The Matthews Christmas Carol - a sogra, o rato e a cama que geme


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Última atualização:15/01/2024

Invisible String

Existem alguns casais no mundo que só vão acontecer.
Sem justificativas, muitas vezes sem que nem mesmo faça sentido que um ou outro tenha se apaixonado. Como alguém viciado em endorfina, exercícios físicos e alimentação saudável, que se apaixona repentinamente por um gamer que sequer se lembra da última vez que correu sem que fosse atrás do ônibus. Ou a pessoa que é conhecida pelo nome em todos os bares e casas noturna da cidade, mas que se apaixona magicamente por alguém que apenas sai de casa para trabalhar – por obrigação.
É como sempre disse Bernard Cornwell, “O destino é tudo”.
E algumas pessoas simplesmente são feitas umas para as outras, não importa a casca, cultura ou costumes. Alguns podem dizer que é o destino do amor, quando alguém está destinado a outro, aquilo sempre vai acontecer. A teoria do fio que te liga a sua alma gêmea, ou a própria teoria das almas gêmeas, predestinação ou no que quer que acredite. Duas pessoas apenas se encontram e então, o que poderia ser estranho e oposto, torna-se curiosamente atraente. O saudável e matutino, se rende aos jogos até tarde da noite e o jogador aprende o valor de caminhadas matinais. O caseiro aprende que se na companhia certa, qualquer lugar fora de casa pode ser confortável, e o que amava viver o fim de semana fora de casa, descobre que massagem e conchinha são melhores que o melhor dos Moscow Mules.
Com e havia sido assim.
Ela sempre fora o tipo de pessoa obcecada em encontrar seu par, sua alma gêmea, a amiga que planejava o casamento sem ter encontrado o noivo. Ela sonhava com os filhos, já sabia seus nomes, tinha no Pinterest duas pastas, uma com inspirações para o casamento, outra com ideias para a decoração da casa. Era romântica, doce, sonhadora, um tanto fantasiosa, mas era feliz assim – talvez viver na Lua tivesse lá seus benefícios. Mas não era só isso, também era brilhante, ótima cirurgiã, uma médica excelente que tinha como cartão de visitas um sorriso e balas de morango no bolso do jaleco.
Era conhecida por ser agradável e inteligente. Era boa com seus pacientes, seus colegas de trabalho, amigos de longa data e com todos da família e parentes. Era respeitada, considerada, comprava presentes caros nas datas importantes, levava as crianças da família para passear e acompanhava os idosos a consultas médicas. Tinha conquistado tudo que mais almejava na vida em quase toda as áreas, uma carreira estável e com reconhecimento, uma vida familiar calma e tranquila, bons e velhos amigos por perto, para os momentos bons e ruins, grana para cuidar de seus pequenos caprichos, quando se permitia. Havia apenas uma coisinha, uma área que parecia simplesmente não querer se desenvolver.
Era um tipo de pedra no sapato, calcanhar de Aquiles. Não importava o quanto tentasse, o quanto trabalhasse o assunto em terapia, ou até mesmo o quanto baixasse seu padrão, não conseguia resolver. Era impossível ter um parceiro. Quando alguém parecia enfim a notar, não conseguia ouvir mais de três palavras proferidas por ele sem expressar – sem querer – suas verdadeiras cores. Ou quando conseguia sentir qualquer fagulha por alguém, recebia um banho frio, molhado o suficiente para que demorasse mais seis meses até que tentasse outra vez. Já em um relacionamento. Só interesse casual. Acabou um relacionamento recentemente. Gay. Coach. Não está pronto para algo sério. Vamos ver no que dá. A lista era grande.

Já ele, era prático.
Focado em seu trabalho e isso lhe consumiu a vida. A infância, adolescência e vida adulta. Não se importava porque depois da família, seu trabalho, seu esporte era o que mais amava no mundo e o que mais valorizava. Era tudo muito simples e até simplório. O amor havia surgido em alguns momentos de sua caminhada, florescendo aqui e ali, mas não conseguiu resistir as investidas maiores de sua paixão pelo esporte e sede por ser perfeito em seu trabalho.
Era um grande jogador de hockey, vindo de uma família de atletas e que respirava aquele universo desde que o filho do meio havia se enfiado nele. Nem sempre era bom em separar seus muitos papéis e em algumas situações tinha causado muita bagunça. Porque a parte ruim de ser o que se é desde sempre, é que as fases da vida continuam vindo sem manual. Você sabe o que fazer para alcançar aquele sonho, a medalha de ouro no mundial olímpico, mas não sabe como devia lidar com a garota por quem você se apaixona, mas que não ama você de volta.
As coisas as vezes ficavam feias por causa disso, ele geralmente não gostava de lembrar porque, em sua mente, todos o estavam julgando do jeitinho que ele estava se julgando – muito, muito ruim. Por isso, a medida com que crescia e compreendia seu meio e como suas decisões implicavam seu destino, ele se fechou. Não totalmente, ou não para todos – era o que gostava de pensar. Mas aos poucos, as reações espontâneas sem medo de julgamento ficaram guardadas apenas para os pais e irmãs, ou amigos mais próximos, e apenas quando ninguém tinha o celular por perto. Não se importava em parecer sociável ou simpático, queria apenas jogar hockey e viver sua vida.
Era algo que tinha aprendido com a idade também. Que precisava ter uma vida para além do gelo, para quando chegasse a hora e precisasse aposentar os patins e deixar o taco apenas como objeto de decoração no canto da sala. Não que realmente se importasse muito com isso. Se fizesse, teria tido algumas crises existenciais depois de todas as tentativas frustradas. Não era adequada, sua mãe não gostava, a textura da pele não era boa, queria mais aparecer, não seria boa mãe, não seria boa esposa, era feia, nariz grande demais, era morena, tinha uma péssima postura, usava muito as redes sociais, não gostava de cachorros, postava fotos de biquíni, só não era a pessoa certa. A lista era grande. Ele não dava a mínima, porque homens tem esse privilégio, podem conhecer bem o gramado antes de realmente acharem alguém para se comprometer. E ele sempre tinha, no fundinho da barriga, a sensação de que podia encontrar alguém melhor – talvez fosse ego.
Fosse o que fosse, ele estava feliz depois do término quase recente, mas que ainda não era um término exatamente, já que continuavam a se encontrar vez ou outra e curar a carência um do outro. Era bom não ter responsabilidades com alguém, precisar encontrar um meio termo para agradar e não apenas simplesmente fazer sua vontade. Era bom ser sozinho e livre, mesmo que em nenhum relacionamento tivesse dado espaço o suficiente para sua parceira entrar de verdade em sua vida ou família – o que para sua mãe, era ótimo.
Mas até com pessoas assim, a mágica pode acontecer.
Ele e ela eram diferentes e qualquer pessoa mais sensata que uma ervilha poderia prever um relacionamento desastroso entre os dois. Ou, que nunca viessem a se envolver. Ela era uma pessoa normal, sem fama ou posses – mas não um fardo para os pais, ainda –, ele era famoso e rico. Isso e o fato de morarem em países diferentes, claro.
Mas, talvez ela nunca tivesse encontrado alguém que a quisesse porque o destino à estava guardando para alguém. Era ansiosa e impulsiva, logicamente o primeiro que se apaixonasse e fosse recíproco a levaria ao altar. Ele talvez sempre tivesse no fundo da barriga aquela sensação porque era verdade. Havia algo além do arco-íris e ele não poderia se comprometer – ainda.
Desse jeito, um dia os caminhos dela foram se entortando o suficiente para que fosse parar na mesma cidade que ele, no mesmo bairro, se tornando amiga da namorada de alguém que, por coincidência, era o melhor amigo dele. Em uma recepção no terraço de outro alguém, em um dia quente demais para se ficar em casa após o plantão no hospital. Ela estava sentada perto de pequenas palmeiras falsas, com bases cobertas por pedrinhas brancas, tendo fundo o céu laranja que parecia pegar fogo – talvez não só parecesse. Ela fazia uma piada, contando como detestava americanos e sobre como tudo parecia mais complicado ali do que em qualquer outro lugar do mundo. As pessoas riam e gostavam dela, porque era natural e engraçada e tinha o ótimo hábito de fazer muitas piadas sobre si.
Todos riram e então alguém se aproximou e perguntou se ela era comediante também, e até aquela pergunta, ela não havia percebido que ele também estava ali. Ela não soube o que fazer porque de pronto o reconheceu, então enquanto pensava sobre como ele era mais alto pessoalmente, fez uma piada sobre as crocs horríveis que ele usava e como ele reforçava seu argumento sobre americanos serem péssimos. Ele riu de verdade, ela sorriu e pensou que era bom fazê-lo rir, mesmo sem entender porque.
Eles conversaram, ela tentava parecer não estar afetada, mas não conseguia controlar os dedos, que se embolavam e se cutucavam, ou as mãos suadas. Ele queria estar perto e chamar sua atenção, sempre que tinha oportunidade e passava perto dela, ele bagunçava seu cabelo, a acertava com uma bolinha feita de guardanapos de papel, mostrava a língua ou tentava colocar na cabeça dela o seu boné. Ela era inteligente e ele estava gostando das caretas que ela fazia e de como fazia uma piada diferente a cada ação sua. E eram boas piadas e eram sobre ele, ela o estava vendo.
Então se sentaram um ao lado do outro, ele quis mostrar suas tatuagens e dizer a ela que devia tentar e que ao contrário do que imaginava, não se arrependeria. Ela tocou a pele desenhada com a ponta dos dedos e elogiou, mas ele não poderia dizer qual delas, já que a estava olhando, perdido no movimento de seus cílios. Mas, teve o reflexo de tencionar seus músculos, porque por alguma razão – ainda desconhecida – achou que ela devia saber que era forte o suficiente.
Ela estava o evitado, porque sentia calor quando perto dele e fazia piadas idiotas e vergonhosas demais.
Ele queria mais e mais piadas, e queria que elas sempre fossem sobre ele, mesmo sobre o quanto ele estava sendo bobo.
Em algum momento, quando a Ursa maior podia ser vista no céu com clareza, eles se aproximaram sem perceber. Ele estava sentado e ela de pé, olhando as estrelas e quando ela o olhou, pediu com sorriso tímido para que ele não a olhasse daquele jeito. Quando ele quis saber a razão, a viu sorrir e apertar os lábios em um sorriso de canto. Ele entendeu. Sorriu de volta e segurou sua mão.
E foi assim.
Simples.
Recíproco.
Naquela noite ela ofereceu carona, ele aceitou e foi a vez dele de implicar com as músicas de sua playlist favorita, enquanto gargalhava e ela pensava que tudo bem se pudesse o fazer rir por muito tempo, só para ouvi-lo. E naquela noite, quando ele – antissocial – chegou no conforto e silêncio de sua casa, foi até a janela para seguir o carro dela com os olhos, queria que a viagem tivesse durado mais. Ela, quando chegou, se olhou no espelho e pensou que devia ter sido aquele tipo de noite que só acontece uma vez na vida de cada pessoa, mas que todos sempre contam como se tivesse durado todo o verão. Ela apertou os lábios, balançou a cabeça e foi dormir. Evitou ouvir Taylor Swift, porque não queria se deixar pensar sobre ele.
No dia seguinte ele não tinha conseguido o telefone dela, mas havia convencido os amigos de que deviam muito comemorar cada dia do verão, porque nunca se sabe quando será a última vez. Ela foi convidada, pensou em não ir e disse que estava cansada demais, mas alguém deixou escapulir – propositalmente – que tudo, inclusive o convite a ela, havia sido ideia dele. Ela ficou curiosa.
Trocaram olhares a noite toda, e piadas sobre cebolas brancas e roxas e sobre o hábito ruim dos americanos de responder a obrigada com uhum. Ele sempre se aproximava, ela gostava disso e lhe dava abertura, sorria para ele e só para ele – estava economizando a bateria social. No final daquela noite, ele ofereceu a carona.
Eles riam sobre propagandas vergonhosas que ele havia feito para TV, porque ela resolveu se vingar dos comentários que ele fez sobre suas meias do Grinch. Mas diferente da outra noite, ela ofereceu chá e um pouco mais de conversa, ele achou que seria uma ótima ideia e disse que chá parecia bom – ele detestava chá.
Adormeceram no sofá pequeno e velho dela, porque ele não acreditou que alguém inteligente e culta como ela poderia mesmo ser fã de The Office, assim como ele. Pela manhã ainda no sofá, quando ele disse das horas ao se espreguiçar e sentir as costas reclamarem, ela estava sonolenta demais para controlar seus impulsos e quis saber se ele precisava estar em outro lugar. Ele a olhou nos olhos e negou – pareceu muito sério e sincero – depois a beijou.




All I want for (this) Christmas is you

Quinta-feira, 14 de dezembro de 2023
Apartamento da
Toronto – Ontário/Canadá



Estavam sentados na cozinha do apartamento um pouco afastado do centro, no terceiro andar de um prédio antigo, com calefação sentimental, sem elevador. Ela comia um sanduíche, ele ovos. Ela tentava trazer a alma de volta ao corpo, ele a chutava por baixo da mesa como uma criança de cinco anos faz para passar o tempo. Ela devolveu o chute, ele trocou de perna.

– Qual o problema? – Ela resmungou e ele ergueu o olhar, como se confuso.
– Acha que vai fazer quantos graus hoje? – Perguntou inocente.
– Não sei, você mora aqui há décadas. Eu não.

Ela riu baixo e balançou a cabeça, voltando ao seu sanduíche.

– Você vai ao jogo no fim de semana?

Ela o mirou, apertou os lábios em uma expressão frustrada e esticou o braço, entrelaçando seus dedos.

– Desculpe, lindo. – apertou ainda mais os lábios e levantou o início de suas sobrancelhas. – Eu estou trocando todos os plantões possíveis para conseguir alguns dias nas festas de final de ano. Esse é um deles.
– Ah. – Ele abriu a boca, desapontado e apertou os lábios também. Os dele eram cheios, o inferior sempre se sobrepunha ao outro quando ele fazia isso e covinhas suaves apareciam em sua bochecha. – Tudo bem, eu entendo.
– Mas vou acompanhar pelo celular e pela TV mais próxima, prometo. – sorriu o olhando nos olhos e retribuiu.
– Eu sei.
– Vai ser bom ter alguns dias, o esforço vai valer a pena. – Ela garantiu, voltando a seu sanduíche. Ele balançou a cabeça. – Já sabem como vai ficar o calendário? Se vão mesmo ter os jogos?
– Não. – Ele respondeu com boca cheia. – Parece que pode ser que mude, tipo, sejam adiados, sei lá. – deu de ombros. – Foram uns três anos sem uma pausa digna, desde a pandemia. Os times estão negociando pelo menos o atraso de uma semana. Não vai fazer tanta diferença no final.
– Seria bom.

Ele assentiu, depois de mastigar o resto de seu café da manhã, depois apoiou os cotovelos sobre a mesa e cruzou os dedos na altura do rosto, apoiando a bochecha nas mãos.

– Acho que vou acabar sendo obrigado a ficar em Toronto. – abriu um sorriso travesso.
– Com certeza vai ser muito difícil, eu imagino. – Ela assentiu, entrando em seu jogo.

Ele se esticou e a beijou estalado no rosto, fazendo-a se deslocar. Depois, ficou de pé, reunindo tudo que precisava para sair.

– Sua família não pode vir para Toronto, caso você tenha que ficar? – quis saber, começando a recolher a louça.
– Eles não costumam. – Ele deu de ombros. – É muito frio, ninguém gosta do frio daqui. – riu pelo nariz e fez o mesmo. – Geralmente não compensa, não se eu for ficar concentrado ou viajando para jogos fora da cidade. Minhas irmãs vieram no ano passado, mas foi só.
– Eu não reclamaria, nunca, de ter você aqui comigo. – se aproximou dele, tocou seu rosto e colocou uma mecha do cabelo escuro atrás da orelha do seu jogador de hockey favorito. – Mas, espero que consigam essa pausa, você precisa de um tempinho em família. Descanso. – Finalizou o beijando.
– Você poderia ir comigo. – Ele sugeriu, inseguro, quando ela começou a se afastar de volta a mesa.

Os natais e qualquer outro evento ou festa, celebração ou data de família eram extremamente importantes para a família , quase nunca contavam com a participação de outros membros. Bre, sua irmã caçula, namorava há anos, mas não se lembrava de nenhum natal compartilhado com o namorado dela ou sua família. engoliu sua respiração logo após dizer, porque não temia apenas a resposta e reação de , mas também a de sua família.

– Eu? – Ela arqueou uma sobrancelha e riu, estranhando.
– É. – Ele maneou a cabeça, se apoiando a parede. – Por que não?
– Está falando sério? – apoiou o quadril a mesa e cruzou os braços. – Eu? Conhecer sua família e bem no natal? – Ele ergueu os ombros, como quem diz “e qual o problema?” – Não sei. – Ela sacudiu a cabeça e voltou a recolher a louça. – Nunca tocou no assunto antes, por que agora?
– Porque eu não vou deixar minha namorada sozinha no natal, caso eu vá para Scottsdale. – Ele deu de ombros e se aproximou dela, afastou o cabelo solto dos ombros e beijou a pele exposta pela gola larga do suéter. – Você não os conheceu quando morava no Arizona, já é a hora.
– E o que mudou? – Ela indagou com curiosidade, ainda de costas, sentindo o afago dele.

ergueu os ombros, apertou os lábios e baixou os cantos, como se não tivesse uma resposta para aquela pergunta.

– Seria muito babaca se eu dissesse que não estava pronto? – Ele perguntou em um sussurro.

riu, apoiando a cabeça aos ombros do namorado. Ele ficou feliz por ela não o achar um idiota, ou o olhar daquele jeito, com o olhar das pessoas chocadas e altamente magoadas. Que bom que era ela ali, ele pensou.

– Agora você está?
– Se eu quero que você seja uma , preciso começar te apresentando a família, não é?

ouviu, quase sentiu fisicamente seu cérebro fazendo as sinapses, conectando neurônios, captando e recaptando neurotransmissores. Então se virou devagar, olhar ansioso, como quem teme ter escutado errado e quer ter certeza, temendo que as palavras tivessem se perdido no ar. Ela apertou os olhos enquanto o olhava. sorriu desconcertado, projetou o lábio inferior em um meio sorriso e ergueu um ombro, ao mesmo tempo em que maneava a cabeça como quem diz “por que não?” de modo relaxado e sem compromisso – o que era oposto ao que ele realmente sentia no momento e ela sabia.
Ela tomou o rosto dele nas mãos, balançou a cabeça para um lado e para o outro, devagar, enquanto sorria com os olhos, como se em silêncio dissesse você é mesmo maluco. E depois, o beijou. Ele considerou que o beijo devia ser uma resposta positiva.


❄❄❄


Quinta-feira, 14 de dezembro de 2023
Scotiabank Arena – Casa do Toronto Maple Leafs
Toronto – Ontário/Canadá



caminhava do jeito de sempre, devagar, erguendo os joelhos, com o cabo do taco quase arrastando no chão. Era um dos últimos a deixar o gelo ao final do treino, como sempre. Teriam um jogo no sábado e mais uns na próxima semana, talvez outros até o final do ano. Os calendários nos meses do meio da temporada costumavam ser apertados, poucas folgas, tempo corrido, as vezes jogos no natal ou até mesmo na noite de ano novo. Era comum, principalmente se considerasse aquelas duas datas importantes bem no meio da temporada – benefícios ou malefícios de se jogar no inverno.
Mitch Marner passou pelo central como um vulto, correndo sob seus patins como se sua vida dependesse disso. O que também era muito comum. A mania de um dos melhores amigos de havia começado por um péssimo hábito e uma bexiga muito solta, mas se tornara marca registrada do ala de olhos azuis. Agora Mitch fazia por uma questão de superstição e porque realmente era muito agitado para caminhar pelos corredores como uma pessoa normal.
No vestiário, uma algazarra generalizada chamou a atenção de . Ao entrar, o grupo todo ria e conversava animadamente, até Sheldon Keefe, seu treinador, estava gargalhando e parecia mais animado do que deveria para um fim de tarde de treino intenso.
se aproximou de seu lugar no vestiário e começou a tirar todo o peso dos equipamentos. John Tavares e Tyler Bertuzzi estavam perto, conversando sobre árvores de natal e crianças pequenas. Quando John cruzou o olhar com o central, indicou a movimentação com o queixo e sustentou um olhar que pedia explicações sobre o que causava aquela agitação.

– Parece que tudo certo para a nossa pausa. – John respondeu com um sorriso. – Vamos ter alguns dias com a família. Só voltamos depois do ano novo.
– É sério? – ergueu as sobrancelhas e sorriu.
– Pode fazer suas malas para o Arizona, Papi. – Tyler riu ao balançar pelos ombros. – Folguinha, baby.

olhou para o time outra vez, agora compreendendo sua agitação, conseguiu até captar alguns assuntos. Alguém que reclamava sobre o calendário apertar mais depois da pausa, outros que faziam planos de férias em família, outros que planejavam beber até esquecer aonde estavam, viagens, jantares. Cada um já montavam uma programação bem específica com aquela notícia.

– Então, a gente aluga um jatinho para o Arizona? – Matthew Knies, o estreante que também era do Arizona, perguntou ao se aproximar, sentando-se para arrancar os patins.
– Nem acredito que vou passar alguns dias quentes, longe daqui. – respondeu com um suspiro teatralmente aliviado.
– O que eu mais queria. – Nick Robertson, outro nascido no Arizona se aproximou. – Nem era tanto pela folga, mas sim para fugir do frio. O clima desse lugar não foi feito para seres humanos. Eu tenho certeza que é a natureza se vingando.
– Eu já me vejo andando por aí de shorts e camiseta. – Knies falou. – E comendo a comida da minha mãe. Vai pra lá também, né? – Perguntou, virando o rosto para buscar .
– Eu acho que sim. – expirou e se recostou, soltando as mãos no colo. – Ainda não tinha planejado nada, mas é o que eu quero e preciso. Vou levar a .
– Legal. – Knies assentiu, voltando a prestar atenção em seus equipamentos.
– A família dela vem também? – Nick perguntou. Ele já estava com peito nu, vestia apenas uma toalha da cintura. – Passar as festas com vocês no Arizona? São do Brasil, não é?
– Na verdade... – mordeu o lábio inferior. – Eles não vêm porque já vieram há pouco tempo, mas também... porque essa vai ser a primeira vez dela com meus pais. – Confessou o central.
– Tá zoando? – Knies ergueu o corpo, surpreso e Nick arregalou os olhos.
– Não, tô falando sério. – apertou os lábios. – Vou apresentar ela pra família.
– Espera. – Nick ergueu um dedo. – Mas vocês não se conheceram no Arizona? E não namoram há tipo... uns nove meses?
– Primeiro, é estranho que você se lembre de detalhes que eu nunca contei exatamente. – respirou erguendo os ombros e estreitou o olhar para o ala moreno. – Segundo, é complicado.
– O que é complicado? – Mitch Marner, com cabelos molhados, sem camisa, se sentou ao lado deles.
– A família do não conhecer a ainda. – Knies respondeu primeiro e Mitch rolou os olhos.

respondeu Matthew Knies com um olhar atravessado.

