Última atualização: 15/07/2019

Capítulo 1

Quando foi recrutado para os Vingadores, Peter pensou que finalmente seu momento havia chegado, que seu valor como herói finalmente tinha sido provado. Agora ele tinha recursos e apoio para deixar as pessoas mais seguras, além de excelentes mentores. Como .
O garoto não fazia ideia de quando ela havia integrado à equipe, mas sabia que precisava demonstrar pelo menos o mínimo de respeito a ela, mesmo que a mulher não merecesse. Claro que em nenhum momento ele esperara uma festa, que de repente seria melhor amigo de seus heróis de infância e fariam altas festas do pijama. Aquela equipe era formada por pessoas diferentes, com histórias de vida diferente, e Peter sempre teve isso em mente. Só que era bastante fácil esquecer aquilo quando era em relação à . Ela não fazia parte dos integrantes mais novos, devia estar em seus trinta e poucos anos. Bem, Sam e Natasha também estavam mais ou menos na mesma faixa etária que ela, e até a Viúva-negra conseguia ser mais amigável que . Peter ainda achava que era um sonho a imagem de Natasha se engasgando com a água que bebia e engatando em uma gargalhada discreta depois de alguma brincadeira inapropriada de Sam e Tony, mas de o máximo que vira fora um sorriso de lado maldoso.
Como alguém que se portava daquele jeito podia ser vista como uma heroína, Peter não conseguia entender. Steve às vezes ria quando notava seu desconforto quando tinham que treinar juntos, e até se empenhou por um tempo em tentar aproximá-los, mesmo sabendo que estava fadado ao fracasso. Sua vontade muitas vezes era repreender a mulher por falta de comprometimento em manter boas relações com os colegas, mas sabia que nem ele o levaria a sério, já que, até certo ponto, mantinha isso muito bem. Dizia apenas o necessário, ouvia tudo – que julgava útil – que o outro tinha a falar e raramente interrompia, era esforçada nos treinos e raramente errava. Quando acordava de bom humor, até desejava bom dia a quem estivesse na cozinha quando ia pegar seu café e correr no parque. Bem que o Capitão queria que todos os seus recrutas dessem tanto trabalho como a mulher, assim ele teria muito mais tempo livre.
May era a pessoa que mais ouvia Peter reclamar da mulher.
Desde que seu sobrinho adentrara a equipe de super-heróis que ela sempre reservava um tempo do dia para conversarem sobre como era a vida na Torre, e toda vez que era citada, era para dizer como ela era assustadora. Esse aspecto May nunca pode confirmar de fato, embora assentisse sempre que Peter se referia assim a ela. Mesmo se tratando de uma equipe com a maior parte das identidades públicas, alguns não exibiam seus rostos e nomes. Peter era o segredo absoluto, escondia apenas o rosto. Claro que a máscara oval que cobria o rosto da mulher não exatamente confortava alguém, mas May não podia se basear apenas nisso, muito menos nos comentários de seu sobrinho.
Tony, aproveitando uma semana que aparentemente seria calma, escolheu uma segunda-feira para quitar uma dívida já de meses: a visita e apresentação de May para todos. A principal preocupação da mulher obviamente era sobre a segurança de Peter nas ruas, mas não podia desconsiderar o ambiente onde ele passava boa parte do dia e as pessoas com que trabalhava, por isso ela aceitou o convite com um sorriso satisfeito.
Peter, por outro lado, não ficou tão feliz.
- É um prazer finalmente conhecê-la, Sra. Parker – disse um Steve Rogers sorridente, que apertara com leveza a mão da mulher.
- Ah, por favor... Me chame de May.
- Bem, acho que completamos a tour, hm? – suspirou Tony, depois de pensar um pouco – e Sam estão subindo, com certeza vão aparecer aqui antes de tomarem um banho. Se importa de conhecer dois heróis suados? Eles saíram faz muito tempo...
May não deixou de perceber como o sobrinho ficara mais tenso com a menção da colega, e não podia negar que estava um pouco mais ansiosa para conhecer a mulher do que os outros. Sabia que não tinha como ela maltratar o garoto, mas tinha que ter algum motivo para toda aquela fixação em especial com ela.
