Capítulo Único
Já era a quinta vez naquela noite que despejava todo o líquido da taça que segurava garganta abaixo.
terminava de se arrumar pelos cômodos do apartamento, naquela noite tinha um encontro com algum cara que havia conhecido
na editora, e certamente não voltaria pra casa antes do amanhecer. já não tinha mais criatividade para escrever uma
mera lista de compras de supermercado quando ligou o notebook, as últimas três horas foram resumidas em taças de vinhos, suspiros e olhares perdidos. O
lançamento internacional do seu segundo livro estava previsto para dali a seis meses e ela não estava nem na metade do que precisava entregar.
— Meu bem, você precisa descansar — disse enquanto pegava a bolsa no sofá e conferia se não estava esquecendo nada. — Beber litros de vinho olhando o rio Tâmisa não vai fazer o seu bloqueio criativo vazar daí. A menos que você queira falar sobre peixes no próximo livro...
— Talvez seja uma boa ideia — respondeu, ainda admirando a vista noturna pelas enormes janelas. — Você sabia que nele existem mais de 120 espécies de peixes? — Perguntou com certa sinceridade e arqueou as sobrancelhas como uma mãe repreendendo uma filha. Apesar de terem quase a mesma idade, queria que a amiga a levasse a sério. — Não tenho muitas opções agora. — Se virou para encarar a amiga que já beirava a indignação. O apartamento era cercado por vidros e estar em um dos últimos andares do prédio ajudava com que elas tivessem uma vista muito privilegiada de Londres.
— Você tem, a questão é que você não quer ceder e ligar pra sua opção. — respondeu com ironia enquanto caminhava até o espelho e checava o batom vermelho nos lábios. Estava impecável e ela sabia, mas o reflexo a animava.
— Sem chances. Ligar pro não é, definitivamente, uma opção. — Levantou da poltrona vermelha e caminhou até a bancada em formato de ilha que dividia a longa sala e a cozinha, enchendo mais uma taça de vinho. e a escritora tinham se conhecido no lançamento do seu primeiro livro e, apesar de se darem muito bem juntos, o relacionamento deles não dava certo de jeito algum. mexia no celular e parecia já estar avulsa ao assunto, enquanto reclamava. -— Eu preciso terminar de escrever um romance — disse em baixo tom, já não sabia se a amiga a ouvia mesmo, não a atrapalharia. — Não preciso passar raiva, muito pelo contrário. – Pousou a taça no mármore enquanto arrumava o cordão que sustentava a calça de moletom que vestia. — Eu preciso de alguém que me desperte paixão. – Suspirou e quase se deixou levar pelas lembranças que tiveram juntos, em vários momentos que ela tinha amado vivenciar com ele. Mas também não conseguia esquecer das coisas ruins — Não. Eu não preciso de nada disso, eu consigo sozinha. E se quer saber, seria muito ruim encontrar com ele agora. Ah, mas ele ouviria poucas e boas. — Sabia que estava tentando se convencer daquilo, quando queria sim vê-lo e dizer como sentia sua falta.
— Então esse é o motivo da ligação na semana passada? Me ligou pra dizer que me odeia? — A voz do cantor ecoou na sala e arregalou os olhos, tentando lembrar como respirar corretamente. tinha ligado para por alguma chamada de vídeo e agora ele encarava a imagem da escritora estática. Descalça, com pijamas coloridos e o cabelo em um rabo de cavalo bem desajeitado. Pega em flagrante. caminhou a passos largos para tentar tirar o celular da mão de , que tinha um sorriso triunfante nos lábios, mas a assistente foi mais rápida.
— , acho que ela precisa de uma ajudinha com a criatividade. — Desviou o caminho, dando a volta pela bancada, antes que a amiga conseguisse pegar o celular. — Eu preciso sair e o apartamento está livre pra vocês dois. Você se importa?
— Eu... — Pareceu considerar se realmente tinha condições de encarar aquele momento, mas não teve tempo de concluir o pensamento.
— Não! — o cortou — Quer dizer, sim, ele se importa e eu também. , eu não preciso que você venha. Eu consigo me virar sozinha... — Foi interrompida.
— Eu posso ir. Só preciso de alguns minutos e um banho.
— Não, não! Eu não tenho 7 anos, ! Eu não preciso de supervisão. Você perdeu o controle total do ridículo.
— , talvez não seja uma boa ideia mesmo, talvez outro dia. — Ele até sentia uma leve vergonha, mas estava tão feliz em ouvir a voz dela depois de um mês que se permitiu ser inconveniente.
— Não mesmo. No mês que vem nós estaremos lotadas de reuniões de divulgação e uma porrada de conteúdo. Ela precisa escrever o final do livro, ! E tem que ser pra ontem.
— Ei! Eu sei das minhas responsabilidades, , eu nunca deixaria de cumprir com algo assim. Não esqueça que você tá falando do meu ganha pão.
— É claro que você consegue escrever! Mas nós precisamos DAQUELE final. , por favor, você sabe que nós precisamos de você.
— Chego em 40 minutos. — A voz saiu pelo aparelho, dessa vez mais confiante. Ele sentia saudade e faria muitas coisas para ver aquela mulher feliz, mesmo que ela tivesse que sofrer um pouquinho antes. Ele também queria a oportunidade de esclarecer pontos e ter a conversa definitiva que nunca tiveram. Ele não aceitaria mais idas e vindas, era muito doloroso.
— Se você vier, não vai entrar. Eu não vou abrir — a escritora respondeu, contrariando o que tinha dito sobre a idade, a atitude era bem semelhante à de uma criança birrenta de braços cruzados.
— Então é isso, pessoal, eu preciso ir. , a minha chave reserva fica embaixo do tapete, caso não queiram abrir a porta pra você. — Sorriu sincera para o rapaz do outro lado da tela. — Bye! — encerrou a chamada e, antes que pudesse levar qualquer tipo de esporro, se apressou para pegar as chaves do carro e ir em direção à porta.
