Última atualização: Fanfic Finalizada

Capítulo Único

Estava dando uma volta. Tinha tirado o final de semana para passear um pouco. Já tinha tempos que não fazia isso, que não fazia algo para mim mesmo. Parei meu carro na beira da praia, peguei meu cigarro e meu celular, e sai. Encostei no capô e senti o vento soprar meu cabelo comprido para trás. Sorri matando a saudade que sentia do cheiro do mar. Ao longe vi uma mulher loira sentada na areia, e ela fazia o mesmo que eu, admirava o horizonte.
Acendi um cigarro e fiquei ali por um tempo, fumando. Até que algo chamou minha atenção. A mulher se levantou e foi em direção à água, mas não era por isso que estava olhando-a, e sim por estar de roupa, com bolsa e tudo. Aquilo não era algo normal. Continuei observando e a vi entrar no mar agitado. As ondas quebravam contra seu corpo. Uni minhas sobrancelhas. Ela não podia estar fazendo o que eu achava que estava.
Até que a mulher sumiu do meu campo de visão e não retornou. Não esperei mais, tirei as coisas do meu bolso o mais rápido possível, junto com meu casaco, camisa e botas, então corri até lá, já entrando na água que estava super gelada. Mergulhei com os olhos abertos sentindo eles arderem por causa do sal, mas não a encontrei. Submergi e olhei para os lados procurando pela mulher. Eu não podia ter alucinado assim em plena luz do dia, juro que a vi.
Afundei mais uma vez, nadando e procurando por ela, até que vi algo ao longe sendo puxado pela correnteza. Tentei chegar lá o mais rápido possível. E, sim, era a mulher loira. Peguei seu braço e a puxei para cima. Estava desmaiada. Comecei a nadar com um só braço levando a mulher para a praia, e assim quando deu pé, a peguei em meus braços e corri o mais rápido que consegui em direção a areia.
Deixei seu corpo na areia e aproximei meu rosto do dela. Não estava respirando. Imediatamente inclinei sua cabeça para trás, tampei seu nariz e abri sua boca, soprando dentro dela. Juntei minhas mãos sobre seus peitos e fiz pressão. Nada. Repeti aquilo umas três ou quatro vezes, esperando por alguma reação dela.
— Vamos lá! — chamei nervoso. Ela não podia morrer! Não a conhecia, mas seu rosto pálido e jovem fazia meu peito ficar pesado e dolorido, de alguma forma sabia que precisava trazê-la de volta de qualquer forma. — Reage! — pedi e voltei a fazer a respiração boca a boca.
Seus olhos se abriram rapidamente, a vi puxar o ar, então parei de bombear seu peito e de fazer respiração boca a boca. Ela começou a tossir, vomitando a água que tinha engolido, então virei seu corpo de lado para lhe ajudar. Sentei na areia respirando aliviado dessa vez, tinha conseguido. Lhe dei espaço para respirar. Olhei para seu rosto e seus olhos verdes se encontraram com os meus. Sorri aliviado e cheguei mais perto, ficando ao seu lado. Com cuidado tirei os fios de cabelo que estavam presos em seu delicado rosto. Ela era linda, e tinha um ar frágil e meigo. Ela suspirou quando a toquei. A garota tinha algo diferente das outras que já havia visto, não sabia bem o que era, mas sentia isso e não era a tristeza que carregava em seu olhar.
Então se virou, ficando deitada de costas e seus olhos se abriram, encarando o céu azulado sobre nós. Seu cenho franziu e ela estreitou os olhos, parecendo que agora tentava controlar sua respiração. Ela mantinha uma careta na expressão. Imaginava que deveria estar ardendo para respirar um pouco, ainda mais pela forma baixa que choramingou. Ela me olhou por alguns segundos.
— Você é um anjo? — perguntou baixinho, tossindo mais um pouco. Voltando a encarar meus olhos, confusa com tudo que tinha acontecido. Ri de leve com o que perguntou, e quase lhe respondi que eu era um bruxo, mas não podia sair por aí falando isso.
— Não. Estou muito longe de ser um anjo. — Agora apenas um pequeno sorriso restava em meus lábios, mas ainda estava feliz que ela não tinha morrido. Não tinha ideia de como me sentiria se aquilo tivesse acontecido mesmo que nem ao menos nos conhecêssemos.
— Mas você salvou minha vida — murmurou, aprofundando seu olhar no meu, mostrando que estava grata por isso, mas ainda assim não parecia entender muito bem. Concordei com a cabeça. — Não é um anjo, mas é um herói. — Sua voz saiu baixinha novamente.
Meu sorriso ficou maior quando disse que eu era um herói, e a vi morder levemente seu lábio. Não iria rebater, se ela queria entender assim, tudo bem para mim, mas eu não me achava um herói. Tive sorte de estar ali naquele momento para salvá-la, apenas isso.
— E faria isso mais um milhão de vezes se fosse preciso — disse de forma gentil e só sorri fraquinho. Ela engoliu seco, umedecendo meus lábios, e vi uma lágrima escorrer pelo seu belo rosto. — Você não me parece alguém que merece morrer tão cedo — confessei o que tinha rodado em meus pensamentos quando estava tentando salvá-la.
— Talvez meu anjinho da guarda tenha o mandado — murmurou, encolhendo os ombros com essa possibilidade, mantendo um olhar mais leve. Achei engraçadinho ela ter dito aquilo, ainda mais no diminutivo. — Ou você é ele.
Então eu ri fraco quando disse que eu deveria ser ele. Queria ser tão bom assim para ser o anjo da guarda de alguém. Suspirei e neguei com a cabeça sorrindo, mas não falei nada. Ela sorriu um pouquinho. Não me parecia justo naquele momento discordar dela ou qualquer coisa parecida, então deixaria que me chamasse do jeito que desejasse. Herói, anjo da guarda ou apenas anjo, tanto faz, por mim estava tudo bem, contanto que ficasse melhor de tal forma. Seus lábios escorregaram um pouquinho para o lado, mas desviou seu olhar e tentou me levantar, mas foi em vão.
