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Última atualização: 23/03/2021

Parte I

Os dois comiam em completo silêncio, era difícil ter qualquer diálogo com Denis há muito tempo. culpava-se por não saber ao certo quando tudo aquilo começou, os dois pareciam completos estranhos dividindo o mesmo teto.
– Como foi seu dia de trabalho? – ela tentou um diálogo.
– Bem. – Denis foi sucinto, mexia em algo no celular, não tinha se dignado a devolver a pergunta a ela.
– Ok… – suspirou fundo, de repente a vontade de comer havia passado, sentiu um gosto amargo na boca. – Eu estou bem também, obrigada por perguntar.
– Desculpa. – respondeu de forma automática.
– Quem é no celular? – Denis levantou o olhar, finalmente encarando .
– É do trabalho. – mais uma vez havia sido monossilábico. Voltando sua atenção ao aparelho.
– E não pode esperar você terminar de comer seja lá quem for a pessoa? Não é adequado, na hora de nos alimentarmos…
– Ah, , dá um tempo, não vem dar uma de médica comigo não, seus pacientes você atende das 09:00 às 17:00. – ela soltou o ar de seus pulmões de uma vez, desgastada. Não sabia como ainda estava aguentando tudo aquilo.
– Primeiramente, você é mulher? Acho que não, não é? – foi irônica, já que era ginecologista. – Então eu não estou fazendo uma consulta com você, Denis, estou te dando uma dica apenas. Você… – se cortou, soltando o ar pelos lábios.
– O que, ?
– Nada. – Ela mordeu os lábios, resolvendo falar. – Quer dizer, é só que eu não sou nem digna da sua atenção, você levantou o olhar por dois segundos em minha direção, e depois voltou a ser monossilábico.
– Estou trabalhando – revirou os olhos, voltando o olhar ao aparelho celular.
– Você parece um capacho do seu chefe – ela explodiu.
– Você conseguiu, , eu perdi o apetite – ele jogou o guardanapo em cima da comida.
– Eu só queria conversar com você, Denis. O que eu te fiz, me fala? Eu preciso entender.
– Eu quero o divórcio! – ela arregalou os olhos, surpresa.
– Quê? – a médica engoliu seco, um bolo se formando em sua garganta.
– É isso que você ouviu, não dá mais, acabou!
– Então depois de jurar amor eterno na cerimônia do nosso casamento eu me resumi a isso, nem uma explicação eu mereço? Muito obrigada.
– Eram outros tempos, . A gente não está mais dando certo, e você sabe disso.
– A gente pode tentar alguma coisa, sei lá, você está sendo radical, Denis, olha, todos os relacionamentos passam...
– Eu não te amo mais. – ele gritou, a assustando. Ela levou as mãos à boca, desnorteada.
– Como assim? – soprou as palavras depois de um longo silêncio.
– Não. Te. Amo. – ele parafraseou e ela sentiu a garganta se fechar em um nó. Aquilo doía muito.
– Um amor como o nosso não morre assim tão bruscamente, a não ser que… não, ou… – ela mordeu os lábios, segurando a vontade de chorar. – Você está com outra pessoa? – soprou as palavras.
– Sim, estou apaixonado. – Eu estou apaixonado… as palavras ecoavam em sua cabeça. – Eu tentei, juro, mas não consigo mais sentir nada por você. – mais uma facada.
– E você ia continuar me traindo se eu não te forçasse para termos essa conversa agora? – ela não conseguiu segurar mais as lágrimas que começaram a rolar de seus olhos.
– Eu ia te contar em respeito a tudo o que vivemos, eu só não consegui antes, não tive oportunidade.
– Desde quando? – ela fungou, limpando as lágrimas com força de seu rosto. – Desde quando você me trai?
– Quase seis meses. – apertou os olhos, aquilo estava doendo demais. – Eu não queria te trair, você é uma boa pessoa, mas foi inevitável, aconteceu.
– Eu não quero mais ouvir nada. – ela soprou as palavras. – Você vai ter seu divórcio, fica tranquilo.
– Ok. – ele sorriu, um pouco desconcertado. – Na verdade, como esse apartamento é meu, , eu o adquiri antes de casarmos, você precisa sair dele. – ela balançou a cabeça, e riu. Ela simplesmente gargalhou alto perante a fala dele. Ainda rindo, ela se levantou da mesa. – Você não precisa ir agora, eu te dou alguns dias e… – ela pegou o copo de suco e jogou na face dele.
– Eu tenho nojo de um dia ter me apaixonado por você. Enfia esse apartamento no seu rabo. – ela depositou o copo com força em cima da mesa, e subiu as escadas, o deixando sem reação. Pegou uma mala grande dali e foi depositando suas roupas com fúria. – Idiota, você é muito idiota, . – ainda chorava, enquanto fazia a atividade. – Vendeu seu apartamento para ter que passar por isso. Imbecil! – pegou mais roupas e foi colocando ali. Sua cabeça fervilhando, não sabia o que faria, ou para onde iria, ela só precisava sair dali, estava a ponto de sufocar. Terminou de colocar as roupas, e se sentou em cima da mala para conseguir fechá-la. Pegou uma mochila e enfiou os itens de higiene pessoal que precisaria usar, seria o que ela conseguiria pegar naquele momento. O resto ela teria que buscar depois. Saiu do quarto, puxando a mala e com a mochila nos ombros.

– Vou pedir que busquem o restante das minhas coisas, incluindo a televisão, alguns itens na cozinha e o meu closet. Coisas que eu comprei antes de nos casarmos! Já que é assim que vamos agir agora.
– Eu já disse que você não precisa sair assim, esta tarde.
– Não fico mais nenhum minuto na sua frente, ok? – ela suspirou fundo. Abriu a porta com certa dificuldade. – Vou levar essa porcaria de chave, porque ainda tenho coisas aqui. Que você tenha uma vida bem infeliz! – bateu à porta assim que colocou os pés no hall. Para sua sorte o elevador estava parado em seu andar, então ela desceu rapidamente por ele. Tudo o que veio em sua mente foi o nome de Melanie, sua melhor amiga, e seria para lá que ela iria, ao menos naquele momento.