— Você está demitida, .
— Você não me demitiria por te ajudar tanto assim. — Saiu jogando beijos pelo ar e acenando com a mão.
não sabia se apareceria ou não. Mas, por via das dúvidas, tomou um banho e substituiu os pijamas por outros, esses limpos e mais sóbrios, em um cetim vermelho. Tudo para voltar à sala em busca de mais bebida. Depois de uma hora sem que chegasse, a garrafa de vinho estava chegando à metade. O álcool por pouco não falava por si só, mas as palavras que soavam no cômodo eram da própria mulher em pé em frente à janela.
— Por que é que você sai com aquela vaca, hein?! — Perguntava olhando para o visor do celular, que tinha uma das poucas fotos dos dois juntos. — Não, quer dizer, ela pode ser uma boa moça, mas nós poderíamos ter sido felizes… — A London Bridge era ainda mais bonita iluminada, era fácil se perder em pensamentos ali, como ela fazia enquanto revezava olhares entre o celular e a vista. — Mas fui eu que disse que não queria mais. Que saco, por que tem que ser assim tão complicado? — O monólogo embriagado era o mais sincero possível. — Não, é melhor não, eu não faço o tipo de um cantor famoso, isso é demais. — E assim foi o último gole da taça, seguido de um calafrio. Era hora de parar com a bebida por aquela noite. Assim que depositou a taça na mesinha central, ouviu um pigarro. Imaginou que, pela segunda vez naquele dia, tinha ouvido demais de um monólogo seu e praguejou baixinho.
— Demorei porque parei pra pegar isso aqui, — balançou uma garrafa de algum whiskey caro em uma das mãos. não sabia digerir tanta informação ao mesmo tempo, não com tanto álcool no sangue. estava bonito, como sempre foi, a garrafa de Royal Salute em sua mão também. Se perguntava se ele tinha ouvido tudo, — mas acho que não vamos precisar. Pelo jeito você já começou a festa sem mim há muito tempo. — A palavra “festa” a lembrava de mais um dos episódios de que se arrependia, quando dirigiu no dia do aniversário dele até o apartamento em que morava e viu da rua algo que quis apagar de sua mente: a cena dele beijando outra na sacada era como sentir uma adaga atravessando o próprio peito. Não que ela soubesse exatamente a dor, mas pelo que sentia, só poderia ser algo muito próximo daquilo.
— Festa? Eu não tenho nada a comemorar. — Colocou as mãos na cintura, tentando se convencer do que tinha dito. Mas ter ali a tão poucos metros de distância deveria sim ser motivo de festa.
— Eu ainda não sei porque você tem me odiado tanto. — Seu sorriso transbordava quase toda a frustração que ele sentia por aquele relacionamento não ter dado certo. — Foi você quem disse que era melhor pararmos de nos ver. Você que não foi no meu aniversário. Você me liga e não diz nada. Qual é a sua? — Nada daquilo era mentira, ela sabia. Sempre que ficava sozinha se controlava para não ligar, mas tudo que ela queria era ouvir um simples “alô”.
não conseguia responder à altura, nem contestar cada palavra que ele dizia. Ele estava certo. Pensar que ela havia pedido o fim de qualquer coisa que tivessem fez seus olhos marejarem por várias noites de insônia.
— Eu não quero conversar hoje. — A fala saiu quase como uma súplica. Ela queria, mas precisava organizar os pensamentos e tudo o que ia falar, pra não se comprometer demais. — Eu aceito a sua companhia. Mas eu não quero falar sobre isso, nem hoje, nem agora. — Ele sabia que não poderia considerar muito de uma conversa agora. Preferia ter uma conversa cem por cento sóbria e certeira sobre o destino dos dois. Desde que tinha saído de sua casa, havia estabelecido um único propósito: entender o que tinha acontecido.
— E o que você pretende fazer? Olhar pra mim até ficar sóbria? – Questionou arqueando as sobrancelhas e sorrindo, ela sabia que era um convite dele, tentando amenizar o clima horrível que tinha se instalado e a convidando a se abrir.
— Eu não pretendo ficar sóbria. — Retribuiu o sorriso e foi em busca dos copos de whiskey.
— E eu não pretendo limpar vômito de ninguém. — Serviu as duas doses nos copos. E virou o primeiro sozinho, não se importando em fazer qualquer tipo de careta, a bebida era realmente boa.
— Você queimou a largada! — Reclamou a mais nova, que o encarava como se fosse a última vez em que o veria, afinal, poderia ser e ela guardaria cada sorriso em sua memória.
— Não senhora, você queimou, eu tô tentando te alcançar. — Virou o outro copo. — Já sei. Quer me mostrar como anda seu livro?
— Meu livro não anda. E ele não tá pronto ainda. — Sorriu irônica.
— Eu quero ver, de verdade. Posso? — Ambos sabiam o motivo da curiosidade dele. Antes mesmo de começar a escrever o segundo livro, ela o prometeu que teria uma parte dedicada a ele, parte da história que ele saberia exatamente em que ela estava falando dos dois.
— Tá bom. — Suspirou. — Pode. — Mas antes que ele pudesse abrir o maior dos sorrisos vencedores, ela o cortou — Só que a parte que você quer saber ainda não está no livro. É a parte que eu não consigo escrever. — Ele a encarava sem saber o que responder. Se perguntava internamente, ainda a encarando, qual seria o motivo do bloqueio ser exatamente nessa parte. — Vai querer ler ou não? — Ela não deu tempo para que organizasse os pensamentos e criasse uma teoria.
— Claro — respondeu ao sair do transe. – Mas eu quero ver aquele esquema legal que você faz, com o resumo do que acontece nos capítulos.
