Última atualização:27/03/2024

PRÓLOGO

Você já se perguntou o que é o destino? Há inúmeras explicações para essa pergunta intrigante. Alguns acreditam que o destino é apenas uma questão de sorte, enquanto outros defendem que é regido por leis naturais e invisíveis. Há também quem enxergue o destino como um frágil fio vermelho atado aos nossos tornozelos, emaranhando-se com outros fios que se ligam a diferentes destinos, causando encontros e desencontros ao longo de nossas vidas.
Aos meus 20 anos, ainda não compreendo totalmente o que é o destino, apesar de acreditar nele. Desconheço as leis, sejam naturais ou sobrenaturais, que me conduziram à situação atual. No entanto, a sensação indescritível ao entrar naquele veículo permanece viva em minha mente. Seu couro preto, brilhoso e bem cuidado, refletia o zelo do seu dono. Ele possuía um cheiro de carro novo, um deleite para os amantes de carros. Logo, aquele agradável aroma foi substituído por uma essência ainda mais marcante, uma fusão de notas amadeiradas, café e cigarro. Foi então que percebi a presença de um homem já assentado no banco do passageiro à esquerda. Vestia roupas pretas, um tanto largas para seu corpo, com sapatos também pretos e brilhantes, bem parecidos com o couro bem cuidado do carro. Seus cabelos, meticulosamente penteados para trás, e a barba rala, mas bem aparada, denotavam um cuidado pessoal evidente. Contudo, seus olhos, distantes e tão sóbrios quanto o tempo naquele dia, exalavam melancolia e mistério. Não hesitei em ocupar o assento ao seu lado, uma vez que ele não parecia se importar com minha presença no veículo.
O proprietário do carro, o Senhor Memphis, nos conduziria até a imponente cidade de Magnolia, distante 231 quilômetros de Dowell, nossa cidade atual. Em contrapartida, nos direcionávamos para Magnolia, a cidade em que todos os sonhos são válidos, possíveis e realizáveis. Grande e imponente como seu nome, Magnolia revelava uma população e dimensão quase incontáveis, tamanho era o seu esplendor. Apesar de ser adornada por tantos adjetivos vantajosos, não me permitia ser ingênua ao ponto de aceitá-los sem questionar. Se observássemos além das belas paisagens de Magnolia, seria possível perceber o sangue que jorrava em seus becos escuros, uma violência banalizada. Famílias mantinham aparências, enquanto os sonhos esperançosos se despedaçavam facilmente, como uma taça de vidro lançada ao chão.
Sonho não foi minha motivação para ir a Magnolia, mas sim a dúvida e a sede por respostas. Eu precisava de respostas e sabia que só as encontraria indo até lá. Então, reuni meus pertences e combinei com o Senhor Memphis uma carona. Quando o carro deu partida e seus motores roncaram, girando as engrenagens e movimentando o veículo, olhei pela janela e percebi nuvens negras aglutinando-se no céu azul de Dowell. Em breve, uma forte tempestade nos alcançaria.
Após aproximadamente 30 minutos de viagem, olhei discretamente para o homem que estava ao meu lado. Até então, ele não havia dito uma palavra, apenas acenado com a cabeça quando entrei no veículo. Notei que ele havia adormecido e decidi fazer o mesmo. Não sei por quanto tempo dormi, mas percebi que minha paz havia sido interrompida por um estrondoso grito, indicando algo incomum prestes a acontecer.



CAPÍTULO 1 – A ESTRADA

Acordei atordoada com o estrondoso grito que ecoava dentro do carro. O veículo freou bruscamente, e o senhor Memphis, em uma tentativa de desviar de algo, girou o carro para a esquerda de maneira inesperada, fazendo com que eu batesse a cabeça na janela. Continuamos em linha reta, adentrando a floresta, e só paramos quando batemos em uma grande pedra. Ao sair, ainda estava tonta dos giros que o carro deu. Cambaleei para fora e apoiei meu peso contra o tronco de um pinheiro, recuperando o fôlego aos poucos. Olhei ao meu redor, tentando me localizar. O cenário me lembrava um conto de terror: fim de tarde nublado, névoa densa nos cercando e a tempestade que nos alcançara.

"Senhorita ! Senhorita ! A senhorita está bem?" - Perguntou o senhor Memphis.
"Sim, senhor! Tivemos sorte de estarmos vivos. O que aconteceu?" - indaguei.
"Foi um tronco, senhorita! Devido à névoa, quase bati o carro em um tronco que estava caído na estrada. Graças a Deus desviamos antes que o pior acontecesse" - explicou o senhor Memphis entre suspiros, claramente assustado.
"Você está sangrando, senhorita" - disse meu companheiro de viagem, estendendo um lenço que estava em seu bolso. Notei o fio escarlate escorrendo pela lateral da minha cabeça. Era a primeira vez que ele me dirigia a palavra.
"Obrigada, senhor" - agradeci, observando-o. Seus cabelos, antes perfeitamente penteados para trás, agora estavam bagunçados e molhados. Seus sapatos, antes lustrados, estavam sujos com a lama da floresta. Mesmo assim, permanecia um homem muito elegante.

Tentaram dar partida no carro, em vão. Nenhum barulho, nenhuma luz. Após verificar que o carro não funcionaria, pegamos nossas malas e caminhamos juntos pela estrada. A chuva aumentava, o vento soprava forte, e eu abraçava meu casaco na tentativa falha de me aquecer. A estrada estava deserta, e nossas opções de sair daquele lugar eram escassas.

