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Última atualização: Agosto de 2024

Capítulo 1

Gosto de pensar que a maioria das decisões que tomei ao longo dos meus quase dezoito anos foi de forma consciente e com muita inteligência. Mas alguma coisa entre o "você não deveria estar fazendo isso" e o garoto entrando pela minha janela dizem o contrário. Espero que a inteligência seja medida de forma proporcional, quero dizer, eu espero que seja assim. Caso contrário, posso esquecer a minha vaga no céu. Os animais que salvei, a velhinha que ajudei e as doações precisam ter um peso maior do que deixar meu namorado subir uma escada de quase dois metros e entrar pelo meu quarto no meio da noite, certo?!
Okay, pode parecer estranho que eu esteja narrando o fato de um garoto estar entrando em minha janela, mas apesar disso, eu não sou uma vagabunda. foi o primeiro garoto, em toda a minha vida, que entrou pela minha janela e que conheceu o meu quarto.
E ele não era um garoto qualquer, ele era meu namorado há um ano.
Ouço um som leve, quase imperceptível, vindo da janela. Meu coração bate mais rápido, mas me esforço para manter a calma. Caminho a passos leves até a janela e, com cuidado, espreito pela cortina. Lá está , com seu rosto iluminado pela luz e uma expressão que beira o cúmulo da ansiedade e irritação.
— Abre logo isso. — ele sussurra, dando dois toques pelo vidro fechado, com pouca voz e muitos lábios, nitidamente irritado com a minha demora.
A essa altura, minhas mãos estão um pouco trêmulas, mas respiro fundo e destravo a janela. Subo-a devagar, o rangido suave do mecanismo pareceu um estrondo no silêncio da noite. Olho rapidamente para os lados, tentando ter certeza de que nenhum vizinho nos viu, embora as casas ao redor estejam mergulhadas na escuridão. ergue o corpo, se apoiando na pequena sacada, e joga uma perna por cima do beiral, em seguida a outra. Ele se movimenta com a graça de alguém que já fez isso antes, mas sei que é a primeira vez dele aqui.
— Silêncio! Minha mãe pode te ouvir. — sussurro, com minha voz quase falhando enquanto observo ele se acomodar no meu quarto.
Ele me lança um olhar sério, mas divertido, seus olhos estão brilhando com a excitação desse momento. Perto dele, o quarto parece menor, mais íntimo. tem esse efeito sobre os lugares. Quando ele está por perto, tudo parece mais fechado. Mais sufocante, talvez.
— Você realmente fez isso. — digo, tentando esconder um sorriso enquanto me sento ao seu lado. — Subiu uma escada de quase três metros no meio da noite.
Ele sorri de volta, esbanjando aquela confiança descontraída que sempre me atraiu.
— E faria de novo, só para te ver. — responde, sua voz é baixa e rouca.
Ele é muito gato. Seu corpo é incrível, seu cabelo é um loiro perfeitamente desleixado, em um nível que torna natural a sua beleza desconcertante, seus olhos são claros e penetrantes. Tudo nele é intimamente planejado para causar caos em qualquer pessoa. A maioria das garotas da nossa escola se sentem privilegiadas em estar no mesmo cômodo dele.
No entanto, apesar de estar no meu quarto com ele, eu não sinto isso. Eu deveria, e eu gosto muito dele, mas não me sinto cheia quando ele está por perto. Só me sinto… menor. Como o meu quarto parece estar.
Antes que eu pudesse responder, suas mãos agarraram minha cintura e seus lábios encontraram os meus. Sua boca pede espaço para a minha e sua língua logo torna tudo um pouco mais molhado.
Ele continua me beijando enquanto tira os seus sapatos e me empurra em direção a cama, sem afastar nossas bocas. Coloco a mão na nuca dele, numa tentativa de não me desequilibrar quando ele me acomoda no colchão, subindo por cima do meu corpo.
— A porta está fechada? — Ele para de me beijar para perguntar, mas aceno com a cabeça. Ele me dá um beijo rápido e me vira, se deitando na minha cama e me colocando montada nele. — E se você me fizer um strip-tease? — Tento ignorar quando suas mãos deslizam pelas coxas, subindo a minha saia. Seus lábios grudam nos meus e chegam até o meu pescoço, em seguida descem enquanto a minha blusa sobe. Suas mãos alcançam meus seios e logo os seus lábios descem.
Fecho os olhos, em seguida os abro, olho para a parede e para os posters espalhados. Olho para a cabeceira da minha cama e para a porta, esperando que minha mãe não surja e, ao mesmo tempo, esperando que ela surja. Seus lábios exploram meu pescoço novamente, são curiosos, rápidos e excitados.
Não estou curtindo, mas continuo deixando ele explorar o meu corpo.
Se não estou curtindo, por que deixo ele explorar o meu corpo?
Acho que parei de me perguntar isso no nosso sétimo encontro. De alguma forma me senti culpada por não retribuir o esforço que ele fazia comigo. Ele era um bom namorado e todas as garotas que eu conhecia suspiravam por ele, no entanto, ele tinha me escolhido. O mínimo que eu podia fazer era retribuir.
Não que eu devesse retribuir, mas eu me sentia muito mal quando não fazia isso. Acho que me sentia ingrata. Eu tinha um namorado, qualquer garota iria querer ele era muito bonito para mim, eu deveria ser agradecida.
Só percebo o quão longe as coisas foram quando sinto as mãos dele na bora de algodão da minha calcinha. Não lembro em que momento ele ficou por cima de mim ou subiu a minha saia ao ponto dele ficar livre para arrastar minha calcinha para o lado.
— Não. — Ele continua. — não. — Empurro ele, fazendo-o sair de cima de mim e ajusto a minha roupa. Ele joga a cabeça no travesseiro, com uma risada quase debochada o suficiente para me deixar constrangida. Quase.
— Você tem que parar de fazer isso. — Ele respira um tanto quanto frustrado, me puxando pela barra da minha calcinha e enfiando a mão novamente entre as minhas coxas, subindo-a. Me afasto mais uma vez, começando a ficar irritada.
— Isso?
— É, fingir de santinha. Porra, estamos namorando a um ano e você nunca nem me chupou. Eu tenho minhas necessidades, Alyssa. E sinceramente, já não aguento mais. Vamos fazer isso de uma vez por todas.
Realmente, eu não sou uma vagabunda. Porque não importa o quanto sentisse que estava devendo ao Universo por ter colocado na minha vida, sabia que não transaria com ele até que ele soubesse que não era apenas fazer isso. Eu podia não sentir muita coisa por meninos, em geral, e até mesmo não ser nem um pouco romântica, mas droga. Eu ainda queria que coisas especiais acontecessem comigo e definitivamente não tinha banalizado o sexo. Ele se aproxima de mim, talvez para uma nova tentativa e me beija de novo.
— Você está bêbado. — É a primeira vez que percebo o olhar avermelhado dele e o cheiro de álcool impregnado em sua boca.
— Foram só algumas cervejas, não faça drama. — Seguro minha vontade de gritar, lembrando que ainda estávamos escondidos no meu quarto.
— Eu te disse para não vir bêbado.
— Você também me disse que iria transar comigo. Somos dois bons mentirosos então.
— Quando eu me sentisse pronta pra isso. Não quando você entrasse pela minha janela bêbado.
— Faz um ano, Alyssa. Um ano. É só uma virgindade, caralho. Eu já sou seu namorado, pra quê se segurar agora?
era o típico playboy egocêntrico que achava que o mundo inteiro girava ao redor dele. Esse era o defeito dele que, muitas vezes, eu esquecia. Eu não queria exatamente esperar para casar, no entanto, meu namorado idiota fazia com que eu nunca me sentisse pronta. Eu sempre achei que a virgindade, por mais que achasse sexo superestimado, tinha que ser quando as duas pessoas quisessem e tivessem certeza disso. Eu nunca me senti pronta com , acho que devo os meus quase dezoito anos de virgindade a falta de sentimentos pelo meu namorado.
— Acho melhor você ir embora.
— É, eu também acho.
Ele sai do meu quarto pela janela da mesma forma que entrou, com um movimento ágil e desajeitado ao mesmo tempo. Fico ali, olhando para a janela aberta, sentindo a brisa fria da noite tocar meu rosto.
Estou aliviada por ele ter ido embora, mas também me sinto culpada. Não por não ter transado com ele, mas por ter deixado que ele me fizesse sentir tão pequena. Mais uma vez, a sensação de que minhas decisões talvez não sejam tão conscientes e inteligentes quanto gostaria de acreditar se torna insuportavelmente clara.
Caminho até a janela e a fecho lentamente, tentando não fazer barulho. Encosto a testa no vidro frio e suspiro profundamente. A lua ainda está alta no céu, como se estivesse observando cada movimento meu, cada decisão que eu tomava.
Volto para a cama e me jogo sobre o colchão, encarando o teto. Por que me sinto assim? Por que não consigo ser feliz com , mesmo sabendo que ele é tudo o que muitas garotas desejariam? Talvez a resposta esteja nas pequenas coisas, nos momentos em que ele me faz sentir pequena, nas palavras que ele usa para me pressionar.
Meu telefone vibra na mesa de cabeceira, interrompendo meus pensamentos. Pego o aparelho e vejo uma mensagem de texto de :
"Desculpa por hoje. Prometo que não vou mais te pressionar. Boa noite."
É a segunda promessa dele em menos de duas semanas.

Capítulo 2

Eu odeio abóboras. Para mim, elas se enquadram na categoria dos xuxus, com a diferença de ser apenas um pouco mais doce, mas não tem um gosto. Hoje, para meu azar, tinha muita abóbora no almoço da escola. Por este motivo ignorei os assobios e as brincadeiras ridículas do meu namorado e dos amigos dele e decidi que iria até a lanchonete. Lá não tinha tantas opções e oitenta por cento do cardápio era insalubre para qualquer dieta, mas eu estava com fome e qualquer sanduíche parecia mais interessante do que o que estava sendo servido.
Peguei meus fones de ouvido, me preparando para colocá-los, abri meu livro em cima da mesa e coloquei a bolsa em outra cadeira enquanto esperava que alguém viesse me perguntar o que eu queria comer. Esperei que viessem rápido, porque eu estava faminta, mas logo entendi o motivo da demora.
— Ele voltou? — Um cochicho incessante começou e imaginei que o ele a quem se referiam deveria ser ao cara alto que entrou pela porta.
As atenções do lugar inteiro estavam voltadas para ele, mas ele fingia que não era o centro das atenções. Me pergunto se ele é humano. Algumas das garotas mais bonitas da escola estão salivando por ele e ele nem ao menos as olha. Não parece ser como os caras que eu conheço.
— Oi, . Quando voltou? — Julie pareceu interessada. Muito interessada. Ela era o sonho de todo cara e, com certeza, o motivo de inveja de várias garotas. Ela havia nascido com muitas das qualidades que algumas pessoas só conseguiam com plástica e isso incluía uma boca cheia, uma bochecha fina, rosto com traços delicados e um nariz perfeitamente empinado. Sua personalidade, no entanto, era um pesadelo.
Na verdade, todos aqui tinham uma péssima personalidade. Todos eram ricos ao ponto de achar que poderiam comprar os seus destinos e jovens o bastante para achar que essa ilusão era real. Uma mistura perigosa que culminava em um único resultado: arrogância.
Pela falta de atenção que ele direciona a ela, algo que até mesmo a loira parece perceber, ela desliza o cardápio para as mãos dele e vira as costas.
Aproveito para olhar com mais atenção o homem que rejeitou a Angelina Jolie loira da nossa escola. Assim que o vejo, percebo quatro coisas:

1. Ele possui os dentes perfeitamente alinhados, escondendo um sorriso meio torto e meio sedutor que me fazem ficar sem fôlego.
2. Ele tem covinhas que se formam no cantos dos lábios quando ele sorri.
3. Ele tem uma voz de anjo.
4. Eu tenho quase certeza que estou sentindo calor.


