10. Reflections

Fanfic finalizada.

Capítulo Único

olhou pelo vidro fumê do carro, pensando na multidão que esperava por ela. Já até podia visualizar os jornalistas a postos, flashs disparando e fotógrafos à espreita para conseguirem os melhores cliques dos famosos que estavam para desfilar pelo red carpet da festa de lançamento da nova coleção de gala da Dolce & Gabbana. Como socialite e modelo, ela havia sido convidada para o evento mesmo que não pisasse em uma passarela há um ano.
Modelo desde criança, aos dezenove anos ela decidiu que precisava testar algo novo para descobrir o que realmente queria do seu futuro, então pausou a carreira e resolveu se dedicar integralmente para a faculdade de psicologia que era uma de suas paixões. Mas mesmo assim o convite para essa festa havia chegado e precisando desesperadamente de algo para se lembrar de si mesma, ela aceitou.
Então, em um elegante vestido de noite da mesma marca que a festa, na cor branca com vários detalhes em pedras delicadas e douradas, rendas impecáveis formando um discreto decote V e uma pequena calda que arrastava ao passar, a ex-modelo estava pronta para colocar os pés calçados em Louboutins no tapete vermelho. O sorriso ensaiado já estava pronto para as câmeras e a noite tinha tudo para correr exatamente como ela já estava acostumada de tantas outras festas iguais que já tinha participado.
ainda lembrava claramente da sensação que era estar nesses eventos. O caos de paparazzi, os jornalistas, o calor das luzes fortes e toda a euforia que vinha junto. Mesmo que não estivesse nem de longe tão empolgada como antes, ela estava determinada a fingir que sim. Não se sentia animada para muita coisa há um tempo já e os motivos eram totalmente particulares, mas não deixaria isso interferir hoje. Repetia para si mesma que estava pronta para tudo e qualquer coisa que acontecesse essa noite.
No entanto, foi pega totalmente de surpresa ao sentir o celular vibrar anunciando uma ligação com o nome dele acendendo na tela.
A jovem gelou encarando o aparelho que vibrava em suas mãos, com medo de mover se quer um dedo. Sua mente entrou rapidamente em um estado de alerta e enquanto o lado mais racional lhe mandava ignorar a chamada; o seu lado emotivo – que por acaso era a maior parte dela – lhe dizia para fazer justamente o oposto e atender, mas ela não conseguia decidir que caminho tomar.
sempre se orgulhou de ser muito bem resolvida. Sempre soube escolher sabiamente quando devia ser racional e quando podia se deixar levar pela emoção, mas isso não se aplicava a ele, nunca foi assim. desde o primeiro momento mexeu com seus sentimentos de uma forma que a deixou completamente perdida. Ele era seu ponto fraco e a maior incerteza. Ela nunca sabia como se sentir sobre ele e agora não estava sendo diferente. Provavelmente nunca seria diferente mesmo que os dois não estivessem mais juntos.
Então, num ato impulsivo e nem um pouco pensado, dando voz ao seu coração que batia acelerado no peito e calando totalmente a razão, ela atendeu.
— Oi – sua voz soou mais firme do que ela estava.
O outro lado da linha permaneceu mudo por alguns segundos e tudo que ela ouvia era a respiração dele e uma musica muito alta misturada com gritos e conversas no fundo. Ele provavelmente não esperava que ela fosse atender.
– a voz dele saiu baixa, quase um murmúrio e nem escondeu a surpresa. – Você atendeu.
... – ela estava prestes a falar, mas ele a interrompeu.
— Eu sinto sua falta, – admitiu roucamente. – E eu nunca senti falta de ninguém. Não sei lidar com isso, machuca de uma forma que eu nunca experimentei.
Ouvir ele dizer todas essas coisas a fez fechar os olhos com força. sabia muito bem sobre a vida dele. Sabia que ele sempre havia sido sozinho desde que os pais foram presos e que ela havia sido a única pessoa que ele permitiu chegar verdadeiramente perto a ponto de conhecê-lo. Sabia também que a decisão de terminar o relacionamento dos dois havia aberto uma ferida nele tão grande quanto a dela.
— Você não pode me ligar falando isso, – o tom dela foi baixo, mas o suficiente para ele poder escutar. – Nós combinamos.
