Capítulo Único
mirou a xícara em suas mãos com desgosto. O café solúvel era simplesmente horrível, mas era sua única opção no momento, uma vez que a máquina expressa havia parado de funcionar. Já fazia um longo tempo que a cafeína não tinha mais o efeito energizante sobre seu corpo, ela tomava pelo simples prazer e pelo sentimento de acolhimento que a bebida quente lhe trazia.
Deu o primeiro gole e tentou controlar a careta, ato que foi em vão. Deu alguns passos até chegar próxima da entrada do quarto que dividia com uma pesquisadora chamada Maddie, posicionou uma das mãos sobre o calendário que ficava atrás da porta e ficou encarando o papel por longos segundos. Quando acordou do transe, pegou sua caneta vermelha e fez um “X” na data atual, suspirando pesadamente. Mais um dia e seria Natal.
E ela não fazia ideia de como seria.
Não apenas por esse ser seu primeiro feriado longe do aconchego daqueles que amava, mas também por estar em uma estação de pesquisa nos glaciares do Alasca, ou seja, no meio do nada no Parque Nacional Glacier Bay.
Sem domínio de seus próprios pensamentos, as lembranças dos natais compartilhados com invadiram sua mente. Os olhos arderam, o peito apertou, e através de um longo gole no café, ela tentou fazer todas essas emoções se dissiparem, ato que foi em vão. Enquanto sentia o líquido descer pela garganta, apenas ficou parada ali. A xícara esquentava a palma de suas mãos e quem olhasse de fora poderia pensar que ela estava encarando o calendário e fazendo planos, mas a realidade era bem diferente. Estava tão imersa em sua melancolia repentina que não percebeu o barulho dos passos da colega no corredor, informando que ela se aproximava.
— Bom dia! - Maddie abriu a porta com tudo, fazendo a xícara e o líquido preto voarem pelo ambiente.
— Caramba! Que susto! - Espalmou a mão sobre o coração, tentando acalmá-lo. — Ai, me desculpa! Mas o que você estava fazendo parada atrás da porta? - A outra não sabia se continuava se desculpando ou dava risada da situação inusitada.
— Estava tentando acordar. - Mentiu. Não sentia vontade de estourar a bolha de tristeza que a envolvia naquele momento para compartilhá-la com o mundo. - Agora eu estou mais que acordada. – Declarou, rindo.
— Me sinto culpada, então vou te ajudar a limpar correndo, porque em breve estaremos atrasadas. - Maddie riu e saiu em busca dos itens de limpeza.
❄️❄️❄️❄️❄️
— Será que seria pedir muito para que o tempo nos ajudasse pelo menos hoje? Já é complicado adentrar no fiorde* em dia de clima bom, hoje vai ser quase impossível... Poxa vida. - A oceanógrafa bufou, frustrada e irritada.
— Um reflexo do seu humor hoje, né? - Charlie, um dos glaciólogos, disparou. Eles eram conhecidos de longa data e não deixou passar despercebido o estado de espírito da mais nova, que costumava ser sempre alegre e falante.
— Ah, vê se me erra, Ewald! - Frisou bem o nome do meio do rapaz, pois sabia que ele odiava e queria irritá-lo um pouquinho. sorriu ao ver a expressão na face dele.
— Esse foi um golpe bem baixo, mas pelo menos você está sorrindo. deixou de lado a caderneta de anotações e aproximou-se de Charlie. Eles não eram exatamente amigos, mas se conheciam bem mais do que normalmente os colegas se conhecem. Já haviam realizados outros estudos juntos, além de saírem juntos sempre que conseguiam se encontrar em Seattle, onde ela residia.
— Desculpe pela falta de humor. - Riu fraco. - É que… - Desviou o olhar para o lado antes de prosseguir. — Esse é o primeiro 25 de dezembro que vou passar sem o . A verdade é que eu já estava sem ele desde que aceitei essa missão. - Admitir em voz alta fazia a saudade ser ainda mais real e aquilo a machucava de maneira dilacerante. — Eu vi que a aliança havia sumido, mas pensei que fosse para não perdê-la no meio da geleira. - fez uma careta engraçada ao ouvir esse comentário e imaginar que ela realmente era capaz de fazer algo do tipo. Agradeceu mentalmente por ter Charlie a bordo do MV Stellar naquela pesquisa com ela, os comentários dele sempre a faziam rir. — Vocês sempre foram aquele tipo de casal, sabe? O tipo perfeito. Não consigo acreditar... Como assim? — Ele declarou, visivelmente surpreso.
Meses Antes…
— Isso é um sonho! - cobriu a boca com as mãos, olhos vidrados na tela do computador enquanto relia pela terceira vez o e-mail mais importante da sua vida. O coração estava aos pulos, as mãos suavam frio, sentia-se presa dentro de um furacão de emoções e que não conseguia definir qual lhe atingia mais forte.
Lá estava a aprovação tão esperada e que traria sentido para sua carreira. Uma nova fase da sua vida estava bem diante de si, braços abertos apenas esperando pela sua chegada.
O desejo de gritar para todos ouvirem, arrancar do peito toda a alegria que começou a fervilhar enquanto a ficha caía.
iria para o Alasca.
A urgência de compartilhar aquela alegria foi tão imensa que saiu do quarto aos tropeços, parando no batente da cozinha ao encontrar preparando um sanduíche.
— Amor! - Chamou-o, desesperada. No mesmo instante, ele olhou-a, preocupado ao ver seu rosto.
— Aconteceu alguma coisa? - Limpou as mãos no pano de prato e ignorou o pão que cortava.
— Sim! – Soltou, enérgica. Riu e se jogou em direção a ele. Apertou-o com força, o riso escapando sem controle.
Ela estava feliz e nada seria capaz de estragar sua alegria.
— O quê? – Questionou, risonho, abandonando a preocupação ao ser pego pelo gesto desprevenido. Depositou um beijo nos cabelos da mulher enquanto a tinha em seus braços.
— Lembra o projeto de pesquisa do Alasca que você me incentivou a participar? - Ela saiu do abraço e descansou as mãos nas bochechas, tinha um sorriso enorme. - Eu fui aceita. - Lançou-se novamente nos braços dele. - Muito obrigada! Eu te amo muito! - fechou os olhos e depositou um beijo no ombro em que descansava o queixo.