A conversa do grupo na sala foi interrompida pela risada alta de Sam, que não era acompanhado por sua parceira, que apenas revirou os olhos. Ambos usavam um conjunto parecido de traje de corrida, parte do tecido colado na pele pelo suor assim como alguns fios soltos do cabelo de . Peter quase agradeceu mentalmente à forma que sua tia reagiu ao avistar a mulher se aproximando, apenas para ficar preocupado em seguida. Até ele tinha que admitir que à primeira vista não parecia uma ameaça, mas a maneira que May fitava a mulher com o cenho franzido fez com que ele ficasse atento.
- Nossos últimos vingadores: Sam Wilson e – Tony continuou as apresentações, e, para a surpresa de Peter, a colega foi a primeira a estender a mão para sua tia, que a aceitou no automático, seus olhos questionadores nunca abandonando seu rosto.
- E aí...? – disse incerta, seu corpo já pendendo para trás para recuar da mulher, que continuava a segurar sua mão por mais tempo do que o socialmente aceitável – Eu perdi alguma coisa?
- Harper?
Para a surpresa de todos, adotou uma postura semelhante de May, pelo menos a parte intrigada, já que a compreensão que aos poucos atingia a mais velha não chegava na mais nova.
- D-do que você me chamou? – questionou ela depois de um tempo, aquele nome de alguma forma lhe soando familiar, mesmo que parecendo vazio de significado. May aproveitou que ainda segurava a mão da mulher e girou seu pulso, revelando a parte de dentro do antebraço que deveria ter uma longa cicatriz de um acidente de tanto tempo atrás, bastante suavizada pelo tempo. Quando entendeu para o que a mulher olhava com abismo, ela puxou o braço de volta e recuou alguns passos, até dar de costas com Steve, que a segurou para que não fosse ao chão. As articulações de seu joelho haviam decidido que era um bom momento para brincarem de gelatina, por isso a mulher sequer se importou com o apoio, muito menos lhe deu atenção.
- É você – disse May com uma certeza que fez a mulher estremecer – Harper.
- E-esse não é meu n... – estava pronta para desmentir, não era difícil. Era uma frase tão simples, que ela dizia com tanta recorrência aos longos dos anos, aquela era só mais uma vez. Só que seu olhar logo desviou de May para o garoto logo atrás dela, que assistia a cena sem compreender o que acontecia. E então uma luz pareceu se acender em sua mente, e não era apenas compreensão. Era de alerta total – Oh meu Deus.
- Procuramos por você por meses.
sabia que estavam se dirigindo a ela, mas as palavras que passeavam pelo ar que a cercava não chegavam a ser computadas, a velocidade que sua mente estava impedindo de qualquer informação nova entrar. Sua memória nunca fora das melhores – principalmente para coisas que ela escolhera esquecer –, mas de repente os traços da mulher a sua frente não eram tão estranhos, mesmo com o fator tempo ter alterado bastante sua fisionomia. Era ela, uma das pessoas com quem ela esbarrara anos atrás, e o que isso significava fez com que seu estômago embrulhasse.
- Me desculpa, Sra. Parker, mas não sou quem acredita que eu sou – disse , com o máximo de firmeza na voz que conseguia transmitir no momento, aos poucos se desvencilhando de Steve, que não ousou se afastar muito, por garantia. A respiração da mulher estava miseravelmente controlada, o tremor em suas mãos claros demais para sua visão sobre-humana. Não sabia dizer o motivo da mulher estar tão abalada e mentindo, mas ficar próximo era uma escolha inteligente – Agora, se me dão licença, tenho outras coisas para fazer. Devo retornar mais tarde.
- De onde vocês se conhecem? – perguntou Peter, uma certa exigência na voz que fez com que May se virasse para ele, de repente lembrando que o sobrinho estava presente, e que suas dúvidas não seriam poucas ou simples – Por que nunca me falaram nada?