"Se ficarmos aqui parados, morreremos de frio. Devemos seguir a pé, procurar abrigo ou ajuda" - disse o homem. Passamos para o outro lado do grande tronco e seguimos estrada acima.

Nossa caminhada durou pouco mais de 20 minutos; estávamos exaustos. A chuva e o vento forte persistiam, os relâmpagos iluminavam o céu, e os raios eram intensos. Contudo, uma luz vinda atrás de nós durou mais que o normal. Era uma pequena caminhonete, nossa salvação. A caminhonete parou ao nosso lado, e era difícil de enxergar quem estava dentro devido a intensidade da chuva. Ouvimos a buzina da caminhonete e a janela que estava do nosso lado foi abaixada. Dentro da caminhonete, havia um homem que aparentava ter uns 40 anos. Ele olhou para nós e nos chamou com a mão. Colocamos nossas malas na parte de trás da caminhonete, coberta por uma lona amarela, e entramos no veículo. O senhor Memphis estava no banco ao lado do motorista, e eu estava mais uma vez com meu colega de viagem no banco de trás. Nosso motorista iniciou a conversa com o sotaque carregado das pessoas que moram no interior.

"Boa tarde, pessoal! Vocês deram sorte de me encontrarem aqui na estrada. O jornal disse que a tempestade de hoje vai parar só amanhã", ele olhou para nós pelo retrovisor. "Me chamo Carl Bensson. Graças a Deus eu estava na minha cabana de caça, que fica próxima da estrada; senão, ninguém teria vindo ajudar vocês.
"É verdade, senhor. Obrigado pela ajuda!" – Disse senhor Memphis enquanto tentava, sem sucesso, enxugar o rosto com as mangas da blusa molhada.
"Sem querer ser intrometida, senhor, mas o que estava fazendo na floresta?" – Perguntei, curiosa.
"Sem problemas, senhorita. Eu trabalho na fazenda Hopevalley, sou faz-tudo, sabem? Aos fins de semana, eu e os outros trabalhadores vamos caçar, e estávamos na cabana onde sempre ficamos nessas ocasiões. Infelizmente, nossa caça foi interrompida pela tempestade, e todos voltamos para nossas casas. Eu vi o tronco que caiu na estrada, creio que o carro de vocês ficou do outro lado dele, né?
"Infelizmente sim! Quase batemos nele devido à neblina." – Disse senhor Memphis.
"Não se preocupem, irei levá-los até a fazenda que trabalho. Tenho certeza de que a senhora Hopevalley irá hospedar vocês. Ela é uma mulher muito conhecida e generosa aqui na cidade.
"Não queremos incomodar, senhor Bensson." – Respondi.
"Ela não irá se incomodar nem um pouco. Amanhã, quando a chuva passar, voltaremos aqui com alguns trabalhadores para retirar o tronco e recuperar o carro de vocês."

Bensson e senhor Memphis entraram em uma conversa sobre a fazenda e a cidadezinha em que estávamos, Pineville. No passado, a cidade era conhecida por suas minas de ouro, mas após o declínio desse produto, a economia quase entrou em colapso, fazendo com que as pessoas perdessem seus empregos, e criando um êxodo forçado. A cidade foi salva pela família Hopevalley, que investiu suas economias em produtos agrícolas, principalmente maçãs e morangos. A atitude dos Hopevalley salvou a cidade e impulsionou, principalmente, o comércio local. Isso gerou mais empregos, permitindo que as pessoas retornassem a Pineville. O investimento da família não apenas revitalizou a economia, mas também fortaleceu os laços comunitários. A cidade passou a ser reconhecida pelo otimismo e pela prosperidade. Pessoas de estados vizinhos visitavam a cidade para conhecer sua culinária, as fazendas e participar de pequenos festivais que aconteciam ao logo do ano. Eu já havia comido morangos daqui; eram os melhores do estado.
Decidi iniciar uma pequena conversa com o homem ao meu lado para criar um clima amistoso, já que ficaríamos mais tempo juntos do que o planejado.

"Creio que nossa noite não saiu como imaginávamos", ri desconfortavelmente.
"De fato", ele riu também. – "Sua cabeça está melhor, senhorita?"
". . Estou melhor sim. E seu nome, senhor?" – Perguntei.
". . É um prazer conhecê-la, mesmo nessas circunstâncias."
"Igualmente, senhor ." – Estendi a mão para cumprimentá-lo.
"Não me chame de senhor, não sou assim tão mais velho que você. Só está bom."

Eu já tinha ouvido esse nome antes. era um promissor detetive de Dowell, no início de sua carreira, mas já com certa fama. Já havia lido sobre ele nas colunas da polícia escritas pelo meu pai. era um detetive da polícia de nossa cidade. Eu acreditava que ele seria bem mais velho, próximo à idade de meu pai.

