Última atualização: 02/02/2018

Capítulo 1


Watching the world float on by
I can say I'm alright
Watching the sun light the moon
As the day turns to night


Oi, eu sou , tenho 21 anos. Eu lutei contra o amor, perdi, e esta é a minha história:
Final de mais um dia de treinos e aqui estou eu, na janela do meu quarto, olhando o pôr do sol e perguntando-me o porquê de algumas coisas. Por que minha mãe nos abandonou? Por que eu me sinto tão só? Por que nenhum homem olha para mim? Será que eles têm medo de mim?
Todos os dias me faço as mesmas perguntas e não obtenho respostas. Talvez essas perguntas realmente não tenham respostas, talvez tudo o que eu precise fazer seja seguir em frente. Seguir em frente! Isso é o que eu venho fazendo desde que nasci, acho que já posso começar a dar palestras sobre isso.
Quando nasci, minha mãe disse a meu pai que ia comprar umas coisas e nunca mais voltou. Deixou-o com três filhos pequenos. Meus irmãos mais velhos são gêmeos, Luke e Dean. Quando mamãe foi embora, eles tinham oito anos, e ajudaram papai a cuidar de mim. Sou apaixonada por eles e por papai.
O Luke é o esquentadinho da família, ele é do tipo impulsivo, sabe? Mas tem um coração do tamanho do mundo. É carinhoso, divertido e me trata como se eu ainda fosse uma criancinha, mesmo sabendo que eu posso imobilizá-lo e derrubá-lo facilmente. Já o Dean é o oposto. O cara é mais pacífico que o oceano inteirinho; ele é tranquilo, sério, contido e me dá os melhores conselhos. Já o papai é o rei da nossa casa, sua palavra é lei. Ele é alegre, carinhoso e muito justo, além de me dar o melhor abraço de urso do mundo.
Eles são minha força, meu mundo. Devo tudo o que sou a esses três que se fazem de durões, mas no fundo são uns fofos. Papai diz que eu sou a mistura perfeita deles três, mas os meninos sempre dizem que eu tenho um gênio do cão. Talvez eu realmente tenha, sei lá. Que mal há em ser um pouco bagunceira e orgulhosa? E um pouco mandona, talvez…

XXXXXXX


Comecei a lutar depois do dia em que cheguei em casa de olho roxo. Lembro-me perfeitamente daqueles garotos chamando-me de menina-macho na saída da escola, tudo isso porque minha única referência de moda na época era meu pai e meus dois irmãos. Então você já pode me imaginar de moletom e calças largas com uma trança muito malfeita no meu cabelo bagunçado.
Eu tinha dez anos e achei que poderia dar conta de três garotos maiores que eu. Saldo final daquele dia: um olho roxo, eu suspensa da escola, de castigo, sem videogame por um mês e Luke furioso querendo ir na escola bater nas crianças.
Depois desse dia, o papai começou a ensinar-me a defender-me, ele sempre diz que toda garota deve saber se defender de um homem, um babaca. Daí então, eu comecei a aprender um pouco sobre defesa pessoal e a gostar disso. Nunca fui encrenqueira, mas saber me defender me livrou de situações muito ruins, como, por exemplo, quando eu fiz quinze anos.
Fui à minha primeira festa sozinha (na verdade, meus irmãos me levaram até lá e ficaram escondidos, vigiando-me sem que eu soubesse, mas eu acreditava que estava sozinha), lá eu conheci um babaca que tentou me embebedar e me levar para a cama contra a minha vontade. Resultado: dei um soco na cara dele, e quando dei por mim, a confusão estava armada, porque o Luke invadiu a festa e bateu no garoto. Fomos todos para a delegacia e o Luke ficou preso por uma noite, porque o garoto era menor de idade.
No fim das contas, papai e Dean acharam melhor me colocar numa academia de luta, e foi lá que eu me apaixonei pelo boxe e comecei a participar das minhas primeiras lutas. Comecei a ganhar várias lutas importantes e ficar conhecida, e me tornei lutadora de boxe Olímpico. Papai é meu advogado, Dean é meu empresário e Luke é meu nutricionista. Mas, não se enganem, nem tudo é um mar de rosas quando se trabalha com a família, eles são terríveis quando querem.
A diferença entre o boxe olímpico e o profissional é que, no profissional, os juízes avaliam qual lutador é mais contundente na luta; eles avaliam qual deles tem mais domínio no centro do ringue, quem dá os golpes mais incisivos, e nem sempre quem dá mais golpes é o vencedor. Já no boxe olímpico, cada golpe encaixado é computado, mesmo sem ser contundente, e no final, vence quem obteve mais pontos, ou seja, quem deu mais golpes encaixados. Além de que, no boxe olímpico, nós usamos protetor de cabeça. Quanto às regras, para as duas modalidades, são praticamente iguais.
Foi na academia que tive meu primeiro e único namorado. Tyler era o filho do dono da academia e, à primeira vista, parecia ser uma cara muito legal, tratava-me como uma princesa. Começamos a namorar, era um namoro meio que escondido, porque nunca saíamos juntos em público, ele nunca me apresentava para os amigos ou família dele. Mas, mesmo assim, depois de alguns meses, ele conseguiu me levar para a cama. Fiquei toda feliz, apesar de não ter sido a melhor noite da minha vida, mas eu o amava. E no dia seguinte, peguei-o na cama com uma mulher bem mais velha que eu, e quando eles me viram, ela ainda me humilhou. Ainda consigo ouvir suas palavras em minha mente:
“Você achou mesmo que ele queria algo sério com você? Você é esquisita, masculina, seu corpo musculoso como de um homem. Você parece um animal no ringue! Ele jamais sairia em público com você, imagina o que os amigos dele iam pensar ao verem ele de mãos dadas com uma mulher-macho! Não se engane, ele lhe fez um favor, nenhum outro homem ia querer você”.
Eu estava tão entorpecida pelas palavras que acabara de ouvir que não tive nem coragem para quebrar a cara daquele casal de imbecis, coisa que eu me arrependo até hoje. Apenas corri para casa e chorei em silêncio, trancada no meu quarto a noite toda. Até hoje, meu pai e meus irmãos não sabem o que aconteceu, apenas ficaram felizes quando eu disse que havia terminado o namoro.
Aquelas palavras me destruíram, e não consegui mais me relacionar com ninguém, tinha medo do que os homens sentiriam ao tocar meu corpo. Na verdade, isso ainda me assusta muito, por isso prefiro estar sozinha. Eu costumava passar horas olhando-me no espelho, tentando mentalizar que meu corpo não era masculino, mas em vão. Sempre que eu vejo outras garotas da minha idade, lindas delicadas e cheias de curvas, eu sinto inveja. Eu amo o que faço, o que me tornei, mas a minha rotina me exige muito, e eu sinto falta de ter vida social, de ter amigos, de ser desejada.

XXXXXXX


Aos 18 anos ganhei medalha de ouro nos primeiros Jogos Olímpicos que participei. Agora, aos 21 anos, eu estou na categoria peso-leve, uma categoria para quem pesa até 60 kg, e estou treinando duramente para os Jogos Olímpicos no próximo ano.
Apesar de toda essa vida de atleta, eu ODEIO acordar muito cedo, por isso sempre alguém aqui de casa se prontifica em vir interromper meu melhor sono todos os dias às 5h da manhã. E é sempre uma luta para eu sair da cama.
Eu, Luke e Dean estamos em Las Vegas, onde participei de algumas lutas-treino com outras atletas e onde assisti algumas lutas de boxe profissional para aprender algumas técnicas. Voltamos para o hotel praticamente de madrugada, e, com certeza, esta manhã será um trabalho árduo sair da cama.
! Vamos lá, campeã, acorda! Está na hora de começar o treino. – Luke me chama carinhosamente, tocando em meu braço.
– Vamos , levanta! Não sei como pode uma atleta ser tão preguiçosa pela manhã! – Ele fala e eu resmungo.
– Ah para, Luke! Deixe-me dormir só mais um pouquinho, você sabe que o melhor sono é a essa hora! – E volto a me cobrir completamente outra vez.
– Nada disso, mocinha! O papai já ligou para saber que horas voltamos. Falei para ele que sairemos mais tarde, porque você tem seu último treino aqui até o meio-dia! Dean está arrumando as coisas, e eu vou correr com você hoje.
– Poxa, Luke, só mais 5 minutinhos!
– De jeito nenhum, mocinha! Não sei como você consegue ser campeã com tanta preguiça matinal! – Ele fala, puxando meu lençol.
– Eu tenho talento, querido! – Falo, levantando e coçando os olhos.
– Quero ver esse talento me ganhar na corrida hoje! – Ele diz e sai do quarto para que eu faça minha higiene matinal e me troque para correr.
Depois de 15 minutos, estou bem acordada e prontinha para correr. Chego ao restaurante do hotel e vejo Luke pronto com duas maçãs nas mãos. Ele sorri torto para mim e joga a maçã em minha direção. Ele adora testar meus reflexos, é um idiota, mas eu o amo, é meu irmão!
Depois de uma hora de corrida, tomamos um café reforçado no hotel e fui direto para a academia. Lá é um dos lugares onde esqueço dos meus problemas. Dedico-me totalmente aos treinos. Sempre fui focada, meio obstinada até. Gosto de ser a melhor na minha categoria, além de deixar minha família orgulhosa das minhas conquistas, e para isso dedicação e disciplina são fundamentais.
Passei a manhã na academia, entre treinos de Muay-Thay, levantamento de pesos, várias séries para fortalecimento das pernas e muitos socos no meu amigo saco de areia. Eu estava quase chegando à exaustão, não é do meu feitio exagerar, tenho plena consciência dos perigos de sofrer alguma lesão, mas a noite não havia sido tão boa e eu acordara com as palavras do meu maldito ex na cabeça. Além de estar ansiosa para ir para casa e ver meu pai, a saudade é imensa, e eu só terei 10 dias de folga para curtir meu velho.
Depois do treino, voltei para o quarto, arrumei minhas coisas, tomei um banho relaxante de banheira e desci para almoçar com meus irmãos no restaurante do hotel. Ao chegar lá, os dois já estavam esperando-me. O almoço foi como sempre, regado a muitas brincadeiras e um Luke implicando com o Dean e comigo, cheio de gracinhas. Até entrarmos no assunto favorito deles: minha vida amorosa, ou melhor, minha inexistente vida amorosa.
– Então, , indo embora de Vegas sem deixar nada para trás? – Dean perguntou.
– Ah, mais é claro que estou deixando coisas para trás! – Respondi, entrando na dele.
– Huuuummm…. Coisas? – Luke, todo engraçadinho, comentou.
– Sim, coisas. Meu dinheiro, meu suor e dois quilos! Acreditam que perdi dois quilos? Assim que chegar em casa, você tem que me passar outra dieta, Luke. Não posso perder mais peso.
– Pode deixar, irmãzinha! Vamos voltar a sua rotina normal de alimentação e você vai recuperar, a não ser que você queira mudar de categoria. – Luke sugeriu.
– Deus me livre. As olimpíadas já são no próximo ano e já estou inscrita na peso-pena, além disso minha altura não me permite estar nem acima, nem abaixo desse peso.
– Tudo bem, pirralha! Vamos focar nisso!
– Vamos para o ringue que eu te mostro quem é a pirralha! – Falei, sorrindo e cerrando os punhos, mas ele apenas gargalhou, sabendo que tudo não passava de uma brincadeira.
, você ainda não respondeu! – Dean falou, tomando um gole de seu vinho branco. – Você não se apaixonou por ninguém aqui em Vegas?
– Claro que não, Dean. Eu vim para Vegas para treinar e assistir algumas lutas, e foi isso que eu fiz. Apaixonar-me só vai tirar meu foco e atrapalhar meu desempenho para as Olimpíadas. – Respondi meio nervosa, pois só eu sei o quanto eu sofri e a maneira cruel como tudo terminou.
– Calma, mana, não quis te estressar. Só quero o seu bem, e você anda muito sozinha. – Dean falou suave, segurando a minha mão.
– Eu sei, Dean. Desculpe se fui grossa com você.
– O Dean tem razão, princesa. Depois daquele babaca, você trancou seu coração. Aliás, você nunca nos contou o que realmente aconteceu, até porque ninguém engoliu aquela historinha que você contou quando terminou com ele.
– Acreditem se quiserem no que contei. Eu só quero voltar para casa e ver o papai. Estou morrendo de saudades dele.
– Todos estamos! Inclusive, já está na hora de irmos, já abasteci o carro e o Luke já colocou todas as malas, precisamos apenas fazer o check-out e ir embora. Temos uma longa estrada pela frente.
Eu insisti para que fôssemos de carro porque eu simplesmente amo a Rota 66, é sempre incrível e muito divertido irmos por ela. A viagem é um pouco cansativa, afinal são 270 milhas, o que dá umas 4 horas de carro, mas nós três nos revezamos dirigindo e é superlegal. Sempre tiramos fotos incríveis juntos para o nosso álbum de família.
Já estávamos chegando a Los Angeles. O sol estava se pondo, lindo no horizonte, e o Luke nos matava, cantando Pixie Lott com sua voz horrenda. Estávamos quase ficando surdos. Ainda bem que ele era nutricionista, porque como cantor ele morreria de fome. Ele estava dirigindo, enquanto Dean e eu ríamos de sua voz, quando ouvimos o som ensurdecedor de uma buzina em nossa direção. De repente, eu senti uma pancada muito forte e tudo escureceu.