Parte II

– Amiga, eu não entendi nada da sua mensagem, o que houve? – Melanie questionou, alarmada. jogou os braços pelos ombros da amiga. Não se sabe por quanto tempo elas ficaram abraçadas assim na porta da casa de Mel, soluçava de tanto chorar. A médica foi se acalmando gradativamente e as duas entraram na casa e se sentaram no sofá.
– Acabou. – As palavras saíram dolorosas dela. – Meu casamento acabou. – Melanie afagou o ombro da amiga, tentando confortá-la.
– Como assim, o que meu irmão fez? – por ironia do destino Melanie era irmã de Denis, e por ela e ele se conheceram.
– Seu irmão tem um caso com outra pessoa há seis meses.
– Ah, meu Deus! – passou a mão no rosto. – Filho de uma puta! – Melanie se levantou do sofá, brava. – Jogou tudo fora por um rabo de saia? Sinto muito, amiga, você não tem ideia do quão arrependida eu estou por ter apresentado vocês dois há oito anos.
– Está tudo bem, você fez na maior das intenções, ninguém poderia imaginar. – ela fungou, limpando as lágrimas. – Ele me expulsou de casa, Mel, é como se tudo o que tivéssemos vivido fosse nada.
– O quê? Ah, não, , ele passou dos limites! Ele vai me ouvir.
– Por favor, não fala nada agora, tudo o que eu preciso é do colo da minha melhor amiga. – fez um biquinho, que desarmou completamente Melanie.
– Vem aqui. – chamou a amiga, que deitou a cabeça no colo dela, e mais uma enxurrada de lágrimas se iniciaram.

🌎

Já haviam se passado um mês desde a separação de e Denis, ela estava vivendo, mas a falta dele ainda mexia muito com ela, tudo era ainda muito novo, afinal foram oito anos vivendo com a mesma pessoa, não lembrava como era dormir sem alguém ao seu lado. continuava morando com Melanie, por insistência da última, mas evitou qualquer contato com a família da amiga, não estava pronta para conversar com ninguém.
Naquele tempo em que esteve na casa da amiga, ela sentia que precisava de algo que balançasse sua vida, mas dessa vez de forma positiva, até encontrar sua motivação em um canal de televisão pago assim que chegou em casa depois de um dia de trabalho na clínica. Sempre fora algo que ela tinha curiosidade para participar, mas devido ao desprendimento, havia deixado aquela ideia para lá. Passou por um processo seletivo rigoroso, mas teve sua resposta positiva.
Não havia contado nada a Melanie, decidiu que contaria apenas quando fosse aprovada, para não criar falsas expectativas para ela, ou para a amiga.
– Médicos pelo mundo? De onde surgiu essa loucura? – Melanie encarava a amiga, incrédula.
– Eu sempre tive vontade, mas eu me apaixonei e casei com aquele traste do seu irmão, sem ofensas, Mel... – a amiga deu de ombros, concordando. Os dois irmãos estavam conversando somente o necessário, Melanie deu uma bronca daquelas no rapaz e mesmo pedindo que ela não tomasse suas dores naquela situação, ela tomou. – Eu vi um comercial, e o sentimento veio com tudo, então eu fui atrás de realizar.
– Mas você já se inscreveu?
– Sim, passei por um processo seletivo rigoroso, mas eles me aceitaram, e agora eu faço parte do time.
– Ah, meu Deus, ! E você só me conta isso agora!? – deu um empurrão de leve na amiga.
– Não queria criar falsas expectativas em mim, e muito menos em você. – suspirou. – Demorou muito para que eu conseguisse passar.
– Tem certeza que embarcar nisso te trará algum benefício nesse momento? – sorriu, assentindo. – Amiga, não vai ser fácil, só de olhar a propaganda me deixa mal...
– Melanie, eu sei, eu sei mesmo, mas eu preciso mesmo desse desafio… – ela sentiu os olhos marejarem, suspirou fundo, não queria se lembrar de Denis, mesmo que tivesse superado, ainda doía. – É uma experiência que vai me ajudar muito como ser humano.
– Eu estou aqui, e não vou sair do seu lado, meu bem. – Melanie entrelaçou sua mão com a da amiga.
– Sei que não quer que eu vá por tudo o que acha que vou passar, mas eu preciso disso. – Melanie fez um biquinho, mas concordou, iria apoiá-la no que ela quisesse.
– Como funciona?
– Vou ficar em missão por oito meses na Haiti.
, meu Deus, aquele país é extremamente pobre. – a médica assentiu. – Eu vou sentir tantas saudades! Nunca ficamos longe tanto tempo uma da outra.
– Eu sei… Meu coração sangra por isso, mas amiga, eu quero tanto.
– Então vá. – a abraçou apertadamente.