A falta de reação do noivo chamou a atenção da oceanógrafa, que libertou-o de seu agarro para que pudesse olhá-lo diretamente, e o que viu em seu rosto fez seu coração partir-se em milhares de pedaços. Estava surpresa e decepcionada pela reação de ao receber a notícia mais importante da sua vida.
— Não faz sentido! - Ela soltou com um sorriso irônico, as palmas para o alto num gesto de frustração.
Ouviu-o suspirar, desanimado, e bagunçar o cabelo com uma das mãos, reconheceu que compartilhava o mesmo sentimento que ela.
— É difícil explicar… - Bufou, desolado, e encarou o chão por alguns segundos, voltando a encará-la. - Você é o meu orgulho como mulher, profissional. Tem um potencial enorme. - começou a listar com os dedos. — Dedicada ao extremo, busca sempre um sentido para o seu trabalho, e não desiste fácil do que quer. E eu a admiro muito, acredito que o céu é o limite para você, mas…
— Mas o quê? - A voz estava triste, os olhos marejados pelas palavras do homem e pelo o que estava por vir.
— Mas eu não quero que você vá para o Alasca. – Deu de ombros enquanto as mãos caíam ao lado do corpo.
Ela riu sem qualquer humor, uma das mãos tocou a própria testa.
— , você está brincando comigo? Por que se estiver…
— Quem dera fosse uma brincadeira, . — suspirou, desolado.
— Você deve ter enlouquecido ou está tirando uma com a minha cara! – Falou, irritada. - Quem me incentivou a me inscrever foi você! - Apontou o dedo indicador em direção a ele. - Você sabia o tempo todo que eu teria que passar dois anos longe. – continuou, gesticulando nervosamente. — A não ser… - A boca abriu levemente, os olhos arregalados com a compreensão que atingia sua mente. - A não ser que você acreditava ser impossível que eu fosse escolhida. - As lágrimas encheram os seus olhos.
No mesmo instante, pareceu reagir negativamente, mas desistiu e desviou o olhar para o chão, uma dolorosa confirmação para a mulher.
— Eu não esperava isso de você. - Cobriu a boca com a mão e permitiu que algumas lágrimas escapassem, mas secou-as rapidamente. - Realmente não esperava.
E aquela foi a última vez que esteve frente a frente com o noivo. Horas depois, ele havia saído do apartamento que dividiam sem dizer uma palavra, e não seria ela que iria atrás dele.
— Caramba, ! Não imaginava que você tinha enfrentado uma barra pesada como essa! — Charlie sorriu tristemente e deu um tapinha reconfortante no ombro da mulher. — Enquanto a Becky quase dançou de alegria ao saber que eu ficaria dois anos longe. — Bufou, indignado, mas sorriu, zombeteiro.
A oceanógrafa riu da tentativa do amigo em animá-la e sentiu-se grata, pois não aguentaria ouvir qualquer conselho. Afinal, o silêncio do noivo deixava subentendido que haviam terminado o relacionamento.
— Qual será o cardápio da nossa ceia? - ela perguntou, mudando de assunto enquanto anotava uma nova informação em seu caderno.
❄️❄️❄️❄️❄️
Sentada na cama com as pernas pendendo para fora, balançava os pés em movimentos incessantes para cima e para baixo. Já era sua terceira tentativa de conversar com a família através de um rádio VHF*. Sem sucesso. A equipe era razoavelmente grande e eles tinham de revezar a utilização do aparelho. Felizmente sua vez finalmente havia chegado após um longo dia de trabalho no barco, mas ela não estava tendo sorte.
— Eu avisei que deveríamos optar pelo UHF*. - disse para si mesma. Respirou fundo e tentou o êxito na quarta tentativa.
— Oi, filha! - A voz do pai preencheu o cômodo e ela automaticamente sorriu. Escutou o homem chamando pela esposa, que logo estava cumprimentando a filha também.
— Que saudade de vocês! - Declarou. - Como estão?
— Tirando a falta que estamos sentindo de você, está tudo bem. - A mãe respondeu. - E você, pequena?
— Tirando isso e o cansaço, tudo ótimo. Os turnos de 12 horas no barco não são fáceis, mas valem a pena. - Os pais não podiam vê-la, mas pelo tom de voz sabiam que ela estava sorrindo. Ela havia lutado muito por aquela chance e eles estavam felizes e orgulhosos por ela.
— E você já viu algum urso polar?
— Papai! - Antes de continuar a falar, ela riu, sabendo que o pai apenas estava se divertindo. - Você sabe que aqui apenas temos os ursos pardos e os negros. - E sim, caso eu veja algum, vou tirar fotos para você… Se eu não desmaiar, mesmo de longe. — Sussurrou a última parte e os pais caíram na gargalhada.
— Deu sorte com a equipe, filha? — A senhora perguntou algo que há tempos atiçava sua curiosidade, mas que ainda não havia tido tempo de questionar nas chamadas anteriores, uma vez que eles recém estavam se entrosando e o tempo de conversa entre eles era escasso e precioso, preferindo focar em escutar a filha do que fazer questionamentos aleatórios.
— Nossa, muita! São todos muito profissionais, sem exceção. Eu divido o quarto com a Maddie, ela também é oceanógrafa. A cada dia que passa ela fica mais engraçada e organizada, então meu TOC passa bem. - Riram. - E com a adição do Charlie ao trio, a diversão é sempre garantida. — Aquela era a maior verdade, pois não havia tempo ruim com ele, que acabava por contagiar as outras duas.
— Que bom, meu amor! Você não imagina o quanto me tranquiliza saber que está ao redor de pessoas boas. - O tom materno deixou o coração da jovem apertado de saudade.
Talvez tenha sido a data em si. Era sua época favorita do ano desde muito nova, gostava de estar com toda a família, fazer uma maratona de filmes natalinos, tomar bastante chocolate quente com marshmallow e jogar muitos jogos de tabuleiro, vestindo um suéter idêntico ao dos pais. Depois que conheceu e esse tornou-se um integrante da família, foi obrigado a aderir a tradição e passou a vestir o mesmo figurino que os sogros e a noiva. Essas lembranças deixaram o seu coração mole o suficiente para fazer com que aquela pergunta escapasse dos seus lábios.
