Dias Homéricos

Finalizada em: 19/07/2021

Capítulo 1 - Parece um sonho!

Estava quente quando Mariana chegou ao aeroporto de Atenas. Tão quente que a menina podia sentir seu corpo acostumado com a temperatura mediana da Flórida começando a suar por baixo da blusa de mangas longas que vestia.
O calor, porém, não impediu que ela desse um dos sorrisos mais largos da sua vida ao pisar no solo grego pela primeira vez. Esse sempre fora um dos maiores sonhos desde que se conhecia por gente: viajar para a Grécia com os seus melhores amigos.
E era por eles que ela esperava sentada em um café, enquanto conversava com Michael, amigo que fez durante a longa viagem de Miami para Grécia. Conversaram pelo que pareceram ser horas, o que na verdade foram somente 1h10, perdendo a noção do tempo e das pessoas à sua volta, até que de repente ouviram um coro gritando:
— Mariana!
Mariana reconheceu aquelas vozes e levantou a cabeça, que estava virada para o café em sua mesa, vendo um grupo de amigos que se atrapalhava com diversas malas.
— São eles! — ela disse para Michael, apontando para o grupo barulhento.
Ela saiu imediatamente da mesa do café e correu em direção ao grupo, sem se importar em esbarrar em algumas pessoas no caminho.
O grupo barulhento era formado por André, uma jovem ruiva também conhecida por Clarissa e, por fim, pela Rebeca, melhores amigos de Mariana, que moravam no Brasil, onde ela também morava antes de se mudar para a Flórida.
— Não acredito que isso está finalmente acontecendo! — Mariana disse, emocionada.
— Eu sei! — Clarissa gritou. — Parece um sonho!
— tudohhhhhh — disse André gritando em plenos pulmões.
— Finalmente conseguimos tornar isso real! — disse Rebeca, ainda um pouco sonolenta após as longas horas de voo.
Começaram então a conversar e se abraçar em um momento de felicidade coletiva que atraia a visão dos outros passageiros no aeroporto. No meio de toda a comoção, Mariana se recordou que não estava sozinha antes da chegada de seus bffs e, como a pessoa educada que ela é, decidiu apresentá-los ao Michael.
— Gente, tô com um amigo aqui que veio comigo desde Miami. — Mariana falou, começando a observar ao redor tentando encontrar o café, pois esse encontro havia a feito perder toda a noção espacial.
Assim que avistou a grande placa escrito Starbucks, apontou para ele sentado, que acenou para ela e os amigos.
— Aquele é o Michael, ou Mike se preferirem, a gente conversou bastante no voo. — falou, puxando André pela mão em direção ao novo amigo enquanto as meninas os seguiam.
chegando perto da mesa que estava Michael, mariana fala:
— Michael, esses são os amigos que eu tinha te falado!
— Prazer, pessoal! Espero que vocês tenham tido uma viagem boa — disse Michael, levantando a cabeça que estava a olhar o telefone. Ele estava vestindo uma jaqueta preta com um pequeno broche em sua gola que tinha um desenho de uma pantera e no bolso de sua jaqueta existia um pente garfo que usava para pentear seu black power que estava a deixar crescer desde o início do ano. Seu estilo, mais do que óbvio para quem o olhava, era baseado no movimento Black is beautiful dos anos 1960.
— Sim, tivemos, obrigada! — disseram Clarissa e André simultaneamente.
— Ele vai pra Skopelos também, galera! — disse Mariana. — Talvez a gente esteja hospedado no mesmo lugar.
— Poxa, seria muito bacana, mas antes, vamos comer por favor! Estou morrendo de fome há 5 horas! — disse Clarissa puxando André e Mariana na frente para fofocarem enquanto procuravam o caminho do pizza hut.
Diante desse contexto Rebeca e Michael acompanharam o grupo inicialmente em silêncio, até que os dois simultaneamente tentam puxar papo e dão uma risada envergonhada.
— Desculpa. — Rebeca falou, com as bochechas coradas. — Pode falar.
Michael riu, achando fofo a menina estar envergonhada.
— A Mariana acabou nem falando o nome de vocês… — ele disse, também envergonhado.
— Me chamo Rebeca. — ela riu. — O que faz pela Grécia?
— Tô tentando começar um mochilão pela Europa. — ele falou. — Último ano de faculdade, sabe como é, né?
— Sei bem. — ela respondeu. — Último ano de quê?
— Línguas Clássicas. — sorriu. — Tô querendo vivenciar um pouco o grego.
Ela riu, observando o rapaz.
— O que foi? — ele perguntou, gostando do som da risada dela.
— Você não parece um estudante de Línguas Clássicas. — disse.
— Bom, você não deveria julgar um livro pela capa. — brincou. — Eu, por exemplo, acho que você deve fazer Medicina, mas provavelmente estou errado.
— Está mesmo. — ela confirmou. — Acabei de terminar a faculdade de Direito, mas realmente não tenho cara de advogada. — ela fez uma careta para ele, que riu.
Chegando à pizza hut, depois de cruzar quase que metade do aeroporto, finalmente iriam saciar a fome que os atingia desde metade do Atlântico. Sentaram-se em uma mesa no canto do restaurante e conversaram até dar umas 12h40.
— Nossa já são 12h40, como o tempo passa rápido — disse Rebeca — Temos que ir agora se quisermos curtir um pouco a cidade antes de irmos pegar a balsa.
Todos concordaram e se despediram de Michael, que visitaria alguns amigos em Atenas antes de ir para Skopelos.
— O que acharam dele? — Mariana perguntou quando já estavam fora do aeroporto. — Simpático, né?
— O que achou, Rebeca? — Clarissa perguntou com um sorriso malicioso. — Ele foi simpático com você? — os amigos riram e Rebeca ficou vermelha.
— Cala a boca, Clarissa. — ela falou, emburrada, virando o rosto para outro lado.
— Ele tá tão na sua! — disse André, cutucando a barriga da amiga e fazendo com que ela ficasse ainda mais sem graça.
— Não acredito que a Rebeca já conseguiu um boy no aeroporto! — Clarissa disse, fingindo estar chateada.
— Vamos deixar pra lá, ele nem está mais aqui e eu nem peguei o contato dele. Vamos curtir a cidade e depois vemos no que dá. — disse Rebeca olhando os arredores da cidade de dentro do ônibus que haviam pegado no aeroporto
— Fica tranquila, amiga. — Mariana enquanto balançava o celular em sua mão — Eu peguei antes de vocês chegarem e, se depender de mim, esse casal sai antes de chegarmos ao hotel.
— Ai, Mari, não me iluda assim, minhas habilidades de fanficar estão a todo vapor… — brincou Rebeca, mas logo perdendo o foco do diálogo para apreciar a paisagem.


Capítulo 2 - Mamma mia...

No todo, o grupo de amigos teve uma tarde agradável em Atenas. Visitaram o principal ponto turístico e histórico, a Acrópole ateniense, e, às 15h40, foram em direção ao porto que os levaria à ilha.
Mariana passou o caminho inteiro reclamando do calor, enquanto André falava sobre a história da Atenas Clássica que estava ao redor do grupo. Contudo as duas outras amigas pouco prestavam atenção no futuro grande historiador, pois Clarissa estava zoando Rebeca por todo percurso pelo acontecimento de mais cedo.
— Agora eu tô sentindo esse calor. — disse Clarissa ao ver um grego que saía da balsa que eles iriam pegar. — Realmente existem deuses aqui, André.

Rebeca’s P.O.V. on
Depois dessa tarde cheia de provocações e desse último comentário da Clarissa, nada mais irá me surpreender durante as próximas 24h. O que a minha amiga tem de espontânea ela tem de sincera. E eu sinceramente amo muito meus amigos e o modo de como esse grupo é formado por pessoas tão distintas entre si, mas que harmonicamente se combinam.
Assim que chegamos no cais, nos direcionamos à fila para fazer todo o procedimento para entrar na barca. Procedimento esse que, na minha humilde opinião, durou muito mais que o necessário, mas quem sou eu para opinar sobre isso, não é mesmo.
Uma vez superado todos os protocolos de embarque, finalmente nos acomodamos na pequena balsa que nos levaria à tão amada ilha de Skopelos. Ao nos acomodarmos, eu, por preferência, fiquei sentada do lado da barreira do casco da embarcação. E é nesse cenário que de fato “me dou conta” de onde estou e com quem.
Nesses últimos 9 anos de amizade, cheio de altos e baixos, já fizemos e planejamos fazer muitas coisas, mas nunca realmente acreditei que iríamos conseguir organizar e executar uma “puta” viagem internacional para a Grécia.
Me lembro como se fosse ontem quando a Mariana pela primeira vez comentou e tentou nos convencer a realizar essa nova, e extremamente cara, aventura pelo mediterrâneo. De primeiro ninguém realmente “pilhou” com a ideia, pois éramos todos universitários falidos que lutavam a cada dia para pagar as xerox, contudo uma coisa a Mariana tem de sobra, e ninguém pode negar, é sua persistência. Não foram uma nem duas as vezes que ela levantou esse tema até nos dobrar enfim a fazê-lo. Contudo, dentre as inúmeros providências que uma viagem desse porte acarreta, houveram dois grandes detalhes que tomaram meses, se não anos, para conseguirmos orquestrar: 1° como iríamos conseguir toda a verba para fazer a viagem; e 2° como faríamos para chegar ao mesmo tempo na Grécia sendo que estávamos praticamente nos pólos opostos do Continente Americano.
Nossa, só de me recordar de todo o trabalho que tivemos já consigo sentir todos os fios de cabelo branco que adquiri e os possíveis anos de vida a menos que terei. Entretanto, ao olhar essa paisagem mitológica digna dos deuses à vista, cercada por meus melhores amigos e uma possível nova amizade, ou quem sabe algo a mais; vejo que todos os sacrifícios valeram a pena só pelo privilégio de viver esse momento. E assim segue minha linha de raciocínio até que do nada sou interrompida por uma voz muito familiar.
Rebeca P.O.V. off

— Olha quem ta chegando, gente! — diz Mariana fazendo com que todos olhem em direção ao porto.
No meio da multidão de turistas, Michael se destacava ao se aproximar do check-in da embarcação. Passa por todo o processo de seguridade que verificava as passagens e pertences, observa o barco e, ao avistar o grupo de novos amigos que havia feito mais cedo naquele dia, se aproxima dos mesmos.
— Oi, gente, tudo bem??? Curtiram a cidade??? — diz, olhando na direção de Rebeca.
— Oi, a gente curtiu muito simmm!!! — diz André historicamente empolgado, todavia Michael continuava a olhar para Rebeca, que estava ficando envergonhada da mesma forma que no aeroporto.
— Bom que vocês curtiram… posso sentar-me aqui??? — disse apontando para um espaço que havia ao lado de Rebeca.
— Claro que pode, só me deixa arrumar para você se sentar — disse ela acenando que sim com a cabeça.
Enquanto isso, Mariana, Clarissa e André se olhavam com aquele olhar que só amigos entendem, mas nada disseram. E, nesse momento, a balsa começou a se movimentar, assim se iniciado a viagem de 5 desgastantes horas, em que os amigos haviam aproveitado para conversar melhor com Michael e para tirar algumas fotos com o mar grego translúcido que estava a cercar o grupo.
Chegaram finalmente, todavia um pouco cansados e enjoados. Ainda estavam se distraindo, admirando o mar que ficava para trás, quando sentiram que a balsa parou. Correram para a proa, vendo a cidade que saltava ao olhar de tão bonita e colorida. Ainda boquiabertos, saíram com dificuldade da balsa e pegaram as malas que os comissários gentilmente os entregavam, assim começando a aventura que planejaram desde a adolescência. Os 5 amigos, agora que Michael parecia estar oficialmente incluído, então caminharam com suas malas em direção ao hotel.
Já estava de noite e as luzes do vilarejo o tornavam mais bonito e aconchegante. Assim eles aproveitaram para tirar várias fotos antes de se dirigirem para o endereço indicado pelo Google.
O hotel era simples, mas muito bonito, e todas as pessoas que conversavam animadas no saguão pareciam se conhecer há anos. Todos ficaram maravilhados com o ambiente e foram para a recepção para fazerem o check-in.
— Gente, pelo amor de Deus, olha este homem atrás do balcão. — Clarissa disse, chamando a atenção dos amigos para um jovem que atendia a alguns hóspedes.
— Mamma mia… — falou Mariana, balançando a mão numa tentativa de conseguir um pouco de vento.
— Vamos fazer esse check-in. — André falou, rindo, e Clarissa e Mariana correram para ver quem chegaria primeiro.
Novamente, Rebeca e Michael ficaram para trás. Olharam-se e riram.
— Parece que isso vai acontecer muito nessa viagem. — ele disse.
— Espero que sim. — Rebeca pensou alto, ficando envergonhada logo depois e tentando corrigir sua fala. — Digo, espero que alguém me faça companhia, pois sempre sou deixada para trás sozinha.
Mike riu, percebendo a vergonha da menina.
— Relaxa, não vou te deixar pra trás. — ele piscou antes de seguirem os amigos até o balcão.
— Isso, reservamos dois quartos. — Clarissa falava quando eles chegaram.
— Estão no nome de quem, senhora? — perguntou o atendente
— No nome de….na verdade eu não sei....fizemos no nome de quem, pessoal??? — disse olhando para os amigos com um ar de dúvida.
— Foi no meu nome, Rebeca Catarina de Melo Mamede — disse com um ar de orgulho na voz.
Os procedimentos básicos do check-in foram feitos, enquanto André e Mariana observavam o salão da recepção e todos os acessos, vendo que havia piscina, bar e muito mais a ser desbravado no hotel. Então, o processo foi concluído e as chaves entregues, os quatro amigos se olharam com uma animação no olhar e com uma rapidez correram em direção aos elevadores, quebrando o cansaço que a viagem deu, já que suas malas já estavam dentro dos quartos.
Rebeca, também empolgada com a chegada nos quartos, parou no meio da corrida aos elevadores, olhou para trás, onde Michael havia ficado fazendo o seu check-in, e disse:
— A gente se vê amanhã! — andando lentamente de costas para os elevadores com um sorriso no rosto, não dando tempo para ele sequer responder, e entrou no elevador em que seus amigos já estavam.


Capítulo 3 - Nunca que isso é uma fanfic

No dia seguinte, por volta de umas 6:30 da manhã, Rebeca acordou como se fosse um dia normal, mas, ao observar o quarto, viu sua amiga Mariana dormindo na cama ao lado, assim abrindo um sorriso pela confirmação de que a viagem a Skopelos não era mais um simples sonho agradável. Levantou para ir ao banheiro, e, no caminho ao pequeno banheiro que o quarto tinha, espiou pela porta que dividia os dois quartos seus outros dois amigos dormindo e o quarto desarrumado.
— Parece que eles foram dormir tarde ontem… Ai ai — pensou alto.
Entrou então no banheiro, para poder fazer sua higiene básica, enquanto Mariana acordava por causa de Rebeca, que havia pensado um pouco alto demais. Mariana, assim como a amiga, acordou e, antes mesmo de abrir os olhos, deu um sorriso que ia de orelha a orelha. Levantou-se da cama em um rápido pulo e disse:
— Que felicidade, ai, Beca, nem acredito que estamos aqui! — disse para a companheira de quarto, que imaginava que estava por ali ainda. Mariana então percebeu que a amiga não estava mais na cama, já arrumada, dando então uma corridinha para o banheiro, que estava fechado e que emanava um barulho de água.
— Ela tá tomando banho, não vai poder me ouvir… Esperta ela — disse Mariana, virando para a porta que dava para o outro quarto, o que a fez abrir novamente aquele contagiante sorriso. Entrou no quarto, gritando:
— BOM DIAAAA! — fazendo com que André e Clarissa se encolhessem na cama para tentarem dormir mais, todavia Mariana era persistente e não cansou até fazer com que os dois acordassem. Quando os dois dorminhocos olharam para a amiga, que estava a rir, imediatamente abriam o mesmo sorriso que todos fizeram ao acordar e se verem na viagem, que antes era somente um sonho e agora se tornava realidade.
— Te amo, Mariana. — disse uma Clarissa sonolenta. — Mas não faça isso nunca mais se quiser estar viva até o fim da viagem.
Os amigos então se arrumaram para o primeiro dia de passeio, dia esse que teria diversas atividades, como a visita ao set de Mamma Mia, filme preferido de um deles. Saíram dos quartos pela porta principal do quarto de Rebeca e Mariana, e foram em direção ao elevador, que estava a uma distância de 4 portas deles, quase saltitando de felicidade, mas com o barulho de seus estômagos vazios.
Quando o elevador abriu e eles foram entrar, Mariana parou um instante e percebeu que tinha esquecido os próprios óculos, e então percebeu que estava vendo tudo embaçado.
— Meu deus, gente, eu esqueci meus óculos, tô vendo nada, eu encontro vocês lá no café da manhã mesmo — disse com um pouco de vergonha ao perceber que havia outras pessoas no elevador e foi em direção ao quarto.
Entrou no quarto e procurou seus óculos, o que não foi tarefa fácil, pois seus eles estavam debaixo da cama. Ela demorou uns bons minutos até cogitar essa possibilidade.
Quando finalmente chegou ao saguão, com os óculos no rosto, percebeu que não fazia ideia de onde era o café da manhã. As poltronas da recepção estavam relativamente vazias e não via nem rastro de seus amigos por ali. Mariana sempre tivera uma péssima noção de localização, por isso sempre era guiada por Rebeca, que certamente havia escutado atentamente as instruções do recepcionista na noite anterior, enquanto ela e Clarissa haviam apenas ficado observando a beleza dele.
De qualquer forma, era justamente o recepcionista uma das únicas pessoas presentes no saguão que poderiam informá-la sobre a direção do café, então ela seguiu até ele um pouco envergonhada.
— Oi, bom dia. — ela sorriu, tímida.
— Bom dia, senhorita. — ele sorriu abertamente. — Posso te ajudar em alguma coisa?
— Hm, na verdade, pode. — ela disse, mexendo nos cabelos. — Eu posso ter ficado um pouco distraída com suas instruções ontem e não faço ideia de onde seja o café da manhã. Acabei me separando dos meus amigos e agora estou um pouco perdida.
— Pegue o elevador para o primeiro andar. — ele falou, rindo da tentativa de explicação dela. — Você vai ver um restaurante assim que sair dele.
— Ah, muito obrigada! — ela agradeceu. — Prometo prestar mais atenção da próxima vez.
— Vou cobrar. — ele piscou e ela ficou vermelha de repente. — Aproveite o café por mim.
Ela sorriu, sem saber o que falar, e balançou a cabeça afirmativamente antes de se dirigir de volta para o elevador, pensando no sorriso do recepcionista e sorrindo consigo mesma. Entrou no elevador e percebeu que no painel tinha escrito “café da manhã” e não tinha percebido, mas gostou de ter conhecido uma pessoa nova.
Chegando na porta do grande restaurante, viu que seus amigos já estavam tomando o café e que Michael já estava lá. A mesa então olhou para Mariana com um ar de dúvida, mas ao mesmo tempo rindo de já imaginar o que causou a demora.
— Gente, eu me perdi por esse hotel, fui parar lá na entrada. — disse ela ainda um pouco corada da conversa com o recepcionista.
— Alguma coisa aconteceu de bom nessa recepção, pra você ficar assim toda coradinha! — disse Clarissa, já imaginando o motivo, e fazendo com que toda a mesa observasse atentamente as bochechas de Mariana, então deixando-a mais envergonhada ainda.
— Você não tem ideia… — disse, observando a organização da mesa e percebendo que Rebeca estava sentada ao lado de Michael, e que infelizmente não havia cadeira disponível.
Michael já havia chegado ao salão antes de todos, por isso, quando Mariana chegou, ele estava acabando. Ele então deu seu lugar a ela, assim se despedindo do grupo, pois iria conversar com seu pai, que estava doente.
O grupo de amigos reunidos agora ficou ouvindo Mariana contar sua história com o recepcionista, enquanto degustavam as comidas típicas da Grécia e de café de hotel.
— Fanficou toda, hein, Mariana. — disse André enquanto ria, derramando um pouco de suco no prato vazio e fazendo a mesa rir.
— Nunca que isso é uma fanfic. — eles riram.
Depois que todos terminaram devidamente o café, desceram para a recepção, onde esperariam Michael para poderem seguir para o tour dos sonhos de qualquer fã de Mamma Mia.
Mariana procurou pelo recepcionista que havia a ajudado mais cedo, mas atrás do balcão estava uma moça de cabelos cacheados.
— Procurando alguma coisa, Mariana? — Clarissa perguntou, debochada.
— Não, Clarissa. — ela deu língua para a amiga, que riu.
Mariana obviamente continuava a espiar a recepção, tentando disfarçar a vontade e a curiosidade de conversar com o recepcionista que ainda nem sabia o nome. Todavia tentava esquecer isso, pois teria um tour que sonhara desde a primeira vez que assistiu seu filme preferido pela primeira vez, mas havia algo que sempre a fazia olhar de volta para a recepção.
Assim que Michael chegou ao saguão, os amigos seguiram para fora do hotel. Clarissa estava conversando com André e rindo sobre algo que havia acontecido mais cedo e acabou esbarrando em alguma coisa.
— Desculpa, eu… — ela começou a falar quando percebeu que havia esbarrado em uma pessoa, ainda rindo com o amigo, que ria agora do mico que ela havia pagado.
— Olha por onde anda. — um rapaz respondeu mal humorado.
Clarissa juntou as sobrancelhas, estranhando a reação rude do homem, que agora ela observava. Ele tinha uma jaqueta de couro pendurada nos ombros, um cigarro nos lábios e um cheiro forte de álcool. “Como um cara bonito desses pode ser tão rude”, ela pensou, revirando os olhos e seguindo os amigos, já que tinha ficado para trás nesse meio período. Antes de alcançá-los, porém, ela virou-se para a direção oposta, em que o rapaz seguia, e pode ver ele virando para a direção dela também, a observando. Os dois se encararam por algum tempo, com uma expressão indefinida nos rostos, antes de Clarissa balançar a cabeça e voltar a seguir seu caminho.

Mariana’s P.O.V. on
Enquanto observo o lindo cenário à minha volta, ainda não consigo acreditar que isso está realmente acontecendo e não é só um sonho maluco que criei na minha cabeça. Ir para Grécia sempre foi meu sonho, desde que eu era uma garotinha, e agora que estou aqui é muito melhor do que eu um dia poderia imaginar! O fato de eu estar aqui e estar com meus melhores amigos faz com que isso seja mil vezes maior. As águas cor de turquesa combinam perfeitamente com as construções brancas que embelezam a ilha.
Sou tirada do meu devaneio quando Clarissa suspira suavemente. Vejo então um homem que é, em minha humilde opinião, o par perfeito para ela. O homem rapidamente se apresenta para o grupo e descobrimos que seu nome é Harry, o guia da excursão. Na medida em que o tour acontece, vejo Clarissa se aproximar cada vez mais dele. Isso me deixa extremamente feliz porque, assim que ele pisou no barco em que estávamos, eu soube que eles dariam um ótimo casal. Eu olho para a frente do barco e vejo Rebeca e Michael ficando terrivelmente próximos um do outro. Começo a rir, fazendo André voltar sua atenção da ilha para mim.
— Por que você tá rindo? — ele pergunta.
— Ah, nada, só olha aquilo… — aponto para o novo casal.
— Ai, meu Deus!! Aquela é a nossa Rebeca? A que nunca quer sair e nunca se abre? Essa Rebeca?
— Sim — eu digo —, mas tem mais… se você olhar para esquerda, você vai ver a Clarissa encarando nosso guia turístico. — termino, rindo levemente.
— Nossa! Não acredito, Rebeca tem um homem e Clarissa tem um homem! Você acha que a gente vai ter essa sorte?
— Eu não sei… espero que sim. — digo, esperançosa, mas, no fundo, já estou pensando em um certo garoto de olhos castanhos.
Mariana’s P.O.V. off


Capítulo 4 - Touché, mademoiselle

Enfim terminaram o tour, que ainda fazia seus olhos se iluminarem. E, já na rua do hotel, ouviram o que o guia falava sobre a cidade como um todo e a importância daquela rua que os amigos estavam hospedados. Chegaram na frente do hotel e começaram a se despedir do guia, que tinha outro grupo para levar ao tour.
— Amei muito esse tour, pessoal, um dos melhores que já tive a oportunidade de guiar — disse o guia com uma felicidade contagiante — Se vocês quiserem podemos sair qualquer dia, vai ter uma festa amanhã de noite lá em Alonnisos, uma ilha que fica umas duas horas daqui, se sim só me dar um toque no zap.
— Vamo pensar sim, nós da mesma forma amamos o tour e a companhia — disse Clarissa animada com uma possível festa.
— Uma festa com você, Harry??? Como que a gente não vai perder essa — disse André, pensando na festona que deveria acontecer na famosa ilha grega das festas.
Assim que se despediram do guia formalmente, ficaram a observá-lo conhecer o novo grupo que iria levar para as maravilhas daquela ilha. Se olharam e perceberam que todos tinham todos a mesma ideia, então abriram um sorriso malicioso.
— Ao mesmo tempo??? — disse Mariana animada
— Em 3… 2… 1… — Ir à praia — disseram André, Clarissa, Mariana e Michael em uníssono. Ao passo que, em dissonância, a quinta integrante animadamente disse: — Dormir — uma fala que terminou de forma desanimada ao ver seu descompasso em relação ao grupo.
— Bem, praia também é uma boa opção, se for o desejo da maioria... — disse Rebeca em sua resolução mais para si do que para eles.
Assim sendo, o quinteto se dirigiu à praia, que era a um bloco de distância do local que estavam, sem passar no hotel por eles já trajarem suas roupas de banho por baixo. Ao menos a maior parte do grupo.
Chegando no destino, seus olhos reluziam ao ver a areia mais branca e a água mais cristalina que já haviam visto em vida. Clarissa e André não perderam tempo e logo tiraram suas roupas, as jogando de qualquer jeito nos braços de Mariana e se encaminhando em direção ao mar. Enquanto isso, Mariana e Rebeca estendiam algumas toalhas na areia ao mesmo tempo que equilibravam a pilha de roupas deixadas para trás. Já Michael se manteve afastado um pouco da turma para testar seu grego com um nativo que havia encontrado no caminho.
André e Clarissa, já dentro do mar, gritavam para que o resto dos amigos fossem nadar com eles. Entretanto Rebeca disse que não estava no clima de entrar no mar, além de que não tinha trago a roupa de banho, pois havia esquecido disso quando os amigos a falaram da ideia de ir à praia, mais cedo no café da manhã antes da chegada de Mariana. Todavia Mari já se levantou, tirando sua roupa.
— Rebeca, olha meu telefone aí que tá no meu short, sim?— disse animada, sem nem olhar onde colocava as roupas que acabara de tirar e correndo em direção a André, que estava atacando a ruiva em uma guerrinha de água.
Depois de alguns bons minutos Michael chegou, sentando-se ao lado de Rebeca após do seu parcial sucesso no treino de grego.
— Eu te vi conversando com o nativo… conseguiu ter um pouco da sua tão procurada experiência grega? — perguntou a menina em tom de brincadeira ao rapaz para puxar assunto.
— Poderia ter sido melhor se não tivesse me esquecido de como se diz loja de suvenir… — ele a respondeu tentando disfarçar seu chateamento com o ocorrido.
— Bem, não posso te ajudar com esse problema. Sei o total de zero palavras em grego, mas sou fluente em mandarim. Se um dia se interessar por essa língua, posso te ajudar — ela disse em um misto de vergonha com desinibição, tendo o intuito de fazer o garoto se sentir um pouco melhor.
— É mesmo? Você não parece ser uma poliglota… — ele disse surpreso por essa nova descoberta sobre a garota e, consequentemente, se esquecendo lentamente do ocorrido anteriormente.
— Não foi você que disse que não se deve julgar um livro pela capa? — Rebeca inquiriu fazendo uma careta engraçada para Michael.
— Touché, mademoiselle — ele a respondeu risonho e, assim, ambos acabaram gargalhando diante da situação.
Eles dois se sentiram pertencentes e nervosos quando o clima começou a mudar, e as ondas do mar começaram a se tornar uma mera trilha sonora para suas bochechas coradas e seus sorrisos tímidos. Foi nessa hora, porém, que os amigos retornaram do mar, fazendo ambos ficarem desconcertados.
Mariana então perguntou para Rebeca, que estava sendo molhada por André.
— Onde está meu telefone, flor???
— Eu... não sei…— disse sendo interrompida pelas brincadeiras de André — Para, André, deixa eu só falar com a Mariana em paz. — disse elevando o tom de voz.
— Amiga, eu realmente não sei onde está o seu telefone, você disse que estava no short, mas achei nada. — disse Rebeca, dando uma última checada na canga em que estava sentada.
— Meu Deus, gente. — disse Mariana, preocupada. — Me ajuda a procurar aqui, por favor.
Os amigos começaram a balançar as toalhas e olhar dentro das bolsas procurando o aparelho de Mariana, mas não o encontraram em nenhum lugar.
— Acho que devo ter esquecido em algum lugar do tour. — ela disse, chorosa, colocando as mãos na cabeça.
— Não lembro de você ter usado ele no tour. — disse Rebeca, tentando recordar-se da última vez que havia visto o celular da amiga. — A Clarissa tirou as fotos com a câmera dela e você não deve ter ligado pra ninguém da Grécia, senão iria pagar uma fortuna.
— Verdade. — Mariana balançou a cabeça, mostrando concordar com a amiga. — Mas ele tava no meu bolso, eu tenho certeza. Ele deve ter caído em algum lugar, ou alguém pode ter pegado. — ela fez uma careta.
— Credo, amiga. — disse Clarissa. — Pensamentos positivos! Onde você se lembra de ter usado ele pela última vez?
— Não sei. — forçou a memória, tentando ao máximo se lembrar. — No café da manhã eu mandei uma mensagem pra minha mãe. Depois eu não me lembro mais…
— Talvez tenha ficado no hotel e você nem percebeu. — disse André, secando seus cabelos molhados. — Você tava super distraída com o boy da recepção. — os amigos riram, embora estivessem um pouco tensos.
— É, talvez eu tenha esquecido mesmo. — ela ponderou, ainda um pouco incerta e esperando muito que o amigo estivesse certo.
— Vamos voltar logo, então. — André apressou Clarissa, que ainda se secava, e logo todos estavam fazendo o caminho de volta para o hotel.
Não demoraram muito para chegarem ao hotel. Mariana logo correu para a recepção acompanhada de André, enquanto Clarissa, Rebeca e Michael seguiram para seus respectivos quartos para tomarem banho.
Para a felicidade de Mariana, embora estivesse triste com a possível perda de seu celular, quem estava no balcão era o rapaz de mais cedo.
— Boa noite. — ela falou, sorrindo e recebendo o bonito sorriso do atendente. — Eu de novo.
— O que te traz aqui novamente? — ele perguntou. — Disse que iria prestar mais atenção. — ele brincou, apoiando os braços no balcão.
— Acontece que eu perdi meu celular. — ela disse com as bochechas vermelhas de vergonha. — Queria saber se por acaso o encontraram no restaurante hoje mais cedo.
Ele rapidamente procurou algo no armário embaixo do balcão e tirou um aparelho de lá.
— Pra sua sorte, me entregaram ele aqui de manhã. — disse, empurrando o celular para ela. — Aliás, bela foto. — ele disse, se referindo ao papel de parede da menina, que consistia em uma foto dela em frente ao famoso castelo da Cinderela localizado no parque da Disney.
Mariana corou mais ainda, se é que isso era possível, enquanto André ria ao seu lado.
— Precisamos saber seu nome. — André disse, entrando finalmente na conversa. — Só pro caso de essa esquecidinha aqui precisar de mais alguma ajuda. — recebeu uma cotovelada discreta de Mariana. — Ai!
— Ele tá brincando. — ela forçou um riso, mas o rapaz já tinha pegado um papel pequeno de um bloco de notas que estava no balcão e começava a escrever alguma coisa.
Logo, ele a entregou o papel, que a informava que o nome dele era Gregg e continha alguns números.
— Pode me ligar se precisar de alguma coisa. — ele sorriu, observando o sorriso envergonhado da menina.
— Obrigada, Gregg. — ela falou e virou-se para ir embora, mas logo lembrou de algo e virou-se novamente para o balcão. — O meu nome é Mariana.
— Estava tentando descobrir. — ele disse antes que ela se virasse completamente.
— Amiga, pode me assoprar aqui, por favor? — André perguntou quando estavam à caminho do elevador, e, ao perceber a expressão confusa da amiga, continuou: — Foi acender a vela, no final do date tem que apagar.