Ou frio. Não sei dizer bem qual a temperatura do meu corpo.
Talvez eu esteja doente.
Essa sensação é tão nova para mim que eu nem sei dizer o que é que estou sentindo. Na verdade eu nem sei de onde ela veio.
Talvez seja ele, mas não sei o que ele tem de tão diferente ao ponto de ser a primeira pessoa em toda minha vida a me despertar reações biológicas. Eu não sabia bem o motivo que meu corpo reagia a ele assim, mas também nunca tinha visto alguém como ele. Ele era lindo. Não lindo do tipo garoto bonitinho, realmente lindo. Ele tinha um corpo de homem. Não era fortão, mas também não era magro. Ele tinha um cabelo escuro que provavelmente não tinha sido penteado hoje, mas nem precisava pentear. O cabelo dele conseguia tornar ele ainda mais bonito, dando um ar despojado e de alguém que, claramente, não se importava se olhariam para ele ou não. Ele era branco, mas tinha a pele levemente bronzeada. O cabelo dele precisa de um corte, está um pouco grande e cai na lateral do rosto, mas não cobre os olhos dele. E os olhos dele…
Merda.
São os olhos mais bonitos que eu já vi na vida. Não são verdes, não são azuis, são castanhos. Os castanhos mais lindos que já existiram.
Os perfeitos olhos castanhos agora estavam encarando os meus. Droga. Eu provavelmente deveria olhar para baixo e desviar o olhar, talvez tentar disfarçar que estava encarando-o descaradamente, mas eu mal lembrava o meu nome naquele momento.
Sinto novamente o calor/frio consumir todas as minhas artérias. Não sabia ainda se estava doente, mas a forma que ele me penetrava até o estômago com seus olhos me incomodava. Era desconcertante e bom. Eu me sentia lisonjeada, vulnerável, afetada e ofendida. Ele dá alguns passos em minha direção, mas para no caminho. Quando ele se aproxima um pouco mais, mesmo ainda estando a quase dois metros de distância percebo que não estou doente.
Quem está me fazendo sentir todas essas coisas, é ele.
Tudo que diz respeito a ele. Desde a pele branca, os cabelos escuros despenteados, as covinhas e os dentes perfeitos até os braços fortes que me fazem querer tocá-lo.
É quase doloroso quando percebo que, se ele sorrisse pra mim do jeito que tenta fazer, minha calcinha estaria no chão em segundos. Ele se aproxima mais, ficando perto. Percebo todo o espaço fechar, preciso de ar, preciso que minha barriga pare de se mexer sem parar. Preciso que minha boca volte a ter saliva. O homem mais bonito que já vi estende as mãos para mim, mas não sorri.
Ainda bem.
Por favor, não sorria. Eu não sei se posso resistir a esse maldito sorriso que libera covinhas perfeitas.
— Me chamo , prazer. — Olho para sua mão, estendida e penso uma, duas, dez vezes se pego. Toda aquela troca de olhares, a reação do meu corpo e a maneira como estou trêmula me dizem que essa não pode ser uma apresentação ingênua e inocente.
Antes que eu consiga responder, sinto mãos me envolvendo. Não são as mãos grandes que ele tem, não são os braços fortes que ele tem, mas ainda são fortes. Olho para o lado, esperando brigar com quem interrompeu esse momento. Vejo .
Meu namorado .
Merda.
Eu tinha um namorado. E esqueci completamente disso quando vi aquele sorriso.
— Então você já conheceu a minha namorada? — A pergunta é direcionada ao dono das borboletas em meu estômago, que agora sei que se chama . — Amor, esse é o . Meu melhor amigo.
Melhor amigo.
O motivo das malditas borboletas em meu estômago é melhor amigo da pessoa que deveria ser dono das borboletas.
Sinto algo dentro de mim murchar, lentamente, algo se esvaziar. Só então percebi que, enquanto me olhava, eu estava cheia. Completa. De uma forma que nunca me senti antes. Ele olha para mim de novo, tão intensamente quanto antes, me preenchendo novamente como antes e me sinto arrepiada.
.
É a única coisa que consigo falar. Nem sei como ainda lembro o meu nome. Ele segura minha mão e vejo um pássaro desenhado próximo do seu polegar. Não consigo pensar tanto, apenas olho pra ele, no fundo daqueles olhos castanhos e imagino o quão sortudo aquele pássaro é.
Eu nunca quis ser nada.
Agora adoraria ser um pássaro.
Aquele pássaro. Naquelas mãos.
Merda.
Merda.
Merda.

Capítulo 3

Respirei fundo várias vezes, tentando ignorar o fato de ter esquecido minha garrafa de água. Como pude ser tão descuidada com algo tão essencial? Eu amava correr, eu sabia que ia correr, então como poderia ter esquecido algo tão importante para minha própria sobrevivência?
Diminuí o ritmo gradualmente, finalmente parando para recuperar o fôlego. Inclinei-me para frente, apoiando as mãos nos joelhos enquanto tentava acalmar minha respiração. Meu corpo clamava por água, mas tudo o que eu tinha era o ar fresco da manhã e o suor que escorria pela minha testa. Nenhum dos dois entrariam pela minha boca, é claro.
Na busca desesperada por ar, levantei o olhar e encontrei um par de olhos castanhos me encarando. Uma onda de desconforto percorreu meu corpo, fazendo meu estômago se revirar. Eu odiava aquela sensação, as malditas borboletas que, ao invés de voarem graciosamente, pareciam querer me fazer vomitar de ansiedade.
As borboletas que estavam lá novamente, agitando-se dentro de mim, enquanto eu sentia a reação física disso em minha pele suada, agora arrepiada de frio, em meu rosto que parecia estar pegando fogo, em minhas mãos que estavam geladas apesar do calor. Eu lutava para manter meus olhos nos dele, mas a intensidade do seu olhar me fazia querer desviar o olhar.
Ele sorriu, como se percebesse o impacto estrondoso que sua presença tinha sobre mim.
— Parece que você precisa disso. — Ele disse, estendendo uma garrafa de água na minha direção. Pensei um pouco antes de, finalmente, aceitar a garrafa de sua mão.
Eu jamais aceitaria qualquer coisa que fosse de um estranho, muito menos beberia da garrafa dele, mas ele não era um estranho. Ele era amigo do .
Um ótimo motivo para eu ficar longe, muito longe, dele.
— Obrigada. — Assenti, pegando a garrafa de sua mão e tomei três goles grandes goles de água, não só pela sede, mas porque eu queria matar afogada as borboletas que reagiam a ele e a mais ninguém.
Eu definitivamente não estava pronta para nomear as reações que despertava em mim. Meus pensamentos vagaram para a forma como ele parecia absurdamente lindo, mesmo com uma simples camiseta branca básica e calça marrom folgada. Era uma combinação terrível, mas nele parecia perfeita.
— Preciso ir. — Murmurei, tentando recuperar minha compostura enquanto me afastava do seu olhar penetrante e dos seus braços grandes que me faziam sentir tão pequena. Ele não pareceu se importar com minha tentativa de partida.
— Você não parece estar muito bem para correr sozinha. Eu te faço companhia.
Eu não respondi que não precisava. Acho que não conseguia responder muito bem quando ele estava por perto. Talvez as borboletas tivessem subido do meu estômago para minha garganta, prendendo qualquer palavra negativa que eu daria para o homem ao meu lado.
— Vamos. — disse suavemente, começando a andar ao meu lado. Seu passo era tranquilo, e eu me esforcei para acompanhar o ritmo, tentando ignorar as borboletas agitadas em meu estômago. — Então, você e ... Estão juntos há muito tempo?
Engoli em seco, tentando disfarçar a confusão que suas palavras provocaram em mim.
— Um ano e meio, na verdade — respondi, tentando parecer casual.
assentiu, um leve sorriso brincando em seus lábios.
— É bastante tempo.
— Sim, acho que sim — concordei, sentindo-me desconfortável com a conversa se voltando para meu relacionamento com . Eu o amava, certo? Então por que essas sensações estranhas ao lado de ?
Ele olhou para mim por um momento, como se estivesse pesando suas próximas palavras.
— Vocês se conheceram há muito tempo?
— Não, na verdade nos conhecemos há uns dois anos — expliquei, tentando manter a voz firme enquanto lutava para não revelar mais do que o necessário.
assentiu novamente, seus olhos castanhos estavam escuros fixos nos meus. Por que os olhos dele me deixavam sem ar?
— E vocês se dão bem?
Tive que respirar fundo antes de responder. Eu e nos dávamos bem, isso era um dos motivos pelo qual eu não devia estar tão nervosa na presença do melhor amigo dele. Okay, meu namorado tinha os seus muitos problemas, mas não era nada insuportável, parando pra pensar.
— Sim, nós nos damos bem — murmurei, desejando que a conversa mudasse de direção.
Um silêncio tenso se instalou entre nós por um momento, e eu me perguntei se ele podia sentir as borboletas que pareciam ter feito ninho em meu estômago. Quando finalmente falou de novo, sua voz era suave e ponderada.
— Deve ser bom ter alguém com quem se dar bem. — Seus olhos me estudavam, como se tentassem decifrar algo em mim.
Assenti, sentindo-me vulnerável sob seu olhar penetrante.
— Sim, é importante.
sorriu gentilmente, e eu me vi hipnotizada pela forma como seu sorriso iluminava seu rosto. Devia ser crime ter um sorriso assim. Ele levantou a mão em um gesto tranquilizador.
— Desculpe se estou sendo muito curioso.
Sacudi a cabeça rapidamente, aliviada pela sua compreensão.
— Não, está tudo bem. E você?
deu de ombros casualmente.
— Não exatamente. A vida tem sido ocupada com outras coisas.
Senti um misto de alívio e curiosidade ao ouvir sua resposta. Não era como se eu estivesse esperando que ele estivesse disponível, mas o fato de ele não mencionar ninguém de alguma forma me tranquilizou.
Conforme nos aproximavamos do final da trilha, meu coração batia um pouco mais rápido do que o normal. Não era apenas a corrida que me deixava sem fôlego; era a proximidade com , suas palavras que tocavam partes de mim que eu mantinha cuidadosamente escondidas. era gentil, tinha o sorriso mais bonito de todo o mundo e era muito fácil conversar com ele.
Nunca era fácil para mim conversar com alguém.
Mas era com ele.
Quando finalmente chegamos ao ponto de partida, respirei fundo, tentando recuperar o fôlego e também minha compostura. Eu tinha corrido oito quilômetros, e, ainda assim, tinha mais reação sobre meu corpo do que todos os quilômetros do mundo. Eu conseguiria dar uma volta no mundo, mas não conseguiria ficar cinco minutos ao lado dele.
olhou para mim com um brilho de divertimento nos olhos, como se estivesse em minha mente. Como se ele soubesse o que se passava dentro de mim. Como se ele visse pela minha pele a forma que todos os meus órgãos se contorciam pelo olhar dele.
— Foi uma boa corrida — ele comentou casualmente, seu sorriso perfeito e amigável nunca desapareciam por completo.
Assenti, tentando não deixar transparecer o turbilhão de pensamentos que ele tinha desencadeado em mim.
— Sim, foi.
olhou ao redor por um momento, como se pensasse no que dizer em seguida. Finalmente, ele se virou para mim, seus olhos olharam os meus com uma intensidade que fez meu estômago revirar novamente.
— Espero que a gente possa fazer isso de novo algum dia — disse ele suavemente.
Meus lábios formaram um sorriso nervoso.
— Quem sabe.
Ele assentiu, parecendo satisfeito com a resposta.
— Bom, vou indo então. Foi um prazer, .
— O prazer foi meu — respondi sinceramente, assistindo enquanto ele se afastava pela trilha.
Quando ele desapareceu de vista, levei a mão ao peito, sentindo meu coração ainda batendo rápido. Era absurdo pensar que uma simples corrida pudesse ter mexido tanto comigo. Eu amava , não havia dúvida disso. Mas a presença de tinha despertado algo dentro de mim que eu não conseguia ignorar, por mais que quisesse. E eu queria muito.
Respirei fundo mais uma vez. Era apenas uma corrida, afinal de contas. Uma amizade se formando, talvez. Nada mais.
Cheguei em casa e fui direto para a cozinha, onde enchi um copo com água gelada. Bebi rapidamente, tentando acalmar tanto minha sede quanto meu tumulto interno. Minhas mãos tremiam levemente, e não sabia se era por causa da corrida ou de .
Enquanto olhava pela janela, observei o jardim cheio de flores que meu pai plantou anos atrás. Lembrei-me de como ele costumava sentar ali, admirando as borboletas que vinham visitar. Na época, eu não entendia a fascinação dele. Agora, as borboletas pareciam simbolizar tudo o que eu não queria enfrentar – sentimentos reprimidos, luto não resolvido, e, agora, a confusão que trazia à tona.
Eu odiava borboletas não apenas porque me faziam sentir fora de controle, mas também porque me lembravam de minha infância. Meu pai as colecionava em quadros na parede. Depois que ele faleceu, aquelas borboletas presas em vidro se tornaram um símbolo do meu luto, da minha incapacidade de lidar com a perda. Era como se aquelas asas delicadas estivessem presas, incapazes de voar livremente, assim como eu me sentia presa às minhas próprias emoções reprimidas.
Demorei muito para superar que meu pai não voltaria mais. Às vezes ainda pego o telefone para ligar para ele, e é aí que dói mais. Quando você percebe que nunca mais poderá compartilhar pequenos momentos. Eu salvei a voz do meu pai no meu computador, para não esquecer dela. Para lembrar que ele existiu, talvez. Às vezes ainda parece que ele está viajando e vai voltar logo. Então, alguns dias, eu paro e fico olhando para a porta, esperando que ele entre, que ele me abrace e me conte as histórias engraçadas sobre nossa família. Eu espero sentir o seu perfume amadeirado e o seu sorriso enorme quando me chama de borboletinha.
Faz cinco anos que ele não volta.
Quando meu pai morreu, sempre achei que uma parte minha tinha morrido junto. Eu achava que não sentia coisas por por isso, porque era incapaz de sentir. Até minha mãe despertava poucas emoções. Então por que me fazia sentir coisas? Se o problema era em mim, como eu achava, por que as borboletas tinham voltado?
No fim, não importava. Eu precisava encontrar uma maneira de lidar com elas. Precisava entender por que tinha esse efeito sobre mim e, mais importante, como parar de sentir isso. Porque, por mais que eu odiasse borboletas, a verdade era que eu não conseguia ignorar o que elas significavam agora.

