Quinta-feira, 21 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América
Na grande sala dos o jantar estava prestes a ser servido e a noite era mais fria do que havia sido o dia. Todos estavam rodeando a estrangeira, fazendo perguntas e se divertindo com as curiosidades que contava sobre seu país. estava sentado ao lado dela, com um braço sobre seus ombros e sentindo o afago confortável de sobre sua coxa. Ele se surpreendia e se divertia com as diferenças entre os três países, Estados Unidos, México e Brasil.
As irmãs e o pai não cessavam de fazer perguntas, empolgados e curiosos, enquanto a mãe se mantinha isolada na cozinha, finalizando o jantar. Bre havia sido apresentada a também, e apesar de mais quieta que Alex e Auston, era divertida, inteligente e muito agradável. Alex e a brasileira também tiveram mais tempo para conversar e encontraram muitas coisas em comum uma com a outra. e Alex amavam livros, adoravam Fórmula Um e torciam para a Ferrari, amavam estar com as amigas, nunca dispensavam café gelado e eram caseiras, apegadas a família e trocavam tudo por um dia de bolinho e café.
– Então, vocês lá, eu sempre imagino todas vocês como a Anitta ou as garotas nos vídeos dela. – Bre comentou. Era a décima pergunta da irmã caçula de à sua nova namorada.
– Na verdade, não. – riu mexendo os ombros e recostando-se a . – Lá há uma grande diversidade, como aqui. Não temos exatamente um padrão. Assim como nem todo mundo gosta de futebol, de calor, de carnaval ou da Anitta.
– Imagine conhecer um brasileiro e ele não gostar de futebol, cerveja, carnaval ou samba. – Brian, o pai, riu. Ele estava de pé, apoiado as costas de uma poltrona porque, em suas palavras, não podia se juntar a eles por estar ocupado. Já fazia quase uma hora que ele estava parado ali, de pé.
– Acontece, é bem comum. – deu de ombros. – Acho que o maior estranhamento é quando conhecem um brasileiro raiz, do tipo que joga conversa fora, se mete na vida dos vizinhos, abraça e beija todas as vezes que se encontra com você...
– Eu não iria querer morar em um lugar assim. – fez careta, para ela a maior parte dos hábitos brasileiro eram pra lá de esquisitos. – Comer feijão e arroz todos os dias, sempre. Almoçar como se fosse um jantar e depois jantar de novo. Abraçar as pessoas, beijar as pessoas.
– Nem todos são assim, as de onde eu vim não costumam ser tão simpáticas. – olhou a mais jovem, sorrindo com a careta quase infantil de repulsa que ela fazia.
– A comida parece boa, mas é tudo muito pesado, sério. – Alex comentou, tinha a expressão parecida com a da irmã, enquanto ria. – É como quando vamos para o México, eu amo, mas meu estômago foi acostumado por muito tempo, até aceitar tudo com tranquilidade.
– É, nada saudável ou glamoroso. – Bre completou, sorrindo. – Eu gosto de brigadeiro, gosto de algumas coisas específicas, tipo açaí. Mas é como o México, eu gosto de visitar, mas não sei se moraria lá.
– Eu achei difícil me adaptar a de vocês, confesso. – assentiu. – As coisas são parecidas em alguns aspectos, mas no geral tudo é muito diferente, e...
foi interrompida com a chegada repentina de Ema a sala. A senhora correu os olhos pelo grupo rapidamente, mas não parecia muito feliz com a cena.
– O jantar está servido. – Avisou sem rodeios e lhes deu as costas. O sotaque dela era diferente. Não era arrastado como o sotaque de Brian, Alex e Bre, nem era mais limpo e neutro como o de .
O grupo se pôs de pé rapidamente, preparando-se para seguir para a mesa.
– Ela vai melhorar. – Bre sussurrou apenas para que e a ouvissem. – Você vai aprender que os não são rápidos de se conquistar. – A golfista piscou e apertou o ombro da namorada, em concordância. – Exceto o , mas isso você já deve saber. – O jogador mostrou a língua e Bre riu.
– Então eu não devo me preocupar com os olhares matadores e com o fato de ela ter me deixado tomar um banho quase frio no inverno? – arqueou uma sobrancelha e sorriu de lado.
– Ela podia ter te colocado pra dormir na sala, ou com a Alex. – Bre levantou um ombro e maneou a cabeça. – Aliás. – A morena buscou o olhar do irmão. – Já contou a ela que a Mama Saló morreu naquele quarto?
Bre lançou sua pergunta no ar e começou a se afastar. dirigiu a um olhar que era uma mistura de incredulidade e pânico. Enquanto o jogador encarava a irmã se afastar, feliz por ter semeado o caos, completamente abismado.
Não tiveram tempo de reação antes que a campainha tocasse.
Ema surgiu na sala, Brian e os outros trocaram olhares, como se se perguntassem quem estava esperando visitas. Pelas expressões fechadas, percebeu que a família não parecia muito fã de visitantes súbitos e criou uma nota mental sobre isso. Bre, que fora a única a não transparecer irritação com a chegada repentina de alguém, se apressou para a porta e a abriu. Do outro lado, com mãos nos bolsos de um sobretudo escuro e olhar ressabiado estava um rapaz loiro, alto, de postura desengonçada.
– Não fode. – sussurrou e lhe deu um puxão e o encarou com olhar confuso.
– Boa noite. – O rapaz cumprimentou a todos assim que se juntou à família. – Ema, Brian, Alex. – Saudou especialmente os pais, acenando com a cabeça. – . – Ao filho do meio, o cumprimento fora mais reticente.
não respondeu.
– Essa é a namorada do , . – Bre apresentou sorrindo e a médica brasileira correspondeu, saudando o outro visitante com um aperto de mão. – Esse é o meu namorado, Peter.
– É um prazer. – sorriu e balançou a cabeça.
– Igualmente. – Ele respondeu com um sorriso torto.
Alheio as apresentações, um clima tenso e pesado se instaurou entre a família . Apesar de Ema e Brian responderem o cumprimento do rapaz com acenos educados, todos pareciam tensionados. se sentia alheia a aquilo, como uma espectadora confusa, que chega na metade do filme e não entende como os dramas foram construídos. Os pais se entreolhavam, olhavam para Bre e Peter e depois para . Alex também olhava do visitante para o irmão, mas Bre encarava os pais e o irmão do meio de nariz em pé, sem hesitação. Peter parecia inseguro e tinha o olhar baixo e lábios apertados em um sorriso sem jeito, que mais parecia uma careta nervosa do que um sorriso.
demorou, mas enfim percebeu o que acontecia ali. Cutucou o namorado e lhe dirigiu um olhar repreensivo, torcendo os lábios, mas apenas rolou os olhos e deu de ombros. Ela então resolveu força-lo a agir, puxando-o pela manga de seu casaco, obrigando-o a olhá-la, mas ele ignorou. Tinha ouvido muito pouco sobre o namorado da irmã caçula, principalmente da boca do .
A família parecia um tipo de clã muito fechado, uma seita onde novos membros precisavam provar serem dignos. Apenas alguns eventos eram permitidos a namorados e acompanhantes, como algumas viagens em família e algumas refeições ou aniversários. A família tinha regras, do tipo, nunca passar férias entre amigos apenas se não tivesse um tempo com a família. Feriados importantes também deviam ser comemorados em família, assim como aniversários. Eram todos discretos, não eram do tipo festeiro ou que gostavam de estar entre muitas pessoas. .
se colocou no lugar de Peter, já namorava Bre por alguns anos, segundo as informações rasas que tinha conseguido arrancar de , mas mesmo assim, sequer era incluído em fotos de família ou em celebrações importantes. Ninguém o seguia em redes sociais ou tentava ser amigo dele, na verdade, era como se não quisessem que ele estivesse ali. O jovem sem jeito já devia ter passado por coisas muito piores do que uma cama que geme, uma sogra irritada e um rato no quarto, pensou ela.
olhou de Peter para Bre, depois para e estreitou o olhar, incrédula com a coragem do namorado. estava em situação menos favorável à de Bre, e mesmo assim se mantinha teimoso. Era a primeira vez que apresentava a família, bem no natal, mesmo depois de ter levado outras garotas a viagens de família e outros eventos. E apesar de Bre ser gentil e acolhedora com sua namorada, seguia sendo inflexível, rude e teimoso, se negando a cumprimentar Peter. A médica acertou o jogador com uma cotovelada e com o olhar, apontou para Peter. apertou os dentes, mas não cedeu.
– Oi, Peter. – Cumprimentou de má vontade e Peter apertou os lábios em um sorriso. O central buscou os olhos da namorada, como uma criança e ergueu as sobrancelhas, incentivando-o a melhorar. – Que bom que veio jantar também. – Disse de modo mecânico.
Os pais ainda se entreolhavam e Bre assistia a cena com olhos estreitos. fez com que o namorado se inclinasse em sua direção e sussurrou algo para que apenas ele ouvisse. a olhou com sobrancelhas unidas, como se quisesse se certificar de ter mesmo escutado aquilo e viu a namorada assentir com firmeza. Depois fez careta e tentou protestar, mas não deu brechas.
– Tá, vem, vamos jantar, então. – O jogador repentinamente mudou sua postura e guiou Peter pelo ombro, levando-o para a sala de jantar. – Minha mãe cozinhou. Deve ter alguma coisa que você gosta. – Falava ele, transformado. – Sente ali, aquele é o lugar da Bre...
o ouviu falar.
Enquanto os outros se afastavam em direção ao jantar, Bre se aproximou com olhos arregalados e um sorriso abismado nos lábios.
– O que você fez? – Quis saber ela, enquanto as duas se uniam ao resto da família, na sala de jantar.
– Estamos no deserto, então... digamos que ele só não quis ficar na seca. – Brincou a médica brasileira e Bre riu. – Disponha.
ocupou a cadeira ao lado de , Brian estava em uma ponta e Ema na outra, a esquerda de Brian, Alex, Bre e Peter, a direita dele, e . O jantar estava servido e parecia atrativo, assim como o cheiro. Havia lombo, saladas diferentes e cremosas, batatas e algumas outras coisas que não foi capaz de reconhecer.
– Você não falou sério, né? – O capitão sussurrou assim que a namorada ocupou um lugar ao seu lado, esticando o guardanapo no colo.
– Experimente. – respondeu entredentes.
– Qual é? – Protestou , choramingando. – Isso nem faz sentido. Você nem conhece ele.
– Não seja hipócrita, acabe com essa implicância idiota com o Peter e você vai ter o que quiser. – Ela deu de ombros enquanto era servida com uma fatia de lombo pelo pai de .
– Espero que goste, . – Ele piscou. – Ema cozinha muito bem, mas sendo brasileira, não sei se está acostumada com essa comida.
– Tenho certeza que está fantástica. – A médica sorriu, buscando o olhar de Ema, mas a matriarca parecia concentrada em seu jantar, mesmo que não aparentasse estar muito contente. – E nossa culinária se parece em vários pontos também. – Ela sorriu e viu Ema erguer as sobrancelhas.
– O que é isso, mama? – quis saber, prestando mais atenção a um prato específico sobre a mesa.
– Chili, amor. – Ema respondeu erguendo o rosto. – Ficou tanto tempo longe que já se esqueceu de como a comida de verdade se parece? – Ela perguntou, usando de um tom dócil, mas ressentido ao responder o filho com outra pergunta.
sorriu apertando os lábios.
– Claro que não, mama. – Ele negou com a cabeça.
– Não é muito comum lá no Brasil, é? – Alex puxou assunto, sorrindo para .
