Novembro 2016

Virou seu quarto copo de uma única vez, sentindo o conteúdo queimar por sua garganta enquanto o gosto cítrico permanecia por algum tempo em seu paladar.
O barman ainda olhava o cliente, esperava que ele caísse em um coma alcoólico ou algo pior, Knockeen Hills não era uma bebida que qualquer um aguentava.
Homens mais velhos, ou mesmo os adolescentes que desafiavam-se entre si para tomar o drink, raramente passavam de duas rodadas.
A bebida irlandesa estava na lista das mais fortes do mundo com nada menos que 90% de álcool.
Quando o barman viu o cliente fazer um novo sinal para encher o copo, negou.
- Você já passou muito do limite, confie em mim, você não vai gostar da ressaca de amanhã.
Viu-o baixar a cabeça por alguns instantes, respirando fundo antes de tornar a olhá-lo e concordar com um aceno, mesmo que contra sua vontade.
No fundo o rapaz não se importava com a ressaca, só queria poder tirar alguns pensamentos da cabeça, mesmo que momentaneamente.
Por fim, virou-se na banqueta do balcão e colocou os dois pés no chão, por um momento sentiu tudo girar e as paredes aproximarem-se dele, uma leve sensação claustrofóbica o atingiu. Fechou os olhos passando as mãos pelo rosto antes de olhar para baixo, tomando cuidado para não cair.
Andava devagar até a saída, um pé de cada vez, deveria ser uma tarefa fácil, mas no momento era quase como se ele fosse uma criança dando seus primeiros passos cambaleantes e incertos.
Assim que abriu a porta do pub, um vento frio bateu em seu rosto, vindo junto com todo o barulho que começara a incomodar seus ouvidos, após tanto tempo com apenas um zumbido de conversas baixas e um jazz ao fundo.
Pessoas falavam alto, carros passavam com o som ligado, alguns buzinavam.
As luzes amareladas dos postes de iluminação logo atingiram seus olhos claros.
Resmungando, ele pegou seus óculos de sol da gola da camisa social e os colocou.
Não fazia ideia do horário, nem se importava, mas seu cérebro identificou rapidamente que já estava escuro, e as ruas movimentadas apenas por adolescentes e pessoas bêbadas e de roupas curtas, o informavam que já devia ser alguma hora da madrugada. Não devia ter ficado menos de dez horas no pub, visto que chegara pouco depois das duas da tarde...
Passou a língua pelos lábios finos antes de voltar a dar passos cambaleantes em direção a seu hotel.
Não devia estar em um bom estado, visto que as pessoas que passavam por ele o olhavam com certo receio. Não se importava, no entanto.
Por que, diabos, deveria se preocupar com a opinião alheia? Não voltaria a encontrar nenhuma delas tão cedo.
O vento gelado não o incomodava, provavelmente devido ao álcool em seu organismo, mas o fez questionar levemente o motivo de não usar uma roupa mais quente com os dias ficando cada vez mais frios...
O The Dead Rabbit Grocery and Grog era longe do hotel, mas fora o único pub decente que encontrara em Nova York.
Era o único que o fazia sentir-se em casa.
Mas ele sabia que não tinha condições de andar as várias quadras de volta, não naquele estado deplorável.
Continuou andando até encontrar um ponto de táxi, e quando o encontrou entrou no carro mesmo sem saber se ainda estava em serviço.
Dane-se se o homem quisesse continuar dormindo no banco da frente.
Ele não recusaria dinheiro.
O mundo era corrupto demais para alguém recusar dinheiro, principalmente quando o cliente estava visivelmente bêbado, o que significava troco errado.
Encostou-se no vidro gelado no banco de trás, apenas sussurrando o nome do hotel em que estava hospedado.
O taxista que se virasse para encontrá-lo, o irlandês não estava em condições de se preocupar com o caminho que o motorista faria para cobrar mais caro pela corrida.
Dinheiro era a menor das suas preocupações no momento, quase sorriu com a ironia daquele pensamento.
Fechou os olhos ouvindo a música baixa que tocava na rádio, ao fundo ainda escutava o barulho que vinha de fora, mas estava cansado demais para importar-se com qualquer coisa.