– Vou levar ela comigo nas festas. – contou ao amigo.
– Até que essa foi rápido. – Mitch deu de ombros. – Mas eu sabia que a não ia aturar a mesma espera e o período de testes das outras. Ela é latina, as coisas lá são diferentes.
– Não é assim também. – bufou e rolou os olhos.
– Mas... – Nick ainda ostentava um semblante confuso. – Mas vocês não namoraram a distância por meses porque ela morava no Arizona? Como ela nunca conheceu seus pais? Scottsdale é do tamanho de uma noz.
– Eles não frequentavam os mesmos lugares. – explicou sem muita ênfase.
– Se você disser isso perto dela, ela deve te acertar no nariz. – Mitch avisou, batendo duas vezes no joelho de . – O problema aqui, é que o sempre acha que ninguém é bom o suficiente pra ele. Enrola a garota até que ela desista.
– Eu não enrolo ninguém. – ficou de pé. – E ninguém era bom o suficiente. – Ele ergueu um ombro. – Agora é.
– Depois de nove meses, mesmo morando na mesma cidade. – Mitch o olhou desconfiado, com preguiça da postura do amigo. – Talvez a seja mais rápida e você assume ela com um ano juntos.
– Mas por que? – Knies quis saber, estava curioso. – Era tipo esses namoros escondidos de famosos?
– Nem os famosos namoram escondido hoje em dia. – Mitch comentou, cruzando os braços sobre o peito nu e rolou os olhos.
– Não é nada disso, é só que... – O jogador se perdeu nas palavras, abriu a boca mais não disse nada. – É só que eu sou muito cuidadoso. – Ele coçou a nuca. – Minha família é. A gente não costuma levar um pretendente por mês para jantar.
– Fechados. Trancados. Não aceitam novos membros. – Mitch implicou. – Mas sabe, eu sempre achei que o Papi aqui morreria sozinho. – Marner ficou de pé e abraçou o amigo pelo ombro. – Do tipo, ninguém vai aguentar a rabugice dele, nem a falta de simpatia. Mas ele achou alguém que ama o Grinch, então deu certo. Ela é meio como ele, nunca se envolve em nada com as garotas do time também. Meio antissocial. – Mitch olhou para o amigo com certo ressentimento. – Sabe quantas vezes minha esposa já a convidou?
não gosta de ter atenção assim. – se explicou, defendendo a namorada. – Ela é tímida e prefere não ter um monte de gente falando dela só por ser minha namorada.
– Tá, tá certo. – Nick sacudiu as mãos. – Mas eu ainda não entendi porque demorou tanto tempo para apresentar sua namorada, que morava no mesmo lugar que seus pais. E por que ainda não assumiu o namoro, se vocês praticamente moram juntos agora?

ergueu os ombros e apertou os lábios em uma careta confusa e sem jeito.

– Sei lá. Por que isso é tão importante? – Ele devolveu a pergunta. – Quando vocês se tornaram tão fofoqueiros?

Mitch, Matthew e Nick trocaram olhares e ergueram os ombros.

– O que importa é que no natal, vou apresentar para meus pais. – justificou, mais para si mesmo do que para os colegas. – Vai dar tudo certo e vai ser legal. Nós dois. Scottsdale. Natal em família. Vai ser legal. E aí assumir para todo mundo. Vai ficar tudo bem. Sem mais.


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Quinta-feira, 14 de dezembro de 2023
Apartamento da
Toronto – Ontário/Canadá



Era o início da noite de quinta, fazia muito frio e o vento machucava. tinha recém-chegado do hospital e tirava o peso de todas as roupas usadas para sair de casa. Estava cansada, a coluna doía e sentia o nariz incomodar, a pele repuxar por estar muito seca, os lábios pareciam nunca ter hidratação suficiente e o rosto estava queimado pelo frio. O que não daria por um dezembro brasileiro. Clima quente, tomar sorvete, pele queimada de sol, passear pela cidade depois de um dia inteiro de praia, tomar Coca-Cola na calçada, andar de Havaianas para qualquer lugar, o cheiro de protetor solar e churrasco.
Como sentia falta do Brasil...
Havia estado com os pais no início do mês, quando os dois vieram para Toronto para comemorar o aniversário da mãe, mas eles já estavam de volta ao Brasil. só poderia visitá-los em sua terra natal nas férias de verão, porque o calendário de trabalho e a rotina no hospital não davam trégua. Trabalhava em um hospital geral no coração da cidade e não lhe faltava trabalho.
Sua jornada profissional fora do Brasil tinha começado no Arizona, em um hospital mais calmo, com uma boa equipe, um ambiente tranquilo e agradável para se trabalhar. Depois de um ano no deserto, já em um relacionamento a distância com , recebera um convite irrecusável de um dos ex-administradores do hospital, que agora residia e trabalhava em Toronto. E assim, era recém completo um mês morando em Toronto, um mês experimentando aquele clima péssimo, um mês em um hospital geral caótico e superlotado, um mês morando mais perto de também.

Antes disso, no último verão, quando se conheceram e nas férias de , tudo era luz, sombra e água fresca. O jogador passava muito mais tempo do que devia ser normal junto a brasileira, era quase como se nunca tivessem estado separados antes. Sabiam os horários um do outro, dormiam e acordavam juntos, saiam juntos com os amigos ou passavam o fim de semana inteiro dentro de casa. Depois, com o início da temporada em outubro, o namoro a distância se resumia a vídeo chamadas que duravam grande parte da noite, viagens longas, mas que só lhes davam algumas horas ou no máximo um ou dois dias juntos. Ansiedade de separação, brigas por ciúmes por causa da distância, inseguranças e muita saudade.
Foram quase dois meses de muito tormento, até que resolvesse enfim aceitar a proposta – depois de uma campanha esforçada de para tal. Agora estava de volta a rotina de antes, praticamente morava com , mesmo que seu apartamento fosse menor, mais simples e coubesse inteiro dentro da cobertura bem equipada, chique e tecnológica do namorado. Ele não dava a mínima, nunca deu. No início queria que morassem juntos, mas foi intensamente contra. Namoravam há alguns meses apenas, e apesar do jogador americano já conhecer sua família e ser adorado por seus pais, pensava que ainda não era o momento. Morar juntos, apesar de não ter tantas diferenças práticas, teriam muitas sutilezas e morava nas sutilezas. Gostava de seu espaço, suas coisas, gostava de não ter que discutir com ninguém sobre como decoraria sua casa, ou sobre o que teria na dispensa. Gostava de não ter compromissos ou exigências, não ter responsabilidades nem mesmo com plantinhas. Achava que morar juntos tiraria isso.
Aquela mudança podia soar estranha, já que era conhecida por alguém intensa, impulsiva, apaixonada por casamentos e louca por viver sua própria história de amor. Mas havia aprendido coisas importantes com o namorado, como ser mais cautelosa, esperar a hora certa, pensar antes de agir. Além disso, tinha dentro dela um medo monstruoso e forte, que gritava que caso algo mudasse na rotina, o relacionamento poderia desandar e estava feliz demais com tudo para colocar o que tinha em risco.
Enquanto enfiava uma lasanha congelada no microondas, ouviu chaves do outro lado da porta e depois passos. Alguém jogou uma bolsa pesada no chão, tirou os sapatos e devagar, em sua rotina prática e totalmente calculada quanto a ordem de tirar os casacos e a ordem de pendurá-los, se despiu junto ao armário.

– Oi, você. – cumprimentou da cozinha, sem ainda tê-lo visto, mas não precisava. Reconhecia o som de seus passos, o barulho da respiração, o jeito com que ele fechava as portas, o som seco da bolsa de treinos batendo no chão.
– Hey, baby. – respondeu ainda do corredor.
– Tenho lasanha congelada, quer jantar comigo? – Ela perguntou, rindo de sua oferta.
– Não, valeu. – surgiu na cozinha. – Comi com os caras do time. – se aproximou e beijou a namorada na bochecha. – E que bom que comi, não é?

O jogador riu abafado e o acertou devagar, na costela.

– É um jantar bem digno, okay?

assentiu com a cabeça e apertou os lábios, controlando o riso. O jogador apoiou uma das mãos na ilha da cozinha, observando de perto a namorada preparar tudo para seu jantar enquanto a lasanha rodava no microondas.

– Como foi seu dia? – quis saber.
– Bom, nada de diferente. – Ele maneou a cabeça. – Treino forte.
– Odeio como homens são pobres nos detalhes. – rolou os olhos e riu, a acompanhou.
– Aliás, eu tenho uma novidade.

A brasileira ergueu o olhar e sorriu, arqueando as sobrancelhas com expectativa.

– Vamos ter a folga das festas. – Contou apertando os dentes como uma criança cheia de expectativas. – Só jogamos de novo depois do ano novo.
! Que notícia ótima. – Ela celebrou com um abraço rápido e ele assentiu. – Vai conseguir celebrar com a sua família.
– Pois é. – Ele balançou a cabeça e a inclinou, mordendo o lábio, hesitante. – Você pensou naquilo que falei hoje de manhã?
– O que, exatamente? – o olhou, para depois lhe dar as costas e conferir sua lasanha.
– Sobre ir comigo, para Scottsdale. – ergueu os olhos a tempo de vê-la tentar disfarçar a expressão surpresa e sem jeito. – Eu sei que... sei que talvez você não queira... na verdade eu reconheço que a gente nem falou sobre isso antes, mas...
– Será que não é uma ideia melhor se fizermos isso em outro momento? – uniu as sobrancelhas. – É que... sabe, o natal é uma época para a família, é uma data importante. Não sei se seria apropriado que eu me enfiasse nas suas comemorações.
– Mas já são nove meses, até os caras do time estavam implicando comigo sobre isso hoje. – Confessou o jogador. – Você já faz parte da família pra mim.
– Para você, mas é diferente. – fingiu estar muito ocupada com sua lasanha, dando-lhe as costa, fugindo.
– Meus pais já sabem que você existe, desde o início. – chegou mais perto dela. – Eu queria que você fosse, é importante pra mim.
– E por isso levou todo esse tempo? – Ela implicou, lançando a ele um olhar carregado de ironia e apertou os lábios em uma careta. – É brincadeira. Eu só não acho que o natal seja o mais apropriado, talvez um jantar em outro momento...
– O natal seria perfeito, porque aí teriam tempo para te conhecer melhor, entender porque eu amo você. – Ele sorriu.
– O fato de eles precisarem de um tempo para gostarem de mim já me diz muita coisa. – riu fraco.
– Não é isso. – sacudiu a cabeça, estava começando a ficar angustiado. – Também é um tempo para você conhece-los, se acostumar com eles. Eu ficaria feliz se você passasse algum tempo com meus pais.
– Não sei, amor. – sacudiu a cabeça. – Eles não quiseram me conhecer quando eu morava há dois quilômetros da casa deles, agora vão querer?
– Não é que não quisessem... – coçou a nuca, sem jeito. – É que eles não se importavam muito com esses detalhes... – O jogador maneou a cabeça. – Achei que nem você...
– Eu não estou insistindo. – deu de ombros e rolou os olhos.
– Está certo, eu sei que tenho alguma culpa nisso tudo. – O jogador ergueu as mãos, rendido. – Sei que podia ter resolvido isso antes e que seria o mais certo. Não devia ter esperado tanto tempo, que seria mais honrado se tivesse assumido o nosso compromisso...
, não é sobre isso... – tentou falar, olhando-o, mas ele a ignorou.
– E eu assumo isso, mas quero consertar. – Ele continuou. – Se quero fazer de você uma , preciso te apresentar para o resto da família. Sei que não fiz as melhores escolhas até agora, mas ainda tenho um tempinho para melhorar. – fez uma breve pausa, levou uma das mãos até o rosto de e puxou seu queixo em sua direção com suavidade. – O que me diz?
– E se eles não gostarem de mim? – Ela perguntou, expondo pela primeira vez sua ansiedade e preocupação quanto a aquele tópico. – Se eles não me aprovarem?

sorriu empático.

– Eles vão te amar, não tem como não te amar.
– Mas e se não? E se eles acharem que não estou à sua altura e...
– Ei. – a calou com um beijo rápido. – Não se preocupe, okay? Vai ficar tudo bem. Eu prometo. – Ele sorriu, olhando em seus olhos. – Em alguns dias estaremos voando para casa e vamos ter o natal mais inesquecível de todos. Mal posso esperar para te mostrar todas as tradições de natal da Família . Vai ser ótimo, confie em mim. – Ele prometeu, beijando-a.



Driving Home for Christmas

Quinta-feira, 21 de dezembro de 2023
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América



Mesmo depois de muita resistência por parte de , que praticamente havia se amarrado a mesa para não sair de casa, estavam no Arizona. O casal viajara sozinho de jato, de Toronto para Scottsdale e depois de carro até a casa dos . havia comido os cantinhos de pele de todos os dedos das mãos, mordido o interior das bochechas e os lábios. Estava ansiosa e insegura demais para se concentrar na beleza da paisagem, ou no falatório do namorado sobre carros, paisagens, cactos, baseball e o Arizona Coyotes. , por sua vez, falava sem parar porque aquela era sua maneira de driblar a ansiedade que também o consumia. A cada metro mais para dentro de Scottsdale, uma peça de roupa era retirada porque não havia neve ali. Ao contrário, com aquele tanto de tecido cobrindo cada faixa de pele, sentiam calor – era isso ou a agitação quente da ansiedade.
A família havia reagido com mais surpresa que empolgação quando o jogador lhes avisou de sua convidada. Parte porque ele mesmo havia sido categoricamente contra a convidarem o namorado de Bre para a comemoração, mesmo que eles já namorassem há anos. Parte porque era , ele gostava daqueles momentos em família e amava tradições e rotinas, saber o que aconteceria e a falsa sensação de controle que isso lhe dava. Por isso o central também segurava muita expectativa para aquele encontro, porque a aprovação dos pais era muito importante para ele, principalmente em um assunto como aqueles. Sua futura família.
Se caso alguém lhe perguntasse, não saberia dizer se seus pais eram fechados e pouco receptivos, ou se apenas não ligavam. No passado, nenhum dos dois se envolveu muito nas escolhas amorosas do jogador de hockey, que também não fazia questão de abrir o tópico para discussões familiares. Era discreto e sutil. Às vezes, era acompanhado pelas namoradas em alguns eventos, quando já juntos há algum tempo. Maggie, a última, o tinha acompanhado ao casamento de Mitch Marner e Steph, depois de quase três anos juntos. Acompanhado em algumas férias, passado tempo com ele em sua casa no Arizona, o visitado em casa em Toronto, nos jogos dos playoffs havia estado junto a outras esposas e namoradas torcendo para o time.
No início era fácil e cômodo, porque Maggie era uma das melhores amigas da namorada de um de seus melhores amigos no time, Michael Bunting, mas com a saída do ala, faltava incentivo e a graça dos encontros diminuiu.
Maggie era sempre envolvida com seus interesses, apesar de sempre se concentrar muito em . Não se envolvia tanto com sua família, pais ou irmãs, apenas com namoradas de outros jogadores e alguns outros amigos do central. Ela não queria ser apenas conhecida como namorada de , queria ser vista por seu talento, criar seu nome na mídia. Por isso e pelo pavor que o jogador tinha de ver seu nome envolvido em páginas de fofoca. Sentia calafrios e as pernas fraquejarem quando imaginava a si vinculado a uma manchete com milhares de comentários, piadas no Twitter e risos mundialmente.
Mas, talvez pela falta de vontade da família, de Maggie, ou dele mesmo, nunca tinha passado por sua cabeça trazer a influencer para um natal em família. Os natais dos eram recheados de tradições que se cristalizaram desde a infância dos três filhos de Ema e Brian. Os suéteres, decorar a árvore de natal, a ceia na véspera, as fotos de família, abrir os presentes, tomar chocolate quente, comer mais que deviam.
Nunca havia imaginado alguém participando daquela festividade até o momento, me imaginava como mãe dos seus filhos, era óbvio que teria que ensinar a ela todas aquelas tradições, para que juntos fizessem aquelas e mais outras com as crianças que teriam.

– Tem certeza sobre ficar na casa dos seus pais? – perguntou após horas em silêncio, apenas acenando com a cabeça para todo falatório do namorado sobre a academia da Arizona State University. – Não seria mais confortável ficar na sua casa? Eu, você e o Felix? – Propôs, lembrando-se do cachorro que dormia no banco de trás. – Mais tempo para nós dois. – Ela sorriu, tentando convencê-lo.
– Se a gente quer passar mais tempo com eles, nada melhor. – deu de ombros. – E a casa é grande o suficiente para todo mundo. Minha família ama o Felix. – sorriu, olhando para a namorada. – Você vai ver, ele até se esquece de mim. Minha mãe e minhas irmãs mimam ele mais do que eu e você.
– Eu aposto que sim. – suspirou, erguendo e baixando os ombros.
– Você pode relaxar, amor. – apertou o joelho da brasileira, atraindo sua atenção enquanto dirigia. – Você está tensa desde que saímos de casa. Não vai ser nada tão terrível quanto você imagina.
– Eu não estou tensa. – Ela tentou disfarçar, sacudindo a cabeça.

inclinou a cabeça sobre o ombro e a encarou, erguendo as sobrancelhas.

– Tá, talvez eu esteja um pouco. – se deu por vencida, rindo pelo nariz. – Mas é que é natal e eu nunca fui apresentada antes. Ainda mais assim.
– Assim como?
– Ah... você é meio... – hesitou e o jogador arqueou uma sobrancelha outra vez. – Meio filhinho da mamãe. – gargalhou. – É sério. É como minha mãe diz, você é o bendito é o fruto, sabe? O único homem da família além do seu pai. Sua mãe deve ter ciúmes de você, você é muito próximo a ela, e a suas irmãs também.
– E toda mãe não tem? – devolveu, ainda rindo. – Não se lembra do seu pai quando me conheceu? A expressão séria a sobrancelha arqueada para tudo que eu falava? Aquilo era ciúmes também.
– É, mas... não levei você para encarar um natal em família. – deu de ombros.
– Não vai ser uma tortura, ou uma sabatina, . – riu outra vez. – Parece que meus pais são monstros e eu estou te levando para um covil. Não é assim. Eles nem são totalmente americanos.
– Não é com a parte americana que me preocupo, é a latina. – o olhou de canto. – Sei como são essas coisas. – Disse em um fio de voz.

sacudiu a cabeça, não ria mais.

– Você pode confiar em mim. – Ele a olhou quando pararam em um semáforo. – Vai ficar tudo bem, são só alguns dias. E você é a melhor pessoa para lidar com isso, porque além de ser a mulher da minha vida, é latina. – O jogador apertou os lábios em um sorriso fechado. – E se te faz sentir melhor, prometo que se algo der errado, vamos para a minha casa.
– Jura? – o mirou de olhos estreitos. – Jura mesmo?
– Juro. – Ele sorriu. – Mas não vai ser preciso, vai dar certo. – se virou e acelerou, aproveitando a luz verde. – Vai ser meu sonho sendo realizado. Você, meus pais e minhas irmãs, eu. Todos juntos no natal.

expirou um riso amarelo.

– Ô, se vai.


❄❄❄


Quinta-feira, 21 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América



Quando o carro de parou em frente a uma casa grande em um condomínio fechado, com jardim grande e bem cuidado, o corpo de resolveu reagir em medidas drásticas para evitar aquele evento. Nunca antes havia sido apresentada a família de alguém como a namorada, a escolhida, a qualquer coisa. Na verdade, não costumava ser muito escolhida, geralmente sequer apresentada como algo mais do que amiga. Não era a pessoa, geralmente era a pessoa que vinha antes de a pessoa. Sendo assim, não sabia como devia agir, até sabia porque lidava com gente há muitos anos para não saber e não era mais uma menina. Mas temia que fizesse algo errado, temia ser rejeitada, temia fazer alguma coisa errada e nem entendia porque precisavam passar por aquilo. Já eram velhos demais para pedir permissão e passar por apresentações, não eram?
Bastava chegar em um dia qualquer e dizer “esse é o meu namorado”. O irônico era que isso era justamente o que pretendia fazer. Mas mesmo sendo ridículo e bobo todo aquele estresse, estava completamente atordoada e nervosa, imaginando o que aconteceria quando cruzasse aquela porta. A médica brasileira não fazia ideia do que fazer, como fazer. Não sabia como eram os pais do jogador, se a mãe era serena e o pai engraçado, ou se eram duas pessoas difíceis de lidar. Se eles se pareciam com , ou se eram extremos diferentes e mais complexos que o filho do meio. Estava completamente no escuro, apavorada.
Quando o jogador abriu a porta para Felix e depois a porta de , esperando que ela descesse com um sorriso animado e lindo no rosto, orou para que Deus a ajudasse a manter as pernas firmes e não se estabacar bem na frente da família . Para sua sorte ou azar, a conhecia bem e pareceu perceber o estado calamitoso em que a namorada estava, pálida, trêmula e prestes a vomitar de nervoso.

– Ei, tudo bem? – Ele quis saber assim que fechou a porta do carro. encarava de olhos estatelados a porta da casa, decorada com uma guirlanda bonita e grande.
– Eu não sei se consigo fazer isso. – Admitiu de uma vez. – A gente devia ir pra sua casa antes que eu vomite no jardim bonito deles.

riu fraco, surpreso e confuso.

– Como assim? – Ele perguntou, entrando no campo de visão da namorada, que se escorou no carro. – Não consegue fazer o quê?
– Isso. Tudo isso. – começou a falar nervosamente. – Conhecer seus pais. Eu não sei se consigo. Eu... – Ela enfatizou apontando para si mesma. – Já tem todo esse tempo, isso nem é tão importante assim. E se eles acharem que sou uma aproveitadora, ou sei lá? Eu não... foi uma péssima ideia.
. – falou com firmeza, sem sorrir, mas apenas para garantir que capturaria a atenção dela. – Você confia em mim? – Ele a olhou nos olhos.
– O quê? – Perguntou o olhando perdida. – É claro que sim.
– Então só relaxa. – O jogador sorriu, depois beijou rapidamente a testa da namorada. – Só relaxa e confia em mim. Como eu já repeti umas mil vezes. – Ele sussurrou.
– Mas , eu... – Ela tentou argumentar.
– Relaxa. – Ele pediu outra vez, usando seu tom mais sereno e manso, segurando-a pelos ombros.