- Alguém tira o Peter daqui.
- O que tá acontecendo?! – o garoto soltou mais alto, tão confuso como o resto do grupo, mas um tanto ofendido com a demanda da tia. Eles tinham segredos agora? Quem diabos podia ser aquela mulher que May precisava da sua ausência para poderem conversar? Eles sempre foram tão abertos um com o outro, aquilo não fazia o estilo de May. A energia nervosa que exalava também era estranha, e pouco ele conhecia da mulher, mas sabia que tinha algo errado. A postura recuada, o receio nos olhos, que às vezes parecia ser medo.
- Peter! – May tentou se impor, apenas para notar que a atenção do sobrinho não era dela, e sim de , que mantinha o olhar vago na direção do garoto, mesmo sem parecer estar o vendo de fato.
- só reagiu quando sentiu a mão do homem apertando de leve seu ombro, a lembrando que sua palavra provavelmente estava sendo aguardada.
- Tira o Peter daqui, por favor – o pedido saiu em quase um sussurro, Sam demorando para assentir e acatar seu desejo. Ela sequer ousou olhar para o garoto, que tentava buscar alguma explicação em seu rosto enquanto o soldado o guiava para fora da sala, dizendo que mais tarde alguém explicaria a ele tudo que estava acontecendo.
Com a ausência dos dois, o grupo manteve um silêncio desconfortável e ensurdecedor, onde todos esperavam tomar a iniciativa e explicar a história, já que parecia ser ela a única detentora do conhecimento absoluto ali. Ela tentou se restabelecer respirando fundo, passando as mãos no rosto, mexendo nos cabelos... Nada parecia adiantar, seu coração ainda batia num ritmo frenético, o eco dos batimentos em seus ouvidos a deixando tonta, isso sem levar em conta os olhares questionadores que a cercavam. May não parecia estar em um estado muito diferente do seu, mas a postura da mulher a intimidava, como se cada célula de seu corpo apontasse para seu rosto, a julgando por seu passado.
Aquilo não podia estar acontecendo.
- Foi mal, não consigo fazer isso – disse ela por fim, dando as costas ao grupo e se direcionando para o elevador. Steve, o mais próximo, tentou a impedir, mas a mulher era ágil e conseguiu desviar de suas mãos insistentes.
- , volta aqui! ! – o soldado se sobressaiu sobre os pedidos da equipe, chegando se adiantar para seguir a mulher – É uma ordem, .
- Eu me demito – parou no meio do caminho, se virando para visualmente afrontar o Capitão – Oficialmente me desligando dos Vingadores. Sem mais ordens para mim.
- Você vai abandonar ele de novo, então?
May não pensou direito no que disse. Na verdade, ela só percebera o que dissera depois que o estrago já estava feito, com um Capitão América segurando pela cintura com os dois braços uma furiosa que correra em sua direção, as unhas da mulher apenas não atingindo seu rosto porque Natasha e Tony também estavam atentos e a puxaram para trás.
- Você não ouse se dirigir a mim dessa forma! – grunhiu , continuando a tentar avançar na direção da mulher mesmo ciente de que não conseguiria vencer Steve no quesito força – Só porque você o criou não te dá o direito de agir como se eu te devesse algo!
- Espera, o quê?!
Pega de surpresa, os músculos de relaxaram por um breve segundo, tempo o suficiente para Steve afastá-la de vez, mesmo estando tão abismado como o resto do grupo. Parecia um sentimento idiota, mas ela não queria ter falado demais. Nas atuais circunstâncias, seria impossível eles não ligarem os pontos, mas tudo que a mulher não queria era estar presente no momento. Não tinha importância eles falarem sobre isso pelas suas costas, ela não ligava. A opinião da maioria não era do seu interesse e não mudava nada em sua vida, mas só não queria ser alvo daqueles olhares de novo.
- Me solta, Rogers – ordenou ela num fio de voz, sem mais apresentar resistência ao soldado a mantendo no lugar, embora não tivesse saído da posição de ataque.