Parte III

prendeu o ar assim que percebeu que o avião aterrissou no Haiti, era um desafio e tanto que tinha proposto a si mesma, mas com certeza seria emocionante. Desceu do avião, ainda um pouco nervosa, foi até o desembarque, pegou sua mala, e foi andando pelo aeroporto, sabia que alguém viria lhe buscar, então foi procurando pelos inúmeros cartazes até achar um com seu nome. Caminhou em direção a mulher que o segurava, teria que colocar o inglês para trabalhar a partir daquele momento, mais um desafio.
– Olá! Sou a Mendes.
– Oh, então é você. Olá, , me chamo Consuelo, sou enfermeira do projeto e vim te levar até o nosso alojamento. Seja muito bem-vinda. – abriu um grande sorriso a ela.
– Obrigada. – ela sorriu, um pouco tímida. Percebeu que a moça também não tinha o inglês como sua língua materna e lembrou-se que o programa reunia pessoas de todos os lugares do mundo por um objetivo em comum: trabalhar por amor.
– Você veio de onde, ? – começaram a caminhar para a saída do aeroporto.
– Eu vim do Brasil.
– Somos vizinhas – brincou, sorrindo de forma terna. – Vim do Uruguai.
– Poxa, que legal. – ela sorriu junto, mesmo que não fossem do mesmo país, era bom encontrar alguém latino como ela.
– No acampamento você verá que tem pessoas de todas as nacionalidades, espero que goste muito de estar nessa conosco. – saíram do aeroporto.
– Tenho certeza que sim. – sorriu, confiante.
As duas embarcaram em um veículo com a marca d'água do projeto, Consuelo lhe explicou que eram vários profissionais da saúde alocados em um único dormitório, dois banheiros para todos, e havia revezamento para cozinharem. Em média eram 10 a 15 pacientes por dia, e como ela já imaginava, ela não seria apenas ginecologista, ajudaria em partos, e em obstetrícia.
Não demorou mais do que 15 minutos para elas estarem em frente ao local, era uma velha casa grande. Os olhos de não paravam de se movimentar conforme ela adentrava cada cômodo, seria ali que passaria 9 meses de sua vida. Respirou fundo, entrou no único quarto, e havia alguns profissionais por lá.
– Oi, gente. É bom que estejam todos aqui, assim a apresento de uma vez. Esta é a Mendes, veio do Brasil, e passará os próximos 9 meses conosco. – a ginecologista acenou de forma educada.
– Oi, , me chamo Raika, sou alemã, é um prazer conhecê-la. – estendeu a mão para ela, que a apertou. – Sou endocrinologista.
– Ei, , meu nome é Juan, sou mexicano, e atuo como enfermeiro. – ela assentiu, também apertando a mão do rapaz.
– Julie. Sou clínica geral. – sorriu para moça. – Nasci nos Estados Unidos.
– Eu sou o , pediatra e o médico responsável por essa unidade. – ele abriu um sorriso fechado, ela o imitou. – Sou brasileiro também. – Ficou feliz com aquela notícia, era bom ter um conterrâneo, iria perguntar de qual estado ele era, mas não percebeu abertura alguma, e decidiu deixar para lá.
– Bom, prazer em conhecê-los, sou ginecologista, mas vocês já devem saber. – eles assentiram. – Eu estou muito feliz de fazer parte disso. – sorriu, tímida.
– Nós ficamos felizes em recebê-la por aqui. – Raika sorriu.
– Hoje eu já vou acompanhar vocês, certo? – ela perguntou, estava num misto de curiosidade e empolgação.
– Sim, deixamos para irmos à tarde porque você não tem nem ideia de como estávamos precisando de você – Julie riu. – Há muitas mulheres que precisam de uma ginecologista naquele hospital. – ela assentiu.
– Bom, certo, eu vou só tomar um banho antes. – abriu a mala, pegou uma camiseta, calça jeans e pegou seus itens de higiene pessoal que estavam em sua necessaire. revirou os olhos, para ele a ginecologista não ficaria nem uma semana ali, só pela forma como se portou desde o momento em que colocou os pés ali. Que ela era atraente, ele não podia negar, mas não teria emocional.
, em 25 minutos saímos para o plantão, se eu fosse você não tomaria banho agora. – Consuelo a aconselhou.
– Viajei por mais de 20 horas, preciso disso, é só para eu me despertar, prometo não demorar. – sorriu. – Onde fica?
– Aqui no quarto mesmo, nessa porta. – Julie apontou, assentiu.
– Obrigada. – deu passos rápidos, entrando no local.
– Quanto tempo você dá para ela, ? – Juan disse, aos risos.
– Não dou uma semana para ela sair chorando daqui implorando para voltar para o Brasil. – Juan e ele gargalharam.
! – Julie revirou os olhos. – Você mais do que nós deveria entendê-la, afinal é brasileiro como ela é, e porra, você é o chefe aqui!
– Qual é, Julie! Por eu estar nessa posição, e por passar por várias experiências que eu sei o que eu estou dizendo. E outra, ela está tão animada que chega a incomodar. Galera, vamos lá, isso aqui é ação humanitária, não é colônia de férias, não.
está certo, ela não vai durar aqui. – Juan complementou.
– Facilitem a estadia dela, que ela não vai embora, simples assim. – Consuelo aconselhou.
– Vocês lembram do Charlie? Eu dei duas semanas e ele foi embora mesmo, teve o Johny também, um dia e desistiu, vocês sabem que eu não erro. – Juan gargalhou. Julie revirou os olhos.
– Babacas, é isso que vocês dois são. Se ela desistir mesmo, você se mate para achar outro ginecologista! – Raika revirou os olhos, saindo do cômodo.
– Um pouquinho de fé nas pessoas não faz mal a ninguém mesmo, nossa. – Consuelo resmungou, extremamente chateada com essa coisa infantil que Juan e tinham.
que estava do outro lado da porta ouvindo tudo, sentiu o rosto ferver de raiva. Detestava que a subestimassem, qual era o problema em tomar banho depois de uma viagem de 22 horas? Nenhum para ela. E como não se empolgar diante de algo naquela magnitude? Ela seria extremamente racional. Como e Juan sabiam que ela não duraria no projeto, como poderiam falar aquilo com tanta propriedade? Isso não ficaria assim, engoliriam aquelas palavras, estava determinada a mostrar a todos que não desistiria.
Ela tomou o banho rapidamente, se vestiu e saiu do banheiro, e não conseguiu disfarçar seu rosto aos dois homens, Consuelo percebeu que estava estranha e entendeu que provavelmente ela não tinha entrado tão rápido assim no banho, e acabou por ouvir. pendurou a toalha no varal na sacada, e encarou os demais que estavam até então calados.
– 22 minutos, não atrasei, viu? – sorriu fechado.
– Vamos de uma vez. – se levantou, entediado, saindo na frente dos outros, sendo acompanhado por Raika e Juan. Julie foi logo atrás. viu Consuelo se aproximando dela.
– Você escutou tudo? – assentiu. – Sinto muito. e Juan são dois idiotas mesmo, pelo amor de Deus, os ignore.
– Está tudo bem. – abriu um sorriso forçado. Não, não estava nada bem, ela estava possessa de raiva.
Pegaram os equipamentos, saíram do alojamento, e foram caminhando até uma espécie de unidade básica de saúde, era bem próximo dali, e já havia uma fila grande para atendimentos no local. Haviam algumas pessoas organizando as filas. Adentraram o local, passaram pela recepção e Consuelo apresentou as recepcionistas, entraram ainda mais no local, Consuelo apresentou os farmacêuticos, enfermeiros e médicos locais. Consuelo a encaminhou até o local que correspondia a sua sala, estava mais para um box, as divisórias eram feitas por cortinas, era mesmo como ela poderia imaginar.
– Boa sorte, qualquer coisa, me chama. – Consuelo sorriu, se despedindo, não seria ela que trabalharia diretamente com , ela ficava na parte de aplicação de medicações.
Deixou suas coisas penduradas em um cabideiro, pegou uma das fichas que estava ali e chamou a primeira paciente. Respirou fundo enquanto aguardava.
– Olá! – arriscou um sorriso e recebeu um sorriso que pareceu mais uma careta.
– Oi! – a moça arriscou no inglês. – Eu estou sentindo algumas dores lá na hora que vou fazer xixi e transar… – sinalizou. assentiu e pediu que ela se sentasse na cadeira ginecológica.
Camila colocou a máscara e as luvas. A médica olhou a região, fechou os olhos por alguns segundos, a região vaginal estava com muito corrimento e com um cheiro extremamente forte, com certeza ela havia feito relações sexuais sem proteção e estava com gonorreia. Faria alguns exames para confirmar. Ela ajeitou a máscara, e começou a examiná-la, aquela foi a primeira de muitas daquele dia.

