Finalizada em: 30/04/2019
Music Video: Airplane pt.2 -Japanese ver.

História

AS pessoas costumam dizer que mudanças são uma parte essencial da vida, que conhecer coisas novas nos ajuda a ser pessoas melhores, mais maduras. No entanto, todos sabem que essa é apenas uma desculpa que costumam usar para justificar situações que estão fora de controle, afinal de contas, ninguém gosta de não saber o que será de sua vida daqui a cinco minutos.
Bem, quase todos. Eu não costumava me importar com essas coisas. Para mim, mudanças não eram bem-vindas e ter a mesma rotina não me incomodava nem um pouco. Pelo contrário, dessa forma me sentia segura, pois não seria preciso enfrentar nenhum imprevisto. Eu era alguém que apenas vivia. Uma pessoa que recebia o destino de braços abertos, sem resmungar. Se o universo tivesse algo reservado para mim, de um jeito ou outro eu saberia.
Mas, depois de tantos anos, eu nunca soube.
Bem, até aquele momento.


Capítulo 1

O dia havia sido cheio. Não tanto quanto os outros, quando pessoas de praticamente todas as partes da cidade vinham até o estabelecimento encher a cara para afogar suas mágoas e arrumar algum tipo de confusão ou apenas para beber com os amigos. O local não era tão grande e o movimento nos dias de semana era menos intenso, ainda assim, eu podia sentir o formigamento nas pernas por passar toda a noite, e boa parte da madrugada, preparando drinks e atendendo clientes que faziam questão de abrir a boa para soltar comentários inoportunos.
Se pudesse, os socaria infinitamente, porém, esse não era o caso. Não quando aquele era o único emprego que havia conseguido após meses de procura. Eu buscava algo melhor, é claro, mas enquanto esse dia não chegava, precisava pagar minhas contas. Por isso apenas os ignorava e tentava ser o mais simpática possível. O que não chegava nem perto de ser fácil.
Após secar uma poça de bebida no balcão, suspirei cansada e limpei o suor que escorreu pela testa. Parando por um instante, apoiei os braços na madeira escura, fitando a porta que ficava do outro lado do estabelecimento. Mesmo estando fechada, podia ver a luz do início do dia penetrar timidamente pelos detalhes vermelhos, amarelos e brancos quase transparentes. Suspirei mais uma vez e continuei o que fazia, aproveitando para limpar toda a extensão do balcão.
Passando a flanela em sentindo circular sem prestar muita atenção, não percebi o momento que minha mão trombou com o braço do rapaz ali. Ele permanecia meio desfalecido, com a cabeça deitada próxima a uma poça de saliva que havia sido produzida há várias horas atrás e um copo de bebida pela metade o acompanhava. Revirei os olhos ao ouvi-lo gemer por conta do contato e apenas pulei aquela parte, limpando o restante do balcão.
- Cuidado, ou vai se afogar na própria saliva – falei como quem não quer nada e o que recebi em resposta foi um grunhido contrariado, o que me fez tentar novamente. – É sério, Jungkook, logo os clientes vão começar a aparecer e não vai ser muito legal encontrarem um bêbado logo cedo.
- Como se eles não tivessem passado a noite enchendo a cara – o homem disse com a voz arrastada, se ajeitando e mantendo um dos cotovelos apoiados na bancada.
- A diferença é que eles pagam o que consomem – um sorriso sarcástico surgiu em meus lábios.
- Sabe, essa sua delicadeza me toca bem fundo – ele imediatamente imitou minha expressão.
- É bom saber que ainda tem um coração – rebati.
- Mas eu não tenho – ele disse e piscou. – O que nos leva a crer que não é dele que estou falando.
- Agora é sério, você precisa vazar – respondi, finalmente terminando a limpeza.
- Então antes não era? – o rapaz inclinou a cabeça para o lado, soltando um riso abafado assim que lhe lancei um olhar mortal. - Qual é, , onde está seu senso de humor?
- Está junto com a minha paciência, num limbo muito profundo da minha mente – lhe dei as costas, saindo de trás do balcão e caminhando até as mesas, as limpando com cuidado e aproveitando para reposicionar as cadeiras.
Jungkook não me respondeu, apenas riu mais uma vez e a partir daquele instante resolvi deixá-lo pra lá. Quando terminasse meu expediente, o arrastaria para longe do lugar por bem ou por mal. Apressada, caminhei até as quatro grandes janelas que haviam no estabelecimento e as abri uma por uma, permitindo que a luz solar penetrasse o bar que antes permanecia nas trevas, ocultando suas paredes esverdeadas. O local era acolhedor, de certa forma. Talvez esse fosse o motivo de tantas pessoas o procurarem.
Pensando em quantos dias ainda teria que voltar ali, levei um leve susto ao ouvir batidas na porta de entrada. Fui até lá, tirando as chaves do bolso da calça cor mostarda e a abri sem muita pressa, pois sabia quem estaria do outro lado. Assim que o encararei, dei apenas um aceno de cabeça e o rapaz loiro me imitou, passando por mim, seguindo para o fundo do salão, próximo ao balcão.
Ele sentou-se em frente ao piano que ficava ali e seus dedos percorreram as teclas, como se as analisasse. Em seguida fitou as próprias mãos, franzindo o cenho em descontentamento.
- As teclas estão sujas! – se virou para mim, que ainda permanecia parada perto da porta. – Onde esteve a noite toda?
- Estava fazendo o meu trabalho – respondi e ao perceber que ele ameaçaria dizer algo, retomei a fala. – O que com toda certeza não inclui a limpeza do piano, afinal, você é o responsável por ele.
- Você sabe ser irritante quando quer – estalou a língua e se levantou, indo para trás do balcão.
- E você é bastante insuportável mesmo sem tentar, Park Jimin – o segui, parando ao lado do Jungkook. – Só queria saber o que faz aqui tão cedo.
- Cedo? – o rapaz parou e me encarou, franzido a testa outra vez. – Você por acaso sabe que horas são?
- Claro que sei! – falei com convicção, virando-me para olhar o relógio de ponteiros preso logo ao lado da prateleira de bebidas. – São... Sete e quinze?
Como assim, sete e quinze da manhã? Isso significava que meu expediente havia terminado fazia mais de quarenta minutos e que a outra garota deveria estar ali para atender os clientes pelo período da manhã a partir das oito horas. Lentamente minha expressão se tornou parecida com a de Jimin, pois não consegui entender como havia perdido tanto a noção do tempo.
- Eu vou matar a – sibilei, suspirando pela milésima vez.
- Vai matar a só porque não sabe olhar as horas? – Jimin me provocou.
- Isso não importa agora – o ignorei e passei para trás do balcão, pegando minha mochila encostada num canto da parede. – Eu vou pra casa. Já deixei tudo arrumado pra quando ela chegar, depois conversamos sobre isso.
- Como quiser – o loiro deu de ombros.
Fui até Jungkook, que parecia ter desfalecido mais uma vez. O cutuquei várias vezes seguidas e só após alguns minutos é que ele reagiu, erguendo a cabeça.
- O quê? – murmurou sonolento.
- Hora de ir pra casa – disse apenas.
O rapaz resmungou algo incompreensível enquanto passava as mãos nos cabelos que pareciam ser tingidos de vermelho ou talvez algum tom de rosa. Eu não saberia dizer agora, pois os fios estavam muito desbotados. Apenas aguardei com toda a paciência que não possuía, mas antes que ele se levantasse, ouvimos a porta do estabelecimento ser aberta.
Jimin já havia voltado para seu piano, porém, nós três olhamos para lá no exato instante que o garoto alto e de óculos redondos adentrava o local. Imediatamente o reconheci, apenas me perguntando o motivo de ele usar um sobretudo branco de tecido num calor como aquele que fazia. Logo os dois garotos o ignoraram, assim fui obrigada a ser gentil e o encarei sorrindo, recebendo o gesto de volta.
- Bom dia, Taehyung! – desejei e pude ouvir o riso debochado do suposto ruivo ao lado.
- Olá, ! – o rapaz respondeu, sentando-se numa das cadeiras do balcão, ao lado de Jungkook.
- O que faz aqui tão cedo? – fiz a mesma pergunta que dirigi a Jimin, todavia o tom havia sido completamente diferente, o que fez com que o loiro me encarasse com as sobrancelhas erguidas.
- Nada demais – balançou os ombros. – Só vim buscar esse babaca antes que ele cause mais prejuízos.
Ao dizê-lo, cutucou o mais novo no ombro, que sequer reagiu, continuando a mirar seu copo de bebida.
- Eu já o estava levando – ressaltei.
- Já está indo pra casa? – Tae franziu o cenho.
- Sim – estranhei sua expressão. – Na verdade, eu já deveria estar em casa, mas perdi a noção do tempo. Sem contar que a outra garota ainda não chegou.
- Entendo – balançou a cabeça uma vez.
Taehyung pensou em dizer mais alguma coisa, porém, desistiu e continuou apenas a me encarar com os lábios entreabertos. Entretanto, notei o exato momento que seus olhos correram até Jimim, que agora arriscava tocar alguma melodia que não reconheci. O belo som logo cessou e então o garoto levantou-se de uma só vez, arrastando o banco onde estava sentado contra o piso claro, o que me fez me virar automaticamente em sua direção.
- Cuidado com o piso, seu tapado! – ralhei, apoiando as mãos no quadril.
Jimin fingiu não me ouvir e veio em minha direção, me puxando pelo pulso. Fiz cara feia por conta de sua atitude, mas antes que pudesse xingá-lo, ele me levou até a porta que havia ao lado do balcão, que daria na despensa.
- O que você está fazendo? – questionei assim que ele me puxou para dentro do lugar e fechou a porta.
- Nada – ele respondeu sem muito interesse. – Apenas quero que me ajude a encontrar aquelas minhas pastas de arquivos mais antigas antes que vá para casa.
- Sério mesmo? – cruzei os braços, incrédula.
- Sim – o garoto parou o que fazia e me encarou por longos segundos. – Só preciso disso, depois, pode ir.
Pensei em provocá-lo um pouco e dizer que não iria fazer nada, afinal, ver as bochechas de Park Jimim coradas de raiva era algo que me contentava. Porém, eu não era esse tipo de pessoa. Bem, pelo menos não o tempo todo. Assim, sem dizer nada, me virei na direção de um grande armário e o abri, tirando algumas caixas de uma das prateleiras. Ao fundo, vi as pastas que ele procurava e as peguei, então as apontei em sua direção.
- Aqui está – permaneci com os objetos erguidos.
- Ah... – ele pareceu surpreso com a minha rapidez. – Tem certeza que são essas?
- Fui eu quem guardou essas tralhas, então sim, tenho – suspirei cansada.
Meio hesitante, o garoto pegou seus pertences de minhas mãos e os abriu um por um, como se os estivesse analisando. Em seguida, balançou a cabeça em confirmação.
- É, são eles sim – disse, me encarando.
- Legal... – dei um meio sorriso. – Agora vou pra casa.
- Não! – Jimin exclamou, me fazendo parar com a mão a centímetros da maçaneta.
- O que foi agora? – me virei visivelmente irritada. – Se não percebeu, eu deveria estar longe daqui a mais de uma hora.
- E sei, é só que... - pigarreou, como se não soubesse mais o que dizer.
- Só quê... – ergui as sobrancelhas.
- Acho que... – coçou a nuca com a mão livre. – Você não deveria ir agora, sabe?
Ao ouvir aquela sentença, minha expressão de descrença atingiu proporções que não imaginei ser capaz, a ponto de quase não enxergar com meus olhos semi abertos.
- E por que não? – dei um passo em sua direção. – Por acaso você bebeu?
- Que droga, ! – o rapaz jogou as pastas sobre as caixas que eu havia colocado no chão. – Por que sempre torna tudo mais difícil?
- Tá legal, você bebeu muito – fitei o teto cheio de teias de aranha.
- ... – Jimim passou a língua entre os lábios. – Apenas fica aqui, ok?
- E por que eu ficaria? – questionei.
Porém, antes que pudesse receber uma resposta, ouvimos um estrondo que nos fez abaixar instintivamente. Era como o som de vidro sendo quebrado, o que me deixou confusa. Em seguida, o som de cadeiras sendo jogadas para todos os lados veio e isso não me deixou nada contente.
- Mas que... – me levantei, indo até a porta.
- , não! – Jimin tentou me impedir, mas fui mais rápida.
Assim que saí, dei de cara com uma cena nada convencional. Vários homens vestidos de preto estavam espalhados pelo bar, que naquele momento se encontrava um caos. As janelas estavam quebradas, garrafas jaziam em pedaços por todos os cantos, mesas e cadeiras estavam viradas. Pensei em perguntar que porcaria estava acontecendo, mas não conseguia encontrar palavras, então apenas observei tudo, abismada.
Entre todos aqueles homens estranhos, consegui vê-los. Taehyung e Jungkook agiam como pessoas totalmente diferentes. Jungkook segurou a nuca de um homem vestido de preto e, sem cerimônias, bateu sua cabeça contra o copo de vidro que havia no balcão, o fazendo em pedaços. Assustada, levei as mãos aos lábios e acompanhei sem desviar os olhos o momento em que o soltou e o corpo foi ao chão, desfalecido.
Um segundo depois ele me viu e em seu olhar havia certa descrença, como se eu estivesse onde não deveria estar. Entretanto, isso não durou muito, pois o som de um disparo encheu o ambiente. Abafei o grito com força ao ver Jungkook ser atingido no ombro, tombando de uma só vez. Ao ver o sangue sujar sua camisa listrada, fiz menção de ir até ele, porém, senti alguém me segurar pelo pulso.
- Jimin! – ouvimos uma voz por cima do som da luta e nos viramos até ela, encontrando Taehyung quebrando uma das cadeiras num dos homens com uma força descomunal. – Tira ela daqui!
Olhei para Jimin com os olhos marejados e pensei em insistir, pois Jungkook era um amigo. Não que eu o conhecesse tão bem. Mesmo assim, ele era uma das poucas pessoas com quem eu me importava na vida. Forcei meu braço, mas ele não o largou. Pelo contrário, o loiro me puxou para longe dele.
- Vamos – ele me arrastou para a porta dos fundos. – Precisamos sair daqui!
- Não... – murmurei, quase sem forças.
- , por favor... – pela primeira vez ele se dirigiu a mim sem nenhum tipo de ironia ou sarcasmos.
Aquele tom diferente de sua parte me fez pensar em seguir suas instruções. Infelizmente, não havia tempo para pensar e só percebi isso quando um dos caras virou em nossa direção, sacando uma pistola prateada. Jimim também notou a retaliação, parando abruptamente e me segurando pelos ombros.
Não entendi o que ele pretendia fazer, mas não houve oportunidade, pois o primeiro tiro o acertou em cheio, fazendo-o grunhir e fincar as unhas em minha pele. Pensei em gritar seu nome quando seu corpo caiu a meus pés, todavia, o som que escapou de minha garganta não teve a ver com o desespero de presenciar mais uma morte e sim por sentir meu peito ser perfurado numa velocidade absurda. A dor foi a última coisa que experimentei, então não houve mais nada.