– Não, chili não. – riu fraco. – Mas provei muita coisa da culinária mexicana quando morei aqui em Scottsdale. Seu irmão também cozinha muito disso para mim. – A médica trocou um rápido olhar com o jogador, que sorriu doce. – No início eu estranhei um pouco, mas aprendi a gostar. Hoje em dia eu adoro, mas só confio e como o que o faz.
ainda sorria para o namorado, mas as expressões dos outros ocupantes da mesa congelaram por alguns segundos. Ema ergueu o rosto e encarou a estrangeira com olhar estreito.
– Mas é claro que a da senhora . Ema. Da Ema . Senhora Ema. – se atrapalhou, nervosa e tossiu, engasgada com sua própria voz. inclinou a cabeça, tentando segurar o riso. – A sua comida deve estar perfeita. Certamente. Muito boa. Não vejo a hora de experimentar.
baixou a cabeça e apertou os olhos, sucumbindo à sua vergonha. apertou os lábios e ergueu as duas sobrancelhas, Peter e Bre trocaram um olhar rápido, Brian e Alex permaneceram em silêncio, em absoluta concentração em seus jantares e enfim Ema desviou o olhar de .
– Então – Brian tornou a puxar assunto, já que o clima silencioso na mesa estava absolutamente constrangedor. – Um dia desses você devia cozinhar algo típico do seu país aqui. – Ele propôs sorrindo e a maior parte da mesa o acompanhou, se agradando da ideia, menos Ema.
– A ? – riu pelo nariz, com sarcasmo e recebeu um chute da namorada por baixo da mesa, que riu amarelo.
– É que eu não sou exatamente a melhor das cozinheiras. – explicou, tentando brincar.
– Não? – Ema tornou a ergueu o rosto e a fitar com olhos surpresos a nova namorada do filho.
– Não. – respondeu num fio de voz, tentando sorrir. – Não tão bem quanto... quanto...
– Que bom que o tem um chef de cozinha só para ele, né? – Peter fez piada.
Não se podia esperar que ele, alheio a todo o resto, compreendesse a delicadeza do momento, principalmente quando nem mesmo parecia compreender.
– Não muda muita coisa se sou eu quem cozinho quando estamos juntos. – O jogador respondeu, sorrindo. A parte boa era que o jogador pareceu minimamente socializar com Peter, a parte ruim era que em breve ficaria solteiro.
– Como? – Ema indagou e pensou ter visto um dos olhos da mexicana piscarem involuntariamente.
ainda ria e estava prestes a responder quando se virou para a mãe e viu seu semblante. O jogador engoliu suas palavras e se endireitou.
– Como o quê? O quê? – Fingiu-se de desentendido, enfiando um pedaço de lombo na boca. – Isso tá realmente muito bom, mama. Muito melhor do que qualquer coisa que eu tenha feito.
– Você quem cozinha? – A mãe insistiu na pergunta e o casal se entreolhou. Antes de responder também buscou o olhar do casal a sua frente, recebendo deles um olhar de pena que a fez sentir vontade de sair correndo.
– Eu não cozinho muito bem. Minha mãe até tentou, mas eu não sou exatamente talentosa nessa área. – admitiu depois de respirar fundo, baixando os ombros. – cuida de mim, nesse sentido e em vários outros.
– É, eu não ligo. – Ele assentiu, tentando ajudar a namorada. – Eu gosto. Pelo menos na casa dela eu tenho liberdade. Em casa sempre tinha alguém na cozinha, cardápio regulado e...
– Você está saindo da dieta? – Fora a vez de Brian questionar mais seriamente e , que tinha os lábios entreabertos por estar prestes a concluir sua frase, apenas os fechou devagar e negou com a cabeça.
– Não muito. – tentou melhorar. – O que ele quis dizer é que, ele gosta de cozinhar. É terapêutico.
– Em casa ele nunca teve que cozinhar. – Ema alfinetou e o casal trocou olhares rapidamente. – Aqui ele nunca teve que cozinhar. Sempre teve alguém para cuidar dele.
– É, mas eu gosto de cozinhar quando estou em casa com a , mãe. – falou depois de um suspiro longo.
– É, cozinhar faz muito bem. – Peter tentou ajudar também. – É bom para criar e fortalecer laços, eu ouvi dizer.
– É, as pessoas mudam. – Bre completou, em um suspiro sarcástico.
– Em casa com a ? – Ema inclinou a cabeça sobre o ombro e repetiu o que o filho havia dito após alguns segundos de contemplação.
e se olharam outra vez.
A médica sacudiu a cabeça negativamente, seu olhar gritava para que ele não fizesse o que ela tinha certeza que estava prestes a fazer. O central abriu e fechou a boca, depois se recostou mais confortavelmente na cadeira e ergueu os olhos para os pais.
– A gente tem passado muito tempo junto, praticamente morando juntos. – Contou de uma vez.
A visitante expirou derrotada e fechou os olhos, inclinando a cabeça.
– O quê? – Ema indagou sem se esforçar para disfarçar suas emoções.
– Vocês o quê? – Brian também se surpreendeu, inclinando-se um pouco sobre a mesa.
Peter encarou o prato sem qualquer reação, Alex inclinou a cabeça e assistia a cena por debaixo de suas sobrancelhas escuras, enquanto Bre fingia não estar presente.
– É, a gente tá. – afirmou. – E eu tô satisfeito com a ideia. Tô bem feliz, na verdade. Estamos, nós dois. – O central entrelaçou os dedos com os da namorada e segurou sua mão sobre a mesa.
– Amor, não é assim também. – tentou amenizar, rindo sem jeito. – Ele ainda tem a casa dele e eu a minha, só para esclarecer.
– É, mas só por enquanto. – torceu os lábios e deu de ombros, negando e olhando para a namorada, como se dissesse que o que ela dizia não fazia sentido.
– Sabe como ele é espaçoso, não é? – tentou se desvencilhar do namorado, sentindo queimar sobre si o olhar de Ema . – Sempre achando que todo lugar é a casa dele. – Ela ria nervosa.
– Mas é claro que lá é a minha casa também. – riu, negando a versão da namorada, sem entender o que se passava. – Se a gente dorme e acorda lá todos os dias, então é a nossa casa. – Ele riu pelo nariz, como se fosse óbvio.
Um dos olhos de Ema tremeu e a mexicana deixou cair o talher que segurava, causando um som seco quando a peça atingiu o chão. A família encarou a matriarca, assustados. Tudo que podia ouvir era o som dos seus batimentos acelerados.
– É sério? – perguntou de modo retórico ao namorado, em um sussurro. – Era mesmo a melhor coisa a dizer?
Quinta-feira, 21 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América
Depois do jantar desastroso, estava em sua cama dura outra vez. Vestia seu pijama e encarava o teto, ouvindo o barulho irritante e alto dos dutos do aquecedor na parede atrás da cama e contando quantos ruídos diferentes os dutos eram capazes de fazer. Apesar da claridade da noite que entrava pela janela sem cortinas, o quarto era um tanto assustador. Principalmente depois de saber sobre o falecimento de mama Saló, mesmo sem fazer ideia de quem era ela.
Se resolveu omitir aquela parte, muito provavelmente seria por ter algo de suspeito ou ruim naquela história. Será que a mama Saló era uma parente dos ? Será havia mesmo morrido naquele quarto ou era só implicância de Bre? Se fosse mesmo, será que haviam trocado a cama e o colchão? Ou estava dormindo no lugar de uma morta?
se remexeu nervosamente, ouvindo a cama gemer a cada movimento, tentando afugentar aqueles pensamentos. Evitando seguir a trilha de sua ansiedade, que a levava diretamente a imaginar uma outra mulher da família, tão infeliz quanto Ema com a escolha de , a perseguindo como um fantasma porque não era a mulher adequada a .
Besteira, .
Ela disse a si mesma, não devia estar tão preocupada com a aprovação de uma morta que nem sabia quem era e de Ema . Era óbvio que a opinião da família seria considerada por , mas cabia apenas a ele se preocupar com isso e lidar com o fato da mãe odiar sua namorada, não a ela. Dizia isso em looping, tentando fazer com que aquelas palavras se cristalizassem em sua mente, mas não estava funcionando. Evitava olhar para a porta do banheiro e em direção a porta do quarto porque temia ver o fantasma de uma mexicana de pé ali, com olhar de desaprovação, porque em sua cabeça, alguém chamada mama Saló só poderia ser mexicana. Só lhe restava o teto bege e o som dos dutos para lhe distrair enquanto a insônia e a ansiedade faziam sua mente girar.
Depois de alguns minutos – que mais lhe pareceram uma eternidade – ergueu o tronco e encarou o quarto. Não precisava iluminar o cômodo com o celular, porque seus olhos haviam se acostumado a claridade da janela. Podia ver com nitidez uma poltrona grande e de design antigo que estava perto da janela, próxima a porta do banheiro. Entre a porta do banheiro e a porta do quarto havia um armário de três portas de madeira maciça, na parede oposta a janela uma cômoda de mesma cor e aparência do armário, com seis gavetas. A cama era antiga, de dossel e a médica se perguntava sobre o motivo de algo tão antiquado. A presença da cama que rangia e quase cantava sobre seus muitos anos de existência não deixavam dúvidas quanto a idade do dono daquelas coisas. O resto da casa era de móveis convencionais, normais e até modernos, nada comparado ao quarto onde a Rainha Elizabeth devia ter dormido quando ainda era uma jovenzinha.
Passando os olhos pelo chão, pelo grande tapete estampado e possivelmente escurecido pelo tempo, viu um pequeno vulto correr e se abrigar junto a um dos pés da poltrona, no canto do quarto. Era um pequeno camundongo marrom com orelhas grandes e redondas. A médica se sentia em um filme, só não sabia ainda se seria Os Fantasmas de Scrooge ou se sobre a Peste Bubônica.
– Parece que tenho mesmo um colega de quarto. – cumprimentou em voz alta. – É um prazer, senhor Ratinho. Também está solitário, triste e ansioso? E veja, é só a minha primeira noite. Espero que ela não seja tão cruel com você quanto é comigo. – A visitante sorriu e observou o rato por alguns segundos, até se dar conta do que fazia e sacudir a cabeça. – Meu Deus, o que esse lugar está fazendo comigo.
A médica jogou-se sobre a cama outra vez e se deitou de lado para que pudesse acompanhar a movimentação do rato. De alguma forma não se sentia mais tão abandonada e insegura, já que, se ouvisse algo suspeito, poderia acreditar ser o ratinho e não um fantasma.
Ainda assistia o rato de olhos estatelados em sua direção quando sentiu seu celular vibrar. Era e ela atendeu de pronto.
– Alô.
– Ah, você atendeu. – Ele pareceu surpreso.
– Você me ligou, o que esperava? – riu fraco, confusa.
– É que eu não queria te acordar. – Explicou o jogador em seu tom suave. – Só percebi que era uma ideia ruim quando já estava ligando.
– Eu não estava dormindo. Não consegui.
suspirou e se fez silêncio do outro lado da linha.
– As coisas não estão saindo exatamente como eu imaginei. – comentou e riu fraco, sem graça.
– Nem me diga. – concordou, sorrindo também. – Se o quarto sem cortinas e banho frio no inverno não resolverem, ela tem um plano B, C... e assim vai. – Brincou a médica. – Não dá pra acusar ela de não ser criativa.
– Ela... ela não costuma ser assim tão... – hesitou, estava sem jeito. O jogador não queria falar mal da mãe, mas também não queria desamparar a namorada. – Dura. Não sei o que está acontecendo.
– Tudo bem. – não queria colocá-lo em uma situação ainda mais difícil, não o culpava por nada, entendia sua situação. – Ela deve ter seus motivos. Quer dizer, até hoje, ninguém é muito fã de brasileiros, sabe... – Riu a médica e o namorado a acompanhou.