– Como foi o primeiro dia? – Consuelo a questionou assim que começaram a voltar ao alojamento.
– Difícil... muito difícil. – mordeu os lábios.
Chiquiline. – Consuelo se aproximou dela, lhe dando um abraço. – No início é assim mesmo, mas você vai se adaptar, tenho certeza disso.
– Eu vou, foi só um choque inicial. – limpou algumas lágrimas que desceram de seus olhos. – É só que é inconcebível que essas meninas sejam violentadas, ou estejam com doenças sexualmente transmissíveis graves, essa desigualdade é gritante.
– Sim, é muito triste tudo isso, de verdade. A gente sai daqui um ser humano muito, muito melhor, pode apostar.
– Com um dia eu já mudei, imagina durante nove meses. – Consuelo a abraçou de lado. que vinha atrás negou com a cabeça, sabendo que algum momento ela não aguentaria o baque, ele já tinha visto aquele filme, as pessoas achavam que era ruim, mas não imaginava o quão ruim era. Ele parecia duro, mas na verdade ele estava calejado daquilo, era sua terceira vez no programa, por isso tinha sido designado como o responsável pela unidade.

chegou no alojamento, e viu que os banheiros já estavam ocupados, teria que tomar banho depois. Pegou o celular que lhe foi disponibilizado enquanto estava no programa, nele havia um chip local e internet móvel, mas ele estava sem sinal, de qualquer forma enviou uma mensagem aos pais e a Melanie, uma hora seria enviada.
Viu que o banheiro desocupou e decidiu que iria, mas antes que pudesse entrar, alguém teve a mesma ideia que ela, acabaram segurando a porta ao mesmo tempo. olhou e foi impossível não fechar a face.
– Pode ir, eu espero. – comentou, largando a porta e dando espaço para que ele entrasse.
– Você já não tomou banho hoje? – a encarava, curioso. Tinha ignorado a reação dela.
– Sim, e daí? Eu quero tomar outro, tenho direito.
– Docinho, você realmente não entende que estamos em um país em que há escassez de água potável?
– Lógico que eu entendo, só que eu simplesmente não posso dormir depois de ter trabalhado o dia todo sem um banho! Amanhã eu não vou tomar banho de manhã, hoje foi atípico – se justificou.
– Claro, claro. Frescurenta... – sussurrou a última palavra.
– Ah, cala boca, você nem me conhece para estar me pré-julgando desse jeito, deixa de implicância. – Ela suspirou fundo. – E vai logo tomar esse banho, você está precisando. – Ela tampou o nariz, fingindo que ele estava cheirando mal.
– Ei! Que isso?
– Vai fazer o quê? – Ela o desafiou.
– Eu… – ele a encarava, bravo.
– Você? – bateu à porta do banheiro, e ela sorriu, era bom que ele entendesse que ela não era idiota e que tinha ouvido bem o que ele havia falado mais cedo, e se ele queria que as coisas fossem dessa forma, seriam então.
Logo desocupou o segundo banheiro, e ela adentrou, ela precisa muito daquele banho, a relaxaria em dimensões estratosféricas.


Parte IV

Já fazia dois meses que estava na ação humanitária, contrariando e desmentindo e Juan que tinham chutado apenas uma semana. As coisas não estavam fáceis para ela, mas ela nunca se deixou abater, tinha que lidar com a escassez de materiais, com a extrema pobreza, as condições do seu “consultório” e sem contar que nem sempre ela atuava com ginecologia, era obstetra e clínica geral se fosse preciso, algo que eles haviam informado a ela no momento da inscrição para o projeto.
Ela tinha uma boa relação com todos ali, exceto , sua convivência com ele era péssima, simplesmente pelo fato de a todo momento em que estavam perto um do outro se ignoravam ou trocavam farpas.
tinha conseguido conversar com a família e com Melanie, mas o fator saudade estava pegando para ela, nunca tinha ficado tanto tempo sem ver pessoalmente nenhum dos entes queridos, e estar no meio de estranhos tornava a tarefa ainda mais difícil.
Em uma das conversas com Melanie, a amiga contou que Denis estava solteiro e havia perguntado sobre ela, com a menção ao nome ela percebeu que desde o momento em que colocou os pés no Haiti não havia pensado nele, ela tinha problemas muito maiores. Essa foi a prova que ela estava superando-o.
Ela tinha saído de seu consultório para comer e tomar um ar, já passava das 14 horas daquele dia, quando voltava para a unidade presenciou uma cena que a fez sorrir involuntariamente, brincava com uma criança, deveria ter no máximo uns 8 anos, ela ria de forma contagiosa, enquanto ele lhe fazia cócegas, ele também tinha saído para almoçar naquele horário. Ele amava muito crianças, isso era inegável. Como a sua mãe disse-lhe quando ela contou sobre o homem, não era possível que alguém fosse mal gostando tanto assim de crianças. Ele tentou algumas vezes conversar com ela coisas de âmbito pessoal, mas em todas as oportunidades ela o cortava ou saía do cômodo.
Balançou a cabeça, voltando a caminhar.
! Ajuda aqui! – ela arregalou os olhos, correndo em direção a Juan. – Ela tá com a pulsação bem fraca, precisa examinar com urgência. – e Juan empurraram a maca às pressas até o consultório mais próximo. A mãe da menina vinha atrás dos dois.
– Minha filha não está se sentindo bem, tem dias que está com a barriga inchada... – quando levantou os olhos para encarar de fato a paciente, não acreditou no que viu, a criança estava grávida, por isso a barriga estava assim. Uma criança gerando outra criança. Ligou o ultrassom que tinha na sala, passou pela barriga da menina só para afirmar aquilo que ela imaginava, havia um feto ali, mas o coração dele não estava batendo.
– Ela está sangrando muito, . – Juan despertou a atenção dela para o sangue que saia de suas pernas
– Mãe, ela está grávida! E possivelmente abortando! – a mulher arregalou os olhos, surpresa. – Quantos anos ela tem?!
– O-onze anos. – a mulher estava nervosa, como a filha poderia estar grávida? negou com a cabeça.
– É muito grave, Juan. Consuelo! – a enfermeira apareceu ali. – Chama o cirurgião, vai precisar fazer uma cirurgia para retirar o feto. Ela está perdendo muito sangue. – Consuelo assentiu. – Senhora, saia, por favor!
– Mas…
– Saia agora! – ralhou e Juan levou a mais velha para fora do local.
Enquanto aguardava o cirurgião, foi fazer os exames básicos para saber como estava a garota. Pegou o estetoscópio para auscultá-la, porém o coração não estava batendo. Ela não tinha pulso também. Ela se desesperou, começou a fazer massagem cardíaca, tentando ressuscitá-la, mas não obteve sucesso. Ela não soube quando, mas Consuelo, Juan e Bernard, o cirurgião, a seguraram para que ela parasse, não tinha mais jeito, Maylla, a garotinha, estava sem vida. Aquilo havia quebrado de inúmeras formas possíveis, e ela não sabia se conseguiria se recuperar daquilo, era uma criança, e seu fraco sempre fora crianças.