— Mãe, o deu notícias? – Soltou, com a voz tímida, preocupada com a reação de seus pais, afinal, sabiam de toda a confusão e ficaram extremamente magoados com o rumo do relacionamento da única filha.
— Mãe? Pai? - Chamou-os, conferiu se o aparelho estava realmente ligado e não sabia por que o fez, pois conseguia ouvir sussurros longe da linha. — Tudo bem, sei que estou sendo fraca em querer saber do cara que eu acreditei que me amava e que era o homem da minha vida. - Deu de ombros, resignada, mesmo que os pais não estivessem vendo.
Não gostava de preocupar o casal, mas desde criança sempre teve um relacionamento com um diálogo transparente. Eles sempre se mostraram preocupados e abertos a ouvir, aconselhar sem qualquer tipo de julgamento, mas sem abandonar o papel de responsáveis por ela. Todos esses meses tentou se manter forte, não queria preocupá-los, mas sentia falta de dividir a sua vida com eles, por isso não conseguiu evitar continuar.
— Ele me machucou muito, muito, muito, mas como é possível que ainda não superei esse amor? - Soltou um suspiro, os olhos marejados. - Será que ele não se arrepende de ter desistido de mim? De nós? - A voz rouca de emoção. - Me desculpa, mãe. - A voz chorosa. - Me desculpa, pai. Eu acho que é culpa do Natal. - Riu.
— Minha filha, eu só queria poder te abraçar nesse momento. - A mais velha falou, emotiva. - Eu te amo. - Tentou transmitir com toda força pelo tom de voz.
— Nós... - Corrigiu o pai. - Te amamos.
riu enquanto secava algumas lágrimas com a manga do suéter.
— Nem tudo são flores quando se trata do amor. - O pai suspirou. - Não foi justo o que o causou a vocês, mas talvez fosse preciso algo assim acontecer para que ele amadurecesse como pessoa e revisse os próprios conceitos.
A filha riu, surpresa.
— Então o senhor não quer mais matá-lo? – Perguntou, surpresa e confusa com a situação. - Ele conversou com vocês? - Desconfiou.
Ouviu o suspiro da mãe.
— Não vou mentir para você, ele esteve aqui, meses depois que você partiu.
— E não me contaram, por quê? – Perguntou, magoada. - Nunca escondi nada de vocês.
Ouviu a gargalhada do pai ao fundo.
— E aquela vez que você cabulou aula com as suas amigas para ir ao cinema? - O homem lembrou, divertido.
Ela cobriu o rosto com a mão livre e riu, esquecendo um pouco a chateação que deveria demonstrar.
— Foi só essa vez.
— Aham, eu sei. - Ironizou.
Ambos riram.
— Eu amo vocês. - Ela falou emotivamente, deixando de lado o assunto .
— Nós também, querida. Nós também. - A mãe garantiu.
— Um beijo e Feliz Natal. - Desligou a ligação e encarou o aparelho em sua mão. Queria estar nos braços de sua família, mas sabia que precisava encarar aquela distância e a nova fase que estava vivendo para amadurecer, aprender a lidar com os sentimentos que dominavam. Não conseguiu evitar pensar que o ex-noivo havia visitado seus pais, e pelo visto, feito as pazes com eles. A única dúvida e indignação que ficava era: MAS E ELA? Ele não lhe deve um pedido de desculpas?
❄️❄️❄️❄️❄️
— Pode entrar, Maddie! Já acabei a ligação. - Falou ao ouvir uma batida na porta do dormitório que dividia com a oceanógrafa. Secou rapidamente as lágrimas com as mãos e respirou fundo. Quando ergueu-se da cama, a porta abriu e os seus olhos quase pularam das órbitas, a voz ficou presa na garganta, o coração começou a martelar no peito, quase prestes a matá-la de um enfarto. Ela não conseguiu soltar uma palavra, a pergunta rondava sua mente. Era como se realmente um gato tivesse comido a sua língua, o choque em vê-lo em carne e osso. Impossível que o homem tivesse saído de Seattle para se desculpar com ela. Se não estivesse tão nervosa, teria rido.
continuava muito bonito, mas diferente de suas memórias. O cabelo castanho estava mais comprido e, provavelmente, bagunçado pelo vento gelado lá de fora. O rosto mais arredondado do que antes. Vestia um enorme agasalho verde musgo com capuz e uma touca por baixo, uma calça de tecido grosso combinando, mas estava de meias pretas ali dentro. Maddie ou qualquer pessoa, não deixaria que entrassem na base de calçados.
Encaravam um ao outro em silêncio, uma expressão de surpresa, e outra com a mais sincera expectativa.
Finalmente, engoliu em seco mais calma e falou, forçando a voz a parecer controlada, livre do furacão de emoções:
— O que está fazendo aqui, ?
Ele não respondeu imediatamente, assumiu uma postura de falso controle e que quase causou inveja na mulher, pois a mão trêmula que abria o zíper de uma mochila, entregou o verdadeiro estado de espírito do ex. Não iria amolecer o coração tão fácil, mas ver o quanto ele estava desestabilizado, assim como ela, mexeu um pouco.
O homem puxou algo de dentro da mochila e chamou a atenção da jovem, um tecido verde musgo que estendeu em sua direção e deu de ombros.
— Vim te devolver o seu suéter. — Deu de ombros novamente, a expressão mais neutra do mundo. — É Natal e sei o quanto é importante para você.
Os olhos de viajavam entre a peça nas mãos de e o rosto dele. Ela não sabia como reagir naquele momento, então seu corpo entrou no automático e ela reagiu da mesma forma que sempre fazia em situações fora de sua zona de conforto: ela riu. Ainda não havia descoberto se o riso era motivado pela incredulidade do gesto ou pela capacidade dele em agir como se os últimos meses separados não tivessem existido e estivesse tudo bem entre eles, o que obviamente não era o caso.