XXXXXXX


Acordei tonta, num lugar estranho, todo branco e com uma luz forte direto sobre mim. Minha boca estava seca e meu corpo todo doía muito. Tentei levantar, mas percebi que não conseguia sozinha, além de muita dor, eu estava cheia de fios ligando meu corpo a um pequeno monitor ao lado da cama. Olhei ao redor e percebi meu pai cochilando numa poltrona do lado esquerdo do quarto.
– Pai?! – Chamei baixinho, minha garganta doía.
– Filha, meu amor, você acordou. Graças a Deus! – Ele levantou rápido e veio até mim.
– O que aconteceu? – Perguntei.
– Vocês sofreram um acidente na estrada. – Assim que ouvi as palavras “acidente e estrada”, entrei em pânico, preocupada com meus irmãos.
– Luke e Dean, onde eles estão? Eles estão bem?
– Calma, filha, eles estão bem, sofreram apenas ferimentos leves. Foram medicados e foram tomar banho e tiras as roupas sujas para voltar para cá.
– Como aconteceu isso? Só me lembro de uma buzina muito alta e depois tudo escureceu. – Falei, chorando.
– Um caminhão perdeu o controle, entrou na contramão, acertou em cheio o carro de vocês, fazendo vocês saírem da rodovia e capotarem. A pancada maior foi do lado onde você estava. – Meu pai falava e lágrimas desciam de seus olhos.
– Pai, o que aconteceu comigo? Por que você está chorando? Por que tem esse monitor? – Perguntei, aflita.
Eu sentia que algo estava muito errado ali.
– Princesa, fica calma! Você vai ter que ser forte. – Nós dois chorávamos, quando meus irmãos invadiram o quarto, acompanhados de um médico. Luke estava com um hematoma bastante roxo no rosto e um corte na mão, e Dean parecia um pouco mais machucado, pois andava mais devagar com a mão como se estivesse segurando a costela, com certeza havia quebrado.
– Fala, pai! O que eu tenho?
– Calma , o doutor vai explicar tudo direitinho. – Eles se acomodaram do outro lado da minha cama, e os três seguravam firme as minhas mãos.
O médico se aproximou com uma prancheta nas mãos.
– Bom, ! Eu sou o ortopedista que está cuidando do seu caso. Vejo que acordou bem e está muito ansiosa para saber o que aconteceu. Vou ser direto com você, mas preciso que você abra sua mente, ouça-me com bastante atenção e siga à risca todas as minhas recomendações. Você pode fazer isso? – Eu apenas balancei a cabeça, tentando conter as lágrimas que corriam pelo meu rosto, já esperando pelo pior.
– Você sofreu um grave acidente e, com o impacto, projetou bruscamente sua coluna para frente, gerando uma fratura vertebral na sua coluna cervical. Esse tipo de fratura provoca uma lesão na medula, impossibilitando ao paciente alguns movimentos.
– Você está dizendo-me que eu perdi movimentos do meu corpo? Eu estou aleijada? Eu não vou mais para as Olimpíadas? – Eu já não conseguia parar de chorar, junto com minha família.
Se a situação não fosse tão trágica, eu até acharia fofo aqueles três marmanjos chorando de mãos dadas. Mas, naquele momento, eu só conseguia pensar em tudo o que eu perderia daqui para frente.
– Calma, , deixa o médico terminar de explicar. – Dean apertou mais forte a minha mão e passou sua outra mão no meu braço, como um carinho, dando-me forças para terminar de ouvir o que parecia ser a minha sentença.
– Bem, foi uma lesão incompleta. – O médico continuou – Foi preciso intervenção cirúrgica imediata assim que você chegou ao hospital por conta do acometimento neurológico do impacto. Retiramos o pedaço de osso que estava empurrando sua medula, diminuindo a compressão.
– O que isso implica doutor? – Luke perguntou, porque eu só sabia chorar.
Naquele quarto, eu via todos os meus sonhos indo por água a baixo.
– Isso implica em um tempo de repouso, muita fisioterapia e reeducação. Algumas coisas você vai ter que aprender a fazer novamente.
– Mas eu vou voltar a andar? – Foi tudo o que eu consegui perguntar.
– Claro que vai. Seu caso poderia ser pior, mas o fato de você ser uma atleta e ter uma musculatura bastante fortalecida na região da coluna diminuiu o estrago que um impacto tão alto faria num caso como esses. A perda dos movimentos e da sensibilidade é temporária e, em algumas semanas, você volta a andar devagarinho com um andador, e com a fisioterapia e acompanhamento médico, aos poucos você pode voltar a andar normalmente e quem sabe até retomar os treinos. Só depende de você.
– Não se preocupe, , vamos contratar o melhor fisioterapeuta para você e você vai voltar com tudo. – Dean falou.
– Tomei a liberdade de ligar para um amigo fisioterapeuta, ele já cuidou de casos como o seu e até mais graves. Além do mais, ele é ex-pugilista e especialista em recuperação de lesões na coluna, vai poder te ajudar a voltar a sua vida normal. E quanto as olimpíadas, isso só o tempo poderá dizer...
– Como ele se chama? – Perguntei, esperançosa.
Eu precisava me agarrar a qualquer chance de voltar a ter minha vida normal.
. Ele se chama , e ele chegará semana que vem. Provavelmente, no dia da sua alta, já estará em sua casa.
– Não se preocupe, querida. Já falei com ele por telefone e ele vai direto para a nossa casa para começar o tratamento com você o mais rápido possível. – Papai falou, limpando minhas lágrimas.

XXXXXXX


Esses quinze dias no hospital foram os piores da minha vida, eu só conseguia pensar no que eu estava perdendo. Ver o meu sonho de participar pela segunda vez de uma olimpíada se tornar impossível era como receber uma facada no coração, e eu me tornei mais amarga do que eu sempre fui. Durante todos aqueles dias, minha rotina era bem simples: chorar, rejeitar comida, evitar encarar minha família e chorar novamente.
A minha tristeza estava esmagando minha família. Papai estava abatido, com olheiras, Dean estava exausto, com uma costela quebrada e tentando resolver tudo com meus patrocinadores, Luke se culpava pelo acidente e sofria muito por isso. Eu não o culpava, eu queria abraçá-lo, dizer a ele que ele não tinha culpa, mas tudo o que eu conseguia fazer era me odiar por não poder levantar daquela cama. A pior parte era fingir que eu estava aceitando tudo para os meus fãs.
Sempre que algum médico ou enfermeiro entrava no quarto sorrindo e, após cuidar de mim, pedia-me um autógrafo, eu queria morrer, mas eu tinha que me fazer de forte, sorrir e ser simpática. Era raro quando isso acontecia, porque papai pedia que não me incomodassem com isso, mas sempre tinha alguém que aproveitava meus momentos sozinha para pedir. Eles sorriam para mim, diziam orar pela minha recuperação, eles tinham fé que eu levantaria daquela cama e voltaria a ser a , a campeã olímpica de boxe feminino. Mas, eu não acreditava, e isso estava complicado ainda mais a minha situação.
Enfim eu recebi alta daquele hospital, e eu não estava preparada para o que estava por vir. Acredite em mim quando eu digo que não estava preparada, eu não estava mesmo! Principalmente para aquela visão.