, chiquiline, eu sei que foi um choque para você, mas pensa na experiência que você tem adquirido no projeto, não vá assim. – Consuelo tentava convencê-la, em vão.
– Eu achei que pudesse, mas eu não vou aguentar, eu… – sentiu que queria chorar novamente, engoliu a seco. – Era uma garotinha, só uma garotinha… – Consuelo soltou o ar que prendia, a vendo ir até o banheiro e pegar algumas coisas.
entrou no quarto, e em um pedido mudo solicitou que Consuelo os deixasse a sós. Ela saiu do quarto, encostando a porta, impediria que qualquer pessoa entrasse lá, torcia que tivesse êxito, não dava para perdê-la, não só pela sua especialidade, mas por já ter se apegado à brasileira.
– Veio rir e dizer que sempre esteve certo? – comentou em português assim que entrou no cômodo e o viu sentado na cama.
… – ele foi interrompido.
– Mas ao contrário do que você falou, eu durei um mês aqui. – ela abriu um sorriso, debochada. Fechou a mala quando colocou os últimos utensílios ali dentro.

– Vamos, , ria... – ele revirou os olhos.
– Você vai me deixar falar? – ela o encarou, bufando.
– Eu não estou muito afim, sabe? Porque eu sei o que você vai falar… vai dizer…
– Me desculpa. – ele falou mais alto, e ela se assustou. – Me desculpa. Eu achei que você não ia escutar aquele dia, e mesmo que não escutasse, foi errado o que eu disse. – ela o encarava, atônita. – A gente tem uma brincadeira idiota de dizer quanto a gente acha que a pessoa vai ficar, foi isso. Eu percebi pelo seu jeito, que seria mais difícil para você, mas fui um idiota me comportando do jeito que me comportei. Depois eu tentei me aproximar de você para acabar com isso, mas você me afastava sempre.
– Ok… – ela desviou o olhar dele. – Mas eu não estou indo embora por sua causa, se é isso que te preocupa.
– Eu sei que não, mas você indo embora só vai afirmar que eu, um completo imbecil, tenho razão. – a médica abriu um pequeno sorriso com a fala dele. – Senta aqui, quero te contar algo. – ele bateu na cama, e ela o encarou, descrente. – Por favor…
– Tudo bem. – se sentou devagar ao lado dele.
– Quando eu cheguei aqui foi um choque muito grande, sabe? Eu sou filho único, sempre fui muito mimado, vivi sempre no luxo, e ver essa desigualdade gritante me destruiu. O meu pior momento foi muito parecido com o seu, uma criança chegou extremamente desnutrida e não resistiu. – suspirou fundo, aquilo ainda doía. – Eu tive a mesma atitude que você, decidi que aquilo não era para mim, que eu não tinha emocional, mas eu escutei um conselho que hoje levo para vida, se eu fosse embora, quantas vidas mais poderiam ser perdidas? – ele a encarou de forma intensa, e ela sentiu o peso daquelas palavras. – Arrumar profissionais que queiram ser médicos humanitários é muito difícil, . Quando entramos nessa jornada, deixamos família, amigos, parceiros, nossos costumes, nosso país por um bem maior. Pense em quantas vidas realmente já salvou, e ainda pode salvar se ficar. – ela tinha os olhos brilhando em lágrimas. – Não foi sua culpa, não tinha nada que você pudesse fazer por ela.
nunca tinha lidado muito bem com a morte quando ainda fazia a faculdade, tanto que em seu período de residência, para ela noticiar uma morte era pior do que a própria morte. Ela tinha prometido que teria seu próprio consultório, mas que não queria ficar na linha de frente em um hospital, e foi assim que ela o fez. Mas apesar disso, sempre teve vontade de ajudar os mais pobres, então sempre viveu em um conflito interno, até a separação com Denis, que havia lhe dado o pontapé inicial para se jogar naquela experiência de vida. tinha razão, ela já havia ajudado tantas mulheres, e quantas mais ela poderia ajudar?
– Você está certo, só que ver aquela garotinha mexeu muito comigo, e não ter minha família perto de mim, estar longe de casa, me destruiu, me senti sozinha, desamparada… – a abraçou de lado, meio sem jeito.
– Estamos nessa juntos, , pode desabafar com qualquer um de nós, seremos sua família. – ela fechou os olhos, não aguentando mais segurar as lágrimas. – Só não desista, ok?
– Obrigada, de verdade. Eu vou tentar mais uma vez. – ela o abraçou de volta e escondeu seu rosto em se pescoço.


