Capítulo 1
Londres, Janeiro de 2001
— Ei, garotas! Quero falar com vocês!
Dylan chama nossa atenção, quando passamos pela sala de estar do dormitório da faculdade. Eu, , e estamos voltando do primeiro dia de aula do ano, mas já com muitas atividades para fazer.
— Oi, Dylan! — cumprimento com um sorriso. Ele namora minha colega de sala e é responsável por alguns eventos aqui no campus, a maioria para os estudantes interagirem mais entre si.
— Vou ser rápido, porque já estou vendo que estão apressadas. — diz. — Vocês topam tocar no mini-festival que ‘tô organizando? Será daqui a quinze dias.
Olho para as meninas e elas balançam as cabeças concordando.
— Quanto tempo será ‘pra cada banda? — pergunta.
— Meia horinha só, mas planejem mais umas duas músicas a mais… — Dylan avisa. — Vai que o público pede bis! — sorri.
— ‘Tá certo, a gente topa. — falo — Então teremos mais uma ocupação nesse começo de semestre... — comento com as meninas.
— Melhor começarmos logo a ensaiar, ‘tô um pouco enferrujada depois dessas semanas longe do violão. — diz.
— Imagina eu! — fala apreensiva. — Há meses que não toco bateria.
— Sei que vão tirar de letra e serão a sensação do evento. — elogia Dylan. — Tenho que ir! Mas muito obrigado por aceitarem meu convite.
O céu escureceu, eu e estamos esperando e aparecem no nosso quarto para planejarmos a setlist, para começarmos os ensaios o quanto antes.
— , cadê elas? Eu ainda tenho que ler uns textos pra aula de amanhã. — fala cansada, mesmo ainda sendo o primeiro dia de aula desse semestre.
— Eu também já estou cheia de atividade, os professores sempre começam bem empolgados, né? — eu digo.
Eu e dividimos um quarto; e , outro. Nos conhecemos desde pequenas, sempre moramos perto uma das outras e estudamos na mesma escola no Brasil. E, juntas, decidimos fazer faculdade fora do país. Foi assim que acabamos em Londres, ainda aos 18 anos.
Mesmo estando sempre juntas, temos gostos e interesses um pouco diferentes. Eu estudo ciência da computação; , química; , história e , economia. Eu avisei que era diferente.
O que temos em comum é a paixão pela música desde pequenas. Temos uma banda, que se chama Younger, com poucas músicas autorais, por enquanto, por isso, também fazemos covers de outras bandas, como Green Day e Blink-182.
Por enquanto, o plano de vivermos da música foi deixado de lado. O máximo que fizemos até agora foi gravar um cd, bem caseiro e simples, com cinco músicas autorais feito com a ajuda de outra amiga nossa, que mora no Brasil.
— Chegamos! — grita, assim que entra no quarto, acompanhada de .
— Achei que não vinham mais. — reclamo deitada na minha cama.
— Você sabe como a é lerda pra se arrumar. — revira os olhos enquanto se joga ao meu lado na cama.
— Claro! Eu que não vou sair de qualquer jeito. — diz num tom divertido. — Vai que eu encontro algum cara bonitinho no caminho…
— , isso aqui é um dormitório feminino. — ri da cara que faz, já cansada desse assunto.
— Vamos ao que interessa, então? — falo — Temos muita coisa pra fazer ainda. Foi loucura aceitar esse convite? — pergunto, apreensiva.
— Não! — me tranquiliza um pouco. — Temos que aproveitar essas chances pra tocar, senão seremos engolidas pelos estudos.
O que era verdade. A banda era um ótimo escape da faculdade.
— Vai ser melhor tocarmos as de sempre, né? — constata. — Não teremos o tempo todo do mundo pra ensaiar.
Fechamos em oito músicas, todas elas covers de Green Day e Blink-182. Mesmo não sendo a primeira vez que tocamos em público, ainda ficamos um pouco inseguras para tocar nossas músicas autorais. Por enquanto, elas ficam só entre a gente.
Duas semanas depois
— Meninas, vocês são as próximas! — Dylan avisa, já nos chamando para ficar mais perto do palco.
— Ok, eu não ‘tô preparada pra isso. — fica assustada com a quantidade de gente que aparece essa noite. — O Dylan disse que seria algo pequeno!
— Amiga, relaxa. A gente ensaiou várias vezes, vai dar tudo certo. — tento tranquilizá—la, mesmo estando tão nervosa quanto.
O mini-festival organizado pelo Dylan encheu bem uma das praças da faculdade e o pessoal parece bem animado para aproveitar um pouco dos dias antes das provas começarem.
Ficamos esperando, do lado do palco, o Dylan anunciar o nome da nossa banda. Estou com o baixo pendurado no ombro, e com suas guitarras e quase quebrando suas baquetas de tão nervosa que está.
— E pra fechar a noite com chave de ouro… — Dylan faz uma pausa — YOUNGER! — grita para o público.
Assim que subimos no palco, o público nos aplaude e vejo no canto da plateia meus amigos de sala gritando meu nome, me dando o maior apoio.
— Boa noite! — cumprimenta o público. — Nós somos a banda Younger, espero que gostem do show!
— Vamos? — , no meio do palco, puxa o início de Dammit na guitarra.
E foi a partir dessa noite que tudo mudou.
Para melhor.
Como nosso show era o último da noite, depois que tocamos a última música que planejamos, as pessoas começaram a esvaziar a praça, ficando apenas nossos colegas mais próximos, esperando para falar conosco.
— Meu Deus! Eu não sabia que vocês tocavam tão bem. — diz Sarah, uma amiga da , que está acompanhada do namorado, Bill. — Bill, seu irmão ia gostar de vê-las tocando.
— O que tem o irmão do Bill? — pergunta.
— Ele ‘tá procurando umas bandas novas pra agenciar — ele explica. — Posso falar com ele sobre vocês.
— Você ‘tá falando sério? — está se segurando para não gritar, dá para ver o seu esforço para manter a calma.
— Não garanto nada, mas já é algo, né?
— Claro! Nós temos umas músicas gravadas, nada muito profissional, mas leva pra ele escutar. — procuro uma cópia do cd na minha mochila. — Aqui, pode levar esse.
— , você sempre anda com isso? — pergunta, querendo rir um pouco.
— Óbvio, ‘tô sempre com uma cópia, vai que uma oportunidade aparece… Como essa agora!
— Tenho certeza que o irmão dele vai curtir, relaxem. — Sarah fala confiante. — Então, para onde vamos? Não quero voltar pra casa agora.
— Nós vamos no dormitório só pra guardar os instrumentos e encontramos vocês depois, pode ser naquele bar lá perto? — pergunto.
— Estamos indo pra lá agora. — Sarah avisa. — Até daqui a pouco!
No caminho para o nosso dormitório, não consegue controlar a felicidade que está sentindo, só falta dar uma estrelinha no meio da rua.
— Meninas, vocês têm noção do que pode acontecer? Nós podemos, finalmente, ficarmos famosas!
— , vamos com calma, ‘tá? — , a sensata do grupo, tenta trazer pra realidade. — Vai que ele nem curte o nosso som…
— Mas vamos pensar positivo, vai que dá certo! — Agora era que mostra sua empolgação.
— Imagina? Eu largaria tudo pra viver da música. — falo já sonhando com essa ideia. — Nossos pais que não iam gostar nada disso.
— Verdade, mesmo gostando do que estou estudando, vocês sabem que a música é minha paixão. — diz . — Por isso ‘tô tão empolgada, quero que isso dê certo.
— Agora só nos resta esperar… — fala, já abrindo a porta do nosso prédio.
Até que não esperamos muito.
Londres, Fevereiro de 2001
— Nós somos a banda Younger! Muito obrigada a todos! Essa será a última música de hoje, uma autoral, espero que gostem. — anuncio no microfone.
Desde o mini-festival, começamos a tocar em alguns pubs para levantar um dinheiro extra, já que as despesas em Londres não são nada pequenas. E, no final de cada show, tocamos uma das nossas músicas, até pra ir perdendo o medo da crítica sobre algo nosso.
Nessa noite, poucos amigos vieram nos ver, até porque a faculdade começou a pesar pra cada um. Hoje contamos apenas com a presença de Sarah, seu namorado Bill e mais um casal que está junto deles, que não conheço.
O pequeno show termina e vamos de encontro aos nossos amigos, cada uma já com a sua cerveja na mão.
— Sarah, muito obrigada por ter vindo, sério. — agradece. — Eu sei que você tem muita coisa pra fazer, porque eu também tenho. — ela ri, mas de desespero.
— Não podia deixar de vir hoje. — Sarah começa. — Quero que vocês conheçam o Fletch, irmão do Bill.
Ela aponta para o outro cara da mesa, que não conhecemos até então.
Meu Deus.
Irmão do Bill.
Sinto me cutucando e com os olhos arregalados, me encarando.
— Oi, boa noite! — Fletch estende a mão para mim e depois cumprimenta também as outras meninas. — Um prazer conhecer vocês. — sorri.
— Meu Deus, ele viu o show todinho. — penso alto demais e todo mundo escuta.
— Sim, sim… — Fletch fala, rindo um pouco da minha reação — E gostei bastante. Só não entendi uma coisa.
— O quê? — logo pergunta.
— Recebi um cd com umas músicas autorais de vocês, mas no show vocês hoje só tocaram uma. — cruza os braços. — Estão querendo economizar nas músicas, ou quê?
Ele escutou todas.
— A gente ainda se sente mais segura tocando covers. — responde rápido. Ainda bem, porque ainda estava em choque e não falei nada.
— Entendo, mas não concordo. — Fletch faz uma pausa para dar um gole na sua cerveja.
— ‘Tá vendo, eu sempre falo pra gente tocar mais música nossa. — sussurra atrás de mim.
— Vocês podem me encontrar amanhã?
— Claro, Fletch! — toma a frente mais uma vez, como uma boa líder da banda.
— Então ‘tá certo, aqui está o meu número — estende um cartão. — Me liguem amanhã de manhã, pode ser logo cedo mesmo.
— Vamos ligar, sim — fala sorridente.
— Ótimo, estarei esperando. — Fletch dá um último gole na sua cerveja. — Agora tenho que ir, amanhã trabalho logo cedo.
E num instante ele e sua namorada se despedem de nós e vão embora.
E agora podemos surtar em paz.
— Sarah, como assim você não avisou a gente que o Fletch viria hoje? — grita assim que Fletch saiu da mesa.
— Óbvio que eu não ia falar. — Sarah nos olha como se fossemos idiotas. — Vocês ficariam super nervosas e ia dar tudo errado. Conheço vocês.
Ela tem razão.
— ‘Tá, você tem razão mesmo. — falo — Desde quando ele escutou nossas gravações? — pergunto para Bill.
— Na mesma semana eu repassei o cd pra ele, mas só hoje ele ‘tava livre pra ver um show de vocês.
— Eu ainda ‘tô sem acreditar. — digo, ainda meio atordoada.
— Pois acredite, ele gostou muito do que viu e escutou hoje. — Sarah abre um sorriso enorme.
— Então vamos embora logo, — olha seu relógio. — precisamos acordar cedo amanhã. , não perde esse cartão, viu?
— Ah, agora vai sobrar pra mim. — revira os olhos. — Tome, guarde com você, melhor. — E entrega o cartão a , que guarda logo na sua bolsa.
— Antes de ir embora… — falo. — Muito muito muito obrigada, a gente demoraria tanto pra ter uma outra oportunidade, se não fosse por vocês.
— Só estou sendo justa! — Sarah sorri. — Uma banda boa, tem que ser conhecida! Vocês merecem.
— Vamos brindar, então! — levanto minha cerveja — Ao futuro? Ao futuro da banda? — olho em dúvida para as meninas.
— , ao futuro da banda — também levanta sua bebida e os outros acompanham.
— À banda Younger! — gritamos e brindamos, animadas por tudo que aconteceu nessa noite.
: Depois desse dia, tudo aconteceu tão rápido, parece até mentira nossa.
: No dia seguinte, nós acordamos bem cedo. Na verdade, eu só consegui dormir porque tinha bebido mais do que o meu normal. Primeira coisa que fiz foi ligar para o Fletch. Já estávamos todas juntas, dormimos no quarto da e da .
Ele marcou uma reunião com a gente para o dia seguinte. Até lá, não conseguimos fazer nada, estávamos ansiosas demais.
: Mas até que tudo foi bem tranquilo naquela primeira reunião, foi mais para conhecer a banda e cada uma de nós. E também para dar uma ideia de como tudo ia seguir, a gente não tinha noção de nada, tanta burocracia.
A coisa ficou mais séria depois, quando ele alertou que não íamos conseguir conciliar a faculdade e a carreira.
: Foi nessa hora que fiquei em dúvida, e acredito que as meninas também. Não porque não queríamos seguir com a banda, mas pelo receio de jogar para o alto o investimento que nossos pais fizeram em nós. E o medo de contar pra eles também, vamos ser sinceras…
: Gosto nem de lembrar de quando contei que ia largar tudo. Minha mãe quase teve um treco de tanta raiva. Meu pai apoiou mais, mas só depois que mostrei que já estava tudo certo, mesmo que só por um tempo, de acordo com nosso primeiro contrato.
: Falando sério agora… Vocês têm saudade dessa época de faculdade?
: Não.
: Jamais!
: Ah, gente! Era legal, mas nada se compara com o que vivemos hoje.
: Eu não tinha noção do que poderia acontecer, mas foi ótimo ter arriscado. E pensando direitinho, todo mundo arriscou. Eu não imaginava que seríamos bem aceitas.
: Até o Fletch acertar nosso contrato com a gravadora, eu só ia dormir pensando: “Isso vai dar merda”.
Só fiquei tranquila quando vi e assinamos o contrato.
E que grana a gente recebeu.
: Nem fala, a gente ficou meio sem noção no começo. Primeiro aquela casa que a gente comprou… Gigante para quatro pessoas, mas não vou reclamar do espaço extra que tínhamos.
, te amo, mas foi bom ter um quarto só pra mim!
: Digo o mesmo, . Escapei da sua bagunça!
: Ei!
Londres, maio de 2001
Mesmo nessa rotina há uns meses, tudo ainda parece um sonho. Tudo gira em torno do nosso primeiro cd, que está com quase todas as músicas prontas, só duas que ainda precisamos dar uns ajustes.
E também falta a capa.
Detalhe.
Acordamos cedo nesta terça-feira, não por nossa vontade, e sim por ordens do Fletch, que aparece na nossa casa logo no café da manhã.
— Então, amanhã a gente tira essas fotos — ele diz animado, no meio da cozinha —, finalmente.
— Quem vai fotografar a gente? — pergunta enquanto tomava café.
— O mesmo fotógrafo que faz todas as fotos da gravadora. — ele começa e nota logo que ia protestar — Nem adianta discutir, vai ter que ser ele mesmo. Falei que vocês queriam que fosse com uma fotógrafa, mas não rolou.
— Se é o jeito… — falo.
— Quem sabe no próximo cd, né? — ele tenta amenizar — Espero que esse faça sucesso, pra que no seguinte vocês tenham mais regalias.
— Esse cara que vai dar a ideia da capa? — pergunto.
— A princípio, sim, mas ele parece ser tranquilo, então se tiverem alguma ideia, podem falar pra ele.
— Contanto que a gente não pareça quatro idiotas, por mim ele pode decidir. — dá um último gole no café e se levanta para lavar os pratos que ficaram na pia da noite anterior, que ela não lavou antes.
Depois que todo mundo termina de comer, recolho todos os pratos para ajudar a responsável pela louça do dia: .
— Esqueci de contar uma novidade pra vocês! — Fletch fala animado. — ‘Tô trabalhando com outra banda, além de vocês.
— Caramba, nem três meses juntos e já fomos traídas. — faz um drama, arrancando uns risinhos.
— Como é essa banda nova? — pergunto.
— Ah, eu já conhecia até antes de vocês, mas eles não deram certo — ele começa — Agora vamos tentar de novo, mas como só tem dois caras até agora, vai demorar pra lançá-los, vamos precisar fazer audições pra achar outros pra banda.
— Ainda bem que já estamos completas, imagina eu, , me apresentando pra conseguir uma vaga? Não ia passar nunca! — faço uma cara assustada e Fletch ri na mesma hora. — Capaz de eu desmaiar na hora.
— Menos um trabalho pra mim! Já achamos a banda completa, por isso vamos lançar logo vocês e depois vamos cuidar da outra banda.
— Ufa, valeu pela preferência! — brinca.
Depois de conversarmos mais um pouco e escutarmos todos os mil avisos sobre o dia seguinte, Fletch vai embora e continuamos na cozinha, fazendo companhia à enquanto ela lava os pratos.
— Já que ninguém tocou nesse assunto, eu toco. — fala.
— Lá vem. — digo, já imaginando o que ela vai falar.
— O Fletch falou, falou e não disse nada sobre os caras.
Bem o que eu imaginava.
— Vai ver ele não quer misturar as coisas. — opina enquanto lava o último prato.
— Ah, que frescura. — reclama. — Vai que são bonitinhos? Guitarristas que nem eu?
— Relaxa, alguma hora a gente conhece eles. — entra na onda também.
— Vocês não perdem tempo, né.
— Falou a santa da casa! — senta com a gente na mesa. — Acha que eu não vi você de papo com um carinha lá da gravadora.
Ops.
— Isso, a gente só ficou no papo mesmo — ela me olha com uma cara desconfiada — ‘Tá, ele me chamou pra sair, eu aceitei, mas não ‘tô muito afim.
— Ele pareceu chato? — questiona.
— Pelo pouco que a gente conversou, não. — respondo. — Eu que não ‘tô no clima, vocês sabem.
Elas olham umas para as outras e que resolve falar:
— , a gente entende que você ainda pensa no Caio, mas vocês acabaram há tanto tempo… — fala segurando na minha mão. — Só o tempo que a gente saiu do Brasil, já tem o quê? Um ano já.
— Eles continuam se falando por email. — me dedura na mesma hora.
— Valeu, . — reclamo — A gente continuou se falando, sim, até porque a gente terminou numa boa — pauso. — Só acabamos porque eu vim estudar aqui, não queríamos ficar a distância.
E foi isso que aconteceu mesmo. Namoramos por uns dois anos e só terminamos porque eu ia me mudar. Caio era um fofo, se não fosse pela distância, ainda estaríamos juntos.
— Mas parece que está, né. — fala — Você continua fechada pra qualquer pessoa que se aproxima de você.
Verdade.
— Você ‘tá certa, mas eu não quero nada com ninguém agora. Vou até desmarcar logo esse encontro. — pego meu celular — Que desculpa eu dou?
— Dá vontade nem de te ajudar, viu. — fala impaciente. — Manda que vai estar ocupada com o trabalho, sei lá.
— Vou mandar isso mesmo, ‘tá bom. — digito e mando logo. — Eu tenho que saber negar logo na hora, depois fico me passando assim.
— É mais simples aceitar e ir. — se levanta. — Vamos se arrumar logo, já tá em cima da hora.
— A gente tem o que hoje mesmo? — pergunto acompanhando-as pela escada.
— Combinamos com o produtor pra terminar de gravar aquelas duas músicas que faltam. — explica. — E de hoje não passa.
Meu celular apita e vejo que é uma mensagem do carinha da gravadora, dizendo que entendia e que poderíamos marcar outra coisa depois.
“Vamos marcar” significa que não íamos de fato.
Ufa.
Menos uma preocupação.
: Eu não sei se estou sendo legal demais, mas até que nossas fotos ficaram legais, né? Não ficou nada brega no primeiro cd.
: A gente saiu com uma cara séria…
: Melhor dizer “misteriosas”.
: Ah, até hoje amo essas fotos. Bem coloridas para o nosso gosto de hoje, se compararmos. Acho que foi por isso que nós não aparecemos sorrindo em nenhuma dessas fotos. Já bastava as cores pra ter algo “feliz” naquele encarte.
: Uma baita propaganda enganosa, porque nesse primeiro cd só falava de coração partido. E nem estávamos assim.
: Eu estava um pouco, mas nada no nível daquelas músicas.
: Fizemos um drama, mas um drama bem-feito!
Capítulo 2
Londres, Maio de 2001
— , ‘tá acordada? — pergunta assim que abre a porta do meu quarto.
Eu ainda não dormi nada e só fiquei encarando o teto desde a hora que subimos para dormir, já que amanhã iremos aparecer na TV pela primeira vez. Estou me segurando para não olhar o relógio de novo, porque sempre fico mais ansiosa e, na última vez que chequei, eram duas da manhã.
Pelo visto está com o mesmo problema que eu.
— ‘Tô sim, , pode entrar. — falo já sentada na cama. — Também não consegue dormir?
— Fiquei rolando na cama e nada. — senta na minha cama — Meu Deus, a gente vai aparecer na tv, . — respira fundo. — Não ‘tô preparada.
— ‘Tava bom demais sem a gente se expor, né? — sorri. — Mas vai ser rápido, só vamos tocar duas músicas e só.
O CD já está pronto e já decidimos qual seria o primeiro single a ser lançado. Semana passada o Fletch chegou com essa novidade que íamos aparecer na TV, em um programa de música aqui da Inglaterra. Ao vivo. Desde então, o surto rola aqui em casa.
— ‘Tava bom demais mesmo. — ela ri — A gente vai chegar com uma cara péssima, olha que horas já! — mostra o visor do celular e me assusto. Quatro horas.
— Agora um chá não vai fazer mais efeito nenhum. — deito. — É melhor a gente tentar dormir, ou pelo menos fingir.
não se mexe.
— Quer dormir aqui? — bato no meu lado vazio do colchão.
— Como nos velhos tempos. — ela ri, já deitando ao meu lado — ‘Tá, três meses atrás.
Não sei a , mas eu só consigo pegar no sono depois que o sol aparece.
Acordo poucas horas depois com o despertador e, logo depois, com uma desesperada gritando pela porta do meu quarto.
— A SUMIU! — grita assim que abri a porta do meu quarto. Para assim que vê deitada na minha cama. — MEU DEUS, EU TE PROCUREI NA CASA TODA!
— , para de gritar. — ela se senta na cama. — Por que esse desespero todo?
— Minha querida, você me pediu ontem ‘pra te acordar, chego no seu quarto e não tem ninguém!
— Ah, foi mesmo. — fala já se levantando — Não consegui dormir e acabei ficando aqui com a .
— Já ‘tá pronta, ? — pergunto.
— Já, o Fletch disse que vem um carro buscar a gente daqui a pouco. Vá logo se arrumar. — fala já me puxando pra fora da cama.
Corro para o banheiro antes que grite novamente.
: Lembro como hoje daquele dia. Estávamos tão nervosas, mas tudo deu certo.
O programa tinha uma pequena plateia e todos foram tão legais e receptivos, eu já estava esperando o pior daquilo.
: Mais pessimistas que nós, impossível!
: O apresentador também foi bem legal, tirando a parte que ele ficou surpreso com o nosso inglês, ninguém merece. Acho que ele perguntou mais sobre o Brasil do que sobre a banda, mas tudo bem.
A surpresa ficou para depois do programa…
: Ficamos um tempo depois no estúdio de TV, mesmo depois do programa ter acabado, o Fletch alugou nosso ouvido por uns minutos, elogiando a nossa performance e, como não poderia faltar, puxando nossa orelha também no que poderia melhorar.
Assim que abrimos a porta para ir embora, a rua estava lotada de gente, para ser mais específica, lotada de adolescentes. Eu fiquei sem entender, até porque a outra banda, já conhecida, que também participou do programa tinha ido embora faz tempo. Ainda ficamos na porta, paradas, sem entender nada.
: Até que alguém gritou o nome da banda. Foi aí que começou uma movimentação em nossa direção.
: Lembro do Fletch sorrindo do nosso lado e só falou:
— Começou, vamos, meninas!
A partir daí, acabou o nosso anonimato. Já tinha umas meninas pedindo autógrafo e eu não tinha ideia do que escrever, eu achei que ia demorar mais um pouco para aquilo acontecer.
Tínhamos aparecemos na TV trinta minutos antes daquilo? Nossa, a galera foi rápida demais.
: Naquele dia tivemos uma noção boa que as pessoas gostaram das nossas músicas, pelo menos de duas delas. O próximo passo foi lançar a primeira música, antes do CD inteiro.
Posso dizer que foi um sucesso antes mesmo do CD ser lançado?
: Ainda bem, né?
Apostaram tanto na gente, era pressão vinda de todos os lados possíveis, que quando esse primeiro single saiu e teve uma boa resposta, o que eu senti foi alívio.
Londres, Junho de 2001
Hoje, logo pela manhã, resolvi sair para comprar uns livros novos numa livraria que fica um pouco distante da nossa nova casa, porém num bairro bem mais calmo. Eu ainda não me acostumei com toda essa atenção que estamos recebendo e, sinceramente, eu só quero sair em paz. E, para isso, não existia uma pessoa mais escondida que eu, só faltava uma máscara para cobrir meu rosto todo.
Compro bem rápido o que eu quero na livraria e volto logo para o carro. Justo hoje, eu esqueço de colocar um CD legal no carro, então tenho que me entreter com a rádio local. Deixo num volume baixo, só para não ficar no silêncio.
Já na rua de casa, algo chama minha atenção.
“Hoje teremos uma novidade no top da semana, de banda e música. Escutem agora o primeiro single da banda Younger, a mais pedida da semana!”
E começa a tocar a introdução da na guitarra. Estacionei super rápido na porta de casa e corro para dentro.
Admito que entro um pouco desesperada.
— LIGA O RÁDIO AGORA! — grito assim que abri a porta.
é a única que está na sala, assistindo algo na TV.
— Menina, que desespero é esse? — se levanta e liga o som. Demorou alguns segundos para reconhecer a nossa música. — ‘Tá, é a nossa música, a gente já escutou na rádio. — fala na maior calma e volta para o sofá.
— Escuta o final, então. — digo me sentando no outro sofá.
“Bom, então é isso, pessoal. Aqui é o Mike e essas foram as mais pedidas da semana! Até a próxima!”
Olho para ela e cruzo os braços.
— MEU DEUS! A gente ficou em primeiro? — ela pergunta e balanço a cabeça confirmando. — MENINAS! — começa a gritar enquanto sobe as escadas. — Fomos as mais pedidas da semana! — consigo escutar os gritos vindos do primeiro andar.
e aparecem logo na sala. desce logo depois, com cara de poucos amigos.
— Que gritaria foi essa? Eu ‘tava dormindo lá em cima. — diz se deitando no sofá.
conta toda a novidade.
— MENTIRA! — grita. — E eu perdi.
— A gente deveria comemorar! — fala animada — Não digo nem sair de casa, podemos fazer algo por aqui mesmo.
— E quem vamos chamar? — pergunto.
— Que tal o pessoal da faculdade? — sugere — Faz tempo que não vejo ninguém.
— Boa! Mas só os mais próximos. — alerto, pensando em uma das mil regras que o Fletch impôs para nós assim que nos mudamos.
— Claro, ‘tá louca? — fala. — Pouca gente.
: E foi no dia seguinte que levamos o primeiro sermão do Fletch. Nossa, ele não parava de falar, só fazia a minha cabeça doer mais ainda.
: Não sei como apareceu tanta gente. Eu só chamei uns quatro amigos.
: Eu também.
: Chamei uns cinco.
: Eu só chamei dois. Alguém vazou e deu no que deu. Apareceu gente lá em casa que eu nunca tinha visto na vida. Galera cara de pau, né? E a bagunça que fizeram? Eu e até tentamos controlar no começo, mas depois eu desisti. O problema já estava feito.
: Eu vi bem vocês tentando controlar a bagunça…
: No começo só, eu que não ia passar a festa toda tentando controlar quem entrava na casa. Desisti logo. que ficou assustada com o tanto de gente que tinha e ficou meio desesperada e começou a mandar um povo embora, só ela mesma. Figura!
: Eu deveria ter expulsado a ponta pé, porque a bronca e a limpeza da casa sobraram para quem? Nossa, ninguém merece limpar a casa estando de ressaca.
: Pelo menos serviu de lição… por um tempo.
: Até o nosso CD ser lançado dois meses depois, em agosto. Fizemos outra comemoração nesse mesmo estilo e quase que dá tudo errado de novo.
: Mas nessa segunda festa o Fletch não falou nada, até porque ele estava tão feliz quanto nós. Para o nosso primeiro CD, foi um sucesso maior do que a gravadora e o nosso empresário esperavam. Boa, meninas!
Londres, Setembro de 2001
Com o começo do outono em Londres, a divulgação do nosso CD continua a mil e, por isso, mal paramos em casa. Passamos por rádio, TV, demos entrevistas para algumas revistas e, finalmente, começamos a planejar nossa primeira, e pequena, turnê.
Acordamos super cedo e fomos para gravadora resolver toda papelada e burocracia que envolve a nossa banda. Fletch nos encontrou logo na entrada do prédio.
— Bom dia! — cumprimenta cada uma de nós — Vamos subir logo, tenho novidade ‘pra vocês. — e entra no prédio.
— Fletch, não gosto quando você faz esses mistérios. — fala, entrando por último no elevador. — A gente nem sabe ao certo o assunto da reunião.
— Não tem mistério nenhum, é sobre a turnê de vocês. — explica. — E sobre o Busted.
— Busted? — eu e perguntamos na mesma hora.
— É aquela outra banda que comentei com vocês. — Fletch diz enquanto segura a porta do elevador para sairmos. — Lembram? Que não ‘tá completa ainda?
— Ah! Lembro sim. — eu digo e, imediatamente, olho para , já atenta a conversa.
— Eles vão participar também? — ela pergunta, como quem não quer nada.
— Sim, mas eles ainda não chegaram, vamos aproveitar esse atraso deles ‘pra discutir o que cabe a Younger. — ele diz — Primeiro, vocês. — e abre a porta da sala.
Chegamos na tão conhecida sala de reunião do quinto andar. É enorme e tem uma vista linda para a cidade, pena que hoje está chovendo mais que o normal, até para Londres.
Para essa reunião, também se juntam a nós duas mulheres responsáveis pelo nosso marketing e outros dois homens, bens mais velhos que a gente, que tratam de todos os contratos da gravadora.