Capítulo 2


And he says
"Don't you know I love you,
Don't you know you're beautiful"


Eu me chamo , tenho 38 anos e já vivi muita coisa nessa vida, muita mesmo! Eu era lutador de boxe profissional, noivo, e aos 22 anos sofri uma lesão na minha coluna em um treino. Isso me tirou dos ringues para sempre. E mesmo em cima de uma cama e com a mulher que eu amava trocando-me pelo meu irmão e fugindo com ele no momento em que eu mais precisava, eu não desisti.
Foi a época mais difícil da minha vida. Eu tinha acabado de perder umas das coisas que eu mais amava na vida, que era o boxe, e já tinha sido transferido para a cadeira de rodas, coisa que me trouxe independência e me deu uma força a mais para continuar.
Era fim de tarde, e eu tinha acabado de voltar da fisioterapia cheio de novidades para contar a minha noiva, Rachel. Naquela tarde, o médico e o fisioterapeuta tinham me avaliado e me encheram de esperança, dizendo que eu já podia tentar fazer os exercícios para ficar de pé. Mas a minha alegria foi esmagada com a cena que presenciei ao entrar em meu apartamento: minha noiva e meu irmão nus, transando na minha cama como se eu não existisse. Aquilo foi um novo acidente, só que dessa vez para o meu coração.
Destruí quase todo meu apartamento. Eu queimava de ódio daqueles dois. Eu tentava entender o porquê daquela traição. Eu ainda era um homem, no sentido sexual da palavra! Isso mesmo, eu tinha ereções, nós fazíamos sexo. Tudo bem que não era como antes, porque eu não mexia minhas pernas, mas ainda conseguia dar prazer a uma mulher. E meu irmão? Por que ele fez aquilo comigo? Ele sabia o quanto eu a amava, ele estava presente no dia em que a pedi em casamento. Passei dois dias trancado, pensando, absorvendo tudo, até que resolvi que não valia a pena definhar por aqueles dois.
Não, eu não me tranquei para o amor, de jeito nenhum. Não iria deixar que o que aconteceu destruir minhas possibilidades de ser feliz. Transformei minha raiva em força e consegui vencer completamente a lesão, foram três anos de cirurgias, fisioterapia e luta. Eu sentia muitas dores, mas minha vontade de voltar a minha plena forma física era maior, e no ano seguinte eu estava de pé, completamente saudável e completamente pronto para voltar ao ringue.
Mas eu não voltei. Durante meu tratamento, pude conhecer várias pessoas que também haviam sofrido lesões na coluna, lesões de todos os tipos. Vi pessoas desistirem dos tratamentos, alguns se suicidarem por não aceitarem suas condições, pessoas ficarem completamente curadas, e aquilo me tocou profundamente. Então decidi estudar, tornei-me fisioterapeuta e especialista em lesões na coluna.
Desde então, tive algumas namoradas, e tenho me dedicado a ajudar pessoas que passaram pelo que eu passei a voltar a viver, seja em casos em que a reabilitação total é completamente possível, como em casos de paraplegia e tetraplegia permanente, a serem mais independentes e terem o controle sobre suas vidas.
Recebi o telefonema de um amigo meu ortopedista, convidando-me para avaliar um caso com ele. O que mais me chamou atenção foi que o caso era bastante semelhante ao meu, a garota era jovem, da mesma idade que eu tinha quando sofri meu acidente, e também era pugilista. Vocês diriam que é coincidência, mas eu não acredito nisso, eu acredito em destino. E o meu estava começando a se direcionar para o lugar onde a maior luta da minha vida aconteceria.
Eu já tinha ouvido falar de , ela era uma promessa do boxe feminino, uma campeã olímpica. Lembro de assistir pela TV a luta em que ela ganhou medalha de ouro. Ela tinha muita técnica e lutava com paixão, isso chamou minha atenção na época. Uma garota realmente incrível e reservada, segundo a mídia, e o acidente que ela sofreu repercutiu em todos os jornais do país.
A lesão de era delicada e exigiria de mim cuidado integral. O fato de ela ser atleta e ter uma musculatura fortalecida tinha diminuído a pressão na medula causada pelo impacto, mas ela precisaria de um tratamento intenso, muita força e dedicação, se quisesse voltar aos ringues.
Doze anos de experiência em fisioterapia não me prepararam para o que eu vi quando cheguei à casa dela. Eu já tinha a visto na TV e nos jornais, ela era incrivelmente linda, com um sorriso enorme; parecia uma garota forte, com um olhar brilhante, e tudo o que eu encontrei ali foi uma garota abatida, apática e sem brilho.
Conversei com seu pai e seus irmãos, e eles me contaram como tudo aconteceu e estavam muito preocupados com o estado emocional em que ela se encontrava. Em menos de vinte dias, ela já estava entregue à tristeza, sem querer comer, receber visitas e até mesmo falar. Passava a maior parte do seu tempo dormindo ou chorando, e isso me preocupou muito.
Ela estava visivelmente magra, pálida, com os olhos mais tristes que eu já havia visto. Imediatamente percebi ali um quadro de depressão, e meu coração me dizia que eu tinha que fazer alguma coisa rápido, antes que esse caminho em que ela estava se tornasse sem volta.


Capítulo 3


He says
"Everyday is special,
You have made me believe".


Eu queria apenas dormir, porque dormindo a gente não pensa em nada, não sente nada, mas nem para isso eu tinha sorte. Eu tinha pesadelos horríveis que sempre terminavam em muito choro abafado no travesseiro de madrugada.
Lembram quando eu falei que não estava preparada? Pois é, eu estava dormindo depois de chorar bastante e de meu pai me obrigar a alimentar-me. Foi apenas um cochilo, porque mais uma vez eu sonhei que o médico me dizia que eu nunca mais andaria e minha família me abandonava sozinha numa cadeira de rodas.
Acordei com lágrimas já descendo dos meus olhos, e ouvi um barulho de porta sendo aberta. Levantei a cabeça já preparada para gritar e mandar embora quem quer que fosse, e fiquei muda ao me deparar com aquele par de olhos negros a minha frente.
Ele era lindo e alguns anos mais velho que eu, talvez da idade dos meus irmãos ou mais; não muito, apenas alguns anos. Tinha a pele morena, bronzeada e um cabelo preto ondulado e revolto, um rosto com expressão forte, queixo quadrado e barba por fazer. Tinha ombros largos e vestia uma camisa azul-escuro, que se moldava a seu peitoral de forma perfeita. Pernas longas, coxas grossas. Era alto, muito alto, meu 1,65 m não seria nada ao lado dele.
Mas o que eu estava pensando? Alguns minutos atrás, eu queria morrer, e agora eu estava imaginando-me ao lado daquele homem que eu não fazia a menor ideia de quem era. É lógico que ele jamais me olharia como eu imaginava. Espera um pouco, eu imaginava? Não! Eu não tinha mais direito de imaginar. Para quem estava inválida, eu estava observando demais aquele homem.
Tentei imediatamente limpar de minha mente a análise que acabara de fazer e desviar o meu olhar, não queria que ele percebesse e eu virasse motivo de chacota de homem outra vez.
– Filha? – Meu pai apareceu ao lado daquele homem. – Este é , seu fisioterapeuta.
– Muito prazer, . – Ele falou com voz firme, sorrindo e estendendo a mão para mim.
Eu não tive reação, não respondi, não estiquei minha mão para tocar a dele. Apenas permaneci séria, calada, tentando não dar importância às sensações que a presença dele começava a despertar em mim.
– Tudo bem, , eu entendo você. Mas você vai ter que colaborar, já que vamos passar um bom tempo juntos. Vou encontrar Dean no escritório para acertar algumas coisas e me instalar. Mais tarde nos vemos. Espero que seu humor esteja melhor! – Ele sorriu, piscou o olho e saiu do quarto.
– Quem ele pensa que é para falar comigo desse jeito? – Falei com raiva. – Colaborar? Até parece que é ele quem está nessa cama.
– Calma, filha! Você precisa se acalmar! Ele será seu fisioterapeuta. Seu ortopedista afirmou que ele é o melhor, é especialista em lesões na coluna e pode ajudar você a sair dessa cama. Mas você tem que colaborar, filha. Você precisa se esforçar, precisa comer. Já te demos tempo demais para sentir sua dor, agora é hora de reagir e lutar para voltar a andar.
Achei que meu pai foi duro comigo, mas ele tem razão. Todos têm sofrido com meus ataques de mau humor e crises de choro. Mas ainda é tão difícil aceitar; tenho medo de me iludir, de me animar e não conseguir. Mas eu preciso fazer algo, preciso lutar.
Passei restante do dia sozinha em meu quarto. Ninguém apareceu para me ver, nem meu pai, nem meus irmãos e muito menos ... Talvez eles estivessem apenas retribuindo todo gelo que tenho dado neles desde o acidente.
No dia seguinte, incrivelmente, eu acordei cedo sem precisar ser chamada. Eu me sentia ansiosa, agitada. A enfermeira me ajudou com o banho e Luke trouxe meu café da manhã.
– Bom dia, pirralha! Acordada e pronta? Meu Deus, que milagre! O que está acontecendo? Sei que você não é a pessoa mais matinal do mundo.
– Luke! Abrace-me! – Eu pedi, e imediatamente ele largou a bandeja com comida em cima da minha penteadeira e sentou ao meu lado na cama, abraçando-me forte.
Nós dois soluçávamos. Eu sabia o quanto ele se sentia culpado, e eu havia me afastado tanto deles depois do acidente. Eu não podia continuar com isso, pelo menos não com isso. Não era justo deixar que ele carregasse uma culpa que não o pertencia.
– Perdoe-me, , eu sinto muito! Eu não aguento mais te ver assim por minha culpa.
– Ei, Luke, olha para mim, irmão. – Eu me desvencilhei do abraço e segurei o rosto dele com as duas mãos, limpando suas lágrimas. – A culpa não foi sua! Não foi! Não foi de ninguém! Simplesmente aconteceu. Ninguém poderia prever que aquele senhor ia perder o controle do caminhão e bater em nós. Não carregue esse peso que não é seu.
– Você não sabe o quanto eu te amo, irmã. Você sempre foi minha pirralha, minha irmãzinha! Ver você sofrendo nessa cama está acabando comigo.
– Não se preocupe, eu só preciso que você esteja sempre aqui do meu lado e tudo vai ficar bem. Falando nisso, cadê o fisioterapeuta? – Antes que eu acabasse de falar, a porta do quarto de abriu e entrou, sério, contido, como se estivesse com receio do que ia encontrar.
– Bom dia, senhorita ! – Falou sério.
– Bom dia, senhor . – Devolvi no mesmo tom.
– Bom, agora que você já está em boas mãos, eu vou trabalhar. Tenho alguns pacientes na clínica hoje, algumas dietas para ajustar. E falando em dieta, já conversei com ontem e ajustei sua nova dieta, que aliás, você começa agora! – Luke falou, colocando a bandeja no meu colo e dando-me um beijo na testa. – Até à noite, pirralha. Te amo.
– Também te amo. – Falei, jogando o travesseiro nele.
Tomei meu café da manhã em silêncio, sob o olhar atento de . Quando acabei, ele retirou a bandeja do meu colo e colocou sobre a penteadeira novamente. O silêncio no quarto era cruel, mas eu não seria a primeira a falar. Não quando, depois de chegar todo confiante e cheio de sorrisos, ele me ignorava daquela forma.
– Senhorita , podemos começar com a fisioterapia? – Ele perguntou.
– Pode me chamar de , já que você mesmo fez questão de dizer que passaremos um bom tempo juntos. – Respondi num tom seco.
– Tudo bem, . Podemos começar?
– Claro.
Ele me explicou mais sobre o tipo de lesão que eu sofri, sobre a recuperação, sobre a nova dieta e os exercícios que faríamos enquanto eu estivesse na cama. Ele foi muito profissional, e conversamos somente o necessário, ele falou que, se eu continuasse diariamente com os exercícios e seguindo as recomendações médicas à risca, logo eu passaria para a cadeira de rodas.
Não pensem vocês que eu fui uma boa menina, não. Fui rebelde, reclamei, tentei desistir várias vezes, até que perdeu a paciência e me colocou contra a parede. Eu era uma garota mimada, reconheço.
O fato de não ter mãe, de ser a única mulher na minha casa e toda a superproteção dos meus irmãos comigo me deixaram mimada, mas eu era mais; eu era egoísta de alma, eu estava pouco lixando-me para o esforço que estava fazendo comigo. Eu estava inconformada com minha situação, achava injusto alguém como eu estar presa numa cama sem andar, como se eu fosse superior aos outros, e isso fazia de mim uma megera.
Mas aquele fisioterapeuta tinha algo de diferente, ele transmitia uma calma, uma serenidade fora do comum. Com ele, eu sentia que não valia a pena agir daquela forma, que eu estava errada e que minha recuperação só dependia de mim. Então tomei uma atitude, resolvi reclamar menos e agir mais. Se dependia apenas de mim, eu faria de tudo para dar certo.
Durante o mês que se seguiu, minha rotina era acordar cedo, fazer os exercícios, comer, descansar e mais exercícios. Eram exercícios para respiração, alongamentos, exercícios posturais, e eu já conseguia mudar da posição deitada para sentada sozinha, e assim passei para a cadeira de rodas.
As conversas com foram evoluindo, e eu já não sentia mais vontade de ficar sozinha, isolada e triste. Eu estava começando a ver uma luz no fim do túnel em que eu me encontrava, mesmo sabendo que eu não conseguiria me recuperar a tempo de ir aos Jogos Olímpicos. Eu só queria me recuperar e voltar a viver. Ele me fez acreditar que eu poderia voltar a ser a garota que eu sempre fui.
A academia que eu tinha em casa foi transformada em sala de fisioterapia. Foram instaladas barras e mais alguns aparelhos especiais para cadeirantes. Aos poucos, eu recuperava a massa muscular que perdi no tempo em que fiquei de cama e sem me alimentar direito.
Só tinha um problema: eu estava gostando da companhia de mais do que deveria, e sabia que aquilo, mais cedo ou mais tarde, ia acabar machucando-me.

