Última atualização: 30/12/2018

Primeiro Capítulo

— Mãe?

A casa está tomada pela escuridão. Tenho certeza de ter escutado um barulho na
Sala. Tento esfregar meus olhos para poder conseguir enxergar. A visão está turva.
Ouço um barulho vindo da sala.

— Mãe? — Volto a chamá-la, tentando fazer meus olhos se acostumarem com a luz que vinha da sala.

— Sky, não venha! — Minha mãe grita.

— Mãe? — Repito assustada, chegando mais próximo da sala.

Sinto meu coração acelerar ao ver a cena. Meu pai está jogado, de bruços no chão, e havia bastante sangue no piso de madeira ao seu lado. Volto a olhar para minha mãe, que usa uma camisola rosa claro. Eu amo vê-la com aquela camisola, mas, agora, ela está vermelha em seu abdômen. Era sangue!

— Pai? Acorda. O que aconteceu? Pai! — Aproximo, correndo para perto dele. Viro para minha mãe, que tenta caminhar em minha direção.

— Sky, vá para o seu quarto. Se esconda, filha. A mãe te ama muito! Tudo ficará bem. Por favor, vá para o seu quarto! A polícia já está a caminho. — Ela fala baixo, segurando seu abdômen. Ela está pálida. Continua linda, mesmo naquela condição. Como minha mãe é linda. Ela tem olhos castanhos, cabelos marrons e adora fazer tranças. Quando faz, não só eu como o meu pai ficamos encantados com sua beleza!

Eu estou com medo, não sei o que está acontecendo. Sinto meu coração bater cada vez mais rápido. Espera... Polícia? Fico mais atordoada. O que realmente está acontecendo?

— Mãe o que está acontecendo? — Quase grito.

Vejo uma luz forte vir em minha direção no momento em que viro. Sinto algo cortar meu ombro esquerdo. Aquilo dói e arde muito. Logo, olho para o lugar cortado e vejo sangue deslizar em minha pele. Não consigo dizer nada, apenas escuto um som bem abafado. Deve ser minha mãe gritando meu nome. Ouço um “Deixa ela em paz!” logo em seguida.

Ao cair no chão, olho direto para ela e vejo uma sombra atingi-la no pescoço. Ela cai do meu lado. Seus olhos estão abertos e ela me encara. Juro que sinto seu olhar mais distante, como se não estivesse mais ali. Reparo que o sangue de seu pescoço escorre sobre o piso. Aquilo não está acontecendo. Eu quero chorar, gritar, mas eu não consigo. Então, a sombra se volta para mim. Não consigo ver seu rosto, por mais que eu tente. Isso não está acontecendo!

No momento em que a sombra para em minha frente com uma das mãos levantadas,
vejo uma faca vindo em minha direção...

— Bip, Bip! Bip, Bip! — Levantei em um pulo. Senti minhas costas toda suada. Pingos e mais pingos de suor corriam pelo meu rosto. Olhei para a minha manga, que estava caída sobre o ombro, mostrando minha cicatriz e ajeitei-a. Desliguei o alarme e esfreguei o rosto.

— Droga! De novo não. — Queria apagar essas lembranças. Eu tenho que apagá-las.
Ouço uma batida na porta e logo alguém a abre.

— Sky, está atrasada. — Era minha tia Betty. Ela, com seus cabelos lisos e marrons, usava um vestido florido vermelho. Não deixei de notar que vermelho lhe caia muito bem. Ela é linda, assim como minha mãe era. As duas se pareciam muito.

Ela me encarou, apavorada.

— Querida, você está pálida, o que houve? Teve pesadelos de novo? — Ela se aproximou da minha cama e se sentou ali mesmo.

— Sim. — Falei em um suspiro.

— Sky, por que não volta para as consultas do Dr. Ruiz? Ele pode voltar a te receitar remédios para te ajudar a dormir. — Ela disse, agora alisando meus cabelos rebeldes.

— Não, tia, não quero ficar me drogando para poder dormir como uma pessoa normal. Eu quero voltar a ser normal, por mim mesma. Preciso superar esses medos, essas lembranças... — Falo fitando o meu cobertor roxo macio. Lágrimas começam a cair em meu rosto.

— Sky, você já tentou várias vezes e não teve resultado... — Ela parou um pouco, logo em seguida postou suas mãos em meu rosto, enxugando algumas lágrimas. — Sinto muito, eu deveria estar te dando força. Eu sei o quanto é difícil, sei o quanto aquela noite estragou sua vida. Como a minha e de seu pai também.

— Sinto falta dela, tia Betty. — Olho para ela com mais e mais lágrimas caindo. Droga, não queria chorar e aqui estou eu, chorando como uma criança.

— Eu sei, querida. Todos nós sentimos. — Ela me abraça.

Queria poder voltar no tempo, mas não posso. Eu precisava tentar mudar meu futuro. Ou seria isso, ou eu terei que aguentar essas lembranças horríveis me atormentarem para o resto da minha vida. Tia Betty me soltou e voltou a ajeitar meu cabelo com um sorrisinho no rosto.

— Vá se lavar, você está atrasada para a faculdade.

— Acho que não vou hoje. — Digo amarrando meu cabelo com um coque e limpando algumas lágrimas. As provas já tinham passado. Estava no último ano da faculdade de artes plásticas. Faltar hoje não seria um problema.

— Ok, então que tal visitar seu pai hoje? — Ela perguntou levantando uma de suas sobrancelhas.

Sim! Meu pai! Eu precisava visitá-lo. Faz dois meses que ele acordou do coma. Ele ainda precisa ficar no hospital em observação por ter ficado três anos em coma. Em relação ao meu pai, aquilo sim foi um milagre. Desde aquela época, meu pai ficou internado. Seus ferimentos eram graves, passou dois anos no hospital e, depois, houve uma complicação em uma cirurgia onde o deixou em coma por três anos. Os médicos já diziam para nos prepararmos para o pior, mas, no fundo, eu sabia que meu pai era forte. Qual é! Ele era um policial, enfrentou várias e várias situações. Ele iria passar por mais aquela e no final acertei.

— Vou me arrumar. — Disse me levantando da cama.

— Vou preparar seu café. Quer ovos mexidos? — Ela me perguntou caminhando até a porta. Fiz um barulho com a boca, que significara um “sim”.

Entrei no banheiro, peguei minha escova de dente, coloquei a pasta e a pus em cima do box. Em seguida, me despi e liguei o chuveiro. Eu realmente precisava de um banho. Precisava tirar aquela consequência do pesadelo, aquele suor que molhou minha cama inteira. Aproveitei o máximo da água quente caindo no meu corpo. Adoro quando a água cai na cabeça, parece que tudo de ruim vai embora junto com a mesma. Eu franzia o rosto toda vez que a água encostava-se à minha cicatriz enorme no ombro. Ah, aquela cicatriz. Como eu a odeio!

Peguei a escova, escovei meus dentes e desliguei o chuveiro em seguida, enrolando a toalha no meu corpo. Coloquei a escova no lugar, peguei minhas roupas no chão e voltei para o quarto. Abri meu guarda-roupa e peguei meu vestido preto com manga comprida. Não me importava se estivesse calor, eu só queria esconder aquilo no meu ombro.

Aquilo me enojava, eu sentia ódio só de vê-la. Olhei-me no espelho antes de colocar o vestido para encarar, mais uma, vez aquele monstro no meu ombro. Eu me achava feia por conta dela.

Peguei meu all star preto com detalhes brancos e o calcei. Penteei meus cabelos e dei uma ajeitada com os dedos no mesmo. Eu o adorava. Era a única coisa que fazia ter 3% da minha autoestima em pé. Os outros 97%, a cicatriz estragava. Meu cabelo era preto e ondulado. Eu realmente o amava. Ok, menos quando ele fica rebelde. Isso me estressava demais.

Peguei minha bolsa, que se parecia mais uma mochila pequena, e fui direto para a escrivaninha próxima a minha cama para pegar meu celular. Tirei-o do carregador e deslizei a tela. Havia três mensagens. Era do Jimmy.

HOJE


Hey Skype!
Tá acordada?
Sky?

Oi Jimmy. Agora estou, o que vc quer?

Nossa, é assim que se trata o seu melhor amigo?
Mais respeito, por favor!

Desculpa Sr. importante, ñ tive uma noite boa.

Pesadelos de novo?

Sim... Já tentei de tudo para esquecer aquilo.
Mas cada vez piora.

Vc não tentou de tudo. Ainda não me usou pra tentar esquecer!
Brincadeira! Queria poder estar aícom você... Sinto sua falta, Sky.

Haha idiota! Também sinto.

É muito chato ficar longe da sua amiga
por 5 anos, me sinto só :(

Quanto drama Jimmy, nos falamos
quase todos os dias!

“Quase”, quero falar com vc todos
os dias... E aí, quais são os planos de hoje?
Não deveria estar na faculdade, mocinha?

Awnnn! Muito fofinho, nunca imaginei
que o Jimmy Scott poderia ser tão fofo ♥
Deveria, mas hoje vou visitar meu pai.

Sempre fui, linda!
Manda um abraço pra ele, meu pai sente
saudades dele. Os dois não se desgrudavam...
Vá e me fala como ele está, ok? Se puder me ligar, melhor,
assim posso ouvir sua voz também.

Meu pai sente falta dele também. Pode deixar.
Ouvir minha voz? Mais do que vc já ouve?
Vai acabar enjoando.

Nunca. Vou para o treinamento agora!
Beijos, Skype.

Bom treinamento. Beijos, Jimmy ♥


Bloqueio o telefone e vou em direção à porta. Olho para a mesa e vejo a tia Betty colocando suco no copo... Acredito que seja meu.

— Vem comer, vai esfriar — ela alerta, indo para a cozinha.

Sentei-me à mesa e comecei a comer os ovos mexidos deliciosos da tia Betty. Bebo o resto do suco e, ao terminar de comer, vou direto para a porta.

— Quer que eu vá com você? — Tia Betty pergunta.

— Não, não precisa! Até mais tarde, tia! — Abro a porta.

— Diga ao seu pai que mais tarde vou visitá-lo — ela grita da cozinha.

— Ok! Beijos! — Grito de volta, agora fechando a porta.

Chamei um táxi e fui direto para o hospital. Ao chegar na recepção, vejo uma das enfermeiras sorrindo para mim.

— Srta. Owens, que bom te ver aqui. Veio ver seu pai? — Ela continuava sorrindo.

— Bom dia Sra... — Olho para seu crachá. Não decorei o nome dela ainda. As mulheres da recepção sempre mudavam. — Sra. Rivers. — Volto para o seu rosto, abrindo um sorriso desajeitado.

— Ah, por favor. Me chame de Lizzy — ela fez um movimento com a mão. — Venha, vou levá-la para o quarto do seu pai. — Me guiou em direção ao corredor.

Chegando à porta, ela a abre e volta a sorrir para mim.

— Pode ficar o tempo que precisar. Mais tarde, o médico irá levá-lo para mais exames. Qualquer coisa, é só chamar apertando o botão vermelho perto da maca.

— Obrigada, Lizzy. — Sorrio e ela sorriu de volta.

Vejo meu pai deitado, me olhando com um belo sorriso no rosto. Seus cabelos com poucos fios brancos apareciam vagamente. Seu sorriso extraordinário iluminou mais uma vez o meu dia. Meu pai era um homem alto, tinha uma estrutura física maravilhosa por conta do seu trabalho. Eu o adorava vê-lo chegar em casa com seu uniforme de policial. Que saudades daquela época...

— Minha Sky! Cada dia mais linda. — Ele abriu os braços.

— Oi, pai. — Aproximei e o abracei. — Como o senhor está? — O observo.

— Estou melhor agora, com sua visita filha. Ótimas notícias. Terei alta essa semana! — Ele sorriu ainda mais.


Segundo Capítulo

— Sério? Mas a enfermeira me disse que o médico fará mais exames. — O olhei, confusa.

— Exato. Serão uns exames finais. Ver se está tudo em ordem e tal, assim poderei voltar para casa o mais cedo possível. — Ele me olha e noto que o sorriso some aos poucos.

— A tia Betty é uma ótima cozinheira, pai! O senhor vai amar a casa em que estamos morando. Tem um jardim pequeno atrás da casa... — Tentei fazer seu sorriso voltar.

— Sky — ele me interrompeu. — Falo em, realmente, voltarmos para casa. Nosso verdadeiro lar. Nossa cidade natal. — O sorriso vai sumindo cada vez mais.

Fico sem palavras. Meu pai quer voltar para aquele lugar? Mesmo depois de tudo? A cidade é pequena. De acordo com Jimmy, as pessoas ainda comentam sobre o ocorrido. Como vou esquecer tudo aquilo voltando para aquele inferno? Fiquei cada vez mais pálida...

— Sky! — Meu pai segura minha mão. — Tudo vai ficar bem. Vamos morar em outro bairro... Não tenho coragem de voltar para aquela casa. Mas quero muito voltar para aquela cidade. Aquele lugar me lembra a sua mãe, é como se ela estivesse lá. Na verdade, ela está lá. Sinto falta dela. — Ele me olha com lágrimas prestes a cair de seus olhos.

Lembrei-me do túmulo da minha mãe. Ela realmente está lá. Eu precisava de um pouco mais tempo... Meu pai estava se recuperando ainda. Mas eu não podia rebelar. Não podia dar mais problemas para ele.

— Tudo bem. Se é o que o senhor quer, vamos voltar para lá. — Agora era minha vez de apertar sua mão.

— Vai ficar tudo bem mesmo? Você que voltar? — Ele disse piscando os olhos, surpresos.

— Sim, pai, vai. — O conforto. — E ainda mais, sinto falta do Jimmy. — Dou um sorriso.

— Ah, o Jimmy! Aquele garoto será um ótimo policial. Como será que o Tom e a Elena estão? Eles vão adorar ver a gente voltando para lá. — Ele sorri imaginando a cena.

— Sim, vão! — Sorrio forçado.

— E a sua faculdade? Você está nos últimos semestres, não? Como vai fazer? — Ele me olha, preocupado.

— Sim, estou. Posso me transferir para alguma de lá e termino lá mesmo. — Tento confortá-lo mais uma vez.

— E seus amigos? — Ele pergunta mais uma vez, preocupado.

— São apenas colegas, pai. Não tenho aquela amizade com eles. — Afirmo, levantando a sobrancelhas ao falar a palavra amizade.

— Ok, se você está dizendo. Posso pedir para um amigo cuidar de tudo, os papéis e etc...

— Tudo bem. — Sorrio mais uma vez.

Ouço batidas na porta e logo vejo o médico entrar.

— Sr. Owens, Srta. Owens. — Ele sorri olhando para mim e depois volta com o olhar para o meu pai. — Como foi sua noite, Sr. Owens? — Ele pergunta, pegando algo que parece uma caneta com lanterna. Abre os olhos do meu pai e os observa.

— Foi ótima, Doutor.

— Perfeito. Mais tarde volto para levá-lo para os exames finais. Dependendo do resultado, já te libero essa semana, como prometi. — Ele sorri, guardando a caneta-lanterna no bolso do seu jaleco.

Vejo meu pai abrir um sorriso enorme e depois olhar para mim.

— O senhor comentou sobre voltar para sua cidade natal. — O médico o olha e meu pai afirma coma a cabeça. — Então, irei transferir sua ficha para um médico de lá. Ele é um grande amigo meu, tenho certeza que o senhor irá gostar dele. Assim, o senhor poderá seguir o processo lá, caso sinta algo, é claro.

— Não irei gostar mais do que gosto do senhor — meu pai fala e o médico ri em seguida. — Obrigado, Doutor.

— Bom, vou mandar trazer o seu café da manhã. — Ele me olha. — Quer alguma coisa para comer também, Srta.?

— Não, muito obrigada doutor. Já comi. — Dou um sorriso tímido.

— Ok, então até mais tarde, Sr. Owens. — O médico fala, indo em direção da porta.

— Até! — Meu pai responde e logo a porta se fecha. — Ótima pessoa, não? — Ele me olha. Assenti com a cabeça e ele voltou a falar. — Fez mais desenhos? Gostaria de vê-los. — Respondi com a cabeça. Peguei meu caderno na bolsa e o entreguei. Ele os olha em silêncio.

— São maravilhosos, Sky. Quem diria que você herdaria esse talento de sua mãe. — Ele sorri.

— Ela pintava paisagens lindas, pai. Eu só desenho lugares ferrados e abandonados. Não sei de quem puxei esse gosto. Não sou nada comparado a ela. — Franzi a testa.

— Esse gosto é o seu sentimento, Sky. Você coloca no papel aquilo que você sente. Cada um tem sua forma de expressar. — Solto um suspiro ao ouvi-lo falar...

— Acha que vamos ser capazes de superar tudo isso, pai? — O olho, preocupada.

— Sim, querida, vamos. Será difícil no começo, mas vamos conseguir. — Ele me puxa para um abraço.

O café da manhã do meu pai foi trazido por outra enfermeira. As horas foram passando. Passar o dia com meu pai foi tão bom. Sentia saudades dos velhos tempos. Conversamos sobre a tia Betty e suas histórias de brigas com os vizinhos, sobre minha faculdade e como eu era elogiada pelos professores, sobre as notícias que Jimmy me dava sempre via celular e entre outras coisas. Tentava o máximo parar de pensar que irei voltar para aquele inferno novamente.

Eu realmente não queria voltar para Newton. Mas eu tinha, pelo meu pai. Os únicos pontos positivos era ter o Jimmy e seus pais perto de novo. Mas era só isso. Como Jimmy me falou, as pessoas ainda comentavam pelas ruas sobre o ocorrido. Isso só vai ferrar mais o meu plano de tentar mudar o rumo de vida.

Quando me dei conta, já estava perto das 16 horas. Almocei lá no hospital com meu pai e recebi uma mensagem da tia Betty, falando que tinha um compromisso à tarde e que só o visitaria à noite. Meu pai falava alguns planos que tinha em mente. Coisas que ele pretendia fazer quando voltar para Newton. Logo, o médico chegou e o levou para fazer os exames. Despedi-me do meu pai e voltei para casa.

Isso de ter que voltar para aquela cidade martelava minha cabeça à tarde toda. Eu precisava me desabafar... Jimmy logo veio em minha mente. Não pensei duas vezes. Peguei meu celular e procurei seu nome nos contatos. Nem me dei o trabalho de procurar, ele estava lá em segundo da lista, perdendo o topo apenas para a tia Betty. Esperei ele atender...

— Skype? Até que enfim! — A voz macia de Jimmy soava em meus ouvidos.

— Oi, Jim. — Falei soltando um suspiro. Eu amava quando ele me chama de Skype. Um péssimo apelido que só Jimmy Scott poderia inventar.

— O que foi? Aconteceu algo? Seu pai está bem? — Ele se preocupava do outro lado da linha ao ouvir meu suspiro.

— Ele está bem. Está ótimo, na verdade. Talvez ele vá ser liberado essa semana. — O acalmei.

— Que susto, jurava ter acontecido algo. E você? Como está? — Perguntou.

— Mal. Bem mal, Jim. — Respondi segurando as lágrimas. Não quero parecer uma chorona de novo.

— Sky, o que aconteceu? — Sua voz aumentou.

— Meu pai quer voltar... Voltar para Newton. — Uma lágrima ameaça cair. Droga, não!

— Sério? Vamos poder ficar juntos novamente, Sky. Isso é maravilhoso! — Ele falou alegremente, logo percebeu o meu estado. — Desculpe, eu me empolguei. Fiquei feliz em saber que vou te encontrar novamente. — Um silêncio de quatro segundos tomou a linha. — Você não quer voltar, né?

— Não sei. Parte de mim quer voltar, mas a outra parte tem medo. — Expliquei.

— Sky, aqui eu vou poder te proteger. Não deixarei ninguém te machucar... — Outro silêncio de quatro segundos tomou a linha. — E, cara, aqui em Newton está muito melhor. Agora tem vários eventos aqui. Você vai gostar — respirou. — A única coisa que atrapalha é um tal de Jay Simmons. Sou louco para colocar aquele idiota na cadeia, mas, primeiro preciso terminar o treinamento. Droga! — A voz de Jimmy soava como se estivesse sendo impedida pelos dentes.

— Quanto ódio, Jim. O que o cara te fez? — Respondi rindo. Afinal, quem era esse Jay?

— Nasceu. Esse idiota nem era para ter nascido. — Falou indignado.

— Credo, Jim. — Fiz uma careta.

— Sky, voltando ao assunto. É sério, talvez você vá gostar muito de voltar para Newton. Talvez não seja esse monstro que você esteja criando. — Sua voz subiu um tom.

— É, talvez... — Ainda continuava preocupada. Tudo estava tão embaçado na minha mente. Percebi que conversar com o Jimmy não estava me ajudando muito. Logo pensei em algo que nunca falha.

— Jimmy, eu só liguei mesmo para dar um oi. Vou desligar agora e vou desenhar um pouco. — Ouvi a mãe de Jimmy cantarolar do outro lado da linha. — Manda um beijo para a Elena. — Sorri.

— Ok, Skype... Mãe, a Sky está mandando um beijo. — Sua voz afastou um pouco. — Um beijo, Sky, venha logo. — Elena gritou do outro lado.

Meu Deus! Ela já estava sabendo. Impossível o Jimmy comentar com ela enquanto estava falando comigo, eu iria escutar. Talvez meu pai ligou para o Tom. É, deve ter sido isso.

— Hey, se cuida. Qualquer coisa é só me ligar. À noite te mando uma mensagem. Sky, é sério. Estou muito feliz que você vai voltar. — Jimmy não conseguiu conter sua alegria novamente. Dei uma risada

— Só você mesmo. Até a noite, então. Beijos. — Ele mandou beijos do outro lado da linha e desligamos.

Peguei meu caderno e voltei para terminar o desenho. Alguns detalhes faltavam. Como janelas, bancos e algumas árvores... Abri a foto em meu celular da escola abandonada que tinha perto do hospital. Eu sempre a reparava quando ia visitar meu pai. Aproveitei para tirar uma foto e deixar salvo, para depois desenhá-la. Comecei a rabiscar... Eu amava lugares abandonados e medonhos. Não sei, achava esses lugares parecidos comigo, de uma forma que não sei explicar. Desenhá-los me ajudava muito psicologicamente. Um traço aqui, outro ali e mais linhas iam se formando. Pretendia terminá-lo hoje mesmo. Mesmo que iria levar o resto da noite para acabar...

Depois que a tia Betty chegou, ela fez a janta. Conversamos sobre a volta para Newton e ela resolveu ir com a gente. Isso me acalmou mais... Fiz minhas necessidades, tomei um banho, escovei os dentes e, antes de dormir, troquei mensagens com Jimmy. E vamos para mais uma noite de pesadelos...


Terceiro Capítulo

Sinto algo cortar meu ombro. Vejo o olhar da minha mãe se distanciando. A sombra segue em minha direção. De novo não! Acordo ofegante, com suor por todo o meu corpo. Levo as mãos para o rosto e tento acalmar minha respiração. Olho para o relógio e o vejo marcar 04:30. Droga! São quatro e meia da manhã ainda.

Hoje preciso passar na faculdade para resolver a transferência. Procurei uma faculdade em Newton. Pedi algumas recomendações para Jimmy. Escolhi qualquer uma. Eu já estava acabando mesmo.

Já se passaram três semanas. Quase tudo já estava pronto para irmos para Newton. Meu pai já estava em casa preparando tudo. Meu quarto se ocupava com várias caixas. Jimmy me mandava mensagens quase todo santo dia. Ele não parava de mandar o quanto estava feliz com minha volta. Parte de mim estava feliz, mas a outra sentia medo.

Olhei para a bagunça do quarto e me levantei para tomar um banho. Ao sair do banheiro, coloquei minha calça jeans e minha blusa preta de manga comprida. Adeus cicatriz. Sorri ao vê-la sendo tampada pela blusa preta. Reparei minhas olheiras no espelho. Merda, eu estava acabada. Não consegui dormir direito esse tempo todo. Fiz uma careta e voltei para a minha cama. Enrolei-me no edredom e peguei meu celular. Comecei a ver alguns vídeos de desenhistas ensinando alguns truques até dar um horário bom para me levantar.

Olhei para as horas no celular, que marcava 9:00. Meu Deus! Fiquei quase quatro horas vendo vídeos. Bloqueei meu celular, o colocando ao meu lado. Virei-me para o teto e fechei meus olhos, massageando-os em seguida. Estavam cansados. Ouvi um barulho na sala em frente ao meu quarto. Esforcei-me para escutar.

— Isso. Robert Owens, Sky Owens e Elizabeth Owens. O-W-E-N-S. Isso. Perfeito. Meu CPF é... — Era meu pai. Estava comprando as passagens.

Levantei-me. Calcei um tênis e fui para a sala. A sala estava lotada de caixas e algumas bagunças largadas pelo chão.

— Bom dia. Vem comer. — Tia Betty falou, colocando alguns pães na mesa que ficava junto com a sala.

Olhei para o meu pai, que se concentrava em falar os números dos documentos. Sentei-me na mesa e comecei a tomar meu café.

— E aí? Dormiu bem? — Tia Betty se juntou à mesa.

— Um pouco. — Menti. A olhei de relance e vi sua expressão confusa. Na verdade, não dormi porra nenhuma.

Reparamos que meu pai desligou o telefone. Ele continuava a olhar para alguns papéis em sua mão.

— Robert, vem comer. A sopa vai esfriar. — Minha tia o alerta. Só meu pai mesmo para comer sopa de manhã. Meu estômago chegou a embrulhar ao vê-la na mesa.

Vejo meu pai colocar os papéis na mesinha de centro e vindo em direção à mesa. Olhou-me e sorriu.

— Bom dia, minha princesinha. — Depositou um beijo na minha testa.

— Princesinha, pai? Sério? — Fechei a cara e ele riu. — Tenho 22 anos, não sou mais criança. — Meu pai sempre me tratou como uma criança. Ele disse que vai me tratar até o dia em que eu me casar. O que nunca vai acontecer, nunca irei encontrar alguém mesmo. Ou seja, terei que aguentar para o resto da minha vida.

— Você sempre será minha princesa. Já te falei isso. — Ele falou, mergulhando a colher na sopa, em seguida a colocando na boca.

— As passagens já estão compradas. Vamos daqui a dois dias. Acredito que teremos tempo o bastante para terminar de empacotar o resto das coisas. — Ele fala virando o rosto para tia Betty.

— Temos que correr, então. — Tia Betty responde, passando manteiga no seu pão. Ali tinha mais manteiga que pão, ela adora exagerar.

— Você falou que ia para a faculdade resolver a transferência. — Meu pai olha para mim.

— Sim, terminando aqui eu já vou. — Mordi meu pão.

— Vai pegar um táxi?

Balancei a cabeça negando.

— Um colega meu vai me dar uma carona, ele vai trancar a faculdade, então resolvemos ir juntos. — Bebo um gole de café.

— Colega? — Meu pai me encara. — É um homem?

— Sim, pai. Um homem. — Olho para ele, rindo.

— Deixa ela, Robert. Já passou da hora de ela achar alguém. Todos tem a necessidade de fazer sexo, às vezes. — Tia Betty interrompe.

Vejo meu pai quase se engasgar com a sopa. Ótima conversa para o café da manhã.

— Gente. Calma. Ele é só um colega. — Levanto as mãos.

— Bom mesmo. Você não tem idade para isso. — Meu pai volta a comer a sopa e tia Betty ri.

Mal sabia ele que eu assistia pornô quase todas as noites antes de dormir. Eu adorava assistir. Eu me pegava sempre desejando estar ali. Com homens musculosos me fodendo. Eu tenho que me divertir sozinha, pois sempre achei que nunca mais faria sexo. Ninguém iria sentir tesão comigo. Ou, se chegar a sentir, a cicatriz iria estragar tudo. Tenho nojo dela.

Ao terminar meu café, me levanto da mesa. Meu pai e a tia Betty continuavam a conversar sobre o caminhão da mudança que iria vir depois de amanhã. Levo os pratos para a pia e volto para o quarto para pegar minha bolsa. Vejo a mensagem do Mark, dizendo que já estava na frente da minha casa. Mark e eu éramos só colegas, só conversamos na faculdade. Ele era um ótimo desenhista. Mas era um cara muito fechado.

Corro para a porta e dou um tchau quase gritando para os dois ainda sentados na mesa. Ouço-os gritarem de volta. Vejo um carro parado. Mark abaixa o vidro e me dá um sorriso. Ele estava bonito. Vestia uma jaqueta jeans com uma blusa preta dentro. Seu cabelo preto estava fixado para cima, como um topete. Entrei no carro e o cumprimentei.

Chegando na faculdade faço uma careta junto com Mark para a fila um pouco grande na secretaria.