"Já ouvi falar de você. Alguns colegas trabalharam em casos em que você estava.
"E em que você trabalha, senhorita?"
"Sou jornalista. Talvez tenha lido uma coluna minha no Dowell Daily, na seção de crimes."
"Crimes, é? Não é comum que mulheres escrevam sobre crimes." – Ele sorriu de canto. Não como deboche, mas como surpresa. “Talvez eu tenha lido. Se não me engano, li uma notícia escrita por Nick . É algum parente seu?"
"Meu pai. Ele escreve para o Dowell's Post Office, o maior jornal da cidade. Não quiseram me contratar lá por causa dele."
"Me perdoe a intromissão, mas por quê?"
"Meu pai nunca quis que eu fosse jornalista. “Tornei meus olhos a estrada. Meu pai nunca quis que eu seguisse os passos dele. “Não me apoiou. Não tem problema, foi melhor assim. Não quero crescer à sombra dele. Desejo conquistar meu espaço e ser reconhecida pelo meu trabalho."

"Que assim seja" – Disse ele, e voltamos ao silêncio.

Observei pela janela as luzes da grande fazenda. Uma casa imponente aguardava por nós. Eu conseguia sentir o aconchego e calor de dentro da caminhonete. Como eu ansiava por uma cama quentinha e um copo de leite com açúcar. Só de pensar que teria isso em poucos minutos, já me sentia confortada.
A caminhonete estacionou em frente à residência da família Hopevalley. Bensson desceu do carro e foi à frente para falar com a dona da casa e explicar a situação. Depois de alguns minutos, ele retornou e nos convidou para entrar. Ao adentrar a casa, conseguia sentir o delicioso cheiro de madeira. Eu amo esse aroma, pois me lembra a casa dos meus avós. Eu era muito feliz lá, até as coisas mudarem...
A senhora Meredith Hopevalley, uma mulher muito elegante e encantadora, veio nos receber.

"Boa noite, meus queridos! Sejam bem-vindos à residência dos Hopevalley. Não se preocupem, Bensson me explicou tudo, e vocês poderão ficar aqui pelo tempo que precisarem", ela disse nos recepcionando.
"Obrigada, senhora! Agradecemos a sua hospitalidade", respondi. apenas acenou concordando com a minha fala.
“Vou pedir à Anne que mostre os quartos de vocês. Um para o senhor e outro para o casal” – disse ela com um sorriso. me olhou com um sorriso de lado. Fiquei ruborizada no mesmo instante.
“Não somos um casal, senhora! Estamos apenas viajando juntos” – ele respondeu.
“Oh! Nesse caso, pedirei a Anne que prepare mais um quarto.” – Ela riu sem graça. “Se troquem e acomodem-se. Pedirei que alguém leve o jantar para vocês. Amanhã teremos tempo para conversar e resolver os problemas do carro. Uma boa noite.”

Guiados por Anne, subimos as escadas até a ala dos quartos. No primeiro, ficou o senhor Memphis, e os seguintes eram para mim e .

"Boa noite, . Merecemos uma ótima noite de sono depois das desventuras de hoje."
"Igualmente, senhorita ! Nos vemos amanhã", ele respondeu.
“Apenas , por favor!”
. Vejo você amanhã” – ele disse e entrou em seu quarto.

Ao entrar em meu quarto, percebi que eram simples, mas bastante aconchegante. Troquei minhas roupas molhadas por um pijama quente gentilmente doado por nossa anfitriã. Envolta nas cobertas macias, adormeci. A noite passou sem incidentes, e o silêncio da fazenda era quebrado apenas pelo suave farfalhar das folhas, e pelo ocasional pio de uma coruja distante. Fechando os olhos, pude ainda sentir a tensão do dia se dissipando. A tempestade lá fora era apenas um eco distante enquanto me entregava ao abraço reconfortante do sono.



CAPÍTULO 2 – BEM-VINDOS A PINEVILLE

Abri os olhos e estava novamente naquela fazenda. Tudo estava exatamente como eu me lembrava. O farfalhar das folhas, o canto harmonioso dos pássaros e o zumbido distante das abelhas. Passei pela cerca de madeira e caminhei até a varanda. Lá estava ela, de costas, mantendo seu laço vermelho na cabeça. Usava um lindo vestido branco e vermelho com estampa de morangos, sua fruta favorita. Como ela adorava aquele vestido. Chamei seu nome, ela se virou e sorriu. "Como é bom te ver aqui... !"

Despertei. Tentei fechar os olhos na esperança de retornar ao sonho, mas foi em vão. Virei-me na cama para verificar o relógio na parede. Eram 7:00 horas da manhã, um desperdício. Poderia dormir um pouco mais, mas não conseguia. Fui ao banheiro no meu quarto e tomei um banho. A água estava tão gelada que quase me deu hipotermia. Eu poderia ter pedido água quente a alguém, mas não era do tipo que incomodava os outros. Depois de me secar e escolher um vestido simples e mais solto para o dia, me sentei na penteadeira para me arrumar. Passei uma maquiagem leve e ajeitei meus cabelos em um simples penteado. Olhei-me no espelho por algum tempo. "Até quando você vai carregar esse fantasma com você?"
Só percebi que tinha passado algumas horas encarando o espelho quando ouvi duas batidas na porta. Surpreendi-me com a voz de chamando do outro lado. Olhei-me novamente no espelho para garantir que estava pronta antes de ir ao encontro dele.