– Eu posso ir até aí? – Perguntou após alguns instantes de silêncio. – Durmo com você e fujo cedo, pela manhã, de volta no meu quarto.
– Não. – riu. – Eu agradeço sua solidariedade, mas, meu plano é conquistar sua família, não dar a eles mais motivos para não gostarem de mim.
– Mas isso não é nem justo, amor...
– São só umas noites em um colchão ruim, uma cama que faz barulho. – Ela omitiu o medo de fantasmas, o camundongo e todo o resto. – Eu vou sobreviver.
– Então... – parou de falar e ouviu do outro lado o som da respiração dele ficar um pouco mais forte rapidamente, como se o jogador tivesse se mexido rápido. – Mostra seu rostinho pra mim na porta.
– Na porta? – riu e se sentou na cama, mordendo o lábio inferior, ansiosa e curiosa. – Que porta?
– Na sua. Do quarto.
desceu da cama, enrolando-se em um robe grosso e calçando chinelos, tomando cuidado para evitar o lado do quarto que pertencia ao camundongo. Quando a médica abriu a porta, encontrou parado, com a porta de seu quarto também aberta, no outro extremo do corredor. Os dois ainda estavam ao telefone e sorriram ao se encontrarem, mesmo que a distância. vestia uma calça de moletom e estava sem camisa, os cabelos mais compridos estavam bagunçados e ele tinha aquele sorriso lindo e travesso nos lábios.
– Isso é até interessante. – Ele sorriu grande do outro lado e sentiu crescer a vontade de beijá-lo. – Namoro escondido. Romeo e Giulietta. Falar escondido no telefone de madrugada.
– É, a diferença é que sua mãe ainda não odeia minha família, mas basta ela ter a chance. – Ela riu abafado, cruzando os braços na frente do corpo, mas mantendo o celular perto do rosto. – Tenho certeza que nem Shakespeare escreveria algo tão dramático.
Os dois riram e viu os ombros do namorado tremerem com sua risada e ele negar com a cabeça.
– Você é maravilhosa, . – Declarou o jogador após algum silêncio, a olhando fixamente.
– É que um jogador famoso resolveu me apresentar para os pais no natal, então não posso me sair mal. – Ela sorriu fraco, fazendo piada com a situação. – Mal posso esperar para amanhecer e descobrir de qual outra forma Ema planeja tentar me espantar.
– Eu vou falar com ela. – prometeu, adotando um tom mais sério.
– Tudo bem, podia ser pior. – sorriu. – Ela podia me colocar na sala, como fez com o Peter.
– Vocês brasileiros... – sorriu, inclinando a cabeça sobre o ombro. – Simpática demais até para reclamar. Não quando é sobre mim, mas... – Ele brincou.
negou com a cabeça e sorriu.
Poderia falar por horas sobre aquela situação, mas não por estar magoada. Na verdade, achava engraçado, não tirava a razão de Ema. De repente havia percebido que talvez não estivesse à altura de e talvez isso fosse óbvio a quem o conhecia bem. Apesar de ser latina como ela, não era o ideal de mulher disposta a cuidar da casa e marido, pronta para viver orbitando ao redor de . Ela não cozinhava, não falava espanhol e talvez fosse mais branca do que o esperado. Era engraçado. Ou fazer graça e tentar ler aquilo como algo engraçado fosse o escape da médica para lidar com a rejeição da mãe do homem que amava.
– Vamos dormir. – chamou o namorado, depois de sacudir a cabeça e se livrar dos pensamentos que sua ansiedade haviam trazido. – Amanhã é um novo dia.
– Tem certeza que não quer vir para cá? – Ele insistiu. – Eu tenho água quente e o único barulho que você vai ouvir aqui sou eu. – O jogador tentou faze-la sorrir.
– Não, tudo bem. – assentiu. – Vou desligar agora. Até amanhã, amor.
– Até. – sorriu.
afastou o celular do rosto e finalizou a chamada. De longe, viu o namorado fazer o mesmo enquanto ainda a olhava. sorriu e falou baixo, apenas movimentando os lábios: “Eu amo você.” Ela sorriu e também, fechou a porta rapidamente, antes que ele tivesse chance de responder, mas mesmo assim o jogador o fez: “eu amo você também.”.
You better watch out, you better not cry, you better not pout, I'm tellin' you why
Sexta-feira, 22 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América
A sexta-feira havia começado um pouco mais quente que o dia anterior, mas ainda era frio. Não havia neve, nem o vento cortante de Toronto, era um frio agradável, do tipo que se faz confortável ficar na cama até tarde, ou se embolar no sofá para assistir filmes de natal. tinha acordado cedo e por alguns momentos, havia ficado feliz por pensar que era um horário aceitável para se acordar. Mas quando desceu, todos já haviam tomado seu café da manhã, exceto que escolhera esperar a namorada. Era a primeira bola fora do dia, pensou .
Por outro lado, o café da manhã parecia agradável, pequenas panquecas, tortillas, pães, café, iogurte, leite, geleia e ovos. tentou agradecer a sogra pela refeição e elogiar a qualidade, mas Ema pareceu não se impressionar com as palavras açucaradas da candidata a nora.
e também não tinham conversado muito desde o início da refeição. Falaram apenas sobre as comidas disponíveis, sobre o clima e só. Não era uma situação estranha, estavam acostumados a nem sempre conversar quando a sós. Era – apesar de todos os outros fatores – apenas mais um café da manhã comum entre os dois.
– Ei, garoto. – Brian surgiu da cozinha, ajeitando luvas. Já havia cumprimentado a brasileira pela manhã. – Preciso de ajuda lá fora, o vento derrubou um galho grande essa noite.
– Sim, papa. – O jogador assentiu, bebendo de uma só vez o conteúdo de seu copo de leite.
piscou para , que assentiu sorrindo, depois ele se afastou com o pai. Enquanto via os dois se afastarem em direção ao armário debaixo da escada, se permitiu não pensar. Apenas queria aproveitar o silêncio daquela manhã, sentir o sabor de cada alimento, respirar devagar, aproveitar a viagem sensorial, estar presa no aqui e agora.
Não percebeu quanto tempo havia se passado quando o namorado voltou, ainda ao lado do pai, completamente vestido e preparado para o trabalho braçal, sorrindo como uma criança.
– Como eu estou? – sorriu, perguntando a namorada. – Estiloso?
– Ah, definitivamente. – assentiu sorrindo, admirando a sobreposição estranha de peças que o namorado usava. Enquanto isso, a campainha tocou e Ema passou por trás do filho para atender, sem se incomodar em interagir com os que estavam por perto. – Não te vejo bem assim desde...
– É uma boa roupa. – Brian abraçou o filho de lado e bateu em seu peito, sobre o pesado e fofo casaco preto. – Protege muito. As pessoas usam para escalar montanhas. É muito forte.
– E por que o senhor tem um casaco desses em casa? – quis saber, curiosa. – Pratica escalada? – riu pelo nariz, mas tentou disfarçar.
– Ainda não, mas nunca se sabe. – Brian respondeu orgulhoso. – Nunca se sabe quando se vai ser convidado para uma boa caçada nos polos. – uniu as sobrancelhas, surpresa com o mais velho e estranhando um pouco. Não era vegana nem nada, mas não fazia parte do fã clube de caça. – Quando eu era jovem, meu pai e eu íamos caçar, na chuva, na neve. Vários dias. Comendo peixe que pegava nos rios quase congelados, matando ursos grandes nas florestas frias, explorando toda a nossa América. – Contou orgulhoso e viu olhar para o pai com admiração, mas com um riso frouxo nos lábios que denunciava outra coisa. – Essa roupa era muito cara. Usávamos plásticos e pele.
– Caçando ursos? – A brasileira uniu mais as sobrancelhas, nesse momento Ema se uniu a eles, permanecendo parada perto da sala, em silêncio.
– Sim. – Contou Brian, aproximando-se mais da mesa. – E o outros bichos grandes também, usava as próprias mãos para pegar presas muito, muito difíceis. – Brian gesticulou e apertou os olhos e a voz, tentando imitar o esforço da época.
ergueu as sobrancelhas, devido ao estranhamento que aquela cena lhe causou. percebeu.
– Papa, acho que já tá ok. – Ele falou, batendo algumas vezes no ombro do pai, que buscou seu olhar, retomando sua postura. – Ela já entendeu. Ela entendeu.
– Ah. – Assentiu o mais velho. – Mas eu também posso mostrar a cabeça de...
– Depois. Depois, papa. – o interrompeu, sorrindo gentil para o pai.
– , querido. – A mãe enfim abriu a boca. – Max e Jamie estão aqui. – Avisou simpática.
– Aqui? – a olhou surpreso e a mãe assentiu em silêncio. – Como eles sabiam que... , vem. – chamou a namorada, agitando uma mão em sua direção. – Quero te apresentar aos meus primos. – A brasileira uniu as sobrancelhas confusa, levantando-se devagar. – Vem, . Vamos. – Ele a apressou.
O jogador tomou a namorada pela mão e seguido dos pais, abriu a porta da frente e encontrou os primos na varanda. Max e Jamie ainda viviam no Arizona com suas famílias, filhos e esposas. mantinha o vínculo com os dois, os encontrando com frequência quando visitava os pais.
Max tinha cabelo curto e barba grossa, era moreno como e tinha tatuagens que tomavam um pouco de seu pescoço descoberto. Ele e haviam feito muitas de suas tatuagens juntos. Ele era um homem alto, do mesmo tamanho que o jogador e devia ter a mesma idade que ele, mas o corte de cabelo e a barba grande o davam aparência de mais velho. Também era um pouco mais gordo, com barriga protuberante, e tinha um sorriso largo e bonito. Jamie era alto e magro, mais baixo que e Max, mais magro que os dois. Tinha cabelos pretos impecavelmente penteados para trás e definido com pomada, olhos castanhos e olheiras marcadas. Tinha risada mais alta, mas o sorriso não era dos melhores.
– Não acredito que você pensou em passar as festas em Dale e não avisar a gente. – Max riu, apoiando o peso no guarda corpo da varanda, cumprimentando o jogador de hockey.
– Eu ia. Juro. – sorriu ao falar.
O jogador se aproximou e abraçou os dois, cumprimentando-os de modo caloroso, enquanto aguardava e assistia paciente, quatro passos atrás. Max, assim que abraçou o jogador, percebeu a presença de e não evitou encará-la enquanto abraçava Jamie.
– E então, o que você anda pescando por aí, ? – Max perguntou, olhando para e pareceu enfim se lembrar da namorada.
Os pais estavam na porta, assistindo a cena e enfim tomou sua garota pela mão a trouxe para perto.
– Essa é , minha namorada. – apresentou sorridente. – , esses são Max e Jamie, meus primos e amigos de infância.
– É um prazer conhece-los. – A mulher sorriu e os cumprimentou com um aceno de cabeça e apertos de mão.
– Não sabia que você estava namorando tão sério. – Max comentou, enfiando as mãos no casaco. – Quanto você a está pagando? Deve ser algum tipo de dívida. – Brincou o mais alto, enquanto e o outro riam. – Você deve dinheiro a ele, não é? – Perguntou, inclinando-se na direção de .
– Como foi que se conheceram? – Fora a vez de Jamie indagar. – Aposto que ele a encontrou na estrada, amarrou e jogou na traseira. Só assim...
– Muito engraçado. – rolou os olhos. ria com eles, mas não sabia se devia. – Por isso não apresento ninguém a vocês.
– Não é por isso, você sabe. – Jamie implicou, sendo empurrado por . – Mas é uma garota bonita. . – Ele repetiu o sobrenome. – É latino?
– Deve ser, sempre temos algo em comum. – respondeu e maneou a cabeça. – Mas sou brasileira.