— Você já devia saber a essa altura que eu sou péssimo em manter minha palavra – tentou fazer graça, mas não conseguiu muito bem. – Eu tentei, . Eu tentei te esquecer e até pensei que tinha conseguido. Eu tô me dando muito bem, parece até uma maré de sorte. Mas aí eu percebi que eu não dou mais a mínima pra toda essa bosta porque tudo que eu quero é você, mas você não é mais minha.
— Para, por favor! – pediu. – Não diz mais nada. Eu preciso desligar, . Eu...
— Eu sei que eu não devia ter ligado – a voz dele quebrou quase como se ele estivesse segurando o choro. – Só que eu acabei uma garrafa de whisky sozinho, perdi mil reais no poker e provavelmente vou ganhar uns ossos quebrados daqui a pouco, mas eu não consigo te tirar da cabeça desde que você foi embora e eu precisei te ligar.
O aperto dela no celular aumentou com o que ele disse sobre o poker e ossos quebrados. Seu coração quase saiu pela boca porque ela suspeitava exatamente onde ele estava e não gostava nada da ideia. era imprudente, autodestrutivo e se meter em brigas e qualquer coisa ilegal era quase um hobby. Ela sabia que ele já tinha participado dessas coisas antes deles namorarem, mas ele estava bêbado, iria acabar se matando.
, sai daí agora – ordenou, soando mais firme do que esperava.
— Eu não te liguei pra falar isso, – suspirou pesadamente. – Eu liguei porque eu precisava que você soubesse de algo que eu não te falei antes.
Mesmo que ela não fizesse ideia do que era, tinha medo do ia ouvir.
— Eu queria que você soubesse, , que se meu coração todo fodido pudesse amar, ele seria todo seu – continuou. – Se eu pudesse eu te amaria como você merece, . Mas eu não posso.
Ouvir isso foi o suficiente para que as lágrimas que ela estava lutando contra se formarem nos seus olhos e toda a dor que ela escondia há semanas voltasse com toda força.
— Isso não é justo, – sussurrou, a voz fraca por conta do choro.
Ele ficou em silêncio por alguns segundos, parecendo não saber o que falar e também não abriu a boca para falar nada enquanto esperava a resposta dele. Sabia que precisava desligar, mas não podia.
— Eu... Eu não devia ter ligado – falou por fim, parecendo totalmente perdido. – Desculpa. Eu vou desligar agora.
— Vai para casa, por favor. Não faz nenhuma besteira – praticamente implorou.
Ele soltou um risco seco e nenhum pouco divertido.
— Você era a minha casa – soou extremamente melancólico. – Agora eu não tenho mais para onde voltar.
! – se sentiu ligeiramente alarmada. – Por favor, tô implorando.
— Tchau, – se despediu, ignorando seu último pedido.
! – gritou, completamente frustrada.
A modelo respirou fundo, tentando acalmar suas emoções que agora estavam um turbilhão só, mas de jeito nenhum conseguiria fazer isso a menos que tivesse certeza de que ele estava bem. Portanto, mais uma vez agiu na mais pura impulsividade.
— Cardwell, não vou mais para a festa – avisou. – Me leva no Brooklyn, Dekalb Avenue 461,por favor.


estava sentado no banco de madeira de um bar mixuruca que servia de espaço para lutas ilegais e ficava no porão bastante espaçoso de um restaurante chinês muito pouco frequentado no Brooklyn. Mesmo tendo entornado uma garrafa de whisky sozinho, ele ainda se sentia extremamente sóbrio e odiava isso. Queria perder os sentidos e ficar entorpecido na esperança de que a parte dele que sentia falta de sumisse, mas não havia conseguido.
Então decidiu trocar o álcool por uma nota de 50 reais que entregou para o organizador da luta para poder participar. Ele fazia isso frequentemente alguns meses atrás, mas tinha parado por . Ele já tinha a levado ali antes e lembrava claramente da empolgação dela a primeira vez que ele a trouxe para assistir. Lembrava também de como no fim daquela noite os dois haviam acabado embolados nus nos lençóis da cama dele pela primeira vez e como ele se permitiu sentir algo também pela primeira vez.
Só que no momento ele só queria esquecer de tudo isso e umas porradas pareciam perfeitas para ajudá-lo. Já tinha se metido em uma briga logo na entrada por uma besteira enorme e ganhado um olho roxo por isso, mas o outro cara tinha ficado ainda pior. Agora ele só estava esperando seu nome ser chamado e se amaldiçoando por ter ligado para .