- Solta ela, Rogers – Natasha optou por interceder, a situação fora demais do controle para seu gosto. A imagem frágil da colega não estava a agradando nem um pouco, e sabia que não teria cabeça para lidar com aquilo tudo. Já era trabalho demais se resolver apenas consigo mesma – Eu lido com a May. Deixe ela ir.
Mesmo relutando, Steve acabou por aos poucos soltar a mulher, que não demorou muito para se afastar de vez. Seu olhar baixo não se aventurou muito no rosto dos presentes, passando apenas por um breve segundo pelas outras duas mulheres antes de girar os calcanhares e rumar para as escadas. Para o inferno com elevador, a última coisa que precisava era ficar presa em um espaço pequeno tendo que ser obrigada a encarar a si própria.
Mais do que nunca, precisava correr.
De tudo.

Capítulo 2

Peter podia ser bem menor do que ele, só que a força sobre-humana definitivamente foi um empecilho para Sam conseguir guiá-lo para uma sala mais afastada, onde o garoto não pudesse interferir na qualquer que fosse a conversa que acontecia entre o restante da equipe. Não dava para mentir e dizer que estava feliz por ter sido deixado de fora, mas a forma despreparada que fizera o pedido não lhe deixara escolhas. Depois de tanto tempo trabalhando juntos, o soldado estava mais do que acostumado com as formas grosseiras e inapropriadas que a mulher podia agir, e aquele tom quase de súplica definitivamente não fazia parte de seu repertório. Por isso Sam estava preocupado.
O que quer que tivesse poder para abalar não podia ser pouca coisa.
- Garoto, te aquieta, por favor – pediu o soldado novamente, quando Peter levantou da cadeira onde passara os últimos cinco segundos e tentara rumar para a saída.
- Você ouviu o que a gritou! – o garoto continuou a argumentar, mesmo retornando ao lugar que fora ordenado.
- E é por isso que você vai ficar aqui comigo – Peter bufou alto diante de tal tentativa de explicar o motivo da necessidade de ficar de fora da conversa que Sam tentava fazer com que ele aceitasse a situação. Sam, por sua vez, não estava nem um pouco confortável em relação a posição que fora obrigado assumir ali. Normalmente, qualquer forma de repreensão era responsabilidade de Steve, ou de qualquer membro sênior da equipe. Ele já estava ali fazia um bom tempo, mas era raro aquela figura de autoridade sobrar para seu lado – É hora de os adultos conversarem.
- O que você sabe? – indagou Peter de repente, um tom de acusação que pegou o soldado de surpresa, mas, como tanto ele como o garoto já estavam sendo mantidos demais no escuro, Sam sequer tentou desconversar.
Só que isso não significava que iria colocar todas as cartas na mesa.
- Definitivamente não o suficiente para te deixar a par da história.
- Tente.
- Não estou em posição para isso, pirralho – lembrou ele, aumentando a firmeza de suas palavras quando Peter voltou a ficar em pé e a bufar – Não é minha história para contar.
- Sexta-Feira? O que todo mundo está fazendo?
- O Sr. Stark e o Capt. Rogers estão tentando acalmar a Srtª . A Srtª Romanoff está conversando com sua tia – anunciou a inteligência artificial depois do pedido do garoto – Todos os outros estão tentando ouvir as conversas.
- Droga, a coisa ficou feia... – ofegou Sam antes de ponderar suas palavras, deixando ainda mais claro que sabia de algo, o que Peter não deixou passar batido.
- Sam, me conta! – pediu o garoto, seu desespero por respostas se tornando mais ameno em seguida, enquanto analisava as possibilidades. Foi quando seus ombros caíram e seu olhar se tornou confuso que Sam se deu por vencido – Ela é minha m...? Isso não...
- não é a pessoa mais aberta do mundo, então não posso afirmar nada com certeza. O máximo de informação sobre ela que eu consegui quando ela estava de porre é que ela teve que abrir mão de... Possibilidades. Levando em consideração de onde ela veio, não me surpreende isso ter acontecido.
- Você realmente acha q...?
