorriu fraco para ele sem dizer mais nada.

“That’s right, fuck, I live because I can’t die
But I don’t have anything I want to do
I’m in so much pain and loneliness but people around me
Keep telling me to regain my consciousness
I try to vent my anger but I only got myself
So what’s the point of venting my anger
I’m scared to open my eyes everyday and start breathing”

apenas saiu caminhando pela larga calçada do hospital, sem dizer mais nada ou sequer ser seguida por . Ela estava certa que era melhor daquela forma, que ela poderia continuar sua vida, mesmo que nada mudasse, era melhor do que passar pela experiência de inserir alguém próximo em sua vida outra vez e por alguma razão não tê-lo mais, no futuro.

Sua casa era poucas quadras dali, podia andar sem preocupação de que se cansaria mas na realidade estava exausta. Queria objetivos, um futuro brilhante e cheio de surpresas — boas —

— Ela não está aí dentro, deixe a garota em paz, ela pagará no próximo mês — escutou um breve cochicho vindo do terraço onde morava.
— Não, eu já tinha avisado que ela não poderia atrasar esse mês, que já tinha alguém de olho nesse apartamento que poderia pagar sem problemas — a senhora de cara amarrada disse ao filho — vamos, vá a nossa casa e pegue as chaves extras, vou tirar as coisas dessa garota irresponsável para fora, ela atrasou três dias.
— Não será necessário — falou subindo o último degrau da escada, assustando a proprietária e seu filho que olhou com pena a garota encharcada e pálida — eu mesma faço isso — disse naturalmente, de alguma forma já esperava por algo daquilo — estava no hospital, realmente não tenho o dinheiro do aluguel comigo agora, apenas me de um dia para retirar minhas coisas e passar a noite.
— Do que você está falando — o rapaz que tinha mais ou menos a idade de disse preocupado — você sequer tem para onde ir, ela não irá te expulsar, não se preocupe.

A mãe olhou a cena curiosa pelo ato do filho mas não disse nada.

— Não será necessário — ela respondeu seca — amanhã estarei retirando minhas coisas pela manhã.

“Even my friends and family are drifting away
I feel anxious as time passes by
It feels like I’m all by myself
I hope everything disappears when I’m alone
I hope things disappear like mirage
I hope things disappear
I hope my damn self disappears
I’m abandoned like this in the world
In this moment I’m drifting away from the sky
I’m falling…”



Ela e o filho da proprietária eram amigos desde que havia se mudado para o local, eles conversaram muito no princípio mas, aos poucos ficava pior e se afastava de tudo e todos. Não deixando que uma alma viva atravessasse as grandes muralhas que havia construído entre ela e a vida.

Sua casa era pequena e nada especial, mas ainda sim, era o único lugar que ela sentia-se bem e independente. Até mesmo isso estava sendo retirado dela.


— Você vai dormir onde? Na rua? — ele disse inconformado com a teimosia da amiga.
— Ela tem para onde ir — os três ouviram a voz vir da escada, onde um vestido casualmente, já sem seu uniforme de médico que foi substituído por um jeans claro, uma blusa branca junto de uma jaqueta e um boné preto, apareceu — uma casa — ele respirou fundo olhando para a garota.


Os três olhavam para ele, estava surpresa e os outros dois analisavam a cena curiosos.

— Uma casa que sempre esperou pela chegada dela — ele disse para ela.

Vê-la partir daquela forma e meio a chuva foi como uma dor física para ele. Ele não suportou, entrou no hospital todo molhado da chuva que caía lá fora e se direcionou a recepção.

Todos o olhavam curiosos, seus cabelos encharcados caiam em seus olhos, sua respiração estava ofegante e seus passos apressados não deixavam passar despercebidos. Ele pensou em parar na recepção mas sabiam que elas não dariam as respostas que ele precisava, então foi diretamente ao escritório do doutor Park que descansava naquele momento.
Abriu a porta sem nenhum ritual e deu um passo à frente naquele carpete vermelho o molhando com seus pingos d’água.

Doutor Park apenas abriu seus olhos lentamente e sorriu por entender a situação apontando para a prancheta em cima da mesa de centro. Afinal, ele escutou sobre desde que conheceu o pequeno prodígio da faculdade de medicina — quando o mais novo apenas começava o curso de primeiro socorros — ele sabia que um dia aquilo aconteceria, de todas as vezes que eles tentaram encontrá-la e nunca sequer conseguiram. Foi decidido que aquele poder realmente não estava em suas mãos.