Capítulo 5 - Moscow Mule

O grupo, agora devidamente calmo, chegou nos quartos e se arrumou, pois planejavam em ir ao bar que havia no hotel após descansar do longo tempo que passaram se divertindo com o tour e a praia. Por volta de umas 19 horas, o grupo, devidamente arrumado, se dirigiu ao bar, que ficava no saguão principal, ao lado esquerdo da recepção.
Ao chegarem na porta do bar, olharam para dentro e se animaram ao verem de longe algumas pessoas e os lindos drinks que alguns tomavam. Ao adentrar o recinto, todos olharam para o grupo que estava levemente mais arrumado que o necessário para a ocasião e, depois de alguns segundos, voltaram os olhares para suas mesas e companheiros.
Se dirigiram ao balcão do bar e se sentaram um do lado do outro, pedindo cada um sua bebida preferida, sem mesmo olhar o cardápio.
— Boa noite, eu gostaria de um mojito, por favor! — disse Clarissa para o barman, que usava uma blusa social branca de mangas curtas juntamente com um suspensório e uma gravata borboleta vermelha.
— … eu queria um Malibu Sunset — disse Mariana com água na boca.
— Gostaria um soju puro — disse Rebeca.
— E você, vai querer o quê? — perguntou o barman para André, que estava o observando.
— Eu??? Vou querer uma Moscow Mule, por favor. — ele pediu, ainda sem tirar os olhos do atendente, que soltou uma risada divertida ao perceber os olhares antes de virar-se para preparar as bebidas.
— Eita. — disse Clarissa, olhando para os amigos. — Sentiram essa tensão aqui, ou foi só eu? — ela riu, seguida das amigas, deixando André sem graça.
— Eu senti também. — Mariana concordou, olhando discretamente para o barman e depois para André. — Ele é uma gracinha, eu investiria.
— Não, gente. — André falou. — Estou bem, muito obrigado.
— Bem eu também estou. — Clarissa disse. — Mas não recusaria um desses.
— Eu estou recusando. — falou André. — Pelo menos por agora. — ele piscou e as amigas riram.
O barman voltou com algumas das bebidas, entregando-as às suas respectivas donas.
— Já volto com seu Moscow Mule. — ele disse bem próximo de André, sorrindo para ele.
— Gente. — Rebeca arregalou os olhos quando o atendente saiu. — O que foi isso? — ela riu. — Pelo visto, se o André não quer, ele tá querendo — disse olhando maliciosamente para todos os amigos, deixando André super vermelho de vergonha.
— Gente, esquece isso aí e vamo falar da festa que o Harry convidou a gente — disse André mostrando o telefone para as amigas — Vai ser amanhã, temos que economizar pra não morrer no final da festa.
O grupo de amigos então conversaram e tomaram uma segunda rodada, agora bebendo outros drinks mais leves, pois não queriam ficar muito bêbados para poderem curtir a festa que teriam no dia seguinte, o que animou o pessoal.
Já no final dos seus drinks, as meninas um pouco cansadas, mas ainda animadas, decidiram ir logo para os quartos e aproveitar para poderem descansar e possivelmente jogar algum jogo qualquer.
— Vamo então, gente, queria jogar algum joguinho com vocês antes de ir dormir — disse Clarissa já pensando em que jogo jogariam.
— Acho uma ótima ideia, estou meio cansada mesmo. — disse Rebeca enquanto Mariana concordava com a cabeça.
— Amadas, vocês podem ir indo na frente, acho que vou aproveitar pra ler um livro que precisava reler para um artigo. — disse André puxando um livro de sua mochila.
— Sei… — disse Mariana, sorrindo maliciosa para o amigo.
— Tô falando sério, gente, olha aqui o livro — riu André balançando o livro na frente das meninas.

André’s P.O.V. on
Finalmente vou poder reler esse livro. Meu orientador vai me matar se eu prolongar mais uma semana a análise dele, mas pelo menos é uma leitura boa, Marx nunca fica chato. Queria estar lá com as meninas, elas devem estar jogando verdade ou consequência, mas pelo menos eu já sei tudo delas, não vou perder muita coisa.
Mas agora tenho que ler logo, senão em breve serei jubilado da universidade, então vamos lá. Leio com um sorriso no rosto, não somente por estar lendo um dos meus autores favoritos, mas sim por a todo momento lembrar que essa viagem finalmente saiu das conversas de whatsapp e se tornou uma realidade. Mas, durante a leitura, outra coisa me distrai.
— Lendo Marx, hein! — diz o barman, que se chama Omar, como se pode ler em sua tarjeta.
— Tô sim, relendo na verdade, terceira vez eu acho... — eu digo, fechando o livro para mostrar a capa para ele.
— Nunca me dei bem com Marx, sou mais pra um estruturalista, um Lévi-Strauss da vida — diz mostrando um livro embaixo da bancada, que lia em momentos de pouco movimento.
— Nunca li nada dele, mas já ouvi falar muito sobre. — digo tentando lembrar das minhas aulas de antropologia que tive há anos.
— Você podia me explicar sobre Marx e eu te explicaria sobre Lévi-Strauss. Creio que seja uma troca justa, não acha? — ele diz com um sorriso no rosto.
— Pode ser, nunca perco uma oportunidade de doutrinar alguém... — eu digo, tentando desviar do olhar penetrante que o barman me dirige.
— Vindo de você, eu até aceitaria ser doutrinado — diz o barman rindo ao mesmo que seca um dos copos do bar em um pano — mas agora não vou continuar atrapalhando sua leitura, divirta-se — diz com um sutil sorriso de lado ao pôr o copo de volta no lugar, dando as costas ao rapaz.
André’s P.O.V. off

Enquanto isso, no quarto, as meninas já haviam colocado seus pijamas e conversavam sobre suas vidas e sobre a viagem como um todo. Clarissa tinha vindo para o quarto de Rebeca e Mariana para poderem se comunicar melhor.
— Vamos jogar verdade ou consequência. — disse Mariana, sentada com as pernas cruzadas em sua cama.
— Pode ser. — disse uma Rebeca já deitada e enrolada em suas cobertas.
— Vocês já sabem tudo sobre mim. — Clarissa disse rindo, sentando-se na cama de Mariana.
— Nada a ver. — disse Mariana. — Eu não sei, por exemplo, o motivo de você estar olhando tanto esse celular desde que a gente entrou no bar.
O sorriso de Clarissa sumiu de repente.
— Nada de importante. — ela forçou um sorriso, mas as amigas a conheciam o suficiente para saber que era algo sim importante.
— Desembucha, Clarissa. — Rebeca ordenou, de olhos fechados.
— Não é nada, gente. — ela disse, olhando para as unhas e recebendo um olhar reprovador de Mariana. — É só o Daniel de novo. — ela revirou os olhos.
Rebeca de repente se sentou na cama, com os cabelos bagunçados e os olhos vermelhos de sono.
— Não acredito que você não apagou o contato desse embuste, Clarissa. — ela disse, fazendo uma cara de brava que fez as outras rirem por conta do estado em que a amiga se encontrava.
— Clarissa, você simplesmente pega os conselhos que a gente te dá e joga no lixo, não é possível. — disse Mariana, cruzando os braços.
Daniel era o ex-namorado de Clarissa, que sempre voltava a importuná-la quando lhe era conveniente, lê-se quando ele estava carente ou quando precisava de alguma coisa. Rebeca e Mariana o odiavam por ter feito a amiga sofrer, e o odiavam mais ainda por continuar procurando Clarissa quando ela estava começando a superá-lo.
— O que ele quer dessa vez? — Mariana perguntou, mexendo nos cabelos da amiga.
— O mesmo de sempre. — ela deu de ombros, jogando o celular na cama. — Quer me ver.
— Coitadinho. — Rebeca fingiu pena. — Que compre uma passagem para a Grécia, então. — ela disse, brava, e as amigas riram.
— Bate na madeira! — Clarissa correu para a mesa de cabeceira que havia entre as duas camas e deu três batidinhas nela com a mão fechada. — Se Deus quiser, volto para lá com um grego bem bonito! E Daniel nunca mais vai me importunar.
— Deus vai querer, amiga. — disse Mariana, pensando no guia turístico e sorrindo consigo mesma antes de ser atingida por um travesseiro na cara. — Ai!
As meninas então começaram uma guerra de travesseiros enquanto Rebeca implorava para que desligassem as luzes.

André’s P.O.V. on
Realmente continuo a ler, até um momento em que eu sou o único cliente restante no recinto, já se aproximam das 23 horas. Com as maravilhosas críticas econômicas-sociais de Marx, acabo perdendo completamente a noção do tempo, assim só há Omar comigo, o qual está sentado em um banco no lado de dentro do balcão lendo o livro que me mostrara anteriormente. Envergonhado de estar prolongando, provavelmente, o seu tempo de expediente, falo:
— Ai meu deus, tô te segurando muito aqui! Só vou recolher minhas coisas para te liberar…
— O horário de fechar realmente já passou, mas você estava tão concentrado que não quis atrapalhar e, sinceramente, não faz muita diferença, porque eu moro aqui do lado. — diz ao fechar seu livro e guardá-lo em sua bolsa.
— Nossa, ainda tenho que pagar, né??? Eu realmente perdi a noção do tempo. — acabo por falar enquanto procuro em minha mochila a carteira.
— Tem mesmo, quase que eu também esqueci — ri sutilmente dizendo isso — São 19 euros. — diz olhando no sistema. — Você pode tanto pagar agora, ou deixar pra pagar no check-out. O que vai escolher?
— Vou pagar agora — falo.
Ao mesmo tempo que falo, abro minha carteira, que está de cabeça pra baixo, fazendo com que todas as notas e moedas caiam no chão. Envergonhadamente, me abaixo e pego tudo que havia caído, e ali mesmo conto os 19 euros.
Levanto e Omar está com uma caneta na mão e tentando segurar um sorriso do mico que acabei de passar. Dou o dinheiro para ele, assim debitando minha divida do sistema. Pego meu livro e me despeço dele, já com olhos cansados. Ao me retirar do bar e, assim, adentrar o elevador, vejo ele fechando a porta do local e em seguida me acenando um tchau com a mão enquanto esbanja um belo sorriso. Lamentavelmente, pouco posso continuar a admirar, ou talvez responder o aceno, pois as portas do elevador logo se fecham.
Já na porta do quarto, agora silencioso, tento pegar a chave que estava dentro da mochila, torcendo para não tê-la esquecido. Ao achá-la, abro a porta cuidadosamente para não produzir muito barulho, podendo acordar as meninas. Todavia, nessa tarefa não me saio bem, pois deixo meu livro cair, causando um barulho que ecoa no corredor silencioso. Me agacho sutilmente, enquanto me xingo pelo descuido, para pegar o livro quando algo chama minha atenção. Muito intrigado, noto que de dentro do livro um pequeno guardanapo cai e, pelo que parece, há algo escrito em seu verso.
Primeiramente, pego o guardanapo misterioso, deixando o livro ainda no chão. Nele estava escrito Omar Ayuso e um número de telefone. Leio isso rindo, percebendo que nem me dei conta que precisava trocar de contato com ele. Abro a porta e, já dentro do quarto, quando vou fechar-lá, olho o livro que ainda está no chão, rindo um pouco mais alto e o pegando.
Observo que as meninas estão dormindo todas em somente um quarto, e observo que Clarissa se encontra no chão quando vejo suas pernas saindo de trás de uma das camas. Vou para o meu quarto, me arrumar para dormir. Mas, antes de ir devidamente me deitar, ponho o livro sobre uma mesa que há em um dos cantos do quarto e coloco novamente o bilhete dentro.
André’s P.O.V. off


Capítulo 6 - A gente se esbarra por aí

Rebeca, como sempre, foi a primeira a despertar, por volta das 7h, e se chocou com o estado pós guerra de travesseiros em que se encontrava o quarto. Clarissa, por algum motivo, estava deitada no chão entre a cama dela e a de Mariana, que estava com parte do corpo na cama e a outra parte pendurada no ar. Rebeca riu da situação das amigas e se dirigiu ao banheiro, tomando cuidado para não pisar na menina ruiva estirada no chão.
Ao terminar sua higiene matinal, retrocedeu em direção às camas, contudo agora só encontrando uma de suas amigas dorminhocas no mundo da lua, ou quem sabe em parte. Era visível para qualquer um que Mariana estava mais dormindo do que acordada enquanto procurava uma muda de roupas para se trocar, entretanto, mesmo que de modo desengonçado, a garota teve sucesso em sua tarefa e suficiente êxito na missão de chegar ao banheiro sem esbarrar em nada. Passada meia hora, Mariana voltou mais desperta e se uniu à mais velha na árdua tentativa de acordar Clarissa, que resultou em completa desistência por parte delas, que, humildemente, preferiram por fim verificar o estado de André e, se possível, despertá-lo rápido o suficiente para que todos pudessem ir ao café da manhã.
Quando Clarissa acordou, já quase 9h, viu todos os seus amigos prontos e sentados nas camas, mexendo em seus celulares.
— Por que não me acordaram? — ela perguntou, esfregando os olhos.
— Eu não queria ser morta, thanks — respondeu Mariana, fazendo a menina recordar da ameaça que havia feito no dia anterior — Agora corre para se arrumar, pois só temos uma hora antes do encerramento do café da manhã — completou Rebeca já se estressando com sua fome crescente.
Ao chegarem no restaurante, faltavam 30 minutos para a suspensão do café da manhã, contudo mesmo assim encontraram Michael esperando-os enquanto bebericava um chocolate quente.
— Você também demorou para descer? — perguntou André ao Michael enquanto o cumprimentava.
— Na verdade não, estava esperando vocês, mas como a Mariana não respondeu minhas mensagens e pela demora preferi ir me adiantando. — respondeu o rapaz de bom humor, assim aproveitando a deixa para cumprimentar as demais integrantes do grupo que se aproximavam.
— Putz, nem notei que você tinha mandado. Foi mal, mas na próxima manda para a Rebeca! Aposto que ela lhe responderá rapidamente — provocou fazendo a outra correr para o bufê na tentativa de disfarçar sua vergonha.

Após todos terminarem suas refeições na velocidade da luz, a qual portanto foi extremamente silenciosa, Michael foi o primeiro a se levantar enquanto chamava a atenção dos outros amigos
— Gente, me surgiu a oportunidade de alugar uma lancha, o que vocês acham? — disse Michael com um ar de dúvida.
Os amigos se olharam e Rebeca disse o que todos estavam pensando:
— Eu imagino que seria um pouco caro, não? — disse com medo de parecer grosseira, mas na verdade tinha um ar de preocupação com Michael.
— No início era um pouquinho, mas comecei a falar em grego com o cara da lancha e ele achou muito bom eu falar em grego com ele, me dando um desconto bonzinho, entretanto é dibas eu pagar, meu pai me deu uma boa reserva de dinheiro pra essa viagem, e eu queria realmente fazer isso com vocês. — olhou carinhosamente para Rebeca enquanto falava.
O pessoal resolveu ajudar em parte do pagamento, como única condição para participarem. Subiram então para pegar dinheiro suficiente para custear a lancha, para poderem dar uma volta na ilha e curtir um pouco.
Diferentemente do dia anterior, dessa vez todos já trajavam roupa de banho antes mesmo de terem ido ao café da manhã, assim, após partilharem as despesas com o canadense, puderam já se direcionar diretamente à lancha.
Após uma caminhada 10 minutos até o píer em que se encontrava a lancha aportada, o grupo colocou o que tinha comprado em seus respectivos lugares e zarparam com a lancha.

Michael’s P.O.V. on
Okay, primeiro passo da operação “Conquistar a Jovem Morena” feito. Agora é torcer para que o resto dê certo. Antes que você se pergunte, leigo leitor, sim, estou quebrando a quarta parede. Nunca gostei dela e não é agora que irei apreciá-la.
Enfim, não sou o tipo de pessoa que acredita em amor à primeira vista. Esse imaginário estilo princesas da Disney já me causou muitos problemas na juventude desde o jeito como meus amigos viam minha sexualidade, bem como eu me compreendia como pessoa, indivíduo. Nunca fui do tipo de querer adquirir crushes em pessoas aleatórias ou de se deslumbrar por uma imagem inventada. Isso, em verdade, sempre me cansou profundamente, pois já experimentei na pele que na maioria das vezes as pessoas não são o que aparentam ser, digo, no quesito romântico. Para mim o belo está na psique humana, a qual pode ser analisada de diversas formas em diversos aspectos.
Talvez por isso decidi fazer línguas clássicas como curso na faculdade, apesar de a minha família obviamente não apreciar essa escolha. Compreender a expressão das pessoas e como elas interpretam a realidade à sua volta diz muito do como elas são em seu cerne. Alguns ousaram dizer que olhos são as portas para a alma, mas para mim a linguagem, qualquer que seja, essa sim é o portal para a imensidade existencial que um ser humano poder ser.
E assim finalmente chegamos no ponto da Rebeca. Ela obviamente não parece ser muito acostumada a interagir com o gênero oposto, mas das conversas que tivemos posso confirmar que ela é um mundo linguístico altamente exótico que me atrai a decodificá-lo, analisá-lo e, se possível, traduzi-lo.
Sim, quem sabe talvez seja por isso que, desde o início dessa viagem, ao invés de simplesmente seguir meu plano de mochilar pelas diversas ilhas paradisíacas dos mediterrâneo grego, preferi acompanhar esse caoticamente organizado grupo de amigos sul-americanos. A animação constante e a alta capacidade de me esquecerem são algumas de suas características que mais me divertem em estar com eles, por mais incrível que possa ser. Devido minha alta posição social, nunca fui antes tratado de modo tão acolhedor e displicente em toda minha vida e admito gostar muito disso.
Voltando ao ponto da Rebeca, perdão pela minha TDAH, como estava dizendo… ela me cativou e, sinceramente, o que eu posso perder? Obviamente ela não está atrás do meu patrimônio, percebo pela forma como age, e estamos ambos tendo uma das melhores viagens de nossas vidas sem pensar muito. Que mal faz deixar rolar? Nenhum! E por isso pela primeira vez decidi fazer algo que meus amigos sempre me orientaram: me deixar viver a vida um pouco.
Por me permitir isso foi que aluguei uma lancha e, sem nenhum aviso prévio, simplesmente os convidei, a convidei, para participar de uma aventura náutica pelas margens do litoral grego.
— Ah! A lancha branca à esquerda foi a que aluguei, aquela ali — digo olhando para ver a reação de Rebeca, a qual somente esbanja animação.
— Ela é perfeita, Mike, nossa!!! — responde Clarissa enquanto o resto do grupo se aproxima da embarcação de luxo nunca antes experimentada.
— Bem, fico feliz de vocês a terem aprovado — digo rindo da comoção que o grupo faz ao redor da lancha. Rebeca e Mariana entram na lancha com cuidado enquanto vão perguntando à capitã todas as informações e procedimentos de segurança que consideravam importantes caso uma ondulação mais acentuada ou um polvo gigante vinhessem a pôr em risco todos nós. Em contrapartida, Clarissa, André e eu estávamos mais interessados em arrumar nossas coisas e simplesmente iniciarmos nossa aventura.
Depois de alguns minutos em alto mar finalmente decidimos ancorar a lancha para aproveitarmos do cenário mítico para poder nadar, bronzear-se ou simplesmente relaxar. Calma, meu nobre leitor, eu sei que até agora nenhuma interação decente ocorreu entre mim e ela. Mas tudo ainda está conforme meu incrível plano infalível: primeiro iríamos embarcar, eu a convidaria para nadar e a partir daí eu iria convidá-la…
—Michael!!! — diz Rebeca, já com roupa de banho, na beira da lancha me chamando para pular com ela. — Ela adivinhou meu plano... — digo pensando alto, fazendo com que Mariana conseguisse ouvir.
— Que plano, hein? — diz Mariana com uma expressão que mostra que já fanficava em sua mente toda a situação.
*tchibum* é o que nos interrompe, é o barulho de Rebeca pulando para o mar cristalino que nos cerca, seguido do grito da mesma.
— Vêm, gente, a água é quentinha e eu consigo ver meus pés — diz animada em perceber que a água é realmente muito cristalina. Eu por um segundo fico parado admirando como ela consegue ser fofa em muitas situações, enquanto vejo o resto do pessoal pular.
— Vai pular não??? — diz a capitã rindo, enquanto percebe minha expressão de admiração.
— Vou sim! — digo ficando vermelho de vergonha.
Nós todos nos divertimos muito naquele mar, todavia uma hora nos cansamos e decidimos ir comer e beber o que tínhamos trago. Todos subimos, ficando somente André ainda nadando, insistindo que ficaria um pouco mais, ideia que durou pouco quando ouve o barulho do vinho que abro.
Já com um pouco de álcool no sangue, colocamos algumas músicas para tocar e podemos gastar a animação que ainda está guardada em nós. É aí que eu percebo uma ótima chance para poder chamar Rebeca para um encontro, ela cansada de se mexer se encosta na grade da lancha sozinha, então vou em sua direção. Faço bem? Quando já estou próximo a ela, de repente uma onda inesperada atinge o barco fazendo com que eu seja jogado na direção dela, entretanto consigo me segurar na grade. Em um segundo, ficamos de frente a frente, na proximidade de um palmo, olho no olho, o que faz com que nós dois nos envergonhemos e voltemos a distância inicial, seguidos de diversas desculpas. Situação essa que muda no momento em que uma onda na direção contrária nos faz cair um em cima do outro, nos deixando ainda mais corados. De repente, a feição de Rebeca muda e ela diz:
— Michael, eu sei que isso é inesperado e a situação não faz isso menos constrangedor, mas você gostaria de ir a um encontro?— depois de ouvir tais palavras você tem que concordar comigo, ela é uma feiticeira. Só pode! Como poderia ela mudar de feição tão rapidamente e me fazer essa pergunta?
— Claro!!!— digo enquanto percebo que todos estão a olhar-nos, todavia o olhar de Rebeca me atrai como se fosse um buraco negro e eu quero encarar essa aventura. Não me julgue, você também iria querer fazer o mesmo se visse o olhar dela!
Nos levantamos e, ainda corados por causa da situação, fingimos que nada ocorreu, apesar dos risos e falas que nosso amigos soltam. Assim, voltamos a dançar ao som da música que constantemente é cortada pela briga entre Clarissa e André, já que um quer pop e o outro indie. Mas, graças às forças do universo, entram em um acordo ao por uma música de sua banda francesa preferida.
O sol começa a se pôr então voltamos ao píer, nos despedimos da capitã, Angèle, pegamos nossas coisas e ficamos a observar a lancha partir.
Michael’s P.O.V. off

Depois de chegarem no porto, apostaram uma corrida para a entrada do hotel, pois a animação para o que esperavam em seguida era tanta que, desde o momento que entraram na lancha, só se falava na tal festa que teriam em uma ilha vizinha. Chegaram no elevador, tentando fazer com que todos entrassem. Michael se despediu, quando o elevador abriu no segundo andar, falando que encontrava o pessoal na entrada às 20h40, e o restante dos amigos desceu no andar que ficavam seus quartos, o terceiro, e entraram no quarto, se espremendo pela porta.
O grupo estava super animado com a primeira festa grega que iriam. As meninas demoraram horas escolhendo suas roupas e se maquiando, enquanto André aguardava ansioso por elas. Mariana havia escolhido um vestido branco brilhante, curto e justo, que tinha um decote nas costas abertas; Rebeca apostou em um cropped top tomara que caia e uma saia de babados, ambos cor de rosa e cobertos por um casaco pesado de pele; Clarissa usava um vestido curto de mangas longas, de um preto meio transparente e um decote em “U”; e André usava uma calça preta listrada, uma blusa verde e uma jaqueta preta aberta.
— Meu Deus, nunca me senti tão bonita em toda minha vida. — disse Mariana enquanto passava seu batom olhando-se no espelho do elevador.
— Eu sou bonito sempre, então nem tô sentindo diferença. — disse André e as amigas riram.
Michael já os esperava na recepção, também arrumado e ansioso. Seus olhos estavam vidrados desde o momento em que pousaram em Rebeca.
— Pede pro seu namorado fechar a boca. — Clarissa sussurrou para ela. — Tá começando a babar.
Era por volta das 21h quando eles pegaram a balsa em direção à Skiathos, ilha em que aconteceria a festa. O guia turístico do dia anterior, Harry, que havia os convidado para a festa, já estava acomodado em um dos bancos.
— Olhem! O Harry! — Mariana apontou para o rapaz e acenou animada, logo puxando Clarissa pelo braço. — Vamos sentar perto dele! — e empurrou a amiga para que sentasse no banco ao lado do guia.
— Boa noite, Harry, como vai? — Clarissa perguntou, simpática, mas estranhando o comportamento da amiga.
— Estou ótimo! Que bom que conseguiram vir! — falou, acenando para Rebeca, André e Michael, que sentaram-se um pouco mais afastados. — Estão todos muito bonitos.
— Obrigada, Harry, você também está bonito! Não está, Clarissa? — Mariana sorriu, cutucando a amiga com o cotovelo.
— Claro. — Clarissa sorriu, mas sua cabeça estava em outro lugar e em outras pessoas.