XXXXXXX


estava progredindo, e eu ficando maluco. Tratar dela estava sendo meu melhor sonho e meu pior pesadelo. Tocá-la, vê-la e ouvi-la estava virando uma tortura. Eu seria reconhecido por ajudar na reabilitação da famosa pugilista , mas sairia dali com o coração destroçado se ela me rejeitasse.
Ela era mimada, birrenta, mas, no fundo, era só uma garota magoada. Eu sentia que ela escondia algo que, nem seu pai, nem seus irmãos sabiam, e esse segredo fazia com que ela vestisse a carapuça de forte e segura de si. E eu apenas queria ajudá-la a superar isso
Ver sair da depressão e voltar a sorrir era minha motivação. Ela aceitou ajuda psicológica e estava saindo-se muito bem, logo ela poderia voltar a viver como a garota de 21 anos que era.
Outro fato que estava matando-me por dentro era nossa diferença de idade. Eu era 17 anos mais velho que ela, e se o pai dela ou um dos irmãos desconfiasse dos meus sentimentos por aquela menina, a princesinha deles, eu estava ferrado. Eles jamais aceitariam que sua princesinha se relacionasse com um homem que tinha idade para ser seu pai.
A gente estava dando-se bem, mas ainda havia uma barreira entre nós dois. Eu sabia que não podia me apaixonar por ela, porque, além de muito mais velho que ela, eu era seu fisioterapeuta, e isso ia contra a minha ética profissional. Mas a cada sorriso dela, a cada nova conquista, iluminava meu coração, e eu não conseguia mais disfarçar.
Ela havia conseguido se mover da cama para a cadeira sozinha e com agilidade e tinha ficado tão feliz que, quando me aproximei, ela simplesmente me abraçou apertado. Aquele abraço mudou algo dentro de mim e me fez perceber que não tinha mais volta. Eu estava me apaixonando por e não sabia mais se queria fugir disso.


Capítulo 4


Hold me in your arms
'Cause I'm falling
Hold me in your arms
While we're sleeping
Hold me in your arms


Quatro meses e eu já estava perita em me locomover com a cadeira de rodas sozinha. tinha mostrado ser o excelente profissional que havia dito. Nós tínhamos construído uma boa amizade, apesar de às vezes nos desentendermos. Quando tomei a decisão de reclamar menos e agir mais, eu achava que seria fácil, mas a megera dentro de mim não havia morrido, e meu orgulho sempre falava mais alto e acabávamos discutindo.
Nossa casa ficava próxima à Venice Beach, e meus irmãos me levaram para dar uma volta lá pela primeira vez após o acidente. O médico disse que seria muito bom para eu voltar a sair de casa e tentar desenvolver atividades normais do meu dia a dia.
Acordaram-me bem cedinho e eu nem reclamei! Estava ansiosa para sentir a brisa do mar bater em meu rosto outra vez. Tomamos café todos juntos, num clima muito bom.
– Vou sair com meus irmãos, . – Comuniquei.
– Sim, seu pai me avisou. Vou aproveitar e sair para resolver umas coisas. – Ele falou friamente, sem olhar para mim, e meu coração apertou sem saber o que estava acontecendo.
– Ok, faça como quiser. Você não é um escravo aqui, pode sair sempre que quiser e precisar.
– Muito obrigada, senhorita .
Eu me perguntava o que poderia ter acontecido para que ele voltasse a me tratar com aquela frieza. Mas eu não iria me rebaixar, não ia implorar atenção de homem nenhum, e tinha que manter em mente que ele era apenas meu fisioterapeuta.
Passei uma manhã incrível com meus irmãos, eles me levaram até o mar e chorei de alegria ao poder sentir novamente as ondas batendo em meu corpo. Tomei sorvete, eles até ficavam apostando corrida com minha cadeira, dois idiotas. Meus idiotas!
Meus irmãos me deixaram em casa depois do almoço e foram cuidar de suas vidas, afinal, eles também tinham compromissos. Estava dirigindo-me até meu quarto, quando me deparei com entrando em casa sem camisa e suado como se estivesse chegando de uma corrida.
Eu tenho certeza que babei, com certeza eu babei. Tudo o que eu queria era poder passar a mão naquele peitoral definido e bronzeado. Perdi a noção de quanto tempo ficamos olhando um para o outro, até que me toquei da cara de idiota que eu, com certeza, estava fazendo e direcionei minha cadeira para o meu quarto com toda rapidez que eu consegui. Traduzindo: eu fugi!
Minutos depois, ele invadiu meu quarto, já tomado banho e vestindo uma camisa branca que o deixava ainda mais sensual do que normalmente ele já parecia.
– Senhorita , desculpe-me ter entrado na casa assim! Eu estava me exercitando e achei que não havia ninguém em casa.
– Não se preocupe, . – Fiz questão de frisar o primeiro nome dele. – Você também mora nesta casa, tem direito a entrar e sair como quiser.
– Muito obrigada, mas eu sei o meu lugar aqui. Sou apenas seu fisioterapeuta, um empregado como qualquer um dos outros que trabalham aqui. – E simplesmente saiu do quarto.
Fiquei procurando os motivos pelos quais ele estava agindo daquele jeito, mas não conseguia chegar a nenhuma conclusão. Quando meu pai e meus irmãos chegarem, eu ia perguntar se tinha acontecido algo. E se queria ser tratado como empregado, ele seria.
Éramos dois orgulhosos e parecia que, quando estávamos juntos, tudo era mais intenso. Ele me levava a exaustão nos exercícios, e havia dias em que tudo o que eu queria era continuar deitada em minha cama. Eu ainda sentia dores, uma leve pressão na coluna, mas meu médico disse que isso era normal dada a gravidade da lesão.