"Bom dia, senhorita ! Dormiu bem?" - perguntou.
"Continua me chamando de senhorita? Já disse que apenas '' está bom", respondi. "E sim, eu dormi bem. E você?"
"Como uma rocha. Aquela caminhada na chuva me deixou exausto! "Virei-me para fechar a porta e segui-o. "A mim também. Mal me deitei na cama e já apaguei."
"Vim te chamar para tomar café da manhã. O senhor Memphis já saiu. Ele foi com Bensson para a estrada verificar o estado do carro e trazê-lo aqui para consertar."
"Acho que vamos ficar aqui muito mais do que o planejado. Eu preciso chegar a Magnolia na próxima semana. Espero que esse acidente não atrapalhe muito os meus planos", disse enquanto caminhava pelo corredor ao lado dele.
"Pelo jeito é algo muito importante! Se não se importa, o que vai fazer lá?" - Ele questionou.
"Tudo bem! É uma entrevista de emprego, uma chance única! Trabalhar para o Magno Observer, apenas o maior jornal do nosso estado. Recebi uma ligação do escritório deles, disseram que o editor gostou muito do caso que escrevi para o Dowell Daily sobre o homem encontrado na mina de carvão."
"Eu li essa matéria. Não notei que era você. Você realmente tem muito talento, não que você precise da minha afirmação para isso, claro." – Ri. - "Tudo bem! É bom saber que gostam do seu trabalho."

Descemos as escadas, e na ponta da escada, Anne aguardava por nós. Ela informou que Meredith tinha ido ao centro da cidade para resolver alguns assuntos e não poderia nos acompanhar no café da manhã. Assim, ela nos levou para a área externa da casa, nos fundos, atrás da cozinha. Havia uma linda varanda toda de madeira com uma mesa menor para quatro lugares, já posta de maneira simples, mas arrumada. puxou a cadeira para que eu me sentasse e depois se sentou à minha frente. Anne se retirou para trazer a comida. Ficamos em silêncio por um tempo, observando a natureza ao nosso redor. Um lindo gramado, com arbustos floridos e uma cerca de madeira, e ao final, a densa floresta de pinheiros. Esse lugar me lembrava muito a casa dos meus avós. Como eu amava aquele lugar.

pigarreou. "Creio que nossa estadia aqui irá muito além do que imaginávamos!" Concordei com a cabeça. "De fato. Espero que o carro seja consertado logo e possamos seguir para Magnolia."
"Se não se importa, o que você vai fazer lá?" - Ele perguntou.
"Recebi uma oportunidade única. Fui chamada para uma entrevista para o Magnolia Observer."
"Não conheço muito de jornais, mas creio que deve ser muito importante. Espero que você consiga."
"Obrigada! E você, ? O que vai fazer em Magnolia?"
"Fui convocado para um caso policial. Um caso de desaparecimento. Parece ser grave demais, pois convocaram muitos policiais e investigadores como eu, mas não tenho muitas informações. Nosso contato foi muito rápido."
"Interessante! Quem desapareceu? Você pode me contar? Eu garanto sigilo!"
"Já está cavando uma matéria, é?" - rimos. "Mas não se preocupe, quando souber mais informações, deixarei passar algumas."
"Não se preocupe com isso. Eu sou curiosa e sempre descubro a verdade."

Depois de conversar um pouco, o desjejum foi servido por Anne. Como eu amo café da manhã na fazenda. Leite quente, um café de aroma delicioso, pão macio com manteiga que derrete na boca, entre outras coisas. Comi como se não houvesse amanhã, e creio que também, pois não falamos nada depois que a comida chegou.
Quando terminamos de comer, decidimos explorar a fazenda. Caminhamos próximo às plantações, envoltos em uma conversa sobre assuntos banais. Interrompi nossa troca de palavras para mostrar a um telhado vermelho desgastado que se escondia no final da extensa plantação.

"Parece ser grande demais para uma simples casa", comentei. "O que você acha que é?"
"Uma outra fazenda, talvez?" Ele concordou com a cabeça. "Faz sentido."

Decidimos voltar para a casa, e ao nos aproximarmos da entrada principal, notamos que Meredith havia retornado, mas não estava sozinha. Ela estava envolvida em uma discussão acalorada com um homem, e pela expressão deles, parecia ser uma conversa intensa. Quando chegamos perto o suficiente para ouvir a discussão, o homem se retirou.

"Sra. Meredith, algum problema?" Perguntei preocupada.
"Bom dia, meus queridos! Nada de novo. Não se preocupem, por favor. Era apenas o velho Abraham resmungando como sempre", ela disse enquanto se acalmava. "É um velho bastante rabugento que adora deixar as pessoas chateadas."
Queria deixar a discussão de lado, mas minha curiosidade foi muito mais forte do que eu. "Deve ser mesmo. Afinal, não consigo perceber como alguém poderia tratar mal a senhora, que é uma mulher tão bondosa", disse sorrindo.
"Obrigada, senhorita . Meu problema com o velho Abraham vem de muito tempo. Mas não vamos nos estressar com isso, por favor entremos. Quero apresentar a fazenda para vocês", ela disse, indicando a direção com o braço para que a seguíssemos.

************


Mais tarde, o senhor Memphis voltou com o carro guinchado na caminhonete do senhor Bensson. Bensson pediu que os acompanhasse até a mecânica, pois ele iria deixá-los lá para começar o trabalho e não poderia permanecer com o senhor Memphis. se despediu e dirigiu-se à oficina, enquanto eu continuei explorando a casa da fazenda com Meredith.
Caminhamos por um corredor adornado com fotos de seus familiares. Meredith compartilhou um pouco da sua história, revelando que ela e seu esposo haviam imigrado da Irlanda em busca de uma vida melhor na América. Parei diante de um quadro grande, uma foto mais jovem de Meredith ao lado de um homem notavelmente bonito e elegante. Ela percebeu meu interesse no quadro.