Clarissa’s P.O.V. on
O percurso da balsa demora mais ou menos 1h. Isso significa que passo 1h fingindo olhar para o mar escuro que nos cerca enquanto milhares de pensamentos invadem minha cabeça. Meus amigos estão todos conversando e se divertindo, animados para a festa que virá. Eu também estou animada, eu sempre estou animada quando o assunto são festas, mas não do jeito que gostaria de estar. Continuo pensando na mensagem que recebi de Daniel na noite anterior, e eu realmente gostaria de dizer que não tinha me afetado, mas não adianta mentir para mim mesma. É fácil dizer para Mariana que estou bem e rir com as piadas de Rebeca e de André, mas, no fundo, só eu sei a confusão que se instaura em minha mente quando meu ex me procura.
Quando finalmente chegamos ao local da festa, vamos direto para o bar. Tomamos shots de tequila e brindamos com a bebida especial da casa, algo colorido à base de vodka, antes de irmos para a pista de dança. Tento ao máximo tirar aqueles pensamentos da minha cabeça enquanto bebo o máximo de álcool que consigo. Não que eu consiga muito.
André dança como se não houvesse amanhã e eu tento imitar os passos dele, sem muito sucesso. Rebeca e Michael sumiram em algum momento e Mariana continua tentando empurrar Harry para mim. Não me levem a mal, ele é uma gracinha, e eu sei que Mariana deve estar pensando que havia encontrado o par perfeito para mim, porque ele é o estereótipo dos caras com quem eu geralmente saía. Mas eu simplesmente não quero ficar com ninguém hoje, eu quero me divertir com meus amigos, beber muito, dançar até meus pés doerem e esquecer que um dia me submeti a um relacionamento com alguém tão escroto como Daniel.
— Cadê o Michael e a Rebeca? — André pergunta, gritando devido à música alta.
— Eles sumiram tem um tempo. — respondo, também gritando, e rio.
— Alguém tá aproveitando bem a festa. — Mariana ri. — Aproveita também. — ela sussurra no meu ouvido, apontando com o olhar para Harry.
— Vou ao bar, já volto. — balanço a cabeça, reprovando mentalmente o comentário de minha amiga e indo em direção ao balcão onde as bebidas são servidas.
No caminho, enxergo um rosto conhecido. O rapaz de jaqueta de couro que havia esbarrado em mim no outro dia claramente passou do ponto com a bebida. Ele está sozinho e conversa animadamente com o nada. “Então ele sabe sorrir”, penso, mas logo me preocupo com o estado em que ele está quando tropeça em seu próprio pé e quase cai. Mudo o trajeto do bar e sigo até o desconhecido que, por algum motivo, me chama a atenção.
— Ei. — digo assim que chego perto dele. — Tudo bem? — pergunto, encostando a mão em seu ombro.
Ele me olha, confuso, parecendo analisar minhas feições e de repente abre um sorriso.
— Eu conheço você! — ele diz, animado, embolando as palavras. — De onde eu conheço você? — junta as sobrancelhas, provavelmente tentando lembrar onde havia me visto.
— Nos esbarramos outro dia. — eu digo. — Você falou “Olha por onde anda”. — faço uma cara de brava e tento imitar sua voz grave.
Ele ri, me fazendo rir também.
— Desculpa! — ele fala, ainda rindo, e segura na minha mão com a mão que não está segurando um copo quase vazio de bebida. — Vem, vamos dançar! — não espera eu responder e me puxa para a pista de dança.
Não vou mentir para mim mesma que não gostei dessa atitude, então apenas deixo-me guiar por ele.
— Você fica bem mais bonito sorrindo. — falo assim que chegamos à pista e ele começa a dançar desajeitadamente.
— Quer dizer que eu não fico sexy com a cara fechada? — ele pergunta, fingindo estar bravo, mas rindo logo depois.
— Tem seu charme. — pisco enquanto danço e ele se aproxima de mim, exalando um cheiro forte de álcool e cigarros.
Seu corpo está bem próximo do meu e seus braços logo vão para a minha cintura. Ele aproxima o rosto do meu e nossas bochechas se tocam.
— Você acha? — ele sussurra no meu ouvido e meus pelos se eriçam.
— Acho que é melhor eu ir procurar meus amigos. — suspiro fundo, retirando seus braços da minha cintura e afastando meu rosto do dele.
Ele junta as sobrancelhas novamente, tentando entender o porquê eu havia me afastado.
— Por quê? O que houve? — ele pergunta, segurando meu rosto.
— Nada. — balanço a cabeça, segurando sua mão que estava no meu rosto. — Eu tô um pouco mal hoje. — falo. — E você também. — rio, olhando-o de cima a baixo. — Vê se toma uma água.
Solto sua mão e começo a andar de volta para onde penso estarem meus amigos.
— Calma! — consigo ouvir sua voz atrás de mim. — Desculpa, eu não quis… — ele começa e eu me viro para ele.
— Tá tudo bem. — falo. — A gente se “esbarra” por aí. — rio e observo ele rir também. — Vê se olha bem por onde anda. — pisco antes de retornar ao caminho que trilhava anteriormente.
Clarissa’s P.O.V. off


Capítulo 7 - Isso foi um erro

Era por volta das cinco da manhã quando os amigos saíram da festa. Comeram em uma barraquinha perto da boate e aproveitaram para observar o silêncio e as ruas completamente vazias na madrugada de Skiathos antes de irem para o porto, onde a balsa para Skopelos sairia às seis em ponto.
Rebeca e Michael juraram ter sumido durante o ápice da festa apenas para conversarem em um local menos barulhento, e todos fingiram acreditar. Clarissa não contou de seu encontro inesperado, e Mariana não contou que acabou ficando com Harry em algum momento em que os dois tentavam procurar pela ruiva. André foi o que mais aproveitou a festa, não deixou de dançar por um segundo, bebeu tudo o que tinha direito, recebeu os mais diversos olhares e até recusou alguns gregos que tiveram coragem de arriscar algo a mais.
Na balsa, Mariana tentava evitar os olhares de Harry, envergonhada, enquanto Rebeca, Michael, Clarissa e André engatavam uma conversa animada. Clarissa às vezes olhava para o lado, procurando um rosto específico por entre os rostos da balsa, mas não o encontrou. Não pôde deixar de ficar preocupada, devido ao estado em que o rapaz estava na noite passada, mas deixou para lá assim que pisaram novamente em Skopelos, às 8h da manhã. Todos só queriam tomar um bom banho e dormir um pouco, por isso foram diretamente para o hotel.
Rebeca, depois de descansar e se arrumar, decidiu descer sozinha até a recepção para poder ter um melhor acesso à internet, pois precisava fazer uma petição que seu pai solicitou e assistir uma audiência que estava ocorrendo no Brasil, porém, antes de fazer suas afazeres, foi perguntar para o recepcionista sobre o sinal.
Na recepção estava Gregg, que estava a arrumar alguns objetos com uma falta de cuidado que o fazia derrubar alguns deles, e Raissa, uma das outras recepcionistas, que estava ao lado de Gregg parecendo que esperava ele se arrumar.
— Que pressa é essa, hein, Gregg? — disse Rebeca tentando ver se conseguia identificar o motivo de toda aquela arrumação.
— É porque acabou meu turno e eu preciso ir rápido pra poder fazer minha atividade agora nesse final de tarde, e você? O que faz aqui sozinha? — disse ainda arrumando algumas coisas em sua bancada.
— Tô tendo que trabalhar, então vim aqui porque me disseram que a internet é melhor.
— Realmente é mesmo, é só sentar nessas cadeiras aqui da esquerda, que é o melhor wifi do… — disse parando o que estava a fazer ao perceber que atrás de Rebeca passava Mariana, que já estava a correr indo em direção à praia, parando na frente do hotel para perguntar alguma informação.
— Ei… Gregg? — disse Rebeca tentando chamar atenção de Gregg sem perceber para o que estava olhando.
— Sim, sim, é só se sentar nessas cadeira aí que a internet vai funcionar muito bem — disse saindo do transe que Mariana o havia deixado e voltando a arrumar sua bancada
— E só mais uma coisa, sabe se tem algo que eu e meus amigos podemos fazer essa noite? — disse com um pouco de vergonha de estar atrapalhando Gregg
— Hoje à noite? Hoje vai ter uma festa típica daqui da ilha, panigiri o nome. Me encontrem aqui umas 20h e eu levo vocês lá. — disse Gregg soltando um leve sorriso.
— Ai, ótimo, eu tinha ouvido falar dessa festa! Então marcado. — disse Rebeca indo em direção às cadeiras.
Rebeca assim fez todas as tarefas que o pai tinha a assinalado e terminou ligando para ele para dizer sobre os trabalhos e contar como estava a viagem. Durante a ligação, viu Gregg correndo para fora do hotel, fazendo o que estava tão apressado a fazer.

Mariana’s P.O.V. on
Quando nós chegamos ao hotel, subimos para os quartos, exaustos da noite passada. Eu corri para o banheiro, esperando que, ao entrar no banho, poderia, além de me lavar, tirar a noite passada de mim. Enquanto massageava o shampoo nos meus cabelos, eu não conseguia parar de sentir culpa das minhas ações da noite anterior.
Em algum momento da festa, enquanto dançava, eu vi que Clarissa não estava dançando com a gente e isso me preocupou, tendo em vista que tínhamos tomado alguns drinks desde que havíamos chegado na festa. Eu parecia tão preocupada que Harry notou, porque imediatamente perguntou o que estava acontecendo de errado.
— Eu não consigo encontrar a Clarissa — Eu disse, tentando superar o alto som que nos cercava.
— O quê? Eu não consigo te ouvir! — Ele respondeu, fazendo com que eu puxasse ele para falar mais próximo de sua orelha
Esse foi meu maior erro nessa festa. Veja, quando eu fico bêbada, eu tendo a exagerar nos flertes. Então, no momento em que eu o aproximei de mim, algo estalou na minha mente. Ele era um pouco mais alto que eu, então tinha que se agachar um pouco para eu o poder alcançar. Entretanto, em vez de dizer como estava preocupada, eu simplesmente o beijei.
Imediatamente eu me afastei.
— Meu Deus… isso não deveria ter acontecido…. Me descul...— Eu fui interrompida pelos seus lábios novamente. — Que que você tá fazendo?
— Quê? — Ele perguntou.
— Isso foi um erro, eu tava tentando te arrumar pra Clarissa
— Clarissa? Então por que você me beijou?
— Você não me ouviu falando que isso foi um ERRO?... Olha eu tenho que procurar ela de qualquer forma, e por favor pelo nosso bem não conte isso para ninguém?
— Tudo bem
Assim que saio do chuveiro, percebo que não estou mais cansada. Pelo contrário, sinto que tenho toda a energia do mundo e que preciso gastá-la de um jeito ou de outro. Olho pela janela e, vendo as lindas ruas de Skopelos, decido que irei fazer uma corrida até que me sinta cansada novamente.
Eventualmente, perco a noção do tempo e do espaço. Quando olho ao redor para tentar achar meu caminho de volta para o hotel, percebo que de alguma forma tinha ido parar na praia.
— Mariana, como, diabos, você vai voltar agora? — digo para mim mesma… ou não.
— Nossa, você é realmente péssima em escutar instruções, huh? — diz uma voz atrás de mim, me fazendo pular de susto.
— PUTA QUE- — grito, virando-me para ver quem teve a audácia de me assustar dessa maneira. — Quem você- ai meu Deus, Gregg?
— Sim? — ele pergunta, rindo da minha expressão assustada.
— Você me assustou — digo, segurando meu peito e tentando acalmar meu coração do susto que acabei de ter, e também por causa do homem extremamente atraente à minha frente.
— Então, você ainda não respondeu minha pergunta...
— Qual era sua pergunta mesmo?— pergunto, envergonhada, porque, para ser sincera, quando tem garotos bonitos por perto, minha mente costuma NÃO funcionar.
Ele ri, balançando a cabeça.
— Esquece. No que você estava tão concentrada que te fez não prestar atenção em onde você estava indo?
— Hm, veja bem... Eu não tive a melhor noite ontem, então decidi vir correr um pouco, mas parece que eu estava tão emergida nos meus próprios pensamentos que não percebi para onde estava indo… então agora talvez eu possa estar um pouco perdida — respondo sinceramente, mas envergonhada.
Ele ri novamente, mas dessa vez, ao invés de me dizer para tomar cuidado, ele pergunta o que há de errado.
— Ei, você não precisa me falar se não quiser. Eu só sei que às vezes conversar sobre essas coisas com um estranho ajuda. — ele continua quando percebe que eu hesitei.
— Você está certo, não me conhece tão bem para me julgar, então acho que você ouvir o que eu tenho pra falar não é tão ruim quanto eu pensei…
— Exatamente! Então vai lá e me diz o que tá te incomodando, não vou te julgar, prometo de dedinho. — ele levanta o dedo mindinho para mostrar o quão sério ele está falando.
Eu bufo com o gesto, mas continuo e junto meu mindinho com o dele. — Então, nós fomos para uma festa noite passada...
Mariana’s P.O.V. off

André’s P.O.V. on
Desci do apartamento, depois de me despedir das minhas amigas, e fui até o ponto de encontro, que era na frente de um café com uma estética francesa, onde iria encontrar Omar para o “encontro” em que iriamos continuar a conversa que tivemos no bar outro dia. Cheguei ao local marcado, era na beira-mar, sentei-me na calçada no outro lado da rua em frente ao café, olhando aos arredores. Vi ele vindo depois de virar de uma esquina, ele vinha com um livro embaixo do braço, estava um pouco vermelho do sol que batia em seu rosto e dava para perceber o suor que escorria de sua testa.
Cruzei a rua correndo e, parado na porta do café, o vi acelerando o passo para me alcançar. Finalmente nos encontramos, ele me deu um abraço apertado e um beijo ao estilo francês. Decidimos sentar-nos em uma mesa ao lado da rua, fora do café, pois tanto eu como ele estávamos ansiosos e precisávamos fumar, o que aumentava ainda mais a estética francesa do lugar.
Estranhei no momento em que ele se sentou ao meu lado e não na minha frente, iria ser mais difícil conversar não estando um de frente ao outro, mas somente estranhei em minha mente, nada falei sobre. Começamos a conversar e as palavras fluíam como um rio, indo de assuntos como marxismo teórico, análise antropológica para assuntos cotidianos como que músicas gostávamos. Entretanto, após pedir um chá gelado, o clima ficou silencioso, nós paramos de conversar por um momento, eu erroneamente pensei que poderia ter sido o chá. Mesmo sendo ilógico, era a única coisa que fazia sentido.
Olhei para ele, ele se aproximou puxando a cadeira para perto de mim, me prensando contra a parede de vidro do café, não estava entendendo o que estava acontecendo. Comecei a olhar aos arredores e comecei a ficar corado de vergonha, então olhei para ele novamente, e, em um movimento rápido, ele me roubou um beijo.
Fiquei alguns segundo sem ainda entender o que havia acontecido, ele ficou corado e com uma culpa que se expressava.
— Eu não tava esperando por isso… — eu disse.
Ele, balbuciando alguns sons, se levantou, puxou uma nota de 10 euros, colocou na mesa e em um andar rápido se distanciou, virando na esquina do café. E eu só conseguia observar tudo isso, sem conseguir completar minha frase.
— … mas, acho que foi melhor do que esperava — disse para mim mesmo, pois estava já sozinho.
Levantei e corri até a esquina, onde ele tinha ido, mas já era tarde, não sabia para onde tinha ido. Voltei pra mesa, onde a garçonete estava a me esperar apontando para a conta que achou que eu não iria pagar.
André’s P.O.V. off


Capítulo 8 - Antes tarde do que nunca

Clarissa’s P.O.V. on
Já estava escuro quando acordei. Chegamos da festa por volta das oito da manhã, e a única coisa que consegui fazer foi deitar na minha cama e dormir. Nem sequer havia tomado um banho ou tirado a maquiagem, por isso, assim que levantei, às 18h43, a primeira coisa que fiz foi entrar no banheiro. Não havia ninguém em nenhum dos dois quartos, então pude me arrumar tranquilamente. Decidi que desceria e passearia pela ilha sozinha, para tirar algumas fotos e esclarecer meus pensamentos confusos. Por algum motivo, o rosto do rapaz da jaqueta de couro aparecia constantemente na minha cabeça, acho que até havia sonhado com ele durante a tarde.
Desci com a câmera pendurada no pescoço e cumprimentei Raissa, que estava cuidando da recepção, antes de me dirigir para a rua e respirar o ar fresco da noite grega. A noite estava tão linda que parecia de mentira, as luzes e as cores faziam o pequeno vilarejo parecer um cenário de filme. As pessoas andavam felizes pela rua e eu consegui capturar os sorrisos mais bonitos que já havia visto.
Andei até chegar em uma praça um pouco mais vazia. Alguns grupos de amigos conversavam e algumas famílias passeavam, e um certo rapaz fumava sozinho em um dos bancos de concreto. Não consegui controlar o sorriso ao vê-lo ali, mas logo balancei a cabeça e fechei a expressão. “Por que eu estava sorrindo?”, indaguei a mim mesma antes de chegar um pouco mais perto dele.
Levei a câmera para o rosto e o observei através das lentes. Ele estava sério, parecia que não querer estar ali e que mandaria qualquer um que falasse com ele para um lugar nada agradável, mas algo em seu semblante irritado me fazia sorrir involuntariamente e, além de achá-lo extremamente atraente, eu queria saber tudo sobre ele. O porquê de ele estar nessa ilha, o porquê de ele ter uma expressão tão séria, o porquê de andar sempre com a mesma jaqueta de couro. Ele me intrigava.
Tirei algumas fotos sem que ele percebesse, mas, depois do quinto clique, ele olhou para a câmera e juntou as sobrancelhas. Eu arregalei os olhos e minhas bochechas ficaram vermelhas de vergonha antes de eu soltar a câmera que tampava meu rosto e sorrir tímida, acenando para ele.
Assim que me reconheceu, ele soltou uma gargalhada e fez um sinal com a cabeça para que eu fosse até ele.
— Eu deveria me preocupar com o destino dessas fotos? — ele perguntou, rindo, assim que parei ao lado dele, fazendo com que meu rosto queimasse ainda mais.
— Não. — fechei o rosto, fingindo estar ofendida. — Posso até te mandar depois pra você postar no Instagram. — falei antes de sentar ao seu lado no banco de concreto.
— Uma desculpa boa pra conseguir meu número. — ele piscou antes de levar novamente o cigarro à boca.
Abri a boca, tentando formular alguma resposta, e juntei as sobrancelhas, sem saber o que falar.
— Não quero seu número, convencido. — respondi, com a voz mais fina do que o normal, porque eu queria sim o número dele. — Estou tentando ser amigável e te oferecendo de graça o meu trabalho.
— Deixa eu ver. — ele pediu, apontando com a cabeça para a câmera pendurada em meu pescoço.
Ele se aproximou de mim para observar melhor as imagens que eu mostrava e pude sentir seu perfume ficar mais forte. A jaqueta de couro encostava no meu ombro nu e eu tentava ao máximo não parecer uma adolescente que conversava pela primeira vez com o garoto que gostava. Eu não gostava dele. Eu nem o conhecia.
— Ficaram boas. — ele disse, se afastando de mim para apagar o cigarro no banco e me fazendo pensar que eu queria que ele continuasse perto de mim. — Talvez eu repense a sua oferta. — ele sorriu, voltando a se aproximar de mim e me fazendo agradecer mentalmente mil vezes por seu cheiro voltar a ficar forte. — Quero ver as outras. — ele olhou nos meus olhos antes de olhar novamente para a tela da câmera.
Mostrei todas as fotos que havia tirado desde o começo da viagem e até algumas de antes. Apresentei todos os meus amigos e contei as histórias por trás de cada uma delas. Ele parecia interessado e intercalava o olhar entre as imagens e eu, que sorria animada cada vez que lembrava do momento da foto.
— Aqui foi quando a Mariana achou que tinha perdido o celular. — falei, apontando para uma Mariana com uma expressão triste na tela. — A gente tava voltando pro hotel e ela tava com uma cara tão engraçada que eu tive que tirar foto. — disse, rindo, ao me lembrar da cena. — Ela me mata se descobre que eu tô mostrando pra alguém. — olhei para ele, com uma expressão divertida, e percebi que ele já olhava para mim.
— Por que tirou fotos minhas? — ele perguntou, sério, enquanto analisava os detalhes do meu rosto, e eu percebi que ele tinha ficado em dúvida quando viu que todas as minhas fotos significavam alguma coisa para mim.
— Não sei. — respondi, sincera, ainda olhando em seus olhos. — Digamos que você desperta minha curiosidade. — agradeci mentalmente que ele não podia escutar meu coração, pois ele batia muito mais rápido do que o normal.
Ele levantou as sobrancelhas, abrindo um sorriso sincero, e não pude deixar de sorrir também.
— Também tenho muita curiosidade em relação a você… — ele espremeu os olhos, esperando que eu completasse a sua frase.
— Clarissa. — sorri e ele balançou a cabeça.
— Clarissa. — ele repetiu, completando a frase. — Van McCann. — falou, apontando para si mesmo.
Clarissa’s P.O.V. off

Rebeca’s P.O.V. on
Estava sentada na cama, vendo os dois amigos, Mariana e André, se arrumando e bagunçando o quarto com muitas roupas, e ao mesmo tempo olhava no relógio para ver se a Clarissa não iria demorar muito com a saída fotográfica dela. Aquela bagunça ia se construindo na minha frente, todavia não me irritava pois estar ali com eles e indo nessa festa típica com meus amigos de colégio e os novos amigos era uma felicidade que me impedia de me irritar, mas já sabia que eu teria que brigar com eles quando voltássemos da festa e víssemos essa bagunça.
— E como é mesmo que a gente tá indo nessa festa? Onde você arranjou isso mesmo, Rebeca? — disse André tentando achar uma calça que combinasse com seu sapato.
— Eu pedi informação pro Gregg e ele se ofereceu pra levar a gente pra essa festa — disse olhando para o relógio vendo que faltava ainda meia hora para o horário marcado com Gregg.
— O Gregg vai também??? — disse Mariana com uma expressão de surpresa. — André, vamo ter que mudar toda minha roupa! — disse tirando mais roupas de sua mala e colocando em cima da cama.
Eu só conseguia rir daquele momento, ver a Mariana toda apaixonadinha no Gregg era bonito de ver, assim como todo o desespero por causa de uma roupa.
— E o Michael? Vai também? — disse André tentando ver se me fazia ficar envergonhada.
— Vai sim… — respondi, tentando evitar contato visual com meus amigos.
— Isso não vai ser um date não, né? — disse André com uma aflição no olhar.
— Meu date vai ser não, mas da Mariana… quem sabe? — disse dando uma pequena risadinha.
— Quem sabe, né? — disse Mariana tentando se esconder com uma peça de roupa.
Faltando uns vinte minutos para termos que ir para a recepção, Clarissa chegou com um grande sorriso no rosto e não demorou muito para se arrumar, pois André e Mariana já haviam escolhido a roupa que iria usar.
Descemos e Gregg e Michael já estavam nos esperando.
— Quase que nós íamos sem vocês! — disse Gregg rindo e ao mesmo tempo olhando para Mariana, que estava realmente belíssima.
— Mas vocês não teriam coragem de ir sem a gente! — disse me aproximando de Michael com um movimento de um abraço.
— Realmente! Não teríamos mesmo não — disse Michael depois de me dar um beijo.
Fomos, então, para o táxi que Gregg tinha reservado para nos levar à festa. Eu tinha ficado sentada ao lado do Michael, Mariana e Gregg sentaram juntos e André e Clarissa sentaram juntos atrás do táxi.
Ficava olhando pela janela, enquanto segurava a mão de Michael, e tentava lembrar da pesquisa que havia feito sobre essa festa.
Chegamos lá, havia muitas pessoas, maioria de idade mais avançada. O lugar era todo iluminado e havia várias mesas com comidas e bebidas que poderíamos comer e beber à vontade. Nós nos espalhamos para conhecer o local e, depois de uns vinte minutos, duas rodas começaram a se formar, e eu e Michael, não entendo o que estava acontecendo, entramos na maior roda que girava em sentido horário ao som do que parecia uma música típica da ilha. Quando, de repente, da menor roda que girava no sentido contrário, André e Clarissa passam por nós dois e dizem:
— Ei, Rebeca, nos encontre na mesa perto da fogueira! — disse André, no mesmo momento que se distanciava de nós.
— Aqui tem um fogueira??? Eu nem sabia. — disse para Michael, que ria da minha expressão de surpresa.
Passaram se alguns minutos, e todo mundo desfez aquela roda e a cantoria havia cessado. E agora tínhamos a missão de encontrar, naquela multidão, a fogueira e a mesa que não tínhamos muita referência de sua posição.
Nos guiamos pela luz que essa fogueira emanava, acima das pessoas, e chegando perto conseguimos localizar os amigos que estavam dançando e rindo.
— Rebecaaa! Você finalmente achou a gente, pensávamos que teríamos que ir atrás de você. — Disse André, enquanto intercalava a fala com o cigarro que já estava no fim.
— Antes tarde do que nunca! — disse Michael indo em direção à mesa pegar algo para beber.
Continuamos a beber, conversando e dançando, até que, de repente, levei um susto ao ver uma pessoa pulando por cima da fogueira.
— Gente, aquele cara pulou a fogueira??? — disse com um tom de susto
— Ah, sim, tem essa hora da festa que as pessoas pulam a fogueira, a tradição diz que tem que ser com o seu casal. — Gregg explicou.
— Clarissa!!! Vamo a gente pular! Já que não temos um casal ainda. — disse André levantando da mesa e segurando a amiga pela mão, que inicialmente exitou, mas que foi convencida com o apoio do resto do grupo.
— Eu acho que eu to fora dessa… — disse, enquanto observava os dois corajosos que pularam a fogueira soltando um grito uníssono.
— Você não quer ir mesmo não? — disse Michael, me cutucando.
— Ai, não sei, não parece das coisas mais seguras de se fazer. — disse enquanto olhava para Mariana pra ver se recebia uma aprovação de meu comentário.
— Rebeca, deixa disso, parece super ok de fazer, olha o André e a Clarissa fizeram de boas. — disse Mariana enquanto abraçava Gregg.
— Gente, é super legal!!! É quentinho. — disse Clarissa animada com a aventura
— Vamos, amor! — disse Michael, um pouco envergonhado por ter me chamado de amor, eu até que gostei.
— Então, tá bom, mas só se a Mariana e o Gregg forem também — disse olhando para o casal.
— Por mim tudo bem, e pra você? Mari? — disse Gregg levantando e dando a mão para Mariana
— O André e a Clarissa me pilharam, vamos sim então! — disse deixando o copo que estava em sua mão na mesa.
Fomos então para a fogueira. Eu segurava a mão do Michael, pois, do jeito atrapalhado que eu sou, poderia muito bem cair na fogueira e me queimar toda, mas faria isso pelo Michael e, caro leitor, eu realmente fiz! Foi um pouco assustador, mas a emoção do momento e a presença do Michael fizeram ser um momento legal e que guardaria na memória para sempre.
Terminamos o banquete e a festa acabou, e fomos de volta ao hotel quando a multidão se dispersou. Não conseguimos arranjar um táxi, devido à multidão, então decidimos ir andando até o hotel, que não era muito distante de onde a festa acontecia. Andávamos em grupo de dois, e fomos rindo de André, que tropeçava a cada esquina que chegávamos, pois ele havia bebido muito, e falava coisas sem muito sentido sobre uma pessoa que ele beijou e não sabíamos quem era.
Chegamos no hotel, estávamos super cansados da noite, então todos subimos rapidamente para o nosso quarto. Michael se despediu de todo mundo de dentro do elevador e, enquanto as portas se fechavam, exclamou:
— E, Rebeca, não esquece do nosso encontro, estou ansioso! —
Somente soltei um sorriso e fomos em direção ao quarto.
Ai, caro leitor, hoje foi um dia bom, eu gosto de criar essas memórias com meus amigos, elas ficam para sempre com a gente… Só não gosto mesmo de ter que cuidar do André.
Rebeca's P.O.V. off