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estava cada vez mais frio comigo, mas eu sentia que algo estava errado. Eu podia ver nos olhos dele que ele sente o mesmo que eu, mas se mantinha longe, agindo profissionalmente. Minha cabeça estava cheia de pensamentos, eu tentava lutar contra o que eu sentia, tentava entender o que eu sentia, e a noite estava sendo terrível. Insônia, alguns cochilos interrompidos por pesadelos e dores nas costas.
Era madrugada e eu estava tendo um pesadelo. Sonhava que estava passeando com e minha família. Eu ainda estava na cadeira de rodas, tentava ficar de pé e acabava caindo. Todos começavam a rir de mim, dizer que eu era ridícula, que jamais andaria novamente e me abandonavam, um a um, e o último era , que dizia que ninguém ia querer uma aleijada.
Fui acordada por braços fortes ao meu redor, acalentando-me. Fui despertando e sentindo aquele perfume. estava abraçando-me.
– Shiiiii, calma, . Está tudo bem, você estava tendo um pesadelo.
Eu apenas chorava, soluçava e tremia. A sensação de abandono era intensa demais. Eu não sabia como reagir. via a minha angústia e tentava me acalmar.
– Calma, , não foi real. Olha para mim. – Ele segurou delicadamente o meu rosto e olhou nos meus olhos. – Não foi real, foi só um pesadelo, querida.
Quando eu o encarei, eu não consegui mais desviar o olhar, era como se eu estivesse hipnotizada. Eu podia ver naqueles olhos negros o mesmo desejo que eu sentia, então num momento de insanidade, inclinei-me para ele e o beijei.
Pela primeira vez na minha vida, eu tomei uma atitude dessas. Eu sempre fui travada em relação aos homens, mas quando o encarei, não pensei duas vezes. A princípio ele não reagiu, mas segurei seu rosto com as duas mãos, aprofundei o beijo e fui correspondida. Eu não conseguia nem lembrar direito como se beijava, mas simplesmente não conseguia parar. A cada segundo, nosso beijo se tornava mais intenso, urgente e eu me sentia no céu. Lutar contra aqueles sentimentos, implicar com , ignorar, fingir não fazia mais sentido para mim. Estar nos braços deles era como estar no mar, forte, intenso, profundo.
Mas como tudo o que é bom dura pouco, ele parou o beijo bruscamente e me olhou assustado. Afastou-se de mim, ficando de pé ao lado da cama e disse.
, você precisa descansar, amanhã será um dia puxado. – Deu as costas e saiu.
Se eu pudesse andar, naquele momento, eu fugiria, com certeza, de tanta vergonha. Como eu pude imaginar que aquele homem se interessaria de verdade por mim? Que seria possível um relacionamento entre nós dois? Mais uma vez, eu, fui idiota. Talvez aquela mulher tivesse razão, ninguém jamais se interessaria por mim, ainda mais numa cadeira de rodas.

XXXXXXX


Naquela manhã, após os exercícios, ela dormiu e eu não resisti: fiquei observado ela dormir. Ela estava cansada, eu havia exigido muito dela nos exercícios e ela não me desapontou. Reclamou, como sempre, mas foi até o fim, e eu estava orgulhoso dela. Aos poucos, sua determinação tomava o lugar da tristeza, e ela estava cada vez mais focada na sua recuperação.
Eu estava sentado na poltrona ao lado da cama dela quando seus irmãos entraram no quarto e me viram. Dean olhou para mim com olhar ameaçador e Luke me convidou a retirar-me do quarto e segui-los até o escritório. Eu já sabia o que estava por vir, respirei fundo e os segui.
– Pode ir sentando e falando o que você estava fazendo no quarto da minha irmã enquanto ela estava dormindo. – Luke estava de pé a minha frente, questionando.
– Nós estávamos conversando após os exercícios e ela acabou dormindo. – Respondi, firme.
– E mesmo assim você continuou lá, parado, olhando para ela como se ela fosse sua presa. – Eu já podia prever aquela conversa, e o tom de Luke deixava mais do que claro sua opinião sobre isso.
– Continuei! Ela estava exausta dos exercícios de hoje, temi que ela precisasse de alguma ajuda ao acordar, e já que vocês não estavam em casa, fiquei ao lado dela.
– Você está interessado na minha irmã. – Dean soltou naturalmente, sentado na poltrona no canto da sala.
– Eu sou o fisioterapeuta dela!
– Você é! Mas está interessado nela, ou você acha que nós não percebemos o modo como você olha para ela, como se preocupa, como age ao redor dela? – Dean continuou.
– Você está fazendo mais que seu papel de fisioterapeuta. – Luke bradou – Você vive rondando, só sai dessa casa quando tem algo indispensável para fazer.
– Você não sai nem na sua folga. Está sempre lá, olhando, enchendo ela de esperanças, estendendo a mão! Minha irmã não precisa se decepcionar outra vez. O que você acha que vai acontecer quando esse tratamento acabar e você for embora? – Dean era o mais calmo dos dois irmãos, o mais sensato, mas também o mais duro em suas palavras e o que ele acabara de dizer me atingiu fundo.
– Além disso minha irmã só tem 21 anos, ela é muito jovem, precisa viver. Você é muito mais velho que ela, poderia ser pai dela! – Luke tocou no ponto que eu mais temia. – Mantenha-se afastado dela. Ela não merece sofrer mais do que já está sofrendo com essa lesão.
– Por favor, nos entenda, . já sofreu com um babaca antes. Nós não sabemos o que ele fez, mas sabemos que foi algo que mudou nossa princesa de uma forma radical, e você é um homem maduro e tem sua vida. Ela não vai suportar se você a iludir e depois a enganar. – Dean falou.
– Mas eu não sou o pai dela e não estou aqui para brincadeiras! Eu sou sim o fisioterapeuta dela, mas também sou homem, e sua irmã não é mais uma criança. Nós não temos nada, além da relação fisioterapeuta/paciente, mas se por acaso tivéssemos, isso seria ela quem decidiria. – Falei firme, de cabeça erguida.
Eu sabia que um relacionamento entre nós não seria possível, mas eu não ia abaixar minha cabeça.
Aquela conversa mexeu com minha cabeça mais do que eu gostaria e colocou na minha cabeça que não era para mim.
A noite chegou e eu estava inquieto, sem sono e resolvi ir à academia. Toda aquela ansiedade seria colocada para fora, de preferência descontada no saco de areia. Eu estava passando pelo corredor quando ouvi um resmungo choroso vindo do quarto dela, não resisti e fui até lá ver o que era. estava tendo um pesadelo. Ela resmungava, pedia por favor para não irem embora e chorava. Não resisti, aproximei-me e a tomei em meus braços acalentando-a.
Ela abriu aqueles lindos olhos verdes-castanhos para mim, ainda sonolenta e com lágrimas caindo. Ela estava assustada e me abraçava apertado. Eu estava exercendo todo o meu autocontrole para não a beijar ali mesmo. Mas minha menina me surpreendeu mais uma vez, ela tomou a iniciativa e me beijou. Eu não podia acreditar naquilo, mas sua língua invadindo minha boca e suas mãos quentes no meu rosto me fizeram acreditar. O beijo não foi muito longo porque logo a realidade me atingiu, mas foram os segundos mais intensos da minha vida.
Afastar-me de e deixar aquele quarto foi a coisa mais difícil que eu já fiz na minha vida. Eu não podia imaginar que ela ia me beijar e confesso que fiquei paralisado; mas minha garota não desistiu (eu falei minha garota? Eu só posso estar meio maluco). Ela insistiu e eu não resisti, correspondi e foi maravilhoso. Aqueles lábios macios nos meus, aquelas mãos pequenas tocando meu rosto, acariciando minha barba.
Saí daquele quarto com uma descarga intensa de adrenalina correndo pelas minhas veias, mas meu coração estava triste, porque sabia que havia magoado a minha menina quando me afastei daquele jeito. Contudo, eu sabia que esse era o melhor a se fazer, principalmente depois daquela conversa com seus irmãos.


Capítulo 5


Dreaming of soft cotton clouds
I feel close to you now
Dreaming of candy and chocolate
All the bad girls not allowed


Depois daquele beijo, muita coisa mudou. passou a agir de modo extremamente profissional, e eu vesti meu orgulho e retribuí o tratamento. Agora éramos Senhorita e Senhor o tempo todo, sem toques de mão, sem olhares furtivos, sem conversas extras.
Eu voltei a fazer minha musculação com acompanhamento dele. Meus braços já haviam recuperado tolamente os músculos perdidos, graças a musculação e ao sacrifício de empurrar sozinha aquela cadeira, sim, eu estava no modo megera independente outra vez.
estava cheio de conversinhas ao telefone, não que isso fosse da minha conta (ok, eu estava mesmo prestando atenção em cada respiração do meu fisioterapeuta). Às vezes, ele saía no meio do dia, dizendo que tinha algo importante para resolver e voltava todo alegrinho (certeza que ele estava com alguma mulher linda e que podia ficar de pé). Mas, quando chegava perto de mim, incorporava o senhor muito profissional outra vez. Eu estava com saudades das nossas conversas, das nossas risadas.
Aquela situação estava enfurecendo-me de forma que eu queria dar uns bons socos na cara dele. Poxa! Será que aquele beijo havia sido tão rum assim?