“Meu Patrick. Era um homem muito bonito, não é?" Ela sorriu tristemente, e eu concordei com a cabeça. “Éramos jovens e cheios de esperança quando viemos para cá. Conseguimos construir muitas coisas juntos com nosso esforço, mas a doença levou meu Patrick embora. Ele contraiu a gripe espanhola, ficou internado em um hospital distante, e eu nem pude me despedir dele", disse ela antes de continuarmos.

Fiquei sem palavras. Eu compreendia a dor de perder alguém tão querido. A saudade tem um gosto agridoce, e eu a detesto.
Percorremos os cômodos que pareciam cheios de histórias. Eu conseguia visualizar em cada um cômodo Meredith e Patrick pareciam ter sido felizes aqui. Ela também me confessou que eles tentaram ter filhos, mas nunca conseguiram realizar esse sonho. Ela me mostrou a sala de estar, adornada com móveis antigos e uma lareira; era um lugar completamente aconchegante, e cada item parecia contar sua própria história. A sala era rodeada por lindas estantes de madeira marrom repletas de livros. Conversamos mais um pouco sobre a fazenda e a cidade. Meredith me contou sobre o Autumn Festival, uma festa que acontecerá durante três dias para celebrar as colheitas e a prosperidade da cidade, e que eu e meus companheiros deveríamos aproveitar para conhecer mais dessa festa.
Minha curiosidade era muito maior que eu. Aproveitei o momento que estava a sós com ela pare perguntar sobre o velho Abraham e porque ele parecia não gostar dela. Tentei buscar a informação direto na fonte, mas antes que eu tivesse chance de perguntar algo fomos interrompidos por um dos empregados da fazenda. Meredith saiu me deixando sozinha na sala à deriva de meus próprios questionamentos.
Olhei para os lados, achando que talvez fosse algo da minha cabeça, e logo depois mais um barulho. Chamei por Anne e Meredith, mas ninguém respondeu. Mais uma vez o barulho. Subi as escadas devagar, lentamente para descobrir o que estava causando aquele barulho. Quando cheguei ao topo das escadas, o barulho ficou mais intenso, parecia que algo estava se arrastando pelo chão de madeira. Ao alcançar o topo, o som tornou-se mais nítido, como se algo arrastasse pelo chão de madeira. O corredor, apesar de ser pleno dia, estava mergulhado em sombras, sugerindo que essa parte da casa raramente era utilizada. Um corredor extenso, flanqueado por seis portas, e com uma porta ao final do corredor.
Enquanto me aproximava do final do corredor, o vento aumentava, fazendo as cortinas balançarem e permitindo que frestas de luz iluminassem o caminho. Notei um espelho ornamentado à minha direita. Ao me aproximar, horrorizada, percebi que meu reflexo estava distorcido, minha pele parecia ter sido cruelmente arrancada pelas garras de algum animal feroz.
Em pânico, soltei um grito e corri em direção à porta no final do corredor. Abri a porta abruptamente e a fechei atrás de mim, revelando um banheiro. O som da água corrente indicava que alguém estava na banheira, oculto pela cortina transparente.

"Olá", minha voz falhou, "Desculpe, não sabia que tinha alguém aqui... Eu sinto muito". Não houve resposta. De repente uma mão monstruosa, abriu a cortina. Era uma mulher, completamente desfigurada, meio cadáver, mas ainda com carne em algumas partes. Uma figura macabra emergiu, sua forma contorcida e desfigurada se esforçava para sair de dentro da banheira. O rosto, se é que ainda se podia chamá-lo assim, parecia ter sido corroído e rasgado por algum animal. Seus dedos esqueléticos e aquele olhar maldito se direcionavam para mim enquanto ela murmurava gemidos horripilantes. – Ela gemia meu nome sem parar. Gritei mais uma vez e me virei para abrir a porta.
Quando consegui, corri rapidamente pelo corredor, e notava enquanto o monstro se arrastava atrás de mim. Na tentativa de ver se o bicho me seguia tropecei dois cadarços de minhas botas e bati em algo. Gritei novamente até ser surpreendida pela voz de .

"! Calma, sou eu, . O que houve?" Ele me segurou.
"Eu... ... Havia algo lá dentro!" Gritei entre lágrimas, apontando desesperadamente. sacou sua arma, posicionando-se à minha frente.

me levou de volta ao corredor, mas não havia nada lá. Estava tudo intacto. Ele abaixou a arma e virou-se para mim, preocupado.