— Pega lá um lugar, vou estacionar o carro. — Ele afirma.

Desço do carro e vou direto para a fila. Após alguns minutos, Mark se junta a mim. Conversamos sobre certas mudanças que virão para as nossas vidas enquanto esperávamos a fila andar. Mark estava trancando a faculdade por causa do seu pai, que está muito doente. Mark pretende voltar para a cidade onde seus pais estão e procurar um emprego para poder pagar os remédios do seu pobre pai. Eu sentia pena por ele. Mas a minha vida não era tão boa também.

Chegando nossa vez, sou a primeira a ser atendida. A mulher do lado chamou Mark, que foi atendido logo em seguida. A mulher atrás do computador digitava algumas coisas olhando para meus documentos. Levou certa de 15 minutos.

— Prontinho. Agora você só precisa ir na faculdade de Newton para carimbar esse documento. — Ela sorri gentilmente, me entregando os documentos.

— Obrigada! — Sorrio de volta, pegando-os.

Saio da fila e espero Mark terminar. Ouço a mulher tentando convencê-lo a não trancar, mas sem sucesso. Mark logo sai e seguimos juntos ao estacionamento. Ele para o carro em frente à minha casa. Olho no relógio do carro, que marcava 12:45. Demoramos demais naquela fila. Mark desligou o carro e olhou para mim.

— Bom, é isso. Boa sorte em Newton. — Ele sorri.

— Boa sorte com seus pais. — Sorrio de volta. Nos abraçamos. Mark cheirava a amaciante. Era bom.

Minha relação com Mark era estranha. Certeza que iremos esquecer um do outro no momento em que eu sair do carro. Só conversávamos na aula. Depois que o professor nos liberava, era cada um para o seu lado.
Abri a porta e acenei bem rápido. Ele acenou de volta, partindo com seu carro em seguida. Adeus colega. Ao entrar em casa, almocei e fui ajudar Tia Betty com a louça.

Meu resto do dia se resumiu em arrumar caixas e caixas. Conversei com Jimmy por mensagem e depois ele me ligou. Cheguei a conversar com seus pais também. Tom Scott avisou meu pai que a casa já estava limpa para recebê-lo. Tom foi quem conseguiu uma casa para a gente. Ele tinha seus contatos. Meu pai e ele eram adorados pelos cidadãos de Newton. Ganharam o prêmio de melhores policiais da cidade.

A tarde passou bem rápido. Meu amanhã se resumiria em empacotar mais e mais coisas. Estava exausta. Só queria dormir. Mas nem isso conseguia fazer.


Quarto Capítulo

— Senhores passageiros. Por favor, apertem os cintos. Iremos pousar. Sejam bem-vindos à Newton. — Uma voz feminina ecoa nas caixas de som do avião.

Sinto um frio enorme na barriga. Quero vomitar todo o café da manhã. Sinto uma mão tocar a minha. Era meu pai. Ele a leva para o seu colo e aperta contra a dele. Sinto-me mais calma. Eu agradecia a Deus todos os dias por ainda ter meu pai ao meu lado. Ele levou minha mãe. Isso bastava. Sem os dois, eu ficaria mais perdida.

— Finalmente chegamos. — Abre um sorriso. — Vai ficar tudo bem, estamos nessa juntos. — Tenta me acalmar. Respondo com um sorriso e volto a olhar para a janela do avião. O tempo estava aberto. Newton era uma cidade linda. Suas casas enormes e seus bairros calmos era o que predominava nessa pequena cidade, além do verde das árvores que adoçavam mais sua beleza. Mas, também, tem alguns bairros que pareciam ser de cidade grande. Nunca os visitei. Meu pai escolheu morar em um bairro a esse estilo dessa vez. Não queremos nada parecido com o que costumávamos viver. Isso só traria lembranças ruins, com certeza. Por mais que tínhamos ótimas lembranças no passado, a lembrança mais obscura se sobressaía.

Com a autorização da aeromoça, levantamos para poder pegar algumas das bagagens em cima dos assentos. Olho para tia Betty, que estava na poltrona em frente a do meu pai. Ela pega suas bolsas enquanto conversava com uma senhora que estava sentada do seu lado. Ela conversa com qualquer pessoa que estiver ao seu lado. Achava isso muito engraçado.

Descemos do avião. O ar era tão limpo... Respirei fundo e o senti tomar todo o meu corpo. O vento soprava levemente. Que vento gostoso! Perguntas tomaram minha mente. Será que vou conseguir deixar o passado para trás? Mesmo morando aonde ele foi criado? Era realmente possível? Eu precisava pensar positivamente. Eu quero uma nova vida. Quero ter lembranças maravilhosas da minha mãe. Não quero ter lembranças de seu sangue jorrando pelo piso ou do seu olhar ficando cada vez mais distante. Ou seja, lembranças dela morrendo. Não, não quero isso. Fecho meus olhos, a fim de levar para longe essas imagens que tanto me atormentavam.

Sigo meu pai e a tia Betty para dentro do aeroporto. Fomos esperar as malas.

— Acabei de receber uma mensagem do Tom. — Meu pai fala olhando para o celular. — Eles já estão aqui.

Sinto outro frio na barriga. Vou ver Jimmy depois de cinco anos. Eu estou mega nervosa. Jimmy sempre foi um rapaz bonito. Imagino o quanto evoluiu nesses anos. Trocamos algumas fotos, mas sabemos que fotos nunca mostram a pessoa como realmente é. Chamada de vídeo? Nem pensar. Jimmy tentava, mas eu não conseguia falar por vídeo. Eu realmente odeio ser filmada. Já bastava abrir a câmera frontal sem querer todas às vezes e me deparar com minha face. Odiava aquilo.

Tento fazer a perna parar de tremer a apoiando no carrinho. Sem sucesso. Meu Deus, estou bem nervosa. Enfim avistamos nossas malas. Era impossível não reconhecer a mala da tia Betty. Era toda florida, assim como seu vestido. Meu pai pegou o carrinho e colocou as malas dentro. Fomos direto para o estacionamento. Tom falou que estavam nos esperando lá.

— Estão ali. — Meu pai fala indo em direção a um carro prata. Logo vi a Elena e o Tom. Olho bem e vejo que, atrás, estava alguém com um buquê. Era Jimmy. Meu pai e Tom voam um para o corpo do outro, dando um abraço bem forte. Tia Betty abraça Elena, ambas com um sorriso no rosto. Vi Jimmy se aproximar, abrindo os braços. Meu Deus! Ele está lindo. Está com uma blusa azul-marinho, que marcava alguns de seus músculos, junto com uma calça jeans clara, e seus cabelos castanhos claros estão jogados para trás. A beleza de Jimmy era de tirar o fôlego.

O senti tomar meu corpo em seus braços.

— Skype! — Grita no meu ouvido. Ele me aperta mais. Seu perfume é tão bom. Tem cheiro de banho misturado com perfume masculino. Não vou mentir, senti algo molhar minha calcinha. Não era atoa que milhares de garotas queriam Jimmy dentro delas. Sempre foi tão popular.

— Jimmy, está me machucando. — Tento falar. Ele me solta, joga as flores no chão e suas mãos voltam para o meu rosto, apertando minha bochecha.

— Meu Deus! Você está mais linda! Como isso é possível?

— Jimmy, está me machucando de novo. — Falo, fazendo biquinho por conta de suas mãos. Ele solta e sorri. Caralho! Que sorriso. Seus dentes são tão brancos. Massageei minhas bochechas doloridas.

— Não acredito que está aqui. É sério. — Ele me encara com um sorriso. Parece um bobo.

Olhei para o chão e vi as flores.

— As trouxe para mim? — Aponto.

— Ai, Droga! Sim. — Ele as pega, dando uma batidinha a fim de limpá-las, e me entrega.

— São lindas! Obrigada. Mas preferia chocolate, você sabe. — Falo sorrindo. Gosto de flores, mas não sei por que elas eram dadas como presentes. Logo iriam apodrecer, não duravam nem uma semana. Prefiro mil vezes ganhar comida.

— Puts. Eu sabia que era para ter comprado algum doce. Foi mal Skype. — Sorriu desajeitado, alisando atrás de sua cabeça.

— Relaxa. Eu amei! — Bagunço seu cabelo, que logo voltou ao normal. Era tão macio. Cabelo bom é assim mesmo. Sinto inveja daquele cabelo.

— Sky! Está tão crescida! — Elena vem em minha direção, me abraçando.

— Elena! — A abraço de volta.

Tom veio logo para perto de mim. Olho para trás e noto que Jimmy estava abraçando meu pai e, em seguida, a tia Betty.

— Sky! Como você está, minha linda? — Me abraça.

— Estou ótima tio. — Ele era como um irmão para o meu pai, sempre o chamei de tio.

— Senti saudades de você me chamar de tio. Era tio para cá, tio para lá. — Fala dando uma leve gargalhada. — Bom, vamos indo. Vocês precisam conhecer a casa. Algumas coisas já chegaram e Elena e eu demos uma arrumadinha. — Fala depositando sua mão no ombro do meu pai.

Enquanto meu pai, Tom e Jimmy guardavam as bagagens atrás, eu, Elena e tia Betty entramos no carro. As duas começaram a conversar sobre Newton. Fico olhando para o retrovisor. Reparo em Jimmy e em como os músculos de seu braço apareciam toda vez que levantava uma das malas. Ele me olha através do espelho e dá uma piscadinha.

Desvio meus olhos timidamente e sorrio. Depois, lembro que o carro só tem cinco vagas e estávamos em seis.

— Como vai caber todo mundo no carro? — Pergunto para Elena.

— Jimmy veio no carro dele.

Então Jimmy bate no vidro. Abaixo-o.

— Hey, mocinha. Você vai comigo. — Fala apontando para o outro carro. Em seguida, ouço Elena rir.

Reviro os olhos e saio do carro. Entro no carro de Jimmy e sinto o cheiro de seu perfume no veículo. Olho alguns documentos espalhados no banco de trás. Há uns equipamentos que eram iguais a do meu pai. Jimmy estava treinando para ser um policial. Ele sempre admirou seu pai. Quando éramos pequenos, em toda brincadeira ele sempre queria ser um policial. Às vezes, nem fazia sentido ele ser um quando eu era uma princesa ou uma rainha. Ao invés dele ser um dragão, um príncipe ou um rei, ele sempre escolhia ser um policial e estragava a brincadeira. Sorrio ao lembrar.

Ele entra no carro e me vê sorrindo.

— Feliz em me ver? — Pergunta.

— Sim — digo colocando o cinto.

Jimmy liga o carro. O reparo mais uma vez. A lembrança que eu tinha do Jimmy era um garoto de 18 anos, magro, porém bonito. Como ele conseguiu crescer tanto? Está bem mais másculo, não sei. Eu não consegui mudar nada. Eu tinha 17 anos quando tudo aquilo aconteceu. Mudei de cidade e, agora, estou de volta. Jimmy está com 23. Apenas um ano de diferença. Mas sempre amou me tratar como uma pessoa bem mais nova.

— E aí? Como foi a viagem? — Ele pergunta fazendo-me voltar dos meus pensamentos.

— Foi boa. Bem tranquila. — Respondo olhando para o vidro. A cidade continuava a mesma. É linda.

— Isso é bom. E sua faculdade? Quando começa? — Fala ligando o ar condicionado. Jimmy parecia meu pai com essas perguntas.

— Segunda-feira — respondo. Estamos na sexta-feira. Mal cheguei e já preciso ir para faculdade na segunda. Minha barriga dói ao pensar nisso. Nem consegui raciocinar o que estava acontecendo ainda. Sinto o ar gelado tocar minha pele, arrepiando alguns pelos no meu braço.

— Que bom! — O celular de Jimmy começa a tocar. Sem querer, reparo o nome “Megan”. Ele desliga.

— Não vai atender? — Pergunto.

— Não. Não é nada de mais. — Franze a testa.

Eu estava estranhando um pouco o Jimmy. Não conseguia falar com ele muito a vontade. Parecíamos ser mais próximos no telefone. O caminho segue tranquilo. Conversamos sobre futuros projetos para sairmos e curtimos Newton, colocamos quase todo papo em dia.

Chegamos perto da minha nova casa.

— Você vai amar o bairro, Skype. É poucos quarteirões perto do meu. Tem alguns lugares bem perto de sua casa que você vai adorar desenhar — ele sorri.

Isso me animou.

— Ótimo. Assim não ficarei presa naquilo. — Solto. Eu preciso dar meu primeiro passo. Preciso parar de falar sobre isso. Droga.

— Você vai superar. Eu sei. — Ele fala estacionando atrás do carro do seu pai. Vejo Elena, tia Betty e meu pai saindo do carro à frente. Olho a casa pela janela. É linda. Portão branco e dois andares. Era realmente diferente da minha de cinco anos atrás. O bairro também era bem diferente, o que me fez pensar que conseguirei sobreviver a tudo isso. Tenho planos de voltar para Waltham depois que eu me formar. Acredito que, até lá, meu pai poderá viver sozinho. No momento não consigo deixá-lo, pois ele realmente precisa de mim por perto.

— Ei, olha para mim. — Jimmy encosta no meu ombro. Viro-me. — Vou estar aqui sempre que precisar.

Assinto com a cabeça, dando um sorriso preocupado.

— Vamos conhecer a casa primeiro. Depois te levo para conhecer o bairro. — Sorri mais uma vez, desligando o carro e, em seguida, abrindo a porta.

Tiro o cinto. Saímos do carro e fomos em direção à casa.

— O que achou? — Tom pergunta colocando seu braço ao redor de Elena.

— É linda. — Digo.

— Amamos. — Solta meu pai.

— Ótimo, vamos entrar. — Tom segue para porta, pegando a chave no seu bolso.

A casa é linda. Por dentro e por fora. Um cheiro de perfume tomou minhas narinas. Elena deve ter limpado. Noto que o chão era carpete. Graças a Deus. Sem piso de madeira. Alguns móveis estavam posicionados. Tia Betty foi direto para a cozinha. Ela abre um sorriso ao ver o tamanho da bancada. Perto da entrada, há uma escada branca.

Subo. Abro algumas portas e, no último quarto do corredor, vejo minha cama. Meu novo quarto. Eu tinha um sonho de morar sozinha, mas não era o momento certo. Eu tinha medo. Vejo o tamanho da janela onde minha cama está posicionada em frente. O papel de parede creme combinando com o carpete foi o que mais me chamou a atenção. Meu quarto é bem confortável, isso bastava. Algumas caixas com meu nome escrito em azul estavam espalhadas pelo carpete. Fiz uma careta ao pensar em ter que desempacotar tudo aquilo. Abro outra porta perto do guarda-roupa e encontro um banheiro bem espaçoso. Perfeito.

— E aí, gostou? — Vejo Jimmy encostado na lateral da porta.

— Sim, amei! — Abro um mega sorriso.

— Sabia que ia gostar. — Desencosta da lateral da porta, vindo em minha direção. Chegando mais perto, seus olhos postaram nos meus. Que clima estranho. Ele abre a boca, mas logo em seguida desiste de falar.

— Prefere descansar antes ou quer dar uma volta para conhecer o bairro? — Pergunta em quase um sussurro.

— Vamos ver o bairro primeiro, depois descanso.

— Ok, estou te esperando lá em baixo. — Deposita um beijo no meu rosto, apertando minha cintura com uma de suas mãos grandes. Sinto meu corpo arrepiar. É sério. Não vou me acostumar com esse novo Jimmy. O que está acontecendo? Estou ficando excitada? Pelo Jimmy? Não, não. De jeito nenhum. Deve ser a consequência de nunca mais eu ter transado. Falando em transar, só transei uma vez, quando tinha 15 anos. Foi uma bosta. O menino mal sabia onde colocar o pinto e, quando descobriu, gozou na terceira ou quarta investida. Ainda me considero virgem por nunca ter gozado no sexo. Só de lembrar, me dá vontade de chorar. O porquê de eu nunca ter voltado a transar? Minha insegurança com a aparência, a maldita cicatriz. Ela é a marca que um demônio deixou no meu corpo. Alguns garotos tentavam me levar para cama. Durante os amassos eu sempre evitava ser tocada, ainda mais no ombro. E quando alguém tocava, eu fugia. Por isso decidi me auto proteger de qualquer atração física por alguém.

Jimmy desceu. Espero minha condição melhorar e depois desço. Ele já estava me esperando no carro. Tão rápido. Entro e coloco o cinto.

— Voltem logo para o almoço. — Elena grita da porta.

Jimmy deu uma buzinada e partiu com o carro. No caminho, ele me mostrava algumas padarias, lojas, mercados e livrarias. Estávamos bem perto de casa ainda. A rua predominava na cor cinza. Há vários lugares pichados. Como se fosse o lado mais “pobre” de Newton. Fiquei feliz em saber que vou morar em lugares assim. Eu achava linda essa parte urbana. Não vou mentir, eu amava onde eu morava, pois tudo era tão verde. Minha mãe adorava ficar na sacada pintando seus quadros. Mas, depois de tudo aquilo, quero distância de lugares calmos e bonitos. Meu ex psicólogo dizia que isso foi consequência do crime e que minha mente quer fazer de tudo para esquecer, por isso me faz interessar por tudo que é oposto da minha vida passada, como forma de proteção. Olho e vejo um lugar que parecia estar abandonado. Parece um ginásio. É enorme. Meus olhos se iluminam.

— O que é aquilo? — Pergunto apontando para o local.

— Aquilo? Era uma academia. Era o lugar onde alguns lutadores de Newton costumavam treinar. Ninguém pode fazer nada com ela. Parece que alguém a comprou, mas ela está aí... Sendo destruída aos poucos. Sozinha. — Ele explica de um modo dramático.

— É linda! — Sorrio já imaginando o processo de desenhá-la no papel.

— Só você mesmo, Sky. Tem ratos lá. — Ele faz uma careta de nojo.

— Ótimo. Mais elementos para por no desenho — sorrio ao ver a careta que fizera mais uma vez.

Não tenho medo. Certeza que vou visitá-la depois. Próxima à academia há duas garotas. Uma possui um cabelo bem vermelho, está com uma bota de couro preta e uma saia do mesmo material. Tem um corpo lindo, por sinal. A outra aparenta ser mais baixa, tem um cabelo da cor mel e está com um vestido preto com um salto da mesma cor. Ambas são bem tatuadas e possuem alguns piercings. A ruiva olha para a minha direção e depois para Jimmy. Faz uma careta, joga seu cigarro no chão e sai com a outra, virando a esquina.

— Eu sabia que você ia gostar — olha para mim e sorri de lado. — Sky, antes eu quero te pedir uma coisa — seu olhar estava mais concentrado. Respirou fundo. — Se qualquer pessoa mexer com você, te perturbar ou te colocar em uma situação que te ponha em perigo, por favor, me chame. — Ele está sério.

— Por que diz isso? — O olho curiosa.

— Há pessoas más aqui em Newton. É só isso. — Ele está escondendo algo.

— Há alguma pessoa específica? — Pergunto.

— Sim... Não. É sério, se algo assim acontecer... Me liga. Promete?

— Prometo. — O que ele estava querendo dizer com aquilo? Tem alguém querendo me fazer mal? Ou será que era aquilo que ele me disse? Que as pessoas ainda comentavam sobre o ocorrido com minha mãe? Será que ele tem medo de como eu vou reagir? Eu estou cada vez mais confusa. Não o culpo por essa proteção toda. Quando tudo aquilo aconteceu, pensei em me matar várias vezes. Foi algo tão difícil de suportar... O que me fez mudar de ideia foi o fato de me mudar para Waltham, pois pensei que teria uma vida bem melhor. Mas aqui estou eu, de volta à Newton.

— Ótimo. — Sorri. Jimmy volta a me apresentar mais lugares. Demos uma volta pelo bairro. Era enorme. Voltando para minha nova casa, o almoço está à nossa espera. Todos na mesa reunidos. Isso era muito bom. Tom e meu pai gargalhavam ao contar sobre seus momentos passados.

Depois do almoço, a família Scott se preparava para ir embora. Eles deram o endereço da casa deles para o meu pai. Tinham se mudado também. Não moravam mais naquele bairro. Acho que ninguém seria capaz de continuar morando ali depois de tudo aquilo.

Jimmy se aproxima para despedir.

— Lembra-se da nossa promessa, né? — Levanta uma de suas sobrancelhas.

— Sim, Jim. Lembro.

Ele me puxa para um abraço.

— Muito bom te ter perto — me encara e sorri. Em seguida, foi para meu ouvido. — Por que tão linda, Skype? — Sussurra. Oi? Fico em transe. Sua voz é tão macia. Dá-me um beijo no rosto e se afasta. — Até mais.

— Até — sorrio ainda em transe. Despeço-me do tio Tom e da Elena.

Meu pai foi para o quarto tirar um cochilo. Tia Betty continuava na cozinha limpando o resto da louça do almoço. Vou para o meu quarto tirar as roupas da mala e colocá-las no guarda- roupa. Quando termino, vou tomar um banho.

Minha tarde se resumiu em desempacotar algumas coisas. À noite, pedimos uma pizza por não ter nada na geladeira. Tia Betty falou que ia ao mercado no final de semana, então podemos aguentar um dia com a geladeira vazia. Conversamos um pouco e fomos todos para seus quartos.

Por causa do Jimmy, eu estava um pouco... Bom, digamos que excitada. Não imaginava que ele teria esse poder sobre mim. Em minha mente, a amizade se encontrava em pé, mas o corpo não correspondia. Penso ajudar minha querida e pobre vagina com um belo pornô. Coloco os fones e apenas deixo seguir o fluxo. Eu precisava aliviar. Ah! Como eu sinto inveja daquela atriz. Só odeio aqueles gemidos altos e forçados, mas não posso culpá-la. O cara fodia com muita força. Depois de altos espasmos, espero meu corpo se controlar. Coloco uma música. The Reason do Hoobastank toma meus ouvidos. Fecho meus olhos e logo adormeço.


Quinto Capítulo

— Aqui está, Srta. Owens — a moça sentada atrás do balcão da recepção me entrega os documentos. — Bem vinda a Andover Newton University — abre um sorriso.

— Obrigada — sorrio de volta, pegando os documentos e guardando-os na bolsa, deixando apenas o papel com a grade horária e o número da sala.

Vou direto para a escada rolante e observo o ambiente. A parede é toda tomada por janelas enormes, isso deixava o ambiente agradável. Está vazio, pois ainda era cedo. Tinha poucas pessoas com seus grupos de amigos andando, algumas faxineiras e alguns seguranças. Ao subir cinco escadas, procuro o banheiro. Minha sala era próxima do mesmo. Isso era perfeito.

Coloco minha pasta na pia junto com minha bolsa e ligo a torneira. Ao lavar minhas mãos, olho para o espelho. As olheiras marcam meus olhos cansados. Não dormi nada, como sempre. Passo a mão pelos meus cabelos com a água, a fim de ajeitá-los. Seco-as e pego minhas coisas, indo a caminho da sala. A sala é enorme. As mesas gigantes com bancos me chamaram atenção. Na outra cidade que eu vivia, eram mesas individuais. Sento na última fileira, que se encontrava toda vazia. Alguns alunos entravam na sala e cumprimentava seus amigos. Um grupo de garotas sentadas em uma das primeiras fileiras me chamou atenção. Gritavam mais que tudo. A sala foi enchendo aos poucos.

Pego meu caderno, meu material e começo a rabiscar, a fim de terminar meu desenho. Agora era um prédio abandonado que vi na internet. Procurei a foto de novo na internet para poder desenhar as pichações. Sinto alguém sentar ao meu lado.

— Carne nova no pedaço. — Me viro e deparo-me com duas garotas. — Sou Tina e essa é a Megan. — Tina tem seus cabelos dourados amarrados e seus olhos cor de mel completavam sua bela aparência. Megan tinha cabelos castanhos escuros, uma sobrancelha bem marcada e olhos escuros. As duas são bem bonitas. — E você é...?

— Sky — respondo.

— Nome legal. Nunca te vi por aqui em Andover. Era da turma da noite? — Ela me pergunta tirando seu material da bolsa jeans. Combinava bastante com sua jaqueta vermelha.

— Não. Acabei de me mudar para Newton. Na verdade eu morava aqui — me enrolo ao falar. Droga. Por que falei isso? Respiro fundo. — Eu vim de Waltham — sorrio desajeitada.

— Waltham? Soube que lá tem ótimos parques — ela sorri. — Então morou aqui em Newton? Por quanto tempo?

— Nasci aqui e fiquei até meus 17 anos. — Por favor, não pergunta o porquê de eu ter me mudado. Cruzo os dedos do lado da perna.

— Por que foi para lá? Não gostava daqui? — Ela pergunta com uma de suas mãos mexendo na argola de seu brinco. Droga.

— N-não... Aconteceram algumas coisas e tive que ir embora. — Volto a olhar para meu caderno. Engulo seco.

— Ah — ela para. — Uau! Você que desenhou isso? — Disse apontando para o desenho do prédio. — Posso ver? — Pega meu caderno assim que concordo. — Você desenha muito! Megan, olha isso — mostra para ela, folheando o caderno.

— Realmente são bons. — Megan finalmente fala algo.

— Que inveja. Sonho em desenhar assim. Parecem fotografias. — Disse Tina.

— Obrigada — com certeza eu estava vermelha.

— Por que só tem lugares, sei lá, caindo aos pedaços? — Megan disse pegando o caderno de Tina.

— Amo desenhar lugares assim, não sei o porquê. — Mexo no cabelo.

— Ah, entendi. — Megan entrega o caderno para Tina e pega o celular. Não vou mentir, a achei um pouco ignorante.

— São realmente lindos — Tina fala ao entregar o caderno para mim.

— Obrigada — sorrio mais uma vez.

— Bom, como você é nova aqui, posso te ajudar a entender como funciona as aulas e as coisas aqui em Andover. Te passo algumas matérias do semestre.

— Claro, eu ia adorar. — Tina é uma pessoa muito simpática.

O professor chega à sala. As conversas começam a diminuir. O professor senta-se a mesa e pega suas coisas. Começa a fazer a chamada, chegando na minha vez.

— Sky Owens — me procura entre os alunos. Levanto a mão. — Seja bem-vinda — sorri.

Notei que todos me olhavam.

— Owens? Não é aquela família que... — Uma menina sussurra para a outra. Sinto meu estômago dobrar. Tento engolir a saliva, que dói para descer. Ela comentou sobre minha família ou era coisa da minha cabeça? Olho para Tina e Megan, que me encaravam. “Aguenta, Sky. Você vai superar isso” sussurro em minha mente.

Abaixo a cabeça, focando no meu caderno. O professor volta para a chamada. A aula se resume em pessoas me espiando o todo tempo. Quero sair daqui. Já vi que não será nada fácil. Depois do primeiro horário, o professor nos libera. Começo a guardar minhas coisas para sair o mais rápido. Penso até em ir embora.

— Sky? — Tina me toca. — Vem comer com a gente. Aqui tem uma pizza maravilhosa. — Ela sorri. Eu deveria ir mesmo? E se me fizerem perguntas...

Concordo e sigo Megan e Tina até o refeitório. Ouço pessoas cochicharem enquanto eu as sigo. Aquilo estava acabando comigo. Devo ligar para Jimmy? E se for só algo da minha cabeça? Não, melhor não. Preciso ser forte. “Seja forte Sky!”, minha voz ecoa na minha mente de novo.

Sento em uma das mesas e fico de olho nas bolsas de Megan e Tina, enquanto as duas pediam a pizza. Eu estava tremendo. Queria ir para casa. Pego meu celular e vejo uma mensagem de Jimmy.

HOJE


Skype? E ai, como ta sendo o primeiro dia de aula?

Perfeito. Fiz novas amigas.

Quem eu estava querendo enganar? Estava sendo uma merda. Tirando o fato de conhecer Tina e Megan.


Mas já? Isso é ótimo. Ta fazendo oq agora?

Estou no intervalo. E vc?

Estou no treinamento.
Preciso urgente de um banho. Um dos novatos vomitou
em mim, posso dizer que ele comeu frango com verduras no almoço.

Ai Jimmy. Que nojo! Não preciso de detalhes.

KKKKKK

Vou conversar com as meninas aqui, beijos.

Não tem nenhum idiota nesse meio né?

Ahn? Oq quer dizer?

Nessa nova amizade... Tem algum homem no meio?

Não. Mas se tivesse, qual seria o problema?

Tenho ciúmes. Não divido minha amiga com ninguém. Ainda mais com homem.

KKKKK, idiota! Não tem essa de me dividir com alguém. Beijos.

Lógico que tem. Estou falando sério. Vou ficar de olho. Tchau Skype.