— Você está bem? — fechei meus olhos com a pergunta burra, e neguei com a cabeça, voltando a olhá-la em seguida, vendo que agora tinha um sorriso leve nascendo em seus lábios. Era óbvio que não estava bem, ou não teria tentado se afogar, mas o pequeno sorriso me agradou, mesmo que minha pergunta tenha sido péssima. — Digo, o que posso fazer para te ajudar a ficar melhor? — mudei minha pergunta. Ela fechou os olhos e respirou profundamente. Eu deveria ficar calado.
Eu poderia lhe comprar algo para comer, ou apenas ficar ali a ouvindo falar, até mesmo levá-la no parque de diversão. Sabia que aquilo só seria momentâneo, mas talvez ajudasse um pouco pelo menos por uma hora ou quem sabe duas.
— Eu não quero mais ficar sozinha. — choramingou, e lágrimas escorreram de seus olhos, seu peito inchando por um choro por mais que parecesse tentar segurá-lo. O que me pediu fez um arrepio correr dentro de mim. Talvez fosse porque eu não esperava aquilo. — Me perdoa. Você parece ser um cara muito, muito, legal mesmo e eu não quero te envolver nos meus dramas e problemas — disse no meio do choro, forçando seus olhos fechados e se entregando ao choro. Não, aquilo não estava certo, ela não tinha que se desculpar por nada.
— Não vai. Estou aqui agora — garanti, e não iria a lugar algum.
Sabia que ela não precisava apenas que alguém a salvasse do afogamento, precisava de ajuda para continuar a viver, e eu estava disposto a carregá-la se precisasse. Minha vida era conturbada, mas sempre tinha espaço para encaixar mais alguém nela, ter uma amiga nova me faria bem também.
— Hey. — Cheguei mais perto dela e passei meu polegar na lateral de seu rosto por onde estava molhado. Ela voltou a abrir seus olhos e me encarou agradecida por isso, mas sem conseguir parar de chorar. — Vem cá. — A puxei para cima, e simplesmente lhe abracei com cuidado, pois seu corpo poderia estar dolorido por tê-la reavivado. A garota me apertou no abraço. — Vai ficar tudo bem, não se preocupe com isso agora — sussurrei preocupado com ela. Não queria que pensasse naquilo nem agora e nem depois.
Ela suspirou baixinho tampando sua boca para abafar o choro. Segurei sua mão, a tirando de sua boca, então ela me encarou.
— Não precisa se esconder e nem segurar o choro, não me importo que chore — declarei falando baixo, como se lhe contasse um segredo. Seus lábios se retraíram, mas então suas lágrimas começaram a saírem livres.
Seus braços me apertaram com força, e eu apenas a segurei com mais firmeza, mas ainda assim com cuidado. Senti seu corpo descansar um pouco em meus braços enquanto a segurava com um pouco mais de firmeza no abraço. Não iria soltá-la. Isso a fez respirar fundo. Tombei de leve minha cabeça para o lado a vendo tocar em seu peito. Será que estava doendo? Eu tinha feito muita força sobre ele quando tentei reavivar ela?
— Obrigada… — agradeceu baixinho em meio ao choro e sua voz rouca.
— Está doendo? — perguntei preocupado, e ela negou com a cabeça. Se fosse o caso, poderia levar ela até o hospital mais próximo. Às vezes alguma costela tinha sido fraturada. — Por nada. — Sorri de forma meiga mesmo que ela chorasse, sabia que não poderia deter suas lágrimas e que às vezes chorar era a melhor coisa a se fazer quando não se estava bem. Ficar guardando os sentimentos dentro do peito era às vezes a pior coisa que tinha, te deixava amargo e por fim até mesmo frio.
— Não. Ele já doeu mais. — Sabia que estava se referindo ao seu coração.
Sorri de um jeito triste ao saber que ela já tinha sido ferida antes. Uma menina doce como ela não deveria ser machucada pelas pessoas. Aquilo era cruel demais até mesmo para o ser humano. Passei a mão em seu rosto, a admirando. O anjo ali era ela, e não seu. Sua beleza era enorme, e ela me trazia uma sensação enorme de leveza, era como se o ar tivesse ficado mais puro em sua presença. A menina finalmente relaxou em meu abraço, então fiz o mesmo, deixando a tensão ir embora. Reparei que ela tinha parado de chorar. Fiquei aliviado por isso, até mesmo feliz. Ver aquela menina chorar estava deixando meu coração bem pequeno e apertado. Queria roubar suas lágrimas e ter o poder de não deixar que ela ficasse mais daquela forma.
— Dizem que sorvete é bom quando estamos tristes. Quer tomar um sorvete comigo? — ofereci sem soltá-la do abraço.
— Eu adoro sorvete — sussurrou, encostando a lateral do seu rosto em seu ombro. — Morango com raspas de chocolate. — Passou as costas da mão em seu nariz para secá-lo. — Como você se chama, anjo da guarda? - perguntou, se afastando pra poder olhar em meus olhos.
— Opa — falei animado por ter acertado na sugestão do sorvete. — Nunca comi desse, mas aposto que é delicioso. Você pode me dar um pouco para provar? Eu gosto muito do de passas ao rum. — disse qual era o meu favorito. — . . E você, Gasparzinho? — brinquei por ser extremamente pálida. Ela sorriu levemente com o apelido, franzindo até o nariz de um jeitinho engraçado, e isso me fez rir um pouco alto. Tinha sido adorável. E eu pude ver seu sorriso aumentar.
— Nunca? É divino. Tem o poder de acalmar oceanos — murmurou, agora sua voz saía mais mansa, leve e não tão rouca quanto antes. — Passas ao rum? Jura? Nunca experimentei. Vamos trocar os sabores — disse em tom de sugestão, umedecendo seus lábios e fungando ao ir parando de chorar aos poucos. — — respondeu, estendendo a mão.
— Sério? Então acho que podemos comprar um pote bem grande dele. O que acha? — sorri para ela, na esperança que seu sorvete favorito fosse lhe fazer ficar melhor por alguns minutos. — Perfeito! Espero não ficarmos com dor de barriga de tanto sorvete. — Brinquei dando uma pequena risada. — — repeti seu nome vagarosamente. — , achei seu nome extremamente lindo, e combina muito contigo. Uma menina linda para um nome lindo. — Peguei sua mão e dei um beijo no dorso dela, sorrindo logo em seguida. Seus olhos se fecharam um pouco pelo sorriso que ficou maior e ela ficou me olhando, respirando fundo sem tirar o sorriso de seus lábios.