— Podemos começar falando sobre as datas da turnê? — Fletch é o primeiro a falar algo, sentado na ponta da mesa. Todo mundo concorda e ele prossegue. — Pensei em janeiro, que tal?
— Fica muito em cima ser em novembro? — pergunta.
— Até daria, mas temos outros planos para os próximos meses. — um dos senhores explica. — Daqui a pouco o Fletch explica para vocês.
— Uns meses a mais, ou a menos… — falo. — Bom que nesse tempo a mais, mais pessoas vão nos conhecer.
— Verdade. — concorda. — Então, qual seria o plano ‘pra outubro e novembro?
— Deixa eu ver se James e Matt chegaram. — Fletch pega o telefone que fica em cima da mesa e liga para a secretária — Oi, bom dia! Tem dois meninos esperando para falar comigo aí? — silêncio — Isso, são eles, pode mandar entrar. Obrigado. — desliga — O assunto cabe a eles também, prefiro falar de uma vez só.
Não demora muito para dois garotos entrarem na sala e se juntarem a nós na mesa.
— Meninas, esses são o James e o Matt — Fletch apresenta e se vira para eles — Elas vocês já devem saber quem são.
— Claro, ‘tô viciado no CD de vocês. — fala James sorrindo para nós. Matt apenas concorda com a cabeça, ele parece ser mais sério.
Não deu em tempo de agradecer direito e nosso empresário começa a falar de novo.
— Já que todos estão aqui, vamos a nossa ideia para o próximo mês: — Fletch começa — O mais importante vai ser achar os outros integrantes do Busted, já demoramos demais ‘pra fazer isso e, por isso, a turnê de vocês vai ficar para janeiro.
— Fletch, desculpa perguntar, mas o que a gente tem a ver? — questiona.
— Eu tenho que estar presente nesses dois compromissos e vocês vão ajudar nas audições, além do que vocês já fazem ‘pra banda de vocês. — Fletch informa na maior calma. Logo ele nota nossas caras confusas e continua. — Vamos usar vocês ‘pra atrair os candidatos.
— Como é que é, Fletch? — reclama — A gente vai servir de isca?
Escuto James e Matt rindo um pouco da alteração da .
— Não é bem isso que vocês estão pensando. — ele explica — Vamos usar o nome de vocês e aproveitar esse sucesso da banda para chamar a atenção de mais candidatos.
— Seria mais ou menos isso. — uma das moças do marketing entrega um panfleto para cada um de nós.
— Ah! — diz assim que termina de ler — Entendi agora. Mas a gente vai ficar lá nas audições com vocês?
— Não durante todo o processo, mas em algum momento vocês vão aparecer pra pelo menos dar um “oi”.
— Vocês vão selecionar quantos caras? — pergunto.
— A princípio pensamos em apenas mais um, mas dependendo dos candidatos que aparecerem, podemos selecionar dois. — Fletch remexe nos papéis que estão em cima da mesa. — Precisamos ver os locais pra isso e divulgar o mais rápido possível. — fala para os outros da gravadora. — Younger e Busted, estão dispensados.
Saímos da sala e paramos no corredor para falar com Matt e James.
— Finalmente nos conhecemos! — James quebra o silêncio.
— Verdade, o Fletch ‘tava adiando isso com a gente faz tempo. — Matt completa. — Parecia até que ‘tava escondendo vocês. — ri.
— Não me diga… — diz e olha para nós rindo. — Bem que eu notei isso também.
Ah, não. Começou.
— A gente podia sair antes das audições começarem. — James sugere.
— Ah, claro — fala —, mas acho que essa semana não dá ‘pra gente, né? — olha para , que sempre lembra dos nossos compromissos.
— Essa semana ‘tá ruim, mas na próxima dá. — sorri para eles, que retribuem.
— Então, tá certo. — James se anima. — Ligo ‘pra vocês e a gente combina. — Matt o cutucou. — O que foi, cara?
— Olha a hora! — Matt mostra o relógio, apreensivo. — Vamos perder o trem. Meninas, desculpa, mas a gente precisa ir.
Com uma rápida despedida, eles correram para o elevador.
— Agora entendi todo o mistério do Fletch. — puxa logo o assunto.
— , dessa vez vou concordar com você. — ri.
— Meu Deus, basta ser inglês que vocês tão paquerando! — fala, impressionada com as duas. — Eu ‘tô fora dessa! — e sai em direção ao elevador.
— Eu também! — sigo a .
— Ah não, vocês vão sair com a gente também — pede assim que nos alcança, à espera do elevador —, senão vai parecer um encontro duplo.
— E não vai ser isso mesmo? — cruza os braços.
— Vai, mas não precisa ficar tão na cara. — sussurra assim que um grupo de pessoas passou por nós. — E mais, eles querem conhecer todas nós, a banda.
— Isso, a gente que ‘tá mal intencionada — dá uma piscadinha.
— Vocês não existem — digo. O elevador chegou, esperamos todo mundo sair e entramos. — Então eu e escolhemos o local! — concordou logo comigo.
— ‘Tá certo — aceita. —, mas escolham um local legal, por favor.
— Deixa com a gente! — fala e olha para mim, já rindo.
“Legal” ela quis dizer para quem?
Uma semana depois
— Eu não acredito que caí na lábia de vocês duas!
reclama assim que estaciono o carro perto do boliche novo, que abriu aqui pela vizinhança.
— Você queria que a gente fosse pra onde? — pergunto rindo da sua cara surpresa.
— Um bar? Boate? — ela lista.
— Ó, eu e pensamos aqui porque vai ser melhor pra conversar. — explico.
— E mais descontraído também. — completa. — Nem adianta reclamar, já avisei aos dois pra encontrar com a gente aqui. Vamos logo. — abre a porta do lado do passageiro e sai do carro.
Eu e fazemos o mesmo e continua no banco de trás.
— , vamos logo, vou fechar o carro. — falo.
— Eu ‘tô arrumada demais, ‘tô com vergonha.
— Bom que chama atenção de um jeito bom — fala abrindo a porta pra ela sair e nada acontece. — , deixa de coisa, você ‘tá linda, vamos!
E, finalmente, ela desce do carro.
— Não parece estar muito cheio, né? — observa a rua e não tem muitos carros por perto.
— É bem o que queríamos quando marcamos numa quinta-feira. — dá uma piscadinha para nós. — Se isso não for legal, culpem a . — diz antes de abrir a porta do estabelecimento.
— Ei, não jogue a bomba pra mim! Ela amou a ideia na hora.
Entramos e ficamos um tempo admirando o local. Por fora parece ser um estabelecimento bem simples, mas por dentro era um pouco mais chique para um boliche. Ou vai ver só achamos isso porque tudo ainda estava novinho em folha.
— Eles já chegaram? Não ‘tô achando. — pergunta.
— Acho que são eles ali! — vejo um garoto loiro, e presumo que seja James, e outro do lado dele que parece muito com o Matt, perto do balcão onde fornecem os sapatos para jogar boliche. — Vão vocês duas na frente. — empurro e .
— Nem precisa falar. — pega pela mão. — Vamos, !
E disparam na nossa frente.
— Essas duas não existem. — ri.
STRIKE!
— Uhu! — grito logo depois de derrubar os dez pinos que tinha na pista. — Então, parece que ganhei a aposta. — aponto para o placar, para que todos da mesa vejam que eu ganhei. Admito que não sou uma boa competidora. Não sei se sou mais irritante quando ganho ou quando perco.
— Eu jurava que você era ruim no boliche, mas acho que confundi com a … — falou, sentada na ponta da mesa — Droga, agora a sua louça também vai sobrar ‘pra mim. Vou até pegar outra cerveja depois dessa. — ela deixa a mesa e me sento no lugar dela.
— Depois você vai me ensinar a jogar melhor, sou uma negação mesmo — ri envergonhada.
— Claro, . — pego um pouco da batatinha que ainda tinha no pote. — A gente pode vir mais vezes, tão perto da nossa casa.
volta com uma cerveja e puxa uma cadeira para sentar perto de mim.
— Voltando ao assunto que ‘tava antes da me humilhar na pista… — começa. — Como andam as inscrições pro Busted?
— Vão muito bem, melhor do que esperávamos — Matt fala animado.
— Já decidiram se vão selecionar um ou dois? — pergunta.
— Ainda não, mas acho que não vai ser a gente que vai decidir isso. — James explica.
— Se acharmos um que preste, já me dou por satisfeito! — Matt diz e repara na minha expressão, um pouco assustada. — É sério, já nos juntamos com outros caras e não deu. Parece até fácil, mas é difícil selecionar alguém que a gente não tem noção de como seja.
— Relaxem, não é possível que no meio de tanta gente, vocês não gostem de ninguém. — tento melhorar o ânimo deles. — Capaz de vocês ainda terem dúvida de qual escolher, com tanta opção boa que vai ter.
— Espero que esteja certa!
: Eu deveria ter apostado sobre isso também naquele dia, né? Eu estava muito pé quente.
: Eu bem que sei. Depois disso, não apostei mais nada com a .
: Amiga, supera, foram só duas semanas lavando louça!
: Nós também pensávamos que nem a , principalmente depois que vimos a quantidade de inscritos para tentar uma vaga na banda dos meninos.
Não participamos da seleção, até porque, no final das contas, não tinha nada a ver com a gente.
: Aquele dia foi bem cansativo. Aparecemos no final do dia no Pineapple Dance Studios, por ordens do chefe, depois de uma entrevista na rádio e acabamos conhecendo os quatro escolhidos para um segundo teste.
Londres, Outubro de 2001
Os testes para o Busted já tinham acabado quando terminamos nossa entrevista na rádio, pelo final da tarde. Assim que entramos no carro, recebemos uma ligação do Fletch pedindo para nos encontrarmos lá em Covent Garden, onde estavam acontecendo os testes.
— O que será que ele quer? — pergunta. — Parecia urgente?
— Ele ‘tá tranquilo, só disse que não tem tempo ‘pra uma reunião amanhã, por isso quer resolver logo hoje — explica depois de desligar a chamada com o Fletch. — Aproveitar que estamos livres agora.
— Espero que seja rápido, só quero chegar em casa, comer e dormir. — digo deitando no ombro da .
— Já já! — me consola —, mas o bom é que vou ver o James antes de ir ‘pra casa. — ri.
— Hm, temos alguém apaixonada? — brinco.
— Não é ‘pra tanto, .
Até onde eu soube, depois que saímos para o boliche, continuou conversando com o James e saíram algumas vezes depois.
— E você dispensou mesmo o Matt, né? — pergunta a .
— Sim, … Não rolou do jeito que eu pensava, não temos nada a ver.
Finalmente chegamos ao estúdio e a rua já estava deserta, diferente de como estava mais cedo, como James contou para . Seguimos a pelas escadas até o segundo andar daquele prédio. Ainda no corredor, encontramos James e Matt.
— Oi, meninas! — James fala assim que nos vê. Cumprimenta cada uma com um abraço e com um beijinho extra. Fofos.
— Vão falar com o Fletch? — Matt pergunta.
— Sim, ele ligou pedindo ‘pra gente dar uma passada aqui. — digo. — Cadê ele, por sinal?
— ‘Tá aí dentro com os quatro caras que escolhemos ‘pra um segundo teste. — James aponta para porta em frente.
— Ah, e como foi? Muita gente boa? — se anima, ainda abraçada ao James.
— Muita, foi difícil escolher, mas o pior vai ser agora, né, escolher entre eles. — James se vira para o Matt. — Podia ficar logo os quatro, fazia uma banda gigante.
— Cara, não viaja. — Matt ri.
Ficamos jogando conversa fora até, finalmente, Fletch aparecer pela porta.
— Então a gente se vê daqui a duas semanas! — ele diz para os quatro garotos enquanto saem da sala. Todos acompanhados de um violão e pareciam ter mais ou menos a nossa idade. Diferente do Fletch, que parecia estar um caco, os quatro pareciam bem animados para quem passou o dia em testes.
— A gente vai lá falar com eles, antes deles irem embora — James avisa e puxa Matt.
Só foi os meninos saírem que Fletch nos chama:
— Vamos, meninas, prometo que vai ser rápido!
— Ó aí, , ‘pra sua felicidade! — brinca, já entrando na sala.
Mas, antes de entrar na sala, sinto alguém cutucando meu ombro, me viro e vejo que é um dos garotos selecionados, um loiro e mais alto que eu.
— Você que é a ? — ele pergunta um pouco envergonhado.
— Sou eu! — sorrio.
— O James disse que eu podia pedir um autógrafo pra vocês — ele fala bem rápido — É ‘pra minha irmã, ela é fã de vocês… Se ela souber que vocês ‘tavam aqui e não consegui nada, ela vai me matar! — ele olha por cima do meu ombro — Eita, mas as outras já entraram, parece que o Fletch ‘tá com pressa.
— Ele sempre ‘tá com pressa, fica tranquilo. — me viro e vejo que as meninas me abandonaram mesmo. — Tem papel e caneta aí?
— Ah, claro, tá aqui — estende o que pedi. — Pena que eu não trouxe o cd, não sabia que vocês iam aparecer aqui.
— Em outros tempos, eu teria algumas cópias na minha bolsa, mas as meninas me intimaram a parar de andar com cd por aí. — reviro os olhos. — Então, qual o nome dela?
— Carrie.
— E o seu?
— Tom — ele responde —, mas não precisa de um autógrafo pra mim, só ‘pra minha irmã mesmo.
— Você não gosta da minha banda? — pergunto fingindo estar ofendida e, pela reação dele, ele leva a sério.
O garoto fica rosa de vergonha na hora.
— Não! Não é isso, a banda de vocês é muito boa. — ele começa a se explicar bem rápido e um pouco nervoso. — Só não queria tomar muito seu tempo.
— Relaxe, ‘tô brincando. — rio um pouco e foco no papel.
Seu irmão falou que você é fã do nosso trabalho, fico muito feliz!
Que a gente se encontre algum dia por aí :D
xx,
P.s.: Não acredito que o Tom não é fã da Younger, como você :(
Por favor, dê um jeito nisso! ;)
Assim que termino, Fletch abre a porta me chamando.
— , estamos só te esperando. — fala bem sério.
— ‘Tô indo, já terminei aqui. — dobro o papel e entrego a Tom, junto com a caneta. — Prontinho.
— Valeu, mesmo! — sorri e percebo logo uma covinha no seu rosto — E desculpa te atrapalhar.
— Foi nada. — digo e escuto Fletch impaciente na porta. — Até mais, Tom.
— Até, !
Capítulo 3
Londres, Outubro de 2001
Nos últimos dias estamos tendo algumas folgas ou, quando temos algo, não preenche nosso dia por inteiro. O motivo de estarmos menos ocupadas assim é porque o Fletch está super ocupado resolvendo a seleção para o novo integrante do Busted e, pelo visto, os meninos também não tiveram mais descanso. Digo isso porque faz tempo que não sai com James ou que ele não aparece do nada aqui em casa.
Hoje é um desses dias livres e o único compromisso que eu tenho é cumprir a promessa que fiz a de começar a assistir Star Wars.
Sim, eu nunca assisti.
Julgamentos à parte, esse é nosso plano tranquilo para mais tarde. escapou porque provavelmente vai sair com o James e deixou um mistério no ar quando perguntamos se ela queria se juntar a nós, só falou que tinha outros planos…
Para fazer jus à folga, levanto da cama mais tarde que o habitual e desço para comer alguma besteira, só para enganar o estômago, até porque está perto da hora do almoço.
Não encontro nenhuma das meninas pela casa, presumo que também estejam aproveitando a folga e dormindo mais um pouco. Passo o café, encho minha caneca só com isso e volto para o meu quarto.
Ignorando a bagunça da minha mesa, arranjo um espaço para a caneca de café e ligo o computador para ver meus e-mails.
Assim que a página carrega, vejo um e-mail dos meus pais e outro de Caio, que chama minha atenção e logo abro para ler.
Assunto: Procura-se !
Oi, !
Tô mandando esse email porque faz tempo que você não manda notícias…
Fiquei preocupado em como anda a baixista mais famosa da Inglaterra do momento! Mas entendo que você deve estar bem ocupada com isso tudo.
Vejo muitas entrevistas com vocês pela internet, fico tão orgulhoso de te ver toda feliz nas fotos, junto com as meninas… queria estar aí e viver isso com você, você sabe, né?
Me manda notícias, tô com saudades!
Caio
Ele não é um fofo?
Eu estou mesmo há um tempo sem mandar notícias para ele, acho que parei de mandar e-mails logo depois que o CD foi lançado e ficamos super atarefadas com a divulgação, mas até antes disso, nós trocamos mensagens quase todos os dias.
E esse e-mail mexe comigo mais do que deveria, porque, sendo bem sincera, eu não percebi que fique esse tempo todo sem dar notícias ao Caio. Pode ter sido por eu estar ocupada? Poderia. Mas fico pensando se já não seria uma falta de interesse minha, no fundo. Claro que eu também sinto saudades, mas ao mesmo tempo não como antes, não sei se isso faz sentido.
Parece que aos poucos vou deixando para trás essa história que tive com ele.
Fecho a mensagem de Caio e marco como não lida para lembrar de responder mais tarde, não estou a fim de responder agora.
O café acaba e desço para cozinha de novo para pegar mais um pouco e encontro na sala vendo alguma besteira que passava na TV.
— Acordou agora? — ela pergunta dando um gole numa caneca cheia de café.
— Nada, esse café que você tá tomando fui eu que fiz. — sigo para cozinha e escuto ela vindo atrás de mim.
— , vai fazer algo pro almoço?
— Não tô a fim de cozinhar nada hoje, pra ser bem sincera. — encho minha caneca.
— Ótimo, então você vai comigo lá no hotel que tá tendo o segundo teste pra banda dos meninos! — sorri.
— Ah não, . — reclamo já saindo da cozinha e ela me segue de novo. — Por que você precisa de mim pra ir atrás do James? — me sento no sofá e ela me acompanha.
— A gente precisa despistar o Fletch, ele já tava tentando arrancar algo do James sobre a gente.
— E o que é que tem o Fletch saber disso? — pergunto confusa.
— Você não escutou o que ele avisou pra gente naquele dia lá em Covent Garden? — continuo com minha cara de dúvida e ela prossegue — Que a gente não pode se envolver com eles?
— O quê? Mas que besteira… — solto uma gargalhada. — Eu não lembro disso. Que regra mais sem sentido.
— Ah! Você ainda tava lá fora quando o Fletch nos avisou sobre isso, porque viu a gente mais próxima dos meninos. — explica. — Acho que ele nem esperou você entrar porque só se importava em dar esse aviso pra mim… Cara esperto!
— Tá, então eu vou te acobertar nessa — ela vibra —, mas só porque achei muito sem noção essa regra!
— Ah, maravilhosa! — me abraça — Quando precisar, vou te acobertar também.
— Vou cobrar — bebo mais café. — Então, qual é o plano? Só chegar lá?
— Vai ser o seguinte: como ele tá mais ocupado hoje, a gente marcou de almoçar juntos.
— Eu vou ficar lá de vela? — era só o que me faltava.
— Não, . Vai ter mais gente, o Matt e mais alguém, esqueci quem ele falou. — pausa para o café. — A gente só precisa inventar algo pra falar com o Fletch, um motivo pra gente ir lá do nada.
— Você tá pirando, ele não vai nem se importar com a gente lá.
— Por que mesmo no dia de folga, vocês ainda me procuram? — Fletch pergunta assim que vê a gente na porta do auditório do hotel.
me olha com os olhos pulando de assustada e tento pensar rápido em algo.
— Fletch, a gente teve uma ideia sensacional pra um novo clipe. — digo com a maior empolgação possível, mas na verdade eu só quero me esconder depois dessa desculpa tão esfarrapada. balança a cabeça confirmando.
— Meninas, eu tô super ocupado hoje, vocês sabem — aponta para o auditório —, a gente pode falar sobre isso outro dia? Quero mesmo ouvir as ideias de vocês, mas agora vão descansar!
Ótimo, agora ainda temos que inventar algo para um clipe novo.
Estamos nos afundando na mentira, mas pelo menos essa agora deu certo.
— Desculpa atrapalhar, Fletch — fala enquanto tenta ver quem está dentro do auditório. — Vocês não vão parar pra almoçar? — olha o relógio.
— Caramba, é verdade! — exclama e entra no auditório, nos deixando sozinhas.
— Que desculpa péssima, … — fala se afastando um pouco da porta.
— De nada por estar te ajudando. — cruzo os braços. — Vai pagar o meu almoço, pelo menos. — intimo.
— Pode pedir o que quiser! — diz e beija minha bochecha.
Escuto uma movimentação dentro do auditório e um pessoal começa a sair. Logo vejo Matt, que vem logo ao nosso encontro e, em seguida, James sai conversando com o Tom. Lembro na hora da irmã dele que é nossa fã.
— Achei que não ia sair mais daí! — fala assim que James se aproxima. Noto que dessa vez os dois só se cumprimentam com um abraço discreto. — Vamos almoçar?
— Agora! Tô morrendo de fome, o Fletch esqueceu total da hora do almoço. — James esfrega a mão na barriga. — Nos acompanha, Matt?
— Hoje não, vou aproveitar esse intervalo pra resolver um negócio, volto já! — Matt já fala meio apressado e desaparece pelo lobby do InterContinental.
Nesse tempo todo, noto que Tom continua do lado do James e quieto.
Minha amiga nota também pelo visto e fala:
— James, apresenta a gente pro seu amigo.
— Ah, foi mal. — James apoia a mão no ombro do garoto — Tom, essa é a e a você já conheceu naquele outro dia. — e ele nos cumprimenta.
— O Fletch tá tirando vocês do sério? — pergunta.
— Um pouco… — Tom ri — Hoje tá mais puxado que no primeiro dia, mas acho que estamos indo bem. — olha desconfiado para James.
— Concordo! Assim fica difícil de escolher. — ele olha o relógio — Melhor a gente ir logo comer, nosso intervalo não é muito grande. — olha para .
— Então vamos logo, tô morrendo de fome. — ela puxa o James pelo braço — Boa sorte no teste, Tom! — antes de desaparecer com o namoradinho, ela sussurra no meu ouvido — Dá um tempinho pra gente. — e ainda manda um beijinho.
Eu só tenho amiga folgada, incrível.
Fui abandonada com o garoto fofo.
— Sua irmã gostou do recado que eu mandei? — tento puxar conversa.
— Nossa, ela amou! — ele parece bem contente. — Ela tá me devendo muito agora depois que consegui isso. — ri.
— Não acredito que você ainda tá se beneficiando com isso! — brinco — Coitada, cobrou dela como?
— Ainda não pensei em nada, vou deixar pra cobrar essa dívida depois… — fala pensativo — E ela tá fazendo bem o que você pediu, ela não para de botar o CD de vocês pra tocar pela casa! — ri.
— Ah, não acredito, que fofa! — digo — Mas espero que estejam gostando e não irritando a casa inteira, imagina?
— Fica tranquila que todo mundo gosta.
— Ainda bem — dou um sorriso.
Minha barriga só falta gritar pedindo por comida e percebo que já dei tempo demais para os pombinhos. Será que ele escutou?
— Você vai almoçar por aqui? — pergunto.
— Vou aqui perto, os caras combinaram comigo pra gente ir junto. — ele fala e olha ao redor procurando por eles. Acompanho e vejo uns três meninos perto da entrada do hotel. — Acho que eles estão me esperando.
— Ah, vá lá, então. — digo — E eu vou filar um almoço por conta da aqui. — aponto para o restaurante. — Ela tá me devendo uma, que nem a sua irmã.
— Já vai gastar seu trunfo? — ele ri.
— Não, não… — balanço a cabeça. — Isso já tava no trato. — Noto que continuam esperando ele na porta do hotel. — Melhor você ir logo…
— Espero que não me matem — exagera — Até, . — dá outro sorrisinho.
— Até! E boa sorte no teste.
Ele agradece e vai encontrar os outros candidatos. Já eu entro no meu papel de vela assim que chego na mesa onde está o casal.
— Achei que não vinha mais. — James fala assim que me sento na mesa. Ele e já começaram a comer.
Dou uma olhada para minha amiga e ela só gesticula um “obrigada”.
— Fiquei conversando com o Tom, gente boa, né? — falo enquanto olho o cardápio.
— E ele é bom, gostei dele, tava falando sobre os caras com a antes de você chegar.
— Acha que ele passa? — pergunta.
— Eu gostaria, mas não decido sozinho. — diz — Matt disse que lembra dele da escola, mas acho que não eram próximos.
O garçom chegou, pedi meu almoço e ainda uma sobremesa.
— Tenho direito à sobremesa também, só avisando. — aviso a .
— A senhora quem manda. — ela diz e manda uma piscadinha.
James olha confuso para nós.
— Ela me convidou pra almoçar, então ela quem vai pagar. — explico.
— Ah, justo. — ele concorda — Pediu o prato mais caro, né? — brinca.
— Eu até olhei qual era o mais caro, mas não é uma comida que eu gosto, infelizmente.
— Preciso lembrar de não te chamar mais pra almoçar no futuro, desse jeito eu vou falir. — se pronuncia.
É só não me colocar em furada.
A noite de filmes com a minha baterista favorita foi muito bem planejada. A pizza já está a caminho e a cerveja já está na geladeira. Mesmo que eu não goste do filme, pelo menos vou comer e beber bem. Estamos na sala, quando aparece toda arrumada.
— Como estou? — ela dá uma voltinha e balança o vestido preto.
— Garota, assim você mata o James! — aplaude. — Pra onde vocês vão?
— Ele disse que era surpresa. — sorri, mas logo parece preocupada — Espero que seja melhor que o canto surpresa de vocês.
— Agora sobrou pra gente! — falo — Admita que o boliche foi bem legal.
— Pra você que ganhou tudo, né. — disse e escutamos a campainha. Ela corre pra abrir, achando que é James — ! — grita — Pediu pizza?
— Sim! — pego minha carteira na mesinha do lado do sofá e vou para a porta. Pago e volto com a pizza, deixando a caixa na mesa de centro.
aparece na sala com duas cervejas e se junta a mim no tapete da sala.
A campainha toca de novo e dispara para abrir.
— , você tá linda demais! — escuto a voz de James. — Acho melhor mudar o nosso destino.
ri e pergunta:
— Quer entrar?
Logo os dois aparecem na sala.
— Isso que é vida, viu. — ele comenta assim que nos vê no tapete da sala, de moletom, segurando uma fatia de pizza numa mão e uma long neck na outra.
— Nada como a noite chique de vocês… — fala — Vão pra onde?
— Surpresa! — ele responde.
— Ô, pombinhos — começo — não tô querendo me meter, mas não é arriscado vocês saírem juntos?
— Um pouco, mas a gente evita esses cantos muito movimentados. — ele explica — Vamos? — pergunta a e ela pega a bolsa que estava no sofá.
Eles já estão saindo quando lembro de uma coisa.
— James, espera! — me levanto e ele volta para sala. — Como foram os testes? Já escolheram alguém?
— Ótimos! Foi difícil, mas conseguimos escolher dois.
Só tive contato com um candidato, o Tom, será que ele passou? Espero que sim.
Fico na dúvida se pergunto ou não, certeza que e vão levar para outro lado.
— Ah! Que legal! — sorrio — A gente pode saber quem entrou pra banda ou é segredo?
— Eu poderia fazer um suspense, né? — ele cruza os braços — Até porque já sei sobre quem você quer saber…
não perde tempo e fala:
— A gente só conheceu um e foi aquele garoto loiro. — pausa — Qual o nome dele mesmo?
— Tom — respondo rapidamente e as meninas me olham. — O que foi? Eu só sei o primeiro nome dele e que a irmã dele é nossa fã. — me viro para James — Deixe pra lá, não precisa falar nada, não sou curiosa. — volto para o sofá.
Eu sou, mas vamos parecer superior.
— Já sei! — ele começa — Podemos sair amanhã e vocês conhecem eles.
— Boa ideia! — fala — Agora vocês escolhem o local.
— Vou pensar em algo legal. — ele olha o relógio — , melhor a gente ir logo.
— Vamos! Eu já tô morrendo de fome, tô quase pegando uma fatia da pizza. — ela diz e puxa James pelo braço. — Bom filme pra vocês duas! — grita antes de fechar a porta.
pega o controle remoto e se acomoda no outro sofá.
— Preparada pra ficar viciada?
A noite anterior foi longa e bem divertida com a e gostei tanto do filme que emendamos e assistimos mais um. Ela pode ter me viciado nisso? Talvez, mas ela não precisa saber.
Acordei há mais de uma hora e ainda não saí do quarto, continuo sentada na frente do computador desde a hora que levantei.
Mais precisamente, continuo sentada encarando o e-mail do Caio, sem saber o que responder.
Alguém bate na minha porta e entra em seguida.
É a .
— Bom dia, fofinha. — ela senta na minha cama — Achei que tava dormindo, vim pra te acordar.
— Ah, acordei faz tempo e tô aqui pensando em como responder isso. — aponto para o monitor. — Vem ver.
— O que foi? — pergunta em pé, já do meu lado. Lê rapidinho o que aparece na tela — Ah, que fofo! Você nunca mais falou dele, tava até estranhando.
— Eu falava muito?
— Falava algo, né. Agora, nada. — volta para minha cama — Responde logo, tem nada demais, você faz isso desde que a gente chegou aqui.
Continuo encarando a mensagem e pergunta:
— Você quer responder?
— Quero — pauso —, na verdade seria falta de educação não responder, né?
— É… Eu responderia. — ela começa — Conta o básico, até porque não teve muita novidade de lá pra cá. — ri um pouco. — A gente tá numa rotina. Uma rotina louca e diferente, mas é uma rotina.
— Hm, verdade.
— Responda logo e desça pra tomar café. — ela se levanta — Vou fazer panqueca de banana!
— Ah, então vou comer primeiro! — me levanto e ela já me empurra para a cadeira de novo. — Ei!
— Só depois! — diz e me dá um beijinho na bochecha — Te conheço bem e você vai ficar enrolando pra fazer isso. Te espero lá embaixo. — e sai do meu quarto.