— Óbvio, eu não esperaria você passar a noite inteira lendo e eu tenho um contrato de confidencialidade. Mesmo se você quisesse, não poderia ver essa magnífica obra de arte antes dos demais.
— Mas é claro, madame. — Fingiu desdém. — Por favor me mostre o que posso saber de sua obra, estou bem curioso. — Estendeu a mão para que ela o guiasse até a sala.
— Se toca, . — Riu e deu um tapa leve na mão do rapaz, andando sozinha até a sala. — Traz a garrafa pra cá — ordenou enquanto desbloqueava o notebook.
— Folgada — reclamou, mas não deixou de atender ao pedido.
Os minutos passaram rapidamente enquanto lia a esquematização dos capítulos e fazia comentários, na maioria das vezes reclamando de algo que os personagens fariam ou pedindo que ela mudasse algo, mas ambos sabiam que era uma brincadeira e que ela não mudaria nem se sua própria mãe pedisse. havia parado de beber o whiskey no segundo copo e era bem resistente ao álcool.
— Eu só não entendi uma parte. — e estavam sentados no sofá ainda discutindo sobre o livro. — Não tem final? Acaba assim, do nada? — Se apressou a explicar: — Não é uma crítica, mas cadê aquela pulga que você coloca atrás da orelha, que dá vontade de te estrangular pra saber a continuação? Só tem no primeiro? — A mulher não sabia o que responder, nem como. Não queria contar exatamente o que pensava em escrever, mas não tinha como contar sem dar os detalhes.
— Esse é o meu bloqueio. — Seu rosto exibiu um sorriso fraco, decepcionado.
— Essa é a parte que você fala sobre nós. O final é sobre nós dois. — Não eram perguntas. havia entendido o motivo da confusão e estava digerindo tudo que havia acontecido desde que deixaram de se ver. Nunca houve um ponto final definitivo, nem a conversa sobre o que eles sentiam. — Nós nunca tivemos essa conversa. A que você tem que escrever no livro. Nós não temos um final, é por isso que você não consegue escrever, você não sabe como a gente termina. — Dizia cada palavra com cuidado, como se fossem duras demais e pudessem a machucar. E pra ela realmente eram. Os olhos dela marejaram, e a única coisa que conseguiu fazer foi acenar com a cabeça. Os dois sabiam que tinham culpa na história. Livros com finais tristes vendem, mas o final desse ela queria muito que fosse feliz. Como ela não fazia menção alguma de continuar, emendou a conversa, tentando cegamente chegar a algum lugar. Afinal era pra isso que ele estava ali. — Você sabe que eu sempre gostei muito de você, . Eu não sei identificar sozinho onde foi que eu errei, ou que nós dois erramos.
— Eu sei. — Se referia às duas coisas. — Eu… — Se ajeitou no sofá e entrelaçou as mãos, tentando achar em si a confiança perdida para que se abrisse de vez. — Eu não sei o que você sente. Ou sentia, quando estávamos juntos. — reagiu com uma careta e a rebateria se ela não tivesse erguido a mão pedindo para continuar a falar. — Eu não tô falando da parte carnal. Nessa a gente se comunica bem demais. — Ele soltou um risinho, o que a deixou mais confortável em seguir em frente. — Eu não sei fingir que gosto de alguém, , não sou o tipo que sabe dividir. — Respirou e tentou não soar tão ridícula. — Te ver acompanhado no Brit Awards foi como uma martelada na boca do estômago. — Ele acenou com a cabeça, ainda digerindo o ponto de vista dela. — Eu sei que nós não tínhamos nada, mas foi depois do aniversário mais incrível de todos os que eu já tive, que não por coincidência foi com você.
— Eu não fiz pra te magoar… Eu nunca usaria ninguém pra isso e muito menos te magoaria de propósito. — A essa altura o clima era completamente de arrependimento. — Nós não tínhamos nada acordado como algo assim… Tão sério. Pensei que você também saísse com outros caras, e você também não apareceu no meu aniversário, nem disse nada. Isso mexeu muito comigo. — Ela não achou que ele sentisse algo parecido com o que ela passou. Medo, desconfiança, ciúmes.
— Eu fui — contou o que jurou a si mesma não falar a ninguém.
— O quê?
— Eu fui até o seu apartamento no dia do seu aniversário.
— Não, eu tenho certeza, eu não bebi a ponto de não lembrar. Eu não te vi lá. — se forçou a lembrar do dia da festa . Tinha certeza de que ela não tinha dado as caras. Afinal, esse foi um dos motivos de ter ficado com Sarah no dia, ele jurou que ela não apareceria e tentou achar algo que o distraísse e tirasse de órbita, não queria estar triste no dia do próprio aniversário. resolveu naquele dia ir literalmente nas últimas horas da festa. Em sua cabeça, encontraria o lugar mais vazio e conseguiria conversar com numa boa.
— Eu dirigi até lá, umas 4h da manhã… Eu não subi. Não consegui. — Lágrimas grossas e teimosas rolaram por seu rosto e tratou de limpá-las com os polegares. Vê-la chorando era horrível. — Te admirei na sacada, de dentro do carro. — E então, como se uma lâmpada acendesse em cima de sua cabeça, como nos desenhos animados, ele lembrou do momento. Entendeu o que ela quis dizer: ele e Sarah ficaram na sacada, ela tinha visto os dois juntos antes mesmo do Brit.
— Eu… Eu jurei que você não ia. — Nesse momento até seus próprios olhos marejaram. Ele sentia um misto de raiva e vergonha, só conseguia pensar em como seria diferente se não tivesse feito aquilo. — Que merda.
— Vi vocês juntos na sacada, e queria muito que fosse eu ali. — Arrancou um riso sem graça dos dois — Mas na outra semana, quando vocês foram juntos ao Brit, eu entendi que não era pra ser. Eu não nasci pra ser alguém que namora um cantor famoso, é muita informação pra mim.