Capítulo 2

Suspirei pela terceira vez seguida, ajeitando a gola de minha camiseta. Limpei a testa que provavelmente brilhava pelo suor e me perguntei o motivo de ter escolhido utilizar aquele tipo de vestimenta numa região onde fazia tanto calor.
Olhando para o relógio de parede mais uma vez, praguejei ao constatar que a outra garota que trabalhava pelo turno da manhã estava atrasada há mais de uma hora. Jimin já havia chegado e, após reclamar do motivo de seu precioso piano estar sujo de poeira, o tocava com maestria. Apesar de ser uma pessoa insuportável na maioria das vezes, seu talento era indiscutível.
Cansada de esperar, caminhei atrás do balcão até o pano que usava para limpar as mesas, o pegando sem muito interesse. Enquanto o dobrava, pensando no que poderia fazer para o almoço, observei os poucos clientes que haviam no estabelecimento. Como sempre, em uma das mesas, Taehyung tentava convencer Jungkook a voltar para casa e o mais novo apenas o ignorava, virando mais uma dose de bebida de uma só vez.
Do outro lado do salão, um rapaz de cabelos pretos que usava uma camisa com uma estampa que eu com certeza confundiria com um tapete bordado, conversava tranquilamente com um garoto que parecia ter a minha altura. Os observei por breves segundos, mas logo a melodia cessou, o que me fez olhar para Jimin levemente confusa.
O loiro também me encarou e pensei em ir até ele para perguntar o motivo daquela pausa tão repentina, todavia, o movimento ao meu lado me fez despertar. Olhando para lá, encontrei um jovem sentado em um dos bancos em frente ao balcão. Abrindo um sorriso gentil, me aproximei.
- Bom dia, senhor! – falei da forma mais animada possível, ainda que estivesse exausta. – Gostaria de pedir algo?
- Ah, bom dia! – ele finalmente me encarou e pude notar seus pequenos olhos escuros. – Não sei bem...
Pensativo, ele olhou por cima dos ombros para a mesa atrás. Acompanhei seus olhos e sorri ao perceber que analisava Tae e Jungkook, que ainda não havia cansado do seu copo.
- Talvez o que aquele rapaz está bebendo – o homem à minha frente sugeriu.
- Tudo bem então – balancei a cabeça positivamente, recebendo um sorriso em resposta.
Naquele instante, notei as covinhas que apareceram em sua bochecha, deixando-o com um aspecto extremamente fofo. Pisquei algumas vezes, mas logo pigarrei, voltando ao meu trabalho sem entender o motivo de ter me distraído tão facilmente com um estranho.
Fui até a prateleira atrás de mim, tirando de lá uma das garrafas. Após alcançar um copo de vidro, preenchi um terço dele com o líquido amarelado, levando-o até o cliente.
- Aqui está, senhor – o coloquei em sua frente. – Espero que goste.
- Ah, obrigado... – mais um sorriso surgiu em seu rosto. – Mas não precisa me chamar de senhor.
- E como deveria chamá-lo? – balancei os ombros.
- Meu nome é Namjoon... – ele me estendeu a mão. – Prazer!
Hesitei por breves instantes, mas aquele garoto parecia ser simpático e conhecer pessoas novas não era nada tão extraordinário.
- ... - apertei sua mão. – E o prazer é meu!
Namjoon sorriu novamente, acentuando a covinha direita, o que prendeu minha atenção por um tempo incalculável. Eu estava tão hipnotizada que levei um susto quando um dos rapazes da mesa ao fundo veio até o balcão, para finalmente pedir algo.
- Bom dia, moça! – ele tinha largo sorriso que parecia iluminar todo o ambiente.
- Ah... bom dia! – me desvencilhei de Namjoon um pouco sem jeito. – Como posso ajudar?
- Duas doses de uísque, por favor. – e sua felicidade continuava.
- Claro! – ri abafado, levemente contagiada.
Enquanto enchia os copos, os dois homens escorados no balcão iniciaram uma conversa descontraída e a música de Jimin voltou a soar. Tudo ia muito bem, até que a porta do bar foi aberta e mais alguém adentrou o lugar. Fitei a entrada, pronta para desejar boas-vindas ao novo visitante, porém, parei assim que o observei. Meus lábios simplesmente travaram quando o garoto loiro que vestia um casaco cor de vinho caminhou em minha direção.
Por um segundo nossos olhares se cruzaram e foi possível observar sua beleza. E, pelo que parecia, não era apenas de minha parte que ele havia atraído olhares. Todos os presentes o observavam com certa atenção, incluindo os garotos no balcão. Não entendi o motivo e também não perguntaria. Apenas o apreciei por mais alguns instantes enquanto encarava com atenção cada canto do local. Foi então que desistiu de vir até onde eu estava e seguiu para a mesa onde Taehyung e Jungkook se encontravam. Pela forma de cumprimento, eles deveriam se conhecer fazia um bom tempo.
Tentando não parecer muito indiscreta, desviei os olhos e levei as bebidas ao outro rapaz que me aguardava pacientemente.
- Aqui está – mordi os lábios. – E desculpe pela demora.
- Sem problemas. – ele deu de ombros.
Em seguida, voltou à sua mesa com as doses, oferecendo uma ao seu companheiro que a pegou sem muito entusiasmo. Voltando ao trabalho, guardei as garrafas que havia utilizado em seus devidos lugares, seguindo para a despensa. Ajeitei rapidamente algumas caixas que Park Jimin havia deixado fora do lugar e então voltei ao bar, pois não podia deixar os clientes sozinhos.
Ao sair pela porta de madeira, franzi o cenho ao encontrar Namjoon conversando outra vez com o garoto radiante que agora não esboçava nenhum tipo de alegria. Pelo contrário, seu rosto demonstrava grande preocupação.
- Mas como vamos saber a hora? – o de cabelos negros perguntou.
- Nós nunca sabemos a hora, Hoseok – Namjoon respondeu, deixando o copo sobre o balcão.
Sem entender a declaração, decidi ignorá-los e não prestar mais atenção nos assuntos alheios. Deixando o balcão, caminhei até o interruptor em uma das paredes e liguei o ventilador de teto que havia ali. Para isso, precisei passar pela mesa onde meus amigos permaneciam sentados. Jungkook mantinha os braços sobre o móvel, escondendo seu rosto neles. Já os outros dois conversavam quase que em sussurros, mas pararam assim que me notaram.
Sem graça, voltei apressada para meu posto, mas não pude deixar de notar o olhar curioso do garoto novo sobre mim. Mais uma vez atrás do balcão, notei que os copos dos homens ali estavam vazios, então me aproximei.
- Então... – abri um sorriso gentil. – Desejam mais alguma coisa?
Namjoon pensou em responder, porém suas palavras se perderam assim que ouvimos um chute atingir a porta da frente. Assustados, viramos para lá exatamente no instante que homens vestidos de preto invadiam o lugar segurando pistolas prateadas.
- Mas que... – murmurei sem entender o que se passava.
Hoseok e Namjoon trocaram um breve olhar e quando o segundo deu um leve aceno de cabeça, Hoseok sequer pensou e numa velocidade absurda se jogou sobre o balcão, rolando por cima dele. Observei tudo abismada, até sentir suas mãos em meus ombros, me puxando para baixo no exato momento que o som de disparos cortaram o ambiente.
Gritei quando os tiros acertaram as garrafas, causando uma chuva de líquidos e cacos de vidro, mas permaneci abaixada, pois o garoto ainda me segurava.
- Você está bem? – ele perguntou
- Acho que... sim – franzi a testa. – O que está acontecendo?
- Apenas fique aqui, tá legal? – me olhou nos olhos com seriedade.
Sem esperar uma resposta, se virou de costas para mim, retirando uma pistola dourada da parte de trás das calças. Com um impulso, Hoseok subiu no balcão, iniciando seus disparos. Não demorei a perdê-lo de vista quando pulou de cima da madeira amarronzada, juntando-se a Jungkook e Taehyung.
Os disparos haviam diminuído de intensidade e som de coisas sendo destruídas tornou-se mais frequente, assim ergui minha cabeça para observar a cena do outro lado, deixando apenas meus olhos desprotegidos. Os arregalei assim que vi Namjoon pegar o copo que usava, acertando-o com força na têmpora de um dos homens, que foi ao chão.
Não sei por quantos minutos permaneci estarrecida com a cena, mas logo um som familiar me chamou a atenção. As teclas do piano emitiam seu tão conhecido som, mas não de uma forma harmoniosa. Era como se as espancassem. Olhando para o instrumento, acompanhei o segundo que Jimin era prensado contra ele por um homem que tinha o dobro do seu tamanho.
Ele o estrangulava sem piedade e o garoto tentava se desvencilhar, sem sucesso. O que me causou uma sensação estranha no peito. Movida pela emoção, me levantei, saindo de trás do balcão e correndo até onde a luta acontecia. Sem saber o que fazia, passei por trás de Jungkook, que me olhou espantado e num só movimento me agarrou pelo braço me impedindo de avançar.
- Não! – bradei instintivamente quando começou a me puxar de volta para onde havia saído. – O Jimin...
- Ele sabe se virar – foi a resposta que recebi.
O suposto ruivo me conduziu por mais alguns metros, mas antes que pudesse me deixar no mesmo lugar em que eu estava, um homem tomou nossa frente com a arma erguida.
- Droga... – Jungkook disse entredentes, antes de virar-se na direção oposta, tomando a minha frente.
Apenas entendi o motivo de sua ação quando a bala alojou-se em seu pescoço, fazendo seu sangue espirrar em meu rosto.
- Jungkook?! – murmurei estupefata.
Meus músculos enrijeceram-se e não tive forças para me mover. Assim, quando seu corpo foi ao chão, também caí sentada. Com ele em meus braços, finalmente entendi a seriedade da situação e lágrimas brotaram do canto dos meus olhos, logo inundando meu rosto suado.
- Não... – o agarrei com força. – Meu Deus, não...
Em prantos, ergui o rosto ao ouvir o som de passos em minha direção. Era o garoto que estava com Hoseok, que também logo se juntou a ele, formando um tipo de escudo humano. Não pensei em questioná-los, apenas assisti seus esforços de tentarem resistir, mas sabia que não durariam muito.
Permitindo que mais lágrimas escapassem, assustei-me ao sentir uma mão em meu ombro e olhei para quem estava atrás de mim, encontrando os olhos preocupados de Jimin a me encarar. Um deles estava roxo e seu nariz sangrava, ainda assim, ele não parecia se preocupar.
- Ei... – em sua voz havia um tom afobado. – Temos que sair daqui.
- Mas... – olhei para o corpo de Jungkook em meu colo.
- Temos que deixá-lo – engoliu seco, como se dizer aquilo fosse extremamente difícil. – Eu sinto muito.
Pensei em contrariá-lo, como sempre fazia. Todavia, eu não entendia nada do que acontecia naquele momento e, acima de tudo, prezava por minha vida. Assim, apenas deixei que me guiasse, segurando sua mão.
Rapidamente nos levantamos e ele tentou me levar para a porta de entrada, mas logo fomos barrados por dois caras desconhecidos. O que não durou muito.
- Jimin! – Taehyung disse após quebrar uma das cadeiras num dos homens com uma força absurda. – Tira ela daqui!
Me guiando pela direção oposta fomos até a saída dos fundos, mas no meio do caminho ele desistiu, pois logo ela também estava bloqueada.
- Merda... – resmungou com raiva.
Então, num movimento que não eu esperava, ele me puxou para perto de si e senti seus braços em minha volta. Não entendi o que pretendia fazer, mas não havia sido rápido o suficiente. Pelo menos não tão rápido quanto a bala que cravou-se em minha coluna, fazendo que um grito desesperado escapasse de minha boca.
- ! – Jimin me olhou assustado. – Não, não, não...
Me pegando em seus braços, correu até a despensa, recebendo cobertura dos garotos que ainda estavam de pé. Adentrando o local, me colocou sobre uma das mesas antigas que não eram mais utilizadas. Enquanto eu gemia de dor, mais uma pessoa se juntou a nós, mas sequer tentei saber quem era.
- Jimin! – o homem falou.
- Jin! – o outro respondeu com certo desespero. – Eu tentei tirá-la daqui, eu sinto muito, eu...
- Ela está morrendo – a outra pessoa o interrompeu e finalmente se aproximou, então pude ver o garoto incrivelmente belo que havia chegado por último no bar.
- E o que vamos fazer? – o mais novo questionou.
- Vamos tentar mais uma vez – sua sentença foi firme.
Então, diante de meus olhos que agora quase não conseguiam focar as imagens, Jin sacou um caixa de fósforos. Retirando um dos palitos de madeira, o acendeu, clareando de forma insignificante o lugar. Me encarou por alguns segundos, mas não tive mais forças para manter meus olhos abertos, cerrando-os contra minha vontade. O derradeiro som que ouvi foi de seus lábios assoprando a pequena chama.


