15. Spring Day

Finalizada em: 23/10/2017

Capítulo Único


Eu não achei que passaria mais um inverno sozinho. Esse já é o terceiro, na verdade.
É engraçado pensar no quanto outra pessoa faz falta. Principalmente quando você nunca esperava sentir tanta falta dela. Na verdade, não é engraçado. É doloroso. E parece que só dói ainda mais quando falo ou penso sobre isso, porque a saudade faz questão de aumentar. Falar desse jeito só me faz parecer meloso ao extremo, eu sei. Provavelmente é o efeito da nevasca que me prendeu em casa hoje. Em dias normais, eu vou para a faculdade, depois para o trabalho de meio-período, faço meus trabalhos na biblioteca do campus, me inscrevo para atividades extracurriculares... Tudo isso acaba ocupando meu tempo e me impedindo de sentir a falta dela como um louco. Mas hoje, preso devido às condições climáticas, ficar em casa olhando para as paredes me deixa nostálgico, carente. Principalmente ao ver nossas fotos espalhadas pelos cômodos. Meus sorrisos eram mais abertos com você, sabia? Era mais fácil sorrir quando estava ao seu lado.
Tempo é uma coisa muito cruel. Ele nos faz definhar, esperando por coisas que podem nunca acontecer. Nos faz esquecer, nos faz ficar ansiosos, cansados. Como um trem que nunca vem, nunca passa. São tantas horas de fuso horário que nem conseguimos mais nos ver por chamada de vídeo. Você está atarefada por aí, eu quase não consigo um tempo livre aqui... Eu chego a nos odiar por quase não termos tempo de sequer nos ver. Ler suas mensagens e ouvir sua voz, na maior parte do tempo, não é suficiente e, mesmo que por vídeo, eu gostaria de poder ver seus olhos brilhantes e seu sorriso tão maravilhoso. Ver o jeito que você bagunça o cabelo tentando organizar seus pensamentos ou o jeito que você olha pro teto quando está pensando em algo importante. O que estou dizendo? Eu gostaria até de poder ver sua testa franzida enquanto você estuda, qualquer coisa. Eu só gostaria de poder te ver.
São quase duas da tarde em Boston, o que faz ser por volta de quase duas da manhã em Seul, e até nisso o tempo nos atrapalha. Sei que você não está acordada porque tem aula cedo amanhã e espero que não esteja exigindo muito de si mesma. Você sabe que é inteligente, espero mesmo que não esteja indo além dos seus limites. Onde está meu telefone? Uma mensagem não vai te acordar e, se você estiver acordada, posso pelo menos te desejar boa noite. A internet também está uma porcaria por causa da neve. Maldita companhia que promete tantas vantagens, mas nunca as cumpre. Se você estivesse aqui, já teria ligado para eles e resolvido essa situação. Você teria gritado com eles, ameaçado cancelar tudo e eles ainda lhe dariam uma promoção… Eu já disse o quão encantadora você fica quando está nervosa? Acho que sim, mas que fique registrado aqui da mesma maneira.
Você sabia que é um dos invernos mais frios dos últimos tempos? Por isso a neve está tão densa. Não para de nevar lá fora, os jornais já noticiaram várias vezes. Essa é a terceira vez que abro a janela para checar. Estou literalmente isolado em casa, embaixo das cobertas, esperando que o tempo melhore. Estou sofrendo aqui, meu amor. Já dormi, acordei, dormi e acordei. Já vi filmes repetidos na TV e revi fotos nossas no computador. É difícil passar esse inverno sozinho… Na verdade, é difícil passar todos os momentos sozinho. É como se todos os meses fossem invernos sem você. Inclusive agosto, o ápice do verão, parece frio quando você não está aqui. De tempos em tempos, me imagino com você, de mãos dadas andando pelas ruas de Yeouido, repletas de cerejeiras em flor. Poder abraçá-la e tirar pétalas do seu cabelo em um carinho suave. Você nem faz ideia do quanto quero fazê-la sorrir, ouvir sua gargalhada por alguma besteira que eu disse ou fiz. Comermos juntos em algum lugar que tenha tteokbokki. O mais apimentado que você conseguir comer sem chorar. Nós vamos rir das pessoas na rua, vamos rir dos casais melosos, vamos rir de nós mesmos.
Estou ansioso por isso, amor.
Será que o tempo vai nos ajudar? Será que se pedirmos com muita vontade, ele passa mais rápido e traz a primavera? Será que seu pedir ainda mais, ele traz você para mim de uma vez? Eu não me importaria de viver em um eterno inverno, contanto que você estivesse comigo. Eu não me importaria nem um pouco. Eu seria como um floco de neve, que sempre correria de encontro a você. Do jeito que a neve cai lá fora, certamente eu a alcançaria muito mais rápido. Não acho que essa nevasca vá parar tão cedo, assim como a falta que você me faz.