Estava apenas rolando o feed do Instagram quando viu a foto que ela tinha postado. Ela estava tão linda, excepcionalmente linda e o seu peito quase explodiu de saudade quando a viu. Havia tentado se impedir, mas no fim não conseguiu. Era péssimo em controlar seus impulsos, ainda mais nos que se referiam a .
Ela era seu ponto fraco e ele não fazia ideia de como lidar com isso.
A verdade é que nunca tinha conhecido alguém como ela. Nunca ninguém tinha o enxergado além das tatuagens, da marra de bad boy e das cicatrizes das brigas que ele se metia. viu, viu tudo e não correu assustada. Apesar de tudo, ela ficou e se apaixonou mesmo quando podia conseguir alguém bem melhor que ele. Ela era seu completo oposto e agora se sentia totalmente dependente dela.
— Sua cabeça tá na lua hoje, – Jack, o organizador da luta, comentou, ocupando o banco vazio ao lado dele. – Se apanhar vai perder seu posto.
— Minha cabeça tá ótima, Jack – respondeu, não se incomodando em olhar para o velho conhecido. – Eu perdi coisas mais valiosas ultimamente, perder o posto não seria o pior nem de longe.
Jack o encarou com surpresa. Nunca o tinha visto daquele jeito, nunca mesmo.
— O que aquela garota fez com você? – soltou a pergunta.
— Eu não quero falar sobre agora – cortou logo. – Quando a minha luta começa?
— Vim falar com você por isso mesmo – Jack bateu nas coxas. – Estamos para começar. Tá pronto para ir para seu lugar no círculo?
— Sempre.
Abandonado a garrafa praticamente vazia no balcão, tirou a jaqueta de couro e deixou-a ali também. De cabeça erguida e com a moral e a fama que havia construído nos últimos cinco anos desde que começara a frequentar o local, abriu caminho entre as pessoas até o meio do círculo formado por todos que queriam assistir a luta. O lugar estava particularmente cheio essa noite, mas ele não se importava com os olhares sobre ele.
— Quem tá pronto para ver sangue hoje? – Jack chegou pulando no meio das pessoas que urraram em resposta. – Não ouvi direito, quem quer ver sangue hoje?
E voltaram a urrar em resposta com mais animação ainda, jogando até bebidas para o ar.
— É assim que eu gosto! – riu gostosamente. – Com vocês na primeira luta dessa noite teremos duas lendas desse bar. Quem aqui lembra do nosso grandioso ?
E quando seu nome foi dito, olhou ao redor para todas as pessoas que gritavam por ele, que passavam dinheiro umas pra as outras, que pulavam em animação. O cheiro de suor se misturava com cigarro, maconha e álcool, o deixando ainda mais tonto do que ele já estava pelo álcool.
— E do outro lado temos o indomável Jacob Flynn! – Jack apresentou, apontando para o outro oponente. – Último minuto para apostas, corram.
flexionou as mãos, abrindo e fechando os punhos com força. Seu olhar estava meio desfocado, mas ele conseguiu analisar claramente o seu oponente. Era enorme, bem mais musculoso e parecia bastante confiante, mas isso não o abalou em nada. Medo de se machucar não era algo que ele tinha, na verdade, medos não eram coisas que ele sentia.
— Podemos começar, senhoras e senhores? – Jack retornou para o meio do circulo, se postando no meio de e Jacob. – E vocês rapazes, prontos?
Ambos se limitaram apenas a assentir. Eles se posicionaram, o círculo ao redor deles abriu mais espaço, Jack relembrou as regras que consistia em apenas uma: Quem ficar de pé por último ganha. Então ele apertou a buzina que iniciava e a luta começou. Como sempre, esperou o adversário fazer o primeiro movimento e acabou levando o primeiro soco. Seus reflexos não estavam os melhores depois de tanta bebida, mas respondendo como se não tivesse nem sentido, disparou um jab na direção de Jacob, seguido quase simultaneamente de um cruzado.
E então tudo virou um borrão. Ele sentiu o supercílio abrir depois de um golpe bem dado, sentiu o gosto de sangue na boca depois de outro, sentiu suas costelas doerem depois de um chute. Mas também sentiu os nós dos seus dedos queimarem depois de terem acertado tanto a cara do outro competidor. Mal escutava tudo ao redor, mal reparava, na verdade. Sua atenção estava em socar o seu oponente, em descontar nele tudo que vinha sentido ultimamente.
