Finalizada em: 24/06/2018

Capítulo Único

Você pensa que as únicas
pessoas que são pessoas
São aquelas que se parecem
e pensam como você
Mas se você seguir as
pegadas de um estranho
Você aprenderá coisas que
você nunca soube, que nunca
soube.

– Eu estou farta , FARTA. – Soletrei.
– Do que está falando?
– Você só pode estar de brincadeira! – Ironizei, enquanto tentava descer as escadas com aquelas malas a tira colo. – Sua família tem o prazer de me iluminar a cada minuto que passa.
– A sua postura é totalmente ao inverso de todos da minha família, eles só querem te moldar para a nossa sociedade.
– Moldar? você ainda vai defendê-los? – Perguntei tentando me agarrar em um fio de esperança.
, só te peço um pouco de paciência. – Suspirou.
– Não me peça isso, por favor. – Mordi o lábio. – Eu tentei, tentei não dar ouvidos a ela e sua trupe, mas não importa em como posso reagir, ela sempre terá uma maneira de provocar. – Puxei as malas pelos degraus. – Você deveria ter se casado com sua prima.
– Não, claro que não. – Respondeu estupefato.
– Eu não vou mais ser tratada como marionete. – Afirmei.
... – O interrompi.
– Todos os dias eu me faço a mesma pergunta por todo esse tempo. – O encarei. – Será que em algum momento você me amou? – Perguntei. Ficamos ali e silêncio, aquela pergunta parecia ter o pego de surpresa e o pior que ele não estava sem resposta pelo acontecido.
– Eu tenho um compromisso e não posso me atrasar. – Deixou um beijo em minha testa.
– Volte para o quarto e desfaça essas malas, quando eu voltar conversamos. – Eu sabia que não haveria conversa, ele chegaria e eu já estaria adormecida.

15 de janeiro de 2009

meu filho, pode vir aqui um minutinho? – Perguntou sua mãe em um tom autoritário.
– Claro. – Enquanto eu fiquei ali parada no meio daquele cômodo, dava para escutar toda aquela conversa entre os dois, não que quisesse, mas a mãe de não fazia questão alguma de evitar que todos a escutassem, nem de que eu a ouvisse.
Ser chamada de caipira, brega e que não fazia o estilo daquela família, que não me enquadrava naquela sociedade. E o que mais me machucava era o fato dele não der me defendido, não ter dito uma sequer palavra que amenizasse toda aquela situação. Não fiquei ali por muito tempo para engolir tudo aquilo, pedi que um amigo dele repassasse o motivo de minha ausência.


Mas tarde naquele mesmo dia ele me convenceu a esquecer todo aquele episódio, que nada que falassem iam nos colocar um contra o outro. Quem eu queria enganar tentando tampar o sol com uma peneira furada, eu nunca seria aceita por ninguém dessa família. Eu não poderia subir para o quarto e guardar minhas roupas como se eu nunca fosse humilhada.
Todas aquelas fotografias na sala não passavam de momentos fingidos, toda mulher que um dia queira se casar, sonha em escolher o seu vestido, que ele seja parte de um sonho, e nem deste dia tão especial eu pude ter paz.

A tempestade e o rio são
meus irmãos
A garça e a lontra são
minhas amigas
E todos nós estamos
conectados a cada um de nós
Em um círculo, em uma roda
que nunca acaba.


19 de março de 2010.

– O que acha desse vestido? – Perguntei para vendedora que estava me atendendo.
– Acho bonito, simples e espontâneo. ­– Lançou um sorriso generoso.
– Vou ficar com ele.
– Querida. – Fui interrompida por aquela voz. – O que você está fazendo nessa loja chinfrim? – Minha sogra me perguntou.
– Escolhendo meu vestido.
– A futura esposa de um grande nome das indústrias britânica não pode simplesmente alugar um vestido para seu casamento. – E como sempre tinha em sua companhia a tia e prima de , prima aquela que nutria um forte sentimento por ele, que não fazia questão nenhuma de esconder. – Quer nos envergonhar menina? – Ralou.
– Gente como ela está acostumada a vestir trapos minha tia. – Sua voz era nasalada. – Nem deve saber o que é um estilista. – Zombou. Enquanto eu era puxada para fora daquela loja, pude notar um olhar de pena vindo da vendedora.
– O que seria desse casamento sem minha Zelda. – Conversava com sua irmã.
– Seria estilo aquelas festas juninas pavorosas. – Respondeu.
Você pensa que eu sou uma selvagem ignorante, por morar em uma cidade pequena. – Virei a sua frente. – Ou por não viver de aparência em festas.
–Escuta aqui garota. – Ameaçou.
– Quem vai me escutar é a senhora. – A segurei. – Não importa como se vista, a quantos lugares você já foi ou irá, porque agindo assim não da para saber quem de nós duas é a selvagem.
saberá de tudo isso. – Respondeu se fazendo de ofendida.
– Que saiba. – A deixei para trás, naquele ninho de cobras.