Eu sinto tanto a sua falta. Tanto.
Sinto falta de beijá-la no meio de uma frase, de abraçá-la quando você está cansada. Sinto falta de fazer café para nós e você reclamar que está muito fraco. Sinto falta das noites que passamos conversando, jogando vídeo game, lendo, vendo filmes e ouvindo música ruim. Eu sinto falta de tudo em você.
Quanto tempo eu terei que esperar? Quantas noites vou precisar passar acordado, pensando em você? Sentindo sua falta, preocupado com você, bolando planos para te ver o quanto antes… Quando vou poder te ver? Quando vou poder te encontrar e abraçá-la como se todo meu mundo dependesse disso? Quantos invernos passarão sem que você esteja aqui? Quando você vai vir e trazer a primavera consigo? Por favor, amor, faça meu coração florescer novamente… Não demore tanto. Eu não sei o que pode acontecer caso demore mais.
Será que você mudou? Seus sentimentos, seu aspecto físico, seu jeito de morder o lábio inferior antes de mentir e a mania de sacudir todos os lençóis antes de deitar-se na cama… Será que tudo isso mudou? Talvez eu tenha mudado, amor. Você vai me querer mesmo assim? Mesmo que eu não seja mais o cara que você deixou aqui há algum tempo? Eu procuro não deixar mais a toalha molhada em cima da cama, eu viro meus sapatos para que fique mais fácil de calçá-los ao sair. Eu tenho aparado a grama com frequência (não agora com tanta neve) e comprei chinelos que não vão arranhar o piso de madeira do segundo andar. Eu tenho penteado o cabelo de um jeito diferente, você notou? Pensei em cortá-lo mais baixo dos lados, você iria gostar disso? Acho que não. Você nem sequer gosta quando eu o corto, normalmente.
Parece que ambos mudamos, não é? Acho que todo mundo muda com o tempo, certo?
São muitas perguntas sem respostas. Dúvidas que me consomem, dia após dia, tornando tudo ainda mais difícil. Por mais que troquemos mensagens, por mais que nos vejamos por vídeo, por mais que você me marque em coisas idiotas nas redes sociais, é extremamente difícil ficar sem você. Eu sinto falta de aquecer suas mãos com as minhas, sinto falta de reclamar que você tem pego minhas blusas para dormir, sinto falta de acordar de manhã com a sua voz desafinada cantando no banheiro. Eu só sei sentir saudades, amar você, desejar que estivesse aqui.
Meu amor, não ache que estou mentindo. Não posso dizer que nunca odiei você nesse tempo. Eu odiei. Eu a odeio toda vez que penso que me deixou aqui. Odeio que tenha ido, odeio não ter te impedido, odeio passar dias e mais dias, horas e horas sem você. Eu odeio tanto não ter nenhum dia em que eu possa dizer que deixei de pensar em você. Honestamente, eu sinto sua falta, mas já pensei diversas vezes em apagá-la de mim. Apagar nossas memórias, nossos carinhos e todas as coisas que me fazem odiar os momentos que passamos longe um do outro. Apagá-la de mim doeria menos do que odiá-la.
Eu preciso respirar.
O frio está tão intenso que nem consigo abrir a porta da varanda do nosso quarto direito. A neve deixou tudo branco do lado de fora, a ponto de doer os olhos. Minha respiração deixa rastros como fumaça, como se eu estivesse fumando, o que nunca foi um hábito meu. O ar frio está quase congelando minhas narinas, mas eu continuo aqui, observando a fumaça branca que sai dos meus lábios, imaginando que estou expelindo você de mim. Expelindo meus sentimentos por você, pelo menos por agora. Posso fingir, só por alguns minutos, que não sinto sua falta? Que ficar aqui, em Boston, enquanto você precisou voltar a Seul para sua tão sonhada vaga na Universidade de Sungkyunkwan, não dói como o inferno? Nunca achei que você abriria mão de estudar nos Estados Unidos para voltar para a Coréia. Não sabia que me sentiria tão mal em ser deixado aqui enquanto você realiza seus sonhos e eu, os meus. Não achei que precisaríamos fazer isso separados. Eu odeio isso também.
Desculpe, amor, mas eu te odeio. Só por esses minutos, eu vou me permitir odiar você. Mesmo que eu nunca consiga deixar você ir, mesmo que eu nunca deixe de amá-la.
.
.
.
Já foi tempo suficiente.
Eu sinto tantas saudades, que nem mesmo se eu comparasse à nevasca, conseguiria expressar a falta que você me faz. Estou sendo muito meloso? Dramático demais? Posso simplesmente desistir e dizer que não aguento mais?
“Tap Tap”, amor.
Exatamente como no fim de uma luta que não se pode vencer. Não que eu realmente queira lutar ou qualquer coisa assim. Já fui vencido há muito tempo, querida. Eu me lembro exatamente do dia.

