After All This Time


Blind – Lifehouse



Eu corria muito.
Bem, pelo menos eu tentava. Eu tinha certeza que o Danny não estava dando tudo dele naquela corrida, só para me deixar ganhar, pelo menos uma vez. Eu tinha certeza absoluta daquilo!
Depois de correr alguns metros, talvez 200, eu não sabia ao certo, minhas pernas começaram a pesar mais do que o normal. Minha garganta estava ficando extremamente seca e a minha velocidade estava diminuindo. Já Danny continuava no mesmo ritmo, aquilo me impressionava! Nós corremos pelo menos quatro quadras gigantescas da casa dele até ali, e ele continuava num ritmo constante, me alcançando.
Eu parei completamente sem fôlego, estávamos apenas a uma quadra até o parque do bairro dele. Apoiei minhas mãos nos joelhos e pude sentir algumas gotas de suor escorrerem na minha testa e pescoço, aquilo incomodava, mas correr com Danny era divertido, ele me fazia ter ataques de risos e eu simplesmente amava ter ataque de risos com ele. Ele era o garoto com a risada mais gostosa e mais contagiante que eu já conheci!
Eu puxei bastante ar para dentro dos meus pulmões. Aquele simples ato pareceu ser a coisa mais prazerosa do mundo. Inspirar oxigênio depois de uma corrida como aquelas é sempre muito bom.
Um ventinho fresco soprou ali perto e antes que eu pudesse fazer qualquer outra coisa, Danny passou correndo ao meu lado. Ele estava na minha frente, correndo bem na minha frente, e ganhando distância! Eu pensei que ele me deixaria ganhar ao menos aquela vez!
Eu voltei a correr com certa dificuldade. Atividades físicas nunca foram o meu forte. Danny chegou ao parque e caminhou em direção às árvores.

- Cansou?
Ele perguntou com aquela voz misteriosa enquanto eu o procurava, sem sucesso, já que a luminosidade naquele parque era algo terrível. Desde que eu me entendo por gente eu ia para aquele lugar durante os Natais e desde aquela época as coisas não eram muito boas.
- Claro que não! Eu sou a esportista da família esqueceu? – Falei brincando e me aproximando dele, que estava encostado em uma árvore perto de onde eu o estava procurando antes.
- Uhh sim! Como eu pude ignorar as medalhas no seu quarto?! – Ele perguntou cruzando os braços com uma cara de desprezo divertida e um sorriso nos lábios. Daniel definitivamente tinha o sorriso mais cativante da galáxia, sem hipérbole ou puxa-saquismo. Ele era o garoto com o sorriso perfeito e a risada então, nem se fala!
- Bobo! – Eu falei parando em frente a ele que ainda tinha a mesma expressão.
Danny parou de sorrir e ficou sério, mas ainda assim eu conseguia ver um brilho naqueles olhos azuis. Ele estava feliz. Eu estava feliz.
Nós não precisávamos sair por aí rindo a toa. Dizem que quem ri demais é sinal de desespero e nós não estávamos nem perto disso.
Ele tocou a minha mão esquerda e me puxou ainda mais para perto dele. Eu envolvi os meus braços em seu pescoço e senti aquela respiração quente na minha bochecha.
- O verão vai ser legal. – Ele sussurrou.
- Eu acho que sim. – Eu fechei meus olhos e pude sentir seus beijos em meu pescoço.
Um gemido fraco e involuntário saiu da minha garganta. Eu não conseguia controlar os efeitos dos carinhos de Danny sobre mim.
Um segundo depois eu estava encostada na árvore. Ele me girou tão rapidamente e tão delicadamente que eu mal percebi.
Danny finalmente me beijou.
Não foi como o nosso primeiro beijo, quando ainda tínhamos 14 anos, foi mais intenso e com mais sentimento, pelo menos sentimentos revelados. Sentimentos agora conhecidos por nós dois.
Danny já estava acariciando a minha cintura por debaixo da camisa quando a música I Feel Good de James Brown veio do celular no bolso de trás de sua calça.
Ele parou de me beijar e sussurrou um “merda”. Eu me segurei para não rir.

- Você não trouxe o seu celular? – Ele perguntou assim que checou o identificador onde estava escrito ‘Tia Meg’.
Minha mãe me ama de verdade!
- Desligado! – Sorri sapeca ao pegar o meu celular no bolso do jeans surrado que usava e mostrar a ele.

- Hey, tia! – Danny falou num tom de voz tão ‘eu sou um sobrinho amado e exemplar’ que eu me segurei novamente para não rir.
- A está com você, Danny?
Ponto para quem inventou o ‘Viva Voz’!
- Está sim, tia. Nós estamos na casa de um colega meu. Você quer falar com ela?
Daniel mentia bem. Fato!
- Não precisa, Danny, é que o celular dela está desligado. Só queria saber onde estava mesmo.
- Ok.
- Sua mãe pediu para não voltarem tarde!
- Pode deixar, estamos indo agora para casa. Beijo!
- Beijo, querido!

Eu sentei esperando que Danny terminasse logo a conversinha com a minha mãe.
Ainda bem que eu tinha esquecido o celular desligado.
Ele logo desligou o aparelho e sentou-se ao meu lado. Beijou meu ombro e apoiou o queixo lá.

- Algum problema? – Perguntou ao me ver séria.
- Nenhum.
- Tem certeza?
- Absoluta! – O olhei e beijei sua bochecha. – Vamos para casa antes que eles liguem novamente!
Ele me respondeu com aquele sorriso sincero e extravagante e eu sorri imediata e involuntariamente. Eu estava acostumada com aquele sorriso há quase dezesseis anos, mas quanto mais ele sorria, algo ainda mais forte crescia dentro de mim.
O sorriso dele me conquistava a cada manhã. E eu daria tudo para aquilo ser eterno.
Tudo mesmo.

- Alguma desculpa em mente? – Eu perguntei um pouco nervosa quando já estávamos em frente à casa de Danny.
- Nós não precisamos de desculpas, . Para eles, nós somos apenas primos se divertindo, nada mais. – Ele falou tranqüilo. – Tente disfarçar, só dessa fez! – Falou me zoando e dando um leve beijo em meus lábios.

- Hey família, cheguei! – Danny entrou sorridente em casa.
Eu estava logo atrás dele, completamente sem graça.
Certo que eles não sabiam de absolutamente nada que acontecia entre Danny e eu, mas aquela situação de “ficar” escondido com o primo não era nem um pouco confortável, mas era gostoso. Digo, Danny é meu primo, eu gostava dele, ele é lindo e tem um sorriso contagiante, nossos pais provavelmente não aceitariam, mas tudo que é proibido é mais gostoso. Eu tive a exata confirmação daquilo aos quinze anos!
Nossas mães são irmãs, e ele só é dois meses mais velho que eu. Minha mãe fazia o tipo moderninha, mas eu tinha certeza que se ela soubesse do que acontecia entre sua filha e seu sobrinho, ela se tornaria a velha mais conservadora e chata de toda a Inglaterra.
Só de imaginar a reação de toda a família já me dava vertigem.



Eu dirigia em direção a Bolton com muita segurança. Eu já havia percorrido aquele caminho milhares de vezes, desde bebê eu passava o Natal ou as férias de verão naquela cidade.
Eu tinha na minha cabeça cada simples detalhe daquela estrada, cada árvore, desvio ou casinha construída bem longe de tudo e de todos. Mas era Natal, a neve cobria absolutamente tudo e eu fazia um tremendo esforço pra enxergar a estrada lá fora.
Logo pela manhã, quando eu saí de Londres, uma rádio que eu não lembrava mais o nome recomendava aos seus ouvintes a não tentarem nenhuma viagem, pelo menos por aquela noite. Ameaça de nevasca era alarmante e os ingleses obedeciam rigorosamente uma previsão do tempo, ainda mais com um tempo daqueles.
Eu estava há muito tempo longe. Eu não podia simplesmente levar tão a sério uma previsão do tempo e não ir para Bolton.
Foram seis longos anos longe daquele país, seis anos longe de tudo. Eu precisava daquele Natal. Eu tinha saudade dos Natais naquela pequena cidade. Eu tinha saudade das pessoas que eu havia deixado para trás.