Respondo a mensagem falando o básico do básico do que aconteceu nos últimos tempos, até porque como ele mesmo disse, ele está acompanhando as notícias sobre nós e conto um pouco sobre a nossa primeira turnê (e peço segredo). E só.
Acho que minha barriga roncando contribui um pouco para minha resposta ser tão curta.
: Agora, relembrando o começo da banda, percebi que éramos comportadas demais. Não demos trabalho para o nosso empresário.
: Muito certinhas para tocar punk rock.
: Na frente das câmeras, sim. Infelizmente, nesse meio tudo é aparência e tínhamos que manter a nossa.
: Vou falar por mim, mas acho que vocês também tinham esse sentimento de estar pisando em ovos quando estávamos na frente das câmeras. Vai que a gente falava alguma merda.
: Garota, olha o palavreado!
: Agora pode falar, porra!
: Mas enfim, era bem isso mesmo, … A casa era nosso refúgio.
: O que acontecia na nossa casa, ficava na nossa casa!
Londres, Outubro de 2001
— , foi por isso que você sumiu ontem à noite, né?
pergunta assim que abre um embrulho de papel no centro da mesa e revela a erva que ela conseguiu.
— Tá louca? — fico surpresa com a quantidade — Pra que isso tudo de uma vez?
— É pra durar, viu? Não vou sair toda hora pra isso. — ela explica. — E quero aproveitar que finalmente temos uma cozinha só nossa pra fazer brownie com isso.
Realmente, a cozinha compartilhada na faculdade era a treva.
— Vai fazer agora? — pergunta animada.
— Hoje não… — ela pausa — Sem saco pra cozinhar hoje, ainda mais isso que é cheio de firula. — Sem mais perguntas. Vamos? — acende um incenso e deixa em cima da mesa.
— Eu tô assistindo muito That 70’s Show pra notar que estamos no nosso circle — digo quando noto como nos distribuímos ao redor da mesa de centro. —, mas neste tá permitido chorar e falar dos sentimentos! — faço uma cara de choro super falsa.
— Ah não! Sem lágrimas. — discorda — Se for pra ficar triste, eu bebo vinho.
— Dá pra adiantar, ? — fala impaciente.
— Só porque me apressou, você vai ficar por último. — e entrega o baseado para que está a sua esquerda — Vai com calma, garota, isso não vai fugir.
Um tempinho se passou e continuamos sentadas no mesmo local.
— Eita, esqueci de avisar pra vocês que os meninos vêm pra cá hoje. — joga essa novidade na roda e ficamos confusas na mesma hora. — O James perguntou se a gente podia se reunir aqui e eu disse que sim.
— , que horas ele marcou? — pergunto.
— Hm, então, acho que umas sete. — pausa e fica encarando o relógio que tem na mesinha perto do sofá. — Pensei em pedir pizza quando eles chegassem.
— Marcou às sete? — fala assustada. — , já são sete horas! — pega o relógio e bota na mesa de centro.
— Eu só esqueci de avisar, calma. — e começa a rir. — O que é que tem?
— Essa sala tá fedendo, minha roupa tá fedendo… — se levanta e corre pra porta.
Ela escutou algo? Porque eu não escutei nada.
— Menina, relaxa, capaz deles se atrasarem. — fala e ela volta para a mesinha de novo. — E tá um cheirinho ótimo, deixa de besteira.
— Bem característico, né. — falo — Meu Deus, eles vão dedurar pro Fletch.
— É nisso que eu tô pensando! — grita, se levanta de novo e dessa vez a acompanho.
Começo a abrir as janelas e ligo mais outro incenso.
— Boa, amiga. — dá uns pulinhos e me abraça.
fica bem carinhosa nesses momentos.
— , teu cabelo tá fedendo muito, ferrou! — me segura pelos ombros e diz bem séria. — Vai tomar um banho.
— Tá louca? Eu que não vou molhar meu cabelo agora, tá frio demais. — digo e reparo que sumiu. — Cadê a ?
— Cheguei com o que faltava! — ela aparece na sala com um violão. — Por que vocês estão abanando o ar?
— Acho que hoje não bateu bem nessas duas. — fala apontando pra mim e . — Estão achando que os meninos vão dedurar pro Fletch. — e dá uma gargalhada depois.
Eu não sei quem está pior.
— Vão não, relaxem. — se senta no sofá e começa a tocar algo que não reconheço de primeira.
Eu sinto sua falta
Não posso esperar tanto tempo assim
O nosso amor é novo
É o velho amor ainda e sempre
Não diga que não vem me ver
De noite eu quero descansar
Ir ao cinema com você
Um filme à toa no Pathé
Skank! Que tempos que não escuto.
— Que culpa a gente tem de ser feliz? Que culpa a gente tem, meu bem? — canto já deitada no sofá.
— O mundo bem diante do nariz, feliz aqui e não além — continua, mas a campainha toca e ela para na mesma hora. — Chegaram! — se levanta empolgada e deixa o violão no sofá.
— Porra, não abre agora! — reclama enquanto recolhe tudo que está jogado na mesa de centro — Deixa eu guardar isso. — e sobe as escadas correndo.
continua sentada no chão cantarolando a música e encarando um pôster qualquer que tem na parede da sala e sigo até a porta.
— Como que eu tô? — me coloco entre ela e a porta.
— Com uma carinha de sono, tá fofa. — ri e aperta minha bochecha.
— Poxa, me sinto melhor depois dessa. — falo sarcástica — Abre logo a porta, não tem mais jeito de melhorar mesmo. — e fico atrás dela.
Ela abre e lá estão eles. James e Matt logo na frente, Tom e outro garoto que não sei o nome atrás.
— Finalmente! Tava quase te ligando pra saber se tinha alguém em casa, demorou pra abrir. — James diz e se assusta com pulando no seu pescoço e dando um beijo.
— Você tá tão lindo hoje. — ela fica admirando o rosto dele entre as suas mãos e ele ri, envergonhado — Vem cá. — e puxa o garoto para dentro da casa.
Essa garota não perde tempo.
some com James e eu continuo escorada na porta encarando os três rapazes, devo dizer que especialmente os dois novos integrantes da banda. Eu não sabia nem o nome do outro além do Tom. Qual será o nome dele? Vem muito nome engraçado na minha cabeça e fico rindo sozinha.
— ?
Matt chama minha atenção e me volto para ele, mas para falar a verdade, quero continuar a supor nomes engraçados.
— Oi, Matt.
— Podemos entrar? — ele pergunta e escuto risinhos dos dois atrás dele.
— Ah, claro, desculpa. — abro mais a porta e eles entram — Sejam bem-vindos! — fecho a porta depois que eles passam.
— , esse é o Tom e o Charlie. — Matt me apresenta os dois.
— Ele eu já conheço — sorrio para Tom, que retribui — Tudo bom, Charlie?
— Tudo tranquilo.
Chego na sala com os três no meu encalço e encontro e dançando forró juntas, mas não tinha música alguma, só consigo escutar as duas cantarolando alguma coisa.
— Meninas? — chamo a atenção delas — Estão com saudades de casa, pelo visto!
Escuto uns risinhos atrás de mim e elas parecem notar também, tanto é que param aquela péssima tentativa de dança.
— Sempre! Pena que não temos nenhum CD de forró. — fala e depois se atenta aos meninos e vai cumprimentá-los. Matt apresenta os dois para as meninas e nos acomodamos pela sala.
— Cadê os dois pombinhos? — pergunto a , sentada ao meu lado, já sabendo a resposta.
— Lá em cima. passou arrastando o James, que não deu nem brecha pra eu dar oi. — ri e todos acompanham.
— Deixa os dois. — se levanta — Agora que todo mundo tá aqui, vamos pra o que interessa: pizza. — pega o telefone — Tô morrendo de fome. Vão querer de quê? — pergunta para as visitas.
— Podem escolher, a gente come qualquer uma. — Matt responde.
— Então vamos de calabresa que ninguém discute. — decide e começa a discar para a pizzaria.
— E aí, como vai ser agora? — quebra o silêncio — Vão morar juntos que nem a gente?
— Capaz, mas o Fletch ainda não entrou nesses detalhes. — Matt responde. — Deve ser legal.
— Nem tanto… — faço uma cara feia para a .
— Que calúnia! — ela ainda leva a sério o que eu falo. — Não minta pra eles, morar assim junto é tranquilo.
— Eles sabem que eu falei brincando. E vai ser bom pra vocês se conhecerem mais. — digo e logo acrescento. — Quer dizer, vocês se conheciam antes?
— Eu só conhecia o Matt, éramos da mesma escola, mas não da mesma turma. — Tom explica.
— Ah! — tento continuar, mas me interrompe.
— Pronto! Tudo certo, oito pizzas a caminho! — anuncia e se senta ao meu lado no sofá, me apertando entre ela e .
— Oito? — me assusto e com razão. — , pra que oito pizzas?
— , se você não notou, tem oito pessoas aqui. — ela explica super séria, mas aquele olho fechadinho não me engana.
— Sim, então vai ser uma pra cada? — não me aguento e começo a rir — Amiga, que conta foi essa?
— Uma conta super certa! — ela ainda tenta se defender.
— Não se preocupe, a gente dá conta — Matt diz e faz um hi five com os meninos.
— Ótimo, então vocês não vão se assustar com a gente. — diz para eles e depois olha para gente com um risinho no rosto.
Não demorou muito para a pizza chegar e o entregador, que já nos conhece, ficou um pouco assustado com a quantidade que pedimos essa noite, deu para notar pela cara que ele fez, mas não comentou nada.
Como se estivesse escutando toda a conversa que rolava no andar de baixo, o casal da casa apareceu assim que eu e colocamos todas as pizzas na mesa de centro. Matt estava certo, eles realmente deram conta de boa parte das pizzas, mesmo assim ainda sobraram algumas. Aceitável.
, que está sentada ao meu lado no chão da sala, é a primeira a se pronunciar depois de toda aquela comilança:
— Sabe o que seria ótimo agora?
— Ficar sentada aqui até meu corpo dar conta de toda essa comida — responde do sofá, onde também está a .
— Não, garota. — rebate — Brigadeiro!
— Ah, não… não fala de comida. — reclama.
— Brigadeiro? — Charlie tenta repetir a palavra em português, mas sai tudo errado.
— Ei, eu quero! — James se empolga com a ideia.
— O que é isso? — Tom pergunta. Ele e Charlie continuavam perdidos na conversa.
— É um doce com chocolate. — James explica.
— Hm, um docinho cairia bem. — dá corda para .
— Faz pra gente, — pede e me abraça de lado. — O seu brigadeiro é o melhor.
— , não tem como alguém fazer um brigadeiro ruim. — rio.
— Ah, tem sim! — ela fala, rindo e apontando para . — Ela conseguiu essa façanha.
— Eu não vou nem me defender nessa história porque foi o cúmulo mesmo.
— Vai, , por favor. — faz uma carinha triste.
— Tá, tá certo. — ela acaba me convencendo e me levanto. — Volto já.
Já na cozinha, pego todos os ingredientes que preciso e uma panela.
— Hey! — Tom aparece na cozinha — Falei que vinha pegar água, mas na verdade só fiquei curioso sobre esse brigadeiro. — ri.
— Então venha aprender — digo e ele se aproxima. — É bem simples, não se iluda. — aviso.
— Melhor, mais chances de conseguir fazer sozinho. O que eu faço?
— Pode abrir essa lata — passo o leite condensado e o abridor. — enquanto eu pico o chocolate.
— Leite condensado e chocolate? Não fica muito doce, não? — ele pergunta enquanto abre a lata.
Era só o que me faltava.
— Como é, garoto? — olho séria e até paro de picar o chocolate em barra. — Olha, se eu contar isso que você falou pra , ela te mata.
— Não está mais aqui quem falou. — zipa dos lábios — Ó aqui — e estende a lata.
— Quer fazer sozinho? Fico te ensinando.
— Pode ser, só não me deixe estragar tudo. — ri, se apossando do fogão e da panela. — E agora?
— Manteiga — passo a colher para ele — e pode colocar essa lata de leite condensado todinha na panela.
Termino de picar a barra de chocolate e coloco na panela.
— Pronto, agora fica aí mexendo até eu dizer que tá pronto.
— Só isso?
— Só. — respondo — Fica ainda mais fácil se usar chocolate em pó, mas prefiro em barra
— Então é por isso que a prefere o seu. — ele deduz.
— Isso, mas se sair ruim, posso te culpar pra não acabar com a minha reputação! — brinco.
— Esperta — ri e continua mexendo o brigadeiro. — Isso é popular no Brasil?
— Demais! Tem em toda festa de aniversário. — falo e fico encostada no balcão da cozinha enquanto ele faz todo o trabalho.
— Ansioso pra provar.
Noto que ele só fica mexendo no meio da panela e me seguro pra não tomar a espátula da mão dele. , ele ainda está aprendendo.
— Tom, passa a colher pelos cantos também, senão vai queimar isso aí. — dou uma risadinha para não parecer tão chata.
— Eita, verdade, foi mal. — ele logo corrige — Eu não sou muito de cozinhar. — se explica.
— Dá pra ver! — brinco, mas com um fundo de verdade. — Quer que eu mexa agora?
— Não, não… — ele responde — Quero fazer tudo.
— Então, tá.
Ficamos em silêncio por um tempinho, só encarando o projeto de brigadeiro e deu para perceber a atenção que ele estava dando para os cantos da panela. Fofo.
— Como vocês vieram parar aqui em Londres? — ele pergunta, quebrando o silêncio.
— A gente veio pra fazer faculdade aqui — respondo —, mas os planos mudaram, como você já sabe...
— Ah! Ainda bem, ninguém merece faculdade.
— Eu gostava, não vou mentir — ele me olha espantado e perde o foco da panela — Tom, tá quase pronto, cuidado pra não estragar agora. — rio e ele volta a atenção para a panela.
— Foi mal, só estranhei porque eu não tô gostando de Stanmore, quero trancar o mais rápido possível, agora que passei pra banda. — ele explica. — Já tá bom? — aponta para a panela.
— Se ele se soltar da panela, tá pronto.
Ele parece confuso.
— Assim. — me aposso da panela e mostro como é. — Tá pronto! — desligo logo o fogo, antes que queime. Pego um prato grande no armário e deixo no balcão. — Só colocar aqui e deixar esfriar um pouquinho. Tá vendo que é fácil?
— É mesmo, acho que consigo fazer sozinho na próxima. — concorda, despejando tudo no prato. — Já dá pra comer?
— Só se quiser queimar a língua! Espera aí. — pego colher para todos da sala e entrego logo uma para ele. — Pode pegar logo a sua parte.
Tom tira um pouco do prato e, em seguida, faço o mesmo.
— Se estiver ruim, vou dizer pra eles que foi você que fez. — aviso.
— E se estiver bom? — pergunta com o ar convencido.
— Vou dizer que fui eu, óbvio! — respondo e ele solta uma risada muito gostosa.
— Tudo bem — ele aceita e, em seguida, prova o brigadeiro. Pela reação dele, acho que deu certo — Acho que teremos nosso primeiro segredo, isso tá muito bom!
— Se tá aprovado, vamos levar logo antes que a venha aqui atrás do brigadeiro. — me encarrego de levar o prato quente e ele, as colheres. Inclusive a minha, ainda cheia do doce.
Chegando na sala, deixo o prato na mesa de centro e Tom entrega uma colher para cada um, só que recusa, ela não aguenta comer mais nada depois de tanta pizza.
não perde tempo, enche sua colher e coloca tudo na boca.
— Porra! Isso tá muito bom. — elogia e bate palmas, ainda de boca cheia. Classe, não temos nesta casa.
— Obrigada, obrigada — agradeço e pisco o olho para o Tom, que está sentado do outro lado da mesa, com um sorrisinho cúmplice. — Eu sempre acerto, né?
Capítulo 4
Londres, Halloween de 2001
Hoje o dia já começou bem agitado, se compararmos com os anteriores, tanto é que acordamos cedo para arrumar e decorar a casa para a festa de Halloween. A ideia de última hora veio da e logo topamos.
— Já pensaram na fantasia de vocês? — pergunto enquanto seguro a escada para colocar uns enfeites na parede. — Vou ter que improvisar a minha.
Como pensamos nessa festa ontem, não tive tempo para procurar uma fantasia e, pelo que notei, as meninas também não saíram para fazer compras.
— Vou usar a do ano passado mesmo. — diz, passando o último enfeite, uma abóbora enorme de papelão, para . Então teremos uma como Wednesday Addams.
— Eu também vou repetir. — comenta assim que desce da escada. — Espero que ainda caiba.
— Menina, então você vai arrasar! — digo quando lembro da fantasia de Mulher Gato do ano passado. — E você, ? A idealizadora da festa!
— Princesa Leia! — ela fala animada, sentada no sofá. — Comprei na semana passada.
Paramos tudo que estamos fazendo para encará-la.
— E por que você não falou pra gente? Eu compraria uma fantasia nova… — reclamou.
— E eu que nem tenho uma! — cruzo os braços. — Você quer uma festa só pra usar, né?
— Claro! — ela ri. — Na verdade, eu comprei porque achei bonita, só depois que notei que não teria um canto pra usar. Daí que veio a ideia da festa.
— Só vou acreditar nessa desculpa porque é bem a sua cara fazer isso. — digo. — Mas eu continuo sem ter o que usar, me ajudem.
— , relaxa que daqui pra mais tarde a gente pensa em algo. — me conforta. — Qualquer coisa você pega uma roupa da e vai fantasiada dela!
— Vocês me amam, né? Eu sei. — faz uma saída dramática para a cozinha — Venham me ajudar com o almoço! — grita já no outro cômodo.
— , avisou pra todo mundo? — pergunta, se acomodando na mesa da cozinha.
— Sim, sim — a acompanha — Quer dizer, a que ficou responsável em chamar os meninos.
Enquanto conversam, pego tudo que preciso na geladeira para fazer uma salada.
— Já avisei aos quatro, só o Tom que não vem. — comenta, olhando para mim enquanto corto o tomate. — Parece que a irmã dele também vai fazer uma festa. Uma pena, né, ?
Não entendi a alfinetada gratuita.
Noto as outras duas me encarando, confusas.
— O que foi que eu perdi? — pergunta.
— Notaram não naquele dia que eles vieram aqui? — pausa, esperando as duas responderem. Elas só negam com a cabeça. — Eu podia estar meio aérea, mas notei que ele sumiu depois que você se levantou pra fazer o brigadeiro. E depois chegam vocês dois na sala com tudo pronto.
— Eu não notei nada! — exclama.
— Eu só me liguei na hora porque tava demorando demais pra vocês voltarem. — explica, me encarando.
— Vocês ficaram se pegando aqui na cozinha? — pergunta um pouco chocada.
— Gente, não! A que tá vendo coisa onde não tem. — tento me explicar. — Ele só tava curioso e queria saber a receita.
— Vocês vão cair nessa? Porque eu não. — instiga as duas.
— Tô com a ! — diz.
— Eu vou esperar as cenas dos próximos capítulos pra dizer alguma coisa. — se pronuncia, sempre sensata.
— Obrigada, . — mando um beijinho para ela e continuo a cortar o resto das verduras. — Mudando de assunto, as duas bonitas que estão aí paradas podem ir comprar as bebidas?
— É pra já. — se levanta num salto — Bora, . — chama e a puxa pelo braço.
— Quero chegar e já sentir o cheirinho do almoço pronto! — grita do corredor.
— Mas é muito folgada! — ainda rebate, mas escuto a porta se fechando antes dela terminar a frase.
Como eu amo essas loucas.
Anoiteceu e já estamos todas prontas para a festa. Eu finalmente tive uma ideia para a minha fantasia e não precisei sair para comprar nada. A ideia surgiu bem do nada quando estávamos arrumando os últimos detalhes da decoração na sala e, enquanto isso, deixamos a TV ligada num programa de videoclipes. E quando começou:
Oh, baby, baby
Oh, baby, baby
Oh baby, baby
How was I supposed to know
That something wasn't right here
Pensei logo em aproveitar a ideia do figurino da Britney no clipe de Baby One More Time, porque era super simples e dava para reproduzir com o que já tinha em casa.
Camisa de botão branca, casaquinho cinza, uma saia preta, meia cinza até um pouco antes do joelho e, como eu não tinha um sapato parecido, um coturno. Ah, e um top preto de renda bonitinho, porque ela usa a camisa praticamente aberta no clipe. Só não me agradava muito o penteado, mas mesmo assim fiz as duas tranças e tinha um enfeite rosa para cabelo parecido com o que ela usa.
— Vocês não vão acreditar no que nós achamos. — fala, com uma cara sapeca e com as mãos para trás.
— , mostra que eu quero beber. — , como também foi com ela comprar as bebidas, já sabia o que era.
— Pra matar a saudade! — , ou Princesa Leia por essa noite, revela o grande mistério que estava por trás das suas costas: cachaça.
— Caramba, vocês não brincam em serviço. — diz, já providenciando quatro copinhos de vidro no armário. não perde tempo e enche os quatro copos assim que coloca na mesa.
, ou melhor, Mulher-Gato, levanta seu copinho e fala empolgada:
— Um brinde à nós, as mais gatas da festa!
Não aguentamos a declaração e os risos atrapalham um pouco o processo e, por nem prestar atenção na gente, ela nem nos espera e vira o pouco conteúdo que tem.
Viro meu copo e no mesmo instante me arrependo. Isso é horrível.
— Não sei como vocês gostam disso, eca.
— Ué, mas você gosta de caipirinha. — me olha um pouco confusa.
— Diferente, né. Tem mais coisa além disso aqui puro.
— Hm, tem razão. — ela se convence. — Falando em caipirinha, quem vai querer? Aproveitem enquanto eu ainda não tô com preguiça de fazer.
— Eu! — respondemos em coro.
A nossa sala era grande, mas hoje estava tão cheia que me fez duvidar por um breve momento do real tamanho daquele ambiente. Alguns amigos da faculdade, mas a maioria eu só tinha a impressão de ter visto rapidamente.
— Você conhece esse pessoal? Não são estranhos, mas não tô lembrando bem. — pergunto a , a Wednesday Addams por um dia, quando encontro com ela na cozinha, onde está mais tranquilo que na sala.
— Ó, a que ficou responsável em convidar o pessoal, por isso que a nossa sala tá parecendo o hall do departamento de economia.
— Ah, tá explicado então.
some da cozinha e me deixa sozinha enquanto faço outra caipirinha, a última da noite porque eu não tenho muita paciência, sendo bem sincera. Bem que a poderia estar aqui e fazer para mim…
Depois de tudo pronto, volto para a sala e fico um pouco atordoada com o tanto de gente. Eu jurava que seria algo mais tranquilo e com pouca gente, mas eu sempre estou enganada quanto a isso. Num canto, vejo , James, Matt e Charlie conversando entre si, mas antes que eu me aproxime deles, um garoto alto e de cabelo escuro simplesmente para na minha frente e fica me encarando.
— Oi?
— Oi! Você é a ? — consigo escutar, mesmo com a altura do som tocando Nelly Furtado.
— Sim! E você?
— David. — ele diz e estende a mão que não está segurando um copo com cerveja. — Recebi o convite da pra vir hoje.
— Ah, você estudava com ela?
— Em duas disciplinas só. — ele dá um gole na bebida e continua — Mas me diz uma coisa, fiquei curioso com uma apresentação que vocês fizeram em um programa.
— Pode perguntar. — sorrio amarelo.
— Como vocês fazem pra parecer tão natural?
— Como assim?
— Como é que vocês disfarçam tão bem que estão tocando? Porque é tudo playback, né?
Ah, não.
É assim mesmo que ele quer puxar conversa comigo?
Respiro fundo e ainda respondo na maior calma, que ele nem merece.
— Ué, mas não é playback.
E o que ele faz em seguida me irrita de um jeito que eu não sei explicar. Ele ri na minha cara como se o que eu acabei de dizer fosse uma piada.
— Não tem como mulher tocar bem daquele jeito.
Eu só queria dizer que eu sou uma pessoa calma, paciente, mas esse cara está me testando em um nível um pouco perigoso.
Vamos aos fatos: ele conhece uma de nós, mas pelo visto não é nada próximo para ter essa visão de nós; está comendo e bebendo às nossas custas e ainda fala na minha cara uma babaquice dessa. Sinceramente…
— David, né? — pergunto só para relembrar o nome dele, tentando parecer simpática, mas com outros planos para ele — Vem cá, um instante. — tiro o copo de cerveja da mão dele e o puxo pela mão até o corredor.
— Pra onde a gente tá indo? — ele questiona por trás de mim.
— Eu não vou pra canto nenhum, você que vai embora. — sorrio para ele e abro a porta da frente.
— O que? — ele parece um pouco irritado. — Tá louca? Eu falei aquilo brincando!
— E eu achei hilário, tô morrendo de rir até agora! — respondo, sarcástica. — Vai, sai logo. — só faço apontar pra rua com a cabeça.
— Bando de mal amada. — ele ainda solta essa antes de sair. — Depois falo com a .
— Nem se dê ao trabalho, teu filme já vai estar bem queimado! — e fecho a porta na cara dele.
Assim que me afasto um pouco da porta, ainda pelo corredor, aparece.
— O que foi isso? Te ouvi gritando, achei estranho.
— Um idiota que apareceu. — não conto tudo, prefiro deixar para explicar depois. — A precisa filtrar quem ela chama, parece que só importa a casa estar cheia.
— Hm, devia ser idiota mesmo pra te tirar do sério. Vem ficar com a gente. — ela chama.
Mas antes de chegar na sala, a campainha toca.
— Porra, não é possível que seja aquele garoto! — volto para a porta, com me acompanhando, um pouco exaltada, devo admitir, e abro sem nem olhar direito — VAI EMBORA!
Só depois que coloco toda a raiva para fora, percebo que gritei com a pessoa errada.
Não era o chato do David.
Tom que está parado na porta, com uma cara super confusa.
— O que foi que eu fiz? — ele pergunta, um pouco assustado.
aparece do meu lado para ver o que está acontecendo. E antes de me explicar para ele, ela fala:
— Olha só quem apareceu! Entra, Tom!
Fecho a porta depois que ele passa e o recebe com um abraço.
— Oi, . — ele cumprimenta e depois olha para mim. — Oi? Ou você quer que eu vá embora? — pergunta um pouco desconfiado.
— Não! — sorrio — Relaxe, aquilo não era pra você.
— E pra quem era, então?
— A expulsou um idiota daqui e achava que era ele tentando voltar. — explica e ele parece mais surpreso ainda. — É, meu querido, não estresse a moça, senão você sai chutado daqui!
— , você tá assustando o garoto. — digo baixinho. — Ela tá exagerando. — digo a ele, tentando me explicar.
— Acho que vou acreditar na Wednesday, você abriu a porta com uma raiva!
— Olha a fama que você tá criando de mim…
— Só falei a verdade, ué. — ela fala — Vou lá ficar com o James, fui! — e some para sala.
— Você tá fantasiada de quê? — Tom pergunta, depois de me olhar de cima a baixo.
— Não acredito que você não reconheceu. — ele continua confuso. — Britney? Baby One More Time?
— Ah! — ele exclama — Claro! Tá igualzinha.
— E por que você tá sem fantasia? — pergunto. Ele está com uma roupa normal. Camiseta preta, calça jeans e tênis.
— Eu não planejava vir, foi de última hora.
— A minha também! Só quem se planejou foi a e não avisou a ninguém. Por sinal, capaz dela te expulsar daqui se te ver sem fantasia. — brinco com ele.
— Vocês estão enxotando todo mundo hoje, pelo visto!
— Só se esconda dela, simples. — alerto — Vai beber hoje? — pergunto e ele confirma com a cabeça. — Então vamos pegar alguma coisa pra você.
— Ele não falou isso!
A festa continua na sala com o som nas alturas, por isso ainda estou na cozinha com o Tom desde a hora que ele chegou. Acho que vamos criar raízes nas cadeiras daqui. E, pelo visto, ele não acredita na minha história.
— Eu não ia mandar o cara embora do nada, ele realmente foi escroto. Quem que chega falando isso na cara? — falo ainda indignada.
— É, ele foi sem noção… ou vai ver ele tava te paquerando. — ele supõe.
— Paquerando? E me xingando ao mesmo tempo?
— Umas pessoas têm umas táticas estranhas, vai entender…
Antes que eu fale algo, meu celular apita em cima da mesa. Mensagem da .
: “Qual é a de vocês com a cozinha, ein?”
Olho para todos os lados daquela cozinha e não vejo ninguém, nem pela porta e nem pelo corredor. Onde ela está?
— O que foi? — Tom pergunta e também olha para a porta da cozinha.
— Nada não, só uma mensagem da .
Digito rápido uma resposta e envio.
: “De onde é que você tá me vigiando?”
: “Segredo! Eu sou bem discreta…”
: “, para de ser enxerida u_u”
: “Ué, foi sem querer! Juro! Passei e vi. Queria estar com uma câmera pra tirar uma foto, discretamente, claro!”
: “, TCHAU!”
: “Tchau mesmo, volte ao papinho, atrapalhei vocês. xx”
Essa garota não existe.
— Desculpa, a gente tava falando do que, mesmo? — até esqueci o assunto.
— Do cara que você expulsou. — ele me lembra depois de dar um gole na cerveja.
— Ah! Claro… — digo — E desculpa por ter gritado com você, eu jurava que era ele de novo.
— Tranquilo — ele sorri — Só me assustei!
— E pela hora, eu achei que não viria mais ninguém.
— Eu avisei pra que tinha essa festa da minha irmã, tava até legal, mas eu precisava sair de casa.
Só foi Tom falar isso que ele ficou com uma expressão meio triste? Séria? Confusa? E logo me preocupo.
— Teve algum problema em casa? — pergunto, mas logo me arrependo. Será que estou sendo entrona? Que nem a ?!
— Não, não, tá tudo tranquilo. — ele começa — Na verdade foi o Rashman que ligou.
Richard Rashman é o outro empresário, além do Fletch, na tarefa de formar o Busted. Mais velho e mais sério que o Fletch.
— E? — instigo. Minha curiosidade fala mais alto.
— Ele ligou pra avisar que tô fora do Busted. Ele foi tão direto que nem assimilei direito na hora. — ele desabafa, meio tristonho.