Capítulo 4

estava entrando pela janela do meu quarto de novo. Em menos de dois dias da última vez que discutimos, cá estava ele novamente, me fazendo mais uma vez questionar a minha sanidade mental e meu autocontrole em não bater no meu namorado.
Mas eu sentia coisas pelo amigo dele, então tudo bem ele estar no meu quarto. Não que uma coisa justificasse a outra, mas eu me sentia menos culpada se tentasse sentir por ele o que meu corpo sentia por .
— Boa noite, linda. — Ele cumprimenta, se aproximando de mim e colocando as mãos em minha cintura. Ele não me deixa responder, suas mãos se encaixam em minha bunda e sua boca cola na minha com pressa, iniciando um beijo rápido.
— Você não avisou que vinha. — murmuro, me afastando um pouco dele, mas não muito, já que ele não solta a minha cintura.
— James vai dar uma festa. Algo sobre ele e a Samantha terem terminado de novo, você sabe como ele fica sem ela. — E eu sabia. James tinha sérios problemas de abandono, ele estava com Samantha a quase quatro anos e quando estavam juntos ele ficava muito bem. Assim que terminavam ele se afundava em festas, bebida e drogas. Ninguém conseguia tirar ele dali, só ela, quando voltava para ele. — Acho que eu ficaria como ele se você terminasse comigo.
— Eu não terminaria com você. — falo baixo, mas não sei se acredito nisso.
— Então, vamos pra festa?
— Você sabe que a minha mãe não me deixaria sair, menos ainda pra uma festa.
— Ela também não deixaria você estar aqui, comigo, sozinhos no seu quarto. E eu estou. Você abre a janela pra mim quase todas as noites. — Odeio o fato de ele conseguir ter argumentos tão bons, às vezes. Muitas vezes quis que fosse o típico loiro burro, mas ele estava longe de ter. Às vezes sua inteligência era tanta que beirava a manipulação. — Além disso, o que ela faria? Te prenderia no quarto? Eu viria pela janela. Te expulsaria de casa? Seria ótimo te ter dormindo na minha cama.
Ignoro o fato de ele sequer ter pensado que isso quebraria a confiança da minha mãe, que já estava por um fio. não tinha pais presentes, ele morava praticamente sozinho e tinha uma pessoa que o ajudava com a casa. Seus pais era ricos e distantes, quase como se uma coisa estivesse vinculada a outra. Ele fingia que não se importava, mas já o vi chorando uma vez, no seu aniversário, quando sua mãe esqueceu da data e ligou apenas para dizer que ele não deveria ter reprovado em matemática.
Eu não tinha a melhor relação do mundo com a minha mãe, mas era bem melhor que a relação dele com a mãe dele. Talvez por isso eu entendia quando ele menosprezava o afeto e respeito que eu tentava manter. não sabia mais o que era isso quando se tratava de família.
— Tudo bem. — Murmuro por fim, dando as costas para ele e indo até o meu guarda-roupas, procurando um vestido. — Vira de costas. — Peço, ele ri de forma quase desdenhosa.
— Você já não me deixa te tocar, agora vou ser impedido de te ver? Seria melhor se terminasse comigo de uma vez. — O drama dele me incomodava tanto, mas eu sabia que tinha um fundo de verdade. Eu colocava muitos limites no nosso relacionamento.
Reviro os olhos, me virando de costas e desço o short jeans que eu vestia, em seguida subo a blusa. Depois substituo as peças com um vestido não muito curto. Eu havia acabado de tomar banho e não era fã de maquiagem, o que fazia com que eu ficasse pronta muito rápido para qualquer ocasião. Coloco um coturno confortável e aponto para a janela. desce, em seguida eu faço isso.
É claro que meu namorado fica olhando minha calcinha enquanto desço as escadas. E é claro que ele volta a me beijar assim que chegamos no carro. Suas mãos agarram a parte interna da minha coxa e sorrio. Gosto quando ele faz isso, acho que é o único momento que me sinto verdadeiramente íntima com .
Talvez seja porque meu pai fazia isso com a minha mãe, então é um gesto de conforto pra mim ter alguém que faça isso comigo.
— No que você está pensando?
— No meu pai. — admito, mantendo a voz baixa. Ele me olha de canto e acena com a cabeça.
não conheceu meu pai, mas no fundo nós dois sabemos que meu pai detestaria ele. Não porque ele era ruim, não daria esse adjetivo para o meu namorado, mas ele era esquentadinho. Acho que nenhum pai gostaria de ter sua filha namorando .
Ele usa a identidade falsa para comprar bebida. E bebia bastante pra alguém que recém completou dezoito anos.
Ele, no mínimo, conhece a detenção mais do que a diretora.
Ele entra escondido pela minha janela.
me pressiona a transar com ele.
É, definitivamente o meu pai detestaria a pessoa que eu escolhi namorar, mas ele amaria os netos que eu e daríamos a ele. Acho que ser avô sempre foi o sonho dele e ele sempre brincava como meus filhos seriam loirinhos como ele e o quanto eu teria que brigar para que meus filhos saíssem da casa dos avós.
Acho que parte de mim escolheu estar com por isso. Seus cabelos loiros lembravam os netos que meu pai queria. Por mais idiota que isso fosse, eu sentia que ainda poderia realizar esse sonho dele. Se eu me casasse e tivesse filhos com o meu atual namorado, teríamos mais propensão de que nossos filhos parecessem o meu pai.
Balanço a cabeça, afastando o quão ridículo meus pensamentos estavam se tornando quando estaciona o carro. Assim que ele sai, ouço gritos. Eu saio logo em seguida.
— Finalmente você chegou, isso aqui tava uma chatice! — AJ reclama. Ele é amigo do meu namorado, eles jogam juntos no time de futebol americano. — Trouxe a sua mulher? Achei que fosse ser a nossa noite.
Reviro os olhos com ambas as coisas. Primeiro: eu odiava o fato de AJ se referir a mim como mulher de . Talvez eu fosse sua namorada e um dia, possivelmente, sua esposa, mas eu não era mulher dele. Eu não era mulher de ninguém além de mim mesma. Segundo: AJ parecia o namorado e eu a amante em alguns momentos, embora eu achasse isso divertido, também era irritante.
— Não fale assim, ela vai achar que não é bem vinda. Eu não viria sem ela. — Mentira. Ele obviamente viria sem mim, não havia nada que eu fizesse, ou deixasse de fazer, que impediria de faltar a uma festa. — Quer algo pra beber? — Nego com a cabeça. Não demora mais que um minuto para ver ele se afastando com AJ. Sinceramente, não lembrava nem mesmo porque eu tinha vindo. Eu sabia que seria exatamente assim.
Aliás, eu sabia porque tinha vindo. Ele ia beber muito, voltar para casa bêbado e sem condições alguma de dirigir. Eu levaria ele em casa, o colocaria na cama e só então iria para a minha cama, dormir tranquilamente sabendo que não teve nenhum acidente com o meu inconsequente namorado.
— Aqui. — Não preciso me virar para reconhecer essa voz. — Trouxe água para você se hidratar. — Havia uma brincadeira sutil e algo desconcertante em seu sorriso.
— Obrigada. — Murmuro, focando bem naquelas duas covinhas maravilhosas que faziam meu estômago se revirar. Droga, borboletas, estava aqui. Vocês deviam pular por ele, não por esse moreno lindo de arcada dentária perfeita, sorriso encantador e covinhas no tamanho exato do meu coração.
— Seus pais devem ter te dito, em algum momento da sua vida, que você não deveria aceitar coisas de desconhecidos, certo? Estou começando a ficar preocupado com a educação que você recebeu. — Apesar de ser ligeiramente ofensivo, há um humor muito, muito, bom atrás de sua voz.
— Ah, não se preocupe, eu sou bem educada. Bem educada o suficiente para não recusar bebidas de um amigo.
— Então sou seu amigo agora? — Olho a forma que ele ergue a sobrancelha e automaticamente mordisco meu lábio inferior.
Ele precisa imediatamente parar de ser tão irresistível. E isso porque não citei o fato de que preciso olhar pra cima quando quero observar todas as perfeições que Deus colocou em seu rosto.
— Amigo de é meu amigo. — Nem eu acreditava nisso, mas eu precisava de algo para manter a conversa e lembrar ele que eu tinha namorado. Para me lembrar, na verdade.
— Eu e não somos bem amigos, se quer saber. Já fomos um dia, hoje somos… pessoas que já tiveram uma amizade. — Não sei se essa afirmação me deixa melhor ou pior. Era bom saber que eu não estava desejando o melhor amigo do meu namorado, mas ao mesmo tempo era ainda pior não ter um agravante tão alto.
— Qual a história de vocês dois? — pergunto, genuinamente curiosa. Eu nunca tinha ouvido falar de .
— Éramos melhores amigos. Há três anos eu me mudei para a Califórnia, ele ficou. Retornei semana passada porque minha mãe precisava de mim e vim terminar o meu último ano na escola que estudamos. Não é uma grande história.
Não era mesmo, mas tudo sobre ele se tornava grandioso de alguma forma.
— Você deve amar muito a sua mãe. — A fala soa como uma piada. ri. Por favor, , não sorria assim para mim.
— Por que? Você não ama a sua? — Ele pergunta de forma acusatória, com um ar de quem sabe exatamente os efeitos que tem sobre mim. Sobre qualquer pessoa.
— Não ao ponto de largar a Califórnia por ela.
Ele ri.
É o sorriso mais bonito que já vi.
— Suponho que ela ficaria muito desapontada com você então.
— Não é como se ela já não fosse desapontada comigo. — Ele fica em silêncio por alguns segundos, me encarando. Tenho quase certeza que ele olha minha boca.
— Segunda coisa.
— Que? — Pisco suavemente, quase como se já estivesse bêbada. me deixava com o mesmo raciocínio de alguém bêbada quando estava comigo.
— Segunda coisa que temos em comum. — Ele explica. Sorrio porque ele está contando as coisas que temos em comum. Então ele também se interessa por mim. — Gostamos de correr e decepcionamos nossos pais.
Gargalho porque algo na forma que ele fala parece ser muito engraçada, apesar de ser um pouco triste.
— Não sei se você decepciona sua mãe. Quero dizer, você veio da Califórnia por ela. O máximo que eu faço pela minha é ir ao mercado comprar brócolis e sempre fico com o troco.
Ele ri novamente.
Céus, que sorriso perfeito ele tem.
— Aposto que são os melhores brócolis da cidade. — Ele está próximo demais? Por que eu estou com tanto calor? Porque brócolis se tornou uma palavra tão… sexy?
. — Escuto me chamar, olho para ele quando ele se aproxima, desconfiado. Conheço aquele olhar. É olhar que indicava que brigariamos mais tarde. — .
A forma que ele cumprimenta não intimida , ao contrário. O moreno apenas coloca a garrafa na boca, sem tirar os olhos de mim.
Eu sempre odiei ser vista, mas amava que olhasse para mim.
— Tem certeza que não quer entrar? Está meio frio aqui fora. — tenta me afastar do que ele considera um perigo, com razão.
— Daqui a pouco eu entro, não quero atrapalhar.
Ele acena com a cabeça, se aproxima de mim e selou meus lábios. Sei que foi para marcar território, sei que ele deveria marcar território já que não estou em pleno uso de minhas faculdades mentais, mas odeio que ele tenha me beijado na frente de .
— Desculpe por isso. — me olha, segurando o sorriso. É mais um daquele olhar com desdém e desafio.
Mais um daquele olhar que me desmancha.
— Pelo seu namorado ter agido como seu namorado? — Me sinto idiota por ter pedido desculpas por isso depois que ele fala de forma tão banal. — Não se desculpe. Eu também ficaria enciumado se você fosse minha namorada. — Minhas bochechas ardem. Tenho certeza que estou vermelha. — Não leve a mal, não estou dando em cima de você. — Me sinto decepcionada por ele não estar dando em cima de mim. — Embora eu definitivamente daria em cima de você.
Meu coração bate tão forte que me pergunto se ele consegue escutar. Ele daria em cima de mim. Isso me deixa feliz de uma forma que não deveria deixar.
— Seria estranho se desse em cima de mim. — Não deixo que ele saiba que o acho bonito demais para dar em cima de mim. Quero dizer, eu sabia que era bonita, namorava o capitão do time de futebol americano, mas ainda assim, não achava ser bonita ao ponto de olhar para mim.
— Claro, porque você namora. — Abaixo a cabeça, levemente constrangida. É, também tinha isso. Eu esquecia completamente de quando estava perto dele.
— Óbvio. E porque sou areia demais para o seu caminhão. — É claro que eu estava brincando, mas ele não precisava saber.
— Isso não seria um problema. — Olho para ele fingindo incredulidade, como se estivesse me sentindo ofendida. Talvez porque me senti um pouco ofendida. Ele se aproxima de mim de uma forma muito perigosa. Suas mãos tocam o meu cabelo de forma descontraída e ele ajusta a minha franja. Odeio o quanto eu amo que ele faça isso. — Eu daria muitas voltas por você, .
Engasgo.
Acho que tentei desesperadamente encher minha boca de água assim que a senti seca. Ou apenas quis me ocupar para não responder implorando que ele falasse meu nome de novo.
, do jeito que ele falava, acabava de se tornar a minha palavra favorita em todo o mundo. Meu nome tinha sido feito para sair da boca dele.
Nota mental: agradecer por esse nome a minha mãe. — Acho melhor deixar um pouco de você para o seu namorado, ele não para de me encarar e não quero destruir o seu relacionamento com o meu… amigo.
Não gosto da forma que ele é arrogante quanto a isso. Quero dizer, mesmo estando certo, ele não precisava me lembrar que eu estava quase largando por ele. A possibilidade disso me incomoda porque, pela primeira vez, parece real.
— Não se preocupe. Você não é uma ameaça para o meu relacionamento.
Ele ri.
Uma risada que demonstra que ele sabe que estou mentindo. Seus cabelos mal penteados caem sobre sua testa, quase alcançando os olhos. Ele tem lindos cabelos.
E olhos.