Em seguida, o jogador segurou com firmeza a mão da namorada, guiando para atravessar o jardim super decorado com renas, bonecos de neve e luzes de natal. Quando os dois estavam perto dos três degraus que levavam a pequena varanda na frente da casa, a porta grande e escura fora aberta. fez um rápido contato visual com uma mulher morena de sorriso pequeno e olhos alegres, não conseguiu decidir se os olhos eram parecidos com os do namorado ou não, mas o olhar era igual ao de .
A mulher – pela idade que aparentava – devia ser a senhora Ema . Ela afastou o olhar de tão rápido quanto a médica, talvez também estivesse nervosa com aquele encontro, e então olhou e sorriu para o filho.
se soltou de para abraçar a mãe. Por causa da diferença de altura, o jogador precisava se curvar para caber nos braços dela, que fechou os olhos para abraçá-lo.

– Você demorou muito. – A matriarca observou, ainda sorrindo e abraçada ao filho.
– Pegamos tempo ruim e muita neve em Toronto. – maneou a cabeça e levantou um ombro. – E o meu pai? Bre e Alex?
– Alex está lá em cima, Bre foi a casa de uma amiga e seu pai está lá dentro. – A mulher apontou para trás de si e em seguida levou a mão para uma correntinha que usava, segurando seu pingente enquanto falava com o filho.

Ema correu os olhos por , que assistia a cena imóvel, porque achava que se fizesse qualquer movimento, seria percebida por ela. O olhar não era um daqueles que se dá quando espera que alguém apresente a visitante, estava mais para um olhar de reconhecimento. Como se quisesse encontrar naquela pessoas as características que o filho provavelmente havia dado.

– Mãe, essa é , a mulher especial na minha vida. – apresentou, sorrindo para a namorada, puxando-a mais para perto.
– Claro... – Ema hesitou, engolindo em seco e uniu as sobrancelhas. – A namorada.
– Isso. – assentiu feliz, olhando apaixonado para , que encarava a cena estática.

Houve um breve silêncio até que cutucasse , lembrando-a de responder a mãe e respirar.

– É um prazer, senhora . Sempre escuto muito sobre a senhora e sua família. – esticou a mão para um cumprimento, mesmo que ainda um pouco tonta e paralisada. – Pode me chamar de , acho que é pode ser mais confortável.
– Então, . – Ema apertou a mão da brasileira sem muito entusiasmo. – Sejam bem-vindos.

Disse, dando-lhes as costas e entrando.

– Vem, vamos entrar. – Ela chamou.
– Vamos, é. – assentiu, voltou-se para a namorada e a trouxe mais para perto, conduzindo-a com uma das mãos em suas costas.
– Meu Deus, ela me odiou. – sussurrou ao namorado, entrando na casa.
– Não, claro que não. – negou e deu de ombros, empurrando a namorada para dentro. – Ela até sorriu.
, ela me detestou. – repetiu congelada. – Meu Deus, ela me detestou.
– Que nada, pare... – O namorado discordou outra vez, guiando-a para a grande sala da casa e a ajudando a se desvencilhar dos casacos pesados que ainda restavam e destoavam do clima daquela parte do país.

A casa lembrava a de quanto a quantidade de fotos de família, decorações de natal e quadros de prêmios e troféus do filho jogador, mas a de era mais sóbria e minimalista na decoração. Havia uma sala ampla com uma TV grande e uma lareira igualmente enorme, decoração de natal por todos os móveis, tapetes grandes, fotos de família espalhadas por todo canto. Felix parecia familiarizado e instalado em um lugar perto da lareira, que parecia ter sido colocado ali para ele, a espera dele. Na sala havia uma escada que levava para o andar de cima, da sala também saia um corredor curto de onde se podia ver uma ampla sala de jantar com uma mesa longa e um lustre bonito e uma cozinha aberta, muito equipada. A cozinha fazia a médica brasileira se lembrar da cozinha aconchegante e calorosa de sua avó, mesma que a da avó fosse bem simples se comparada a ela.
Do lado de fora, através das janelas grandes e de vidro impecavelmente limpo, podia-se ver um grande quintal com duas ou três árvores e o que parecia ser um jardim, o clima era bem quentinho se comparado a Toronto, mas refrescava um pouco e as árvores reclamavam com o peso do vento forte. Era o meio da tarde e o céu estava pesado de nuvens, o vento frio era cortante, mas parecia menos intenso que em casa.
Antes, quando vivia em Scottsdale, nunca havia antes estado naquele condomínio ou naquela vizinhança. Claro, tinha aqueles amigos que conhecera no hospital, que haviam a convidado para aquela noite fatídica, quando encontrou pela primeira vez – pessoalmente. De relacionamento com o americano moreno, o tempo passado no calor do deserto americano nunca foi exatamente propício para uma apresentação familiar. Preferiam ficar a sós, ou com amigos em comum, vivendo devagarzinho o que sentiam, experimentando e descobrindo um ao outro e se descobrindo ao mesmo tempo. Nunca haviam tido a conversa sobre a família, embora sempre falasse da família em suas conversas confortáveis na cama antes de pegarem no sono juntos.
Era engraçado como foi preciso se mudar para outro país para só enfim conhecer pessoas que moravam há vinte minutos de sua casa.
De volta ao presente, quando entraram na cozinha um cheiro forte do que parecia ser chá encheu o nariz de . Lá estava um homem de sua altura, mas mais baixo que o namorado, branco, com olhos azuis, bigode, significativa falta de cabelos e os que restavam eram brancos e nariz pequeno. Era um homem estranho, talvez pelo formato do nariz e dos lábios ou o conjunto da obra, mas uniu as sobrancelhas e inclinou a cabeça sobre o ombro por alguns segundos, lembrando-se dos castores de As Crônicas de Nárnia.
Era o pai de . Não era difícil perceber, mas não por já ter o visto milhões de vezes pela TV ou por fotos com o namorado, mas sim porque os olhos e sobrancelhas eram quase idênticos aos de , assim como o formato de seu rosto, apesar de já transparecer a idade com alguma flacidez ali ou aqui. Brian tinha um semblante relaxado mais sério e soturno que o de Ema, mas ao contrário dela, o americano, assim que colocou os olhos sobre a recém-chegada, endireitou as costas e sorriu.
Ele se aproximou sorrindo apertou a mão de , sacudindo com animação. Ele usava uma camisa xadrez e não conseguia parar de olhá-lo e pensar sobre a semelhança dele como um castor, ou com um rato – ao menos quanto ao seu nariz – e de agradecer pelo namorado ter puxado a outra metade do rosto de seus parentes latinos.

– Então é você, a famosa brasileira. – Brian sorria. – Acho que está na família ir buscar mulheres longe. – riu sem jeito, mas achou gracioso. – E eu amo o Brasil. As florestas, as pessoas sempre felizes, o samba, o futebol. – olhou de canto para o namorado, que apenar apertou os lábios e inclinou a cabeça, sem jeito. Enquanto isso, Brian fazia uma dança desengonçada, como se tentasse sambar, colocando um pé na frente do outro e depois trocando. – Neymar. Pelé. Kaká. Messi.
– O... – hesitou, coçando o queixo. – É que... bem, o Messi é da Argentina, mas... é, isso aí. – Ela apertou e sorriu fechado, encabulada pelo olhar investigativo de Ema .
– Alguém quer chá? – Ema se virou para a pia, não sorriu.

Brian e começaram uma conversa sobre a diferença de clima entre o Canadá e o Estados Unidos, se perdeu em suas palavras rápidas e com sotaque carregado, que levou alguns instantes até perceber que Ema falava sozinha enquanto servia o chá, de costas para eles.

Una blanca como la leche. ¿Latina? No. Nunca. – A cada palavra, a mulher mexia o chá com mais força. – Y Brasil no es latino, es brasileño. Ella no es brasileña, nunca. No lo es. Ahora mi hijo va a traer esa a casa, ¿y después? – Ema bufou. – Tyler y Hayley. Niños blancos. Blancos. Y aún se dice latina... a viu sacudir a cabeça.

Quando percebeu, olhou do namorado para a mãe, depois de volta ao namorado. Demorou um pouco, mas assim que percebeu o olhar da namorada, não custou a entender o que a mãe dizia. tentou manter a expressão mais calma e desapercebida que conseguia, mas o olhar perdido e rosto vermelho de entregavam o conteúdo das palavras da matriarca.

Es incluso el fin del mundo. – Ema começou a traçar sobre si o sinal da cruz, respirou fundo e apertou os olhos. – Que Dios me perdone, que aleje el mal de esa casa, en el nombre del Padre, del Hijo y del Espíritu Santo de Dios. Virgen de Guadalupe y todos los santos...

olhou da mãe para o filho, depois do filho para a mãe, uniu as sobrancelhas e apontou para si, como quem pergunta, “é para mim?”
prendeu a respiração e sem jeito, tentou chamar a atenção da mãe, que ainda estava de costas, descontando sua chateação com torrões de açúcar e biscoitos. Brian, que ainda falava animado sobre os planos para o natal, quando percebeu enfim o que se passava, tossiu, despertando a esposa de seu momento. Ema se virou, olhou rápido para os três e colocou a bandeja de chá e biscoitos sobre a ilha da cozinha.

– O chá.
– Você quer chá? – perguntou de repente, como se nada tivesse acontecido instantes antes.
– Eu? – quis se certificar, tonta. – Sim. Sim, adoraria. – Ela assentiu rápido, tomando um gole maior do que o saudável de um chá com gosto estranho e lutou muito para não fazer careta por causa do gosto forte, mas o namorado percebeu e apertou os lábios em solidariedade.

– Então, ? – O pai, Brian, ergueu as sobrancelhas em uma expressão agradável. – nos disse que é médica. – Ele continuou. – Fazia o que no Brasil?
– Eu era médica no Brasil, também. – se esforçou para controlar seu estranhamento e soar simpática ao mesmo tempo. – Me graduei e fiz residência lá.
– Sua família ainda é de lá? – A mãe perguntou dessa vez. Ema estava de costas para os três, organizando algo perto da pia e ao fazer essa pergunta, se virou, apoiando o corpo e cruzando os braços sobre o peito. buscou o olhar do namorado antes de responder, mas tinha a cabeça inclinada, olhava para os pés e tinha as duas mãos apoiadas a grande ilha no centro da cozinha.
– Sim, toda minha família ainda mora lá. – Ela sorriu fechado e assentiu. – Está ótimo o chá, aliás. – ergueu a xícara na direção da matriarca e sorriu, mas ela não retribuiu. – Do que é?
– É chá de mastruz. – Brian respondeu, conferindo o fundo de sua xícara. – A gente não sabia se vocês brasileiros tomavam chá também, ou só café. A Ema achou melhor o chá.
– É, eu nem tomo muito café mesmo. – riu fraco, mas nem Brian ou pareceram entender as palavras do mais velho do jeito que ela havia entendido.

– E como estão as coisas no time? – O pai tornou a perguntar e ergueu o rosto e encarou o mais velho outra vez, depois sorriu aliviado.
– Estão bem, enfim. – O central expirou cansado e , que tinha os olhos no namorado, sorriu porque sabia bem ao que ele se referia. – Na verdade muito melhor do que o esperado. – esticou uma mão para apertar a da namorada, sobre a ilha e entrelaçou seus dedos. – Se me dissessem que ia conseguir essa marca, de vinte e oito gols em trinta e um jogos, até aqui, eu teria rido. Principalmente depois desse nosso início.
– Eu sabia que ia conseguir. – Brian sacudiu a cabeça e deu de ombros. – Você tinha dúvidas? Porque eu não.
– Nem eu. – também sorriu, inclinando a cabeça sobre o ombro do namorado, que sorriu e a beijou.

e seu pai começaram uma conversa sobre estatísticas, sobre a situação da defesa do time e seu problema sério com goleiros. Aqueles tópicos eram constantemente discutidos em casa com , ela sempre ouvia o namorado e também opinava como fã sempre que tinha oportunidade. Resolveu deixar os dois conversarem sem interrupções, preferiu encarar o fundo de sua xícara de chá. Ema parecia tão interessada quanto a médica.

– Toronto, como está? – Brian voltou a se referir a visitante.
– Fria. – respondeu rápido, sorrindo.
– Sempre é mais fria que o Arizona. – O pai riu. – Deve estar cheia de turistas.
– Não tanto quanto ano passado. – respondeu, esticando um dos braços e envolvendo os ombros da namorada.
– Você brasileira, deve gostar mais daqui do que lá, não é? – Brian quis saber, mas não teve tempo para responder.

Subitamente o grupo parou de falar quando passos fortes foram ouvidos em outro cômodo, descendo as escadas, depois alguém que chegou a cozinha como um vento. Era uma moça jovem, de cabelo escuro, liso com franjas e olhos castanhos, com feição muito semelhante à da mãe, era Alexandria, ou como se referia a ela: Alex.

– Você chegou! – Alex sorriu e abriu os braços para receber . – Achei que só viriam para o ano novo do próximo ano.
– Uma mudança de planos. – respondeu sorrindo.

Depois de abraçar o irmão calorosamente, Alex parou ao lado do pai com olhar ansioso direcionado a .

– Essa é a , te falei dela. – apresentou, apontando com o queixo para a namorada, que sorriu.
– Claro! – Alexandria sorriu grande. Seu tom de voz era confortável, macio e doce, não falava alto e tinha olhos agitados. – Bom te conhecer, .
– O prazer é meu. – A médica sorriu, cumprimentando a irmã mais velha do namorado. – sempre fala muito de você. – riu e Alex assentiu, em uma grata surpresa.
– Um pouco de chá, Alex? – Ema ofereceu e a outra negou com a cabeça.
– Quer biscoitos, ? – O pai pareceu se lembrar e esticou a uma lata com biscoitos. – São de leite. Não sei se gostam de biscoitos de leite lá no Brasil, mas a gente não sabia se açaí era uma boa opção no inverno. Ou se vocês tomavam açaí com chá. Ema não sabia fazer coxinha. – Ele começou a explicar e a cada palavra o espaço entre os lábios de se apertavam mais. – Você prefere uma cerveja? Temos muita cerveja aqui.
– Na verdade, eu nem bebo nada alcóolico e... – Ela tentou dizer, sentindo-se estúpida com seu sotaque ruim. – E eu sempre adorei biscoitos de leite. São meus favoritos, na verdade. – Mentiu, dando uma mordidinha em um biscoito.
– O que vocês estão fazendo? – Alex riu, inclinando-se para roubar um biscoito. – Coitada, pai. Não é como se o Brasil fosse outro mundo, muito diferente do México, ou que ela tenha tipo acabado de chegar na América – Bre riu e balançou a cabeça, dirigindo a convidada um olhar empático. gostou dela.

❄❄❄


Quinta-feira, 21 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América



Depois de um chá constrangedor, para se dizer o mínimo, e enfim subiam para seus quartos. Ema estava com eles, andando a frente do casal, guiando pela escada e corredor, andava atrás das duas, com as malas da médica brasileira. No segundo andar, assim como no primeiro, haviam várias fotografias de família, fotos de jogos e vitórias de e algumas de Bre – que ainda não havia conhecido –, onde ela jogava golfe e ostentava troféus. não conseguiu conter seu lado profissional, pensando sobre como aquele contexto devia ressoar em Alexandria, a filha mais velha.
A matriarca da família não parecia exatamente feliz ou animada ao levar a hóspede para seu quarto. Ema estava silenciosa, como esteve durante a maior parte do tempo na cozinha. A mexicana guiou o casal para o fim do corredor, duas portas à esquerda, depois da escada, sempre apertando e esfregando a medalhinha que tinha no pescoço. A matriarca abriu a porta do quarto e falou:

Tú quédate aqui. – Falou em espanhol e o filho, que estava ao lado da namorada, torceu os lábios.
– Mãe, inglês, lembra? – Pediu e Ema o olhou, depois afastou o olhar, piscou demoradamente e mirou , que ouvia tudo sem jeito.
– Você fica aqui. – Ema estava segurando a maçaneta, com corpo apoiado a porta.

sorriu apertando os lábios e assentiu com a cabeça, sussurrando um “obrigada”, depois se esticou para olhar dentro do quarto. Parecia um quarto amplo, havia uma cama grande de dossel e uma cômoda, um armário e poltrona. Havia uma janela grande, com vista para o jardim, mas nenhum sinal de cortinas, observou. O papel de parede parecia ser mais antigo do que o do resto da casa, e o quarto, apesar de amplo, tinha ares pouco habitados.

– Não consegui colocar as cortinas de volta a tempo. – Comentou ela, mas sem parecer realmente aborrecida com o pequeno deslize. – Às vezes, se nevar, o sol reflete na neve e deixa o quarto mais claro, mas só quando se dorme até muito tarde. – Ema falou com desdém. – Aqui não dormimos até tarde.
– Tudo bem. – A médica sorriu educada. – Isso não é um problema, eu não me incomodo.
– Por que ela não fica comigo, no meu quarto? – perguntou, abraçando a cintura da namorada, depois de correr os olhos pelo quarto pouco convidativo. – Ela ficaria mais confortável, a gente ficaria.
– Você se casou e esqueceu de me avisar? – A mãe arqueou uma sobrancelha para o central, que não respondeu, mas trocou um olhar rápido com a namorada. – Foi o que eu pensei. Você tem o seu quarto, ela tem o dela. Pode ficar tranquilo, ela vai sobreviver a algumas noites separada de você.

Ema lhes deu as costas e seguiu em direção a escada. uniu os dentes e baixou o canto dos lábios, olhando para o namorado da mesma forma que uma criança olha para o amigo quando este leva uma bronca da mãe. riu abafado e negou com a cabeça, abraçando a namorada e escondendo seu rosto na curva de seu pescoço.

– Desculpe por isso. – Ele pediu, ainda rindo envergonhado. – Por tudo isso.
– Tudo bem. – beijou o lado da cabeça do jogador, se divertindo com aquela situação. – Podia ser pior. – se afastou para olhá-la. – Na verdade, eu estava esperando ter que dividir espaço com Felix, do lado da lareira. Então, pelo tanto que ela me detestou, podia ser bem pior. – O jogador negou com a cabeça e riu abafado.
– Ela não te detestou. Ela só... – coçou a nuca, demorou para tentar encontrar as melhores palavras, enquanto isso o olhava com uma sobrancelha arqueada, comprovando seu ponto. – Só tá te conhecendo ainda. É isso.
– Bom, então espero que um quarto sem cortinas seja o armamento mais pesado dela. Não tenho interesse em um remake daquele filme da Jane Fonda com a JLo. – , que tinha os braços ao redor do pescoço do namorado, brincou. – Espero não ter meu rosto enfiado em um prato na ceia ou algo assim.

riu jogando a cabeça para trás.

– Você não existe. – Ele sorriu, beijando a namorada.
– Me diz, naquela hora, a oração foi, tipo, o mal que ela quer combater com a oração sou eu? – riu.

torceu os lábios e desviou o olhar, sorriu depois de canto com olhar baixo.

– Aquilo? Não era nada. – O moreno a beijou rapidamente, rindo – Não gaste tempo pensando nisso, tá? Não era nada de importante. Deixe minha mãe pra lá. – Pediu.

A médica riu balançando a cabeça.

– Isso parece uma comédia romântica de natal, onde eu preciso conquistar a família do meu parceiro. – riu outra vez. – Mas de novo, tomara que nada parecido com Entrando numa fria ou o filme da Jane Fonda.
– Meu pai gostou de você. – Lembrou , tentando trazer à tona algo positivo daquele encontro.

Para , a reação da mãe também o estava confundindo e o deixando desconfortável, sem jeito. Mais até do que as comparações e piadas de humor duvidoso do pai. Tinha prometido a que tudo daria certo, e só para começar, certo não seria nem de longe a melhor palavra para descrever aquele encontro.

– É, deu para notar com as centenas de coisas que ele parece ter pesquisado no Google sobre o Brasil. – Ela comentou, divertindo-se. – Um fofo. Me lembra de você. Os dois me lembram, na verdade. Cada um à sua maneira. – Disse ela e foi beijada rapidamente por .
– Eu tô feliz que você está achando graça disso e rindo. – afagou o rosto da namorada, segurava a visitante com uma mão em sua cintura e a outra usou para delinear seus lábios. – Achei que você fosse dar uma surtada, ou travar, como na hora que chegamos. – Ele uniu os dentes como uma criança, como costumava fazer.
– Por dentro eu estou. – Confessou e os dois riram juntos, unindo suas testas. – Mas tem a Alex que pareceu simpatizar comigo, você, e seu pai parece empenhado... já conquistei metade do campo. – A mulher ergueu o olhar e parou de sorrir. – Eu só não quero que fique em uma situação ruim com sua família. Com sua mãe. Por minha causa.
– Como você é fofa. – elogiou e sorriu, torceu os lábios, já que ele parecia não ter levado a sério sua fala. Em seguida o jogador a mostrou a língua e se aproximou devagar do rosto da brasileira, até que tocasse a ponta do nariz de com sua língua.
– Eca. – riu, esfregando o nariz e se desvencilhando dele, mas o jogador a abraçou forte, por trás, a impedindo de se afastar.
– Você não reclama quando eu faço isso no...– se virou, ainda gargalhando e cobriu a boca do namorado.
– Seus pais! – Exclamou num sussurro. – Sua mãe já me detesta. Por favor, não piore as coisas.
– Com as coisas que a gente faz e como isso me deixa feliz, ela devia te amar. – sussurrou, olhando a namorada com olhar estreito, malicioso, empurrando-a para dentro do quarto depois de conferir se estavam sozinhos no corredor.
, se controle. – riu, segurando-se ao batente da porta para que ele não a levasse para dentro.
– Eu não faço isso aqui em casa desde... sei lá, desde sempre. – Ele lembrou e riu alto.
– E aí, decidiu que quer quebrar o jejum comigo? – negou com a cabeça, segurando-se com mais força. – Não. Eu estou numa missão aqui. – Ela lembrou, batendo com o dedo indicador no peito dele, enquanto o jogador ria. – Fazer sua mãe me amar.
– O que pode fazer ela amar mais você do que você fazer o filho favorito dela feliz? – riu pelo nariz, fazendo um barulho engraçado e cobriu a boca dele outra vez, usando um dos dedos para colocar sobre os próprios lábios e pedir silêncio. – Dez minutos. Que tal? Só preciso de dez minutinhos.
– Dez minutos? – arregalou os olhos e riu. – Então não vale a pena. – Negou sacudindo a cabeça.
– Ah, ... – reclamou, rolando os olhos.

riu alto e parou de ceder, abraçando os ombros do namorado e se deixando ser empurrada para dentro do quarto. empurrou a porta com os pés e a fez se fechar.