— Obrigada, eu acho. - Ela se pronunciou ao tomar o suéter para si, sentindo o cheiro de casa invadir suas narinas. Havia tanta coisa a ser dita, entalada em sua garganta, que ela tinha medo de começar e nunca mais parar. Por isso, optou por seguir o conselho da mãe e manter-se calma, pelo menos no lado externo, já que seu interior estava uma completa bagunça.
Os meses afastados não foram suficientes para que eles se tornassem completos estranhos. Muitas coisas haviam mudado, mas o conhecimento essencial permanecia ali. Observando-a, notou que, apesar de se manter distante, ela aparentava estar mais receosa do que ele próprio. Já que ele havia viajado todos aqueles quilômetros para vê-la, cumpriu sua obrigação de ser o primeiro a falar.
— Eu não sei se ainda tenho o direito de te chamar assim, mas irei fazê-lo. … - o coração da mulher apertou ao ouvi-lo pronunciar aquela frase e completando-a com o apelido pelo qual todos a chamavam, mas que tinha um som diferente quando saia da boca do homem à sua frente. - Fui um completo idiota ao deixá-la acreditar que eu apoiei sua inscrição nesse projeto por pensar que você não seria uma das escolhidas. Não escolhê-la seria um erro! Por mais que eu não entenda muito os dados difíceis que você analisa, eu sempre entendo os resultados. - Ele riu fraquinho e viu os lábios dela se comprimirem para tentar não sorrir junto. - E eu sei o quão esforçada, inteligente e comprometida você é. A questão é que eu sempre acreditei no seu potencial, talvez até mais que você mesma. Todo meu incentivo foi verdadeiro, mas quando a situação se tornou real com aquele e-mail… - Ele fez uma pausa, olhando para cima e tentando reunir as forças, pois aquela parte seria a mais difícil. - Eu agi como um egoísta. Queria te ver realizando um sonho profissional, mas, ao mesmo tempo, não queria ficar longe, não queria te ver partir.
agora tinha o suéter abraçado ao peito e encarava o homem, sem reação. Abriu a boca, mas nenhum som foi emitido.
— Também fui imaturo de levar tanto tempo para passar por cima do ego ferido e assimilar o fato de que você não estava me abandonando pelo emprego, mas que seria um período que iríamos passar um tempo afastados fisicamente. Isso não precisava significar o nosso fim, já que nossa conexão é muito mais forte que isso, afinal, eu te amo. Amo você e não me sinto completo sem você. Eu fui um idiota em te deixar partir sem acertar as coisas. — Finalizou. Estava com medo do que poderia vir a seguir, mas já se sentia mais leve, pois agora ela pelo menos sabia a verdade.
— Se chamar de idiota, imaturo e orgulhoso não vai diminuir o seu erro ou o fato de você ter me magoado muito, . - A mulher que sempre fora tão expressiva com o olhar, agora mirava-o sem qualquer expressão. - Mas devo admitir que o fato de você ter viajado todos esses quilômetros, nessa data, para admitir tudo isso que acabou de me falar… Bem, isso mostra que você realmente pensou a respeito… E eu acredito em você. É claro que teremos de passar toda essa história bem a limpo para que jamais volte a se repetir e que mágoas não fiquem corroendo nosso relacionamento… Mas eu nunca deixei de te amar. - Admitiu com a voz embargada e os olhos marejados. Sentiu o homem se aproximar e seu corpo entrou em alerta, ansiando pelo toque das mãos e dos lábios dele.
— Vamos ceiar?!?! - Maddie abriu a porta de forma nada sutil, como sempre, e deu de cara com e aos beijos. - Arrumem um quarto! Ops, vocês já estão em um. - A oceanógrafa riu da própria piada, arrastando o casal consigo. - Vocês se acertaram, que amor! - Ela exclamou, fazendo um coração com as mãos. sussurrou um “sim” baixinho e escorou a cabeça no peito do noivo, meio envergonhada pelo flagra.
— Estou muito feliz por vocês, mas morrendo de fome. Podemos ir? - O casal riu novamente e passou a segui-la pelos corredores.
— Então, . Como foi chegar até aqui? - Maddie perguntou enquanto eles adentravam o espaço onde ficava a cozinha/refeitório.
— Olha, foi a viagem mais difícil que já fiz. - Ele admitiu. - Primeiro que eu tive que ir na casa dos meus sogros, arriscando tomar um tiro. - Ouviu exclamar que ele estava exagerando, mas ela logo riu, sabia que o pai podia ser extremamente rígido quando queria. — Eu fui totalmente transparente com eles, assim como fui com a agora há pouco, e eles me ajudaram com a localização. Quando cheguei em Juneau, achei que tinha perdido o horário do barco para cá e fiquei bem nervoso, mas deu tudo certo. Chegando aqui… Quase bateram a porta na minha cara. — Olhou para Charlie e riu.
— Não esperava menos de ti! — fez um high five com o glaciólogo.
— Felizmente, fui salvo pelo gongo. — Apontou para Maddie e foi a vez dos dois fazerem um high five.
— Bom, agora que já temos nosso milagre natalino, podemos, por favor, comer? Não é moleza ficar 12 horas a bordo. Preciso reabastecer! — Todos riram do exagero, mas concordaram com Maddie e sentaram-se para compartilhar daquela que seria uma das refeições mais especiais na vida de todos, cada um com seu motivo particular.
Mini glossário
Fiorde: formação geológica em que o mar passa entre altas montanhas. Very High Frequency (Frequência Muito Alta) designa a faixa de radiofrequências de 30 a 300 MHz. É frequentemente utilizada por emissoras de rádio FM, comunicação de embarcações, aviões e radioamadores.
UHF é a sigla para o termo inglês Ultra High Frequency (Freqüência Ultra Alta), e designa a faixa de radiofrequências de 300 MHz até 3 GHz. Frequentemente utilizada por emissoras de TV, por exemplo.