Capítulo 3

Em tantos anos de existência, eu ainda não havia compreendido como o ser humano podia produzir tanto lixo. Enquanto amarrava mais uma sacola cheia de todas as porcarias possíveis, xingava vários palavrões impublicáveis, pois meu expediente estava quase no fim, mas os minutos pareciam não querer passar e aquele cheiro não era nem um pouco agradável.
Caminhando pelo bar, que havia sido fechado há poucas horas e só reabriria em uma hora, limpei todas as lixeiras me perguntando por mais quanto tempo teria que fazer aquilo. Distraída, praticamente pulei ao ouvir o som de algo se quebrando perto do balcão, olhando para lá alarmada.
- Jeon Jungkook! – ralhei ao ver os cacos de vidro aos pés do garoto. – Já é o terceiro copo que quebra só hoje.
- Foi mal... – fez uma careta, voltando a se sentar no banco alto.
- Tanto faz – revirei os olhos e me aproximei dele, abaixando e pegando os cacos maiores. – Só quero que vaze daqui antes que eu reabra o bar.
- Ainda é cedo – Jungkook apoiou os cotovelos na madeira grossa. – O sol acabou de nascer.
- E você sequer foi para casa – me ergui e ele me encarou. – Imagino o pobre do Taehyung te procurando pela cidade inteira. Não deveria fazer isso com seus amigos, sabia?
- Vocês merecem – um sorriso sarcástico surgiu em seu belo rosto.
Indignada, dei-lhe as costas e carreguei o lixo para o lado de fora, saindo pela porta dos fundos. Segui por um corredor de paredes num tom amarelo mostarda, contando as portas verdes onde antes funcionavam quartos de uma hospedaria, porém, por conta de dificuldades financeiras, o dono do estabelecimento decidiu apenas manter o bar. Hoje, eles apenas ficavam trancados sem nenhum uso.
Perto de uma das portas, havia uma mesinha com um pequeno abajur trabalhado em detalhes, que sempre estava apagado. Acostumada a vê-lo todas as vezes que passava ali, continuei até estar numa varanda com uma larga área aberta, coberta de pisos brancos. Desci os poucos degraus que me separavam dela e segui até a caçamba de lixo que ficava na parede do estabelecimento vizinho.
Após deixar os sacos em seu devido lugar, voltei pelo mesmo caminho, mas parei ao ver os inúmeros vasos de plantas espalhados por todos os lados. Eu deveria molhá-los e havia me esquecido.
- Mas que... - resmunguei, deixando meus braços penderem ao lado do corpo.
Logo chegaria para assumir seu horário, então decidi deixar aquela tarefa para ela pelo menos daquela vez. Arrastando meus tênis no chão polido, voltei para dentro, passando outra vez pelo corredor estreito. Tudo continuava igual. Bem, pelo menos por fora.
De dentro do quarto número cento e dois consegui ouvir um ruído suspeito. Era como o barulho de passos. Parei de supetão, tentando ouvir melhor, mas então tudo voltou a ficar quieto, me dando a certeza de que não passara de uma ilusão de minha cabeça cansada.
Dando de ombros, retornei minhas passadas. Todavia, ouvi o som novamente e, quem quer que seja, estava apressado. Isso era evidente pela forma como a sola de seus calçados ia de encontro ao chão. Franzindo o cenho, me recostei à porta para escutar o que se passava e, com atenção redobrada, distingui não uma e sim duas pessoas caminhando de um lado para o outro lá dentro.
Pensei em abrir a porta e perguntar o motivo de estarem num local que não era permitido o acesso, no entanto, quando uma delas começou a falar, a curiosidade me enlaçou, me fazendo encostar o ouvido na madeira pintada.
- Você já tentou muitas e muitas vezes, mas nunca conseguiu tirá-la de lá! – uma voz masculina e grave se fez ouvir. – Eu até tinha minhas dúvidas sobre o que Seokjin nos dizia, mas da última vez, eu vi com meus próprios olhos e você simplesmente não pode salvá-la.
- E o que pretende fazer então? – a segunda pessoa falou e imediatamente reconheci sem timbre.
Confusa, arregalei os olhos ao identificara voz de Jimin, o rapaz que trabalhava no lugar tocando piano. Praticamente me espremi para poder saber mais, ainda que não fizesse ideia do que falavam ou do motivo de estarem ali dentro.
- Dessa vez eu vou – o primeiro foi firme.
- O quê? – Jimin pareceu estar indignado. – Não pode simplesmente chegar lá e fazer isso.
- Eu nunca tentei salvá-la – o homem continuou. – É a minha vez agora, não?!
- Ela não o conhece – o loiro insistiu.
- E o que isso tem a ver? – respondeu sem elevar o tom. – Talvez seja melhor não envolver sentimentos.
- Não existem sentimentos – o outro foi rápido em sua resposta.
Definitivamente, eu não consegui compreender nenhuma daquelas sentenças, assim não fazia sentindo continuar a ouvir aquela conversa. Eu deveria apenas expulsar aqueles intrusos e questionar o motivo de Park Jimin estar com um desconhecido num dos quartos da antiga hospedaria, sem me avisar.
Segurei a maçaneta e a girei, constatando que estava destrancada, então abri a porta esverdeada já preparando a bronca que daria neles. No entanto, ao fazê-lo, fiquei mais confusa do que antes. Dentro do quarto não havia ninguém. Apenas os móveis intactos e empoeirados.
Fitei o breu quase total por longos segundos me perguntando se estava delirando, pois ouvir a voz de Jimin sem que ele estivesse presente não era normal. No mínimo, estava louca. Rindo abafado, balancei a cabeça para mandar aqueles pensamentos embora. Não poderia perder tempo com bobagens.
Mas, antes que pudesse fechar a porta, parei e permaneci estática. Com a mão na maçaneta, fitei o nada, dando atenção à voz dentro de minha mente que dizia que eu deveria voltar até a varanda. Pisquei algumas vezes antes de segui-la e logo os fortes raios de sol aqueciam minha pele outra vez.
Antes de descer os degraus, olhei para a outra extremidade do local e me surpreendi ao encontrar uma figura masculina parada ao lado de uma das pilastras. Ele mantinha as mãos nos bolsos da calça clara e seus cabelos avermelhados cobriam parte da bandana que usava. Permaneci parada o observando de longe até que ele me notou, olhando em minha direção. Em seus pequenos orbes escuros vi certo espanto que ele logo tratou de ocultar.
Sem pensar, caminhei em sua direção e ele sequer se moveu. Não sei o que me atraia, porém, algo me dizia que eu deveria ir até lá. Logo eu estava sob a sombra da mesma pilastra, a poucos passos do rapaz que era um pouco mais alto que eu. Nos encaramos sem dizer nada, até que resolvi quebrar o silêncio.
- Er... bom dia, senhor! – pigarrei para limpar a garganta. – Por acaso está perdido? Eu poderia ajuda-lo, se desejar.
- Não, obrigado – ele negou sem deixar de me encarar. – Estou exatamente onde deveria estar.
- Tudo bem, então - tentei esconder a careta que fiz diante daquela frase enigmática. – Nosso estabelecimento abre em trinta minutos, mas se quiser, posso servir algo.
O garoto pálido me encarou profundamente sem responder minha pergunta e seu olhar era intimidador, me obrigando a desviar o rosto. Fitei meus próprios pés, mas assim que meu cérebro processou o timbre de sua voz, consegui identificá-la.
- Você! – o olhei com os olhos arregalados. – Foi você quem estavam com o Jimin no quarto cento e dois.
- Me desculpe?! – o rapaz franziu a testa em confusão.
- Sim, é você mesmo! – apontei com o indicador. – O que estava fazendo lá, afinal?
Ele entreabriu os lábios para me dizer algo, entretanto, parou assim que ouvimos um estrondo vir de dentro do estabelecimento. Virei assustada na direção do bar e soltei um gritinho agudo quando disparos foram realizados.
- Mas... – murmurei. – O que está acontecendo?
Avancei em direção à entrada, ignorando qualquer bom-senso que poderia ter, mas antes que alcançasse a porta, senti os dedos do garoto ruivo me puxando na direção oposta. O encarei sem entender sua ação, mas não tive tempo de me desvencilhar de seu aperto, pois logo dois homens vestidos de preto surgiram a poucos metros de distância. Eles seguravam armas prateadas e assim que nos avistaram, correram até nós.
Eu não sabia como agir, por isso apenas deixei que o garoto me conduzisse para onde quer que fosse. Corremos pelos degraus alcançando a área aberta, mas infelizmente não fomos muito longe, pois mais homens de preto surgiram, nos cercando. Instintivamente, me escondi atrás dele que pareceu entender meu receio, pois tomou uma posição defensiva, como se quisesse ser um tipo de escudo.
- Vocês... – ele começou a dizer com calma. - Vão nos deixar passar agora.
- Isso não vai funcionar, garoto – um dos estranhos disse, rindo com desdém. – Acha mesmo que não estamos preparados para enfrentá-los?
O homem à minha frente xingou com raiva, cerrando os punhos com força. Ele olhava de um para outro, como se os analisasse, mas não parecia ter uma solução, pois os inimigos eram numerosos.
- Vocês tentaram mais de uma vez, Yoongi – uma mulher havia falado. – Que tal desistirem agora?
Tentei encontrá-la entre os outros, porém, apenas figuras masculinas faziam-se presentes. Desorientada, olhei para trás a tempo de ver o que menos esperava. Sentada com as pernas cruzadas numa cadeira de palha que havia na varanda, uma mulher de cabelos negros e olhos da mesma tonalidade nos encarava com um sorriso ladino. Suas vestimentas escuras e justas completavam o figurino.
- ? – me virei completamente até ela. – Mas o que... o que está acontecendo?
- Você sempre pergunta a mesma coisa, todas às vezes – ela respondeu. – E o interessante é que nunca obtêm uma resposta porque morre logo em seguida.
- O quê? – fiz uma careta. – Do que está falando?
- Estou falando do destino que esses tolos ainda não perceberam que não podem mudar – ela respondeu.
A cada minuto a situação de tornava mais estranha. Havíamos sido cercados por pessoas vestidas de preto, o tal de Yoongi, que por algum motivo me ajudava, tentou controlá-las apenas com palavras. E agora a minha colega de trabalho que sempre se mostrou meiga e feliz, usava roupas pretas e sacava uma pistola prateada de um coldre preso em sua perna direita.
Levantando-se, ela caminhou em nossa direção, então Yoongi tomou mais uma vez a minha frente, como se uma só mulher fosse mais perigosa do que uma dezena de homens armados.
- Sabe que não pode lutar – sorriu de canto. – Não contra mim.
- Eu não posso – ele falou, dando uma pausa dramática. – Mas ele sim.
A garota pareceu perceber sobre o que ele dizia, deixando que o sorriso morresse, erguendo arma em nossa direção. Fechei os olhos, aguardando o disparo nos acertar em cheio. Todavia, não foi o que senti.
Quando uma mão tocou o meu ombro, abri as pálpebras ligeiramente, encontrando Park Jimin a poucos passos de distância. E tão rápido quanto ele apareceu, sumiu, mas nos levando junto consigo. Num piscar de olhos não estávamos mais na área externa e sim no quarto cento e dois. Assustada, me desvencilhei dele, notando que Yoongi também estava lá e corri para um canto do quarto.
- Isso não pode estar acontecendo... – me agachando perto da cômoda, levei as mãos às têmporas. – Isso não... Mas que... que DROGA É ESSA?
Elevei a voz, olhando para os dois que permaneciam calados. Eles trocaram um breve olhar e então Jimin veio até mim, se abaixando para ficar da minha altura. Apesar do leve temor, o encarei por tê-lo como uma figura conhecida.
- Eu sei que tudo isso é muito estranho, mas logo vamos dizer o que está havendo – sua voz era suave, de uma maneira como nunca tinha falado comigo antes. – Agora preciso que faça tudo que dissermos, pois nunca chegamos até aqui antes, tudo bem?
Sem muita escolha, balancei a cabeça positivamente e quando ele me ofereceu sua mão, a peguei com cautela. Após me ajudar a levantar, o loiro me levou até Yoongi, que apenas escutava.
- O que vamos fazer agora? – Jimin questionou. – Ela já sabe que estou aqui, então não vou conseguir mais usar minha habilidade caso saia do escudo.
- A proteção do quarto logo vai terminar, Taehyung não pode nos despistar por muito tempo – o outro disse. – Precisamos sair antes disso.
- Para onde? – perguntei baixinho.
- Eu não sei... ainda – o ruivo balançou a cabeça uma vez.
Sentei-me no colchão empoeirado e tentei ignorar os últimos eventos daquela manhã. Eu só queria terminar meu expediente e não enfrentar um bando de lunáticos comandados pela minha suposta colega de serviço.
- Jimin – Yoongi o chamou. – Pode existir um jeito de acabarmos com isso de uma vez.
- Acabar com o quê? – franzi a testa.
- Que jeito? – o loiro perguntou no mesmo momento.
- Leve-a até Seokjin – explicou com paciência. – E diga para mostrar à ela.
- Quer que ele lhe diga a verdade? – o mais novo estranhou.
- É uma linha temporal que nunca foi traçada – ele se aproximou de mim. – Pode ser uma nova alternativa.
- Talvez... eu consiga levá-la – ele hesitou. – Mas isso vai tirá-la do campo de proteção.
- O campo vai acabar a qualquer momento, pois já está aqui – repetiu. – Não se preocupe com isso.
Suspirando, finalmente concordou resignado. Eu apenas o observei parar em minha frente, abaixando-se e apoiando as mãos em meus joelhos. O encarei com os olhos marejados, pois tudo aquilo me causava certo pavor, porém, eu não precisaria chorar na frente deles.
- Vai ter todas as respostas que precisa, mesmo que não tenha nenhuma pergunta sobre – sorriu de forma gentil.
- Jimin... – minha voz era baixa. – Quem é Seokjin?
À minha pergunta, os garotos trocaram uma olhar significativo, mas logo Jimin voltou a me encarar. Segurando minhas mãos, ele se levantou e me ajudou a fazer o mesmo. Parando próximo a meu corpo, segurou meus ombros e respirou fundo.
- Logo vai saber – disse num tom amigável. – Agora, apenas feche os olhos.
Eu o obedeci. Então uma sensação estranha, como um formigamento, atingiu todo meu corpo. Mas tão rápido quanto veio, ela se foi. Então, finalmente, voltei a abrir minhas pálpebras. Para minha surpresa, estávamos na despensa. Me afastei de Jimim para olhar em volta sem acreditar no que havia se passado, mas meu êxtase logo se foi, assim que avistei um homem sentado sobre uma das mesas antigas.
Ele me encarava de volta, como se minha presença já fosse esperada. Reparei em seu casaco cor de vinho e em seus cabelos tingidos de loiro. Sua beleza era indiscutível. Entretanto, o que prendeu a atenção foi o objeto entre seus dedos. Uma pequena caixa de fósforos.