— Isso não tem nada a ver, .
— Tem, você sabe que tem. — Ela nunca deixaria a teimosia de lado.
— Não, não tem. — Mas ele estava decidido. Eles resolveriam qualquer problema naquela noite. — Eu fiquei com ela porque queria esquecer que você não tinha ido. Eu movi mundos pra que você tivesse um dia perfeito no seu aniversário e você sequer tinha ido ao meu. É claro que eu senti raiva! Só queria que você tivesse aparecido. Seria tudo diferente. — Jogou a cabeça no encosto do sofá. o encarava enquanto também digeria tudo. Era o que ela precisava, saber o que ele sentia o tempo todo. Só assim conseguiria dar um final digno aos personagens. A verdade é que o relacionamento morno com era resultado da falta de clareza entre os dois.
— Obrigada, . — Ele a encarou sem entender bem ao que ela agradecia. — Por ter vindo e por ter me ajudado a entender o que aconteceu com a gente.
— Não tem pelo que agradecer, eu queria muito te ver. — Não havia mais motivos pra que ele não fosse sincero. — Acha que já consegue escrever o final agora?
— Com certeza. — Lançou um sorriso sincero. Estava triste em saber que tudo teria um outro rumo se ela não fosse tão ruim em expressar sentimentos, mas aliviada em saber que ele também se arrependia por não terem dado certo juntos.
— E como vai ser? — A pergunta não era só sobre o livro, ela sabia que ele esperava a resposta do que fariam em seguida.
— Bom, o personagem principal namora agora. Não há nada que ela possa fazer. — Ele pareceu voltar à triste realidade e seu semblante o acompanhou instantaneamente. e Sarah tinham um relacionamento sério, divulgado em toda a mídia. Contratos de publicidade juntos assinados. — Mas ela sabe que eles se amam, — falou com cuidado, sem olhar em seus olhos e teve certeza de que seu coração errou a sequência das batidas quando ouviu a frase. Ela estava falando deles e não dos personagens, mesmo que indiretamente. Saber que ela o amava o incendiou com as mesmas sensações que ele sentiu quando se conheceram, ele também a amava, muito, — e isso a deixa menos pior. — Continuou, buscando alguma reação em seu olhar e seguiu quando percebeu que ele entendeu. Sentiam o mesmo um pelo outro. — Quem sabe num terceiro livro o destino não faz ambos felizes? — concordou sorrindo e beijando a mão da mulher que amava. Ela o amava. Era incrível saber aquilo, era tudo que ele precisava.
— Quero te pedir um favor — disse o rapaz levantando.
— Você sabe que tem muito mais dinheiro que eu, né? Não sei se consigo te ajudar — brincou, mas ele respondeu só com um sorriso.
— Me dá um abraço forte. — Foi o suficiente para que ela risse, lembrando do dia que tinha usado a frase com ele. Tinha acabado de passar por um dia horrível e ligou para em busca de consolo. Tudo que ele fez foi abrir os braços para que ela se encaixasse. Ele sentiu por dias saudade daquele abraço, do cheiro do shampoo no cabelo dela, de como seus corpos se encostavam em busca de mais contato. Ela amava abraços apertados, o dele era o melhor. Por segundos teve a lembrança de dormir em seu peito, enquanto ele suspirava tranquilo. Mas tudo tinha acabado por erro deles mesmos.
— Eu quero te pedir um favor também — pediu e ele a encorajou a dizer, ainda abraçados. — Dorme aqui hoje? — Ele a encarou cogitando e calculando as consequências de tudo rapidamente. — Não nesse sentido!
— Eu entendi, dormir mesmo — respondeu.
— Isso! Você pode ficar no sofá, eu arrasto um colchão do quarto de hóspedes pra cá. — Ela sabia que era arriscado e que ele provavelmente negaria. Mas já estava colocando algo em prática para evitar arrependimentos: não perder oportunidades como antes.
— … — respirou fundo, mas ela já sabia a resposta e se desfez aos poucos do abraço — Eu…
— Não, , deixa. Não é certo mesmo. Foi uma péssima ideia, me desculpa.
— Desculpa, não é justo. Eu não posso agir assim só porque sei agora que você me ama.
— Eu não disse isso, convencido. — Sorriu, deixando o clima tenso ir embora.
— Você não consegue mais mentir pra mim. — Fez cócegas na mulher, que em poucos segundos estava jogada no sofá tentando se livrar das mãos do rapaz.
A campainha tocou, dando fim às gargalhadas e os dois levantaram indo até a porta.
— Ué! O que aconteceu? A comida era ruim? — não se surpreendeu em ver em pé na cozinha enquanto abria a porta.
— Literalmente! Em todos os sentidos! Foi horrível. — Jogou a bolsa no balcão e analisou as feições deles, apertando os olhos. — Mas aqui pelo jeito correu tudo bem — sugeriu maliciosa. estava vermelha e descabelada pelo ataque de cócegas, levemente ofegante.
— Não! — Responderam juntos, com medo de que ela pensasse errado.
— Quer dizer, tá tudo bem entre a gente, nós conversamos. Mas foi só isso. — completou. — Inclusive, tá na minha hora — disse abraçando e beijando a testa de . — Nós nos falamos — sussurrou e a mulher sorriu em resposta.
— Tá, eu quero saber TU-DO. — disse assim que a porta fechou.
— Mas você já sabe. — Riu do desespero da amiga. — Nós conversamos e tá tudo bem. Agora eu preciso escrever, parece que a inspiração finalmente voltou.
— Hã? Como assim? Eu quero saber! O que vocês falaram? O que acontece agora? Você disse pra ele o que você sente?
— Você vai saber, menina, se acalme. — sentou em uma das cadeiras esperando que ela contasse tudo e continuasse a falar, mas a autora deu as costas e voltou para o sofá com o notebook.