Capítulo 9 - Polyvore da vida real

Logo depois de tomarem o café da manhã, os amigos estavam prontos para retornarem aos quartos e se arrumarem para mais um dia de passeios. No saguão, enquanto Clarissa e Mariana riam de alguma coisa que André havia dito, Michael sentiu sua mão ser segurada levemente.
— Planos pra hoje, senhor? — Rebeca perguntou assim que Michael virou-se para ela.
— Compras no centro, eu acho. — o rapaz deu de ombros. Por estar hospedado em outro andar, não participara da montagem da programação que os amigos haviam feito, mas ouvira alguém mencionar compras durante o café da manhã.
Rebeca fez uma careta e Michael a acompanhou, rindo.
— O que acha de pularmos essa? — ela perguntou, ainda segurando a mão dele sugestivamente.
— E não atender ao chamado dos meus instintos consumistas? — ele levantou uma sobrancelha, encarando a menina. — Sim, parece uma boa. — ele riu, fazendo com que ela risse também.
— Então, Michael, considero iniciado o nosso primeiro encontro. — ela disse simplesmente, começando a andar na direção contrária dos amigos, em direção à saída, e puxando Michael pela mão.
— O quê? — ele perguntou, surpreso. — Calma. Eu não estava preparado. — segurou a mão da menina para que ela parasse de andar. Ela virou-se para ele.
— Precisa se maquiar? — ela perguntou quando parou na frente dele. — Acho que você está bem assim, mas, se quiser…
— Não, Rebeca! — ele riu, olhando para os chinelos nos seus pés e para bermuda que ele usava para dormir. — Vestir uma roupa melhor, pegar minha carteira…
Rebeca balançou a cabeça negativamente, sorrindo com a preocupação do rapaz.
— Só vem. — e voltou a puxar Michael em direção à rua.
Depois de caminharem por algum tempo e conversarem sobre suas vidas pré-Grécia, chegaram à praia. Lá, andaram um pouco até chegarem em uma tenda maravilhosa.
Rebeca sorriu para Michael antes de puxá-lo para dentro da tenda.
— Rebeca, não podemos entrar. — Michael riu enquanto tentava puxar a menina de volta para a praia. — Essas tendas geralmente são privadas.
A tenda não era enorme, mas era linda. Cheia de almofadas coloridas e cangas espalhadas pela areia branquinha, uma pequena mesa com vários tipos de frutas e outras comidas típicas.
— Exatamente! — a menina respondeu, rindo e sentando-se perto de uma aglomeração de almofadas.
— Rebeca… o que… — Michael tentava raciocinar, enquanto Rebeca apenas ria.
— Michael, eu disse que era nosso primeiro encontro. — ela sorriu ao ver os olhos do rapaz brilhando.
— Meu Deus. — ele passou as mãos pelo rosto. — Como você…
— Uma ajudinha do Gregg. — ela piscou antes de jogar uma das almofadas perto de si em Michael. — Agora para de fazer essa cara de bobão e vem sentar aqui comigo.
Michael riu enquanto caminhava até Rebeca.
— Você me surpreende muito, garota. — ele comentou enquanto sentava nas almofadas ao lado dela e abraçava seus ombros.
— Eu tento. — ela deu de ombros e fez uma careta.
— Saiba então que essa é a primeira vez que uma garota prepara um encontro para mim, acredita?— ele diz sorrindo já completamente encantado pela jovem.
— Se continuar comigo, prometo que não será a última. — assim ela se inclinou em direção aos lábios do rapaz iniciando um lento beijo.
Passaram horas conversando, experimentando as comidas e aproveitando a companhia um do outro. Pareciam velhos conhecidos, que namoravam há vários anos e estavam em somente mais um encontro de muitos. Um pensamento, porém, surgiu na cabeça de Rebeca depois de Michael se engasgar com uma uva e eles rirem até ficarem roxos.
— O que vamos fazer depois de tudo isso? — ela perguntou depois de algum tempo em silêncio após a crise de riso.
— Bom, podemos encontrar os outros no centro, se você quiser. — ele respondeu, bebendo um pouco de água para recuperar o fôlego.
Rebeca riu, um pouco sem graça, encarando as almofadas aos seus pés.
— Não tô falando de hoje. — ela disse e Michael a encarou. — Tô falando de quando tudo isso acabar.
Um silêncio tomou conta da tenda. Nenhum dos dois havia pensado nisso até aquele momento, mas um dia aquela viagem chegaria ao fim, e esse fim não estava longe. Michael voltaria para o Canadá e Rebeca para o Brasil, continuariam suas vidas de antes, em que não se conheciam, e tudo voltaria ao normal.
Naquele momento, porém, apesar de sempre resguardar seus sentimentos e nunca os demonstrar, Rebeca não conseguia simplesmente mentir para si mesma e dizer que simplesmente gostaria que sua vida voltasse ao normal. Sim, gostaria de retornar ao Brasil, ao seu escritório de advocacia, ver novamente a sua família — de quem já morria de saudades — e continuar sua rotina lotada. Apesar disso, não queria imaginar a possibilidade de nunca mais ver Michael na sua vida. Conhecia-o há pouco tempo, é verdade, mas sentia algo tão bom no peito quando olhava para ele ou escutava sua voz e suas risadas, que seria difícil deixar tudo isso de uma hora para outra.
— Eu não sei. — ele falou baixo. — Não sei o que vai acontecer.
O coração de Rebeca deu um pulo. Era melhor aproveitar o presente, pois o futuro era totalmente incerto para eles.
Apesar de seu peito doer um pouco com a possibilidade de nunca mais vê-lo na vida depois de alguns dias, a menina conseguiu forçar um sorriso antes de jogar uma almofada em Michael novamente.
— É melhor aproveitarmos então. — ela riu da reação dele e seguiu até ele para beijá-lo. — Corrida até o centro?
— Você tem que aprender a me avisar as coisas antes! — ele gritou, rindo, enquanto a menina já se levantava e se preparava para correr.

Enquanto isso, os outros três amigos estavam a passear pelas ruas da cidade olhando as lojas e comprando as roupas mais bonitas que já haviam visto. Em um momento, os três se separam para ir às lojas que mais lhe agradavam e lá compraram suas roupas, mais roupa do que já haviam comprado. Então, com suas sacolas que ocupavam as mãos e que pesavam com a quantidade, se encontraram no meio da rua, que havia sido reservada para o uso de pedestres no dia, e falando rápido por conta da ansiedade de mostrar as roupas, pois foi a primeira vez no dia que o grupo entrou separado em lojas diferentes.
— Olha essa calça que eu comprei — falou André, levantando a calça cintura alta com listras brancas e azuis.
— Que linda! — disse Clarissa procurando a sua nova peça em meio ao monte de sacolas que possuía.
Mariana com um cara de choque, lentamente tirou de dentro de uma sacola uma calça idêntica a que André havia comprado.
O que fez o grupo em êxtase e dar um grito, chamando a atenção de todos ao redor, o que fez o grupo rir de vergonha. Rapidamente voltaram para o hotel para poderem criar os looks.
— Finalmente vamo fazer o polyvore da vida real — disse Clarissa já pensando em todos os looks que poderia usar em suas antigas fanfics.

Michael quando chegou em seu quarto, depois de se despedir de Rebeca, deitou-se em sua cama. Observando seu quarto, percebe a roupa que havia separado para usar, idéia que foi atrapalhada pelos planos de Rebeca, fazendo com que Michael refletisse que em situações normais não teria se sentido confortável, mas a presença de Rebeca naquele momento o fez esquecer completamente de como estava vestido e de como as pessoas o veriam.
Michael cresceu no meio de Vancouver e nunca teve muitas referências em quem se inspirar. Sendo o único menino negro de sua escola, viveu uma infância de bullying e racismo, o que mudou no momento em que Michael conseguiu se ver em um certo grupo de militantes do movimento negro dos Estados Unidos, quando estudou o mesmo grupo no ensino médio em uma aula de história. A partir desse momento, assim, o menino que antes se via reprimido, agora se sentia empoderado ao abraçar a estética dos Panteras Negras, inclusive entrando em um grupo local de militantes negros quando completou 18 anos.
E agora, Rebeca fazia também parte do empoderamento de Michael. Estar sendo amado e colocado em nível de grande importância como a sua possível futura namorada estava fazendo era algo que elevava sua auto-estima e fazia com que fosse possível, assim, fazer o mesmo por ela.
Nesse mar de pensamentos que fluía na mente de Michael, Rebeca era o que lhe fazia naquele momento sorrir, e com ela ainda no pensamento, pegou no sono e sonhou com uma possível vida que podia se concretizar estando junto de Rebeca.


Capítulo 10 - Conta tudooooh

Rebeca entrara no quarto onde seus três amigos estavam vendo as compras que fizeram no dia, então os amigos, com algumas roupas em mãos, as jogaram para cima e deram um grito uníssono. Todos estavam empolgados com o date do qual Rebeca acabara de sair.
— Conta tudoooo. — Disse Clarissa já levantando para chegar perto da amiga.
Rebeca cheia de alegria no olhar sentou na cama e começou a contar toda a experiência maravilhosa que teve mais cedo com o amigo, que nessa altura do campeonato se tornaria seu par romântico.

Rebeca já estava com os olhos pesando de sono quando contava sobre a última parte de seu primeiro encontro com Michael e como tudo havia sido perfeito. Portanto, não demorou para que caísse no sono logo depois que terminou o relato minucioso.
Clarissa havia combinado de se encontrar com o Van no dia anterior, todavia, não queria que ninguém soubesse de seu encontro noturno. Sabia que seria uma coisa passageira e preferia que os amigos não ficassem idealizando-o como seu futuro namorado, como Mariana havia feito com Harry. Por isso, esperou que eles fossem dormir para poder sair de fininho.
Todavia, seu plano foi atrasado no momento que André decidiu contar o que havia acontecido no dia anterior e que o estava afligindo desde então. Rebeca ouvia tudo já com os olhos fechados e Mariana estava atenta ao que André tinha a falar, todavia Clarissa estava mais a prestar atenção no relógio, que parecia congelado no tempo. Quando André terminou de contar, Mariana puxou um bocejo da sua cara de ansiedade e espanto ao ouvir a história do amigo.
Os amigos então decidiram ir logo dormir. Antes mesmo que André e Clarissa fossem para suas camas, Rebeca já exprimia seus baixos roncos e Mariana estava já debaixo das suas cobertas. Então os dois amigos se dirigiram ao quarto e deitaram em suas respectivas camas. Clarissa, não sabendo disfarçar o que estava tramando em segredo, nem se deu o trabalho de se cobrir com a fina coberta que tinha na cama, enquanto André se cobria e parecendo que dormia pensando sobre Omar, já que a conversa com as amigas o fez relembrar e pensar mais ainda sobre.
André conseguiu ver quando Clarissa, no escuro, começou a andar pelo quarto, mas decidiu ficar em silêncio para ver o que a amiga estava tramando. Viu quando ela pegou a bolsa no armário e quando ela esbarrou sem querer na cama da Rebeca, que, por sorte, nem se mexeu, e segurou a risada quando a ruiva segurou a perna que que havia batido no móvel. Por fim, observou Clarissa abrir a porta do quarto e sair, como se nada estivesse acontecendo.

Após Clarissa sair do quarto "secretamente", André decidiu tirar logo do peito o que estava guardando. Se descobriu até a altura das pernas, pegou seu óculos e em seguida o celular, que tinha já uma notificação de Omar. Se assustou quando viu a notificação, André iria mandar mensagem justamente para ele. Quando desbloqueou o telefone, Omar estava a tentar pedir desculpa pelo acontecimento que havia feito no dia anterior, todavia, enquanto ele digitava, André o interrompeu dizendo que aceitaria desculpas somente se fossem feitas ao vivo, o que assustou Omar, que ficou algum tempo sem digitar nada.
O que o barman não sabia era que André havia feito isso somente para ter um motivo para poder ver o menino que estava a nutrir sentimento de novo, o coração de André havia conquistado uma batalha que nem sabia que estava participando. Assustado, ele aceitou fazer o pedido de desculpas ao vivo, chamando-o para descer no bar, pois o expediente dele estava a acabar e o local estava vazio.
André se arrumou e desceu para o saguão, rindo por estar fazendo o mesmo que Clarissa, chegou na porta do bar e viu Omar limpando o balcão. Ele viu parado na porta André, que logo se dirigiu para os bancos do balcão, fazendo com que o barman, corado de vergonha, desse a volta e sentasse junto com o amigo. Os dois sentaram um de frente ao outro, e, ainda vermelho, Omar começou a falar.
— Sabe … eu to muito envergonhado com o que aconteceu… não sei porque fiz aquilo, fiz no impulso… porque desde o dia que eu te conheci, eu não te tirava da cabeça — disse olhando para baixo enquanto mexia nas suas mãos.
— Eu entendo… na verdade, se não tivesse fugido o final poderia ter sido diferente. — disse André levantando da cadeira alta do bar e ficando mais próximo ainda de Omar, que agora não estava mais entendendo.
— Como assim poderia ser… — tentou dizer ao ser interrompido por um beijo que André acabara de roubar.
Os amigos, no momento eram algo mais que amigos, se olharam um nos olhos dos outros, mostrando que o ditado popular estava certo, os olhos são as janelas da alma, e as almas dos dois expressavam no momento uma paixão que talvez nunca tivessem sentido antes. E a partir daí, surgindo um clima romântico composto por beijos e abraços apaixonantes, começaram a também conversar sobre aqueles sentimentos que haviam surgido.
Clima esse que, infelizmente, para os dois teve que acabar, quando se percebeu que Omar deveria fechar o bar e ir para casa, e André deveria voltar para o quarto antes que Clarissa voltasse e percebesse sua falta. Já na porta do hotel, os dois apaixonados se dão um beijo de despedida e, quando começam a andar em direções opostas, olham para trás com sorrisos nos rostos e corados, não mais pela vergonha, mas sim por uma paixão efervescente.

Clarissa se sentia um pouco mal de estar escondendo Van dos seus amigos, mas sabia que, quando tudo acabasse, seria melhor. Não daria falsas esperanças a eles nem a si mesma.
Van estava a esperando do lado de fora do hotel, com a jaqueta de sempre nos ombros e os cabelos molhados de quem havia acabado de tomar banho. Ele estava hospedado em um hotel a alguns metros, por isso haviam se esbarrado no primeiro dia.
— Tá bonito. — Clarissa brincou, rindo, logo depois que o abraçou. — Se arrumou todo pra me ver, né?
— Claro, tenho que estar à sua altura. — ele falou enquanto oferecia o braço para que ela entrelaçasse com o dela.
Eles caminharam juntos até a praia, que estava totalmente deserta a essa hora, e sentaram-se na areia macia.
— Hora de matar suas curiosidades, Clarissa. — ele apoiou as mãos atrás do corpo e olhou para ela. — O que quer saber sobre mim?
A menina cruzou as pernas e virou-se para ele antes de sorrir e começar:
— De onde você vem, Van McCann? O que faz na Grécia? — ela riu antes de continuar: — Por que você tá sempre tão mal humorado? Ou quase sempre. — balançou a cabeça ao se lembrar da noite da festa e da noite anterior.
— Venho de Liverpool, na Inglaterra. — ele falou. — Tenho uma banda lá, mas nós somos um fracasso. Tô na Grécia há quase um mês fingindo pra mim mesmo que tô procurando inspiração, mas acho que a verdade é que eu só queria fugir de tudo. — ele acendeu um cigarro aos olhos atentos da menina, que prestavam atenção em cada movimento que ele fazia. — Eu sou mal humorado porque percebi que essa não era a vida que eu planejava ter quando tinha 12 anos e tocava guitarra no porão dos meus avós. — ele riu sem muita vontade. — Eu queria ser um astro do rock, Clarissa. — ele a olhou e ela sentiu a dor em seus olhos. — Mas sou só mais um fracassado.
— Você não é um fracassado, Van. — Clarissa balançou a cabeça negativamente. — Você veio pra cá pra encontrar algo que tá faltando, e você vai descobrir o que é. — ela disse, segurando a mão livre do rapaz. — A sua banda pode ser uma merda, e aposto que sua voz não é muito boa. — ela riu, fazendo com que ele risse também. — Mas eu consigo ver nos seus olhos o quanto você acredita nela e o quanto você quer realizar o sonho daquela criança de 12 anos, embora você finja pra você mesmo que já desistiu. — ele a observava em silêncio. — Agora pega essa guitarra e vai escrever uma música, Van McCann. — ela falou e ele riu.
O resto da noite passou rapidamente. Os novos amigos conversaram sobre suas vidas, sobre seus sonhos, seus medos e tudo o que passava em suas cabeças naquele momento. Clarissa não sabia dizer o porquê confiava em um quase-desconhecido a ponto de falar sobre sua vida, nem o porquê de gostar tanto de ouvi-lo falar sobre a dele. Deitaram na areia, molharam os pés na água gelada do mar, correram pela praia vazia e provocaram risos e sorrisos sinceros um no outro. Quando começaram a sentir frio, porém, tiveram que voltar para o hotel.

André entrou em um dos elevadores, clicou em um botão no painel que era um andar abaixo do andar dos quartos dos amigos, então em seguida apertou o correto, vendo que iria perder tempo parando em um andar errado. E enquanto a porta do elevador fechava, uma voz masculina gritou.
— Segura a porta! — todavia André no momento não soube reagir, sendo tarde demais quando apertou o botão de abertura da porta.
No lado de fora estavam McCann e Clarissa, que não tinha ideia de que era o amigo que estava no elevador. Clarissa se despediu de seu novo amigo e entrou no elevador ao lado, apertando o botão do andar no painel.
Os elevadores chegaram ao mesmo tempo ao andar, fazendo com que, quando os dois amigos saíram, se olhassem fazendo-os ficar boquiabertos de espanto, ao perceberem que os dois foram descobertos.
— Eu já sabia que você tinha saído… nada discreta você — disse o amigo tentando tirar o dele da reta.
— Mas agora eu sei que você saiu escondidinho também … foi falar com o Omar, né, eu vi ele saindo do hotel — disse Clarissa tentando criar um acordo no estilo de Las Vegas.
— E chuto que quem pediu para eu segurar a porta foi o seu date da noite — disse André tentando jogar com a mesma moeda.
— Não é date não! Só fui falar com um amigo… mas isso não é importante, o Omar parece ter gostado da “conversa” de hoje — disse de forma sarcástica.
— Olha, tô percebendo que esse joguinho não vai a lugar nenhum, vamo fazer assim — disse André com uma expressão pensativa — Eu não conto da sua escapada e nem você da minha, e depois a gente vê como contamos para as meninas.
— Acho um acordo justo… depois falo com todo mundo sobre o McCann. — disse já se dirigindo ao quarto com o amigo.
— Então esse é o nome dele… — André disse, rindo da furada que Clarissa acabava de cometer.
Entraram no quarto silenciosamente, deram uma última olhada para si juntamente com um risinho, que terminou com os dois dormindo com os sorrisos ainda estampados no rosto.


Capítulo 11 - Fogos de artifício no céu noturno.

Pela primeira vez, todos estavam juntos na mesa do café da manhã e comiam na mesma sincronia e velocidade. Todos haviam acordado facilmente, inclusive Clarissa, o que foi uma surpresa para os amigos.
Eles estavam ainda meio sonolentos quando Gregg, o rapaz da recepção, chegou e cumprimentou a todos por alto. Ele estava com roupas normais, pois era seu dia de folga, e sentou-se em uma cadeira vaga ao lado de Mariana, dando um beijo em sua bochecha.
— Bom dia, pessoal. — ele falou, olhando para todos. — Como estão hoje? — ele perguntou, sempre simpático.
Todos responderam que estavam bem e contaram sobre como Rebeca e Michael estavam quase namorando agora.
— Hoje é meu dia de folga do hotel. — ele disse, olhando para Mariana antes de voltar a olhar para o restante da mesa. — Pensei que gostariam de fazer um passeio mais diferente.
— Claro que queremos! — disse André, animado, batendo palmas.
— Tem uma praia do outro lado da ilha que fica literalmente vazia nessa época do ano. — ele contou, sorrindo e gesticulando. — Se vocês quiserem, nós podemos acampar por lá. — sugeriu, observando a expressão dos amigos, que se entreolhavam, animados.
— Que legal, Gregg! — Rebeca disse, sorrindo, e Michael concordou ao seu lado. — Como faríamos isso?
— O hotel tem algumas barracas de camping para alugar, posso pegá-las emprestadas de graça. Já fiz isso várias vezes com meus amigos. — sorriu ao ver que todos pareciam ter gostado da ideia. — Aliás, se não se importarem, gostaria de levar uns amigos também.
— Claro que não nos importamos. — Clarissa pareceu subitamente mais interessada. — Eles estão solteiros?
Gregg riu da pergunta da menina.
— O Harry tá. — ele falou, fazendo Mariana se constranger, ao lembrar de tudo que aconteceu. — O Omar, eu não sei. — ele disse, olhando para André. — Tá?
André ficou vermelho de repente quando percebeu de quem ele estava falando. Assim que o resto dos amigos percebeu o olhar de Gregg para André e as bochechas coradas do menino, entenderam do que se tratava e começaram a rir. Clarissa até cuspiu o suco que estava bebendo.
Depois que todos terminaram de comer, subiram para os quartos para que pudessem arrumar as coisas que levariam para o acampamento. Gregg disse que seria bom saírem o mais cedo possível, pois poderiam aproveitar o dia na praia e assistir ao pôr do sol, que ele garantiu que era uma das coisas mais bonitas da ilha.
Às 10h, todos estavam dentro de uma van que levava o nome do hotel esperando que Omar chegasse. Gregg estava no banco do motorista, com uma Mariana nervosa ao seu lado, no banco do passageiro. Atrás estavam Michael e Rebeca, trocando carinhos no primeiro banco. No segundo estavam Clarissa e Harry, que não pareciam estar vivendo no presente, mas sim no passado; ela vivendo seu encontro do dia anterior ao olhar para a rua pelo vidro da van, e ele vivendo os péssimos momentos da festa ao olhar para quem estava no banco do passageiro, mas que de alguma forma o intrigavam. Enquanto André, no terceiro, esperava ansioso para que seu parceiro chegasse.
Assim que Omar chegou, dirigiu-se para o banco em que André estava e cumprimentou-o com um selinho, fazendo com que Clarissa olhasse para trás e soltasse um “hmmmmm” antes de Gregg dar partida na van.
No caminho da praia, todos conversavam e alguns trocavam beijos e carinhos, mas, no segundo banco, havia um silêncio que, movido pelo saudosismo e inquietação, fazia os dois sonharem acordados. Sonhos, ou pesadelos, esses que foram interrompidos quando Gregg não freou a tempo do quebra-mola não sinalizado, fazendo com que os dois saíssem dos banco, quase batendo a cabeça no teto da van. Então, pelo que pareceu, perceberam a presença do outro ao seu lado e começaram uma conversa, que foi interrompida pelo grito de Gregg.
— Chegamos, galera!!!
O grupo chegou, estacionou em um pequeno estacionamento que existia na entrada da praia, tiraram as coisas do bagageiro e foram andando por um caminho por dentro da restinga que os levou para uma linda praia de areia branca e água cristalina. Decidiram fazer o acampamento próximo de dois coqueiros, então começaram o longo processo da montagem das barracas, que somente acabou por volta das 14h. Logo em seguida, Harry fez uma fogueira com alguns galhos e pedras que encontrou na restinga e começaram a cozinhar o que tinham trago, pois não tinha conseguido almoçar por conta da longa viagem de 2h30.
Comeram e descansaram um pouco, pois Rebeca havia dito que não se podia entrar na água após comer pois passariam mal e o grupo não quis desobedecê-la, mesmo que estivessem super animados para entrar no mar.
Passados uns 30 minutos, o grupo foi acordado de seu descanso por André e Omar, que saíram de suas barracas correndo logo em direção ao mar. E todos, ao verem a animação dos dois, se trocaram rapidamente e foram na direção deles, que já brincavam se jogando água.
Antes que Mariana pudesse seguir os amigos, ouviu uma voz lhe chamar.
— Mariana — gritou Harry — Podemos conversar? — perguntou, fazendo com que ela engolisse em seco.
— Claro. — ela respondeu, com um meio sorriso.
Eles andaram até onde estavam penduradas as toalhas.
— Então, sobre aquele dia na festa. — ele riu meio sem graça tentando quebrar o clima. — Fiquei intrigado, e digo que até com um pouco de raiva sobre o que aconteceu, mas queria entender o porquê daquela reação. — olhou para ela, com medo da resposta.
— Ai, nem sei como me explicar.— ela procurou as palavras, com medo de magoá-lo. — Harry, escuta. — respirou fundo, decidindo que era melhor ser sincera. — Queria pedir desculpa se te passei alguma impressão de ser grossa. — ela passou a mão pelos cabelos. — Mas, como você sabe, eu tava tentando te arranjar para Clarissa… — ela riu, olhando para a ruiva que brincava na água. — Aquilo que aconteceu… Foi coisa do momento, eu infelizmente não tava pensando direito. — ela disse da maneira mais sutil que conseguiu. — Não que eu não tenha gostado, mas é que realmente eu não estava em plena consciência de meus atos — ela levantou os ombros. — Desculpa mesmo.
— Eu entendo — disse Harry com a cabeça cabisbaixa. — Nem sempre as coisas acontecem da forma que se espera — disse olhando para o mar. — Mas obrigado por me chamarem para cá, eu tava mesmo precisando esfriar a cabeça — disse tentando colocar um sorriso no próprio rosto.
— Mas ainda somos amigos, não somos? — disse batendo com o braço no amigo cabisbaixo. — Vamos curtir todos, todos juntos! — disse correndo e puxando o amigo pela mão até chegarem nas ondas de cor branca que se formavam no mar.
Na água, Rebeca mergulhava e brincava com os amigos. Nunca se sentira tão feliz em toda a sua vida. Gostaria de poder guardar esse momento em algum lugar em que ela pudesse retornar sempre e sentir a mesma sensação que estava sentindo naquele momento.
— Eu tô tão feliz. — ela disse enquanto abraçava Michael pelas costas.
— Aposto um beijo que eu tô mais. — ele disse enquanto virava-se para a garota, sorrindo radiantemente.
— Então, infelizmente, você terá de me dar um beijo, Sr. Jordan, pois é humanamente impossível superar minha felicidade.
Ele riu da menina antes de puxá-la para um beijo.
— Obrigado. — ele sussurrou quando se separaram, ainda muito próximos um do outro, de olhos fechados.
— Por te fazer perder a aposta? — ela sorriu, abraçando-o pela cintura submersa na água e encostando a testa na dele, enquanto sentia seu cheiro.
Ele sorriu.
— Por aparecer na minha vida. — ele disse antes de abrir os olhos e observar os olhos negros de Rebeca o analisando.
A menina não respondeu, apenas levantou as mãos para o pescoço do rapaz à sua frente e puxou-o para outro beijo, que falou tudo que ela não conseguiria falar.
Depois que ficaram cansados de nadar, voltaram para perto de onde estavam as barracas, onde estavam os restos da fogueira que fizeram mais cedo. O sol estava prestes a se pôr e todos se cobriram com toalhas para observar o espetáculo.
Rebeca estava deitada no colo de Michael, que penteava os cabelos molhados dela. André e Omar saíram para andar pela praia, e Mariana e Gregg estavam abraçados em uma só toalha. Clarissa e Harry riam da situação enquanto conversavam e a menina aproveitava para tirar fotos dos casais e do céu que ficava cada vez mais alaranjado.
— Que coisa mais linda. — Michael falou.
— É maravilhoso. — Mariana concordou, se aconchegando em Gregg e agradecendo mentalmente por tê-lo encontrado. — Obrigada por trazer a gente aqui. — ela falou baixo para que só ele ouvisse e beijou seu ombro descoberto.
Ele olhou para ela e sorriu, segurando seu rosto para poder beijá-la.
Quando já estava escurecendo, Harry pegou o violão que havia trago consigo e sentou ao redor da fogueira, que já estava acesa novamente. Todos cantaram músicas que gostavam, conversaram e riram muito. Clarissa não pode deixar de pensar em Van e de querer que ele estivesse ali, rindo e cantando para ela.
Os amigos cantavam uma música da banda francesa Arcadian quando Gregg e Mariana se afastaram com a desculpa de procurarem mais lenha, apesar de parecer que a fogueira ainda duraria por algumas horas.
Gregg guiou Mariana até um pequeno relevo, em que ele subiu e ajudou-a a subir.
— Consegue ver as luzes do outro lado? — ele perguntou, apontando para um brilho quase imperceptível a vários quilômetros de distância. Quando ela afirmou que sim com a cabeça, ele continuou: — É onde fica o hotel. — ele disse, com os olhos brilhando, e ela sorriu.
— Que lindo, Gregg. — ela respondeu, olhando para ele. — Você ama esse lugar, não é? — perguntou ao ver o brilho nos olhos dele.
— Mais do que qualquer outro lugar no mundo. — ele disse, sorrindo. — Eu nasci e cresci aqui, é minha casa.
— E quantas garotas já trouxe pra acampar? — ela brincou, dando um soquinho no ombro dele.
— Não vou mentir, muitas. — ele deu de ombros, soltando uma risada divertida ao ver a expressão dela. — Mas isso não altera o que eu tô sentindo agora. — ele falou antes de segurar a nuca da menina e beijá-la, passando tudo o que estava sentindo.
Ele não estava mentindo, e Mariana sentiu isso durante aquele beijo. Beijo esse que parecia ser iluminado por fogos de artifício no céu noturno.