[Flashback]
JiHoon estava realmente impressionado. Não achou que poderia encontrar outra pessoa coreana em sua classe de inglês. Não imaginou que poderia encontrar uma garota que também estava migrando, estudando para entrar em uma faculdade americana. JinSung o encarou e reverenciou, com um sorriso tímido, o que foi o suficiente para que ele fosse falar com ela.
- Olá. - Era bom falar em coreano e saber que conseguiriam entendê-lo. - Você é coreana, certo?
- Sim. Olá. Você estuda aqui há muito tempo? - Era uma voz linda. Doce e suave, mas grave ao mesmo tempo.
- Não. Primeiro ano também. Acabei de me mudar com meus pais. E você?
- Vim estudar inglês. Estou morando com a minha tia. - JinSung não se lembrava de ter um sorriso tão brilhante assim. Ele se sentou ao lado dela e o perfume também era ótimo.
- Park Ji Hoon. - Ele estendeu a mão e ela o encarou, tímida.
- Yoo Jin Sung. - Ela apertou a mão dele, tentando controlar o sorriso e não parecer tão feliz.
- Quantos anos você tem? - Ji Hoon perguntou, acomodando-se e tirando os cadernos da mochila ao ver a professora entrar.
- Dezoito.
- Pode me chamar de “oppa”, então. - Ele deu uma piscadela, esperando que não tivesse sido atrevido demais. Jin Sung sentiu suas orelhas esquentarem e segurou o sorriso, tentando ao máximo prestar atenção no início da aula.


Você se lembra de como nos conhecemos? De tudo o que passamos até agora? Um ano como amigos, mais seis meses como namorados, o escândalo dos nossos pais quando decidimos morar juntos, para ficar mais perto da faculdade. Ainda me lembro dos vários discursos da minha mãe e do meu pai dizendo que era desrespeitoso. Sua tia apoiando a gente e seu pai querendo que nos casássemos. Nós dois, nesse meio, só tentando não pirar e ficar junto, apesar dos pesares. Você sempre sabia tudo. Sabia o que eu estava pensando, como eu estava me sentindo, como me acalmar, mesmo que fizesse isso sem nem perceber. Sempre fazia planos como se nada estivesse acontecendo, como se tudo estivesse resolvido, mesmo em meio ao caos.
Minha melhor amiga. Meu amor. Estar longe de você é como uma noite que não tem fim, um inverno que não acaba. Eu não vejo a hora de ver você de novo, poder te dar o anel que comprei há mais de um mês e, finalmente, poder me humilhar dia e noite até que seus pais nos dêem a benção deles. Viver pra sempre com você, até que a morte nos separe. Mostrar para todos que não há dor que dure para sempre.
O anúncio de mensagem no meu telefone me traz de volta ao quarto. Eu nem percebi quanto tempo passou e já são quase seis da tarde. Ver seu nome na tela do telefone, com o anúncio da nova mensagem, traz um sorriso gigantesco e completamente vergonhoso ao meu rosto. Ah amor, você aquece tudo dentro de mim. Desbloqueio com pressa, errando a senha duas vezes antes de poder ler o que você me escreveu.