— ? Hello? To esperando!
— Mas eu não disse que seria agora, você vai saber quando ler o final do livro, que inclusive eu preciso escrever agora. — Colocou os fones e começou a escrever, deixando a amiga atônita. Mesmo estando brava, se sentia feliz e esperançosa de que seu casal favorito voltasse algum dia.
— Meu bem, você precisa descansar — disse enquanto pegava a bolsa no sofá e conferia se não estava esquecendo nada. — Beber litros de vinho olhando o rio Tâmisa não vai fazer o seu bloqueio criativo vazar daí. A menos que você queira falar sobre peixes no próximo livro...
— Talvez seja uma boa ideia — respondeu, ainda admirando a vista noturna pelas enormes janelas. — Você sabia que nele existem mais de 120 espécies de peixes? — Perguntou com certa sinceridade e arqueou as sobrancelhas como uma mãe repreendendo uma filha. Apesar de terem quase a mesma idade, queria que a amiga a levasse a sério. — Não tenho muitas opções agora. — Se virou para encarar a amiga que já beirava a indignação. O apartamento era cercado por vidros e estar em um dos últimos andares do prédio ajudava com que elas tivessem uma vista muito privilegiada de Londres.
— Você tem, a questão é que você não quer ceder e ligar pra sua opção. — respondeu com ironia enquanto caminhava até o espelho e checava o batom vermelho nos lábios. Estava impecável e ela sabia, mas o reflexo a animava.
— Sem chances. Ligar pro não é, definitivamente, uma opção. — Levantou da poltrona vermelha e caminhou até a bancada em formato de ilha que dividia a longa sala e a cozinha, enchendo mais uma taça de vinho. e a escritora tinham se conhecido no lançamento do seu primeiro livro e, apesar de se darem muito bem juntos, o relacionamento deles não dava certo de jeito algum. mexia no celular e parecia já estar avulsa ao assunto, enquanto reclamava. -— Eu preciso terminar de escrever um romance — disse em baixo tom, já não sabia se a amiga a ouvia mesmo, não a atrapalharia. — Não preciso passar raiva, muito pelo contrário. – Pousou a taça no mármore enquanto arrumava o cordão que sustentava a calça de moletom que vestia. — Eu preciso de alguém que me desperte paixão. – Suspirou e quase se deixou levar pelas lembranças que tiveram juntos, em vários momentos que ela tinha amado vivenciar com ele. Mas também não conseguia esquecer das coisas ruins — Não. Eu não preciso de nada disso, eu consigo sozinha. E se quer saber, seria muito ruim encontrar com ele agora. Ah, mas ele ouviria poucas e boas. — Sabia que estava tentando se convencer daquilo, quando queria sim vê-lo e dizer como sentia sua falta.
— Então esse é o motivo da ligação na semana passada? Me ligou pra dizer que me odeia? — A voz do cantor ecoou na sala e arregalou os olhos, tentando lembrar como respirar corretamente. tinha ligado para por alguma chamada de vídeo e agora ele encarava a imagem da escritora estática. Descalça, com pijamas coloridos e o cabelo em um rabo de cavalo bem desajeitado. Pega em flagrante. caminhou a passos largos para tentar tirar o celular da mão de , que tinha um sorriso triunfante nos lábios, mas a assistente foi mais rápida.
— , acho que ela precisa de uma ajudinha com a criatividade. — Desviou o caminho, dando a volta pela bancada, antes que a amiga conseguisse pegar o celular. — Eu preciso sair e o apartamento está livre pra vocês dois. Você se importa?
— Eu... — Pareceu considerar se realmente tinha condições de encarar aquele momento, mas não teve tempo de concluir o pensamento.
— Não! — o cortou — Quer dizer, sim, ele se importa e eu também. , eu não preciso que você venha. Eu consigo me virar sozinha... — Foi interrompida.
— Eu posso ir. Só preciso de alguns minutos e um banho.
— Não, não! Eu não tenho 7 anos, ! Eu não preciso de supervisão. Você perdeu o controle total do ridículo.
— , talvez não seja uma boa ideia mesmo, talvez outro dia. — Ele até sentia uma leve vergonha, mas estava tão feliz em ouvir a voz dela depois de um mês que se permitiu ser inconveniente.
— Não mesmo. No mês que vem nós estaremos lotadas de reuniões de divulgação e uma porrada de conteúdo. Ela precisa escrever o final do livro, ! E tem que ser pra ontem.
— Ei! Eu sei das minhas responsabilidades, , eu nunca deixaria de cumprir com algo assim. Não esqueça que você tá falando do meu ganha pão.
— É claro que você consegue escrever! Mas nós precisamos DAQUELE final. , por favor, você sabe que nós precisamos de você.
— Chego em 40 minutos. — A voz saiu pelo aparelho, dessa vez mais confiante. Ele sentia saudade e faria muitas coisas para ver aquela mulher feliz, mesmo que ela tivesse que sofrer um pouquinho antes. Ele também queria a oportunidade de esclarecer pontos e ter a conversa definitiva que nunca tiveram. Ele não aceitaria mais idas e vindas, era muito doloroso.
— Se você vier, não vai entrar. Eu não vou abrir — a escritora respondeu, contrariando o que tinha dito sobre a idade, a atitude era bem semelhante à de uma criança birrenta de braços cruzados.
— Então é isso, pessoal, eu preciso ir. , a minha chave reserva fica embaixo do tapete, caso não queiram abrir a porta pra você. — Sorriu sincera para o rapaz do outro lado da tela. — Bye! — encerrou a chamada e, antes que pudesse levar qualquer tipo de esporro, se apressou para pegar as chaves do carro e ir em direção à porta.
— Você está demitida, .