Novembro 2015

Passou a chave na porta de mogno escura, com a pequena placa dourada do 240, e então a guiou pelo quarto, parando próximo as grandes janelas abertas.
Ela abriu os olhos assim que ele retirou a faixa que cobria boa parte de seu rosto, e a primeira coisa que seus olhos focalizaram foi o sorriso na face do outro, antes dele puxar-lhe pela mão apontando para a janela.
O pequeno sorriso que ela tinha começou a alargar-se por seu rosto, à medida que olhava encantada para todas as luzes logo abaixo deles.
Aproximou-se ainda mais, encostando-se na grade da pequena sacada e inclinando-se para a frente. Mordeu o lábio inferior virando-se para ele, os olhos brilhando e o sorriso preso em seus lábios.
- É incrível! Como conseguiu?
O deu de ombros, colocando as mãos no bolso da calça, um sorriso esperto brincando nos lábios finos.
- Tenho meus contatos.
- Deve ter custado mais caro do que toda a festa e as passagens de avião para cá! - comentou em voz baixa. Sabia o quanto ele tinha trabalhado no último verão, fazendo horas extras para conseguir pagar tudo aquilo.
Ele negou com a cabeça.
- Não pagamos nada pelo quarto. O dono é um amigo antigo do meu pai...
Ela riu concordando.
- Eu prometi te dar tudo, não foi? Nova York é sua, pelo menos por uma semana.
A mulher deu pequenos passos para frente, passando os braços pela cintura do outro.
- Você é incrível, sabia disso?
- Sabia. - afirmou convencido antes de abaixar-se ligeiramente, beijando-lhe a testa. - E você é a melhor coisa que aconteceu na minha vida.

Ouviu o motorista chamar-lhe, o cutucando no braço irritantemente.
Ao que parecia, já haviam chego há algum tempo.
O mais novo colocou a mão no bolso, retirando a carteira e entregando alguns dólares ao homem de camisa xadrez com cara de poucos amigos, sem realmente importar-se com o quanto estava dando. Visto que o homem não reclamou, foi obviamente dinheiro a mais.
Abriu a porta e saiu do táxi, seguindo até a recepção do Courtyard New York Central Park. O rapaz com o uniforme de colete vermelho escuro e chapéu engraçado segurou a porta para que o irlandês entrasse, saudando-o com um boa noite educado.
Parou cambaleante em frente à recepção, na qual o gerente cheio de gel no cabelo o olhou desconfiado, confirmando seu nome antes de entregar-lhe a chave do quarto.
andou lentamente até os elevadores, entrando no primeiro que estava no térreo e apertando o 24°.
Escorou-se na parte espelhada, encarando o reflexo de sua própria imagem.
Retirou os óculos escuros dando uma boa olhada em si mesmo.
Os cabelos s embora curtos e cheios de gel, estavam totalmente bagunçados.
Talvez devido ao vento, talvez devido à quantidade de vezes que passara as mãos desesperadamente por eles, puxando-os para todos os lados.
O rosto fino e magro parecia mais magro que de costume, possivelmente por não comer bem há dias.
As bolsas ao redor dos olhos lhe davam um sinal de cansaço e o faziam parecer mais velho, assim como as olheiras arroxeadas devido às muitas noites de insônia.
Os olhos estavam mais escuros e a cor vermelha em volta era totalmente visível, tanto pelo choro interminável quanto pelo vício em cigarros.
Sua barba por fazer crescia de forma irregular, tinha algumas falhas próximas ao queixo devido a cicatrizes antigas.
Olhou para suas roupas, completamente amarrotadas.
O terno preto tinha o cheiro do whisky que ele derrubara horas antes e o colarinho da camisa social branca estava sujo, uma cor amarronzada em torno do mesmo. A gravata preta estava mais folgada do que horas antes e a ponta molhada, visto que limpara a bebida que escorrera pela boca com ela.
Virou-se quando o elevador parou em seu andar, com um leve solavanco, as portas de metal abrindo em seguida. Suspirou andando pelo corredor acarpetado encostando-se na batente da porta do 204 enquanto passava a chave para abri-la.

Novembro 2015

A garota entrou correndo pela porta, jogando a chave na cama, junto com sua bolsa.
Tirou a jaqueta escura e as botas marrons balançando os cabelos molhados, tentando inutilmente secá-los. riu por um segundo, antes de tirar boa parte da própria roupa, totalmente molhada.
Reparou nos braços arrepiados da menor enquanto ela abria a mala para puxar algumas roupas secas e confortáveis.
- Eu disse que não era uma boa ideia sair nessa chuva.
- Achei que era só uma garoa, não imaginei que Noé estaria construindo outra barca tão cedo. - deu de ombros antes de levantar-se e andar para o banheiro, tirando a camiseta durante o percurso. - Você vem?
demorou dois segundos para entender a pergunta, retirando a blusa verde rapidamente, foi quase correndo ao ouvir o chuveiro sendo ligado.