"O que você viu?" Perguntou ele.
"Uma mulher... ela estava completamente desfigurada, como um cadáver... eu não sei... eu..."
"Calma, . Está tudo bem agora. Deve ter sido algo que você viu, uma cortina ou um animal. Deve haver uma explicação lógica."
"Acho que não há explicação para o que eu vi... Eu tenho certeza do que vi... pelo menos eu acho. Como você me encontrou?"
"Voltamos da mecânica e perguntei à Anne onde você estava. Ela disse que você estava na sala de estar. Quando cheguei lá, escutei seus gritos e vim atrás de você."
"Obrigada, ! Vamos descer e encontrar os outros." Quando estávamos prestes a descer as escadas, segurou gentilmente meu pulso, fazendo-me virar para ele.
", só para deixar bem claro, eu acredito em você. Vamos descobrir o que está acontecendo." Ele acenou com a cabeça, e descemos juntos as escadas.
Se antes eu tinha questionamentos, agora elas pipocam na minha mente. Eu não sei o que está acontecendo, mas sei que há algo muito estranho acontecendo em Pineville, e eu vou descobrir.





CAPÍTULO 3 – A BOLINHA VERMELHA

’s POV

O dia estava ainda mais quente do que quando eu estava na fazenda. Segui no carro com o senhor Memphis em direção à oficina, localizada no centro urbano de Pineville. Segundo ele, chegaríamos em 30 minutos. No início de nossa pequena viagem, conversamos sobre assuntos banais, como clima, paisagem e carros, até que o assunto mudou para algo inesperado.

"Você está aproveitando bastante a companhia da senhorita , não é?" - Disse ele, mantendo o foco na estrada. "Ela é uma moça muito gentil. Conheço seus pais desde a mocidade. Me alegra muito saber que, apesar de tudo o que houve, ela parece estar bem."
"O que o senhor quer dizer com isso?" - Perguntei curioso.
"Ah... me desculpe, meu jovem. Creio que você não sabe da história. tinha uma irmã, e em uma viagem, a ela acabou morrendo. Depois disso, segundo os pais dela, ficou bem estranha. Passou a ter muitos pesadelos e falar de coisas que não existiam. Pobre menina! Ficou doida do juízo!" - Ele balançou a cabeça de um lado para o outro e torceu a boca com uma expressão de pena. - "Estou comentando isso porque, caso ela lhe diga algo estranho, você entenda e acolha a pobre menina!" - Concluiu.

Murmurei em concordância, sem me aprofundar muito em um assunto tão delicado. me parecia muito segura de suas faculdades mentais. Entretanto, essa nova informação me deixou alerta.
Ao chegarmos à oficina, fomos ao encontro do mecânico. Depois de alguns minutos de conversa, só recebemos más notícias. O carro teve peças importantes muito danificadas e que não havia na cidade. Todas as peças necessárias para que o carro voltasse a funcionar só chegariam depois de 1 semana. Tentei pedir dicas de algum tipo de transporte que pudesse nos levar para as cidades vizinhas, mas só recebi notícias que contrariavam minhas expectativas. Não havia ônibus ou carros que pudessem sair de Pineville. Após as chuvas, a estrada estava totalmente bloqueada. Isso significava que estávamos presos por alguns dias.
Retornamos inconformados com as notícias, mas não havia muito a ser feito. Quando chegamos à fazenda, perguntei a Anne onde estava. Ela me disse que estava na sala de estar. Ao me aproximar, ouvi seus gritos desesperados. Corri para o segundo andar e a encontrei. Ela estava encolhida, cobrindo o rosto com as mãos como se estivesse se protegendo de algo. Perguntei o que havia acontecido, e ela me explicou ter visto alguém no banheiro que ficava no final do corredor. Sacando minha arma, entrei no cômodo, mas não havia ninguém lá. Lembrei imediatamente da conversa com o senhor Memphis mais cedo. Estaria tendo algum tipo de surto ou crise? Fiz como ele me pediu e a acolhi. Antes de descermos as escadas, segurei-a gentilmente pelo pulso e disse: " , só para deixar bem claro, eu acredito em você. Vamos descobrir o que está acontecendo."

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’s POV

Quando desci as escadas, uma mistura de emoções tomou conta de mim. Eu estava envergonhada por ter cedido ao medo e queria evitar qualquer constrangimento desnecessário. Era como se estivesse lutando contra minhas próprias fraquezas, tentando manter a compostura diante daquele sentimento familiar. Decidi então pedir a que guardasse segredo sobre o que aconteceu. Não queria olhares estranhos sobre mim pelos motivos errados. Decidi seguir para o meu quarto para tentar recuperar um pouco de calma e sanidade. Fechei a porta atrás de mim e me deitei na cama. As paredes do quarto pareciam fechar-se ao meu redor, o ar tornando-se mais denso a cada segundo. Por que estou tendo essas visões novamente? Tentei afastar os pensamentos intrusivos, focando em controlar a minha respiração. "Fique calma, ", repeti para mim mesma, como um mantra silencioso. "Está tudo apenas na sua cabeça." As janelas estavam abertas e uma brisa fresca e reconfortante entrava por elas. Eu adoro sentir o vento entre meus dedos. Gradualmente, comecei a relaxar e me envolver em um suave sono. Era tudo o que eu precisava naquele momento.
Quando acordei, o sol já estava alto no céu e o aroma tentador do almoço flutuava pela casa. Abri os olhos devagar, espreguiçando-me na cama. Levantei-me com calma e me espreguicei mais uma vez, sentindo os músculos relaxarem. As cortinas tremulavam suavemente com a brisa que entrava pelas janelas abertas, e eu me aproximei da janela para sentir mais dela. Lá de cima pude observar concentrado lendo um livro na varanda. Naquele momento, me senti aliviada por tê-lo como companheiro de viagem e pelo acolhimento que me foi dado. Tomei um banho frio para despertar, troquei de roupa e desci para almoçar. Ao chegar ao final da escada, encontrei-me com Anne, que estava espanando alguns itens da estante.