Jacob era forte, não dava o braço a torcer e talvez fosse por estar em uma condição totalmente precária, mas estava sendo mais difícil do que normalmente era. Ele obviamente não desistiria, isso nem era hipótese e apesar de se recuperar bem e devolver os socos muito bem, ele estava apanhando mais do que batendo.
!
Então ele a ouviu, a voz dela sobressaindo a qualquer outra e seu punho ensanguentado parou no ar, bem na frente da cara inchada de Jacob. Primeiro ele pensou ter ouvido coisa, mas quando finalmente olhou para o lado, seu olhar suavizou e ele mal pôde acreditar no que estava vendo, pois naquele vestido destonando com todos ao redor, se assemelhava bastante com um anjo de cabelos escuros. No entanto, o momento de distração foi suficiente para o outro lutador se recuperar e acertar um soco mais forte que os outros.
A visão de escureceu, a tontura lhe pegou de jeito e ele sentiu o corpo se render ao golpe que havia acabado de receber. Tudo ao redor se calou e se apagou. A última imagem que seu cérebro conseguiu capturar foi parecendo muito com um anjo.


sentiu sua cabeça latejar quando abriu os olhos. Não só a cabeça, mas quase todas as partes do seu corpo, especialmente a mandíbula. Fez um esforço para olhar ao redor tentando se situar e ficou surpreso ao se ver no quarto de no apartamento novo que ela tinha comprado na 300 East 55th Street. Ele não lembrava muito do que tinha acontecido, vagos flashs vinham a sua cabeça e ele teve que se concentrar até juntar tudo para conseguir descobrir como chegou ali. Quando finalmente sua mente colaborou, ele levantou rapidamente.
Não foi a ideia mais inteligente já que estava meio zonzo e o quarto todo girou, quase o fazendo ir ao chão, mas ele conseguiu se manter firme. Massageou as têmporas enquanto vagarosamente saiu do quarto até o corredor que levava até a sala de estar. As luzes estavam acesas e ele encontrou sentada na cadeira confortável perto da janela metálica que tinha uma vista incrível para os prédios altos de New York.
— Como você se sente? – ela murmurou, mantendo o olhar lá fora.
Se olhando no espelho que tinha na parede oposta, se viu com um olho roxo que já começava a inchar, ainda tinha sangue seco no corte do lábio e no supercílio. Baixando o olhar, os nós dos seus dedos estavam praticamente esfolados e ele mal conseguia abrir a mão sem fazer uma careta de dor.
— Já estive melhor – respondeu, erguendo seu olhar para ela novamente.
— Não consegui limpar seus cortes quando chegamos, mas acho melhor limpar isso antes que infeccione – falou suavemente. – Eu ia te levar ao hospital, mas o Cardwell não achou que dizer que te achamos assim num clube de luta ilegal seria muito bom e eu não consegui encontrar outra desculpa na hora. Ele me ajudou a te trazer para cá.
assentiu, sentindo seu pescoço doer com isso.
— Obrigado – ele sussurrou, inseguro sobre o que falar. – Eu vou dar um jeito na minha cara.
— Eu ajudo – se manifestou, finalmente voltando a encará-lo.
— Não precisa... – começou a recusar, mas ela já havia levantado e ia na direção dele.
— Não, não deveria precisar – resmungou, passando na frente e puxando até o banheiro.
Ele a seguiu calado e sentou na borda da banheira, apenas observando e deixando que pelo menos seus olhos matassem a saudade que ele tinha dela. parecia um anjo naquele vestido e se movendo graciosamente para pegar os curativos no armário do banheiro antes de parar na frente dele. Seus olhos se encontraram quando ela abaixou a cabeça e o coração dos dois saltou quase como se cumprimentassem um ao outro.
Não se viam desde que terminaram o namoro uma semana antes das férias de verão da faculdade e isso já fazia quase dois meses. As aulas retornariam em breve e a ligação de também tinha sido a primeira vez que ela tinha tido notícia dele depois desse tempo todo.
— Onde você esteve? – perguntou, não conseguindo evitar.
Ele, diferente dela, não tinha feito tanto esforço assim para fugir de notícias da ex-namorada. A seguia nas redes sociais e tinha visto as fotos que ela postou com as amigas em alguma praia muito bonita onde passou as últimas semanas. Os vestígios da viagem ainda estavam nela, o bronze havia ficado ainda mais destacado com a cor branca do vestido.