Retirou os sapatos sociais, deixando-os espalhados pelo quarto, enquanto puxava o nó da gravata até conseguir tirá-la por completo.
Sentou-se na grande cama de casal, retirando o terno e jogando-o no chão.
Deixou-se cair de costas no colchão, olhando para o teto claro, respirou fundo, fechando os olhos em seguida.
Soltou o ar devagar, sentindo o nó na garganta voltar aos poucos.
Colocou as mãos no rosto, esfregando-o com força, sentia a vontade de chorar voltar a crescer em seu peito, porém respirou fundo mais algumas vezes, soltando o ar lentamente.
Queria gritar, tirar todo aquele peso dos ombros, tirar aquela sensação de seu corpo de alguma forma...
Ouviu o celular tocar e retirou-o do bolso, vendo o nome do melhor amigo piscar na tela. Jogou-o contra a parede, escutando o barulho quando o mesmo caiu no chão aos pedaços.
Passou a língua pelos lábios finos antes de voltar a sentar, as costas curvadas para frente.
Não sabia o que fazer, não sabia o que pensar.
Levou as duas mãos a camisa, abrindo os botões um por um, de cima para baixo. Quando estava no terceiro olhou para sua mão esquerda. O anel brilhando em seu dedo anelar.

virou a taça de cristal tomando todo o conteúdo e então tocou na ponta da taça da garota, erguendo-a levemente. Eles riram quando um pouco do champagne escorreu pela boca dela, retirou a taça da mão delicada, dando um beijo no canto dos lábios, no local em que a bebida tinha escorrido, colocando-a junto a sua no bidê ao lado da cama, virando-se para a mulher que mantinha o sorriso bobo no rosto.
- O quão bêbada você está nesse momento?
piscou lentamente, passando a língua pelos lábios, franziu o cenho por alguns segundos, dando de ombros em seguida.
- Não faria nada que eu fosse me arrepender amanhã...
O homem riu roucamente, tornando a aproximar-se, passou um braço pela cintura dela, beijando-lhe o pescoço.
- Por exemplo, isso, eu sei que eu com certeza não me arrependerei!
Comentou abrindo os botões da camisa que ele usava, um sorriso travesso em seus lábios, antes de inclinar-se para beijá-lo.

Sentiu novamente o peso atingir seu ser, o coração apertar e a vontade de chorar tomar-lhe por inteiro.
Levou as mãos aos olhos, virando as palmas e forçando-os por breves momentos.
Deslizou as mãos sobre o rosto, deixando apenas os dedos sobre os olhos, não se permitia chorar, não de novo. Soltou o ar de uma só vez, olhando para frente, levou as mãos à camisa, tirando-a e jogando ao chão.
O silêncio prevalecia no quarto, a angustia parecia atingir-lhe mais forte dessa forma.
Pegou o controle remoto ao lado da cama, voltando a sentar-se na beirada do colchão enquanto ligava o aparelho. Não tinha nada que quisesse assistir. Nenhuma programação o interessava naquele momento, mas não podia mais ficar no silêncio.
O barulho o incomodava, mas a falta dele o matava aos poucos.
Fazia o medo crescer em seu peito e seu coração ser tomado pela tristeza e desespero.
Encarou a televisão por breves momentos, mudou de canal algumas vezes, mas desistiu ao perceber que nada prenderia sua atenção por mais de dois segundos.
Levantou-se andando até próximo à janela, olhando a cidade e todas as suas luzes, abriu os vidros deixando a brisa gelada passar sentindo seu corpo arrepiar-se levemente.
Ainda podia sentir o gosto da cevada em sua boca, assim como via as luzes borradas devido ao álcool.
Infelizmente não parecia o suficiente para sufocar todas as lembranças e pensamentos que o assombravam há tantos dias.
Encostou a cabeça no vidro gelado, cruzando os braços enfrente ao peito desnudo.
Olhou o relógio digital próximo à cama, 2h30 da manhã.
Deixou seu olhar cair sobre o smartphone desmontado próximo a televisão, deveria ter ligado para os pais para avisá-los que tinha chegado, sua mãe deveria estar tão preocupada, deveria avisar que estava bem.
Embora esse estar bem fosse relativo.
Estava doente.
Emocionalmente ferido, a dor era tanta que chegava a ser física.
Sentia como se alguém, aos poucos, esmagasse seu coração tamanho o aperto que tinha no peito.
Sentia como se alguém pegasse seus pensamentos e todas as suas lembranças e as pintasse de cinza, preto e branco.
Era como se olhasse por aquela janela no vigésimo quarto andar e, por mais que seus olhos visualizassem todas as cores e seus ouvidos escutassem o barulho, tudo o que via era um filme de Charlie Chaplin.
Era tudo preto, branco e silencioso.
Um silêncio absurdo que o envolvia e o amarrava com força.
Parecia que carregava uma grande nuvem negra sobre sua cabeça.
Era como se chovesse em todos os momentos e guarda-chuva nenhum pudesse protegê-lo.
Sentia uma vontade absurda de dormir e não acordar.
De ficar quieto em um canto esperando que algo ou alguém viesse encontrá-lo e então levá-lo para um lugar melhor, um lugar no qual ele pudesse sentir-se em paz.
Para um lugar no qual tudo fizesse sentido novamente, que as cores voltassem para seus devidos lugares, que a nuvem se dissipasse e o sol voltasse a brilhar.