- Eu não acho nada, Parker – ele cortou o garoto, que deixou a expressão agoniada de lado para assumir uma postura mais distante e determinada. Ah, aquilo não podia ser bom também, certo – Senta aí e espera sua tia vir conversar com você.
Para sua surpresa, Peter obedeceu, voltando para a cadeira que ocupara anteriormente e puxando seu celular do bolso, respondendo algumas mensagens aleatórias. Seus ombros não relaxaram por um momento sequer, nem seus olhos abandonaram a tela do aparelho. Sam suspirou alto, olhando o relógio em seu pulso para estipular quanto tempo poderia demorar para ir atrás de respostas, já que ele estava tão confuso e preocupado quanto o próprio Peter.

Natasha assistiu pacientemente a mulher andar de um lado para o outro, gastando um pouco da ansiedade que a dominava, a fazia chegar em conclusões que não sabia dizer ao certo se era verdade ou não. Podia ser que nem fosse a tal garota de tantos anos trás – embora a reação de não deixasse muito espaço para dúvidas. May sabia que precisava se acalmar para entender a história direito, mas não parecia existir algo possível de fazer seu coração bater naquele ritmo desesperado.
- Você sabia – disse May por fim, parando de frente para a ex-espiã. Natasha teve que controlar sua vontade de sorria diante da postura da mulher, seu olhar bastante determinado para alguém tão transparente como ela, tentando estudar e procurar respostas na expressão de alguém que fora treinada desde criança para não entregar informações.
- Sabia de alguns detalhes. Fui eu, afinal, que recrutei a garota – contou a ruiva, se direcionando para a janela – Sei pelo que ela passou, temos uma história de origem semelhante em alguns pontos, por isso ela confiou em mim para contar.
- Ela era só uma criança – a voz May tinha algo que atraiu a atenção da mulher. Era remorso? Parecia um tanto de revolta, talvez. Como se ela estivesse revivendo um dia de tanto tempo atrás – Uma criança com um bebê tão debilitado como ela. Queríamos ter ajudado ela, mas ela fugiu. Nunca a encontramos.
- Ela não se acha digna de ajuda, prefere fazer as coisas do jeito dela – Natasha saiu em defesa da colega, embora suspirasse cansada, um sinal de que nem sempre concordava com suas decisões. Ela era cabeça dura, mas conseguia a superar nesse quesito – Deu certo, de certa forma. Claro que podia ter sido um caminho mais simples, mas não é isso que importa no momento.
- Eu não devia ter tentado encurralá-la... Não pensei direito – May voltou a ficar agitada, querendo seguir para a porta, que Natasha logo bloqueou – Peter...
- Sam está com ele, não se preocupe.
Para sua surpresa, May logo respirou fundo e voltou a se afastar.
- De certa forma estou feliz em saber em quem ela se transformou, mas... – ela começou a se explicar, comprovando que a teoria de Natasha estava certa.
- Nunca contaram para o garoto sobre isso.
- Parecia a coisa certa. Agora já não mais – May levou as mãos ao rosto, sem saber o que fazer – Ele tem medo daquela mulher.
Natasha não pretendia, mas acabou deixando um sorriso escapar. Peter realmente evitava ficar no mesmo ambiente que por mais tempo que o necessário, agora todas suas memórias de cenas assim tinham um humor conturbado.
- Esperto ele – disse a ruiva – é difícil de lidar, precisa de tempo para se acostumar.
- Acha que ele vai me perdoar? – a pergunta pegou Natasha desprevenida, que desviou o olhar, sem saber o que fazer para ajudar na situação – Os pais dele, Ben... Eles não estão mais aqui para levar a culpa, só eu.

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Não pegaria mal relatar aquilo, mas, mesmo depois de tantas guerras e batalhas ganhadas, um dos maiores desafios que Steve tivera na vida foi fazer parar e ouvi-lo por um breve instante, para que se acalmasse e explicasse o que acontecia. Talvez o soldado até fosse obter sucesso em algum momento, sempre tivera um bom relacionamento com , mesmo ela sendo considerada difícil de conviver por parte da equipe, só que seu plano não contava com Tony seguindo a dupla, dizendo que seria seu suporte para o dia.