— Eu acreditaria se ele não tivesse olhando pra mim como alguém que quer me matar. — Suspiro, tenho certeza que queria mesmo matar ele. — E você não estaria tão graciosamente vermelha.
— Não estou vermelha. — Contesto de imediato, apenas por teimosia. Tinha certeza que meu rosto estava todo vermelho. Eu me sentia uma cereja nesse momento.
— Erro meu. — Encaro ele por alguns segundos. Seus olhos brilham, um sorriso desdenhoso ocupa seus lábios e suas covinhas aparecem. — Eu te dei água, não um espelho. É comum que esteja confusa. Da próxima vez vou garantir que veja como fica.
Gargalho mais uma vez, dessa vez de forma forçada, porque não sei outra forma de reagir a maneira que eu estava sendo descoberta.
— Eu só não te respondo isso a altura, porque desdém não combina comigo.
Ele se aproxima mais. Esqueço como respira. Parece que todo o ar some. Tudo é absorvido por , como se ele fosse um buraco negro, puxando tudo ao seu redor. Me puxando.
— Seu namorado também não.
É o último sussurro que ele dá, antes de sair. aparece com raiva, muita raiva. E eu preciso de forças para não cair porque, de repente, o ar volta de uma só vez.
Mas minha mente continua nele.

Capítulo 5

— Você nem tentou disfarçar, né?
— Do que você está falando agora? — Era o segundo início de discussão que eu tinha com nos últimos trinta minutos. Ele estava bêbado e, como eu já tinha previsto, eu tinha que levar ele em casa.
— Você e , rindo e se divertindo a noite toda. Você acha que eu sou cego?
— Nós estávamos só conversando. Por que você sempre faz isso?
— Porque eu vejo como você olha para ele. E como ele olha para você. — Engulo em seco e agradeço o fato de meu namorado estar bêbado o suficiente para não perceber a cor vermelha que minhas bochechas devem estar.
— Isso é ridículo, . Você está vendo coisas que não existem.
— Será? Porque às vezes parece que vocês dois têm mais química do que nós dois. Talvez seja por isso que você não quer transar comigo, se fosse com ele o que me parece é que você já teria aberto as pernas.
— Você está me acusando de algo que não é verdade. Isso não tem nada a ver com . — Dessa vez eu não estava mentindo. Minha virgindade realmente estava sendo guardada por muitos outros fatores que não envolviam .
Eu gostava de , mas ele me deixava um tanto quanto nervosa quando se tratava de sexo. A forma que ele se importava com isso tornava o ato banal demais. Como se fosse apenas sexo e não era apenas sexo para mim. Eu sabia que sexo podia ser superestimado porque conversava sobre isso com minhas amigas, mas de alguma forma eu queria que fosse algo especial. Queria que fosse importante, porque era. Era algo meu, algo íntimo e pessoal que, por mais que não fosse mudar a minha vida, representava a escolha que eu tinha. Seria a minha primeira vez. Não acho que estou errada em querer que seja importante.
— Então prove, caralho! Mostra que eu sou importante para você. Porque, sinceramente, está difícil de acreditar.
Ficamos em silêncio pelos minutos restantes. Eu não sabia muito bem o que falar e ele estava emburrado o suficiente para continuar.
Paro no sinal algumas vezes e, assim que chego na casa dele, ele sai e bate à porta. Respiro fundo e volto para casa, sabendo que ele buscaria o carro no dia seguinte, se não estivesse com tanto ódio assim de mim.
Não sei como vou explicar o carro de estar perto de casa sem a presença dele, de um dia para o outro, mas eu e minha mãe não estávamos dando muitas explicações uma à outra ultimamente, então imagino que não é um problema.
Quando chego em casa, não subo pela janela. Ao invés disso, tenho a brilhante ideia de apenas entrar pela porta principal, buscando fazer silêncio. Nos meus brilhantes pensamentos, eu não imaginei, nem por um segundo, que minha mãe estaria sentada na cadeira da sala, me esperando.
Lawrence. Posso saber onde porcaria você estava? São três da manhã. — O tom ríspido em sua voz aponta que hoje não seria um dos dias que eu conseguiria contornar a situação.
— Mãe, por favor…
— Agora eu sou sua mãe? Não parecia isso quando você saiu de madrugada ou me chamou pelo meu nome antes de ir para a escola. Você vai fazer dezoito anos em algumas semanas e precisa ser responsável, mas ao invés disso você faz de tudo para me decepcionar.
— Não é verdade.
— Não me responda quando eu estiver falando com você! Não é verdade? Esse é o seu argumento? Você reprovou em uma matéria, você foi pega bebendo, você foge de casa… Se o seu pai tivesse aqui… — A frase morre por alguns segundos. Sinto uma raiva crescer dentro de mim e nem ao menos sei da onde ela vem. Talvez viesse do fato da minha mãe estar ficando com outra pessoa quando as fotos do meu pai ainda estavam pela parede. — Ele estaria tão desapontado.
É nesse momento que perco o pouco controle que tenho. Não consigo aguentar a onda de hipocrisia que essas palavras causam. Ela fala tão abertamente sobre o que desapontaria ele quando se trata de mim, mas droga, e o que ela fazia?
— Pelas minhas notas, hm? Não por você estar transando com o chefe dele na cama que ele dormia? — Os olhos da minha mãe lacrimejam e, pela primeira vez, ela me bate. O tapa arde, mas arde ainda mais saber que ele nunca teria feito isso comigo. — Eu preferia que tivesse sido você no lugar dele.
Não espero que ela responda, mas vejo a mágoa nos olhos dela, vejo o arrependimento também. Os lábios dela tremem e ela se aproxima de mim, tentando tocar o lugar que sua mão encostou a poucos segundos. Me afasto, subindo as escadas e indo para o meu quarto. Quero chorar, quero gritar e quebrar coisas, mas nada que eu quebre vai fazer nossa relação mudar. Nada do que eu faça vai trazer meu pai de volta. Quebro então a única coisa intacta que tem em mim.
O telefone toca algumas vezes antes de atender. Sua voz é arrastada e ainda mais irritada do que antes.
— O que você quer agora, ?
— Eu quero… — Minha voz falha. Talvez ele ainda esteja bêbado, mas a minha decisão, mesmo tomada no calor do momento, ainda é clara. — Eu quero provar que você é importante para mim. Eu vou até aí.
, são três da manhã. Você não devia…
— Eu vou. Vou estar aí em vinte minutos.
Desligo o telefone antes que ele possa responder. Tento não pensar muito enquanto pego minhas coisas e saio de casa. O caminho até a casa de é curto, mas parece uma eternidade. Cada passo parece pesar mais do que o anterior.
Quando chego à porta, hesito por um momento antes de bater, cada batida ecoa dentro de mim de uma maneira desesperadamente dolorida. abre a porta, mantendo em mim os seus olhos confusos e cansados.
, você realmente não precisava vir.
— Eu preciso. Para nós. — Entro, tentando ignorar o nó no meu estômago.
Nós subimos para o quarto dele em silêncio. A tensão entre nós é visível e palpável, eu o olho e ele está em um misto de confusão e excitação. Acho que ele não acredita que vai acontecer hoje, assim e do nada. Eu também não.
Quando chegamos ao quarto, me puxa para perto dele, seus movimentos são desajeitados e desesperados. Fecho os olhos, tentando afastar os pensamentos que inundam minha mente. Eu queria que isso fosse especial, mas agora só quero que acabe.
— Amor, você tem certeza…? — pergunta, sua voz está mais suave, mas ainda incerta. Devo realmente estar péssima para que ele pergunte isso.
— Tenho, . Vamos fazer isso logo.
Ele não pergunta mais uma vez e agradeço por isso, rapidamente seu corpo se aproxima do meu. Nós nos movemos com uma urgência que parece mais uma tentativa de silenciar nossas inseguranças do que qualquer outra coisa.
Sinto suas mãos em mim, passeando pela lateral do meu corpo, apertando minha pele e subindo por dentro da minha blusa. Não sinto conforto, tudo o que sinto é a dor da perda do meu pai, a solidão que cresceu desde que ele se foi. Cada toque de é um lembrete do vazio que estou tentando preencher.
Tento me concentrar em qualquer coisa que não seja a dor, mas é impossível.
Os lábios dele se aproximam dos meus, sua boca rapidamente suga a minha e sua língua pede espaço. Eu cedo.
Enquanto ele me beija, tudo o que consigo pensar é no rosto do meu pai, nas histórias que ele contava, na segurança que ele proporcionava. continua com suas mãos explorando meu corpo, mas minha mente está em outro lugar. Sinto um aperto no peito, uma sensação de sufocamento, mas me forço continuar. Preciso que isso signifique alguma coisa, qualquer coisa, para mim.
tira a camisa dele, em seguida desce a sua calça, ficando apenas de Boxer. Acho que congelo um pouco, mas ele logo percebe e se aproxima, se livrando do meu vestido. Ajudo ele, ficando apenas de roupa íntima. Seus lábios passam pelo meu pescoço, chupando, mordendo e lambendo. Sua boca desce para meus seios e suas mãos apertam meu quadril com tanta força que sei que amanhã as marcas das mãos dele estariam ali.
— Você está bem? — Ele pergunta, quando percebe minha hesitação.
— Estou. Apenas… continue. — Ele me olha por alguns segundos. — Continue, , por favor. — murmuro, tentando esconder o quão trêmula minha voz está.
Ele não pensa muito, apenas continua. Quando sua boca toca meu mamilo, solto um gemido alto, que o faz arfar. Não sei bem como, mas ele se livra do sutiã e antes que consiga perceber, sua boxer já não está mais nele. Ergo o quadril, permitindo que ele tire a minha calcinha. Ele se posiciona no meio das minhas pernas e consigo sentir o seu pau roçando em minhas coxas.
Engulo em seco. Cada tentativa dele de me dar prazer é um contraste doloroso entre a necessidade de sentir algo e a certeza de que isso não vai preencher o vazio dentro de mim. Agarro seus cabelos, puxando levemente quando ele me beija.
— Você é tão gostosa. — Ele sussurra contra meu ouvido, sinto vontade de chorar. Não me sinto íntima de , sinto que estamos pulando vários passos, mas não posso mais voltar atrás. Quero sentir tudo que a primeira vez pode trazer, quero sentir o amor de , quero sentir os seus toques, seus lábios, mas não sinto. Só me sinto magoada. Abandonada. Só sinto o maldito luto. — Se você não relaxar, vai doer mais.
Aceno com a cabeça. Quero que doa. Quero que a dor física substitua a emocional. Eu preciso disso.
A boca de busca a minha de forma mais desesperada e agradeço por ter outra coisa pra me concentrar. Então sinto a pressão dele em minhas pernas, sinto a dor enquanto ele vai entrando dentro de mim, sinto o sopro quente de ar saindo da boca dele junto com um gemido desesperado que sai da minha.
Demorou um ano e meio para acontecer, mas quando finalmente aconteceu, foi tudo o que eu temia: rápido, desconfortável e emocionalmente vazio.
Ele para um pouco assim que me retraio, fechando os olhos e jogando minha cabeça para trás. me dá tempo para que eu me acostume, mas não consigo me acostumar.
dói quando ele volta a se mexer. Ele ergue um pouco minhas pernas, colocando-as em seu quadril. Isso faz com que ele entre mais fundo, isso também faz com que doa mais. Não reclamo.
É uma sensação forte. Uma barreira que estava lá a segundos e que agora não está mais. Eu tinha acabado de perder a minha virgindade com .
Era dolorido, mas não era.
Era desconfortável, mas não era.
Era ruim, mas não era.
Fico parada, mantendo as mãos nas costas dele e arranhando conforme a dor vai diminuindo, esperando que ele traga a dor de novo. Eu não me sinto empolgada, não me sinto emocionada, não sinto nada. Eu só sinto a mágoa me preenchendo, mesmo quando se move mais rápido. Mesmo quando ouço o barulho que sai de sua boca ou quando ouço o choque de nossos corpos colidindo.
— Eu te amo tanto, baby. — Não sinto o amor também.
Parte de mim briga comigo, falando que eu deveria ter esperado. Tento silenciar essa voz gemendo, mas ela está alta demais. Percebo que não é uma parte de mim, são todas.
Não sei quanto tempo exatamente se passou desde que continuou se movimentando em cima de mim, ele toca meus seios e ergue minha coxa. Acho que gosto da posição que estamos. Talvez, quando acontecer de novo e eu não estiver com a mente tão fodida, possa ser melhor. Sem dor. Sem os pensamentos todos.
Quando acaba, sai de dentro de mim. Me sinto estranhamente mais vazia do que nunca. Deito ao lado dele, que logo adormece, mas não consigo dormir também. Ao invés disso fico acordada, olhando para o teto, tentando entender o que acabei de fazer.
As lágrimas vêm silenciosamente, a confusão do que fiz também.
Quando o sol começa a nascer, me levanto silenciosamente e saio do quarto de . Caminho de volta para casa, sentindo-me perdida e confusa. Quando entro, a casa está silenciosa. Subo as escadas até meu quarto, caminho até o meu banheiro, entro debaixo do chuveiro e finalmente deixo as lágrimas caírem livremente.
Nada mudou.
Eu ainda sou eu, e a dor e a confusão ainda estão aqui.