— Alina me convidou para ir com a família dela passar umas semanas na Riviera Francesa – contou, passando a toalha umedecida no rosto de para limpar antes. – Passamos por Nice, Mônaco e Cannes.
— Você se divertiu muito então – murmurou, olhando para as próprias mãos.
Enquanto ela tinha viajado para destinos caros aos quais já era acostumada, ele havia se afundado na própria miséria e na tristeza. Bares, brigas, mulheres das quais nem lembrava o nome... Esse tinha sido o máximo de divertimento de durante esse tempo, mas também já era o que ele era acostumado.
— Não tanto quando poderia – admitiu, deixando a toalha de lado. – E eu me esforcei para conseguir.
— Sinto muito por isso – disse baixinho, quase inaudível.
não falou nada mais sobre isso e continuou a limpar o rosto machucado dele. Aplicou remédio em cima dos cortes e cobriu com band-aid o do supercílio. Os dedos dela roçavam na pele quente de e ambos sentiam vontade de fechar os olhos e aproveitar o contato discreto, mas nenhum deles fez isso. Quando terminou, se afastou.
— Vou esperar você tomar banho e iremos conversar – ela decretou. – Ainda tenho umas roupas suas no meu closet, pode pegar lá.
Dito isso, o deixou sozinho no banheiro enorme.

estava sentada no sofá, encolhida e agarrada a uma almofada de caveira mexicana que ela havia ganhado de presente de quando se mudou para cá. A almofada destonava de todo o resto do apartamento que fora meticulosamente decorado por uma designer de interiores em tons alegres de amarelo, branco e azul.
Não só isso, mas na parede da cozinha que era pintada de preto fosco e servia de mural de recados ainda tinha a letra de sweet child of mine que ele havia escrito no primeiro dia que os dois passaram ali. Na verdade, foi a primeira coisa escrita na parede e ela não ousava e nem tinha tido coragem para apagar. Era uma lembrança muito boa de um dia incrível.
— Você está linda, se não for óbvio.
O olhar dela foi até o vão do corredor onde estava parado a encarando. Agora estava limpo, parecia mais sóbrio e usava uma camisa que não deixava amostra dos seus braços tatuados. Ela poderia dizer que ele também estava lindo só daquele jeito e até com um olho roxo que estava inchando, mas não falou.
— Obrigada – disse por fim, arriscando um sorriso. – Acabei esquecendo de me trocar.
respirou fundo e se aproximou do sofá, sentando-se a uma distância confortável de , o corpo virado na direção dela.
— Eu queria pedir desculpas – clareou a garganta, fitando o rosto da morena. – Sinto muito por ter te ligado, feito você ir até lá presenciar aquilo e perder a festa. Eu tentei o máximo que pude não fazer isso, mas foi mais forte.
E realmente tinha sido exatamente assim. todo dia até hoje pegava o celular, abria no contato e digitava mensagens perguntava onde ela estava, quando iria voltar e despejando tudo que estava sentindo. No entanto, algo falava mais alto e ele sempre apagava, arremessava o celular longe e procurava outra coisa. Talvez hoje a saudade tivesse sido maior.
— Eu não dei a mínima pra festa, – suspirou pesadamente. – Eu estava mais preocupada com você se machucando.
— Você já sabia que eu faço esse tipo de coisa, .
— E eu sempre odiei ver você fazendo! Você havia parado.
— Eu tinha parado por você, – engoliu em seco. – Porque eu sabia que te machucava me ver assim.
— E ainda machuca, ! – seu tom de voz aumentou um grau. – Sempre vai me machucar.
Inconscientemente, puxou a mão dele e entrelaçou seus dedos. Isso foi suficiente para tudo terminar de desmoronar dentro dos dois.
— Você era a única coisa que me mantinha inteiro – confessou, apertando com delicadeza a mão pequena da garota. – E agora eu tô caindo de volta aos pedaços que eu costumava ser.
— Mas não precisa voltar ao que você era antes – acabou se aproximando mais um pouco dele, ajoelhando-se no sofá. – Você é melhor que aquilo.
— Eu sempre soube que precisaria mais de você do que você de mim, – levou a mão dela até os lábios. – Eu sabia que você era a droga que iria me deixar viciado e cá estamos. Eu tentei te esquecer, mas eu não consigo te tirar da minha cabeça, é simplesmente impossível.