— Um pote bem grande? Ai meu Deus, esperei minha vida inteira pra ouvir isso — falou bem séria, colocando minhas mãos em seu peito e então sorriu de uma maneira divertida, mostrando que era zoeira, mas que tinha mesmo adorado a ideia. Seu sorriso era lindo, meigo e encantador. Ela parecia mesmo uma boneca, e eu queria apertar aquela criaturinha até que me pedisse para parar por estar lhe causando falta de ar. Sorri mais abertamente. — Espero também, a dor de barriga é a pior parte. — Fez uma leve careta, mas sorriu. — Obrigada, é muita gentileza da sua parte. Mas você me deixou sem graça agora, anjinho da guarda. — Soltou uma risadinha baixa e leve, coçando suas bochechas que estavam vermelhas. A forma como seus olhinhos se fechavam quando seu sorriso ficava maior, me deixava calmo. Era como se confirmasse que agora estava tudo bem. Por Deus, aquela menina precisava ficar bem, queria que ficasse bem.
— O tamanho que você quiser. — Garanti. Ela sorriu, piscando seus olhos como se tivesse acabado de realizar seu sonho. — Viu, Deus te mandou um anjo para te pagar sorvete. — Brinquei com ela dando um riso fraco, feliz por ela estar bem por alguns minutos. — Posso comprar papel também, caso dê dor de barriga. — Brinquei novamente com a ideia, e ri mais uma vez. A garota soltou uma risada mais alta, negando com a cabeça e fazendo uma careta em seguida. — Te deixei sem graça? Espera aí que vou te devolvê-la. — Coloquei a mão dentro do bolso molhado de minha calça e fingi tirar de lá. Peguei a mão de e virei sua palma para cima, a abrindo, colocando - algo - ali, e fechando logo em seguida. Então fingiu pegar sua graça, não conseguindo não rir com isso. — Pronto, sua graça de volta. — Pisquei para ela com um sorriso de lado. — Olha, guarda ela bem ou vou tirá-la de você novamente — ri um pouco.
— Mandou mesmo e eu nem sei mereço! — o sorriso aumentou ainda mais. Apenas neguei com a cabeça demonstrando que não tinha nada disso, ela merecia, sim. — Não vai dar, não, somos fortes e aguentamos. — Sorriu confiante. Aquilo estava me deixando tão leve e feliz. — Guardarei com certeza, mas eu não me importaria de perdê-la pra você novamente. Você parece ser cuidadoso. — Piscou seus olhos de uma forma meiga e gentil, colocando a palma da sua mão em seu peito e imitando um zíper ali, sorrindo em seguida. Apenas assenti. — Prontinho, está guardada. — Sorrio fechado como uma boa garota. Isso foi tão agradável.
— Estou confiando em você, então — falei sobre não termos dor de barriga e pisquei um olho para ela. — Você consegue ficar de pé? — perguntei já que tinha tentado se levantar antes e não tinha conseguido. — Se quiser posso te levar, você é tão leve que é como carregar uma boneca de pano. — Fiz piada.
Levei minha mão até seu rosto e sequei de novo onde que estava molhado por causa das lágrimas que tinham descido há pouco ali. Seus olhos se fecharam. soltou o ar e tentou levantar, parecendo ter ficado tonta e quase caindo para trás, mas me segurou em mim.
— Acho que consigo sim, com uma pequena ajuda. Por favor! — fez uma leve careta, mas piscou meus olhos em tom de brincadeira. — Vou levar isso como um elogio, . — Semicerro os olhos.
— Opa, vamos com calma — disse segurando-a com firmeza. Ela apenas assentiu. — ? Ah, por favor. Parece minha avó me chamando assim. — Brinquei com ela e me afastei um pouco, mas sem soltar seu braço para que pudesse andar.
— Tá bom, sem chamar pelo sobrenome então, só quando eu for te dar bronca, tá? — olhou para mim, mantendo o tom brincalhão e o sorriso leve nos lábios.
Ela se colocou de pé. Eu poderia pegá-la no colo e levá-la até meu carro, mas talvez ela precisasse tentar andar com suas próprias pernas para se sentir melhor. Acompanhei passo após passo, pronto para segurar seu corpo caso precisasse. Não a deixaria cair de forma alguma, e não era apenas literalmente. Nós andávamos calmamente.
— Você vai querer me dar bronca? Logo a mim que sou um anjo? — levei a mão livre até meu peito de forma chocada, abrindo a boca, como se não esperasse nunca aquilo de , até minhas sobrancelhas estavam erguidas. me olhou como se o avaliasse antes de responder à pergunta.
— Talvez, vai que você precise de uma bronca? - ergueu suas sobrancelhas em questionamento, mas sorrindo divertida no canto dos lábios.
— Nunca! — respondi e abri um sorriso largo, e isso tirou um pequeno riso dela. — Tenho um casaco no carro, posso te emprestar para você tirar essa roupa molhada e não pegar um resfriado. — ofereci quando estávamos quase chegando lá.
— Eu adoraria, estou começando a sentir um pouquinho de frio mesmo. — Estalou a língua no céu da boca. — Obrigada. — sorriu, fazendo um gesto de agradecimento também. Concordei com a cabeça.
Quando chegamos no meu carro, minhas coisas ainda estavam jogadas ali no chão. Peguei meu casaco que estava ali e o bati, tirando toda a areia que tinha agarrado em seu moletom.
— Aqui, acho que vai te servir. — Estiquei a peça em sua direção, e apenas neste ato deu para perceber que meu casaco iria engoli-la. Deveria ir até abaixo de seus joelhos, ou algo assim. Ela sorriu agradecida. — Ali tem um banheiro. — Apontei para um lugar onde costumava usar quando saía da praia e queria me limpar antes de entrar no carro. olhou para o lugar e sorriu novamente. — Ah. — Fui até minha mala e peguei uma toalha que tinha ali também, e já voltei. — Se quiser se secar um pouco.