Capítulo 6

Acordo com o som estridente de uma buzina. Esfrego os olhos sonolentos e me levanto da cama, deixando o cobertor cair no chão. Quando olho pela janela, vejo ao volante de seu carro, impaciente.
, vamos! Você está atrasada! — ele grita, acenando para que eu me apresse.
Com um suspiro, percebo que havia dormido demais e estava atrasada para a escola.
Rapidamente, visto a primeira roupa que encontro e saio do quarto às pressas. Na cozinha, não encontro minha mãe, apenas uma mesa posta. Imagino que, pelo horário, ela já tenha ido trabalhar e não quis me acordar para evitar mais dos sentimentos confusos e diálogos que se transformavam em discussão.
Sem olhar para trás, saio de casa e me dirijo ao carro onde está esperando. Ele está encostado no capô, quando me aproximo ele segura minha cintura, beijando os meus lábios.
— Desculpe pelo atraso. Obrigada por esperar — digo, tentando parecer mais calma do que estou me sentindo.
Entro no carro de e fecho a porta, sentindo-me mais distante do que nunca. Ele parte o carro e seguimos em silêncio, até que ele finalmente decide falar.
— Baby... Obrigado por ontem, significou muito pra mim — ele começa, seu rosto iluminado por um sorriso genuíno. Eu assinto, tentando parecer natural, embora uma parte de mim se sinta culpada por não compartilhar sua felicidade. — Não deveria ter ido embora. Você podia ter acordado comigo. Vou garantir que da próxima vez, não fuja de mim — ele continua, tentando manter o clima leve e descontraído. Forço um sorriso, sabendo que ele está tentando melhorar as coisas entre nós. Mas por dentro, meu coração está pesado de culpa. — Trouxe algo para você.
— O que? — Deixo que minha curiosidade fale mais alto, numa maneira de fugir do assunto e evitar meu próprio desconforto. aponta para o banco de trás, pego a caixa e a abro. Tem rosas, chocolates, um bilhete que dificilmente ele escreveu e uma cartela com dois comprimidos. — O que são esses comprimidos? — Pergunto, surpresa e um pouco desconcertada.
— Comprei uma pílula do dia seguinte para você. Ontem à noite não usamos camisinha e... Bom, somos jovens demais para lidar com as consequências de uma gravidez indesejada. — explica ele, seu tom é sério contrastando com o gesto romântico dos chocolates e das flores.
Fico em silêncio por um momento, processando suas palavras. A preocupação de é evidente e sei que ele está certo, mas sinto um aperto no peito ao perceber que ele tomou uma decisão que afeta nós dois sem me consultar.
— Agradeço sua preocupação, mas isso não foi correto. Você devia ter falado comigo antes de tomar essa decisão sozinho. — digo, lutando para não deixar transparecer a mistura de emoções que estou sentindo.
— Nós transamos, . Não é grande coisa. Estou apenas cuidando da prevenção. E você deveria tomar anticoncepcional, agora que isso aconteceu. — Ele estaciona o carro e se aproxima, beijando a minha testa. — Quer que eu marque uma consulta?
— Eu ainda sei tomar minhas próprias decisões. E, aliás, por que eu preciso tomar o remédio? Por que você simplesmente não usa camisinha?
— Eu demorei um ano e meio para estar dentro de você, vou aproveitar da melhor forma. — Ele fala como uma piada, mas não acho engraçado quando ele fala. Era grande coisa para mim e me deixava ainda mais frustrada e decepcionada saber que para ele foi apenas sexo. Ele suspira, percebendo que não estou me divertindo com a situação. — Podemos conversar sobre isso depois da aula?
Aceno com a cabeça, sabendo que isso não nos levaria a lugar algum. Ele desliga o carro e saio do automóvel deixando a caixa no mesmo lugar que a encontrei e pegando apenas os remédios. Os coloco discretamente dentro da bolsa porque não preciso que as minhas amigas ou os amigos dele façam caso disso. Ninguém precisa saber o que aconteceu.
A aula se mantém chata, meu olhar fixo apenas na cadeira que deveria estar, agora que voltou. Percebo que além da sensação incômoda dentro de mim, também tem uma saudade um pouco absurda dele. De conversar com ele. Acho que não é apenas porque sinto coisas confusas, mas porque ele é distante o suficiente para não me julgar sobre minhas péssimas escolhas.
Ele sempre tinha uma maneira de me ouvir sem me fazer sentir como uma idiota. Eu sentia que podia falar sobre , sobre minha mãe, sobre qualquer coisa, e ele apenas ouvia. Não tentava consertar tudo ou dar conselhos que eu não tinha pedido. Simplesmente estava ali, presente, e isso me fazia sentir menos sozinha.
Agora, com ele ausente, a sala de aula parece ainda mais sufocante. está na aula, mas está mais interessado em trocar mensagens com seus amigos do que prestar atenção.
Eu desvio o olhar para o quadro, tentando focar no que a professora está dizendo, mas a ausência de continua me distraindo. Sinto uma pontada de culpa por estar tão preocupada com a ausência dele, especialmente depois da noite passada com . Mas não consigo evitar.
Quando a aula acaba, demoro um pouco mais a sair da sala. sai e logo em seguida AJ, Brian e Marcus vão com ele. Reviro os olhos com o ridículo código masculino que os quatro têm. Quando passo pelo corredor, os vejo reunidos. Me sinto um tanto quando deslocada perto deles, mas não tenho muita opção no momento.
— Então, , como foi a noite passada? Dormiu bem? — Seu sorriso era brincalhão, mas senti sua pergunta me atingir como um soco no estômago. Eu sabia exatamente do que ele estava falando, mas não esperava que os amigos de estivessem tão cientes dos detalhes da minha vida pessoal.
— Como assim?
— Todo mundo viu como estava animado quando vocês chegaram hoje. — A voz de Brian era casual, mas havia um subtexto óbvio em suas palavras. Eu me senti exposta, como se a noite anterior não fosse mais minha, mas sim um tópico de conversa entre eles.
— Qual a droga do problema de vocês? Vocês não tem um assunto mais produtivo para discutirem?
, que até então tinha ficado em silêncio, deu um tapinha no ombro de Brian.
— Deixe em paz, cara. Não há nada para vocês especularem. — ele disse, com uma tentativa de ser firme, mas seu tom tinha uma pitada de nervosismo. Quase como se ele estivesse se aproveitando da situação. Suas mãos passaram por minha cintura, ficando atrás de mim, mas logo me afastei dele, sentindo a raiva e mágoa crescerem em mim.
— Ah, relaxa, . Estamos só brincando. Não precisa ficar na defensiva — AJ disse, tentando acalmar as coisas.
— É, não precisa levar tudo tão a sério — Brian concordou.
Balancei a cabeça, tentando afastar a sensação de exposição que me envolvia. Eu não deveria estar me explicando para eles, nem tentando justificar minhas escolhas. Elas eram minhas, afinal de contas.
Eu não sabia ao certo o que esperar do nosso relacionamento, mas uma coisa era certa: não era para ser um assunto de fofocas entre seus amigos.
— Você é um idiota, . — Murmurei, antes de me afastar. Ele tentou me seguir, segurando minha mão, mas apenas me soltei dele. — Eu vou correr, não venha atrás de mim. Converse mais com os seus amiguinhos sobre como foi bom me comer ontem a noite.
, espera. Eu não queria que fosse assim — ele tentou se explicar, segurando meu braço suavemente mais uma vez.
— Não quero ouvir suas desculpas agora. Você não tem o direito de expor nossa vida íntima assim, como se fosse um troféu para mostrar aos seus amigos — respondi, sentindo o calor da raiva se misturar com a frustração.
Ele pareceu atordoado por um momento, antes de tentar novamente se aproximar de mim.
— Eu só estava brincando com eles, não pensei que fosse te incomodar tanto — disse, com um tom de voz mais suave, quase arrependido.
— Isso não é uma brincadeira para mim, . É pessoal e íntimo, e eu não estou confortável com isso sendo exposto assim. — expliquei, tentando manter minha voz firme apesar do turbilhão de emoções dentro de mim.
— Tudo bem, tudo bem. Me desculpa. — Ele me olhou com os olhos claros que eu tanto achei que gostava, mas não me vi mergulhando neles. — Podemos nos ver à noite? Para conversar.