– Você foi longe dessa vez, . – Max ergueu o queixo ao falar, sorrindo. – Brasil. Mas sempre soube que você não se contentava com coisas pequenas.
– A gente se conheceu aqui, quando ela veio morar em Scottsdale. – Contou , abraçando quando a percebeu se encolher com uma rajada de vento frio. Ele estava equipado, mas a namorada não. – Antes que reclamem, estávamos mantendo só entre nós.
– Vocês estão sérios, então? – Perguntou, analisando o casal.
– Sim. – desviou o olhar dos dois para a namorada enquanto falava. – Juntos em casa. Tem sido bom.
– Agora você já pode sentar na mesa dos adultos, os homens sérios e casados. – Max ergueu a mão direita, exibindo uma aliança larga.
– Aqui as pessoas se casam cedo. – expirou um riso, explicando para .
– Na verdade, se casam com idades normais, que é encalhado. – Jamie negou. – Ou melhor, era.
– Cale a boca. – O central fez careta. – O que vocês vieram fazer aqui? Tenho muito trabalho com galhos caídos lá atrás e vocês estão em atrapalhando. – Brincou ele, apontando para trás.
– Você sempre tem algo lá atrás pra tirar, . – Max rolou os olhos, fazendo Jamie rir com sua fala de duplo sentido. – Mas vamos lá. Você não consegue sozinho, mesmo.
– Eu preciso te lembrar algumas coisas. – respondeu, devolvendo a ofensa do primo.
Max e Jamie desceram da escada, afastando-se devagar para os fundos da casa, mas pararam para esperar o parente jogador.
– Entra, se aquece um pouquinho. – sorriu, esfregando os braços da namorada e a beijou rapidamente. – E você não vai querer ouvir o que esses caras falam. – Ele riu e assentiu com a cabeça. – Papa, você vem?
O pai se juntou a eles e os quatro se afastaram, sumindo atrás da casa. e Ema entraram juntas.
– Ele nunca tinha mencionado esses dois. – A médica pensou alto, andando atrás da sogra.
– São coisas pessoais. – Ema respondeu rápido, em seu tom duro. – Ele não falou de você nem para a família...
apertou os lábios e preferiu não se explicar ou reagir a alfinetada da mais velha. Podia listar a sogra a imensa quantidade de coisas pessoas que os dois partilhavam, ou sobre porque não fazia diferença se ele havia contado a família sobre eles ou não, mas sabia que não era sobre isso. A questão ali era muito maior do que ela saber ou não o nível de intimidade que tinham, então resolveu não escolher aquela batalha como sua.
Logo as duas estavam de volta a grande mesa, onde o café da manhã estava posto.
– Será que eu posso ajudar a retirar a mesa? – se ofereceu, incerta e recebeu um olhar atravessado.
– Se você quiser... – Ema começou a recolher a louça. – Ou o faz isso em casa também?
– Depende. – respondeu sem pensar e atraiu a atenção da sogra. – Nós costumamos dividir. Às vezes sim, mas geralmente não. Ele fica muito na minha casa, então eu costumo cuidar dessa parte e de algumas outras.
Ema não respondeu.
– O que sua família faz no Brasil? – A matriarca indagou após algum tempo em silêncio.
hesitou, surpresa com a pergunta direta, pensou antes de responder, correndo os olhos pela mesa.
– Bom, meu pai trabalha na prefeitura e minha mãe é professora. – contou, evitando Ema e se concentrando em recolher a mesa. – Tenho uma irmã, ela é uma arquiteta.
– E por que você veio para cá? – Ema continuou sua inquisição enquanto enfiava tigelas na lava-louças.
– Bem, eu... – tossiu, limpando a garganta. – Eu quis experimentar. País novo, cultura, emprego...
– disse que trabalha no hospital geral, em Toronto. – Comentou a mais velha, seu tom era seco, sem muita emoção, positiva ou negativa. – Cirurgia.
– É isso. – A brasileira respondeu com cuidado. – Eu me mudei para o Canadá para trabalhar no hospital, justamente.
Ema ergueu o rosto para a nova namorada do filho, sem parecer muito tocada ou interessada, parou de falar.
– Sua mãe já conhece meu filho? Sua casa? – Ema tornou a inquirir e respirou fundo.
Seria uma manhã longa.
Sexta-feira, 22 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América
Depois de piadas infames, depois de tirarem carrinhos e carrinhos de galhos da porta dos fundos e da calçada, Max e Jamie tinham voltado para suas casas e suas famílias. Estavam ainda do lado de fora e seu pai, tirando o resto de galhos e limpando o que ainda impedia a entrada para o pequeno cômodo nos fundos da garagem onde o americano guardava ferramentas e equipamentos de caça. enchia um balde com folhas retirada da calçada, enquanto o pai assistia ao trabalho do filho apoiando o corpo ao cabo de uma pá.
– Acho que agora já basta. – Brian assentiu quando o filho ergueu o tronco, ajeitando a coluna e fazendo careta pelo esforço. – Agora, posso mostrar a ela a cabeça do alce. – Falou orgulhoso, batendo nas costas do filho e erguendo o balde de neve.
– Não sei se a vai se impressionar muito com uma cabeça de alce, papa. – riu abafado, vendo a movimentação do pai.
– Como não? – Brian franziu o cenho. – É uma cabeça de verdade. Que eu cacei. – Ele se vangloriou.
– Eu sei, mas acho que ela não gosta muito dessas coisas. – Opinou o jogador. imaginava qual seria a reação de ao se deparar com a cabeça gigante de um animal morto pendurada na parede. – A gente nunca falou exatamente sobre o assunto, mas ela... ela gosta dos animais vivos e é meio contra armas.
O pai agitou uma das mãos e estalou a língua com desdém, desconsiderando a opinião do filho. Tinha certeza que ela amaria aquilo, era bonito, era uma boa caça e estava muitíssimo bem conservada.
– E essa garota. – Brian tornou a falar. Estavam os dois de pé no quintal, segurava a pá em uma das mãos, já o pai usava a sua ferramenta para se apoiar. – Não é do jeito que as outras eram. – O americano projetou o lábio inferior e deu de ombros. – Mas até que é bonita também. – baixou a cabeça, sorrindo. – Eu simpatizo, mas ela é quieta demais. Não ri muito, não fala, nem parece latina. Sua mãe duvida, branca demais.
– Ela é, papa. – imitou o pai, apoiando os antebraços ao cabo de sua pá e a firmando no chão. – Ela entende muito bem o que é ser latina, também não é como as mulheres daqui, extravagantes e que parecem uma árvore de natal. E ela conversaria mais se vocês ajudassem, se a mamãe não implicasse tanto. – O jogador torceu os lábios, reprovando e viu o pai dar de ombros.
– Mas eu até falei de futebol. – Brian se justificou. – Ensaiei o samba, até.
expirou um riso fraco e rolou os olhos.
Os dois permaneceram em silêncio, contemplando o trabalho, deixando seus olhos vagarem pelo terreno que apesar do tempo mais frio, era de um verde vivo de causar inveja aos vizinhos. Enquanto os olhos viajavam distraídos, olhou para a janela de vidro grande da cozinha, encontrando a mãe e a namorada. As duas pareciam ocupadas com qualquer coisa e o jogador agradeceu internamente por pelo menos estarem juntas no mesmo espaço. Agradecia também a paciência de , tolerando todos os desconfortos sem reclamar.
– O que há com a mamãe? – O jogador indagou ao pai, que apenas o encarou, esperando mais contexto para aquela pergunta. – Essa implicância com a . Quartos separados, água fria, janela sem cortina, aquele quarto que não era usado desde quando eu era criança...
Brian ergueu os ombros.
– Não sei. – Respondeu. – Talvez ela tenha percebido algo que você não viu ainda.
Primeiro expirou um riso confuso e fraco, mas quando o pai não riu junto ou disse se tratar de uma brincadeira e manteve seu semblante sério, o jogador gargalhou.
– Eu vivo com ela há meses, passamos juntos vinte e quatro horas dos dias. – arqueou uma sobrancelha, ainda ria com incredulidade. – Mas está me dizendo que a mamãe colocou os olhos nela apenas uma vez e viu algo que eu ainda não percebi?
Brian assentiu, ignorando o riso descontrolado do filho.
– é uma mulher boa. – ensaiou se afastar, negando com a cabeça e ainda rindo, mas voltou. – Ela é minha amiga e minha namorada. E também gosta de mim. Ela é boa pra mim. – O jogador apontou para o pai. – Não tem como a mamãe ter visto algo que eu não percebi. Porque não tem nada assim para ver. Isso é... – Ele riu alto, jogando a cabeça para trás, mas sem humor. – É absurdo.
começou a se afastar, ainda estarrecido com aquela ideia.
– Sua mama só se preocuparia em analisar uma mulher se percebesse que você realmente está nas mãos dela. – O pai falou em seu tom firme e manso, atraindo a atenção do filho.
– Espera. O quê? – sacudiu a cabeça, perdido naquele raciocínio. – Analisar? O que quer dizer? Ela tá sendo analisada? Ela tá testando a ? – Questionou e viu o pai erguer os ombros como quem diz “vai saber”. – É, seria bom se ela parasse com esse teste idiota, então. – tornou a falar. – Ou daqui a pouco não vou ter mais uma namorada para ser testada.
Dizendo isso o central deu as costas ao pai e se dirigiu para dentro, pouco feliz.
Sexta-feira, 22 de dezembro de 2023
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América
Durante a tarde, para felicidade de , a havia convidado para um passeio. Explorar a cidade que lhe era tão familiar, mas que há alguns meses já não a visitava, e de quebra, se afastar do clima esquisito que pairava ao redor de Ema e que afetava ao casal.
Scottsdale era pequena, ficava perto do grande campus da Arizona State University, banhada pelo Salt River, era uma cidade localizada na parte oriental de Maricopa County e parte na grande Phoenix. Tinha recebido esse nome em 1894, homenagem a seu fundador Windfield Scott, um capelão do exército americano aposentado. A cidade estava decorada, o natal parecia ter enchido as ruas com sua magia e os habitantes estavam agitados. Por todo lugar que passavam, cruzavam com pessoas ansiosas e afobadas, carregando sacolas de presentes e compras que deviam ser para a ceia de natal. O Arizona tinha uma grande população de imigrantes e isso com certeza afetava no jeito com que as pessoas celebravam aquela data.
Por todo lugar também, pessoas acenavam, sorriam, diziam palavras agradáveis a , mas nenhum pedido de foto, abraço ou assédio. O jogador a tinha explicado antes que as pessoas ali estavam acostumadas demais à sua presença e além disso, naquele país o hockey e seus jogadores não eram tão conhecidos quanto no Canadá. Mesmo sendo um filho queridinho da cidade, não eram todas as pessoas que o reconheciam de pronto. Segundo ele contava, se divertindo muito ao dizer, se tivesse trilhado o caminho do baseball ou futebol americano, seria mais famoso em casa.
Talvez por isso ele amasse tanto o lugar. Conhecendo o namorado, podia-se supor que o fato da pequena cidade ser tranquila, sem a pressão constante de fãs de hockey ansiosos e intensos era o que mais atraía o central. moraria em uma ilha deserta se com ele fossem seus amigos e família. Apesar de não ser muito diferente, gostava de cidades visualmente bonitas e com boas opções de comida, agradáveis de viver, Arizona era uma dessas, por isso foi seu lar por tantos meses.
– Por que você tá me olhando assim? – indagou a namorada, rindo dela enquanto caminhavam.
Já a estava observando fazia muito tempo, desde que haviam saído de casa. era alguém muito expressiva, ela até conseguia disfarçar suas emoções, mas nunca os pensamentos. Enquanto pensava, costumava ficar tão absorta em sua própria mente profunda que não se lembrava de prestar atenção a sua expressão. Apesar da expressão da namorada não ser das piores durante o breve passeio, ele quis a provocar um pouco, puxar papo.