Queria encontrar uma forma de fazer todos esses sentimentos angustiantes que o envolviam aos poucos sumirem, não importava como, apenas queria que fossem embora.
Sentia como se nada mais fizesse sentido, era como quando visitava galerias de arte moderna com , não entendia nada o que estava acontecendo, não conseguia perceber o que aquilo significava, nada daquilo fazia sentido em sua cabeça.
Para ele era um monte de rabisco, sucata e figuras desconexas com um tanto de tinta misturada, para outras pessoas aquilo era a mais pura e bela arte.
Ele queria que sua vida voltasse a ser uma bela obra de arte, não precisava ser um Van Gogh ou Monet.
Se contentaria se fosse feita por um artista de rua desconhecido.
Não seria sempre colorido, mas no final era o suficiente para fazê-lo dormir com um sorriso no rosto. A chuva viria como de costume, mas logo depois o sol tornaria a brilhar e, se desse sorte, um arco-íris surgiria.
Mas no fundo sentia que isso não tornaria a acontecer, sentia como se ele fosse a grande nuvem carregando tempestade por todos os lados.
Seu sol não brilhava mais, tinha se apagado, assim como ela.

Irlanda - Setembro, 2014

- Deveríamos ficar aqui para sempre!
- Como é? – perguntou inclinando a cabeça para encará-la.
- Só você, eu e esse céu estrelado. Sem preocupações, sem cobranças, só nós e esse céu enorme.
ergueu a cabeça, o céu escuro com milhões, bilhões de pequenas luzes brilhantes.
- Olha lá, a Ursa Maior! - apontou para um punhado de estrelas, a garota olhou fascinada.
- Não consigo ver...
- E você acha mesmo que eu conseguiria? - sorriu vendo-a rolar os olhos, balançando a cabeça.
A garota sentou no chão, encostando-se a uma das árvores do parque, fez o mesmo segundos depois, apoiando a cabeça no ombro dela, sentindo-a acariciar seus cabelos lentamente.
- Sabe por que eu não preciso olhar para as estrelas todas as noites? - perguntou retoricamente, seu olhar perdido no lago escuro mais à frente - Porque eu tenho você durante todas as horas do meu dia. Eu não preciso de um céu estrelado quando eu tenho você o tempo todo para fazer meus dias mais claros... E eu sei o quão brega isso soa!
Ela riu baixinho virando o rosto para beijar-lhe o topo da cabeça.
- Eu sempre acho que você parou nos quatorze anos, , não por ser imaturo, mas por continuar tendo um coração tão puro quanto naquela época...
- Bom, talvez o coração fosse puro... Não posso dizer o mesmo sobre o resto...
A risada rouca logo preencheu os ouvidos da garota, que não pode deixar de sorrir.
- Você é a estrela mais brilhante do meu céu, .