❄❄❄


Quinta-feira, 21 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América



bateu algumas vezes contra o travesseiro e se deixou cair no colchão duro, fazendo muito barulho, demorando para se ajeitar em uma posição confortável. riu pelo nariz e se aconchegou nele outra vez, assim que o namorado parou de se remexer como um peixe recém pescado. Um barulho esquisito enchia o quarto, parecia vir das paredes, não haviam percebido antes porque o barulho da cama era mais alto, mas estreitou o olhar tentando descobrir sua origem agora que estavam em silêncio.

– Que barulho é esse?
– Ah. – O jogador apoiou a cabeça com o braço. – Uns anos atrás meus pais tiveram um problema no aquecedor e ele não funcionava direito em alguns quartos. Trocaram os dutos, mas o desse quarto parece que ficou mal colocado e aí faz esse barulho, principalmente no inverno. – Explicou ele.
– Ah. – baixou o olhar e sorriu, divertindo-se daquela situação.
– É, parece que minha mãe realmente não foi muito com a sua cara. – inflou as bochechas, depois riu envergonhado. – Me desculpe. – O jogador se virou, ficando de lado, olhando-a mais de perto. – Mas você pode fugir pra minha cama, não importa o que ela disse. Ou podemos ir para a minha casa, se for demais para você.
– Está tudo bem. – deu de ombros, beijando o peito dele, que agora já não era mais depilado há semanas. Apesar da insegurança pela clara rejeição por parte da sogra, estava se divertindo. Pensava que certas coisas só aconteciam com ela e aquilo a fazia rir. – Eu já dormi em quartos piores, ela vai precisar de muito mais do que um quarto sem cortina, uma cama que geme e dutos que fazem barulho para quebrar meu espírito se quiser que eu desista do filho dela. – A médica sorriu e o namorado a acompanhou.
– Não esqueça o chá, o colchão duro e a recepção calorosa. – riu pelo nariz.
– E é até justificado, considerando que nós viemos fazer justamente o que sua mãe não queria. – e riram juntos de novo, baixinho.
– Ninguém pode nos deter. – O jogador brincou, abraçando com mais força a namorada. – Nem um colchão ruim.
– Ou uma cama que geme. – completou.
– Ela não gemeu mais que você, então. – O jogador falou sério e deu de ombros, sorrindo com malícia, fazendo com que a namorada erguesse o rosto e o encarrasse com expressão chocada e lhe acertasse um tapa fraco. – Não foi uma crítica. – riu erguendo as sobrancelhas e se defendendo.
– Idiota. – Ela riu negando com a cabeça, apoiou os cotovelos no colchão e olhou ao seu redor, prestando atenção no quarto pela primeira vez desde que haviam entrado ali. – Qual é a história desse quarto?
– Você não vai querer saber. – inflou as bochechas e sorriu fechado.
– Claro que vou. – negou com a cabeça de novo. – Por que eu não iria? É uma história ruim?
– É só um quarto abandonado há anos. – Ele deu de ombros. – Deve ter muita coisa por aí além da poeira. Tipo um rato. – se lembrou. – Ele é quase da família, na verdade. Vive aqui há anos.

arregalou os olhos, mas se recompôs rapidamente, e mesmo que tentasse disfarçar devido seus bons modos, a mudança no semblante da brasileira fez o namorado rir alto.

– Um rato. – Ela repetiu.
– É, mas não se preocupa, ele é pequeno. – levou uma das mãos ao rosto dela, afagando sua bochecha. – É tipo um camundongo, desses de desenho animado. E ele é antissocial, não corre o risco de tentar fazer amizades.
– Eu não tenho medo. – Respondeu.
– Não? – duvidou, sorrindo de lado.
– Não, eu só não gostaria de dividir a cama com ele. – Disse e não era uma mentira completa.

O casal fez silêncio.

conferia as unhas enquanto sentia o namorado afagar seu rosto e depois nuca. encarava o teto, perdido em seus pensamentos. Estavam nus, como de costume, cobertos por uma manta grossa que cobria a cama antes de se deitarem ali. imaginava se a família havia dado falta dos dois, ou se haviam sido mesmo rápidos como brincou ser, ou se por algum milagre tinha razão e as paredes eram grossas demais para serem ouvidos em outros cômodos. Não queria gerar aos pais de a ideia de um casal descompensado, mal-educado, que não conseguia ver uma cama feita sem se deitar nela. “Não é o que uma moça de família devia fazer.” Aquelas palavras, escutadas tantas vezes encontravam terreno fértil na mente vazia de .
pensava sobre estar com frio e se perguntava e pensava sobre formas de melhorar seu desempenho e dotes para aqueles momentos.

– Você gostou? – perguntou de repente, atraindo um olhar confuso da namorada. – De hoje. Você gostou?
– Claro, amor. – assentiu com um sorriso suave. – Foi tudo ótimo, a viagem, aqui. Só estou um pouco cansada por passar tanto tempo dentro do avião, carro e...

a interrompeu.

– Não, não tô falando disso. – Ele riu pelo nariz. – Tô falando do que a gente fez.
– Do sexo? – uniu as sobrancelhas, confusa com aquela pergunta tão pouco usual entre eles.
– Não chama assim, chamar de sexo agora é esquisito. – Ele riu de novo e ficou corado. – Mas é, é disso que tô falando. Você gostou? – O jogador balançou pelos ombros, enquanto ela ria alto.
– Por que isso agora? Achou que eu fingi?
– Eu não, não tem como você ter... – se interrompeu, deixou os olhos vagarem até a parede e ficarem ali por alguns segundos. – Espera. Do que você tá falando? Você já fingiu alguma vez? – Ele estreitou o olhar de modo quase criminoso.
– Eu não disse isso. – negou, deitando-se e encarando o teto.
. – O central a chamou com firmeza e rolou para cima da namorada, apoiando o corpo em um cotovelo e no antebraço, posicionado ao lado do rosto de , prendendo-a. – Eu não acredito que você já fingiu comigo. – Acusou ressentido, mas sem conseguir segurar o riso.
– Você quem está falando isso. – negou, se esforçava para não rir, o que a dava um ar de culpada ainda maior. – Você não disse que não tinha como eu ter feito?
– É, mas agora eu tenho minhas dúvidas. – estava chocado e ria da situação. Aquele relacionamento e aquela mulher eram tão mágicos que até algo assim parecia ter graça.
– Só foi uma vez. – Ela confessou e o jogador a cutucou nas costelas, fazendo a visitante se encolher pelas cócegas. – Eu juro. Só uma.
– Como? Quando? – estava chocado. – se você acha que eu transo mal, me fale. – Ele riu espantado e nervosamente, porque estava chocado.
– Eu não acho. Não acho. – Ela negou, tinha desistido de segurar o riso. – Foi só uma vez, porque estava com sono. Lá em casa.
. – se sentou, passado. – Eu tô rindo, mas é por estar nervoso.

riu pelo nariz e se sentou também, o abraçando e beijando seus ombros.

– Desculpe. – Pediu ela. – Mas realmente só aconteceu uma vez. Você saberia se fosse frequente.
– Não sei, não sei de mais nada. – Ele apoiou o rosto com uma mão, desolado. – Minha vida foi uma mentira.
– Amor, não. – ainda ria. – Não entendo porque você quis saber isso hoje. Porque achou isso sobre hoje...
– Eu não achei. – a interrompeu. – Eu queria perguntar pra melhorar o que já era bom, mas agora...
– Aí, minha nossa. – ria sem saber o que fazer. deixou o corpo pender sobre a cama outra vez.

– Por que? Estava ruim? Você fingiu em que parte? – Ele tornou a questionar após uns instantes de silêncio.
– Nada, só estava cansada... já tinha tido meu momento quando você... – Ela hesitou.
– Quando eu o que? – quis saber, unindo as sobrancelhas escuras e retas.
– Sabe? Você... – apontou com o olhar para baixo e o namorado acompanhou. – Entendeu? Quando você...
– Ah, sim, quando eu te...
. – Brian, pai de bateu a porta repentinamente, interrompendo o que o filho diria. – Está acordada?

O casal arregalou os olhos e apertou os travesseiros no rosto, abafando sua risada.

– Sim. – respondeu depois de balançar e clamar por ajuda pelo olhar.
– Desculpe se te acordei. – Pediu o mais velho. – Só para avisar que Bre já chegou também e que logo vamos servir o jantar.
– O jantar? – A visitante se surpreendeu e a olhou em silêncio com olhar que dizia “como assim já é a hora do jantar?” – Eu perdi completamente a noção do tempo. – Comentou em voz alta para o namorado, mas fora o pai dele quem a respondeu.
– Foi uma viagem longa de vocês para cá, é um dia frio. – Pelo tom de Brian era possível perceber que ele sorria. – É bom descansar.

riu e o acertou com o travesseiro.

– Obrigada por me avisar, vou descer logo. – Respondeu a visitante.

Os dois esperaram o som de passos sumir do corredor para enfim voltarem a falar.

– Então é assim que é fazer as coisas escondido dos pais? – riu e a namorada o acertou com outro travesseiro.
– Quantas namoradas você já trouxe para casa? – quis saber.
– Nenhuma. – Negou o jogador de hockey. – Pelo menos pra fazer isso, não. Só fazia isso em casa. – Contou exibido. – Na minha própria casa. É que eu quase sempre tive minha própria casa.
– Se minha mãe pudesse me ver agora, ela morreria de vergonha. – A médica balançou a cabeça, envergonhada com a situação.
– Relaxa, ele não perguntou por mim, deve pensar que eu tô por aí. – deu de ombros, apoiando uma das mãos atrás da cabeça.
– Duvido, ele conhece o pervertido que tem como filho. – empurrou o namorado com as pernas, rindo. – Ande. Vá embora. Eu preciso tomar um banho. – A visitante olhou pelo quarto e percebeu uma porta em um dos cantos, parecia ser um banheiro. – Ah, graças a Deus um banheiro no quarto. – Ela suspirou. – Não vou ter que andar pela casa para tomar banho.

riu pelo nariz, ficando de pé.

– Eu estava de cueca? – O jogador perguntou, olhando para o quarto em busca da peça de roupa.
– Se a sua mãe entrar aqui e achar, ela vai me matar. – A médica se enrolou na manta que antes cobria a cama e ficou de pé para tentar ajudar o namorado a procurar, encontrando a peça jogada embaixo da cama. – Aqui.

se vestiu rápido enquanto reunia as próprias roupas. Tinham tanto hábito em espalhar roupas e não pensar em juntar depois, que não tinham mais qualquer cuidado quando se despiam.

– Por favor, invente uma desculpa para que eles não saibam o que a gente fez. – pediu e viu o namorado gargalhar, jogando a cabeça para trás. – Ande. Preciso tomar banho.
eu já te vi sem roupa mais vezes do que me lembro. – O central rolou os olhos e abraçou a cintura da namorada. – Já te vi tomando banho, dormindo, de vários ângulos... de todos os ângulos. – riu, enfatizando suas palavras com o olhar. – Eu posso te ver tomando banho.
– Pode, mas não vai. – A médica o empurrou em direção a porta. – Eu quero que sua mãe goste de mim, não que ela me desconjure. – apenas ria. – Ande. Vamos. Saia.

A visitante parou de empurrá-lo, abriu a porta devagar e conferiu se estavam mesmo sozinhos no corredor antes de colocar o namorado para fora. se segurou no batente da porta antes de sair, inclinando-se para falar com a namorada.

– Tá, já vou. – Ele sorriu. – Só cuidado no banho.
– Por que? – uniu as sobrancelhas.
– O seu colega de quarto rato pode aparecer e te ver pelada. – piscou e sorriu. – E eu sou muito ciumento.

tentou acertar o namorado com um tapa fraco, mas ele desviou e se afastou depressa, rindo alto no corredor. também riu, fechou a porta rápido, se apoiando a ela e respirando fundo.

– Ai, ... Aonde você veio parar. – Suspirou encarando o quarto, ainda enrolada ao cobertor.

❄❄❄


Quinta-feira, 21 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América



Tinha sido um satisfatório banho quente, deixou o banheiro em seu quarto andando despreocupadamente, até se assustar com a figura de Alex deitada em sua cama, com pernas cruzadas e dar o maior e mais estridente grito que tinha dado em meses. O primeiro instinto dele fora correr de volta para o banheiro e assim ele o fez, quase perdendo a toalha que estava presa a sua cintura no caminho. Para em seguida se dar conta de que se tratava da irmã e voltar para o quarto com uma mão sobre o peito. Tudo durou menos de cinco segundos, tinha uma excelente velocidade de reação.

– Alex, meu Deus. – O jogador a repreendeu.
– A já te viu gritando assim? – A irmã mais velha riu alto, divertindo-se com o grito vergonhoso do irmão.
– Cala a boca.

lhe deu as costas, procurando algo na mala para vestir e ignorando sua presença.

– Mamãe e papai vão ter que dormir com os velhos abafadores de ouvido da Mama Saló essa noite. – Alex voltou a falar e fingiu não prestar atenção. – Porque você e a podiam tentar fazer menos barulho, não é? E evitar aquela cama gritadeira.
– Alex. – repreendeu a irmã outra vez, mas dessa sem a olhar, estava envergonhado. Apesar de ter mais liberdade com a irmã do que era comum, não era normal que ela ouvisse quando ele estava em momentos íntimos, nem ela, nem os pais.
– Me diz. – Ela voltou a falar depois de um suspiro e se aproximou do irmão, ficando de pé. – Como saímos de você nunca apresentando ninguém e implicando com a Bre por causa do Peter, para essa quase exibição de lua de mel, com direito a uma cavalgada rangedora e roxos pelo corpo. – Ao dizer, Alex se aproximou mais e puxou a gola do suéter que havia acabado de vestir, revelando o pescoço marcado dele. O central se desvencilhou. – Felizmente para você é uma ótima temporada para investir em gola rolê.
– Para, Alex. – O jogador se afastou emburrado, sentando-se na beira a cama. – Não sei porque seu espanto. – Ele deu de ombros. – Trouxe minha namorada, estamos juntos há um tempo bom para eu ter certeza do que estou fazendo.
– Eu não me espantaria se não fosse você. – Alex se sentou na cama também. – Eu não tenho voz aqui, mas você sempre foi um dos a apoiar essa coisa do feriado em família. Nunca ajudou ou deixou que a Bre trouxesse o Peter para o natal, aniversário ou qualquer coisa assim.
– Mas mesmo assim, ele estava nas nossas últimas férias em família. – resmungou.
– Assim como a Maggie, sua ex. – Alex o lembrou, arqueando uma sobrancelha, ficou de pé.
– Isso é passado, e é diferente. – Falou com firmeza o jogador. – Com as outras eu sempre tive dúvidas e não queria que nada atrapalhasse nosso natal em família. Com a ... – Ele hesitou, sorrindo e inclinando a cabeça. – Eu não sei, é só que... eu nunca tenho dúvidas. Tudo com ela é simples e fácil, sem dúvidas ou hesitação. Estamos muito bem. Ela me apoia em tudo, é doce, compreensiva, já até falou que me ama.
– Ui, as coisas estão sérias mesmo. – Brincou a morena, retomando seu lugar entre as almofadas da cama do irmão caçula, assistindo-o falar.
– Você nem faz ideia. – riu de maneira infantil e deixou as costas penderem sobre as pernas da irmã quando se sentou outra vez. – Eu não trouxe só a garota para o natal... trouxe um anel também. – Confidenciou e Alex arregalou os olhos.
– É o quê?
– Vou te contar. – O jogador se virou, apoiando os cotovelos no colchão. – Então, você me conhece, sabe como eu sou chato com as pessoas na minha vida, mas aí...

❄❄❄


havia tomado o pior banho de sua vida.
A água não esquentava o suficiente e toda vez que se mexia, parecia ver de soslaio a sombra do bendito rato, sempre levava algum susto com o barulho do aquecedor. Sentia-se como o velho do livro O velho e o mar. era seu marlim, o peixe gigantesco, reluzente, melhor do que sonhara, Ema era o tubarão. Na verdade, representados na sogra estavam todos aqueles tubarões do livro. O quarto barulhento, a cama que rangia e o colchão duro, a janela sem cortinas, o banheiro cuja água quente – em pleno inverno – não funcionava direito. Ema devia estar muito familiarizada com técnicas de guerrilha misturado a táticas do exército americano para desestabilizar um oponente. A médica só não sabia que era uma inimiga tão considerável a matriarca.
Não entendia se por ciúmes ou se era por ser estrangeira, ou se Ema só a achava inadequada a seu filho. não discordava. Se tratando da mãe de alguém tão sensível e dócil como , era normal e esperado que ela tivesse suas ressalvas. Por mais que esquecesse disso na maior parte do tempo, era alguém famoso e muito rico, devia ser normal que pessoas surgissem em sua vida e na vida de sua família para apenas se aproveitar.
A visitante estava pronta para descer, depois de beirar o impossível para ficar apresentável para o jantar, com as roupas mais confortáveis e adequadas que tinha na mala, quando ouviu uma notificação no celular. Era Chiara, uma de suas melhores amigas e grande incentivadora em todas as áreas da vida.

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Chiara 💎
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O que a safada está fazendo?

Nenhuma coisa safada no momento 😂😂

Sentando muito?

Ops... saindo muito, quis dizer

CHIARA! 😂🙈🙈

Pare de fingir, você

Aonde está que não respondeu minhas ligações?

Ah… desculpe, amiga.

Estou na casa dos sogros...



suspirou e resolveu se sentar na cama, dobrando as pernas. Do lado de fora a noite já havia caído e a sombra dos galhos de algumas das árvores do jardim entravam no quarto, esticando-se pelo chão. Não costumava usar celular em suas viagens, mas mentiria se dissesse que ficar no quarto conversando com sua melhor amiga não era uma ótima saída para não encarar a mãe de seu namorado.

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Chiara 💎
Online

Então ele te arrastou mesmo?

Nove meses e só agora ele te apresenta, ainda faz isso no natal, com a família reunida. Sinceramente, hein...

Não é como se eu tivesse pressa, amiga...

Dá pra ver...

Por mim, continuava como estávamos, não sentia falta disso.

Eu sei que tem toda essa coisa dele ser famoso, mas... eu não consigo achar normal toda essa demora quando se realmente gosta de alguém

Estavamos mais preocupados em viver kkkkkk acho que é isso

Agora que já conhece a sogrinha, falta pouco para serem DESMASCARADOS na mídia também.

Espero que isso aconteça quando eu estiver aí, vou amar assistir a cena. Vai ser digna de novela, vai sair no alfinetei, choquei, até na Ana Maria Braga.

TÓXICA!

Como estão as coisas na casa da sogrinha? Já saudaram a bandeira? Já perguntaram se você ia para a faculdade montada numa onça ou num macaco?



riu alto, depois fez um pequeno vídeo do quarto, mostrando-o rapidamente a amiga.

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Chiara 💎
Online

Que cativeiro é esse?

É o quarto que a mãe dele me reservou. Eu sinto que há uma coisa no ar

Além da poeira do túmulo do JFK? Ácaros? Alguém já lembrou a ela que aí não existe SUS?

Idiota 😂 me refiro a ela não gostar de mim

Nossa, se você ainda não tem certeza, assista o vídeo que me mandou.

Meia noite vou te contar um segredo

Não sei se é bem isso, porque o pai dele parece ter pesquisado todo tipo de curiosidade aleatória sobre comida e futebol, até tentou sambar

Se ele ainda não te perguntou como é tão branca e brasileira ao mesmo tempo, ou se você tinha internet em casa no BR, pode ser que esteja mesmo se esforçando.

Ela nos colocou em quartos separados, disse que não somos casados. Talvez ache que sou uma interesseira, ou esteja com ciúmes de seu bebê. Meu quarto não tem água totalmente quente, a cama faz barulho, tem o barulho do aquecedor...

Nossa, ela realmente gostou da ideia dele trazer alguém para casa, não é?...

Nem me fale, ela quer quebrar meu espírito de qualquer jeito

Mostre a ela, amiga! Eles esquecem que a gente nasce com formação em fugir de dois caras em uma moto, vendedor de perfume falso na rua e arrastão. Não vai ser um cativeiro desses que vai te fazer desistir do seu homem



se deixou cair deitada na cama e rolou, rindo alto da mensagem de Chiara.

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Chiara 💎
Online

Espero sobreviver até o natal, pelo menos

Assuma suas origens brasileiras, amiga. Se lembra daquele ditado? O segredo para lidar com um doido, é um doido e meio.

kkkkkkkkkkkkkkkk

Só espero que a rolada esteja valendo a pena para você aí por passar por tudo isso

Digo.

Ah, digo nada. Foi isso mesmo que quis dizer

CHIARAAAAAAAAAA!!!! 😂😂😂😂😂😂😂



❄❄❄


Quinta-feira, 21 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América



Na grande sala dos o jantar estava prestes a ser servido e a noite era mais fria do que havia sido o dia. Todos estavam rodeando a estrangeira, fazendo perguntas e se divertindo com as curiosidades que contava sobre seu país. estava sentado ao lado dela, com um braço sobre seus ombros e sentindo o afago confortável de sobre sua coxa. Ele se surpreendia e se divertia com as diferenças entre os três países, Estados Unidos, México e Brasil.
As irmãs e o pai não cessavam de fazer perguntas, empolgados e curiosos, enquanto a mãe se mantinha isolada na cozinha, finalizando o jantar. Bre havia sido apresentada a também, e apesar de mais quieta que Alex e Auston, era divertida, inteligente e muito agradável. Alex e a brasileira também tiveram mais tempo para conversar e encontraram muitas coisas em comum uma com a outra. e Alex amavam livros, adoravam Fórmula Um e torciam para a Ferrari, amavam estar com as amigas, nunca dispensavam café gelado e eram caseiras, apegadas a família e trocavam tudo por um dia de bolinho e café.

– Então, vocês lá, eu sempre imagino todas vocês como a Anitta ou as garotas nos vídeos dela. – Bre comentou. Era a décima pergunta da irmã caçula de à sua nova namorada.
– Na verdade, não. – riu mexendo os ombros e recostando-se a . – Lá há uma grande diversidade, como aqui. Não temos exatamente um padrão. Assim como nem todo mundo gosta de futebol, de calor, de carnaval ou da Anitta.
– Imagine conhecer um brasileiro e ele não gostar de futebol, cerveja, carnaval ou samba. – Brian, o pai, riu. Ele estava de pé, apoiado as costas de uma poltrona porque, em suas palavras, não podia se juntar a eles por estar ocupado. Já fazia quase uma hora que ele estava parado ali, de pé.
– Acontece, é bem comum. – deu de ombros. – Acho que o maior estranhamento é quando conhecem um brasileiro raiz, do tipo que joga conversa fora, se mete na vida dos vizinhos, abraça e beija todas as vezes que se encontra com você...
– Eu não iria querer morar em um lugar assim. – fez careta, para ela a maior parte dos hábitos brasileiro eram pra lá de esquisitos. – Comer feijão e arroz todos os dias, sempre. Almoçar como se fosse um jantar e depois jantar de novo. Abraçar as pessoas, beijar as pessoas.
– Nem todos são assim, as de onde eu vim não costumam ser tão simpáticas. – olhou a mais jovem, sorrindo com a careta quase infantil de repulsa que ela fazia.
– A comida parece boa, mas é tudo muito pesado, sério. – Alex comentou, tinha a expressão parecida com a da irmã, enquanto ria. – É como quando vamos para o México, eu amo, mas meu estômago foi acostumado por muito tempo, até aceitar tudo com tranquilidade.
– É, nada saudável ou glamoroso. – Bre completou, sorrindo. – Eu gosto de brigadeiro, gosto de algumas coisas específicas, tipo açaí. Mas é como o México, eu gosto de visitar, mas não sei se moraria lá.
– Eu achei difícil me adaptar a de vocês, confesso. – assentiu. – As coisas são parecidas em alguns aspectos, mas no geral tudo é muito diferente, e...

foi interrompida com a chegada repentina de Ema a sala. A senhora correu os olhos pelo grupo rapidamente, mas não parecia muito feliz com a cena.