Capítulo 4

Quando Jimin se afastou e foi até o outro rapaz, uma sensação estranha me ocorreu, como se estar longe dele me deixasse desprotegida. Pensei em segui-lo, porém, permaneci perto da porta apenas observando a conversa que se iniciava.
- Seokjin, que bom que já está aqui – o loiro parou em frente ao outro e pude ver que era mais baixo.
- Sim – respondeu com um aceno de cabeça. – Yoongi disse que eu deveria vir pra cá.
- É claro que disse – riu abafado, como se já esperasse a resposta que recebeu.
- Ele também disse que Taehyung deveria transferir o escudo para cá – Seokjin explanou.
- Ele... – Jimin pareceu surpreso diante daquela declaração. – Droga, Yoongi!
Ainda calada e encolhida contra a parede, vi quando Park Jimin socou o vidro do armário atrás de si e os cacos voaram para todos os lados, vindo até mesmo perto de mim, me fazendo arfar pela surpresa.
- Ele está desprotegido agora – falou com uma raiva visível. – E ela não vai tardar a encontrá-lo.
- Ele sabe muito bem disso, garoto – o mais velho disse, descendo da mesa. – E o fato de ter se sacrificado me faz ter certeza de que ele sabe o que está fazendo, então vamos em frente.
- Tudo bem... – respirou fundo antes de correr seus olhos em minha direção.
Sem dizer uma só palavra, apenas ergueu sua mão para mim e, inconscientemente, fui até ele. Quando a segurei, percebi que o outro rapaz nos encarava com curiosidade, mas decidi ignorar o seu sorriso de canto.
- O que preciso fazer? – o mais alto questionou. – Não acha muito cedo para voltarmos outra vez?
- Não vamos voltar – negou, passando a mão livre nos cabelos.
- E então? – Seokjin ergueu as sobrancelhas.
- Precisa mostrar tudo à ela – suspirou, como se a ideia não lhe agradasse.
- Contar a ela? – inclinou a cabeça para o lado – Mas isso não está nos planos.
- Eu sei, mas Yoongi disse que tentamos todas as possibilidades e nenhuma deu certo. Sequer passamos desse dia – Jimin explicou com calma. – Mas em nenhuma das linhas ela soube a verdade, o que talvez faça alguma diferença.
- Realmente, faz sentido... – murmurou pensativo e então me encarou. – Ela pelo menos sabe o motivo de estarmos aqui?
- Não – respondi por mim mesma. – Mas Jimin disse que eu teria respostas.
- Não se preocupe – Seokjin sorriu minimamente. – Vamos dar um jeito nisso.
Dessa vez, ele me estendeu sua mão. Hesitante, olhei para Jimin e ele acenou positivamente com a cabeça, mostrando que eu deveria ir. Só então percebi que nossas mãos ainda estavam entrelaçadas e a larguei um pouco envergonhada, indo até o outro garoto. Quando nossos dedos se conectaram senti uma espécie de estática me atingir, porém, ela logo se foi.
- Eu vou voltar pra lá e ganhar mais tempo – Jimin disse, chamando nossa atenção.
- Avise aos outros que ela está comigo – ele lhe respondeu.
- Certo – sem mais palavras, nos deu as costas.
Entretanto, antes que deixasse o local, o loiro virou-se mais uma vez e veio até mim a passos largos. Segurando meus ombros com firmeza, me encarou nos olhos e a preocupação que havia nos seus era quase palpável.
- O que... – pensei em perguntar, mas fui interrompida.
- Apenas... fique viva – sua voz saiu carregada de sentimentos que não consegui discernir.
Então depositou um beijo em minha testa, afastando-se logo em seguida. Enquanto ainda me encarava, o garoto sumiu diante de nossos olhos, deixando para trás apenas a sensação de seus lábios em minha pele.
- – Seokjin me chamou, tirando-me de meu devaneio. - Sei que tudo que eu disser vai aparecer insano, mas preciso que acredite em cada palavra, pois sua vida depende disso.
- Acabei de ver Park Jimin se teletransportar mais de uma vez – respondi, ficando de frente para ele. – Não sei se é possível existirem coisas mais estranhas que essa.
- Pode ter certeza que sim – deixou que um riso anasalado escapasse.
Me puxando para o fundo do local, nos sentamos perto de uma parede, ficando escondidos por algumas caixas de papelão empilhadas. Eu não sabia o motivo, mas agora que Jimin havia ido, eu ainda me sentia segura. Talvez a expressão serena de Seokjin ajudasse.
- Seokjin... – comecei a falar.
- Me chame apenas de Jin – sorriu mais uma vez. – Vamos começar, pois não temos muito tempo.
Às suas palavras, tirou algo de dentro do bolso que havia em sua calça. Reconheci a caixa de fósforos e franzi o cenho sem entender o que aquele objeto aparentemente comum tinha a ver com a situação.
- Já ouviu falar em anomalias temporais? – o garoto iniciou com a pergunta.
- Er... sim – semicerrei os olhos, tentando lembrar algo. - Só não sei dizer do que se trata.
- São coisas ou situações que não deveriam existir no espaço-tempo, um erro no universo, para ser mais exato – ele completou. – E digamos que nós somos essas anomalias.
- Nós? – franzi o cenho.
- Já se encontrou conosco mais de uma vez, mas não se lembra – Jin balançou os ombros uma vez. – Somos sete, ao todo.
- Além de você, Jimin e Yoongi, quem mais? – perguntei curiosa.
- Hoseok, Namjoon, Taehyung e Jungkook – revelou, me fazendo arregalar os olhos. – Haviam outros, mas foram eliminados ao longo do caminho.
- E por que são anomalias? – quis saber.
- Porque somos algo fora do comum – o loiro passou a língua entre os lábios. – Fazemos coisas que está além da capacidade humana compreender e isso não é normal.
- E o que eu tenho a ver com isso? – fui direta.
Jin me encarou em silencio por breves segundos e antes que me respondesse, ouvimos um baque na porta trancada. Alguém tentava entrar. Olhei assustada para ele, que não perdeu tempo e acendeu um dos palitos, fazendo surgir uma pequena chama entre nós.
- Eu vou te mostrar – disse antes de assoprar o fogo.
No mesmo segundo, tudo foi tragado pela mais profunda escuridão, mas ela não durou muito. Logo uma luz surgiu em minha frente e foi se tornando cada vez maior e mais forte. Por fim, tudo estava claro e foi possível que eu distinguisse o ambiente ao meu redor.
Não estávamos mais na despensa mal iluminada, mas sim do lado de fora do bar onde eu trabalhava, a algumas ruas de distância. O sol era forte, me obrigando a erguer uma das mãos para tentar bloqueá-lo e as ruas sempre movimentadas estavam praticamente vazias. Vez ou outra, pessoas passavam apressadas para seus empregos, mas nada extraordinário para aquela hora do dia.
Olhando para o lado, vi Seokjin a poucos passos com as mãos em seus bolsos. Por sua expressão facial, não parecia estar tão animado, apenas apressado.
- O que estamos fazendo aqui? – questionei com os olhos semicerrados por conta da claridade. – Os outros ainda estão lá dentro.
- Não se preocupe, eles ainda não estão – respondeu sereno.
Ao ver minha cara de confusão, o rapaz apontou para o outro lado da rua. Lá, no fim da faixa de pedestres, havia uma placa digital que marcava a temperatura mínima e também a máxima. Logo abaixo dos números havia também as horas, que alternavam por alguns instantes com a data. Prestando atenção, quase engasguei com a própria saliva ao constatar que dia era aquele.

06/10/2018


- Isso não é possível... – murmurei, dando passos até estar na beirada da calçada. – Esse dia aconteceu faz...
- Um mês, eu sei – Jin completou minhas palavras.
- Então está dizendo que nós... – gaguejei antes de completar a frase. – Que estamos... no passado?
- Você entende rápido – o garoto sorriu satisfeito. – Enfim, vamos continuar.
Jin saiu caminhando como se aquela fosse a coisa mais normal do mundo e tudo que pude fazer foi segui-lo, dando uma leve corridinha para alcançá-lo.
- Tá legal, voltamos para o dia seis de outubro – tentei raciocinar da melhor maneira possível. – Mas o que há de especial aqui?
No momento que viramos uma esquina, Seokjin colocou uma mão em minha frente, me mostrando que deveria parar e o fiz de supetão. Pensei em perguntar o motivo do movimento brusco, entretanto, o avistei sem demora.
Uma outra versão de mim caminhava apressada pela calçada, com apenas uma alça da mochila pendurada da forma correta. Na outra mão segurava um celular e escondia os olhos com óculos escuros de um modelo que eu provavelmente não fazia ideia se ainda estaria vivo. Distraída, guardei o aparelho no bolso da calça e não percebi o momento que uma garota se esbarrou em mim.
- Oh, eu sinto muito! – a moça falou imediatamente, pegando a mochila que havia ido ao chão. – Eu não a vi, é sério, eu...
- Está tudo bem – dei de ombros e peguei o objeto. – Não se preocupe.
Deixei um riso sem humor escapar por meus lábios assim que reconheci . Aquele era o primeiro dia que tivemos contato e eu a havia achado uma pessoa adorável e seu jeito atrapalhado e seus belos vestidos floridos apenas confirmavam isso.
- Como eu sou desastrada – a outra, que usava um de seus belos vestidos e prendia os cabelos numa trança de lado, bateu a mão na testa. – Eu só estava tentando encontrar meu novo local de trabalho, pois estou atrasada.
- Bem... – balancei os ombros uma vez. – Talvez eu possa ajudá-la.
- Sério? – o rosto dela se iluminou, logo tirando um pequeno papel da bolsa. – Aqui está o endereço.
- Uau, parece que você está com sorte – dei um riso baixo. – É justamente onde eu trabalho.
- Não acredito! – seu sorriso era largo. – Então podemos ir juntas.
- Claro – concordei e começamos a caminhar na direção do estabelecimento enquanto minha nova colega continuava a tagarelar.