— Você não me demitiria por te ajudar tanto assim. — Saiu jogando beijos pelo ar e acenando com a mão.
não sabia se apareceria ou não. Mas, por via das dúvidas, tomou um banho e substituiu os pijamas por outros, esses limpos e mais sóbrios, em um cetim vermelho. Tudo para voltar à sala em busca de mais bebida. Depois de uma hora sem que chegasse, a garrafa de vinho estava chegando à metade. O álcool por pouco não falava por si só, mas as palavras que soavam no cômodo eram da própria mulher em pé em frente à janela.
— Por que é que você sai com aquela vaca, hein?! — Perguntava olhando para o visor do celular, que tinha uma das poucas fotos dos dois juntos. — Não, quer dizer, ela pode ser uma boa moça, mas nós poderíamos ter sido felizes… — A London Bridge era ainda mais bonita iluminada, era fácil se perder em pensamentos ali, como ela fazia enquanto revezava olhares entre o celular e a vista. — Mas fui eu que disse que não queria mais. Que saco, por que tem que ser assim tão complicado? — O monólogo embriagado era o mais sincero possível. — Não, é melhor não, eu não faço o tipo de um cantor famoso, isso é demais. — E assim foi o último gole da taça, seguido de um calafrio. Era hora de parar com a bebida por aquela noite. Assim que depositou a taça na mesinha central, ouviu um pigarro. Imaginou que, pela segunda vez naquele dia, tinha ouvido demais de um monólogo seu e praguejou baixinho.
— Demorei porque parei pra pegar isso aqui, — balançou uma garrafa de algum whiskey caro em uma das mãos. não sabia digerir tanta informação ao mesmo tempo, não com tanto álcool no sangue. estava bonito, como sempre foi, a garrafa de Royal Salute em sua mão também. Se perguntava se ele tinha ouvido tudo, — mas acho que não vamos precisar. Pelo jeito você já começou a festa sem mim há muito tempo. — A palavra “festa” a lembrava de mais um dos episódios de que se arrependia, quando dirigiu no dia do aniversário dele até o apartamento em que morava e viu da rua algo que quis apagar de sua mente: a cena dele beijando outra na sacada era como sentir uma adaga atravessando o próprio peito. Não que ela soubesse exatamente a dor, mas pelo que sentia, só poderia ser algo muito próximo daquilo.
— Festa? Eu não tenho nada a comemorar. — Colocou as mãos na cintura, tentando se convencer do que tinha dito. Mas ter ali a tão poucos metros de distância deveria sim ser motivo de festa.
— Eu ainda não sei porque você tem me odiado tanto. — Seu sorriso transbordava quase toda a frustração que ele sentia por aquele relacionamento não ter dado certo. — Foi você quem disse que era melhor pararmos de nos ver. Você que não foi no meu aniversário. Você me liga e não diz nada. Qual é a sua? — Nada daquilo era mentira, ela sabia. Sempre que ficava sozinha se controlava para não ligar, mas tudo que ela queria era ouvir um simples “alô”.
não conseguia responder à altura, nem contestar cada palavra que ele dizia. Ele estava certo. Pensar que ela havia pedido o fim de qualquer coisa que tivessem fez seus olhos marejarem por várias noites de insônia.
— Eu não quero conversar hoje. — A fala saiu quase como uma súplica. Ela queria, mas precisava organizar os pensamentos e tudo o que ia falar, pra não se comprometer demais. — Eu aceito a sua companhia. Mas eu não quero falar sobre isso, nem hoje, nem agora. — Ele sabia que não poderia considerar muito de uma conversa agora. Preferia ter uma conversa cem por cento sóbria e certeira sobre o destino dos dois. Desde que tinha saído de sua casa, havia estabelecido um único propósito: entender o que tinha acontecido.
— E o que você pretende fazer? Olhar pra mim até ficar sóbria? – Questionou arqueando as sobrancelhas e sorrindo, ela sabia que era um convite dele, tentando amenizar o clima horrível que tinha se instalado e a convidando a se abrir.
— Eu não pretendo ficar sóbria. — Retribuiu o sorriso e foi em busca dos copos de whiskey.
— E eu não pretendo limpar vômito de ninguém. — Serviu as duas doses nos copos. E virou o primeiro sozinho, não se importando em fazer qualquer tipo de careta, a bebida era realmente boa.
— Você queimou a largada! — Reclamou a mais nova, que o encarava como se fosse a última vez em que o veria, afinal, poderia ser e ela guardaria cada sorriso em sua memória.
— Não senhora, você queimou, eu tô tentando te alcançar. — Virou o outro copo. — Já sei. Quer me mostrar como anda seu livro?
— Meu livro não anda. E ele não tá pronto ainda. — Sorriu irônica.
— Eu quero ver, de verdade. Posso? — Ambos sabiam o motivo da curiosidade dele. Antes mesmo de começar a escrever o segundo livro, ela o prometeu que teria uma parte dedicada a ele, parte da história que ele saberia exatamente em que ela estava falando dos dois.
— Tá bom. — Suspirou. — Pode. — Mas antes que ele pudesse abrir o maior dos sorrisos vencedores, ela o cortou — Só que a parte que você quer saber ainda não está no livro. É a parte que eu não consigo escrever. — Ele a encarava sem saber o que responder. Se perguntava internamente, ainda a encarando, qual seria o motivo do bloqueio ser exatamente nessa parte. — Vai querer ler ou não? — Ela não deu tempo para que organizasse os pensamentos e criasse uma teoria.
— Claro — respondeu ao sair do transe. – Mas eu quero ver aquele esquema legal que você faz, com o resumo do que acontece nos capítulos.
— Óbvio, eu não esperaria você passar a noite inteira lendo e eu tenho um contrato de confidencialidade. Mesmo se você quisesse, não poderia ver essa magnífica obra de arte antes dos demais.
— Mas é claro, madame. — Fingiu desdém. — Por favor me mostre o que posso saber de sua obra, estou bem curioso. — Estendeu a mão para que ela o guiasse até a sala.