– O jantar está servido. – Avisou sem rodeios e lhes deu as costas. O sotaque dela era diferente. Não era arrastado como o sotaque de Brian, Alex e Bre, nem era mais limpo e neutro como o de .

O grupo se pôs de pé rapidamente, preparando-se para seguir para a mesa.

– Ela vai melhorar. – Bre sussurrou apenas para que e a ouvissem. – Você vai aprender que os não são rápidos de se conquistar. – A golfista piscou e apertou o ombro da namorada, em concordância. – Exceto o , mas isso você já deve saber. – O jogador mostrou a língua e Bre riu.
– Então eu não devo me preocupar com os olhares matadores e com o fato de ela ter me deixado tomar um banho quase frio no inverno? – arqueou uma sobrancelha e sorriu de lado.
– Ela podia ter te colocado pra dormir na sala, ou com a Alex. – Bre levantou um ombro e maneou a cabeça. – Aliás. – A morena buscou o olhar do irmão. – Já contou a ela que a Mama Saló morreu naquele quarto?

Bre lançou sua pergunta no ar e começou a se afastar. dirigiu a um olhar que era uma mistura de incredulidade e pânico. Enquanto o jogador encarava a irmã se afastar, feliz por ter semeado o caos, completamente abismado.
Não tiveram tempo de reação antes que a campainha tocasse.
Ema surgiu na sala, Brian e os outros trocaram olhares, como se se perguntassem quem estava esperando visitas. Pelas expressões fechadas, percebeu que a família não parecia muito fã de visitantes súbitos e criou uma nota mental sobre isso. Bre, que fora a única a não transparecer irritação com a chegada repentina de alguém, se apressou para a porta e a abriu. Do outro lado, com mãos nos bolsos de um sobretudo escuro e olhar ressabiado estava um rapaz loiro, alto, de postura desengonçada.

– Não fode. – sussurrou e lhe deu um puxão e o encarou com olhar confuso.

– Boa noite. – O rapaz cumprimentou a todos assim que se juntou à família. – Ema, Brian, Alex. – Saudou especialmente os pais, acenando com a cabeça. – . – Ao filho do meio, o cumprimento fora mais reticente.

não respondeu.

– Essa é a namorada do , . – Bre apresentou sorrindo e a médica brasileira correspondeu, saudando o outro visitante com um aperto de mão. – Esse é o meu namorado, Peter.
– É um prazer. – sorriu e balançou a cabeça.
– Igualmente. – Ele respondeu com um sorriso torto.

Alheio as apresentações, um clima tenso e pesado se instaurou entre a família . Apesar de Ema e Brian responderem o cumprimento do rapaz com acenos educados, todos pareciam tensionados. se sentia alheia a aquilo, como uma espectadora confusa, que chega na metade do filme e não entende como os dramas foram construídos. Os pais se entreolhavam, olhavam para Bre e Peter e depois para . Alex também olhava do visitante para o irmão, mas Bre encarava os pais e o irmão do meio de nariz em pé, sem hesitação. Peter parecia inseguro e tinha o olhar baixo e lábios apertados em um sorriso sem jeito, que mais parecia uma careta nervosa do que um sorriso.
demorou, mas enfim percebeu o que acontecia ali. Cutucou o namorado e lhe dirigiu um olhar repreensivo, torcendo os lábios, mas apenas rolou os olhos e deu de ombros. Ela então resolveu força-lo a agir, puxando-o pela manga de seu casaco, obrigando-o a olhá-la, mas ele ignorou. Tinha ouvido muito pouco sobre o namorado da irmã caçula, principalmente da boca do .
A família parecia um tipo de clã muito fechado, uma seita onde novos membros precisavam provar serem dignos. Apenas alguns eventos eram permitidos a namorados e acompanhantes, como algumas viagens em família e algumas refeições ou aniversários. A família tinha regras, do tipo, nunca passar férias entre amigos apenas se não tivesse um tempo com a família. Feriados importantes também deviam ser comemorados em família, assim como aniversários. Eram todos discretos, não eram do tipo festeiro ou que gostavam de estar entre muitas pessoas. .

se colocou no lugar de Peter, já namorava Bre por alguns anos, segundo as informações rasas que tinha conseguido arrancar de , mas mesmo assim, sequer era incluído em fotos de família ou em celebrações importantes. Ninguém o seguia em redes sociais ou tentava ser amigo dele, na verdade, era como se não quisessem que ele estivesse ali. O jovem sem jeito já devia ter passado por coisas muito piores do que uma cama que geme, uma sogra irritada e um rato no quarto, pensou ela.
olhou de Peter para Bre, depois para e estreitou o olhar, incrédula com a coragem do namorado. estava em situação menos favorável à de Bre, e mesmo assim se mantinha teimoso. Era a primeira vez que apresentava a família, bem no natal, mesmo depois de ter levado outras garotas a viagens de família e outros eventos. E apesar de Bre ser gentil e acolhedora com sua namorada, seguia sendo inflexível, rude e teimoso, se negando a cumprimentar Peter. A médica acertou o jogador com uma cotovelada e com o olhar, apontou para Peter. apertou os dentes, mas não cedeu.

– Oi, Peter. – Cumprimentou de má vontade e Peter apertou os lábios em um sorriso. O central buscou os olhos da namorada, como uma criança e ergueu as sobrancelhas, incentivando-o a melhorar. – Que bom que veio jantar também. – Disse de modo mecânico.

Os pais ainda se entreolhavam e Bre assistia a cena com olhos estreitos. fez com que o namorado se inclinasse em sua direção e sussurrou algo para que apenas ele ouvisse. a olhou com sobrancelhas unidas, como se quisesse se certificar de ter mesmo escutado aquilo e viu a namorada assentir com firmeza. Depois fez careta e tentou protestar, mas não deu brechas.

– Tá, vem, vamos jantar, então. – O jogador repentinamente mudou sua postura e guiou Peter pelo ombro, levando-o para a sala de jantar. – Minha mãe cozinhou. Deve ter alguma coisa que você gosta. – Falava ele, transformado. – Sente ali, aquele é o lugar da Bre...

o ouviu falar.
Enquanto os outros se afastavam em direção ao jantar, Bre se aproximou com olhos arregalados e um sorriso abismado nos lábios.

– O que você fez? – Quis saber ela, enquanto as duas se uniam ao resto da família, na sala de jantar.
– Estamos no deserto, então... digamos que ele só não quis ficar na seca. – Brincou a médica brasileira e Bre riu. – Disponha.

ocupou a cadeira ao lado de , Brian estava em uma ponta e Ema na outra, a esquerda de Brian, Alex, Bre e Peter, a direita dele, e . O jantar estava servido e parecia atrativo, assim como o cheiro. Havia lombo, saladas diferentes e cremosas, batatas e algumas outras coisas que não foi capaz de reconhecer.

– Você não falou sério, né? – O capitão sussurrou assim que a namorada ocupou um lugar ao seu lado, esticando o guardanapo no colo.
– Experimente. – respondeu entredentes.
– Qual é? – Protestou , choramingando. – Isso nem faz sentido. Você nem conhece ele.
– Não seja hipócrita, acabe com essa implicância idiota com o Peter e você vai ter o que quiser. – Ela deu de ombros enquanto era servida com uma fatia de lombo pelo pai de .
– Espero que goste, . – Ele piscou. – Ema cozinha muito bem, mas sendo brasileira, não sei se está acostumada com essa comida.
– Tenho certeza que está fantástica. – A médica sorriu, buscando o olhar de Ema, mas a matriarca parecia concentrada em seu jantar, mesmo que não aparentasse estar muito contente. – E nossa culinária se parece em vários pontos também. – Ela sorriu e viu Ema erguer as sobrancelhas.
– O que é isso, mama? – quis saber, prestando mais atenção a um prato específico sobre a mesa.
Chili, amor. – Ema respondeu erguendo o rosto. – Ficou tanto tempo longe que já se esqueceu de como a comida de verdade se parece? – Ela perguntou, usando de um tom dócil, mas ressentido ao responder o filho com outra pergunta.

sorriu apertando os lábios.

– Claro que não, mama. – Ele negou com a cabeça.
– Não é muito comum lá no Brasil, é? – Alex puxou assunto, sorrindo para .
– Não, chili não. – riu fraco. – Mas provei muita coisa da culinária mexicana quando morei aqui em Scottsdale. Seu irmão também cozinha muito disso para mim. – A médica trocou um rápido olhar com o jogador, que sorriu doce. – No início eu estranhei um pouco, mas aprendi a gostar. Hoje em dia eu adoro, mas só confio e como o que o faz.

ainda sorria para o namorado, mas as expressões dos outros ocupantes da mesa congelaram por alguns segundos. Ema ergueu o rosto e encarou a estrangeira com olhar estreito.

– Mas é claro que a da senhora . Ema. Da Ema . Senhora Ema. – se atrapalhou, nervosa e tossiu, engasgada com sua própria voz. inclinou a cabeça, tentando segurar o riso. – A sua comida deve estar perfeita. Certamente. Muito boa. Não vejo a hora de experimentar.

baixou a cabeça e apertou os olhos, sucumbindo à sua vergonha. apertou os lábios e ergueu as duas sobrancelhas, Peter e Bre trocaram um olhar rápido, Brian e Alex permaneceram em silêncio, em absoluta concentração em seus jantares e enfim Ema desviou o olhar de .

– Então – Brian tornou a puxar assunto, já que o clima silencioso na mesa estava absolutamente constrangedor. – Um dia desses você devia cozinhar algo típico do seu país aqui. – Ele propôs sorrindo e a maior parte da mesa o acompanhou, se agradando da ideia, menos Ema.
– A ? – riu pelo nariz, com sarcasmo e recebeu um chute da namorada por baixo da mesa, que riu amarelo.
– É que eu não sou exatamente a melhor das cozinheiras. – explicou, tentando brincar.
– Não? – Ema tornou a ergueu o rosto e a fitar com olhos surpresos a nova namorada do filho.
– Não. – respondeu num fio de voz, tentando sorrir. – Não tão bem quanto... quanto...
– Que bom que o tem um chef de cozinha só para ele, né? – Peter fez piada.

Não se podia esperar que ele, alheio a todo o resto, compreendesse a delicadeza do momento, principalmente quando nem mesmo parecia compreender.

– Não muda muita coisa se sou eu quem cozinho quando estamos juntos. – O jogador respondeu, sorrindo. A parte boa era que o jogador pareceu minimamente socializar com Peter, a parte ruim era que em breve ficaria solteiro.

– Como? – Ema indagou e pensou ter visto um dos olhos da mexicana piscarem involuntariamente.

ainda ria e estava prestes a responder quando se virou para a mãe e viu seu semblante. O jogador engoliu suas palavras e se endireitou.

– Como o quê? O quê? – Fingiu-se de desentendido, enfiando um pedaço de lombo na boca. – Isso tá realmente muito bom, mama. Muito melhor do que qualquer coisa que eu tenha feito.
– Você quem cozinha? – A mãe insistiu na pergunta e o casal se entreolhou. Antes de responder também buscou o olhar do casal a sua frente, recebendo deles um olhar de pena que a fez sentir vontade de sair correndo.
– Eu não cozinho muito bem. Minha mãe até tentou, mas eu não sou exatamente talentosa nessa área. – admitiu depois de respirar fundo, baixando os ombros. – cuida de mim, nesse sentido e em vários outros.
– É, eu não ligo. – Ele assentiu, tentando ajudar a namorada. – Eu gosto. Pelo menos na casa dela eu tenho liberdade. Em casa sempre tinha alguém na cozinha, cardápio regulado e...
– Você está saindo da dieta? – Fora a vez de Brian questionar mais seriamente e , que tinha os lábios entreabertos por estar prestes a concluir sua frase, apenas os fechou devagar e negou com a cabeça.
– Não muito. – tentou melhorar. – O que ele quis dizer é que, ele gosta de cozinhar. É terapêutico.
– Em casa ele nunca teve que cozinhar. – Ema alfinetou e o casal trocou olhares rapidamente. – Aqui ele nunca teve que cozinhar. Sempre teve alguém para cuidar dele.
– É, mas eu gosto de cozinhar quando estou em casa com a , mãe. – falou depois de um suspiro longo.
– É, cozinhar faz muito bem. – Peter tentou ajudar também. – É bom para criar e fortalecer laços, eu ouvi dizer.
– É, as pessoas mudam. – Bre completou, em um suspiro sarcástico.
– Em casa com a ? – Ema inclinou a cabeça sobre o ombro e repetiu o que o filho havia dito após alguns segundos de contemplação.

e se olharam outra vez.
A médica sacudiu a cabeça negativamente, seu olhar gritava para que ele não fizesse o que ela tinha certeza que estava prestes a fazer. O central abriu e fechou a boca, depois se recostou mais confortavelmente na cadeira e ergueu os olhos para os pais.

– A gente tem passado muito tempo junto, praticamente morando juntos. – Contou de uma vez.

A visitante expirou derrotada e fechou os olhos, inclinando a cabeça.

– O quê? – Ema indagou sem se esforçar para disfarçar suas emoções.
– Vocês o quê? – Brian também se surpreendeu, inclinando-se um pouco sobre a mesa.

Peter encarou o prato sem qualquer reação, Alex inclinou a cabeça e assistia a cena por debaixo de suas sobrancelhas escuras, enquanto Bre fingia não estar presente.

– É, a gente tá. – afirmou. – E eu tô satisfeito com a ideia. Tô bem feliz, na verdade. Estamos, nós dois. – O central entrelaçou os dedos com os da namorada e segurou sua mão sobre a mesa.
– Amor, não é assim também. – tentou amenizar, rindo sem jeito. – Ele ainda tem a casa dele e eu a minha, só para esclarecer.
– É, mas só por enquanto. – torceu os lábios e deu de ombros, negando e olhando para a namorada, como se dissesse que o que ela dizia não fazia sentido.
– Sabe como ele é espaçoso, não é? – tentou se desvencilhar do namorado, sentindo queimar sobre si o olhar de Ema . – Sempre achando que todo lugar é a casa dele. – Ela ria nervosa.
– Mas é claro que lá é a minha casa também. – riu, negando a versão da namorada, sem entender o que se passava. – Se a gente dorme e acorda lá todos os dias, então é a nossa casa. – Ele riu pelo nariz, como se fosse óbvio.

Um dos olhos de Ema tremeu e a mexicana deixou cair o talher que segurava, causando um som seco quando a peça atingiu o chão. A família encarou a matriarca, assustados. Tudo que podia ouvir era o som dos seus batimentos acelerados.

– É sério? – perguntou de modo retórico ao namorado, em um sussurro. – Era mesmo a melhor coisa a dizer?

❄❄❄


Quinta-feira, 21 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América



Depois do jantar desastroso, estava em sua cama dura outra vez. Vestia seu pijama e encarava o teto, ouvindo o barulho irritante e alto dos dutos do aquecedor na parede atrás da cama e contando quantos ruídos diferentes os dutos eram capazes de fazer. Apesar da claridade da noite que entrava pela janela sem cortinas, o quarto era um tanto assustador. Principalmente depois de saber sobre o falecimento de mama Saló, mesmo sem fazer ideia de quem era ela.
Se resolveu omitir aquela parte, muito provavelmente seria por ter algo de suspeito ou ruim naquela história. Será que a mama Saló era uma parente dos ? Será havia mesmo morrido naquele quarto ou era só implicância de Bre? Se fosse mesmo, será que haviam trocado a cama e o colchão? Ou estava dormindo no lugar de uma morta?
se remexeu nervosamente, ouvindo a cama gemer a cada movimento, tentando afugentar aqueles pensamentos. Evitando seguir a trilha de sua ansiedade, que a levava diretamente a imaginar uma outra mulher da família, tão infeliz quanto Ema com a escolha de , a perseguindo como um fantasma porque não era a mulher adequada a .
Besteira, .
Ela disse a si mesma, não devia estar tão preocupada com a aprovação de uma morta que nem sabia quem era e de Ema . Era óbvio que a opinião da família seria considerada por , mas cabia apenas a ele se preocupar com isso e lidar com o fato da mãe odiar sua namorada, não a ela. Dizia isso em looping, tentando fazer com que aquelas palavras se cristalizassem em sua mente, mas não estava funcionando. Evitava olhar para a porta do banheiro e em direção a porta do quarto porque temia ver o fantasma de uma mexicana de pé ali, com olhar de desaprovação, porque em sua cabeça, alguém chamada mama Saló só poderia ser mexicana. Só lhe restava o teto bege e o som dos dutos para lhe distrair enquanto a insônia e a ansiedade faziam sua mente girar.
Depois de alguns minutos – que mais lhe pareceram uma eternidade – ergueu o tronco e encarou o quarto. Não precisava iluminar o cômodo com o celular, porque seus olhos haviam se acostumado a claridade da janela. Podia ver com nitidez uma poltrona grande e de design antigo que estava perto da janela, próxima a porta do banheiro. Entre a porta do banheiro e a porta do quarto havia um armário de três portas de madeira maciça, na parede oposta a janela uma cômoda de mesma cor e aparência do armário, com seis gavetas. A cama era antiga, de dossel e a médica se perguntava sobre o motivo de algo tão antiquado. A presença da cama que rangia e quase cantava sobre seus muitos anos de existência não deixavam dúvidas quanto a idade do dono daquelas coisas. O resto da casa era de móveis convencionais, normais e até modernos, nada comparado ao quarto onde a Rainha Elizabeth devia ter dormido quando ainda era uma jovenzinha.
Passando os olhos pelo chão, pelo grande tapete estampado e possivelmente escurecido pelo tempo, viu um pequeno vulto correr e se abrigar junto a um dos pés da poltrona, no canto do quarto. Era um pequeno camundongo marrom com orelhas grandes e redondas. A médica se sentia em um filme, só não sabia ainda se seria Os Fantasmas de Scrooge ou se sobre a Peste Bubônica.

– Parece que tenho mesmo um colega de quarto. – cumprimentou em voz alta. – É um prazer, senhor Ratinho. Também está solitário, triste e ansioso? E veja, é só a minha primeira noite. Espero que ela não seja tão cruel com você quanto é comigo. – A visitante sorriu e observou o rato por alguns segundos, até se dar conta do que fazia e sacudir a cabeça. – Meu Deus, o que esse lugar está fazendo comigo.

A médica jogou-se sobre a cama outra vez e se deitou de lado para que pudesse acompanhar a movimentação do rato. De alguma forma não se sentia mais tão abandonada e insegura, já que, se ouvisse algo suspeito, poderia acreditar ser o ratinho e não um fantasma.
Ainda assistia o rato de olhos estatelados em sua direção quando sentiu seu celular vibrar. Era e ela atendeu de pronto.

– Alô.
– Ah, você atendeu. – Ele pareceu surpreso.
– Você me ligou, o que esperava? – riu fraco, confusa.
– É que eu não queria te acordar. – Explicou o jogador em seu tom suave. – Só percebi que era uma ideia ruim quando já estava ligando.
– Eu não estava dormindo. Não consegui.

suspirou e se fez silêncio do outro lado da linha.

– As coisas não estão saindo exatamente como eu imaginei. – comentou e riu fraco, sem graça.
– Nem me diga. – concordou, sorrindo também. – Se o quarto sem cortinas e banho frio no inverno não resolverem, ela tem um plano B, C... e assim vai. – Brincou a médica. – Não dá pra acusar ela de não ser criativa.
– Ela... ela não costuma ser assim tão... – hesitou, estava sem jeito. O jogador não queria falar mal da mãe, mas também não queria desamparar a namorada. – Dura. Não sei o que está acontecendo.
– Tudo bem. – não queria colocá-lo em uma situação ainda mais difícil, não o culpava por nada, entendia sua situação. – Ela deve ter seus motivos. Quer dizer, até hoje, ninguém é muito fã de brasileiros, sabe... – Riu a médica e o namorado a acompanhou.
– Eu posso ir até aí? – Perguntou após alguns instantes de silêncio. – Durmo com você e fujo cedo, pela manhã, de volta no meu quarto.
– Não. – riu. – Eu agradeço sua solidariedade, mas, meu plano é conquistar sua família, não dar a eles mais motivos para não gostarem de mim.
– Mas isso não é nem justo, amor...
– São só umas noites em um colchão ruim, uma cama que faz barulho. – Ela omitiu o medo de fantasmas, o camundongo e todo o resto. – Eu vou sobreviver.
– Então... – parou de falar e ouviu do outro lado o som da respiração dele ficar um pouco mais forte rapidamente, como se o jogador tivesse se mexido rápido. – Mostra seu rostinho pra mim na porta.
– Na porta? – riu e se sentou na cama, mordendo o lábio inferior, ansiosa e curiosa. – Que porta?
– Na sua. Do quarto.

desceu da cama, enrolando-se em um robe grosso e calçando chinelos, tomando cuidado para evitar o lado do quarto que pertencia ao camundongo. Quando a médica abriu a porta, encontrou parado, com a porta de seu quarto também aberta, no outro extremo do corredor. Os dois ainda estavam ao telefone e sorriram ao se encontrarem, mesmo que a distância. vestia uma calça de moletom e estava sem camisa, os cabelos mais compridos estavam bagunçados e ele tinha aquele sorriso lindo e travesso nos lábios.

– Isso é até interessante. – Ele sorriu grande do outro lado e sentiu crescer a vontade de beijá-lo. – Namoro escondido. Romeo e Giulietta. Falar escondido no telefone de madrugada.
– É, a diferença é que sua mãe ainda não odeia minha família, mas basta ela ter a chance. – Ela riu abafado, cruzando os braços na frente do corpo, mas mantendo o celular perto do rosto. – Tenho certeza que nem Shakespeare escreveria algo tão dramático.

Os dois riram e viu os ombros do namorado tremerem com sua risada e ele negar com a cabeça.