— Hum... Namorado? — Tina senta ao meu lado, colocando sua bandeja na mesa e colocando a outra na minha frente.

— Não — balanço a cabeça. — Obrigada — falo ao vê-la colocar a bandeja.

— Estava sorrindo igual a uma idiota para o celular — ela fala.

— É meu melhor amigo — explico.

— Amizade entre homem e mulher nunca rola.

— Somos amigos de infância, nunca rolou nada — explico mais uma vez.

— Hum... Ok. É solteiro então? — Pergunta.

— Sim, é — como um pedaço da pizza.

— É de Newton?

— Sim.

— Nome, por favor? Quem sabe eu me desencalho — Tina levanta suas sobrancelhas.

— Jimmy — as duas me olham espantadas.

— Jimmy Scott? — Ela arregala os olhos. — Conhece ele? — Pergunta assustada.

— Como falei, somos amigos desde pequenos. Éramos vizinhos quando crianças. — Esclareci. Por que elas estavam tão espantadas, como seu eu fosse amiga de alguém mega famoso? Vejo Tina olhar para Megan, que se encontrava com a cara fechada.

— Por que ficaram tão espantadas? — Tive a coragem de perguntar.

— Nada — Tina sorri. — Jimmy Scott é bastante famoso em Newton. O novo policial gato. Todas o querem. Só perde para uma pessoa, mas isso não vem ao caso.

— Ele ainda não é policial, está em treinamento — falo. Megan me encara. Quem é a pessoa que Jimmy perde? Existe alguém mais bonito que Jimmy? Impossível.

— Isso, isso. Mas está perto de se tornar um. — Tina come um pedaço de sua pizza. — Então, vocês são bem próximos. Nunca rolou nada mesmo?

— Vocês se veem todo dia? — Megan pergunta interrompendo Tina. O silêncio toma a mesa.

— Quase todos os dias — quebro o silêncio. Por que ela estava me perguntando isso? — Os pais dele vão bastante lá em casa — explico. Vejo a cara de Megan se fechar mais ainda.

— Hum... — Ela volta a comer sua pizza.

— Bom, mudando de assunto. Vocês vão para o Triangle hoje à noite? — Pergunta Tina.

— Triangle? — Pergunto.

— Sim. É um evento de luta. Quase toda a cidade vai — explica.

— Não curto essas coisas. — Faço uma careta. Prefiro ficar em casa desenhando e ouvindo música.

— Qual é? Vem comigo. Megan, e você? — Tina olha para Megan, que permanecia encarando a latinha de refrigerante.

— Megan? — Tina chama sua atenção.

— Ah, sim! Vou. — Ela pega a lata e toma um gole.

— Vamos, Sky. Você vai gostar. É divertido. — Tina bate no meu braço.

— Ok. — Não quero parecer uma pessoa chata.

Terminamos de comer e voltamos para a sala. Ao me sentar, o mesmo grupo de garotas gritalhonas da primeira aula me encaravam e cochichavam.

— Idiotas. Parecem que nunca viram uma pessoa nova — cospe Tina. — Ignora elas, sempre foram babacas.

Concordo e volto a abrir meu caderno. Pego minhas anotações com algumas dicas que o professor deu e tento colocá-las no desenho.

— Meu Deus! Você pega muito rápido. — Tina olha espantada. — Qual é, Sky! Acabamos de aprender isso. Você é muito sem graça. — Fala pegando seu caderno e olhando seu próprio desenho. Tina desenhava bem. Em sua folha estava um desenho de um campo com algumas crianças correndo. Não querendo me achar a profissional, mas ela faltava colocar alguns elementos em seu desenho. Mas isso ela vai descobrir sozinha, com o tempo. Assim como eu. Foi exatamente esse meu processo para tornar meus desenhos realistas.

— Você desenha bem, Tina — digo.

— Tento, né? — Ela fecha o desenho e depois volta a abrir. — A mão desse garotinho demorou séculos para ser desenhada — ela fala apontado para o garoto correndo com a pipa.

— Ficou bom — afirmo.

— Ficou... Mas não mais do que seus desenhos.

— Não sei desenhar pessoas. Esse é o ponto fraco dos meus desenhos. — Sorrio e ela sorri de volta.

— Posso te ensinar alguns truques — ela fala entusiasmada.

— Perfeito.

Megan permanece calada. Queria ver os desenhos dela, mas não tive a coragem de pedir. Tina tentava várias vezes fazê-la falar. Acho que ela não gostou muito de mim. O professor entrou na aula. A aula foi sobre forma, cor e composição. No momento em que a aula acabou, nos despedimos.

— Foi um prazer conhecer você, Sky. Nos vemos a noite. Te mando o endereço por mensagem. — Tina me dá um beijo no rosto.

— Tchau — Megan se despede colando sua bochecha na minha e fazendo um barulho de beijo. — Até a noite.


Sexto Capítulo

— Essa ficou melhor. — digo olhando-me no espelho. Várias roupas se encontravam jogadas na minha cama. A maioria da cor preta. Eu amo preto. Combina em qualquer ocasião, além de não chamar muita atenção.

Sinceramente, eu não queria estar indo para esse tal de “Triangle”. Odeio lutas. Odeio sangue. Odeio pessoas. Faço uma careta ao pensar no que eu podia encontrar lá. Bato a mão na blusa preta com mangas compridas para tirar algumas poeiras que ali se encontravam. Aliso minha calça jeans, virando de um lado para o outro a fim de ver como o visual estava por trás. Estava ótimo, eu acho.

Pego meu tênis e o calço após colocar a meia. Mexo nos fios do meu cabelo, arrumando-os. Aplico um rímel e passo um gloss. Eu passei a não gostar de maquiagem pesada com o tempo, sem contar a preguiça que eu tinha para passar uma simples base. Coloco minhas coisas na bolsa e desço. Meu pai se encontra no sofá, assistindo o noticiário.

— Uma mulher com uma criança foram assassinadas brutalmente ontem perto do parque Smith. A mulher, conhecida como Deisy Rogers, caminhava com sua filha de cinco anos para a sua residência, que ficava a poucos quarteirões do parque, onde se deparou com um assassino anônimo e foram mortas a facadas. Vamos com o repórter Andrew, que está no local para mais informações. — A voz vinha da televisão.

A visão da minha mãe levando a facada no pescoço veio à tona. Um nó começou a se formar em minha garganta. Senti uma fisgada em minha cicatriz, como se outra lâmina se encostasse à mesma. Meu pai estava estático no sofá, suas mãos apertavam o controle com tanta força que chegavam a tremer. Ele estava sofrendo também. Por que tenta esconder tanto, pai? Ele fecha a cara, olha para o chão e me olha em seguida. Vê minha feição, que eu acreditara que se encontrava pálida. Suspira e troca de canal. A imagem de um grupo de pessoas vendendo bugigangas tomou o aparelho.

— Vai para onde? — Pergunta meu pai, tentando quebrar o clima horrível.

— As meninas da faculdade me convidaram para um evento da cidade hoje — respondo desviando meu olhar da tv para ele.

— Hum, ok. Qualquer coisa me liga e não chegue muito tarde.

Concordo e vou direto para a porta. O noticiário volta a me atormentar. Uma mãe com uma criança. Ambas assassinadas no meio da noite. A criança tinha apenas cinco anos. Isso é tão cruel. Quem conseguiria fazer algo assim? Minha cabeça começa a latejar. Olho para o relógio do celular e são oito horas. Eu decido ir a pé, o local do evento ficava apenas 15 minutos da minha rua. Chegando lá, noto a multidão. Algumas mulheres agarradas em homens sem camisa, tatuados. O cheiro de álcool, cigarro e suor dominavam o local.

— Sky, aqui! — Vejo Tina gritar, balançando os braços. Ela está magnífica. Está com um vestido azul escuro curto que marcava bem seu corpo. Seu cabelo estava solto, usava uma bota curta com um salto e uma jaqueta preta de couro. Olho para o pessoal, algumas pessoas estavam arrumadas e outras com roupas inadequadas para estar em um local com muita gente. Porém, cada um com seu cada um.

Dou uma olhada para meu visual novamente, notando que eu poderia ser a mais normal dali. Junto-me a Tina e Megan. Megan está linda também. Seus cabelos lisos agora estavam ondulados. Sua maquiagem era bem pesada e está usando um vestido curto da cor verde esmeralda, com um salto da cor preta que combinava com sua jaqueta preta.

— Se eu soubesse que vocês viriam assim, eu teria me arrumado mais — solto, olhando para Tina.

— Cala boca. Você está linda. — Tina fala, rindo.

Solto uma risada ao ouvir Tina falar.

— Obrigada — digo sorrindo e vejo Tina sorrir também. Pena que não vejo dessa forma. Olho ao redor. — Esse lugar está lotado. O pessoal gosta mesmo de uma briga.

— Está vazio ainda. Daqui a pouco chega mais gente. Não é todo dia que podemos ver pessoas se matando e ainda poder beber de graça — sorriu. Megan permanecia calada e parecia procurar alguém. — Vamos entrar.

Seguimos para o portão principal. Mais fumaça embaçava minha visão. Meus olhos estavam ardendo. O ringue era enorme. O lugar possuía muitos refletores, principalmente no centro. Olhei para cima e vi várias caixas de som fixadas em barras de ferro. Se lá fora o cheiro de álcool e cigarro estavam fortes, imagina aqui dentro.

Estava difícil de suportar, minha garganta chegava a arder. Atrás do ringue tinha um local como fosse um camarote, acredito que seja uma área VIP. Estava vazio. Quem ficasse ali teria uma visão e tanta da luta, além de ter toda a visão do lugar. Aquela área parecia tão confortável, tão vazia. Adoraria estar lá, sozinha.

Eu segui Tina e Megan, tentando passar pelas pessoas. Aquele lugar estava muito lotado. Senti uma mão tocar minha coxa. Sinto um frio na barriga.

— Oi, linda — um homem alto sorri e tenta tocar meus cabelos. Seu hálito era álcool puro e misturava com o cheiro de seu suor. Nojo! Fiquei sem reação.

— Cai fora, idiota. — Vejo Tina bater na mão do homem.

— Acho que hoje é meu dia de sorte. Adoro um ménage. — Ele sorri.

— Sou uma policial. Acho que o senhor está querendo muito ir para trás das grades. Te darei uma chance de cair fora. E não me deixa te ver novo.

O cara fica pálido. Cospe um “merda” e sai correndo pela multidão.

— Idiota! Com certeza tem ficha suja. É só falar em polícia que eles se borram. Sky, fica por perto — sinto Tina me puxar. Ela foi tão incrível. Sonho em ter essa coragem. — Vamos esperar a luta e daí pegamos alguma cerveja. O bar vai estar mais vazio. Espero.

— Tina, vamos sentar. Meus pés estão me matando. — Megan reclama e aponta para o sofá, que milagrosamente estava vazio.

— Eu falei para você colocar um salto menor.

— Tá, tá... Vamos nos sentar, pelo amor de Deus. — Megan implora.

Pegamos o lugar no sofá. Dou graças a Deus por odiar saltos. Eu estou muito bem confortável com meu tênis. Os olhos de Megan continuam procurando alguém na multidão.

— Fiquem aqui, vou tentar pegar uma bebida. — Tina fala colocando sua bolsa no meu lado.

Como Megan permanecia calada e procurando algo ou alguém, aproveito o momento para reparar mais no local. A música alta toma meus ouvidos. Casais de todo o tipo estavam se pegando em todos os lugares. Alguns quase transando ali mesmo. Vou ser sincera, estou completamente desconfortável aqui. Péssima ideia de aceitar vir para cá.

— Vou ali e já volto — Megan se levanta e some. Ótimo, agora estou sozinha. O que vou fazer? Pego meu celular. No momento em que deslizo a barra de notificações, uma mensagem do Jimmy chega.


HOJE


Não sabia que gostava de brigas.


Quê? Ele está aqui. Bloqueio o celular e posto meus olhos à frente. Jimmy vem na minha direção, sorrindo e tentando desviar de algumas mulheres que o alisavam e o chamava de todo tipo de nome.

— O que uma moça tão linda faz sozinha nesse local tão perigoso? — Ele sorri e depois me cumprimenta com um beijo no rosto. O perfume de Jimmy ocupou minhas narinas. Deu a impressão de que todo o cheiro de cigarro saiu do local só com aquele perfume.

— Essa moça que você diz ser “linda”, está tentando curtir Newton — respondo, vendo-o sentar ao meu lado.

— E aí? Curtindo? — Pergunta cerrando as sobrancelhas.

— É... Não muito. Isso aqui é assustador.

— Você odeia lugares assim, né? Lotados — ele mexe as mãos apontando para as pessoas. — Lembro-me de quando éramos crianças e você odiava ir ao parque aquático nos feriados por conta da lotação. Eu ficava puto com você porque eu queria ir, mas por sua causa tínhamos que cancelar.

— Desculpa — ri. — Era só ir sozinho — digo.

— Não teria graça — Jimmy fez uma careta. — Vai querer beber alguma coisa? — Pergunta.

— Minha amiga já foi pegar — aponto para o bar.

— Pediu água, né? Não quero te ver bêbada aqui.

— Cerveja. Eu sei minha tolerância a álcool, Jim.

— Ficarei de olho.

— Veio com quem? — Pergunto.

— Com o pessoal do treinamento. Quer que eu os apresente? — Perguntou.

— Passo. Outro dia, talvez — respondo.

— Ok, como você preferir — sorri.

— Sky, ajuda aqui — vejo Tina tentando trazer as bebidas sem esbarrar em alguém. Levanto e pego a minha. — Cadê a Megan? — Ela grita, colocando uma das bebidas no braço do sofá. Meu Deus! Aquele lugar estava uma zona, as pessoas não conversavam, elas gritavam.

— Não sei, ela falou que já voltava — respondi em um tom alto.

— Bom, vou deixar você curtir com suas amigas — Jimmy fala em meu ouvido e levanta. Tina o olha.

— Ah. Oi, sou a Tina. — Ela estende sua mão.

— Jimmy — ele sorri e aperta a mão de Tina.

— Por que não fica com a gente? — Ela pergunta. Seus olhos brilhavam ao ver Jimmy. Os olhos de todas brilham.

— Eu vim com um pessoal, qualquer coisa depois me junto a vocês — ele sorri mais uma vez e depois pisca para mim. — Até mais, Skype. Prazer Tina.

— Tchau — Tina o encara e depois olha para mim sorrindo. — Eu não sei como você não pegou esse boy ainda, garota. Ele é caidinho por você, Sky. E não vem com essa de “somos melhores amigos”. Se eu fosse você, eu já implorava para ele me foder. Bom, no caso, nem precisaria, dá pra ver que ele deseja isso.

Arregalo os olhos ao ouvir a palavra “foder”. Jimmy caidinho por mim? Nunca. Como assim dá pra ver? Eu não vejo nada. Se algo rolasse ia ser estranho, o vejo apenas como amigo.

— Tina! Nada a ver... — Fico sem palavras.

— Ok, já vi que você adora se fazer de tonta — ela dá um sorrisinho safado. — Aonde Megan se enfiou? Achei que ela queria se sentar.

— Não sei, ela parecia estar procurando alguém e saiu — respondi dando um gole na cerveja.

Olho para a área VIP, que não estava mais vazia, e vejo uma mulher de cabelos vermelhos toda tatuada junto com uma mulher de cabelos mel. Elas me eram familiares. Lembro-me, então, do dia em que as vi quando eu estava conhecendo o bairro como o Jimmy. Sim, eram elas. Seu olhar encarou o meu. Senti meu sangue esfriar. Ela voltou a olhar para a amiga, em seguida cochichando em seu ouvido. A mulher de cabelos mel agora me encarava também. Desvio o olhar e tomo mais um gole da cerveja.

— Senhora e Senhores. Prontos para ver mais uma batalha épica? — Uma voz saiu das caixas de som. Um cara se encontra no meio do ringue com um terno rasgado e parecia estar segurando um microfone. Vejo a multidão correndo diretamente para o ringue e gritando, animados.

— Já vai começar! Vamos lá. — Tina fala pegando a bolsa e as bebidas. Levanto-me e vou em direção à multidão. Fico na ponta dos pés para tentar enxergar os lutadores. Está muito lotado. Eu estava bem irritada com aquele tanto de gente. Tentei me enfiar entre as pessoas.

Luzes bem fortes deixam meus olhos desconfortáveis. O homem apresenta os dois homens que iam lutar e a galera grita a cada palavra. Meus ouvidos doem. Uma mulher quase nua anda sobre o ringue com uma placa. Pensei que só iria ver isso em filmes. E a luta começa. O cara da direita dá um golpe no da esquerda no rosto. A galera grita mais. Faço cara de nojo ao ver sangue começar a se misturar com suor. Não era possível que só eu estava odiando aquilo.

Olho para as pessoas para ver se eu conseguia encontrar Jimmy ou Tina. Tina! Droga, me perdi dela. Olho para cada rosto que apreciava a luta, a fim de encontrar um rosto conhecido. Sem sucesso. Então olho para cima e vejo a maldita área VIP. Alguém me encarava. Senti o sangue tomar meu rosto.


Sétimo Capítulo

Um homem de olhos escuros me encarava e logo meu coração dispara. Parece que seu olhar entrou no meu corpo e rompeu tudo que se habitava nele. É como se algo me devorasse aos poucos. Que sentimento estranho é esse? Medo? Timidez? Atração? Eu não sabia realmente o que estava sentindo. Fico sem fôlego. Meu rosto está queimando. Ele é deslumbrante. Suas tatuagens cobrem seus braços musculosos que saltam de sua regata preta, elas seguem o caminho até o pescoço, seu antebraço apoiado no parapeito com uma garrafa de cerveja em uma de suas mãos, é como seu eu estivesse apreciando uma obra de arte.

Meus olhos seguem seu outro braço, onde se encontrava agarrado a uma mulher loira. Ela é bem... Sensual. Seu corpo esbelto chamava atenção, usava um vestido curto vinho, seus lábios pintados a um batom rosa escuro e seus cabelos loiros ondulados e sedosos caíam sobre seu ombro. O que é essa pontada em meu estômago? Estou ficando confusa com essa mistura de sensações. Então, a mulher começa a beijar seu pescoço, o vejo tomar o rosto dela partindo para um beijo. Meus lábios se separam lentamente ao vê-los se beijarem, como se eu estivesse desejando estar ali. O que está acontecendo comigo? Sky volte a real, pelo amor de Deus.

Enquanto a beijava, seus olhos permaneciam abertos. Estavam em minha direção. Realmente estavam? Ou isso era da minha cabeça? Estou em transe, não consigo me mover. O que caralhos estava acontecendo? Tudo parece estar em um total silêncio.

Desvio o olhar, respiro fundo e a gritaria toma meus ouvidos novamente. Eu devo estar louca, com tanta gente aqui bonita, porque ele me olharia? Ainda mais um cara como ele. Aqui estou eu me iludindo novamente. Achei que isso nunca ia acontecer depois que me iludi com um garoto da escola aos meus 16 anos, ele me encarava o tempo todo, mas depois descobri que ele queria conhecer o Jimmy. Sim, foi um momento tenso.

Esfrego minha mão na bochecha com a esperança de esfriá-las.

— Sky, para com isso. — sussurro para mim mesma.

Eu precisava ir ao banheiro. Urgente. Ajeito minha bolsa e vou saindo da multidão que continuava a gritar. Agora minha missão é achar onde está o banheiro nesse lugar lotado. Tento procurar placas, mas não encontro nada. Vou até o bar que se encontrava mais vazio.

— Deseja beber algo, srta.? — Um homem aparece em minha frente atrás do balcão, limpando um copo.

— Uma cerveja, por favor. — respondo.
Eu preciso tomar algo gelado. Meu rosto está ardendo. Como alguém consegue ser tão gostoso assim? Isso, gostoso! Essa é a palavra que define aquele homem. Ele conseguiu ser mais atraente que o Jimmy. Já vi que terei que apelar para o meu amigo pornô essa noite, me sinto excitada. Droga. O que foi aquele olhar? Ele não pode ser desse mundo...

Balanço a cabeça para tentar esquecer-me do tal maldito.

— Aqui está. — ele me entrega a garrafa de vidro. — Não está curtindo a luta? — Me pergunta.

— Não gosto muito dessas coisas. — respondo fazendo uma careta.

— Entendo. — O homem pega outro copo para limpar.
Tomo minha cerveja para acabar com minha garganta seca, a sinto descer rasgando. Isso é tão bom. Peço mais algumas depois de terminar a primeira e ouço “Like a Stone” do Audioslave tocar no ambiente cheio de gritaria, até que dava para escutar melhor, pois havia uma caixa de som perto do bar. Cantarolei um pouco e ao terminar minha terceira cerveja. Levanto-me.

— Poderia me informar onde posso encontrar o banheiro aqui? — Pergunto ao homem.

— Bom, os banheiros do andar de baixo são lotados e bem nojentos. Como vi, você não é acostumada com lugares assim. Poucos sabem, mas no andar de cima tem banheiros mais limpos e vazios, é só subir.

— Obrigada. — Sorrio.
Vou em direção à escada desviando das fumaças de cigarro e de homens totalmente bêbados. Ao subir vejo um corredor enorme. Está vazio. Como que não há ninguém aqui? Tento procurar alguma placa na porta e nada de banheiro. Há muitas portas, mas eu não tenho a coragem de sair abrindo-as. Sinto que eu não deveria estar aqui. O medo toma conta do meu corpo. É melhor eu descer.

Paro em uma das portas ao ouvir um gemido.

— Você vai falar ou não caralho? — Uma voz grossa fala atrás da porta. E mais alguns gemidos tomam o quarto junto com barulhos de socos. Alguém estava apanhando. Fico imóvel. Devo chamar alguém? Meu Deus, o que faço?

— Quer perder a vida aqui mesmo idiota? — A voz volta em seguida. — Cody, o alicate!

— Tyler acho que já está bom, ele já entendeu o recado. — uma outra voz fala.

— Ele vai falar e se não falar, vou matá-lo aqui mesmo. Certo, Jay? — A voz grossa agora fala em um tom mais baixo. — Ótimo, o que o Ethan quer?

— N-Não sei, senhor, não o conheço. — O cara tenta falar.

— Mentiroso. Acha mesmo que acredito nesse papo de que não o conhece? Acha mesmo que vai me enganar? — Outro barulho de soco.

— O-Ok, ok. Ele me mandou para vigiar seu chefe, relatar tudo que ele faz. — o cara tosse.

— Ha, ha, ha. Covarde, não? — Ouço três risadas na sala. — Precisa mesmo mandar um otário para vigiar meu chefe? — Mais risos tomam a sala — Seu chefe precisa saber com quem está lidando.

— V-Vou falar com ele, mas, por favor, não me mata! — O homem implora.

— Tarde demais.

Então minha bolsa cai e solto um grito abafado. Levanto-a rápido e escuto tudo ficar em silêncio. Droga! Será que me escutaram? Tento sair de fininho andando para trás. E sinto a presença de duas pessoas. Então, algo tampa meu nariz e vejo tudo apagar.

Abro meus olhos vagamente e sinto algo apertar meus pulsos. Estou amarrada? Espero minha visão desembaçar e noto a presença de três homens. Um sentado em uma cadeira no meio. Estava com suas pernas abertas e com um cigarro em sua boca. Os outros dois estavam ao seu lado, um do lado direito e outro no esquerdo. O do esquerdo era alto, magro, possuía poucos músculos e tinha um cabelo grande amarrado. Estava com uma feição séria e me encarava. O outro era mais baixo, possuía cabelos castanhos escuros e olhos verdes. Ambos eram bem tatuados. O da esquerda possuía um corvo enorme no lado esquerdo do pescoço, enquanto o da direita tinha a mesma tatuagem, porém no lado direito. Eles tinham algumas semelhanças, eu julgaria que são parentes.

— Acho que Ethan mandou outro ratinho. Ratinha melhor dizendo. Não imaginava que o cara mandaria uma mulher, covarde. — O homem alto fala e se prepara para aproximar.

— Onde estou? — Pergunto tentando me acostumar com a visão turva. Minha cabeça girava e doía.

— O que faz aqui garota? — Pergunta, agora se aproximando.

— E-Eu estava procurando o banheiro. — respondi.

— Ah, claro... Quer mesmo que eu acredite nisso? — Aproxima seu rosto do meu.

— Por que eu mentiria? — tomei a coragem de falar.

— Será por que você estava perto da porta bisbilhotando? Agora responda. Por que Ethan te mandou aqui? — Pergunta tirando algo do bolso, não consigo ver o que é.

— Ethan? Quem é Ethan? — Pergunto confusa.

— Agora se faz de desentendida. Olha garota, acha certo ficar atrás da porta escutando conversas alheias? Sei que alguém te mandou aqui. — fala, passando a blusa no objeto como se estivesse limpando. Droga, eu não conseguia ver. Ele vai me matar? Eu tento me manter calma.

Olho para o homem do meio e não acredito no que vejo. Droga é ele. O cara que estava me encarando. Bom, a pessoa que eu achava que estava me encarando. Realmente era ele, o cara que estava engolindo a loira. Sinto outro frio na barriga ao ver seus olhos me encarando mais uma vez. São lindos, profundos e escuros. Pisco umas quatro vezes. Eu estou nervosa. Sinto uma dor nos pulsos. Olho e noto que estou realmente amarrada.

— Eu realmente não sei quem é Ethan. Sou nova na cidade, não tem como eu conhecer esse tal Ethan. Olha, — respiro fundo para manter a calma — vim com umas amigas da faculdade. Eu realmente não o conheço. Você pode me soltar? Isso está me machucando. — Falo olhando desesperadamente para ele agora. Vejo uma de suas sobrancelhas levantarem. Ele se permanece calado e continua tragando seu cigarro.

— Acha mesmo que sou louco de te soltar? De onde você é? — O cara magro volta a perguntar.

— O quê? Acha que eu vou fazer algo com você, olha o seu tamanho. Por favor, meus pulsos e minhas mãos são importantes pra mim, está me machucando. — Droga, Sky se controle. Quem foi o desgraçado que amarrou aquela corda.

Ele olha para o homem do meio e ele assente. Ele desamarra minhas mãos e tento massagear meus pulsos ao sentir a corda cair.

— Agora responda de onde você é garota? — O homem magro pergunta.

— Sou de Waltham. — minto, não posso dizer que sou daqui, tenho a leve impressão de que eles perguntariam minha vida toda. Não quero dizer sobre o caso dos Owens. — Eu juro que não sei nada sobre vocês, sobre Ethan ou sei lá mais quem. Se quiserem confirmar com meus amigos é só ir lá em baixo. Eu só queria achar a porra do banheiro. — Digo irritada. Talvez seja a adrenalina ou o álcool. Ou a dor que eu sentia em meus pulsos. Eu não estava de bom humor só de estar aqui. Eu deveria ser mais educada, não quero morrer.

O magrelo me olha curioso. Vejo o homem engolidor de loiras cochichar no ouvido do outro cara que logo saiu em seguida.

— Boquinha suja hein e bem corajosa. Há vários banheiros lá em baixo, porque procuraria aqui em cima? Você sabe com quem está se metendo garota? — Ele para de novo à minha frente e levanta suas sobrancelhas. Esse cara estava começando a me irritar. Quantas vezes eu teria que repetir.
— Não, porque como falei, não conheço vocês e não conheço esse lugar. Não entendeu ou quer que eu desenhe? Sou ótima nisso, posso desenhar para você. — Digo levantando uma sobrancelha e ouço uma risada escapar. Olho para onde ela veio. É a dele. Maldito sorriso. Sinto meu rosto queimar novamente e desvio o olhar. Não sei o que estava acontecendo comigo. Eu realmente estava enfrentando o perigo. Vejo a cara do magrelo se fechar.

— Está tirando uma comigo garota? — Ele fala irritado.

Escuto a porta se abrir

Jay, o policialzinho de merda está vindo para cá. — O garoto de olhos verdes fala ofegante. Jay? Esse nome me era familiar.
Vejo o tal de Jay abrindo um sorriso de lado e afirma com a cabeça para o magrelo. Então o vejo levantar uma faca. Entrei em desespero ao ver o objeto. Flashes tomaram minha visão, o diálogo entre mim e minha mãe ecoavam nos meus ouvidos. Sinto minha respiração acelerar. Lágrimas caem dos meus olhos. Meu coração está quase saindo pela boca. Eu estou na casa...

— Sky, vá para o quarto e se esconda. Eu te amo, filha. — Minha mãe grita. O homem vai em direção a ela.

— Deixa minha mãe em paz, por favor. — grito o mais alto que posso.
Após a faca cortar o pescoço da minha mãe o homem vem em minha direção. Fecho os olhos. Sinto minha pele marcada pela lâmina doer.