— Você que terminou comigo, – sussurrou, o tom cheio de mágoa. – Você que causou todo esse sofrimento a nós dois. Não precisaria me esquecer a se não tivesse feito isso.
Ele fechou os olhos com força, pois sabia que era mesmo o culpado.
— Eu estava tentando fazer o melhor para você – voltou com esse papo. – Eu não te mereço, nunca mereci. Aquele dia no seu aniversário só comprovou tudo.
A mulher balançou a cabeça em negação, frustrada com isso.
— Eu tentei te fazer entender, poxa! – levantou do sofá, parando na frente dele com os olhos castanhos queimando de irritação. – E você poderia ter tentado, mas não, você não quis. Eu te disse que eu não tava nem aí pra esse seu papo, que eu sabia onde tava me metendo quando a gente começou e mesmo assim eu resolvi ficar. Não sou tão ingênua quanto você pensa que eu sou, . Eu conhecia as consequências e estava disposta a enfrentá-las, mas você não deixou.
— Porque eu não queria que você acabasse machucada! – repetiu, um pouco exaltado e levantou do sofá também.
— E olha só como você me deixou então – soltou um riso irônico. – Saí machucada de qualquer forma, .
não conseguiu segurar o olhar dela e não aguentou manter a distância por muito tempo. Ignorando tudo, se aproximou do ex-namorado, segurou seu rosto entre as mãos e o fez encará-la.
— Nós estávamos tão perto das estrelas, – murmurou, encostando a testa na dele. – Você era tudo que eu queria.
As mãos trêmulas e machucadas dele seguraram com firmeza a cintura fina da modelo, a puxando mais para perto e matando toda a saudade que sentia de tê-la em seus braços. Sentiu o ímpeto de colar seus lábios, mas esse ele conseguiu conter.
— E você era tudo que eu queria, – admitiu, cansado. – Você preencheu todos os vazios que existiam no meu peito e eu fiquei assustado.
— Assustado com o quê?
— De estar te usando para tapar os buracos que a minha vida de merda deixou – fechou os olhos. – Eu prefiro perder alguém, do que usá-la, . Você era a última pessoa que eu gostaria de usar.
Ela ignorou isso. Sabia que o que ele sentia por ela era bem mais do que isso, mas não enxergava. Ele não era bom com seus sentimentos, não entendia a metade do que sentia e ela sabia que ele sentia muito. Era intenso, provavelmente para compensar a vida vazia que tinha tido. Mas ela sabia muito bem lidar com isso e sabia que ele não estava a usando coisa alguma.
— Olha pra mim, – pediu, tocando carinhosamente a bochecha dele. – Por favor.
Ele voltou a abrir os olhos, olhando direto para a imensidão castanha que o fitava de volta. Ele estava em agonia. Era difícil, muito difícil. Ele a queria tanto que doía, mas não podia. Não devia. Ele iria acabar com ela como sempre acabava com tudo ao seu redor.
— Eu vejo meu reflexo nos seus olhos, – sussurrou, roçando os lábios nos dele. – E eu vejo o que eu sei que você vê em mim.
As mãos dele subiram pelas costas dela, pressionando ainda mais seu corpo quente contra o dele. As respirações se misturavam, o cheiro amadeirado do moletom que ele vestira se mesclava com o perfume suave de flores que a garota usava. O toque delicado das mãos dela no rosto dele destoavam dos dedos calejados e machucados do rapaz que a acariciava pelas costas nuas do vestido.
— Eu não quero partir seu coração e fazer você me odiar, – soou tão sincero e vulnerável que doeu nela. – Mas eu sei que eu vou.
— Não, você não sabe – grunhiu. – Então você prefere desistir antes e nunca saberemos o que poderia ter sido.
O olhar de escureceu um pouco ao lembrar dos próprios pais. O pai era um alcoólatra que fazia de tudo por dinheiro, inclusive fazer da esposa uma prostituta. Sua mãe era drogada que por dinheiro acabou se tornando o pombo correio de umas entregas de cocaína antes de ser descoberta e presa pela polícia. Seu pai seguiu pelo mesmo caminho depois de cometer homicídio culposo durante um assalto para conseguir dinheiro para encher a cara.