— Ah, não… Mas ele disse o motivo?
— Preferem que a banda seja só um trio mesmo. — ele dá de ombros.
— Poxa, sinto muito, Tom — digo e ainda me arrisco em fazer um carinho no ombro dele. — Mas vamos ver pelo lado bom, agora eles já te conhecem, vai que rola outro projeto com você.
— Ele até pediu pra eu trabalhar em algumas músicas e mostrar pra ele quando ele voltar pra Londres, mas deve ter dito isso só pra me confortar. — ele diz como se não acreditasse em nada.
— Sei não, ein… Se ele não gostasse de você, ele só te tiraria da banda e tchau! — tento alertá-lo — Como você disse, ele é bem direto.
— É verdade — pausa —, mas não tô com cabeça pra escrever nada depois dessa.
— Entendo, mas tem tempo até ele voltar? — pergunto e ele só concorda com a cabeça. — Então, até lá você pensa em algo.
— É, espero que sim.
E depois dessa conversa, noto que ele ficou um pouco para baixo. Droga, eu não deveria ter perguntado nada.
— Desculpa ter tocado nesse assunto, você já veio pra cá pra se distrair.
— Nem se preocupe, foi bom ter falado pra alguém. — ele dá um sorrisinho para mim.
E antes que eu falasse mais alguma coisa, entra na cozinha fazendo a maior bagunça quando esbarra num vaso, que tem na bancada perto da porta.
Era só o que faltava.
— Porra! Não vi isso aqui. — ela grita enquanto observa a sujeira de terra no chão do cômodo. — Desde quando tem um vaso aqui? — pergunta para mim. Logo percebo que ela está um pouco alterada.
— Desde sempre, o que tá diferente aqui é o seu nível de álcool. — digo e Tom começa a rir e só assim ela percebe que tem outra pessoa na cozinha.
— GAROTO! Você veio! — ela grita, de novo, mas agora bem mais perto de nós. — E sem fantasia, não tô acreditando! — coloca as mãos na cintura.
— Calma! Eu posso explicar. — ele ergue as mãos na altura da cabeça, se rendendo. — Antes que você me expulse.
— , o que você acha que eu devo fazer?
— Olha, eu já escutei a explicação dele e achei válida!
— Hm, então vou confiar em você… — começa. — Agora vamos virar uma dose comigo, por favor.
— Tô fora. — falo assim que ela mostra a garrafa de cachaça.
— Ah não, , deixa de ser chata. — ela reclama enquanto enche três copinhos com a bebida. — Botei só um pouquinho no seu copo, toma. E aqui tá o seu, Tom!
— Isso presta? — ele pergunta desconfiado.
— Não. — aviso logo. — É horrível.
— , shiu, sem mentiras. — ela reclama.
— Prove e dê seu veredito. Mais justo. — digo e ela concorda comigo.
Não esperamos muito e viramos a dose. Tom continua parado com o copinho na mão e olha para nós, desconfiado.
— Isso fede.
— Concordo.
— , você tá influenciando pra ele não beber! — reclama.
— E você, pra beber! — respondo.
— Ei, calma, vou provar logo. — ele chama nossa atenção e num instante vira o copinho, fazendo a maior careta de todas logo em seguida.
— E aí? Gostou? — pergunto, mesmo já sabendo a resposta depois daquela careta que ele fez.
— Pior coisa que já bebi até agora. — ele diz e rapidamente vira o que ainda tinha na sua garrafa de cerveja. Ele jura que o gosto vai melhorar assim.
— Dois chatos! Vou até embora depois dessa. — faz o drama dela, normal e, quando já está na porta da cozinha, ela pergunta — Oh, , você ainda não dançou a coreografia da Britney, né?
Ah, droga, eu estava torcendo para ela não lembrar disso.
Mais cedo, assim que eu finalmente consegui a fantasia, as meninas tiveram a brilhante ideia que seria legal eu imitar a Britney por completo. Menos cantando, eu não conseguiria imitar a voz dela de jeito nenhum. E não sei o que deu em mim que eu gostei e topei a ideia. Eu só poderia estar sob o efeito de alguma coisa.
Agora estou aqui pensando num jeito de fugir dessa. Por um milagre, o álcool ainda não tirou meu senso de ridículo.
— Não, não… Quem sabe mais tarde, que tal? — tento parecer o mais convincente possível. Na verdade, pensando bem, do jeito que a está, ela não vai lembrar disso mais tarde. É no que estou tentando acreditar.
— Certo, mas não ache que você vai escapar… — ela diz antes de sair da cozinha.
— Você sabe a coreografia desse clipe? — Tom pergunta e logo depois solta um risinho.
— Tá rindo do quê? Sei sim!
— Essa eu quero ver.
— Vai ficar querendo, então, porque isso vai ficar pra próxima! — digo enquanto abro a geladeira para pegar algumas cervejas. — Vou me esconder das meninas.
— Ah não… Vou contar pra elas. — ele para bem na porta da cozinha, me impedindo de passar.
— Tom, você tem duas opções: ser dedo duro ou vir se esconder comigo.
Ainda bem que a sala continua lotada, todo mundo dançando e sem noção alguma de como já está tarde, porque assim consigo sair despercebida da cozinha com o Tom e seguir pelo corredor até o nosso “quarto de ensaio”. Não é um cômodo muito grande, mas é um espaço suficiente para guardar todos os nossos instrumentos e ensaiarmos sem incomodar ninguém por conta das paredes à prova de som. Obrigada, Fletch, por essa ideia! Se bem que não sei o que incomodaria mais os vizinhos: nossos ensaios ou nossas festas…
— Uou! — Tom exclama assim que ligo a luz do quarto. — Que demais isso aqui! — não demora muito para ele se acomodar no sofá de couro marrom, que fica próximo a porta.
— Muito legal, né? — concordo e me sento do lado dele, enquanto tento abrir a garrafa de cerveja — Só cuidado pra não sujar nada, a cuida disso como se fosse um santuário! — e, parecendo até piada, assim que digo isso, a cerveja esborra da garrafa, melando o tapete e o meu coturno.
— E eu que tenho que ter cuidado, né? — ele ri do meu desastre e não move um dedo para me ajudar.
— Será que elas vão notar?
Óbvio que elas vão notar, . Esse fedor de cerveja vai ficar até alguém mandar lavar o tapete.
— Olha, derramou bastante… Mais tarde isso aqui vai estar podre. — ele aponta para o quarto todo.
— Droga, agora já era. — me encosto no sofá e bebo o que ainda resta na garrafa. — Você não viu nada e nunca esteve aqui.
— Um segredo a mais ou a menos… — ele diz e também dá um gole na sua bebida.
O quarto fica bem silencioso, pela acústica e por ficar um pouco mais distante da sala. E, com esse combo “Silêncio + sofá confortável + muita bebida”, noto como estou cansada. Acordamos cedo, não descansamos nada pela tarde e já entramos pela madrugada. Porém, mesmo um pouco cansada, eu não quero dormir agora e, para a felicidade da , está bem legal passar esse tempo com o Tom. Se bem que ele agora, refletindo sobre isso tudo enquanto encaro um canto aleatório do cômodo, ele deve estar me achando bem sem graça. Será que ele notou que fechei os olhos por um tempinho a mais?
— Nossa, aqui tá tão quieto, nada a ver com a festa, se quiser voltar pra lá, pode ir. — falo e logo acrescento — Não que eu esteja mandando você sair, mas provavelmente lá tá bem mais animado.
O garoto foi expulso da banda hoje, correu para cá para se divertir e eu segurando-o aqui. Tudo isso porque eu aceitei aquela ideia ridícula de dançar igual a Britney. Como se alguém quisesse ver isso.
— Aqui tá ótimo. — ele sorri — Digamos que eu não sou o melhor dançarino do mundo, então eu prefiro ficar por aqui mesmo.
— Ah, então somos dois escondidos.
— Isso aí — ele pausa —, mas concordo com você aqui tá muito quieto. Tem som por aqui?
— Tem sim, bem ali… — me viro para o canto onde fica o aparelho e noto que o móvel está vazio. — Ué, não tá aqui, capaz de estar no quarto da .
Já demos falta desse som outra vez e estava com ela. Normal.
— Ah, que droga. — ele diz e fica pensativo — Já sei!
Ele se levanta e pega o violão preto da , que está à amostra perto do móvel onde era para estar o aparelho de som.
— Dois músicos aqui e deixar uma sala como essa num silêncio… Absurdo! — ele senta no sofá do meu lado e entrega o violão para mim. — Você começa.
— O que você quer ouvir?
— Tenho uma em mente que combina muito bem.
♫♪♫
: Até hoje fico rindo disso. A primeira música que você tocou para ele foi muito romântica, ein.
: Ele que pediu, não posso fazer nada.
: Você realmente foi uma ótima Britney Spears por uma noite. Pena que só o Tom viu isso.
Tom: Privilégios, , privilégios!
: Ela dançou também? Ela nunca contou essa parte.
Tom: E não vai ser eu quem vai contar. Vai ficar o mistério.
: Porra! Se não estão contando, é porque ela dançou!
: Tá bom de falar de mim, né? Vamos prosseguir, por favor.
: Ainda não, . Ainda tem mais coisa da festa para contar. Como o fato de você ter passado mal dentro daquele quarto.
Lá estava eu, pleníssima na sala dançando com alguém. Já era bem tarde, a maioria já tinha ido embora. e estavam no décimo sono.
Do nada, chega o Tom, um pouco desesperado, me chamando.
: Vocês fazem um drama, eu só vomitei.
Tom: E depois desmaiou!
: , quem não te conhece muito, se assusta. Você fica lá estatelada no chão.
Continuando. Quando cheguei no quarto estava aquela cena horrorosa, preciso nem descrever. Só não reclamei daquela sujeira toda porque não ia adiantar nada, você não ia lembrar.
Tom: No final das contas, a cerveja que caiu no carpete era o menor dos problemas.
: Antes disso você ainda derrubou cerveja ali?
: Tom, ela não sabia dessa parte!
Tom: Ops.
♪♫♪
Hoje o dia já começou bem agitado, se compararmos com os anteriores, tanto é que acordamos cedo para arrumar e decorar a casa para a festa de Halloween. A ideia de última hora veio da e logo topamos.
— Já pensaram na fantasia de vocês? — pergunto enquanto seguro a escada para colocar uns enfeites na parede. — Vou ter que improvisar a minha.
Como pensamos nessa festa ontem, não tive tempo para procurar uma fantasia e, pelo que notei, as meninas também não saíram para fazer compras.
— Vou usar a do ano passado mesmo. — diz, passando o último enfeite, uma abóbora enorme de papelão, para . Então teremos uma como Wednesday Addams.
— Eu também vou repetir. — comenta assim que desce da escada. — Espero que ainda caiba.
— Menina, então você vai arrasar! — digo quando lembro da fantasia de Mulher Gato do ano passado. — E você, ? A idealizadora da festa!
— Princesa Leia! — ela fala animada, sentada no sofá. — Comprei na semana passada.
Paramos tudo que estamos fazendo para encará-la.
— E por que você não falou pra gente? Eu compraria uma fantasia nova… — reclamou.
— E eu que nem tenho uma! — cruzo os braços. — Você quer uma festa só pra usar, né?
— Claro! — ela ri. — Na verdade, eu comprei porque achei bonita, só depois que notei que não teria um canto pra usar. Daí que veio a ideia da festa.
— Só vou acreditar nessa desculpa porque é bem a sua cara fazer isso. — digo. — Mas eu continuo sem ter o que usar, me ajudem.
— , relaxa que daqui pra mais tarde a gente pensa em algo. — me conforta. — Qualquer coisa você pega uma roupa da e vai fantasiada dela!
— Vocês me amam, né? Eu sei. — faz uma saída dramática para a cozinha — Venham me ajudar com o almoço! — grita já no outro cômodo.
— , avisou pra todo mundo? — pergunta, se acomodando na mesa da cozinha.
— Sim, sim — a acompanha — Quer dizer, a que ficou responsável em chamar os meninos.
Enquanto conversam, pego tudo que preciso na geladeira para fazer uma salada.
— Já avisei aos quatro, só o Tom que não vem. — comenta, olhando para mim enquanto corto o tomate. — Parece que a irmã dele também vai fazer uma festa. Uma pena, né, ?
Não entendi a alfinetada gratuita.
Noto as outras duas me encarando, confusas.
— O que foi que eu perdi? — pergunta.
— Notaram não naquele dia que eles vieram aqui? — pausa, esperando as duas responderem. Elas só negam com a cabeça. — Eu podia estar meio aérea, mas notei que ele sumiu depois que você se levantou pra fazer o brigadeiro. E depois chegam vocês dois na sala com tudo pronto.
— Eu não notei nada! — exclama.
— Eu só me liguei na hora porque tava demorando demais pra vocês voltarem. — explica, me encarando.
— Vocês ficaram se pegando aqui na cozinha? — pergunta um pouco chocada.
— Gente, não! A que tá vendo coisa onde não tem. — tento me explicar. — Ele só tava curioso e queria saber a receita.
— Vocês vão cair nessa? Porque eu não. — instiga as duas.
— Tô com a ! — diz.
— Eu vou esperar as cenas dos próximos capítulos pra dizer alguma coisa. — se pronuncia, sempre sensata.
— Obrigada, . — mando um beijinho para ela e continuo a cortar o resto das verduras. — Mudando de assunto, as duas bonitas que estão aí paradas podem ir comprar as bebidas?
— É pra já. — se levanta num salto — Bora, . — chama e a puxa pelo braço.
— Quero chegar e já sentir o cheirinho do almoço pronto! — grita do corredor.
— Mas é muito folgada! — ainda rebate, mas escuto a porta se fechando antes dela terminar a frase.
Como eu amo essas loucas.
Anoiteceu e já estamos todas prontas para a festa. Eu finalmente tive uma ideia para a minha fantasia e não precisei sair para comprar nada. A ideia surgiu bem do nada quando estávamos arrumando os últimos detalhes da decoração na sala e, enquanto isso, deixamos a TV ligada num programa de videoclipes. E quando começou:
Oh, baby, baby
Oh, baby, baby
Oh baby, baby
How was I supposed to know
That something wasn't right here
Pensei logo em aproveitar a ideia do figurino da Britney no clipe de Baby One More Time, porque era super simples e dava para reproduzir com o que já tinha em casa.
Camisa de botão branca, casaquinho cinza, uma saia preta, meia cinza até um pouco antes do joelho e, como eu não tinha um sapato parecido, um coturno. Ah, e um top preto de renda bonitinho, porque ela usa a camisa praticamente aberta no clipe. Só não me agradava muito o penteado, mas mesmo assim fiz as duas tranças e tinha um enfeite rosa para cabelo parecido com o que ela usa.
— Vocês não vão acreditar no que nós achamos. — fala, com uma cara sapeca e com as mãos para trás.
— , mostra que eu quero beber. — , como também foi com ela comprar as bebidas, já sabia o que era.
— Pra matar a saudade! — , ou Princesa Leia por essa noite, revela o grande mistério que estava por trás das suas costas: cachaça.
— Caramba, vocês não brincam em serviço. — diz, já providenciando quatro copinhos de vidro no armário. não perde tempo e enche os quatro copos assim que coloca na mesa.
, ou melhor, Mulher-Gato, levanta seu copinho e fala empolgada:
— Um brinde à nós, as mais gatas da festa!
Não aguentamos a declaração e os risos atrapalham um pouco o processo e, por nem prestar atenção na gente, ela nem nos espera e vira o pouco conteúdo que tem.
Viro meu copo e no mesmo instante me arrependo. Isso é horrível.
— Não sei como vocês gostam disso, eca.
— Ué, mas você gosta de caipirinha. — me olha um pouco confusa.
— Diferente, né. Tem mais coisa além disso aqui puro.
— Hm, tem razão. — ela se convence. — Falando em caipirinha, quem vai querer? Aproveitem enquanto eu ainda não tô com preguiça de fazer.
— Eu! — respondemos em coro.
A nossa sala era grande, mas hoje estava tão cheia que me fez duvidar por um breve momento do real tamanho daquele ambiente. Alguns amigos da faculdade, mas a maioria eu só tinha a impressão de ter visto rapidamente.
— Você conhece esse pessoal? Não são estranhos, mas não tô lembrando bem. — pergunto a , a Wednesday Addams por um dia, quando encontro com ela na cozinha, onde está mais tranquilo que na sala.
— Ó, a que ficou responsável em convidar o pessoal, por isso que a nossa sala tá parecendo o hall do departamento de economia.
— Ah, tá explicado então.
some da cozinha e me deixa sozinha enquanto faço outra caipirinha, a última da noite porque eu não tenho muita paciência, sendo bem sincera. Bem que a poderia estar aqui e fazer para mim…
Depois de tudo pronto, volto para a sala e fico um pouco atordoada com o tanto de gente. Eu jurava que seria algo mais tranquilo e com pouca gente, mas eu sempre estou enganada quanto a isso. Num canto, vejo , James, Matt e Charlie conversando entre si, mas antes que eu me aproxime deles, um garoto alto e de cabelo escuro simplesmente para na minha frente e fica me encarando.
— Oi?
— Oi! Você é a ? — consigo escutar, mesmo com a altura do som tocando Nelly Furtado.
— Sim! E você?
— David. — ele diz e estende a mão que não está segurando um copo com cerveja. — Recebi o convite da pra vir hoje.
— Ah, você estudava com ela?
— Em duas disciplinas só. — ele dá um gole na bebida e continua — Mas me diz uma coisa, fiquei curioso com uma apresentação que vocês fizeram em um programa.
— Pode perguntar. — sorrio amarelo.
— Como vocês fazem pra parecer tão natural?
— Como assim?
— Como é que vocês disfarçam tão bem que estão tocando? Porque é tudo playback, né?
Ah, não.
É assim mesmo que ele quer puxar conversa comigo?
Respiro fundo e ainda respondo na maior calma, que ele nem merece.
— Ué, mas não é playback.
E o que ele faz em seguida me irrita de um jeito que eu não sei explicar. Ele ri na minha cara como se o que eu acabei de dizer fosse uma piada.
— Não tem como mulher tocar bem daquele jeito.
Eu só queria dizer que eu sou uma pessoa calma, paciente, mas esse cara está me testando em um nível um pouco perigoso.
Vamos aos fatos: ele conhece uma de nós, mas pelo visto não é nada próximo para ter essa visão de nós; está comendo e bebendo às nossas custas e ainda fala na minha cara uma babaquice dessa. Sinceramente…
— David, né? — pergunto só para relembrar o nome dele, tentando parecer simpática, mas com outros planos para ele — Vem cá, um instante. — tiro o copo de cerveja da mão dele e o puxo pela mão até o corredor.
— Pra onde a gente tá indo? — ele questiona por trás de mim.
— Eu não vou pra canto nenhum, você que vai embora. — sorrio para ele e abro a porta da frente.
— O que? — ele parece um pouco irritado. — Tá louca? Eu falei aquilo brincando!
— E eu achei hilário, tô morrendo de rir até agora! — respondo, sarcástica. — Vai, sai logo. — só faço apontar pra rua com a cabeça.
— Bando de mal amada. — ele ainda solta essa antes de sair. — Depois falo com a .
— Nem se dê ao trabalho, teu filme já vai estar bem queimado! — e fecho a porta na cara dele.
Assim que me afasto um pouco da porta, ainda pelo corredor, aparece.
— O que foi isso? Te ouvi gritando, achei estranho.
— Um idiota que apareceu. — não conto tudo, prefiro deixar para explicar depois. — A precisa filtrar quem ela chama, parece que só importa a casa estar cheia.
— Hm, devia ser idiota mesmo pra te tirar do sério. Vem ficar com a gente. — ela chama.
Mas antes de chegar na sala, a campainha toca.
— Porra, não é possível que seja aquele garoto! — volto para a porta, com me acompanhando, um pouco exaltada, devo admitir, e abro sem nem olhar direito — VAI EMBORA!
Só depois que coloco toda a raiva para fora, percebo que gritei com a pessoa errada.
Não era o chato do David.
Tom que está parado na porta, com uma cara super confusa.
— O que foi que eu fiz? — ele pergunta, um pouco assustado.
aparece do meu lado para ver o que está acontecendo. E antes de me explicar para ele, ela fala:
— Olha só quem apareceu! Entra, Tom!
Fecho a porta depois que ele passa e o recebe com um abraço.
— Oi, . — ele cumprimenta e depois olha para mim. — Oi? Ou você quer que eu vá embora? — pergunta um pouco desconfiado.
— Não! — sorrio — Relaxe, aquilo não era pra você.
— E pra quem era, então?
— A expulsou um idiota daqui e achava que era ele tentando voltar. — explica e ele parece mais surpreso ainda. — É, meu querido, não estresse a moça, senão você sai chutado daqui!
— , você tá assustando o garoto. — digo baixinho. — Ela tá exagerando. — digo a ele, tentando me explicar.
— Acho que vou acreditar na Wednesday, você abriu a porta com uma raiva!
— Olha a fama que você tá criando de mim…
— Só falei a verdade, ué. — ela fala — Vou lá ficar com o James, fui! — e some para sala.
— Você tá fantasiada de quê? — Tom pergunta, depois de me olhar de cima a baixo.
— Não acredito que você não reconheceu. — ele continua confuso. — Britney? Baby One More Time?
— Ah! — ele exclama — Claro! Tá igualzinha.
— E por que você tá sem fantasia? — pergunto. Ele está com uma roupa normal. Camiseta preta, calça jeans e tênis.
— Eu não planejava vir, foi de última hora.
— A minha também! Só quem se planejou foi a e não avisou a ninguém. Por sinal, capaz dela te expulsar daqui se te ver sem fantasia. — brinco com ele.
— Vocês estão enxotando todo mundo hoje, pelo visto!
— Só se esconda dela, simples. — alerto — Vai beber hoje? — pergunto e ele confirma com a cabeça. — Então vamos pegar alguma coisa pra você.
— Ele não falou isso!
A festa continua na sala com o som nas alturas, por isso ainda estou na cozinha com o Tom desde a hora que ele chegou. Acho que vamos criar raízes nas cadeiras daqui. E, pelo visto, ele não acredita na minha história.
— Eu não ia mandar o cara embora do nada, ele realmente foi escroto. Quem que chega falando isso na cara? — falo ainda indignada.
— É, ele foi sem noção… ou vai ver ele tava te paquerando. — ele supõe.
— Paquerando? E me xingando ao mesmo tempo?
— Umas pessoas têm umas táticas estranhas, vai entender…
Antes que eu fale algo, meu celular apita em cima da mesa. Mensagem da .
: “Qual é a de vocês com a cozinha, ein?”
Olho para todos os lados daquela cozinha e não vejo ninguém, nem pela porta e nem pelo corredor. Onde ela está?
— O que foi? — Tom pergunta e também olha para a porta da cozinha.
— Nada não, só uma mensagem da .
Digito rápido uma resposta e envio.
: “De onde é que você tá me vigiando?”
: “Segredo! Eu sou bem discreta…”
: “, para de ser enxerida u_u”
: “Ué, foi sem querer! Juro! Passei e vi. Queria estar com uma câmera pra tirar uma foto, discretamente, claro!”
: “, TCHAU!”
: “Tchau mesmo, volte ao papinho, atrapalhei vocês. xx”
Essa garota não existe.
— Desculpa, a gente tava falando do que, mesmo? — até esqueci o assunto.
— Do cara que você expulsou. — ele me lembra depois de dar um gole na cerveja.
— Ah! Claro… — digo — E desculpa por ter gritado com você, eu jurava que era ele de novo.
— Tranquilo — ele sorri — Só me assustei!
— E pela hora, eu achei que não viria mais ninguém.
— Eu avisei pra que tinha essa festa da minha irmã, tava até legal, mas eu precisava sair de casa.
Só foi Tom falar isso que ele ficou com uma expressão meio triste? Séria? Confusa? E logo me preocupo.
— Teve algum problema em casa? — pergunto, mas logo me arrependo. Será que estou sendo entrona? Que nem a ?!
— Não, não, tá tudo tranquilo. — ele começa — Na verdade foi o Rashman que ligou.
Richard Rashman é o outro empresário, além do Fletch, na tarefa de formar o Busted. Mais velho e mais sério que o Fletch.
— E? — instigo. Minha curiosidade fala mais alto.
— Ele ligou pra avisar que tô fora do Busted. Ele foi tão direto que nem assimilei direito na hora. — ele desabafa, meio tristonho.
— Ah, não… Mas ele disse o motivo?
— Preferem que a banda seja só um trio mesmo. — ele dá de ombros.
— Poxa, sinto muito, Tom — digo e ainda me arrisco em fazer um carinho no ombro dele. — Mas vamos ver pelo lado bom, agora eles já te conhecem, vai que rola outro projeto com você.
— Ele até pediu pra eu trabalhar em algumas músicas e mostrar pra ele quando ele voltar pra Londres, mas deve ter dito isso só pra me confortar. — ele diz como se não acreditasse em nada.
— Sei não, ein… Se ele não gostasse de você, ele só te tiraria da banda e tchau! — tento alertá-lo — Como você disse, ele é bem direto.
— É verdade — pausa —, mas não tô com cabeça pra escrever nada depois dessa.
— Entendo, mas tem tempo até ele voltar? — pergunto e ele só concorda com a cabeça. — Então, até lá você pensa em algo.
— É, espero que sim.
E depois dessa conversa, noto que ele ficou um pouco para baixo. Droga, eu não deveria ter perguntado nada.
— Desculpa ter tocado nesse assunto, você já veio pra cá pra se distrair.
— Nem se preocupe, foi bom ter falado pra alguém. — ele dá um sorrisinho para mim.
E antes que eu falasse mais alguma coisa, entra na cozinha fazendo a maior bagunça quando esbarra num vaso, que tem na bancada perto da porta.
Era só o que faltava.
— Porra! Não vi isso aqui. — ela grita enquanto observa a sujeira de terra no chão do cômodo. — Desde quando tem um vaso aqui? — pergunta para mim. Logo percebo que ela está um pouco alterada.
— Desde sempre, o que tá diferente aqui é o seu nível de álcool. — digo e Tom começa a rir e só assim ela percebe que tem outra pessoa na cozinha.
— GAROTO! Você veio! — ela grita, de novo, mas agora bem mais perto de nós. — E sem fantasia, não tô acreditando! — coloca as mãos na cintura.
— Calma! Eu posso explicar. — ele ergue as mãos na altura da cabeça, se rendendo. — Antes que você me expulse.
— , o que você acha que eu devo fazer?
— Olha, eu já escutei a explicação dele e achei válida!
— Hm, então vou confiar em você… — começa. — Agora vamos virar uma dose comigo, por favor.
— Tô fora. — falo assim que ela mostra a garrafa de cachaça.
— Ah não, , deixa de ser chata. — ela reclama enquanto enche três copinhos com a bebida. — Botei só um pouquinho no seu copo, toma. E aqui tá o seu, Tom!
— Isso presta? — ele pergunta desconfiado.
— Não. — aviso logo. — É horrível.
— , shiu, sem mentiras. — ela reclama.
— Prove e dê seu veredito. Mais justo. — digo e ela concorda comigo.
Não esperamos muito e viramos a dose. Tom continua parado com o copinho na mão e olha para nós, desconfiado.
— Isso fede.
— Concordo.
— , você tá influenciando pra ele não beber! — reclama.
— E você, pra beber! — respondo.
— Ei, calma, vou provar logo. — ele chama nossa atenção e num instante vira o copinho, fazendo a maior careta de todas logo em seguida.
— E aí? Gostou? — pergunto, mesmo já sabendo a resposta depois daquela careta que ele fez.
— Pior coisa que já bebi até agora. — ele diz e rapidamente vira o que ainda tinha na sua garrafa de cerveja. Ele jura que o gosto vai melhorar assim.
— Dois chatos! Vou até embora depois dessa. — faz o drama dela, normal e, quando já está na porta da cozinha, ela pergunta — Oh, , você ainda não dançou a coreografia da Britney, né?
Ah, droga, eu estava torcendo para ela não lembrar disso.
Mais cedo, assim que eu finalmente consegui a fantasia, as meninas tiveram a brilhante ideia que seria legal eu imitar a Britney por completo. Menos cantando, eu não conseguiria imitar a voz dela de jeito nenhum. E não sei o que deu em mim que eu gostei e topei a ideia. Eu só poderia estar sob o efeito de alguma coisa.
Agora estou aqui pensando num jeito de fugir dessa. Por um milagre, o álcool ainda não tirou meu senso de ridículo.
— Não, não… Quem sabe mais tarde, que tal? — tento parecer o mais convincente possível. Na verdade, pensando bem, do jeito que a está, ela não vai lembrar disso mais tarde. É no que estou tentando acreditar.
— Certo, mas não ache que você vai escapar… — ela diz antes de sair da cozinha.
— Você sabe a coreografia desse clipe? — Tom pergunta e logo depois solta um risinho.
— Tá rindo do quê? Sei sim!
— Essa eu quero ver.
— Vai ficar querendo, então, porque isso vai ficar pra próxima! — digo enquanto abro a geladeira para pegar algumas cervejas. — Vou me esconder das meninas.
— Ah não… Vou contar pra elas. — ele para bem na porta da cozinha, me impedindo de passar.
— Tom, você tem duas opções: ser dedo duro ou vir se esconder comigo.
Ainda bem que a sala continua lotada, todo mundo dançando e sem noção alguma de como já está tarde, porque assim consigo sair despercebida da cozinha com o Tom e seguir pelo corredor até o nosso “quarto de ensaio”. Não é um cômodo muito grande, mas é um espaço suficiente para guardar todos os nossos instrumentos e ensaiarmos sem incomodar ninguém por conta das paredes à prova de som. Obrigada, Fletch, por essa ideia! Se bem que não sei o que incomodaria mais os vizinhos: nossos ensaios ou nossas festas…
— Uou! — Tom exclama assim que ligo a luz do quarto. — Que demais isso aqui! — não demora muito para ele se acomodar no sofá de couro marrom, que fica próximo a porta.