– Assim como? – Ela sacudiu a cabeça, voltando para a Terra e perguntou, confusa. Os dois caminhavam por uma pequena ladeira com vista para o rio, cheia de lojinhas e bares.
– Com essa cara de quem está odiando tudo. – riu pelo nariz ao falar e viu a namorada congelar.
– , eu... – Ela tentou se justificar e ele abriu a boca, chocado.
– Eu só brinquei. – Ele se surpreendeu. – Você tá odiando mesmo?
– Não. Não é isso. – A brasileira parou de andar para tentar se explicar. – Eu não odeio Scottsdale, eu morei aqui. Mas é só que...é que é tudo tem sido...muito diferente. – Ela hesitou.
– Diferente como? – , que tinha as mãos nos bolsos do casaco, ergueu as sobrancelhas para a encarar.
– Diferente. – Ela respondeu sem jeito, sem saber como falar, maneando a cabeça e afastando o olhar.
– Você não está sendo totalmente sincera aqui. – expirou um riso e manteve os lábios em um pequeno sorriso fechado enquanto negava com a cabeça.
– Bom, você também não foi totalmente sincero quando disse que sua mãe não tinha me detestado, quando te perguntei ao chegarmos. – apontou, dando de ombros. – Estamos quites.
– Então é sobre isso? – arqueou as sobrancelhas de novo, surpreso.
– Não é sobre isso. – Ela negou e os dois voltaram a andar. – Eu só estou dizendo. E eu não estou odiando nada.
– Você tem a mesma expressão aqui, a mesma que tem quando sai com as garotas, namoradas e esposas do time. – falou e o olhou, estarrecida.
– Eu não. – A brasileira cruzou os braços sobre o peito. – E eu não olho pra elas, eu mal me relaciono com elas.
– Você mente mal, . – devolveu rolando os olhos. – Mas nisso você tem razão, você não se envolve mesmo. – Ele suspirou, querendo atacá-la, mesmo que não soubesse bem o porquê.
– Ah, veja só... – A médica ergueu as mãos, como se rendida. – Desculpe, senhor que é super sociável e adora ficar aparecendo em posts falsos, fingindo ser amiga de pessoas que não dão a mínima para você.
– Eu pelo menos tento. – Ele respondeu azedo, ainda caminhando ao lado dela.
– E quem está mentindo agora? – estalou a língua no céu da boca.
– Quando eu me tornei o problema aqui? – O central apontou para si mesmo. Estavam chegando a um pequeno ponto na ladeira que servia de mirante para o rio, que devido ao frio estava vazio. – Você está com essa cara feia para tudo desde que saímos de casa.
– Eu? – Ela apontou para o próprio peito, ofendida. – Tudo que eu tenho feito é ser gentil e educada. – O namorado debochou com um riso de lado. – E se quer saber, é até difícil dizer o que é pior, ficar lá ou sair por aí para andar no frio. – falou baixo, sem pensar, rolando os olhos.
parou de andar e se virou para a namorada, encarando-a com a boca aberta e sobrancelhas erguidas.
– Você não disse isso.
– É fácil falar quando você tem água quente, uma cama boa e sem barulho e não precisa dividir o quarto com um rato que faz barulho a noite. – listou, erguendo dedos para ele a cada item. – E sabe o pior? Ele faz um barulho horrível quando rói a mobília da morta fantasma que também divide o quarto com a gente.
– Você é um monstro. – estava pasmo. – O rato não é nada comparado a isso. – Ele agitou o dedo indicador na direção da namorada, que trancou a expressão. – E não fale da minha avó.
– Sua avó? Mas que ótimo. – se surpreendeu, rindo sem humor. – E quando pretendia me contar que sua doce mãezinha me colocou pra dormir no quarto velho da sua vovó falecida? – uniu as sobrancelhas, ainda mais ofendido e irritado.
– E o problema agora é a minha avó e a minha mãe?
– Também posso citar seu pai caçador de animaizinhos indefesos e que se orgulha disso. – Ela projetou o lábio inferior e cruzou os braços.
– E pelo menos o meu pai é legal e tentou. – O jogador de hockey devolveu. – E minha mãe não é uma megera. Talvez só com você. – Ele se corrigiu. – Mas pelo visto, não sem motivo.
– Você é baixo. – disse pausadamente, com dedo erguido em direção ao namorado, estavam cerca de cinco passos de distância. – E sim, sua mãe é uma megera. Fique você sabendo.
deu as costas ao namorado e começou a se afastar, pisando duro, xingava em pensamento e sentia raiva. a imitou e começou a descer a pequena ladeira respirando fundo e pensando no quão idiota estava sendo. Os dois compartilhavam o mesmo pensamento, sobre como um ou o outro estavam sendo tolos, estúpidos, imaturos e burros.
planejava esperar em casa, sem se importar se ela se lembraria como chegar até lá ou não. Já que ela queria ser autossuficiente e não estava gostando da viagem, que desse seu jeito para sair dali. xingava o jogador por ser tão esquentado, enquanto desbloqueava o celular em busca de um Uber. Não precisava do namorado para voltar para casa, na verdade, nem sabia se queria voltar para casa.
Mas no segundo seguinte, a mente dos dois se perdeu, mudando de rota tão rápido quanto haviam entrado naquela. Como esperar que , sozinha, sem saber o endereço do condomínio dos pais, chegasse até lá. Estava frio, apesar de não estar mortalmente frio como no Canadá. Além do frio do banho em casa, ela passaria frio na rua. bufou irritado e deu a volta, girou em seu próprio eixo e começou a subir a rua, em direção ao caminho que a namorada havia feito. cedeu e deixou cair as muralhas da raiva tão rápido quanto as ergueu. Parou de andar e olhou ao seu redor, percebendo-se perdida entre letreiros e pessoas, pensamentos enraivecidos e sobre ter talvez exagerado um pouquinho ao chamar a mãe do namorado de megera. Ela não era uma, não tão megera, pelo menos – não que não estivesse se esforçando muito para a obtenção do título.
A brasileira suspirou, projetou o lábio inferior chateada e inclinou a cabeça, girou em seus calcanhares, pronta para ir atrás do namorado. Quando ergueu o rosto o viu vindo em sua direção, com lábios torcidos em uma careta impaciente e contrariada.
– Por que a gente começou a brigar mesmo? – Ela perguntou, caminhando na direção dele, confusa e chateada.
– Eu não sei. – respondeu balançando a mão uma vez frente ao corpo.
– Eu não acho sua mãe uma megera, nem seu pai ou sua falecida avó. – Ela choramingou ao ser abraçada pelo namorado pela cintura, segurando o rosto dele com as mãos. – Nem estou brava por você pelas coisas que se passaram desde que nós chegamos. – A médica uniu a testa a do namorado e ele riu abafado.
– Não te acho um monstro também. – começou a falar. – Nem que você merece o rato no seu quarto. Também não quis dizer que seu pai não é legal ou o resto das coisas que falei.
– Tá tudo bem. – riu, balançando a cabeça.
Os dois riram, ainda com testas unidas.
– Somos dois idiotas. – sorriu.
– É, mas não seria a gente se não tivesse uma briga dramática no meio da rua, no natal. – riu pelo nariz.
– Ainda não é nem véspera de natal. – Completou a brasileira e os dois riram outra vez. – Eu amo você, .
– Mas ama minha família também? – Ele riu, a provocando ao arquear uma sobrancelha.
– Uma coisa de cada vez, né!? – fechou um dos olhos, sorrindo e o namorado riu também, apertando os olhos. – Uma coisa por vez.
e se beijaram, enquanto sorriam. Ou sorriam enquanto se beijavam, seria difícil diferenciar.
Sábado, 23 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América
O dia anterior havia sido usado completamente para e , que depois de voltar muito mais tarde do que o planejado de seu passeio, se reuniram no quarto do jogador para aproveitar o resto da noite. só retornou aos seus aposentos quando Ema, de maneira insistente, bateu a porta avisando que era hora de dormir.
O dia seguinte também havia sido agradável, aos poucos percebia que quanto mais longe de ficava, menos ira de sua sogra ela atraia. Passara o dia todo com Bre e Alex, conversando assuntos bobos e leves, enquanto ajudava o pai com algumas coisas e encontrava os primos outra vez.
Mas à noite, , , Alex, Peter e Bre iriam sair. As irmãs haviam sugerido um passeio diferente, entre os jovens, e agradecia a misericórdia delas. Havia passado o dia grudada a elas, não por carência ou por estar muito afetuosa, mas sim por temer ficar sozinha com a sogra. Ema parecia muito motivada em descobrir detalhes dos antepassados mais distantes de , parecia buscar inconsistências na história de vida da brasileira, ou motivos para embasar sua decisão de que não era a garota certa para seu filho toda vez que a encontrava perto de . mal podia esperar pelo natal e pela hora de irem embora, voltar para o conforto e a paz de Toronto e fingir que aqueles dias nunca aconteceram.
Estava na sala de estar, junto com Peter, e seu pai, esperando Alex e Bre ficarem prontas. Fazia frio – nada como o gelado absurdo de Toronto – e estava seco, usava apenas um rímel, bastante hidratante, um pouco de corretivo sob os olhos, blush e um batom leve. Usava botas, calças quentes, um suéter lilás e um casaco quentinho e confortável para sair à noite. não estavam muito diferente, tênis, moletom e uma touca, além das pulseiras, brincos e os dois anéis que ele costumava usar.
estava no sofá, ao lado de , com a cabeça apoiada a seu ombro, Peter na outra ponta e Brian em uma poltrona, afagando entre as orelhas de Felix.
– Sabe, eu vi na TV, uma corrida de cães. – Brian começou a falar, atraindo a atenção do pequeno grupo. – Eles eram inteligentes. Colocavam os cães para correr como cavalos. Devia tentar com esse aqui. – Falou, dando dois tapas leves no lado de Felix, que resolveu se aproximar do dono.
– Não. Não, ele não precisa competir. – sorriu, inclinando-se para afagar o cão com as duas mãos.
– Até porque, ele só competiria em provas de comida e de sonequinha. – riu, olhando para o cachorro.
– Mas ele é um garoto esperto. – começou a fazer vozinha e afagar o cachorro. – Não é? Quem é o meu garotão esperto? O meu garotão? Quem é?
– Eu estava pensando. – tornou a falar, dirigindo-se a Brian. – Apesar de ter morado aqui, sei ainda pouco sobre o Arizona, sobre os Estados Unidos no geral, gostaria de saber mais. – Podia não ter o apoio da sogra, mas precisava garantir ao menos um voto a mais para seu lado.
– Ah, é, sim. – Assentiu ele. – Chame o garoto para passear por aí. – Sugeriu Brian. – Também, podemos pescar. Você pesca?
– Sim, na verdade sim. – assentiu sorrindo, sentindo-se animar. – Sempre pescava nas férias, minha irmã, meu pai, meus primos, tios e avô.
– Aposto que nunca pescou em um lugar com tantos peixes brutos e fortes como os nossos.
– Eu aposto que não. – Ela sorriu em concordância.
– É um bom esporte. – Brian sorriu e suspirou, depois silêncio. – Pescar então. Amanhã.
– O que mais as pessoas fazem por aqui? Além de pescar. – tornou a falar. – Que esportes são populares por aqui, quais o senhor jogava? Sem dizer hockey, claro. – e Brian riram e o mais velho cruzou os dedos sobre a barriga, pensativo.