XXXXXXX


O dia foi intenso, voltei à praia com meu pai e meus irmãos, fiz muitos exercícios e comecei a sentir novamente aquela maldita dor nas minhas costas. A noite chegou e eu estava agoniada com aquela dor. Os analgésicos prescritos pelo médico nãos estavam mais fazendo o efeito desejado e a dor me consumia a ponto de eu fazer algumas caretas quando ninguém estava olhando-me, mas percebeu e, quando eu já estava na minha cama, ele veio fazer os exercícios noturnos para minhas pernas.
– Você está com dor, Senhorita ?
– Não! Eu só quero ficar quieta no meu canto. – Eu já estava de saco cheio de tudo, e essa dor estava deixando-me ainda pior.
– Por favor, não minta para mim! Preciso saber se estar com dor, não podemos exagerar nos exercícios.
– Sim, ! Eu estou com dor, estou com raiva e gostaria muito de poder socar a sua cara neste momento!
– Isso é ótimo! Raiva é melhor que indiferença!
– Olha só quem fala de indiferença! Desde aquele beijo, você é só Senhorita para lá, senhorita para cá, sempre frio e muito profissional. Achei que éramos pelo menos amigos! Eu te beijei, você gostou e pronto! Não roubei sua virtude, nem te pedi em casamento. Tampouco vou correr atrás de você. – Falei, apontando para as minhas pernas.
Ele sentou na cama, descobriu minhas pernas e começou os exercícios. Enquanto falava, ele me ajudou a virar de costas e começou a massagear minhas costas, pressionando levemente, fazendo minha dor diminuir.
– Tudo bem, , vamos conversar. Eu gostei, sim, do beijo, gostei mais do que devia. Esses meses cuidando de você me fizeram ver quem você realmente é, e eu gostei muito do que vi. Deixei-me levar por esse seu jeito de menina rebelde. Tentei fugir, fingir que não sentia nada, que não queria nada. Você me encantou, menina, mas eu não posso.
– Por que não? – Perguntei na cara de pau, porque, na verdade, eu estava morrendo de medo da resposta.
Depois de Tyler, eu havia me fechado completamente para o amor, mas com eu me sentia leve para falar, para sentir, eu sentia uma coragem que eu nunca tive.
– Olha para mim, . Se você está achando que é por que você não anda, pode ir parando! Você vai andar, no tempo certo você vai! Olha para nós, a diferença de idade é gritante! Eu sou 17 anos mais velho que você! Vou parecer o velho tarado que seduziu a novinha.
Eu apenas ri. Ri não, eu gargalhei! Eu não conseguia acreditar no que acabara de ouvir. Eu morrendo de medo de ele dizer que eu não servia para ele e tal, ele vem diz que está preocupado com nossa diferença de idade.
– O que foi? Eu contei alguma piada? – Ele me olhou, sisudo.
– Ai, , minha barriga está doendo de tanto rir. Eu aqui pensado zilhões de coisas que você poderia me dizer e você vem me dizer que está preocupado com nossa diferença de idade?
– Isso é sério, . Pense no que sua família acharia disso. Seus irmãos, com certeza, não iam achar nada bom se algo acontecesse entre a gente.
– Por que você está falando isso? Meus irmãos sabem do beijo? O que meus irmãos te disseram? – Perguntei, aflita, mas já ficando enfurecida.
Eu não deixaria ninguém me tirar a chance de ser feliz de verdade.
– Calma, . Seus irmãos não disseram nada. Apenas pense em como seria a reação deles.
– Tudo bem, já entendi, você está com medo! E quanto a essa questão de idade, pode ir parando! Não achei que você fosse tão antiquado ao ponto de se importar com isso. – Ele sorriu para mim e segurou minha perna esquerda perto do tornozelo, e com a outra mão segurou meu calcanhar, girando meu pé lentamente de um lado para outro. Senti um leve formigamento na panturrilha, mas achei que era coisa da minha cabeça.
– Eu não estou com medo, , não por mim! Você ainda é muito jovem e me parece ter um segredo que te mantém a uma certa distância de mim mesmo depois do beijo. Eu não sou moleque, não estou a fim de brincar. – Enquanto ele falava, eu já não me concentrava mais em suas palavras, e sim na sensação em meu pé.
Ele desceu mais a mão, segurando a planta do meu pé e eu senti, senti cócegas, eu me lembrava perfeitamente daquela sensação e comecei a ri.
, não estou entendendo você! Você fala toda séria, e toda vez que eu falo você começa a rir?
, eu senti! Eu estou sentindo! – Eu ria, enquanto lágrimas brotavam dos meus olhos.
– Você sentiu o quê, ? – Ele falou, apreensivo.
– Meu pé! Toque no meu pé outa vez! – Ele tocou e eu senti novamente. – Isso, na planta do meu pé! – Ele tocou novamente e eu ri.
Não era coisa da minha imaginação! Eu senti cócegas de novo.
– O que você está sentindo?
– Cócegas! Eu estou sentindo cócegas e também sinto sua mão, de leve, mas sinto. – Ele continuou massageando meu pé, passou para a perna direita e eu senti a mesma coisa.
Eu ainda estava maravilhada. Nós estávamos sorrindo com essa evolução quando meu quarto foi invadido pelos três homens da minha vida.
– Posso saber o porquê de tanta risada neste quarto? – Luke me deu um beijo na testa e sentou ao lado da minha cama, enquanto papai e Dean sentavam no pequeno sofá perto da porta.
– Boa noite para você também, Luke! Vou ignorar sua grosseria porque eu tenho algo maravilhoso para falar.
– Fale, princesa. – Papai se levantou e se posicionou ao meu lado na cama, enquanto continuava exercitando meu pé de um lado para outro, em modo profissional.
– Eu consigo sentir! Eu sinto quando toca meu pé, eu sinto cócegas.
De repente, o clima tenso do meu quarto se desfez e a alegria não podia ser contida. Meus irmãos comemoravam afoitos, meu pai sorria, enquanto lágrimas de felicidade escorriam de seus olhos.
– Eu sabia, querida, que você ia conseguir! – Ele se virou para , apertou sua mão e disse baixinho. – Muito obrigado, meu rapaz, por não desistir dessa teimosa.
Senti uma certa ambiguidade nas palavras, e apenas dei meu melhor sorriso e uma piscadela para ele, enquanto apertava a mão do meu pai um tanto apreensivo.
– Temos que ligar para o médico e marcar nova consulta para você, . – Dean falou, alheio ao que realmente acontecia naquele quarto.
– Não se preocupe, Dean. Amanhã tenho umas coisas para resolver perto da clínica, aproveito para passar lá e conversar com o médico. Agora a senhorita precisa descansar, foi um dia bastante cansativo e ela estava com algumas dores. – falou, mantendo seu tom profissional.
Todos me deram boa noite e saíram, deixando-nos a sós. Ele me cobriu com o edredom, deu um beijo na minha testa e disse.
– Durma bem, , você precisa descansar. Se sentir dor, não hesite em me chamar. Depois conversaremos melhor. – E saiu do quarto, apagando a luz.

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A minha noite foi bastante atípica. Eu estava eufórico, lembrando das palavras dela: ”Tudo bem, já entendi, você está com medo! E quanto a essa questão de idade, pode ir parando! Não achei que você fosse tão antiquado ao ponto de se importar com isso” . Passei a noite revirando na cama, pensando numa solução para os meus problemas. Eu precisava ser livre para , ela merecia um homem completo, livre!
Aquela menina queria me enlouquecer, só pode. Fiquei muito surpreso ao vê-la falar comigo daquele jeito, expor o que aconteceu com tanta naturalidade. Ela não se importava com a nossa diferença de idade, nem com a opinião dos irmãos. Aquela marrentinha parecia bem-disposta a ser minha de verdade, e eu seria o homem mais feliz do mundo se isso acontecesse. Mas, primeiro, eu precisava resolver a minha vida. Eu não permitiria que nada machucasse minha menina.
Levantei cedinho, tomei meu café da manhã na cozinha e fui até o quarto dela. Ela estava dormindo, tão serena, mas eu precisava falar com ela antes de sair daquele jeito.
, acorda, preciso falar com você. – Falei, passando a mão em seus cabelos que, antes do acidente eram curtos, e agora estavam compridos, quase chegando a cintura.
– Hum... Deixe-me dormir. – Ela gemeu.
– Vamos, , por favor, acorda! É sério, precisamos conversar antes de seus irmãos acordarem. – Insisti e ela sentou-se lentamente na cama, esfregando os olhos.
– O que foi? Aconteceu alguma coisa? – Ela perguntou, sonolenta.
– Responda-me uma coisa! – Ela se ajeitou melhor na cama, encarando-me curiosa. – Você quer mesmo se relacionar comigo?
– Como assim? Relacionar como?
– Ser minha namorada, . De verdade.
– Sim, e você? Quer mesmo ser meu namorado? – Ela rebateu.
– Quero, . Você virou minha cabeça, e não consigo pensar em outra coisa senão ter você para mim. Mas, primeiro, eu preciso resolver umas coisas, preciso que você me espere.
– Como assim esperar? Para onde você vai?
– Vou sair, preciso resolver uma coisa antes. Assim que voltar, nós resolvemos tudo de uma vez.
– O que aconteceu? Eu não estou entendendo nada. – Ela me olhava, querendo explicações.
– Calma, minha menina. – Falei carinhosamente, tocando o rosto dela, e ela pareceu se acalmar. – Preciso resolver uma coisa antes, é muito importante. Mas volto o mais rápido que puder. Serão só alguns dias, eu prometo.
– Você não pode ir comigo? – Ela perguntou, maliciosa.
– Infelizmente, não, mas falarei com seu médico assim que puder, inteirando-me de tudo. – Dei um selinho nela e seu rosto se iluminou com um sorriso lindo. – Seja uma boa menina, vá a consulta e logo estarei aqui com você.
– Promete?
– Prometo, agora me dá um beijão daqueles, porque eu vou sentir saudades. – Ela não me decepcionou, beijou-me com paixão, e tive certeza de que eu queria muito aquela menina para mim o mais rápido possível.
Eu, um homem de 38 anos, estava me sentindo um adolescente idiota, apaixonado por uma garotinha e escondendo as coisas dela.
Rachel havia voltado! Parece que sua vida com o traidor do meu irmão não havia dado muito certo, e depois de todos esses anos e dois filhos, eles se separaram, e ela resolveu que voltaria para mim. Sim, ela achava que eu ainda estava esperando por ela e resolveu que tinha o direito de me importunar até eu aceitá-la de volta.
Ela começou mandando-me mensagens, que viraram telefonemas insistindo em me ver. Mas ela não desistiu, e vê-la rondando a casa de , fez-me dar uma chance para que ela falasse mesmo eu não querendo ouvir o que ela tinha a dizer.
Saí da casa de determinado a resolver de vez esse problema. Eu conhecia Rachel e sabia que, se não a recebesse, ela importunaria com mentiras, e isso estava fora de cogitação. Cheguei ao local combinado e me preparei para aquela conversa.
Às nove horas da manhã em ponto, ela apareceu num vestido curto e exageradamente justo. Ela ainda era uma mulher muito bonita e sensual, o tempo só a fez bem. Convidei-a a sentar, mas ela permaneceu de pé em seus saltos muito altos, como se esperasse que eu admirasse seu visual.
– Você não vai sentar? – Perguntei, sem paciência.
– Calma, . Você já foi mais gentil. – Ela respondeu, sinuosa.
– Não vim aqui para ser gentil, vim para conversarmos. Afinal, foi para isso que você me importunou.
– Ok, vamos conversar civilizadamente. – Ela sentou-se e chamou o garçom.
– Seja direta e rápida, eu tenho compromisso. – Falei, pedindo uma água ao garçom.
, eu estou arrependida do que eu fiz com você. Eu quero voltar para você! – Ela foi categórica.
– Você só pode estar maluca! O que te faz pensar que depois de tudo e de tanto tempo eu vou voltar para você? – Perguntei, admirado com a cara de pau daquela mulher.
– Eu sei que fui errada, mas me entenda, . Você estava numa cadeira de rodas, que futuro eu teria com alguém assim? – Eu não podia acreditar no que aquela maluca estava dizendo. – Seu irmão tinha mais a me oferecer...
– Mas agora ele resolveu oferecer mais à outra pessoa e você achou que eu seria imbecil o suficiente para cair na sua conversa mesmo depois de tantos anos. – Interrompi-a.
– Meu amor, escute-me! A gente se dava tão bem, éramos um casal lindo, perfeito. Você voltou a andar, a trabalhar, você agora é fisioterapeuta daquela lutadora famosa, querido! Temos tudo para ser felizes outra vez.
– Você só pode estar louca, você matou tudo o que eu sentia por você no dia em que me traiu. Não venha me dizer que ainda me ama, porque você nunca me amou. Você está apenas interessada no meu dinheiro e na carreira que eu construí... – Levantei-me da cadeira. Eu não podia mais ouvir as sandices daquela mulher. – Volte para o seu marido e seus filhos e me deixe viver em paz, eu amo outra mulher e é ela que eu quero.
De repente, ela levantou da cadeira e me beijou. Antes que eu pudesse tirá-la de cima de mim, eu ouvi foi aquela voz que fez meu coração bater mais forte e meu corpo tremer pela situação em que eu me encontrava.
– Então era essa a coisa que você tinha para resolver? Beijar outra mulher? – estava ali em sua cadeira de rodas, acompanhada de seu pai e seus irmãos.
, escute-me. – Pedi, mas fui interrompido por Rachel.
– Não acredito que você se apaixonou pela sua paciente. Uma aleijada, ? Isso é o que? Caridade? É para curar a dor que você sentiu quando eu te abandonei? – Rachel era cruel.
– Chega, Rachel! Vá embora! Você já fez o que queria, mais uma vez estragou minha vida, vá embora. – Bradei.
– Ir embora? E deixar você com essa mulher? Olha para ela , é por uma aleijada musculosa que você vai me trocar? Ela nem sequer pode andar. Olha para mim, linda, madura, é por ela que você me trocar? Por uma ninfeta que mais parece um moleque com o cabelo comprido, e ainda por cima aleijada?
– CHEGA! – gritou, enquanto todos olhávamos estarrecidos com as palavras de Rachel. – Pai, tire-me daqui, preciso voltar para casa.
– Olha aqui sua louca, pouco me importa que você fique com esse daí, mas deixe a minha irmã em paz. – Luke se aproximou furioso de mim. – E você seu canalha, nunca mais se aproxime dela, não esqueça o que conversamos. – E deu um soco na minha cara.
Eu poderia revidar, mas a dor que vi nos olhos de me fizeram recuar. Apenas segurei meu queixo na tentativa de diminuir a dor e me ajoelhei aos pés de .
, minha menina, deixe-me explicar. – Supliquei.
– Você está demitido! – Foi tudo o que ela disse, olhando em meus olhos, e foi levada dali por Luke.
– Depois passe no escritório para acertamos tudo! – Dean falou.
– Não se preocupe, meu rapaz, espere ela se acalmar. Tenho observado vocês e ouvi a conversa de vocês pela manhã. Confio no seu sentimento por minha filha. – O pai dela deu um tapinha nas minhas costas. – Resolva seu problema e afaste essa mulher da minha filha.
– Eu quero que você suma da minha vida de uma vez por todas, e se eu souber que você se aproximou de ou sequer olhou para ela, eu esqueço que você é mulher e acabo com você. – Ameacei Rachel, que foi embora com o rabinho entre as pernas.
Isso tudo só aconteceu por que eu tive medo, medo do que sentiria quando reencontrasse aquela mulher, medo de fraquejar, medo de magoar . E esse medo acabou por me afastar da minha menina, da mulher que agora eu tinha realmente certeza que amava.
Durante todo aquele mês, eu corri atrás de , e no mês seguinte também. E ela nunca me recebeu. Consegui conversar com seus pais e com seus irmãos, expus tudo o que sentia e o quanto eu queria fazer feliz, ver o seu sorriso novamente.
Ela contratou outro fisioterapeuta que, por sinal, era meu amigo. Eu passei para ele todo o meu plano de tratamento sem que ela soubesse, e ele deu continuidade. Fiquei na minha por uns dias, eu precisava pensar e bolar uma nova estratégia de como reconquistar a minha menina.