— Sky! — Abro meus olhos voltando a realidade . Vejo Jimmy tomar meu rosto com suas mãos frias. Minha respiração está rápida, tudo parece girar. O que raios acabou de acontecer? Meus olhos estão cheios de lágrimas. — O que vocês fizeram com ela?

Percebo que todos me encaravam confusos. Minha respiração não acalmava. Parecia que eu iria desmaiar a qualquer momento.
— Filho da puta! — Jimmy foi em direção à Jay para dar um soco.

— Jimmy, para! — Tive a força de gritar. Tento controlar minha respiração. Enxugo minhas lágrimas. — Eles não fizeram nada. — respondo olhando para o chão. Não consigo encarar ele, me sentia envergonhada. Eu estava em choque.

Jay e os outros dois me olham ainda mais confusos. Eles devem estar achando que sou louca, que tenho problemas na cabeça. Quem não iria? Eu não sabia que eu poderia alucinar aquela maldita noite.

— Como assim não fizeram nada? Olha sua situação — ele me encara.

— Vamos embora, por favor. — Abaixo e pego minha bolsa. Vi que estava aberta, nem liguei. Apenas a coloquei no ombro. Sinto Jimmy tomar meus ombros com o braço e me guiar até a porta. Minha respiração estava voltando ao normal, mas eu queria chorar. Apenas chorar.

— Você está fodido na minha mão, Jay Simmons — Jimmy fala para Jay, antes de sair da sala.

— O que caralhos acabou de acontecer? — Escuto uma voz dentro na sala ao sair. Parecia ser a voz do cara mais baixo.

Entro no carro de Jimmy, respiro fundo e olho para o letreiro gigante “Triangle”. Jimmy entra no carro e me cobre com seu casaco.

— Está tudo bem? — Jimmy pergunta esfregando seu casaco no meu ombro.

— Sim. — digo em quase um sussurro.
— Sky, o que aconteceu lá? — Jimmy me olha puto.

— Eu escutei a conversa deles e eles acharam que alguém tinha me enviado, sei lá. Fizeram-me algumas perguntas e eu as respondi. — explico. Eu estava mais calma. Será que devo voltar a consultar um psicólogo? Isso de alucinar parecia bem perigoso.

— E por que chorou? Por que gritou daquele jeito? — Pergunta.

— Não sei... Parece que em questões de um segundo fui levada para aquela noite. Vi o cara erguer a faca para a minha mãe. Tive as mesmas emoções e reações de tudo o que aconteceu. — Mais lágrimas escorrem no meu rosto, as limpo em seguida.

— Queria muito ter meu distintivo em mãos e colocar aquele imbecil na cadeia. — Ele bate no volante.

— Jimmy ele não fez nada. Estava mais fácil do outro fazer do que ele. Isso o que acabou de acontecer foi o meu pesadelo vindo me amedrontar.

Um silêncio toma o carro. Jimmy parecia puto por eu defender o Jay, logo ele suspirou e levou suas mãos para meu rosto enxugando as lágrimas.

— Não chora mais. Vou te levar para casa. Vamos esquecer isso. E, — parou por um momento — fique longe daquele cara.

— Por quê? — Sério Sky? Você ainda pergunta “por quê?”.

— Esse Jay Simmons é um cara perigoso, Sky. Ele é líder da maior gangue da cidade. Mexe com tráfico, armas, tudo que é de ruim. Se bobiar até assassinato o cara está envolvido. Ele usa aquela aparência de playboyzinho pra atrair qualquer tipo de mulher e usar como ele quer. Por favor, não chegue perto desse cara. Eles podiam ter te matado, Sky. — Jimmy me encarava. Atrair mulheres e usá-las como quer? Assassinato? Me matar? Ele é tão perigoso assim? Meu Deus, eu estava louca ao responder aqueles caras daquele jeito. Será que aquilo que senti foi atração, ele realmente conseguiu me seduzir só com um olhar? Era esse o tal poder dele?

Assento confusa e Jimmy liga o carro. Mando mensagem para Tina dizendo que eu tinha ido embora com Jimmy. Ela me manda várias perguntas como o que tinha acontecido e se eu estava bem e em seguida uma mensagem escrita “se estiver com o Jimmy, não se esqueça, use camisinha ;) ”. Sorrio ao ler, Tina era louca. Mal sabia ela daquela situação.

Chegando à porta de casa, Jimmy suspira mais uma vez.

— Hey, vamos esquecer o dia de hoje, ok? Mas juro que se esse cara encostar novamente em você, não sei o que serei capaz de fazer. — Jimmy me olha furioso.

— Ele não encostou um dedo em mim Jimmy. Relaxa. Eu estava escutando a conversa, eu realmente fui errada. Eu estou bem agora, não se preocupe. — O tranquilizo.

— O que eles estavam falando? — Perguntou.

— Não sei, não ouvi direito. — Minto.

— Sky, fala. Preciso de provas concretas para por aquele imbecil na cadeia quando eu passar no treinamento.

— Já falei que não sei Jimmy, não consegui escutar nada. Fui pega tentando. — Digo irritada. Por que estou escondendo dele? Não era o certo contar? Esquece, é melhor eu não me meter nisso.

— Ok, tenta descansar. Se sentir vontade de desabafar, me ligue.

— Pode deixar. — dou um beijo no seu rosto — Boa noite.

— Boa noite.

Tudo que fiz ao chegar em casa foi tomar um banho, caçar comida na geladeira e depois tentar dormir. Chorei um pouco ao lembrar-me daquela cena. A vergonha me tomou mais uma vez ao me lembrar daqueles rostos confusos me olhando. Consegui me desapegar ao ocorrido após assistir um filme no celular. Tento dormir, mas como sempre, não conseguia. Porém o motivo agora era aqueles malditos olhos que tanto me encaravam.


Oitavo Capítulo


— Aconteceu alguma coisa ontem? — Meu pai pergunta me analisando.

— Não. Foi tudo normal. — Minto.

— Seus olhos estão inchados, Sky. — Ele tenta encostar e eu o evito.

— Não aconteceu nada, pai, deve ter sido a fumaça. Aquele lugar estava empesteado de fumaça. — mordo a torrada.

— Hum. Como voltou para casa? — Pergunta.

— Jimmy me trouxe — respondo.

— Jimmy também frequenta esses lugares? — Ele arregala os olhos.
— Sim pai, quase toda a cidade. Não é um evento ilegal. — Reviro os olhos. Eu realmente não estava boa para ouvir meu pai julgar as ações alheia. Esse era o defeito dele, por ser policial ele sempre julga os atos das pessoas. Se é certo ou errado, se está seguindo a lei ou não. Quem liga? Hoje me sinto mais sensível e irritada. Acordei com uma vontade de sumir e de chorar. Queria faltar à faculdade hoje, mas mal cheguei, não tenho essa audácia.

— Hoje vou sair com o Tom para encontrar uns antigos colegas. Talvez eu volte tarde para casa. — ele quebra o silêncio. Assenti. Eu estava com a mente longe. Não conseguia parar de lembrar de ontem. — Sky, você realmente está bem filha? Está calada. — ele me encara.

— Sim pai, estou. — Levanto-me e dou um beijo em seu rosto. — Bom vou indo. Não quero me atrasar. Se divirta com seus amigos. Te amo. — pego a bolsa e vou para a porta.

— Também te amo — o vejo sorrir.

A caminho da faculdade, passo perto da academia abandonada. Eu realmente queria visitá-la. Chego perto e tento olhar pela janela quebrada. Havia um ringue intacto e sobre ele tinha um saco de boxe. Levanto meus pés para tentar ver mais e vejo um sofá velho, porém intacto. Alguns equipamentos de ginástica estavam desmontados e se encontravam encostados na parede. O local parecia estar mais limpo do que seria o normal, como se alguém o limpasse constantemente. Há pouca poeira e algumas teias de aranhas, mas nada caindo aos pedaços. Perfeito, assim não corro o risco de pegar alguma doença. Queria tanto cabular aula e ficar ali o dia inteiro, desenhando. Suspiro e sigo o caminho.

Chegando ao campus. Vejo grupinhos de amigos conversando. Um garoto tentava pendurar um banner enorme perto da entrada. Uma garota me entrega um folheto convidando-me para ver a apresentação do trabalho de fim de curso deles. Pego o folheto e sigo o caminho até a minha sala. Hoje a aula será no auditório, parece que teremos um palestrante alemão de artes plásticas. Eu estava ansiosa para assistir. Ao chegar ao auditório o grupo de garotas risonhas conversavam com alguns garotos. Ambos me encaram. Vejo Tina e Megan sentadas em uma das cadeiras no meio do auditório.

— Olá. — sento-me.

— Sky! O que aconteceu ontem? Por que foi embora cedo? Aconteceu alguma coisa? — Ela dispara com os olhos arregalados.

— Estou bem. Não aconteceu nada. Apenas me senti mal e fui embora. — Minto a acalmando.

— Eu só fiquei tranquila por que soube que estava com o Jimmy.

— Você foi embora com o Jimmy? — Megan pergunta arregalando os olhos.

— Sim, fui. — Quase sussurro.

Ela solta um ar pela boca e se vira para frente fechando a cara.

— O que foi, Megan? Ela é a melhor amiga dele, normal. — Tina a enfrenta.

— Não é nada. — Megan volta a ficar com a cara fechada.

Pensei em perguntar o motivo, mas desisti. Será que aquela Megan que ligou para o Jimmy, é essa Megan que conheço? Com certeza vou perguntar para o Jimmy. Abro minha bolsa e noto que meu caderno não está ali. Droga onde foi parar? Tento lembrar-me se o deixei em casa. Então a noite passada passa vagamente em minha cabeça.

— Minha mochila estava aberta. — sussurro para mim mesma.

— Oi? — Tina me olha.

— Perdi meu caderno. — a olho espantada.

— O quê? Procura direito. Você não deixou em casa? Meu Deus Sky, seus desenhos.
— Eu sei. Não deixei em casa. Ah, Senhor. — Tento procurar mais uma vez na bolsa. Eu estava implorando para ele aparecer milagrosamente na minha frente. — Acho que perdi no Triangle.

— Por que você levou seu caderno para lá? — Ela pergunta confusa.

— O levo para todos os lugares, não tiro da minha bolsa. Nunca. — Continuo a tirar tudo de dentro da minha bolsa. Ai Deus, por favor, meus desenhos não. A maioria levou bastante tempo para terminar. Dói perder eles.

— Será que algum funcionário achou? Vamos voltar hoje lá para perguntar. Calma que você vai achar.

— Não, acho que realmente já era. — Desisto de procurar. Nem me pagando que eu volto para aquele lugar. — Passo na papelaria mais tarde e compro outro. — digo suspirando.

— Toma aqui, desenha aqui hoje. — Ela destaca um papel do seu caderno e me entrega.

— Obrigada. — pego e suspiro mais uma vez. Sinto Tina me encarar com um olhar de pena. E eu achando que nada podia estragar meu dia. Que saco. Pelo menos hoje tinha a palestra.

Outras meninas se juntaram ao grupo das garotas risonhas. O que tanto elas riam?

— Owens, certo? — Uma delas grita em minha direção. Sinto meu sangue gelar e assento.

— Sky, não dê ouvidos. — Tina me alerta.

— Não falei? É ela mesmo. — Uma das meninas me olha espantada. Tento seguir o conselho de Tina e ignoro.

— Soube que a mãe dela traiu o pai dela, ele descobriu e conseguiu fazer a cabeça dela para não encontrar mais o amante, o amante revoltado fez aquilo como vingança. — uma voz ecoou o auditório. Todos ficaram quietos e encaravam a menina. Sinto como se alguém jogasse um balde de água fria. Meu coração dói ao ouvir cada palavra sobre minha mãe. Ela traiu meu pai? O assassino é o amante? Eu não consigo acreditar no que eu acabei de ouvir. Eu odeio os humanos. Odeio tudo. Meus olhos começam a queimar.

Não consigo me mexer. Respiro fundo e tudo que consigo fazer é fechar meus olhos sentindo uma lágrima pingar. Não tenho forças e nem estruturas para gerar uma discussão agora. Tive o impulso de pegar minhas coisas, me levantar e sair correndo.

— Sky! — Tina me grita.

— Abra a boca mais uma vez e eu te mato vadia. — agora era a voz de Megan se referindo ao grupo de garotas. Nunca pensei que ela me defenderia.

— Pegou pesado, Victoria. — um garoto diz para a menina que acabou de estragar meu dia.

Tudo que eu fiz foi correr o mais rápido que pude, ouço Tina e Megan correrem atrás de mim, mas consigo me esconder. Eu me perguntava o porquê de estar viva? Eu queria sumir, apenas isso. Pegava-me muitas vezes desejando morrer naquela noite. Por quê? Não aguento tudo isso. Tudo que eu queria era esquecer, mas como se todos ainda comentam ao ver o sobrenome “Owens”. Meu peito parece querer explodir. Já bastava ter aguentando tudo aquilo naquela época e depois de cinco anos tenho que aguentar pessoas julgar minha mãe, que foi morta sem motivo nenhum e ainda passarem a mão na cabeça de um assassino tentando justificar aquele ato cruel. Sinto nojo dessas pessoas.

Eu não podia ir para casa nesse estado, Tia Betty iria fazer um interrogatório e não estou nada a fim de explicar tudo. Ando o caminho todo segurando minhas lágrimas, algumas caíam sem minha permissão. Os olhares de interrogação das pessoas ao me verem chorar me torturam ainda mais. Por favor, me deixem em paz. Eu preciso me esconder desse mundo por apenas um segundo. Então a vi. A academia.

Entro pelo buraco do portão tomando cuidado para não me cortar com os cacos de vidro. Jogo minha bolsa no chão e deslizo pela parede sentando-me no chão um pouco empoeirado. Não ligo se aquilo iria estragar minha roupa, não ligo para mais nada nesse exato momento. Simplesmente desabei. Não consegui conter minhas lágrimas e meu desespero.

Aos poucos consegui me conter. O cheiro de mofo que permanecia no local, por incrível que pareça, estava me acalmando. Alguns soluços interrompiam minha respiração. Tento limpar meu nariz e meus olhos com a manga da blusa. Escuto o telefone tocar. “Jimmy” aparece na tela. Deslizo e me arrependo na mesma hora.

— Oi? — Funguei.
— Sky? O que aconteceu? A Megan me ligou e... — ele pausou parecendo ter falado algo de errado. Então é a mesma Megan. O que aconteceu entre eles? Megan me fuzilava só com o olhar toda vez que eu comentava sobre Jimmy. — O que aconteceu?

— Jim, eu não aguento mais. Não aguento. Eu quero... — Sinto o choro prestes a voltar, tento segurá-lo.

— Sky, calma. Ai droga queria estar aí com você, maldito treinamento, não posso sair. Me conta o que aconteceu?

Eu não quero repetir aquelas palavras. Aquelas palavras difamando minha própria mãe. Tentando justificar o erro de um monstro. Nojo de quem inventou aquilo. Tento recuperar a respiração. Não era para eu ter a atendido. Eu preciso ficar sozinha.

— Não foi nada. — Tento falar mais calma. — Apenas tive outra recaída. Não se preocupa, eu estou bem agora. Só quero ficar sozinha. — falo, tentando evitar Jimmy. Ele vai achar que sou bipolar, mas fazer o que? Não quero conversar agora.

— Não foi nada o caralho, Sky! O que disseram pra você? Me fala! — Jimmy estava quase gritando.

— Jimmy, depois conversamos. Você está ocupado. Prometo que não farei nenhuma besteira. — Tento segurar minhas lágrimas, mas elas ganham essa batalha e caem. Eu estava mentindo. Eu realmente queria fazer alguma besteira e várias coisas passam na minha cabeça nesse exato momento.

— Ok, vou confiar em você. Saindo do treinamento eu passo na sua casa. Vamos conversar. Lembra-se que te amamos Sky. Por favor, não faça nada.

— Sim, fica tranquilo. Beijos.

Ao desligar o celular, volto a chorar. Não acredito que aquelas malditas estragaram minha chance de assistir a palestra. Que ódio. Ao conseguir me acalmar, paro para apreciar o silêncio. Alguns pássaros assobiam lá fora. É tão bom, tão confortável estar aqui.

— Dia ruim? — Pulo ao escutar uma voz grossa. Olho em direção da mesma. Espera? Jay? Jay Simmons estava encostado na janela fumando. Que horas ele chegou aqui? Como ele está aqui? Eu estava alucinando? Balanço a cabeça a fim de tentar apagar a visão dele na minha frente.

— É muda? — pergunta. Droga ele está realmente aqui. Enxugo minhas lágrimas.

— Não .— falo trêmula. “Ele é perigoso, Sky, mantenha distância. Lembra-se que prometeu ao Jimmy”, eu repetia em minha mente. Tento pegar minhas coisas e levantar para sair dali.

— Espera. Você não vai sair daqui sem responder algumas perguntas. — Joga seu cigarro no chão agora cruzando seus braços. Jay tem uma beleza de tremer as pernas. Filho da puta é um gato. Aquelas tatuagens cobrindo seu corpo inteiro, eram lindas. Aquilo deve ter doído muito. Noto que ele tem uma argola em sua narina esquerda. É estranho ver que isso combina muito com o resto de seu visual. Ele é tão, tão gostoso. Balanço minha cabeça a fim de sair dessa magia que ele tinha sobre mim. Perigoso, Sky. Vaza.

— Já vi que a senhorita adora estar em lugares em que não deveria estar. — Ele fala levantando suas sobrancelhas.

— E-Estou de saída. — Tento passar por ele e o sinto me puxar. Suas mãos cobriam meu braço inteiro. Eram enormes e grossas. Meu Deus.

— Acha que estou brincando, garota? — Sua voz engrossa. Sinto um frio tomar meu corpo. — Senta. — diz apontando para o sofá. Sento-me. Meu coração está prestes a sair pela boca.

— Está me vigiando? — Pergunta.
— Vigiando? Quê?

— Você não respondeu aquela noite, o que fazia no corredor escutando escondida? — Ele estava sério.

— E-Eu já falei, eu estava procurando banheiro. — Ele ri. — É sério, o bartender estava conversando comigo, perguntei onde tinha um banheiro e ele disse que eu podia usar o do andar de cima. Não me diga que não existe banheiro no andar de cima? — Perguntei.

— Existe.

— Então por que não acreditam em mim? — Pergunto.

— Por que é estranho. Te encontro ouvindo nossa conversa atrás da porta e agora te encontro aqui.

— Não vejo nada de estranho. Agora posso ir? — Levanto uma sobrancelha. Eu ainda tremia por dentro. Levanto do sofá agora ficando bem próxima a ele. Senhor que homem! Toda vez que o vento bate, seu cheiro invade meu nariz. Nunca pensei que uma mistura de cigarro com perfume fosse tão bom.

— Não. Tenho mais perguntas. Por que reagiu daquela forma? — Ele me encarava. Malditos olhos escuros. Sinto minha pele queimar.

— Não quero falar sobre isso. — encaro o chão. Aquela noite foi uma vergonha e tanto. Quero esquecê-la.

— Quer que eu arranque a resposta de um jeito pior? — Ele ameaça.

— O quê? Vai me bater? Matar? Ótimo, hoje estou realmente querendo morrer. Me mata. — Abro os braços e meus olhos começam a arder. Jay fica estático, uma de suas sobrancelhas levanta de modo curioso. Esse jeito dele de certa forma me irrita. Essa mania de estar curioso sobre algo e que quer a resposta de imediato. Como se mandasse em mim, coitado.

Jay começa a rir.

— Acha que essas palavras impedem de eu fazer algo com você garota? É uma pena, não quero sujar esse lugar de sangue. — Seu tom volta a ser ameaçador.

— Vai me forçar a falar algo pessoal? Quer saber o que aconteceu? Eu sou louca, tenho problemas sérios na cabeça, foi isso. — Rebato.

Jay me encara e fica sem palavras. Engulo seco.

— Não venha mais aqui. — ele alerta e senta no sofá.

— Por quê? Esse lugar é seu? Pelo que eu vi ele está abandonado. Posso ir e vir a hora que eu quiser. — Não sei de onde estou tirando a coragem, acho que estou realmente querendo morrer hoje.

— Esse local está no meu nome. Odeio que pisem aqui sem minha permissão. — ele aponta para o chão do local. — Vaza daqui. Não queira saber o que farei com você ao vê-la aqui de novo, está avisada.

Pego minha bolsa no sofá. Tento manter minhas pernas firmes, mas estava bem complicado. Tudo que eu quero nesse exato momento é dar um chute nele e simplesmente sair dali. Sinto-me mais aliviada ao imaginar a cena. Decido ir embora, era melhor assim.

Passo na papelaria e compro outro caderno. Fico mais triste ao lembrar-me dos meus desenhos perdidos. Hoje realmente não era meu dia. Passo na farmácia e compro alguns calmantes. Eu realmente preciso de alguns.

Chego em casa ainda cedo. Penso em como não voltar amanhã para a faculdade. Não quero ter que enfrentar Megan e Tina. Fico vermelha de vergonha só em pensar. É constrangedor. Passou na minha cabeça desistir da faculdade e seguir um rumo diferente, mas eu não sabia fazer mais nada além de desenhar, sem contar que eu estou no último ano. Céus. O que aquela menina falou... As pessoas realmente achavam isso? Que minha mãe traía meu pai? Ao fazer essas perguntas sinto meu peito apertar. Odeio tudo isso. Tomo um banho para tentar relaxar, mas a água foi o gatilho para mais choros no banho.

Ao terminar vou para a cozinha de roupão e como a torta que estava no forno. Vejo o recado da tia Betty na geladeira “Fui para o chá de bebê de uma amiga, tem torta no forno”. Sorrio ao ver que fui mais rápida em achar à torta. Desligo meu celular e tomo os calmantes junto com o suco. Eu precisava ficar sozinha.

Eu ainda tenho que enfrentar Jimmy hoje à noite. Penso se conto ou não sobre o encontro com o Jay. Acho melhor não, ele ia ficar puto. Vou para o quarto, ligo minha caixa de som em um volume ambiente e sinto Iris do Goo Goo Dolls tomar minha alma. Logo o remédio começa a fazer efeito e apago.


Nono Capítulo


— Sky. — Sinto alguém alisar minha testa. Abro os olhos e vejo Jimmy com a feição preocupada.

— Hm. — Murmuro. Eu estava sob efeito do remédio ainda, estava muito sonolenta. E aquela voz macia dele me deixava mais ainda.

— Está tudo bem? — Pergunta, colocando uma mecha do meu cabelo atrás da orelha.

— Uhum. — Murmuro mais uma vez — Desculpa, não vou conseguir conversar hoje, tomei alguns calmantes. — Tento falar atropelando algumas palavras.

— Tudo bem, só vim ver como você estava. Amanhã conversamos, sua tia me chamou para almoçar aqui. Vou deixá-la dormir. — ele beija minha testa.

Puxo meu cobertor e viro de lado. Apago mais uma vez. A noite foi tão tranquila graças ao remédio, queria poder tomar ele todos os dias, mas sei que não posso. Queria poder dormir normalmente.

Sinto o sol queimar meu rosto, a cortina atrás da minha cama estava aberta. Droga esqueci-me de fechar, se não fosse o sol eu com certeza iria dormir mais pouco. Tento abrir os olhos que logo são impedidos pelo mesmo. Ouço meu telefone tocar, não consigo ver o nome e deslizo.

— Oi. — digo sonolenta.

— Sky, sou eu, Tina. Como você está? Vai vir hoje? — pergunta. Olho para o relógio e eu estava atrasada. Decido não ir.

— Não vou hoje, mas estou bem. Só preciso de um tempo sozinha. — Tina vai entender o motivo.

— Tudo bem. Eu gravei a palestra pra você, você parecia tão ansiosa para vê-la. Descansa bem. Ainda bem que você não veio hoje, só terá o primeiro horário. O professor de artes nos passou um trabalho pra ser entregue na terça, então o resto dessa semana não terá aula por conta de uma manutenção na faculdade. Vamos fazer ele na sexta na minha casa, te mando o endereço certinho. E Sky, não fique brava, avisei o coordenador sobre o ocorrido, ele dará um sermão na vadia que falou aquilo, não se preocupe.

— Obrigada, Tina. Valeu mesmo. Me passa por mensagem sobre o que é o trabalho, assim preparo algumas coisas antes.

— Nada. Passo sim. Bom o professor chegou, vou desligar. Beijinhos.

— Beijos. — desligo.

Levanto-me e vou para o banheiro tomar um banho. Após toda minha higienização, visto meu moletom largo cinza. Sinto-me tão protegida com roupas largas, simplesmente as adoro. É como se elas me protegessem de qualquer coisa, mesma impressão que temos do cobertor nos proteger de monstros.

Passo pelo quarto do meu pai e o vejo todo descabelado tentando se levantar. Sorrio ao ver a cena.

— Bom dia, pai. — Entro em seu quarto.

— Bom dia, minha princesa. Não vai pra faculdade hoje? — Pergunta esfregando os olhos e bocejando em seguida.

— Não, tomei alguns calmantes ontem e acordei atrasada hoje. — explico sentando-me ao seu lado.

— Calmantes? Está tudo bem? — Me olha preocupado.

— Está sim, apenas queria dormir tranquilamente.

— E por que acordou tão cedo? Volte a dormir.

— Quero dar uma caminhada e desenhar um pouco para esfriar a cabeça. — Sorrio.

— Entendo. Tenho algo ótimo para te contar. Consegui um trabalho, ajudarei na parte de treinamento de alguns novatos na polícia. O salário é ótimo e irei trabalhar com o Tom e alguns ex-colegas.

— Pai, isso é ótimo. — O abraço.

— As coisas estão começando a dar certo novamente, isso é muito bom. — ele sorri. Bom pai, para mim não estão, mas tudo bem não devo preocupá-lo com isso.

— Vou comer. — Digo, me levantando da cama.

— Ok, vou tomar um banho. Depois me mostre seu desenho.

— Mostro sim. — Falo, indo para a porta.

Volto para o meu quarto. Pego uma manta e minha bolsa. Nem me preocupo em trocar de roupa, meu moletom estava ótimo e confortável. Desço e tomo meu café. Ao terminar pego algumas balas de menta no pote em cima do balcão e as coloco no bolso do moletom. Vou para a porta.

A vizinhança se encontra vazia, talvez por ser cedo demais. Alguns vizinhos molhavam sua calçada com mangueiras. Muitos me cumprimentavam com sorrisos. Estou indo para aquele lugar maravilhoso. Acredito que Jay não estará lá bem pela manhã. Espero que não esteja, não estou a fim de morrer hoje. Bom, o plano é ficar até o começo da tarde e depois ir embora antes que ele me veja. Ótimo, plano perfeito.

Estou fazendo isso por mim mesma, se me sinto bem lá, irei para lá e pronto. Olho pela janela e noto que não há nenhuma alma. Graças a Deus. Sorrio e entro pelo mesmo buraco da última vez. Pego a manta coloco sobre o sofá e me sento.

Observo bem o local. O sofá está em um ângulo que dá pra ver a academia por completo. Ótimo ponto para desenhar. Pego meu caderno vazio e meu materiais. Começo fazendo o ponto de fuga. Ao encontrar o ponto, começo a desenhar os poucos.

O tempo foi se passando, eu gelava a cada barulho que eu escutava na rua. Ficava-me perguntando se era ele e que talvez eu seria morta aqui mesmo. Qualquer coisa me escondo. Ele não vai me matar por estar aqui desenhando, vai? Sinto o medo tomar meu corpo.

Com o tempo passando o sono foi voltando. O efeito do remédio não foi embora completamente, sem contar que eu estava muito confortável e o silêncio daquele lugar era incrível. Olho para o celular para ver o horário, tenho mais 3 horas. Baseei esse tempo no horário em que o encontrei ontem, ele apareceu à tarde, então provavelmente ele só vem nesse horário. Espero.

Coloco o celular para despertar e fecho meu caderno. Deito-me e adormeço. É incrível como consegui dormir tranquilamente naquele lugar, não tive nenhum pesadelo, nenhuma lembrança. Uma sensação que nunca senti.

Escuto pancadas e gemidos abafados. O que é isso? Abro meus olhos devagar e o vejo. Droga ele está aqui, está batendo no saco de boxe. Fecho os olhos novamente e os evito abrir. E agora? O que eu faço? Continuo a fingir que estou dormindo? E se ele não for embora? Merda de celular, por que não tocou? Estou ferrada. Que merda Sky. Eu suava frio.

— Sei que está acordada — a voz grossa cria um eco no local. Estou fodida.

— Vai levantar ou quer que eu te levante? — Pergunta. Droga, droga.