— Muito legal, né? — concordo e me sento do lado dele, enquanto tento abrir a garrafa de cerveja — Só cuidado pra não sujar nada, a cuida disso como se fosse um santuário! — e, parecendo até piada, assim que digo isso, a cerveja esborra da garrafa, melando o tapete e o meu coturno.
— E eu que tenho que ter cuidado, né? — ele ri do meu desastre e não move um dedo para me ajudar.
— Será que elas vão notar?
Óbvio que elas vão notar, . Esse fedor de cerveja vai ficar até alguém mandar lavar o tapete.
— Olha, derramou bastante… Mais tarde isso aqui vai estar podre. — ele aponta para o quarto todo.
— Droga, agora já era. — me encosto no sofá e bebo o que ainda resta na garrafa. — Você não viu nada e nunca esteve aqui.
— Um segredo a mais ou a menos… — ele diz e também dá um gole na sua bebida.
O quarto fica bem silencioso, pela acústica e por ficar um pouco mais distante da sala. E, com esse combo “Silêncio + sofá confortável + muita bebida”, noto como estou cansada. Acordamos cedo, não descansamos nada pela tarde e já entramos pela madrugada. Porém, mesmo um pouco cansada, eu não quero dormir agora e, para a felicidade da , está bem legal passar esse tempo com o Tom. Se bem que ele agora, refletindo sobre isso tudo enquanto encaro um canto aleatório do cômodo, ele deve estar me achando bem sem graça. Será que ele notou que fechei os olhos por um tempinho a mais?
— Nossa, aqui tá tão quieto, nada a ver com a festa, se quiser voltar pra lá, pode ir. — falo e logo acrescento — Não que eu esteja mandando você sair, mas provavelmente lá tá bem mais animado.
O garoto foi expulso da banda hoje, correu para cá para se divertir e eu segurando-o aqui. Tudo isso porque eu aceitei aquela ideia ridícula de dançar igual a Britney. Como se alguém quisesse ver isso.
— Aqui tá ótimo. — ele sorri — Digamos que eu não sou o melhor dançarino do mundo, então eu prefiro ficar por aqui mesmo.
— Ah, então somos dois escondidos.
— Isso aí — ele pausa —, mas concordo com você aqui tá muito quieto. Tem som por aqui?
— Tem sim, bem ali… — me viro para o canto onde fica o aparelho e noto que o móvel está vazio. — Ué, não tá aqui, capaz de estar no quarto da .
Já demos falta desse som outra vez e estava com ela. Normal.
— Ah, que droga. — ele diz e fica pensativo — Já sei!
Ele se levanta e pega o violão preto da , que está à amostra perto do móvel onde era para estar o aparelho de som.
— Dois músicos aqui e deixar uma sala como essa num silêncio… Absurdo! — ele senta no sofá do meu lado e entrega o violão para mim. — Você começa.
— O que você quer ouvir?
— Tenho uma em mente que combina muito bem.
: Até hoje fico rindo disso. A primeira música que você tocou para ele foi muito romântica, ein.
: Ele que pediu, não posso fazer nada.
: Você realmente foi uma ótima Britney Spears por uma noite. Pena que só o Tom viu isso.
Tom: Privilégios, , privilégios!
: Ela dançou também? Ela nunca contou essa parte.
Tom: E não vai ser eu quem vai contar. Vai ficar o mistério.
: Porra! Se não estão contando, é porque ela dançou!
: Tá bom de falar de mim, né? Vamos prosseguir, por favor.
: Ainda não, . Ainda tem mais coisa da festa para contar. Como o fato de você ter passado mal dentro daquele quarto.
Lá estava eu, pleníssima na sala dançando com alguém. Já era bem tarde, a maioria já tinha ido embora. e estavam no décimo sono.
Do nada, chega o Tom, um pouco desesperado, me chamando.
: Vocês fazem um drama, eu só vomitei.
Tom: E depois desmaiou!
: , quem não te conhece muito, se assusta. Você fica lá estatelada no chão.
Continuando. Quando cheguei no quarto estava aquela cena horrorosa, preciso nem descrever. Só não reclamei daquela sujeira toda porque não ia adiantar nada, você não ia lembrar.
Tom: No final das contas, a cerveja que caiu no carpete era o menor dos problemas.
: Antes disso você ainda derrubou cerveja ali?
: Tom, ela não sabia dessa parte!
Tom: Ops.
Capítulo 5
Londres, Novembro de 2001
Acordo no dia seguinte à festa me sentindo tão esgotada e passo um tempo apenas deitada na cama, encarando o teto. O relógio que fica na mesinha de cabeceira indica que já passou do meio-dia. Nossa, como eu dormi. Na verdade, eu ainda quero dormir mais, mas não consigo por conta da enorme dor de cabeça que eu estou sentindo. Isso que dá beber muito. Só não faço o discurso de “Nunca mais eu vou beber!” porque vai ser uma mentira gigante.
A festa foi bem legal, até onde eu lembro. Notei que e pegaram leve na bebida, diferente da , que não passou muito tempo do início da festa e já estava sem controle. E eu? Então, eu achei que não tinha passado do ponto, mas vamos aos fatos: minha cabeça está explodindo, estou com um gosto horrível na boca, ainda estou vestida de Britney — só que agora como uma Britney destruída — e também não lembro como cheguei no meu quarto. A última coisa que lembro é estar no quarto de ensaio com o Tom tocando umas músicas de pop bem aleatórias e rindo muito por ele errar boa parte das letras, ainda acho que de propósito.
Meus planos de passar o dia deitada vão por água abaixo assim que minha barriga ronca pedindo comida. Sigo logo para o meu banheiro e levo um susto com o meu estado. , que decadência. Escovo os dentes e lavo o rosto, tentando tirar toda aquela maquiagem borrada da minha cara.
Estando um pouco mais decente do que quando eu acordei, desço para a cozinha atrás de comida. Encontro e sentadas na mesa.
— Olha quem acordou. — fala com a boca cheia de cereal.
— Fecha a boca, mulher. — respondo. — Onde tem remédio pra dor de cabeça?
— Ih… Alguém está de ressaca! — brinca. — Tem naquele armário, ali em cima.
Pego logo um comprimido na cartela e tomo com água.
— Eu já ia lá no seu quarto, vai que você desmaiava de novo? — diz, um pouco preocupada. — E sozinha no quarto, olha o perigo.
— Eu desmaiei?
me olha assustada.
— Não me diga que agora você virou esse tipo de bêbada esquecida.
— Tô falando sério… Não sei nem como fui parar no meu quarto.
— , senta aí que eu vou lembrar pra você. — aponta para a cadeira ao lado da . Obedeço e tomo o resto da água. — A senhorita simplesmente vomitou no quarto onde a gente ensaia. Por pouco não pegou no violão dela. — apontou para a .
— Como é que é? — grita do meu lado e minha cabeça parece que vai explodir. — , o que é que você foi fazer lá? E ainda com o meu violão?
Tento começar minha explicação, mas me corta na hora.
— , calma, seu violão está intacto.
— Sorte sua.
— Eu só lembro que estava enjoada, só isso. Conte o resto.
— Então, depois de botar tudo pra fora, acho que a sua pressão caiu e você desmaiou no sofá. Quer dizer, não sei se foi no sofá, mas quando eu cheguei lá, você já tava deitada.
— Como assim “quando eu cheguei lá”? Você não tava com ela? — pergunta.
— Que nada, eu tava na sala, dançando com um bonitinho e do nada aparece o Tom desesperado na sala, pedindo ajuda. Ele que tava com ela lá.
olha surpresa para mim, com um sorriso no rosto. Certeza que ela gostou do que aconteceu.
— !
— , não grita, minha cabeça tá explodindo. — peço. — Meu Deus, que vergonha eu passei.
— Vocês pelo menos se pegaram antes desse vexame?
— O quê? — pergunto confusa. — Claro que não!
— , essa menina precisa de uma intervenção urgente!
— Tenho que concordar com você.
— Teve mais alguma coisa? Mais vergonha? — pergunto, ignorando o que elas estavam discutindo e deito minha cabeça na mesa.
— Não, não… Você acordou logo depois que eu entrei, disse que queria dormir e levamos você pro quarto. Na verdade, foi o Tom, porque eu não aguento carregar ninguém. — ela ri.
— Ele fez isso?
— Claro, o coitado ficou super preocupado. Você deveria ligar pra ele, avisar que tá viva.
— Mas eu nem tenho o número dele.
— Isso não é problema, consigo isso agora mesmo com o James. — diz enquanto digita algo no celular.
Então foi assim que minha noite terminou. Sinceramente, era melhor eu não ter descoberto.
Completando o grupo, entra na cozinha, e devo dizer que está pior do que eu. Se é possível.
— Onde tem remédio pra dor de cabeça?
— Então temos duas de ressaca hoje. — alfineta.
— Eu achei que só estava de ressaca física, mas depois desse papo aqui, também estou de ressaca moral.
— , não foi nada demais. Eu dou uma semana pra você estar rindo disso. — me consola.
— O que houve? — pergunta.
Enquanto a conta tudo o que aconteceu para ela, recebe uma resposta do James, com o número do Tom.
— Pronto, já mandei o número pra você.
— Valeu, . Daqui a pouco eu ligo. — digo — Só preciso comer algo e tomar um banho pra voltar ao normal.
Enquanto eu coloco pão na torradeira, pergunta:
— Já arrumaram as malas pra amanhã?
— O que tem amanhã? — parece bem confusa e , só um pouco.
— Olha, vou comprar um calendário gigante aqui pra casa, colocar na porta da cozinha pra ficar bem visível. — reclama. Realmente, só ela que lembra de tudo. Se não fosse por ela, todo dia teríamos um susto com um carro aqui na porta pra nos levar para um canto que não sabemos. — Amanhã vamos pra Manchester, logo cedo… Cedo de verdade dessa vez.
— Nossa, claro! Eu fiquei muito animada e focada com a festa de Halloween e acabei esquecendo dessa viagem. — parece animada — Vou logo arrumar minha mala, só tenho isso pra fazer hoje. — dizendo isso, ela deixa a cozinha.
Vamos passar alguns dias, bem ocupados, em Manchester. Vai ser bom sair dessa casa, nem que seja por poucos dias. Não entenda mal, adoramos a casa, mas tudo tem limite. E finalmente teremos nossa primeira viagem juntas, como uma banda.
— Tem café pronto, bom pra vocês duas. — avisa, enquanto lava os pratos.
Encho duas canecas e entrego uma para , que já está sentada à mesa, apenas encarando o nada.
— Quer torrada também? — ofereço.
Ela faz uma careta, recusando. Certo, então ela está pior do que eu.
Final da tarde e eu ainda não fiz nada. Nada. Trancada no meu quarto apenas existindo. E evitando tudo que eu tenho para fazer também, quem eu quero enganar? Pelo menos eu tenho uma justificativa. Continuei um pouco mal, mesmo depois do café (que era pra ser almoço) e do banho, mas o que me renovou mesmo foi o de sempre: um cochilo super longo.
Acordada, porém ainda deitada, sigo procrastinando as duas tarefas que tenho para hoje. Uma super chata: arrumar a mala. A segunda, bem mais legal que a primeira, mas que me deixa receosa por algum motivo. Talvez vergonha? É, até pode ser, mas, no fundo, sei que eu não ficaria assim se não me importasse com a pessoa que me viu naquela situação. Ok, pelo visto acabei de desvendar o mistério.
Não quero parecer toda apaixonadinha, mas admito que a festa ficou bem mais legal depois que o Tom apareceu. Não sei se foi por ele ter aparecido logo depois daquele chato ou porque, no fundo, eu queria muito que ele aparecesse. Que não escute isso.
Será que tem algo rolando mesmo? Ou eu só estou dando muita bola para o que as meninas estão falando sobre? Se bem que elas nunca erram, do mesmo jeito que eu nunca erro quando é algo delas. Cá estou eu sofrendo por antecipação. Melhor eu ligar logo.
Rapidamente acho o contato do Tom no celular e ligo.
Espero.
Espero mais um pouco.
Nada.
Desligo, um pouco desesperada, antes que caia na caixa postal.
Claro que ele pode não ter atendido por mil motivos e nenhum ser relacionado a mim, até porque ele nem tem o meu número, mas óbvio que eu já estou vendo problema onde não tem.
Preciso tirar essas besteiras da minha cabeça e sei que eu sozinha não consigo, por isso, finalmente, saio do meu quarto e, pelas risadas que escuto, já sei que estão todas lá embaixo.
Assim que piso na sala, pergunta:
— Tá com tudo pronto já, né? Ficou tanto tempo lá em cima.
— Nada arrumado ainda, não separei nenhuma roupa. — digo — Eu passei a tarde dormindo.
— Também fiz isso, tô nova! — realmente parece melhor. — , relaxe que num instante a gente arruma tudo.
— Eu não falei nada. — ela ainda tenta parecer calma, mas tenho certeza que queria mandar a gente subir para fazer as malas.
— Nem precisa, sua cara já fala por você. — diz logo a verdade.
— Oh , vai ficar aí parada em pé? — pergunta.
Continuo em pé e agarrada ao celular.
— Ei, o que você tem? — parece preocupada.
Ok, vou admitir logo.
— Eu liguei pra ele e ele não atendeu.
— Ele quem? — está mais confusa do que eu.
— O Tom! — e respondem ao mesmo tempo.
— Ah! Não precisava gritar!
— E por que você tá encucada com isso? — toca bem na ferida, já sabendo a resposta. Não sei o que responder. Na verdade, não sei se quero responder e sigo em silêncio. — Eu sabia que tinha coisa aí! Te conheço. Admita que você, finalmente, tá interessada por outro cara depois do Caio.
— Talvez…
— Que talvez, óbvio que tá. O cara não te atendeu e olha como mexeu com você. — fala sorridente. Ela está feliz com a minha paranoia? — Olha só pra ela, se permitindo!
Pelo visto as outras duas também ficam felizes.
— Já aprovei esse casal. — afirma.
— Eu também, eu notei antes de vocês. — se vangloria.
— Gente! — chamo a atenção delas — Eu ainda tô aqui, me ajudem.
— Em que exatamente? — questiona. — Tá preocupada porque ele não te atendeu? , daqui a pouco ele retorna, só espere.
— E ele não sabe que foi você que ligou… Ou ele já tem o seu número? — agora é a vez da falar.
— Não tem. — respondo. — É, vocês têm razão. Nossa, por que eu tô assim?
— Desaprendeu a paquerar e tá com medo. — diz, simplesmente matando a charada.
— Você fala assim e parece até que namorei dez anos com o mesmo cara.
— Não foi seu caso, mas convenhamos que aqui nessa casa não tem nenhuma experiente nisso — admite e concorda.
— Olha quem tá falando! — cutuca.
— Querida, eu e só somos caras de pau, é bem diferente.
se levanta e estala os dedos, chamando a atenção de todas nós.
— Ei, perdemos o foco aqui. — aponta para mim.
— Não, , vocês já disseram tudo — eu começo — e estão certas. Vou arrumar minha mala que é melhor do que ficar esperando.
E, sem brincadeira, assim que termino de falar, meu celular toca e quase o derrubo no susto que levo.
— É ele? — pergunta, quase gritando.
— , atende logo! — não se contenta como a e grita do meu lado.
Em meio aquele barulho todo, vejo o nome Tom no visor. Só olho para as meninas e digo, antes de correr escada acima para o meu quarto:
— É o Tom!
— Garota, volta aqui!
Ainda escuto elas me seguindo pela escada, mas entro no meu quarto e fecho a porta antes que elas possam entrar também.
Atendo logo a chamada, antes que ele desista.
— Oi!
— Oi, de quem é esse número? — ele pergunta, com a voz um pouco rouca. Será que ele acabou de acordar? E ele realmente não tem o meu número, já estou me sentindo uma idiota pelo surto que tive mais cedo.
— Ah, sou eu, a … — começo — Peguei seu número com o James. — e me explico logo.
— Ah! Oi, ! Desculpa não ter atendido antes, eu tava dormindo e acordei com o celular tocando, mas como eu não conhecia o número, deixei tocando… Foi mal.
Ótimo jeito de começar, , parabéns.
— Não, tranquilo… Eu que peço desculpas, te acordei assim.
— Vou até já deixar seu número salvo pra não te ignorar de novo.
— Melhor! — solto uma risada e ele me acompanha do outro lado da linha. — Só liguei pra agradecer por ontem — pauso — A me contou como você me ajudou.
— Ah! Não foi nada… Você tá melhor? — ele pergunta preocupado.
— Agora sim, melhorei depois de dormir o dia inteiro, mas acordei péssima.
— Sei bem, acho que a cachaça não me fez muito bem — ele ri — Acho que só hibernando por dois dias pra me recuperar dessa festa!
— Ih, tá fraco então! — brinco.
— Falou a que passou mal ontem!
— É, bom ponto, mas já tô nova e você ainda tá acabado, pelo visto.
— Acertou, eu ainda estou acabado.
— Então é melhor eu desligar — digo, mesmo querendo conversar mais com ele — Você precisa dormir e eu vou arrumar a minha mala.
— Mala? Vai pra onde? — ele indaga.
— Vamos amanhã pra Manchester, pra fazer divulgação do CD. — explico e me sento na cama, tentando ignorar a minha mala aberta no chão do quarto, totalmente vazia.
— Ah, que legal! Boa viagem, então. — ele diz, animado. — E volta quando?
— Acho que na segunda ou na terça… — ele ri da minha confusão — Eu sei que sou péssima com a nossa agenda, ainda bem que temos a !
— Viva a ! — ele brinca. — Então não vou te alugar mais, você tem que arrumar suas coisas.
— E você vai voltar a dormir.
— Vou sim, o sono é mais forte que eu. — ri.
— Então tá… Tchau, Tom — me despeço. — E obrigada, de novo.
— Já disse que não foi nada. E boa viagem de novo, aproveite Manchester!
— Valeu, Tom! Até mais.
— Até!
E desligamos.
Ok. Ocorreu tudo bem, agora posso parar de me preocupar à toa e arrumar minha mala com calma, mas bem que eu poderia ter uma ajuda, né? E já sei onde achar.
— Podem entrar, eu sei que vocês estão curiosas! — grito para as meninas escutarem pela porta fechada. Nada acontece. — Eu sei que vocês estão aí!
Em menos de dois segundos, a minha porta se abre.
— A gente é previsível assim? — pergunta assim que entra no meu quarto.
— Sim, nós quatro, na verdade. — respondo, rindo junto com elas. — Escutar atrás da porta tá virando tradição por aqui.
— Sim, e aí? Conta como foi! — pede, se jogando do meu lado na cama.
— Você vai ter que contar, porque não conseguimos escutar nada, infelizmente. — se acomoda na minha cadeira, que por um milagre, não está cheia de roupa. E senta na beirada da cama.
— Sua mala ainda está vazia! Não tô acreditando. — mira logo nessa parte do chão.
— Se quiser eu arrumo agora e vocês ficam aí sem saber de nada…
— , a gente ajuda a a arrumar as coisas depois, agora deixa ela contar o papo dos dois, que eu tô curiosa. — se vira para ela, um pouco desesperada. A fofoqueira sofre.
— Tá, tá… — se convence. — Então, conte logo, , antes que a infarte!
Mesmo que a minha conversa com o Tom tenha sido bem breve, eu sei que as meninas iam fazer de tudo para prolongar o assunto. Pelo menos eu terei ajuda para arrumar a mala depois.
A manhã, ou madrugada, de sexta-feira começa de um modo bem estressante na nossa casa, por muitos motivos que eu já esperava por conhecer bem com quem eu divido o mesmo teto. Praticamente não dormimos, porque acordamos quando ainda estava o céu escuro e, para completar, estamos com um hábito péssimo de dormir super tarde e não foi ontem que conseguiríamos dormir cedo do nada. Então, dá para imaginar bem como estava o humor de todas nós, mesmo empolgadas com a viagem.
Só quando desço para a sala, já pronta com a calça jeans mais folgada que eu tenho, moletom e mais outro casaco por cima, noto o tanto de bagagem que estamos levando. E não, não estamos levando malas imensas de roupa, pelo menos nisso nós temos noção, porque sabemos o quanto de espaços os instrumentos tomam, mesmo que sejam poucos, só para os pockets shows que vamos fazer.
Desviando de todas as malas e cases que estão espalhados pela sala, entro na cozinha e encontro apenas a arrumando uma bolsa térmica gigante. Ainda bem que alguém lembrou de comida.
— Bom dia! Ou boa noite ainda? — digo enquanto encho uma caneca com café e vejo uma travessa enorme de brownie. — Hum, alguém acordou inspirada, já vou comer um pedaço agora.
— Eu não consegui dormir. — ela confessa — Aproveitei pra cozinhar isso pra viagem, não pra você comer agora. — e começa a cortar em quadradinhos.
— Um pedaço não vai fazer falta...
— , é brownie especial, se liga! — ela fala, sem parar de guardar os quadradinhos no pote de plástico. — É pra mais tarde.
— Ah! Você pensa em tudo!
— Óbvio! — ela se gaba. — Ó, eu fiz sanduíches também, se quiser.
— Já disse que te amo hoje? — dou um beijo na sua bochecha. — Então não vou comer nada agora, como no caminho.
— Cadê aquelas duas? Já já o Fletch aparece aqui na porta.
— Vou chamar as princesas.
Em algum lugar no caminho entre Londres e Manchester, Novembro 2001
— Fletch, por que a gente saiu tão cedo, ein? — pergunta, ainda sonolenta, acabando com o silêncio na van.
Só se passou uma hora que saímos de casa, ainda não amanheceu e continua puxando papo, só porque ela não consegue dormir.
— São quatro horas de estrada até lá — ele se vira no banco para responder, na calma de sempre. — E vocês já têm compromisso antes do almoço.
— , silêncio, tem gente querendo dormir aqui. — reclama, sentada na poltrona ao meu lado e atrás da . Já a , está acomodada na minha frente.
— Droga, queria conseguir dormir também. — ela diz e se livra para falar comigo, baixinho dessa vez. — Já falou com o Tom hoje?
— Não. — respondo, sem dar muita conversa. Eu só quero dormir.
— E por que não manda uma mensagem?
— , não são nem 6h da manhã. — mostro a tela do celular. — Eu que não vou mandar nada agora, já basta eu ter acordado ele ontem. Daqui a pouco ele tá me chamando de despertador.
Ela ri e não demora muito para escutarmos uma reclamação da , pedindo silêncio de novo.
— Verdade, mais tarde você manda alguma coisa. — ela sussurra para não levar outra bronca.
— Eu não, já liguei ontem e agora ele tem meu número.
— , deixe de ser orgulhosa, não te eduquei assim.
— Não é orgulho, eu só quero ver se ele mostra algum interesse também, né.
— É, você tem razão. — ela fica pensativa. — E se ele não mandar nada?
— Não vou ligar tanto, até porque a gente não tá se falando todo dia pra eu esperar isso, sabe? É até meio sem noção cobrar isso.
— Nossa, queria ser assim. — ela ri. — Acho que tô mais animada com seu romance do que você.
— , relaxe que não tem romance nenhum ainda.
— Ainda!
— Vocês duas! — tira a máscara que usava nos olhos para dormir e se vira para nós. — Eu quero dormir!
— Mas a gente tá falando baixo, nem venha reclamar. — rebate, ainda sussurrando. — Ó a , tá dormindo tranquilamente.
— Ela dorme até no meio de um show, não conta. — diz e abaixa a máscara para cobrir os olhos, no maior drama. — Não quero parecer acabada nas fotos!
— Tá, durma aí que a gente vai tentar falar mais baixo ainda. — se dá por vencida e volta a atenção para mim. — Quer que eu pergunte para o James se o Tom comentou alguma coisa?
— Não! — acabo gritando, porque bate um desespero só de pensar. só se mexe na poltrona e cobre a cabeça toda com o gorro do casaco. Ufa, pelo menos ela não reclamou comigo. — Por favor, não, me prometa que não vai perguntar nada.
— Tá, pode ficar tranquila, só estava sugerindo. Sua cara de espanto foi ótima, vou pensar em outra coisa pra te assustar. — ela ri.
— Depois dessa vou dormir, já te distraí demais por hoje. — me encosto de novo na poltrona e dou um tchauzinho para ela.
— Droga. — ela se vira, contrariada. — Fletch? — ela chama, mas não tem resposta. Certeza que ele também está dormindo.
É, pelo visto, o melhor a se fazer agora é acompanhar os dorminhocos.
Manchester, Novembro 2001
Depois de mais algumas horas de estrada, finalmente chegamos em Manchester, para a felicidade da , principalmente. Eu realmente fiquei com pena dela, ela não conseguiu descansar nada na van.
Assim que chegamos, fomos direto para o hotel e tínhamos pouco tempo para nos arrumar para a primeira entrevista do dia. O Fletch logo distribuiu as chaves dos quartos para cada uma e seguimos para o quinto andar daquele hotel gigante, eu e de um lado do corredor e e , do outro.
Já no quarto, enquanto separo a roupa que vou usar pelo resto do dia antes de tomar um banho, meu celular apita avisando que tenho uma nova mensagem, mas como estou com medo de ser a atrasada da vez, corro para o banheiro e me arrumo o mais rápido possível. Ok, também me apresso para me arrumar rápido para ver logo meu celular.
Apita de novo, nova mensagem.
A curiosidade fala mais alto e paro de fazer a maquiagem para olhar.
Tom: “Bom dia! E boa viagem :D”
Tom: “Espero ter te acordado haha”
Ah, que fofo. Admito que fiquei receosa com aquele papo todo com a mais cedo na van. Eu queria que ele mandasse algum sinal? Queria. Se ele não mandasse, eu ia ficar triste e mesmo assim não iria fazer nada a respeito? Sim. Sou idiota? Sim, de novo.
Não demoro muito e respondo:
: “Bom dia! Não foi dessa vez que você me acordou hahaha”
: “Por sinal, já estamos em Manchester”
Largo o celular de lado e volto para o que eu estava fazendo antes. Como não faço nada exagerado no rosto, logo termino a maquiagem e já estou pronta. Combinamos de nos encontrar na recepção do hotel, deixo meu quarto e vou para o ponto de encontro, espero mesmo não ter demorado muito. A fama de atrasada não vai ser minha.
Chego na recepção e só encontro o Fletch sentado numa poltrona perto da entrada. Então consegui não ser a atrasada da vez!
— Cadê as meninas? — pergunto, me sentando no sofá que tem perto dele.
— Ainda não apareceram. — ele responde. — Mas ainda estão no horário.
Sem nada para fazer enquanto espero pelas princesas, resolvo plantar a semente da curiosidade na mais exagerada de todas: .
: “Adivinha quem mandou mensagem”
E, quase no mesmo momento, chega uma nova mensagem do Tom.
Tom: “Já? Mas agora que são 10h :O”
: “Tivemos que madrugar hoje, muita coisa pra fazer por aqui”
Tom: “Posso imaginar”
dá sinal de vida. Desesperada como sempre, até por mensagem.
: “!! TÔ DESCENDO AGORA!!”
Agora já sei uma boa técnica para apressar a : fofoca.
Eu até pensei que o assunto tinha acabado, mas ele manda outra mensagem.
Tom: “Descobriu quando vocês voltam? haha”
— Fletch, quando é que a gente volta pra Londres mesmo? — pergunto. Eu não faço ideia, espero ter colocado roupa o suficiente para os dias aqui.
— Na terça pela manhã, não tão cedo como hoje, pode ficar tranquila. — ele diz e se levanta — Volto já. — e some pelo saguão.
: “Descobri agora, voltamos na terça”
Por que será que ele quer tanto saber? Não sei se pergunto… Cadê a para me ajudar?
Não demora muito e chega outra mensagem.
Tom: “Ah, ainda vai passar uns dias por aí. Se conseguir tempo, aproveita pra conhecer a cidade. Eu fui só uma vez, bem rápido e não deu pra conhecer tanta coisa, mas foi bem legal”
: “O Fletch não comentou sobre algum horário livre, não sei se não temos mesmo ou ele que esqueceu de falar haha”
: “Vá vendo como é, já já vai ser você atarefado com sua banda”
Tom: “Não vejo a hora! :D”
aparece do meu lado, na verdade se jogando ao meu lado no sofá, me dando o maior susto. Ou eu que estava bem concentrada no celular e não notei a chegada dela.
— Ok, me atualize!
— , não tem nada pra atualizar.
— Você disse que ele mandou mensagem, e aí? — ela pergunta, um pouco impaciente e olha ao redor. — Ué, cadê o Fletch?
— Ele foi pra lá — aponto para o outro lado do saguão. — Disse que voltava já.
— Ah, tudo bem. Agora, vamos, me conta!
— A gente tá trocando mensagens. — sorrio e ela parece contente com a novidade também. — Ele perguntou, de novo, quando a gente voltava pra Londres.
— Hm, alguém vai te chamar pra sair. — ela deduz e bate palminhas. — E você vai.
— Ei, calma, moça. — digo. — Ele não falou nada sobre isso, mas se ele chamar, óbvio que eu vou.
— Vamos esperar as cenas dos próximos capítulos. — ela se acomoda melhor no sofá ao meu lado. — E também as duas princesas da vez.
Depois de passarmos o dia inteiro fora, finalmente chegamos no hotel depois de jantar em um restaurante na mesma rua. A mais acabada de nós quatro era a , com certeza, mas eu sabia que ela não ia dormir agora.
— Boa noite, meninas! — Fletch deseja assim que o elevador para no quarto andar e aponta para e . — Nada de atrasos amanhã, por favor.
— Não se preocupe! — responde e ele dá um tchauzinho.
Assim que a porta do elevador fecha, ela pergunta:
— Vai ter algum dia que não vamos acordar tão cedo?
— Pelo visto, não. — respondo. — Quem sabe no último dia, parece que na terça não temos compromisso nenhum. Só voltar pra casa.
O elevador para o quinto andar e seguimos para o quarto da , menos , que sem perceber que todas paramos na porta do quarto, segue para o seu, o vizinho.
— Já vai dormir, ? — pergunta, enquanto a se atrapalha com a chave da porta.
— Eu pretendia… — ela diz um pouco desconfiada. — Vocês não estão cansadas, não?