Sem domínio de seus próprios pensamentos, as lembranças dos natais compartilhados com invadiram sua mente. Os olhos arderam, o peito apertou, e através de um longo gole no café, ela tentou fazer todas essas emoções se dissiparem, ato que foi em vão. Enquanto sentia o líquido descer pela garganta, apenas ficou parada ali. A xícara esquentava a palma de suas mãos e quem olhasse de fora poderia pensar que ela estava encarando o calendário e fazendo planos, mas a realidade era bem diferente. Estava tão imersa em sua melancolia repentina que não percebeu o barulho dos passos da colega no corredor, informando que ela se aproximava.
— Bom dia! - Maddie abriu a porta com tudo, fazendo a xícara e o líquido preto voarem pelo ambiente.
— Caramba! Que susto! - Espalmou a mão sobre o coração, tentando acalmá-lo. — Ai, me desculpa! Mas o que você estava fazendo parada atrás da porta? - A outra não sabia se continuava se desculpando ou dava risada da situação inusitada.
— Estava tentando acordar. - Mentiu. Não sentia vontade de estourar a bolha de tristeza que a envolvia naquele momento para compartilhá-la com o mundo. - Agora eu estou mais que acordada. – Declarou, rindo.
— Me sinto culpada, então vou te ajudar a limpar correndo, porque em breve estaremos atrasadas. - Maddie riu e saiu em busca dos itens de limpeza.
— Será que seria pedir muito para que o tempo nos ajudasse pelo menos hoje? Já é complicado adentrar no fiorde* em dia de clima bom, hoje vai ser quase impossível... Poxa vida. - A oceanógrafa bufou, frustrada e irritada.
— Um reflexo do seu humor hoje, né? - Charlie, um dos glaciólogos, disparou. Eles eram conhecidos de longa data e não deixou passar despercebido o estado de espírito da mais nova, que costumava ser sempre alegre e falante.
— Ah, vê se me erra, Ewald! - Frisou bem o nome do meio do rapaz, pois sabia que ele odiava e queria irritá-lo um pouquinho. sorriu ao ver a expressão na face dele.
— Esse foi um golpe bem baixo, mas pelo menos você está sorrindo. deixou de lado a caderneta de anotações e aproximou-se de Charlie. Eles não eram exatamente amigos, mas se conheciam bem mais do que normalmente os colegas se conhecem. Já haviam realizados outros estudos juntos, além de saírem juntos sempre que conseguiam se encontrar em Seattle, onde ela residia.
— Desculpe pela falta de humor. - Riu fraco. - É que… - Desviou o olhar para o lado antes de prosseguir. — Esse é o primeiro 25 de dezembro que vou passar sem o . A verdade é que eu já estava sem ele desde que aceitei essa missão. - Admitir em voz alta fazia a saudade ser ainda mais real e aquilo a machucava de maneira dilacerante. — Eu vi que a aliança havia sumido, mas pensei que fosse para não perdê-la no meio da geleira. - fez uma careta engraçada ao ouvir esse comentário e imaginar que ela realmente era capaz de fazer algo do tipo. Agradeceu mentalmente por ter Charlie a bordo do MV Stellar naquela pesquisa com ela, os comentários dele sempre a faziam rir. — Vocês sempre foram aquele tipo de casal, sabe? O tipo perfeito. Não consigo acreditar... Como assim? — Ele declarou, visivelmente surpreso.
Meses Antes…
— Isso é um sonho! - cobriu a boca com as mãos, olhos vidrados na tela do computador enquanto relia pela terceira vez o e-mail mais importante da sua vida. O coração estava aos pulos, as mãos suavam frio, sentia-se presa dentro de um furacão de emoções e que não conseguia definir qual lhe atingia mais forte.
Lá estava a aprovação tão esperada e que traria sentido para sua carreira. Uma nova fase da sua vida estava bem diante de si, braços abertos apenas esperando pela sua chegada.
O desejo de gritar para todos ouvirem, arrancar do peito toda a alegria que começou a fervilhar enquanto a ficha caía.
iria para o Alasca.
A urgência de compartilhar aquela alegria foi tão imensa que saiu do quarto aos tropeços, parando no batente da cozinha ao encontrar preparando um sanduíche.
— Amor! - Chamou-o, desesperada. No mesmo instante, ele olhou-a, preocupado ao ver seu rosto.
— Aconteceu alguma coisa? - Limpou as mãos no pano de prato e ignorou o pão que cortava.
— Sim! – Soltou, enérgica. Riu e se jogou em direção a ele. Apertou-o com força, o riso escapando sem controle.
Ela estava feliz e nada seria capaz de estragar sua alegria.
— O quê? – Questionou, risonho, abandonando a preocupação ao ser pego pelo gesto desprevenido. Depositou um beijo nos cabelos da mulher enquanto a tinha em seus braços.
— Lembra o projeto de pesquisa do Alasca que você me incentivou a participar? - Ela saiu do abraço e descansou as mãos nas bochechas, tinha um sorriso enorme. - Eu fui aceita. - Lançou-se novamente nos braços dele. - Muito obrigada! Eu te amo muito! - fechou os olhos e depositou um beijo no ombro em que descansava o queixo.
A falta de reação do noivo chamou a atenção da oceanógrafa, que libertou-o de seu agarro para que pudesse olhá-lo diretamente, e o que viu em seu rosto fez seu coração partir-se em milhares de pedaços. Estava surpresa e decepcionada pela reação de ao receber a notícia mais importante da sua vida.
— Não faz sentido! - Ela soltou com um sorriso irônico, as palmas para o alto num gesto de frustração.
Ouviu-o suspirar, desanimado, e bagunçar o cabelo com uma das mãos, reconheceu que compartilhava o mesmo sentimento que ela.
— É difícil explicar… - Bufou, desolado, e encarou o chão por alguns segundos, voltando a encará-la. - Você é o meu orgulho como mulher, profissional. Tem um potencial enorme. - começou a listar com os dedos. — Dedicada ao extremo, busca sempre um sentido para o seu trabalho, e não desiste fácil do que quer. E eu a admiro muito, acredito que o céu é o limite para você, mas…
— Mas o quê? - A voz estava triste, os olhos marejados pelas palavras do homem e pelo o que estava por vir.
— Mas eu não quero que você vá para o Alasca. – Deu de ombros enquanto as mãos caíam ao lado do corpo.
Ela riu sem qualquer humor, uma das mãos tocou a própria testa.