아침은 다시 올 거야
어떤 어둠도
어떤 계절도
영원할 순 없으니까
사랑해 오빠 ❤


É possível sentir-se tão feliz com uma simples mensagem? Uma mensagem que eu nem entendi direito, mas uma simples junção de frases que tornou meu dia frio em um dos melhores dias. Qualquer dia fica maravilhoso quando eu falo com você, meu amor. Tudo bem, eu não entendi muita coisa da mensagem… “A manhã virá novamente, porque não há escuridão e nem estação que dure para sempre.” Que sentido isso faz, meu anjo? A única coisa que fez muitíssimo sentido, é quando você diz que me ama. Nossa, como eu sinto falta de você me dizendo isso, pessoalmente, com aquele olhar sorridente e brilhante, que faz meu coração disparar. Meu Deus, eu sou tão apaixonado por você que chega a ser ridículo.

“Você sabe que isso não faz sentido nenhum, certo?”


“Vai fazer.”

“Você precisa ser tão enigmática?
Você sabe que eu não sirvo pra isso”


“Preciso me arrumar. Nos falamos depois.”


Essa menina ainda vai me deixar maluco. Certamente vai.
Mais uma mensagem dela soou no meu telefone.

“Espere pelo dia de primavera.”
“O que isso quer dizer?”


Sem resposta. Mais uma vez, ela me deixa mais confuso do que antes. Ainda falta mais ou menos um mês até que a primavera chegue, esse inverno sequer parece perto de acabar com toda essa neve do lado de fora. Mesmo assim, sem respostas, parece que terei mesmo que esperar. Mais tempo, mais noites acordado pensando em você. Minha vontade mesmo é largar tudo, ir até você, buscá-la e sequestrá-la, para acabar de vez com o meu inverno pessoal.
Infelizmente nesse momento, só me resta esperar.