No final, quando entrou pela porta de emergência com o olhar extasiado, com ela em seus braços e colocando-a em uma das macas disponíveis mais próximas, revisando seus sinais vitais e reações sem deixar com que mais ninguém interferisse, nem mesmo ele ousou falar algo até que o mais novo comprovasse que ela estava realmente bem e que nada de ruim lhe aconteceria, apenas conseguindo fazer com que o rapaz mudasse suas roupas úmidas algumas horas depois, ele teve certeza, aquela era a pessoa que ele buscou por tanto tempo.

Contando como a encontrou e o que aconteceu quando soube que ela já havia acordado na manhã seguinte, ele pode ver o quanto aqueles dois haviam passado por caminhos diferentes em suas vidas e como precisavam um do outro, ele realmente achava que era destino eles terem se reencontrado naquele ponto de suas vidas.

Por isso, esperou pelo dia.

Desde a mesma manhã em que acordada para sua primeira revisão no hospital, passou seus dados para a ficha, ele deixou a prancheta com as informações da garota ali, para que quando fosse o momento, ele tomasse a coragem que ele teve todos esses anos em buscá-la, para ir atrás dela. Ele conhecia bem aquela criança persistente, o havia criado como um filho dentro daquele hospital, sempre lhe ensinando como as coisas deveriam ser, já era hora dele descobrir sozinho como sua vida seguiria.

sabia daquilo, daquela hora, por isso, parado naquele momento, naquela cobertura vendo a cara exausta que ela trazia tendo que enfrentar cada vez mais coisas que drenassem sua energia, ele soube que era certo, cuidar dela, estar com ela, querer ela. Antes, seus sentimentos podiam ser puramente platônicos por serem crianças, mas todas as vezes que a via em seus sonhos como algum tipo de mágica, ele sabia que aqui já não era algo instável em seu peito.

— ele disse fraco, de forma sentimental — nós acabamos de nos reencontrar, mas para mim, daqui de dentro — ele apontou para seu peito — você nunca partiu, eu te vi todas as noites durante todos esses anos em meus sonhos, mesmo que por segundos — ele suspirou — e acredite, eu tentei seguir a minha vida depois de tanto buscá-la por esse país é até mesmo fora dele e não encontrar um vestígio sequer de você por aí. Eu tentei, mas não consegui — ele disse tirando o boné que usava, ajeitando seu cabelo para trás, nervoso — você sabe como te reconheci naquela ponte?

Ela balançou a cabeça negativamente.

— Você era exatamente a mesma pessoa que foi crescendo nos meus sonhos durante os anos — ele respondeu — era como se você viesse me visitar toda a noite, me implorando para te encontrar mas, isso só aconteceu quando realmente deveria acontecer.

Ele deu alguns passos adiante, caminho na direção da garota.

— E eu não sei se quero te deixar ir mesmo com você tentando me afastar — ele disse.

Uma de suas mãos agarrou a dela que estava livre e apertou com cuidado e ternura, que ao sentir aquele quente vindo dele, fez com que seu corpo se arrepiasse.

— Eu sei que parecesse repentino — ele diz olhando em seus olhos — e que você provavelmente não sente o que eu estou sentindo desde o momento em que te vi naquele dia, mas por favor — ele implorou trazendo-a para um abraço — me deixe cuidar de você, preencher esse vazio que você vem sentindo a anos, ser sua família ou pelo menos alguém que você possa contar, me deixe ser o seu contato de emergência.
— A minha vida é uma bagunça — ela disse baixinho ainda presa em seu abraço — você não tem que tomar para você e cuidar de algo apenas porque sente pena ou responsabilidade.
— Essa é a questão — ele disse deixando um carinho gentil nos fios de cabelo da garota — eu quero, case-se comigo se for preciso — ele disse de repente — ou não, você escolhe seu destino, eu posso ser seu mesmo sem que tenhamos nada oficial. Apenas venha comigo, coma algo que te deixe feliz por ser bom é porque pode, tenha seu próprio quarto, sua própria cama, sua própria casa. Você não precisa passar por tudo que está passando — ele disse suspirando e apertando ela contra si — eu queria ter te encontrado antes, ter ido com você para a faculdade, te dado ânimo para continuar e nunca ter pensamentos como aquele.
— Eu também queria ter te encontrado antes — ela disse, deixando algumas lágrimas rolarem pelo seu rosto — você é a minha única pecinha complementar que realmente fez questão de ficar na minha vida.
— E eu nunca vou sair dela a menos que você me peça — ele disse tranquilo — na realidade, a menos que você implore.

Ouvir ela rindo mesmo que baixo e quase imperceptível fez com que o coração dele se acendesse em alegria. Ele não conseguiria largar aquela mulher nunca mais e sabia disso.