deu três passos até passar pela varanda e curvou-se para frente, apoiando-se na grade metálica, dando um leve impulso colocou o corpo sobre a mesma, passando as pernas por ela e sentando-se ali. As mãos seguravam com firmeza as grades, seu corpo mais para o lado de dentro do que para o de fora, respirou fundo tornando a fechar os olhos e prestando atenção apenas no vento que tocava seu rosto, mexendo em seus cabelos curtos...

entrara batendo a porta, jogou a jaqueta preta em um canto e deixou o violão de lado, a frustração estampada em seu rosto.
- O que aconteceu? - questionou saindo do quarto, vendo-o sentado no sofá.
- Me mandaram embora, arranjaram outro músico para o bar...
abaixou a cabeça, os cotovelos apoiados nos joelhos, o rosto escondido nas mãos. Tinha perdido sua única fonte de renda.
Sentiu quando sentou-se ao seu lado, passando o braço por seu ombro, puxando-o para perto. Beijou-lhe a cabeça enquanto acariciava os cabelos compridos dele.
- Vai dar tudo certo, quando te conheci você mal tinha um violão, agora tem no currículo um dos melhores bares de Dublin. - dizia em voz baixa, suspirou. - Vai ficar tudo bem, , já estivemos pior, não é?
- ... - chamou com a voz vacilante.
- Você acredita em destino, ?
Ele afastou-se minimamente, deixando o olhar parar nos olhos da garota, o sorriso calmo continuava em seus lábios.
- Eu acredito. Acredito que temos duas ou três escolhas realmente importantes na nossa vida, e que elas nos levam por milhões de questionamentos e trilhões de respostas. Mas no final, boa parte dos nossos destinos já estão traçados. Por exemplo, acho pouco provável que fossemos conversar pela primeira vez, se a Sra. Carter não tivesse me pedido para ser sua monitora no colegial. Você era muito problemático para ser meu amigo, mas olha só para nós dois agora. - ela levantou a mão com a aliança dourada no dedo anelar. - Eu acho que todos os momentos são relevantes de alguma forma, e no seu devido tempo nós descobrimos o motivo. Todos temos dias azedos e doces... Isso sempre depende de como você encara os problemas. Você pode ficar triste e chorar o tempo todo, perguntando o que fez de errado, ou você pode erguer a cabeça e começar novamente, tirando uma lição disso tudo e sorrindo com as possibilidades de um novo futuro. Nós não sabemos o que vai ser de amanha, talvez ele não venha, hoje é tudo o que nós temos.

Curvou a cabeça para trás lentamente, vendo as poucas estrelas que brilhavam no céu encoberto por nuvens escuras. As lágrimas voltaram a escorrer por seu rosto, quentes e rápidas deslizavam até perder-se em sua barba ou fazer parte do caminho até seu pescoço. O vento arrepiava seu corpo, mas ele não ligava.
Seu mundo tinha desabado tão facilmente quanto um castelo de areia desmanchado com uma onda mais forte que o atingira.
Mas, diferente de como fazem as crianças na praia, ele não conseguia reconstruí-lo.
Uma vez desmanchado, por mais que ele tentasse, seu castelo não era mais como fora da primeira vez, sempre teria algo diferente.
Sempre teria algo faltando.
Ele não precisaria mais de um castelo se a pessoa que ele escolhera para compartilhar não estava mais ali para governar ao seu lado.
fechou os olhos, perdendo-se novamente nas lembranças que tentava tão desesperadamente esquecer, mesmo que por um único momento.

“Fala comigo... Por favor... Não me deixa, eu preciso tanto de você... Por favor...”

Era quase como se ele ainda estivesse lá, podia sentir as mãos geladas da mulher agarrando-lhe a camisa, a respiração profunda e hesitante, os olhos fechando-se aos poucos, por mais que ele suplicasse, por mais que ele implorasse para ela mantê-los abertos.

“Eu não posso continuar sem você... Por favor...”

Ele olhava para os lados desesperado, mas o socorro nunca chegara...
Aos poucos o aperto em seu braço ia diminuindo, tão lentamente quanto sua respiração.
O sangue quente e escuro escorrendo por seu peito. O sorriso leve perdido em seu rosto.

“Eu não posso... Não sem você...”

Ele suplicava como nunca fizera em sua vida, ela talvez não entendesse o que ele dizia, pois continuava a olhá-lo como sempre fizera; de forma tranquila, compreensiva, como se nada no mundo tivesse importância, somente os dois.