Eu tentava dormir a todo custo, mas o maldito abajur rotatório da Vicky fazia questão de me irritar. As sombra dos corpos celestes do abajur batiam direto na parede para qual eu estava voltada e eu ficava tão hipnotizada pelas estrelinhas girando que o sono simplesmente desaparecia.
Eu odiava aquele abajur. Eu sempre o odiei. Desde o aniversário de oito anos da Vicky quando o tio Alan comprou para ela na Irlanda.
Se eu virasse para o lado oposto eu daria de cara com a coisa e certamente arremessaria um travesseiro que o quebraria, mas eu não queria ver a minha prima triste comigo.
Respirei alto sem paciência e me levantei. Vicky dormia tranqüilamente e parecia não se incomodar com o meu “mexe-mexe” na cama.
Eu desci em direção à cozinha. Um chá forte talvez resolvesse, mas só quem sabia transformar um simples chá em um magnífico sonífero era a minha mãe, e ela provavelmente estava em seu décimo sono.
Peguei um copo de água gelada e fui para a sala de TV.
Sorte minha meus tios terem TV a cabo em casa, se não eu não teria outra escolha a não ser qualquer filminho de vinte anos ou algum jornal da madrugada.
Passava em um canal de música, a reprise de um especial de bandas dos anos 80 que eu jurava já ter visto antes, mas não havia muitas opções. Ou era a coisa lá em cima, ou a TV aqui embaixo. Eu escolhi a segunda opção e minutos depois estava me segurando para não rir de alguns clipes toscos que passavam.
Quase uma hora depois, o especial acabou e eu sentia minhas pálpebras pesadas. Finalmente algum resquício de sono!
A TV continuava ligada em algum programa que eu desconhecia. Eu fechei meus olhos e a única luz na sala era a que vinha do eletrônico ligado à minha frente.
Eu não estava totalmente consciente, mas ainda não estava dormindo.
Um peso afundou o lugar ao meu lado no sofá, o que me fez despertar do quase sono, imediatamente.
- Te assustei?
Danny estava lá. Bem ao meu lado, só de boxer.
Maldito garoto e maldito verão que o obrigava a dormir daquele jeito!
- Um pouco. – Eu sorri timidamente e bêbada de sono.
- Por que você está aqui?
- A abajur da Vicky não gosta de mim.
Ele riu.
- Você quer dormir no meu quarto?
Eu despertei. O olhei com uma sobrancelha erguida.
Eu sabia que nossos pais não viam mal nenhum na nossa união, nessa coisa de sair junto ou sei lá mais o que, mas uma coisa muito diferente era eu dormir no quarto e na cama dele!
- Você dorme lá e eu fico aqui na sala. – Ele se defendeu após notar o meu olhar.
- Não precisa. Eu logo subo e apago aquele monstrinho do lado da cama da sua irmã!
- Tudo bem. – Ele sorriu e encostou o nariz na minha bochecha. Aquele carinho era tão gostoso.
- Você não está com sono? – Eu perguntei enquanto ele me abraçava e eu encostava a cabeça em seu peito nu.
Danny tinha um cheiro de amaciante de roupa misturado com algum perfume masculino muito bom e isso o tornava ainda mais irresistível. O cheiro era realmente uma delícia.
- Não. – Respondeu simples fazendo cafuné em mim.
- E você?
- Cansada. A viagem foi um pouquinho longa.
- Tenta dormir então.
- Com esse carinho todo eu não duro nem mais dez minutos acordada.



O carro finalmente parou em frente à casa que eu sempre enfeitava com toda a minha família para o Natal. Ela continuava a mesma, exceto pela pintura que passou de um amarelo claro para um branco com detalhes verdes. As luzes de Natal estavam lá cuidando para que a comemoração fosse ainda melhor.
Alguns muitos carros estavam estacionados em toda a rua e nas casas vizinhas, assim como naquela, podia-se ouvir vozes felizes e risadas extravagantes.
Aquele era o clima de Natal!

- Pela Rainha! Você está mesmo aqui! - Essa foi a primeira coisa que a Vicky falou assim que atendeu a porta.
Eu carregava uma pequena mala e uma mochila, além de muitos pacotes na outra mão com presentes para a família inteira. Ela me abraçou apertado e a minha bagagem caiu.
Eu respondi o carinho da mesma forma, sentia muito a sua falta. Por um segundo eu esqueci a raiva que o seu amado abajur me fazia passar antigamente.
- A está aqui gente!
Ela gritou para todos que estavam em casa e em questão de segundos eu vi muitos cabelos e agasalhos me cobrindo com abraços e o carinho que eu esperei por tanto tempo para sentir novamente.

- Pensei que você não viesse passar o Natal conosco. – A tia Kathy falou docemente depois de todos os cumprimentos, e eu me senti extremamente feliz. Eu não sabia que aquela voz doce e meiga dela me fazia tanta falta.
- Eu tive que ignorar a previsão do tempo ou passaria o meu sexto Natal consecutivo sem vocês. - Ela sorriu e depositou um beijo na minha bochecha, seguindo para a cozinha terminar o jantar.
A casa estava tão animada que eu me aqueci rapidamente com todo aquele carinho familiar. Como eu sentia falta daquilo!


Aquela era a minha segunda semana em Bolton e eu estava realmente me divertindo.
Danny e eu continuávamos ficando, mas ninguém desconfiava de nada, porque se desconfiassem, eu nem estaria mais naquela cidade.
Eu dividia o meu tempo com Vicky e suas amigas, Danny e nossas aventuras e algumas saidinhas com a nossa família.
Era incrível o cinismo daquele garoto, chegava a me irritar.
- A tia Kathy também notou a forma como aquele garoto olhava para você filha! – Minha mãe falou animada.
Eu, mamãe, tia Kathy e a Vicky estávamos na cozinha terminando o jantar. Havíamos passado a tarde numa feira ao ar livre que vendia artigos para casa em geral, um verdadeiro saco, mas era programa de família então tínhamos que estar lá.
Eu, Danny e Vicky ficamos conversando numa improvisada praça de alimentação enquanto nossos pais se divertiam comprando besteiras que eu duvidava muito que um dia fossem usadas na nossa varanda ou na sala de jantar em nossa casa em Londres.
Um garoto se aproximou do nosso grupo e começou a conversar comigo. COMIGO! Ele praticamente ignorava os outros dois na mesa.
- Ele nem percebeu que havia mais duas pessoas na mesa! – Vicky colocava lenha na fogueira enquanto mexia o molho do macarrão.
- Eu prefiro que vocês não me lembrem desse incidente. – Falei irritada mordendo um pedaço da maçã que eu tinha acabado de pegar na geladeira.
Eu não queria discutir se um garoto estava ou não a fim de mim na frente da minha mãe, aquilo era no mínimo constrangedor!
- Eu juro que vi uma baba no canto da boca daquele rapaz! – Danny entrou na cozinha se intrometendo na conversa. Com certeza ele estava ouvindo escondido atrás da porta da cozinha para ter algo com o que me zoar mais tarde.
Ele correu e roubou a minha maçã. Eu o olhei com cara de “você me paga garoto” e ele riu saindo da cozinha.
- Até o Danny percebeu! – Minha mãe voltou a falar como uma franga. Ok, eu nunca levei nenhum namorado em casa, aliás, eu nunca havia me relacionado sério com alguém, só aquela coisa de adolescente, de ficar com garotos, mas ainda assim eu era bem comportada nesse sentido. Conversar sobre aquilo na frente da minha mãe era triste, e com Danny ouvindo as teorias da nossa família louca era pior ainda!