Abro os olhos, levanto-me ajeito meus fios e tento não olhar para ele. Permaneço sentada sem saber o que fazer.

— Desculpa. — solto.

— Hum? — Ele ri.

— Por favor, não me mata. — Me jogo no chão ajoelhando e fechando os olhos. O que eu estava fazendo? Vai realmente se humilhar dessa maneira Sky?

Ouço uma risada tomar o local. Que risada gostosa. Aquele homem é gostoso por completo.

— Achava que você estava mentindo em ter problemas sérios na cabeça. Acabo de confirmar que é verdade.

Quem é ele para me chamar de doida? O encaro irritada e depois desvio o olhar. Maldito olhos escuros. Por que tem tanto efeito assim sobre mim? Levanto e sento-me mais uma vez no sofá. O que acabei de fazer? Meu rosto queima de vergonha.

— Você sente prazer em estar à beira da morte ou algo assim? — Me pergunta. O olho e ele parece estar desenrolando uma faixa laranja da sua mão. Noto que está sem camisa. Há mais tatuagens em seu peito e abdome. O suor faz com que elas se realcem ainda mais. Ele está tão sexy. Queria poder apreciar cada detalhe. Balanço a cabeça para evitar tais pensamentos e desvio o olhar.

— Por que balança tanto a cabeça após me olhar? — Ele pergunta e sorri de lado.

Droga, ele notou. O olho mais uma vez e aos seus olhos encontrarem os meus, desvio novamente. Não consigo, hoje eu não estava com a mesma confiança de antes.

— Não balanço. — Respondo fitando meu moletom.

— Olhe pra mim ao falar — ele manda. Sinto o frio na minha barriga se formar. Ouço-o saindo do ringue e se aproximando. — Disse para olhar para mim.

— Não consigo. — Solto. Puta merda Sky, cala a boca.

— Por quê? — ele está cada vez mais perto.

— Estou envergonhada. — Solto sem pensar novamente. Ser sincera não era meu plano, não tenho que dar nenhuma explicação para ele. Por que disparo toda vez que ele está por perto? Como se eu tivesse total confiança perto dele, como se eu não conseguisse mentir de forma nenhuma. Isso parece ser perigoso.

— Por ter se ajoelhado? Ou por ter invadido novamente? — Ele ajoelha e me encara. Muito perto! Peço em silêncio o afastamento dele. Não consigo pensar e nem respirar ao estar tão perto assim. Permaneço com os olhos no moletom. Não consigo olhar para ele, merda.

— Os dois, acho. — digo em voz baixa o fazendo rir mais uma vez.

— Por que você tanto invade esse lugar? — Pergunta. Sinto seus olhos em minha cabeça. Por favor, pare de me olhar.

— Bom, esse lugar me deixa mais calma, ele me ajuda em certas formas. — Minha voz diminui mais um tom.

— Hum... Muito raro isso — ele fala em quase um sussurro.

— Quê? — Pergunto, a fim de que ele repita sua fala.

— É difícil pessoas gostarem de lugares como esse, a não ser que queira usá-los para alguma coisa bem perigosa. Bom, você não...? — Ele me encara prestes a terminar sua fala. Espera ele acha que eu quero usar um lugar para algo perigoso, quem ele pensa que eu sou?

— Lógico que não! — Disparo.

— Mas eu não disse nada. — ele sorri tirando uma com a minha cara. Quanto mais irritada eu ficava, mais parecia que ele gostava.

— Seja o que você pensou, não é isso. — Respondo revirando os olhos.

— Não sei você poderia muito bem se deparar com um corpo em um lugar como esse.

— Corpo? — Olho desesperadamente para os lados tentando ver algo que eu não queria ver. Estou lidando com o líder de uma gangue, primeira coisa que me veio à cabeça é que aqui teria gente morta.

Jay começa a rir, sua risada é completamente maravilhosa. Esse homem é fascinante.

— Parece muito fácil tirar uma com você. — depois de alguns segundos ele volta a ficar sério. — Bom, agora vamos ao que interessa, acredito que você tenha entendido que não gosto de ninguém pisando na minha área sem permissão. — Sua voz grossa soa firme. — Considere uma garota de sorte, deixarei essa passar.

— Mas, parece que ninguém vem aqui, o que custa me deixar frequentar esse lugar as vezes? — O enfrento.

— Se eu disse que não gosto, não é para vir. — Ele me encara sério.

— Por favor! — Junto minhas mãos. Acho que o jeito é implorar. — Essa academia foi minha salvação desde que cheguei aqui, único lugar que posso respirar em paz. E-Eu prometo que não irei tocar em nada, não irei trazer ninguém e quando você estiver aqui eu prometo não por o pé, apenas venho se não tiver ninguém. Mas por favor — fecho meus olhos para fazer com que meu desespero toque seu coração de pedra.

Jay me encara com os olhos interessados soltando um sorriso abafado logo volta para o seu olhar sério.

— Não acredito que irei fazer isso, mas ok haverá algumas condições. — ele cruza seus braços musculosos.

— Quais?

— A primeira é não me tratar como alguém íntimo, só por que te dei a permissão de vir aqui. Segunda, esse local é como se fosse minha casa, as vezes resolverei alguns problemas aqui, se algo que eu disser aqui vazar, você pode se considerar morta — engulo minha saliva ao ouvir sua ameaça. — E outra não quero vê-la se metendo onde não é chamada. Bem e o terceiro será uma pergunta — Ele aproxima mais e agacha em minha frente. Jay me encara com olhos curiosos. Mais um passo e podíamos estar nos beijando. Cada vez mais perigoso. — Qual a sua relação com Jimmy Scott? — Ele pergunta.

Oi? Por que ele quer saber isso?

— Sou a melhor amiga dele, somos amigos desde a infância. — Respondo. Vejo ele me encarar novamente. Sua sobrancelha se contrai.

— E como posso confiar que você não falará nada para ele?

— Não contei nada do que escutei naquela noite no Triangle. Não tenho a coragem de me meter onde não sou chamada. — tento convencê-lo.

— E você acha que irei acreditar em você? — Ok, ele tem razão, eu não acreditaria em alguém que é melhor amiga de um quase policial e que ainda odeia ele.

— Vamos fazer o seguinte, então. — Ele me olha curioso — Se Jimmy souber de alguma coisa, você pode fazer o que bem entender comigo. — Digo e depois sinto que isso poderia soar estranho.

— Interessante. — Ele para um segundo e me encara profundamente — Será que devo torcer para que ele descubra algo, então? — Ele fala em um tom flertante e meu rosto queima.

— V-você entendeu! — Tento explicar quase engasgando.

— Entendi. — ele solta o maldito sorriso fascinante. Espero que Jimmy nunca descubra nada, se não poderei levar a culpa. Meu Deus onde eu estava com a cabeça.

— Então, tenho a permissão de vir aqui? — Pergunto.

— Sim, mas lembra-se das outras condições. — Ele solta uma piscada, se levanta e pega uma toalha que estava pendurada na corda do ringue.

Respiro fundo após aquela piscada, bato palmas silenciosas e abro um sorriso enorme. Realmente ganhei o dia. Jay não parece ser perigoso, não para mim. Tudo bem que ele é ignorante na maioria das vezes, mas eu também sou. É normal, não posso julgá-lo. O que esse homem tem de tão ruim que todos temem?

— E para de entrar pelo buraco, vai se machucar. A chave do portão está debaixo do latão ao lado da porta, depois que ir embora a coloque no mesmo lugar. — Ele está preocupado comigo? — Não quero me responsabilizar por você, sem contar que não quero seus pais venham perguntar quem machucou a filhinha deles. — Esta bom, ele é um completo idiota. — Há alguns colchonetes naquele armário azul caso queira usar. Quanto a roncar, não ronque quando eu estiver por perto, odeio certos barulhos, ainda mais vindo de você. — Qual é o problema dele comigo?

— Primeiramente, eu não e, segundo, isso de roncar não estava nas condições — rebato.

— Tem certeza? Quer que eu adicione?

— Não. Não vou dormir mais aqui, relaxa.

— Ótimo. — ele segue para o banheiro masculino.

Acho melhor eu ir, esqueci que Jimmy ia almoçar lá em casa. Se ele sonhar que eu estava aqui com o Jay, ele matará ele e eu juntos. Ele não pode descobrir isso de nenhuma forma. Pego minhas coisas e tento escutar algum barulho vindo do banheiro. O que ele foi fazer lá? Ouço um barulho de chuveiro. Uau, esse lugar está mais vivo do que pensava. Imagino como seria ele tomando banho, deve ser a visão do paraíso. Pensei em esperá-lo sair do banheiro, talvez eu veria a melhor cena da minha vida, mas é melhor eu ir mesmo. Sorrio boba e então balanço a cabeça. Meu Deus Sky você precisa de tratamento. Abro a porta e volto para casa.


Décimo Capítulo


— Até que fim, onde estava? — Tia Betty fala levantando do sofá. Vejo Tom, Elena e Jimmy sentados também. Todos me encaravam.

— Hum... Caminhando? — Respondo colocando minha bolsa no braço do sofá e vou em direção a eles para cumprimentá-los.

— Até agora? Você saiu bem cedo e volta agora? Nem suando você está. Filha, você sabia que tínhamos visitas. — agora é a vez do meu pai.

— Eu disse que eu ia desenhar pai, sentei em um lugar e fiquei desenhando. Perdi o horário, desculpa. E o Tom e a Elena não são visitas, são como família. — falo e vejo Elena sorrir.

— Deixa ela, Robert, a menina já é crescida. Não se preocupe querida. — Ela levanta do sofá e me abraça. Meu pai depois me abraça e pede desculpas. Por que está tão alterado?

— Vou colocar a mesa. — Tia Betty levanta e vai em direção à sala de jantar.

Cumprimento o Tom o abraçando e vou para Jimmy que se permanecia calado. Ele me olha e depois sorri levantando do sofá.

— Vamos lá fora conversar? — Ele sussurra. Balanço a cabeça como um sim e seguimos para o quintal.

Chegando ao quintal, sentamos no sofá pequeno perto do muro. Jimmy me encara.

— Onde estava, Sky? — Pergunta. Sinto a dificuldade de engolir a saliva. Não posso falar a verdade para ele.

— Desenhando. — Respondo.

— Aonde, Sky?

— E-Eu fiquei perto de uma livraria, tentei desenhar aquele restaurante mexicano — minto. Desculpa Jimmy, se você souber que estava com o Jay, não sei o que você será capaz de fazer.

— Posso ver?

— Ver o quê? — Pisco assustada.

— O desenho, Sky. — Levanta sua sobrancelha.

— E-Eu o joguei fora.

— Jogou fora? Por quê? — Pergunta.

— Por que não era o que eu costumo desenhar, saiu uma porcaria. — Evito seu olhar. Se eu mentir olhando para Jimmy ele poderia ver se era verdade ou não. Ninguém me conhecia mais que ele.

— Hum. Ok. — ele fala e depois se permanece calado.

— Queria falar sobre isso? — Pergunto.

— Não, não. É sobre ontem, ficamos de falar sobre o que aconteceu com você na faculdade, lembra? Mas você tinha tomado o remédio e tals.

— Ah sim! — Não quero falar sobre isso, droga.

— E aí? Vai me contar? Estou preocupado, Sky. — Ele franze a testa.

Não era justo eu não contar pra ele, Jimmy sempre tenta me ajudar em tudo. Eu me sentia bem contando tudo que acontecia comigo para ele antigamente. Por que agora escondo tanto as coisas?

— Uma garota da minha sala soltou que minha mãe havia traído meu pai e que o amante era o assassino... — Digo sentindo a boca secar. Aquilo ainda doía.

— Meu Deus. — Jimmy fala cerrando os dentes. — Desculpa não poder estar com você no momento em que liguei. Eu queria ir até você, mas se eu saísse e levaria uma advertência e isso só ferraria mais meu plano de conseguir o distintivo.

— Jim, tudo bem. Você não tem que estar perto de mim toda vez que estou triste.

— Preciso sim, Sky. Não quero ver você fazendo besteiras. — Ele solta.

— Não vou fazer, Jimmy. — O acalmo — Não tenho mais coragem. Não vou mentir, bem que eu gostaria, mas por vocês, por todos que me apoiam, eu não tenho mais coragem. — O olho calmamente.

O vejo sorrir. Jimmy realmente se tornou um homem muito bonito. Ele me puxa para seus braços e me abraça bem forte.

— Eu te amo, Sky. Obrigado por sempre me manter perto de você. Quando você foi embora, eu achei que você me esqueceria.

— Também te amo, Jim. Nunca que eu esqueceria você, como esquecer alguém que eu veja como irmão? — Solto.

Ele me afasta lentamente e me encara com uma expressão irritada.

— Droga. Irmão, Sky? — Pergunta. Será que exagerei? Tina tinha razão ao falar que Jimmy gostava de mim? Não, isso é impossível.

— Sim, Jim. Você é uma das pessoas mais importantes pra mim. Por quê? Não gostou de ser comparado como irmão? Queria ser comparado com o que Jim? — Pergunto.

— Com nada. — Ele cerra os olhos desviando seu olhar do meu. — Também te vejo como uma — deu uma pausa de três segundos — irmã. — Sorri forçado.

Sinto uma pontada ao ver sua expressão. Não quero perder nunca minha amizade com o Jimmy. Não vou mentir, já pensei em como seria namorar ele. Por mais que ele seja um ótimo cara para namorar, se um dia chegássemos a namorar, a amizade não será mais a mesma. E se um dia terminássemos? O clima seria horrível. Não quero perdê-lo, não mesmo. Nada podia rolar nada entre nós e creio que não irá.

Ele dá um beijo na minha testa e se levanta. O vejo caminhar lentamente para a porta.

— Venham comer. — Tia Betty grita.

Levanto-me e sigo Jimmy. A mesa estava lotada. O cheiro de frango cozido com batata tomam minhas narinas fazendo minha barriga roncar. Todos sentaram à mesa. Jimmy continuava calado. Odiei vê-lo assim. Isso é sua culpa Sky. Gargalhadas era o que predominava o ambiente. Tom e meu pai com suas histórias divertidas sobre seus tempos de policiais.

Após todos comerem. Elena vai até a geladeira e pega a sobremesa. Ao colocar a travessa na mesa, vejo o pavê de chocolate com morangos iluminarem minha visão. Ela serve cada um e apreciamos todos juntos a sobremesa feita por ela. Está uma delícia. Levantamos após comer e todos ajudaram na limpeza.

Vou para perto do Jimmy.

— Está tudo bem? Está tão calado. — Pergunto. Lógico que não estava Sky.

— Estou bem. Sim. Desculpa, estava com algumas coisas na cabeça e também estou cansado do treinamento.

— Entendo.

— O admiro muito ter essa paixão em ser um policial Jim, sempre admirei. — Digo e vejo seu sorriso se abrir.

— Obrigado. — Ele parece estar mais animado. Então algo surge em minha mente, “Megan”.

— Jimmy, você conhece a Megan? — Solto. Jimmy fica pálido e desconcertado. Ótimo Sky, fodeu ele de novo.

— Não. — Ele fala em quase um sussurro. Ele conhecia sim. O jeito que ele lidou com a pergunta, o entregou.

— Não precisa mentir. — Falo.

Ele então me encara.

— Saímos uma vez. — Solta.

Por que fiquei surpresa? Sinto o estômago enrolar. Não estou com ciúmes, acho. Talvez, um ciúmes de amizade?

— Ah. — Fico sem palavras.

— Mas não foi nada, eu juro. — Ele fala desesperadamente.

— Ela parece, sei lá. Gostar muito de você. — Digo.

— Está louca? Lógico que não. Saímos só uma vez, não foi nada demais.

— Bom, talvez, para ela foi. — Falo e o vejo cerrar as sobrancelhas. Megan claramente gosta do Jimmy.

— Isso é problema dela, Sky. — Ele cospe. — Vamos parar de falar dela. No domingo, eu e o pessoal vamos jogar uma partida de futebol, quer ir assistir?

— Claro. Quero ver se você ainda é ruim.

— Para com isso.— Fala indignado. — Nunca fui ruim Skype, mas consegui melhorar bastante.

— Bom, vamos ver. — Sorrio.

A família Scott passou a tarde aqui em casa. Jimmy e eu jogamos alguns jogos de cartas, o que me fez lembrar de quando éramos crianças. Éramos viciados em qualquer tipo de jogo. No final da tarde nos despedimos. Tia Betty já estava na vizinha fazendo suas fofocas. Meu pai estava na sala assistindo TV. Sento-me ao seu lado e seu telefone toca. O nome “Rose” toma a tela. Ele me olha assustado e cancela a ligação.

Quem é Rose? Meu pai estava saindo com alguém? Eu iria adorar isso, ele precisa seguir em frente. Comecei a rir.

— O que foi? — Pergunta confuso ao me ver rir.

— Pai, quem é Rose? — Não consigo controlar a risada. Ele fica vermelho.

— É uma amiga do Tom, ela que me conseguiu o emprego. E por que está rindo? — Fala nervoso, noto que ele começa a soar.

— Por nada. Pai não precisa ficar nervoso. Se estiver afim dela, pode ir em frente. Eu apoio. — Sorrio.

— Sky, está exagerando. Ela é uma colega e nada mais. Não vou trocar sua mãe. — Ele solta.

Aquilo doeu. Meu pai ainda está apegado a minha mãe. Não quero que ela seja esquecida, mas não posso vê-lo preso no passado. Assim como eu.

— Pai, minha mãe está morta. — Solto sentindo uma pontada no peito. — Ela infelizmente seguiu o caminho dela, você precisa seguir o seu. — Uau, Sky. Você dando conselhos, deveria segui-los também, não? Falou a garota que não consegue dormir por conta do passado.

— Ela não escolheu o caminho dela. Mataram ela, Sky. A mataram de forma cruel. Sua mãe queria viver e por causa daquele filho da puta, ela foi impedida. — Ele solta e em seguida se arrepende. — Desculpa.

A vontade de chorar vem à tona. Realmente a vida da minha mãe foi tirada de forma cruel. Vejo a feição do meu pai se tornar triste. Ele fita o tapete.

— Eu sei, pai. — Seguro algumas lágrimas — Desculpa ter falado assim. Só quero vê-lo feliz e tenho a certeza que a minha mãe iria querer também.

— Tudo bem, filha. — Me abraça.

Ele me afasta, então levanta e desliga a TV.

— Vou me deitar. — Beija minha testa e segue para a escada.

Eu posso até não conseguir esquecer tudo aquilo. Mas quero que meu pai esqueça. Quero vê-lo sorrir todos os dias novamente. Pouco importa a mim. Ele estando feliz, eu estarei também.


Décimo Primeiro Capítulo


Hoje completa uma semana que estou em Newton, é incrível como tanta aconteceu. Imagino passar o resto da minha vida aqui, tenho até medo do que pode vir.

— Cadê meu estojo? — digo procurando-o no meu quarto. O encontro no chão perto da escrivaninha, coloco-o na mochila e vou direto para a porta. Hoje vou na casa da Tina para fazer o trabalho, confesso que estou com um pouco de medo de perguntarem sobre aquela noite, agora que todos sabem que eu sou a filha da mulher que foi assassinada brutalmente. Respiro fundo e saio de casa.

Entro em uma rua estreita e ao sair dela vejo uma rua larga. Há vários prédios pequenos, uns mais cuidados que outros. Tina falou que o dela era o prédio azul claro, então o encontro. Toco o interfone informando meu nome e o número da porta de Tina, logo o porteiro abre a porta para mim.

— Pode subir. Terceiro andar. — Ele diz sorrindo.

— Obrigada.

O prédio é bem fofo por dentro e por fora. Pego o elevador e vou para o terceiro andar. Tina se encontra na porta encostada.

— Sky. — Me abraça.

— Oi, Tina. — Respondo a afastando.

— Como você está? — Ela me olha preocupada.

— Estou bem melhor. — Sorrio.

— Perfeito, entra. — Me encaminha para dentro de sua casa.

Vejo Megan sentada no tapete com suas coisas espalhadas sobre o mesmo.

— Oi, Megan. — Aceno.

— E aí? — Ela sorri. Estranho ela não me tratar friamente.

Sento-me no tapete e tiro minhas coisas da bolsa.

— Vou pegar alguns lanchinhos — Tina diz, indo para a cozinha

— O trabalho é sobre o que? — Pergunto para Megan. — Tina disse que ia me passar pelo telefone, mas esqueceu.

— Ele quer que a gente pegue uma obra famosa e a refaz com cores opostas. — Megan explica. Refazer uma obra famosa, meu Deus isso será bem trabalhoso.

— Já escolheram o quadro? — Pergunto.

— Ainda não, pensamos em esperar você para escolhermos juntas.

Megan pega seu notebook e o abre. Tina coloca a bandeja com alguns copos de suco e com algumas tortinhas.

— Meninas, eu que fiz essas tortinhas, se estiver ruim não me falam, apenas comam. — Tina fala sorrindo.

Megan e eu começamos a rir. Pego uma e provo.

— Tina, está uma delícia. — Digo. E estava mesmo.

— Obrigada. — Ela sorri.

— Então, que obra vamos pegar? — Megan fala virando o notebook para Tina.

— Sky, alguma ideia? — Tina pergunta.

— Vocês gostam de algum pintor em especial? — Olho para as duas.

— Não gosto de ninguém. — Megan fala.

— Eu também não. — Tina responde com uma careta.

Tento pensar em alguma obra que eu possa ter gostado e lembro-me do quadro “Noite Estrelada”.

— Que tal “Noite Estrelada” de Van Gogh?

Megan então procura o quadro no Google.

— Gostei, parece ser mais fácil de fazer. — Ela fala.

— Gostei também, acho que as cores opostas devem cair bem nesse quadro. — Agora é a vez de Tina.

— Sky, você pode fazer o esboço? E daí eu e Megan pintamos.

— Posso, sou péssima com cores. — Digo concordando.

— Ótimo, vamos começar então. Quer ir para a mesa? É mais espaçoso pra você. — Tina aponta para a mesa.

— Sim, é melhor. — Levanto-me e vou para a mesa com a tela de pintura e meus materiais.

— Megan, vamos preparar as cores. — Tina levanta e pega algumas tintas e as coloca em potinhos.

Coloco a tela sobre a mesa. Vejo Megan se aproximar com seu notebook o colocando em minha frente.

— Veja por aqui, será melhor para você desenhar. — Sorri. Não esperava um ato amigável de Megan. Sorrio de volta em forma de agradecimento. Então começo. Olho para pintura, pego meu lápis e traço as curvas do desenho. Começo pela árvore e depois passo para as pequenas casas do quadro. Faço as montanhas, desenho as curvas e ondas do céu.

Tina vem para o meu lado.

— Uau, Sky! Está ficando ótimo. — Tina diz abrindo a boca.

— Está mesmo? — Me afasto para olhar para o desenho.

— Está sim. Eu estava pesquisando aqui, Van Gogh usava o pincel rapidamente para fazer esses espirais para dar movimento ao céu, tentei fazer aqui nessa folha, acha que ficou bom? — Pergunta levantando a folha.

— Ficou muito bom. — Pego a folha e observo.

— Então vamos fazer essa técnica também. — Fala voltando para o tapete. Megan se encontrava concentrada na mistura de algumas cores. Termino de fazer os pequenos detalhes do desenho como as janelas e algumas linhas entre as casas.

— Terminei meninas. — Estico meus braços cansados.

— Vamos começar a pintura. — Tina levanta e pega alguns potes de tinta. Vou até lá ajudá-la e Megan vai para mesa.

— Uau, ficou perfeito!— Megan fala.

— Obrigada. — Sorrio.

— Ok, então a árvore tem uns tons pretos e marrons, então usaremos... — Tina para confusa — Megan pega o papel com o círculo cromático pra mim, por favor?— Ela pede. Megan vai até a mesa de centro da sala e pega o papel e a entrega.

— Vamos usar o branco no lugar do preto e — pausa novamente — droga o marrom não entra no círculo cromático. — Tina olha desesperada para Megan.

— Vamos usar uma cor creme então só para dar o destaque no branco, o professor vai entender. — Megan fala.

— Espera o branco também não entra no círculo. Não deveríamos fazer outro quadro? — Tina pergunta ainda mais confusa.

— Tina, cores opostas. Sempre entendemos que o oposto de branco é o preto, mesmo que não seja o professor quer que a gente use cores diferentes do quadro. Vamos usá-lo então, não precisa seguir esse círculo ridículo aí — Megan fala irritada apontando para o papel.

— Tá, tá... — Tina então começa a pintar o branco cuidadosamente para esconder as linhas do lápis. Megan prepara a cor creme e depois entrega para Tina. Percebo o quanto Tina é bom com pintura em tela. Não tenho esse olhar para a combinação de cores, prefiro mil vezes fazer só a estrutura do desenho mesmo. Pintar não é comigo.

— Ficou bom. — Megan fala.

— Ok, agora o céu terá que variar nos tons de laranja. Meu Deus, estamos estragando a obra dele. — Tina ri.

— É isso que o professor quer, então foda-se. — Megan fala. Tina começa a pintar e depois pede para Megan ir fazendo os detalhes com os outros tons. As horas se passaram bem rápido. Demos uma pausa para almoçar e depois voltamos para o quadro. Tentei pintar algumas coisas para ajudar, mas desisti.

— Até que não ficou ruim. — Tina levanta a tela.

— Meus olhos estão doendo com as combinações dessas cores. — Megan reclama.

Rio a cada palavra que as duas soltam. Olho bem para o desenho. Bom, ele não está horrível, mas os tons de azul naquele quadro o faziam ser incrível, laranja não ficou nada bom.

— O desenho está incrível. Sky, você é demais. Megan imagina se fosse só eu e você, o que isso iria sair? — Tina fala colocando a tela na parede para secar.

— Não quero nem pensar, Sky salvou nossa nota. — Megan solta.

— Que é isso gente, Tina você desenha bem. — Falo.

— Não, tento. Apago trezentas vezes e nada sai. Você apenas faz um risco e ele já sai maravilhoso. — Ela fala e eu começo a rir.

— Bom meninas, terminamos. Vou esperar secar para colocar os nossos nomes atrás. — Tina fala indo para a mesa limpar a bagunça. Megan e eu nos juntamos na limpeza.

— Ah Sky, só pra te avisar, amanhã vamos sair à noite. — Tina me encara.

— Para aonde? — Pergunto espantada.

— Um evento de moto. — Responde.

— Mas eu não quero ir. — Falo. Mais um evento? Essa cidade não cansa? Tinha planos de ficar em casa no final de semana e ir para a academia desenhar.

— Não tem que querer, já coloquei seu nome na lista.

— Ela sempre foi assim, vai se acostumando. — Megan fala.

— Mas... — Fico sem palavras. Pensei em dizer várias mentiras para evitar ir, mas não quero mentir para elas.

— Mas nada. Você precisa sair para se distrair e dessa vez não sairei no deu lado. — Ela fala.

— Falando em sair do seu lado, Sky por que foi embora cedo aquele dia no Triangle? — Megan pergunta.

Será que eu deveria contar para elas? Bom por que esconder?

— Fui procurar o banheiro no andar de cima e acabei escutando um interrogatório, digamos que, violento.

— Interrogatório violento? — Ambas falam ao mesmo tempo.

— Sim. Três caras estavam fazendo perguntas para outro cara, além de socar ele várias vezes e ameaçá-lo de morte. Foi horrível.

— Meu Deus. E aí? — Megan pergunta.

— Então minha bolsa caiu e eles me pegaram. — Ao dizer vejo a expressão espantada de Tina e Megan. — Eles me fizeram algumas perguntas, acharam que alguém tinha me mandado como espiã, mas dai o Jimmy chegou e me levou de lá.

— Meu Deus Sky, foi mais sério do que pensei — Tina fala.

— Eles chegaram a fazer alguma coisa com você? — Megan pergunta. Ela parecia estar bem preocupada.

— Não. Não me tocaram momento nenhum. Só o magrelo alto que chegou a levantar uma faca pequena, mas acredito que não foi para me ameaçar.

— Magrelo alto? — Megan se espanta e olha para Tina que está com a mesma expressão.

— Sim. — Olho confusa.

— Sky, por acaso um dos caras era um gostoso todo tatuado? — Tina pergunta

— Bom — paro um segundo — sim, era. — As olho timidamente. Elas conhecem o Jay? Acho que sim, a cidade é pequena, todos se conheciam por aqui.

— Minha nossa! — Tina para. — Sky, você se encrencou com o Jay Simmons? Amiga, como você está viva? — Ela grita.

— Ele não falava nada no interrogatório, só olhava. — Falo. Gente que mal esse homem fez para todos temerem? Ok, tudo bem, ele é perigoso pelas coisas que ele mexe, mas não o achava tudo isso, ele até me deixou ficar na academia.