“Você não vai morrer hoje à noite... Você... Você vai continuar, vai fazer o que sempre quis...”

negara com a cabeça ao escutar, sentia o aperto em seu peito tão forte, sentia como se agulhas o furassem ao mesmo tempo, arrancando-lhe o ar dos pulmões. A voz dela parecia tão distante, estava tão fraca...

“Pense de novo, ... Você ainda tem tantas coisas para fazer... Eu te amo tanto...”

O grito desesperado saiu por sua garganta quando a mão que o segurava caiu ao seu lado, sem força alguma. Os olhos , que já não tinham mais o brilho que ele tanto amava, fecharam-se. O sorriso sereno ficou perdido em seu rosto.
Por mais que ele gritasse, implorasse, ela não voltara para ele, ela tinha o deixado.
Tinha partido deixando-o para trás, deixando-o sem saber o que fazer, completamente perdido e sozinho...

abriu os olhos, seu corpo tremia, a dor o consumia.
Ainda conseguia sentir as gotas geladas da chuva que caíra naquela noite.
A rua movimentada, as conversas das pessoas ao redor, chamando pelo socorro que não chegara a tempo...
Ele não precisava mais dormir para lembrar-se, ele simplesmente não esquecia.
Era como se estivesse em um loop infinito.
Sentia como se parte dele tivesse ficado naquela calçada, se misturado com o sangue e escorrido com a chuva.
Como ela pôde pedir para ele continuar?
Como ele poderia seguir em frente?
Ela era tudo o que ele queria, tudo o que ele precisava e fora embora, tinha o deixado.
Todos os planos que haviam feito foram levados, todos os sonhos de construírem uma família juntos tinham se destruído naquela noite.
Nada daquilo fazia sentindo em sua cabeça, ainda sentia-se tão perdido e solitário quanto naquele momento, semanas atrás.
Lembrava-se bem de seus amigos e familiares dizendo que aquela dor era temporária, que logo tudo ficaria bem.
Como ele ficaria bem se tinha perdido tudo?
Perdera não só sua melhor amiga e esposa, mas também o filho de poucos meses em seu ventre.

tornou a olhar para baixo, os carros pareciam grandes borrões coloridos e barulhentos, contrastando com as estrelas silenciosas no céu escuro.
Seu mundo parecia tão vazio naquele momento.
Tudo parecia tão perdido e distante quanto aquelas estrelas.
Não sabia como poderia continuar seguindo em frente, não sabia se conseguiria.
nem mesmo sabia se queria tentar descobrir.
A dor que consumia o seu ser era intensa.
Não era uma dor física que com os dias melhorava, com dois ou três medicamentos passava.
Era uma angustia que simplesmente não passava.
Estava com ele a todo momento.
não conseguia sorrir como fazia antes.
Não conseguia pensar em coisas boas.
Não via um futuro melhor.
Nem mesmo viu um futuro.

Ele estava perdido no meio de toda aquela escuridão e dor.
Nada que fazia era suficiente para levá-la embora.
Ela sempre estava lá, parecia fazer parte dele.
Mesmo enquanto tentava afogar suas mágoas e desespero no álcool, aquela dor ainda estava lá, apertando seu peito e fazendo-o lembrar-se de tudo o que queria esquecer.
E ao mesmo tempo sentia-se culpado.
Culpado por querer esquecer-se dela.
fora a melhor coisa que acontecera em toda sua vida, e também a pior.
Ele não estaria sofrendo daquele jeito se não tivesse a conhecido, mas ao mesmo tempo em que pensava nisso, tentava imaginar como teria sido sua vida sem ela.
Ele talvez não estivesse sofrendo nesse momento, mas sabia com todo o seu coração que cada minuto com ela tinha valido a pena.
Era um preço alto que estava pagando, sentia-se vazio e desamparado.
Mas ao mesmo tempo parecia válido.
Deus, ele passara anos maravilhosos com ela.
Não eram sempre fáceis, mas todos os dias que acordara e a via dormindo ao seu lado sabia que tudo estaria bem novamente.
Ele era tão sortudo de tê-la...
Mas ela não estava mais ali... Ela tinha partido e agora ele não tinha mais a certeza de que tudo ficaria bem.
No fundo ele sabia que não ficaria.