Parte V

Depois do terrível incidente, não havia passado por mais nada naquela magnitude naqueles últimos quatro meses, aquilo em partes a aliviou muito, ela não sabia se estaria pronta.
A aproximação com tinha sido natural depois daquela conversa que tiveram, ele havia se mostrado uma pessoa boa, e lhe passava a sensação de estar em casa, afinal, ele era brasileiro e eles se comunicavam em português quando conversavam.
arrumava as coisas de seu consultório após a saída da última paciente dali, seu plantão tinha acabado. Seu telefone tocou, ela ficou surpresa, pois nunca tinha sinal com facilidade ali. Viu no visor que se tratava de Melanie e sorriu, o peito apertado de saudades da amiga.
– Oi, meu amor! – ela sorriu, segurando o telefone com o ombro, enquanto terminava de ajeitar as coisas.
– Ai, amiga, como você faz falta! Que saudade de você! – Melanie suspirou. – Como está?
– Estou bem, amiga. As coisas por aqui estão bem melhores. – ela terminou de guardar as coisas e saiu do local. Foi caminhando para a saída, acenando para quem via. – E você? Como está?
– Que bom, eu estou incrivelmente bem. E o motivo da ligação é por esse motivo! , se você tiver em pé, quero que se sente porque o que eu vou te contar vai te deixar muito surpresa. – franziu o cenho. – Eu vou casar em dois meses.
– OI?! Que porra é essa, Melanie? – avistou , e ele a encarou de cenho franzido quando escutou o que ela disse, ele estava a esperando para que esticassem em um bar que havia próximo dali. Haviam combinado de tomarem algo.
– Eu sei, foi tudo muito rápido e intenso, Brenno recebeu uma promoção para trabalhar em Goiás, e a gente não quer se separar, sabe? E nem viver uma relação à distância, e como nos amamos por que não oficializar nossa união? Então eu aceitei o pedido de casamento. Coloquei como imposição apenas que fosse em dois meses porque eu sei que é quando acaba sua missão e você está de volta. Vamos nos casar uma semana depois que você já estiver aqui.
– Deus, Melanie, é muita coisa! Você nem me preparou, amiga! – fez um sinal para que contaria a ele logo.
– Foi muito rápido, inclusive o Brenno já está em Goiás, e eu estou morrendo de saudades do meu bebê e surtando com os preparativos todos do casamento. E você será a madrinha, e isso não é uma pergunta!
– Ok, eu não esperava menos, mas ainda estou em choque que você vai casar e ainda vai morar em Goiás! Deus, Melanie!
– Eu sei! Eu estou surtando com essa parte, sabe? Mas eu não me vejo longe do Brenno, meu trabalho é home office, então, eu só vou. – sorriu, Brenno era um bom homem, os dois namoravam há um ano, temia um pouco pela amiga, pois tinha se machucado com a relação que tinha tido com Denis, mas nem todos os homens eram iguais, certo? – Eu sei o que está passando na sua cabeça, ok? Eu confio no Brenno, e bom, se ele for um filha da puta como meu irmão, eu dou um pé na bunda dele e volto para São Paulo, sem problema.
– Eu não estava pensando nisso, eu…
– Eu te conheço mais do que você possa imaginar, meu bem. – sorriu largo. – Ele vai ser padrinho também, porque aquela peste é meu irmão ainda, mas ele não será seu par, tá? Pode ficar tranquila, vou te colocar com um amigo do Brenno.
– E se fosse também não faria nenhuma diferença, Melanie. Eu já não sinto mais nada por ele. – escutou aquilo, e a encarou de lado, aquela informação era importante.
– Você não tem ideia do quão feliz você me faz falando isso. – Melanie se jogou na cama, aliviada.
– Eu estou feliz de falar isso para você, já é uma página virada para mim. – sorriu novamente, era a mais pura verdade.
– Eu te amo tanto, amiga! Tanto, e tanto pela mulher que você é! – Melanie se ajeitou no travesseiro. – Vê se leva o delicia, digo, o Doutor , só para esfregar na cara do meu irmão que você o superou.
– Idiota. Eu não preciso disso para mostrar que eu superei.
– Ele é tão bonito, vocês estão bem próximos, por que não?
– Para! – foi sucinta, Melanie arregalou os olhos quando percebeu que a amiga estava monossilábica.
– Ele está do seu lado?
– Sim.
– Ai, meu Deus! Convida, convida, anseio por conhecê-lo pessoalmente.
– Cala boca, Melanie, eu preciso desligar, essa ligação já está ficando cara demais. Te amo muito, Mel.
– Ridícula! – gargalhou. – Também te amo. Vou te mandando mensagem para atualizar sobre os preparativos. Se cuida.
– Se cuida também. – desligaram a ligação juntas. – Desculpa, é só a Melanie sendo a Melanie. Vai se casar em dois meses.
– Sério? Caramba. Não pude deixar de escutar um trecho da conversa em que você dizia que ela moraria em Goiás, poxa, é meu estado.
– Nossa, é verdade.. Que coincidência louca. O noivo dela vai começar a trabalhar na filial de lá. – Chegaram ao local e se sentaram em uma mesa, seriam só os dois, ninguém estava muito no pique no dia. Logo o garçom veio os atender. Pediram duas cervejas para iniciar a noite.
– Poxa, que bacana. Meio louco esse lance de casar rápido, mas se os dois se amam, né? Às vezes a melhor coisa é agir mesmo no impulso.
– Talvez. – viu o garçom trazer as duas cervejas que eles haviam pedido, bebericou um pouco da sua.
– Por que talvez? Você não acredita no amor?
– Nossa, que papo é esse? Acho que vou precisar de mais bebida para continuá-lo. – eles gargalharam.
– Tá me enrolando muito para me responder, dona , e ai? Não acredita?
– Ah, , você está jogando comigo, não é? Você escutou parte da conversa que eu sei, então pode me perguntar de forma mais clara. – ela piscou para ele, voltando a beber. Ele não pôde deixar de rir.
– Você não acredita no amor porque alguém quebrou seu coração, certo?
– É. – suspirou, vendo que tocar no assunto não era mais incomodo. – Eu fui corna por seis meses, . E se eu não o pressionasse, sabe se lá por quanto tempo mais eu continuaria sendo corna. Eu o amava, e por um momento eu sei que ele me amou também, não sei dizer quando eu fiquei amando sozinha. – riu, amargurada. – Não é que eu seja desacreditada do amor, é só que eu não ando confiando em ninguém.
– Entendo, eu não faço ideia do que você tenha sentido, mas é foda pra caralho ter o coração quebrado. Nessa minha vida de médico humanitário eu vivo para o meu trabalho então nunca amei ninguém, mas acredito no amor.
– Você não tem ideia da sorte que você tem, . Te garanto que você não está perdendo nada.
– É muito solitária a nossa vida, sabe? Não vou dizer que não tenho meus casinhos aqui ou lá, mas as vezes sinto falta de um relacionamento sério. – viu seu copo ser cheio novamente, assim como o de .
– Eu sei, às vezes bate um vazio, né? – ele assentiu. – Você já dormiu com algumas das meninas do alojamento?
, . – ela deu de ombros. – Já. Dormi com Julie, mas não dessa vez, tivemos em missão em Lesoto e foi lá que dormimos. Agora ela está com o Juan também.
– Eu sabia que você ia dizer a Julie, ela faz muito o seu tipo. – ela voltou a bebericar a cerveja, rindo.
– E eu tenho algum tipo de mulher agora? Hum… me conte mais sobre isso, .
– Ah, eu não sei explicar, , é só olhar para vocês dois, sabe? Meio que vocês ornam.
– Acho que ela orna mais com o Juan. – ele gargalhou. – Mas você está errada, eu não tenho um tipo de mulher, eu me atraio, simples assim. E você? Tem um tipo de homem?
– Eu só me atraio também. – eles se encaram de forma intensa. A médica estava sozinha em um bar com , levemente alcoolizada, era tentação demais, e perigoso também. Não queria terminar aquela noite na cama dele. – E como foi o dia? – ele a encarou, e não aguentou, gargalhando, ele riu junto com ela.
– Ah, … – ela ainda ria, mas ela aceitou a brecha dela para mudarem de assunto, seria realmente perigoso se continuassem naquele papo. – Meu dia foi bem intenso. Atendi por volta de umas 15 crianças, em sua grande maioria desnutridas… – mordeu os lábios, prestando atenção ao homem.