– Você é maravilhosa, . – Declarou o jogador após algum silêncio, a olhando fixamente.
– É que um jogador famoso resolveu me apresentar para os pais no natal, então não posso me sair mal. – Ela sorriu fraco, fazendo piada com a situação. – Mal posso esperar para amanhecer e descobrir de qual outra forma Ema planeja tentar me espantar.
– Eu vou falar com ela. – prometeu, adotando um tom mais sério.
– Tudo bem, podia ser pior. – sorriu. – Ela podia me colocar na sala, como fez com o Peter.
– Vocês brasileiros... – sorriu, inclinando a cabeça sobre o ombro. – Simpática demais até para reclamar. Não quando é sobre mim, mas... – Ele brincou.

negou com a cabeça e sorriu.
Poderia falar por horas sobre aquela situação, mas não por estar magoada. Na verdade, achava engraçado, não tirava a razão de Ema. De repente havia percebido que talvez não estivesse à altura de e talvez isso fosse óbvio a quem o conhecia bem. Apesar de ser latina como ela, não era o ideal de mulher disposta a cuidar da casa e marido, pronta para viver orbitando ao redor de . Ela não cozinhava, não falava espanhol e talvez fosse mais branca do que o esperado. Era engraçado. Ou fazer graça e tentar ler aquilo como algo engraçado fosse o escape da médica para lidar com a rejeição da mãe do homem que amava.

– Vamos dormir. – chamou o namorado, depois de sacudir a cabeça e se livrar dos pensamentos que sua ansiedade haviam trazido. – Amanhã é um novo dia.
– Tem certeza que não quer vir para cá? – Ele insistiu. – Eu tenho água quente e o único barulho que você vai ouvir aqui sou eu. – O jogador tentou faze-la sorrir.
– Não, tudo bem. – assentiu. – Vou desligar agora. Até amanhã, amor.
– Até. – sorriu.

afastou o celular do rosto e finalizou a chamada. De longe, viu o namorado fazer o mesmo enquanto ainda a olhava. sorriu e falou baixo, apenas movimentando os lábios: “Eu amo você.” Ela sorriu e também, fechou a porta rapidamente, antes que ele tivesse chance de responder, mas mesmo assim o jogador o fez: “eu amo você também.”.



You better watch out, you better not cry, you better not pout, I'm tellin' you why

Sexta-feira, 22 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América



A sexta-feira havia começado um pouco mais quente que o dia anterior, mas ainda era frio. Não havia neve, nem o vento cortante de Toronto, era um frio agradável, do tipo que se faz confortável ficar na cama até tarde, ou se embolar no sofá para assistir filmes de natal. tinha acordado cedo e por alguns momentos, havia ficado feliz por pensar que era um horário aceitável para se acordar. Mas quando desceu, todos já haviam tomado seu café da manhã, exceto que escolhera esperar a namorada. Era a primeira bola fora do dia, pensou .
Por outro lado, o café da manhã parecia agradável, pequenas panquecas, tortillas, pães, café, iogurte, leite, geleia e ovos. tentou agradecer a sogra pela refeição e elogiar a qualidade, mas Ema pareceu não se impressionar com as palavras açucaradas da candidata a nora.
e também não tinham conversado muito desde o início da refeição. Falaram apenas sobre as comidas disponíveis, sobre o clima e só. Não era uma situação estranha, estavam acostumados a nem sempre conversar quando a sós. Era – apesar de todos os outros fatores – apenas mais um café da manhã comum entre os dois.

– Ei, garoto. – Brian surgiu da cozinha, ajeitando luvas. Já havia cumprimentado a brasileira pela manhã. – Preciso de ajuda lá fora, o vento derrubou um galho grande essa noite.
– Sim, papa. – O jogador assentiu, bebendo de uma só vez o conteúdo de seu copo de leite.

piscou para , que assentiu sorrindo, depois ele se afastou com o pai. Enquanto via os dois se afastarem em direção ao armário debaixo da escada, se permitiu não pensar. Apenas queria aproveitar o silêncio daquela manhã, sentir o sabor de cada alimento, respirar devagar, aproveitar a viagem sensorial, estar presa no aqui e agora.
Não percebeu quanto tempo havia se passado quando o namorado voltou, ainda ao lado do pai, completamente vestido e preparado para o trabalho braçal, sorrindo como uma criança.

– Como eu estou? – sorriu, perguntando a namorada. – Estiloso?
– Ah, definitivamente. – assentiu sorrindo, admirando a sobreposição estranha de peças que o namorado usava. Enquanto isso, a campainha tocou e Ema passou por trás do filho para atender, sem se incomodar em interagir com os que estavam por perto. – Não te vejo bem assim desde...
– É uma boa roupa. – Brian abraçou o filho de lado e bateu em seu peito, sobre o pesado e fofo casaco preto. – Protege muito. As pessoas usam para escalar montanhas. É muito forte.
– E por que o senhor tem um casaco desses em casa? – quis saber, curiosa. – Pratica escalada? – riu pelo nariz, mas tentou disfarçar.
– Ainda não, mas nunca se sabe. – Brian respondeu orgulhoso. – Nunca se sabe quando se vai ser convidado para uma boa caçada nos polos. – uniu as sobrancelhas, surpresa com o mais velho e estranhando um pouco. Não era vegana nem nada, mas não fazia parte do fã clube de caça. – Quando eu era jovem, meu pai e eu íamos caçar, na chuva, na neve. Vários dias. Comendo peixe que pegava nos rios quase congelados, matando ursos grandes nas florestas frias, explorando toda a nossa América. – Contou orgulhoso e viu olhar para o pai com admiração, mas com um riso frouxo nos lábios que denunciava outra coisa. – Essa roupa era muito cara. Usávamos plásticos e pele.
– Caçando ursos? – A brasileira uniu mais as sobrancelhas, nesse momento Ema se uniu a eles, permanecendo parada perto da sala, em silêncio.
– Sim. – Contou Brian, aproximando-se mais da mesa. – E o outros bichos grandes também, usava as próprias mãos para pegar presas muito, muito difíceis. – Brian gesticulou e apertou os olhos e a voz, tentando imitar o esforço da época.

ergueu as sobrancelhas, devido ao estranhamento que aquela cena lhe causou. percebeu.

– Papa, acho que já tá ok. – Ele falou, batendo algumas vezes no ombro do pai, que buscou seu olhar, retomando sua postura. – Ela já entendeu. Ela entendeu.
– Ah. – Assentiu o mais velho. – Mas eu também posso mostrar a cabeça de...
– Depois. Depois, papa. – o interrompeu, sorrindo gentil para o pai.
, querido. – A mãe enfim abriu a boca. – Max e Jamie estão aqui. – Avisou simpática.
– Aqui? – a olhou surpreso e a mãe assentiu em silêncio. – Como eles sabiam que... , vem. – chamou a namorada, agitando uma mão em sua direção. – Quero te apresentar aos meus primos. – A brasileira uniu as sobrancelhas confusa, levantando-se devagar. – Vem, . Vamos. – Ele a apressou.

O jogador tomou a namorada pela mão e seguido dos pais, abriu a porta da frente e encontrou os primos na varanda. Max e Jamie ainda viviam no Arizona com suas famílias, filhos e esposas. mantinha o vínculo com os dois, os encontrando com frequência quando visitava os pais.
Max tinha cabelo curto e barba grossa, era moreno como e tinha tatuagens que tomavam um pouco de seu pescoço descoberto. Ele e haviam feito muitas de suas tatuagens juntos. Ele era um homem alto, do mesmo tamanho que o jogador e devia ter a mesma idade que ele, mas o corte de cabelo e a barba grande o davam aparência de mais velho. Também era um pouco mais gordo, com barriga protuberante, e tinha um sorriso largo e bonito. Jamie era alto e magro, mais baixo que e Max, mais magro que os dois. Tinha cabelos pretos impecavelmente penteados para trás e definido com pomada, olhos castanhos e olheiras marcadas. Tinha risada mais alta, mas o sorriso não era dos melhores.

– Não acredito que você pensou em passar as festas em Dale e não avisar a gente. – Max riu, apoiando o peso no guarda corpo da varanda, cumprimentando o jogador de hockey.
– Eu ia. Juro. – sorriu ao falar.

O jogador se aproximou e abraçou os dois, cumprimentando-os de modo caloroso, enquanto aguardava e assistia paciente, quatro passos atrás. Max, assim que abraçou o jogador, percebeu a presença de e não evitou encará-la enquanto abraçava Jamie.

– E então, o que você anda pescando por aí, ? – Max perguntou, olhando para e pareceu enfim se lembrar da namorada.

Os pais estavam na porta, assistindo a cena e enfim tomou sua garota pela mão a trouxe para perto.

– Essa é , minha namorada. – apresentou sorridente. – , esses são Max e Jamie, meus primos e amigos de infância.
– É um prazer conhece-los. – A mulher sorriu e os cumprimentou com um aceno de cabeça e apertos de mão.
– Não sabia que você estava namorando tão sério. – Max comentou, enfiando as mãos no casaco. – Quanto você a está pagando? Deve ser algum tipo de dívida. – Brincou o mais alto, enquanto e o outro riam. – Você deve dinheiro a ele, não é? – Perguntou, inclinando-se na direção de .
– Como foi que se conheceram? – Fora a vez de Jamie indagar. – Aposto que ele a encontrou na estrada, amarrou e jogou na traseira. Só assim...
– Muito engraçado. – rolou os olhos. ria com eles, mas não sabia se devia. – Por isso não apresento ninguém a vocês.
– Não é por isso, você sabe. – Jamie implicou, sendo empurrado por . – Mas é uma garota bonita. . – Ele repetiu o sobrenome. – É latino?
– Deve ser, sempre temos algo em comum. – respondeu e maneou a cabeça. – Mas sou brasileira.
– Você foi longe dessa vez, . – Max ergueu o queixo ao falar, sorrindo. – Brasil. Mas sempre soube que você não se contentava com coisas pequenas.
– A gente se conheceu aqui, quando ela veio morar em Scottsdale. – Contou , abraçando quando a percebeu se encolher com uma rajada de vento frio. Ele estava equipado, mas a namorada não. – Antes que reclamem, estávamos mantendo só entre nós.
– Vocês estão sérios, então? – Perguntou, analisando o casal.
– Sim. – desviou o olhar dos dois para a namorada enquanto falava. – Juntos em casa. Tem sido bom.
– Agora você já pode sentar na mesa dos adultos, os homens sérios e casados. – Max ergueu a mão direita, exibindo uma aliança larga.
– Aqui as pessoas se casam cedo. – expirou um riso, explicando para .
– Na verdade, se casam com idades normais, que é encalhado. – Jamie negou. – Ou melhor, era.
– Cale a boca. – O central fez careta. – O que vocês vieram fazer aqui? Tenho muito trabalho com galhos caídos lá atrás e vocês estão em atrapalhando. – Brincou ele, apontando para trás.
– Você sempre tem algo lá atrás pra tirar, . – Max rolou os olhos, fazendo Jamie rir com sua fala de duplo sentido. – Mas vamos lá. Você não consegue sozinho, mesmo.
– Eu preciso te lembrar algumas coisas. – respondeu, devolvendo a ofensa do primo.

Max e Jamie desceram da escada, afastando-se devagar para os fundos da casa, mas pararam para esperar o parente jogador.

– Entra, se aquece um pouquinho. – sorriu, esfregando os braços da namorada e a beijou rapidamente. – E você não vai querer ouvir o que esses caras falam. – Ele riu e assentiu com a cabeça. – Papa, você vem?

O pai se juntou a eles e os quatro se afastaram, sumindo atrás da casa. e Ema entraram juntas.

– Ele nunca tinha mencionado esses dois. – A médica pensou alto, andando atrás da sogra.
– São coisas pessoais. – Ema respondeu rápido, em seu tom duro. – Ele não falou de você nem para a família...

apertou os lábios e preferiu não se explicar ou reagir a alfinetada da mais velha. Podia listar a sogra a imensa quantidade de coisas pessoas que os dois partilhavam, ou sobre porque não fazia diferença se ele havia contado a família sobre eles ou não, mas sabia que não era sobre isso. A questão ali era muito maior do que ela saber ou não o nível de intimidade que tinham, então resolveu não escolher aquela batalha como sua.
Logo as duas estavam de volta a grande mesa, onde o café da manhã estava posto.

– Será que eu posso ajudar a retirar a mesa? – se ofereceu, incerta e recebeu um olhar atravessado.
– Se você quiser... – Ema começou a recolher a louça. – Ou o faz isso em casa também?
– Depende. – respondeu sem pensar e atraiu a atenção da sogra. – Nós costumamos dividir. Às vezes sim, mas geralmente não. Ele fica muito na minha casa, então eu costumo cuidar dessa parte e de algumas outras.

Ema não respondeu.

– O que sua família faz no Brasil? – A matriarca indagou após algum tempo em silêncio.

hesitou, surpresa com a pergunta direta, pensou antes de responder, correndo os olhos pela mesa.

– Bom, meu pai trabalha na prefeitura e minha mãe é professora. – contou, evitando Ema e se concentrando em recolher a mesa. – Tenho uma irmã, ela é uma arquiteta.
– E por que você veio para cá? – Ema continuou sua inquisição enquanto enfiava tigelas na lava-louças.
– Bem, eu... – tossiu, limpando a garganta. – Eu quis experimentar. País novo, cultura, emprego...
disse que trabalha no hospital geral, em Toronto. – Comentou a mais velha, seu tom era seco, sem muita emoção, positiva ou negativa. – Cirurgia.
– É isso. – A brasileira respondeu com cuidado. – Eu me mudei para o Canadá para trabalhar no hospital, justamente.

Ema ergueu o rosto para a nova namorada do filho, sem parecer muito tocada ou interessada, parou de falar.

– Sua mãe já conhece meu filho? Sua casa? – Ema tornou a inquirir e respirou fundo.

Seria uma manhã longa.

❄❄❄


Sexta-feira, 22 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América



Depois de piadas infames, depois de tirarem carrinhos e carrinhos de galhos da porta dos fundos e da calçada, Max e Jamie tinham voltado para suas casas e suas famílias. Estavam ainda do lado de fora e seu pai, tirando o resto de galhos e limpando o que ainda impedia a entrada para o pequeno cômodo nos fundos da garagem onde o americano guardava ferramentas e equipamentos de caça. enchia um balde com folhas retirada da calçada, enquanto o pai assistia ao trabalho do filho apoiando o corpo ao cabo de uma pá.

– Acho que agora já basta. – Brian assentiu quando o filho ergueu o tronco, ajeitando a coluna e fazendo careta pelo esforço. – Agora, posso mostrar a ela a cabeça do alce. – Falou orgulhoso, batendo nas costas do filho e erguendo o balde de neve.
– Não sei se a vai se impressionar muito com uma cabeça de alce, papa. – riu abafado, vendo a movimentação do pai.
– Como não? – Brian franziu o cenho. – É uma cabeça de verdade. Que eu cacei. – Ele se vangloriou.
– Eu sei, mas acho que ela não gosta muito dessas coisas. – Opinou o jogador. imaginava qual seria a reação de ao se deparar com a cabeça gigante de um animal morto pendurada na parede. – A gente nunca falou exatamente sobre o assunto, mas ela... ela gosta dos animais vivos e é meio contra armas.

O pai agitou uma das mãos e estalou a língua com desdém, desconsiderando a opinião do filho. Tinha certeza que ela amaria aquilo, era bonito, era uma boa caça e estava muitíssimo bem conservada.

– E essa garota. – Brian tornou a falar. Estavam os dois de pé no quintal, segurava a pá em uma das mãos, já o pai usava a sua ferramenta para se apoiar. – Não é do jeito que as outras eram. – O americano projetou o lábio inferior e deu de ombros. – Mas até que é bonita também. – baixou a cabeça, sorrindo. – Eu simpatizo, mas ela é quieta demais. Não ri muito, não fala, nem parece latina. Sua mãe duvida, branca demais.
– Ela é, papa. – imitou o pai, apoiando os antebraços ao cabo de sua pá e a firmando no chão. – Ela entende muito bem o que é ser latina, também não é como as mulheres daqui, extravagantes e que parecem uma árvore de natal. E ela conversaria mais se vocês ajudassem, se a mamãe não implicasse tanto. – O jogador torceu os lábios, reprovando e viu o pai dar de ombros.
– Mas eu até falei de futebol. – Brian se justificou. – Ensaiei o samba, até.

expirou um riso fraco e rolou os olhos.
Os dois permaneceram em silêncio, contemplando o trabalho, deixando seus olhos vagarem pelo terreno que apesar do tempo mais frio, era de um verde vivo de causar inveja aos vizinhos. Enquanto os olhos viajavam distraídos, olhou para a janela de vidro grande da cozinha, encontrando a mãe e a namorada. As duas pareciam ocupadas com qualquer coisa e o jogador agradeceu internamente por pelo menos estarem juntas no mesmo espaço. Agradecia também a paciência de , tolerando todos os desconfortos sem reclamar.

– O que há com a mamãe? – O jogador indagou ao pai, que apenas o encarou, esperando mais contexto para aquela pergunta. – Essa implicância com a . Quartos separados, água fria, janela sem cortina, aquele quarto que não era usado desde quando eu era criança...

Brian ergueu os ombros.

– Não sei. – Respondeu. – Talvez ela tenha percebido algo que você não viu ainda.

Primeiro expirou um riso confuso e fraco, mas quando o pai não riu junto ou disse se tratar de uma brincadeira e manteve seu semblante sério, o jogador gargalhou.

– Eu vivo com ela há meses, passamos juntos vinte e quatro horas dos dias. – arqueou uma sobrancelha, ainda ria com incredulidade. – Mas está me dizendo que a mamãe colocou os olhos nela apenas uma vez e viu algo que eu ainda não percebi?

Brian assentiu, ignorando o riso descontrolado do filho.

é uma mulher boa. – ensaiou se afastar, negando com a cabeça e ainda rindo, mas voltou. – Ela é minha amiga e minha namorada. E também gosta de mim. Ela é boa pra mim. – O jogador apontou para o pai. – Não tem como a mamãe ter visto algo que eu não percebi. Porque não tem nada assim para ver. Isso é... – Ele riu alto, jogando a cabeça para trás, mas sem humor. – É absurdo.

começou a se afastar, ainda estarrecido com aquela ideia.

– Sua mama só se preocuparia em analisar uma mulher se percebesse que você realmente está nas mãos dela. – O pai falou em seu tom firme e manso, atraindo a atenção do filho.
– Espera. O quê? – sacudiu a cabeça, perdido naquele raciocínio. – Analisar? O que quer dizer? Ela tá sendo analisada? Ela tá testando a ? – Questionou e viu o pai erguer os ombros como quem diz “vai saber”. – É, seria bom se ela parasse com esse teste idiota, então. – tornou a falar. – Ou daqui a pouco não vou ter mais uma namorada para ser testada.

Dizendo isso o central deu as costas ao pai e se dirigiu para dentro, pouco feliz.

❄❄❄


Sexta-feira, 22 de dezembro de 2023
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América



Durante a tarde, para felicidade de , a havia convidado para um passeio. Explorar a cidade que lhe era tão familiar, mas que há alguns meses já não a visitava, e de quebra, se afastar do clima esquisito que pairava ao redor de Ema e que afetava ao casal.
Scottsdale era pequena, ficava perto do grande campus da Arizona State University, banhada pelo Salt River, era uma cidade localizada na parte oriental de Maricopa County e parte na grande Phoenix. Tinha recebido esse nome em 1894, homenagem a seu fundador Windfield Scott, um capelão do exército americano aposentado. A cidade estava decorada, o natal parecia ter enchido as ruas com sua magia e os habitantes estavam agitados. Por todo lugar que passavam, cruzavam com pessoas ansiosas e afobadas, carregando sacolas de presentes e compras que deviam ser para a ceia de natal. O Arizona tinha uma grande população de imigrantes e isso com certeza afetava no jeito com que as pessoas celebravam aquela data.
Por todo lugar também, pessoas acenavam, sorriam, diziam palavras agradáveis a , mas nenhum pedido de foto, abraço ou assédio. O jogador a tinha explicado antes que as pessoas ali estavam acostumadas demais à sua presença e além disso, naquele país o hockey e seus jogadores não eram tão conhecidos quanto no Canadá. Mesmo sendo um filho queridinho da cidade, não eram todas as pessoas que o reconheciam de pronto. Segundo ele contava, se divertindo muito ao dizer, se tivesse trilhado o caminho do baseball ou futebol americano, seria mais famoso em casa.
Talvez por isso ele amasse tanto o lugar. Conhecendo o namorado, podia-se supor que o fato da pequena cidade ser tranquila, sem a pressão constante de fãs de hockey ansiosos e intensos era o que mais atraía o central. moraria em uma ilha deserta se com ele fossem seus amigos e família. Apesar de não ser muito diferente, gostava de cidades visualmente bonitas e com boas opções de comida, agradáveis de viver, Arizona era uma dessas, por isso foi seu lar por tantos meses.

🎵 Dê play na música aqui, e se necessário coloque para repetir. Taylor Swift – The way I loved you🎵


– Por que você tá me olhando assim? – indagou a namorada, rindo dela enquanto caminhavam.

Já a estava observando fazia muito tempo, desde que haviam saído de casa. era alguém muito expressiva, ela até conseguia disfarçar suas emoções, mas nunca os pensamentos. Enquanto pensava, costumava ficar tão absorta em sua própria mente profunda que não se lembrava de prestar atenção a sua expressão. Apesar da expressão da namorada não ser das piores durante o breve passeio, ele quis a provocar um pouco, puxar papo.