“Boa tarde, senhorita! Como está se sentindo? comentou que você estava indisposta”, disse ela preocupada.
“Deve ter sido o calor. Obrigada, Anne, já estou me sentindo melhor. Onde estão todos?”, perguntei olhando ao redor.
“A senhora Hopevalley está resolvendo assuntos da fazenda. O senhor está lá fora, lendo na varanda, e o senhor Memphis está dando uma volta pelos arredores da fazenda.” – Ela respondeu prontamente, me dando o paradeiro dos demais.
“Todos já comeram?", perguntei, ao me aproximar dela.
"Sim, senhorita! Você gostaria de comer agora? É melhor comer algo para que não passe mal novamente", ela continuou, preocupada com meu bem-estar.

Agradeci a gentileza de Anne e neguei com a cabeça. Os eventos anteriores haviam tirado minha fome, embora o delicioso cheiro da comida parecesse muito convidativo. Segui até onde estava lendo.

"O Misterioso Caso de Styles, de Agatha Christie. Um detetive lendo um livro sobre crimes, isso é um tanto engraçado", comentei enquanto me acomodava na confortável cadeira à frente dele.
Sem tirar os olhos do livro, respondeu: "E qual tipo de livro você acha que eu leio?"
"Pensando bem... Talvez 'O Pequeno Pastor do Reino dos Céus'?", sugeri.
"Uma história sobre a guerra civil americana? Não faz muito o meu estilo, se me permite dizer. Mas já li e achei muito bom!", disse ele, fechando o livro e se ajeitando na cadeira para me encarar. colocou o livro na pequena mesa redonda ao seu lado e se inclinou em minha direção, apoiando o queixo na mão. "E você, senhorita ? Tem cara de quem gosta muito de romances, como os das irmãs Brontë, certo?"
"Como um bom detetive, o senhor deve lembrar que não se deve julgar pela aparência. Eu leio sim alguns romances, porém meus favoritos são os livros do senhor Edgar Allan Poe!"
"Muito bem! Parece que temos gostos muito parecidos, não acha?", disse ele, sorrindo de lado.
"De fato, senhor ", concordei, apertando sua mão. "Eu gosto muito de histórias misteriosas assim."
"Foi isso que a fez seguir na carreira de jornalista? Gostar de mistérios?”, perguntou ele, ajeitando-se em sua cadeira mais uma vez para uma posição mais confortável.
"Um pouco! O que realmente me motivou a seguir jornalismo foi observar o trabalho do meu pai. Sempre amei histórias e adorava ler as coisas que ele escrevia. Eu sempre gostei de escrever também, o que já me ajuda bastante. E você, por que escolheu ser detetive?"
"Não sei explicar... Sabia que não queria ser médico ou advogado como meus irmãos. Também compartilho o amor pela leitura e pela escrita, como você. Além disso, gostava muito de jogos de lógica e de brincar de encontrar coisas com meu pai, principalmente caça ao tesouro", explicou ele, e nós dois rimos. "Acho que foi um pouco de tudo isso."

Ficamos em silêncio por alguns instantes, observando a linda paisagem à nossa frente, até que retomou a fala: "Temo ter más notícias, . O mecânico disse que não há peças de reposição para o carro, e não há transportes ou estradas que possam nos levar a Magnolia. Melhor você ligar para o jornal de lá e pedir mais tempo a eles. Farei o mesmo com meu contato da polícia."

Baixei os olhos para minhas mãos. Definitivamente, o destino não estava facilitando as coisas para nós.

"Bom, considerando que não há mais o que fazer, devemos ficar aqui até que as coisas sejam resolvidas, não é mesmo?", sugeri, olhando para .
Ele concordou com a cabeça e eu continuei: "A senhora Hopevalley me falou do festival que haverá na cidade. Pelo menos teremos algo para nos distrair de nosso infortúnio."
"O Festival de Outono? Vi que as ruas já estão ficando decoradas. As pessoas do centro parecem estar muito empolgadas com os preparativos. Talvez nosso infortúnio não seja tão ruim assim. Podemos encarar como uma pequena pausa em nossas rotinas", sugeriu ele, sorrindo.
"Pois bem, que assim seja!", concordei. Quando terminamos de conversar, ouvimos um barulho vindo dos arbustos próximos à varanda. Parecia algo se movendo apressadamente entre as folhagens. Levantei-me de minha cadeira e me aproximei do arbusto com passos lentos, cautelosa. levantou-se também e ficou me observando da varanda.

Com medo de ser um animal peçonhento, peguei um galho seco à minha direita, pronta para me defender. Mas, para minha surpresa, um pequeno cachorrinho da raça Boston Terrier saltou do meio dos arbustos e correu em minha direção. Virei-me para e acenei para que ele viesse até mim e ao pequeno canino. Abaixei-me para fazer carinho em sua cabeça.