— Boa ideia ou eu vou congelar de frio. Aqui é sempre tão frio — resmungou a última parte. Andou mais para frente em direção a porta do banheiro, mas parou. — Ei, anjo da guarda — chamou, virando para trás e me olhando. O vento agora bagunçava seu cabelo, assim como o meu. Então ela abriu mais o sorriso. — Obrigada. — disse com todo seu coração, abrindo mais o sorriso em total agradecimento.
Então se virou novamente e seguiu até o lugar, me deixando ali com um sorriso largo nos lábios. Fiquei a olhando de longe, o vento fazendo seus fios voarem no ar em uma dança bonita. Até que fui puxado.
Senti minha cabeça latejar. Estava tonto e as vozes que falavam ao meu redor eram confusas, não dava para entender direito. De qualquer forma eu tinha sonhado com aquela garota de novo. . Sempre o mesmo nome, e todas as vezes eu a salvava de alguma forma. Era assim desde quando eu era criança. Sua aparência sempre continuava a mesma, apenas eu quem ia crescendo e mudando dentro de cada sonho, e a pior parte disso, era que eles nunca continuavam, não tinham uma sequência, ou algum outro tipo de significado. Eu a salvo, nós nos apresentamos, e ela vai embora depois.
Abri meus olhos percebendo que minha visão estava turva e a iluminação não era lá grandes coisas. Um cheiro forte tomou meu nariz e recebi um tapa na cara, mas isso não me ajudou a ficar menos tonto naquele momento, só piorou a porra da situação.
— Vamos lá, bonitão. Acorde. — Uma voz debochada chamou com uma risada no final.
Torci uma careta em meu rosto por sentir que não era só a minha cabeça que doía, meus braços e pulsos também. Que inferno. Forcei minhas pernas e percebi que não estava de pé, nem sentado, muito menos deitado, eu estava sendo pendurado pelos pulsos. Ergui a cabeça e vi correntes ao redor dos meus pulsos que estavam presos juntos, e pelo jeito que a cor escura que brilhava estava em minha pele, deduzi que estava sangrando. Ótimo.
Tentei me lembrar do último babaca no qual havia irritado, mas muitos nomes vieram em minha cabeça, então olhei para ver quem estava ali e não reconheci nenhum dos três. Eram dois caras e uma mulher. Girei minhas mãos sentindo a dor percorrer pelos meus braços e segurei as correntes com força e me ergui, ficando de pé e sentindo minhas pernas molhadas. Uni as sobrancelhas e olhei para baixo vendo água ali. Em uma pequena análise percebi que estávamos dentro de uma caverna.
— Nunca tive um encontro dentro de uma caverna, e se não fosse pelas correntes até diria que estaria tudo perfeito — comentei debochado. Ficava propenso a isso quando estava irritado. — O que devo a honra de tal date? — perguntei olhando para os três enquanto segurava as correntes com mais força pensando em qual feitiço usar para me soltar daquela merda e poder arrebentar aqueles três por conta daquela gracinha deles.
— Vamos ser diretos. — A garota veio andando em minha direção, movendo lentamente seu quadril de um lado para o outro.
Ali de perto pude ver como seus olhos eram extremamente claros, chutaria que eram azuis, mas a luz laranja que vinha das tochas dava um tom amarelo tão estranho quanto ela. Sua unha pontuda passou pelo meu rosto fazendo um corte ali, o qual ardeu um pouco, mas não esbocei nada.
— Sabemos que você está atrás da estrela e que tem um bom rastro dela. — Fiz cara de desentendido.
— Estrela? Ah sim. Estrela. — Ponderei com a cabeça. — Chega mais perto que vou te contar. — A olhei com um sorriso malicioso no rosto como se fosse contar apenas para ela. A garota chegou bem perto, deixando sua orelha bem na frente dos meus lábios. — Veja se está dentro do meu bolso — sussurrei dando uma risada e ela me deu um tapa na cara. — Não sei que porra de estrela você está falando. — Rosnei e joguei a cabeça para trás, fazendo meus cachos irem junto. Passei a língua no canto do lábio, sentindo que tinha cortado com o tapa.
— Adoraria dizer que teríamos à noite toda para isso, mas tempo é algo que não temos. — Apontou para o chão onde a água subia vagarosamente. — Você tem a opção de ficar aqui e morrer afogado, ou ficar e só morrer com um tiro mesmo. — Ergueu a camisa mostrando a arma que estava enfiada no cós de sua calça. — Dizem que morrer afogado é péssimo. — Fez cara de quem tinha pena de mim.
— Vai se foder — mandei e comecei a sussurrar um feitiço para conseguir me soltar dali, até que a garota riu.
— Acha mesmo que seríamos tão burros assim? As correntes são enfeitiçadas contra magia. — Isso me fez ir na direção dela, mas meus pulsos travaram me impedindo de alcançá-la. — Não seja tão durão, nos diga o que você sabe. — Tentou colocar a mão em meu rosto, mas joguei a cabeça para trás novamente e me afastei.
— Vocês querem uma estrela? Fácil. Vai lá fora e olhem para o céu, ele está cheio delas, é só pegar. — Ergui minhas sobrancelhas e um dos caras chegou perto de mim e me deu um soco no estômago, o que me fez tossir e ficar enjoado. — Minha mãe sempre me disse que era mais fácil que me levassem até o inferno na conversa do que no grito ou no soco. — Segurei as correntes com força e me ergui, passando minhas pernas pelo pescoço dele e o enforcando com uma chave. Vi o outro puxar a arma pronto para atirar. — Faça isso e eu quebro o pescoço dele agora mesmo — disse bem sério, não tinha deboche na minha voz, e eu faria aquilo sem pensar muito. Forcei a corrente, e senti o pino dela no teto se afrouxar um pouco. Se fizesse mais pressão talvez aquilo soltasse.
— Nos diga onde está a estrela! — O cara que apontava a arma em minha direção gritou, e pelo jeito que tremia não achava que iria atirar.
— Não sei do que diabos vocês estão falando! — berrei de volta em um rosnado, apertando ainda mais o pescoço no cara, o sufocando.