— Não tanto, eu até dormi um pouco na viagem, mesmo com vocês duas fofocando tanto. — ela cutuca e revira os olhos. — O que é que vocês falavam tanto, ein?
— Ah, agora ela quer saber! Pergunta pra .
— A gente conversa lá dentro. — falo logo antes que ela pergunte alguma coisa. — , adianta isso aí.
— Calma! — ela rebate e, finalmente, consegue abrir a porta. — Pronto, podem entrar!
— Não vem, ? — noto que ela continua na porta do próprio quarto. — A trouxe brownie.
— Brownie brownie?
De repente, ela parece interessada, acho que ela vai mudar de ideia sobre dormir mais cedo.
— Brownie brownie. — levanto as sobrancelhas, sendo bem sugestiva.
— Hm, meu sono pode esperar.
Sabia.
♫♪♫
: Uma pena que nessa viagem não deu para conhecer bem a cidade, mas foi ótimo todo o contato que tivemos com os fãs que foram nos ver nas sessões de autógrafos, nas portas das rádios. Isso só me deixou ainda mais ansiosa para a turnê, que demorava para chegar.
: Nem me fala. Aquela primeira viagem foi rápida, mas cansativa ao mesmo tempo. Não estou reclamando, óbvio. Nosso trabalho é o melhor do mundo!
: Se o Fletch escutar isso que estamos contando, ele vai nos chamar de ingratas. Até que teve um lazer, vocês estão fingindo que não lembram, só pode.
: Verdade, não vamos ser injustas, mas o lazer era só poder encher a cara no jantar com bebida cara. Depois cada uma para o seu quarto.
: Na teoria.
: Isso, na teoria, a noite acabava ali.
♪♫♪
Manchester, Novembro 2001
A terça-feira chegou e com muita chuva para se despedir da Younger. , um pouco mais poética, diz que são lágrimas de Manchester porque vamos embora. Figura.
Começamos o dia sem pressa alguma, só tínhamos que cumprir uma ordem do Fletch: estarmos prontas na hora do almoço, para só comer e pegar estrada de volta para casa. E é óbvio que aproveitamos aquela manhã de chuva do melhor jeito: dormindo o que não dormimos nos dias anteriores.
Nesses últimos dias, não deixei de conversar com o Tom um dia sequer. Nenhuma conversa muito profunda, só falando sobre o que estava acontecendo no dia. Mesmo eu insistindo desde antes, só ontem que ele começou a trabalhar em uma música para mostrar para o Rashman quando ele estiver em Londres. Até agora ele não está muito convencido que esse empresário importante e ocupado quer dar uma outra chance a ele, agora que ele está fora do Busted.
Falando em Busted, comentou que eles se mudaram para um apartamento só deles, até um pouco perto da nossa casa, mas o ambiente era outro nível de tão chique. Ela também já deixou avisado que teria uma festa lá para inaugurar o novo lar deles quando arrumarem tudo, mas só com os mais próximos, segundo a , James não quer arrumar problema com os vizinhos ricaços logo de cara. Ansiosa desde já para uma festa sem ser na nossa casa.
Com todas dentro da van, de barriga cheia e só esperando o Fletch terminar de resolver alguma coisa por telefone do lado de fora, quebra o silêncio:
— Eu não queria ir embora agora.
— Também não. — concorda com ela.
— Ah, eu quero chegar logo em Londres. — diz.
— Ninguém sabe o motivo, né. — jogo na roda e todas, tirando a , começamos a rir. — Amiga, deixa o cara respirar.
— Já respirou esses dias sem mim, já tá bom! E a senhora também tem interesse em voltar logo, acha que engana alguém.
— Eu não tenho nada marcado, não sei do que você tá falando.
E não estou me fazendo de desentendida, eu realmente não tenho nada marcado. Bem que eu queria.
Fletch entra na van e paramos a conversa.
— Pronto, agora podemos ir.
— , larga esse celular, estamos falando com você.
estala os dedos na minha frente, tentando chamar a minha atenção e consegue, por um tempo.
Depois de algumas horas na estrada, faltava pouco para chegar em casa.
— Oi, tô escutando o que vocês estão falando. — minto.
— Hm, e estamos conversando sobre o que? — me olha, desconfiada.
— Sobre… — tento pensar em algum assunto mais provável de ser verdade, mas me interrompe.
— , nem tente inventar alguma coisa. Agora fala com quem você conversa tanto.
— , fala baixo. — repreende e olha de lado para o Fletch. Ele parecia muito ocupado para estar prestando atenção a nossa conversa. — E você já sabe com quem ela tá nesse papo todo.
Meu celular vibra com uma nova mensagem.
Tom: “Ainda falta muito pra chegar em casa?”
: “Não tanto, já estamos pertinho, ainda bem”
Tom: “Ah, legal”
Tom: “Quer sair mais tarde? Pra comer alguma coisa :)”
Ai. Meu. Deus.
— O que foi, ? — pergunta, um pouco preocupada e um pouco curiosa ao mesmo tempo. — Os olhos estão quase saindo do rosto de tão arregalados. — ri.
— Ah, nada não, besteira só. — respondo rápido e antes de mandar uma mensagem para ele, chega outra.
Tom: “Você deve estar cansada da viagem, né? Pode ficar pra outro dia, se você quiser”
: “Não, pode ser hoje mesmo, tá tranquilo :D”
: “Hoje o Fletch pegou leve e deu pra descansar haha”
Tom: “Hahaha ótimo! Passo na sua casa umas 20h”
: “Combinado ;)”
— Meninas, — chamo as três e conto a novidade mais baixo — acho que tenho um encontro hoje.
— EU SABIA! — não se controla e grita na van, chamando a atenção do nosso empresário, que olha rapidamente para trás, vê que não é nada e volta a fazer o que estava fazendo. — Finalmente!
— , gostei de ver. — até bate palmas.
— Gente, dá pra parar de me tratar como se eu estivesse encalhada? — peço, tentando parecer séria, mas com muita vontade de rir junto com elas — Só não me deixem nervosa, até agora estou calma com isso.
— , nada de pressionar a quando a gente chegar em casa. — manda logo o recado e faz uma cara confusa, mas no fundo ela sabe que é a bem o jeito dela surtar e me levar junto no surto. — Vocês vão fazer o que? — ela pergunta para mim.
— Ele chamou pra comer alguma coisa.
— Hm, não disse o que, né. — já comenta na maldade e começa a rir, puxando e com ela.
— ! — repreendo, mas acabo não conseguindo segurar o riso. — Vocês não existem.
Espero que eu ainda saiba flertar.
Acordo no dia seguinte à festa me sentindo tão esgotada e passo um tempo apenas deitada na cama, encarando o teto. O relógio que fica na mesinha de cabeceira indica que já passou do meio-dia. Nossa, como eu dormi. Na verdade, eu ainda quero dormir mais, mas não consigo por conta da enorme dor de cabeça que eu estou sentindo. Isso que dá beber muito. Só não faço o discurso de “Nunca mais eu vou beber!” porque vai ser uma mentira gigante.
A festa foi bem legal, até onde eu lembro. Notei que e pegaram leve na bebida, diferente da , que não passou muito tempo do início da festa e já estava sem controle. E eu? Então, eu achei que não tinha passado do ponto, mas vamos aos fatos: minha cabeça está explodindo, estou com um gosto horrível na boca, ainda estou vestida de Britney — só que agora como uma Britney destruída — e também não lembro como cheguei no meu quarto. A última coisa que lembro é estar no quarto de ensaio com o Tom tocando umas músicas de pop bem aleatórias e rindo muito por ele errar boa parte das letras, ainda acho que de propósito.
Meus planos de passar o dia deitada vão por água abaixo assim que minha barriga ronca pedindo comida. Sigo logo para o meu banheiro e levo um susto com o meu estado. , que decadência. Escovo os dentes e lavo o rosto, tentando tirar toda aquela maquiagem borrada da minha cara.
Estando um pouco mais decente do que quando eu acordei, desço para a cozinha atrás de comida. Encontro e sentadas na mesa.
— Olha quem acordou. — fala com a boca cheia de cereal.
— Fecha a boca, mulher. — respondo. — Onde tem remédio pra dor de cabeça?
— Ih… Alguém está de ressaca! — brinca. — Tem naquele armário, ali em cima.
Pego logo um comprimido na cartela e tomo com água.
— Eu já ia lá no seu quarto, vai que você desmaiava de novo? — diz, um pouco preocupada. — E sozinha no quarto, olha o perigo.
— Eu desmaiei?
me olha assustada.
— Não me diga que agora você virou esse tipo de bêbada esquecida.
— Tô falando sério… Não sei nem como fui parar no meu quarto.
— , senta aí que eu vou lembrar pra você. — aponta para a cadeira ao lado da . Obedeço e tomo o resto da água. — A senhorita simplesmente vomitou no quarto onde a gente ensaia. Por pouco não pegou no violão dela. — apontou para a .
— Como é que é? — grita do meu lado e minha cabeça parece que vai explodir. — , o que é que você foi fazer lá? E ainda com o meu violão?
Tento começar minha explicação, mas me corta na hora.
— , calma, seu violão está intacto.
— Sorte sua.
— Eu só lembro que estava enjoada, só isso. Conte o resto.
— Então, depois de botar tudo pra fora, acho que a sua pressão caiu e você desmaiou no sofá. Quer dizer, não sei se foi no sofá, mas quando eu cheguei lá, você já tava deitada.
— Como assim “quando eu cheguei lá”? Você não tava com ela? — pergunta.
— Que nada, eu tava na sala, dançando com um bonitinho e do nada aparece o Tom desesperado na sala, pedindo ajuda. Ele que tava com ela lá.
olha surpresa para mim, com um sorriso no rosto. Certeza que ela gostou do que aconteceu.
— !
— , não grita, minha cabeça tá explodindo. — peço. — Meu Deus, que vergonha eu passei.
— Vocês pelo menos se pegaram antes desse vexame?
— O quê? — pergunto confusa. — Claro que não!
— , essa menina precisa de uma intervenção urgente!
— Tenho que concordar com você.
— Teve mais alguma coisa? Mais vergonha? — pergunto, ignorando o que elas estavam discutindo e deito minha cabeça na mesa.
— Não, não… Você acordou logo depois que eu entrei, disse que queria dormir e levamos você pro quarto. Na verdade, foi o Tom, porque eu não aguento carregar ninguém. — ela ri.
— Ele fez isso?
— Claro, o coitado ficou super preocupado. Você deveria ligar pra ele, avisar que tá viva.
— Mas eu nem tenho o número dele.
— Isso não é problema, consigo isso agora mesmo com o James. — diz enquanto digita algo no celular.
Então foi assim que minha noite terminou. Sinceramente, era melhor eu não ter descoberto.
Completando o grupo, entra na cozinha, e devo dizer que está pior do que eu. Se é possível.
— Onde tem remédio pra dor de cabeça?
— Então temos duas de ressaca hoje. — alfineta.
— Eu achei que só estava de ressaca física, mas depois desse papo aqui, também estou de ressaca moral.
— , não foi nada demais. Eu dou uma semana pra você estar rindo disso. — me consola.
— O que houve? — pergunta.
Enquanto a conta tudo o que aconteceu para ela, recebe uma resposta do James, com o número do Tom.
— Pronto, já mandei o número pra você.
— Valeu, . Daqui a pouco eu ligo. — digo — Só preciso comer algo e tomar um banho pra voltar ao normal.
Enquanto eu coloco pão na torradeira, pergunta:
— Já arrumaram as malas pra amanhã?
— O que tem amanhã? — parece bem confusa e , só um pouco.
— Olha, vou comprar um calendário gigante aqui pra casa, colocar na porta da cozinha pra ficar bem visível. — reclama. Realmente, só ela que lembra de tudo. Se não fosse por ela, todo dia teríamos um susto com um carro aqui na porta pra nos levar para um canto que não sabemos. — Amanhã vamos pra Manchester, logo cedo… Cedo de verdade dessa vez.
— Nossa, claro! Eu fiquei muito animada e focada com a festa de Halloween e acabei esquecendo dessa viagem. — parece animada — Vou logo arrumar minha mala, só tenho isso pra fazer hoje. — dizendo isso, ela deixa a cozinha.
Vamos passar alguns dias, bem ocupados, em Manchester. Vai ser bom sair dessa casa, nem que seja por poucos dias. Não entenda mal, adoramos a casa, mas tudo tem limite. E finalmente teremos nossa primeira viagem juntas, como uma banda.
— Tem café pronto, bom pra vocês duas. — avisa, enquanto lava os pratos.
Encho duas canecas e entrego uma para , que já está sentada à mesa, apenas encarando o nada.
— Quer torrada também? — ofereço.
Ela faz uma careta, recusando. Certo, então ela está pior do que eu.
Final da tarde e eu ainda não fiz nada. Nada. Trancada no meu quarto apenas existindo. E evitando tudo que eu tenho para fazer também, quem eu quero enganar? Pelo menos eu tenho uma justificativa. Continuei um pouco mal, mesmo depois do café (que era pra ser almoço) e do banho, mas o que me renovou mesmo foi o de sempre: um cochilo super longo.
Acordada, porém ainda deitada, sigo procrastinando as duas tarefas que tenho para hoje. Uma super chata: arrumar a mala. A segunda, bem mais legal que a primeira, mas que me deixa receosa por algum motivo. Talvez vergonha? É, até pode ser, mas, no fundo, sei que eu não ficaria assim se não me importasse com a pessoa que me viu naquela situação. Ok, pelo visto acabei de desvendar o mistério.
Não quero parecer toda apaixonadinha, mas admito que a festa ficou bem mais legal depois que o Tom apareceu. Não sei se foi por ele ter aparecido logo depois daquele chato ou porque, no fundo, eu queria muito que ele aparecesse. Que não escute isso.
Será que tem algo rolando mesmo? Ou eu só estou dando muita bola para o que as meninas estão falando sobre? Se bem que elas nunca erram, do mesmo jeito que eu nunca erro quando é algo delas. Cá estou eu sofrendo por antecipação. Melhor eu ligar logo.
Rapidamente acho o contato do Tom no celular e ligo.
Espero.
Espero mais um pouco.
Nada.
Desligo, um pouco desesperada, antes que caia na caixa postal.
Claro que ele pode não ter atendido por mil motivos e nenhum ser relacionado a mim, até porque ele nem tem o meu número, mas óbvio que eu já estou vendo problema onde não tem.
Preciso tirar essas besteiras da minha cabeça e sei que eu sozinha não consigo, por isso, finalmente, saio do meu quarto e, pelas risadas que escuto, já sei que estão todas lá embaixo.
Assim que piso na sala, pergunta:
— Tá com tudo pronto já, né? Ficou tanto tempo lá em cima.
— Nada arrumado ainda, não separei nenhuma roupa. — digo — Eu passei a tarde dormindo.
— Também fiz isso, tô nova! — realmente parece melhor. — , relaxe que num instante a gente arruma tudo.
— Eu não falei nada. — ela ainda tenta parecer calma, mas tenho certeza que queria mandar a gente subir para fazer as malas.
— Nem precisa, sua cara já fala por você. — diz logo a verdade.
— Oh , vai ficar aí parada em pé? — pergunta.
Continuo em pé e agarrada ao celular.
— Ei, o que você tem? — parece preocupada.
Ok, vou admitir logo.
— Eu liguei pra ele e ele não atendeu.
— Ele quem? — está mais confusa do que eu.
— O Tom! — e respondem ao mesmo tempo.
— Ah! Não precisava gritar!
— E por que você tá encucada com isso? — toca bem na ferida, já sabendo a resposta. Não sei o que responder. Na verdade, não sei se quero responder e sigo em silêncio. — Eu sabia que tinha coisa aí! Te conheço. Admita que você, finalmente, tá interessada por outro cara depois do Caio.
— Talvez…
— Que talvez, óbvio que tá. O cara não te atendeu e olha como mexeu com você. — fala sorridente. Ela está feliz com a minha paranoia? — Olha só pra ela, se permitindo!
Pelo visto as outras duas também ficam felizes.
— Já aprovei esse casal. — afirma.
— Eu também, eu notei antes de vocês. — se vangloria.
— Gente! — chamo a atenção delas — Eu ainda tô aqui, me ajudem.
— Em que exatamente? — questiona. — Tá preocupada porque ele não te atendeu? , daqui a pouco ele retorna, só espere.
— E ele não sabe que foi você que ligou… Ou ele já tem o seu número? — agora é a vez da falar.
— Não tem. — respondo. — É, vocês têm razão. Nossa, por que eu tô assim?
— Desaprendeu a paquerar e tá com medo. — diz, simplesmente matando a charada.
— Você fala assim e parece até que namorei dez anos com o mesmo cara.
— Não foi seu caso, mas convenhamos que aqui nessa casa não tem nenhuma experiente nisso — admite e concorda.
— Olha quem tá falando! — cutuca.
— Querida, eu e só somos caras de pau, é bem diferente.
se levanta e estala os dedos, chamando a atenção de todas nós.
— Ei, perdemos o foco aqui. — aponta para mim.
— Não, , vocês já disseram tudo — eu começo — e estão certas. Vou arrumar minha mala que é melhor do que ficar esperando.
E, sem brincadeira, assim que termino de falar, meu celular toca e quase o derrubo no susto que levo.
— É ele? — pergunta, quase gritando.
— , atende logo! — não se contenta como a e grita do meu lado.
Em meio aquele barulho todo, vejo o nome Tom no visor. Só olho para as meninas e digo, antes de correr escada acima para o meu quarto:
— É o Tom!
— Garota, volta aqui!
Ainda escuto elas me seguindo pela escada, mas entro no meu quarto e fecho a porta antes que elas possam entrar também.
Atendo logo a chamada, antes que ele desista.
— Oi!
— Oi, de quem é esse número? — ele pergunta, com a voz um pouco rouca. Será que ele acabou de acordar? E ele realmente não tem o meu número, já estou me sentindo uma idiota pelo surto que tive mais cedo.
— Ah, sou eu, a … — começo — Peguei seu número com o James. — e me explico logo.
— Ah! Oi, ! Desculpa não ter atendido antes, eu tava dormindo e acordei com o celular tocando, mas como eu não conhecia o número, deixei tocando… Foi mal.
Ótimo jeito de começar, , parabéns.
— Não, tranquilo… Eu que peço desculpas, te acordei assim.
— Vou até já deixar seu número salvo pra não te ignorar de novo.
— Melhor! — solto uma risada e ele me acompanha do outro lado da linha. — Só liguei pra agradecer por ontem — pauso — A me contou como você me ajudou.
— Ah! Não foi nada… Você tá melhor? — ele pergunta preocupado.
— Agora sim, melhorei depois de dormir o dia inteiro, mas acordei péssima.
— Sei bem, acho que a cachaça não me fez muito bem — ele ri — Acho que só hibernando por dois dias pra me recuperar dessa festa!
— Ih, tá fraco então! — brinco.
— Falou a que passou mal ontem!
— É, bom ponto, mas já tô nova e você ainda tá acabado, pelo visto.
— Acertou, eu ainda estou acabado.
— Então é melhor eu desligar — digo, mesmo querendo conversar mais com ele — Você precisa dormir e eu vou arrumar a minha mala.
— Mala? Vai pra onde? — ele indaga.
— Vamos amanhã pra Manchester, pra fazer divulgação do CD. — explico e me sento na cama, tentando ignorar a minha mala aberta no chão do quarto, totalmente vazia.
— Ah, que legal! Boa viagem, então. — ele diz, animado. — E volta quando?
— Acho que na segunda ou na terça… — ele ri da minha confusão — Eu sei que sou péssima com a nossa agenda, ainda bem que temos a !
— Viva a ! — ele brinca. — Então não vou te alugar mais, você tem que arrumar suas coisas.
— E você vai voltar a dormir.
— Vou sim, o sono é mais forte que eu. — ri.
— Então tá… Tchau, Tom — me despeço. — E obrigada, de novo.
— Já disse que não foi nada. E boa viagem de novo, aproveite Manchester!
— Valeu, Tom! Até mais.
— Até!
E desligamos.
Ok. Ocorreu tudo bem, agora posso parar de me preocupar à toa e arrumar minha mala com calma, mas bem que eu poderia ter uma ajuda, né? E já sei onde achar.
— Podem entrar, eu sei que vocês estão curiosas! — grito para as meninas escutarem pela porta fechada. Nada acontece. — Eu sei que vocês estão aí!
Em menos de dois segundos, a minha porta se abre.
— A gente é previsível assim? — pergunta assim que entra no meu quarto.
— Sim, nós quatro, na verdade. — respondo, rindo junto com elas. — Escutar atrás da porta tá virando tradição por aqui.
— Sim, e aí? Conta como foi! — pede, se jogando do meu lado na cama.
— Você vai ter que contar, porque não conseguimos escutar nada, infelizmente. — se acomoda na minha cadeira, que por um milagre, não está cheia de roupa. E senta na beirada da cama.
— Sua mala ainda está vazia! Não tô acreditando. — mira logo nessa parte do chão.
— Se quiser eu arrumo agora e vocês ficam aí sem saber de nada…
— , a gente ajuda a a arrumar as coisas depois, agora deixa ela contar o papo dos dois, que eu tô curiosa. — se vira para ela, um pouco desesperada. A fofoqueira sofre.
— Tá, tá… — se convence. — Então, conte logo, , antes que a infarte!
Mesmo que a minha conversa com o Tom tenha sido bem breve, eu sei que as meninas iam fazer de tudo para prolongar o assunto. Pelo menos eu terei ajuda para arrumar a mala depois.
A manhã, ou madrugada, de sexta-feira começa de um modo bem estressante na nossa casa, por muitos motivos que eu já esperava por conhecer bem com quem eu divido o mesmo teto. Praticamente não dormimos, porque acordamos quando ainda estava o céu escuro e, para completar, estamos com um hábito péssimo de dormir super tarde e não foi ontem que conseguiríamos dormir cedo do nada. Então, dá para imaginar bem como estava o humor de todas nós, mesmo empolgadas com a viagem.
Só quando desço para a sala, já pronta com a calça jeans mais folgada que eu tenho, moletom e mais outro casaco por cima, noto o tanto de bagagem que estamos levando. E não, não estamos levando malas imensas de roupa, pelo menos nisso nós temos noção, porque sabemos o quanto de espaços os instrumentos tomam, mesmo que sejam poucos, só para os pockets shows que vamos fazer.
Desviando de todas as malas e cases que estão espalhados pela sala, entro na cozinha e encontro apenas a arrumando uma bolsa térmica gigante. Ainda bem que alguém lembrou de comida.
— Bom dia! Ou boa noite ainda? — digo enquanto encho uma caneca com café e vejo uma travessa enorme de brownie. — Hum, alguém acordou inspirada, já vou comer um pedaço agora.
— Eu não consegui dormir. — ela confessa — Aproveitei pra cozinhar isso pra viagem, não pra você comer agora. — e começa a cortar em quadradinhos.
— Um pedaço não vai fazer falta...
— , é brownie especial, se liga! — ela fala, sem parar de guardar os quadradinhos no pote de plástico. — É pra mais tarde.
— Ah! Você pensa em tudo!
— Óbvio! — ela se gaba. — Ó, eu fiz sanduíches também, se quiser.
— Já disse que te amo hoje? — dou um beijo na sua bochecha. — Então não vou comer nada agora, como no caminho.
— Cadê aquelas duas? Já já o Fletch aparece aqui na porta.
— Vou chamar as princesas.
Em algum lugar no caminho entre Londres e Manchester, Novembro 2001
— Fletch, por que a gente saiu tão cedo, ein? — pergunta, ainda sonolenta, acabando com o silêncio na van.
Só se passou uma hora que saímos de casa, ainda não amanheceu e continua puxando papo, só porque ela não consegue dormir.
— São quatro horas de estrada até lá — ele se vira no banco para responder, na calma de sempre. — E vocês já têm compromisso antes do almoço.
— , silêncio, tem gente querendo dormir aqui. — reclama, sentada na poltrona ao meu lado e atrás da . Já a , está acomodada na minha frente.
— Droga, queria conseguir dormir também. — ela diz e se livra para falar comigo, baixinho dessa vez. — Já falou com o Tom hoje?
— Não. — respondo, sem dar muita conversa. Eu só quero dormir.
— E por que não manda uma mensagem?
— , não são nem 6h da manhã. — mostro a tela do celular. — Eu que não vou mandar nada agora, já basta eu ter acordado ele ontem. Daqui a pouco ele tá me chamando de despertador.
Ela ri e não demora muito para escutarmos uma reclamação da , pedindo silêncio de novo.
— Verdade, mais tarde você manda alguma coisa. — ela sussurra para não levar outra bronca.
— Eu não, já liguei ontem e agora ele tem meu número.
— , deixe de ser orgulhosa, não te eduquei assim.
— Não é orgulho, eu só quero ver se ele mostra algum interesse também, né.
— É, você tem razão. — ela fica pensativa. — E se ele não mandar nada?
— Não vou ligar tanto, até porque a gente não tá se falando todo dia pra eu esperar isso, sabe? É até meio sem noção cobrar isso.
— Nossa, queria ser assim. — ela ri. — Acho que tô mais animada com seu romance do que você.
— , relaxe que não tem romance nenhum ainda.
— Ainda!
— Vocês duas! — tira a máscara que usava nos olhos para dormir e se vira para nós. — Eu quero dormir!
— Mas a gente tá falando baixo, nem venha reclamar. — rebate, ainda sussurrando. — Ó a , tá dormindo tranquilamente.
— Ela dorme até no meio de um show, não conta. — diz e abaixa a máscara para cobrir os olhos, no maior drama. — Não quero parecer acabada nas fotos!
— Tá, durma aí que a gente vai tentar falar mais baixo ainda. — se dá por vencida e volta a atenção para mim. — Quer que eu pergunte para o James se o Tom comentou alguma coisa?
— Não! — acabo gritando, porque bate um desespero só de pensar. só se mexe na poltrona e cobre a cabeça toda com o gorro do casaco. Ufa, pelo menos ela não reclamou comigo. — Por favor, não, me prometa que não vai perguntar nada.
— Tá, pode ficar tranquila, só estava sugerindo. Sua cara de espanto foi ótima, vou pensar em outra coisa pra te assustar. — ela ri.
— Depois dessa vou dormir, já te distraí demais por hoje. — me encosto de novo na poltrona e dou um tchauzinho para ela.
— Droga. — ela se vira, contrariada. — Fletch? — ela chama, mas não tem resposta. Certeza que ele também está dormindo.
É, pelo visto, o melhor a se fazer agora é acompanhar os dorminhocos.
Manchester, Novembro 2001
Depois de mais algumas horas de estrada, finalmente chegamos em Manchester, para a felicidade da , principalmente. Eu realmente fiquei com pena dela, ela não conseguiu descansar nada na van.
Assim que chegamos, fomos direto para o hotel e tínhamos pouco tempo para nos arrumar para a primeira entrevista do dia. O Fletch logo distribuiu as chaves dos quartos para cada uma e seguimos para o quinto andar daquele hotel gigante, eu e de um lado do corredor e e , do outro.
Já no quarto, enquanto separo a roupa que vou usar pelo resto do dia antes de tomar um banho, meu celular apita avisando que tenho uma nova mensagem, mas como estou com medo de ser a atrasada da vez, corro para o banheiro e me arrumo o mais rápido possível. Ok, também me apresso para me arrumar rápido para ver logo meu celular.
Apita de novo, nova mensagem.
A curiosidade fala mais alto e paro de fazer a maquiagem para olhar.
Tom: “Bom dia! E boa viagem :D”
Tom: “Espero ter te acordado haha”
Ah, que fofo. Admito que fiquei receosa com aquele papo todo com a mais cedo na van. Eu queria que ele mandasse algum sinal? Queria. Se ele não mandasse, eu ia ficar triste e mesmo assim não iria fazer nada a respeito? Sim. Sou idiota? Sim, de novo.
Não demoro muito e respondo:
: “Bom dia! Não foi dessa vez que você me acordou hahaha”
: “Por sinal, já estamos em Manchester”
Largo o celular de lado e volto para o que eu estava fazendo antes. Como não faço nada exagerado no rosto, logo termino a maquiagem e já estou pronta. Combinamos de nos encontrar na recepção do hotel, deixo meu quarto e vou para o ponto de encontro, espero mesmo não ter demorado muito. A fama de atrasada não vai ser minha.
Chego na recepção e só encontro o Fletch sentado numa poltrona perto da entrada. Então consegui não ser a atrasada da vez!
— Cadê as meninas? — pergunto, me sentando no sofá que tem perto dele.
— Ainda não apareceram. — ele responde. — Mas ainda estão no horário.
Sem nada para fazer enquanto espero pelas princesas, resolvo plantar a semente da curiosidade na mais exagerada de todas: .
: “Adivinha quem mandou mensagem”
E, quase no mesmo momento, chega uma nova mensagem do Tom.
Tom: “Já? Mas agora que são 10h :O”
: “Tivemos que madrugar hoje, muita coisa pra fazer por aqui”
Tom: “Posso imaginar”
dá sinal de vida. Desesperada como sempre, até por mensagem.
: “!! TÔ DESCENDO AGORA!!”
Agora já sei uma boa técnica para apressar a : fofoca.
Eu até pensei que o assunto tinha acabado, mas ele manda outra mensagem.
Tom: “Descobriu quando vocês voltam? haha”
— Fletch, quando é que a gente volta pra Londres mesmo? — pergunto. Eu não faço ideia, espero ter colocado roupa o suficiente para os dias aqui.
— Na terça pela manhã, não tão cedo como hoje, pode ficar tranquila. — ele diz e se levanta — Volto já. — e some pelo saguão.
: “Descobri agora, voltamos na terça”
Por que será que ele quer tanto saber? Não sei se pergunto… Cadê a para me ajudar?
Não demora muito e chega outra mensagem.
Tom: “Ah, ainda vai passar uns dias por aí. Se conseguir tempo, aproveita pra conhecer a cidade. Eu fui só uma vez, bem rápido e não deu pra conhecer tanta coisa, mas foi bem legal”
: “O Fletch não comentou sobre algum horário livre, não sei se não temos mesmo ou ele que esqueceu de falar haha”
: “Vá vendo como é, já já vai ser você atarefado com sua banda”
Tom: “Não vejo a hora! :D”
aparece do meu lado, na verdade se jogando ao meu lado no sofá, me dando o maior susto. Ou eu que estava bem concentrada no celular e não notei a chegada dela.