– Assim como? – Ela sacudiu a cabeça, voltando para a Terra e perguntou, confusa. Os dois caminhavam por uma pequena ladeira com vista para o rio, cheia de lojinhas e bares.
– Com essa cara de quem está odiando tudo. – riu pelo nariz ao falar e viu a namorada congelar.
, eu... – Ela tentou se justificar e ele abriu a boca, chocado.
– Eu só brinquei. – Ele se surpreendeu. – Você tá odiando mesmo?
– Não. Não é isso. – A brasileira parou de andar para tentar se explicar. – Eu não odeio Scottsdale, eu morei aqui. Mas é só que...é que é tudo tem sido...muito diferente. – Ela hesitou.
– Diferente como? – , que tinha as mãos nos bolsos do casaco, ergueu as sobrancelhas para a encarar.
– Diferente. – Ela respondeu sem jeito, sem saber como falar, maneando a cabeça e afastando o olhar.
– Você não está sendo totalmente sincera aqui. – expirou um riso e manteve os lábios em um pequeno sorriso fechado enquanto negava com a cabeça.
– Bom, você também não foi totalmente sincero quando disse que sua mãe não tinha me detestado, quando te perguntei ao chegarmos. – apontou, dando de ombros. – Estamos quites.
– Então é sobre isso? – arqueou as sobrancelhas de novo, surpreso.
– Não é sobre isso. – Ela negou e os dois voltaram a andar. – Eu só estou dizendo. E eu não estou odiando nada.
– Você tem a mesma expressão aqui, a mesma que tem quando sai com as garotas, namoradas e esposas do time. – falou e o olhou, estarrecida.
– Eu não. – A brasileira cruzou os braços sobre o peito. – E eu não olho pra elas, eu mal me relaciono com elas.
– Você mente mal, . – devolveu rolando os olhos. – Mas nisso você tem razão, você não se envolve mesmo. – Ele suspirou, querendo atacá-la, mesmo que não soubesse bem o porquê.
– Ah, veja só... – A médica ergueu as mãos, como se rendida. – Desculpe, senhor que é super sociável e adora ficar aparecendo em posts falsos, fingindo ser amiga de pessoas que não dão a mínima para você.
– Eu pelo menos tento. – Ele respondeu azedo, ainda caminhando ao lado dela.
– E quem está mentindo agora? – estalou a língua no céu da boca.
– Quando eu me tornei o problema aqui? – O central apontou para si mesmo. Estavam chegando a um pequeno ponto na ladeira que servia de mirante para o rio, que devido ao frio estava vazio. – Você está com essa cara feia para tudo desde que saímos de casa.
– Eu? – Ela apontou para o próprio peito, ofendida. – Tudo que eu tenho feito é ser gentil e educada. – O namorado debochou com um riso de lado. – E se quer saber, é até difícil dizer o que é pior, ficar lá ou sair por aí para andar no frio. – falou baixo, sem pensar, rolando os olhos.

parou de andar e se virou para a namorada, encarando-a com a boca aberta e sobrancelhas erguidas.

– Você não disse isso.
– É fácil falar quando você tem água quente, uma cama boa e sem barulho e não precisa dividir o quarto com um rato que faz barulho a noite. – listou, erguendo dedos para ele a cada item. – E sabe o pior? Ele faz um barulho horrível quando rói a mobília da morta fantasma que também divide o quarto com a gente.
– Você é um monstro. – estava pasmo. – O rato não é nada comparado a isso. – Ele agitou o dedo indicador na direção da namorada, que trancou a expressão. – E não fale da minha avó.
– Sua avó? Mas que ótimo. – se surpreendeu, rindo sem humor. – E quando pretendia me contar que sua doce mãezinha me colocou pra dormir no quarto velho da sua vovó falecida? – uniu as sobrancelhas, ainda mais ofendido e irritado.
– E o problema agora é a minha avó e a minha mãe?
– Também posso citar seu pai caçador de animaizinhos indefesos e que se orgulha disso. – Ela projetou o lábio inferior e cruzou os braços.
– E pelo menos o meu pai é legal e tentou. – O jogador de hockey devolveu. – E minha mãe não é uma megera. Talvez só com você. – Ele se corrigiu. – Mas pelo visto, não sem motivo.
– Você é baixo. – disse pausadamente, com dedo erguido em direção ao namorado, estavam cerca de cinco passos de distância. – E sim, sua mãe é uma megera. Fique você sabendo.

deu as costas ao namorado e começou a se afastar, pisando duro, xingava em pensamento e sentia raiva. a imitou e começou a descer a pequena ladeira respirando fundo e pensando no quão idiota estava sendo. Os dois compartilhavam o mesmo pensamento, sobre como um ou o outro estavam sendo tolos, estúpidos, imaturos e burros.
planejava esperar em casa, sem se importar se ela se lembraria como chegar até lá ou não. Já que ela queria ser autossuficiente e não estava gostando da viagem, que desse seu jeito para sair dali. xingava o jogador por ser tão esquentado, enquanto desbloqueava o celular em busca de um Uber. Não precisava do namorado para voltar para casa, na verdade, nem sabia se queria voltar para casa.
Mas no segundo seguinte, a mente dos dois se perdeu, mudando de rota tão rápido quanto haviam entrado naquela. Como esperar que , sozinha, sem saber o endereço do condomínio dos pais, chegasse até lá. Estava frio, apesar de não estar mortalmente frio como no Canadá. Além do frio do banho em casa, ela passaria frio na rua. bufou irritado e deu a volta, girou em seu próprio eixo e começou a subir a rua, em direção ao caminho que a namorada havia feito. cedeu e deixou cair as muralhas da raiva tão rápido quanto as ergueu. Parou de andar e olhou ao seu redor, percebendo-se perdida entre letreiros e pessoas, pensamentos enraivecidos e sobre ter talvez exagerado um pouquinho ao chamar a mãe do namorado de megera. Ela não era uma, não tão megera, pelo menos – não que não estivesse se esforçando muito para a obtenção do título.
A brasileira suspirou, projetou o lábio inferior chateada e inclinou a cabeça, girou em seus calcanhares, pronta para ir atrás do namorado. Quando ergueu o rosto o viu vindo em sua direção, com lábios torcidos em uma careta impaciente e contrariada.

– Por que a gente começou a brigar mesmo? – Ela perguntou, caminhando na direção dele, confusa e chateada.
– Eu não sei. – respondeu balançando a mão uma vez frente ao corpo.
– Eu não acho sua mãe uma megera, nem seu pai ou sua falecida avó. – Ela choramingou ao ser abraçada pelo namorado pela cintura, segurando o rosto dele com as mãos. – Nem estou brava por você pelas coisas que se passaram desde que nós chegamos. – A médica uniu a testa a do namorado e ele riu abafado.
– Não te acho um monstro também. – começou a falar. – Nem que você merece o rato no seu quarto. Também não quis dizer que seu pai não é legal ou o resto das coisas que falei.
– Tá tudo bem. – riu, balançando a cabeça.

Os dois riram, ainda com testas unidas.

– Somos dois idiotas. – sorriu.
– É, mas não seria a gente se não tivesse uma briga dramática no meio da rua, no natal. – riu pelo nariz.
– Ainda não é nem véspera de natal. – Completou a brasileira e os dois riram outra vez. – Eu amo você, .
– Mas ama minha família também? – Ele riu, a provocando ao arquear uma sobrancelha.
– Uma coisa de cada vez, né!? – fechou um dos olhos, sorrindo e o namorado riu também, apertando os olhos. – Uma coisa por vez.

e se beijaram, enquanto sorriam. Ou sorriam enquanto se beijavam, seria difícil diferenciar.

❄❄❄


Sábado, 23 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América



O dia anterior havia sido usado completamente para e , que depois de voltar muito mais tarde do que o planejado de seu passeio, se reuniram no quarto do jogador para aproveitar o resto da noite. só retornou aos seus aposentos quando Ema, de maneira insistente, bateu a porta avisando que era hora de dormir.
O dia seguinte também havia sido agradável, aos poucos percebia que quanto mais longe de ficava, menos ira de sua sogra ela atraia. Passara o dia todo com Bre e Alex, conversando assuntos bobos e leves, enquanto ajudava o pai com algumas coisas e encontrava os primos outra vez.
Mas à noite, , , Alex, Peter e Bre iriam sair. As irmãs haviam sugerido um passeio diferente, entre os jovens, e agradecia a misericórdia delas. Havia passado o dia grudada a elas, não por carência ou por estar muito afetuosa, mas sim por temer ficar sozinha com a sogra. Ema parecia muito motivada em descobrir detalhes dos antepassados mais distantes de , parecia buscar inconsistências na história de vida da brasileira, ou motivos para embasar sua decisão de que não era a garota certa para seu filho toda vez que a encontrava perto de . mal podia esperar pelo natal e pela hora de irem embora, voltar para o conforto e a paz de Toronto e fingir que aqueles dias nunca aconteceram.
Estava na sala de estar, junto com Peter, e seu pai, esperando Alex e Bre ficarem prontas. Fazia frio – nada como o gelado absurdo de Toronto – e estava seco, usava apenas um rímel, bastante hidratante, um pouco de corretivo sob os olhos, blush e um batom leve. Usava botas, calças quentes, um suéter lilás e um casaco quentinho e confortável para sair à noite. não estavam muito diferente, tênis, moletom e uma touca, além das pulseiras, brincos e os dois anéis que ele costumava usar.
estava no sofá, ao lado de , com a cabeça apoiada a seu ombro, Peter na outra ponta e Brian em uma poltrona, afagando entre as orelhas de Felix.

– Sabe, eu vi na TV, uma corrida de cães. – Brian começou a falar, atraindo a atenção do pequeno grupo. – Eles eram inteligentes. Colocavam os cães para correr como cavalos. Devia tentar com esse aqui. – Falou, dando dois tapas leves no lado de Felix, que resolveu se aproximar do dono.
– Não. Não, ele não precisa competir. – sorriu, inclinando-se para afagar o cão com as duas mãos.
– Até porque, ele só competiria em provas de comida e de sonequinha. – riu, olhando para o cachorro.
– Mas ele é um garoto esperto. – começou a fazer vozinha e afagar o cachorro. – Não é? Quem é o meu garotão esperto? O meu garotão? Quem é?
– Eu estava pensando. – tornou a falar, dirigindo-se a Brian. – Apesar de ter morado aqui, sei ainda pouco sobre o Arizona, sobre os Estados Unidos no geral, gostaria de saber mais. – Podia não ter o apoio da sogra, mas precisava garantir ao menos um voto a mais para seu lado.
– Ah, é, sim. – Assentiu ele. – Chame o garoto para passear por aí. – Sugeriu Brian. – Também, podemos pescar. Você pesca?
– Sim, na verdade sim. – assentiu sorrindo, sentindo-se animar. – Sempre pescava nas férias, minha irmã, meu pai, meus primos, tios e avô.
– Aposto que nunca pescou em um lugar com tantos peixes brutos e fortes como os nossos.
– Eu aposto que não. – Ela sorriu em concordância.
– É um bom esporte. – Brian sorriu e suspirou, depois silêncio. – Pescar então. Amanhã.
– O que mais as pessoas fazem por aqui? Além de pescar. – tornou a falar. – Que esportes são populares por aqui, quais o senhor jogava? Sem dizer hockey, claro. – e Brian riram e o mais velho cruzou os dedos sobre a barriga, pensativo.
– Bom, eu na verdade nunca joguei realmente hockey. – Contou Brian. – Foi uma coisa que o garoto inventou sozinho, porque uma vez nós o levamos a um rinque e ele se encantou à primeira vista. – Ele narrou, olhando de soslaio e sorrindo para o filho, que abriu um largo sorriso também. – Mas, eu jogava baseball. Além disso, minha época de jovem o esporte que mais praticávamos era a caça. Caça, muito.
– Mais do que o senhor já disse? – perguntou, um pouco incomodada.
– Ah, sim. – Brian gargalhou. – Aquilo não foi nada. Precisa ver a cabeça de alce que tenho pendurada. Enorme. Bruta. – Ele riu outra vez e a convidada arregalou os olhos. – Há uns dois anos também fui convidado para caçar na África, foi o melhor dia da minha vida.
– Oi?

arregalou mais os olhos, mas Brian não conseguiu terminar, Alex, Bre e Ema desceram as escadas falando alto, chamando o resto do grupo para irem, apressando os que já estavam prontos. Quando chegaram a sala, Peter abraçou Alex de lado e Ema correu os olhos pelos outros.

, você ainda não está pronta? – A mulher perguntou agitada.
– Vamos nos atrasar ainda mais. – Bre comentou, sentando-se desajeitada no sofá.
– Não, eu estou. – sorriu sem jeito, um pouco confusa e instaurou-se um clima de velório na sala dos . – Estou pronta.
– Você vai assim? – Ema apontou, mirando a futura nora dos pés à cabeça. – Mas...

olhou para suas roupas, depois olhou para Alex e Bre. As duas vestiam vestidos, Alex um preto e Bre usava vermelho, meia-calça, sapatos de salto, casacos, o de Alex parecia ser de pele. Elas tinham cabelos soltos e escovados, maquiagens perfeitas e elaboradas como as que as noivas do Brasil usam, ou as produções especiais feitas por uma maquiadora profissional. abriu os lábios, mas não disse nada, demorou para raciocinar. Entendeu o que Cinderela devia sentir.

– É que eu... – mordeu o lábio inferior, sem jeito. – Não imaginei que a gente fosse sair assim... pensei que só fossemos comer por aqui perto, e também, o clima aqui...não tenho nada diferente para vestir. – Falou baixo, inclinando a cabeça.
– Se quiser, posso te emprestar alguma coisa. – Alex sorriu, empática, inclinando o corpo para esfregar o ombro de .
– É, podemos. – Bre também se ofereceu. – Com certeza você vai achar algo que goste. Alex trouxe vestidos lindos do México quando fomos lá.
– Mas está frio e... – apontou com o polegar para trás de si. Apesar do incômodo terrível pelo comentário, estava confortável e realmente gostaria de aproveitar a noite com tranquilidade, não estavam com vontade de se montar inteira para uma saída simples, em uma noite fria como aquela.
– Aqui as mulheres se arrumam bem, mesmo no frio. – Ema comentou, erguendo um ombro e apertou os lábios em uma linha fina. – Ou em qualquer clima. Você não é latina? Devia saber como é.
– Ela está linda assim. – interveio, colocando um dos braços sobre o ombro da namorada. – E está frio lá fora. Não precisa de nada disso, só vamos comer alguma coisa. está ótima como está. – O jogador trocou um rápido olhar com a irmã mais velha, que pareceu compreender de pronto.
– E brasileiros são brasileiros, americanos são americanos, e Mexicanos... bem, vocês entenderam. – Alex falou, tentando ajudar. – Roupas não importam. Vamos, vamos . – Chamou a mais velha, tomando a frente, puxando a brasileira pela mão. – Adiós, mama. Buenas noches, papa. – Ela acenou, rumo a porta, enquanto o resto do grupo a seguia.

❄❄❄


Sábado, 23 de dezembro de 2023
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América



O bar estava lotado.
Cheio de pessoas jovens e não tão jovens assim que se divertiam no karaokê, cantando músicas em vários idiomas, de várias épocas diferentes, novas ou velhas. nunca havia ido aquele bar antes, era tímida demais para cantar em karaokês e preferia lugares mais calmos, onde pudesse conversar sem precisar gritar. Mas seus acompanhantes da noite pareciam não concordar, Alex, , Bre e Peter já haviam cantado ao menos uma música cada um. Alex e Bre cantaram Fabulous, da trilha sonora de High School Music, Alex fizera também um número brilhante de Nancy Sinatra com These Boots Are Made for Walkin', e Bre e Peter havia dado um show com Ain't No Mountain High Enough, de Marvin Gaye e Tammi Terrell. e Alex cantaram I Want You Back dos The Jackson 5 do jeito mais desajeitado possível, e a estrela do Toronto Maple Leafs, para surpresa da namorada, havia feito um excelente número de The Galway Girl de Steve Earle. Enquanto isso, lutava com todos seus argumentos para evitar subir ao palco, já se sentia péssima desde que saíram de casa, não precisava se expor ali também.
A maior parte das mulheres do lugar eram bonitas e todas, sem exceção, estavam super maquiadas, usando vestidos lindos, além de salto alto, obviamente. se sentia como há muito não sentia. Era desconfortável, tinha a sensação de que todos ali a olhavam e julgavam. Se sentia horrível com aquelas roupas, destoava dos que a acompanhavam e por isso tentava se esconder o máximo possível, curvada em um canto, sobre a mesa, usando os cabelos para cobrir o rosto e tentando – orando – para se tornar invisível.
Não conseguia aproveitar um minuto do passeio, enquanto o namorado, Peter, Alex e Bre riam e faziam brincadeiras uns com os outros, só conseguia sorrir fraco e se encolher, quase tornando-se parte do estofado dos sofás que rodeavam as mesas do bar. Nem mesmo ver solto, cantando em um palco para um público duvidoso a tinha animado ou distraído de seu fracasso.

– Que foi? – cutucou a namorada, apoiando em seguida os cotovelos sobre a mesa, estava ao lado dela, com olhos no palco. Peter e Bre cantavam uma canção no karaokê, parecia Brown Eyed Girl, de Van Morrison. Alex havia ido ao banheiro.
– O quê? – A médica sorriu fraco. – Comigo? Não. Está tudo bem.

torceu os lábios, negou com a cabeça e deu um gole em seu copo de cerveja. As pessoas, algumas o cumprimentavam, algumas sorriam, outras olhavam e comentavam sobre a sua presença desde a chegada do pequeno grupo.

– Olha, não fica pensando naquilo que minha mãe disse. – O namorado falou, voltando-se para ela e o encarou surpresa. – Aproveite a noite, deixe isso pra lá.
– Como sabe que estou pensando nisso? – ergueu as sobrancelhas. – Que eu supostamente estou pensando nisso. – Ela maneou a cabeça, se corrigindo.
– Supostamente? – riu pelo nariz. – Esqueceu que fui criado com duas irmãs? – O jogador esticou um dos braços, pousando-o sobre os ombros da namorada. – Isso é besteira, não tem nada a ver. As mulheres aqui são assim, mas você não precisa agir diferente só por isso. – desviou o olhar para tomar um pouco mais de cerveja. – Você nem é daqui.
– Mas e você? – Ele a olhou curioso. – Porque estamos em um bar na sua cidade e todas as mulheres aqui parecem ter saído de um seriado ou de uma passarela. – bufou, apontando para o público ao seu redor. – Todas lindas, loiras, hiper magras, vestidas como as garotas que eu vejo no Instagram, mas que não sigo para não me sentir mal comigo. E eu...bem, eu tô de jeans e com esse suéter sem graça que nem está na minha cartela de cores. Nem estou usando maquiagem direito, ou salto alto. – Ela apontou para si mesmo. – Eu sei que você não vai fazer nenhum comentário sobre a aparência delas ou a minha, mas imagino que seja frustrante pra você. A sua namorada ser a esquisita do bar, malvestida, feia e desarrumada. – suspirou chateada. – Devia ter ouvido sua mãe e pelo menos trocado de roupa.

O queixo de caiu – não apenas figurativamente.

– O que aconteceu com a minha namorada? – O central segurou o rosto da médica brasileira. – Porque a que eu conheço nunca, nunca pensaria que ser ela mesma poderia incomodar alguém. Ou pediria desculpas por isso. E a que eu conheço teria feito um discurso de três horas se eu tivesse feito qualquer comentário desse tipo. – O jogador fez careta.

expirou uma risada culpada e inclinou a cabeça.

– Você tem razão. – Ela assentiu. – Mas é que...
– Eu gosto da exatamente como ela é. – a interrompeu, falando sereno. – E eu não acho ruim a gente se vestir igual, acho engraçado e legal até. E não tô nem aí para um monte de mulher maquiada, fingindo não estar com frio ou desconfortável em um salto alto. Eu gosto de você justamente porque é diferente delas.

beijou os lábios da namorada suavemente.

– Eu amo você. – sussurrou e ele sorriu, olhando nos olhos dela por alguns instante, com aquele olhar bobo, sorrindo grande, mas sem mostrar os dentes.

– Prove, então. – sussurrou de volta, de repente e uniu as sobrancelhas e sacudiu a cabeça.
– Provar? – Ela estranhou.
– Prove. – sorriu e puxou , levantando-se da mesa. – Cante uma música comigo.
! Ficou maluco. – tentou protestar, mas só conseguia rir nervosa.
– Ei, nós somos os próximos. – O central levantou uma das mãos, atraindo o olhar da pessoa que cuidava das inscrições.
, eu não canto. – estava congelada de medo, mas ria como uma psicótica. – Por favor.
– O que acontece no Natal dos , fica no Natal dos . – O central piscou, segurou o rosto da namorada e deu-lhe um beijo estalado. – A gente vai cantar.

puxava a namorada para o palco, e toda as tentativas dela de se agarrar em coisas, ou empacar no lugar foram frustradas. Ele a deixou no centro, sozinha, enquanto se apressava para o responsável, escolhendo a música que cantariam. Não demorou muito para o jogador encher o palco também, sorridente.

A música escolhida


. – o repreendeu entredentes, assustada. – Eu não sei cantar. O que você está fazendo?
– Confia em mim? – Ele perguntou em um sussurro, divertindo-se.
– Mas é claro que não. – Ela negou e o viu gargalhar, jogando a cabeça para trás. A música tomou o telão e os primeiros acordes vieram junto. A médica arregalou os olhos. – . O que é isso? Que música é essa? – Ela tentava disfarçar, segurando o microfone no apoio como se sua vida dependesse disso.

I wasn't jealous before we met
Now every man I see is a potential threat


começou a cantar, ele sorria para . Estavam de pé, um do lado do outro, mas o corpo do central estava inclinado e quase completamente voltado na direção na brasileira. Enquanto encarava a situação com olhos arregalados, congelada.

And I'm possessive, it isn't nice
You've heard me saying that smoking was my only vice


enfim se voltou inteiro para a namorada. Ele cantava bem, mas estava apavorada demais para perceber. Ele tentava encorajá-la com o olhar e sorria para ela, animado com o fato de estarem cantando juntos.

But now it isn't true
Now everything is new
And all I've learned has overturned
I beg of you


olhou para a namorada e ergueu as sobrancelhas, acenando com a cabeça, engoliu em seco.

Don't go wasting your emotion Lay all your love on me


leu a letra, conhecia a canção, mas não o suficiente para que se lembrasse em seu atual estado de nervosos. A médica havia soltado o suporte do microfone e abraçava com força o próprio corpo. estava satisfeito e as pessoas que assistiam também, o jogador sorriu e assentiu, animado.

– Eu não sei o que estou fazendo. – grunhiu entredentes, encolhida e envergonhada.
– Só vá em frente. – falou apenas movendo os lábios.

olhou para o parceiro, para o público, para o telão com as letras, se encolheu um pouco mais e resolveu tentar. Alex, Peter e Bre tentavam a incentivar, agitando as mãos e mostrando sinais positivos. Afinal, seria mais vergonhoso se ficasse em silêncio.
It was like shooting a sitting duck
A little small talk, a smile and baby I was stuck
I still don't know what you've done with me
A grown-up woman should never fall so easily


, a medida com que cantava, sentia mais coragem e olhava para de canto, sorrindo com ele. Tomando enfim coragem para relaxar os braços e segurar o pedestal do microfone. já havia se desfeito do dele e segurava seu microfone.

I feel a kind of fear
When I don't have you near
Unsatisfied, I skip my pride
I beg you dear


conseguia já cantar olhando para o namorado, um pouco mais solta, apreciando a letra e a música.

Don't go wasting your emotion
Lay all your love on me
Don't go sharing your devotion
Lay all your love on me


retomou a canção, aproximando-se de , cantando enquanto a olhava nos olhos e a namorada ria, dificultando a concentração dela.

I've had a few little love affairs
They didn't last very long and they've been pretty scarce

I used to think that was sensible
It makes the truth even more incomprehensible


Dessa vez, não precisou de incentivo. Até mesmo conseguiu tirar o microfone do pedestal sem se atrapalhar.