– Bom, eu na verdade nunca joguei realmente hockey. – Contou Brian. – Foi uma coisa que o garoto inventou sozinho, porque uma vez nós o levamos a um rinque e ele se encantou à primeira vista. – Ele narrou, olhando de soslaio e sorrindo para o filho, que abriu um largo sorriso também. – Mas, eu jogava baseball. Além disso, minha época de jovem o esporte que mais praticávamos era a caça. Caça, muito.
– Mais do que o senhor já disse? – perguntou, um pouco incomodada.
– Ah, sim. – Brian gargalhou. – Aquilo não foi nada. Precisa ver a cabeça de alce que tenho pendurada. Enorme. Bruta. – Ele riu outra vez e a convidada arregalou os olhos. – Há uns dois anos também fui convidado para caçar na África, foi o melhor dia da minha vida.
– Oi?
arregalou mais os olhos, mas Brian não conseguiu terminar, Alex, Bre e Ema desceram as escadas falando alto, chamando o resto do grupo para irem, apressando os que já estavam prontos. Quando chegaram a sala, Peter abraçou Alex de lado e Ema correu os olhos pelos outros.
– , você ainda não está pronta? – A mulher perguntou agitada.
– Vamos nos atrasar ainda mais. – Bre comentou, sentando-se desajeitada no sofá.
– Não, eu estou. – sorriu sem jeito, um pouco confusa e instaurou-se um clima de velório na sala dos . – Estou pronta.
– Você vai assim? – Ema apontou, mirando a futura nora dos pés à cabeça. – Mas...
olhou para suas roupas, depois olhou para Alex e Bre. As duas vestiam vestidos, Alex um preto e Bre usava vermelho, meia-calça, sapatos de salto, casacos, o de Alex parecia ser de pele. Elas tinham cabelos soltos e escovados, maquiagens perfeitas e elaboradas como as que as noivas do Brasil usam, ou as produções especiais feitas por uma maquiadora profissional. abriu os lábios, mas não disse nada, demorou para raciocinar. Entendeu o que Cinderela devia sentir.
– É que eu... – mordeu o lábio inferior, sem jeito. – Não imaginei que a gente fosse sair assim... pensei que só fossemos comer por aqui perto, e também, o clima aqui...não tenho nada diferente para vestir. – Falou baixo, inclinando a cabeça.
– Se quiser, posso te emprestar alguma coisa. – Alex sorriu, empática, inclinando o corpo para esfregar o ombro de .
– É, podemos. – Bre também se ofereceu. – Com certeza você vai achar algo que goste. Alex trouxe vestidos lindos do México quando fomos lá.
– Mas está frio e... – apontou com o polegar para trás de si. Apesar do incômodo terrível pelo comentário, estava confortável e realmente gostaria de aproveitar a noite com tranquilidade, não estavam com vontade de se montar inteira para uma saída simples, em uma noite fria como aquela.
– Aqui as mulheres se arrumam bem, mesmo no frio. – Ema comentou, erguendo um ombro e apertou os lábios em uma linha fina. – Ou em qualquer clima. Você não é latina? Devia saber como é.
– Ela está linda assim. – interveio, colocando um dos braços sobre o ombro da namorada. – E está frio lá fora. Não precisa de nada disso, só vamos comer alguma coisa. está ótima como está. – O jogador trocou um rápido olhar com a irmã mais velha, que pareceu compreender de pronto.
– E brasileiros são brasileiros, americanos são americanos, e Mexicanos... bem, vocês entenderam. – Alex falou, tentando ajudar. – Roupas não importam. Vamos, vamos . – Chamou a mais velha, tomando a frente, puxando a brasileira pela mão. – Adiós, mama. Buenas noches, papa. – Ela acenou, rumo a porta, enquanto o resto do grupo a seguia.
Sábado, 23 de dezembro de 2023
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América
O bar estava lotado.
Cheio de pessoas jovens e não tão jovens assim que se divertiam no karaokê, cantando músicas em vários idiomas, de várias épocas diferentes, novas ou velhas. nunca havia ido aquele bar antes, era tímida demais para cantar em karaokês e preferia lugares mais calmos, onde pudesse conversar sem precisar gritar. Mas seus acompanhantes da noite pareciam não concordar, Alex, , Bre e Peter já haviam cantado ao menos uma música cada um. Alex e Bre cantaram Fabulous, da trilha sonora de High School Music, Alex fizera também um número brilhante de Nancy Sinatra com These Boots Are Made for Walkin', e Bre e Peter havia dado um show com Ain't No Mountain High Enough, de Marvin Gaye e Tammi Terrell. e Alex cantaram I Want You Back dos The Jackson 5 do jeito mais desajeitado possível, e a estrela do Toronto Maple Leafs, para surpresa da namorada, havia feito um excelente número de The Galway Girl de Steve Earle. Enquanto isso, lutava com todos seus argumentos para evitar subir ao palco, já se sentia péssima desde que saíram de casa, não precisava se expor ali também.
A maior parte das mulheres do lugar eram bonitas e todas, sem exceção, estavam super maquiadas, usando vestidos lindos, além de salto alto, obviamente. se sentia como há muito não sentia. Era desconfortável, tinha a sensação de que todos ali a olhavam e julgavam. Se sentia horrível com aquelas roupas, destoava dos que a acompanhavam e por isso tentava se esconder o máximo possível, curvada em um canto, sobre a mesa, usando os cabelos para cobrir o rosto e tentando – orando – para se tornar invisível.
Não conseguia aproveitar um minuto do passeio, enquanto o namorado, Peter, Alex e Bre riam e faziam brincadeiras uns com os outros, só conseguia sorrir fraco e se encolher, quase tornando-se parte do estofado dos sofás que rodeavam as mesas do bar. Nem mesmo ver solto, cantando em um palco para um público duvidoso a tinha animado ou distraído de seu fracasso.
– Que foi? – cutucou a namorada, apoiando em seguida os cotovelos sobre a mesa, estava ao lado dela, com olhos no palco. Peter e Bre cantavam uma canção no karaokê, parecia Brown Eyed Girl, de Van Morrison. Alex havia ido ao banheiro.
– O quê? – A médica sorriu fraco. – Comigo? Não. Está tudo bem.
torceu os lábios, negou com a cabeça e deu um gole em seu copo de cerveja. As pessoas, algumas o cumprimentavam, algumas sorriam, outras olhavam e comentavam sobre a sua presença desde a chegada do pequeno grupo.
– Olha, não fica pensando naquilo que minha mãe disse. – O namorado falou, voltando-se para ela e o encarou surpresa. – Aproveite a noite, deixe isso pra lá.
– Como sabe que estou pensando nisso? – ergueu as sobrancelhas. – Que eu supostamente estou pensando nisso. – Ela maneou a cabeça, se corrigindo.
– Supostamente? – riu pelo nariz. – Esqueceu que fui criado com duas irmãs? – O jogador esticou um dos braços, pousando-o sobre os ombros da namorada. – Isso é besteira, não tem nada a ver. As mulheres aqui são assim, mas você não precisa agir diferente só por isso. – desviou o olhar para tomar um pouco mais de cerveja. – Você nem é daqui.
– Mas e você? – Ele a olhou curioso. – Porque estamos em um bar na sua cidade e todas as mulheres aqui parecem ter saído de um seriado ou de uma passarela. – bufou, apontando para o público ao seu redor. – Todas lindas, loiras, hiper magras, vestidas como as garotas que eu vejo no Instagram, mas que não sigo para não me sentir mal comigo. E eu...bem, eu tô de jeans e com esse suéter sem graça que nem está na minha cartela de cores. Nem estou usando maquiagem direito, ou salto alto. – Ela apontou para si mesmo. – Eu sei que você não vai fazer nenhum comentário sobre a aparência delas ou a minha, mas imagino que seja frustrante pra você. A sua namorada ser a esquisita do bar, malvestida, feia e desarrumada. – suspirou chateada. – Devia ter ouvido sua mãe e pelo menos trocado de roupa.
O queixo de caiu – não apenas figurativamente.
– O que aconteceu com a minha namorada? – O central segurou o rosto da médica brasileira. – Porque a que eu conheço nunca, nunca pensaria que ser ela mesma poderia incomodar alguém. Ou pediria desculpas por isso. E a que eu conheço teria feito um discurso de três horas se eu tivesse feito qualquer comentário desse tipo. – O jogador fez careta.
expirou uma risada culpada e inclinou a cabeça.
– Você tem razão. – Ela assentiu. – Mas é que...
– Eu gosto da exatamente como ela é. – a interrompeu, falando sereno. – E eu não acho ruim a gente se vestir igual, acho engraçado e legal até. E não tô nem aí para um monte de mulher maquiada, fingindo não estar com frio ou desconfortável em um salto alto. Eu gosto de você justamente porque é diferente delas.
beijou os lábios da namorada suavemente.
– Eu amo você. – sussurrou e ele sorriu, olhando nos olhos dela por alguns instante, com aquele olhar bobo, sorrindo grande, mas sem mostrar os dentes.
– Prove, então. – sussurrou de volta, de repente e uniu as sobrancelhas e sacudiu a cabeça.
– Provar? – Ela estranhou.
– Prove. – sorriu e puxou , levantando-se da mesa. – Cante uma música comigo.
– ! Ficou maluco. – tentou protestar, mas só conseguia rir nervosa.
– Ei, nós somos os próximos. – O central levantou uma das mãos, atraindo o olhar da pessoa que cuidava das inscrições.
– , eu não canto. – estava congelada de medo, mas ria como uma psicótica. – Por favor.
– O que acontece no Natal dos , fica no Natal dos . – O central piscou, segurou o rosto da namorada e deu-lhe um beijo estalado. – A gente vai cantar.
puxava a namorada para o palco, e toda as tentativas dela de se agarrar em coisas, ou empacar no lugar foram frustradas. Ele a deixou no centro, sozinha, enquanto se apressava para o responsável, escolhendo a música que cantariam. Não demorou muito para o jogador encher o palco também, sorridente.
– . – o repreendeu entredentes, assustada. – Eu não sei cantar. O que você está fazendo?
– Confia em mim? – Ele perguntou em um sussurro, divertindo-se.
– Mas é claro que não. – Ela negou e o viu gargalhar, jogando a cabeça para trás. A música tomou o telão e os primeiros acordes vieram junto. A médica arregalou os olhos. – . O que é isso? Que música é essa? – Ela tentava disfarçar, segurando o microfone no apoio como se sua vida dependesse disso.
Now every man I see is a potential threat
começou a cantar, ele sorria para . Estavam de pé, um do lado do outro, mas o corpo do central estava inclinado e quase completamente voltado na direção na brasileira. Enquanto encarava a situação com olhos arregalados, congelada.
You've heard me saying that smoking was my only vice
enfim se voltou inteiro para a namorada. Ele cantava bem, mas estava apavorada demais para perceber. Ele tentava encorajá-la com o olhar e sorria para ela, animado com o fato de estarem cantando juntos.
Now everything is new
And all I've learned has overturned
I beg of you
olhou para a namorada e ergueu as sobrancelhas, acenando com a cabeça, engoliu em seco.
leu a letra, conhecia a canção, mas não o suficiente para que se lembrasse em seu atual estado de nervosos. A médica havia soltado o suporte do microfone e abraçava com força o próprio corpo. estava satisfeito e as pessoas que assistiam também, o jogador sorriu e assentiu, animado.
– Eu não sei o que estou fazendo. – grunhiu entredentes, encolhida e envergonhada.
– Só vá em frente. – falou apenas movendo os lábios.
olhou para o parceiro, para o público, para o telão com as letras, se encolheu um pouco mais e resolveu tentar. Alex, Peter e Bre tentavam a incentivar, agitando as mãos e mostrando sinais positivos. Afinal, seria mais vergonhoso se ficasse em silêncio.