Enquanto as duas seguiam distraídas, eu e Jin permanecíamos parados na esquina ainda as observando até perdê-las de vista.
- Como não nos notaram aqui? – eu quis saber.
- Posso me ocultar quando viajo no tempo – respondeu apenas, mudando o assunto. – Lembra desse dia?
- Foi quando veio trabalhar conosco, no período da manhã – respondi, mordendo o lábio inferior. – Ela sempre foi tão... alegre. Como pôde ter se transformado tanto?
- Na verdade, isso é apenas um disfarce que ela assumiu, assim como alguns de nós – explicou.
- Disfarces? – o olhei com o cenho franzido.
- Lembra de mais alguma coisa desse dia? – ergueu as sobrancelhas de forma sugestiva.
- Sim... – fitei o nada, pensativa.
Então, sem mais explicações, corri na direção do meu local de trabalho e logo o senti em meu encalço. Parei apenas quando pude vê-los novamente. Eu e nos aproximávamos da porta do bar quando encontramos um garoto loiro sentado, com uma pasta marrom em mãos. Ao nos ver, se levantou rapidamente e nos cumprimentou.
- É o dia que Jimin foi contratado – sussurrei abismada. – E também foi a primeira vez que Jungkook virou a noite bebendo.
- Nada disso é uma coincidência - o rapaz disse. – Todos estão assumindo seus papéis.
- Papéis para quê? – eu ainda permanecia perdida.
- Como eu disse, somos erros existentes no espaço-tempo – Jin disse e me segurou pelo ombro. – Para alguns isso é bom, para outros, nem tanto.
- Disse mais cedo que alguns foram eliminados – relembrei-me.
- Sim e restamos apenas os sete – Jin confirmou e quando vimos os três adentrando o lugar, fizemos o caminho oposto.
- Suponho que sejam aqueles que apoiam a existência das anomalias – deduzi, continuando a caminhar. – E que não.
- Como eu disse, você é rápida em entender – entramos num beco sem saída.
- E por que eu? – ficamos frente a frente. – Por acaso sou como vocês?
- Você, , é algo que está além até mesmo do nosso entendimento – ele tocou meu rosto com as costas dos dedos e mais uma vez uma estática me atingiu. – Você é o elo que nos mantém vivos.
- Elo? – dei um passo inconsciente em sua direção.
- Quando anomalias surgem, com o tempo, o próprio universo dá um jeito de corrigi-las – expressou. - De alguma forma, você a responsável por ainda existirmos.
- É por isso que querem me salvar? – me afastei de seu toque. – Por vocês mesmos?
- No começo, essa era a nossa missão – balançou a cabeça uma vez. – Mas depois de vivenciarmos os mesmos acontecimentos várias vezes, tudo se tornou muito mais complexo.
- Várias vezes? – indaguei perplexa. – Então quer dizer que aquela não foi a primeira vez?
- Muito longe disso – negou, pegando mais uma vez a caixinha.
Diante de meus olhos, Seokjin acendeu outro fósforo e o apagou ligeiro. A mesma sensação de vazio preencheu tudo, todavia, não demoramos a estar em outro lugar. Dessa vez o interior do bar.
Meu outro eu caminhava pelo recinto, ajeitando as cadeiras, esperando que chegasse para assumir seu expediente. Porém, como o relógio de parede mostrava, ela estava atrasada. Xinguei vários nomes sujos e segui para o balcão, começando a limpa-lo com uma flanela. Na outra extremidade da bancada, um rapaz de cabelos vermelhos desbotados dormia debruçado sobre a própria saliva.
Reconheci Jungkook e sorri ao lembrar que a qualquer momento Taehyung viria procurá-lo. Mas assim como surgiu, meu sorriso logo murchou.
- Porque ele sempre está bêbado? – questionei.
- Talvez seja a forma que encontrou para driblar a dor das lembranças – Seokjin disse.
- Como? – me virei para ele.
- Hoje é seis de novembro de 2018, a primeira vez que tentamos levá-la em segurança, o que não deu muito certo – sentou-se em uma das mesas e eu o imitei.
Instantes após sua fala, Jimin chegou e, como sempre, foi direto para seu piano. Discutimos algo e então o ignorei, voltando ao meu trabalho. Em seguida, Taehyung entrou pela porta da frente usando seus óculos arredondados, sentando-se ao lado do mais novo.
- A partir daí, tentamos outras vezes, mas ela sempre aparecia – explanou.
- Se refere a ? – continuei a fitar a cena à nossa frente. – O que há de tão perigoso nela?
- também é uma anomalia, mas diferente de nós, trabalha para nos exterminar – mordendo os lábios, continuou. – E sempre que surge em cena, não somos páreos para seu poder.
- O que ela faz? – franzi a testa.
- Apenas veja – apontou com a cabeça.
Aquele era justamente o momento em que o local era invadido por homens vestidos com roupas pretas. Em suas mãos haviam armas que foram apontadas para mim e para os garotos, que logo tomaram a dianteira, formando um escudo em minha volta.
- Jimim, tira ela daqui! – ouvimos a voz de Taehyung praticamente ordenar.
- Eu... eu não consigo – o outro parecia alarmado, olhando para as próprias mãos. – Não posso usar meus poderes.
- Eu também não! – Jungkook exclamou.
Desorientados, os jovens encararam-se e então os mais novos decidiram avançar mesmo sem suas habilidades, deixando Jimin para trás comigo. Jungkook segurou a nuca de um homem vestido de preto e, sem cerimônias, bateu sua cabeça contra o copo de vidro que havia no balcão, o fazendo em pedaços. Ele lutou por alguns segundos, mas logo foi atingido no ombro, tombando de uma só vez.
Ao ver o sangue sujar sua camisa listrada, fiz menção de ir até ele, porém, Jimin me segurou pelo pulso. Olhei para ele com os olhos marejados e pensei em insistir, pois Jungkook era um amigo. Forcei meu braço, mas ele não o largou. Pelo contrário, o loiro me puxou para longe dele.
- Temos que ir – falou com dificuldade. – Eu sinto muito.
Sem tempo para pensar, deixei que me levasse, mas logo fomos bloqueados por alguns homens. Jimim notou sua intenção e, parando abruptamente, me segurou pelos ombros. Não entendi o que ele pretendia fazer, mas não houve oportunidade, pois o primeiro tiro o acertou em cheio, fazendo-o grunhir e fincar as unhas em minha pele. Pensei em gritar seu nome quando seu corpo caiu a meus pés, todavia, o som que escapou de minha garganta não teve a ver com o desespero de presenciar mais uma morte e sim por sentir meu peito ser perfurado numa velocidade absurda.
Quando meu corpo atingiu o chão, já estava sem vida, o que me fez levar as mãos aos lábios. Naquele momento a cena se desfez e se refez novamente, nos deixando no mesmo lugar.
- Mas o que... – olhei em volta sem entender o motivo da falta de mudanças.
Todavia, deixei as palavras morrerem ao entender o motivo. Seokjin me fez reviver cada uma das viagens que havia feito e eu vi cada detalhe. Cada morte e cada tentativa fracassada. Era tão real que até mesmo a dor dos disparos podia ser sentida. Talvez esse fosse o motivo da embriagues de Jungkook, pois ele era o que mais se sacrificava para me manter viva. Quando a passagem de tempo finalmente terminou, me debrucei sobre a mesa, ofegando pelo misto de sentimentos que tomava o meu peito.
- Como eu disse, vivemos esse mesmo momento várias vezes – Jin suspirou ao meu lado. – Trinta, para ser mais exato. Mas nunca conseguimos passar desse ponto e não posso viajar além desse dia, o que significa que perdemos.
- Nunca conseguiram? – engoli em seco.
- Até hoje – acrescentou. – Pois pela primeira vez conseguimos levá-la para o lado de fora e aqui estamos.
- Yoongi disse que eu nunca soube a verdade e que talvez isso faça diferença – eu murmurei, mas ele pôde ouvir. – Como?
- É o que vamos descobrir – ao dizer isso, Jin apagou mais uma chama.
Num segundo deixamos a mesa do salão e quando olhei ao redor, vi as paredes descascadas da despensa. Olhando para frente, o encontrei sentado ao meu lado, enquanto as batidas na porta perduravam.
- O escudo de Taehyung chegou ao fim – observou. – Não podemos mais continuar aqui.
Nos levantamos, limpando a poeira das nossas roupas claras. Tirando uma pistola dourada da parte de trás da calça, Seokjin caminhou cautelosamente para um lado da porta e indicou que às suas costas. Aguardamos e quando ela foi aberta com um chute, um homem adentrou o local com sua pistola erguida. Rapidamente, o loiro o acertou, nos dando assim passagem.
Saímos do quartinho, encontrando um caos ainda maior do que antes, mas não tivemos tempo para nada, já que assim que fomos identificados, tivemos homens de preto em nosso encalço. Os meninos que estavam ali também nos notaram e correram prontamente em nossa defesa. Taehyung, Jungkook e Jimin. Todos ainda vivos.
Juntando-se a nós, conseguiram derrubar um a um dos inimigos e então, milagrosamente, chegamos até a porta dos fundos.
- Onde estão os outros? – Jin perguntou.
- Namjoon e Hoseok foram auxiliar Yoongi – Tae lhe disse, não deixando de correr.
Passamos apressadamente pelo corredor, porém, antes que chegássemos à área aberta, um rapaz de preto nos surpreendeu, saindo de um dos quartos. Assustada, berrei e agarrei a primeira coisa que encontrei e o acertei em cheio na cabeça, fazendo-o desmaiar.
- Ah não... – Jimin choramingou. – Eu gostava desse abajur.
Só então percebi que segurava o abajur que ficava na mesinha perto dos quartos, mas minha atenção logo se voltou para o som de disparos seguidos. Nos entreolhamos e voltamos a correr para o lado de fora, passando pelas pilastras amarelas. Quando completamos o percurso, porém, desejei fortemente não tê-lo feito.