Capítulo 6


And he says as he thinks I'm sleeping
He whispers "Girl, you are the one,
Never thought I could feel this way,
Girl, you made me believe"


Dispensar partiu meu coração, mas a cena que vi antes esmagou mesmo. Vê-lo com aquela mulher me fez relembrar o que acontecera antes com Tyler. Essa era a segunda mulher que falava sobre a minha aparência. Eu era uma mulher como outra qualquer, o fato de ser lutadora apenas moldou meu corpo para tal. Eu não era tipo fisiculturista, que aliás não tenho nada contra. Cada mulher tem direito de ter a forma física que quiser, e eu tinha a minha.
Quando chegamos em casa, fui para o meu quarto, e meus amores vieram junto comigo, eles me mimaram. O Luke esculachou com , mas eu já podia esperar isso dele, afinal, ele era o esquentadinho da família. Dean me dava todo apoio para qualquer decisão que eu tomasse e me perguntou várias vezes se eu queria mesmo demitir o , principalmente agora que o médico havia autorizado os exercícios de tentativas para ficar de pé. Mas fui irredutível, e um pouco mimada talvez.
Assim que meus irmãos saíram do quarto, papai fechou a porta, levou-me até o espelho e me perguntou o que eu via. Eu via uma mulher de braços fortes, com bíceps definido, costas um tanto largas, mas com musculatura densa, rígida. O médico mesmo disse que isso me ajudou muito a não sofrer uma lesão mais grave. Uma barriga trincada por horas de treinos, e pernas fortes que, em breve, estariam de pé.
– Filha, você não é uma aleijada! Olhe para você! Você não é masculina, você é linda, especial e única. Não deixe que nenhuma outra pessoa, além de você, dizer o que você é ou o que tem que ser. Quem te amar, vai amar exatamente como você é. Dê o tempo ao rapaz, ele realmente ama você. Eu pude ver isso nos olhos dele.
Eu nunca quis ser malhada, eu magra ou gorda, nada; eu nunca liguei para isso. Meu corpo é uma consequência do que eu sou, da forma como vivo, e não aceito ser julgada por isso. Se os homens queriam outro tipo de mulher, eles que procurassem. Mas, como toda garota, no fundo, eu buscava aceitação, e era por isso que a opinião de outras pessoas, principalmente de outras mulheres, machucavam-me tanto. Nós não deveríamos ser unidas? Aceitar e ajudar umas às outras? Mas, infelizmente, não era assim, muitas mulheres eram machistas, cheias de padrões e muito cruéis com as que não conseguiam se encaixar.
Mas ali, ao lado do meu pai, o homem que me criou sozinho depois que a minha mãe nos abandonou, o homem que sempre esteve do meu lado, eu via outra , uma capaz de lutar, levantar daquela cadeira e ser o que sempre fui: uma lutadora! E esse era o meu plano.
E eu lutei. Em três meses, eu estava de pé com auxílio de um andador. Meus passos eram lentos, mas decididos, e eu iria mais além. Nesse tempo me procurou, mas fui categórica em me recusar a vê-lo mesmo meu coração morrendo de saudades.
Dediquei-me a minha recuperação com toda força e obstinação que eu tinha, e só encontraria com ele depois que eu encontrasse comigo mesma; depois que eu me curasse dessa insegurança e me sentisse pronta para me entregar a ele por inteiro, pronta para ser vista como meu corpo exatamente como era: rígido, com músculos definidos e marcas de uma vida dedicada ao esporte que eu tanto amo e que me trouxe tantas alegrias.
E eu levantei, saí daquela cadeira, abandonei o andador e, por último, a muleta. Perdi a Olimpíada, pois não me recuperei a tempo. No dia do meu aniversário de 22 anos, eu estava voltando da minha última consulta antes de voltar com tudo para o boxe. O médico tinha me liberado para iniciar os treinos pesados. Eu estava distraída ao lado do Dean, sorrindo com as boas notícias quando eu o vi. Ele estava lindo, sua barba estava maior. Estava um pouco frio e ele usava uma jaqueta de couro meio envelhecida, deixando-o com um ar sexy e misterioso.
– Boa tarde. – Ele nos cumprimentou.
– Boa tarde. – Eu e Dean respondemos juntos.
– Como vai, ? – Perguntou Dean. – Pensou no que conversamos?
– Sim, mais tarde te dou minha resposta. – Ele respondeu e virou as costas.
– Que conversa? – Olhei pra Dean e perguntei desconfiada.
– Coisas profissionais, irmã! Agora vamos para casa, temos que contar para o pai e para o Luke as novidades.
Antes de chegarmos em casa, Dean parou numa loja para comprar uma camisa nova. Não estranhei, pois meus irmãos eram a dupla mais vaidosa que eu conhecia. Ele me fez assisti-lo provar várias camisas, até escolher uma totalmente branca e igual as que ele já tinha. Olhei para ele, levantando a sobrancelha.
– O que é? Camisa branca nunca é demais! – Ele respondeu, rindo, e fomos para casa.
Chegamos em casa e as luzes estavam apagadas. Segundo Dean, papai e Luke haviam saído e voltariam mais tarde para sairmos para jantar e comemorar meu aniversário. Mas, assim que entramos na sala, as luzes se acenderam e lá estavam eles segurando um bolo cheio de velas, acompanhados de alguns amigos e amigas nossas, só os mais íntimos, e .
Sim! Ele estava lá, lindo do mesmo jeitinho que eu vira na clínica. Um a um, todos vieram me cumprimentar, não só pelo aniversário, mas também pela recuperação. Eu continuava falando e sorrindo para todos, mas meu coração vibrava na expectativa de ser cumprimentada por ele. Até que meu pai e meus irmãos se aproximaram de mim, seguidos por .
– Parabéns, pirralha! – Luke me abraçou apertado, girando-me pela sala.
– Você nunca vai parar de me zoar? – Perguntei para ele.
– Nunca! – Ele respondeu com seu sorriso gigante.
Eu amava demais aquele maluco.
– Irmã, feliz aniversário! – Dean me puxou dos braços de Luke. – Sai, idiota, agora é a minha vez! Parabéns, princesa, eu estou feliz demais por você!
– Filha, feliz aniversário. – Papai tomou o lugar de Dean e eu me perguntava se eles me amavam ou queriam me sufocar com tanto aperto. – Eu e seus irmãos conversamos com seu médico e nos reunimos para te dar um presente.
– Foi complicado, mas chegamos a um acordo. Embora eu deva dizer que manterei a guarda o tempo todo. – Luke falou e eu fiquei confusa.
– Do que você mais precisa agora irmã? – Dean perguntou com uma cara de quem estava aprontando.
Meu Deus, eu não podia acreditar. Eles sabiam que o que eu precisava era de um bom treinador. Eu havia perdido tudo, treinador e patrocínios, depois do acidente, e só poderia voltar aos ringues se tivesse um bom treinador.
– Um treinador! – Respondi ainda sem entender o que fazia ali.
– Então, conheça seu treinador. – Luke falou, apontando para . – E que fique claro que estarei de olho.
– Filha, conversamos com , ele aceitou ser seu treinador! – Papai falou, avaliando minha reação.
– Isso, parabéns aos dois. Agora se entendam! – Dean falou, rindo e saindo dali junto com os outros, deixando-me a sós com .
– Parece que você não gostou muito da ideia. – falou, com as mãos no bolso de trás da calça, aproximando-se de mim.
– Ainda estou tentando entender o que está acontecendo. – Respondi.
– Vamos ao escritório, precisamos conversar. – Não respondi, apenas o segui.
Eu estava pronta para conversar e também não queria esperar mais.
Chegamos ao escritório, ele trancou a porta e sentou na poltrona em frente à estante, apontando para que eu me sentasse na outra. Sentei e, por alguns minutos, permanecemos calados, olhando-nos. Até que ele quebrou o silêncio.
, sei que você deve estar sem entender nada mesmo, mas tenho acompanhado seu tratamento à distância e estou imensamente feliz pela sua total recuperação. Sei também que você pode voltar a treinar, seus irmãos conversaram comigo e, na verdade, eu me ofereci para treinar você. Não vou ser hipócrita e dizer que quero apenas te treinar. Não! Quero me aproximar de você novamente, mas se você não quiser, é só dizer que vou embora. Eu só preciso que você me ouça.
– Uau, por essa eu não esperava. Estou mesmo precisando de um treinador com experiência, mas nunca imaginei que esse seria você. – Fui sincera.
– Eu sei, sei também que você sabe que já fui lutador, mas o que você não sabe é que eu também lesionei minha coluna e tive que parar de lutar. – Ele começou a me contar sua história, e eu não conseguir nem piscar os olhos, só percebi que estava prendendo a respiração quando ele segurou minhas mãos entre as dele.
Ele me contou tudo sobre o acidente, sobre Rachel, sobre como ele se tornou fisioterapeuta e até da conversa que ele teve com meu pai e meus irmãos antes, e depois quando eles aceitaram que ele me procurasse e apoiaram seu amor por mim, mesmo com nossa diferença de idade. Eu queria chorar, jogar-me em seus braços e dizer tudo bem, mas precisava agir como uma mulher madura e mostrar que eu realmente havia amadurecido e mudado.
– Eu nem sei o que lhe dizer, . Na verdade, eu peço desculpas por não ter te ouvido antes, mas esse tempo longe de você me fez curar feridas antigas que me impediam de abrir completamente meu coração. Eu precisava me entender, amadurecer e deixar de me machucar com a opinião das pessoas. O que sua ex me disse reabriu um buraco que estava fechando-se em meu peito, mas graças a Deus eu superei. Lutei por mim, pela minha vida, pela minha recuperação. E eu já sabia que você foi lutador, aliás, um ótimo lutador, e ficarei honrada em ser treinada por você.
– Você não sabe o quanto estou feliz em ouvir isso, mas tem algo que me deixaria ainda mais feliz.
– O que? – Perguntei.
– Ser seu namorado! Você aceita namorar comigo? Aceita namorar um homem mais velho que teve medo de contar que a ex estava de volta, que se encantou pela jovem lutadora, mimada, teimosa, mas forte, determinada e prestes a voltar a ser campeã de boxe?
, eu sempre te aceitei do jeito que você é, sua idade não é nada para mim. Não ache que você me escondeu algo, porque não penso assim, eu só não esperava ver outra mulher beijando você! Todos têm seus segredos, seus medos, suas inseguranças, o que a gente precisa é se sentir completo consigo mesmo, só assim a gente pode transbordar um ao outro. Foi isso que eu fiz, eu me completei, reencontrei-me, entendi-me. Meu pai me ajudou a ver em mim algo que eu não via há muito tempo, e se você está pronto para mim, eu também estou pronta para você.
Ele não esperou mais nada, tomou-me em seus braços e me beijou. E nossa! Como eu estava com saudades daquele beijo quente, intenso, saudoso.