Capítulo 12 - Eu gosto muito de você, sabia?

Omar’s P.O.V. on
Nós saímos do animado grupo que estava a aproveitar a fogueira e fomos andar por aquela bela praia, que ficava mais ainda à luz das estrelas. De mãos dadas caminhamos sobre as ondas que se desfaziam aos nossos pés. André admirava a lua que estava um pouco acima da linha do horizonte, ela estava linda, todavia eu só tinha olhares para ele.
Me admirava o fato de que eu, em pouquíssimo tempo, me apeguei a ele de tal forma que fiz aquilo no nosso primeiro “encontro”, o que me assustava de certa forma por que talvez não tivéssemos um “felizes para sempre”, e nem mesmo sabia o que havia me atraído tão fortemente a ele. Talvez ele fosse a medida certa de todas as coisas que sempre me atraíram em uma pessoa, ao mesmo tempo que aberto era um mundo novo a descobrir, que me fazia o querer mais e mais.
Enquanto André ria depois de ele mesmo fazer uma piada sobre terraplanistas, eu percebi que um pouco mais a frente havia uma espécie de grande pedra que adentrava sobre o mar e que em seu final havia um declive, formado pelo atrito com as ondas. Mas antes que eu pudesse expressar minha ideia…
— Olha aquela pedra, será que a gente consegue ir até o final dela? — André disse ao me olhar com uma grande expressão de animação.
— Eu ia falar a mesma coisa!!! Acho que conseguimos, sim! — disse ao perceber que eu e ele tivemos a mesma ideia.
Ainda de mãos dadas, andamos cuidadosamente pelo caminho molhado que levava até a ponta da pedra e, ao chegar no final, sentamos, podendo sentir os respingos das ondas que levemente batiam na pedra.
Começamos a conversar sobre diversos assuntos, enquanto trocamos carinhos e toques, sendo interrompidos por uma onda, que agora veio com mais força, fazendo com que André em um susto me abraçasse com toda sua força. Mesmo que tenha sido aplicado muita força nesse abraço, eu me sentia seguro entre os braços dele, e ironicamente, ele procurava segurança me abraçando, porém fui eu que me senti assim.
Agora, em silêncio, observávamos as ondas e ouvíamos o calmo barulho que soava ao se chocar com o paredão. Encostei minha cabeça no seu ombro, fechei os olhos e imaginei um futuro. Nesse futuro, eu e ele estávamos em Paris, minha cidade natal, caminhando em direção à Universidade de Sorbonne, onde íamos apresentar uma palestra falando sobre Marxismo e Antropologia, tudo isso acompanhado pelo som das folhas do outono no chão e daquele calmo mar.
Acordei daquele sonho, por conta dele, que estava a falar sobre a Segunda República Francesa, e não percebia o meu silêncio. Esse assunto realmente animava ele de uma tal forma que tudo ao redor parava.
— Já que estamos falando da França, eu nunca lhe contei o porquê de eu estar trabalhando aqui na Grécia e não na meu país natal. — disse interrompendo, infelizmente, a palestra que estava a dar.
— Realmente! Eu sempre dei como algo natural, as pessoas se movimentam muito dentro da Europa, mas agora que você disse, imagino que não seja algo tão natural assim. — ele disse frisando as sobrancelhas.
— Vim pra cá tem um ano e meio, porque, quando eu terminei a faculdade, comecei a sentir um vazio em mim, que se expandiu para minha visão da cidade e de meus amigos. Então, surgiu uma oportunidade para que eu viesse para cá e pudesse ter um recomeço. — disse agora tirando minha cabeça de seu ombro e o olhando nos olhos. — Todavia, eu fiz isso meio que sem avisar ninguém muito bem. Estava mal e precisava de um reinício só meu, o que talvez tenha sido um erro. O que fez com meus amigos parassem de falar comigo, por que no início eu também não os respondia, e neste momento não tenho coragem de voltar atrás nas minhas atitudes e nem mesmo de voltar a Paris, mesmo que eu tenha consigo resolver tudo que me fazia mal. — disse, o abraçando.
— Imagino que realmente seja uma situação péssima, sentir como se uma parte de você faltasse e com ela as únicas pessoas que podiam te ajudar. Mas você pode ter certeza que pelo menos uma pessoa você tem, eu... — ele disse, diminuindo a voz ao chegar no final da frase, pouco, mas entendia que aquele pouco era sincero, pois pelo que conhecia dele sabia que não se dava bem em situações assim.
— Eu queria voltar logo para Paris e para meus amigos, mas tenho medo. Medo de fazer isso e acabar sozinho novamente. Quando cheguei aqui, fiquei logo amigo do Gregg e do Harry, e os dois sempre me apoiaram a voltar, mas eu sabia que ele não me acompanhariam nessa jornada de volta, não pelo menos fisicamente. — disse com os olhos agora cheios d'água.
— Hmmmm… eu poderia te acompanhar, falando a verdade. Sei que desde de quando nos conhecemos tivemos uma conexão forte, que me fez achar algo que nem sabia que estava a procurar. E teoricamente, mês que vem eu vou para Paris, resolver coisas para minha pesquisa, vou para lá passar um mês. Se você conseguir esperar, eu lhe acompanho. — disse André com timidez no olhar.
— Eu iria adorar! Eu precisaria muito desse apoio, e eu poderia aguentar mais algumas semanas para poder te esperar. Nossa conexão realmente foi mais forte do que eu imaginaria e acho que não conseguiria sem você. — disse com uma lágrima que cai em meu rosto. Lágrima essa que era de felicidade ou tristeza? Eu não sabia, mas sei que era de emoção.
— E além do mais, eu ficaria lisonjeado de descobrir Paris junto com você! De conhecer seus amigos, que diria que não te esqueceram, porque é impossível esquecer uma pessoa tão especial como você. — disse ele, me dando um beijo caloroso.
— Sim, poderia te levar nas minhas festas preferidas da cidade! E poderia te mostrar meus amigos mesmo, você iria amar o Tom, ele também é historiador como você e ele… — disse sendo interrompido por André.
— Não quero que me conte por dois motivos: primeiro, nossos amigos devem estar esperando por nós, disseram que iam assar marshmallows; segundo, já vou o conhecer pessoalmente… — disse levantando e me dando a mão para poder levantar também.
Demos um abraço e um beijo caloroso e eu disse:
— Eu gosto muito de você, sabia? — andei em direção a areia da praia, segurando a mão de André.
Depois daquele momento de extrema emoção, saímos da grande pedra e fomos ao caminho dos nossos amigos, que ainda estavam a cantar e conversar em volta da fogueira. Quando Clarissa viu seu amigo vir, gritou em ânimo levantado um saco grande em nossa direção.
— Vêm, vocês dois, a gente tava esperando! Vamos assar marshmallows agora!!! — fazendo com que André corresse em direção à grande fogueira que era supervisionada por Harry.
Omar’s P.O.V. off

Van’s P.O.V. on
Acordei tarde. Tinha demorado a dormir na noite anterior, não conseguia parar de pensar no que Clarissa havia me falado. Cada palavra, cada história e cada risada que saíram da boca dela estavam literalmente impregnadas no fundo do meu cérebro, como uma tatuagem. Minha cabeça girou em torno dela a noite inteira e, quando finalmente consegui dormir, sonhei com ela e com tudo que ela havia dito.
No sonho, ela cantava para mim, e, assim que abri os olhos, a melodia e a voz dela ainda estavam completamente nítidas na minha mente. Levantei mais rápido do que já havia levantado em toda a minha vida, esbarrando nos móveis e tropeçando em roupas espalhadas pelo chão. Antes que pudesse fazer qualquer coisa, rumei em direção ao violão que estava encostado na cômoda branca do quarto. Sentei no chão mesmo, com o violão sobre o colo, e afinei-o rapidamente antes de passar a melodia da minha cabeça para as cordas do instrumento.
Fazia mais de seis meses que eu não compunha uma música. Fazia mais de seis meses que eu não possuía nenhum tipo de inspiração, não só para composições, mas para a vida. Eu estava desistindo. Na verdade, eu já havia desistido antes que Clarissa aparecesse. A Grécia era a última chance que eu estava dando a mim mesmo, e, depois de um mês sem nada, eu não tinha mais esperanças. Até que ela surgiu literalmente como uma luz no fim do túnel escuro que minha vida estava se tornando. Eu soube disso desde o primeiro dia que ouvi sua risada enquanto ela me pedia desculpa por ter esbarrado em mim na rua. Eu soube quando vi seus olhos castanhos me encarando curiosos, mesmo depois de eu ter esbravejado contra ela. Soube que aqueles olhos, naquele momento, procuravam me enxergar de verdade enquanto eu nem ao menos tentava.
Confirmei isso com as fotos que ela havia tirado de mim. Através da lente dela, eu enxerguei um Van que nunca tinha enxergado antes, que estava escondido dentro de mim. Um Van que conseguia se conectar às pessoas apesar de todas as barreiras que tentava impor, e que despertou interesse, apesar da cara fechada e da jaqueta de couro, em alguém como Clarissa.
Não conseguia conter minha felicidade enquanto meus dedos trilhavam pelas cordas. Para alguém que sempre viveu de música, desde os quatro anos de idade, e sonhava mais do que tudo em ser um astro do rock aos doze, ficar seis meses sem produzir nada era quase uma eternidade. Então não estranhei quando algumas lágrimas molharam meu rosto à medida que eu ia anotando, num papel que havia achado em cima da cômoda, as notas que formavam a melodia que Clarissa cantava para mim no sonho.
Sol maior, Dó maior, Mi menor, Si maior com sétima♩♪♫♬.
Meus pelos se eriçaram assim que as notas escritas no papel amassado à minha frente saíam livremente do meu violão. Era isso.
Embora ainda não tivesse a letra, eu sabia exatamente sobre o que minha primeira música pós-quase-desistência seria.

Já era noite quando deixei meu quarto, com o violão pendurado no ombro e indo em direção à razão de tudo aquilo com o sorriso mais largo que meu rosto já tinha sustentado. A música estava pronta. Minha primeira música depois de seis meses estava pronta e era linda, modéstia à parte, graças a Clarissa.
Cheguei animado à recepção do hotel em que ela estava hospedada e logo falei o número de seu quarto, preparado para subir e lhe mostrar o que ela havia me feito fazer. A moça de cabelos cacheados atrás do balcão ligou no apartamento três vezes, e ainda arriscou uma quarta com pena de mim, mas ninguém atendeu.
Ela deveria ter saído com os amigos. Ainda esperei na recepção por umas duas horas, sentado em um sofá e recebendo o olhar de pena da recepcionista quando me levantava toda vez que alguém chegava pela porta de entrada, mas ela não voltou.
À meia noite, eu rumei de volta para o meu hotel um pouco decepcionado, por não ter mostrado para ela o que as palavras da noite anterior me provocaram e que eu estava de volta à ativa graças a ela, mas carregando ainda uma profunda felicidade dentro do peito e esperando ansiosamente para vê-la no dia seguinte, o mais cedo possível.
Eu precisava que ela soubesse, através da música que ela me tinha inspirado, tudo o que eu estava sentindo e o quanto ela estava sendo importante para mim, apesar de ter a conhecido em tão pouco tempo.
Eu esperava, mais do que tudo, que ela não fugisse de mim.
Van’s P.O.V. off


Capítulo 13 - Eu amo você, Clarissa

Assim que todos estavam de volta à fogueira, a conversa durou mais algum tempo até que os amigos começassem a sentir o sono de um dia agitado começar a bater. Surpreendentemente, não foi Rebeca a primeira a se retirar, e sim Clarissa, alegando estar cansada de conversar por ter cantado muito com Harry mais cedo.
Não demorou muito para que os outros fossem para as barracas também. Eram duas, cada uma comportava até três pessoas. A ideia, inicialmente, era que as meninas ficassem em uma e os meninos em outra, mas, quando Mariana e Gregg entraram se beijando na barraca vazia, os restantes decidiram que era melhor se encolherem junto de Clarissa na barraca ao lado.
A noite foi boa para Gregg, Mariana e Clarissa. Os dois primeiros por dormirem abraçados e confortáveis, e a última por não ter nada que realmente a impedisse de dormir, nem mesmo as cotoveladas que recebia de André.
Todos, menos os três mencionados, acordaram muito cansados no dia seguinte, com partes do corpo doendo e se arrependendo de terem deixado Gregg e Mariana terem seu momento a sós.
— Mariana, você me deve sessões ilimitadas de massagem pro resto da vida. — Rebeca falou assim que avistou a amiga toda sorridente no dia seguinte.
— Claro, meu amor. — ela beijou a bochecha de Rebeca, que estranhou.
— Pelo jeito a noite foi boa mesmo. — André riu, fazendo Michael e Clarissa rirem também e Mariana corar.

Já eram 10h quando o grupo finalmente chegou na cidade. O café da manhã já tinha sido parado de servir, todavia Gregg conseguiu que algumas coisas que sobraram fossem levadas para os quartos, já que não tinham comido muito quando acordaram de manhã.
Entraram nos quartos e se acomodaram. Já comendo a comida que havia chegado, conversavam sentados nas camas de André e Clarissa, até que o telefone de Clarissa tocou.
Assim que olhou o aparelho, sua risada cessou e ela ficou séria de repente. Os amigos estavam muito animados conversando sobre todos os acontecimentos da noite anterior e colocando em dia todas as fofocas, então não perceberam a mudança repentina no humor da ruiva.
— Preciso atender. — ela forçou um sorriso, balançando o celular mas escondendo o chamador. — Já volto. — falou antes de calçar os chinelos, que estavam na beirada da cama, e sair rapidamente do quarto.
No corredor, de pijamas, Clarissa respirou fundo antes de colocar o telefone no ouvido. Não precisava estar fazendo isso, mas seu coração era mole demais para que recusasse a ligação.
— Oi. — ela falou baixo.
Clarissa! — a voz do outro lado, que ela conhecia muito bem, respondeu. — Graças a Deus você atendeu, estou tentando falar com você faz dias. Seu celular pifou de novo? — ele perguntou, falando normalmente como se nada tivesse acontecido desde a última vez que se encontraram.
— Não. — ela respondeu, seca. — Não estou no Brasil, por isso não consegue ligar pra mim sem ser pelo Whatsapp.
Quando ia me contar que está na Grécia? — ele perguntou e Clarissa arregalou os olhos. — Liguei na sua casa, sua irmã me disse. — silêncio.
Clarissa iria ter uma boa conversa com a irmã assim que voltasse. Não se passavam informações como essas por telefone, principalmente para ex-namorados.
Bem, tudo bem, não precisava me contar. — ele continuou, vendo que ela não falaria nada. — Só quero que você saiba que estou com saudades. — sua voz ficou doce de repente, como sempre ficava quando ele queria alguma coisa. — Logo que voltar, vamos conversar, está bem? — Clarissa revirou os olhos involuntariamente. — Tenho muitas coisas pra te contar, quem sabe possamos nos resolver, hein?
— Daniel, eu… — a menina começou, já com os olhos marejados e o nariz ardendo, mas foi interrompida por seu interlocutor.
Eu amo você, Clarissa. — ele disse, fazendo com que uma lágrima solitária escapasse de um dos olhos da garota. — Estou com saudades, espero que fique bem. — ele disse antes de desligar.
Assim que ouviu a linha voltar a chamar, anunciando o fim da ligação, Clarissa jogou o celular no piso de carpete do corredor num impulso. Espero que fique bem.
Ela tentou rir, mas mais lágrimas começaram a preencher seu rosto e ela teve que aceitá-las. Ela sabia que ele fazia de propósito. Agora mesmo, deitado em sua cama, ele deveria estar rindo ao imaginar a situação em que Clarissa estaria, a situação que ele sabia que conseguia provocar na garota com um simples “Estou com saudades” ou um falso “Amo você”. Daniel sabia perfeitamente que a garota não ficaria nada bem depois de ouvir sua voz doce falar tais coisas. E ele adorava ter controle sobre isso.
Clarissa sentiu vontade de gritar. Sentiu vontade de dar um grito tão alto que Daniel conseguisse ouvir no Brasil e percebesse o quão mal ele estava a fazendo. Não era justo. Não era justo ele sempre sair como o bonzinho que ainda estava apaixonado, sendo que eles dois sabiam muito bem que ele não estava, e Clarissa sair sempre como a vilã que ainda parte seu coração depois de tanto tempo separados.
Era sempre assim. Depois de algum tempo distantes, ele sempre voltava, com a mesma história e com as mesmas palavras. E Clarissa sempre se derretia ao ouvir a voz dele prometendo que dessa vez iria ser diferente. Nunca era. E era sempre ela que chorava toda vez que dava errado de novo, e, quando ela não aguentava mais chorar e decidia que era melhor se afastarem novamente, era sempre ele que saía como o coitadinho da história.
Clarissa estava cansada. Enquanto pegava o celular que jogara no chão, conseguia ouvir seu coração pulsando rapidamente. Estava sentindo duas coisas: 1) o que sempre sentia quando algo do tipo acontecia; uma dorzinha lá no fundo do peito que a lembrava de todos os bons momentos que tiveram e uma vozinha no fundo da cabeça, ancorada na nostalgia, que dizia “e se realmente der certo dessa vez?”; e 2) um profundo ódio; de Daniel, por conhecê-lo muito bem a ponto de saber que ele estava mentindo e que ele mentia muito bem, e de si mesma, por sempre cair na dele e sempre se deixar levar pelo efeito (vide 1) que ele causava nela.
Com esses pensamentos na cabeça e certa de que precisava respirar ar fresco antes que passasse mal, Clarissa chamou o elevador e desceu até a recepção, de pijamas e com o rosto banhado em lágrimas.
Absolutamente não queria falar sobre o assunto nem responder perguntas sobre seu estado emocional, e sabia que, para isso, os amigos não poderiam nem sonhar em vê-la naquele estado. Não esperava, porém, que Van McCann estivesse no seu hotel, de costas para ela e de frente para o balcão, provavelmente ligando naquele exato momento para o quarto onde os amigos, que não faziam ideia da existência dele, iriam atender o telefone.
Clarissa xingou baixo antes de virar-se rapidamente de volta para o elevador e tentar apressadamente não ser vista por McCann, mas escutou a voz dele atrás de si logo que deu o primeiro passo.
— Clarissa! — ele chamou de longe e a garota não teve coragem de virar, mas sentia cada vez mais ele se aproximando de onde ela estava, imóvel. — Liguei agora mesmo pro seu quarto, uma menina atendeu e disse que você tinha acabado de sair. — ele estava rindo e Clarissa chorou mais ainda silenciosamente por não poder retribuir a seu humor. — Pela voz, chuto que tenha sido Mariana. — ele brincou, mesmo não a conhecendo pessoalmente. — Por que está de pijamas? — ele perguntou, rindo, e tocou os ombros da menina para que ela se virasse.
Ela secou as bochechas inutilmente com as palmas das mãos antes de encará-lo, sem conseguir fingir um sorriso no rosto completamente inchado. A expressão de Van mudou completamente em questão de segundos. Ela ainda conseguiu ver o sorriso radiante dele antes que sua expressão fosse tomada pela preocupação.
— Clarissa, o que houve? — ele perguntou, sério, com as mãos ainda nos ombros dela e tentando procurar alguma explicação.
— Nada, Van, estou bem. — ela respondeu, seca, tirando as mãos dele de seu ombro.
Clarissa tinha um grande problema. Era muito difícil para ela compartilhar o que estava sentindo. Odiava que os outros ficassem preocupados por sua causa e detestava quando seu humor mudava o humor dos outros, especialmente quando eles estavam felizes. Ela sempre queria fazer todos ao seu redor rirem e se esforçava ao máximo para isso todos os dias, mas, quando algo a incomodava e ela se sentia mal, a menina se trancava e ficava sozinha até que o sentimento passasse. Não gostava que os outros soubessem que ela estava triste, não gostava de dividir sua dor e realmente não sabia como se expressar nesses momentos.
— Você não está bem, Clarissa. — Van abaixou-se para olhar melhor nos olhos dela, que ainda estavam marejados. — O que aconteceu? — ele insistiu.
— Não aconteceu nada, Van. — ela disse, ríspida, balançando a cabeça e tentando desviar os olhos dos dele.
— Ei, calma, eu só quero ajudar. — ele falou, calmo, voltando as mãos para os ombros dela e deixando um carinho ali.
— Eu não quero ajuda, Van! — ela falou um pouco mais alto, atraindo alguns olhares de quem estava por perto.
A respiração de Van falhou e seu nariz ardeu. Sentiu como se tivesse recebido um soco na boca do estômago e queria vomitar enquanto sentia um choro subir-lhe pela garganta. Clarissa não queria ajuda. Seu coração parecia bater mais fraco enquanto cenas dos dois na praia passavam em sua mente, a risada de Clarissa, as histórias que ela contou, o jeito que ela havia falado com ele e como havia o olhado, o quanto haviam se divertido e o sorrisos verdadeiros que ele não dava há tanto tempo. Foi tudo coisa da cabeça dele? Era o que ele sinceramente pensava enquanto procurava pelos olhos da garota, que fugiam dos seus.
Certamente tudo isso não tinha significado a mesma coisa para ela, ele pensava e segurava o choro enquanto lembrava do sonho que havia tido na noite anterior e na música que havia composto, nas emoções tão intensas que havia sentido e que jurava que ela havia sentido também. Mas parecia que não.
Podia ser um sinal. Talvez ele devesse desistir de tudo mesmo.
— Só… me deixa, tá? — a voz dela falhou enquanto ela tirava novamente as mãos dele de seu ombro.
Ele levantou as mãos, como se mostrasse que não queria a ofender e pedisse desculpas, e andou alguns passos para trás, ainda de frente para ela. Ele queria falar alguma coisa, mas sua voz ficou presa no choro entalado em sua garganta e ele apenas trouxe a capa do violão que estava pendurada em suas costas para frente, abrindo um bolso externo e tirando de lá um papel amassado.
Só agora Clarissa parecia perceber o instrumento enorme que Van carregava e passou a observar atenta suas ações enquanto ele voltava a se aproximar calmamente, retornando o violão para as costas e segurando o papel em frente a ela, balançando-o algumas vezes até que ela entendesse que deveria pegá-lo.
Assim que a mão gelada da garota tocou no papel bege, ele o soltou, virando de costas para ela sem dizer nenhuma palavra e andando pela recepção até sair pela porta principal.
Clarissa segurou firme o papel em suas mãos e retornou a chorar. Mas não por Daniel, nem se lembrava mais dele naquele momento. E sim pelo amigo que sabia que tinha acabado de perder.


Capítulo 14 - Eu e quantas mais?

Gregg's P.O.V. on
Acordei e eram por volta de umas 15 horas da tarde, e hoje haveria um encontro duplo que Mariana havia pensando. Eu tinha que me arrumar para poder ir ao restaurante para poder ver se conseguia reservar uma mesa pra nós quatro, pois a ideia surgiu muito tarde para fazer uma reserva normal. Eu teria que contactar alguns contatos, e isso tinha que ser ao vivo.
Passados alguns minutos, finalmente me arrumei e fui em direção ao restaurante, que na verdade era uma espécie de bar gourmet que eu ia constantemente, sendo minha arma secreta para conseguir uma reserva para o mesmo dia. Entretanto, não foi essa saga que mais me interessou nesse dia, o que mais me atiçou foi, na verdade, meus pensamentos durante a ida ao bar.
Enquanto andava em direção ao bar, eu só conseguia pensar na Mariana e isso não era comum de eu sentir. E era isso que me angustiava, eu em um período de duas semanas sai com várias garotas, mas só sinto isso com ela, e o que me deixava mais angustiado ainda era que eu não sabia direito o que estava sentindo. Pensar em uma pessoa desde o momento que você acorda até a hora de dormir, ver uma pessoa e sentir um calor no peito, sorrir sempre que ela vem à sua mente, isso é estar apaixonado? Possivelmente eu estava sim, mas eu relutava em aceitar a realidade.
Mariana tinha um jeito único de ser, ela consegue fazer qualquer um rir, mesmo no momento mais triste, com sua voz doce e meiga. E seu abraço consegue me levar às nuvens com o jeito que ela me envolve em seus braços, com o jeito que ela toca no meu rosto com suas mãos suaves e macias, que mesmo quando estão frias aquecem meu resto. E era tudo isso que me atraia a ela, o sorriso que está no meu rosto dizia por si só, era como se ela estivesse comigo naquele momento a segurar minha mão.
Cheguei no restaurante, era Manon que estava atendendo os clientes que chegavam, eu já a conhecia bem, das vezes que vim sozinho beber durante o happy hour. Depois de conversar com ela por algum tempo, ela me arranjou uma reserva de uma mesa que os antigos clientes cancelaram de última hora.
Assim, terminado a missão principal, voltei para o hotel para poder descansar um pouquinho mais e me arrumar devidamente para o encontro. Cheguei no quarto e logo me deitei na cama com um sorriso no rosto e depois de alguns minutos caí no sono, que foi interrompido com uma ligação de Mariana.
— Já está pronto, Gregg??? — disse antes mesmo de dizer oi.
— Eu? To pronto… quase pronto — disse ainda com os olhos fechados.
— Gregg, eu sei pela sua voz que você tava dormindo até esse exato momento. — disse com uma confiança estampada em sua voz.
— Você me pegou… tava dormindo mesmo — disse com uma voz em tom baixo por vergonha.
— Você tem meia hora pra se arrumar, bobão — ela disse rindo.
— Então, até, e se prepare que você vai ficar de queixo caído quando me ver. — disse rindo.
Quando Mariana encerrou a ligação, eu corri em direção ao banheiro para tomar um banho rápido. Em seguida coloquei a minha melhor roupa e, faltando cinco minutos para o horário combinado com Mariana, desci para o saguão, onde nos encontramos todos.
Pegamos um táxi e fomos em direção ao restaurante. Enquanto saíamos do táxi, percebi o quão linda estava Mariana, era uma visão quase angelical que me hipnotizava, quase me fazendo ignorar o aceno que Manon me dava ao me ver chegando. Sentamos em uma mesa encostada em uma parede e durante nossa conversa que fluía, olhávamos o cardápio para ver o que pedíamos.
As bebidas e comida chegaram e estavam tão deliciosas que nós estufamos por ter comido cada grama de comida que foi nos servido, mas o delicioso gosto que ficou em nossas bocas pedia por mais. Assim, nos olhamos e vimos quem seria a pessoa que daria a ideia de pedir uma sobremesa.
— Então a gente pede uma sobremesa ou vamos pedir a conta logo? — disse Rebeca pensando em uma sobremesa específica que tinha visto no cardápio.
— Acho que podemos sim, o que de mal pode acontecer se a gente ficar um pouquinho a mais e comermos um pouquinho a mais também. — disse Mariana, chamando a garçonete com um acenar de mão.
Gregg's P.O.V. off