Suas mãos seguravam minha perna tentando se soltar, mas isso só me fazia apertar mais. A garota tirou a arma da mão do cara e atirou sem pestanejar, bem na lateral da minha barriga, me fazendo soltar o sujeito no mesmo instante. Travei os dentes sentindo aquela merda queimar. Abaixei a cabeça vendo o furo em minha camisa branca que começou a ficar manchada rapidamente.
— Última chance. — Ela apontava em minha direção enquanto o cara que segurou a arma ajudou o outro a se levantar.
A água já estava batendo em nossas cinturas, e eu precisava pensar em alguma coisa para sair dali logo. Minhas chances de morrer eram altas. Afogado ou por hemorragia. Mas ainda assim não iria contar o que sabia. Sim, eu sabia exatamente do que estavam falando e tinha o rastro da estrela, estava bem perto dela quando me pegaram, só que ao contrário deles e do meu coven, não queria seu coração, queria avisar que deveria fugir ou tentar voltar de onde veio, e que estavam caçando-a, porque não era justo alguém morrer para outro viver para sempre. Claro, se a lenda sobre estrelas fosse verdade. O meu coven passou centenas de anos vigiando o céu e caçando as estrelas que caíam dele, dizem que alguns bruxos já tinham até mesmo conseguido o coração de uma estrela, mas nunca vi nenhum deles para ser sincero. Então para mim estávamos perseguindo algo que nem sabíamos mesmo se era real, matariam uma criatura a troco de nada sendo que tinha outros jeitos de arranjar imortalidade por aí.
— Está valendo quanto essa última chance? Eu vou morrer de todo jeito, preciso de algo que vá valer a pena. — Continuei enrolando e a garota ficou com mais raiva ainda, se aproximando e encostando o cano da arma em meu queixo.
Eu deveria estar com medo de morrer, deveria estar fazendo de tudo para sobreviver, só que cheguei em um ponto que não continuaria mais vivendo daquele jeito, perseguindo e sendo mandado fazer o que eu não acreditava ser o certo. Estava farto daquilo tudo. Então, talvez fosse mais fácil apenas morrer mesmo, pelo menos eu saberia que tive um final digno.
— Se você contar, podemos te soltar. — Seus olhos me diziam que ela nunca faria isso.
— Já é alguma coisa. Mais o que vou ganhar? Não estou aceitando beijo como pagamento. — Ela rosnou e deu um soco no meu nariz. Passei a língua pelo meu lábio superior sentindo o sangue banhando-o. — Vamos, temos pouco tempo. — A água já estava quase no peito da mulher. Mal estava sentindo minhas pernas direito por causa da água gelada. Não sabia porque água de cavernas tinham que ser assim.
— Ele não vai falar, Meg. Vamos embora. — Um dos caras a puxou pelo braço, mas ela o puxou de volta e apontou a arma para a minha testa.
— Fala, agora! — disse entre dentes e antes que eu abrisse a boca para falar mais algum deboche, as tochas se apagaram por causa do nível da água.
Puxei a menina para perto com as pernas, e a afundei na água com meu peso, mesmo que a dor que estivesse sentindo me fizesse querer parar. Era isso ou nada. Ela se debateu enquanto tentava se soltar, mas fiquei segurando-a até que parasse, e certamente tinha perdido a arma também, já que não tentou atirar novamente. Os outros caras gritavam tentando achar a tal de Meg, mas não tiveram respostas. Se eu saísse dali, os próximos seriam eles. Minha barriga doía por causa da força que eu fazia, e já começava a duvidar que conseguiria fugir daquelas correntes e nadar para fora.
Eles desistiram e foram embora. Quando a garota parou de se mexer, fiquei mais algum tempo a prendendo até que soltei.
— Vamos lá. — Segurei as correntes e ergui meu corpo colocando meus pés no teto e puxando com força para baixo.
A água batia em meu rosto enquanto eu tentava fazer com que o pino que estava fincado na pedra soltasse. Rosnei irritado. E puxei com mais força. Meus pulsos latejavam já implorando para que eu parasse com aquilo. Respirei fundo, e dei um tranco para trás com todo meu peso e força, então meu corpo caiu contra a água gelada. Afundei rapidamente e submergir tomando fôlego já tirando as correntes de meu pulso.
— Lux! — disse e a pedra no meu cordão se acendeu em uma luz azulada.
Olhei para os lados, e vi para onde deveria ir, já que a outra direção era sem saída. Andei me segurando nas paredes. Minha barriga doía e por mais que segurasse onde tinha levado o tiro, era bem inútil. Segui quase me rastejando agora e teve uma parte que tive que nadar como se aquilo já não estivesse péssimo demais. Deveria me lembrar que tinha que ser mais cuidadoso se continuasse vivo. O ar estava começando a faltar, então tive que subir na primeira bolha de ar que achei. Olhei para baixo e vi a água turva com meu sangue.
— Você está me zoando, . É assim mesmo que você vai morrer? Dentro de uma caverna e afogado? — reclamei comigo mesmo e me empurrei para baixo, voltando a nadar para onde achava que era a saída, já que a correnteza ia para aquela direção.
Finalmente cheguei em algum lugar. Agarrei na pedra e me puxei para cima, me rastejando para fora daquela maldita água gelada. Grunhi me arrastando até achar algo para me apoiar e ficar de pé. Segurei no cascalho e me encostei nele. Ergui minha camisa e olhei o buraco em minha barriga.
— Mas que merda. Por que essas bostas sempre têm que atirar? — reclamei e comecei a andar para fora da caverna.
Estava noite, o céu limpo, totalmente estrelado com uma enorme lua. Aquilo me fez rir fraco. Comecei a tossir sentindo meu corpo inteiro doer. Precisava voltar para a cidade, mas dessa vez eu não sabia que direção seguir. A pedra em meu cordão brilhou mais forte, e isso me fez abaixar a cabeça e olhá-la. Era a estrela, ela estava por perto.