E você já esteve em
vários lugares
Eu acho que é isso
mesmo
Mas ainda não
consigo ver
Se a selvagem sou eu

As lembranças eram todas péssimas, como se não bastasse toda aquela vergonha, tive que aguentar Ana provando todos aqueles modelos de medidas de corpo em meu lugar, de ouvir com todas as letras que ela era a candidata ideal para aquele posto. E de onde foi que ele me achou.
Como não se deram por satisfeitos nenhum familiar meu foi colocado na lista de convidados, não queriam ser envergonhados por terem como convidados e pseud. membros da família, alguém que não soubesse utilizar todos aqueles talheres.

15 de dezembro de 2008.

eu estou cansada de andar para todos os lados, carregar coisas, livros sobre a cabeça...
– Minha mãe está se esforçando.
– Se esforçando? – Questionei. – Ela está presa no século passado.
– Amor você precisa manter a calma. – Pediu.
– Eu estou cansada de ser humilhada perto de todos, ela nem ao menos disfarça.
– Ela acostumou a mandar sempre em todos nós.
– Pare de a defender. – Vociferei. – Por que você não me defende pelo menos uma vez em sua vida?
– Estou tentando amenizar a situação.
– Você está compactuando com tudo isso, mesmo sem querer ou perceber.
– Você é boa para mim e isso basta. – Se aproximou.
– Eu não vou suportar por mais tempo.
– Podemos conversar sobre isso assim que eu sair da reunião de hoje a tarde. – Desviou.


Todas aquelas aulas infernais de etiquetas dias após dias para que eu pudesse estar preparada para ir em algum evento com eles, o qual nunca participei. Eu pensava em desistir, porem cada fim de tarde me encorajava, falava que eu poderia simplesmente ignorá-la e como sempre não pedia ela para parar.
Meu único pensamento era que ele poderia estar buscando uma forma de se livrar de mim, talvez tentando reparar um erro, era notório eu que era de todas as maneiras diferentes, não tinha a mesma condição financeira. Não morava em uma grande metrópole. Parecíamos aquele típico amor impossível de o filho do patrão com a empregada. E então pensar em bons momentos vividos longe dali poderia de certo modo amenizar minha sensação de não ser boa o bastante.

20 de setembro de 2008.

Ei moço da cidade. – Gritei ao ver aquele rosto conhecido na noite passada.
– Se não é a moça da noite passada. – Disse vindo ao meu encontro. – Então o que vocês fazem para passar o tempo por aqui?
– Nada demais. – Comecei. – Apenas trabalhamos, as vezes tem festas divertidas por aqui e temos aquela sorveteria com ótimos sorvetes. – Apontei. – Quer experimentar?
– Tenho uma reunião importante agora com os antigos donos da fazenda Werner.
– Eles venderam a fazenda? – Perguntei confusa.
– Mais tarde conversamos. – Deu meia volta. – No lugar que você me ajudou? – Perguntou.
– Claro. E então eu esperei, esperei que ele aparecesse.


nunca foi muito pontual com os compromissos, único defeito que ele tinha ligado ao seu trabalho. Por todo aquele pouco tempo que esteve lá comigo, ele se mostrou bem diferente, passamos bastante tempo juntos, sorveteria, o pequeno restaurante, deitados na montanha analisando as estrelas ou quando ele cismou que me ajudaria a tirar leite. Como esquecer daquela cena.

O quão alto esse sicômoro
cresce?
Se você o cortar, então
nunca saberá
Você nunca ouviu o lobo
uivando para a lua azul?


Orrara, 2008.

– Tem certeza que quer mesmo fazer isso? – Perguntei pela decima vez.
– Claro que tenho. – Sorriu. – Eu só não tenho noção do que fazer.
– Você tem que ter equilíbrio nesse banco, é a parte mais difícil. – Assegurei.
– Acho que consigo ficar por um tempo aqui imóvel. – Fez força sobre as pernas.
– Certo, agora coloque esse balde aí. – Entreguei. – E tente fazer assim, para o leite sair.
– Vamos lá. – E então leite começou a jorrar em todas as direções menos dentro daquele balde.
, pare com isso. – O som de gargalhadas ecoara ali.
– Eu definitivamente não consigo fazer isso. – O som seguinte foi de um estalo, e um rapaz caído no chão em cima, digamos, um monte de obra prima de vaca. – E agora sem chances de ir embora desse jeito.
– Não vai ser uma surpresa por aqui. – Zombei.
– Uma moça bonita como você, eles não teriam olhos para o seu figurino. – Desviou o olhar.
– Muito obrigada pelo elogio. – Corei.
– O que vai fazer aqui amanhã? – Perguntou. – Digo, só por curiosidade.
– Bom, amanhã irei ajudar a senhora Miller a fazer tortas para o aniversário de suas netas.
– Ah sim!
– Mas posso conseguir um jeito de sair mais tarde. – Me xinguei mentalmente por isso.
– Combinado.


O tempo passou rapidamente e ele veio embora para cá, sempre manteve contato comigo, mandava mensagens, até que fui convidada a vir para cá. Onde nos aproximamos cada vez mais, o primeiro beijo, a primeira noite juntos, o pedido de casamento, até chegar a esse ponto.
Tirei minha aliança e deixei ali naquele criado mudo, peguei minhas malas e sai arrastando em direção a porta, tentando apagar todas aquelas lembranças vividas.

Você pode possuir a
terra e ainda assim
Tudo o que você obtém é
apenas terra
Você pode pintar com todas
as cores do vento...




Fim.



Nota da autora: Continua em Know Who You Are.


Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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