— Sky, Jay é perigoso por vários motivos. Há boatos de que ele mata qualquer um que cruzar seu caminho, a não ser que ele permite. — Megan fala.

— São só boatos meninas, ele não parece ser assim. — Falo.

— Espera, não parece? Você já conversou com ele? — Tina me encara.

— Já. — Solto e fico calada após abrir um sorriso.

— Sky, você por acaso está interessada nele? — Tina arregala os olhos.

— Não, lógico que não. Não sou louca a esse ponto. — Quase grito. Tina e Megan me observam.

— E esse sorriso bobo ao falar o nome dele? Tudo bem que se estivesse eu não a culparia. Aquele homem é um pedaço de mau caminho. Ele em questão de aparência e sensualidade ganha de todos em Newton. — Tina solta.

— Não acho. — Megan fala e depois se cala.

— Se ele me desse bola, eu dormiria com ele sem nem pensar. Falam que ele é ótimo na cama. É uma pena que ele só se atrai por aquelas mulheronas. Todas que eu o vi pegar eram bem bonitas e sensuais. — Tina fala e Megan ri. Lembro-me da loira com ele no Triangle. Realmente ela era muito bonita. Sinto uma pontada no estômago.

— Qualquer garoto bonito que te desse bola você dormiria Tina, não é só o Jay. — Megan provoca.

— É lógico. Não é todo dia que isso acontece. Sonho de consumo Jay Simmons se interessar por mim. — Tina olha para o teto sonhando. Começo a rir. — Então quando conversou com ele, rolou algum clima? Ele deu em cima de você? — Tina dispara.

— Não rolou nada Tina. Ele me perguntou o porquê de ter escutado a “conversa” deles e só. — Minto. Mas realmente não rolou nada, isso me deixa triste de alguma forma. Não deveria ficar.

— Que pena. — Ela faz uma cara triste.

— Achei que iria alertá-la Tina, não incentivá-la. — Megan fala secando os pincéis.

— Bom, vai se ele muda ao se interessar pela Sky, até você mudou Megan, está mais agradável. — Tina fala.

— Não mudei. Nunca a tratei mal, certo?— Megan olha para mim.

— Ela nunca me tratou mal, Tina. — Digo. Bom, mais ou menos.

— Viu? — Megan joga o pano em Tina.

Terminamos a limpeza. Arrumo minhas coisas e vejo algumas mensagens do meu pai no celular.

— Meninas, vou indo. — Falo.

— Mas já? — Tina faz um bico.

— Sim, meu pai já está me procurando e já são quase sete horas. — Vou direto para a porta e Tina me segue.

— Então tá. Até amanhã. — Ela me dá um beijo no rosto e me abraça.

— Até. — Respondo. — Tchau Megan.

— Tchau, Sky! — Megan grita da sala.


Décimo Segundo Capítulo


Chegando em casa, vou direto para o banheiro tomar um banho. Eu estava com tinta no braço todo. Ao terminar vou para a cozinha e vejo algumas panelas no fogão. Meu pai então desse as escadas.

— Terminou o trabalho? — Ele dá um beijo em meus cabelos molhados.

— Sim. — Pego um prato e coloco o macarrão.

— Onde a tia Betty está? — Pergunto.

— Ela vai dormir na casa de uma amiga hoje, fez a janta e disse que voltará amanhã.

— Quem disse que existe idade para dormir na casa das amigas? — Falo rindo.

— Sua tia parece uma adolescente, totalmente diferente da sua mãe. — Ele ri junto.

— Vai jantar? — Pergunto.

— Agora não.

— Como foi o trabalho? — Enrolo o macarrão no garfo e o levo a boca.

— Foi legal. Jimmy estava lá, é uma pena eu não poder treinar ele. Mas o garoto é muito bom. — Ele responde sorrindo.

— Imagino. — Dou outra garfada.

— Vocês deveriam namorar. — Meu pai solta. Engasgo com o macarrão e tomo um gole de suco. O que meu pai acabou de falar? Meu Deus.

— Não pai, não devíamos. — Levanto-me e coloco o prato na pia.

— Por quê? Ele cuida muito bem de você e parece gostar bastante de você. — Ele fala. Alguém fecha a boca do meu pai?

— Pai, não. Jimmy é como um irmão pra mim, nada mais. — Explico lavando meu prato.

— Ele é o único que eu aceitaria que namorasse você, difícil achar alguém no nível dele.

— Pai, não. No dia em que eu achar alguém que eu realmente gosto e que seja recíproco, você não tem que aceitar nada. — Digo irritada. Vejo meu pai cerrar os olhos.

— Está afim de alguém? — Ele pergunta me estudando.

— Afim? Não. — Falo nervosa. Por que estou nervosa? Não estou afim de ninguém.

— Hum. — Ele faz um barulho com a boca me encarando e então a campainha toca. Meu pai se levanta e vai direto para a porta.

— Robert! — Uma voz feminina.

— Rose! — Ele diz espantado. Meu Deus, é a mulher que ligou para ele ontem à noite. Ele a convida para entrar e ela me olha.

— É a sua filha?

— Sim, sou. — Sorrio e a cumprimento.

— Muito bonita. — Sorri.

— Obrigada. — Sorrio de volta.

Meu pai se encontra espantado. Eu estava achando um barato tudo isso. Com certeza não vou estragar essa noite. Lembro-me então dos colchonetes na academia, seria perigoso eu dormir lá, mas por ser como uma casa para o Jay creio que ninguém chega perto. Então tenho a ideia louca de ir dormir lá.

— Pai, vou dormir na casa de uma amiga hoje. — Digo.

— Não vai, não. — Ele diz em desespero.

— Vou sim. — Sorrio. E vejo sua cara de “não faça isso”. Lógico que eu faria, sem mim ali, os dois podiam ter uma ótima noite juntos.

— Bom se divirtam. Vou pegar minhas coisas. — Subo as escadas. Rose parecia estar bem agradecida. Talvez dormindo lá o maldito pesadelo não venha me aterrorizar durante o sono. Pego meu travesseiro e meu cobertor grosso. Coloco meu celular no bolso do moletom e paro para pensar como vou sair pela porta com essas coisas. Escuto a voz do meu pai e da Rose na cozinha, então se eu for devagar consigo levar as coisas.

Desço devagar com tudo aquilo em meus braços e vou até a porta na ponta dos pés. Abro-a e saio. Consegui! A academia fica três minutos da minha casa. Algumas pessoas da minha vizinhança me olhavam confusos. Deveriam achar que eu estava fugindo de casa. Chegando ao local, vejo algumas luzes dentro da academia. Ele está aqui? A porta está destrancada. Entro e o vejo deitado no sofá com suas mãos debaixo do pescoço olhando para o teto. Então me olha.

— O que está fazendo aqui a essa hora? — Pergunta.

— É, vim dormir aqui. — Digo sem jeito. Espero que ele não me expulse, não tenho para onde ir essa noite.

— Achei que tinha falado que não iria dormir aqui.

— Apenas aconteceu. — Falo.

Vejo as velas acesas pelo local. Meu Deus, eu não tinha pensado que aqui não tinha luz. Graças a Deus que ele está aqui. Pego o colchonete no armário e coloco o mais longe dele possível. Forro, coloco meus travesseiros e me preparo para deitar.

— Veio toda preparada, hein? — Fala.

— Sim. — Suspiro.

— Você vai morrer congelada aí, garota. — Realmente a noite estava bem fria e a idiota aqui coloca o colchão perto de uma das janelas quebradas, estava entrando muito vento.

Evito falar algo.

— Coloca o colchão aqui. — Ele aponta para em frente do sofá. Eu dormir ali? Com ele me olhando, nem pensar.

Deito mesmo assim. Então ouço algo se aproximar, meu colchonete deslizar pelo chão. Jay o puxou junto comigo para o local que antes apontara. Permaneço imóvel, ele volta a se deitar no sofá.

— Você adora se fazer de teimosa, não? — Diz ofegante e irritado.

— Eu queria dormir ali. — Falo.

— E morrer congelada? — Vira seu rosto e me olha.

— E por que se importa? — Evito olhar para ele.

— Não quero encontrar uma pessoa morta pela manhã, ainda mais aqui na academia.

— Pensei que estava acostumado a ver pessoas mortas em locais como esse. — Digo sem olhar para ele.

— Já vi em outros lugares, mas não permito isso aqui. E já te disse que quando for falar comigo, olhe nos meus olhos. —Diz irritado.

Ele que pensa que farei tudo o que ele diz, se eu quiser olhar eu olho. Permaneço calada. Jay me deixa nervosa, não sei como agir perto dele. É estranho. Enrolo-me mais na coberta, aquele lugar realmente estava mais quente. Percebo então que eu estava virada com o rosto para ele.

— É corajosa vir dormir em um lugar assim. — Ele fala ainda me olhando.

— É o que tem para hoje. — Falo.

— Por que veio para cá a essa hora?

— Meu pai está tendo um encontro agora, não quero atrapalhar. — Explico e ele ri.

— Então fez bem. — Fala me fazendo olhar para ele.

— E você? Por que está aqui? — Tomo a coragem de perguntar.

— Venho dormir aqui às vezes quando tenho vontade. — Explica.

Então ficamos em silêncio. Tento olhar para tudo menos para ele.

— Parece estar sem sono. — Solta.

— Sim, estou. Esqueci minhas coisas, há essa hora eu estaria desenhando até o sono vir.

— Você desenha bem. Desde quando você faz isso? — Pergunta.

— Como você sabe que desenho bem? — Fico confusa.

— Deixou isso aqui para trás. — Ele pega meu caderno perto das costas dele e joga em mim. Fico aliviada em ver meu precioso caderno de volta. Espera estava com ele esse tempo todo. Queria ter visto sua reação ao olhar meus desenhos. E por que raios ele estava com meu caderno nesse exato momento? Ele estava olhando antes de eu chegar?

— Então, desde quando você desenha? — Volta a perguntar.

— Desde meus seis anos. Minha mãe era pintora, amava vê-la pintar. Então eu me virava com algumas folhas de papel. Adorava pintar as paredes do meu quarto, até o dia em que levei uma bronca por fazer isso. Meu pai achava que isso iria me fazer virar um vândalo. — Falo rindo e Jay também ri. Meu senhor, como ele é lindo, as luzes das velas o fazia mais perfeito ainda. Queria tocá-lo.

— Fala na sua mãe no passado, ela... — Jay me encarava.

— Ela morreu quando eu tinha 17 anos. — Não iria falar mais que isso.

— Sinto muito.

— Tudo bem. E os seus pais? — Faço a merda de perguntá-lo.

Sua expressão se torna fria e ele se permanece quieto.

— Desculpa. — Falo.

— Não vamos falar sobre isso. — ele se vira para o teto novamente. Merda, Sky. O trato era não se intrometer nos assuntos pessoais dele. Permaneço calada por um tempo. Meu telefone começa a tocar e o nome de Jimmy aparece na tela. Entro em pânico.

— Não vai atender? — Jay pergunta.

— É o Jimmy. — Falo ainda espantada e Jay me olha.

— Se falar algo daqui, considere-se morta. — Ele alerta.

Deslizo a tela e faço um sinal de silêncio para o Jay.

— Skype!

— Oi, Jim.

— Está em casa? — Pergunta.

— E-Em casa? Não. — Gaguejo.

— Então está aonde?

— Estou — paro e olho para Jay. Ele se encontra sorrindo ao ver meu desespero — na casa da Tina. Estamos fazendo um trabalho e vou dormir aqui. — Minto.

— Na casa da Tina? Por que está tão quieto aí?

— Por que estou na sacada, elas estão lá dentro.

— Entendi, só liguei para saber como você está. Eu ia passar na sua casa, ainda bem que liguei antes.

— Sim, estou bem.

— Bom, não vou te atrapalhar. Boa noite, até domingo.

— Até. Beijos. — Desligo e olho para Jay que me encarava.

— Que amizade linda. — Jay soa sarcástico.

— Cala a boca. — Digo irritada e arrependida por ter mentido para Jimmy.

— Você falou que não era mentirosa.

— Não sou. O que? Quer que eu fale desse lugar pra ele? Você me pediu para não falar. — O questiono — Pediu não, me ameaçou.

— Então fará tudo que eu pedir? — Ele levanta sua sobrancelha, sinto minhas bochechas queimarem ao pensar besteira. Balanço a cabeça.

— O que acabou de pensar, Sky? — Pergunta sorrindo.

— Não pensei em nada. Boa noite. — Fecho meus olhos e sinto alguém pular ao meu lado no colchonete.

— O que está fazendo? — Pergunto assustada ao vê-lo do meu lado.

— Estou congelando. — Ele se enfia no meu cobertor. Sua pele gelada toca a minha dando um pequeno choque térmico. Tento me afastar.

— Relaxa, não vou fazer nada com você, a não ser que queira. — Ele me encara. Sem querer me pego pensando besteiras novamente. Aquele homem vai acabar com meu psicológico.

— Boa noite. — Digo novamente e o ouço rir. Droga não consigo dormir.

— Não consegue dormir né? — Ele pergunta. Ele lê meus pensamentos? Meu Deus quem é esse homem? Abro meus olhos e olho para ele.

— Não. — Suspiro.

— Também não consigo. — Solta. Legal e o que vamos fazer? Ficar olhando um para o outro? Bom, bem que eu queria. Jay então deita olhando para o teto novamente.

— Suas tatuagens — paro um segundo — parecem ter doído muito.

— Algumas sim.

— Elas têm algum significado? — Pergunto.

— Não, mas tem uma função. — Ele fala, me deixando confusa — apenas uma tem um significado. — ele me encara. Mesmo sem entender isso de ter uma função, decido ficar calada.

— Você tem algum sonho? — Ele pergunta do nada.

— Tenho. — Viro-me para o teto também. — Tenho vários. E você? — O encaro.

— Não sei. — Suspira.

— Como assim não sabe? — O olho confusa. — Não tem nada que ame fazer?

— Tem, mas... — Ele fica em silêncio.

— Mas? — Tento fazê-lo falar.

— Nada. — Ele evita novamente. — Não está seguindo as regras, Sky. Nada de ser íntima, lembra? — Ele me olha.

Mas é ele que está se abrindo comigo. Acho que temos alguém bipolar aqui...

— E, então, você pode ser íntimo comigo? Pode me perguntar e ainda sou obrigada a responder. — Digo irritada.

— Você não é obrigada a nada, responde por que quer. Em nenhum momento você disse que não queria que eu te perguntasse.

— Então te proíbo de fazer perguntas assim também. — Viro-me irritada para o outro lado e tento dormir. Não ligo em falar da minha vida para ele, mesmo sabendo que ele é perigoso. Mas algo me faz confiar nele, não sei o que é.


Décimo Terceiro Capítulo


Olho-me no espelho mais uma vez para confirmar o visual. Estou sendo obrigada a ir para esse evento de motos hoje. Bato a mão em minha jaqueta preta para tirar as pequenas poeiras. Vejo uma pequena mancha na minha calça jeans, lambo a ponta do meu dedo e passo em cima para limpá-la. Sucesso. Espirro um pouco de perfume em ambos os lados do pescoço esfregando no corpo em seguida. Pego minha bolsa em cima da cama e depois meu celular. Vou para a porta e desço as escadas.

— Uau, está linda! — Tia Betty fala surpresa tampando sua boca.

— Você também. — Sorrio. Ela está indo para uma boate. Minha tia é mais velha que minha mãe, mas sua mente ainda parece estar na adolescência.

— Espero que eu consiga beijar muito esta noite. — Ela levanta as mãos para o alto balançando. — Talvez eu nem deva voltar para casa. — Ela pisca indo para a porta e eu começo a rir.

A caminho da porta sinto meu celular vibrar. Uma mensagem da Tina.

Sky, cadê você? Já entramos, desculpa não te esperar.

Tudo bem. Estou saindo de casa.

Ainda? Meu Deus amiga, vai casar? Não precisa se arrumar toda.

KKK, já já chego aí.

Ok, é só falar seu nome e mostrar a identidade.

Ok.

No caminho me pego pensando em Jay. Será que ele vai estar lá? Ao acordar hoje na academia ele não estava mais lá. Mas eu queria o quê também? Que acordássemos juntos como um casal? Sorrio boba ao imaginar a cena. Aliás, dormi muito bem. Sem nenhum pesadelo dessa vez, nunca me senti tão viva. Aquele lugar é milagroso. Depois me lembro de Jay não querendo falar sobre ele, então a raiva ocupa todos os sentimentos bobos que acabei de sentir. Por que ele impede tanto de conhecê-lo?

Olho à frente e vejo uma movimentação. Há uma fila na entrada, pessoas se identificavam e ao serem confirmadas na lista, entravam. Uma garota com vários piercings está ao lado do portão com um papel em mãos. Barulhos de motores ecoavam pelo local.

— Nome e identidade. — A garota fala sem ao menos olhar para mim.

— Sky. — Digo pegando minha identidade na bolsa.

— Não está na lista. — Ela soa ignorante.

— Como assim? — Pergunto confusa.

— Não está na lista. Quer que eu soletre? Agora saia do caminho. — Me encara com cara de nojo.

Mas a Tina disse que eu estava. O que está acontecendo? Ligo algumas vezes para a Tina que não atende o celular. Envio algumas mensagens, mas nada de visualizar. O jeito é ir embora.

— Ela está comigo. — Uma voz grossa fala atrás de mim. Conheço aquela voz.

— J-Jay. — a garota olha espantada e depois me olha.

— Ela está comigo, Jen. — Ele me puxa pela cintura e me cola ao seu lado. O olho atordoada. Ele está com uma jaqueta de couro preta e uma calça jeans azul escura. Alguém poderia dizer estamos combinando. Jay está sexy como sempre. Seu perfume toma minhas narinas. É tão bom...

— Podem passar. — Ela sorri e fecha a cara ao me olhar.

Entro com Jay ainda abraçando minha cintura.

— Está bem cheirosa hoje. — Comenta encostando seu nariz em meu pescoço. Sinto um frio na barriga. Tiro sua mão de minha cintura e saio o ignorando. Não era isso que ele queria? Que eu não me aproximasse dele? Não entendo o motivo de ele interagir tanto comigo.

Olho para as pessoas para encontrar Tina ou Megan. Sem sucesso. Onde essas duas se enfiaram? Tento mandar mais algumas mensagens e nada de resposta. Algumas motos passam perto de mim. Aquelas motos não eram motos normais, eram motos clássicas, algumas luxuosas e enormes. Qual é o propósito desse evento? Talvez um desfile? Mal sei o que estou fazendo aqui.

Mesmo sem entender nada de carros e motos, meus olhos são captados a uma. Ela é enorme, toda espelhada, seu design é magnífico. A aliso fascinada.

— Linda, não? — Um homem fala ao meu lado e tomo um susto. Um homem bem bonito por sinal. Possui um sorriso encantador, sobrancelhas grossas e cabelos castanhos escuros.

— Sim. — Sorrio afastando da moto.

— É uma NCR MH TT. Ganhei em uma aposta. — Ele explica. Meu Deus ele é o dono da moto, não era para eu tê-la alisado. Permaneço calada, não sei o que dizer.

— Seu nome é? — Pergunta levantando sua sobrancelha.

— Sky. — Sorrio forçado.

— Sou Ethan. — Ele levanta sua mão para me cumprimentar. Fico imóvel ao ouvir seu nome. Ethan? Aquele Ethan que me perguntaram se eu conhecia? Talvez não. Fico em transe fazendo vários questionamentos em minha cabeça esquecendo de apertar sua mão. O encaro assustada.

— Então já deve ter ouvido falar sobre mim. — Ele sorri abaixando a mão colocando-a em seu bolso.

— N-Não, não o conheço. — Tento parecer calma.

— É uma menina muito bonita, Sky. — Ele solta. Por que do elogio? Eu bonita? Ele está tirando uma com minha cara, só pode.

— Obrigada. — Falo virando o rosto procurando o paradeiro de Tina e Megan.

— Bom, nos vemos por aí. — Ele diz batendo sua mão em meu ombro, logo indo para outro lugar. Devo falar com o Jay? Não, não devo. Por que eu iria falar com aquele idiota? Vou mais uma vez a procura das meninas. Então uma gritaria começa. O que está acontecendo? Tendo olhar e vejo alguns homens invadir o local. Fico paralisada sem saber o que fazer. Até que uma moto para em minha frente.

— Suba. — Jay manda.

— Não! — Nego irritada.

— Que merda garota, suba agora! — Ele se irrita.

Sento-me na moto e agarro seu abdome. Que raios estava acontecendo? Jay acelera moto. Várias pessoas desviam para não serem atropeladas.

Outras motos começam a sair do local também. Tina e Megan! Elas estavam bem? Rezo em silêncio para que nada aconteça a elas. Mesmo com tudo isso, não deixo de apreciar o quão perto eu estou do Jay. Eu estou o abraçando, literalmente. Aproveito para sentir seu perfume em sua jaqueta. É extremamente delicioso. Queria poder ficar assim para o resto da minha vida.

A rua estava vazia agora. Olhava para os lados para tentar entender onde estávamos indo. Pensei em perguntar, mas desisti. Jay então para em cima de algo que parecia um viaduto. Dava para ver a cidade inteira dali, era uma paisagem e tanto. Ele desliga a moto e eu desço.

— O que raios estava acontecendo ali? — Pergunto espantada.

— Invasão, provavelmente alguém queria me matar. — Ele fala.

— Te matar? Por quê? Com aquele tanto de gente, por que queria matar logo você?

— Ainda pergunta, Sky? Não passou na sua cabeça que um cara como eu não tenha inimigos?

— Passou sim, mas... — Fico pensativa.

— Mas? — Ela questiona.

— Nada, deixa pra lá.

— Está bem? — Pergunta antes de descer da moto e logo me encara.

— Sim, estou. — Digo em um tom irritado e ajeito meu cabelo que está sendo bagunçado pelo vento.

— Está irritada comigo? — Pergunta encostando-se à moto. Meu Deus esse homem é um pecado.

— Não. — Minto.

— Está sim. — Ele sorri.

— Não estou, por que estaria? — Pergunto já respondendo em minha mente o motivo da raiva.

— Então por que me afastou daquele jeito na entrada? — Seu olhar se torna confuso.

— Por que não somos íntimos, não? — Falo e Jay cai na gargalhada.

— Não acho engraçado. — Digo irritada e ajeito meu cabelo de novo. O vento está me irritando também. Então um silêncio ocupa o ambiente. Ele continuava me olhando.

— Droga, como você é linda! — Ele solta. Fico paralisada ao ouvir seu comentário. Ele me acha linda? Eu ouvi certo? Isso não é possível.

Ficamos nos encarando em silêncio. Jay então me puxa pela cintura colando nossos lábios. Um beijo profundo começa. O gosto dos lábios de Jay tomam minhas papilas gustativas. Seu gosto é incrível. Suas mãos empurram-me para mais perto de si. Isso só podia ser um sonho. Minha língua se sente perdida, logo é guiada pela de Jay a todo canto de sua boca. Uma de suas mãos e levada até meu rosto, assim me puxando para mais perto, como se não quisesse que desgrudássemos. Seu piercing batia em meu nariz várias vezes, estava com medo de machucá-lo.

Afastamos um pouco para poder respirar, mas em questão de segundos Jay volta a me beijar novamente. Minha cabeça gira a todo estante. Borboletas voam em meu estômago. Sensações de todos os tipos começam a aparecer. Duas bocas coladas e duas línguas que pareciam estar e uma batalha. Era mágico. Sua mão então desliza até minha nuca, então sobe mais um pouco agarrando meu cabelo. Não conseguíamos nos separar. É viciante, é prazeroso, é magnífico. Minha calcinha se encontra encharcada. Depois de mais alguns segundos, nos separamos. Jay cola sua testa na minha, ambos ofegantes sem dizer nenhuma palavra.

Voltando a realidade, logo uma voz fala em minha cabeça. “Ele faz isso com todas Sky, você foi apenas mais uma”. Afasto sua mão das minhas costas e vou para trás. Ele me olha confuso.

— Com quantas você já fez isso? — Pergunto segurando as lágrimas.

— Fiz o quê, Sky?

— Beijar sem permissão. Levar para um lugar afastado, então chamar de linda e depois beijar — Digo irritada.

— Você é a primeira que faço isso. — Ele solta. Por que não consigo acreditar? Uma hora me manda ignorá-lo, na outra me beija. Ele está achando que sou otária, só pode.

— Ah, conta outra, Jay.

— Sky, e se eu tivesse feito isso com outras, o que te diz direito? — Pergunta. Sinto uma pontada no estômago. Não sou nada dele, por que quero explicações? Meu momento mágico se foi.

— Foda-se o que você faz ou fez com outras mulheres. Mas não te dei a permissão para me beijar. — Minha vez de atacá-lo. Não se iluda mais uma vez, Sky.

— Você me permitiu, Sky, ficamos minutos nos beijando — ele afirma. Droga, ele não está errado. Fico sem palavras. Então um táxi passa na estrada. Levanto a mão para ele parar e ele para. Graças a Deus está vazio.

— Sky, volta aqui! — Jay grita. O ignoro e entro no táxi. Ao partir, o olho pelo vidro e o vejo chutar a roda da moto colocando suas mãos na cabeça. Tento acalmar minha respiração que ainda estava rápida por conta do beijo. Meu coração também estava prestes a sair pela boca. Preciso falar com alguém. Jimmy? Não sou louca. Meu pai? Me mata. Tia Betty? Irá fazer um alvoroço. Tina? Vai surtar e criar suas ficções. Então só sobrou Megan, a que parecia ser a mais cabeça. Tento ligar para ela torcendo para a mesma atender.

— Alô?

— Megan? Está tudo bem? Não consegui encontrar vocês lá. — Digo.

— Tina passou mal e levei ela para casa, tentei ligar pra você, mas só dava caixa postal. Acabei de ler as mensagens que você enviou.

— Ela está bem? — Pergunto preocupada.

— Sim, está. Foi algo que ela comeu antes de ir. — Fala.

— Que bom. Megan, posso me encontrar com você? Preciso muito falar com alguém agora.

— Claro, moro perto da Tina. Meu prédio é o laranja, quinto andar. Mas está tudo bem? — Ela pergunta.

— Está sim, só preciso conversar.

— Tudo bem, estou te esperando. Até daqui a pouco.

— Até. Tchau. — Desligo o telefone.


Décimo Quarto Capítulo


— Oi, entre! — Megan libera o caminho para eu passar.

— Oi, desculpa por te chamar do nada, mas preciso muito conversar. — Falo entrando e apreciando o cheiro de lavanda na casa.

— Tudo bem. — Ela fecha a porta. — Vamos para o meu quarto. — Ela disse me guiando para o corredor.

A casa de Megan era bem limpa. Os porta-retratos bem organizados embelezavam mais a estante moderna. Sua sala com as cores marrom e creme predominantes davam um aspecto de conforto.

A segui até seu quarto. Megan é realmente uma mulher muito organizada. O quarto parecia novo, como se ninguém nunca dormira ali. Sento-me em sua cama colocando a minha bolsa no chão para não sujar a mesma.

— Aconteceu alguma coisa? — Ela senta ao meu lado.

— Sim. — Paro e suspiro.

— O quê, Sky? Fala.

— O Jay, — paro por cinco segundos — ele me beijou.

Megan abre seus olhos espantada. Fica alguns minutos calada.

— Como isso aconteceu, Sky?

— Lá, no evento, parece que invadiram, não sei. Fui tudo tão rápido. Eu estava assustada, então Jay parou com sua moto na minha frente e me mandou subir. Ele me levou para um viaduto, me chamou de linda e me beijou. Sem minha permissão, deixando claro.

— Sem sua permissão? O beijo foi rápido? Ou? — Ela me olha curiosa. Parecia já saber a resposta.

— Demorado. — Mordo a boca e a olho como um gato que acabara de ser pego pelo seu dono fazendo algo de errado.

— Então foi com sua permissão Sky. Se não quisesse beijar ele, era só empurrá-lo. — Ela estava certa.

— Verdade. — Coço a cabeça.

— Foi bom? Você gostou? — Pergunta.

— Sim. Amei. E esse é o problema. — Digo me levantado e começo a andar de um lado para o outro em seu quarto.

— Problema? Por quê? Sky, só foi um beijo.

— Pra mim não só foi um beijo. — Solto — Eu estou gostando dele, Megan. Esse é o problema. Ele, ele me deixa louca de uma forma que não consigo explicar. Sinto uma mistura de sensações quando ele chega perto, quando ele apenas me olha.

— Essa é realmente a sensação que ele causa nas mulheres. Mas, droga, você se apaixonou. — Ela me olha mais espantada.