Nós jantamos e o assunto na mesa ainda era, segundo Danny, a minha força sedutora sobre o garoto da feira o qual eu mal lembrava o nome.

Os homens da casa ficaram responsáveis por tirar a mesa e lavar a louça. Nada mais justo já que as mulheres haviam cozinhado.
Vicky conversava com alguma amiga por telefone e mamãe e tia Kathy estavam na sala de TV assistindo um programa sobre cirurgia plástica. O volume do aparelho estava tão alto que eu podia ouvir da varanda do segundo andar os conselhos do cirurgião.
Eu estava sentada na varanda em uma poltrona de couro sintético marrom muito confortável, qualquer um conseguiria facilmente dormir nela de tão espaçosa e fofa que era. Com certeza havia sido comprada na ida a alguma feira como aquela que eu tinha freqüentado aquela tarde.
Um game sem graça do celular prendia a minha atenção.
- O que você está fazendo?
Danny e sua maldita mania de aparecer do nada me assustando.
- Jogando. – Falei seca.
- O quê? – Ele falou sentando-se no braço da poltrona onde eu estava sentada.
- Um jogo chato. – Continuei no mesmo tom.
- Você está brava. – Ele tomou o celular da minha mão e eu o fuzilei com o olhar, mas ele nem percebeu já que agora quem jogava o game sem graça era ele mesmo.
Eu passei as mãos pelos meus cabelos e me levantei andando até a sacada.
Danny conseguia me irritar quando resolvia dar uma de bom ator e logo em seguida vinha fingindo que nada havia acontecido. Ele realmente conseguia!
- Você está brava. – Ele repetiu, mas dessa vez olhando para mim.
- É, eu estou. – Eu me virei e ele andou até mim.
- Você sabe que aquilo foi pura brincadeira. – Ele pegou a minha mão e eu olhei naqueles seus lindos olhos azuis que brilhavam de uma forma diferente com a luz da rua.
- Eu sei. Eu sou boba por ficar brava com uma brincadeira.
- Eu gosto de você assim. – Ele sorriu e encostou um pouco mais.
- Danny, eu não acho uma boa idéia. – Me afastei e voltei a sentar na poltrona.
- ... – Falou manhoso.
- Estão todos em casa Danny, não vamos arriscar.
- Você é tão racional... – Ele voltou a sentar no braço da minha poltrona.
- E você tão abusado! – Sorri olhando para ele.
Danny encostou um pouco mais e me beijou de leve nos lábios.



A Vicky cantarolava animada alguma música natalina no quarto enquanto eu tomava banho. Ela já estava pronta para o jantar. Vestia uma saia jeans escura com meia calça e bota preta e tudo combinada angelicalmente com uma blusa de cetim vermelha de alcinha. Eu tinha certeza que aquilo era trabalho da tia Kathy, eu não imaginava uma blusa como aquela no armário da minha prima.
Não demorou muito e a música que ela cantava há quase quinze minutos, cessara. Eu desliguei o chuveiro achando estranho e a chamei, sem sucesso. Ela devia ter descido para receber mais algum convidado.
Coloquei um jeans preto, uma espécie de bata cinza com um decote em ‘V’ junto com um cinto dourado por cima e um salto que eu adorava usar. Mamãe e as minhas amigas sempre diziam que eu ficava bem de salto e isso só me fazia usá-los ainda mais.
Eu rezava para que o sistema de calefação interna cumprisse com o seu trabalho, se não eu estaria numa fria terrível, literalmente.
Fiz um rabo de cavalo simples e desci as escadas correndo assim que a minha mãe ameaçou vir me buscar.

Era bom estar com a família novamente, e principalmente, porque aquele momento era o Natal.
Faltava uma pessoa ali, o tio Alan, mas pelo pouco que eu soube, ele aprontou muito com toda a família e nunca mais ninguém o viu. Por mais que a tia Kathy, a Vicky e o Danny estivessem agora lidando bem com toda aquela situação, o tio Alan fazia falta, havia um vazio naquele momento com o qual os outros já deviam ter se acostumado, exceto eu.
Desde que eu coloquei o pé naquela casa eu não parava de me perguntar onde estaria o meu primo. Se ele passaria o Natal com a família ou se daria uma passadinha em Bolton pelo menos para vê-los no dia seguinte. Eu não conseguia esconder para mim mesma que apesar de seis anos terem passado eu ainda sentia uma coisa anormal dentro de mim quando o assunto era o Daniel. Havia um assunto muito mal acabado entre a gente, a forma como tudo aconteceu há seis anos foi no mínimo broxante.

Eu estava na cozinha com a Vicky cuidando da sobremesa e lutando para me manter limpa.
- O Danny demorou. – Ela tocou no ponto exato.
- Ele vem?
- Esse ano sim. Mamãe o fez prometer passar em casa, já que nos dois últimos Natais ele não jantou conosco por causa dos compromissos com a banda.
Eu ri imaginando a tia Kathy dando um sermão em Danny.
- Ele sempre pergunta por você.
- Eu sinto falta daqui. – A olhei sincera tentando disfarçar a alegria ao ouvir que ele sempre perguntava por mim e ela me beijou na bochecha. A Vicky sempre foi como uma irmã para mim, apesar de eu odiar aquele seu amor pelo maldito abajur.
Em pouco tempo nós terminamos a sobremesa, na verdade a calda de alguma receita nova da minha mãe. Estavam todos na sala em volta da lareira, havia mais algumas pessoas que foram apresentadas assim que eu cheguei, mas eu não lembrava mais o nome de muitas delas. Todos conversavam e sorriam enquanto algumas músicas natalinas tocavam bem baixinho no rádio.
Eu sentei ao lado do papai que me ofereceu uma taça de vinho e em seguida recebeu uma cutucada da minha mãe.
- A já tem 21 anos, Meg! – Ele exclamou tentando se defender.
- Eu não vou ficar bêbada, mamãe. - A beijei na bochecha e fui atender a campainha que tocava.

- Filha, volte aqui com essa taça de vinho!
Eu já estava abrindo a porta da sala quando minha mãe gritou e eu ri muito com aquilo. Por pouco eu não tenho um anel de noivado no dedo e ela ainda me tratava como uma criança. Mães...
- Wow! Se eu soubesse que você ficaria mais linda do que já era eu não te deixaria ir para Alemanha há seis anos! – Ele falou segurando o riso e eu parei de respirar por cinco segundos.
Danny estava bem na minha frente. Com um jeans folgado, uma camisa quadriculada nas cores azul, vermelho e branco, um paletó por cima e um cachecol que na minha opinião o deixou ainda mais bonito.
Ele não era mais um garoto, apesar da combinação ‘jeans e tênis’. Não parecia mais aquele adolescente que se apaixonou pela prima, ele continuava com aquela cara sapeca de sempre, mas agora ele era um... Homem.
Danny cresceu, assim como eu, acho que naquele exato momento eu percebi tudo o que eu havia perdido em todos aqueles anos.
Eu fiquei quase um minuto parada sem falar ou fazer nada, pode até parecer pouco tempo, mas tente ficar um minuto parado em frente a alguém, só assim você percebe a eternidade que realmente é.
Ele só me olhava com um sorriso extravagante, e eu provavelmente tinha a expressão mais boba que possa existir na face.
Não esperei muito e o abracei. Os pacotes que ele carregava caíram e milésimos de segundos depois eu senti seus braços envolverem a minha cintura. Como eu tinha saudade daquele toque.
- Eu senti tanto a sua falta, garota. – Ele falou baixinho e eu parti o abraço. Sorri sinceramente e o puxei pela mão até a sala onde todos estavam.