Cause everything is new
And everything is you
And all I've learned has overturned
What can I do


Os dois pareciam em sintonia, principalmente quando entrelaçaram os dedos e se aproximaram mais.

Don't go wasting your emotion
Lay all your love on me
Don't go sharing your devotion
Lay all your love on me


E então, a música acabou.

❄❄❄


Sábado, 23 de dezembro de 2023
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América



estava um pouco bêbado quando chegaram em casa de madrugada. Alex e Bre já tinham subido e Peter tomado seu lugar junto a Felix, no chão do quarto de . O jogador havia decidido parar e tomar um pouco de água antes de subir e o acompanhava.

Honey, honey, how you thrill me, aha, honey, honey. cantava, meio bêbado, meio sonolento, tropeçando nos próprios pés ao subir as escadas.
– Meu Deus, você vai derrubar nós dois. – ria, atrás dele, tentando ajudá-lo a se equilibrar.
Honey, honey, let me feel it, aha, honey, honey. – se virou para encarar a namorada, sorrindo como uma criança travessa. – Honey, honey, don't conceal it, aha, honey, honey. – Ele cantou, fazendo uma coreografia boba junto ao corrimão da escada.
– Meu Deus, cantor, tenha pena de mim e suba logo essas escadas. – pediu, empurrando o namorado pelas costas e ele, como criança, subiu correndo os degraus que faltavam.
. – Ela o repreendeu baixinho, segurando o riso. – Vai acordar seus pais assim.
– A gente devia começar uma banda. – O jogador abraçou pela cintura, com força, assim que ela conseguiu subir as escadas.
– Uma banda? – A brasileira riu cobrindo a boca, tentando não fazer muito barulho.
– A gente sai por aí, cantando e fazendo sexo e cantando e bebendo. – Ele começou a falar empolgado e cobriu a boca dele.
! – gargalhou com olhos arregalados.
– Vou dormir com você. – começou a andar, empurrando na direção de seu quarto.
– Não. Não. Ficou maluco? Não. – Ela negou, empurrando-o de volta. – Não mesmo.document.write(Auston) se lamentou infantilmente. – Ele ronca.
– É, e eu também. – riu, lutando para afastar o namorado da porta de seu quarto. – E ele não está com você. – O namorado fez beicinho. – Vamos. Minha intenção é sua mãe gostar de mim, não me expulsar daqui. Regras são regras.
– Não seja chata. – Ele rolou os olhos. – Vamos dormir juntinhos. Você pode dormir em cima de mim, aí fica tudo mais macio. – Ele propôs, fazendo vozinha e a namorada riu.
– Não. Por favor. – o empurrou em direção ao quarto, encostando o corpo dele na porta. – Eu amo você, não me tente. Não. Por favor.
...
– Vamos fazer o que tem que ser feito. – Ela disse, enfiou a mão por trás de , girou a maçaneta da porta e empurrou-a levemente. – Eu amo você. Nos vemos amanhã.

Beijando-o rapidamente, correu para o quarto antes que o namorado tivesse tempo para raciocinar e a seguir.

❄❄❄


Domingo, 24 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América



A véspera de natal amanheceu um dia claro e absurdamente frio.
tinha acordado mais cedo que o planejado depois da noite fora, e logo fora convocado pelo pai para ajudá-lo aos preparativos para a noite de natal.
ainda estava cansado e sentia a boca amarga, a dor de cabeça que lhe lembrava de ter bebido demais na noite passada. Mas não se arrependia. Fora uma experiência diferente sair na companhia das irmãs e da namorada, mesmo que , até metade da noite não estivesse em seu melhor momento. Tinha Peter ali, como namorado de Bre e pela primeira vez não era estranho tê-lo por perto. Era como uma reunião entre velhos amigos, mais que isso, uma reunião familiar. E quando pensava sobre como gostaria de viver a vida, com as irmãs e suas famílias, aquele tipo de sentimento sempre lhe vinha à cabeça. Estava feliz em ter se aberto para as ideias de , em ter cedido a irmã e parado com as negativas, em ter dado a Peter uma chance. Bre parecia feliz ao lado dele e Peter também não agia como um babaca.
A noite anterior estava guardada como uma foto nas memórias do jogador. Os cinco sentados na mesa daquele bar, comendo batatas fritas murchas no final da noite, rindo da falta de habilidades de Peter no palco, enquanto o próprio Peter assistia Bre fazer piadas sobre ele, a olhando como um bobo apaixonado. Alex ria alto, mastigando qualquer coisa, e também, abraçados, rindo das piadas de Bre – ou da expressão apaixonada de Peter. Era bom. O tipo de memória que você pensa quando se lembra de casa e sente saudades.
Claro que, a memória de cantar junto a em um karaokê também era muito agradável. Não costumava cantar em outros lugares além de sua casa – em Toronto ou Arizona – mas por alguma razão, naquela noite se sentia extremamente motivado. Talvez tocado pela felicidade de estar em casa com as pessoas que mais amava no mundo, ou talvez pela vontade de fazer se sentir melhor.
Se sentia entre a cruz e a espada. Confuso com a reação da mãe, o modo com que ela agia com , não entendia porque falava e fazia aquelas coisas. Mas, também não estava certo se devia questioná-la. Talvez conversar, pedir que a mãe tivesse um pouco mais de paciência com a namorada, enquanto torcia para que aquilo não fizesse desistir da vida junto a ele. Tinha planos para aquela noite e a relação espinhosa da namorada com a mãe precisava parar se quisesse pô-los em prática.
Por isso, se preocupava, tentava ficar por perto e fazer companhia a ela. não tinha dito nada sobre querer voltar para casa ou sobre irem para sua casa no Arizona, e com isso acreditava que fosse Deus ou o destino dando mais uma chance para que Ema visse na médica quem ela era de verdade.
Quando percebeu que quase era a hora do almoço, agradeceu ao pai por facilmente aceitar paralisar o trabalho. Queria ver se precisava de algo, ou se a mãe já havia afugentado de vez. Entraram na casa pela porta dos fundos e não ouviram nada até chegarem a grande sala de jantar. Só então ouviram os risos que ecoavam da sala. e Brian se aproximaram devagar e encontraram Bre, Alex, e Peter perto de Ema. Estavam sentados no chão, sorrindo e tomando alguma bebida quente, enquanto rodeavam a grande caixa de fotografias antigas da família.

– O que estão fazendo, vocês? – Brian quis saber, anunciando sua chegada, atraindo o olhar de todos.

trocou um rápido olhar de cumprimento com a namorada, mas se manteve em silêncio.

– Chegaram na hora certa, a gente estava mostrando a e ao Peter fotos de família. – Bre contou, sorrindo para os dois recém-chegados.
– Você era tão fofinho. – comentou e expirou um riso envergonhado, depois balançou a cabeça e se aproximou. Ema rolou os olhos.
– Me mostre o que estão vendo.


– Eu não acredito que você guardou essa? – gargalhou e apertou contra si uma foto, impedindo a namorada de ver quando ela se inclinou em sua direção. – Mãe, por que tirar uma foto assim? Que foto mais vergonhosa. – Reclamou, vermelho como as bolas da árvore de natal.
– Qual o problema da foto? – Ema, que estava sentada em uma poltrona, tomando café, perguntou.
– Que foto é essa? – quis saber, curiosa, tentando roubar a foto do namorado.
– Você não vai ver isso. – Ele negou e em seguida voltou seu olhar para a mãe. – Ninguém avisava que essas fotos eram péssima ideia?
– Ela tem a foto daquele dia, que você tirou a roupa quando foi ao banheiro, naquele restaurante, e entrou no salão com os shorts nas mãos. – Alex lembrou, fazendo os outros gargalharem e arregalar os olhos, em pânico. – Está bem aqui, em algum lugar. – A irmã mais velha começou a procurar.

se distraiu por alguns instantes, chocado com a revelação da irmã e se aproveitou para roubar a foto das mãos do central. tentou lutar, mas foi em vão.

– Olhe, , que lindo! – sorriu. – Você na banheira. Você tinha quantos anos aqui? Uns quinze? – A médica riu alto e o jogador fechou os olhos e suspirou, enfezado.

A chaleira começou a chiar na cozinha.

– A segunda rodada de chá. – Ema ergueu o rosto e o dedo indicador. – Quem quer chá? – Ela perguntou de modo retórico antes de se levantar e se afastar.

– Eu vou esconder isso. – se adiantou e catou o álbum que a mãe folheava antes de se levantar e ir para a cozinha. Em seguida ele cruzou as pernas e escorreu, apoiando-se desajeitadamente em uma poltrona. – Eu acho que gostava mais de quando você não conhecia minha família. – Brincou o jogador e a namorada o acertou na costela.
– Saiba você que eu estou amando ver suas fotos constrangedoras. – sacudiu no ar a foto que tinha em mãos. –Você realmente tinha quinze anos aqui?
– Não. – O jogador riu pelo nariz, olhando a foto com mais cuidado. – Uns treze. Acho que foi quando eu estava entre bonito e popular, para esquisito e detestável.
– Eu gostaria de você, mesmo sendo esquisito e detestável. – suspirou.
– Diz isso porque me conheceu agora. – a olhava com olhar apaixonado, divertindo-se com o momento. – Se eu sentasse do seu lado nessa época, você teria me chutado.
– Quem disse que não quis te chutar, quando sentou do meu lado naquela noite? – arqueou uma sobrancelha e abriu a boca, teatralmente chocado.

, você pode me ajudar com o chá? – A mãe chamou da cozinha e arregalou os olhos.
– Vai lá. – a motivou, sorrindo de lábios fechados, erguendo as sobrancelhas de modo sugestivo.
– Mas o que eu faço? – Perguntou a brasileira, beirando o desespero em se imaginar perto da sogra, sozinha.
– Ajudar com o chá. – Ele incentivou de novo. – Alguém tem que dar o primeiro passo. – Ele a olhou em um pedido silencioso. assentiu, respirou fundo e ficou de pé. – Eu vou pensar numa resposta pra você enquanto isso. – O central sorriu e piscou. – E ela vai ser muito boa.

– Você sabe fazer chá? – Ema indagou, passando por se dirigindo a um armário, sem dar muita importância a ela. A brasileira assentiu com a cabeça, respondendo à pergunta da mais velha.
– S-sim. – gaguejou, depois respirou fundo e sacudiu a cabeça. – Não tinha visto o desde ontem. – começou a falar, puxando assunto com a sogra, sem entender exatamente o que ela pretendia com aquele convite. – Chegamos tarde e quando eu... – Ema a cortou.
– Sim, ouvi vocês chegando.
– Ouviu? – A brasileira ficou alerta, pensando no que a mãe do namorado podia ter ouvido.
– Sim. – Ema assentiu, não tinha uma expressão muito serena. Na verdade, estava com uma expressão fria como mármore.

inflou as bochechas e inclinou a cabeça, não sabia o que fazer ou falar. Desejou que o chão se abrisse e que pudesse desaparecer, ir para outra realidade paralela onde não existisse o olhar crítico e julgador de Ema . Ao menos não tinha permitido que entrasse em seu quarto, se tivesse cedido, certamente a expressão da mulher seria pior.

– O que sua mãe acha sobre o namoro de vocês? – Ema voltou com o assunto que a visitante não queria abordar e sentiu crescer a vontade de correr, mas decidiu ser firme. Lembrou-se do que tinha dito na noite anterior, devia voltar a ser ela, ser sincera, corajosa e não ter medo de assumir quem era de verdade.
– Na verdade, minha família não interfere muito ou dá opiniões sobre meu namoro. – Contou firme e viu Ema estreitar o olhar e franzir a testa, surpresa e talvez um pouco insatisfeita. – Não que... não que vocês... ou que não devam por que eu não quero, é que... – Ela tentou explicar quando percebeu a expressão dela, mas apenas se atrapalhou mais e perdeu toda firmeza, ficando nervosa. – Eu quis dizer que eles não ligam. Não. Eles ligam, mas... eles... eles não...
– É, meu filho me conta o que acontece. – Ema tornou a interromper. – Eu sei. Ele liga para a minha opinião, geralmente bons filhos ligam.

entrou em pane. Outra vez. A brasileira inflou as bochechas e baixou o olhar. Queria sair correndo, mas não seria educado e ainda não sabia se havia algo a mais para o convite de Ema, ou apenas mais uma tentativa para afugentá-la.
olhou rapidamente para a ilha na cozinha, vendo ervas e percebendo uma chaleira no fogão, que chiava. Ema começou a organizar xícaras em uma bandeja e biscoitos, em silêncio, enquanto apenas observava. Até que ergueu os olhos para a médica, como quem espera uma resposta. olhou para os lados, confusa.

– O quê?
– O chá não vai ser feito sozinho. – Ema a lembrou, apontando com o queixo para a chaleira.
– Ah, claro. – assentiu rápido. – O chá. Claro. – A brasileira apontou para as ervas sobre a ilha, mas a única resposta que teve foi um olhar incrédulo por parte da candidata a sogra. – Claro. O chá.

se virou para o fogão. Sentiu toda informação sobre o preparo de chás se esvair de sua mente, assim como a água quando se tentava segurá-la nas mãos. Péssimo momento para ter um branco, cérebro.

Sinceramente, esa es la clase de mujer que trae para Navidad en familia. – Ema começou a reclamar baixo, em espanhol, mas não conseguiu fingir não escutar. – Justo para Navidad. Para la familia. No puedes hacer té sin un mapa. No me sorprende que mi hijo tenga que cocinar en casa. Que Dios tenga misericórdia.
– Disse alguma coisa? – fingiu, virando-se para a sogra. Sentia as últimas gramas de paciência escaparem por entre os dedos, assim como seu conhecimento sobre o preparo de chá.
– Não, querida. – Ema respondeu, torcendo os lábios em uma careta debochada.

O tom da mexicana fizera o sangue da brasileira começar a esquentar. rasgou as ervas e as jogou na água quente, abafando em seguida. Apoiou as mãos a pia, enquanto aguardava.

Mal tipo, mal té, mala chica. – Ema seguiu resmungando, mais baixo dessa vez.

se irritou, muito.
Virando-se rápido, pegou a tigela de biscoitos que Ema havia posto na bandeja e jogou inteira sobre a mexicana maquiavélica, enquanto ria e sentia-se vingada pelo quarto, o fantasma, o rato e a cama que geme.
A brasileira sacudiu a cabeça, voltando a realidade, já que diferente de em sua imaginação, não podia fazer aquilo com a mãe de sem ficar solteira. Respirou fundo, depois pegou a chaleira e se virou, colocando-a na bandeja, sob o olhar atento e crítico de Ema .

No te preocupes, lo haré, suegra. a provocou, sorrindo para a sogra, usando todo o pouco espanhol que havia aprendido no Duolingo.

A brasileira saiu da cozinha sorridente, a expressão de choque e incredulidade de Ema fora impagável. Quase tão saboroso quanto jogar uma tigela e biscoitos sobre a sogra.

❄❄❄


Domingo, 24 de dezembro de 2023
Casa dos
Scottsdale – Arizona/Estados Unidos da América



Durante a tarde de domingo a família ignorou o clima frio, o fato de ser véspera de natal e o péssimo horário para pescaria e foram todos pescar. , ao contrário deles, não conseguia ignorar o frio, ou o fato de que deviam estar em casa se preparando para a ceia e não ao redor de um rio ou lago, pescando. , Peter e Brian pareciam sequer perceber o vento frio enquanto andavam pela margem de um lago largo para encontrar o melhor ponto para a pescaria. Alex, Ema e Bre se dividiam em preparar iscas, cadeiras e tirar fotos. não conseguia relaxar e curtir o momento junto a eles, tentava abraçar o corpo e se esfregar, tentando se aquecer mais, enquanto reclamava por pensamento por estarem ali.
Depois de conseguirem um lugar suficientemente bom para a pescaria, o pequeno grupo estava sentado, concentrado com suas varas em mãos, concentrados nos molinetes. Por sorte, havia ali perto uma cabana de caça, que pertencia aos , e fora liberada pela família para buscar abrigo. Depois de algum tempo de pescaria sem sucesso, se aproximou da namorada, sentando-se perto dela e a puxando para junto de si, beijando sua testa coberta pelo capuz do casaco de moletom que ostentava o número do namorado e nome do time dele.

– Se divertindo? – Ele perguntou.
– Ah, claro. – ironizou e riu abafado, sendo imitada por . – Eu amo pescar no inverno, em plena véspera de natal.
– Isso é meio que uma tradição de família. – Ele contou com um sorriso. – Tem as tradições de decorar a casa, fazer biscoitos... a gente perdeu algumas, mas essa deu para aproveitar. Pense bem se quer mesmo fazer parte dessa família no futuro? – falou contra a testa dela, depois de beijá-la outra vez. – Pescar no gelo, fotos de infância humilhantes...
– Isso é um convite? – ergueu o rosto para ele e o jogador riu.

Fez-se um breve silêncio.

– Ainda é estranho pra mim, tudo isso. – voltou a falar, sentindo o aperto do namorado se intensificar ao seu redor. – Vivi aqui por meses e é como se eu fosse uma turista conhecendo a sua cidade. Fora sua mãe e seu jeito dócil e amável de demonstrar o quanto está feliz com a minha presença. – Ela ironizou.
– Esse é o charme de Ema . – O jogador sorriu e maneou a cabeça.

Concordava com a namorada, o comportamento da mãe havia sido mesmo repentino e estranho, mas não perderia tempo pensando nisso, preferia aproveitar a onda de bons sentimentos ao lado de sua garota. Além disso, há algum tempo uma questão despontava na mente e coração jogador, e a cada segundo se percebia mais incomodado com ela – de um jeito bom.

– Acho que tem uma coisa que a gente precisa conversar. – A brasileira o olhou confusa. – É uma conversa. – Ele maneou a cabeça e a olhou, tentando falar com os olhos.
– Uma conversa? – Ela devolveu.
– É, aquela conversa. – assentiu com a cabeça. – Aquela conversa, específica.
– Mas que conversa especifica é essa? – A médica ergueu as sobrancelhas.
– A conversa especifica que os casais tem... – desviou o olhar para onde o pai lutava com o molinete, fugindo das sobrancelhas unidas em confusão da namorada. – Acho que a gente precisa se resolver. Fazer a vida andar, eu quero fazer a minha vida andar com você. – a olhou nos olhos.

respirou fundo e prendeu a respiração sem perceber.

– Tá na nossa hora. – Ele ergueu as sobrancelhas.
– Essa conversa é sobre o que eu tô pensando? – perguntou com olhos arregalados. Praticamente moravam juntos, como o namorado tinha dito para a mãe, estava feliz com isso e surpresa com aquele assunto. – Tipo, aquela conversa?
– É, eu acho que é a mesma conversa que estamos pensando. – falou com firmeza. – Eu sei que meu convite para esse natal foi repentino e te assustou, não quero repetir. Então, só queria que pensasse sobre isso. Que a gente pensasse junto. Pensasse sobre uma vida de verdade juntos, tipo os meus pais, os seus, uma família... – sentiu o ar faltar. – Eu tenho certeza do que eu quero, penso nisso sempre de uns tempos pra cá.
– Mas e se eu ainda não tiver certeza? – o olhou, estava insegura.

Era um passo importante, envolvia muita coisa e por mais que parte sua tivesse total certeza sobre seus sentimentos, tinha medo de dar aquele salto, tinha medo de falhar naquele salto.

– Por isso que a gente tem que conversar, pensar sobre. – apertou os lábios em um sorriso fechado e desprendeu algum tempo olhando para os detalhes do rosto queimado pelo frio de Toronto da namorada.

o imitou e ficaram ali, no silêncio cúmplice por algum tempo, até serem despertados pelos gritos agitados da família. O casal então prestou atenção na cena. Todos estavam empolgados e afobados ao redor de Bre, que puxava com dificuldade a vara de pescar. Peter se apressava ao lado dela, tentando ajudar a mais nova dos com o molinete. e se uniram a empolgação e se apressaram em direção ao grupo. Já estavam perto o suficiente quando Bre conseguiu tirar o peixe da água gelada, revelando um bruto e grande animal que se sacudia como se sua vida dependesse disso – literalmente – e espirrando água para toda parte.

– Puxe com mais força. – Brian ordenou e se adiantou para ajudar a irmã.

Peter ajudava Bre a sustentar o peso da vara, Alex e Ema se agitavam ao lado, segurando suas próprias varas, tentava içar o peixe e liberar o peso que tencionava a linha da irmã. estava achando maravilhoso, fez lembrar das pescarias de sua vida e do livro de Hemingway, ela se divertia. Brian anunciou que daria um jeito, se aproximou mais de onde o filho estava, tentando suspender o peixe prateado que devia ter quase um metro de comprimento.
Em um bater de cílios, Brian levou a mão atrás das costas e puxou um revolver e atirou uma vez no peixe, que instantaneamente parou de se remexer. O som do tiro foi alto, devido ao silêncio da natureza que os rodeava e coloriu a água agitada de vermelho. Peter arregalou os olhos e empalideceu, congelando no lugar e na posição que estava, gritou de susto, o resto da família se entreolhou, talvez não esperassem aquela reação por parte da nova candidata a membro da família .

– Agora está resolvido, huh? – Brian sorriu vitorioso.
– Ai meu Deus! Meu Deus! – exclamou, assustada. – Você atirou! Você... meu Deus!
– Brian! – Ema repreendeu o esposo.

Peter ainda estava estático, com os nervos aflorados. se aproximou da namorada.

– Você estava segurando o peixe. Bem ali. – Ela falava e tinha os olhos onde antes estava o peixe e o namorado. – Você estava segurando o peixe. Ele atirou no peixe. Ele só puxou a arma e atirou no peixe. Ele tinha uma arma o tempo todo?
– É o jeitinho dele. – tentou acalmar a namorada. – Ele tem boa pontaria. – O central tentou amenizar.
– Ele só atirou. Ele atirou no peixe. – ainda estava pasma. – Seu. Pai. Atirou. No peixe.
– Não ligue para ele, . – Alex se aproximou, tentando ajudar. – É só a maneira do papai de resolver as coisas. – Ao dizer a última palavra, Alex dirigiu um olhar atravessado para o pai, que deu de ombros, ainda orgulhoso.
– Pense pelo lado bom, vamos ter peixe para o jantar. – ergueu um ombro e riu torto, enquanto a namorada o mirou com incredulidade.





Continua?



Nota da autora:Depois de aparecer muito nesse site escondido atrás de pseudônimos e nomes diferentes, ele veio com sua própria história. Pode entrar, Auston Matthews.
Embarquem nesse conto de natal que se passa no deserto, onde o que menos teremos será paz e amor entre entes queridos.

Espero que estejam se divertindo.
Não deixem de comentar.

Um grande beijo e até breve,
Carmen




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