Os dois casais estavam em um clima agradável até a chegada da sobremesa.
— Nossa, eu amo pudim! — Rebeca falou, animada, olhando para seu prato, e logo depois uma onda de tristeza pareceu tomar conta dela e de sua expressão. — Eu costumo fazer muito em casa. — e abaixou a cabeça, atraindo olhares preocupados de todos na mesa. — No Brasil.
Com o suspiro que Rebeca deu no fim da frase, o clima, antes alegre, se tornou um pouco pesado. Mariana passou a brincar com o garfo, mexendo em seu cheesecake, para não ter que encarar Gregg, e a expressão de Michael rapidamente mudou. Ele sabia o que a garota estava querendo dizer com isso. Já havia jogado verde no encontro deles e agora isso. Suspirou alto, fazendo Rebeca revirar os olhos visivelmente.
Gregg, por sua vez, estava com a cabeça em outro lugar. Seus pensamentos estavam confusos e ele preferiu ficar quieto para não acabar dizendo alguma besteira sem querer. Mariana sentiu o clima pesado entre Rebeca e Michael e decidiu fazer uma piada para quebrar o gelo, mas, antes que pudesse abrir a boca, foi interrompida por uma mulher esbelta que se aproximava da mesa.
— Gregg! — a moça disse, abaixando-se rapidamente e cumprimentando-o com um beijo caloroso na bochecha.
Mariana arregalou os olhos. Não conhecia muito sobre europeus, mas sabia muito bem que eles não costumavam ter esse tipo de contato a menos que…
— Emma! — ele respondeu, levantando-se para abraçá-la dignamente. — Pessoal, essa é a Emma, está hospedada no hotel também. — disse e Mariana juntou os olhos, tentando entender a relação entre eles. — Esses são Michael, Rebeca e Mariana. — apontou para os amigos sentados. — São do Brasil, Estados Unidos e… — apontou para Michael, sem se lembrar de onde ele vinha.
— Canadá. — ele falou mais alto do que se esperava, olhando diretamente para Rebeca, como uma resposta para a fala dela de alguns segundos antes.
— Que legal! — Emma disse, sorrindo bastante. — Está mostrando a ilha pra eles também, huh? — e piscou para Gregg, que ficou sem graça momentaneamente.
Mariana analisava cada ação e cada reação entre eles. As palavras não ditas são aquelas que esclarecem mais, e o jeito como a tal de Emma olhava para Gregg esclarecia muita coisa.
— Foi muito legal na quinta. — ela disse de uma forma convidativa e Mariana soltou o garfo no prato, o que gerou um barulho estridente que fez Gregg se virar, dando de cara com uma Mariana de braços cruzados e uma cara que dizia “me explique isso, por favor”. — Fiquei esperando você me ligar, mas… — ela deu de ombros, balançando a cabeça. — Quando podemos sair de novo?
Mariana não acreditava no que estava ouvindo e vendo, mas, sim, estava ouvindo e vendo tudo muito bem. Gregg intercalava o olhar entre Emma e Mariana e não sabia o que falar ou para quem falar. Queria que um buraco abrisse debaixo de seus pés e ele pudesse sair dali naquela hora, sem que ninguém se lembrasse dele. Até o dia seguinte, claro, porque no dia seguinte ele gostaria de receber uma ligação de Mariana ou um beijo ou qualquer coisa que ela quisesse lhe oferecer.
— Olha, Emma, eu… — ele começou, envergonhado, sentindo-se pressionado entre duas paredes, mas tendo a certeza que não queria decepcionar Mariana.
— Qual é, Gregg. — ela passou a mão pelo braço dele, fazendo um carinho. — Volto pra Alemanha na segunda.
Antes que Gregg pudesse responder, Mariana levantou-se da cadeira onde estava sentada e passou pelos dois com a cara emburrada, saindo pela porta principal do estabelecimento. Rebeca deixou uma nota de 50 euros em cima da mesa antes de levantar e ir atrás da amiga, sem nem olhar para Michael.
Gregg explicou a situação para Emma, que ficou triste mas entendeu, e pagou rapidamente a conta antes de correr e pegar o primeiro táxi para o hotel. Ainda conseguiu alcançar Mariana no saguão, ela estava esperando pelos elevadores com Rebeca e virou de costas para ele assim que o viu, apertando mais vezes o botão do elevador cada vez com mais força, como se isso fosse fazer com que ele chegasse mais rápido.
Gregg agradeceu mentalmente o elevador antes de correr até elas.
— Mariana, me escuta, por favor. — ele pediu quando chegou perto dela.
— Escutei bastante no restaurante. — ela falou, ainda de costas.
Sua voz estava embargada, como de alguém que havia acabado de chorar ou estava prestes a isso, e Gregg se sentiu péssimo.
— Sim, foi péssimo, mas você não sabe que é você que tem estado na minha cabeça durante o dia todo nesses últimos dias. — ele disse, sincero.
Ela soltou uma risada sarcástica, se virando para ele finalmente, com os olhos marejados.
— Eu e quantas mais? — ela perguntou e Gregg balançou a cabeça negativamente. — É algum tipo de ritual? Pegar mulheres estrangeiras que se hospedam no seu hotel? — cruzou os braços. — Aposto até que você tem uma lista.
— Só você, Mariana. — ele disse, tentando colocar a mão no rosto dela, mas ela desviou. — Desde que eu acordo até quando vou dormir, eu fico pensando em você e pedindo mentalmente que você apareça no saguão só pra eu poder te ver.
O elevador se abriu nessa hora, fazendo com que Rebeca entrasse e Mariana olhasse para ela antes de olhar novamente para Gregg.
— Gregg, você pode sair com quantas garotas você quiser. — ela disse, as lágrimas começando a aparecer novamente. — Mas não mente pra mim. — falou antes de entrar no elevador. — Isso machuca.
Foi a última coisa que Gregg ouviu antes que o elevador fechasse em sua frente e ele se sentisse o cara mais estúpido da face da terra.


Capítulo 15 - Pudins foram banidos

Michael's P.O.V. on
Já faz duas horas desde que voltei do desastroso encontro, no qual fui deixado para trás, e de que me joguei nessa cama de hotel, que talvez, devido aos recentes acontecimentos combinados com minha ansiedade, mais parece com um chão frio de uma vala qualquer.
Por que, caro leitor/Deus/universo/seres mágicos de outra dimensão, tudo teve que terminar daquele jeito? Querer que o precioso tempo que ainda me resta com a Rebeca seja o mais perfeito do mundo é pedir demais? Necessitava trazer à tona discussões, teoricamente simples ao meu ver, justo no nosso segundo encontro? Encontro esse, para piorar, que possivelmente foi o nosso último em um longo período de tempo!!! Falando nisso, pudins foram banidos da minha dieta por tempo indeterminado. Como uma simples e doce sobremesa consegue desencadear tantos atritos?
Do nada, meu inquérito às forças sobrenaturais é interrompido por meu telefone, que insistentemente toca anunciando uma nova chamada. Relutante, me arrasto até a outra extremidade da cama de casal para ver quem em sã consciência pagaria por uma ligação internacional. Ao ver o nome que pisca na tela, solto um pequeno suspiro acompanhado de um leve sorriso. Só ela mesmo para me aprontar uma dessas.
— A que devo a honra de receber essa caríssima ligação, Κυρία Μητέρα?
— Sabe como é, quando seu único filho viaja para o outro lado do mundo e nem mesmo uma mensagem envia falando como está, misteriosamente a conta de ligações DDI se torna irrelevante… — e com essa deixa entro em uma crise de risos que logo é seguida por uma muito similar a minha, só que mais feminina — … Custava ter entrado em contato pelo menos uma vez? Umazinha? Em consideração com a sua idosa mãe? — e lá vamos nós com a DramaQueen.
— Primeiramente, minha amada mãe, uma mulher estonteante como a senhora jamais poderia ser considerada uma idosa, no máximo uma quarentona muito conservada. Em segundo lugar, desculpa — suspiro —, estive tão ocupado nos últimos dias que me esqueci de falar com você. Mas antes tarde do que nunca, não é mesmo?
— Michael B Jordan, cada dia que passa acredito mais e mais que, de crescido, você só tem na altura. Como você pode se esquecer assim de entrar em contato com a sua família? Pelo amor de Deus, o que de tão interessante tem aí na Grécia que lhe fez esquecer de ligar para a própria mãe? Em? Vai ter que ser um motivo muito bom, mocinho, porque senão…
— Então, digamos que eu conheci alguém…
E assim contei tudo para minha mãe, que, além de ser minha genitora, meu exemplo de integridade e ídola, também é minha melhor amiga e minha confidente. Relatei desde o meu embarque até o terrível jantar de algumas horas atrás nos mais meticulosos detalhes. Contei sobre como a Beca era aos meus olhos e, principalmente, sobre o tema da nossa grande divergência. Até que de repente sou surpreendido por uma pergunta que, embora esperável, levei tempo para digerir.:
— Meu bem, até que ponto você está disposto a ir nesse envolvimento? Ou melhor, até que ponto, do pouco que você conhece essa garota, você acha que ela aceitaria para estar com você?
— Como assim, mãe? O que a senhora quer dizer com isso?
— Michael, por tudo que ouvi até agora, consigo sentir o quanto você se apegou a essa menina e, se ela conseguir ser metade de como a descreveu, tenho certeza que seja uma pessoa adorável. Mas será que vocês estão dispostos realmente a entrar em um relacionamento à distância?
Gostaria muito de dizê-los que a teria respondido com toda a confiança do mundo que sim e que assim terminamos nossa ligação, felizes da vida por enfim termos colocado o papo em dia. Contudo não seria sincero da minha parte se o dissesse. Em verdade fiquei quieto por tanto tempo que minha mãe decidiu encerrar a ligação com um simples “eu te amo e tudo dará certo”, terminando assim nosso primeiro contato em uma semana.
Após tudo isso, e com a cabeça cheia com as coisas que aconteceram nas últimas horas, acomodei-me em minha cama buscando a melhor posição possível para finalmente repousar um pouco depois desse caótico dia. Entretanto, fiquei acordado até às 1h da manhã ruminando toda a conversa que tive com minha mãe e sempre chegando a uma mesma resposta para sua pergunta: eu iria até o inferno para continuar meu relacionamento, mas será que ela estaria disposta fazer o mesmo por mim?

No dia seguinte, acordei às 3h da manhã por insônia, assim me dando algumas horas a mais para continuar a minha mais nova modalidade de tortura particular: até que ponto meu relacionamento com a Rebeca é o só um amor de verão para ela ou não.
Que eu a amo, não possuo dúvidas. Sei que para muitos seria loucura se entregar tanto a um relacionamento de menos de uma semana de existência, mas por ela eu quero correr esse risco. Suas falas, andares, jeitos, posicionamentos, o seu eu como inteiro me atrai e me faz ficar viciado em sua existência. Não sei se é porque nunca antes fui alvo de tanto carinho por pessoa alheia à minha família, mas sua mera presença ao meu lado conseguiu tornar os dias mais belos e emocionantes. Agora, será que ela sente o mesmo por mim?
E, com esses pensamentos, me arrumo e desço até o andar do café da manhã, onde, como sempre, sou o primeiro a chegar e a guardar a mesa para o grupo. Mais ou menos meia hora depois de me sentar, vejo o quarteto se aproximar do hall de entrada, tendo o André como o único a emanar animação, em completo descompasso de suas amigas. Clarissa, no entanto, é a primeira a me ver e chamar-me para me servir com eles. Servimos-nos e comemos em completo silêncio. Clarissa ficava encarando discretamente o celular vez ou outra, André e Mariana conversavam sobre algo e Rebeca, o principal foco de toda minha atenção e fonte das minhas novas inquietações, fazia o possível e o impossível para não estabelecer contato visual comigo.
Ao terminarmos de comer, eu e a Beca nos levantamos em sincronia; contudo, antes que ela pudesse fazer qualquer coisa, seguro sua mão e, com toda a vulnerabilidade que ela consegue causar em mim, pergunto:
— Podemos conversar… a sós?
Michael's P.O.V. off

Acenando positivamente com a cabeça, a garota recolheu a mão e passou a seguir o rapaz, que, ao notar o recuo da parte da “namorada”, acelerou sua quase corrida em direção à saída do restaurante/refeitório. Cada um com seus próprios pensamentos, andaram lado a lado até o elevador, que, para o azar de Rebeca — que estava cada vez mais ficando tensa com toda a situação —, estava superlotado com malas e mais malas de novos hóspedes. Embora desconfortável com toda a situação, tentou intervir um pouco com o clima:
— Acho que aqui ainda vai demorar… quer ir de escada ou quem sabe me dar alguma dica do que iremos conversar? — ela perguntou da melhor forma que pode sem parecer rude.
— Aceito a oferta da escada — ele respondeu enquanto se voltava para a saída de emergência que ficava ao lado esquerdo elevador — Quanto ao assunto, eu creio que você já deve saber pelas suas reações desde que me viu hoje…
Assim, novamente o silêncio reinou entre o casal, até que, na metade do percurso da escadaria, a jovem já não aguentava mais todo clima negativo entre eles. Na impulsividade que raramente fazia parte do cotidiano da jovem, mas que nessa viagem se apresentou todas as vezes que interage com Michael, puxou o mais forte que pode o braço do rapaz, fazendo ambos quase caírem escada abaixo.
— Meu Deus, Rebeca! O que foi isso? Você está bem? — Michael virou-se, preocupado, achando que talvez o ato vindo da menina poderia ter decorrido de uma quase queda ou quem sabe de uma queda de pressão, coisa que ele descobriu não ser muito raro na vida da jovem por seus hábitos alimentares. Ao se deparar, no entanto, com a imagem dela parada logo atrás de si segurando seu braço sem qualquer sinal de fraqueza ou desequilíbrio enquanto lhe olhava profundamente, soube que ali foi o palco escolhido por ela para o que viria a seguir.
— Você quer terminar o que temos por causa de ontem? — e lá estava mais uma vez Michael surpreso pelas iniciativas da moça, contudo dessa vez a surpresa se misturava com nenhum sentimento positivo ao ouvir a pergunta dirigida a si, depois de um pequeno embate de olhares. Negro no negro sem que nenhum sentimento pudesse ser perdido por qualquer um deles.
— Eu não vou terminar com você. Agora, você pretende terminar comigo? — ele perguntou, mostrando toda a ansiedade e insegurança que vinham o rondando desde ontem à noite, após se dar conta que, inferno, o que eles tinham, mesmo que muito recente, já tinha relevância imensa para ele. — Rebeca, eu não sou mais um adolescente cheio de hormônios que vai se “apaixonando” pela primeira criatura minimamente atraente que passa ao lado! Eu não sou do tipo de ter vários crushes e fazer planejamentos loucos de como será o nosso futuro daqui a 50 anos. Não sou santo, admito, já vivi aventuras, mas nada que já tive chegou perto do que sinto quando estou com você. — segurando agora a mão dela, que insistia em permanecer ao redor de seu braço, continuou: — Com você eu sinto doses de sinceridade que chegam a me assustar, de tão palpável que a veracidade das suas emoções são, não só comigo, mas também com seus amigos. Acredite, já estive em relacionamentos tão tóxicos e interesseiros que nada de bom se transmite deles. Agora você… você em momento nenhum procurou saber sobre minhas condições financeiras para se aproximar; demonstrou ter personalidade própria e convicções, lealdade por quem se importa e é dona de um charme único que te faz ao mesmo tempo um dos seres mais fofos e sexies do mundo. — tomando fôlego e falando um pouco mais lentamente que antes, ele continuou — Sei que em uma semana não conheço seus lados mais obscuros, bem como você não conhece os meus, mas a questão é que eu quero conhecê-los. Seja aqui, no Canadá, no Brasil ou em qualquer lugar do mundo! Eu quero continuar com você nem que seja por um relacionamento à distância para não perder o que temos, sentimos. Eu sei o que eu quero, agora cabe você me dizer: você sabe o que quer?
Depois dessa confissão feita pela mais humana das almas, o silêncio reinou pela quarta vez e, como das anteriores, ele estava cercado por diversos tipos de emoções e pensamentos a todo vapor. Expectativa, ansiedade, temor, esperança, insegurança, respeito e amor cercavam o casal em uma contagem regressiva para o choque iminente de sentimentos acumulados e de traumas do passado que não simplesmente somem com o decorrer do tempo.
Quebrando, finalmente, o contato visual que iniciou-se desde o início da fala do rapaz e que se manteve até agora, Rebeca suspirou e, olhando para as mão entrelaçadas, começou a falar:
— Michael, por você ter sido sincero comigo, serei a mais franca que minha perturbada persona pode ser. Eu te amo! I love you! Wo ai ní! Amo mais do que já fui capaz de amar alguém e isso me assusta!!! — tomada pelos resquícios de coragem em seu ser, ela levanta os seus já úmidos olhos para fitar a face do primeiro rapaz que a fez sentir muito mais do que um mero interesse carnal. Respirando profundamente umas duas vezes, ela continuou:
— Me assusta a ideia de perder o que temos aqui e simplesmente cair no conto de uma aventura da juventude. Me apavora assumir o quão dependente dos seus sorrisos fáceis me tornei nesta semana. Me arruina pensar em perder essa sensação de pertencimento e felicidade que você me trouxe nesses oito dias. Mas, acima de tudo, me aterroriza até a alma a ideia de que permiti novamente criar expectativas em algo que sabia desde o prelúdio que não teria qualquer chance de vingar e, de bônus, deixei um ser tão precioso se magoar novamente com as pessoas por meu egoísmo suicida.
— Então é isso?! Você está com medo de tentar? — ele perguntou, já elevando dois tons sua voz e se esquecendo completamente da possibilidade de alguma pessoa entrar nas escadas de emergência e flagrá-los brigando — É isso mesmo que você está me dizendo? Que me ama, mas não acredita que teremos algum futuro?
Já consternada com toda a situação e por raramente deixar suas emoções fluírem com tamanha liberdade em seu ser, a garota não suportou ver a dor que causou nos olhos de Michael e por instinto retrocedeu dois degraus abaixo, como se dessa forma fosse protegê-los de todo o mal que estavam sentindo. Que ela estava o fazendo sentir. Assim, soltando a mão do rapaz que, até alguns segundos atrás, estava esticada para conseguir alcançar o toque da jovem, ela finalizou o último contato físico que ocorreria entre eles sem a mácula das palavras que viriam.
Com o coração na boca e já se questionando se foi correto ter deixado o relacionamento deles ter avançado até aquele ponto, ela continuou em um sussurro:
— Sejamos sinceros entre nós, eu não posso e não quero largar a vida que tenho no Brasil, bem como você não pretende o fazer com a que tem no Canadá. Ambos passamos por muitas coisas nessa vida e ultrapassamos muitas adversidades para termos e sermos quem somos para simplesmente largarmos tudo pela possibilidade de um relacionamento. — olhando novamente o rapaz, só que com o rosto já banhado em lágrimas, Rebeca usou todo o ar que queimava em seus pulmões para falar o mais claramente sobre seus sutis soluços — Não me olhe ou fale como se eu simplesmente estivesse jogando todos os nossos sentimentos no lixo por um capricho infantil!! Mas a vida já me mostrou que simplesmente amar não leva relacionamento algum pra frente. Eu já amei tantas pessoas, mas isso não as impediu de me deixar/trocar por outras quando a conveniência batia à porta e, acredite, ela sempre bate. Outra, me diz, tirando o maravilhoso mundo das fanfics e dos romances, quantos relacionamentos à distância você conhece que deram certo?
— …
— Exatamente, nenhum! — suspirando diante de tudo que foi dito e se recriminando imensamente por ter perdido totalmente o controle de suas emoções em um momento delicado em que sua famosa “face de notória advogada equilibrada e no controle das coisas” nunca deveria ter sido perdida de vista, ela olhou novamente para Michael; e, antes de descer todos os degraus que a impediam de alcançar novamente o térreo, disse a verdade mais dura daquele dia: — O problema não está no meu querer, pois este sempre esteve em permanecer com você. A grande problemática é o que no mundo dos adultos aprendemos desde cedo, o abismo entre o desejar e a possibilidade de fazer. E, sinceramente, não sei como realisticamente podemos ver algum futuro dessa relação.
Dito isso, a menina enxugou um pouco dos rastros de lágrimas que marcaram todo o seu rosto e finalmente deu as costas ao seu amado. Sem saber, no entanto, que a cada degrau descido uma nova lágrima banhava a face do pobre rapaz. Já ele a viu ir sem saber que a mesma estava prestes a entrar em uma das piores crises de pânico de toda sua vida.


Capítulo 16 - Novidades não contadas!

Era durante o pôr do sol que todos os 4 amigos estavam no quarto, quando André recebeu uma notificação de Omar o convidando para dormir em sua casa, fazendo com que ficasse animado e de imediato aceitasse o convite. Animação essa que desapareceu quando lembrou que não contou nada sobre a saída secreta e a caminhada na praia, algo que seria importante de se contar antes de falar que iria dormir na casa de um boy.
— Reunião, gente, tenho novidades não contadas!!! — gritou, fazendo com que as amigas se reunissem em torno de sua cama com uma grande animação.
André, então, terminou de contar toda a história, o que levou as meninas a um êxtase de animação ao ver o amigo entrando em um típico romance de fanfiction, mas que era real em seus sentimentos e história. Os quatro amigos, então, se reuniram para escolher as roupas que André levaria para lá.
Feito isso, o menino se despediu de suas amigas e foi em direção ao apartamento de Omar, que era a alguns blocos do hotel. Ao chegar no prédio, um pouco maior que o hotel que estava hospedado, com uma estética art nouveau que combinava com o morador francês que por um ano havia chamado aquilo de lar, tocou a campainha; todavia a porta abriu sem ninguém falar nada com ele. Subiu dois lances de escada que o levaram ao segundo andar, onde havia duas portas, uma em frente a outra. Ficou em frente à porta vermelha com o número 21, bateu na porta e ficou sem resposta. Bateu novamente, e o silêncio era ensurdecedor. A ansiedade começou a afetar o menino, que achava que poderia ter errado tanto o prédio como o apartamento; pegou o celular do bolso para conferir os dados e, ao abaixar a cabeça para olhar o telefone, percebeu que havia um envelope embaixo do tapete.
Abriu-o e nele estava escrito "No lugar certo você está, mas está com os pés muito no chão, sonhe mais alto". Era uma charada que Omar planejou para poder brincar um pouco com André. Agora estava um pouco menos ansioso, ao perceber que estava sim no lugar certo; todavia demorou a entender como poderia se aproximar do céu, dúvida que se esclareceu quando percebeu o óbvio fato de que poderia subir mais andares. Depois de chegar no último andar, percebeu que, no quadro que todo andar possuía, havia outro envelope, que dizia "Estás alcançando o céu, mas à luz da lua tens que se iluminar", charada essa que não demorou a ser respondida.
Subiu o último lance de escada e se deparou com uma porta pesada e cinza, que tinha um post-it com um ":)" grudado no centro. Abrindo a porta, começou a ver a cidade do alto e, quando mais a abria, mais se iluminava tanto pelas luzes da cidade, quanto pela luz da grande lua cheia que estava no céu. Ao abrir completamente a porta, se deparou com uma mesa toda arrumada com taças, um vinho tinto, uma embalagem de comida de um restaurante e outras coisas; entretanto faltava uma coisa, o Omar. Todavia, a beleza da organização da mesa e o cheiro que vinha dela distraíam André, fazendo com que fosse arrastado em sua direção. Quando chegou no pé da mesa, foi pego de surpresa pelas costas por um abraço carinhoso de Omar, que começava a exclamar sua felicidade por ele ter resolvido as charadas.
— Você resolveu os enigmas!!! Mas eu facilitei eles pra você. — disse, virando André em sua direção e dando-lhe um beijo.
— Você quase me matou de susto, mas realmente eu amei tudo isso — disse enquanto apontava para tudo a sua volta, percebendo que havia mais um elemento iluminando o ambiente, diversas luzes pisca-pisca, ficando boquiaberto com toda aquela produção.
Os dois apaixonados ficaram alguns minutos em um abraço caloroso que exalava amor e felicidade no terraço, quando Omar convidou para se sentarem à mesa e comerem a comida que havia comprado mais cedo de um de seus restaurantes favoritos. Comeram e beberam, enquanto conversavam e apreciavam a vista que a altura lhes oferecia.
Depois de algumas taças de vinho, Omar pegou a mão de André e começou a dizer-lhe:
— Sabe, André, você tá sendo muito importante pra mim nesse momento, e imagino que no futuro será também, mas eu quis te fazer esse jantarzinho especial, ou melhor, organizei e comprei a comida, para mostrar como você é especial e pra gente ter um "encontro" propriamente dito.
— Te dizer que não esperava isso, mas isso superou totalmente minhas expectativas e eu amei completamente. E você já sabe o quanto você é especial para mim da mesma forma e da mesma forma me ajuda de uma maneira inexplicável. — disse, segurando com mais força a mão de Omar e olhando no fundo de seus olhos.
— Então, eu talvez tenha preparado outra surpresinha pra você! — disse, fazendo com que André fizesse uma expressão de animação e de surpresa ao não conseguir imaginar o que possivelmente estaria planejando Omar.
Omar, então, correu em direção à porta de saída e tirou de um esconderijo uma caixa de som que começou a tocar músicas francesas que ambos amavam, o que fez com os dois começassem a dançar à luz da lua e gastassem a animação que o álcool havia lhes dado.
Depois de um tempo, o momento foi estragado com uma grande quantidade de nuvens que cobriram a lua e ameaçavam fazer chover, fazendo com que os dois guardassem tudo e levassem para o apartamento, organizando tudo da forma que estava antes, pois Omar havia tirado a mesa da sua própria cozinha para fazer todo o encontro. O casal se deitou no sofá, cansados da dançaria e de comerem a comida italiana, e ficaram assistindo televisão enquanto ficavam abraçadinhos.
André então percebeu que Omar já estava quase dormindo e já não prestava atenção na TV e nem na conversa dos dois, deixando André conversando sozinho. André então desligou tudo e conseguiu fazer com que o dorminhoco guiasse os dois em direção ao quarto de Omar para que deixasse-o em sua cama e fosse então dormir no sofá.
— Vem deitar aqui comigo!?! — disse Omar ao deitar em sua cama, segurando o braço de André.
— Mas pensei que ia dormir no sofá? Não sei. — disse André, pego de surpresa, mas com um sorriso no rosto, pois já queria aquilo.
— Não… você tem que dormir aqui comigo… — disse, não sabendo muito bem dizer as palavras.
André se deitou com ele, e em seus braços Omar começou a balbuciar algumas frases que não faziam muito sentido, até que disse:
— Sabe, André… eu gosto muito… muito mesmo de você… — disse, entrando finalmente em sono profundo enquanto André acariciava sua cabeça, tentando esconder em sua fala algo a mais que sentia, talvez por não ter certeza do que estava sentindo, ou por não querer assustá-lo.
— Eu também. — disse, dando um beijo na testa de Omar e dormindo logo em seguida.