— Se toca, . — Riu e deu um tapa leve na mão do rapaz, andando sozinha até a sala. — Traz a garrafa pra cá — ordenou enquanto desbloqueava o notebook.
— Folgada — reclamou, mas não deixou de atender ao pedido.
Os minutos passaram rapidamente enquanto lia a esquematização dos capítulos e fazia comentários, na maioria das vezes reclamando de algo que os personagens fariam ou pedindo que ela mudasse algo, mas ambos sabiam que era uma brincadeira e que ela não mudaria nem se sua própria mãe pedisse. havia parado de beber o whiskey no segundo copo e era bem resistente ao álcool.
— Eu só não entendi uma parte. — e estavam sentados no sofá ainda discutindo sobre o livro. — Não tem final? Acaba assim, do nada? — Se apressou a explicar: — Não é uma crítica, mas cadê aquela pulga que você coloca atrás da orelha, que dá vontade de te estrangular pra saber a continuação? Só tem no primeiro? — A mulher não sabia o que responder, nem como. Não queria contar exatamente o que pensava em escrever, mas não tinha como contar sem dar os detalhes.
— Esse é o meu bloqueio. — Seu rosto exibiu um sorriso fraco, decepcionado.
— Essa é a parte que você fala sobre nós. O final é sobre nós dois. — Não eram perguntas. havia entendido o motivo da confusão e estava digerindo tudo que havia acontecido desde que deixaram de se ver. Nunca houve um ponto final definitivo, nem a conversa sobre o que eles sentiam. — Nós nunca tivemos essa conversa. A que você tem que escrever no livro. Nós não temos um final, é por isso que você não consegue escrever, você não sabe como a gente termina. — Dizia cada palavra com cuidado, como se fossem duras demais e pudessem a machucar. E pra ela realmente eram. Os olhos dela marejaram, e a única coisa que conseguiu fazer foi acenar com a cabeça. Os dois sabiam que tinham culpa na história. Livros com finais tristes vendem, mas o final desse ela queria muito que fosse feliz. Como ela não fazia menção alguma de continuar, emendou a conversa, tentando cegamente chegar a algum lugar. Afinal era pra isso que ele estava ali. — Você sabe que eu sempre gostei muito de você, . Eu não sei identificar sozinho onde foi que eu errei, ou que nós dois erramos.
— Eu sei. — Se referia às duas coisas. — Eu… — Se ajeitou no sofá e entrelaçou as mãos, tentando achar em si a confiança perdida para que se abrisse de vez. — Eu não sei o que você sente. Ou sentia, quando estávamos juntos. — reagiu com uma careta e a rebateria se ela não tivesse erguido a mão pedindo para continuar a falar. — Eu não tô falando da parte carnal. Nessa a gente se comunica bem demais. — Ele soltou um risinho, o que a deixou mais confortável em seguir em frente. — Eu não sei fingir que gosto de alguém, , não sou o tipo que sabe dividir. — Respirou e tentou não soar tão ridícula. — Te ver acompanhado no Brit Awards foi como uma martelada na boca do estômago. — Ele acenou com a cabeça, ainda digerindo o ponto de vista dela. — Eu sei que nós não tínhamos nada, mas foi depois do aniversário mais incrível de todos os que eu já tive, que não por coincidência foi com você.
— Eu não fiz pra te magoar… Eu nunca usaria ninguém pra isso e muito menos te magoaria de propósito. — A essa altura o clima era completamente de arrependimento. — Nós não tínhamos nada acordado como algo assim… Tão sério. Pensei que você também saísse com outros caras, e você também não apareceu no meu aniversário, nem disse nada. Isso mexeu muito comigo. — Ela não achou que ele sentisse algo parecido com o que ela passou. Medo, desconfiança, ciúmes.
— Eu fui — contou o que jurou a si mesma não falar a ninguém.
— O quê?
— Eu fui até o seu apartamento no dia do seu aniversário.
— Não, eu tenho certeza, eu não bebi a ponto de não lembrar. Eu não te vi lá. — se forçou a lembrar do dia da festa . Tinha certeza de que ela não tinha dado as caras. Afinal, esse foi um dos motivos de ter ficado com Sarah no dia, ele jurou que ela não apareceria e tentou achar algo que o distraísse e tirasse de órbita, não queria estar triste no dia do próprio aniversário. resolveu naquele dia ir literalmente nas últimas horas da festa. Em sua cabeça, encontraria o lugar mais vazio e conseguiria conversar com numa boa.
— Eu dirigi até lá, umas 4h da manhã… Eu não subi. Não consegui. — Lágrimas grossas e teimosas rolaram por seu rosto e tratou de limpá-las com os polegares. Vê-la chorando era horrível. — Te admirei na sacada, de dentro do carro. — E então, como se uma lâmpada acendesse em cima de sua cabeça, como nos desenhos animados, ele lembrou do momento. Entendeu o que ela quis dizer: ele e Sarah ficaram na sacada, ela tinha visto os dois juntos antes mesmo do Brit.
— Eu… Eu jurei que você não ia. — Nesse momento até seus próprios olhos marejaram. Ele sentia um misto de raiva e vergonha, só conseguia pensar em como seria diferente se não tivesse feito aquilo. — Que merda.
— Vi vocês juntos na sacada, e queria muito que fosse eu ali. — Arrancou um riso sem graça dos dois — Mas na outra semana, quando vocês foram juntos ao Brit, eu entendi que não era pra ser. Eu não nasci pra ser alguém que namora um cantor famoso, é muita informação pra mim.
— Isso não tem nada a ver, .
— Tem, você sabe que tem. — Ela nunca deixaria a teimosia de lado.