A little small talk, a smile and baby I was stuck
I still don't know what you've done with me
A grown-up woman should never fall so easily
, a medida com que cantava, sentia mais coragem e olhava para de canto, sorrindo com ele. Tomando enfim coragem para relaxar os braços e segurar o pedestal do microfone. já havia se desfeito do dele e segurava seu microfone.
When I don't have you near
Unsatisfied, I skip my pride
I beg you dear
conseguia já cantar olhando para o namorado, um pouco mais solta, apreciando a letra e a música.
Lay all your love on me
Don't go sharing your devotion
Lay all your love on me
retomou a canção, aproximando-se de , cantando enquanto a olhava nos olhos e a namorada ria, dificultando a concentração dela.
They didn't last very long and they've been pretty scarce
I used to think that was sensible
It makes the truth even more incomprehensible
Dessa vez, não precisou de incentivo. Até mesmo conseguiu tirar o microfone do pedestal sem se atrapalhar.
And everything is you
And all I've learned has overturned
What can I do
Os dois pareciam em sintonia, principalmente quando entrelaçaram os dedos e se aproximaram mais.
Lay all your love on me
Don't go sharing your devotion
Lay all your love on me
E então, a música acabou.
Sábado, 23 de dezembro de 2023
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América
estava um pouco bêbado quando chegaram em casa de madrugada. Alex e Bre já tinham subido e Peter tomado seu lugar junto a Felix, no chão do quarto de . O jogador havia decidido parar e tomar um pouco de água antes de subir e o acompanhava.
– Honey, honey, how you thrill me, aha, honey, honey. – cantava, meio bêbado, meio sonolento, tropeçando nos próprios pés ao subir as escadas.
– Meu Deus, você vai derrubar nós dois. – ria, atrás dele, tentando ajudá-lo a se equilibrar.
– Honey, honey, let me feel it, aha, honey, honey. – se virou para encarar a namorada, sorrindo como uma criança travessa. – Honey, honey, don't conceal it, aha, honey, honey. – Ele cantou, fazendo uma coreografia boba junto ao corrimão da escada.
– Meu Deus, cantor, tenha pena de mim e suba logo essas escadas. – pediu, empurrando o namorado pelas costas e ele, como criança, subiu correndo os degraus que faltavam.
– . – Ela o repreendeu baixinho, segurando o riso. – Vai acordar seus pais assim.
– A gente devia começar uma banda. – O jogador abraçou pela cintura, com força, assim que ela conseguiu subir as escadas.
– Uma banda? – A brasileira riu cobrindo a boca, tentando não fazer muito barulho.
– A gente sai por aí, cantando e fazendo sexo e cantando e bebendo. – Ele começou a falar empolgado e cobriu a boca dele.
– ! – gargalhou com olhos arregalados.
– Vou dormir com você. – começou a andar, empurrando na direção de seu quarto.
– Não. Não. Ficou maluco? Não. – Ela negou, empurrando-o de volta. – Não mesmo.
– É, e eu também. – riu, lutando para afastar o namorado da porta de seu quarto. – E ele não está com você. – O namorado fez beicinho. – Vamos. Minha intenção é sua mãe gostar de mim, não me expulsar daqui. Regras são regras.
– Não seja chata. – Ele rolou os olhos. – Vamos dormir juntinhos. Você pode dormir em cima de mim, aí fica tudo mais macio. – Ele propôs, fazendo vozinha e a namorada riu.
– Não. Por favor. – o empurrou em direção ao quarto, encostando o corpo dele na porta. – Eu amo você, não me tente. Não. Por favor.
– ...
– Vamos fazer o que tem que ser feito. – Ela disse, enfiou a mão por trás de , girou a maçaneta da porta e empurrou-a levemente. – Eu amo você. Nos vemos amanhã.
Beijando-o rapidamente, correu para o quarto antes que o namorado tivesse tempo para raciocinar e a seguir.
Domingo, 24 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América
A véspera de natal amanheceu um dia claro e absurdamente frio.
tinha acordado mais cedo que o planejado depois da noite fora, e logo fora convocado pelo pai para ajudá-lo aos preparativos para a noite de natal.
ainda estava cansado e sentia a boca amarga, a dor de cabeça que lhe lembrava de ter bebido demais na noite passada. Mas não se arrependia. Fora uma experiência diferente sair na companhia das irmãs e da namorada, mesmo que , até metade da noite não estivesse em seu melhor momento. Tinha Peter ali, como namorado de Bre e pela primeira vez não era estranho tê-lo por perto. Era como uma reunião entre velhos amigos, mais que isso, uma reunião familiar. E quando pensava sobre como gostaria de viver a vida, com as irmãs e suas famílias, aquele tipo de sentimento sempre lhe vinha à cabeça. Estava feliz em ter se aberto para as ideias de , em ter cedido a irmã e parado com as negativas, em ter dado a Peter uma chance. Bre parecia feliz ao lado dele e Peter também não agia como um babaca.
A noite anterior estava guardada como uma foto nas memórias do jogador. Os cinco sentados na mesa daquele bar, comendo batatas fritas murchas no final da noite, rindo da falta de habilidades de Peter no palco, enquanto o próprio Peter assistia Bre fazer piadas sobre ele, a olhando como um bobo apaixonado. Alex ria alto, mastigando qualquer coisa, e também, abraçados, rindo das piadas de Bre – ou da expressão apaixonada de Peter. Era bom. O tipo de memória que você pensa quando se lembra de casa e sente saudades.
Claro que, a memória de cantar junto a em um karaokê também era muito agradável. Não costumava cantar em outros lugares além de sua casa – em Toronto ou Arizona – mas por alguma razão, naquela noite se sentia extremamente motivado. Talvez tocado pela felicidade de estar em casa com as pessoas que mais amava no mundo, ou talvez pela vontade de fazer se sentir melhor.
Se sentia entre a cruz e a espada. Confuso com a reação da mãe, o modo com que ela agia com , não entendia porque falava e fazia aquelas coisas. Mas, também não estava certo se devia questioná-la. Talvez conversar, pedir que a mãe tivesse um pouco mais de paciência com a namorada, enquanto torcia para que aquilo não fizesse desistir da vida junto a ele. Tinha planos para aquela noite e a relação espinhosa da namorada com a mãe precisava parar se quisesse pô-los em prática.
Por isso, se preocupava, tentava ficar por perto e fazer companhia a ela. não tinha dito nada sobre querer voltar para casa ou sobre irem para sua casa no Arizona, e com isso acreditava que fosse Deus ou o destino dando mais uma chance para que Ema visse na médica quem ela era de verdade.
Quando percebeu que quase era a hora do almoço, agradeceu ao pai por facilmente aceitar paralisar o trabalho. Queria ver se precisava de algo, ou se a mãe já havia afugentado de vez. Entraram na casa pela porta dos fundos e não ouviram nada até chegarem a grande sala de jantar. Só então ouviram os risos que ecoavam da sala. e Brian se aproximaram devagar e encontraram Bre, Alex, e Peter perto de Ema. Estavam sentados no chão, sorrindo e tomando alguma bebida quente, enquanto rodeavam a grande caixa de fotografias antigas da família.
– O que estão fazendo, vocês? – Brian quis saber, anunciando sua chegada, atraindo o olhar de todos.
trocou um rápido olhar de cumprimento com a namorada, mas se manteve em silêncio.
– Chegaram na hora certa, a gente estava mostrando a e ao Peter fotos de família. – Bre contou, sorrindo para os dois recém-chegados.
– Você era tão fofinho. – comentou e expirou um riso envergonhado, depois balançou a cabeça e se aproximou. Ema rolou os olhos.
– Me mostre o que estão vendo.
– Eu não acredito que você guardou essa? – gargalhou e apertou contra si uma foto, impedindo a namorada de ver quando ela se inclinou em sua direção. – Mãe, por que tirar uma foto assim? Que foto mais vergonhosa. – Reclamou, vermelho como as bolas da árvore de natal.
– Qual o problema da foto? – Ema, que estava sentada em uma poltrona, tomando café, perguntou.
– Que foto é essa? – quis saber, curiosa, tentando roubar a foto do namorado.
– Você não vai ver isso. – Ele negou e em seguida voltou seu olhar para a mãe. – Ninguém avisava que essas fotos eram péssima ideia?
– Ela tem a foto daquele dia, que você tirou a roupa quando foi ao banheiro, naquele restaurante, e entrou no salão com os shorts nas mãos. – Alex lembrou, fazendo os outros gargalharem e arregalar os olhos, em pânico. – Está bem aqui, em algum lugar. – A irmã mais velha começou a procurar.
se distraiu por alguns instantes, chocado com a revelação da irmã e se aproveitou para roubar a foto das mãos do central. tentou lutar, mas foi em vão.
– Olhe, , que lindo! – sorriu. – Você na banheira. Você tinha quantos anos aqui? Uns quinze? – A médica riu alto e o jogador fechou os olhos e suspirou, enfezado.
A chaleira começou a chiar na cozinha.
– A segunda rodada de chá. – Ema ergueu o rosto e o dedo indicador. – Quem quer chá? – Ela perguntou de modo retórico antes de se levantar e se afastar.
– Eu vou esconder isso. – se adiantou e catou o álbum que a mãe folheava antes de se levantar e ir para a cozinha. Em seguida ele cruzou as pernas e escorreu, apoiando-se desajeitadamente em uma poltrona. – Eu acho que gostava mais de quando você não conhecia minha família. – Brincou o jogador e a namorada o acertou na costela.
– Saiba você que eu estou amando ver suas fotos constrangedoras. – sacudiu no ar a foto que tinha em mãos. –Você realmente tinha quinze anos aqui?
– Não. – O jogador riu pelo nariz, olhando a foto com mais cuidado. – Uns treze. Acho que foi quando eu estava entre bonito e popular, para esquisito e detestável.
– Eu gostaria de você, mesmo sendo esquisito e detestável. – suspirou.
– Diz isso porque me conheceu agora. – a olhava com olhar apaixonado, divertindo-se com o momento. – Se eu sentasse do seu lado nessa época, você teria me chutado.
– Quem disse que não quis te chutar, quando sentou do meu lado naquela noite? – arqueou uma sobrancelha e abriu a boca, teatralmente chocado.
– , você pode me ajudar com o chá? – A mãe chamou da cozinha e arregalou os olhos.
– Vai lá. – a motivou, sorrindo de lábios fechados, erguendo as sobrancelhas de modo sugestivo.
– Mas o que eu faço? – Perguntou a brasileira, beirando o desespero em se imaginar perto da sogra, sozinha.
– Ajudar com o chá. – Ele incentivou de novo. – Alguém tem que dar o primeiro passo. – Ele a olhou em um pedido silencioso. assentiu, respirou fundo e ficou de pé. – Eu vou pensar numa resposta pra você enquanto isso. – O central sorriu e piscou. – E ela vai ser muito boa.
– Você sabe fazer chá? – Ema indagou, passando por se dirigindo a um armário, sem dar muita importância a ela. A brasileira assentiu com a cabeça, respondendo à pergunta da mais velha.
– S-sim. – gaguejou, depois respirou fundo e sacudiu a cabeça. – Não tinha visto o desde ontem. – começou a falar, puxando assunto com a sogra, sem entender exatamente o que ela pretendia com aquele convite. – Chegamos tarde e quando eu... – Ema a cortou.
– Sim, ouvi vocês chegando.
– Ouviu? – A brasileira ficou alerta, pensando no que a mãe do namorado podia ter ouvido.
– Sim. – Ema assentiu, não tinha uma expressão muito serena. Na verdade, estava com uma expressão fria como mármore.
inflou as bochechas e inclinou a cabeça, não sabia o que fazer ou falar. Desejou que o chão se abrisse e que pudesse desaparecer, ir para outra realidade paralela onde não existisse o olhar crítico e julgador de Ema . Ao menos não tinha permitido que entrasse em seu quarto, se tivesse cedido, certamente a expressão da mulher seria pior.