O próprio havia crescido aprendendo tudo isso. Tinha participado de lutas clandestinas, rachas e até mesmo se prostituído para conseguir casa e comida uns anos antes. Foi assim que conseguiu dinheiro para pagar a faculdade e embora estivesse melhorando, aquelas coisas ainda o marcavam e ele sabia o bastante para ter certeza que o passado sempre voltaria para assombrá-lo.
Pessoas como ele não tinham finais felizes, mas merecia um. Um que não teria se fosse ao lado dele.
— As coisas não acabam bem para pessoas como eu, – falou com firmeza. – Você precisa entender isso. Não vou te arrastar pra o fundo do poço comigo. Eu não deveria ter te ligado hoje, foi um erro. Eu sinto muito por ter reacendido tudo isso, mas nós não vamos voltar.
Os olhos dela se encheram de lágrimas e passou o polegar por sua bochecha quando a primeira escorreu.
— É melhor eu ir – emendou, respirando fundo e criando a coragem necessária.
Antes que ele virasse para ir embora, segurou com firmeza no seu pulso, o forçando a encará-la novamente.
— Eu não sei como ficar sozinha, – choramingou, entrelaçando os dedos nos dele. – Então não vai, só fica.
Ela voltou a segurar o rosto dele entre as mãos, aproximando mais uma vez sua boca da dele.
— Fica comigo mais uma noite, só essa noite – fechou os olhos, pressionando mais seus lábios contra os dele. – Já que você vai cometer essa loucura e desistir de tudo, me salva mais uma vez, .
A voz dela saiu mais como uma súplica e todo o autocontrole dele foi para o espaço. Agarrou-a pela cintura com força, recuando até que as costas da modelo estivessem encostadas na parede e o corpo esguio dele a prendesse lá. a beijou com intensidade, desejo, dor, saudade e despedida.
A respiração ofegante deles, o barulho dos beijos e a chuva grossa que começara a cair lá fora era a trilha sonora da despedida dos dois enquanto caminhavam a tropeços até o quarto. As mãos ágeis dele desceram o zíper do vestido de enquanto ela arquejava por os lábios dele estarem em seu pescoço chupando e beijando, marcando a pele morena.
Quando se deram conta já estavam nus e enroscados um no outro no meio da cama de dossel. Ambos arfando, ofegando e gemendo em êxtase por estarem juntos novamente. Os corpos queimando de calor e do desejo fulminante que lhes consumia. Fizeram questão de gravar a sensação de cada toque, de cada beijo e cada sentimento, se apegando a cada detalhe para lembrarem com saudade no futuro.


não havia pregado os olhos a noite inteira. O corpo adormecido de estava abraçado ao dele embaixo do edredom grosso que os cobria. Ele fizera questão de aproveitar o momento, de guardá-lo e de observar o rosto dela pelo máximo de tempo que tinha. Então a noite deu lugar as primeiras luzes solares da alvorada e o céu foi clareando, iluminando o quarto onde eles passaram a noite.
Ele sabia que estava na hora de ir embora. acordaria a qualquer momento e ele precisava facilitar para os dois e ir embora antes disso. Portanto, após dar um beijo suave de despedida na bochecha da morena adormecida, beijo esse que partiu seu coração, ele levantou, se vestiu e estava pronto para sair.
Parou na porta para observá-la uma última vez e reunindo sua força, saiu de lá direto para as ruas frias do amanhecer em New York. Enfiou as mãos nos bolsos, olhou para o céu e engoliu o choro. Sabia que essa decisão era um caminho sem volta, mas era a mais sensata a fazer. Tinha partido dois corações para que no futuro alguém melhor ajudasse a consertar o dela.
Garotos perdidos não podiam ter alma e nem coração, era mais fácil para viver e era assim que ele viveria. Ela seria um belo fantasma que com certeza o atormentaria para sempre, mas que ficaria adormecido na sua mente até que ele estivesse sozinho na cama às três da manhã onde ele poderia lembrar e sonhar com tudo que poderiam ter sido.
havia vendido sua alma pela dela e apesar de tudo, talvez fosse uma benção disfarçada no final de tudo.
Ou pelo menos ele esperava que sim.




Fim!



Nota da autora: E AÍ? Então, essa fic foi bem difícil de escrever. Eu amo essa musica e ela tem um significado enorme e pesado na letra. Me esforcei o máximo para fazer jus desse hino e espero que tenham gostado porque mudei a história umas três vezes. Não deixem me falar o que acharam. Beijos!




Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


comments powered by Disqus