Como se as coisas já não tivessem tendência a dar errado.
- ? – arriscou Steve, quando finalmente conseguiu fazer com que ela entrasse em uma sala, não surpreso ao ver que ela se recusara sentar e fora para perto de uma janela, estudar a silhueta da cidade – Você realmente é...?
- Mãe do pirralho? – completou a pergunta, quando sentiu que Steve não se sentia confortável o suficiente para isso. Se não estivesse com a cabeça em outro lugar, teria parado para apreciar e talvez até zombar do soldado pela carinha inocente de quem não sabia o que fazer – Pelo jeito.
- Hm, alguém aqui conseguiu ter uma relação pai/filho pior que eu.
- Stark! – esbravejou Steve sem pensar duas vezes, sua expressão horrorizada tendo como alvo o engenheiro.
- Que é?! – devolveu ele, se fazendo de desentendido. Não demorou muito para que ele se virasse para , quem eles deviam estar questionando – Você não falou sério em se demitir, não é? Precisamos de você.
- Bastante sério – respondeu ela, a expressão determinada fazendo com que a dupla travasse um pouco. Era difícil demonstrar se importar com algo o suficiente para que quebrasse sua fachada indiferente, o assunto devia estar a perturbando, e muito – Não posso ficar perto dele sabendo quem ele é, e essa palhaçada de herói significa muito mais para ele do que para mim.
- Hm, não esperava que você fosse o tipo de mãe que faz sacrifícios pela cria.
- Se eu não sou mais da equipe, posso te socar sem risco de advertência, Stark – rosnou a mulher, os punhos fechados e indo em direção do herói, não chegando mais perto apenas porque Steve segurou seu braço, em um aperto delicado – Fecha a boca.
- Qual é, volta para a sala. Conversa com o garoto – pediu Steve, aproveitando que ela não tentou se desvencilhar de imediato – Sabe que é a coisa certa a se fazer.
Mas aquilo fez com que puxasse seu braço em um movimento único e preciso.
- Não me vem com essa baboseira de coisa certa, Garoto de Ouro – devolveu ela, se virando para o soldado e cutucando seu peitoral firme. tinha completa ciência que não era forte o suficiente para fazer Steve recuar com apenas um cutucão, mas fez muito bem para sua moral assistir o soldado recuar um passo, sabendo que cometera um deslize – Peter não é meu problema, é da tia dele.
- , eu não quis...
- Mas jogou a responsabilidade em mim, algo que nunca foi minha. É minha escolha. Se eu quisesse saber quem ele era, se me importasse com isso, eu teria rastreado. Só que olha que interessante: eu não fiz isso. Porque eu não me importo. Eu não queria saber – a cada passo que a mulher deva em sua direção, Steve recuava outro, até suas costas encontrarem uma das paredes do andar e ele estar encurralado, engolindo em seco ao ver que apenas ficava mais irritada com o passar de cada segundo – E agora ele sabe quem eu sou, por isso eu vou embora.
Antes que Steve pudesse se recuperar e fazer algo a respeito, marchou para longe, a dupla se mantendo em silêncio por um tempo, sem saber mais o que fazer.
- Muito bem, Stark – suspirou Steve, os ombros caindo depois de passar as mãos pelos cabelos curtos. O que fariam agora?
- Qual é, vai jogar a culpa disso em mim também? – resmungou Tony – Não acha que está forçando um pouco mais a barra do que de costume?
- Você deixou a garota ainda mais na defensiva!
- Como se você também n...
Sam apareceu no meio da discussão da dupla, entendendo menos ainda o que diabos estava acontecendo naquele prédio naquele dia. Toda comunicação tinha que ser feito aos berros?
- Cadê a ? ¬– indagou ele, depois que os dois decidiram lhe dar atenção.
- Foi embora – contou Tony, abrindo um sorriso sacana quando o moreno praguejou baixo – O que? Não teve a chance de confessar seu amor por ela? Te disse para ser mais rápido.