André acordou sozinho na cama, se levantou e andou em volta do médio apartamento, tanto à procura de Omar quanto pelo banheiro, todavia só encontrou o último. Omar não estava no apartamento, o que deixou o sozinho amigo apreensivo por não ter noção da localização do outro. Então começou a desvendar o apartamento, tentando ver se achava um bilhetinho que o poderia levar à localização de Omar, mas não encontrou nada até que uma gaveta semi-aberta chamou sua atenção.
Ao abrir a gaveta, viu que tinham diversos papéis, algumas cartas e alguns textos impressos. Deviam ser coisas que trouxe da França, já que estão em Francês, André pensou, pegando um dos papéis que o chamou a atenção.
Era uma pequena carta endereçada para uma pessoa chamada Arthur; era uma carta de amor, mas que pelo visto nunca tinha sido enviada, e, ao perceber que a carta tinha uma espaço em branco na parte da data, provavelmente existe um plano de enviar a carta, pensou André — que, ao terminar de ler, foi possuído por um triste pensamento que talvez alguém o esperasse na França, que na verdade Omar ainda teria sentimentos por alguém. André analisava que a escrita não tinha sido recente, também pelo estado um pouco abatido que o papel se encontrava, mas a tristeza de André o fazia acreditar que o que havia pensado era uma certeza, e os aspectos materiais da carta não estavam já na mente dele.
Sentado no sofá, já não com os mesmos sentimentos da noite passada, decidiu que não o esperaria voltar e que partiria imediatamente. André se arrumou e levava a carta junto sem nem perceber, passou pela porta de entrada e por algum motivo não conseguia descer as escadas; algo o segurava lá e, já com os olhos úmidos, decidiu ter uma última lembrança, que talvez era o que o mantinha imóvel, e assim subiu até o terraço com passadas lentas entre os degraus.
Chegou na porta e, com uma lenta movimentação de mãos, a abriu. E se deparou com as luzes do nascer do sol que iluminavam o céu. Depois de se acostumar com a luminosidade, percebeu que Omar estava ali, sentado na beirada, observando o nascer do sol. Ele chorava; André não sabia disso até o momento que se aproximou do amigo. André, ao caminhar, deixou sua mochila no chão e sentou ao lado do amigo, que logo percebeu a carta na mão de André.
— Pelo visto você investigou minha casa, bem coisa de historiador mesmo. — disse Omar, secando as lágrimas de seus olhos e dando um leve riso, parecia que ver André com aquela carta não era algo a se preocupar.
— Desculpa, eu não devia ter feito isso — disse com um tom de arrependimento — preferia não ter encontrado isso.
— Quer que eu te explique o que é isso? — disse, pegando a carta da mão de André — Esse era um cara que eu achava que gostava, a gente ficou junto por duas semanas e eu achava que era o amor da minha vida, e não chegou nem perto disso na realidade, eu tinha 15 anos e vivia no mundo das fantasias. — disse ao rasgar a carta ao meio — A gente se beijou uma única vez… na verdade era tudo uma aposta dele com os amigos dele… ele hoje em dia é gay, mas na época não tinha se assumido ainda, dizia que era hétero. E você com essa cara de surpresa deve se perguntar por que eu trouxe essa carta pra cá, né? — disse, olhando nos olhos de André — Era a única lembrança de um amor, mesmo que falso, que eu tinha, mas agora não é mais algo que eu queria lembrar, porque agora eu sei o que é amar de verdade — disse, terminando de rasgar a carta e joga-lá de cima do prédio.
André neste momento não sabia muito bem o que falar, sabia que tinha errado completamente na sua imaginação do que era aquela carta, que nem existe mais.
— Mas por que que você está aqui… — disse com um tom real de preocupação, já não se importando com a história que havia criado, segurando a mão de Omar
— Eu sempre venho aqui quando estou mal, ver o nascer do sol, porque queria que fosse fácil como um nascer de um novo dia poder mudar e esquecer o passado — disse, mudando o foco do olhar do horizonte para os olhos do amigo ao lado — Quando acordei fiquei pensando na nossa conversa que a gente teve lá na praia, pensar que tenho que enfrentar um medo, e, mesmo que eu me prepare, eu sei que vai ser difícil.
— Minha presença com você não vai facilitar, mas quando ficar difícil vai ter alguém pra te ajudar, e eu não sairia de seu lado por nada nesse mundo, nem pela mais complexa dificuldade. — disse, apertando a mão de Omar com mais força e se sentindo um pouco idiota ainda com a história da carta.
— Obrigado… — Omar disse ao começar a ter um choro silencioso, que, mesmo sendo de tristeza, fez com que estampasse um sorriso em seu rosto.
O casal ficou por mais alguns minutos apreciando o fim do nascer do sol, e se dirigiram ao apartamento. Omar estranhou o fato de André ter ido com uma mochila para o térreo, mas imaginava que o fato de ter encontrado aquela carta o levasse a fazer isso. Assim, já tendo esquecido o que havia acontecido e enquanto tomavam café da manhã, Omar mostrou mais algumas das lembranças que tinha naquela gaveta, como algumas fotos de seus amigos e cartas que escreviam um para o outro enquanto estavam no colégio. E os dois terminaram se dirigindo ao hotel, tendo no pensamento os ótimos momentos que passaram juntos na noite anterior.


Capítulo 17 - Me ajuda a consertar?

*Alerta de gatilho: uma crise de ansiedade/ataques de pânico será retratada nesse capítulo.

Clarissa havia passado quase o dia anterior inteiro remoendo o modo que tinha tratado Van, e a tristeza visível no semblante dele continuava aparecendo em sua mente toda vez que ela fechava os olhos.
Ela ainda não tinha tido coragem de ler o que estava escrito no papel que o garoto havia entregado para ela e se sentia uma covarde por isso. Ele estava guardado na sua bolsa desde então e ela sempre olhava para ele quando a abria e, de repente, ela se lembrava de tudo o que havia acontecido e de como tinha sido uma completa babaca.
Na madrugada daquele dia, porém, o papel parecia gritar de dentro da bolsa, que estava jogada no carpete. Não conseguia dormir de jeito nenhum, devido aos pensamentos que rondavam sua mente sem parar. O fato de seu quarto estar vazio, pois André havia ido dormir na casa de Omar, também a deixava agoniada e ela revirou o corpo várias vezes na cama antes de levantar e ir em direção à bolsa.
Sentada no chão, Clarissa pegou o papel nas mãos e o abriu delicadamente. Enquanto lia os versos e as estrofes escritos à mão numa caligrafia preguiçosa, não pode segurar as lágrimas que caíam de seus olhos involuntariamente.
Era uma música. Van tinha escrito uma música depois de tanto tempo sem inspiração. E era linda. Clarissa não conseguia acreditar que o mesmo rapaz que havia se aberto para ela aquela noite na praia sobre não conseguir mais escrever tinha escrito aquelas palavras, embora conseguisse enxergar Van em cada uma delas e quase conseguisse ouvir a voz dele cantando-as.
Mais do que tudo, se recusava a acreditar que tinha sido tão rude com ele quando ele só queria mostrar para ela o progresso que havia feito. Estava com raiva de si mesma e de como havia agido, infantil. Queria voltar no tempo e receber Van com um sorriso maior que o dele, se fosse possível, e escutar tudo o que ele tinha para falar e cantar. Mas era impossível.
Por causa de Daniel, e principalmente por causa de si mesma, tinha sido uma imbecil e não sabia como iria conseguir reparar isso. A tristeza no olhar de Van estava nítida na sua mente enquanto ela lia os últimos versos da música e molhava o papel com suas últimas lágrimas.
Foi Mariana quem a acordou no dia seguinte. Ela tinha dormido no chão mesmo, segurando a folha de papel.
–– Quer me contar o que aconteceu? –– Mariana perguntou assim que a amiga abriu os olhos ainda inchados.
Clarissa balançou a cabeça negativamente.
–– Clarissa, estamos preocupados com você. –– ela continuou enquanto a ruiva procurava olhar para qualquer lugar que não fosse para a amiga. –– Você chegou no quarto com a cara inchada anteontem e não quis falar com ninguém, ficou quietinha ontem o dia inteiro e nem fez piada sobre André ter ido dormir no Omar. –– Clarissa abaixou a cabeça, sem saber o que falar. –– O que está acontecendo?
Clarissa olhou para cima para segurar as lágrimas que queriam descer novamente.
–– Eu… –– ela começou, mas não conseguiu terminar. Era difícil falar sobre o que tinha acontecido, sendo que ela nem sabia quem era Van, então apenas recebeu o abraço que a amiga a ofereceu.
–– Foi o Daniel, não foi? –– Mariana perguntou. –– Foi ele que te ligou aquele dia, não foi?
Clarissa fechou a cara, com raiva só de ouvir o nome sendo mencionado.
–– Foi ele quem ligou sim. –– ela falou pela primeira vez, com o semblante emburrado. –– Mas não é por causa dele que estou assim. –– e entregou para Mariana o papel em suas mãos.
A menina leu rapidamente o conteúdo antes de olhar para Clarissa novamente.
–– O que é isso? –– ela perguntou e Clarissa começou a chorar.
–– Van. –– respondeu entre soluços.
–– Van? –– repetiu e obteve um sim como resposta. –– O que ligou aqui no quarto te procurando? –– novamente um aceno de cabeça. –– O que ele fez? Eu vou quebrar a cara desse babaca.
Clarissa balançou a cabeça negativamente várias vezes e depois riu entre as lágrimas.
–– Vai ter que quebrar a minha cara, então. –– ela disse. –– Porque eu que fui uma babaca.
–– Novidade. –– Mariana riu e recebeu um tapa da amiga.
–– Me ajuda a consertar? –– Clarissa fez seu melhor semblante pidão e Mariana apertou suas bochechas antes de abraçá-la.
–– Com certeza.

Rebeca P.O.V on
Ao ouvir a conversa que ocorria no quarto ao lado fico eternamente agradecida à Mariana por ter ido no meu lugar acordar a Clarissa. Sabíamos que alguém teria que checar o estado de nossa amiga e, dentre todos nós, Mari sempre foi a mais apta emocionalmente para esse tipo de tarefa.
Encostada à parede em que se encontra a porta que liga os quartos, permaneço quieta, ouvindo o relato de nossa amada ruiva enquanto mais uma vez sinto um forte aperto no peito e volto a recordar da última conversa que tive com Michael. As palavras ditas, as lágrimas amargas e o fel sabor impregnado na minha boca devido a minha covardia. Todas essas coisas se enlaçando ao redor de meu corpo como novas correntes que me prendem, me afogam na percepção tardia da dor que meu pessimismo, inseguranças e pânico causaram de uma vez só ao partir o coração de duas pessoas.
Dizer que menti ou me arrependo do que disse jamais seria verdade. Eu externei o que estou sentindo nas profundezas sórdidas daquilo que nunca consegui de fato controlar, meus sentimentos. Agora. o que me arrependo, e sempre me martirizei por ter, é a completa incapacidade de controlar minhas inseguranças, meus demônios, minha autossabotagem psicológica.
Eu quero estar com o Michael e acreditar que existe alguma forma de permanecermos juntos, pois tudo nele me faz amá-lo e me faz sentir amada, pertencente, e, acima de tudo, segura.
Contudo, meu consciente não consegue superar meu pessimismo revestido de realismo. Quando dei por mim, toda a carga negativa que habita em meu ser mostrou seu domínio sobre minhas ações e minha capacidade de externar o que sinto. Infiltrando e corrompendo o que horas antes já tinha planejado a dizer a ele, meu discurso de proposição de uma solução para o nosso relacionamento perdeu todas suas características positivas e se tornou um amontoado de bloqueios e descrença. Verdade seja dita, não pretendo abdicar de tudo pelo qual lutei até hoje, não creio que ele venha a fazer isso também e, sobre o relacionamento a distância, realmente não acredito que funcione. Entretanto é nesse tópico que vive a grande diferença entre a versão original do meu discurso e o que foi proferido, eu queria tentar. Nunca vi nenhum que realmente deu certo, mas queria arriscar para não perder o que temos. Eu quero acreditar que tem como salvar o que temos, tínhamos.
Mas como em tudo que envolve meu emocional, essa característica, antiga e até mesmo apelidada pela Mari como a Tristeza do filme Divertida Mente, de bloqueio me impede de ver o lado positivo das coisas, me cega das possibilidades viáveis enquanto envia ondas de formigamento, tremores, espasmos por todo meu corpo ao descompassar meu batimento cardíaco e minha capacidade de respirar.
Desencostando da parede que dá acesso ao quarto da Clarissa, a que me permitia ouvir todo o desabafo de minha amiga sem ser vista, decido sair do quarto e dar a elas toda a privacidade que precisam.
–– Senhor, quando me tornei tão descontrolada... –– pergunto-me em um sussurro já fechando a porta atrás de mim, o mais silenciosamente possível.

Já do lado de fora, envio uma mensagem no nosso chat avisando que não os acompanharia durante o dia devido a um compromisso advocatício inesperado que surgiu e, sem nem mesmo checar o envio, bloqueio o telefone e me direciono ao elevador.
Chegando no térreo vou diretamente para o hall de entrada do hotel esperar meu mais novo cúmplice do crime chegar ao local combinado, ontem à noite, por mensagens, após a minha recuperação de um dos meus quadros de crise de pânico. Após uns 10 minutos de minha chegada, creio eu, vejo um Harry todo confuso se aproximar de mim com a fisionomia mais hilária que já vi em seu rosto.

Rebeca P.O.V. off
–– Pelo amor de Deus, Rebeca, é bom esse seu plano maluco valer a pena pelo meu dia de folga perdido, sério. –– diz ele tentando forçar estar bravo, mas no fundo só estava preocupado com a jovem. Quando ela ontem inesperadamente mandou-lhe mensagens às 22h, pedindo-lhe ajuda para resolver seus problemas com Michael, garoto o qual só viu duas vezes, soube que seja o que tivesse acontecido, ela teria que estar minimamente desesperada para escolher a si como apoio dentre seus amigos de longa data.
–– Olha, nada posso prometer, mas tentarei ao máximo que sim. –– respondeu ela tentando não demostrar todo o nervosismo que ameaçada se externa novamente.
–– Outra coisa, o que significa aquela última mensagem que você enviou? Sabe como é, não falo português e o tradutor não ajudou muito na tarefa de me traduzir aquilo. –– pensando um pouco ele retoma –– Algo sobre o direito cochilar e você socorrer seus medos…
Soltando o mais próximo de um sorriso nas últimas 48h ela decide corrigir o rapaz:
–– A mensagem dizia: bem como o direito não socorre aqueles que dormem, meu amor-próprio não vai permitir minha ansiedade tomar mais uma oportunidade de viver minha vida. –– suspirando e continua –– Meio que eu fiz uma combinação entre um jargão jurídico com meu mais novo lema existencial, sabe. Para ver se assim eu acredito mais nele… Enfim, ‘bora? Quanto mais ficamos aqui, mais eu sinto que alguma coisa pode dar errado…
–– E fazer todo o plano ir por água abaixo antes mesmo de ser iniciado? Jamais –– respondeu ele risonho começando a curta caminhada entre eles e seu carro.

[COLOCAR A MÚSICA PARA TOCAR]

Já passava das três da tarde quando todos os últimos ajustes do plano de Rebeca se mostravam completos tendo somente um e, mais importante, deles faltando: a presença de Michael no píer abandonado, também conhecido como o templo solitário, que ficava em uma das praias próxima ao hotel em que o antigo casal estava hospedados. Como faria para Harry trazer Mike, nenhum dos cúmplices sabiam bem ao certo, mas naquele momento os fins justificavam qualquer meio necessário para isso.
De pé observando a paisagem, Rebeca permaneceu na beirada do píer relembrando de cada momento que viveu com Mike, de cada história que compartilharam de suas vidas, de cada toque e como eles a faziam se sentir. No entanto esses pensamentos, que alguns dias atrás tinham o poder de embalar seu corpo como a mais bela cantiga de ninar, agora não a permitiam relaxar ou simplesmente ter a paz de espírito suficiente para sentar-se à beira do píer e aproveitar da luz solar que banharia seu colo parcialmente desnudo pelo short.
Não, agora essas doces lembranças a assombravam mostrando como sua fraqueza psicológica no dia anterior a fez mudar o tom de sua fala, a conclusão de sua síntese e, provavelmente, perder uma das pessoas mais maravilhosas que já deve a honra de conhecer.
Já a quase a meia hora naquela infinita espera, a esperança de que Harry tivesse êxito em sua missão de trazer Mike diminuía gradativamente no coração da menina a qual conforme perdia sua fé sentiu um outro sentimento crescer em seu âmago. E foi aí que tudo começou a dar errado.
Com a crescente sensação de perigo em seu peito juntamente com a sutil arritmia cardíaca que se apresentava, Rebeca deu início a uma série de exercícios respiratórios para tentar evitar a sensação de perigo que lentamente tomava conta de todos seus instintos.
A jovem notou, no entanto, que suas mãos estavam cada vez mais dormentes e a sensação de perigo em momento algum chegou amenizar seus efeitos. Com pesar, evidenciou que seu costumeiro exercício não estava surtindo efeito algum em contornar a crise que a cada segundo ameaçava se instalar.
Trêmula e ainda sem sinal de qualquer aproximação humana ao píer, Rebeca buscou qualquer coisa ao seu redor que lhe trouxesse alguma sensação de segurança, mas não conseguia ver nada além do mar ao seu redor e da praia vazia. Tentando não focar nos sintomas que sentia ou nos pensamentos mórbidos que surgiam em sua cabeça sem nenhum nexo real, mas suficientes para desestabilizá-la ao ponto de não mais conseguir permanecer em pé, a jovem agachou e desesperadamente buscou qualquer coisa em sua mente que lhe trouxesse acalanto o suficiente para passar por aquela nova crise. Em sua busca um hino religioso em particular surgiu-lhe e prontamente ela começou a cantá-lo como se ele fosse a única boia salva-vidas que pudesse tirá-la do tormento que sua mente e seu corpo se tornarão em fração de segundos.
Enquanto tentava cantar, sua respiração tornava cada vez mais difícil a tarefa de pronunciar-se palavras ao ponto que de seus lábios somente conseguiam emitir uma angustiada melodia do que outrora seria uma das mais belas canções católicas lusitanas. E no meio de todo aquele tormento ela não notou, no entanto, o jovem rapaz que ao vê-la, da janela do jipe em que estava como passageiro, em um píer rodeado pelo mar agachada quase em posição fetal, pulou apressadamente do veículo correndo do concreto da pista até a costa em que sua amada sofregamente se encontrava.
Ao chegar nela, talvez por ter sido de modo tão súbito ou pela velocidade e conteúdo dos nocivos pensamentos que rondavam a mente dela naquele momento, ela tentou se afastar de Michael como se ele fosse somente mais um fruto imaginário de sua mente que sadicamente projetada a imagem de seu amado como um fantasma divino intencionado a sentenciá-la por todas as suas fraquezas humanas. Contudo, ao insistir em tocá-la e trazer o trêmulo corpo feminino ao encontro do seu, Rebeca pela primeira vez, desde o início de seu ataque de pânico, conseguiu sentir algo além das desilusões assustadoras criadas por seu subconsciente. Ela conseguiu sentir calor, acolhimento.
Deste modo, eles permaneceram por tempo indeterminado grudados um ao outro. Ela completamente encolhida no colo Mike enquanto esse abraçou-a fortemente e cantava uma canção de ninar que sua mãe outrora ensinou-lhe quando os monstros que habitavam debaixo de sua cama ainda eram os maiores problemas de sua vida. Ele cantando, ela chorando, ele servindo de porto e ela em busca de um porto.
Enquanto isso, Harry não sabia o que fazer naquele inusitado cenário trágico em que sem desejar se tornou um espectador vip. Estava preocupado demais com Rebeca para simplesmente dar ré no carro e se retirar do local, mas, também consciente o suficiente para respeitar o momento deles e não se aproximar do comovente ato que, mesmo contrariado, assistia de camarote. Sem muito o que fazer, o jovem subiu os vidros do carro para dar ao casal mais privacidade, mas também não deixou de observá-los no caso de necessitarem de sua intervenção.
Minutos se passaram até que Rebeca estivesse novamente apta a formular palavras e distinguir o que era real ou não. O embrulho em sua mão era real, a mão que lhe sufocava não; o doce som da voz de Michael era real, o sussurro consternado em sua mente não; os braços que protetoramente lhe rodeavam eram reais, o perigo mortal que lhe puxava para os mais primitivos instintos de sobrevivência não. E assim ela foi distinguindo cada uma das sensações reais que sentia das ilusórias que sua mente criava. Uma por uma ela contabilizava e ia retomando o controle do seu ser até que finalmente disse:
–– Você veio… Mas por que você veio?
Analisando meticulosamente a garota que agora retomava a capacidade de pronunciar alguma coisa além de sua respiração falha, e que não demonstra qualquer intenção de liberar o aperto de seu corpo contra o dele, respondeu-lhe o mais sincero e pacificamente, temendo que qualquer deslize que fizesse trouxesse o pesadelo que lentamente parece abandonar o corpo da jovem.
–– Porque você me chamou, simples assim.–– tomando fôlego, continuou–– Como te disse ontem, eu te amo e, mesmo que me doa, esse sentimento não vai sumir simplesmente por você ter me rejeitado.
–– Mas eu não te rejeitei. ––replicou ela ainda tendo certa dificuldade em se fazer audível –– Mas acredito que depois de hoje isso não importe mais. Que amor poderia sobreviver ao que você acabou de presenciar…
Surpreso pela colocação dela, ele lentamente solta uma de seus braços da lateral do corpo da jovem enquanto lentamente leva sua mão inclinando a face de Rebeca para si.
–– Como alguém poderia continuar me amando após saber do quão desesperadamente solitária eu estive, incapaz de até mesmo manter minha sanidade…
Ainda mais chocado pelo que a menina disse e, agora, entendendo um pouco mais da origem de todo pessimismo e descrença que ela demonstrou ter ontem no amor, ele sutilmente beijou um de seus olhos e acariciou sua face enquanto proferia as seguintes palavras:
–– É claro que eu continuo te amando, Rebeca, pois com você, independente de tudo, descobri que posso ser feliz. Que talvez o que sempre estive procurando fosse por alguém capaz de me fazer sentir pertencente, amado. –– e agora com lágrimas no olhar Michael continuou –– Coisas essas que você sempre me fez sentir.
E envoltos naquelas fortes emoções e sem mesmo necessitar proferir qualquer palavra a mais, eles se beijaram apaixonadamente, assim pactuando silenciosamente o acordo não verbal de que não iriam desistir daquele amor, independente das dificuldades e obstáculos que pudessem encontrar. Tendo o mar como testemunha, firmaram definitivamente que, se necessário fosse, entrariam sim em um relacionamento a distância, modificariam seus estilos de vida, mas jamais permitiriam que qualquer insegurança arrisca-se o lar que eles representavam um ao outro.
Mas como tudo que é bom dura pouco, ao longe, eles escutaram um buzinar ininterrupto de um jipe no estacionamento da praia. Dentro do veículo, um motorista muito envergonhado grita ao casal um monte de piadas e gozações em grego do tipo “apaga esse fogo que aqui é local público” ou “bipolaridade mata, sabia?”. Contudo isso não foi capaz de abalar nenhuma grama do doce e forte sentimento que rodeava o casal. Assim, tal interrupção somente promoveu neles uma sutil risada enquanto se levantavam.
Com essa movimentação lenta, finalmente, Michael nota o pequeno embrulho protegido nas mãos de Rebeca e sem pensar muito perguntou:
–– O que é isso na sua mão? Por acaso é para mim? –– agora, sustentando um radiante sorriso ao olhar os olhos da menina e não encontrar mais nenhum sentimento negativo ou reprimido neles.
–– Na verdade, é sim. Sabe como é, pensei que se por acaso todo o discurso que tinha planejado para você fracassasse em tê-lo de volta, talvez um pequeno suborno pudesse mudar sua opinião... –– disse ela agora tentando ser um pouco engraçada para não mostrar o constrangimento que sentia ao ter se esquecido do presente que tão fortemente segurava –– Sabe, uma espécie de lembrete eterno do quanto você representa para mim…
E nesse clima mais descontraído, ela timidamente entregou o pacote o Michael, o qual prontamente abriu com todo cuidado do mundo a sacola já muito amassada e retira dela uma pequena caixinha de joias de tamanho médio. Respira fundo e abri encontrando uma das coisas mais preciosas que já teve o orgulho, amor e felicidade de receber.
Envolto em um travesseirinho de veludo se encontrava a joia que dizia tanto sobre o presenteador que nenhuma palavra ou confirmação eram necessárias ao presenteado. Com toda a delicadeza que seus longos dedos permitem que tenha, Mike retira a pequena corrente que jamais o faria duvidar dos sentimentos da garota.


Capítulo 18 - Eu vou tentar...

Rebeca e André chegaram logo depois. Rebeca tinha ido ao quarto de Michael e André estava voltando da casa de Omar. Não demorou muito para que todos sentassem no chão e escutarem a história de Clarissa. Depois de a ouvirem e tentarem da melhor forma ajudá-la, começaram a arrumar suas malas, pois o fim da viagem estava próximo.
–– Gente, que tal a gente ir em um barzinho hoje? –– disse André enquanto via suas amigas arrumarem suas malas.
–– André, terminou de arrumar sua mala? –– disse Rebeca olhando através da porta que unia os dois quartos.
–– Claro que já… –– disse, procurando se havia algo embaixo da cama.
–– Mas eu achei uma boa. –– disse Clarissa ao som do zíper que fechava sua mala. –– Vou tentar chamar o Van.
–– Boa, amiga! –– Mariana disse, animada. –– Tem aquele barzinho que fica aqui na esquina, que o Gregg… Recomendou. –– uma tristeza surgiu no olhar da garota ao lembrar de Gregg.
–– Vamos, gente, aí a gente anima esse fim de viagem. –– disse André tentando convencer o grupo.
–– Tudo bem, a gente vai. –– disse Rebeca também terminando de arrumar sua bagagem.
O grupo que havia terminado de arrumar suas malas, se trocaram e foram em direção ao bar, onde já estava Omar e, por surpresa dos quatro amigos, Harry. Os amigos se cumprimentaram e sentaram se em uma mesa que ficava no lado de fora do bar, e pediram diversas bebidas e petiscos para consumirem enquanto conversavam e riam.
Clarissa havia tentado falar com Van a tarde toda. Fora ao hotel em que ele estava hospedado, discou o quarto dele várias vezes e esperou sentada na recepção por horas, mas nada de ele atender ou aparecer. Ela entendia a reação dele, entendia que ele não queria vê-la, mas estava preocupada e, principalmente, estava com saudades.
Depois de passar o dia cabisbaixa, porém, permitiu-se rir com os amigos naquela noite. Era o penúltimo dia deles na Grécia, e ela com certeza sentiria muita falta de tudo aquilo. Ali, naquela mesa de bar, parecia que todos os problemas haviam desaparecido e a felicidade era contagiante.
O grupo passou umas quatro horas sentados na mesa do bar, horas essas que pareceram minutos, e os amigos agora um pouco alterado depois de uns copos de bebida decidiram que estava na hora de irem embora. Harry foi o primeiro a ir embora, não tinha bebido nada, pois no dia seguinte tinha que levar um grupo de turistas para o tour de Mamma Mia. Alguns minutos depois da saída de Harry, Omar também percebeu que seu horário estava chegando.
–– Gente, acho que tenho que ir… –– disse Omar em um tom meio tímido.
–– Também acho que deveríamos ir indo também. –– disse Rebeca, soltando um bocejo logo em seguida.
–– Podemos ir, sim, vou ir ali pagar a conta. –– disse Mariana pegando sua carteira da bolsa –– O Harry deixou a parte dele? –– perguntou pegando o cartão da carteira.
–– Deixou sim. –– disse Omar entregando uma quantia de 10 euros para Mariana –– E aqui está a minha parte também –– já se despedindo da amiga.
Omar levantou da mesa, se despediu de Clarissa e Rebeca com um abraço e se despediu de André com um abraço caloroso e um beijo. –– Você não vai deixá-lo em casa não? hein, André? –– disse Clarissa levantando a sobrancelha tentando lembrar André de algo.
–– É mesmo! Quer que eu te acompanhe até em casa? Mesmo que ela seja aqui perto. –– disse André segurando uma das mãos.
–– Como eu poderia recusar. –– disse Omar apertando mais a mão de André.
O casal então se distanciou do grupo, todavia Omar em um último relance conseguiu ouvir algo que Clarissa disse para Rebeca:
–– O André quase que esquece da surpresa que estava planejando… –– o que fez Omar soltar um sorriso.
Chegando perto do apartamento de Omar, André parou embaixo de um dos postes que iluminavam a rua, alguns metros antes da entrada do prédio. Omar não entendia o que estava acontecendo e o porquê de ter André parado naquele momento, assim André tira de sua mochila, um livro meio gasto que parecia ter sido lido diversas vezes.
–– Eu sei que a gente vai se distanciar por um tempo, então eu decidi deixar com você uma coisa que você pudesse olhar e lembrar de mim. –– André dizia enquanto folheava o livro –– Eu anotei muito nesse livro, não sei se porque é meu favorito ou porque ele é muito bom mesmo, então se você ler, ele vai parecer que estamos lendo juntos. –– terminou, entregando o livro nas mãos de Omar.
Omar, sem saber bem o que falar, pegou o livro e percebeu mesmo que o livro tinha sido lido e anotado várias vezes e de diversas formas. Quando olhou de volta para André, era uma única lágrima que corria pelo seu rosto, lágrima essa que não era pela perda de um livro, mas perceber que o tempo que teriam que esperar para poderem se ver novamente seria angustiante, mas valeria a pena considerando o futuro dos dois.
A lágrima que André tinha escorrido em seu rosto, tinha se camuflado pela chuva que começava a cair naquele momento, quebrando o silêncio. E antes mesmo de ter um reflexo de correr em busca de abrigo, Omar teve o instinto de beijar André, o beijo mais caloroso e apaixonante que os dois já experienciaram na vida. E depois de alguns segundos, que pareceram horas, maravilhosas horas, se tomaram conta de que estavam na chuva, ao ponto de estarem encharcados, assim correndo para a entrada do prédio de Omar.
–– Ai, eu nem sei dizer, você me dando esse livro… Eu sempre quis ler ele inclusive, só nunca tive a oportunidade –– disse Omar quando foi interrompido.
–– Eu não estou te dando o livro, estou te emprestando, porque eu vou tê-lo de volta daqui a um ano. –– disse André pegando o livro das mãos de Omar e dando um pequeno beijo na capa um pouco molhada pela chuva.
–– Sabia que não seria fácil assim arrancar um livro de você. –– disse pegando o livro de volta enquanto soltava um riso frouxo.
Os apaixonados se despiram com um abraço que durou uns dois minutos e a cada segundo que passava, mas apertado ficava, pois a saudade um do outro já era extrema e angustiante.
Omar, antes de entrar no apartamento, ficou a observar André a correr pela chuva tentando se proteger dos fortes pingos que caiam do céu escuro, que depois de alguns metros ficou invisível para o olhar de Omar, que se virou em direção das escadas e foi a caminho de seu apartamento. Quando se encontrava na frente de sua porta, se atrapalhou com a abertura da porta e assim deixou o livro cair, que abriu na primeira página e percebeu que havia algo recém escrito com uma caneta preta que falhava em alguns momentos, e foi isso que Omar leu:
"Falo hoje - não ontem nem amanhã - mas hoje e neste próprio instante perecível. Tenho um pouco de medo: medo ainda de me entregar, pois o próximo instante é o desconhecido. O próximo instante é feito por mim? Ou se faz sozinho? Fazemo-lo juntos com a respiração. E com uma desenvoltura de toureiro na arena. Só no ato do amor - pela límpida abstração de estrela do que se sente - capta-se a incógnita do instante que é duramente cristalina e vibrante no ar e a vida é esse instante incontrolável, maior que o acontecimento em si"

Algumas palavras, agora se borravam, não sabemos se por lágrimas ou por simplesmente gotas de água, mas sabemos que se for a primeira opção, seriam lágrimas de amor e felicidade, mesmo que a tristeza estivesse presente no momento. Omar entrou em no apartamento, foi ao seu quarto e o deixou seu novo livro –– Crime e Castigo de Fiódor Dostoiévski –– na cômoda ao lado de sua cama e foi dormir logo em seguida.
Enquanto isso, as três amigas chegavam no hotel. Mariana ao passar pela recepção, foi tomado por uma tristeza imediata ao lembrar-se de Gregg, que mesmo não estando na recepção, era como uma presença oculta. As amigas tinham entrado no hotel logo antes do início da chuva, assim era reconhecível que Mariana tinha o rosto molhado por causa de lágrimas.
–– Mari, você está bem? –– disse Rebeca colocando um dos braços sobre Mariana.
–– Você quer conversar sobre algo? –– disse Clarissa já sabendo o motivo de ver a amiga chorando.
Mariana tentava falar, mas nada saía de sua boca se não ruídos de choro que aumentavam cada vez que se aproximavam do quarto. Ao entrarem no quarto, as duas amigas sabiam que tinham que ajudar e esqueceram de tudo, das malas, do check-in, o foco agora era ajudar a amiga.
Mariana logo deitou-se em sua cama e suas amigas se sentaram ao seu lado. Passados alguns minutos que pareciam horas devido ao silêncio de Clarissa e Rebeca, Mariana conseguiu parar de chorar e finalmente conseguia se expressar.
–– Eu sei que a gente não estava junto… Não posso cobrar nada dele, mas eu nesse tempo que passamos junto estava sentindo algo… E o que me fez agir daquele jeito, fui eu achar que era algo recíproco, que o que eu sentia era algo mútuo… Mas acho que não era no final das contas… –– disse intercalando suas frases com soluços de choro.
–– Eu realmente gostava dele… Ele parecia diferente dos outros meninos, pelo visto era somente aparência mesmo –– disse já não chorando mais.
As meninas não sabiam muito bem o que falar, nenhuma das duas tinha passado por uma situação semelhante e estavam realmente só como um ombro amigo, até que finalmente Clarissa quebrou o silêncio.
–– Amiga, mesmo que sua expectativa tenha sido quebrada e que seu coração também tenha sido, acho bom você falar com ele, é bom a gente ouvir o outro lado da história. –– disse acariciando os cabelos de Mariana.
–– Mari, olha, a impressão que eu tive da reação dele é que talvez ele tenha realmente algo a dizer, e que você deve realmente ir atrás disso. –– disse Rebeca limpando as lágrimas dos rostos de Mariana.
–– Não sei se tenho forças para vê-lo de novo, para falar com ele. –– disse Mariana que parecia estar reduzindo seu choro.
–– Às vezes a gente tem que tirar forças que a gente nem imagina que tinha. –– disse Rebeca enxugando as últimas lágrimas de Mariana.
–– Use todas as emoções e lembranças que você tem dele e as transforme não em sua fraqueza, mas em sua fortaleza. –– disse Clarissa segurando as duas mãos de Mariana.
–– Eu vou tentar… –– disse Mariana interrompida pelo som da porta que se abria com a chegada de André.