- Papai e mamãe ultimamente vêm me perguntando coisas estranhas.
- Por exemplo?
Eu e Danny estávamos em mais uma das nossas aventuras. Eu usei a desculpa de ir até o parque ler um livro enquanto ele programava um falso encontro com os amigos.
Havíamos caminhado até um pier abandonado de um grande lago que ficava um pouco afastado da cidade. Eu estava com a cabeça apoiada na perna de Danny enquanto o mesmo insistia naquele carinho gostoso que só ele sabia fazer, cafuné.
- Eles sempre me perguntam o que eu acho sobre mudanças.
- Mudanças?
- Sim. Eu pergunto que tipo de mudança e eles fogem do assunto.
- Suspeito.
- Muito.
Se não fosse aquela conversa, eu já estaria dormindo graças ao carinho de Danny.
- Você tem alguma suspeita do que seja? – Ele perguntou me olhando.
- Talvez... Às vezes eu acho que eles estão tentando me preparar para uma separação.
- A tia Meg e o tio Paul? Nunca! – Ele riu.
- É esquisito sim pensar nos dois separados, eles parecem tão bem juntos, mas eu não vejo outra coisa.
- Tira isso da cabeça , eles estão muito bem. Vai ver é outra coisa, ou nem é nada.
- É, talvez sim...



- Tia Kathy, o sal, por favor? – Eu pedi quando já estávamos na mesa jantando.
A sala de jantar estava tão cuidadosamente arrumada para a ocasião. Havia aquelas luzes coloridas de Natal na janela de vidro bem ao lado de onde comíamos. A neve caía fraquinha lá fora e aquela visão deixava o clima de Natal ainda melhor. Alguns arranjos estavam espalhados por toda parte e a toalha estava tão impecavelmente bordada...
- E o noivado, ? Sua mãe me contou, não vai dar a notícia para toda a família? – Tia Kathy me perguntou naquele tom gentil feliz assim que me passou o sal.
Danny estava sentado bem na minha frente e mesmo sem olhá-lo eu percebi que ao ouvir o que a mãe disse, ele tirou os olhos que antes estavam em seu apetitoso prato e me olhou.
A sala pareceu ficar mais quente e eu estava incrivelmente sem graça. Isso seria até normal se eu ainda tivesse quinze anos, mas eu era uma mulher agora!
- Bom... – Eu gaguejei.
Minha mãe ficaria bem triste quando soubesse o que havia acontecido antes de eu embarcar para a Inglaterra.
- Sim, meu bem? – Ela voltou a perguntar e eu a olhei. Naqueles poucos segundos que os meus olhos demoraram a encará-la eu pude sentir toda atenção da mesa voltada para mim.
- Eu não estou noiva. Eu recusei o pedido.
Não havia saída, mais cedo ou mais tarde eu tinha que falar toda a verdade. Eu fui bem direta e todos ficaram sérios. Eu tomei um grande gole de água da taça à minha frente e não consegui encarar ninguém ali.
- Minha querida, você vem comigo até a cozinha me ajudar com a sobremesa?
Santa tia Kathy, me tirando de um furacão de perguntas que provavelmente meus pais fariam bem ali, na hora do jantar de Natal.
- Claro, tia. – Sorri muito timidamente para ela e a segui até a cozinha.

- Obrigada por me tirar de lá, tia. – Falei encostada no balcão com a respiração pesada enquanto a tia Kathy pegava a sobremesa na geladeira.
- Eu não sei o que aconteceu exatamente, mas eu sei que você não recusaria um pedido de noivado à toa. Pegue os pratos no armário, por favor, ?
- Sim, tia, eu estou tão... Confusa. – Fui até o armário, peguei os pratos da sobremesa e os depositei no balcão.
- Eu sei que está. Você só tem 21 anos, o casamento é um grande passo e é preciso muita segurança para aceitar dar esse passo. Não fique mal por não ter dito ‘sim’, se essa foi a decisão correta para você é a única coisa que importa.
- O único problema é que a minha mãe organizou tudo isso com o Mark. Ela deu e idéia do lugar, opinou no anel que ele devia comprar, até sobre a época que o pedido devia ser feito ela deu opinião!
- Ela não fez isso por mal, querida...
- Eu sei, tia, mas eu tenho medo da reação dela entende?
- Entendo. A Meg estava bem feliz com essa idéia de você se casar, mas ela entende exatamente o que acontece com o seu coração, meu amor. Talvez você só não esteja preparada ainda. Ela vai entender. – A tia Kathy sorriu tentando me passar segurança e aquilo funcionaria há vinte minutos, antes da minha mãe saber que eu recusei o pedido de casamento do meu namorado, o Mark, agora, nada tirava aquele desconforto do meu coração.
Eu tentei sorrir, mas não adiantou muito. Eu peguei os pratos e os talheres e segui a tia Kathy até a sala de jantar novamente.


- Mark, eu... – Eu gaguejei pela segunda vez consecutiva. Estávamos em um restaurante caro no centro de Berlim. Mark havia me convidado para jantar naquele sábado e eu aceitei. A faculdade estava ocupando muito o meu tempo e um jantar com o meu namorado que eu já quase não via seria muito bom.
Ele me lançou um olhar profundo e uma lágrima escorreu pelo meu rosto.
- Você não é obrigada a aceitar. – A mão dele atravessou a mesa e acariciou a minha que segurava uma caixinha de veludo com um anel de brilhante dentro.
- Eu te amo, Mark, mas casar não é algo que está nos meus planos. Eu não me vejo casada, nem planejando um casamento, ou comprando coisas para um enxoval, ou escolhendo um apartamento legal com quartos suficientes para futuros filhos. Não é essa a vida que eu quero agora. Eu me vejo como oradora da minha turma da faculdade, fazendo um discurso legal com você e os meus pais me assistindo da platéia e sorrindo para mim. Eu me vejo trabalhando em uma grande empresa em Berlim e dividindo quem sabe um apartamento contigo, juntando dinheiro para uma viagem até a América do Sul. Me vejo numa super promoção na empresa, me vejo aprendendo coisas novas e conhecendo novas pessoas, tudo isso com você ao meu lado, mas não casada. A palavra “casamento” me assusta muito, eu não quero que isso me preocupe quando eu ainda tenho 21 anos, eu não estou preparada, entende?
- Entendo.
- Talvez isso não seja justo com você, mas se eu aceitar, o nosso casamento não vai ser feliz. Eu sinto que não vai.
- Eu te amo, , e não te forçaria a nada. Nós não precisamos casar para ser feliz. Se um dia você quiser casar com o plebeu aqui, avisa que o pedido ainda vai estar de pé.
Os meus soluços foram interrompidos por uma risada gostosa e logo em seguida pelo beijo de Mark.



A conversa com a minha mãe foi tranqüila. Eu pensei que ela me mandaria direto para a guilhotina, mas ela foi bem paciente e respeitou a minha decisão, e isso era o mínimo que ela realmente podia fazer, porque eu jamais me casaria à força, nem por ela. Pode até parece egoísmo da minha parte, ainda mais falar assim da minha mãe, mas nós estamos falando de casamento, é uma das decisões mais importantes que uma pessoa pode tomar na vida e eu não podia simplesmente me casar com o cara que a minha mãe julgava ser o genro perfeito.

O jantar acabou e toda a família seguiu para perto da lareira, estava muito frio. Eu peguei uma taça de um dos vinhos que a tia Kathy tinha estocado em casa e subi até a varanda do segundo andar.
Aquele era um dos meus lugares preferidos na casa. Eu podia ver a rua e um parque que ficava bem perto. À noite, a vista dali de cima era perfeita, a neve, as luzes das ruas, as luzes de Natal iluminando toda a cidade...
Eu sorri involuntariamente ao sentir um vento muito gelado bater no meu rosto. Dois grossos casacos de lã trabalhavam para me manter aquecida e as luvas mantinham as minhas mãos tão quentinhas que mesmo se eu ficasse cinco minutos com elas mergulhadas na neve eu não sentiria absolutamente nada.
A velha poltrona marrom continuava ali, mas agora, duas poltronas roxas moderninhas roubavam a cena. Eu me joguei em uma delas e fechei meus olhos. Era bom respirar aquele ar frio, era bom estar em casa novamente.