- Que? – soltou ele, desistindo de levar Tony a sério principalmente depois que Steve estapeou seu braço, o repreendendo – Peter fugiu.
- Ele o quê?!

Capítulo 3

Oficialmente, era uma das poucas recrutas da equipe que não tinha poderes, embora ela gostasse de contrariar aquele argumento.
Seu poder sempre fora passar despercebida, fazer tão intimamente parte da multidão que seu rosto nunca ficava registrado na memória sequer da pessoa mais atenta presente. Por isso ela costumava andar pelas ruas com a tranquilidade de não ser importunada.
Mas isso não queria dizer que sua atenção não pudesse ser atraída por algo, ou alguém.
Como Peter Parker com um grupo de adolescentes encrenca, de cabeça baixa e bebendo algo direto do gargalo.
Porque claro que seu inconsciente tinha que a guiar para o último lugar que ela queria estar, nem sabia porque estava surpresa.
- Parker? – a voz mais madura e alta traiu a atenção do grupo, que pateticamente tentou esconder ainda mais dentro dos sacos de papel os líquidos que consumiam. O único a se manter como se nada estivesse acontecendo era o alvo da mulher – Solta essa garrafa agora e volta para a Torre.
- Você não manda em mim – devolveu o garoto.
- Quanta maturidade.
- Falou a pessoa que abandonou o filho – continuou ele, sem erguer o olhar para a mulher. apenas teve sua atenção quando estapeou a garrafa que ele levava a boca para longe - Ei!
- Eu mandei soltar a porcaria da garrafa, não ouviu?!
Sentindo a hostilidade vinda da mulher, o grupo tentou partir em defesa de seu mais recente integrante, todos recuando assim que ergueu sua antiga identificação de vingadora que sequer tinha mais valor – não que eles precisassem saber daquilo.
Sem muitas escolhas, Peter seguiu a mulher por um caminho que ele até conhecia, embora transitasse bem pouco por ele, e agora questionava o porquê. Havia bem menos pessoas naquele trajeto, era bastante tranquilo.
Tranquilidade essa que não estava na mente do jovem herói.
Não era novidade Peter ter mais ciência de tudo ao seu redor do que uma pessoa comum, mas aquilo chegava a ser absurdo. Cada movimentação de ao seu lado acionava seus sentidos, mas não como perigo. Como que se nomeava aquela sensação?
- Você sabia? – perguntou ele depois de um tempo, o estômago embrulhando só de cogitar contextualizar a sua pergunta – Por isso estava na equipe?
revirou os olhos.
- Cresce, Peter. O mundo não gira em torno e você – resmungou ela, apertando o passo – Eu estava na equipe antes de você entrar no ginásio. Se eu soubesse, não teria ficado por perto.
- O que tem de errado comigo?! – gritou Peter, parando completamente de andar e se surpreendendo ao notar que também parara – O que tem em mim que é tão desprezível assim para você agir dessa forma?!
- Eu! – devolveu ela no mesmo tom, sequer se dando o trabalhão de parar para ponderar suas palavras, ciente de que se arrependeria mais tarde – Acredite em mim: você esteve muito melhor sem mim e vai continuar dessa forma. Vou te deixar na Torre e sumir de novo, não se preocupe.
Peter continuou parado no lugar, a cabeça levemente inclinada e o cenho franzido. Era estranho ver tanta expressão na mais velha, estava fazendo com que as palavras ficassem travadas em sua garganta.
- O que aconteceu com você para pensar tão mal assim de você mesma? – perguntou ele em um sussurro, quase acreditando que a mulher não seria capaz de ouvir – Por que não me quis?
- O que aconteceu com seus pais foi um saco, mas você cresceu com uma família. Você cresceu um herói – respondeu ela, o olhar incapaz de focar em um lugar por muito tempo, principalmente no garoto a sua frente. Era ridículo, mas ela se sentia ameaçada por um adolescente chorão, definitivamente o ponto mais baixo de toda sua vida – Isso tudo apenas aconteceu pela minha ausência, pode ter certeza.