XX

As batidas na porta acabaram me acordado, de tão insistentes. A campainha também estava sendo tocada incessantemente. Que horas são mesmo? Nem dá pra pensar direito à essa hora da manhã, mas a pessoa que decidiu me acordar está determinada. Eu preciso levantar e abrir a maldita porta. Ainda cambaleando, procuro meu casaco e desço as escadas devagar, bocejando, tentando não cair. Eu gostaria de dizer que estou acordado, mas não estou. Assim que eu despachar essa pessoa, vou aumentar o aquecedor e voltar a dormir. Quando estiver na hora de pensar se limparam as ruas ou não, eu me preocupo em ir trabalhar. Pessoas inconvenientes que surgem tão cedo na casas de outras pessoas, deveriam ser multadas ou algo assim.
- Já vai! - Gritei, raivoso, para ver se a pessoa parava de surrar minha porta, mas não adiantou muita coisa. Bufei e fui em direção à porta. Até a maçaneta estava gelada, nem quero imaginar o frio que deve estar lá fora. Abri a porta só alguns centímetros, sentindo meus dedos do pé congelarem com o vento frio que entrou e meu coração parar por alguns segundos com a figura da pessoa que eu vi ali.
- Não acredito que você trocou a fechadura, oppa! Eu estou congelando aqui fora! - Eu juro que parecia um sonho. Ela, parada na minha porta, toda agasalhada, brigando comigo em coreano. Eu ainda estava dormindo. - Você vai me deixar aqui fora virando picolé? - Eu ainda não estava conseguindo acreditar naquilo. Dei um passo para trás e ela passou por mim, deixando seu cheiro floral pelo ar. Gardênias. Eu até me lembrava do cheiro?! - Você não devia manter esse aquecedor tão baixo, está muito frio! Eu tive que vir caminhando desde a rua principal, praticamente não sinto meus pés. - A casa antes vazia e silenciosa, agora parecia lotada e barulhenta. Ela se movimentava, tirando o excesso de roupa, indo até o aquecedor, ficando com os pés próximos à saída de ar. - Achei que o vôo seria um pouco mais calmo, mas tinha um bebê na minha frente que estava tão enjoadinho, coitado. A mãe dele não sabia mais o que fazer para que ele ficasse quieto. O pai andava com ele pelo avião, brincava com ele, mas o silêncio nunca durava mais do que uma hora. Eles estavam muito envergonhados pelo barulho. Pobre Jimin, não tinha culpa, certo? O que você fez ontem, preso em casa por causa da neve? Eu vi as matérias no aeroporto, enquanto esperava pelo outro vôo da minha conexão. - Eu nem estava conseguindo pensar direito. Ela não podia estar ali, podia? Eu mandei mensagem pra ela, JinSung estava na Coréia, não estava? - Oppa? - Ela riu, estalando os dedos em frente ao meu rosto. - Você está me ouvindo?
- JinSung? Yoo JinSung? - Perguntei, ainda tentando organizar meus pensamentos.
- Não consegue acreditar que sou eu? Ou tem alguma vadia que você precise esconder? Park JiHoon, eu vou destruir você e toda sua existência! Onde ela está?! Não acredito que você está me traindo com uma americana qualquer! Eu vou matá-la e depois eu mato você. - Ela começou a andar de um lado para o outro, bufando, procurando por alguém que não estava ali, bagunçando os cabelos de nervoso. - Não acredito que eu cruzei o Pacífico e os Estados Unidos inteiros para isso! Como eu sou tola. - E eu não consegui mais aguentar. A alcancei e a envolvi com meus braços, apertando forte meus braços ao redor dela, como se minha vida dependesse daquilo. Honestamente, eu acho mesmo que depende.
- Eu estava morrendo de saudades de você. Definhando aqui, meu amor. - Meu rosto estava afundado no pescoço dela, eu estava me embebedando do melhor cheiro do mundo.
- Está tentando me bajular pra eu não revirar essa casa? - A voz dela, abafada pelo abraço, já tinha perdido toda raiva, dando lugar à doçura e à saudade. Eu me afastei alguns centímetros, segurando o rosto dela em minhas mãos, enquanto seus braços envolviam minha cintura, impedindo que eu deixasse mais qualquer milímetro entre nós. Seus olhos me puxavam, como um ímã, prendendo-me a JiSung do jeito que eu mais gostava.
- Você não faz ideia do quanto eu tenho desejado você aqui… Tanto, a ponto de ainda acreditar que estou delirando, que minha cabeça e coração, completamente inebriados por você, estão me fazendo imaginá-la nos meus braços. - Ela riu, iluminando o ambiente e fazendo com que eu também sorrisse.