— Ok, me atualize!
— , não tem nada pra atualizar.
— Você disse que ele mandou mensagem, e aí? — ela pergunta, um pouco impaciente e olha ao redor. — Ué, cadê o Fletch?
— Ele foi pra lá — aponto para o outro lado do saguão. — Disse que voltava já.
— Ah, tudo bem. Agora, vamos, me conta!
— A gente tá trocando mensagens. — sorrio e ela parece contente com a novidade também. — Ele perguntou, de novo, quando a gente voltava pra Londres.
— Hm, alguém vai te chamar pra sair. — ela deduz e bate palminhas. — E você vai.
— Ei, calma, moça. — digo. — Ele não falou nada sobre isso, mas se ele chamar, óbvio que eu vou.
— Vamos esperar as cenas dos próximos capítulos. — ela se acomoda melhor no sofá ao meu lado. — E também as duas princesas da vez.
Depois de passarmos o dia inteiro fora, finalmente chegamos no hotel depois de jantar em um restaurante na mesma rua. A mais acabada de nós quatro era a , com certeza, mas eu sabia que ela não ia dormir agora.
— Boa noite, meninas! — Fletch deseja assim que o elevador para no quarto andar e aponta para e . — Nada de atrasos amanhã, por favor.
— Não se preocupe! — responde e ele dá um tchauzinho.
Assim que a porta do elevador fecha, ela pergunta:
— Vai ter algum dia que não vamos acordar tão cedo?
— Pelo visto, não. — respondo. — Quem sabe no último dia, parece que na terça não temos compromisso nenhum. Só voltar pra casa.
O elevador para o quinto andar e seguimos para o quarto da , menos , que sem perceber que todas paramos na porta do quarto, segue para o seu, o vizinho.
— Já vai dormir, ? — pergunta, enquanto a se atrapalha com a chave da porta.
— Eu pretendia… — ela diz um pouco desconfiada. — Vocês não estão cansadas, não?
— Não tanto, eu até dormi um pouco na viagem, mesmo com vocês duas fofocando tanto. — ela cutuca e revira os olhos. — O que é que vocês falavam tanto, ein?
— Ah, agora ela quer saber! Pergunta pra .
— A gente conversa lá dentro. — falo logo antes que ela pergunte alguma coisa. — , adianta isso aí.
— Calma! — ela rebate e, finalmente, consegue abrir a porta. — Pronto, podem entrar!
— Não vem, ? — noto que ela continua na porta do próprio quarto. — A trouxe brownie.
— Brownie brownie?
De repente, ela parece interessada, acho que ela vai mudar de ideia sobre dormir mais cedo.
— Brownie brownie. — levanto as sobrancelhas, sendo bem sugestiva.
— Hm, meu sono pode esperar.
Sabia.
: Uma pena que nessa viagem não deu para conhecer bem a cidade, mas foi ótimo todo o contato que tivemos com os fãs que foram nos ver nas sessões de autógrafos, nas portas das rádios. Isso só me deixou ainda mais ansiosa para a turnê, que demorava para chegar.
: Nem me fala. Aquela primeira viagem foi rápida, mas cansativa ao mesmo tempo. Não estou reclamando, óbvio. Nosso trabalho é o melhor do mundo!
: Se o Fletch escutar isso que estamos contando, ele vai nos chamar de ingratas. Até que teve um lazer, vocês estão fingindo que não lembram, só pode.
: Verdade, não vamos ser injustas, mas o lazer era só poder encher a cara no jantar com bebida cara. Depois cada uma para o seu quarto.
: Na teoria.
: Isso, na teoria, a noite acabava ali.
Manchester, Novembro 2001
A terça-feira chegou e com muita chuva para se despedir da Younger. , um pouco mais poética, diz que são lágrimas de Manchester porque vamos embora. Figura.
Começamos o dia sem pressa alguma, só tínhamos que cumprir uma ordem do Fletch: estarmos prontas na hora do almoço, para só comer e pegar estrada de volta para casa. E é óbvio que aproveitamos aquela manhã de chuva do melhor jeito: dormindo o que não dormimos nos dias anteriores.
Nesses últimos dias, não deixei de conversar com o Tom um dia sequer. Nenhuma conversa muito profunda, só falando sobre o que estava acontecendo no dia. Mesmo eu insistindo desde antes, só ontem que ele começou a trabalhar em uma música para mostrar para o Rashman quando ele estiver em Londres. Até agora ele não está muito convencido que esse empresário importante e ocupado quer dar uma outra chance a ele, agora que ele está fora do Busted.
Falando em Busted, comentou que eles se mudaram para um apartamento só deles, até um pouco perto da nossa casa, mas o ambiente era outro nível de tão chique. Ela também já deixou avisado que teria uma festa lá para inaugurar o novo lar deles quando arrumarem tudo, mas só com os mais próximos, segundo a , James não quer arrumar problema com os vizinhos ricaços logo de cara. Ansiosa desde já para uma festa sem ser na nossa casa.
Com todas dentro da van, de barriga cheia e só esperando o Fletch terminar de resolver alguma coisa por telefone do lado de fora, quebra o silêncio:
— Eu não queria ir embora agora.
— Também não. — concorda com ela.
— Ah, eu quero chegar logo em Londres. — diz.
— Ninguém sabe o motivo, né. — jogo na roda e todas, tirando a , começamos a rir. — Amiga, deixa o cara respirar.
— Já respirou esses dias sem mim, já tá bom! E a senhora também tem interesse em voltar logo, acha que engana alguém.
— Eu não tenho nada marcado, não sei do que você tá falando.
E não estou me fazendo de desentendida, eu realmente não tenho nada marcado. Bem que eu queria.
Fletch entra na van e paramos a conversa.
— Pronto, agora podemos ir.
— , larga esse celular, estamos falando com você.
estala os dedos na minha frente, tentando chamar a minha atenção e consegue, por um tempo.
Depois de algumas horas na estrada, faltava pouco para chegar em casa.
— Oi, tô escutando o que vocês estão falando. — minto.
— Hm, e estamos conversando sobre o que? — me olha, desconfiada.
— Sobre… — tento pensar em algum assunto mais provável de ser verdade, mas me interrompe.
— , nem tente inventar alguma coisa. Agora fala com quem você conversa tanto.
— , fala baixo. — repreende e olha de lado para o Fletch. Ele parecia muito ocupado para estar prestando atenção a nossa conversa. — E você já sabe com quem ela tá nesse papo todo.
Meu celular vibra com uma nova mensagem.
Tom: “Ainda falta muito pra chegar em casa?”
: “Não tanto, já estamos pertinho, ainda bem”
Tom: “Ah, legal”
Tom: “Quer sair mais tarde? Pra comer alguma coisa :)”
Ai. Meu. Deus.
— O que foi, ? — pergunta, um pouco preocupada e um pouco curiosa ao mesmo tempo. — Os olhos estão quase saindo do rosto de tão arregalados. — ri.
— Ah, nada não, besteira só. — respondo rápido e antes de mandar uma mensagem para ele, chega outra.
Tom: “Você deve estar cansada da viagem, né? Pode ficar pra outro dia, se você quiser”
: “Não, pode ser hoje mesmo, tá tranquilo :D”
: “Hoje o Fletch pegou leve e deu pra descansar haha”
Tom: “Hahaha ótimo! Passo na sua casa umas 20h”
: “Combinado ;)”
— Meninas, — chamo as três e conto a novidade mais baixo — acho que tenho um encontro hoje.
— EU SABIA! — não se controla e grita na van, chamando a atenção do nosso empresário, que olha rapidamente para trás, vê que não é nada e volta a fazer o que estava fazendo. — Finalmente!
— , gostei de ver. — até bate palmas.
— Gente, dá pra parar de me tratar como se eu estivesse encalhada? — peço, tentando parecer séria, mas com muita vontade de rir junto com elas — Só não me deixem nervosa, até agora estou calma com isso.
— , nada de pressionar a quando a gente chegar em casa. — manda logo o recado e faz uma cara confusa, mas no fundo ela sabe que é a bem o jeito dela surtar e me levar junto no surto. — Vocês vão fazer o que? — ela pergunta para mim.
— Ele chamou pra comer alguma coisa.
— Hm, não disse o que, né. — já comenta na maldade e começa a rir, puxando e com ela.
— ! — repreendo, mas acabo não conseguindo segurar o riso. — Vocês não existem.
Espero que eu ainda saiba flertar.
Capítulo seis
Londres, Novembro de 2001
— Poxa, eu só tenho amiga linda!
solta esse comentário assim que apareço na sala onde as meninas estão assistindo ao filme escolhido pela , não escutei como se chama, mas pelo pouco que vi, parece ser uma comédia romântica. Elas decidiram tirar o resto do dia (somente a noite, no caso) para descansar e não fazer nada de importante, por isso a nossa sala ainda está uma bagunça. Só chegamos e largamos tudo pelo meio da casa.
— , para, assim eu fico com vergonha. — falo depois que pausa o filme.
— Humilde, né.
— Descobriu pra onde vocês vão? — pergunta.
— Ele quer que eu conheça uma pizzaria que fica lá perto da casa dele. — respondo. — Ele ainda teve a audácia de dizer que a pizza que a gente sempre pede não chega aos pés dessa de hoje.
— Folgado esse Tom, né? Gostei. — diz e se levanta, ficando ao meu lado. — E amei o look! Botou as pernas pra jogo!
— Tá bom mesmo? — pergunto atrás de uma confirmação das meninas. — Tô com medo de ficar com frio com essa saia, do jeito que sou friorenta.
— Ócios do ofício! Vai assim mesmo, não vou deixar vou trocar de roupa. — confere a hora no seu relógio de pulso. — Até porque já tá na hora que vocês combinaram. Tá nervosa?
— E eu que boto pressão nela, né? — resmunga e volta para o sofá.
— Mais ou menos… Acho que tô mais animada do que nervosa, mas também não quero criar muita expectativa.
— Te entendo! E concordo, melhor se surpreender do que se decepcionar. — , sempre soltando umas frases de efeito.
— Mas e vocês vão fazer o quê?
— que foi responsável pelo delivery de hoje. — responde.
— Então é bem capaz de ser sushi, de novo. — resmunga. É, a está viciada em sushi.
— Eu que paguei e ainda reclama, incrível! — revira os olhos e olha de novo para o seu relógio. — Temos alguém atrasado.
— Que inglês mais fajuto você foi arrumar. — brinca e as meninas a acompanham nas risadas.
— Ele deve estar chegando. — suponho e me sento ao lado da .
Para meu alívio, não demora muito para a campainha tocar. Só pode ser ele.
Assim que me levanto, noto que as outras três me acompanham.
— Pra onde vocês pensam que vão?
— Ué, alguém chegou. — responde, se fazendo de sonsa.
— Sim, e só pode ser o Tom. — digo o óbvio.
— A gente não pode falar com ele? , você já tá com ciúmes? — já faz de propósito para brincar com a minha cara, só pode.
— Ciúme é um sentimento horrível, . — E ainda dá corda.
— Meninas! — acabo gritando mais do que eu planejava. — Eu não estou com ciúmes, parecem até que não me conhecem. Só não quero que me acompanhem como três mães corujas vendo a filha sair para o primeiro encontro da vida!
— Eita, verdade! — exclama. — Vamos fingir costume, todo mundo se senta. — ela se joga no sofá na mesma hora e as outras acompanham. Loucas.
— Obrigada! E bom filme pra vocês. — agradeço e saio da sala para não demorar mais ainda para abrir a porta. Pelo barulho da televisão, elas voltam para a comédia romântica que estavam assistindo antes.
Abro a porta e me deparo com Tom assobiando alguma coisa aleatória e andando pela entrada com as mãos nos bolsos da bermuda.
— Oi! Demorei demais, né?
— Claro que não, atrasado de hoje sou eu! — ele faz uma careta e pergunta: — Vamos?
— Deixa só eu pegar meu casaco. — e só lembrei dele porque senti o frio que estava do lado de fora quando abri a porta. Pego bem rápido um sobretudo cinza mesclado no armário que fica perto da porta. — Prontinho! — digo quando apareço de novo na porta.
— Mas nem tá tanto frio assim. — ele constata enquanto visto o sobretudo, já do lado de fora de casa. Ele não parece mesmo estar com frio com aquela bermuda e camiseta. — Imagina quando chegar o inverno! — ele ri da minha cara a caminho do carro dele.
— Ah, nem me fala! — digo antes de entrar no carro e dentro continuo — Nossa turnê ficou pra janeiro… Ninguém vai me ver porque vou me esconder embaixo de mil casacos, gorros e cachecol. — parece até exagero meu, mas é a pura verdade.
Ele continua rindo da minha cara e liga o carro. O som está sintonizado numa rádio que sempre escutamos em casa, só pela expectativa de, quem sabe, escutar nossa música tocando.
— Consigo até imaginar a notícia: — ele limpa a garganta e começa a imitar um locutor de rádio — “, baixista da banda Younger, acaba congelada no frio londrino de 15 graus!”
— Eu não tenho nem como me defender sobre isso. — falo isso porque estou com frio nas pernas e xingando a de alguns minutos atrás que escolheu uma saia curta para sair.
Depois de alguns minutos, ele avisa que já estamos perto da pizzaria. Eu não me atento muito ao caminho, mas posso dizer que fica um pouco longe da minha casa. Quando ele disse que estávamos perto da pizzaria, começou a tocar na rádio uma música que conheço muito bem. Não vou dizer que já esperava para não parecer tão convencida, mas aquela rádio realmente amava nossas músicas.
— Olha só quem está tocando! — ele fala animado e aumenta um pouco o volume, agora dá para ouvir bem os agudos da .
— Eu achei que você não escutava nossas músicas. — disse desconfiada, cruzando os braços e estreitando os olhos. Ele continuava olhando para frente, atento ao trânsito.
— Impossível não escutar a banda de vocês morando na mesma casa com a minha irmã. — ele ri. — Se bem que ultimamente eu tô escutando mais que ela.
— Não me diga... — provoco.
— É sério! — ele exclama e para mostrar que está falando a verdade, começa a cantar o refrão, com a de fundo.
Eu só tinha escutado o Tom cantando na festa de Halloween e, sendo bem sincera, eu não lembrava tanto assim da voz dele. Não sei se estou achando mais bonita ainda porque está cantando uma música da minha banda ou por estar bestinha por ele em poucos dias de proximidade.
Ele para de cantarolar e diz, me tirando dos meus pensamentos sobre ele:
— Chegamos!
Como eu posso descrever a pizzaria? No mínimo, aconchegante. Parece um ambiente bastante familiar e, pelo visto, o Tom conhecia todos os funcionários dali. Ele escolheu uma mesa mais ao fundo, mais distante das outras duas mesas ocupadas ali, afinal hoje é terça-feira, eu já esperava algo mais tranquilo. Sentamo-nos um de frente para o outro e não demorou muito para alguém aparecer e anotar nosso pedido.
— Você ainda não falou como foi em Manchester. — ele fala e parece mesmo interessado para saber mais ainda sobre a viagem, como se eu já não tivesse contado praticamente tudo durante a viagem.
— Não sei o que ainda não te contei. — paro e penso em algo interessante para dividir. — Ah, nós conhecemos duas fãs brasileiras!
— Nossa, deve ter sido legal!
— E foi mesmo! No meio de um monte de gente, eu só escuto um grito: “Meu Deus, vocês são muito lindas!”, em português. — até começo imitando o grito da menina, mas paro no meio para não gritar no meio do restaurante. Ops.
— Chamou logo a atenção, né. — ele diz.
— Sim! A gritou logo perguntando quem era que tava falando em português ali. — falo e pauso por um breve instante até lembrar de outra história. Sem pensar muito, infelizmente, continuo — Ah! Teve o dia que me perdi no hotel com a , tentando achar nossos quartos.
— Vocês esqueceram o número do quarto? — ele ri, um pouco confuso.
Olha o que a minha boca grande faz comigo.
“Sim, Tom, a gente se perdeu saindo do quarto da , que era em frente ao nosso.” Eu não vou contar isso. Porque a única explicação para essa burrada é o que realmente aconteceu: brownie demais na barriga. A achou que seria uma boa ideia, antes de dormir, ver se o corredor do andar inferior era igual ao que a gente estava. E eu ainda caí nessa. Nisso, saímos do quinto para o quarto andar, depois eu teimei que descemos em algum andar mais embaixo que o planejado. Subimos para outro andar, que eu não faço ideia qual. O passeio só parou porque entrou um funcionário do hotel no elevador e perguntou qual andar era o nosso andar. Só mostramos as chaves dos quartos e deduzo que foi assim que, finalmente, voltamos para o andar certo.
Eu não faço ideia de qual vai ser a reação dele se eu contar essa história. Melhor deixar quieto.
— A gente só não esqueceu porque estávamos com as chaves — começo e invento uma história menos idiota do que a verdade — A me arrastou pra conhecer o hotel, a parte da piscina, etc… Aquilo era gigante! — certo, pela feição dele, acho que está acreditando. — Mas não a ponto de se perder, acho que foi o sono nos confundiu. — rio e ele me acompanha.
— Sorte que o hotel não era mal assombrado! — ele brinca e até solto uma risada, mas por dentro só consigo pensar em: ainda bem que não pensamos nisso naquela noite.
— Agora você concorda que essa pizza é melhor? — Tom pergunta até um pouco convencido.
Por pouco não acabamos com a pizza inteira, se não fosse por uma fatia. Até comi mais, mesmo estando satisfeita porque estava boa demais. É, tenho que admitir que aquela que pedimos em casa não é nada parecida com essa.
— Concordo. — respondo e dou um último gole no refrigerante. — As meninas precisam conhecer também, será que entregam lá em casa? Achei um pouco longe.
— Provavelmente não, mas você liga e diz pra quem é o pedido. — ele se empolga com a própria ideia. — Capaz de chegar mais rápido que na minha casa. — ri.
— Vou tentar sem falar meu nome verdadeiro, só pra testar. — considero a ideia, mesmo sabendo que nenhuma das meninas concordaria com isso — Ou venho com elas outro dia aqui, elas vão gostar. — e acrescento antes que ele fale algo — Eu só não sei quando, mas já se considere convidado.
Ele sorri e diz:
— Convite mais que aceito.
Depois que terminamos de comer, não demoramos muito na pizzaria, até porque tenho reunião com o Fletch logo cedo e Tom sabia disso. No caminho de volta para minha casa, ele puxa um assunto um tanto interessante.
— Por que ninguém sabe sobre o James e a ?
Sempre aproveito todas as oportunidades que tenho para criticar essa regra ridícula do Fletch. Obrigada, Tom, por tocar nesse assunto.
— Na teoria eles não podem se relacionar. — explico e reviro os olhos — Quer dizer, na teoria e na prática. — ele continua confuso e continuo — O Fletch não quer relacionamento nenhum entre as bandas.
— Ele disse o motivo?
— “Porque sim” — respondo imitando a voz do Fletch e ele ri. — Nossa, isso não faz o menor sentido. Ou eu que não consigo enxergar um problema nisso.
Tom continua focado no trânsito que, a essa hora da noite, não tinha quase nenhum carro na rua. Não demora muito para dar sua opinião.
— Pode ser para poupar vocês, ou o Busted, de fofoca, mas é bem provável que é pra não “dar o que falar” de vocês.
— E o que falariam de ruim sobre os dois namorando?
— Aí eu já não sei. — Tom responde. — O bom é que eles não terminaram por causa disso.
— Ah, isso é verdade. Só a mesmo se limitar por causa do Fletch. — rio e Tom me acompanha. — Falando em Fletch, me lembrei do outro chefe.
— Rashman?
— Ele mesmo. Já preparou algo pra mostrar pra ele?
Tom olha rapidamente para mim e volta a olhar para frente.
— Então… — ele começa e coça a nuca. — Não.
— Tom!
— , eu não vou perder meu tempo fazendo isso, ele não deve nem lembrar do meu nome, quanto mais que me pediu isso.
— Quando ele volta?
— Acho que na próxima semana.
Ele vira na esquina e agora já estamos na rua da minha casa.
— Então na próxima semana você vai estar surtando de véspera para encontrar o Rashman porque não vai ter nada para mostrar.
Nossa, agora ele deve estar me achando a pessoa mais chata do universo, mas esse é o meu jeito de tentar incentivar. Ou está tudo errado? Agora já era. Não me controlo e acrescento:
— E se ele não te procurar, qualquer música que você fizer agora pode servir no futuro, nada se perde.
Ele continua calado. Ótimo, , parabéns! Por favor, fala alguma coisa.
Ele estaciona na porta da minha casa, desliga o carro e se vira para mim. Até me acalmo um pouco, porque ele não parece estar com raiva.
— Você tem razão. — ele diz e me bate um alívio na mesma hora, mas pelo visto ele entende errado o porquê do meu sorriso depois do que ele falou. — Tá se achando só porque admiti que você ta certa! — ri.
— Não! — tento me explicar logo — Ok, foi um pouquinho por isso também. — admito. — Só achei que fui chata com isso.
— Ah, não, eu entendi o seu ponto, fique tranquila. — ele sorri. — Vou tentar criar algo, só não vou te mostrar, vai que tá péssimo.
— Olha, na música tem lugar pra todo mundo! — brinco e ele dá uma risada super fofa. E sem intenção, vejo a hora que aparece no display do som e levo um susto — Nossa, como tá tarde, preciso ir. — solto o cinto do carro e me viro para ele.
— Vá pra não levar uma bronca do Fletch amanhã! — ele diz isso e se aproxima. — Até mais, . — e logo em seguida me dá um abraço apertado.
E um beijo.
Só que na bochecha.
Devidamente pronta para dormir, desço para a cozinha atrás de beliscar algum doce antes de cair no sono. Todo o andar de baixo está apagado, já encontrei assim quando cheguei. Pelo visto ainda estão cansadas da viagem. Enquanto ataco a geladeira, com tudo escuro, escuto alguém se aproximando e, não demora muito para acender a luz da cozinha.
— Tá se escondendo de quem nesse escuro? — pergunta, encostada no batente da porta e com os braços cruzados.
— De ninguém. — fecho a geladeira depois que acho um pote com brigadeiro dentro, pelo menos é o que parece. — E você, pelo visto, caiu da cama.
— Acordei com sede e não tinha mais água no quarto. — ela mostra a garrafinha vazia e segue para pia. — E como foi com o Tom?
— Ah, foi bem legal, mas… — pauso e desvio o olhar para o pote de brigadeiro.
— Mas? — ela senta na mesa comigo, na minha frente.
— Acho que tô confundindo as coisas. — digo e tento tirar um pouco do doce com a colher, mas não consigo. — Que pedra é essa?
ri e responde:
— pediu outra chance para fazer brigadeiro e deu nisso. De novo. Acho que só sai com uma faca. — ela solta uma gargalhada e vai buscar o talher para me ajudar. — Mas não desvie da conversa importante, conte mais.
Conto o que acho de mais importante sobre o encontro por causa da hora e porque ela parece cansada, não quero prolongar muito.
— Tá, então ele só te deu um beijo na bochecha. — ela fala. — E pelo visto você queria em outro canto.
— Isso — confirmo. —, mas tirando esse final que não foi como eu esperava, foi tudo ótimo.
— Então você vai marcar outro encontro com ele e se ele vier com beijo na bochecha de novo, você agarra ele e tasca um beijo no canto que você quer! — se empolga e ainda bate na mesa, antes de se levantar. — Agora larga essa pedra de chocolate e vamos dormir.
Eu não entendo como a sempre erra numa receita tão simples.
Devolvo o pote para a geladeira e, depois de apagar a luz da cozinha, acompanho a escada acima.
♫♪♫
: No dia seguinte, pontualmente como quase sempre, nos reunimos com o Fletch e mais uma mulher, que até então não conhecíamos.
: Charlotte. Fletch nos apresentou e avisou que, a partir dali, ela ia ajudá-lo com a Younger. Ela é tudo. E não estou falando isso só porque ela vai ver essa entrevista.
: Até ela aparecer, a gente não sabia que precisava tanto dela. Eu, finalmente, parei de ser a agenda da banda.
: Ela passou a nos acompanhar em tudo, acho que o Fletch estava muito ocupado com o Busted e outras coisas.
Fletch, a gente te ama, mas…
Todas: Team Charlotte!
♪♫♪
— Poxa, eu só tenho amiga linda!
solta esse comentário assim que apareço na sala onde as meninas estão assistindo ao filme escolhido pela , não escutei como se chama, mas pelo pouco que vi, parece ser uma comédia romântica. Elas decidiram tirar o resto do dia (somente a noite, no caso) para descansar e não fazer nada de importante, por isso a nossa sala ainda está uma bagunça. Só chegamos e largamos tudo pelo meio da casa.
— , para, assim eu fico com vergonha. — falo depois que pausa o filme.
— Humilde, né.
— Descobriu pra onde vocês vão? — pergunta.
— Ele quer que eu conheça uma pizzaria que fica lá perto da casa dele. — respondo. — Ele ainda teve a audácia de dizer que a pizza que a gente sempre pede não chega aos pés dessa de hoje.
— Folgado esse Tom, né? Gostei. — diz e se levanta, ficando ao meu lado. — E amei o look! Botou as pernas pra jogo!
— Tá bom mesmo? — pergunto atrás de uma confirmação das meninas. — Tô com medo de ficar com frio com essa saia, do jeito que sou friorenta.
— Ócios do ofício! Vai assim mesmo, não vou deixar vou trocar de roupa. — confere a hora no seu relógio de pulso. — Até porque já tá na hora que vocês combinaram. Tá nervosa?
— E eu que boto pressão nela, né? — resmunga e volta para o sofá.
— Mais ou menos… Acho que tô mais animada do que nervosa, mas também não quero criar muita expectativa.
— Te entendo! E concordo, melhor se surpreender do que se decepcionar. — , sempre soltando umas frases de efeito.
— Mas e vocês vão fazer o quê?
— que foi responsável pelo delivery de hoje. — responde.
— Então é bem capaz de ser sushi, de novo. — resmunga. É, a está viciada em sushi.
— Eu que paguei e ainda reclama, incrível! — revira os olhos e olha de novo para o seu relógio. — Temos alguém atrasado.
— Que inglês mais fajuto você foi arrumar. — brinca e as meninas a acompanham nas risadas.
— Ele deve estar chegando. — suponho e me sento ao lado da .
Para meu alívio, não demora muito para a campainha tocar. Só pode ser ele.
Assim que me levanto, noto que as outras três me acompanham.
— Pra onde vocês pensam que vão?
— Ué, alguém chegou. — responde, se fazendo de sonsa.
— Sim, e só pode ser o Tom. — digo o óbvio.
— A gente não pode falar com ele? , você já tá com ciúmes? — já faz de propósito para brincar com a minha cara, só pode.
— Ciúme é um sentimento horrível, . — E ainda dá corda.
— Meninas! — acabo gritando mais do que eu planejava. — Eu não estou com ciúmes, parecem até que não me conhecem. Só não quero que me acompanhem como três mães corujas vendo a filha sair para o primeiro encontro da vida!
— Eita, verdade! — exclama. — Vamos fingir costume, todo mundo se senta. — ela se joga no sofá na mesma hora e as outras acompanham. Loucas.
— Obrigada! E bom filme pra vocês. — agradeço e saio da sala para não demorar mais ainda para abrir a porta. Pelo barulho da televisão, elas voltam para a comédia romântica que estavam assistindo antes.
Abro a porta e me deparo com Tom assobiando alguma coisa aleatória e andando pela entrada com as mãos nos bolsos da bermuda.
— Oi! Demorei demais, né?
— Claro que não, atrasado de hoje sou eu! — ele faz uma careta e pergunta: — Vamos?
— Deixa só eu pegar meu casaco. — e só lembrei dele porque senti o frio que estava do lado de fora quando abri a porta. Pego bem rápido um sobretudo cinza mesclado no armário que fica perto da porta. — Prontinho! — digo quando apareço de novo na porta.
— Mas nem tá tanto frio assim. — ele constata enquanto visto o sobretudo, já do lado de fora de casa. Ele não parece mesmo estar com frio com aquela bermuda e camiseta. — Imagina quando chegar o inverno! — ele ri da minha cara a caminho do carro dele.
— Ah, nem me fala! — digo antes de entrar no carro e dentro continuo — Nossa turnê ficou pra janeiro… Ninguém vai me ver porque vou me esconder embaixo de mil casacos, gorros e cachecol. — parece até exagero meu, mas é a pura verdade.
Ele continua rindo da minha cara e liga o carro. O som está sintonizado numa rádio que sempre escutamos em casa, só pela expectativa de, quem sabe, escutar nossa música tocando.
— Consigo até imaginar a notícia: — ele limpa a garganta e começa a imitar um locutor de rádio — “, baixista da banda Younger, acaba congelada no frio londrino de 15 graus!”
— Eu não tenho nem como me defender sobre isso. — falo isso porque estou com frio nas pernas e xingando a de alguns minutos atrás que escolheu uma saia curta para sair.
Depois de alguns minutos, ele avisa que já estamos perto da pizzaria. Eu não me atento muito ao caminho, mas posso dizer que fica um pouco longe da minha casa. Quando ele disse que estávamos perto da pizzaria, começou a tocar na rádio uma música que conheço muito bem. Não vou dizer que já esperava para não parecer tão convencida, mas aquela rádio realmente amava nossas músicas.
— Olha só quem está tocando! — ele fala animado e aumenta um pouco o volume, agora dá para ouvir bem os agudos da .
— Eu achei que você não escutava nossas músicas. — disse desconfiada, cruzando os braços e estreitando os olhos. Ele continuava olhando para frente, atento ao trânsito.
— Impossível não escutar a banda de vocês morando na mesma casa com a minha irmã. — ele ri. — Se bem que ultimamente eu tô escutando mais que ela.
— Não me diga... — provoco.
— É sério! — ele exclama e para mostrar que está falando a verdade, começa a cantar o refrão, com a de fundo.