Toquei na pedra e senti ela quente. Sabia que tinha duas opções, seguir para onde a luz ficava mais forte ou tentar ir até a cidade. Olhei para o céu vendo onde ele estava mais iluminado, era para o lado oposto o qual a estrela deveria estar. Poderia levar horas até chegar nela, ainda mais ferido, só que agora parecia estar tão perto, e a única coisa que eu queria era ir até ela.
Encarei minha barriga agora, o sangue descia pelos meus dedos mais do que deveria, e aquilo era a prova que não conseguiria chegar até a cidade. A única chance que tinha era de tentar chegar até a estrela e avisá-la que deveria fugir. Então respirei fundo, sentindo tudo doer e continuei andando, seguindo para onde minha pedra indicava. Ela era feita de uma estrela morta e brilhava sozinha quando outra estrela viva estava por perto, quando mais forte ficava o brilho, mais próximo estava.
Continuei caminhando até que ouvi um barulho. Encostei na árvore e segurei a pedra para que o brilho não denunciasse onde eu estava caso fosse um dos caras que estavam na caverna comigo. Pelo brilho da lua, vi uma figura pequena vestindo um vestido de prata que reluzia a luz conforme se mexia. Era ela? Abri minha mão e vi como a pedra brilhava agora, mais forte do que nunca. Escorei um pouco na árvore, não conseguindo mais me manter de pé. Fechei meus olhos e respirei fundo, eu precisava continuar.
Ouvi um barulho, e isso me fez abrir os olhos rapidamente. Uma garota me olhou e encarei seus olhos, e não soube descrever o que eu vi, foi algo extremamente puro. Agora estava respirando com certa dificuldade, mas estava tudo bem, se eu morresse naquele momento, pelo menos tinha visto um anjo, na verdade, uma estrela de verdade. Ela olhou para meu colar e seus olhos brilharam como a pedra que tinha presa nele. Estrelas eram reais. A pedra começou a brilhar mais, e até mesmo queimar em meu peito, mas não a tirei. Não consegui olhar para ela, seu brilho era muito forte e tudo ao nosso redor estava parecendo prateado, então apagou, e senti que ficou fria. A garota parecia que estava hipnotizada pela pedra, e me perguntei se ela sentia algo ou se ouvia alguma coisa vindo dela. Ela deu um passo à frente, mas caiu sentada ainda olhando a pedra, então sorriu.
— Uma Pedra da Estrela. Uma irmã — disse em voz alta, piscando seus olhos em admiração à Pedra. Sua voz era tão doce. Olhei para o colar. Sua irmã foi morta por nós. Foi a única coisa que pensei, e isso me fez ficar mal. Seu olhar subiu até encontrar o meu, então ela viu meu sangue. Travei meu maxilar com aquilo. — Isso não significa algo bom — murmurou bem baixinho, se levantando e caminhando em minha direção
— Tudo bem — disse e então dei um pequeno sorriso, unindo as sobrancelhas sentindo dor quando respirava. — Você precisa... — não consegui terminar a frase, porque sua mão repousou sobre a minha e eu senti uma tranquilidade que jamais imaginei existir.
Aquilo era bom, aquela sensação. Se isso queria dizer que estava morrendo agora, então estava tudo bem. Eu não me importava mais, havia encontrado a estrela depois de muito tempo, e agora poderia dizer que ela deveria fugir e se esconder. Ela negou com a cabeça. A forma como ela me olhava era um tanto quanto curioso. Era um misto de coisas que eu não sabia descrever ao certo, era confuso para mim. Seu cabelo fino e prateado dançaram lentamente no ar junto com sua cabeça quando ela foi de um lado para o outro em um movimento sutil. Ela não queria me ouvir, mas eu precisava falar antes que fosse tarde, tarde para ela, tarde para mim. Eu seria levado, e em breve fariam o mesmo com ela, se não avisasse. Porém todo meu esforço foi roubado por aquela garota quando sua mão tocou a minha.
— Feche seus olhos. Não pense em nada e nem diga nada, apenas feche os olhos –- pediu com cautela, deixando sua voz sair bem calma e suave.
Então fiz isso. Fechei meus olhos deixando aquele sentimento me tomar. A estrela provavelmente me faria ir mais rápido e que a dor fosse embora. Sua voz era tão gostosa de ser ouvida. Nunca imaginei que fosse morrer desse jeito, de uma forma tão boa. Fui descendo até me sentar no chão e minha mão deslizou para o lado, parando de fazer pressão. Não tinha nada mais a se fazer mesmo. A garota colocou suas pequenas mãos sobre a ferida. Seu assobio tomou seus ouvidos como uma melodia que nunca tinha ouvido. Então esse era o canto de uma estrela?
— Vai queimar um pouquinho — alertou e uni as sobrancelhas, porque aquilo não fazia sentido com morrer em paz.
Antes que pudesse perguntar qualquer coisa, soltei um grito de dor sentindo o buraco em minha barriga queimar mais do que o próprio tiro. Travei meus dentes e segurei a grama abaixo de minhas palmas com força. Mesmo com os olhos fechados, pude ver que uma luz intensa brilhava. Até que parou. A dor, a queimação e a luz. Soltei a respiração de forma cansada. Estava molhado e suando. Engoli em seco e abri meus olhos, encarando a garota à minha frente.
— Você está a salvo, caro rapaz da Pedra da Estrela. — Ela me parecia feliz.
Ergui a mão e meu polegar passou pelo seu rosto, o manchando de vermelho com meu sangue, a fim de saber se aquela menina era mesmo real por mais que tivesse sentido sua mão sobre a minha. Sua voz doce, seu olhar sereno, suas delicadas mãos e eu rosto embonecado. Ela era real. Então a Estrela sorriu e julguei ser o mais bonito dos sorrisos que já tinha visto. Tinha uma sinceramente enorme nele, e sem dúvidas era verdadeiro. Aquilo fez um pequeno sorriso vir aos meus lábios. Seus olhos se fechando foi como se o universo tivesse ficado em paz. O mundo era feio e ela era linda. Nós não merecíamos uma criatura como aquela. Tão doce e inocente. Queria ter meu celular ali para poder fotografar seu belo rosto com aqueles traços tão finos e serenos. Eu só queria proteger ela de tudo que fosse capaz de lhe fazer algum mal. Naquele momento, soube que minha verdadeira missão não era encontrar uma estrela, e sim salvar uma. Eu lutaria por ela até o final.