— Apaixonar ainda é uma palavra muito forte. Mas sim, estou mega interessada nele. Acho que todas estão.

— Menos eu. — Ela ri. — E o que pretende fazer? — ela pergunta.

— Não sei, — a olho — eu tenho a certeza, que para ele, eu só sou mais uma de suas conquistas. Mais uma boba que achou que irá ter algo com ele. Sinto-me usada, não sei. — Sento-me de novo.

— O que ele falou? Depois do beijo.

— Eu o questionei sobre ele fazer isso com todas.

— E?

— Ele falou que ele nunca tinha feito isso com ninguém. É lógico que é mentira. Ele beijou uma loira na minha frente no Triangle, estava quase engolindo ela. Certeza que deve ter elogiado ela também. Como pode ser tão, tão — tento procurar um xingamento certo — descarado!— acho um que não é tão forte.

— Sky, acho que ele não quis dizer sobre beijar. — Ela fala e a olho confusa. Como assim? É sobre o quê então?

— Então quis falar sobre o quê?

— Sobre a sensação, o sentimento, talvez. — Ela me encara. Não acho que isso seria possível. Não sou uma pessoa que despertaria esses sentimentos em alguém, ainda mais em Jay Simmons.

— Acho que não. — Fico pensativa.

— Sky, não quero te iludir mais, mas por que não fala com ele? Tenta esclarecer, pergunta sobre a intenção dele com você. Isso tudo pode se resolver a base de uma conversa. — Megan é ótima em aconselhar. Talvez eu vá falar com ele. Pode ser amanhã ou nunca, não sei. Continuo confusa.

— Não sei, Megan. Sinto que vou acabar me ferrando nessa história. Ele não parece ser uma pessoa para ter algo sério. Estou sendo sincera, eu queria ter algo com ele. Mas, não sei. Sinto que não é recíproco.

— Você só saberá se conversar com ele. — Ela fala. Eu odiava o fato dela estar sempre certa.

Entrelaço meus dedos e coloco a mão em meu colo. As fito em busca de alguma solução. Permaneço em silêncio enquanto Megan me encara.

— Sky, eu deveria falar para você ficar longe desse cara, mas você parece estar bem interessada nele. Sei o quanto isso dói, saber que, talvez nada dará certo. Ficar nessa de “será que ele gosta de mim?”, ficar rodeada de perguntas sem respostas, ficar com os sentimentos confusos, coração dolorido. Eu entendo tudo isso. — Ela para. Com certeza ela está falando do Jimmy.

— Você gosta do Jimmy, né? — A olho. Seus olhos começam a encher de água. Algumas começam a pingar.
— Sim. — Ela para.

— O que realmente aconteceu com vocês dois? — Pergunto. Ela suspira, enxuga algumas lágrimas e me olha.

— Eu e ele estávamos em uma festa, foi quando me interessei por ele. Bebemos juntos e conversamos um pouco, a bebida foi nos fazendo ficar mais confortáveis um com o outro. Então nos beijamos. Depois fomos para o quarto e dormimos juntos. Sim, transamos. Para mim aquilo foi tão significativo, tão maravilhoso. Mas não passei de uma iludida. Jimmy nem sequer me olha agora. — Ela para e olha para suas mãos que se encontram em cima da almofada em seu colo.

Fico sem palavras. Nunca pensei que Jimmy faria algo assim. Se não quisesse algo com ela, então para que transar com ela? Para que dar esperança para alguém assim? Jay está fazendo isso comigo também. Por que homens são tão escrotos?

— Você falou com ele? — Pergunto segurando sua mão.

— Sim, ele falou que aquilo foi um erro. E que só fez por conta da bebida. Só Deus sabe quantos filmes criei em minha cabeça, filmes dele me pedindo em namoro... — ela para novamente — Mas ele gosta de outra pessoa e sei que é você, Sky. — Volto a ficar sem palavras. Não sei o que dizer para ela.

— Eu só vejo Jimmy como irmão, Megan. — Solto.

— Mas ele te ver como algo mais. — Ela funga.

Suspiro.

— Nunca pensei que sofreria assim por alguém. — Solto.

— Eu também. Deveríamos nos tornar namoradas, talvez fosse mais fácil. — Ela fala e começamos a rir.

— Iria ser ótimo. — Rio.

— Sky, é sério, tenta falar com o Jay. No meu caso eu já tenho uma resposta, mas no seu não. Talvez Jay tenha realmente algum sentimento por você. Serei sincera, ele não é um ótimo cara para namorar. Ou talvez seja, não sei, não posso julgá-lo sem ao menos conhecê-lo.

— Vou pensar. Talvez eu fale com ele amanhã, se eu tiver coragem é claro. — Rio e ela ri também.

— Bom, está tarde. Por que você não dorme aqui?

— Posso? — Eu estava com muita preguiça de voltar para casa. Megan é uma pessoa totalmente diferente do que eu pensava.

— É claro. — Ela levanta indo para a porta. — Você deve estar com fome, vamos pedir uma pizza e beber algumas cervejas? Acho que estamos em uma situação ótima para beber. Duas garotas com corações confusos e arrasados. — Ela ri.

— Concordo.

Megan abre seu guarda-roupa e pega uma roupa jogando em mim.

— Vista isso, ficará mais confortável.

— Obrigada.

Pedimos pizza e esperamos a mesma chegar enquanto bebíamos cerveja. Eu precisava disso, queria que Tina estivesse aqui também. Senti-me culpada por não ter ido me consolar com ela, mas não iria dar muito certo se eu fosse. Megan desce para pegar a pizza. Lembro-me de mandar uma mensagem para meu pai.

Comemos a pizza e nos afogamos no álcool. Eu estava mais relaxa. Ambas encostadas na cadeira passando mal de tanto comer.

— Obrigada. — Megan me pega de surpresa.

— Por quê?

— Por ter me escolhido para conversar. Jurava que em momentos assim você escolheria a Tina.

— Imagina falar sobre isso com a Tina? — Começo a rir e Megan também.

— Ela com certeza iria mandar você transar com o Jay na hora.

— Sim. — Rimos mais uma vez. Até que adoraria esse conselho. Não, Sky, foco. Megan me encara.

— Desculpa tratar mal você nos primeiros dias. Eu senti inveja de você, quando vi que era a pessoa que Jimmy gosta.
— Tudo bem. Eu também faria isso.

— A uma nova amizade e que foda-se aqueles idiotas gostosos. — Ela levanta sua lata para brindar, bato minha lata na dela e damos mais um gole. Acredito que já estávamos bêbadas.

— Deve ter sido difícil. — Ela fala fechando seus olhos sonolentos os abrindo em seguida.

— O que? — Sinto minha cabeça girar.

— Ver sua mãe ser assassinada. — Ela solta.

Fico sem reação. Realmente vamos falar sobre isso?

— Desculpa. — Ela fala ao ver minha reação.

— Não, tudo bem. Nunca falei disso com ninguém. A não ser Jimmy, minha tia e meu pai. Foi realmente difícil. — Encaro a lata e depois bebo mais um gole. Eu estava bêbada, então foda-se.

— Aquele filho da puta vai pagar, Sky. — Ela cerra seus olhos.

— Espero. — Engulo seco.

— Bom, acho que é melhor a gente ir dormir.

— Você mora sozinha? — Pergunto.

— Moro com minha mãe. Ela é médica, está de plantão. Estou acostumada a ficar sozinha. — Fala.

— E seu pai?

— Meus pais são divorciados.

— Sinto muito.

— Tudo bem, não ligo.

Limpamos nossa bagunça e fomos para o quarto. Conversamos mais um pouco. Lembro-me do jogo amanhã. Droga tenho que acordar cedo. Coloco o celular para despertar. Megan começou a falar de sua infância, de como gostava de fugir toda vez que seus pais brigavam. Ela teve uma infância difícil. Ao contar sobre seu passado ela apaga. Fito o teto e lembro-me do beijo, tenho a sensação de meus lábios pulsarem. Eu queria sentir seu gosto novamente. Sinto me excitada ao lembrar de suas mãos pressionando minha cintura. Sorte de quem já pode provar aquele homem por completo. Respiro fundo e fecho os olhos.


Décimo Quinto Capítulo


Olho para a cama de Megan e a vejo toda espalhada, ainda estava em um sono profundo. Minha cabeça pesa. Ressaca não. Que merda! Tento me levantar com os olhos cerrados. Decido não acordar Megan, pego minha roupa e vou para o banheiro. Graças a Deus que sempre guardo uma escova de dente na bolsa. Faço minhas necessidades e me troco. Bom, agora tenho que acordá-la para trancar a porta.

— Megan. — Sussurro tocando-a — Megan. — Sussurro novamente.

— Hm. — Ela resmunga.

— Eu já vou indo, vem trancar a porta.

— Depois tranco. — Ela coça sua perna.

— Ok, então até amanhã.

— Até. — Resmunga e volta a dormir.

Pego minhas coisas e vou para casa. A dor de cabeça estava me matando. A luz do dia parecia maltratar meus pobres olhos. Escuto uma moto e a olho em uma rapidez. Jay? Não, não era ele. Bom, Graças a Deus que não era ele, não queria que me visse assim. Estou um pó.

Chego em casa, Jimmy me manda uma mensagem dizendo que me buscará daqui a uma hora. Tomo um banho e visto um short jeans com uma blusa de manga comprida até o cotovelo, preta é claro. Encaro minha cicatriz antes de por a blusa. A odeio tanto. Como algo na cozinha. Meu pai mal ficava em casa depois do emprego. Tia Betty nem precisa falar. Saudades de ter movimentos em casa. Antigamente a família Scott visitava quase todos os dias, minha mãe sempre fazia o almoço, a janta, tudo. Eram pequenos momentos, mas nunca imaginei que iria sentir falta de coisas assim.

Espero Jimmy me buscar. Minha cabeça está a ponto de explodir, tento massageá-la. Procuro algum remédio e tomo qualquer um para dor de cabeça. Jimmy então chega e buzina no lado de fora. Tranco a porta e olho para sua direção.

— Vamos? — Abaixa o vidro e grita.

Entro no carro, dou um beijo no seu rosto. Ele está magnífico com um uniforme de futebol. Evito conversar no caminho, minha cabeça não estava ajudando. Massageio-a novamente.

— Está tudo bem? — Jimmy me olha.

— Estou morrendo de dor de cabeça. — Explico

— Quer que eu passe na farmácia? — Pergunta.

— Não precisa, vai passar. Estou de ressaca.

— Ressaca?

— Bebi com a Megan ontem.

— Ah. Então não vai passar tão rápido, Sky. Vou passar na farmácia. — Diz virando em uma rua.

Ele para o carro, desce e entra na farmácia. Ao entrar no carro, me entrega uma sacolinha com os comprimidos dentro.

— Aqui. — Me entrega uma garrafa de água.

— Obrigada. — Pego e bebo com os comprimidos.

— Você não é de beber, aconteceu alguma coisa? — Pergunta me encarando.

— Não, só estava me divertindo com, Megan. — Se eu estivesse bem, com certeza eu iria te dar um sermão, por tudo que ele fez a Megan passar. Mas por outro lado, Jimmy não é obrigado a aceitá-la. Só acho que tem um jeito melhor para dar um fora em alguém.

— Se quiser voltar eu te deixo em casa.

— Lógico que não. Quero te ver jogar. — O vejo abrir um sorriso. Ele volta a seguir o caminho. Logo para em frente a um campo. O local era cercado por uma grade. Alguns homens estavam no campo fazendo alongamento. Jimmy me entrega seus óculos escuros, não sei se vou usar isso, não combina muito comigo. Pego-os e saio do carro.

— Até que enfim. — Um deles grita para Jimmy.

— E aí, cara. — Jimmy o cumprimenta.

— Quem é a gata? — Outro se reúne.

— Essa é a Sky. — Jimmy fala.

— A famosa Sky. Sou Dylan, esse é o Jorge, Kylan, Ren, Bob, Cris e Liam. — Ele aponta para cada homem e eles vão levantando sua mão ao falar seus nomes.

— Prazer. — Sorrio. Vou ser sincera, não lembro o nome de mais ninguém.

— Cadê o resto? — Jimmy pergunta.

— Estão no vestiário. — Outro responde.

— Skype, senta ali na sombra. Vou me aquecer agora. Você pode segurar pra mim? — Ele entrega seu celular, as chaves do carro e sua carteira.

— Hummmmm “Skype”. — Seus amigos zoam Jimmy ao falar meu apelido.

— Idiotas. — Jimmy ri e rio também.

— Seguro. — Pego suas coisas e vou para a sombra, coloco os óculos de Jimmy. Meus olhos agradecem.

— Não vai me desejar sorte? — Ele grita.

— Boa sorte. — Grito e ele sorri.

Sento-me na arquibancada onde tem sombra. O vento bate em meu rosto, tão gostoso. Mais homens entram no campo. Um time jogará com camisa e o outro sem. Obrigada Deus, por uma visão assim. Jimmy é do time sem camisa. Não deixo de notar sua boa forma, ele cresceu tanto, meu Deus. Eles tiram a sorte na moeda para ver quem vai começar a jogar. O time com camisa começa, Dylan consegue tomar a bola do outro cara. Jimmy gritava pela bola. Um chute falso, a bola está fora.

Depois de algumas horas, Jimmy consegue fazer um gol. Ele olha para mim e aponta como se “esse foi para você”. Sorrio que nem uma boba. Ele realmente melhorou muito, é uma pena. Amava zoá-lo toda vez que perdia a bola.
Umas adolescentes apreciavam o jogo também. Gritavam toda vez que a bola era tocada para o time sem camisa. Por que será?

Dylan faz um gol, mas depois de certo tempo, o time adversário marca um ponto. O jogo permanece no mesmo ritmo. Até que um homem apita. O time de Jimmy ganhou. Grito e bato palmas que nem uma louca. A cabeça volta a latejar, não estava cem por cento curada. Todos agarram seus joelhos cansados, alguns se deitam no campo. Como eles aguentavam correr tanto? Eles serão futuros policiais Sky. Bato em minha testa ao ver que minha burrice ataca novamente.

— E aí, o que achou? — Jimmy senta ao meu lado pingando e todo ofegante.

— Jogou muito bem, Sr. Scott. — Sorrio.

— Falei que tinha melhorado. — Ele toma um gole de água. O suor escorria em seu peitoral. Jimmy realmente é muito bonito. Sempre achei que ele deveria seguir a carreira de modelo. Possui um rosto lindo, simétrico, olhos sensuais, tem uma altura boa, ombros largos, com certeza uma agência iria adorá-lo como modelo.

— Estou exausto.

— Percebi.

— Melhorou a cabeça? — Pergunta tentando controlar sua respiração.

— Um pouco. — Digo.

— Vou tomar uma ducha, já venho.

Curto o momento solitário em silêncio. O barulho do vento fazia qualquer outro barulho sumir. O campo é enorme, se eu correr até a metade dele, eu já morria. Espero Jimmy voltar da ducha. Os homens saem do vestiário e se despedem.

— Tchau, Sky! — Alguns gritavam acenando, aceno de volta.

Jimmy vai para o campo novamente.

— Vem aqui. — Me chama. Desço e vou para o campo. Ele bagunçava seus cabelos molhados. Ele estava com a bola em suas mãos. Ao chegar perto, o cheiro de banho toma minhas narinas.

— Que tal uma pequena partida? — Pergunta colocando um pé em cima da bola com sua mão na cintura.

— Tem certeza?

— Tenho. Venha pegar. — Me desafia. Corro até ele e tento pegar a bola. Consigo algumas vezes, mas ele pegava-a de volta. Ficamos nisso por dez minutos, eu já estava morta.

— Credo, Skype, está sedentária — Ele solta rindo.

— Me deixa. Não sou muito de exercícios. — Me jogo na grama ofegante. Jimmy deita ao meu lado. Ficamos fitando o céu que agora estava tomado por nuvens.

— Sinto saudades das nossas partidas. — Ele fala.

— Também sinto.

Jimmy então rola e fica em cima de mim. O que ele está fazendo? Ele me encara. Fico paralisada.

— Eu preciso tentar, desculpa. — Sussurra. Fico confusa. Jimmy então aproxima o rosto dele no meu. Droga, ele vai me beijar. O empurro e ele vai para o lado se sentando em seguida. Levanto-me fazendo o mesmo.

— Jimmy, o que pensa que está fazendo? — Digo irritada.

— Desculpe. — O encaro ainda assustada. Lembro-me então da Megan.

— Jimmy, nada vai acontecer entre nós. — Falo. Preciso mandar a real para ele. Apenas um mexia tanto comigo, e todos sabemos quem, Jay Simmons. Aquele maldito gostoso.

— Por quê? — Ele se encontra sério.

— Por que não o vejo assim.

Ele fica em silêncio fitando a grama.

— Não voltarei a fazer isso, desculpa. — Resmunga.

— Perfeito. — Levanto-me e ele também faz o mesmo.

— Esquece o que acabei de fazer, por favor. — Ele estava envergonhado.

— Tudo bem. — O abraço.

Jimmy me deixa em casa. Ficamos calados no caminho todo. Por que ele faz essas coisas? Isso nos deixa mais desconfortáveis. Eu o amo, mas não dessa maneira. É tão difícil de entender?


Décimo Sexto Capítulo

Algumas semanas se passaram, e nada de Jay dar as caras. Eu, como uma idiota sem rumo, vou para a academia todo santo dia com uma pequena esperança de vê-lo. E essa pequena esperança inclui falar sobre o beijo e me iludir com uma resposta positiva. Quero ouvir da boca dele palavras que podem mudar minha vida, talvez a dele também. Mas meu lado racional diz que nada disso será possível, que é tudo uma novela se formando em minha mente. Aonde que Jay Simmons, o cara que é conhecido por ser mal, mulherengo e sem alma vai querer tentar viver uma fantasia? Só nos seus sonhos, Sky.

Despeço-me de Megan e Tina e vou rumo a academia. A esperança ainda está de pé. Existe alguém mais otária que eu nesse momento? Ao invés de seguir minha vida, vou atrás de algo que talvez vá me machucar. O “talvez” nem deveria ser colocado nessa frase. Ao chegar ao local, meu corpo fixa-se no chão ao ver a porta aberta. Ele está aqui. Meu coração pulsa mais rápido por conta do medo, o medo de ser rejeitada, medo de encarar a realidade. Não é melhor ir embora Sky? A secura começa a se formar em minha garganta. Seja o que Deus quiser.

O maldito está aqui. Está com suas tatuagens à mostra, a luva vermelha vestindo suas mãos e o suor cobrindo seu corpo. Jay batia no saco de boxe com uma tamanha raiva. Fecho a porta fazendo um pequeno barulho e ele vira seu rosto em minha direção. O que raios aconteceu? Alguns hematomas e feridas encontram-se em sua face. Meu coração apeta ao vê-lo todo machucado.

— Oi. — Diz ele com sua voz grossa.

— O-Oi. — Gaguejo. Jay tenta estudar minha expressão, eu não conseguia parar de olhar seus machucados, queria entender o que aconteceu.

— Ainda está brava? — Me encara e depois dá um sorriso. Meu sangue ferve ao vê-lo sorrindo. Esse homem é um maldito por completo.

— Um pouco. — Digo indo para o sofá em seguida colocando minha bolsa no mesmo. Permaneço em pé.

— Suba aqui!

— Não, obrigada.

— Droga, Sky, dá para ser menos chata? Venha suba logo! — Eu, chata? E ele é o quê?

— Não quero, Jay. — Quem é ele para mandar em mim? Ótimo ele conseguiu fazer minha raiva crescer. Ridículo.

— Se você não subir em cinco segundos, vou aí te buscar, e com certeza farei algo que você vai odiar. — Ameaçou.

Não vou mentir, meu corpo pede para ficar e ver o que ele pretendia fazer. Mas meu lado racional me impedia de seguir isso, é perigoso.
— Um. — Começa a contar. Fico confusa se vou ou não. O fato de ele achar que manda em mim fere ainda mais meu orgulho. Sim, eu tenho um pouco. — Dois. — Continua. Permaneço parada. — Três. — Ele anda alguns passos. Então decido subir. Meu lado medroso falou mais alto, não posso esquecer que Jay é líder de uma gangue. É melhor não deixá-lo nervoso, Sky.

— Ótimo. Agora pega aquelas luvas ali no chão e coloque-as. — Aponta para as luvas. Faço como foi pedido e fico em sua frente.

— Me bata. — Ele solta.

— O quê?

— Eu disse: me bata.

— Jay, você está louco? Você já está todo machucado.

— Eu disse que é para me bater, Sky. — Ele aumenta um tom. Meu sangue borbulha novamente. Tento dar um soco e ele desvia. Ele está de sacanagem comigo, só pode. Tento outro soco e ele volta a desviar.

— Seja mais rápida. — Ele fala.

Dou outro e ele defende com sua luva. Tento mais três socos em seguida e nada de acertá-lo. Após algumas tentativas, meu sedentarismo então começa a aparecer junto com o suor que começa a escorrer em meu rosto. Jay ri a cada erro.

— Ponha toda sua raiva na mão, gata. — Ele fala e eu reviro os olhos. Minha respiração se encontrava acelerada, procurava o ar e nada dele vir.

— Já está cansada? — Ele zoa.

— Me deixa, Jay! — Tiro as luvas e jogo no chão. Tento sair do ringue, mas sou puxada.

— Espera. Por que ficou tão irritada quando eu te beijei? — Ele me encara curioso — Sky, foi seu primeiro beijo? — Cerra os olhos.

— Não, não foi. É só porque eu não te dei a permissão. — Falo. Não, não era por isso.

— Ah, qual é, Sky? Não venha com essa de permissão. Você permitiu e bem ainda. — Sinto meu rosto queimar. — Me fala, o que está acontecendo?

— Eu que pergunto. O que está acontecendo? O que somos Jay? — Tenho a coragem de encará-lo. Eu preciso saber, mesmo que doa.

Algumas rugas começam a se formar entre suas sobrancelhas. Ele continua me encarando.

— Não sei, Sky, não vamos falar sobre esse assunto. — Uau isso doeu mais do que pensei.

— Precisamos falar. Não quero ser mais uma de suas conquistas e depois ser descartada como um nada. — Será que eu estava exagerando? Será que só eu senti algo a mais entre a gente? Isso está me matando.

Ele permanece quieto me encarando, logo corta a conexão de nossos olhares. Entendi.

— Ok, essa é a resposta que eu precisava. — Tento descer do ringue.

— Eu... — Ele para. — Eu gosto de você, Sky. — Fico paralisada ao ouvi-lo. Esse gostar é gostar como amigo ou como algo mais? Por que ele não consegue ser mais claro? — Mas, não podemos ter o que você quer. — Continua. E lá se vai meu momento maravilhoso, como ele consegue estragar sempre?

— Por quê? — Viro-me para ele.

— Você sabe os motivos. Sabe quem eu sou, não sou um cara para ter uma vida, um namoro ou que quer que seja. Não largarei o que eu faço por ninguém, Sky. — Pensei que não podia doer mais, estava errada.

— Entendo. — Suspiro. Mas em momento nenhum pedi para ele largar alguma coisa por mim. Pretendo não mostrar mais esse meu lado bobo. Eu estava sendo muito idiota, uma tonta. — Vamos esquecer essa conversa, vamos esquecer tudo o que rolou. — Solto. Ótima decisão, Sky, bola para frente.

— Não vá, fique aqui. — Ele pede. Esse homem me deixa mega confusa.

— Quem fez isso com você? — Tento mudar o assunto olhando para os seus machucados.

— Não foi nada. — Tira suas luvas jogando no chão.

— Nada? Está todo ferido, Jay.

— Isso é normal para alguém como eu, Sky. — Ele me olha.

— Gosta realmente de viver assim? — Pergunto.

— Gosto.

— Tudo bem, me preocupei por nada então.

— Estava preocupada comigo? — Sorriu.

— Sim, você é uma pessoa que conheço, é normal ficar preocupada após ver a pessoa que conhece aparecer toda machucada.

— Entendo. — Ele morde os lábios — Eu falei que gostava de você e você, — ele para — gosta de mim? — Ele se faz de idiota ou ele é assim mesmo?

— Falei para esquecermos esse assunto, não? — Não quero mais me machucar.

— Responda, Sky. — Seu tom aumenta. Fico confusa ao pensar se mostro meus verdadeiros sentimentos ou não.

— Estou interessada em você, Jay. Vim aqui com o propósito de tentarmos algo. — Falo. Meu Deus Sky, Não!

Ele me encara com seus olhos escuros, sua boca se abre ao ouvir minha confissão.

— Merda, Sky! E-Eu não sabia que você levou isso tão a sério. Foi erro meu te beijar, desculpa. — Meu coração leva mais uma facada.

— Foi erro meu me iludir. Relaxa isso passa rápido. — Minto.

Ele aproxima e me encara.

— Desculpa. — Sussurra. Ele estava se culpando.

— Jay, pare de se desculpar. Eu fui a otária nisso tudo, criei coisas em minha cabeça que nunca poderia se tornar realidade. Você só fez o que sempre faz, pegar mulheres e depois descartá-las. Eu que deveria ter tomado cuidado aqui. — Surto — E, não sou uma pessoa digna de despertar sentimento em alguém, qual é olha para mim. — Meus olhos lacrimejam ao falar da minha aparência. — Sou uma pessoa crua por dentro, não tenho qualidades, não tenho nada. — Paro e o vejo me encarar confuso. Alguém cala minha boca. Droga, por que me sinto tão à vontade com ele, sempre solto coisas que nunca falaria com ninguém mais. Ele é perigoso, tudo isso é.

Jay fica imóvel, sem nenhum movimento, a não ser por sua respiração pesada.

— Desculpa pelo meu momento de surto. Como falei, tenho problemas na cabeça. — Seco algumas lágrimas, desço do ringue, pego minhas coisas e vou embora. Isso já bastava para mim.


Décimo Sétimo Capítulo

— Que idiota! — Grita Megan no telefone, após eu ter contato tudo que aconteceu na academia. — Sky, cai fora. É um idiota mulherengo, sem noção, tudo de ruim.

— É, eu sei. Não sei como fui ser tão boba. — Sinto vontade de chorar, mas seguro com todas minhas forças. Já bastava ter que aguentar as pessoas falarem merda sobre minha mãe e, agora, me interessar por alguém que é muita areia para meu caminhãozinho. Considero isso como ter recebido a marca do demônio.

— E então, como vai ser agora? — Pergunta.

— Vou esquecê-lo, simples. Vou evitar a todo custo não me encontrar com ele. — Decido.

— É, amiga isso será um pouco complicado. Jay Simmons lembra? Esse cara está por todos os lados de Newton, a cidade ser pequena também não ajuda.

— Darei um jeito. — Falo.

— Então tudo bem.

Após toda a conversa, desligamos. Meu sonho de desenhar a academia em todos os ângulos possíveis terá que ser adiado, uma pena. Evitarei passar lá por um bom tempo, não quero encontrá-lo, talvez assim posso esquecê-lo. Nunca pensei que poderia me interessar por alguém assim, tão rápido. Nem Jimmy conseguiu alcançar isso. Não sei, Jay transmitia ser uma pessoa sozinha por dentro, uma pessoa que precisava de alguém para ocupar grande parte de sua alma. Sou assim também, pensei que podíamos ocupar o vazio um do outro. Mas isso pode ser da minha cabeça, talvez ele não seja assim.

— Pai! — Grito ao descer as escadas.

— Estou na cozinha! — Ele grita de volta.

Eu poderia filmar isso, meu pai cozinhando? Melhor cena da minha vida. Seu rosto se encontrava confuso ao olhar o livro de receitas.

— O macarrão vai junto com o molho? Não estou entendendo. — Ele coloca a colher no balcão e lê o livro mais uma vez.

— O que você está fazendo pai? — Sorrio.

— Macarrão ao molho branco. Bom, estou tentando. Filha ,vem aqui, vê se entende isso aqui. — Vou para o se lado e pego o livro de receitas. — O macarrão se faz junto com o molho?

— Pai, não. — Dou uma risada. — Você cozinha ele e faz o molho, depois joga o molho nele. — Não sei cozinhar, mas ao ler a receita não parecia ser tão difícil. A cena do meu pai confuso estava animando meu dia, fica tão fofo com um avental e com o rosto melado. Minha mãe adoraria ver isso.
— Posso saber o motivo do senhor estar cozinhando? — Pergunto me sentando no banco em frente ao balcão. Meu pai jogava os temperos um atrás do outro, senti que aquilo não irá dar certo.

— Estou com vontade de comer macarrão. — Não sinto firmeza em sua desculpa.

— Por que não pediu pra tia Betty? — Pergunto.

— Sua tia mal fica em casa, decidi eu mesmo fazer.