Penso em responder, mas sou interrompida pelo meu celular. Minha mãe liga e manda mensagens, sem parar. Engulo a seco sabendo que tinha mais um problema em casa e não fazia a menor ideia de como iria resolvê-los.
— Eu tenho que ir.
Ele assentiu, sem se colocar entre a saída e eu. Mordi levemente o lábio inferior e saí, o ouvindo chamar os amigos de idiota, o que me deu vontade de rir porque concordava com ele, todos os amigos dele eram idiotas. Eu só não queria que ele fosse também.

Capítulo 7

Ninguém fala sobre a dor um dia após a primeira vez. Me viro na cama, sentindo-me desconfortável com a dor em minhas pernas e em meu estômago. Cada movimento é uma lembrança incômoda da noite anterior, das decisões tomadas sob a pressão do momento e da tentativa frustrada de escapar da dor emocional que me persegue como minha sombra.
Desço para a cozinha, encontrando minha mãe já preparando o café da manhã. Seus olhos encontram os meus por um momento antes de desviar o olhar, e sei que a conversa que precisamos ter está pendente no ar.
, precisamos conversar — diz ela, sua voz calma, mas carregada de uma seriedade que me faz engolir em seco.
Sento-me à mesa, nervosa com o que está por vir. O silêncio entre nós é pesado, preenchido apenas pelo som dos talheres e da chaleira que ferve ao fundo.
— Eu sinto muito pelo que aconteceu ontem à noite. Não devia ter dito aquilo. Estava com raiva, magoada... mas não justifica minhas palavras. Seu pai teve muito orgulho de você, em toda a sua vida. Não seria uma nota que o faria perder isso.
Eu olho para ela, lutando contra as lágrimas que ameaçam escapar. Por um momento, sinto um lampejo de esperança de que talvez possamos consertar as coisas entre nós. Desde que meu pai morreu, sinto que minha relação com a minha mãe foi enterrada junto a ele. Sempre foi ele a cola que nos unia.
— Eu também... eu também sinto muito, mãe — murmuro, mal conseguindo encontrar as palavras certas.
Ela suspira, seu olhar perdido por um momento antes de se concentrar em mim novamente.
— Eu realmente gosto de Jake. — Ela começa, me fazendo desviar o olhar. — Faz cinco anos que o seu pai se foi e eu preciso seguir a minha vida porque parece que morri com ele, mas isso não é verdade. Eu ainda estou aqui. Sei que é difícil, não é fácil para mim também, mas… Jake e eu estamos namorando e isso não aconteceu porque não respeitei o seu pai. Eu o respeito tanto que escolhi alguém que ele aprovaria para estar comigo, para conviver com você. Espero que entenda isso algum dia. — As palavras dela caem como um peso sobre mim. O novo namorado de minha mãe não é uma novidade completa, mas ouvir isso tão diretamente deixa meu coração pesado. Ela está seguindo em frente, tentando encontrar um pouco de felicidade para si mesma, enquanto eu ainda estou presa ao passado, tentando lidar com a perda que parece cada vez mais insuperável. — Ele é gentil, é compreensivo e tem sido um apoio para mim.
A dor que sinto é maior do que a física. É uma dor profunda e dilacerante, misturada com uma sensação de abandono que não posso ignorar. Minha mãe está buscando consolo em outro lugar, enquanto eu mal consigo encontrar conforto em mim mesma. Estamos muito quebradas, mas ela ainda consegue procurar se curar. Eu só consigo me afundar mais. E mais. E mais.
— Eu não sei como me sentir sobre isso. — admito, finalmente permitindo que as lágrimas rolem por meu rosto.
Ela se aproxima e tenta me tocar, mas eu recuo involuntariamente. A dor emocional que sinto é tão intensa que qualquer gesto de consolo parece insuficiente.
— Eu entendo, . Eu só quero que saiba que... que ainda estou aqui para você. Sempre estarei.
Não sei o que responder diante disso. Achei que, quando ela finalmente admitisse, eu sentiria raiva dela, mas tudo que sinto é uma compreensão dolorosa. Uma aceitação insuportável de que meu pai não vai mais voltar. Que ela está seguindo sem ele porque não existe mais ele.
Só existe ela. Eu. E Jake.
Falo a única coisa que consigo.
— Eu perdi minha virgindade ontem. — Não sei se eu queria um conselho ou se eu queria irritar ela ao ponto de desencadear uma reação explosiva. Acho que esse é o problema das pessoas quebradas, nós sempre queremos que uma dor substitua outra. Sempre buscamos a dor mais forte. Porque, no fim, sentir dor é melhor do que não sentir nada.
— Foi com o ? — Minha mãe conhecia meu namorado e, assim como imagino que seria com o papai, ela também não gosta dele.
— Sim. — Respondo, esperando pela reação dela. Ela não briga comigo, mas consigo ver que está se controlando para não perder o controle.
— Tudo bem. — Ela finalmente diz.
— Tudo bem? Não vai gritar comigo? — Pergunto, surpresa pela falta de reprimenda.
— É a sua virgindade, . Por mais que eu não goste de ter acontecido ou de ter sido com o seu namorado irresponsável, isso é sobre você agora. Vocês se protegeram? — Ela pergunta diretamente, e eu balanço a cabeça negativamente, sentindo-me envergonhada.
Minha mãe suspira profundamente, parecendo pensar cuidadosamente antes de falar.
— Você sabe que isso é importante. Não só por gravidez, mas por sua saúde. Eu entendo que as coisas acontecem, mas você precisa ser responsável. entende isso?
— Ele me deu uma pílula do dia seguinte. — murmurei, sentindo o peso da desaprovação silenciosa dela. — Eu sei que não deveria ter acontecido assim, mas... foi o que fizemos.
Ela franziu a testa, claramente incomodada.
— Isso não é algo que deveria ser feito de forma tão leviana. Proteção é importante em todas as situações.
— Eu sei, mãe. Eu sei.
Minha mãe fechou os olhos por um momento, processando a informação.
— E você, como se sente sobre isso? — Ela perguntou, abrindo os olhos para me encarar diretamente.
Respirei fundo, tentando colocar em palavras todas as emoções que estava sentindo.
— Eu não sei ao certo. Parte de mim se arrepende, parte de mim está confusa... Não é como eu imaginei que seria. Eu só queria que fosse especial, sabe? — Admiti, sentindo um nó na garganta.
Minha mãe colocou uma mão sobre a minha, oferecendo um gesto de conforto que eu aceitei.
— Eu entendo, querida. É normal se sentir assim. Mas lembre-se, se você não se sente pronta para algo, não se force. — Ela suspirou, ficando em silêncio por alguns segundos enquanto me olhava. — Eu não vou fingir que estou feliz com isso, mas não vou te punir por tomar suas próprias decisões. Só quero que você pense mais antes de agir, especialmente quando se trata de sua saúde, do seu futuro e bem-estar.
Eu abaixei a cabeça, sentindo a responsabilidade, a confusão emocional e os pensamentos turbulentos de minha mente. Acho que, além de tudo, eu me sentia envergonhada. Claro que não contei que os amigos dele sabiam ou que ele tinha sido idiota mais cedo, acho que essas coisas eu não queria admitir em voz alta, nem mesmo para mim.
— Desculpe por não ter contado antes. Eu só... não sabia como.
Minha mãe colocou a mão suavemente em meu ombro.
— Eu entendo, querida. Estamos todas tentando lidar da melhor forma que podemos. Acho que devemos marcar uma consulta para você. Para garantir que está tudo bem e para conversarmos com um médico sobre as próximas etapas.
— Mãe? — Ela olhou para mim, observei seus traços atenciosos e por mais que quisesse uma briga antes, agradeci por não termos uma. — Obrigada.
— Você quer conversar mais sobre isso? — Ela perguntou, agora com um tom mais suave e materno.
Balancei a cabeça.
— Não agora. Só quero descansar um pouco.
Ela assentiu compreensivamente.
— Tudo bem. Estou aqui se precisar de qualquer coisa.
Pela primeira vez, após anos, voltei a sentir o que sentia quando meu pai era vivo. Voltei a me sentir filha e voltei a ter uma mãe. Agradeci por isso, nosso vínculo era pouco, mas ainda existia. Ver isso foi a melhor coisa que já pude ver desde que minha vida perdeu as cores que tinha.