"Olá, pequenino! Como você veio parar aqui? Você tem nome?", perguntei, verificando se havia alguma identificação em seu pescoço. Havia apenas um nome pouco visível em uma medalha dourada e arranhada, presa em sua coleira rosa, extremamente suja e desgastada. "Ed... Edith! Você está perdida? Você é uma dama, não é? Olá, Edith... Como você veio parar aqui?", falei suavemente enquanto rapidamente se aproximava.
"Veja, , quero te apresentar nossa amiga Edith. Ela é uma dama."
"Edith? Que nome incomum para dar a uma cadela...", comentou ele.
"De fato! Você viu algum cartaz de 'procura-se' por ela pela cidade? Ela não me parece ser uma cachorrinha de fazenda, mas julgando pela coleira, faz algum tempo que deve estar aqui."
"Não que eu lembre. O que faremos? Somos apenas hóspedes aqui. Será que nossa anfitriã deixaria ficarmos com ela até descobrirmos seus donos? Quem sabe ela até mesmo os conheça. Vamos levá-la para dentro, venha!", disse , pegando-a no colo enquanto seguimos de volta para a casa da fazenda. Brincamos com ela durante a tarde, e quando Meredith apareceu, ela nos informou que não sabia quem eram seus donos. Segundo ela, essa raça de cachorro era bem comum por lá, e era comum também encontrar cachorros perdidos pela fazenda.
Ela disse não se importar se ficássemos com Edith durante nossa estadia, mas que deveríamos banhá-la antes de deixá-la entrar na casa e sermos responsáveis por ela.

*****************************


Após o jantar, subi para meu quarto com Edith. Deitei-me em minha cama, e ela deitou-se no tapete, confortavelmente. Apesar da brisa fria, e aconchegante da noite que entrava calmamente pelas cortinas, não conseguia dormir. O relógio do andar de baixo tocou à meia-noite como de costume, e dessa vez já estava desperta. Notei que Edith arranhava a porta do quarto com certa pressa. Coloquei meu robe e segui para acalmá-la. Não podia deixá-la arranhar uma porta que não era minha. Edith começou então a latir sem parar. Abri a porta antes que ela acordasse todos na casa. Ela correu para o banheiro que ficava no final do corredor.
Esta hora a casa tinha uma atmosfera um tanto quanto amedrontadora. Havia apenas as luzes fracas de três lâmpadas que haviam no corredor. Edith passou a arranhar a porta do banheiro. Por que logo essa porta? Caminhei lentamente, não querendo acordar os demais hóspedes que estavam em meu andar, e chamei Edith em meio a sussurros: "Edith... volte. Edith." Quando a alcancei, ela circulou pelas minhas pernas e tornou a arranhar a porta. Abri a porta a contragosto e Edith sumiu na escuridão do banheiro. Dei um passo para trás a fim de me proteger de qualquer coisa ruim que se escondesse nas sombras daquele cômodo. Chamei Edith mais uma vez, enquanto estalava meus dedos. "Por favor, Edith, vamos voltar. Venha!" Ela pareceu entender o que eu dizia, pois retornou de lá, porém trazia em sua boca uma pequena bolinha vermelha. A bolinha estava muito gasta e suja, e não me lembrava de tê-la visto na manhã mais cedo. Creio que mesmo que a visse não me lembraria. Passei a ouvir murmúrios agonizantes, piores que os da manhã.
Rapidamente, peguei Edith em meu colo e corri para meu quarto. Antes de fechar a porta, notei a mesma mulher retorcida de hoje de manhã mancando em direção ao meu quarto. Tapei minha boca para não gritar e tranquei a porta em total desespero. Ainda com Edith no colo, me escondi dentro do guarda-roupa de madeira que havia em meu quarto. Ajoelhei-me e coloquei Edith no cesto dos lençóis que havia lá dentro. Ela estava entretida com a bolinha que ainda estava entre seus pequenos dentes. Havia lágrimas em meus olhos, mas eu precisava me concentrar. Repeti para mim mesmo com um mantra: "É apenas sua cabeça, , está tudo em sua cabeça".
Depois de alguns minutos, nenhum barulho podia ser ouvido do lado de fora. Edith parecia estar mais calma. Quando saímos de nosso esconderijo, ela caminhou ao lado da cama onde estava antes e continuou brincando com sua bolinha, deitando-se em seguida. Deitei-me em minha cama, fechei os olhos e passei a respirar fundo a fim de controlar minha respiração. Quando consegui recuperar o fôlego, me virei para desligar o abajur, então apenas a luz da lua iluminava a escuridão do quarto. Ao deitar-me novamente, ouvi. Dessa vez muito alto e próximo a mim, pude escutar o grito da criatura. Ela estava lá. Sobre a cama, com o rosto próximo ao meu. Gritei alto, o som ecoando pelas paredes vazias, enquanto a figura avançava em minha direção, uma visão de pesadelo ganhando vida. Ouvi de longe o som de batidas na porta, meu nome sendo chamado, e em seguida a escuridão tomando conta de tudo. Seria assim que eu iria morrer?







Continua...



Nota da autora: Queridas leitoras, obrigada por favoritar e/ou comentar no prólogo de Sombras do Entrelace. Gratidão! Gostaria de informar que criei um espaço para nós. Acesse meu blog no Tumblr, Detalhes & Rascunhos, e conheça um pouco mais sobre mim e sobre minhas futuras histórias e algumas curiosidades sobre Sombras do Entrelace. Basta clicar AQUI <3.

Espero que tenham gostado do capítulo 1! Estou ansiosa para saber o que vocês acharam.
Até a próxima.





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