— , você está brincando comigo? Por que se estiver…
— Quem dera fosse uma brincadeira, . — suspirou, desolado.
— Você deve ter enlouquecido ou está tirando uma com a minha cara! – Falou, irritada. - Quem me incentivou a me inscrever foi você! - Apontou o dedo indicador em direção a ele. - Você sabia o tempo todo que eu teria que passar dois anos longe. – continuou, gesticulando nervosamente. — A não ser… - A boca abriu levemente, os olhos arregalados com a compreensão que atingia sua mente. - A não ser que você acreditava ser impossível que eu fosse escolhida. - As lágrimas encheram os seus olhos.
No mesmo instante, pareceu reagir negativamente, mas desistiu e desviou o olhar para o chão, uma dolorosa confirmação para a mulher.
— Eu não esperava isso de você. - Cobriu a boca com a mão e permitiu que algumas lágrimas escapassem, mas secou-as rapidamente. - Realmente não esperava.
E aquela foi a última vez que esteve frente a frente com o noivo. Horas depois, ele havia saído do apartamento que dividiam sem dizer uma palavra, e não seria ela que iria atrás dele.
— Caramba, ! Não imaginava que você tinha enfrentado uma barra pesada como essa! — Charlie sorriu tristemente e deu um tapinha reconfortante no ombro da mulher. — Enquanto a Becky quase dançou de alegria ao saber que eu ficaria dois anos longe. — Bufou, indignado, mas sorriu, zombeteiro.
A oceanógrafa riu da tentativa do amigo em animá-la e sentiu-se grata, pois não aguentaria ouvir qualquer conselho. Afinal, o silêncio do noivo deixava subentendido que haviam terminado o relacionamento.
— Qual será o cardápio da nossa ceia? - ela perguntou, mudando de assunto enquanto anotava uma nova informação em seu caderno.
Sentada na cama com as pernas pendendo para fora, balançava os pés em movimentos incessantes para cima e para baixo. Já era sua terceira tentativa de conversar com a família através de um rádio VHF*. Sem sucesso. A equipe era razoavelmente grande e eles tinham de revezar a utilização do aparelho. Felizmente sua vez finalmente havia chegado após um longo dia de trabalho no barco, mas ela não estava tendo sorte.
— Eu avisei que deveríamos optar pelo UHF*. - disse para si mesma. Respirou fundo e tentou o êxito na quarta tentativa.
— Oi, filha! - A voz do pai preencheu o cômodo e ela automaticamente sorriu. Escutou o homem chamando pela esposa, que logo estava cumprimentando a filha também.
— Que saudade de vocês! - Declarou. - Como estão?
— Tirando a falta que estamos sentindo de você, está tudo bem. - A mãe respondeu. - E você, pequena?
— Tirando isso e o cansaço, tudo ótimo. Os turnos de 12 horas no barco não são fáceis, mas valem a pena. - Os pais não podiam vê-la, mas pelo tom de voz sabiam que ela estava sorrindo. Ela havia lutado muito por aquela chance e eles estavam felizes e orgulhosos por ela.
— E você já viu algum urso polar?
— Papai! - Antes de continuar a falar, ela riu, sabendo que o pai apenas estava se divertindo. - Você sabe que aqui apenas temos os ursos pardos e os negros. - E sim, caso eu veja algum, vou tirar fotos para você… Se eu não desmaiar, mesmo de longe. — Sussurrou a última parte e os pais caíram na gargalhada.
— Deu sorte com a equipe, filha? — A senhora perguntou algo que há tempos atiçava sua curiosidade, mas que ainda não havia tido tempo de questionar nas chamadas anteriores, uma vez que eles recém estavam se entrosando e o tempo de conversa entre eles era escasso e precioso, preferindo focar em escutar a filha do que fazer questionamentos aleatórios.
— Nossa, muita! São todos muito profissionais, sem exceção. Eu divido o quarto com a Maddie, ela também é oceanógrafa. A cada dia que passa ela fica mais engraçada e organizada, então meu TOC passa bem. - Riram. - E com a adição do Charlie ao trio, a diversão é sempre garantida. — Aquela era a maior verdade, pois não havia tempo ruim com ele, que acabava por contagiar as outras duas.
— Que bom, meu amor! Você não imagina o quanto me tranquiliza saber que está ao redor de pessoas boas. - O tom materno deixou o coração da jovem apertado de saudade.
Talvez tenha sido a data em si. Era sua época favorita do ano desde muito nova, gostava de estar com toda a família, fazer uma maratona de filmes natalinos, tomar bastante chocolate quente com marshmallow e jogar muitos jogos de tabuleiro, vestindo um suéter idêntico ao dos pais. Depois que conheceu e esse tornou-se um integrante da família, foi obrigado a aderir a tradição e passou a vestir o mesmo figurino que os sogros e a noiva. Essas lembranças deixaram o seu coração mole o suficiente para fazer com que aquela pergunta escapasse dos seus lábios.
— Mãe, o deu notícias? – Soltou, com a voz tímida, preocupada com a reação de seus pais, afinal, sabiam de toda a confusão e ficaram extremamente magoados com o rumo do relacionamento da única filha.
— Mãe? Pai? - Chamou-os, conferiu se o aparelho estava realmente ligado e não sabia por que o fez, pois conseguia ouvir sussurros longe da linha. — Tudo bem, sei que estou sendo fraca em querer saber do cara que eu acreditei que me amava e que era o homem da minha vida. - Deu de ombros, resignada, mesmo que os pais não estivessem vendo.
Não gostava de preocupar o casal, mas desde criança sempre teve um relacionamento com um diálogo transparente. Eles sempre se mostraram preocupados e abertos a ouvir, aconselhar sem qualquer tipo de julgamento, mas sem abandonar o papel de responsáveis por ela. Todos esses meses tentou se manter forte, não queria preocupá-los, mas sentia falta de dividir a sua vida com eles, por isso não conseguiu evitar continuar.
— Ele me machucou muito, muito, muito, mas como é possível que ainda não superei esse amor? - Soltou um suspiro, os olhos marejados. - Será que ele não se arrepende de ter desistido de mim? De nós? - A voz rouca de emoção. - Me desculpa, mãe. - A voz chorosa. - Me desculpa, pai. Eu acho que é culpa do Natal. - Riu.
