Se eu quiser chorar, não ter que fingir, sei que posso errar, que é humano se ferir......
“Hora da morte?”
“6:45 da manhã.”

Madelyn saiu de dentro do quarto do hospital apertando os olhos e respirando fundo. Ela tinha certeza que curaria aquele paciente. Ninguém acreditava nela, mas ela insistiu que conseguiria, e conseguiu, mas ele não resistiu. Respirou fundo e caminhou até a máquina de café, sentindo o gosto do líquido descer pela garganta. Ela precisaria dar a notícia a família do paciente e não tinha coragem. Enrolou alguns minutos, tomou mais um copo de café e foi atrás dos entes que esperavam notícia.

– Doutora, como nosso menino está? – Droga. Aquilo era a pior parte do seu trabalho.
– Eu sinto muito. Ele não resistiu.

Madelyn explicou o que aconteceu com ele e o que levou a morte súbita, deixou que a família se despedisse e quebrou as regras pela primeira vez. Ela os abraçou. Depois de liberar o corpo e fazer o óbito formalmente, Madelyn caminhou até a capela do hospital e sentou em umas fileiras.

– É.....oi. – suspirou. – Você tinha mesmo que matar ele? Não tem gente o suficiente pra você aí, não? Precisava de mais um? – disse com raiva. – Todo mundo fala que você é justo, isso pra mim não é justiça! Será que você existe mesmo? Não consigo acreditar em um Deus que mata pessoas e deixa a família sofrendo aqui. – ela se levantou e saiu.

Mady botou sua máscara de durona mais uma vez e foi encarar o resto do seu plantão de 48 horas esperando que realmente ela tivesse alguma prova dessa existência. Depois que seu pai morreu, Mady perdeu toda fé que ela tinha em Deus, então toda vez que algum paciente morria no hospital que ela trabalhava, mais afastada ela ficava.

Não quero imitar Deus ou coisa assim, só quero encontrar o que é melhor em mim.

O anjo Cassiel era o anjo de Madelyn desde quando ela nasceu, tomou conta dela em todas as circunstâncias onde ela estava e não seria diferente agora. Ele estava do lado dela quando ela pecou dentro da capela de frente para Ele. Dizem que nossos anjos da guarda levam todas as nossas orações até Deus. Não foi diferente dessa vez.

– Como ela ousa falar assim Dele? – indagou Miguel.
– Ela só estava nervosa. Eu vou aconselhar ela. Pode confiar em mim.
– Ele vai ficar sabendo disso. – assentiu.
– Ela vai melhorar, eu sei. Ela ficou chateada com a morte do paciente dela, ela tem como se salvar, por favor. Eu consigo.
– Cassiel...
– Eu sei que é mais experiente que eu, mas eu vou conseguir! Ela só precisa de um tempo....

Cassiel saiu cabisbaixo e desceu novamente na Terra para ver Madelyn. Ela estava na hora do descanso e dormia na pequena poltrona da sala. Ser anjo da guarda deve ser muito difícil, ainda mais se ela for uma descrente, mas Cassiel acreditava nela. Acreditava sempre no melhor das pessoas. Acreditava que se ficasse por perto e ajudasse Mady, sabia que ela iria melhorar.

Parece absurdo, mas tente aceitar que os heróis também podem sangrar.........

Madelyn chegou em casa depois do seu plantão e se enfiou no chuveiro tentando tirar o cheiro de hospital que ela sentia saindo do corpo. Botou um pijama velho e pediu comida chinesa. Mady se sentia meio solitária vez ou outra e até pensava em adotar um bichinho e ter alguém pra quem chegar em casa, mas também pensava na responsabilidade de cuidar do bicho, então ela deletava essa possibilidade da cabeça toda vez que podia.

– Que droga. – bufou sozinha. – Eu deveria mesmo arrumar um gato ou um peixe, sei lá. – disse jogando o controle da tv de lado.

Mady foi jogar fora as caixas de comida quando se deparou com ela mesmo chorando. Ela não sabia se era de raiva, de cansaço, os dois, ou se ela simplesmente era a velha Mady que tinha sentimentos e não aquela que ela se tornou. Ela limpou o rosto e deitou-se em sua cama.
Naquela noite Mady sonhou que estava em um jardim bonito com muitas flores e com uma paz que ela jamais sentiu antes. Ela viu seu pai no sonho, também. Ele disse que estava em paz e que ela deveria estar em paz também. Pela primeira vez em muito tempo ela dormiu tranquila.

xXx
Cassiel estava mais uma vez zelando por Mady como sempre fazia, ele a ouviu falando sobre o bichinho de estimação e teve uma ideia mirabolante, pegaria um gatinho para ela de algum jeito. Pra isso, ele precisou fazer algo que ele nunca pensou em fazer: Desobedecer a ordens celestiais. Ele esperou o dia amanhecer, se disfarçou de ser humano e adotou um gato de um abrigo. Ficou esperando a janela de Mady se abrir e tocou sua campainha repetidas vezes e se escondeu. Mady abriu a porta e se deparou com o gato deitado na cesta com um bilhete escrito “me adote”, sem remetente. Ela olhou pros lados e não viu ninguém. Pegou o gato e o levou pra dentro.

– É....Acho que você vai precisar de um nome. Cookie? O que acha desse nome? Cookie é bacana. – ela disse o soltando na cama dela. – Vamos precisar de cama, brinquedos e ração pra você. – Não sei quem te mandou, mas eu agradeço. Vai ser legal ter alguém. – ela disse brincando com a patinha do felino que já parecia pertencer a cama.

Os meses passaram e Cassiel continuou cuidando de Madelyn como prometeu. Ele estava sempre de olho nela e fazia pequenas interferências inocentes, palavras dele. Ela, por outro lado, também estava melhorando bastante. Ela começou a se abrir mais com os colegas de profissão, se reconectou com parentes que não falava mais e cuidava de seu gato, Cookie, com muito amor e cuidado. Cassiel estava feliz por vê-la feliz. Mas Cassiel estava dividido entre ficar no céu ou perder sua imortalidade e ficar para sempre no mundo dos humanos. Então pediu conselho aos três arcanjos: Miguel, Gabriel e Rafael.

Seja como for, agora eu sei que o meu papel não é ser herói no céu.....É na terra que eu vou viver......

– Tem certeza disso? – disse um deles
– Tenho. Sei que se eu descer de vez, viro mortal e posso morrer a qualquer momento. Mas quero correr o risco.

Eles assentiram e Cassiel desceu até a terra e esperou pelo seu encontro com Mady. Ele sabia que seria em breve.

Nota da autora: Sem nota.


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