✈️🌏

agora arrumava as malas de verdade, aqueles dois meses tinham passado muito rápido e já tinha chegado o momento em que iria embora daquela missão, eles seriam substituídos por outros médicos, e teriam umas férias, para partirem para uma próxima missão logo.
– Vou sentir tantas saudades de você, chiquiline! – Consuelo terminou as malas que fazia, se aproximando de e a abraçando apertadamente.
– Eu também vou sentir, meu bem. Você é maravilhosa, e foi um presentinho do projeto. Espero que nos encontremos na próxima missão.
– Decidiu que vai embarcar nessa com a gente mesmo? – assentiu. – Isso é incrível, chiquiline.
– Eu já não me vejo fazendo outra coisa do que ser médica humanitária, estou apaixonada pela experiência, apesar de tudo. Me fez crescer muito como ser humano. Saio uma muito melhor do que quando cheguei.
– Eu te disse que isso te mudaria muito. – ela suspirou, se separando da nova amiga.
– Mudou. Obrigada por me ajudar muito durante isso tudo.
– Ai, quero me despedir também. – Raika apareceu na frente dela, se jogando nos braços da brasileira. – Foi incrível te conhecer, . Nos vemos por aí, essa foi minha última missão, quero ficar mais perto da minha família e do meu namorado.
– Você tem toda razão, você tem alguém! – a abraçou ainda mais apertadamente. – Seja muito feliz.
– Eu serei. – se separaram com grandes sorrisos.
– Casal! – fechou finalmente as malas e se aproximou de Juan e Julie. – Cancun?
– Merecemos isso, não? Depois iremos conhecer a família um do outro, vamos fazer isso se tornar de verdade. – Julie sorriu, olhando para Juan.
– É isso, cheguei solteiro e agora estoy enamorado – brincou, dando um beijo na testa da namorada, e deu um abraço apertado em . – Eu sei que deveria ter pedido desculpas antes, mas me desculpa por aquilo lá no início, você é uma mulher incrível e maravilhosa. – se separaram, e abriu um pequeno sorriso.
– Obrigada! Curtam bem as férias de vocês. – sorriu, se despedindo deles que também saíram do cômodo.
… – ela se aproximou dele. – Nem vou me despedir de você ainda, nossa viagem é longa. 22 horas.
– É, de mim você não vai se livrar agora. – ele piscou para ela, a abraçando, se deixou ser abraçada.
– Toma. – ela lhe entregou um pequeno papel para ele.
– O que isso? – franziu o cenho.
– O lugar onde vai ser o casamento da Melanie, se você quiser dar uma passada lá, fique à vontade.
, , isso é muito tentador. – ela sorriu.
– Então não se atrase. – ele lhe deu um beijo no canto da boca.
– Não irei.
e ela tinha criado uma conexão estranha, mas, ao mesmo tempo, bacana naquele período, era sempre uma leve tensão sexual quando os dois estavam em um mesmo ambiente, mas nunca havia de fato ficado, acho que isso que instigava ainda mais a curiosidade e a atração entre os dois. Todos que conviviam com eles haviam percebido, mas ninguém nunca tocou no assunto, respeitando o que quer que fosse o que tivessem. O engraçado é que se lhe perguntassem há um tempo sobre ter um relacionamento com era impossível, brigaria com a pessoa com certeza, agora se encaminhavam para isso.