- Nós precisamos conversar. – Danny entrou no quarto da Vicky onde eu estava deitada virada para a parede e se sentou bem ao meu lado na cama.
- Eu não quero conversar Danny. – Minha voz saiu embargada, apesar de eu ter lutado para disfarçar.
- , por favor. Vamos aproveitar que só estamos nós dois em casa. – Ele acariciava minhas costas tentando me convencer a conversar com ele.
- Nós só vamos nos ver no Natal agora. – Eu me virei encarando os olhos de Danny que não tinham mais o mesmo brilho do começo do verão quando eu tinha acabado de chegar na cidade.
Seis semanas se passaram, meus pais tinham planos para o resto das férias e logo as minhas aulas recomeçariam. Eu precisava me despedir de Bolton.
Eu sentei na cama e encostei minhas costas na parede fria. Uma lágrima correu pelo meu rosto involuntariamente, mas eu não tentei impedi-la. Eu não queria esconder meus sentimentos, não dele.
- Vai ficar tudo bem. – Danny falou baixinho limpando a minha lágrima e eu o encarei.
- Como você tem tanta certeza?
- Eu vou esperar ansiosamente pelo Natal, aliás, eu vou esperar ansiosamente para te ver novamente. Eu não quero outra coisa, . – Ele sorriu tentando passar confiança, mas a certeza que eu só o veria dali a quatro ou cinco meses só piorava a situação.
Danny segurou minha mão e se sentou ao meu lado, eu pude sentir nossos ombros se tocarem e sua respiração aliviada, mas ainda um tanto triste.
- Me fale algo que me faça lembrar de você a todo momento. – Eu falei interrompendo o silêncio que se instalara no quarto.
- Você não lembra de mim a todo momento? – Ele me encarou com uma expressão engraçada.
- Claro que eu lembro! Mas algo especial, algo diferente que me faça lembrar de você e só de você. Por exemplo, quando eu penso no Natal eu me lembro sempre daqui de Bolton, porque aqui eu passei os melhores Natais da minha vida, entende?
- Espera um pouco.
Danny levantou e saiu do quarto. Eu não entendi absolutamente nada, mas esperei.

- Eu tenho algo aqui, mas... Bom, eu não sei se você vai gostar.
Ele chegou silenciosamente e eu só o percebi no cômodo quando finalmente ouvi sua voz. Abri meus olhos e lá estava Danny com uma expressão insegura, em pé bem na minha frente e com as mãos para trás.
- Você tem algo para mim?
- Sim. – Ele sorriu tímido e me entregou uma caixinha branca que mais parecia uma caixinha que guardava um anel de noivado ou algo do tipo.
Eu abri e encontrei um colar de linha e um pingente, no formato de uma guitarra, feito de casca de coco, e nele escrito “felicidade” com um coraçãozinho desenhado. Eu me perguntei onde diabos Danny encontrou aquilo para comprar, mas nenhum lugar veio a minha cabeça.
Não era um pingente de coração ao qual eu ficava com uma metade e ele com a outra, não era um anel de compromisso, nem um pingente escrito “eu te amo”, mas vinha do garoto por quem eu me apaixonei, não importava o que era nem do que era feito, só importava quem havia me dado.
Mordi meu lábio inferior e sorri para ele assim que peguei e analisei o presente que acabava de ganhar.
- Me desculpa a falta de romantismo, garotas preferem colares de verdade. – Ele fez uma careta e eu ri.
- Eu adorei, Daniel! - Danny riu e me abraçou. - Eu sentirei muito a sua falta. – Sussurrei no meio do abraço.



Eu acendi um cigarro e rezei para que ninguém me visse naquela situação. Eu não era uma viciada nem nada, mas aquele era o meu companheiro inseparável nas noites que eu virava acordada adiantando alguns trabalhos da faculdade. Talvez eu tenha pegado aquela mania com algum filme que eu costumava assistir na adolescência, quando um velho detetive virava a noite atrás de pistas com um cigarro na boca, mas eu não dependia daquela coisa para nada, era só mais um acontecimento banal na vida de uma universitária. Um maço daqueles ficava na minha bolsa tanto tempo que eu tinha que jogá-lo fora porque vencia e eu não usava. Definitivamente eu não era uma viciada.
Frio, vinho, cigarro e aquela poltrona formavam a combinação perfeita para uma noite de Natal. Eu não pensava em sair dali tão cedo e pouco me importava se os meus dedos dos pés começassem a sentir o efeito do frio congelante. Eu só queria ficar ali, tranqüila, pensando que tudo estava bem, pensando nas pessoas que eu amava e que elas estavam tão próximas de mim como eu jamais imaginei em seis anos.
Um barulho veio da grande porta de vidro da varanda e eu agi na velocidade da luz escondendo, ou pelo menos tentando esconder, o cigarro.
- Droga, Daniel! Quer me matar de susto?! – Perguntei brava quando o vi abrindo a porta e se apertando no casaco quando um vento gélido bateu lá em cima.
- Você estava fumando?! – Ele perguntou com aquela cara sapeca.
- Não!
- Ah, claro! Você quase se queimou tentando esconder a bituca e não tava fumando.
- Eu não estava fumando!
- Me deixa sentir seu hálito!
- Quê?! – Aquele pedido era no mínimo esquisito.
- Seu hálito, mocinha! – Ele falou rindo e se aproximando de mim.
- Não, Danny! Sai daqui ou então eu grito! – Eu tentava me afastar, mas ele se aproximava cada vez mais e eu acabei caindo na poltrona. – Merda!
- Eu te conheço muito bem pra saber que você não gritaria. – Ele continuou se aproximando. Eu já estava me esquivando na poltrona e Danny estava em pé bem na minha frente com as mãos no bolso do casaco.
- E então?
Eu me levantei tentando mostrar alguma segurança e fiquei de pé na poltrona. Apoiei minhas mãos em seus ombros e aproximei meu rosto do dele.
- E então, Daniel? Algum sinal de cigarro? – Nossas bocas estavam a pouquíssimos centímetros de distância e eu sussurrava provocando-o.
- Não. – Eu pude sentir aquela palavra ser pronunciada com insegurança.
- Tem certeza que essa distância é suficiente? Não quer que eu me aproxime mais só para não restar dúvidas?
- Heeey! Você tem um chiclete de menta na boca! Você trapaceou! – Ele falou alto e eu me afastei novamente dele.
- Você é maluco. – Pulei da poltrona e me apoiei na barra de segurança da sacada. Ele riu e veio para o meu lado.
Houve um grande silêncio. A única coisa que eu conseguia ouvir era o chiado da nossa respiração e algumas risadas no andar de baixo. As luzes na rua continuavam acesas e havia um sorriso no meu rosto.
- Você gosta muito do Natal, não é mesmo?
- É. – Eu respondi olhando para as luzes lá fora.
- Você fez falta aqui, muita falta.
- Eu também senti muita falta de tudo.
- Vamos lá... A Alemanha não é tão ruim assim.
- Não mesmo. – Eu o olhei. – Mas não é como estar em casa, não é como saber onde serão seus Natais, nem é como saber que você verá as pessoas que você mais ama no mundo nas férias. Não é a Inglaterra entende?
- Mas você tem uma vida lá agora. Tem a faculdade, seus amigos, seu namorado...
- Nada foi fácil, desde a minha ida, absolutamente nada foi fácil e eu não falo só de me adaptar a uma nova cultura ou a uma nova língua, eu falo de ter que me afastar de tudo aquilo que eu jamais devia ter me afastado.