Capítulo 19 - Eu queria que fosse diferente...

Depois de mais uma noite sem nenhum resquício de sono, Clarissa conseguia sentir seu corpo inteiro pedindo por descanso. Enquanto observava o sol nascer aos poucos pela janela do quarto, não conseguia acreditar que voltaria para casa naquele dia. Seu coração doía profundamente com a possibilidade de nunca mais ver Van na sua vida. Ela iria embora e deixaria para trás um grande mal-entendido, que a perseguiria por anos e tiraria seu sono por várias noites. Era sempre isso que acontecia, e que, inclusive, já estava acontecendo. Clarissa não conseguia parar de pensar em como poderia ter feito diferente e tudo o que teria acontecido se ela tivesse agido de outra forma.
Enquanto observava André dormir tranquilamente na cama ao lado, sentia no fundo de seu peito que não queria que as coisas terminassem desse jeito. Enquanto tentava imaginar como seria a melodia da música cuja letra já sabia de cor, sentiu seu celular vibrar. Na tela, o nome de Daniel piscava. A causa de tudo. O motivo pelo qual a vida de Clarissa começava sempre a desandar quando estava começando a melhorar. Olhando o celular tremendo em suas mãos, ela riu. Riu porque não deixaria que isso acontecesse nunca mais, que outra pessoa decidisse sua vida.
Depois de recusar a chamada, apagou o contato. Mas sentia que isso não era suficiente por todo o sofrimento que já tinha passado, então mandou uma mensagem em que dizia o que já deveria ter dito há muito tempo. Finalmente, Daniel estava morto. Clarissa havia o matado para não morrer. E não podia morrer antes de falar com Van McCann uma última vez, por isso levantou e trocou o pijama por uma calça jeans antes de sair do quarto, às 6h da manhã.
Não sabia o que iria fazer, pois já tinha tentado falar com o Van no dia anterior e tinha sido ignorada com sucesso, e com razão, então não tinha ideia de como iria resolver isso. Rumou para o hotel dele mais uma vez e cumprimentou a recepcionista que a atendera no outro dia antes de sentar na recepção. Resolveu não discar no quarto dele dessa vez, para que ele não ficasse preso lá para sempre como da última vez, e pegou uma revista da mesinha de centro para se distrair, mas acabou fechando os olhos para descansar um pouco.
Acordou com alguém balançando seu ombro. O sol já estava mais forte, o que sugeria que tinha passado algum tempo, Clarissa chutou que deveriam ser umas 9h e ficou morrendo de vergonha por ter dormido na recepção de um hotel que nem era seu. Ficou meio desnorteada, tentando entender onde estava e quem era, e arregalou os olhos quando viu Van à sua frente, se ajeitando rapidamente na poltrona em que estava esparramada e procurando algum vestígio de baba nos cantos da boca.
–– O que você está fazendo aqui? –– ele perguntou, tentando parecer sério.
–– Eu… –– ela tentou formular alguma frase, mas nem ela mesma sabia o que queria dizer. –– Ia pensar no que te dizer quando chegasse aqui, mas acabei cochilando. –– resolveu ser sincera.
Ele continuava calado, a encarando, e Clarissa sorriu por ele estar ali e por poder ter a chance de vê-lo mais uma vez antes de ir embora. Seus olhos claros transmitiam uma verdade que nunca tinha visto em outros olhos e ela não queria que eles ficassem tristes novamente.
–– Van, eu sinto muito. –– falou baixo, observando o rapaz olhar para o chão. –– Sinto muito mesmo. –– continuou. –– Pela forma que te tratei, não queria ter dito aquelas coisas.
–– Machucou. –– ele disse, baixo, ainda olhando para o chão.
–– Eu sei. –– ela suspirou. –– Que merda. Não era para ter sido daquele jeito. –– passou a mão pelo rosto. –– A música é perfeita. Eu nem sei como te falar o quanto é linda, está acima de palavras.
Ele sorriu timidamente, levantando um pouco o olhar.
–– Você nem a escutou. –– ele disse, intercalando o olhar entre ela e o chão.
–– Não, mas já decorei. –– ela sorriu. –– I’d love to find myself looking straight up to you for the answers…

[COLOCAR A MÚSICA PARA TOCAR]

Ele sorriu abertamente dessa vez e Clarissa sentiu o coração aquecer.
–– Quer ouvir? –– ele perguntou, a olhando.
–– Quero muito. –– sorriu, querendo chorar de felicidade.
Ele estendeu a mão para ela, que a segurou e, ao levantar, envolveu Van num abraço inesperado. Ele a envolveu também, por fim, sorrindo enquanto sentia novamente seu cheiro.
–– Senti muito sua falta. –– ela sussurrou no ouvido dele.
–– Eu também. –– ele sorriu antes de puxá-la pela mão até o elevador. –– A recepcionista me ligou.
–– Eu juro que não pedi dessa vez. –– ela arregalou os olhos.
–– Eu sei. –– ele riu. –– Ela ficou com pena de você, disse que estava aqui desde 6h e dormiu.
–– Você é mau. –– as bochechas dela coraram. –– Esperei umas três horas ontem.
–– Ei, eu também esperei muito no seu hotel, bonitinha. –– ele falou. Ainda estavam de mãos dadas. –– E você nem estava lá.
–– Meu Deus, eu nem fiquei sabendo. –– ela riu.
–– Pois é, foi um dia antes do… –– ficou em silêncio.
–– Do dia em que eu fui uma babaca. –– ela disse. –– Pode falar, Van McCann.
–– Isso. –– ele riu, antes de puxá-la para fora do elevador em direção ao quarto. –– Do dia em que você foi uma babaca. –– repetiu. –– Escrevi mais músicas sobre isso, inclusive, se estiver interessada.
–– Mas é óbvio que estou! –– ela riu, animada, quando entraram no quarto.
–– Não repara a bagunça, estou arrumando as malas. –– ele disse e o coração dela apertou, mesmo que ela também estivesse indo embora. –– Mas você ainda não me disse o porquê de ter sido uma babaca. –– sentou na cama, pegando o violão que estava ali.
Ela suspirou, sentando ao lado dele.
–– Meu ex-namorado tinha me ligado. –– encarou os olhos dele. –– Mas, não se preocupe, eu já o matei. –– observou Van arregalar os olhos antes de rir. –– Modo de falar.
–– Justificado. –– ele riu antes de começar a tocar.
A música era perfeita, melhor do que Clarissa poderia imaginar e mais bonita do que qualquer uma das melodias que ela tinha inventado na cabeça. Era maravilhosa.
Eles passaram o resto da manhã juntos, Van cantou as outras duas músicas que tinha escrito e Clarissa estava cada vez mais apaixonada. Ajudou ele arrumar as malas, pois, coincidentemente, ele também iria embora naquele dia. Tinha mandado a música para a gravadora em Llandudno e eles tinham adorado, a banda estava esperando-o para gravar. Clarissa ficava feliz em fazer parte daquilo.
Por volta das 13h, eles foram caminhando até o porto. O voo dele era antes do dela e ele precisava pegar a balsa das 13h30 para chegar em Atenas a tempo.
Nenhum dos dois se atreveu a falar nada quando chegaram. Seguravam as mãos um do outro e Clarissa permitiu-se chorar quando ele a abraçou.
–– Obrigado. –– ele sussurrou no abraço. –– Por tudo. –– a apertou mais forte. –– Tudo isso é graças a você.
Ela o afastou, encarando seus olhos azuis, que estavam marejados, e segurou o rosto dele antes de aproximá-lo e beijá-lo pela primeira vez. O beijo era salgado, por conta das lágrimas que escorriam em ambos os rostos, e tinha gosto de saudade.
–– Vem comigo. –– ele pediu quando se separaram e Clarissa balançou a cabeça, tirando um envelope da bolsa e entregando-o para Van.
–– São suas fotos. –– ela sorriu por entre o choro. –– E tem uma minha também, para se lembrar de mim.
Ele riu, limpando as lágrimas que escorriam.
–– The minute you’re up for it, I mean it, we’ll find a little moment in time to set up somewhere different for a while. –– ele cantou um pedaço da música antes de beijá-la novamente, pela última vez.
Vê-lo subir na balsa doeu. Ela queria ir com ele, mas sabia que tinha muita coisa para resolver em sua vida e consigo mesma antes que pudesse se jogar de cara em outro relacionamento. Apesar disso, sentia aquela sensação boa no pé da barriga que sentimos quando estamos começando a nos apaixonar, e esperava que Van esperasse por ela lá na Inglaterra, enquanto ela sonhasse com ele no Brasil. Que eles pudessem se encontrar, nos sonhos, na Grécia que germinou o amor deles.
Enquanto o via acenar da balsa com o violão nos ombros, lembrou de algo que fez seu sorriso se transformar numa expressão surpresa. Tinha esquecido de perguntar uma coisa importante e correu até a beira do cais para que ele pudesse a escutar.
–– A música. –– ela gritou. –– Qual é o nome?
Ela conseguiu escutar ele rindo antes de responder:
–– Clarissa.

Enquanto isso, Mariana desceu do quarto e foi em direção ao balcão de atendimento, na esperança de encontrar-se com Gregg. Infelizmente, ele não se encontrava, mesmo sendo o dia em que ele trabalhava lá.
–– O Gregg não deveria estar aqui? –– disse Mariana para a recepcionista que nem havia percebido sua presença.
–– Teoricamente, era sim para ele estar aqui, mas ele pediu o dia de folga –– disse a moça depois de levar um pequeno susto com a aproximação da hóspede. –– Eu pensei inclusive que ele tinha pedido esse dia de folga para passar o dia com você e seus amigos.
–– Eu sei por que ele pediu esse dia de folga... Você por acaso saberia onde eu posso encontrá-lo?
–– Ele saiu com a bolsa que ele sempre leva quando vai para a praia, então ele deve estar lá. –– falou a balconista vendo Mariana se virar em direção a porta e com um rápido andar sumir de sua visão.
Mariana cruzou a avenida beira mar e, ainda na calçada, tentou procurar alguma figura familiar. E percebeu que uma pessoa saía do mar quase que na sua reta, mesmo com as distâncias seus olhares se encontraram, e ali teve a certeza de que era Gregg.
Ele andava em direção ao calçadão com um olhar cabisbaixo, indo já em direção a Mariana, que estava sentada na beirada com os pés na areia.
–– Oi, Mari… –– disse com uma voz baixa que só Mariana conseguia ouvir, e teve somente um leve balançar de cabeça como resposta. –– Eu te devo uma resposta sobre tudo aquilo.
–– Eu ia gostar muito… –– Mariana disse com a voz um pouco rouca.
Ele balançou a cabeça, assentindo, antes de sentar-se na frente dela na areia.
–– Eu, Mariana, nunca fui uma pessoa que almejava relacionamentos sérios, que tinham sentimentos reais envolvidos, que não fossem somente um encontro de um dia. –– disse com um olhar triste –– Eu sempre saí com muitas meninas, às vezes várias em uma mesma semana, e não foi diferente quando você esteve aqui, infelizmente você foi uma das várias meninas que saí, mas você foi diferente de todas.
Ela rolou os olhos como se não acreditasse. Ele riu antes de continuar:
–– Eu também não acreditaria em mim se fosse você. –– levantou os ombros e bateu as mãos umas nas outras a fim de tirar um pouco da areia que grudava em sua pele molhada. –– Não precisa acreditar se não quiser, só achei que te devia essas explicações. –– encarou Mariana, que olhava discretamente para seus pés para evitar o contato visual. –– E é verdade. Tudo o que eu disse. Para não dizer que nunca tive uma namorada, eu tive, no primeiro ano do Ensino Médio. O nome dela era Betty e ela era mais velha que eu. Ficamos juntos por duas semanas e cinco dias, até eu me apaixonar pela irmã dela. –– Mari arregalou os olhos e Gregg riu.
–– Você namorou duas irmãs? –– ela perguntou, voltando os olhos para ele.
–– Não. –– ele balançou a cabeça. –– Eu terminei com Betty e fiquei com a Taylor até eu me cansar dela no dia seguinte.
–– Ah. –– ela suspirou. –– Que inspirador.
Gregg riu.
–– Estou sendo sincero. –– ele levantou os dois braços em sinal de rendição. –– Foi naquele dia que eu percebi que realmente não servia para namorar. Eu queria estar com todo mundo que eu via. –– ele riu. –– Quando vi você, achei que seria divertido ficar contigo, como com qualquer outra garota que eu já fiquei. Mas não foi.
Ela juntou as sobrancelhas e semicerrou os olhos enquanto olhava para ele, incrédula. Além de tudo, não tinha sido divertido pra Gregg ficar com ela? Por que ela ainda estava ali ouvindo ele mesmo?
–– Foi bem mais que divertido. –– ela acalmou os ombros, tentando disfarçar um sorriso. –– Eu senti, Mariana. Pela primeira vez, eu senti as borboletas que todo mundo fala e que eu nunca acreditei que realmente existissem. Senti o frio na barriga toda vez que você chegava perto e me senti vazio toda vez que você saía. Eu me arrepiava a cada toque do seu beijo, a cada abraço. Além disso, quando eu vi você saindo daquele restaurante, foi a primeira vez que eu senti a sensação de um coração partido, ao ver que eu não te tratei da maneira que meus sentimentos pediam.
–– Eu queria que fosse diferente... –– Mariana disse começando um leve soluçar. –– Queria que não acabasse assim, porque mesmo eu não devendo acreditar em você, eu sinto a mesma coisa e meu coração esteja talvez falando mais alto.
–– A gente pode tentar fazer ser diferente, esse não precisa ser o nosso final… –– disse Gregg pegando as mãos de Mariana.
–– Não sei o como a gente poderia fazer isso… –– disse segurando com mais força as mãos de Gregg.
–– Não sei… –– ia dizendo Gregg ao ser interrompido.
–– Mas eu estou disposta a descobrir… A construirmos algo juntos. –– disse se levantando juntamente com Gregg e dando um beijo que aquecia o corpo ainda molhado de Gregg.


Capítulo 20 - Até logo!

Os amigos com um pesar no coração, com um sentimento de que algo deles estava sendo deixado para trás, e de certa forma estava. Cada um ao passar por aquela linha, que os impedia de voltar, via tudo que havia vivido naquela viagem, todas as maravilhosas vistas e pessoas ganhando o privilégio de ter vivido a melhor viagem da vida deles.
Mariana, ao atravessar por aquela linha, viu ao olhar para trás, sobre o ombro, Gregg, que tinha olhos que brilhavam com uma aparência de choro, mas um sorriso que ia de orelha a orelha que brilhava de amor, e esse último olhar dos dois foi um "isso ainda não acabou" e a esperança de um grande amor era a principal lembrança que Mariana trazia consigo, não na mala, mas sim no coração.
André demorou um pouco a passar por esse divisor de águas, sendo o último a atravessá-la, o abraço que dava em Omar naquele momento era infinito e uma força mais forte que os dois os impedia de terminar o abraço, mas que teve seu fim ao som do nome de André sendo gritado por Rebeca, já quase na fila do raio-X. André sabia que aquele não era o fim, mas doeu no coração dele como se fosse, e a expressão de choro de Omar parecia transmitir o mesmo sentimento. Tanto André quanto Omar precisavam um do outro, e foi essa responsabilidade que entrou no avião juntamente com o amor.
Rebeca não teve dificuldades, nesse momento, em relação a questão amorosa –– o que ainda teria ––, mas esse momento não foi mais fácil para a mesma. Rebeca, ao perceber que realmente a viagem havia acabado, sofreu ao lembrar de todas as lembranças boas que havia criado com os amigos, tanto os antigos quanto os novos, principalmente com o que ainda a acompanhava pelo raio-X, Michael. O coração de Rebeca, todavia, era forte e mesmo tendo essa dor sabia que carregaria essas lembranças para sempre e que elas trariam um sorriso ao seu rosto sempre que lembradas.
Clarissa não tinha ninguém para olhar, pois a despedida mais dolorosa havia acontecido mais cedo. Nem tinha conversado com McCann depois da despedida no porto, talvez o mesmo já tivesse no avião indo para o Reino Unido, não sabia como iria prosseguir depois daquilo, não tinha planos, todavia tinha emoções, e fortes emoções, e para ela naquele momento bastava. Emoção de estar terminando um ciclo em sua vida junto com seus amigos e via aquela despedida, aquele fim de viagem, como o início de mais um ciclo e não podia esperar nem mais um segundo para vivê-lo.
Os cinco amigos, já tendo passado por todos os protocolos de segurança, agora se encontravam nos portões de embarque e um silêncio ensurdecedor criava um clima estranho entre os amigos, a próxima despedida talvez seria mais forte que as anteriores e era a agonia dessa despedida que gerava todo o silêncio.
Michael seria o primeiro a ir embora da Grécia, não indo junto com Mariana desta vez, e o processo de despedida foi difícil, principalmente para Rebeca, que se segurou para não chorar em frente de seu namorado, mas no momento em que o nome de Michael ressoou nos altos falantes, os amigos se deram conta de que não havia mais jeito, era preciso completar mais essa despedida. Rebeca, mesmo sendo a mais forte do grupo, não conseguiu evitar que uma lágrima caísse quando já não era possível ver Michael.
O grupo, agora formado por quatro pessoas, se olhava e via que a cada minuto que passava o coração de cada um apertava cada vez mais e mais, todavia sabiam do destino inevitável. Rebeca, André e Clarissa seriam os próximos, o grupo teve a oportunidade de ainda ficar uma hora juntos antes que o embarque do trio começasse, o que fez com que achassem que a despedida fosse fácil, entretanto foi a despedida mais difícil que o grupo faria.
Chegou o momento, ninguém sabia muito bem como agir. André levantou pegando sua mochila que estava no chão e iria por ela nas costas, se não tivesse sido impedido por Mariana que o abraçava enquanto chorava, dizendo:
–– Não vão, gente! Eu não quero dizer adeus mais uma vez.
Clarissa e Rebeca nesse momento entraram no forte abraço que Mariana dava em André, o que chamava a atenção dos outros passageiros, que olhavam não por desdém, mas com sorrisos nos rostos de ver aqueles grupos de amigos, sendo uma cena de felicidade e não de tristeza.
–– Nunca te demos "adeus", Mariana, sempre foi um "até logo". –– disse Clarissa enxugando suas lágrimas com a manga de sua blusa.
A despedida aconteceu, o trio havia se separado de Mariana, que estava sozinha no aeroporto. A sensação de solidão que Mariana estava sentindo juntamente com as fortes emoções que tinha pelos amigos e por Gregg a fizeram fazer algo que mudaria a sua vida, todavia, irei primeiro contar o que se deu com o trio que partia para o Brasil.
Os três sentaram perto das asas do avião, e por alguns minutos ficaram em silêncio, a despedida tinha sido algo forte demais, André nem conseguia falar desde o abraço inesperado de Mariana, Clarissa estava incapacitada de falar pelo choro incessante que tinha e Rebeca estava a pensar de tal forma que se desligou do mundo. E o grupo ainda teria que se despedir mais uma vez, todos mesmo indo para São Paulo, iriam se separar, pois cada um teria uma jornada a seguir. André iria para Recife, pois tinha um congresso em Recife em que iria apresentar seu trabalho; Rebeca iria de volta para Brasília, pois tinha que participar da cerimônia de posse do novo ministro do STF, seu pai, e começar seus preparos para a prova da OAB; e Clarissa decidiu cancelar sua passagem para Brasília, pois surgiu uma proposta de emprego em um jornal importantíssimo de divulgação cultural da cidade.
Incrivelmente, por causa desses momentos a vida de todos foi recheada de futuros brilhantes: Rebeca, depois de ver o sucesso do pai na carreira de advocacia, criou o seu próprio sucesso sendo uma das mais brilhantes advogadas empresariais do país; Clarissa conseguiu o tal cargo no jornal paulista, cargo de editora-chefe, e conseguiu que o jornal tivesse alcance nacional, com suas medidas editoriais, ficando conhecida como umas das mais importantes do ramo, mas o seu futuro iria ter uma segunda reviravolta, no momento que recebesse uma chamada do Reino Unido, mas especificamente da Inglaterra; André, com a apresentação que fez em Recife conseguiu a confirmação que seu trabalho deveria ser desenvolvido em um mestrado em Paris, na Universidade de Sorbonne, com direito inclusive a bolsa de 80% para seus estudos.
Todavia, isso era o futuro, atualmente o trio ainda se encontrava no avião, os três estudando, André estudava sua fala que faria no congresso, Rebeca arrumava seu discurso que faria a seu pai e Clarissa analisava a proposta que a empresa havia a encaminhado. Estudo que foi atrapalhado, quando Clarissa e Rebeca perceberam que gotas caíam nas páginas do trabalho de André, demoraram a entender que eram lágrimas. Rebeca tentou dizer algumas palavras, mas não conseguia, também começou a chorar e só um abraço conseguiu fazer, abraço que quando juntado com o de Clarissa valiam mais que mil palavras.
Mas, deixe de ansiedade, leitor, você deve estar se perguntando o que ocorreu com Mariana, pois eu mesmo disse que a vida dela mudou depois da ida dos amigos e agora irei contar.
Mariana passou uns 10 minutos sozinha, sentada no banco ainda em frente ao portão de embarque do trio que foi para o Brasil. Pensava enquanto ainda escorriam lágrimas em seu rosto, Mariana tinha também saído abalada dessa viagem, por motivos tanto bons quanto ruins, mas tinha sido uma reviravolta na sua vida. Mariana nunca tinha se sentido tão viva, como na Grécia, como em Skopelos, como com a companhia de Gregg e sabia o que estava a pensar, pois já havia pensado isso em outros momentos da viagem e mesmo antes.
Pensava em não voltar para os EUA, já havia terminado sua graduação em administração e já possuía certa independência de seus pais, mas não se sentia totalmente completa e, no momento que estava no aeroporto a pensar sobre isso, seria a oportunidade que ela sempre desejou e possivelmente a única. O medo, todavia, a fazia recuar, obviamente sentiria falta de seus pais e de seus amigos americanos, mas valeria a pena essas perdas para o que ela sempre procurava? O que Mariana fez?
Os quatro amigos combinaram de, no dia seguinte, se encontrarem via houseparty para uma conversa para ver como estavam em seus respectivos destinos, contarem alguma novidade e lembrarem um pouco da viagem. André foi o primeiro a entrar na chamada, seguido por Mariana e Clarissa que entraram quase no mesmo tempo e Rebeca que entrou uns cinco minutos depois e a conversa fluiu por uns 10 minutos em que Clarissa contava da entrevista que havia tido mais cedo naquele mesmo dia.
–– Mariana, você está bem? –– André disse percebendo que Mariana estava um pouco inquieta e algo o intrigava acerca de onde ela estava.
–– Ai, gente, não queria atrapalhar a empolgação da Clarissa, mas eu tenho uma notícia muito, muito importante para dar para vocês, vocês não reconhecem nada, não? –– disse Mariana com uma voz viva de emoção.
–– Eu não… Acredito … eu sabia que reconhecia esse fundo de algum lugar! Você está no hotel ainda!? –– disse André ficando boquiaberto.
–– O que aconteceu, Mariana, o seu voo foi cancelado? –– disse Rebeca que quase pulou da cadeira de susto.
–– Gente, muita coisa aconteceu na verdade! Depois que vocês foram embora eu comecei a pensar o que que me levava voltar para os EUA e eu percebi que nada me puxava de volta, o contrário, na verdade, eu era atraída por aquele lugar… E eu meio que fiz a maior loucura da minha vida… Eu voltei para Skopelos… –– disse Mariana com um pouco de medo da reação dos amigos.
Reação essa que foi animadíssima, ver a amiga feliz foi o que fez os amigos gritarem um som uníssono e quase pularam de suas cadeiras. Essa viagem tinha muitas loucuras, todavia essa teria sido a maior de todas e a mais empolgante, mesmo para o trio que não estava a vivenciá-la.
–– Amiga, a gente quer saber tudo. Conta cada detalhe. –– disse Clarissa que já não tinha nada mais em mente.
–– Gente, foi assim… –– disse Mariana começando a contar sua aventurosa história.




Fim.



Nota da autora: (04/09/2020) Oi, gente! O que acharam? Essa é minha primeira fanfic, escrevi ela com muito carinho! Ela já está toda pronta, então as atualizações não irão demorar nada! Vou mandar os capítulos de dois em dois. Espero muito que vocês gostem e acompanhem! Estou muito feliz em publicar aqui.

Ei, leitoras, vem cá! O Disqus está um pouco instável ultimamente e, às vezes, a caixinha de comentários pode não aparecer. Então, caso para você deixar a autora feliz com um comentário, é só clicar AQUI.


Nota da beta: Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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