Capítulo 5

Nos dando a visão de seu vestido preto e justo, mantinha-se de costas para nós. Os fios escuros esvoaçavam graças a brisa que passava de leve e em sua mão direita segurava sua pistola, a apontando para um ponto fixo. Não demorei a identificar Yoongi desfalecido aos seus pés ao redor de uma poça de sangue. Ao lado dele estavam mais dois rapazes que logo reconheci como sendo Namjoon e Hoseok, na mesma situação.
- Não... – Jimin murmurou.
A garota não demorou a nos notar, virando-se para nós como uma cobra armando o bote. Em seus olhos sempre alegres, agora havia um tipo de escárnio que nunca havia presenciado.
- Veja só quem temos aqui – abriu os braços de forma teatral. – Se não é a equipe dos azarões.
- Sua desgraçada! – Jungkook cerrou os punhos.
- Ah, garoto – riu abafado. – Parece que morrer tantas vezes não o fez aprender nada.
- Não vai gostar nem um pouco de saber o que aprendi – o mais novo fez menção de que avançaria, mas foi impedido por Jin.
- Não – falou firme. – Não vale a pena.
- Seokjin! – apesar do sarcasmo, havia certo grau de admiração em seu timbre. – Finalmente tenho o prazer de encontrar o viajante do tempo em carne e osso.
- Nos encontramos mais do que possa imaginar – ele retaliou. – Apenas não sabe disso.
- Realmente, não sei – ela deu de ombros. – Mas posso sentir as mudanças que causa na linha do tempo. Por que acha que sei exatamente como impedi-los?
- O que você é, afinal? – Taehyung questionou.
- Eu, meu querido, sou alguém muito maior do que todos vocês – a garota esboçou um sorriso ladino. – E estou aqui para cumprir a missão que recebi.
Como se os três garotos caídos não fossem nada, a mulher passou por eles, tomando cuidado para não encostar os saltos de suas botas em suas vestes. Girando a arma entre os dedos enluvados, parou a poucos metros. Nós nos mantínhamos parados, como se ninguém tivesse a coragem de ao menos respirar.
- Acha mesmo que vamos permitir que isso continue? – Jin disse, tomando a frente do grupo. – Sabe que é em vão estar aqui, pois eu sempre posso mudar as coisas.
- No começo eu não entendia muito bem quais eram suas habilidades, Seokjin – ela não pareceu se abalar. – Mas depois de tantas vezes, agora compreendo o que devo fazer.
Erguendo mais uma vez a pistola prateada em nossa direção, a segurou com firmeza, disparando sem sequer hesitar. No início, o alvo não estava claro, por isso, no momento que Jin cambaleou para trás todos ficaram perplexos.
O garoto levou a mão ao lugar atingido e apenas não caiu, pois Jimin o segurou. Rapidamente ele se abaixou, levando Jin consigo, que perdia muito sangue. Todos os outros garotos também se ajoelharam para socorrer o amigo e apenas eu permaneci de pé, paralisada, assistindo seu visível desespero.
- Por que... – murmurei, correndo meus olhos para a mulher logo à frente. – Por que está fazendo isso?
- Você não entenderia, meu bem – por um segundo, assumiu sua antiga expressão cheia de meiguice. – Isso está além da sua capacidade.
- Sei exatamente quem todos vocês são e também sei que sou o alvo – engoli em seco. – Então por que ele?
- Se realmente soubesse, não estaria me perguntando – ergueu as sobrancelhas, fazendo com sua expressão ardilosa retornasse.
Ofegante, baixei o rosto para que ela não pudesse ver as primeiras lágrimas que se formavam no canto dos meus olhos. As lágrimas que guardei a vida inteira e que agora tinha motivos de sobra para derramar. Cerrando os punhos, tentei disfarçar o tremor que me tomava conta, pois em minha mente a ideia de que tudo estava acabado era forte.
Eu não precisava pensar muito para discernir o desenrolar da situação. Jin havia sido baleado. Justamente ele, o responsável pelas viagens temporais. Sem ele não existiriam mais chances de mudanças ou reinícios e quando voltei a fitar , ela percebeu que eu havia entendido.
- Essa é a derradeira viagem – o sorriso escarnecedor voltou com ainda mais vigor.
Como se aquela oração fosse algum tipo de invocação, os homens de preto ressurgiram, vindos de todos os lados e nos cercaram. Taehyung e Jungkook se levantaram, deixando Seokjin com Jimin e vieram em minha direção, prontos para me proteger. Instintivamente, me pus atrás deles.
- Eu sinto muito – sussurrei para que apenas eles ouvissem.
- Não é culpa sua – Tae respondeu. – Nada disso é.
- Vamos tirá-la daqui – Jungkook disse.
- Como? – franzi o cenho. – Eles são muitos.
- Vamos tentar – insistiu.
- Jungkook... – segurei o seu braço.
- ... – senti quando seus músculos se tencionaram. – Fica com o Jimin.
Dizendo isso, desvencilhou-se de meus dedos e deu dois passos na direção de . Esta o encarava com divertimento e sua expressão debochada alargou-se quando Taehyung juntou-se ao mais jovem. Sem opções, corri até os outros dois garotos e me ajoelhei perto deles.
- Jimin! – chamei o garoto quem antinha seus olhos em Jin.
- ... – me encarou com os olhos tristes.
- Como ele está? – murmurei, tocando levemente a mão de Jin que estava sobre seu ferimento.
- Nada bem – respondeu, balançando a cabeça negativamente. – Não sei quanto tempo vai resistir.
Ouvi suas palavras, sentindo meu coração pesar. Já haviam três garotos mortos a poucos metros e agora mais um estava quase juntando-se a eles. E tudo isso porque precisavam me proteger. Eles necessitavam de mim para que continuassem vivos, porém, não foi o que aconteceu. Preservar minha vida custou-lhes as suas e era só uma questão de tempo para que todos nós estivéssemos mortos.
Respirando fundo, fitei a luta que continuava a acontecer ao nosso redor. Dois contra dezenas. O mais estranho era que nenhum deles havia avançado contra nós ali no chão e também , que permanecia parada do outro lado do caos, com uma mão apoiada na cintura apenas observando tudo.
Como tudo isso foi acontecer? Até hoje de manhã eu não era ninguém, apenas mais uma garota entre todas as outras que existiam no mundo. Sempre vivi a vida sem esperar nenhuma surpresa, todavia, sempre aguardei que em algum momento o universo me mostraria um objetivo a mais. Algo além de acordar todos os dias e fazer o mesmo caminho, para então retornar para casa.
Mas não isso. Não ser alguém de quem outras pessoas dependiam para existir. Não uma aberração responsável por todas aquelas mortes. Eu nunca quis o caos. Nunca desejei ser especial. Porém, o universo não pareceu entender muito bem.
Desnorteada, assustei-me quando senti um aperto em meu pulso, olhando para lá automaticamente. Encontrei Seokjin me encarando com os olhos pesados e a respiração falha. Pensei em dizer algo, porém, ele foi mais rápido.
- Esse não é o fim... – sussurrou com dificuldade. – Nós não somos os únicos.
- Do que ele está falando? – questionei a Jimin.
- Existem mais anomalias espalhadas pelo mundo – respondeu após certa hesitação. – Somos uma pequena parte deles.
- Tirem ela daqui... – Jin insistiu em falar, mas parou abruptamente, começando a tossir.
- Estamos tentando – murmurou, fechando os olhos com força. – Mas...
Park Jimin parou no meio da sentença quando o mais velho tossiu novamente, expelindo uma quantidade significativa de sangue. Arfei quando seus dedos apertaram ainda mais meu pulso e uma estática, semelhante a que já havia sentido antes, percorreu todo meu antebraço.
- Não se deixe vencer, garota – disse com muito sacrifício. – Você é muito mais do que pode imaginar.
Aos poucos, Jin fechou os olhos e a sensação de eletricidade em mim foi se esvaindo, como se nossa conexão estivesse sendo cortada. Antes que pudesse perceber, as lágrimas já escorriam pela minha face suada e cansada e meus ombros balançavam por conta dos soluços que escapavam cada vez mais. Olhei para Jimin e me surpreendi ao ver seu rosto inundado como o meu e, quando me encarou, notei o quão abalado estava.
Era a primeira vez que víamos Seokjin morrer. Em todas as linhas temporais ele sempre foi a chave para o recomeço. Agora, especialmente para Jimin, ele estava fora da jogada. O futuro dependia de nós mesmos e, ao que tudo indicava, nada estava ao nosso favor. Com cuidado, o loiro segurou o corpo do amigo e o deitou no chão, mostrando que não havia mais o que ser feito por ele.
Com a raiva latente, ele passou as mãos sob os olhos, enxugando o rosto corado graças ao calor e num só movimento virou-se em a direção da batalha, pronto para adentrá-la. Num impulso, o agarrei pela manga da camisa, o que o fez parar. Surpreso, o garoto me encarou por cima do ombro, mas não o larguei.
- Eu preciso ir – murmurou e consegui captar a fúria em suas palavras.
- Não posso mais vê-los morrer – engoli em seco. – Não por minha causa.
- E o que acha que poderia mudar? – se virou inteiramente para mim. – Com ou sem você, vamos todos morrer. Se eu lutar, pelo menos estarei usando minha vida por você.
- Não quero que use sua vida por mim – elevei o tom. – Nunca quis que nenhum de vocês se sacrificassem por mim.
- É tarde de mais – num movimento inesperado segurou meu rosto e me olhou profundamente nos olhos. – Eu realmente achei que tudo isso daria certo em algum momento, mas não. E não haverá mais chances.
Permaneci estática, apenas encarando seus olhos pequenos e escuros. Jimin estava tão próximo que eu podia ver com clareza o brilho em sua pele causado pelo suor agora seco. Seus fios amarelos caíam parcialmente sobre a testa, bagunçados por conta de toda a euforia da situação. Percebi quando hesitou, desviando seus olhos dos meus por breves instantes, no entanto, logo retomou a coragem para continuar o que iria fazer.
Quando seu nariz roçou o meu, sua respiração pesada me acertou a face, me causando cócegas. Delicadamente, aproximou seus lábios dos meus e apenas fechei os olhos, pois não conseguia sequer expressar quão pasmada estava. Primeiro senti o calor, que me envolveu lentamente. Em seguida, a mesma sensação que tive quando toquei cada um deles, se fez presente. Contudo, dessa vez a sua magnitude era assoladora, me atingindo de uma só vez por todo o corpo.
Não sei quanto tempo permanecemos ali, mas foi como se o universo sequer existisse. Meu coração palpitava descontroladamente, como se tentasse compreender o que se passava dentro de mim. Mas não existiam palavras para descrever a plenitude de minhas emoções. Era algo que nunca havia experimentado antes. E quando ele se afastou de mim, precisei de alguns segundos para recobrar os sentidos.
- O que foi isso? – questionei.
- Só uma coisa que deveria ter feito há muito tempo – se afastou devagar.
Então, sem mais demora, se levantou e correu até os outros dois. Sozinha, vi quando se juntaram e tentaram criar uma barreira ao meu redor. Sabendo que era em vão, abracei meu próprio corpo e fechei os olhos, pois a eletricidade ocasionada pelo contato com Jimin, ainda não havia deixado meus músculos. Pelo contrário, parecia aumentar cada vez mais.
Com a cabeça latejando, não sei quanto tempo permaneci alheia ao que ocorria. Foi só quando ouvi novos disparos que olhei para frente, me deparando com uma nova cena. Jungkook agonizava no chão após ter sido acertado no ombro, Tae estava imobilizado, sendo mantido contra os ladrilhos brancos por dois caras com o dobro de sua estatura. Quanto a Jimin, permanecia de pé, cercado por quatro homens que apontavam suas pistolas prateadas para ele.
- Sabe, eu sempre achei que vocês fossem um time muito mais poderoso – de repente falou e, passando por seus homens, ficou cara a cara com Jimin. – Mas não são tudo isso.
- Diz isso por que estamos sem poderes – o garoto rebateu. – Gostaria de vê-la experimentar jogar limpo.
- Não é do meu feitio jogar limpo, você me conhece – sorriu de canto.
Então ela me olhou, me analisando por alguns segundos e riu abafado, fitando o rapaz à sua frente outra vez.
- Achei que nunca teria coragem para mostrar o que sente – seu tom era cheio de sarcasmo. – É uma pena que não faça mais diferença.
Sem deixar de encará-lo, a mulher ergueu sua arma, mirando-a bem em sua testa. Arregalando os olhos, ouvi o som da trava, mas ela não disparou.
- De joelhos – ordenou.
- Vai se ferrar... – o loiro disse com desdém.
- Ah... que menino atrevido – negou com a cabeça e então baixou a pistola, disparando contra a perna de Jimin, que foi obrigado a abaixar. – Assim está bem melhor.