Epílogo


“So far away, if I had a dream
If only I had a flying dream
Don’t fall away, if I had a dream
If only I had a flying dream”

! — ele ouviu seu nome ser chamado e colocou sua cabeça para fora do quarto, onde se arrumava — será que você pode me ajudar a amarrar os cadarços do tênis?

Ela estava um pouco estressada pelas tentativas falhas de se abaixar e amarrar seus cadarços, ele já havia dito para ela que ele faria isso quando ela precisasse, que se estressar não faria bem ao bebê. Mas ainda sim, sabia que ela era teimosa e tentaria, por isso riu quando a escutou pedindo enquanto bufava sem paciência.

— Claro que sim! — ele disse sorrindo — você vai querer algum casaco? Parece estar fresco lá fora.
— O azul clarinho que você me deu aquele dia no hospital — ela respondeu sentando-se em uma das cadeiras da mesa de jantar para descansar, afinal, estava de oito meses e ela se cansava com qualquer movimentação — Nabi, meu amor! Você já está pronta? — ela chamou a garotinha de mais ou menos seis anos, que estava em seu quarto pegando as últimas coisas para levar para a escola.

— Sim, mamãe! — ela disse fechando a porta de seu quarto.
— Você pode pegar um copo de água para a mamãe, meu amor? — ela pediu para a pequena que sorriu assentindo enquanto colocava sua bolsa de lado, se direcionando a cozinha, trazendo minutos depois um copo de água para a mais velha.
— Aqui mamãe — ela estendeu com suas mãos pequenas o copo para a mãe.
— Obrigado meu amor, agora por favor, vá checar porque seu pai está demorando? — ela disse olhando em direção ao corredor — desse jeito nos atrasaremos e…
— Você é apressada — ele disse rindo da impaciência da mulher, colocando o casaco nela com cuidado e se abaixando para amarrar os tênis da mulher.
— Eu apenas não quero chegar atrasada — ela disse rindo junto dele.
— Está tudo bem, mamãe! — a pequena disse chamando a atenção dos dois para ela — eu não me importo de chegar atrasada se estiver com vocês dois.
— Eu realmente tenho uma boa garota — disse pegando a pequena em seu colo sorrindo — você é igualzinha a sua mãe quando era pequena, sabia?
— Verdade? — ela disse com os olhinhos brilhando e ele balançou a cabeça positivamente enquanto sorria.
— Mamãe era tão sorridente e arteira, igual alguém que eu conheço — ele disse tocando o nariz da pequena levemente, fazendo ela rir baixinho — ela corria para lá e para cá, tinha vários amigos e tocava piano muito bem, foi por ela ser exatamente assim que eu me apaixonei.
— A mamãe era linda assim desde pequena? — ela falou animada.
— Ela era a garota mais linda de todas que eu já tinha conhecido — ele sorriu contando — e mesmo quando estávamos separados mamãe aparecia nos meus sonhos, até o dia em que eu a encontrei outra vez.

observava aquela cena sorrindo e com um coração cheio de felicidade. Felicidade que não existia antes de reaparecer em sua vida. Felicidade que foi surgindo dia após dias, felicidade que ele fez questão de fazer com que ela sentisse com a sua presença e com tudo ao redor dela. Ele a abraçou, a acolheu, deu uma família a ela, fez questão que ela estudasse e lhe deu apoio para que aquilo acontecesse. Que ela, além de ser feliz com ele, fosse feliz com ela mesma.

Ele fez questão de ser seu número de emergência, de que suas batalhas pudessem ser compartilhadas com ele.

Ela sorriu assistindo os dois conversando animadamente enquanto se dirigiam à porta juntos. Ela colocou as mãos no bolso do casaco que ele havia dado a ela anos atrás, sentindo um pequeno pedaço de papel com uma das letras mais bonitas que ela já tinha visto e que conhecia muito bem. Sorrindo, ela leu aquelas mesmas palavras que ela tinha sonhado a anos atrás.

“I will be there for your creation
Until the end of your life (don’t far away)
Wherever you might be
It will be lenient
You will fully bloom
After all the hardships
Your beginnings will seem humble
So prosperous will your future be.”

E ela soube, soube que o dia em que ela decidiu deixar com que ele passasse seu muro construído entre ela e o mundo, se tornando a principal peça complementar de seu quebra cabeça, que agora estava completo com ela, ele, Nabi e o bebê Jay.


FIM



Nota da autora: Olá minha gente, como vocês estão? Hoje eu tô realmente sentimental, essa Fic me deixou com tanto aperto no peito e ao mesmo tempo um alívio absurdo, o que vocês sentiram? Nossa pp merecia um final assim, certo? Enfim, espero que tenham gostado, agradeço por ter lido até aqui.

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Xoxo Caleonis



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