✈️✈️

A maquiadora finalizou a maquiagem de , o cabelo já estava pronto, o casamento seria em menos de duas horas, no quarto ao lado Melanie estava sendo arrumada. Hoje ela também veria Denis depois de quase um ano. Ela sabia que tinha o superado finalmente, mas o encontro seria a afirmação que precisava.
Estava em expectativa por aquele dia também porque havia passado o endereço a , e ele havia prometido ir. Eles não tinham conversado depois da longa viagem que compartilharam, então ela realmente não sabia se ele iria ou não.
chegou próximo do dia do casamento ao Brasil, então teve que correr atrás dos ajustes do seu próprio vestido, matou a saudade da família, e sequer se lembrou de procurar o pediatra, e bem, ele também não a procurou, provavelmente ocupado com a família e amigos.
Ela colocou o vestido no corpo, e o admirou, contente com o resultado, estava linda. Como Melanie tinha bom gosto e a conhecia muito bem... O vestido caiu como uma luva em seu corpo, precisou dar pequenos ajustes apenas. Vestiu os sapatos, e olhou-se no espelho, estava pronta e maravilhosa. Pegou a bolsa de mão e saiu do quarto indo para o de Melanie.
– Amiga! – ao contrário da calmaria no quarto anterior, o de Melanie estava uma loucura, ela foi entrando e vendo que tinha a cabeleireira ajustando o arranjo do cabelo no coque bem feito dela, Melanie estava sendo maquiada e sua ex sogra estava no canto do quarto conversando com alguém da organização.
– Oi, ! – ela pediu que a amiga se aproximasse. – Estou tão feliz por você estar comigo nessa, você é muito importante para mim.
– Eu sei, te amo muito. E mesmo se você não tivesse me esperado, eu estaria aqui por você. – Melanie estendeu a mão para a amiga, e ela a apertou.
– Te amo. – sorriram. – Eu acho que vou vomitar a qualquer momento, estou muito nervosa.
– É assim mesmo, eu lembro que cheguei a vomitar mesmo quando me casei…
– Oh, meu Deus, é verdade. – por um momento Melanie havia se esquecido que havia passado por tudo aquilo. – Alguma dica?
– Respira fundo, hoje o dia é todo seu, e ninguém vai estragá-lo, ok? Ninguém! – ela assentiu com um sorriso trêmulo.
– Obrigada pelas dicas, querida, espero que ela te escute. – Magali apareceu, interrompendo a conversa delas.
– Oremos, sogrinha. – segurou a boca, tinha sido tão espontâneo. Magali gargalhou audivelmente. – Preciso voltar a te chamar de tia.
– Pode me chamar de sogrinha, meu amor. Você continuará sendo minha nora eternamente. Não é porque se separou do embuste do meu filho que deixará de ser parte da minha família.
– Obrigada. – a abraçou apertadamente. – Nós já éramos próximas, mesmo antes do Denis, mas eu tinha medo que nos afastássemos por isso.
– Jamais! – elas se separaram. – Eu sei que depois que vocês terminaram você não quis falar com ninguém, se isolou, respeitei seu tempo.
– Sim, eu precisava desse tempo de tudo, Magali. Agora me sinto muito melhor, melhor do que já estive antes. – elas sorriram.
, já está na hora dos padrinhos! – ela desvinculou as mãos unidas com Melanie e se levantou.
– Bom, vou deixá-las. Melanie, você está linda!
– Obrigada! – soltou um gritinho agudo. – Você também está. – sorriram mais uma vez.
saiu do quarto, deixando–as, se posicionou ao lado do amigo de Brenno, esse estendeu o braço para ela, que sorriu, entrelaçando-o com o seu. Olhou para frente, sentindo-se observada, eram os olhos azuis de Denis presos nela, negou com a cabeça, o encarando de volta, e constatou mesmo o que imaginava, Denis não significava mais nada para ela.


Epílogo

suspirou fundo, retocando o batom no banheiro, seu cabelo ainda estava em perfeito estado após passar umas boas horinhas de pé, afinal a cerimônia do casamento havia acabado finalmente. Melanie estava incrível, e foi impossível não chorar vendo a melhor amiga se casando, a maquiagem era a prova d’água então estava tudo ok.
Assim que saiu do banheiro deu de cara com Denis, e para a surpresa dele, sorriu.
– Você está linda, . – Denis comentou, com um pequeno sorriso. – Você também está muito diferente.
– Diferente como? – ela não agradeceu pelo elogio, ela não precisava.
– Não sei explicar, não sei se é o jeito, ou…
– Passar por uma ação humanitária muda as pessoas, meu bem. Pode apostar. – ela piscou, começando a andar.
, espera… – ele segurou seu pulso, ela o encarou, tirando as mãos dele do local de forma delicada. – Eu quero me desculpar por como as coisas foram. E se você quiser, podemos conversar sobre como as coisas foram, eu estou solteiro, você também e… – ele tentou se aproximar novamente, ela o parou.
– Não me toca. – ele levantou as mãos, sem graça. – E bom, Denis, se não fosse aquilo, eu não estaria no meu melhor momento, então eu quero te agradecer, você não tem ideia do quão bem você me fez.
– Como assim?
– Eu encontrei a minha melhor versão, meu bem, e eu valorizo muito mais a minha vida. – ela deu de ombros, triunfante.
? – ela abriu um sorriso, reconheceria aquela voz sempre.– Atrapalho?
– De jeito nenhum, . Estou feliz que você não desperdiçou o convite. – ele abriu um sorriso galanteador.
– Jamais, ! – ela o abraçou de forma carinhosa. Tinha sido apenas uma semana, mas tinha sentido saudade dele. Ele se separaram, o encarou de forma intensa, e encostou seus lábios de surpresa. Ele passou as mãos pela cintura dela, os aproximando ainda mais.
Denis encarava a cena, boquiaberto, não era a mesma pessoa, ela estava… Sensual, linda como nunca ele tinha visto, era uma tentação ambulante, mas não era mais dele.
e se separaram, com os olhos presos um no outro. O beijo de era ainda mais maravilhoso do que ela poderia imaginar, ele era mesmo um homem sedutor, e muito intenso.
– Tem uma noiva ansiosa para te conhecer, . – ela entrelaçou seus dedos, nem se lembrando de Denis ali.




Fim!



Nota da autora: Oi, gente! Eu tenho esse plot há tanto tempo. Finalmente saiu! O programa que eu menciono é baseado no Médico sem fronteiras. Obrigada por chegarem até o fim da leitura! <3

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