- Sua... – disse entredentes, mas não completou a frase por conta da dor.
- Agora é a sua hora – sorriu para e ele e após se virou para mim. – Olhe com bastante atenção, minha querida . Tudo isso é por sua causa.
Sem tirar os olhos de mim, andou em volta de Jimin e parou às suas costas, me dando assim a oportunidade de ver seu rosto. Ele desviou o olhar, evitando me encarar. Apenas quando a mulher apoiou o cano da arma em sua cabeça é que me olhou. Em sua expressão havia muitos sentimentos, mas a culpa era o maior de todos eles e transbordava a ponto de acertar meu estômago como um soco.
- Me desculpe... – de repente ele disse, me pegando de surpresa.
Abraçando meu próprio corpo com ainda mais força, tentei conter o calafrio que percorreu toda a minha espinha. Por antecipação, voltei a chorar e a carga elétrica dentro de minhas veias parecia latejar. Ao ver nossa aflição, deixou que um riso escapasse pelo nariz.
- Adiós, mi amor... - dando um passo para trás, ela apertou o gatilho.
- Não! – gritei, sentindo meu corpo entrar combustão.
Tentei me conter por um segundo sem entender o que se passava, todavia, a força que havia em meu interior era absurda, escapando de uma só vez. Como uma pulsação invisível, tremulou o ambiente em volta, assemelhando-se a ondulação das águas de um riacho quando é acertado por uma pedra. Em câmera lenta, assisti a onda acertar todos em volta, lançando-os para longe.
O tempo voltou ao normal e pisquei os olhos diversas vezes, tentando acreditar no que havia acabado de ocorrer. Me levantei devagar, reparando na expressão perplexa de cada um ali. ainda estava no chão, mas me encarava como se não acreditasse no que via. Jimin, um pouco mais à frente, sustentava um semblante similar.
- Não pode ser... – a mulher murmurou desacreditada.
Num movimento veloz, se levantou e atirou. Jimin até tentou impedi-la, mas avançou muito tarde. Assustada, dei um passo para trás e meu movimento fez com que outra onda invisível surgisse. A única maneira de distingui-la era pelo fato de distorcer o ambiente. Diante dos olhos de todos, fiz com que a bala de prata se transformasse em pétalas de flores, que foram ao chão delicadamente.
Desnorteada, fitei minhas próprias mãos, percebendo que a sensação de estática continuava, agora de maneira mais controlada. Eu havia feito aquilo. Então era isso o que eu era? Alguém que podia transformar coisas em outras? Antes que pudesse obter uma resposta lógica, passei as mãos nos cabelos e a cada segundo meu desespero aumentava.
Eu era como eles e podia sentir. O poder circulava em minhas veias como se estar ali não fosse algo novo. A corrente de energia rapidamente me envolveu, correndo para as extremidades do meu corpo. Meus dedos formigavam e meus olhos ganhavam cada vez mais foco. Minha cabeça latejava, meu coração pulsava velozmente e meus pulmões trabalhavam ferozmente buscando oxigênio.
Cerrando os punhos, olhei para o céu, pensando que talvez Seokjin teria algumas boas palavras para aquele momento. Talvez eu conseguisse me concentrar. Mas ele não estava mais entre nós. Ao meu pensamento, sem que eu pudesse controlar, uma nova pulsação deixou meu corpo e elevou-se acima de nossas cabeças. Instantaneamente o céu encheu-se de nuvens negras e uma chuva se iniciou lentamente, mas logo tomando força.
Arfei surpresa ao sentir as gotas em minha pele e olhei para Jimin que agora estava ao lado de Jungkook com Taehyung. Suas expressões eram carregadas de assombro, porém, havia também uma faísca de esperança em seu olhar.
- O que é você? – de repente questionou e a fitei. – Não é possível que possa fazer tudo isso em tão pouco tempo.
- Ela é muito mais do que podemos imaginar – ouvimos uma voz familiar e todos olharam ao mesmo tempo para a varanda.
Arregalei os olhos quando vi Seokjin emergir das sombras, deixando que a chuva molhasse suas vestes. Seus olhos escuros brilhavam e em seus lábios um sorriso de canto demonstrava a plenitude de sua confiança. A passos calculados, veio até nós e parou em minha frente, me olhando nos olhos.
- Ela é a responsável por nossa existência – completou sua fala.
- Quer dizer que eu... – tentei formar uma frase, mas as palavras morreram graças a incredulidade.
- Sim, você me trouxe de volta – balançou a cabeça positivamente.
- Mas, você estava... – engoli seco, olhando o lugar onde Jimin o havia deixado sem vida. – Como isso é possível?
- Também não sei – apoiou a mão em meu ombro. – Mas vamos descobrir.
- Já chega dessa conversa, vocês estão me fazendo perder muito tempo – finalmente se pronunciou.
Nos viramos para ela e vimos seus homens formando uma barreira à sua dianteira. Eram dezenas empunhando suas armas prateadas.
- Seja lá quem você for, não vai durar muito tempo – às suas palavras, seus capangas se dividiram.
Alguns deles vieram em nossa direção, quanto ao restante foram até os outros garotos. Olhei para Jin, que permanecia sereno, apenas avaliando a situação.
- Jin! – agarrei seu braço com força.
- Tente alguma coisa – ele sugeriu.
- Mas o quê? – franzi o cenho.
- Qualquer coisa – segurou a minha mão entre a sua.
Confusa, tentei ordenar meus pensamentos, mas nada me vinha à mente. Olhei ao redor, tentando encontrar algo que valeria a pena mudar, até que meus olhos caíram sobre os três garotos do outro lado da área. Jungkook ainda sofria, perdendo sangue e Jimin tentava auxiliá-lo. Quanto a Taehyung, estava de pé, pronto para defender os companheiros.
De repente uma ideia me surgiu e a coloquei em prática. Segurando mais firmemente a mão de Seokjin, deixei que as ondas fluíssem de mim e chegassem até eles. No começo, nada pareceu diferente. Tae, porém, logo notou a mudança e me encarou sem acreditar. Eu apenas acenei com a cabeça uma vez e ele devolveu o gesto rapidamente. Logo após retornou sua atenção para os caras de preto que se preparavam para atirar.
Quando o som dos disparos encheu o ambiente, o rapaz apenas ergueu uma de suas mãos e uma bela aura cor de rosa quase transparente, surgiu ao redor deles, bloqueando o ataque. O que eu fiz havia dado certo.
- Genial! – Jin comemorou ao meu lado. – Consegue repetir?
- Acho que sim – disse, ainda que não soubesse a magnitude de minhas habilidades.
Usando um pouco mais de esforço, fiz com que o bloqueio que causava, fosse anulado, devolvendo assim o poder dos garotos. Jungkook, que antes permanecia deitado, não tardou a levantar, como se sequer tivesse sido acertado. Ao seu lado, Jimin o ajudava a se erguer e eles pararam um a cada lado de Taehyung, sustentando olhares determinados.
Jungkook deixou a segurança do escudo, avançando contra dois homens à direita. Primeiro, socou um deles que foi lançado contra uma das janelas, fazendo-as em pedaços. O outro recebeu um chute no peito, sendo arremessado contra uma parede que ganhou uma rachadura. Jimin disse algo a Tae e este apenas balançou a cabeça. Então, num piscar de olhos, ele desapareceu. Quando ressurgiu, o loiro estava ao meu lado, me pegando de surpresa.
- Hey! – ele tocou meu ombro.
- Jimin! – exclamei e o abracei com força, logo sentindo seus braços em minha cintura. – Ah meu Deus, você está bem?
- Não se preocupe comigo – se afastou e apontou com a cabeça para o outro lado.
Olhamos para lá, encontrando com o semblante carregado de ódio. Parecia não acreditar nos estragos que estávamos causando. Quando nossos olhares se cruzaram, os seus ganharam um tom avermelhado. Antes que pudéssemos reagir, ela abriu seus braços e fez com que fôssemos lançados para longe, me separando dos meninos.
- Não me importa quem você seja – veio em minha direção. – Esse é o fim do jogo.
Sem hesitar, correu em minha direção. Os garotos também tentaram avançar, mas havia criado uma espécie de bloqueio ao nosso redor. Eu me levantei o mais rápido que consegui a tempo de ver Jin e Jimin desferindo socos e chutes contra o escudo transparente, mas em vão. Assim que me pus de pé, um soco atingiu meu rosto e cambaleei desnorteada. Ela tentou repetir o feito, mas me desviei e corri para o mais longe possível.
- De que adianta tanto poder se não sabe como usá-lo? – riu com desdém.
Girando uma vez a pistola prateada entre os dedos, a apontou para mim e então atirou. Mais uma vez o tempo pareceu desacelerar e vi a bala vindo devagar. Num último segundo de clareza, ergui minha mão esquerda e fiz com que um portal semelhante a uma fumaça rosada surgisse. A bala entrou por ele e então desapareceram. No segundo seguinte, ainda que sentisse meu corpo protestar, fiz o portal ressurgiu atrás dela, que não teve sequer como lutar. O projétil a acertou em cheio, fazendo-a arfar.
Com os olhos arregalados de surpresa e dor, caiu de joelhos. Persistente, tentou usar a arma outra vez, porém, suas forças se foram e a largou. Quando caiu de lado, lentamente o escudo em nossa volta se desfez e os dois garotos correram até mim.
- Ei, está machucada! – Jimin segurou meu rosto, examinando o local onde eu havia sido atingida.
Pensei em responder, contudo, minhas palavras se perderam ao observarmos o que aconteceu com os homens de preto. Como se fossem feitos de fumaça, foram se desfazendo e por fim, levados pelo vento.
- Eram apenas uma criação dela – Jin disse ao perceber meu espanto.
Sentindo a ansiedade e a angústia diminuírem, aos poucos consegui me controlar internamente e a chuva cessou. Logo as nuvens escuras começaram a se dispersar e o sol brilhou intensamente como de costume.
- Nós vencemos? – Tae se aproximou, limpando o suor da testa. – Depois de tantas tentativas, vencemos?
- É, parece que sim – Jungkook vinha ao seu lado.
Jimin me ajudou a levantar e, apesar de finalmente todo aquele caos ter terminado, eles não pareciam realmente contentes e eu sabia o motivo. Nenhum deles ousou olhar para o local onde seus três amigos permaneciam sem vida e aquilo me cortou o coração. Eles haviam sacrificado tanto para chegar até aqui, mas não presenciaram o fim daquele ciclo.
Prendendo minhas lágrimas, caminhei até eles e me abaixei ao seu lado. Eles não eram meus amigos, mas me lembrava de cada um deles. Namjoon e sua gentileza, Hoseok e seu sorriso que conseguia iluminar qualquer lugar, Yoongi e sua inteligência. Todos eles haviam dado suas vidas por mim.
No começo não entendi bem porque o universo reservou algo assim para mim. Na verdade, ainda não compreendia. Todavia, não havia como mudar os fatos agora. Aquela era eu. E dessa vez eu poderia escolher o rumo de minha vida. Decidida, voltei a me aproximar dos garotos, que me olhavam de longe. Parando frente a Seokjin, esperei que me olhasse.
- Eu tenho uma solução para tudo isso – resolvi ser direta.
- Solução? – ele franziu a testa. – Mas tudo já está resolvido.
- Não é verdade – olhei de um por um. – Não é verdade e eu posso sentir. Cumpriram sua missão, mas a custo de quê? Da vida de seus amigos?
- Todos nós sabíamos dos riscos – Jimin passou a língua entre os lábios.
- Eu não – neguei com a cabeça. – E é por isso que não vou aceitar essa perda. Não quando posso mudá-la.
- O que quer dizer? – Tae questionou.
- Ainda não sei usar os meus... poderes – respirei fundo. – Mas o que tenho é suficiente.
- E o que sugere então? – o mais novo balançou os ombros uma vez.
- Vamos recomeçar – meu tom era firme como nunca antes. – Todos nós.
Os rapazes se entreolharam, como se ao mesmo tempo aquela fosse e não fosse uma boa ideia. Mas o que havia a ser perdido? Yoongi estava certo. Eu saber a verdade foi de extrema ajuda e seria quantas vezes precisássemos. Sem perdas, sem sacrifícios.
Trocamos um último olhar e logo confirmei que todos eles haviam cedido. Eles se importavam demais com os amigos para não concordarem. Suspirando, Seokjin pegou sua caixa de fósforos e tirou um palito de lá.
- Então... Nós vemos em breve – acendeu a chama numa só riscada.
Cerrando os punhos, acenei positivamente com a cabeça. Foi quando senti Jimin ao meu lado segurar a minha mão. Lancei a ele um olhar caloroso e apertei seus dedos com os meus para mostrar que tudo ficaria bem. Então, finalmente Jin assoprou o fogo. Imediatamente uma escuridão assoladora tomou tudo e por um momento não havia mais nada.