Eu só tinha escutado o Tom cantando na festa de Halloween e, sendo bem sincera, eu não lembrava tanto assim da voz dele. Não sei se estou achando mais bonita ainda porque está cantando uma música da minha banda ou por estar bestinha por ele em poucos dias de proximidade.
Ele para de cantarolar e diz, me tirando dos meus pensamentos sobre ele:
— Chegamos!
Como eu posso descrever a pizzaria? No mínimo, aconchegante. Parece um ambiente bastante familiar e, pelo visto, o Tom conhecia todos os funcionários dali. Ele escolheu uma mesa mais ao fundo, mais distante das outras duas mesas ocupadas ali, afinal hoje é terça-feira, eu já esperava algo mais tranquilo. Sentamo-nos um de frente para o outro e não demorou muito para alguém aparecer e anotar nosso pedido.
— Você ainda não falou como foi em Manchester. — ele fala e parece mesmo interessado para saber mais ainda sobre a viagem, como se eu já não tivesse contado praticamente tudo durante a viagem.
— Não sei o que ainda não te contei. — paro e penso em algo interessante para dividir. — Ah, nós conhecemos duas fãs brasileiras!
— Nossa, deve ter sido legal!
— E foi mesmo! No meio de um monte de gente, eu só escuto um grito: “Meu Deus, vocês são muito lindas!”, em português. — até começo imitando o grito da menina, mas paro no meio para não gritar no meio do restaurante. Ops.
— Chamou logo a atenção, né. — ele diz.
— Sim! A gritou logo perguntando quem era que tava falando em português ali. — falo e pauso por um breve instante até lembrar de outra história. Sem pensar muito, infelizmente, continuo — Ah! Teve o dia que me perdi no hotel com a , tentando achar nossos quartos.
— Vocês esqueceram o número do quarto? — ele ri, um pouco confuso.
Olha o que a minha boca grande faz comigo.
“Sim, Tom, a gente se perdeu saindo do quarto da , que era em frente ao nosso.” Eu não vou contar isso. Porque a única explicação para essa burrada é o que realmente aconteceu: brownie demais na barriga. A achou que seria uma boa ideia, antes de dormir, ver se o corredor do andar inferior era igual ao que a gente estava. E eu ainda caí nessa. Nisso, saímos do quinto para o quarto andar, depois eu teimei que descemos em algum andar mais embaixo que o planejado. Subimos para outro andar, que eu não faço ideia qual. O passeio só parou porque entrou um funcionário do hotel no elevador e perguntou qual andar era o nosso andar. Só mostramos as chaves dos quartos e deduzo que foi assim que, finalmente, voltamos para o andar certo.
Eu não faço ideia de qual vai ser a reação dele se eu contar essa história. Melhor deixar quieto.
— A gente só não esqueceu porque estávamos com as chaves — começo e invento uma história menos idiota do que a verdade — A me arrastou pra conhecer o hotel, a parte da piscina, etc… Aquilo era gigante! — certo, pela feição dele, acho que está acreditando. — Mas não a ponto de se perder, acho que foi o sono nos confundiu. — rio e ele me acompanha.
— Sorte que o hotel não era mal assombrado! — ele brinca e até solto uma risada, mas por dentro só consigo pensar em: ainda bem que não pensamos nisso naquela noite.
— Agora você concorda que essa pizza é melhor? — Tom pergunta até um pouco convencido.
Por pouco não acabamos com a pizza inteira, se não fosse por uma fatia. Até comi mais, mesmo estando satisfeita porque estava boa demais. É, tenho que admitir que aquela que pedimos em casa não é nada parecida com essa.
— Concordo. — respondo e dou um último gole no refrigerante. — As meninas precisam conhecer também, será que entregam lá em casa? Achei um pouco longe.
— Provavelmente não, mas você liga e diz pra quem é o pedido. — ele se empolga com a própria ideia. — Capaz de chegar mais rápido que na minha casa. — ri.
— Vou tentar sem falar meu nome verdadeiro, só pra testar. — considero a ideia, mesmo sabendo que nenhuma das meninas concordaria com isso — Ou venho com elas outro dia aqui, elas vão gostar. — e acrescento antes que ele fale algo — Eu só não sei quando, mas já se considere convidado.
Ele sorri e diz:
— Convite mais que aceito.
Depois que terminamos de comer, não demoramos muito na pizzaria, até porque tenho reunião com o Fletch logo cedo e Tom sabia disso. No caminho de volta para minha casa, ele puxa um assunto um tanto interessante.
— Por que ninguém sabe sobre o James e a ?
Sempre aproveito todas as oportunidades que tenho para criticar essa regra ridícula do Fletch. Obrigada, Tom, por tocar nesse assunto.
— Na teoria eles não podem se relacionar. — explico e reviro os olhos — Quer dizer, na teoria e na prática. — ele continua confuso e continuo — O Fletch não quer relacionamento nenhum entre as bandas.
— Ele disse o motivo?
— “Porque sim” — respondo imitando a voz do Fletch e ele ri. — Nossa, isso não faz o menor sentido. Ou eu que não consigo enxergar um problema nisso.
Tom continua focado no trânsito que, a essa hora da noite, não tinha quase nenhum carro na rua. Não demora muito para dar sua opinião.
— Pode ser para poupar vocês, ou o Busted, de fofoca, mas é bem provável que é pra não “dar o que falar” de vocês.
— E o que falariam de ruim sobre os dois namorando?
— Aí eu já não sei. — Tom responde. — O bom é que eles não terminaram por causa disso.
— Ah, isso é verdade. Só a mesmo se limitar por causa do Fletch. — rio e Tom me acompanha. — Falando em Fletch, me lembrei do outro chefe.
— Rashman?
— Ele mesmo. Já preparou algo pra mostrar pra ele?
Tom olha rapidamente para mim e volta a olhar para frente.
— Então… — ele começa e coça a nuca. — Não.
— Tom!
— , eu não vou perder meu tempo fazendo isso, ele não deve nem lembrar do meu nome, quanto mais que me pediu isso.
— Quando ele volta?
— Acho que na próxima semana.
Ele vira na esquina e agora já estamos na rua da minha casa.
— Então na próxima semana você vai estar surtando de véspera para encontrar o Rashman porque não vai ter nada para mostrar.
Nossa, agora ele deve estar me achando a pessoa mais chata do universo, mas esse é o meu jeito de tentar incentivar. Ou está tudo errado? Agora já era. Não me controlo e acrescento:
— E se ele não te procurar, qualquer música que você fizer agora pode servir no futuro, nada se perde.
Ele continua calado. Ótimo, , parabéns! Por favor, fala alguma coisa.
Ele estaciona na porta da minha casa, desliga o carro e se vira para mim. Até me acalmo um pouco, porque ele não parece estar com raiva.
— Você tem razão. — ele diz e me bate um alívio na mesma hora, mas pelo visto ele entende errado o porquê do meu sorriso depois do que ele falou. — Tá se achando só porque admiti que você ta certa! — ri.
— Não! — tento me explicar logo — Ok, foi um pouquinho por isso também. — admito. — Só achei que fui chata com isso.
— Ah, não, eu entendi o seu ponto, fique tranquila. — ele sorri. — Vou tentar criar algo, só não vou te mostrar, vai que tá péssimo.
— Olha, na música tem lugar pra todo mundo! — brinco e ele dá uma risada super fofa. E sem intenção, vejo a hora que aparece no display do som e levo um susto — Nossa, como tá tarde, preciso ir. — solto o cinto do carro e me viro para ele.
— Vá pra não levar uma bronca do Fletch amanhã! — ele diz isso e se aproxima. — Até mais, . — e logo em seguida me dá um abraço apertado.
E um beijo.
Só que na bochecha.
Devidamente pronta para dormir, desço para a cozinha atrás de beliscar algum doce antes de cair no sono. Todo o andar de baixo está apagado, já encontrei assim quando cheguei. Pelo visto ainda estão cansadas da viagem. Enquanto ataco a geladeira, com tudo escuro, escuto alguém se aproximando e, não demora muito para acender a luz da cozinha.
— Tá se escondendo de quem nesse escuro? — pergunta, encostada no batente da porta e com os braços cruzados.
— De ninguém. — fecho a geladeira depois que acho um pote com brigadeiro dentro, pelo menos é o que parece. — E você, pelo visto, caiu da cama.
— Acordei com sede e não tinha mais água no quarto. — ela mostra a garrafinha vazia e segue para pia. — E como foi com o Tom?
— Ah, foi bem legal, mas… — pauso e desvio o olhar para o pote de brigadeiro.
— Mas? — ela senta na mesa comigo, na minha frente.
— Acho que tô confundindo as coisas. — digo e tento tirar um pouco do doce com a colher, mas não consigo. — Que pedra é essa?
ri e responde:
— pediu outra chance para fazer brigadeiro e deu nisso. De novo. Acho que só sai com uma faca. — ela solta uma gargalhada e vai buscar o talher para me ajudar. — Mas não desvie da conversa importante, conte mais.
Conto o que acho de mais importante sobre o encontro por causa da hora e porque ela parece cansada, não quero prolongar muito.
— Tá, então ele só te deu um beijo na bochecha. — ela fala. — E pelo visto você queria em outro canto.
— Isso — confirmo. —, mas tirando esse final que não foi como eu esperava, foi tudo ótimo.
— Então você vai marcar outro encontro com ele e se ele vier com beijo na bochecha de novo, você agarra ele e tasca um beijo no canto que você quer! — se empolga e ainda bate na mesa, antes de se levantar. — Agora larga essa pedra de chocolate e vamos dormir.
Eu não entendo como a sempre erra numa receita tão simples.
Devolvo o pote para a geladeira e, depois de apagar a luz da cozinha, acompanho a escada acima.
: No dia seguinte, pontualmente como quase sempre, nos reunimos com o Fletch e mais uma mulher, que até então não conhecíamos.
: Charlotte. Fletch nos apresentou e avisou que, a partir dali, ela ia ajudá-lo com a Younger. Ela é tudo. E não estou falando isso só porque ela vai ver essa entrevista.
: Até ela aparecer, a gente não sabia que precisava tanto dela. Eu, finalmente, parei de ser a agenda da banda.
: Ela passou a nos acompanhar em tudo, acho que o Fletch estava muito ocupado com o Busted e outras coisas.
Fletch, a gente te ama, mas…
Todas: Team Charlotte!
Capítulo sete
Londres, Novembro de 2001
— , ainda não entendi essa sua ideia de dirigir hoje. — diz, do meu lado no banco do carona. — A gente poderia ter pego um táxi.
— , ela sabe disso, mas ela quis mesmo assim, deixa ela. — me defende, sentada no banco de trás.
Sábado à noite. Finalmente um descanso depois de uma semana tão agitada. Ok, uma festa não é bem um descanso, mas sim uma distração. Estamos a caminho do condomínio chique onde o Busted resolveu comprar um apartamento. passou o dia lá ajudando na organização de tudo e levou tudo para se arrumar lá para a festa de hoje à noite, que por sinal estamos bem atrasadas.
— Hm, sei não. — parece desconfiada ao meu lado. Sigo olhando para frente, atenta ao trânsito e ainda posso ignorar qualquer olhar desconfiado dela. — Aí tem coisa.
Meu celular toca e rapidamente jogo para atender.
— Fala, ! — ela atende animada — Ela tá dirigindo, por isso que eu atendi. — ela fica em silêncio enquanto fala algo — Sim! Reclame com ela, eu também não entendi! — pausa de novo — Garota, se acalme, já estamos pertinho. Vá beijar o James enquanto isso. — fala algo que faz gargalhar — Tá, eu aviso a ela. Até daqui a pouco. — e desliga.
— O que ela queria? — pergunto.
— Ela ligou pra te avisar que o Tom já chegou. — ela responde. — E depois ficou perguntando se éramos três noivas pra demorarmos tanto.
— Ela fala isso, mas eu tenho certeza que algum convidado chegou antes dela ficar pronta! — diz e se aproxima da gente, ficando entre os bancos. — , você sabe mesmo o caminho?
— Claro! Já tá pertinho. — respondo.
Ficamos alguns minutos em silêncio até perguntar:
— Você já sabia que ele vinha pra essa festa também?
Olho rapidamente para ela e volto a prestar atenção no trânsito.
— Sabia.
Finalmente chegamos na rua certa, eu não lembrava tão bem assim do caminho, mas elas não precisam saber disso.
— Então é por isso que você não quer beber hoje! — ela afirma.
Estaciono o carro em frente ao prédio enorme e, finalmente, me viro para as duas.
— Ok, é por isso mesmo.
— , ainda por causa do halloween? — questiona um pouco preocupada. Balanço a cabeça confirmando e ela continua. — , acho que não é pelo Tom, é por ter passado mal na última festa.
— Na frente dele. — completo a logo em seguida.
— Hm, ressaca moral ainda? Vocês não saíram essa semana? — pergunta.
— Mais ou menos… — abro a porta do carro para acabar logo com esse assunto. — Vamos?
Todo mundo sai do carro e seguimos para o prédio dos meninos.
— Só prometa que não vai ficar morgada na festa. — para na minha frente, enquanto esperamos o elevador.
— Tá dizendo que eu só fico legal quando tô bêbada?
— Não quis dizer isso. — ela fala calmamente. — Só não fique se policiando tanto só porque o garoto tá na mesma festa.
— Ah, vou concordar com você! — diz e abre a porta do elevador para nós entrarmos. — Duvido muito ele te ver algum dia pior do que na festa passada.
Nossa, ajudou muito.
— ! — recrimina.
— Falei demais, né.
— Tudo bem — interrompo e abro a porta do elevador depois que ele para no andar certo. — Acabou o assunto.
— Não tá mais aqui quem falou.
Não demora muito para estarmos na porta do apartamento do Busted, e ficamos ali paradas por um tempo, porque ninguém escutava a campainha com aquela música alta tocando.
— Vou ligar pra . — digo. — Eu achava que eles não queriam problemas com os vizinhos.
— Agora já era. — ri.
— Cadê vocês? — atende o celular na maior simpatia.
— Estamos aqui na porta, mas ninguém escuta a gente chamando com essa música alta! — reclamo. — Venha abrir a porta pra suas amigas, por favor.
— Ah, tô indo. — e desliga.
Rapidamente a aparece na porta, junto com o James. Se eu já estava achando barulhento do lado de fora, me assusto quando eles abrem a porta e percebo como está dentro.
— As noivas chegaram! — ela grita. — Achei que tinham se perdido no meio do caminho.
— Você explicou bem o caminho, , não tinha como errar. — digo.
— Garotas, bem-vindas a nossa nova casa! — James grita igual a antes, agarrado com uma garrafa de cerveja. Acho que já se animou demais com a festa de inauguração do apartamento. — Fiquem à vontade!
Ok, o apartamento é gigante, bem maior do que eu imaginava e a sala está abarrotada de gente. Eu não dou meia hora para algum vizinho reclamar.
— , quem são essas pessoas? — pergunta, um pouco assustada que nem eu estou.
— Amigos dos meninos, eu acho… — ela responde e dá um gole na cerveja. — Eu achei que só iam chamar os mais próximos, mas pelo visto… Venham pegar uma bebida. — ela para e olha para mim. — E um refri pra motorista da noite.
— Sendo sincera, eu achei que nem teria. — rio e acompanho a até a cozinha, junto com as meninas.
Olho ao redor e não vejo o Tom em canto nenhum, pelo menos por onde eu passo. Quando chegamos na cozinha, distribui uma cerveja para cada e o meu refrigerante.
— A avisou? O Tom já tá aí. — pergunta.
— Avisou sim, mas não o vi ainda. — respondo e finjo que não estou tão preocupada com isso.
— O papo tá ótimo aqui, mas eu quero dançar! — fala animada e tenta empurrar nós três para fora do cômodo.
3h da madrugada.
Eu só quero chegar em casa e dormir.
Estou sentada no sofá pequeno, que parece mais um banco acolchoado, na varanda do apartamento, em um dilema comigo mesma. Não quero acreditar que estou um pouco entediada na festa só porque não estou bebendo como todo mundo. Patético, eu sei.
Mas, infelizmente, é a mais pura verdade. Não sei quantas latinhas de coca-cola eu já tomei e mesmo assim não perdi o sono.
Aqui na varanda está um pouco mais calmo, porque estão mantendo a porta de vidro sempre fechada e o som fica só dentro do apartamento. Umas duas pessoas estão fumando e conversando alto no canto oposto ao que estou e, mesmo sem querer, acabo escutando um pouco da conversa. Uma pena que não é nada tão interessante assim.
Ainda tem muita gente animada lá dentro, entre elas, as minhas amigas que vão voltar para casa comigo. Eu já cumpri minhas horas de dança por hoje e, como elas me conhecem bem, não insistiram mais em me puxar para a “pista de dança”, que nada mais é que o tapete "caro e feio que o Matt escolheu”. Palavras do James.
Quem também segue por aqui é o Tom, mas ele entrou uns minutos atrás quando o James apareceu aqui super bêbado e o arrastou para dentro, não sei bem o porquê.
Sinto meu celular vibrando no bolso da calça. Qualquer pessoa que pudesse me ligar a essa hora, está aqui na festa.
Tom aparece no visor. Ué.
— Oi? — digo, assim que atendo a chamada. Só consigo escutar uma música de fundo. Na verdade, é a mesma que escuto, um pouco abafada, vindo da sala.
— Tá com fome? — ele pergunta, e fico mais confusa ainda. — Tô aqui na cozinha procurando algo pra comer. — ele explica logo em seguida.
— Se achar alguma coisa, pode trazer pra mim! — exclamo — Ainda tem aqueles mini-hambúrgueres? — pergunto.
— Vim atrás deles, mas já acabaram… — pausa. — Hm, ainda tem bolo.
— Pode trazer.
— É pra já! — e desliga.
Não demora muito para eu escutar uma batida na porta de vidro, me levanto para ver quem está do outro lado do vidro e vejo Tom, segurando numa mão um prato grande, cheio de bolo, e na outra, uma lata de coca-cola e dois copos descartáveis em cima.
Abro a porta de vidro corrediça para ele passar e fecho logo em seguida.
— Trouxe refrigerante também, mesmo sem perguntar se você queria. — ele avisa, já sentado no sofá. Abre a latinha e divide o conteúdo nos dois copos que trouxe.
— E acertou, porque é só o que tô bebendo hoje. — sento ao seu lado, pego um dos copos e dou um gole. — Só sobrou isso de comida lá dentro?
— Sim… — ele pausa para tomar um gole do refrigerante. — Acho que a ideia do James de que as pessoas iam mais beber do que comer não foi muito certa.
— Ou talvez ele esteja certo, não vi ninguém comentar ainda que a bebida acabou, e olha que horas já são!
— Tá tarde mesmo, já já vou pra casa. — ele diz enquanto come a fatia de bolo.
— Se quiser eu te deixo em casa. — ofereço.
— Você não vai ficar mais tempo? — ele pergunta e aponta para a sala. — Suas amigas não parecem muito afim de ir embora agora.
Garoto, elas vão me entender se eu deixá-las para trás.
— e podem voltar de táxis depois e vai ficar por aqui mesmo. — explico e continuo comendo meu bolo.
— Então vou aceitar sua carona, se não for atrapalhar mesmo.
— Relaxe, sem problemas. — digo. — Sua ideia foi muito boa, ein. Encher a barriga antes de ir embora!
— Admito que eu faço isso em todas as festas. — ele ri e noto uma covinha fofa no seu rosto. — Imagina, chegar em casa e ainda procurar algo pra comer? — ele já acabou com o pedaço dele de bolo e deixa o prato na mesinha que tem na nossa frente.
— Bom ponto! — quando pego o último pedaço que tem no prato, escuto a porta da varanda se abrindo, e com ela também, o barulho da música que está tocando na sala. É a . E a sua long neck de Heinekein.
— ! Estava te procurando por todo canto. — ela parece surpresa ao me ver. Não sei o motivo, porque eu avisei que ficaria aqui na varanda. Claramente ela não está sóbria.
— Eu vim pra cá para fugir um pouco do som alto… — explico. — Eu tô cansada, vocês querem ir embora agora?
— Agora? Mas ainda tá cedo! — certeza que ela não tem noção de que horas são. — Mas pode ir, xuxu, eu vou depois com a de táxi.
— Ah, ótimo! — junto todo o lixo que eu e Tom fizemos na mesa e me levanto. — Então, vamos, Tom?
me olha com uma expressão engraçada, já pensando coisas erradas e logo desvio minha atenção para ele, que também se levanta e me acompanha para dentro da sala barulhenta.
Enquanto procuro e para me despedir, Tom leva tudo que usamos para a cozinha.
Finalmente encontro as duas no canto oposto ao que eu estava antes.
— Meninas, já estou indo!
— Pera lá! Eu vou voltar com você! — exclama e aparece atrás dela, assustando-a. — , a vai nos largar aqui, vê se pode.
dá uma risada e fala:
— E nós vamos ficar largadas aqui mesmo, sem reclamar.
— Como é que é? — ela parece mais confusa ainda.
— A bonita aí — usa sua cerveja para apontar para mim. — vai dar carona para o Tom e nós não vamos atrapalhar!
— Ah! Então a motorista tá liberada, vá embora logo! — ri enquanto me empurra para fora da rodinha delas. — Depois me conte tudo. — ela sussurra no meu ouvido.
Já expressei meu amor pelas minhas amigas hoje?
A casa do Tom não parece tão distante quanto da outra vez que saímos, quando ele estava dirigindo. Claro que a minha percepção pode ter mudado pelas ruas estarem vazias e por isso não peguei nenhum trânsito. Ou pelo fato dele estar bem mais conversador do que no outro dia.
O CD Dookie do Green Day está tocando no som desde o momento em que liguei o carro. Ele já está há um tempo aqui, porque eu sempre esqueço de colocar outro. Faz tanto tempo que só escuto ele que agora já sei que está tocando a faixa de número 5, Welcome to paradise.
Entro na sua rua, depois dele passar as instruções durante todo o caminho.
— É naquela casa ali que tem um carro preto na porta. — ele diz.
Estaciono atrás do carro indicado. A rua está deserta e a casa dele está como eu já imaginava, toda apagada, pela hora.
Admito que passei boa parte do caminho até aqui pensando nesse momento de agora, o que aconteceria quando chegasse aqui na casa dele. Porque da última vez que isso aconteceu — com a diferença que era ele me deixando em casa — eu fiquei um pouco frustrada e até me questionando se, talvez, eu esteja confundindo as coisas entre nós. Então, cá estou eu nesse dilema desde o momento que nos despedimos de todos e saímos da festa. Devo tentar alguma coisa? Se eu tentar e não for isso que ele quer, será que as coisas vão ficar estranhas? Não acho que somos super-amigos ou num nível amizade de infância para ficar algo estranho. E se eu não tentar agora, não vai faltar oportunidade para tentar novamente.
Sim, estou presumindo tudo de acordo com uma possível atitude minha.
Vai que ele vem me beijar na bochecha de novo.
Se eu estivesse num desenho animado, tenho certeza que estaria saindo fumaça pelas minhas orelhas de tanto que estou pensando e formulando teorias. Que tanta burocracia para um beijo, . Você já foi melhor!
— Eu achava que você não ia hoje. — ele fala, assim que desafivela o cinto de segurança e se vira para mim.
— Por que não? — indago. — Nós até confirmamos com o James com uma certa antecedência.
— James só comentou que a ia. — minha cara de surpresa-dúvida-incrédula o deixa curioso. — O que foi?
— Que mentira dele, nós confirmamos juntas que íamos. — conto e agora é ele que está confuso. — Estranho, porque eu sabia que você ia. Perguntei pra .
Na hora, noto suas sobrancelhas levantando e um sorrisinho no canto dos lábios.
Ah não, minha própria boca me entregou.
— Se bem que eu poderia ter perguntado isso logo pra você, né. — ele diz e ri um pouquinho. — Não é como se eu não tivesse seu número.
— Verdade! — sorrio sem graça. — Eu também não precisaria perguntar a sobre isso.
— Vou chamar os dois agora de pombo-correio, e o James é horrível nisso, como podemos ver!
— Melhor não recorrer mais a ele. — brinco.
— Sim! Parece até paquerinha da época de escola. — ele fala e assim que se cala, percebo logo na cara dele a expressão: “Merda, falei demais.”
Certo, isso é um sinal? Que ele não só quer amizade?
Pelo visto, ele pensa mais rápido do que eu e quebra o silêncio:
— Er… Então, eu já vou indo. — sorri sem mostrar os dentes — Valeu pela carona! — e se inclina para o meu lado, e me abraça do jeito que dá, porque eu ainda estou usando o cinto de segurança. Droga, deveria ter desafivelado isso antes.
— Que isso, foi nada. — digo, ainda no abraço.
Nossa, o cheiro dele continua firme e forte. Igual ao que senti quando encontrei com ele na festa. Espero que eu ainda esteja decente nesse aspecto também.
Quando ele se afasta um pouco, apoio as minhas mãos nos ombros dele por alguns segundos e isso faz com que ele não se afaste mais do que isso e, muito menos, não saia do carro.
Garota, não pense muito!
Paro de encarar um pouco os seus olhos e só foco mais na sua boca, mas não sei se ele percebe qual é o meu foco, porque aqui dentro do carro não está tão iluminado, só um pouco por causa do poste de luz amarela na nossa frente.
Como estamos bem próximos um do outro, não preciso me inclinar tanto para chegar perto dele e beijá-lo. Não sei se tudo isso que fiz agora foi rápido demais, mas não consigo não reparar que ele demora um instante para corresponder ao beijo, mas vou pensar que ele foi pego de surpresa para não abalar meu ego nesta noite. Ele aprofunda o beijo, mas não demora muito — pelo menos é o que parece para mim — e ele se afasta, parando tudo que está acontecendo entre nós. Porém, mesmo um pouco atordoada, escuto bem claro o que ele fala, antes de abrir a porta do carro e sair:
— Preciso ir, boa noite.
Vejo o nascer do sol pela janela da sala de estar, enquanto tento prestar atenção em qualquer baboseira que passa na televisão, mas sem sucesso. Ainda estou vestida com a roupa da festa e sentada no sofá desde a hora que cheguei em casa naquela madrugada.
Que cara sai assim depois de beijar alguém?
— ? Ainda acordada ou dormiu aqui na sala mesmo? — aparece na sala de repente e não consigo evitar um grito.
— Meu Deus, ! — exclamo. — Não ouvi vocês entrando. — vejo passando direto para a cozinha. — E aí, como foi o final da festa?
se senta do meu lado e apoia os pés, já descalços, na mesinha de centro.
— Ah, ficou um pouco fraca, não foi todo mundo que aguentou ficar até agora. — ela diz. — Mas o que interessa é como foi o seu final de festa… — ela me lança um sorrisinho. — me contou porque você nos largou lá, espero que tenha valido a pena.
— , não sei nem como começar a contar isso, mas…
me interrompe assim que entra na sala:
— Beijou o Tom? — como sempre, muito direta. Ela se acomoda no outro sofá da sala, com um sanduíche na mão.
— Sim, mas… — respondo.
— Ih… Mas o quê? — indaga. — Ele fugiu do carro, por acaso?
— Mais ou menos isso.
— COMO É QUE É? — as duas gritam ao mesmo tempo e até rio um pouco com essa cena. O famoso “rir para não chorar”.
— Conta tudo o que aconteceu. — pede.
Depois de contar todos os detalhes, até porque não posso resumir nada para essas duas, digo:
— Essa foi a minha humilhação da noite. — suspiro.
— Tô muito confusa. — diz e pausa por um instante. — Porque pelo que vocês conversaram antes, eu também entenderia que ele está afim de você, como você também entendeu na hora.
— Meninas, a gente tá fazendo uma coisa errada. — afirma e se levanta do sofá.
— O quê? — pergunto.
— Estamos pensando como mulheres, que é isso que somos. — explica. — Primeiro, a gente precisa tentar pensar como homem.
— Ih, não consigo fazer essa proeza, já evolui muito pra isso. — fala e arranca risadas minhas e da . — O que você acha que foi? — se vira para .
— Eu não sei no momento, até porque posso estar um pouco bêbada ainda, então prefiro deixar esse problema para depois do meu cochilo. — ela sai da sala, mas logo retorna. — E você trate de dormir também, quem já se viu perder uma noite de sono por causa de macho!
Isso não tem mais jeito, já fiquei a noite em claro.
— Ô amiga, fique assim não… — tenta me consolar com um abraço apertado. — Você não fez nada de errado, vamos esperar pra ver no que isso vai dar.
— É, , vamos dormir que já está tarde. — completa. — Ou cedo.
Já elogiei minhas amigas o suficiente?
Continua...
Nota da autora: Oi, gente! Quanto tempo, né?
Vi minha nota na última atualização e eu foi antes da turnê deles de 2022, e cá estou atualizando depois da turnê de 2024.
Demorou, mas muita coisa boa aconteceu nesses últimos anos e que me inspiraram a voltar com essa fic, que tem muita coisa para acontecer ainda (ainda estamos em 2001!).
Ano passado tive a sorte de ganhar um intercâmbio, consegui ir para a Inglaterra durante a turnê deles de novembro e realizei meu sonho de conversar e tirar foto com minha banda favorita. Todos os quatro foram muito simpáticos e muito queridos! <3
Depois disso tudo, nada mais inspirador para continuar essa história.
Espero que essa atualização seja um bom jeito de voltar!
Até a próxima! <3
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Vi minha nota na última atualização e eu foi antes da turnê deles de 2022, e cá estou atualizando depois da turnê de 2024.
Demorou, mas muita coisa boa aconteceu nesses últimos anos e que me inspiraram a voltar com essa fic, que tem muita coisa para acontecer ainda (ainda estamos em 2001!).
Ano passado tive a sorte de ganhar um intercâmbio, consegui ir para a Inglaterra durante a turnê deles de novembro e realizei meu sonho de conversar e tirar foto com minha banda favorita. Todos os quatro foram muito simpáticos e muito queridos! <3
Depois disso tudo, nada mais inspirador para continuar essa história.
Espero que essa atualização seja um bom jeito de voltar!
Até a próxima! <3