— Por que sinto a presença da Rose nesse seu motivo? — Sorrio. Meu pai fica calado, eu estava certa.

— O senhor está cozinhando pra Rose?

— Estou.— Ele encara o molho fervendo — Pareço um idiota, não?

— Não pai, você parece um fofo. — Dou uma risada e ele ri também. — Então, quer dizer que algo realmente está acontecendo entre vocês.

— Sim. — Ele suspira. — Sky, se achar que é errado, achar que estou trocando sua mãe...

— Não, pai. — Interrompo. — Já falei que quero te ver feliz. — O olho e ele sorri.

— Vou para a casa dela hoje, falei que iria cozinhar. — Ele faz um cara engraçada, sorrindo. — Tentei fazer com que ela me visse como o homem dos sonhos — Ele e eu rimos.

— Seja apenas você, pai. Você é um homem dos sonhos, te garanto. — Digo.

— Obrigada, filha. Te amo, princesa. — Sorri.

— Também te amo, pai. — Sorrio de volta. — Então quer dizer que, não voltará para casa essa noite?

— Voltarei, só que tarde. Tudo bem ficar sozinha? Não vai sair?

— Ficarei em casa hoje, não estou a fim de sair. Fica tranquilo, vou ficar bem.

— Quer que eu chame o Jimmy?

— Pai, não. O Jimmy não tem que cuidar de mim sempre.

— Tudo bem. Aqui vê se o macarrão está bom. — Ele me entrega o garfo com o macarrão enrolado.

— Está um pouco salgado. — Falo fazendo careta, sabia que aquele exagero com os temperos não ia dar certo.

— Merda.

— É só não por muito tempero, pai. — Rio — E não custa deixar ela te ajudar.

— Verdade, farei isso.


Meu pai sai dizendo que precisa comprar um vinho. Vejo que o encontro será bem romântico, sorrio ao imaginar a cena. Começo a limpar a bagunça, não o deixarei cozinhar mais em casa. Há molho branco caído nas portas do armário, sem contar a sujeira no fogão. Ligo minha caixa de som e a conecto no meu celular, escolho a música The Man Who Can’t Be Moved do The Script e começo a cantarolar. Então penso nele, meu coração dói ao pensar que nunca o terei, respiro fundo e volto a focar na limpeza.

Aproveito minha tarde para ler alguns livros passados pelos professores, anoto várias informações e dicas dadas pelos autores. Pratico algumas técnicas no papel.

A Solidão então começa a predominar, sinto uma angústia enorme no peito. Penso em como seria minha vida se nada daquilo tivesse acontecido, ter minha mãe aqui, viva e com aquele sorriso mágico no rosto. Conversar com ela, pedir conselhos, contar sobre minhas decepções amorosas, contar a ela sobre o Jay. Solto algumas lágrimas em silêncio, a vontade de não existir mais é o que ocupa cem por sento da minha vida nesse momento. Não posso pensar sim, não posso deixar isso dominar minha pequena felicidade. Limpo as lágrimas e balanço a cabeça a fim de afastar maus pensamentos.
Vamos viver, Sky.


Décimo Oitavo Capítulo

— Já vou indo, filha — Meu pai diz descendo as escadas — E aí, como estou? — Tento me virar no sofá e o vejo com uma blusa social verde escura e uma calça jeans preta.

— Está lindo, pai — Sorrio.

— Obrigado. — Sorri. — Vou deixar aqui um dinheiro, pede uma pizza.

— Ok, obrigada, pai.

— Bom preciso ir. — Ele vem até mim e me dá um beijo na bochecha. — Tchau, princesa. Não se esqueça de trancar a porta quando for dormir.

— Tudo bem, pai, pode deixar — Volto a olhar para a televisão.

Ele sai e tranca a porta. Perfeito, agora só sou eu e minha solidão. Vou até a geladeira e pego uma cerveja voltando para a sala em seguida. Aprecio o líquido rasgar minha garganta seca. Distraio-me com as cenas engraçadas da série Good Girls, a cada gargalhada meu humor melhorava. Faz tempo que não fazia isso, maratonar alguma série, com certeza voltarei a maratonar várias.

Sinto meus braços e pernas arrepiarem com o frio vindo da janela. Pauso a série, fecho a janela e vou lá para cima pegar alguma manta. Voltando em direção a escada escuto um barulho vindo de baixo, alguém está na sala. Fico imóvel e sinto o gelo em meu corpo. Cenas daquela noite vêm em minha mente. Enfim consigo me mexer e pego o celular no meu bolso. Droga, para quem eu ligo. Penso em ligar para Jimmy, até que meu celular começa a vibrar. Um número desconhecido. Volto de fininho para meu quarto e atendo.

— Alô. — Sussurro.

— Sky, sou eu. — A voz de Jay toma meus ouvidos. Meu coração começa a acelerar.

— Jay, me ajuda. Tem alguém aqui em casa, estou sozinha. N-não sei o que fazer. — Digo com a voz trêmula. Esqueci-me do plano de evitar ele, acredito não ser o melhor momento.

— O quê? Sky, calma! Me passa o endereço da sua casa, fica escondida. Estou indo. — Ele tenta me acalmar. Passo meu endereço e tranco minha porta. Meu coração vai sair do meu corpo a qualquer momento, o medo, o desespero tudo vindo à tona. E se for à pessoa que matou minha mãe? Sinto minha cicatriz fisgar. Não quero morrer, não agora. Procuro enxugar as lágrimas, abraço minhas pernas bem forte. Ouço outro barulho lá em baixo. Então meu celular volta a vibrar.

— Estou aqui, abra a janela.

Levanto-me e abro a janela da minha cama. Olho para fora e vejo Jay. Sinto um alívio ao vê-lo. Jay procura uma maneira de subir, ele começa a escalar, assim chegando na minha janela. Eu continuava tremendo, com certeza eu estava pálida.

— Está tudo bem. — Ele me abraça, sinto a proteção de seu corpo acalmar o meu — Fique aqui. — Ele logo se afasta.

— O que você vai fazer? — Sussurro.

— Vou lá em baixo — Ele tira então uma arma de dentro da sua camisa, fico espantada ao ver a cena. Ele anda armado? Lembro-me então quem é Jay, para a sua posição realmente se esperava isso.

Ele caminha em silencio e chega na escada. Fico em meu quarto procurando alguma solução se algo acontecer. O silêncio ocupa a casa toda, nenhum barulho, nem mesmo de passos.

— Está tudo limpo — Pulo ao ver Jay aparecer na porta e ele começa a rir. — Sou tão horrível assim? — Ele se aproxima. De horrível não tem nada. Eu continuava tremendo. Então sou tomada pelos seus braços.

— Está tudo bem, relaxa. — Encosto no seu ombro e libero todo o medo no choro. — Ei, ei está tudo bem, provavelmente foi o barulho do vento, a porta estava aberta, estou aqui não se preocupe. — Ele abraça mais forte. Largo-o e em seguida sento na minha cama, Jay se aproxima e agacha na minha frente. Ele enxuga minhas lágrimas e me olha preocupado.

— Obrigada. — Sussurro aos soluços. Jay deposita uma de suas mãos em meu rosto novamente e alisa minha bochecha. Procuro me acalmar com seu toque, como pode um homem conceber tanta proteção assim? Não consigo vê-lo como uma pessoa que todo mundo fala, como um ser humano frio, sem alma e perigoso. Ele não parece perigoso, não para mim.

— Está melhor agora? — Ele me encara e eu o olho.

— Sim, estou.

— Onde está seu pai?

— Ele saiu para um encontro, ele falou que ia chegar tarde, mas garanto que ele não virá para casa hoje.

— Então você vai ficar sozinha aqui?

— Vou.

— Não vou deixá-la sozinha aqui, Sky, olha sua situação. Duvido que vá conseguir dormir. Vamos para a academia.

— Não, não quero ir pra lá — Se eu voltar para aquele lugar não vou conseguir deixar de frequentar lá.

— Então ficarei aqui com você, até seu pai voltar. — Preciso evitá-lo e vou, mas pensando bem, nesse momento não quero ficar sozinha em casa. Autorizo balançando a cabeça.

— O que estava fazendo antes de ouvir o barulho?

— Estava assistindo uma série.

— Então vamos lá para baixo, vou assistir com você.

Não vou mentir, estava adorando tê-lo perto. Assistir uma série com Jay Simmons, isso realmente não passava na minha cabeça. Seu visual badboy não contradiz com assistir uma série de comédia. Devo colocar uma de terror, criminal, talvez? Não sei o que ele gosta de assistir, não quero ser um incômodo.

Sentamos no sofá, assusto ao vê-lo sentar tão próximo de mim. Noto que estou tão obcecada com ele, após surtar com a maneira dele de se sentar. Sua perna direita apoiava-se a seu joelho esquerdo, seus braços com suas tatuagens estavam amostra. Esse homem é um pecado. Por que tão sensual, Jay Simmons?

— Se quiser assistir outra coisa... — Tento dizer.

— Não, vamos ver esse mesmo. — Ele me interrompe. Dou play na série e tento me concentrar na história, mas estava sendo impossível. Só conseguia me concentrar em seu perfume e em quanto perto ele estava de mim. Que sensação ótima. Não vou mentir, por dentro eu estava louca, eu realmente queria estar envolvida em certas pegações com ele nesse exato momento.

Jay gargalhava junto comigo nas melhores cenas. Ele começa a elogiar o estilo do gangster na série. Concordo com todos os elogios feitos por ele, me apaixonei por esse personagem assim que vi. Obrigada vida, por me dar um estilo de homem tão inacessível. Jay abre seus braços e envolve um atrás do meu pescoço, apoiando sua mão no sofá. Nós se formam em meu estômago, pensei em deitar em seu peito, mas deixei para lá.

— Muito bom, minha barriga está doendo de tanto rir. — Ele diz, com a respiração ofegante por causa das risadas.

— Sim, preciso de outra temporada. — Digo. Na verdade, eu precisava rever, não consegui me concentrar em nada por causa da confusão que minha mente se encontrava.

— Ainda não saiu?

— Não.

— Que pena.

— Está com fome? — Pergunto.

— Sim, por quê? Vai cozinhar?

— Não sei cozinhar. Vou pedir uma pizza.

— Bem que eu não te imaginava cozinhando. — Ele ri.

— Sei cozinhar algumas coisas tá? — O olho irritada.

— Duvido.

Prefiro deixar para lá ao invés de discutir. Pedi a pizza, então comemos e bebemos cerveja juntos assistindo o filme Percy Jackson e o Ladrão de Raios, eu amo tudo naquele filme, já o vi várias vezes. E ver com Jay, então, com certeza iluminou minha noite horrenda. Durante o filme fiquei pensando o que poderíamos fazer depois, única ideia foi jogar cartas. Desligo a televisão e levo a caixa e as latas para a cozinha.

Jay parecia tudo, menos um líder de uma gangue. Por que será que ele escolheu ser isso? Ele é tão normal quando está comigo, principalmente essa noite. Queria saber como é o seu trabalho.

— Preciso pegar uma blusa de frio, estou congelando. — Vou para a escada e paro. Estava com medo de subir sozinha, mas como dizer isso a ele?

— Quer que eu vá com você? — Ele pergunta. Jay deve ter notado meu medo, obrigada Senhor.

— É... Se não te incomodar. — Solto um sorriso culpado.

— Vamos lá, medrosa. — Ele caminha até a escada. — Tem medo de fantasmas?

— Não. Fantasmas não fazem nada, tenho mais medo de pessoas vivas. — Digo e o vejo cerrar suas sobrancelhas.

Volto a tomar o caminho da escada e entro no meu quarto junto com Jay. Vou para o guarda roupa pegar a blusa, Jay para e olha os meus desenhos na parede.

— Seus desenhos são incríveis, Sky — Ele comenta.

— Obrigada — digo tímida. Jay então me olha e aproxima. Muito perto, muito perto! Droga.

— Aquilo que disse na academia, não é verdade.

— O quê? — Pisco os olhos confusos.

— Sobre você não ser digna de despertar sentimentos em alguém. — Ele para. — Sobre não ter qualidades, sobre sua aparência... — Continua.

— Jay, não vamos falar sobre isso...

— Eu te acho linda, Sky. — Ele me interrompe e o olho assustada. — Você não tem noção da pessoa que é, do que faz as outras sentirem. Te acho tão perfeita e isso em pouco tempo que nos conhecemos.

— O que você quer dizer com isso? — Pergunto.

— Quero que você não se odeie tanto. Não quero que seja igual a mim. — Igual a ele? Ele se odeia? Mas, por quê?

— Jay... — Não sei o que falar.

— Não. — Sussurra e se aproxima. — Você não sabe o quanto me deixa louco, Sky. — Jay chega mais perto dos meus lábios. Ele os encarava como um leão faminto ao localizar sua presa. E lá vamos nós mais uma vez. Por que não consigo afastá-lo? Que merda, Sky!

— Jay... — Tento falar, mas logo seus lábios carnudos ocupam os meus. Jay os devora como um animal faminto. Uma de suas mãos se encontra em minha cintura, pressionando para mais perto de seu corpo. Meu corpo parecia amolecer e ser apenas sustentado pelas suas enormes mãos. Era como se eu estivesse anestesiada, com apenas um beijo.

Levo minhas mãos trêmulas para seu pescoço, trazendo-o mais para mim. Seu gosto, seu cheiro, seus movimentos, tudo é tão incrível! Ele então me vira, nossos corpos grudados são jogados na cama. Abro minhas pernas ao sentir sua pélvis comprimir a minha. Não podíamos parar, não quero parar, me encontro no último estado da excitação. Eu precisava dele, urgente.

Jay interrompe o beijo trilhando seus lábios em meu pescoço. A cada toque, minha respiração acelerava. Ele continua a trilhar, parando perto dos meus seios. Seu nariz os toca e uma explosão de tesão acontece, Jay então dá uma mordida de leve em um dos mamilos marcados na blusa, fazendo-o endurecer naquele exato momento. Então ele volta para meu pescoço, assim chegando até meus lábios. Outro beijo se forma, sua língua enrola na minha fazendo minha cabeça girar mais e mais. Uma de suas mãos alisa minha barriga e vai para debaixo da minha blusa em seguida, me arrepiando a cada segundo. Sua mão toca meu seio direito gentilmente, massageando levemente enquanto nossas línguas dançam na mesma sincronia. Jay afasta sua mão e volta a beijar meu pescoço fazendo movimentos com sua pélvis, então com uma de suas mãos, ele puxa minha manga esquerda para baixo. Lembro-me da maldita cicatriz, ele não pode ver aquilo. Nunca. O empurro.

— Desculpa, não posso. — Digo ofegante tentando me levantar da cama.

— Te machuquei? — Jay pergunta preocupado.

— Não, é só que... — Me perco nas palavras. Meu coração e minha cabeça girando não me ajudavam a procurar as palavras certas.

— É só o que Sky? Você é virgem? — Ele me encara.

— Não, não sou. É só que... Eu não consigo, desculpe. — Digo e sem seguida saio do meu quarto indo para a escada.

— Espera! — Jay grita interrompendo-me de descer. — Desculpa apressar as coisas, vamos apenas esquecer isso. — Por que para ele é tão fácil de esquecer tudo que acontece com a gente? Balanço a cabeça como sim, não estava com vontade de discutir.

— Ótimo. Por que não vai descansar um pouco, está tarde. Seus olhos parecem pesados, ficarei do seu lado. Não se preocupe, não farei nada com você. — Ele diz me puxando de volta para meu quarto.

Eu realmente estava com sono e para piorar meu corpo ainda estava mole por todas as sensações que Jay me fez passar. Deito-me e Jay se deita ao meu lado. Estar tão próxima a ele em uma cama me deixava mais nervosa, e aquele silêncio piorava as coisas.

— Como conseguiu meu número? — Tento quebrar o silêncio.

— Tenho minhas manhas, Sky. — Diz.

— Devo me preocupar com essas “manhas”? — O encaro.

— Não e nem ouse perguntar, isso envolve meu trabalho.

— Ok. — Gostaria muito de saber como ele conseguiu, mas não vou me meter mais nisso. Preciso seguir com o plano de esquecê-lo, hoje vacilei, não posso deixar mais isso acontecer.

Viro-me de costas para ele.

— Boa noite, linda. — Sua voz grossa soa em quase um sussurro.

— Boa noite. — Respondo.

A sensação de tê-lo ao meu lado era maravilhosa. Queria poder estar abraçada com ele. Como eu queria que tudo fosse tão fácil para nós dois.


Décimo Nono Capítulo

— Filha? — Ouço a voz do meu pai e abro os olhos. Lembro-me então de Jay, levanto em um pulo e vejo que ele não está. Não sei o que aconteceria se meu pai o visse aqui.

— Bom dia. — Meu pai se aproxima e senta ao meu lado.

— Bom dia. — Respondo ajeitando meus cachos bagunçados.

— Dormindo até essa hora? Aconteceu alguma coisa? — Pergunta.

— Dormi tarde. pai.

— Por que sua janela está aberta? Não sabe que é perigoso?

— Eu esqueci de fechar. — Jay deve ter saído por ali, mas que horas ele saiu?

— Quer um remédio para ressaca? — Meu pai se levanta e abre a cortina.

— Ressaca? — Pergunto confusa.

— Sim, acredito que esteja depois de beber várias latas de cerveja. E filha, como conseguiu comer uma pizza inteira sozinha? — Droga, como vou explicar isso?

— Estava com bastante fome. — Solto e sorrio.

— É. tenho medo de você começar a comer desse jeito, altos prejuízos.

Eu estava louca com tantas perguntas, meu corpo estava acordado, mas minha alma com certeza estava dormindo.

— E o senhor, está voltando para casa a essa hora? Não sou eu quem deveria te encher de perguntas Sr. Owens? — Cruzo meus braços. Nem sei que horas são, mas pelo que meu pai falou, deve ser tarde.

— Ok, você ganhou. Vá se lavar. — Me levanto cambaleando. — Sua tia ligou ontem?

— Não.

— Meu Deus, onde essa mulher se meteu. Depois desce, eu trouxe comida para você. — Ele grita saindo do quarto.

Olho meu celular entes de ir ao banheiro. Meu Deus eu dormi até 15:00, tudo bem que fui dormir umas 4:00 da manhã, mas perder quase o dia todo dormindo não fazia parte do meu plano. Respondo algumas mensagens de Tina e vou para meu banho. Desço e como a comida que meu pai fez, acredito que não sozinho. Rose deve ter colocado o dedo, com certeza. Irei aproveitar o resto do dia para relaxar, pois mais uma semana cansativa de faculdade estava prestes a vir. Ter que focar nos estudos exige bastante da minha pouca energia que sobrara, pois meu passado e agora minha vida amorosa só ajudam a ferrar cada vez mais minha vida.

Na hora de dormir, olho para o número desconhecido inúmeras vezes pensando se salvo nos contatos ou não. Ter o número de Jay salvo me deixava mais ansiosa, mas minha mente toma a decisão de não salvar por proteção. Eu preciso esquecê-lo, está na cara que não daríamos certo.


Algumas semanas sem ir para a academia, algumas semanas sem Jay Simmons. O medo de ele aparecer na minha frente era grande, mas a decepção dele não ter aparecido gritava mais. Ou seja, sou otária. Todas as noites eu lembrava do seu cheiro, do seu toque, de tudo. Parece que me afastar está me atraindo mais para ele, como me livro disso? O pior é ficar com sua voz grudada na cabeça dizendo “gosto de você, Sky”, “te acho perfeita”, “você me deixa louco”, “não podemos ter o que você quer”. Eu realmente não o entendia. Para que falar todas essas coisas e depois agir como se não quisesse nada? Será que sou muito iludida? Estou odiando tudo isso.

— Vai fazer o que nesse final de semana? — Megan pergunta.

— Não sei, talvez adiantar alguns trabalhos. — Respondo guardando meu caderno.

— Não vai ver o Jimmy jogar no sábado? — Pergunta. Meu Deus o Jimmy, depois daquilo no campo, ficamos esse tempo todo sem se falar. Fui muito ignorante com ele? Tudo bem que ele passou dos limites, mas será que peguei pesado?

— Não sei, não falei com ele.

— Vocês dois? Sem se falar? Sky, aconteceu alguma coisa?

— Não, cada um estava ocupado, apenas isso. — Como vou dizer para ela que ele tentou me beijar, não posso. Não quero magoá-la.

— Estranho isso.

— Achei que não ia ficar mais atrás dele. — Encaro culpando-a.

— Sou uma idiota, não? — Ela suspira.

— Somos duas idiotas.

— Foi atrás do Jay?

— Acredita que não? Mas o cretino não sai da minha cabeça, não importa o quanto eu tente.

— Nossa, amiga, está realmente envolvida nele. — Ela cerra seus olhos.

— O pior é que fiquei mal por ele não ter me procurado. Não sei, é uma confusão. Uma hora quero afastá-lo e na outra não.

— Entendo bem isso. Quando me contou de vocês dois na sua casa, achei que iam dar um jeito.

— Não quero ficar pegando ele sem ter nada sabe? Ele parece querer isso. Parece não querer uma relação séria comigo, apenas pegação, não sei explicar. Não posso culpá-lo, quem iria querer algo comigo? Ainda mais um cara como ele...

— Famoso Jay Simmons amiga. E para de besteira, você é linda e tem um caráter incrível, além de um talento de dar inveja.

— Obrigada — Sorrio. Isso me machuca, soube desde o início que ele não se envolvia com ninguém, apenas comia mulheres e depois descartava. Aonde que fui me meter? Não sei, me comparando com suas peguetes, não sou nada. Se elas com aquela beleza toda não conseguem algo sério com ele, quem dirá eu.

— Opa, estão falando do Jay Simmons... Qual é a bomba? — Tina aparece nos assustando.

— Nada. Vamos, você não falou que não queria comprar aquela blusa? A loja vai fechar, estamos atrasadas. — Megan pega Tina pelo braço e a puxa. — Tchau, Sky, nos falamos depois.
— Ei, espera! — Tina grita confusa. Eu quero contar para ela sobre tudo, mas não agora. Pelo o que Megan me falou, Tina iria tentar dar uma de cupido e isso atrapalharia tudo. Até que gostaria de uma ajudinha, mas não quero forçar nada.

Ficar até tarde na faculdade me estressava, volto para casa e tomo um banho. Não ir à academia estava me matando, eu preciso sair de casa, preciso procurar outro local para passar o tempo. Dói em pensar nos meus desenhos incompletos dela, preciso focar em desenhar outra coisa, não sei.

Pego minhas coisas e saio, a uns 20 minutos de casa, vejo um parque. Crianças brincavam nos brinquedos, não imaginaria ter tantas as cinco da tarde, era uma gritaria sem fim. Sento-me em um banco e olho para um edifício em frente, decido então desenhá-lo. Coloco meus fones com a intenção de não ouvir as gritarias e começo a desenhar o esboço.

Percebo que o céu está prestes a escurecer, o vento começou a ficar forte, decido então me preparar para ir para casa. Guardo minhas coisas na mochila e sinto uma presença.

— Sky, certo? — Uma voz masculina quebra meu pequeno silêncio. Ao virar-me vejo Ethan, sinto meu sangue esfriar.

— S-Sim — engulo seco.

— Lembra de mim? — Ele levanta uma de suas sobrancelhas.

— Ethan, certo?

— Isso. — Ele sorri. E que sorriso, meu Deus. O que acontece com os homens dessa cidade? Jimmy, Jay e agora Ethan... Três deuses abençoados.

— O que está fazendo aqui a essa hora? — Ele continua.

— Desenhando.

— Desenhando? Posso ver? — Pergunta e assento com a cabeça, pego meu caderno e o entrego.

— Minha nossa, é aquele edifício? Tenho que dizer que isso está muito bom. — Sorri impressionado.

— Obrigada.

— Sabe, eu tinha uma irmã que adorava desenhar, ela chegava a desenhar tudo que está sob sua vista, passava o dia inteiro desenhando.

— Legal. Mas espera... tinha? — Estava com medo da resposta que viria.

— Sim, tinha. Ela morreu faz cinco anos.

— Quantos anos ela tinha? — Tento evitar minha curiosidade de querer saber como ela morreu.

— 13 anos, — Ele encara meu caderno.

— Sinto muito. — Encaro sua expressão.

— Tudo bem, infelizmente a vida é assim. — Ele dá um sorriso amargo e me entrega o caderno pressionando até sua mão tremer. Achei isso estranho.

Por que os caras do Jay perguntavam tanto sobre Ethan? Ele parece ser um cara tão legal. Queria entender o motivo de Jay odiá-lo tanto. Preparo para me despedir de Ethan, estava escurecendo.

— Bom, já vou indo. — Levanto-me.

— Posso te levar para casa, é perigoso andar por aí sozinha e está escurecendo.

— Se não for muito incômodo...

— Lógico que não. — Ele me interrompe.

Sigo o caminho para casa e Ethan me acompanha.

— Então, você desenha há quanto tempo? — Ele quebra o silêncio.

— Desde pequena, acho. Minha mãe era pintora, acredito que herdei um pouco do seu dom, mesmo não tendo o mesmo talento magnífico dela. — Reviro os olhos e Ethan ri.

— Era? Ela não é mais? — Ethan pergunta e sinto uma pontada no peito.

— Sim, morreu quando eu tinha 17 anos.

— Sinto muito.

— Não, tudo bem. — Sorrio. — Como você disse, infelizmente, a vida é assim.

— Sim — Ele ri. — Às vezes eu queria ter trocado de lugar com minha irmã, sabe? Ela tinha sonhos, sonhava em construir uma escola de artes, viajar pelo mundo e ajudar a natureza. Mas por conta de pessoas ruins, somos obrigados a sofrer e aturar a perda de uma pessoa que amamos. — Ethan trinca seu maxilar ao falar.

“Pessoas ruins”? O que será que aconteceu com a irmã dele? Opto por não perguntar.

— Sim, acho a vida muito injusta. Há pessoas que nem mereciam morrer e infelizmente isso acontece bem com elas.

— No caso, sua mãe, não? — Ele pergunta e eu balanço a cabeça com um sim prestes a derramar uma lágrima. Pensar o quanto minha mãe era boa e não merecia morrer daquela forma apertava cada vez meu peito.

— Somos mais parecidos do que eu imaginava. Não sei, nós dois perdemos alguém que amamos. Digo, conseguimos entender a dor do outro.

— Sim — alinho meus lábios em um sorriso assentido.

Paramos ao ver viaturas em frente a uma casa. Meu estômago começa a embrulhar. Alguns vizinhos se encontravam cochichando, outros choravam. Eu e Ethan então nos aproximamos calmamente.

— O que aconteceu aqui? — Ethan pergunta a uma mulher abraçada com uma criança pequena.

— Um casal foi assassinado brutalmente.

— Como assim? Pegaram o assassino? — Ethan pergunta.

— Não, infelizmente não. Penso na filha deles, a coitada viu toda a cena, só não foi morta porque alguns vizinhos arrebentaram a porta da casa para tentar ajudar. Uma barbaridade fazer isso na frente de uma criança de apenas oito anos, mesma idade que minha pequena aqui. — Ela abraça mais forte sua filha.

Sinto o chão ficar mais fundo, perco meu equilíbrio e caio no chão. Lágrimas caem sem minha permissão. Parecia a mesma cena, só que vista por fora da casa. Então é assim que todos viram aquilo acontecer na minha casa? Não acredito que o que aconteceu com minha família, acabou de acontecer com outra. Aquela criança passará por toda luta psicológica que nem eu passei? Ela tem apenas oito anos, meu Deus.

— Sky? Está tudo bem? — Ethan grita segurando meu braço com uma expressão confusa, a mulher tenta me ajudar também. Não sinto minhas pernas, me desespero com a falta de ar. Alguns flashes tomam minha visão, sinto minha cicatriz latejar, a dor da lâmina encostando vem à tona. Os olhos sem vida da minha mãe me encaram, meu pai caído sem responder nenhuma palavra. Sentia-me sozinha e em perigo, minhas lágrimas não param.

— Srta. Owens? — Vejo um policial vir em minha direção.

— Owens? — Ethan me encara assustado.

— Vamos levar ela para a viatura. Tragam-me uma garrafa de água. — Sinto o oficial me carregar junto com Ethan.


Continua...



Nota da autora: Olá amores, quero que saibam que estou lendo todos os comentários, sou muito grata a todos que estão lendo minha fanfic. E se você está lendo essa fanfic sem comentar, por favor deixe um comentário aqui em baixo, isso me ajuda e me incentiva muito a continuar a história.Essa é minha primeira escrita, estou tendo uma ótima experiência com ela, então espero que deem muito amor a Lost Souls. Me sigam no insta @nandacarolineb para ficar por dentro das atualizações, beijos.



Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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