Pessoas passavam anos procurando pela pessoa certa, por aquela pessoa que faria seu coração acelerar e você sorrir por qualquer mínimo gesto.
A pessoa que faria você sentir-se bobo e ao mesmo tempo sortudo por tê-la encontrado. A pessoa que seria a causa de suas lágrimas e seus sorrisos.
E que quando passava tempo demais distante sentia uma saudade imensa.
Algumas pessoas passavam a vida procurando e nunca encontravam a pessoa certa.
Aquela que com o passar dos dias você só tem mais certeza que é ela que precisa ao seu lado, que é com ela que vai dividir sua vida.
E ele encontrara com apenas treze anos, ela virara sua melhor amiga e depois sua namorada.
passara quatorze anos com ela e não poderia ser mais grato por isso.
Mas agora não tinha mais o que buscar...
Ele a encontrara e agora tinha partido.
perguntava-se por que não o contrário.
Por que ele tinha ficado?
Por que ele não tinha ido em seu lugar?
Ou ao menos junto com eles, as duas pessoas mais preciosas de sua vida tinham partido e ele nada pudera fazer para evitar, apenas chorara tentando-se agarrar a qualquer chance de fazê-los continuar ali com ele, mesmo sabendo que isso não aconteceria.
soube que estava tudo perdido quando a viu cair sangrando na calçada, enquanto o cara corria com a bolsa dela, sem importar-se com mais nada.
Ele sentiu que a tinha perdido quando tocou em seu corpo, puxando-a para perto, tentando a todo custo protegê-la de alguma forma, viu o sangue começar a escorrer, manchando sua camisa e caindo pelo chão.
soube que tinha acabado quando ela levantou a mão tremula e tocou em seu rosto, dizendo que o amava.

Na verdade ele sabia que estava perdido da primeira vez que olhou naqueles olhos e ela sorriu para ele, apresentando-se em seguida como sua monitora.
Sentiu-se nervoso antes de chamá-la para um sorvete.
Sentiu como se seu coração fosse saltar do seu peito quando a beijou pela primeira vez, ainda lembrava-se de sentir as mãos formigarem quando segurou em seu rosto, inclinando-se até encostar seus lábios nos dela.
E só Deus sabe como ele se sentiu na primeira vez que fizeram amor.
sempre soubera que era a pessoa que ele queria para estar ao seu lado.
Era ela ou mais ninguém.
E agora ele tinha certeza do quão certo ele estava desde aquele primeiro dia em que se conheceram.
A dor em seu peito crescia junto com as lágrimas que escorriam por seu rosto.
Suas forças aos poucos esvaindo-se, assim como o sorriso triste em seus lábios finos.
dissera para si mesmo que tentaria, e ele achava que tinha tentado, mais do que imaginara.
Mas ele não sabia mais como encontrar forças para recomeçar, para tentar novamente. Ele nem mesmo queria encontrar essa força de vontade.
Tudo o que ele queria era sentir-se leve novamente, como em todas as vezes que estivera com ela.
fechou os olhos respirando fundo, soltando-se aos poucos daquelas barras.
Tudo o que ele queria era poder ver o sol brilhar novamente após aquela tempestade...


Nota da autora: (03.12.2015) Olá!
Só Deus sabe o quão difícil foi escrever uma fic baseada em 24 floors! Porque eu simplesmente amo essa música e gostaria de abraçar o John toda vez que eu escuto, porque 24 floors é amor <3
O que deixou tudo muito pior porque DE FORMA ALGUMA eu poderia estragar uma das minhas músicas preferidas! Mas quanto mais eu tentava, mais lágrimas rolavam porque não saiu como eu esperava. Tive cinco ideias diferentes e nenhuma parecia boa o suficiente. No final fiquei com a que desenvolveu mais rápido, embora eu ainda ache que tenha faltado algo! De qualquer forma, queria agradecer a Elaine pela ajuda <3 E desde já agradeço quem perdeu uns minutinhos lendo! <3
xx Reh


Nota da beta: Eu queria reservar esse espacinho pra dizer o quão feliz eu estou de ter feito parte da publicação dessa fic, mesmo que tenha sido apenas como intermédio da Reh com o site. Eu já a admirava bastante como autora, mas depois de trabalhar com ela isso apenas aumentou. Reh, parabéns pela história que ficou linda, intensa, apaixonante. Muito sucesso pra você, e que essa não seja a última vez que trabalhemos juntas. Beijão, Lannes.

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