- A Vicky e eu estamos planejando as nossas próximas férias de verão!
- Isso mesmo! E Bolton definitivamente não está em nossa lista!
- Eiii! Me incluam nesses planos! - Danny me olhou e sorriu meigamente sem ninguém perceber.
Já era Natal novamente.
Cinco meses haviam se passado desde aquelas férias onde eu e Danny resolvemos assumir os nossos sentimentos. Éramos jovens e completamente inexperientes, mas quando se trata de sentimento, ninguém precisa de experiência ou idade, talvez seja esse uma das poucas certezas que um jovem pode ter.
- Filha... – Mamãe me chamou assim que me serviu um pedaço do peru. O jantar de Natal daquele ano pareceu muito mais divertido com os nossos planos para as férias.
- Nós estamos pensando em algo como o litoral. – Eu falei sem perceber que a minha mãe havia me chamado e me virei para a família. – O que vocês acham?
Vicky fez aquela cara de anjinho como quem pede aos pais por favor para deixarem. Nós encarávamos a família quando papai me chamou novamente.
- Sim, papai? – Perguntei colocando uma azeitona na boca. Eu adorava azeitonas.
- Nós temos algo para falar.
- Hum. – Emiti algum som encorajando meus pais a continuarem. Minha boca estava ocupada tentando comer toda a massa da azeitona ao mesmo tempo em que tentava me livrar daquele maldito caroço.
Eu vi mamãe segurar a mão do meu pai e apertá-la. Eu sabia exatamente o que aquele sinal significava. Mamãe estava tentando passar confiança para papai e se aquele assunto exigia confiança ou encorajamento para que ele me contasse, não era nada bom. Nada bom mesmo.
Naquele momento eu me lembrei de uma conversa que eu tive com o meu primo nas férias, sobre as perguntas estranhas que os meus pais me faziam. Eu senti tanto medo que imediatamente parei a luta contra a azeitona e olhei rapidamente para Danny angustiada.
- O que está acontecendo? – Ele perguntou sério assim que percebeu o meu olhar.
- Não vai ter viagem nas férias de verão, filha. – Papai falou e me olhou sério.
- Por que, tio Paul? O papai disse que nos leva, o Danny também vai, não vai ter problemas! – Vicky argumentava.
- Eu fui transferido para a Alemanha.
Eu só abaixei o meu olhar e tentei controlar o que eu sentia. Eu precisei contar mentalmente para não explodir bem ali. A família toda ficou em silêncio só esperando a minha reação.
- Sua mãe vai abrir outro ateliê lá e tudo vai dar certo. Nós nos mudamos em um mês. – Papai continuou quando não obteve nenhuma resposta minha.
- Você realmente acha que tudo vai dar certo? – Eu o encarei tristemente. – Você acha que eu largando tudo na Inglaterra, colégio, amigos, família e indo para um país completamente desconhecido vai estar tudo bem? Você acha que lá o ateliê da mamãe ou a sua promoção na empresa vão me deixar tão feliz quanto os deixou?
- Filha...
- Me poupe, Paul! Eu nem sei falar alemão! Eu não vou e encerramos aqui esse assunto! – Joguei o guardanapo na mesa com força e subi a escada correndo com lágrimas escorrendo pelo meu rosto.

Eu não posso negar, aquele foi o pior Natal da minha vida.
Bolton não ficava nada perto de Londres, mas eu sabia que se precisasse ir até lá, uma viagem de trem resolveria. Paul estava falando da Alemanha que não é nada perto de Londres, muito menos de Bolton. Eu demoraria horas de avião para chegar até o meu país. Eu não queria e nem podia me distanciar dali naquele momento.
Eu não falava apenas do colégio ou das minhas amigas que seriam abandonadas em Londres, ou ainda da minha família que estava toda naquele país, havia uma pessoa em particular. Eu não conseguia simplesmente deixar Danny para trás sem uma parte do meu coração ser completamente quebrada.

O jantar não durou muito depois de eu ter corrido até o quarto. Não precisava ser vidente nem nada para perceber que o clima na sala de jantar não era o melhor. Eles não riam e nem havia mais o barulho dos talheres tocando os pratos. Eu fiquei muito tempo chorando, abraçando as minhas pernas numa posição de quem quer se esconder e ao mesmo tempo se proteger de tudo ao redor.
Eu não queria conversar com os meus pais, porque provavelmente eles tentariam me convencer de que aquela decisão, apesar de não ser a melhor, seria legal e logo tudo se encaixaria. Mas, quando exatamente as coisas se encaixariam? Quanto tempo eu teria que sofrer para que tudo entrasse nos eixos? Se é que um dia entraria.

Vicky subiu cerca de duas horas depois e eu já estava enrolada na cama. Ela perguntou se estava tudo bem e eu respondi que tudo se acertaria, então ela colocou seu pijama e pela primeira vez não se importou em ligar o seu amado abajur antes de se deitar.

Eu não conseguia dormir e nenhum chá conseguiria esse efeito sobre mim naquela noite.
Eu chequei se a minha prima estava dormindo e coloquei alguns casacos de lã por cima do pijama.
Estava bastante escuro e eu tateava tudo pelo caminho com muito cuidado para não acordar ninguém.
Caminhei até o fim do corredor e entrei em outro quarto.
O quarto de Danny estava iluminado somente pela luz que vinha dos postes da rua e de algumas luzes de Natal, ainda acesas lá fora. Por um momento eu me senti completamente deslocada na minha época do ano favorita.
A porta atrás de mim se fechou e eu vi a luz refletir nos cabelos do garoto deitado na cama.
- ? – Ele me chamou.
Só de ouvir a voz dele, as lágrimas começaram a correr pelo meu rosto. Eu era oficialmente uma adolescente boba e apaixonada.
Escorreguei até o chão com as costas na porta e Danny veio ao meu encontro quando percebeu que eu estava chorando.
- ... – Ele sussurrou me abraçando forte.
- Eu não posso, Danny... Eu não posso ir morar na Alemanha! – O olhei desesperada enquanto ele tentava a todo custo me confortar com aquele abraço que eu simplesmente adorava.
Danny me puxou carinhosamente até a cama e eu deite lá, ele logo se deitou de frente para mim e aproximou os nossos corpos. Sua respiração batia no meu rosto e eu fechei os olhos quando os seus lábios tocaram os meus. Foi só um beijo bobo e inocente, mas que me acalmou completamente.
Ele acariciava a minha bochecha enquanto eu o encarava e me perguntava quando o teria novamente. Eu tinha medo que as coisas mudassem radicalmente depois que eu fosse para a Alemanha e mudança era algo que definitivamente aconteceria. Por mais que naquele momento eu me negasse a ter relacionamentos com outros garotos, mais cedo ou mais tarde eu o faria, assim como outras garotas entrariam na vida do meu primo.
Ele começou a sussurrar uma canção que eu conhecia, uma canção que conseguia expressar exatamente o que ele sentia e que por alguma razão não conseguia falar.

I was young but I wasn't naive
Eu era jovem, mas não era ingênuo
I watched helpless as you turned around to leave
Eu assisti sem poder fazer nada enquanto você ia embora
And still I have the pain I have to carry
E eu ainda tenho a dor que devo carregar
A past so deep that even you could not burry if you tried
Um passado tão profundo que nem você não poderia enterrar se tentasse

After all this time
Depois de todo este tempo
I never thought we'd be here
Eu nunca pensei que nós estaríamos aqui
Never thought we'd be here
Nunca pensei que nós estaríamos aqui
When my love for you is blind
Quando meu amor por você é cego
But I couldn't make you see it
Mas eu não consegui fazer você ver
Couldn't make you see it
Não conseguia fazer você ver

That I loved you more than you'll ever know
Que eu te amei mais do que você jamais vai saber
And part of me died when I let you go
E uma parte de mim morreu quando eu deixei você ir

I would fall asleep only in hopes of dreaming
Eu dormiria somente na esperança de sonhar
That everything would be like it was before
Que tudo seria como era antes
But nights like this it seems are slowly fleeting
Mas noites como essas parecem estar passando lentamente
They disappear as reality is crashing to the floor
Elas desaparecem conforme a realidade vem à tona



After all this time
Depois de todo este tempo
I never thought we'd be here
Eu nunca pensei que nós estaríamos aqui
Never thought we'd be here
Nunca pensei que nós estaríamos aqui
When my love for you is blind
Quando meu amor por você é cego
But I couldn't make you see it
Mas eu não consegui fazer você ver
Couldn't make you see it
Não conseguia fazer você ver

That I loved you more than you'll ever know
Que eu te amei mais do que você jamais vai saber
And part of me died when I let you go
E uma parte de mim morreu quando eu deixei você ir...