Capítulo 8

Ele trouxe flores, pela segunda vez na semana ele trouxe flores. Lírios para agradecer, rosas para se desculpar. Me pergunto se é esse o motivo de cemitérios estarem tão cheios, são esses os sentimentos que fazem as pessoas darem flores a alguém? A culpa? Agradecimento? Porque tudo que consigo sentir é uma raiva crescente, mas nem sei se consigo sentir essa raiva.
Voltei para o estado que não sinto nada, ou que sinto tudo. Tão confuso que não posso identificar nenhum sentimento.
— Oi . — Murmuro, ele sorri quando me vê, mas não consigo retribuir, não assim, não quando ainda estou magoada por ele.
— Ei, amor. Ainda está brava? Eu te trouxe flores. — Olho para a mão dele e um sorrio irônico e inevitável escapa dos meus lábios.
— Desculpe, acho que me perdi um pouco na linha do tempo. As flores são para se desculpar por ter contado aos seus amigos que transamos, ou para se desculpar por ter me dado uma pílula do dia seguinte depois de agir como um babaca? — Minha voz soa mais fria do que eu pretendia, carregada com uma mistura de sarcasmo e mágoa.
parece desconcertado por um momento, seu sorriso desaparece lentamente. Ele parece encontrar as palavras enquanto seus olhos procuram os meus, procurando uma maneira de se desculpar que não seja trivial. Não sei se ele vai conseguir, às vezes acho que trivial é tudo que ele consegue ser.
— Amor, eu... Eu não queria que fosse assim. Você sabe que eu me preocupo com você. Eu pensei que... que estava fazendo o melhor para nós dois — ele murmura, as palavras saindo com hesitação.
Eu o encaro, por alguns segundos vejo a sinceridade em seus olhos misturada com culpa. A raiva ainda borbulha dentro de mim, mas também há uma tristeza profunda, um vazio que não se preenche quando estou com ele, um vazio que me lembra do quanto nos desgastamos com o tempo.
— O que você pensou, ? Que eu ficaria bem com tudo isso? Com suas decisões, com a maneira como você age sem me consultar? — Minha voz treme um pouco agora, acho que quero que ele reaja. Quero que ele também brigue comigo porque, assim, talvez isso passe. Talvez essa sensação de irritação acabe se eu tiver como acabar com ela.
Ele suspira, parecendo derrotado. As flores em sua mão parecem tão frágeis e inúteis.
— Eu sei que errei. Eu deveria ter falado com você antes de agir. Mas por favor, , acredite em mim quando digo que fiz isso porque me importo com você. Eu não queria que nada de ruim acontecesse. — sua voz é baixa, cheia de arrependimento. — Meus pais chegaram hoje. Por favor, eu preciso de você.
Eu olho para as flores por um momento, então para ele. Uma parte de mim quer aceitar suas desculpas, quer acreditar que ele se importa. Mas outra parte, uma parte mais racional, está cansada de desculpas vazias. Lembro-me dos meus pais. Isso doía em mim, porque sabia que os meus pais nunca gostariam mais de do que de mim.
Eu sabia que a distância emocional dos pais dele não era uma justificativa para que ele agisse assim, mas também sabia que nós amávamos da forma que sabíamos amar. sabia muito pouco sobre o amor e, por mais que ele falhasse em muita coisa, ele tentava.
Respiro fundo, sentindo o peso das emoções se acalmar. Com um gesto decidido, pego as flores dele e as coloco no centro da mesa, aceitando suas desculpas silenciosamente. observa e vejo um pequeno sorriso de alívio se formando em seus lábios.
— Obrigado. — ele diz, com os olhos cheios de gratidão.
Eu assinto lentamente, gosto de ver a felicidade dele. Gosto de ver o sorriso dele, rapidamente um sorriso leve aparecendo nos meus lábios em resposta.
— Vou tomar um banho rápido e já desço. Podemos ir para a casa dos seus pais juntos.
Ele parece aliviado com minha decisão, concordando com um aceno de cabeça.
— Eu te espero aqui então.
E ele esperou. sempre foi paciente, mesmo nos meus momentos de dúvida e hesitação. Era um dos motivos pelos quais eu ainda estava aqui, apesar de todas as vezes que tentei me afastar. Por mais que fugisse, acabava voltando para ele. Ele era o que eu tinha e, mais que isso, eu era o que ele tinha também. Ele podia agir como um idiota em muitas das vezes, mas eu estava com ele há mais de um ano, eu sabia de suas tentativas de defesa e sabia, mais ainda de como ele tentava desesperadamente ser forte. Não que ele não fosse forte, ele era, mas precisava de muito esforço pra se convencer disso.
e eu éramos como ímãs, atraídos um pelo outro mesmo quando parecia que estávamos nos afastando. Os altos e baixos do nosso relacionamento me deixavam exausta emocionalmente, mas havia algo nele que eu não conseguia deixar para trás. Ou talvez fosse algo em mim. Talvez fosse a maneira como ele conseguia me fazer rir nos momentos mais sombrios, ou como sua vulnerabilidade se mostrava nos momentos de intimidade. Éramos dois quebrados tentando colar os pedaços um do outro.
Acho que fiz as coisas mais no automático do que gostaria, porque quando percebi eu já estava descendo as escadas e indo ao encontro dele. Ele sorriu quando me viu e veio até mim, me abraçando. Eu permiti que o fizesse, mas além disso, o abracei de volta. Senti o cheiro do seu perfume que sempre me acalma, senti suas mãos agradecidas tocando meu quadril e vi em seu olhar ternura misturada com incerteza, como se não soubesse ao certo o que dizer ou fazer. Mas além disso, senti que ele precisava de mim. E eu senti que precisava dele também.
segurou minha mãe enquanto caminhávamos até o carro e uma calma estranha se instalou dentro de mim. Não era a solução para todos os nossos problemas, mas, por enquanto, estar ao lado de parecia o lugar onde eu deveria estar.

(...)


Chegamos à casa de e fomos recebidos por uma cena familiar. Seu pai estava em uma conversa animada ao telefone, para não dizer exaustiva e agressiva, enquanto sua mãe folheava uma revista na sala de estar. Ambos me cumprimentaram quando entrei, mas de maneiras muito diferentes. Seu pai apenas acenou com a cabeça em reconhecimento, enquanto sua mãe se levantou imediatamente e veio me abraçar calorosamente.
, querida, que bom vê-la novamente! — ela disse com um sorriso afetuoso, segurando minhas mãos com ternura. Era estranho pensar que ela era assim comigo, mas nunca a vi abraçando o próprio filho.
Eu sorri em resposta.
— Oi, Sra. Evans. É um prazer estar aqui — respondi sinceramente.
Seu pai, por outro lado, interrompeu sua conversa apenas por tempo suficiente para lançar um olhar de avaliação antes de retomar sua ligação. Eu sabia que ele era um homem de poucas palavras, mas sua expressão severa sempre me fazia sentir como se estivesse sendo julgada.
Os Evans eram conhecidos por serem rigorosos com , especialmente seu pai. Eles viam poucas qualidades nele que mereciam elogios, exceto talvez o fato de ele estar comigo. Às vezes, eu me perguntava se sua rigidez contribuía para os problemas de autoestima de .
— Você sempre será bem-vinda aqui, querida. precisa de alguém como você ao seu lado — comentou sua mãe, olhando de soslaio para seu marido, que estava imerso na ligação. — E então, vai dormir aqui hoje?
Sorri de lado, quase esquecendo o quanto ela me incentivava a passar o maior tempo possível ao lado do seu filho.
— Não sei se posso, minha mãe vai me esperar para o jantar e...
— Ah, querida, não se preocupe. Sua mãe tem você todos os dias e nós só nos vemos a cada três meses — disse ela, com um tom que misturava persuasão e firmeza. — Durma em um dos quartos de hóspedes, ou com . Esta casa logo será sua também.
O convite da Sra. Evans era caloroso, mas também intimidador. Ela tinha uma elegância que deixava as pessoas constrangidas, eu não sabia explicar o quê era, mas sentia isso tão bem que nunca conseguia negar aos seus pedidos.
— Eu... eu agradeço muito pelo convite. Acho que posso ficar esta noite — respondi, tentando não parecer indecisa.
— Ótimo! Vou pedir que sirvam mais um lugar à mesa. — disse a Sra. Evans, sorrindo satisfeita.
permaneceu ao meu lado, observando sua mãe se afastar com um sorriso leve nos lábios.
— Ela gosta muito de você, sabia? — ele murmurou, baixando a voz como se estivesse compartilhando um segredo. Meu namorado se aproxima, ficando atrás de mim, mordo o lábio inferior quando ele distribui alguns beijos pelo meu ombro.
— Acho que ela apenas vê o que quer ver — respondi, tentando esconder minhas próprias inseguranças por trás de um sorriso.
tocou meu braço suavemente, seu pai estava a alguns metros, distantes de nós dois, mas ainda tinha no ar o perigo de sermos pegos.
— Ela tem razão, . Você é especial. Eu sei que hoje foi complicado, mas estou feliz que você tenha aceitado ficar. E não é apenas porque eu gosto da sua presença ou porque preciso me desculpar, é porque você me deixa calmo. Todo mundo fica bem quando você está perto. Eu não conheci o seu pai, mas sei que você foi a melhor coisa que ele fez.
Senti um nó se formar na garganta enquanto olhava para ele. Em momentos como esse, era fácil lembrar por que continuamos lutando, apesar de todas as dificuldades.
— Vamos pro seu quarto. — Peço, ainda mantendo o tom de voz baixo.
Não sei porque pedi isso, não sei porque quis isso, talvez fosse a dor que novamente se espalhou em mim. Talvez fosse a sensação de que meu namorado merecia que eu fosse mais ou, talvez, simplesmente fosse o fato de que quando estava dentro de mim, eu esquecia o que estava acontecendo fora.
E, em alguns momentos, eu precisava esquecer.