- Sam disse que não ficou surpreso em saber de... Bem, mim. O que ele quis dizer com isso?
- Que ele é um boca aberta e eu preciso parar de contar as coisas para ele – rosnou a mulher, quase dando as costas ao garoto e voltando a perambular pela cidade – Eu não cresci em um lugar bacana, ok? Você foi criado para estudar, fazer o que quiser da vida. Eu fui criada para ser uma espiã, uma assassina. Romanoff passou por algo semelhante com o Red Room, a diferença foi que eu consegui escapar quando ainda era bastante nova.
- Por quê?
- Abusos e maus-tratos. Nenhuma criança deveria passar por aquilo, nem adulto. Quando vi a brecha, não hesitei.
- Abus...? – estranhou Peter, o sangue logo sumindo de seu rosto – , eu...?
- Eu nem sabia o que estava acontecendo comigo. Uma moradora de rua que me ajudou. Com a fuga eu fiquei bem mal, acabou atingindo seu desenvolvimento – explicou ela antes que o garoto pudesse recobrar a habilidade de formular frases – Não me estranha você ter ficado tão baixinho.
O silêncio repentino do garoto atingiu mais do que ela se orgulhava. Nada daquilo era culpa dele, mas tinha certeza que ele estava se martirizando de alguma forma.
- Na maior parte das vezes eu passava nós dois como irmãos. Alguns acreditavam, nem todos. Eu não tinha como trabalhar, o único trabalho que conhecia era roubar informações, atacar pessoas... Fiz um pouco disso para tentar sobreviver. Então um dia eu encontrei essa casa – contou ela, lentamente voltando a caminhar, e Peter a seguindo automaticamente – Não era muito luxuosa, mas eu não estava atrás de fortuna. Só um pouco de comida e algumas notas amassadas. Estava tão debilitada que não percebi que a casa não estava vazia. Tinha te deixado no quintal e corri para ir embora, não lembro no que exatamente eu caí, só sei que cortei o braço, um corte bem feio. Por causa disso acabei desmaiando, quando acordei, as pessoas da casa tinham cuidado do meu machucado, e estavam te alimentando.
- Eram os...?
- Os Parker, pelo visto. Me perguntaram o que tinha acontecido, onde estavam meus pais... Enrolei o máximo que pude, e eles me ouviram e não chamaram a polícia. Quando todos dormiram, eu fugi. E eu não te levei junto – continuou ela, percebendo o exato momento os passos de Peter abandonaram o ritmo regrado que mantinha – Eu estava machucada, mas sabia me virar. Eu fui criada para isso, você não. Não tinha como eu saber se eles cuidariam bem de você, mas qualquer futuro era melhor do que comigo, então eu fui embora. Eventualmente entrei no radar da S.H.I.EL.D., fui recrutada. Alguns anos atrás fui remanejada para os Vingadores, e aqui estamos.
- Eu sinto muit...
- Não sinta – ela logo o cortou, o garoto estranhando a firmeza de suas palavras que não alcançavam seus olhos – Nos saímos bem. Não vá para esse lugar, tudo bem? Não tente imaginar cenários diferentes. A pessoa que você se tornou teria morrido se tivesse ficado comigo, é algo que você tem que ter orgulho.
Peter assentiu no automático, ainda absorvendo as palavras da mulher. Muita informação, muita coisa nova para se acostumar. Definitivamente não gastaria apenas uma noite pensando naquilo, não adiantava se apressar.
- Anda, vou te levar para a Torre – a voz de que o tirou de seus devaneios, o tom costumeiro menos amigável mais uma vez marcando presença.
Só que dessa vez Peter não se sentia acuado.



Fim



Nota da autora: Um dia eu vou aprender a não começar a escrever/postar alguma coisa sem saber o final porque aí chego no final e não sei se deu bom aslkdjalksjd

Nota da amiga intrometida que revisa as coisas: eu odeio o pirralho, mas odeio mais a Madison, e não me venha com essa historiazinha dela no final, continuo odiando.



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