Epílogo


Quando a luz do sol atingiu meu rosto, ergui uma das mãos para tentar me proteger. Mais uma vez estava sem meus óculos escuros e me perguntei por que nunca os deixava na mochila, se sabia que os esqueceria. O pensamento ainda permanecia quando olhei para o outro lado da rua.
Levei alguns segundos para perceber, mas estava lá. O letreiro digital marcando 35 graus piscava próximo ao início da faixa de pedestres. Logo abaixo dos números havia também as horas, que alternavam por alguns instantes com a data e quando os números mudaram, arfei surpreendida.

06/11/2018


Era o recomeço. Seokjin havia reiniciado o dia mais uma vez, como eu tinha sugerido. Apressada, iniciei uma caminhada que me levaria até o bar a apenas algumas ruas de distância. Sem me incomodar com o suor que começava a molhar meu pescoço e minhas testa, apenas prossegui, me desviando das poucas pessoas na calçada.
Quando finalmente virei a esquina, parei de supetão ao avistar Taehyung. Ele chegava mais cedo do que o de costume e quando me notou também parou. Nos encaramos por um tempo que não pude calcular até que tomei coragem para prosseguir. Se ele estava ali, era provável que os outros também estariam.
Ao observar meus primeiros passos, o rapaz me imitou e não tardamos a nos encontrar em frente à porta do estabelecimento. Em seus olhos havia um misto de curiosidade e dúvida e por isso hesitou antes de falar, como se não quisesse dizer coisas demais.
- Está tudo bem – sorri de forma gentil. – Eu me lembro de tudo.
- Não sabe como isso é um alívio – deixou que o ar escapasse pelos lábios.
- Onde estão os outros? – olhei em volta.
- Por que não entramos e descobrimos? – ergueu as sobrancelhas de forma sugestiva.
Respirando fundo, balancei a cabeça uma vez, mostrando que concordava. Taehyung sorriu e, ajeitando os óculos, foi até a porta e a abriu de uma só vez. Ele entrou primeiro, então o segui e aos poucos pude vê-los perto do balcão.
Sentados ao meio estavam Jungkook e Seokjin. Ao lado do mais novo, Hoseok apoiava seu braço no ombro dele e Yoongi escorava-se na madeira, fitando o nada. Perto de Jin, Jimin mantinha uma mão no bolso e Namjoon mantinha-se sereno, como se nos aguardasse. Tae caminhou, parando no meio deles e então olhou para mim.
Assim que perceberam que eu já estava lá, Jin não demorou a se levantar e se aproximou.
- Estamos todos aqui – abriu os braços. – E então?
Me preparei para dizer algo, porém, uma sensação estranha me envolveu e parei, fitando o nada. Corri meus olhos para as janelas abertas e, lentamente, consegui entender o que aquilo significava.
- Ela está vindo – murmurei, mas eles puderam ouvir.
- E como sabe? – Hoseok perguntou.
- Eu posso sentir – esclareci.
- Ótimo! – de repente Jimin disse e, automaticamente, o encarei. – Ela não perde por esperar.
Tentando esconder o sorriso que ameaçava se formar, mordi meus lábios e apenas acenei com a cabeça. Em seguida, me virei em direção à entrada e cerrei os punhos. Logo eles entenderam minha posição e se juntaram a mim, ficando em minhas extremidades. Jimin parou à minha direita e Seokjin à minha esquerda, prontos para lutar.
Eu nunca havia desejado uma vida como aquela. Longe disso, sequer pensei em ser alguém especial. Agora, porém, não havia como voltar atrás. Nunca decidi meu destino antes e agora era a hora de mudar o que estava ao meu alcance. Eu era um deles e aqueles garotos dependiam de mim, assim como várias pessoas espalhadas ao redor do mundo.
Buscando coragem, aproximei meus dedos dos de Jimin, não demorando a sentir os seus entrelaçando-se a eles. Não nos olhamos, todavia, eu conseguia reconhecer a estática em meu corpo aumentar. Era a nossa conexão. A conexão que eu tinha com todos eles.
Juntos, iriamos por um fim àquele caos. E, juntos, tentaríamos quantas vezes fosse preciso.




Fim.



Nota da autora: Olá, pessoas lindas do meu coração! Passando para dizer que é a primeiríssima vez que escrevo algo com os meninos do Bangtan e estou feliz com o resultado. Pra falar a verdade, achei não conseguiria colocar em prática uma ideia como essa, envolvendo linhas temporais e super habilidades. Mas, pra quem é army, isso é comum, não é mesmo?! Kkkkkkk Enfim, espero que gostem da história e me digam lá nos comentários sua opinião. Rsrs. Minhas outras fics:

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Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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