- Para de ser bobo. - Ela parecia feliz. Eu não sei definir como eu me sentia, mas “a ponto de explodir de felicidade” seria uma boa expressão. - Eu aproveitei que tinha algum tempo livre e adiantei as matérias. Estudei como uma condenada, nem dormi direito, extingui minha vida social e fiz uma promessa para mim mesma: eu viria até você no primeiro dia de primavera. - Ela sorriu, fechando os olhos e remexendo o rosto ainda envolto pelas minhas mãos, como um gato pedindo carinho. - Aqui estou eu. - Ela é tão linda! Deixei que minhas mãos acariciassem sua pele macia, em cada pedacinho de seu lindo rosto.
- Meu amor… Não sei se você notou, mas é uma das piores nevascas das quais se tem notícia. Eu sei que o tempo pode um pouco melhor em Seul, mas eu duvido que a primavera tenha chegado, sei lá, quase um mês antes? Não ache que eu estou reclamando, porque eu definitivamente não estou e… - Ela grudou seus lábios nos meus por alguns segundos, impedindo-me de continuar meu discurso.
- Você está enganado. - Ela riu, como uma criança travessa, e se afastou de mim. - As cerejeiras estão florescendo. - Ela correu até a mochila que largara ao chegar, abrindo e revirando como se procurasse por algo, enquanto eu só a olhava. Não conseguia tirar meus olhos dela. Honestamente, eu sabia que deveria estar com a maior cara de idiota do mundo, sorrindo sem parar. JiSung está aqui. E eu não estou sonhando. - AH NÃO! - Ela gritou, despertando-me do meu topor. - Eu não acredito nisso.
- O que houve? - Eu cheguei mais perto e precisei me esquivar do galho que ela ergueu da mochila.
- Caíram todas do galho! - Sua expressão estava devastada. - Eu as protegi de todas as outras coisas, em uma caixa, e agora estou com um mísero galho! Não acredito nisso… Eu quase fui presa por pegar isso, sabia? Uma cerejeira floresceu antes do tempo e enquanto todo mundo tirava fotos e noticiava, eu fui lá e saquei um ramo. Tive que correr mais de três quarteirões dos guardas municipais. Estou muito frustrada. - Seu biquinho de tristeza e seus ombros caídos deixavam bem evidente o quanto aquilo era importante pra ela. Minha namorada tinha preparado uma surpresa que não deu tão certo quanto ela esperava e eu só queria beijá-la até que sorrisse novamente. Dei alguns passos até ela, segurando seus ombros e fazendo-a olhar para mim.
- Querida, você está aqui. Faz ideia do quanto isso já é mágico para mim? Muito mais do que cerejeiras florescendo antes do tempo. Quer saber por quê? - Ela continuava emburrada, mas assentiu para que eu continuasse. - Porque, para mim, não importa se lá fora caem flocos de neve ou pétalas de flores, se está -20°C ou 40°C. Você é o que mais importa. Você é quem aquece tudo, trazendo a primavera para dentro de mim, fazendo meus sentimentos florescerem, mesmo em meio a esse inverno tão rigoroso. - Eu não achei que minhas palavras teriam tanto impacto, mas JiSung estava com os olhos marejados, visivelmente emocionada.
- Eu senti tanto sua falta… Eu te amo tanto. - Era disso que eu estava falando. Ouvir só essas duas frases já aquecem meu corpo inteiro, fazendo meu coração acelerar. Ter seus braços ao meu redor é como ser envolvido pelo próprio verão. Como eu poderia querer outra coisa? Quem se importaria com as flores de cerejeira quando essa menina viajou por horas só para estar aqui, ao meu lado?
- Eu também amo você. - Levantei seu rosto em direção ao meu. Não iria aguentar mais nem um minuto sem beijá-la. - E saiba que, se você não viesse, se esperasse mais um pouco, eu teria ido até você. Eu não ia suportar mais tempo tão longe.
- Isso quer dizer que eu podia ter economizado dinheiro se esperasse por você? - Ela perguntou em brincadeira e eu não consegui segurar o riso.
- Cala a boca e me deixa te beijar de uma vez. - Uni nossos lábios ainda em meio aos sorrisos, beijando minha garota como quis desde que ela chegou. Eu sabia que ela teria que voltar para Seul em algum momento. Sabia também que logo limpariam as ruas e eu teria que voltar à minha rotina enlouquecedora. Eu sabia que teríamos que passar mais algum tempo separados, mas nada disso me impediria de aproveitar cada segundo que eu pudesse com a garota dos meus sonhos. A garota da minha vida. Ali, na minha sala, beijando-a e deixando-a saber o quão amada ela é, eu podia sentir toda a solidão, tristeza e saudade irem descongelando aos pouco, como a neve lá fora. Percebi que JiSung tinha razão.
Era o primeiro dia de primavera.
Da nossa primavera.


Fim.



Nota da autora: Sem nota.



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