– O que sua mãe acha sobre o namoro de vocês? – Ema voltou com o assunto que a visitante não queria abordar e sentiu crescer a vontade de correr, mas decidiu ser firme. Lembrou-se do que tinha dito na noite anterior, devia voltar a ser ela, ser sincera, corajosa e não ter medo de assumir quem era de verdade.
– Na verdade, minha família não interfere muito ou dá opiniões sobre meu namoro. – Contou firme e viu Ema estreitar o olhar e franzir a testa, surpresa e talvez um pouco insatisfeita. – Não que... não que vocês... ou que não devam por que eu não quero, é que... – Ela tentou explicar quando percebeu a expressão dela, mas apenas se atrapalhou mais e perdeu toda firmeza, ficando nervosa. – Eu quis dizer que eles não ligam. Não. Eles ligam, mas... eles... eles não...
– É, meu filho me conta o que acontece. – Ema tornou a interromper. – Eu sei. Ele liga para a minha opinião, geralmente bons filhos ligam.
entrou em pane. Outra vez. A brasileira inflou as bochechas e baixou o olhar. Queria sair correndo, mas não seria educado e ainda não sabia se havia algo a mais para o convite de Ema, ou apenas mais uma tentativa para afugentá-la.
olhou rapidamente para a ilha na cozinha, vendo ervas e percebendo uma chaleira no fogão, que chiava. Ema começou a organizar xícaras em uma bandeja e biscoitos, em silêncio, enquanto apenas observava. Até que ergueu os olhos para a médica, como quem espera uma resposta. olhou para os lados, confusa.
– O quê?
– O chá não vai ser feito sozinho. – Ema a lembrou, apontando com o queixo para a chaleira.
– Ah, claro. – assentiu rápido. – O chá. Claro. – A brasileira apontou para as ervas sobre a ilha, mas a única resposta que teve foi um olhar incrédulo por parte da candidata a sogra. – Claro. O chá.
se virou para o fogão. Sentiu toda informação sobre o preparo de chás se esvair de sua mente, assim como a água quando se tentava segurá-la nas mãos. Péssimo momento para ter um branco, cérebro.
– Sinceramente, esa es la clase de mujer que trae para Navidad en familia. – Ema começou a reclamar baixo, em espanhol, mas não conseguiu fingir não escutar. – Justo para Navidad. Para la familia. No puedes hacer té sin un mapa. No me sorprende que mi hijo tenga que cocinar en casa. Que Dios tenga misericórdia.
– Disse alguma coisa? – fingiu, virando-se para a sogra. Sentia as últimas gramas de paciência escaparem por entre os dedos, assim como seu conhecimento sobre o preparo de chá.
– Não, querida. – Ema respondeu, torcendo os lábios em uma careta debochada.
O tom da mexicana fizera o sangue da brasileira começar a esquentar. rasgou as ervas e as jogou na água quente, abafando em seguida. Apoiou as mãos a pia, enquanto aguardava.
– Mal tipo, mal té, mala chica. – Ema seguiu resmungando, mais baixo dessa vez.
se irritou, muito.
Virando-se rápido, pegou a tigela de biscoitos que Ema havia posto na bandeja e jogou inteira sobre a mexicana maquiavélica, enquanto ria e sentia-se vingada pelo quarto, o fantasma, o rato e a cama que geme.
A brasileira sacudiu a cabeça, voltando a realidade, já que diferente de em sua imaginação, não podia fazer aquilo com a mãe de sem ficar solteira. Respirou fundo, depois pegou a chaleira e se virou, colocando-a na bandeja, sob o olhar atento e crítico de Ema .
– No te preocupes, lo haré, suegra. – a provocou, sorrindo para a sogra, usando todo o pouco espanhol que havia aprendido no Duolingo.
A brasileira saiu da cozinha sorridente, a expressão de choque e incredulidade de Ema fora impagável. Quase tão saboroso quanto jogar uma tigela e biscoitos sobre a sogra.
Domingo, 24 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América
Durante a tarde de domingo a família ignorou o clima frio, o fato de ser véspera de natal e o péssimo horário para pescaria e foram todos pescar. , ao contrário deles, não conseguia ignorar o frio, ou o fato de que deviam estar em casa se preparando para a ceia e não ao redor de um rio ou lago, pescando. , Peter e Brian pareciam sequer perceber o vento frio enquanto andavam pela margem de um lago largo para encontrar o melhor ponto para a pescaria. Alex, Ema e Bre se dividiam em preparar iscas, cadeiras e tirar fotos. não conseguia relaxar e curtir o momento junto a eles, tentava abraçar o corpo e se esfregar, tentando se aquecer mais, enquanto reclamava por pensamento por estarem ali.
Depois de conseguirem um lugar suficientemente bom para a pescaria, o pequeno grupo estava sentado, concentrado com suas varas em mãos, concentrados nos molinetes. Por sorte, havia ali perto uma cabana de caça, que pertencia aos , e fora liberada pela família para buscar abrigo. Depois de algum tempo de pescaria sem sucesso, se aproximou da namorada, sentando-se perto dela e a puxando para junto de si, beijando sua testa coberta pelo capuz do casaco de moletom que ostentava o número do namorado e nome do time dele.
– Se divertindo? – Ele perguntou.
– Ah, claro. – ironizou e riu abafado, sendo imitada por . – Eu amo pescar no inverno, em plena véspera de natal.
– Isso é meio que uma tradição de família. – Ele contou com um sorriso. – Tem as tradições de decorar a casa, fazer biscoitos... a gente perdeu algumas, mas essa deu para aproveitar. Pense bem se quer mesmo fazer parte dessa família no futuro? – falou contra a testa dela, depois de beijá-la outra vez. – Pescar no gelo, fotos de infância humilhantes...
– Isso é um convite? – ergueu o rosto para ele e o jogador riu.
Fez-se um breve silêncio.
– Ainda é estranho pra mim, tudo isso. – voltou a falar, sentindo o aperto do namorado se intensificar ao seu redor. – Vivi aqui por meses e é como se eu fosse uma turista conhecendo a sua cidade. Fora sua mãe e seu jeito dócil e amável de demonstrar o quanto está feliz com a minha presença. – Ela ironizou.
– Esse é o charme de Ema . – O jogador sorriu e maneou a cabeça.
Concordava com a namorada, o comportamento da mãe havia sido mesmo repentino e estranho, mas não perderia tempo pensando nisso, preferia aproveitar a onda de bons sentimentos ao lado de sua garota. Além disso, há algum tempo uma questão despontava na mente e coração jogador, e a cada segundo se percebia mais incomodado com ela – de um jeito bom.
– Acho que tem uma coisa que a gente precisa conversar. – A brasileira o olhou confusa. – É uma conversa. – Ele maneou a cabeça e a olhou, tentando falar com os olhos.
– Uma conversa? – Ela devolveu.
– É, aquela conversa. – assentiu com a cabeça. – Aquela conversa, específica.
– Mas que conversa especifica é essa? – A médica ergueu as sobrancelhas.
– A conversa especifica que os casais tem... – desviou o olhar para onde o pai lutava com o molinete, fugindo das sobrancelhas unidas em confusão da namorada. – Acho que a gente precisa se resolver. Fazer a vida andar, eu quero fazer a minha vida andar com você. – a olhou nos olhos.
respirou fundo e prendeu a respiração sem perceber.
– Tá na nossa hora. – Ele ergueu as sobrancelhas.
– Essa conversa é sobre o que eu tô pensando? – perguntou com olhos arregalados. Praticamente moravam juntos, como o namorado tinha dito para a mãe, estava feliz com isso e surpresa com aquele assunto. – Tipo, aquela conversa?
– É, eu acho que é a mesma conversa que estamos pensando. – falou com firmeza. – Eu sei que meu convite para esse natal foi repentino e te assustou, não quero repetir. Então, só queria que pensasse sobre isso. Que a gente pensasse junto. Pensasse sobre uma vida de verdade juntos, tipo os meus pais, os seus, uma família... – sentiu o ar faltar. – Eu tenho certeza do que eu quero, penso nisso sempre de uns tempos pra cá.
– Mas e se eu ainda não tiver certeza? – o olhou, estava insegura.
Era um passo importante, envolvia muita coisa e por mais que parte sua tivesse total certeza sobre seus sentimentos, tinha medo de dar aquele salto, tinha medo de falhar naquele salto.
– Por isso que a gente tem que conversar, pensar sobre. – apertou os lábios em um sorriso fechado e desprendeu algum tempo olhando para os detalhes do rosto queimado pelo frio de Toronto da namorada.
o imitou e ficaram ali, no silêncio cúmplice por algum tempo, até serem despertados pelos gritos agitados da família. O casal então prestou atenção na cena. Todos estavam empolgados e afobados ao redor de Bre, que puxava com dificuldade a vara de pescar. Peter se apressava ao lado dela, tentando ajudar a mais nova dos com o molinete. e se uniram a empolgação e se apressaram em direção ao grupo. Já estavam perto o suficiente quando Bre conseguiu tirar o peixe da água gelada, revelando um bruto e grande animal que se sacudia como se sua vida dependesse disso – literalmente – e espirrando água para toda parte.
– Puxe com mais força. – Brian ordenou e se adiantou para ajudar a irmã.
Peter ajudava Bre a sustentar o peso da vara, Alex e Ema se agitavam ao lado, segurando suas próprias varas, tentava içar o peixe e liberar o peso que tencionava a linha da irmã. estava achando maravilhoso, fez lembrar das pescarias de sua vida e do livro de Hemingway, ela se divertia. Brian anunciou que daria um jeito, se aproximou mais de onde o filho estava, tentando suspender o peixe prateado que devia ter quase um metro de comprimento.
Em um bater de cílios, Brian levou a mão atrás das costas e puxou um revolver e atirou uma vez no peixe, que instantaneamente parou de se remexer. O som do tiro foi alto, devido ao silêncio da natureza que os rodeava e coloriu a água agitada de vermelho. Peter arregalou os olhos e empalideceu, congelando no lugar e na posição que estava, gritou de susto, o resto da família se entreolhou, talvez não esperassem aquela reação por parte da nova candidata a membro da família .
– Agora está resolvido, huh? – Brian sorriu vitorioso.
– Ai meu Deus! Meu Deus! – exclamou, assustada. – Você atirou! Você... meu Deus!
– Brian! – Ema repreendeu o esposo.
Peter ainda estava estático, com os nervos aflorados. se aproximou da namorada.
– Você estava segurando o peixe. Bem ali. – Ela falava e tinha os olhos onde antes estava o peixe e o namorado. – Você estava segurando o peixe. Ele atirou no peixe. Ele só puxou a arma e atirou no peixe. Ele tinha uma arma o tempo todo?
– É o jeitinho dele. – tentou acalmar a namorada. – Ele tem boa pontaria. – O central tentou amenizar.
– Ele só atirou. Ele atirou no peixe. – ainda estava pasma. – Seu. Pai. Atirou. No peixe.
– Não ligue para ele, . – Alex se aproximou, tentando ajudar. – É só a maneira do papai de resolver as coisas. – Ao dizer a última palavra, Alex dirigiu um olhar atravessado para o pai, que deu de ombros, ainda orgulhoso.
– Pense pelo lado bom, vamos ter peixe para o jantar. – ergueu um ombro e riu torto, enquanto a namorada o mirou com incredulidade.
Continua?
Embarquem nesse conto de natal que se passa no deserto, onde o que menos teremos será paz e amor entre entes queridos.
Espero que estejam se divertindo.
Não deixem de comentar.
Um grande beijo e até breve,
Carmen
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