Capítulo 7


Though I'm a little scared / embora esteja um pouco assustada
That all the times we shared/ que todos os momentos que compartilhamos
Almost too perfect to ever last / quase tão perfeitos para durar
And when I'm lying here/ e enquanto eu estou deitada aqui
And you are holding me/ e você está me abraçando
I know the fear in me will pass/ embora o medo em mim vá passar


Embora estivesse morrendo de medo, eu estava pronta. Eu havia conseguido: voltei a andar e treinar, e hoje seria a minha primeira luta após o acidente.
Dois anos atrás, eu estava em cima de uma cama, sem esperanças, achando-me uma inútil. Acreditando que ninguém jamais ia me aceitar como sou, que ninguém ia olhar para mim. E hoje estou aqui, de roupão, cabelo trançado, prestes a subir naquele ringue e voltar a fazer uma das coisas que eu mais amo na vida, que é lutar.
Olhando para trás, eu vejo o quanto eu mudei, o quanto evoluí. Passei de uma menina assustada a uma mulher confiante, segura de suas qualidades e feliz com o que vê quando se olha no espelho. foi muito importante durante todo esse processo. Todo seu carinho, seu cuidado, fizeram-me ver que as pessoas são diferentes umas das outras, que cada um é único e que eu não posso viver em função do meu passado ou de algo ou alguém que me machucou.
Ele foi um treinador incrível e não me deu descanso, treinamos duro até eu estar completamente pronta. Alguns patrocinadores voltaram a procurar-me, e eu estava voltando aos ringues. Dean marcou minha primeira luta e eu me sentia como da primeira vez que subi no ringue, só que mais decidida, mais focada.
Finalmente, ouvi meu nome ser anunciado no ringue. Dei aqueles famosos pulinhos de aquecimento e deixei meu roupão cair ao pé do ringue. Agachei para passar pelas cordas e entrei ali. A sensação de estar de volta era incrível, ouvir todas aquelas pessoas torcendo por mim. Olhar para a plateia e ver meu pai e meus irmãos ali, dando-me força. No canto do ringue, um homem lindo, meu fisioterapeuta, meu treinador, meu namorado. E ali dentro do ringue, prestes a enfrentar minha adversária, estava eu, completa, feliz e pronta para ganhar essa luta.
A luta foi difícil, mas eu estava preparada e com sede de vitória, foram quatro rounds de dois minutos cada, como manda o regulamento, e venci por 10 a 7, o que, tecnicamente, significa que me mantive a liderança em todos os rounds. A multidão me ovacionava, e a adrenalina corria solta por minhas veias. Eu era novamente campeã e já começava a pensar nos próximos Jogos Olímpicos!
Assim que os juízes deram tudo por encerrado, minha família entrou no ringue e foi uma chuva de abraços e comemorações. Fomos para casa, e depois de muita comemoração, fui para meu quarto. tinha voltado para a minha casa, porque eu inventei que precisava dele perto, mas dormia no quarto de hóspedes sob a supervisão dos meus irmãos.
Tomei um banho quente; vesti uma camisa de que eu havia pego escondido. Esperei todos irem dormir e saí descalça, caminhando na ponta dos pés. Fui até a cozinha e peguei uma garrafa de vinho e duas taças, e andei sorrateiramente até o quarto de , que para a minha alegria estava com a porta destrancada.
Entrei discretamente, deixei o vinho e as taças no criado-mudo, tirei a camisa e minha peça íntima e entrei embaixo do edredom, aconchegando-me ao meu namorado, que fingia que estava dormindo e sorriu quando sentiu meu corpo colado ao dele.
– Eu estou pronta, , completamente pronta! Pronta para mim, pronta para você. Quero ser sua, completamente sua. – Falei ao seu ouvido.
– Achei que você nunca teria coragem de fazer isso, mas vejo que está saindo-se uma menina muito danadinha. – Ele falou, sorrindo e virando-se para mim.
– Huum… – Murmurei. – E o que esse velhote vai fazer comigo? – Perguntei, ousada.
– Vem cá que eu vou te mostrar o que esse velhote é capaz de fazer. – E realmente ele me mostrou, amou-me como eu sempre quis ser amada.
O dia já estava amanhecendo, e eu estava caindo no sono. Éramos só um emaranhando de braços e pernas, nus, num abraço forte, quente. E depois de tudo, eu percebi que não há nada melhor que amar a si mesmo, e que ser amado é apenas uma consequência do amor que sentimos por nós mesmos. Percebi que me conhecer, aceitar-me, amar-me foi o primeiro passo para me sentir bem dentro do abraço que eu sempre esperei.

Hold me in your arms
'Cause I'm falling
Hold me in your arms
While we're sleeping
Hold me in your arms


Fim.



Nota da autora: Oi pessoas lindas que leram esta fic! Espero que tenham gostado, porque não foi muito fácil escrevê-la. Foi pc que travava, notícias tristes na família, prazo de entrega vencido, mas saiu! E lembrem-se: vocês são muito especiais exatamente como são, nunca deixe que lhes façam acreditar no contrário. Nunca desistam dos seus sonhos.
Beijos e até a próxima.



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