— Você me salvou — balbuciei e ergui minha camisa, vendo que a ferida tinha fechado. — Obrigado — disse sem saber como reagir direito. As coisas foram se iluminando que nem ela, que nem o sorriso que me deu quando agradeci.
— Não precisa agradecer — sussurrou calmamente, piscando seus olhos ao encarar os meus
— Você precisa se esconder ou voltar para casa. Estão te caçando. Querem seu coração — informei rapidamente e tirei meu colar, então estendi em sua direção. — Estão usando isso para te encontrarem. — Aquilo não podia ficar comigo, se eu a achei, outros que conseguissem aquele colar poderiam fazer o mesmo. Não sabia quantos tinham por aí, mas sabia que aquele era o único do meu coven e era algo extremamente raro, diria até que era o único. — Você corre perigo.
Assim quando despejei as informações sobre a garota, seus olhos se arregalaram e ela caiu sentada para trás. Certamente tinha a assustado. Será que entendia do perigo, do meu mundo? Sabia o quanto era selvagem aquela terra era, mas a garota não parecia entender. A segurei pelos ombros, sua pele macia estava gelada, e se eu estivesse com a minha jaqueta aqui, provavelmente a cobriria com ela. A Estrela me olhou, pela luz do luar consegui ver a forma como seus olhos estavam lustrosos, ela estava a ponto de chorar. Ela negava com a cabeça, até que voltou a me encarar.
— Mas... mas — Tampou minha boca, surpresa e horrorizada. — Não faz sentido, rapaz da Pedra da Estrela — murmurou, sentindo lágrimas escorrerem de meus olhos. - O que eu fiz de mal para quererem meu… meu coração? — segurou o tecido do vestido do lado esquerdo do seu peito, deixando mais lágrimas rolarem em suas bochechas. — Eu não posso voltar, não há como voltar. E eu não sei onde me esconder, não sei o que fazer. Por que eles querem me matar? Eu só quero ajudar, não faz sentido. — Mordeu levemente seu pulso para controlar o desespero.
— Hey, se acalma. — Afaguei seus braços vendo agora as lágrimas rasgarem seu belo rosto como linhas prateadas que brilhavam conforme refletia a luz. Ela tentava fazer o que pedi, se acalmar, mas a Estrela parecia perdida. — Respira — pedi fazendo o mesmo, profundamente. — Agora solta. — Soltei o ar para que fizesse o mesmo enquanto olhava dentro de seus olhos. Fique calma, vai ficar tudo bem. — Pode me chamar de — falei de forma carinhosa para tentar acalmar a menina. Seu sorriso voltou a aparecer e isso me aqueceu. — Você não fez nada — disse secando as suas lágrimas, mas acabei sujando mais seu rosto, e isso me fez rir um pouco, estava parecendo uma criança com o rosto sujo de tinta. — Existe uma lenda que diz que se você comer o coração de uma estrela, você pode viver para sempre — expliquei. Ela abriu sua boca em surpresa e tocou seu peito do lado esquerdo onde ficava o coração. — Têm muitas pessoas aqui na terra que querem viver para sempre. Bruxos, feiticeiros, piradas, lobisomens e por aí vai. Por isso você corre perigo. — Tirei sua mão de seu peito e a segurei com firmeza. Ela estava sozinha, não sabia como voltar e não conhecia nada aqui. Deveria ter algum feitiço, alguma coisa que pudesse levar ela de volta, eu daria o jeito de descobrir. — Tudo bem. — Sorri fraco. Seus olhos encararam os meus. — Vou te ajudar a se esconder. — Era o mínimo que podia fazer quando ela tinha acabado de me salvar. Puxei sua outra mão que estava sendo mordida. — Assim você vai se machucar — avisei e olhei o local onde seus dentes foram cravados, vendo sua pele levemente marcada. — Vem, vamos encontrar um lugar. — Então levantei, bem melhor agora do que antes, mas ainda não estava muito bem. Ela assentiu e fez o mesmo.
— repetiu, fungando. Assenti com a cabeça demonstrando que estava certo. Ela piscou meus olhos para tentar conter as lágrimas e mais desceram. — O-obrigada — gaguejou. — Isso é horrível. Isso é cruel demais. — murmurou, ficando mais apavorada ainda. Seus olhos se encontraram com os meus e simplesmente não consegui desviar. Afirmei com a cabeça e depois ri. — Sério? Você vai me ajudar? — perguntou surpresa, abrindo a boca em seguida. — Você é o que chamam de anjo? — quis saber, tocando meu rosto levemente com as pontas dos seus dedos. Meus olhos se fecharam com seu toque. Seus dedos eram gentis e sua pele macia, apesar de estar gélida. Suspirei e abri meus olhos em seguida.
— Não precisa agradecer — falei dando um pequeno sorriso. Aumentou o sorriso fechado em seus lábios. — Ver você melhor já será um agradecimento — comentei tentando pegar suas outras lágrimas com as costas dos meus dedos. Piscou seus olhos fortemente e voltou a olhar dentro de meus olhos. — É sim. Nós somos cruéis e você nunca vai ser como a gente. Eu prometo que nunca vou deixar que algo ruim te aconteça. — garanti. Gostaria de dizer que sentia muito por ela, por ter caído em nossa terra, mas me questionei se entenderia tal coisa. — Não. Anjos geralmente não têm livre arbítrio e sentimentos, eles são outros tipos de guerreiros — expliquei por alto. Ela assentiu com a cabeça. — Eu só sou um bruxo mesmo. — Não sabia que ela saberia o que significava ser um bruxo, porém depois poderia explicar melhor. A estrela franziu levemente o cenho.
— Não se coloca no meio deles, . Eu vejo em seus olhos a bondade e ela é linda. Você não faz parte disso — falou confiante e convicta daquilo. Apenas assenti, não iria debater aquilo com ela quando sabia do que eu já fiz e ainda era capaz de fazer. — E eu acredito em você. — Umedeço seus lábios ao dizer essas palavras. Fiquei grato por isso. — Bruxos. Uma raça antiga e injustiçada em algumas épocas violentas. Vocês recebem poderes da mesma fonte de vida que nós estrelas. — Apontou a natureza à nossa volta e me encarou.