— Não, não tem. — Mas ele estava decidido. Eles resolveriam qualquer problema naquela noite. — Eu fiquei com ela porque queria esquecer que você não tinha ido. Eu movi mundos pra que você tivesse um dia perfeito no seu aniversário e você sequer tinha ido ao meu. É claro que eu senti raiva! Só queria que você tivesse aparecido. Seria tudo diferente. — Jogou a cabeça no encosto do sofá. o encarava enquanto também digeria tudo. Era o que ela precisava, saber o que ele sentia o tempo todo. Só assim conseguiria dar um final digno aos personagens. A verdade é que o relacionamento morno com era resultado da falta de clareza entre os dois.
— Obrigada, . — Ele a encarou sem entender bem ao que ela agradecia. — Por ter vindo e por ter me ajudado a entender o que aconteceu com a gente.
— Não tem pelo que agradecer, eu queria muito te ver. — Não havia mais motivos pra que ele não fosse sincero. — Acha que já consegue escrever o final agora?
— Com certeza. — Lançou um sorriso sincero. Estava triste em saber que tudo teria um outro rumo se ela não fosse tão ruim em expressar sentimentos, mas aliviada em saber que ele também se arrependia por não terem dado certo juntos.
— E como vai ser? — A pergunta não era só sobre o livro, ela sabia que ele esperava a resposta do que fariam em seguida.
— Bom, o personagem principal namora agora. Não há nada que ela possa fazer. — Ele pareceu voltar à triste realidade e seu semblante o acompanhou instantaneamente. e Sarah tinham um relacionamento sério, divulgado em toda a mídia. Contratos de publicidade juntos assinados. — Mas ela sabe que eles se amam, — falou com cuidado, sem olhar em seus olhos e teve certeza de que seu coração errou a sequência das batidas quando ouviu a frase. Ela estava falando deles e não dos personagens, mesmo que indiretamente. Saber que ela o amava o incendiou com as mesmas sensações que ele sentiu quando se conheceram, ele também a amava, muito, — e isso a deixa menos pior. — Continuou, buscando alguma reação em seu olhar e seguiu quando percebeu que ele entendeu. Sentiam o mesmo um pelo outro. — Quem sabe num terceiro livro o destino não faz ambos felizes? — concordou sorrindo e beijando a mão da mulher que amava. Ela o amava. Era incrível saber aquilo, era tudo que ele precisava.
— Quero te pedir um favor — disse o rapaz levantando.
— Você sabe que tem muito mais dinheiro que eu, né? Não sei se consigo te ajudar — brincou, mas ele respondeu só com um sorriso.
— Me dá um abraço forte. — Foi o suficiente para que ela risse, lembrando do dia que tinha usado a frase com ele. Tinha acabado de passar por um dia horrível e ligou para em busca de consolo. Tudo que ele fez foi abrir os braços para que ela se encaixasse. Ele sentiu por dias saudade daquele abraço, do cheiro do shampoo no cabelo dela, de como seus corpos se encostavam em busca de mais contato. Ela amava abraços apertados, o dele era o melhor. Por segundos teve a lembrança de dormir em seu peito, enquanto ele suspirava tranquilo. Mas tudo tinha acabado por erro deles mesmos.
— Eu quero te pedir um favor também — pediu e ele a encorajou a dizer, ainda abraçados. — Dorme aqui hoje? — Ele a encarou cogitando e calculando as consequências de tudo rapidamente. — Não nesse sentido!
— Eu entendi, dormir mesmo — respondeu.
— Isso! Você pode ficar no sofá, eu arrasto um colchão do quarto de hóspedes pra cá. — Ela sabia que era arriscado e que ele provavelmente negaria. Mas já estava colocando algo em prática para evitar arrependimentos: não perder oportunidades como antes.
— … — respirou fundo, mas ela já sabia a resposta e se desfez aos poucos do abraço — Eu…
— Não, , deixa. Não é certo mesmo. Foi uma péssima ideia, me desculpa.
— Desculpa, não é justo. Eu não posso agir assim só porque sei agora que você me ama.
— Eu não disse isso, convencido. — Sorriu, deixando o clima tenso ir embora.
— Você não consegue mais mentir pra mim. — Fez cócegas na mulher, que em poucos segundos estava jogada no sofá tentando se livrar das mãos do rapaz.
A campainha tocou, dando fim às gargalhadas e os dois levantaram indo até a porta.
— Ué! O que aconteceu? A comida era ruim? — não se surpreendeu em ver em pé na cozinha enquanto abria a porta.
— Literalmente! Em todos os sentidos! Foi horrível. — Jogou a bolsa no balcão e analisou as feições deles, apertando os olhos. — Mas aqui pelo jeito correu tudo bem — sugeriu maliciosa. estava vermelha e descabelada pelo ataque de cócegas, levemente ofegante.
— Não! — Responderam juntos, com medo de que ela pensasse errado.
— Quer dizer, tá tudo bem entre a gente, nós conversamos. Mas foi só isso. — completou. — Inclusive, tá na minha hora — disse abraçando e beijando a testa de . — Nós nos falamos — sussurrou e a mulher sorriu em resposta.
— Tá, eu quero saber TU-DO. — disse assim que a porta fechou.
— Mas você já sabe. — Riu do desespero da amiga. — Nós conversamos e tá tudo bem. Agora eu preciso escrever, parece que a inspiração finalmente voltou.
— Hã? Como assim? Eu quero saber! O que vocês falaram? O que acontece agora? Você disse pra ele o que você sente?
— Você vai saber, menina, se acalme. — sentou em uma das cadeiras esperando que ela contasse tudo e continuasse a falar, mas a autora deu as costas e voltou para o sofá com o notebook.
— ? Hello? To esperando!
— Mas eu não disse que seria agora, você vai saber quando ler o final do livro, que inclusive eu preciso escrever agora. — Colocou os fones e começou a escrever, deixando a amiga atônita. Mesmo estando brava, se sentia feliz e esperançosa de que seu casal favorito voltasse algum dia.