After all this while
Depois de tudo isto
Would you ever wanna leave it
Você nunca iria querer deixá-lo?
Maybe you could not believe it
Talvez você não pudesse acreditar
That my love for you is blind
Que meu amor por você é cego
But I couldn't make you see it
Mas eu não consegui fazer você ver
Couldn't make you see it
Não consegui fazer você ver

That I loved you more than you'll ever know
Que eu te amei mais do que você jamais vai saber
And part of me died when I let you go
E uma parte de mim morreu quando eu te deixei ir...

Danny estava cantando novamente aquela música. Estava me fazendo lembrar de algo que voltou a me atormentar desde que a minha mãe me convenceu a passar o Natal na Inglaterra depois de tanto tempo.
Quando eu ouvi aquela canção novamente, a vontade que eu tinha era de abraçar o garoto ao meu lado de tal forma que nada e nem ninguém conseguiria nos separar, mas como papai havia falado, eu já tinha 21 anos, sem falar que havia muitas pessoas envolvidas agora.
Eu não podia abandonar novamente as coisas e recomeçar tudo como há seis anos, agora a escolha era toda minha e eu não seria tão irresponsável de deixar os sentimentos de outras pessoas serem machucados por algum tipo de capricho ou sentimento adolescente mal resolvido.
Acho que assim como eu, Danny não tinha completa noção do que estava acontecendo. A música, nós dois juntos depois de tanto tempo...
Era extremamente confuso, ainda mais quando eu tinha um quase noivo e ele finalmente um relacionamento sério.
Eu estava informada de tudo graças às conversas da minha mãe com a tia Kathy, essa sempre falava da sua preocupação com Danny, seus relacionamentos nunca duravam mais do que poucos meses, mas agora ele finalmente tinha conhecido uma garota legal. Eles namoravam há pouco mais de um ano e a minha tia finalmente estava tranqüila.

O ritmo irritante de algum pop chato da Britney Spears veio do bolso do meu grande casaco de lã e eu voltei à realidade.
O nome da minha amiga começou a piscar no visor do meu celular e eu tinha certeza que alguém bem bêbado falaria besteira do outro lado da linha. Devia ser quase três horas da manhã em Berlim. devia estar em algum bar se divertindo com os amigos.

- Obrigada por ligar e me lembrar que eu preciso excluir esse toque ridículo do meu celular! – Eu falei sarcástica.
- Eu te amo e você não faria isso com a sua amiga!
estava bêbada.
- Ok bêbada!
- Eu não estou bêbada, docinho! – Eu ri muito com o meu pseudo-apelido carinhoso.
- Onde você está? – Tentei ficar séria, porque se eu risse só sairia besteira naquela conversa.
- Eu liguei pra te desejar um Feliz Natal! Aaaah, e manda um beijo pra tia e pro tio! – Ela gritou e eu tive que afastar o aparelho do ouvido. Danny riu ao também ouvir o grito que vinha do outro lado da linha.
- Meus pais receberão o recado.
- Por que você está tão séria? O seu primo gatinho não foi para esse Natal? – perguntou num sussurro, provavelmente alguém que não podia ouvir aquela conversa estava por perto, e eu até já podia imaginar quem.
- Veio sim.
- Wooooooow! – Ela gritou novamente e eu revirei os olhos.
- Por favor, eu ainda tenho um semestre de aula na faculdade, não estrague a minha audição!
- Aaai, Mark, sai pra lá! – Eu consegui ouvir risos e alguns gritos ao fundo. – , o seu namoradinho quer falar contigo. Te ligo assim que der! Se divirta docinho! Beijoooooooooooooooooooooooooooooooo...
- Oi, amor. – Mark tomou o celular da minha amiga à força, eu ainda pude ouvir o resmungo alto dela.
- Hey, Mark. – No momento em que eu falei, Danny que parecia concentrado em alguma coisa na rua, virou o rosto e me encarou. Segundos depois eu o vi olhar novamente para algum ponto da rua e em seguida entrar em casa.
Eu respirei fundo e voltei a falar com Mark.

- Mas, mamãe, eu disse que consigo dirigir até Londres!
Nós estávamos na mesa do café e há minutos eu argumentava com a minha mãe.
- A senhorita já ouviu hoje cedo as notícias no rádio, certo?
- Mãe, Londres não é assim tão longe!
- Você não vai sozinha e acabou, ! Além do mais, o Danny disse que não via problema em te levar. – Ela acabou com a conversa com aquele tom superior e mandão das mães.

Ainda nevava muito na manhã seguinte à noite de Natal e, segundo as rádios locais, o tempo continuaria daquele mesmo jeito. A estação de trem em Bolton estava parada devido a alguns problemas com a neve na noite anterior, mas eu precisava chegar em Londres imediatamente e embarcar para Berlim. havia conseguido marcar a minha tão esperada entrevista de emprego na maior empresa de publicidade da Alemanha e eu não podia perder a oportunidade.

- Vai ser tão ruim assim viajar comigo, ? – Danny me perguntou depois do café da manhã. Nós estávamos sentados assistindo algum desenho que passava na TV.
- Não vai ser ruim, Danny, mas eu sei que você está sempre muito ocupado pra vir até Bolton e quando vem tem que ir embora em menos de vinte e quatro horas porque uma prima chata resolve aparecer depois de seis anos... Não é justo.
- Danny, tira os pés do centro agora! – Tia Kathy entrou na sala com alguns enfeites nas mãos e os colocou no mesmo centro que Danny repousava tranqüilamente os pés. – Vem comigo até a cozinha porque nós precisamos da ajuda de um homem aqui! – Ela voltou a falar naquele tom ameaçador engraçado e deu leves tapinhas na perna do meu primo.
- Será um prazer te levar até Londres, . – Ele falou, sorriu, beijou a minha bochecha e pulou do sofá seguindo até a cozinha antes que ouvisse outra ameaça.

Desde criança eu tinha o costume de pedir algo de Natal, o que parece completamente normal, já que Natal remete comemorações, reuniões em família, presentes e todas essas coisas que nós esperamos ansiosamente que aconteça. Mas o costume de pedir algo naquela data, não envolvia apenas uma cartinha carinhosa para os meus pais ou familiares pedindo uma boneca que andava ou ainda um novo jogo para videogame.
Eu tinha uma espécie de “ritual pessoal”. Logo depois de todos os jantares de Natal, eu subia até a varanda do segundo andar na tia Kathy e esperava por uma estrela cadente e eu realmente esperava a noite toda se fosse possível, às vezes ela nem aparecia, mas ainda assim eu fazia o pedido. E aquele pedido não envolvia nada material, eu geralmente pedia felicidade e união para a nossa família. Eu lembro que quando tinha oito anos, o meu pedido foi: “me deixe ser criança para sempre”.
Bom, aquilo sempre significou muito para mim, mesmo quando eu ainda era uma criança sem grande noção das coisas, os pedidos podiam parecer tão bobos e tão sinceros ao mesmo tempo, mas aquela era a minha verdade, a verdade que eu carreguei até o meu último Natal na Inglaterra.