— Não está errada, não, não somos santos também. Nosso poder vem da natureza, mas ainda assim alguns usam para fazer mal a outros seres, então não se engane, por favor — pedi dando um pequeno sorriso. Ela deu um suspiro e um sorriso triste, assentindo com a cabeça. Não falei mais nada.
Precisávamos ir. Apesar de ela ter me curado, eu estava cansado, precisava achar um lugar para passar a noite. Peguei o colar que estava no chão e coloquei no pescoço da menina assim que se levantou.
— É sua agora. Sei que ela está morta e que deve ser estranho isso, mas é mais seguro ficar contigo. Se me pegarem vão saber como te encontrarem — informei e olhei mais uma vez para a pedra que permanecia apagada agora. Será que ela havia morrido de vez? Então a estrela gritou me fazendo arregalar os olhos. Então ela se segurou em mim para não cair. — Está tudo bem? A pedra te feriu? — perguntei a segurando para que não caísse e pronto para tirar o colar dela.
— A mataram! Tiraram o coração dela, . Esse colar… era minha irmã e o coração dela foi tirado dela. Isso era ela. — Tocou na pedra apagada em seu peito. A encarei alarmada quando explicou. Ela teve a última lembrança de sua irmã.
— Sim, eu sei — disse sobre aquela pedra ser uma estrela também. — Por isso que ela brilha. — A Estrela me olhava procurando por algo que eu não sabia o que era, mas também não perguntei, certamente iria achar uma resposta. Então ela apenas ficou calada
Estendi a mão para a menina, e ela a aceitou. Comecei a andar na frente, me guiando pelas estrelas para saber para onde ir e tirando os galhos e arbustos da frente para a Estrela passar sem se machucar. Andamos por um bom tempo, eu já começava a catar gravetos para fazer uma fogueira até que achamos uma cabana. Pedi para me esperar que veria se estava tudo bem lá dentro. Entrei no local e achei uma lamparina a óleo, acendi e vasculhei a casa. Achei um corpo que só tinha ossos e roupas sentado em uma cadeira de balanço. Bem, aquilo parecia que já estava ali há tanto tempo que duvidava muito que alguém ia ali. As coisas estavam empoeiradas e com teias de aranha, mas se limpasse tudo ficaria aconchegante. Juntei os ossos em um saco de linha que encontrei na cozinha e o levei para fora para me desfazer daquilo depois. Então chamei a estrela, ela sorriu, mas parou na porta e me olhou.
— Pode vir, é seguro — informei e coloquei o saco perto de uma árvore. Olhei para o lado ouvindo um barulho de água. Tinha um rio aqui perto, eu poderia ir lá buscar água depois.
— Pode me chamar de — contou, e uni as sobrancelhas por causa daquele nome, então meus olhos desceram para a pedra em seu pescoço. Era ela.
— Um lindo nome para uma estrela — falei e toquei de leve em seu ombro.
Então entramos na cabana. Olhei para o lado de fora mais uma vez e fechei a porta. Procurei por velas e mais lampiões e fui acendendo quando achava. Peguei lenha e coloquei na lareira que tinha ali.
— Você deve estar com fome e com frio. Fica sentada aqui perto da lareira. Vou ver se arranjo algo para comermos — informei e fui vasculhar os armários, mas eles estavam vazios.
Fui até o quarto e abri o guarda-roupas e peguei uma camisa seca ali, porque limpa não estava. Acabei espirrando por causa da poeira, mas era melhor que a minha molhada e suja de sangue. Voltei até a sala, vendo perto da lareira tentando se aquecer.
— Vou ter que ir ao vilarejo. Não saia de casa. Você vai ficar bem enquanto eu estiver fora? — quis saber antes de ir. Ela me olhou naquele instante.
— Sim, vou ficar sim. Você vai se cuidar também, não é? — perguntou preocupada e achei aquilo adorável.
— Vou. — Garanti, a vendo sorrir.
Então sai rapidamente, lançando um feitiço na casa para ficar oculta para que não que ninguém a achasse. O colar, a sua irmã morta, ela estava o tempo todo tentando falar comigo que eu deveria salvar . Certamente ela sabia de algo quando a mataram e estava desesperadamente tentando ajudar sua irmã, então eu iria protegê-la, porque estava cansado de ajudar a destruir tudo à minha volta por causa de poder. A vida não era só isso. Eu já era solitário, sabia também como era viver sozinho sem ter ninguém por perto para me ajudar, e ela não precisava se sentir assim. Faria de tudo para que voltasse para sua casa, assim como iria proteger seu coração de qualquer um que quisesse roubá-lo, quebrar ou devorá-lo. Porque, ao salvá-la, eu estaria me salvando também de uma eternidade fria e solitária.

Your precious heart, can't watch it break
So I close my eyes while you walk away
Can I have a second chance?
Can I start another life with you? Yeah
When I wake up in a haze and I haven't slept in days
You're a thousand miles away with
Such a lonely heart, oh woah


Fim



Nota da Jaden: Olá, pessoal! Deixo vocês com mais uma short de um casal meu e da Sereia Laranja, vindo de um dos RPG’s que a gente joga também! A Holly, esse docinho e a coisa mais preciosa do universo, é personagem da Sereia. Como sempre ela só me arrasa e acaba comigo, e isso não é novidade nenhuma para ninguém. O plot foi inspirado em Stardust, um filme que a Sereia adora demais, e me fez pirar junto com ela! Espero que tenham gostado. Beijos e até a próxima!



Nota da Sereia Laranja: Olá, meu amores! Mais um casal de RPG que amamos demais. Nem acreditei quando a Jaden me mandou uma ação do Piers salvando a Holly de tentar se matar e a conexão incrível que eles formaram! E sobre o plot ser em Stardust foi ainda mais perfeito quando ela topou fazermos porque o tanto que amo esse filme nem existe.
Enfim, espero que gostem mesmo e não se esqueçam de comentar conosco.




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