— Minha filha, eu só queria poder te abraçar nesse momento. - A mais velha falou, emotiva. - Eu te amo. - Tentou transmitir com toda força pelo tom de voz.
— Nós... - Corrigiu o pai. - Te amamos.
riu enquanto secava algumas lágrimas com a manga do suéter.
— Nem tudo são flores quando se trata do amor. - O pai suspirou. - Não foi justo o que o causou a vocês, mas talvez fosse preciso algo assim acontecer para que ele amadurecesse como pessoa e revisse os próprios conceitos.
A filha riu, surpresa.
— Então o senhor não quer mais matá-lo? – Perguntou, surpresa e confusa com a situação. - Ele conversou com vocês? - Desconfiou.
Ouviu o suspiro da mãe.
— Não vou mentir para você, ele esteve aqui, meses depois que você partiu.
— E não me contaram, por quê? – Perguntou, magoada. - Nunca escondi nada de vocês.
Ouviu a gargalhada do pai ao fundo.
— E aquela vez que você cabulou aula com as suas amigas para ir ao cinema? - O homem lembrou, divertido.
Ela cobriu o rosto com a mão livre e riu, esquecendo um pouco a chateação que deveria demonstrar.
— Foi só essa vez.
— Aham, eu sei. - Ironizou.
Ambos riram.
— Eu amo vocês. - Ela falou emotivamente, deixando de lado o assunto .
— Nós também, querida. Nós também. - A mãe garantiu.
— Um beijo e Feliz Natal. - Desligou a ligação e encarou o aparelho em sua mão. Queria estar nos braços de sua família, mas sabia que precisava encarar aquela distância e a nova fase que estava vivendo para amadurecer, aprender a lidar com os sentimentos que dominavam. Não conseguiu evitar pensar que o ex-noivo havia visitado seus pais, e pelo visto, feito as pazes com eles. A única dúvida e indignação que ficava era: MAS E ELA? Ele não lhe deve um pedido de desculpas?
— Pode entrar, Maddie! Já acabei a ligação. - Falou ao ouvir uma batida na porta do dormitório que dividia com a oceanógrafa. Secou rapidamente as lágrimas com as mãos e respirou fundo. Quando ergueu-se da cama, a porta abriu e os seus olhos quase pularam das órbitas, a voz ficou presa na garganta, o coração começou a martelar no peito, quase prestes a matá-la de um enfarto. Ela não conseguiu soltar uma palavra, a pergunta rondava sua mente. Era como se realmente um gato tivesse comido a sua língua, o choque em vê-lo em carne e osso. Impossível que o homem tivesse saído de Seattle para se desculpar com ela. Se não estivesse tão nervosa, teria rido.
continuava muito bonito, mas diferente de suas memórias. O cabelo castanho estava mais comprido e, provavelmente, bagunçado pelo vento gelado lá de fora. O rosto mais arredondado do que antes. Vestia um enorme agasalho verde musgo com capuz e uma touca por baixo, uma calça de tecido grosso combinando, mas estava de meias pretas ali dentro. Maddie ou qualquer pessoa, não deixaria que entrassem na base de calçados.
Encaravam um ao outro em silêncio, uma expressão de surpresa, e outra com a mais sincera expectativa.
Finalmente, engoliu em seco mais calma e falou, forçando a voz a parecer controlada, livre do furacão de emoções:
— O que está fazendo aqui, ?
Ele não respondeu imediatamente, assumiu uma postura de falso controle e que quase causou inveja na mulher, pois a mão trêmula que abria o zíper de uma mochila, entregou o verdadeiro estado de espírito do ex. Não iria amolecer o coração tão fácil, mas ver o quanto ele estava desestabilizado, assim como ela, mexeu um pouco.
O homem puxou algo de dentro da mochila e chamou a atenção da jovem, um tecido verde musgo que estendeu em sua direção e deu de ombros.
— Vim te devolver o seu suéter. — Deu de ombros novamente, a expressão mais neutra do mundo. — É Natal e sei o quanto é importante para você.
Os olhos de viajavam entre a peça nas mãos de e o rosto dele. Ela não sabia como reagir naquele momento, então seu corpo entrou no automático e ela reagiu da mesma forma que sempre fazia em situações fora de sua zona de conforto: ela riu. Ainda não havia descoberto se o riso era motivado pela incredulidade do gesto ou pela capacidade dele em agir como se os últimos meses separados não tivessem existido e estivesse tudo bem entre eles, o que obviamente não era o caso.
— Obrigada, eu acho. - Ela se pronunciou ao tomar o suéter para si, sentindo o cheiro de casa invadir suas narinas. Havia tanta coisa a ser dita, entalada em sua garganta, que ela tinha medo de começar e nunca mais parar. Por isso, optou por seguir o conselho da mãe e manter-se calma, pelo menos no lado externo, já que seu interior estava uma completa bagunça.
Os meses afastados não foram suficientes para que eles se tornassem completos estranhos. Muitas coisas haviam mudado, mas o conhecimento essencial permanecia ali. Observando-a, notou que, apesar de se manter distante, ela aparentava estar mais receosa do que ele próprio. Já que ele havia viajado todos aqueles quilômetros para vê-la, cumpriu sua obrigação de ser o primeiro a falar.
— Eu não sei se ainda tenho o direito de te chamar assim, mas irei fazê-lo. … - o coração da mulher apertou ao ouvi-lo pronunciar aquela frase e completando-a com o apelido pelo qual todos a chamavam, mas que tinha um som diferente quando saia da boca do homem à sua frente. - Fui um completo idiota ao deixá-la acreditar que eu apoiei sua inscrição nesse projeto por pensar que você não seria uma das escolhidas. Não escolhê-la seria um erro! Por mais que eu não entenda muito os dados difíceis que você analisa, eu sempre entendo os resultados. - Ele riu fraquinho e viu os lábios dela se comprimirem para tentar não sorrir junto. - E eu sei o quão esforçada, inteligente e comprometida você é. A questão é que eu sempre acreditei no seu potencial, talvez até mais que você mesma. Todo meu incentivo foi verdadeiro, mas quando a situação se tornou real com aquele e-mail… - Ele fez uma pausa, olhando para cima e tentando reunir as forças, pois aquela parte seria a mais difícil. - Eu agi como um egoísta. Queria te ver realizando um sonho profissional, mas, ao mesmo tempo, não queria ficar longe, não queria te ver partir.
agora tinha o suéter abraçado ao peito e encarava o homem, sem reação. Abriu a boca, mas nenhum som foi emitido.