- Ontem a estrela cadente não demorou a aparecer. – Eu quebrei o silêncio.
Danny e eu permanecemos calados durante toda a viagem. Ele dirigia com todo o cuidado enquanto um CD de Bruce Springsteen tocava no rádio do carro e eu lia algumas revistas que levava comigo na bolsa, tentando passar o tempo.
Nenhuma palavra foi trocada de Bolton até o check-in no aeroporto.
Nós estávamos sentados esperando o chamado do meu vôo.
Algumas tocas, agasalhos e um óculos escuro fizeram Danny ficar irreconhecível.
- Eu pensei que você já era uma adulta, garota! – Ele falou rindo e eu dei um tapa no braço dele.
- Insuportável!
- Hum... O que você pediu? – Ele desviou o olhar até mim rapidamente.
- Bem, eu não acho que o pedidos sejam realmente atendidos.
- Desde criança você espera por uma estrela para fazer os pedidos e depois de muito tempo vem falar que eles não são atendidos? – Danny levantou a sobrancelha e me encarou confuso.
- Bem, eu... Eu pedi algo que está se desmanchando hoje.
- Como assim desmanchando?
- Eu pedi que você não fosse mais tirado de mim. – Eu estava séria e concentrada em todas as palavras que saíam da minha boca. Meu olhar estava fixo na revista nas minhas mãos e o som saiu baixinho da minha garganta, mas eu percebi que ele ouviu tudo quando se virou com uma expressão surpresa e um tanto, talvez triste no rosto.
- ... – A voz dele saiu arrastada.
- Sabe, Danny, nós não precisamos falar nada. – Eu continuei com o olhar fixo nas gravuras da revista. – Foram seis anos e eu não estou aqui para te cobrar nada. Eu... Eu... – Um nó na garganta e as lágrimas nos olhos me proibiram de terminar a frase.
Danny se levantou e me puxou para um abraço.


- Como nós ficaremos? – Eu ainda estava no quarto de Danny.
O carinho dele me fazia sentir sono, mas eu me negava a fechar os olhos. Eu tinha certeza que aquela era uma das últimas vezes que eu o veria tão de perto.
- Eu não sei...
- Eu estou com medo, não é como se eu fosse passar as férias lá, nem é como se eu mudasse para uma outra cidade. É outro país e eu vou morar lá.
- Não pensa nisso agora, ...
Eu puxei a mão dele e a beijei.
- Como não se em dois dias eu volto para Londres e em um mês eu me mudo para a Alemanha?
- Eu não sei o que falar, de verdade. – Danny falou respirando pesado.
- Nem eu. – Eu apertei os meus olhos com força impedindo que mais lágrimas corressem pelo meu rosto. – Eu vou dormir agora. – Me levantei da cama e passei por cima de Danny com tanta pressa que quase caí da cama.
- Fica mais um pouco, . – Ele falou segurando a minha mão.
- Eu não acho uma boa idéia, Danny. O que nós podemos fazer? Esperar um pelo outro? Isso soa tão ridículo. Eu posso ser nova, mas não tapada de cair nessa história de esperar! Eu estou confusa, triste e com muita, muita raiva como eu jamais estive antes. Eu só não quero me machucar mais Danny, se é que isso é possível.
Puxei-o para um abraço rápido e saí dali correndo.



- Eu não sei exatamente o que falar, eu nunca soube o que falar, e você sabe disso. Depois daquela noite nós nunca mais nos reaproximamos e as nossas vidas tomaram rumos diferentes. Você na Alemanha e eu com uma banda famosa na Inglaterra. Eu me perguntava como você estaria e se estaria feliz lá. Acredite, foi tão difícil para você quanto foi para mim. Eu continuo me achando completamente atraído por você, quando você me atendeu na porta ontem à noite eu me segurei pra não te beijar, , você não tem noção do quanto eu tenho me esforçado para não te magoar novamente, porque eu sabia que você viria, mas você voltaria para a Alemanha e essa distância é complicada.
- Eu me sinto ridícula.
- Eu me sinto bem com você, . Eu me sinto muito bem com você. – Ele falou e segurou a minha mão. – Há pessoas envolvidas nisso, não são só os nossos sentimentos agora e eu já sou maduro o suficiente para fazer as coisas direito.
- Eu não estou pedindo nada, Danny, eu só estou... Falando sobre o meu pedido de Natal. – Eu olhava para baixo sem conseguir olhar para os olhos do garoto na minha frente.
- Eu também.
- Quê? – Eu precisei encará-lo.
- Eu pedi que você não fosse mais tirada de mim. Completamente egoísta já que você tem uma vida na Alemanha.
- Você sempre foi meio possessivo, querendo as coisas só para você. – Nós nos encaramos e sorrimos.

Eu já tinha ouvido o suficiente.
Obviamente os nossos sentimentos não foram completamente enterrados e havia ainda algo que pedia urgentemente para renascer.

A voz elegante e o belo sotaque britânico de uma mulher invadiram todo o aeroporto. A chamada para o meu vôo estava sendo feita.
Eu sorri novamente quando Danny me puxou para outro abraço, agora mais apertado. Antes de partir o abraço de urso, ele beijou em baixo da minha orelha e eu o soquei.
- Você sabe que não pode fazer isso! – Ele riu com a expressão mais sapeca já vista no rosto e eu tremi novamente com o calafrio que um beijo naquele lugar me causava.
- Boa viagem. – Ele falou sorrindo.
- Obrigada. – Eu sorri de volta e comecei a andar até o portão de embarque.
- ! – Alguns poucos segundos depois ele me gritou.
- Sim?
Danny correu até onde eu estava e aproximou os nossos corpos me fazendo perder momentaneamente o equilíbrio. O cheiro que ele exalava estava a cada dia melhor.
Nossas testas se aproximaram e eu conseguia sentir a respiração dele bater nos meus lábios.
- Por favor, não demora dessa vez. – Ele falou sério olhando nos meus olhos. Eu sorri docemente e beijei a pontinha do nariz dele.
- Seu pedido é uma ordem.

Pela primeira vez a viagem de Londres até Berlim não foi dolorida.
Eu não tinha certeza do que aconteceria dali em diante, mas sabia que o tempo, como muitos costumam falar por aí, se encarregaria de cuidar de tudo. As coisas finalmente se acertariam.


- Qual é a sua, garota? Você vai se atrasar para a prova da beca de formatura!
está me gritando neste exato momento.
A formatura é daqui a duas semanas e a tia Kathy me prometeu arrastar o maior número de familiares possível para me ver recebendo o diploma. Ela é a melhor tia que qualquer um pode ter!
Assim que eu voltei para a Alemanha, Danny me ligou e nós mantemos contato por mais umas três semanas, mas logo ele entrou em turnê e desde então não nos falamos mais. Eu ainda sinto muito a falta dele, mas Berlim é a minha casa agora. Apesar de eu não ter conseguido o emprego que a tentou me arrumar, eu sei que vai aparecer algo realmente legal para eu fazer.
A formatura tem me deixado bastante animada, mas muito nervosa também!
Eu estava tentando escrever alguma coisa importante, legal, marcante e que soasse bem aos ouvidos de quem vai me ouvir embromar daqui a alguns dias. Muitos requisitos para o discurso de uma recém formada em publicidade, mas eu sei que chego lá.
Talvez me ajude mais tarde com um pouquinho das besteiras que ela fala, mas agora eu realmente preciso ir provar aquela maldita e ridícula beca. Eu estou terminando a faculdade e não o colegial!
Ok, ok. Lembrem-me de colocar esse protesto no discurso para o dia da formatura!

Fim



N/A: Fic para a frô das frÔres selvagens desse mundo -> Luh! Isso é um presente de aniversário, [ATRASADO], mas valeu a intenção! Frô, você é especial para mim! =D Bem, eu quero agradecer a minha companheira inseparável, Jéssica Braga, por toda a ajuda nas fics, por todo apoio moral [Joshua mode ON xD], por tudo! A minha beta, por toda grande paciência, porque acreditem, ser beta exige MUITA paciência! É isso e comentem! Críticas ou elogios são sempre bem-vindos, sejam apenas sutis tudo bem? Vivemos uma democracia, mas eu não quero ser xingada! ;x Querem parte 2? Preciso que vocês me falem! See ya! ;)


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