— Também fui imaturo de levar tanto tempo para passar por cima do ego ferido e assimilar o fato de que você não estava me abandonando pelo emprego, mas que seria um período que iríamos passar um tempo afastados fisicamente. Isso não precisava significar o nosso fim, já que nossa conexão é muito mais forte que isso, afinal, eu te amo. Amo você e não me sinto completo sem você. Eu fui um idiota em te deixar partir sem acertar as coisas. — Finalizou. Estava com medo do que poderia vir a seguir, mas já se sentia mais leve, pois agora ela pelo menos sabia a verdade.
— Se chamar de idiota, imaturo e orgulhoso não vai diminuir o seu erro ou o fato de você ter me magoado muito, . - A mulher que sempre fora tão expressiva com o olhar, agora mirava-o sem qualquer expressão. - Mas devo admitir que o fato de você ter viajado todos esses quilômetros, nessa data, para admitir tudo isso que acabou de me falar… Bem, isso mostra que você realmente pensou a respeito… E eu acredito em você. É claro que teremos de passar toda essa história bem a limpo para que jamais volte a se repetir e que mágoas não fiquem corroendo nosso relacionamento… Mas eu nunca deixei de te amar. - Admitiu com a voz embargada e os olhos marejados. Sentiu o homem se aproximar e seu corpo entrou em alerta, ansiando pelo toque das mãos e dos lábios dele.
— Vamos ceiar?!?! - Maddie abriu a porta de forma nada sutil, como sempre, e deu de cara com e aos beijos. - Arrumem um quarto! Ops, vocês já estão em um. - A oceanógrafa riu da própria piada, arrastando o casal consigo. - Vocês se acertaram, que amor! - Ela exclamou, fazendo um coração com as mãos. sussurrou um “sim” baixinho e escorou a cabeça no peito do noivo, meio envergonhada pelo flagra.
— Estou muito feliz por vocês, mas morrendo de fome. Podemos ir? - O casal riu novamente e passou a segui-la pelos corredores.
— Então, . Como foi chegar até aqui? - Maddie perguntou enquanto eles adentravam o espaço onde ficava a cozinha/refeitório.
— Olha, foi a viagem mais difícil que já fiz. - Ele admitiu. - Primeiro que eu tive que ir na casa dos meus sogros, arriscando tomar um tiro. - Ouviu exclamar que ele estava exagerando, mas ela logo riu, sabia que o pai podia ser extremamente rígido quando queria. — Eu fui totalmente transparente com eles, assim como fui com a agora há pouco, e eles me ajudaram com a localização. Quando cheguei em Juneau, achei que tinha perdido o horário do barco para cá e fiquei bem nervoso, mas deu tudo certo. Chegando aqui… Quase bateram a porta na minha cara. — Olhou para Charlie e riu.
— Não esperava menos de ti! — fez um high five com o glaciólogo.
— Felizmente, fui salvo pelo gongo. — Apontou para Maddie e foi a vez dos dois fazerem um high five.
— Bom, agora que já temos nosso milagre natalino, podemos, por favor, comer? Não é moleza ficar 12 horas a bordo. Preciso reabastecer! — Todos riram do exagero, mas concordaram com Maddie e sentaram-se para compartilhar daquela que seria uma das refeições mais especiais na vida de todos, cada um com seu motivo particular.
Mini glossário
Fiorde: formação geológica em que o mar passa entre altas montanhas. Very High Frequency (Frequência Muito Alta) designa a faixa de radiofrequências de 30 a 300 MHz. É frequentemente utilizada por emissoras de rádio FM, comunicação de embarcações, aviões e radioamadores.
UHF é a sigla para o termo inglês Ultra High Frequency (Freqüência Ultra Alta), e designa a faixa de radiofrequências de 300 MHz até 3 GHz. Frequentemente utilizada por emissoras de TV, por exemplo.
Fim!
Nota da autora: A ideia de escrevermos em parceria surgiu há algum tempo, mas somente conseguimos colocar em prática nessa atualização de Natal e não poderíamos estar mais contentes com o resultado! Estamos completamente apaixonadas pelo local escolhido para ser o fundo dessa história, por nosso casal e pelos personagens secundários, que apareceram pouco, mas nos divertiram um monte.
Não podemos deixar de agradecer nossa pitaqueira, Becky, pela ajuda com a sinopse. Ficou maravilhosa! E a nossa beta, Lala, que aceitou betar aos 45 minutos do segundo tempo. Você é T-U-D-O!
Esperamos que vocês tenham gostado e que nos façam felizes com um comentário aqui embaixo 🥰
Caixinha de comentários: A caixinha de comentários pode não estar aparecendo para vocês, pois o Disqus está instável ultimamente. Caso queira deixar um comentário, é só clicar AQUI
Caso queiram ler fanfics da Thay, comecem por:
● Café com Pattinson [Atores/Em Andamento]
● 05. Ring - Ficstape #203: Rare - Selena Gomez
Onde encontrar fanfics da Stone:
Nota da beta: AI QUE AMOR! Meu Deus, eu já sabia que ia morrer de amores, mas não imaginei que seria tanto! Tava super triste no começo, com medo de terminar odiando o pp, mas imagino a dificuldade de ouvir que a pessoa simplesmente vai embora por um tempo, deve ser horrível! Fico feliz demais pelo arrependimento deles, porque eles são muito fofos! É um prazer betar a primeira parceria de vocês, e eu realmente espero que venham MUITAS parcerias, estou sempre aqui para me alimentar dessa coisa maravilhosa, porque vocês arrasaram demais! <3
Qualquer erro nessa atualização ou reclamações somente no e-mail.
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