Capítulo 9

Sinto os lábios de descendo para o meu pescoço, sorrio com as cócegas que me causam e suspiro baixo quando me mexo um pouco mais lentamente na sua cama. Ele coloca a mão direita no meu quadril e sobe em cima de mim, se encaixando em minhas pernas, mas não me beija. Ao invés disso ele me encara quando abro os olhos, sinto minhas bochechas corarem.
— Cadê seus pais? Perdemos a hora? — Ele sorri, dando de ombros e me dá um selinho nos lábios.
— Não sei, não me importo. — Reviro os olhos com o comentário porque sei o quanto ele se importa.
— Já foram embora?
Ele acena com a cabeça e mordisco levemente o lábio inferior, suspirando. Em seguida puxo os lábios dele entre meus dentes de forma suave, leve e um pouco provocativa também.
— Você se arrepende? — A pergunta dele não é clara, mas não precisa ser. Sei exatamente ao que se refere.
Preciso pensar nessa pergunta porque eu não sei se me arrependo. Quero dizer, eu gostava de , estávamos juntos há algum tempo, os pais dele gostavam de mim e tínhamos idade para isso. Então, acho que eu não tinha motivos para me arrepender. Ele era meu primeiro namorado e acho que, de alguma forma, era justo que ele fosse meu primeiro também.
— Não. — Respondo, mas havia algo na minha voz, na minha mente. Algo que sussurrava em um tom baixo um “mentirosa”.
me olha por alguns segundos e sinto algo dentro de mim se revirando, um frio na barriga que eu não costumava sentir, mas que sempre aparecia quando algo estava errado. Espero que ele não insista nesse assunto.
— Eu sei que posso ser… complicado às vezes, mas você sabe que te amo, não sabe? — Suspiro, concordando com a cabeça.
Eu sabia. gostava de mim e apesar de ter um gênio difícil, ele mostrava isso quando podia. Ficamos em silêncio por alguns minutos, mas não é exatamente constrangedor, apenas incômodo.
— Eu sei. Eu também gosto de você. — Era verdade, eu gostava de , gostava do que tínhamos e gostava da nova forma que tinha aprendido com ele para lidar com o vazio. — Eu falei com a minha mãe. Sobre o que aconteceu.
Umedeço os lábios, mordendo o lábio inferior enquanto sinto minhas bochechas queimarem. Ele me olha um tanto quanto desconfiado e quase consigo ouvir seus pensamentos e as certezas de que ele precisaria não ver minha mãe pelo resto do ano.
— E aí?
— E aí que ela vai num médico comigo.
Ele concorda com a cabeça, sem saber exatamente o que falar e sinto vontade de rir. Era meio raro ver ele tão sem ação assim, chegava a ser um pouco engraçado.
— Okay.
— Okay. — Murmuro, acompanhando o seu próprio tom de voz. Acho que esperava mais, esperava que talvez ele fosse desenvolver um pouco o assunto porque, afinal, estávamos juntos há mais de um ano. Ele deveria saber que a relação com a minha mãe era importante para mim, mas entendo. nunca fica muito bem quando os pais estão aqui. — Podemos descer? Não quero que seus pais pensem algo errado de mim.
— Não devia se preocupar com isso, eles te adoram.
Percebo seu suspiro um pouco mais alto, bem como o seu afastamento, mas essa era uma coisa de todos os pais que não podíamos escapar. Nós não podíamos fugir da nossa família, ele sabia disso também, por isso levantou, se vestiu e esperou que eu fizesse o mesmo.
— Bom dia — digo, tentando soar animada. Tentando ignorar a tensão que sei que existe. sentia falta dos pais, mas era inevitável saber o quanto desconfortável ele ficava com eles.
A mãe de olha para cima, um sorriso suave no rosto, mas consigo sentir que é um tanto quanto forçado.
, querida, bom dia. Sente-se, por favor. — Ela então olha para , e o sorriso desaparece. — Bom dia, .
— Bom dia, mãe. — responde, mas não há entusiasmo na sua voz.
Ela volta a atenção para mim, ignorando o filho como se ele não estivesse lá.
— Como você está, querida? Espero que esteja tudo bem no relacionamento de vocês. — Sua voz é doce, mas consigo sentir o subtexto. Ela sempre tenta me colocar contra de forma sutil.
— Estou bem, obrigada. — Sorrio, tentando manter o clima leve.
O pai de entra na sala, novamente ao telefone, e apenas acena com a cabeça na nossa direção antes de se sentar em sua poltrona habitual. Ele nos ignora enquanto continua sua conversa.
cruza os braços, seu desconforto é evidente e me sinto constrangida por ele. Ou, talvez, me sinta constrangida pela minha ineficácia.
— E vocês? Como estão? — Tento puxar assunto, quebrar a tensão que paira no ar.
A mãe de suspira, fechando a revista que estava lendo.
— Estamos bem, querida. Sabe como é, sempre ocupados. — Ela lança um olhar para o marido, que continua alheio à conversa. — Mas felizes por estarmos juntos, pelo menos por enquanto.
não consegue esconder a frustração.
— Claro, felizes. — Ele murmura, mais para si mesmo do que para nós.
, vi seu boletim. É o último ano, você precisa melhorar. Não acredito que ficou com nota vermelha em mais uma matéria. Você realmente precisa começar a levar as coisas mais a sério. Estamos preocupados com o seu futuro.
O pai dele concorda, tento ignorar o fato de que é a primeira vez que ele se dirige ao filho. Não um bom dia, não um você dormiu bem, apenas mais uma crítica. Às vezes eu entendia porque o meu namorado gostava tanto de ficar bêbado em momentos inoportunos.
— Não sabemos como você espera ter sucesso com essa atitude desleixada. Olhe para seu irmão, ele é um exemplo a ser seguido.
fica em silêncio, olhando para o prato à sua frente. Eu sinto a raiva crescendo dentro de mim, mas mantenho a calma.
— Eu estou me esforçando, pai — finalmente responde, a voz tensa. — Só preciso de um pouco mais de tempo.
A mãe dele balança a cabeça para os lados, desaprovando a resposta.
— Tempo é algo que você não pode desperdiçar. Nós investimos muito em você, e esperamos retorno.
A crueldade nas palavras deles me faz querer intervir, mas sei que isso só pioraria as coisas para . Ele aperta minha mão debaixo da mesa e a aperto de volta, tentando passar o conforto silencioso de que eu estava aqui, porque estava.
Eu queria estar.
Mas vejo o quanto as palavras deles estão afetando-o, acho que me identifico, lembro da briga com a minha mãe, sinto uma necessidade absurda de proteger ele porque, de alguma forma, era como eu queria me sentir. Vejo a mágoa em seus olhos, observo o desconforto evidente em sua postura.
— Você está fazendo o seu melhor. — digo suavemente, tentando amenizar a situação.
Ele me olha com um misto de gratidão e frustração.
, por favor. Não hoje.
A mãe de lança um olhar cortante na nossa direção.
— Você tem tudo o que precisa para ser bem-sucedido. O que falta é empenho da sua parte. Se ao menos você fosse mais como o Adrian...
Antes que ela possa continuar, o pai dele interrompe.
— Sua mãe está certa. E francamente, estou cansado de ver você desperdiçar seu potencial. Chega a ser patético.
Essas palavras parecem a gota d'água para . Ele se levanta abruptamente, o barulho da cadeira arrastando no chão ecoa com um ruído alto.
solta um suspiro pesado e encosta-se na cadeira, esfregando o rosto com as mãos. A tensão é palpável e, de repente, ele empurra a cadeira para trás e se levanta bruscamente.
— Não aguento mais isso. — Ele murmura, com a voz carregada de frustração, saindo da sala rapidamente.
Eu fico parada por um momento, observando a cena. O pai dele lança um olhar desaprovador, mas não diz nada. A mãe de volta a ler sua revista como se o incômodo do filho fosse apenas um importuno, alheia à situação. Sem perder tempo, me levanto e vou atrás dele, seguindo-o até a sala de estar.
está de pé, de costas para mim, olhando pela janela. A tensão em seus ombros é evidente. Aproximo-me devagar, querendo dar-lhe espaço, mas ao mesmo tempo querendo confortá-lo.
... — Minha voz é suave, aprendi a lidar com ele com o tempo. Sei que a maneira mais fácil de acalmá-lo é, apenas, sendo terna quando ele está prestes a explodir.
Ele se vira abruptamente, vejo os seus olhos brilhando de raiva e mágoa.
— Por que eles têm que ser assim? Por que não podem me apoiar ao invés de sempre me derrubar?
Eu dou mais um passo na direção dele, estendendo a mão para tocar seu braço.
— Eles são duros, eu sei. Mas você é forte, . Você vai superar isso. E eu estou aqui com você.
Ele passa a mão pelos cabelos, frustrado.
— Às vezes, sinto que nunca vou ser bom o suficiente para eles. Não importa o quanto eu tente, nunca é suficiente. Eles deviam ter parado no Adrian.
Eu o abraço, sentindo a dor dele como se fosse minha. Tento transmitir todo o amor e apoio que posso porque é a única coisa que posso fazer.
— Não fale isso. Você é bom o suficiente, . Eles não veem isso, mas eu vejo. Eu acredito em você.
Ele me aperta contra si, e vejo lágrimas nos seus olhos, algo que ele raramente deixa transparecer. era alguém vulnerável, mas ele não demonstrava isso. Ele sempre odiou demonstrar o quanto a situação toda com o seu irmão o afeta, o quanto seu corpo tenciona quando os pais estão por perto, o quanto a validação é importante pra ele.
Ele não consegue esconder isso de mim, fiquei boa demais em ler ele. Em enxergar ele.
— Eu não me importo. — Sua voz treme, revelando o que ele sempre tenta esconder. É a segunda vez que ele fala que não se importa e é a primeira vez que eu o vejo se importar tanto. Eu o seguro com mais força, sentindo meu coração se partir por ele.
— Eu amo você. — Murmuro, com o tom de voz rouco. Não minto, eu amava esse . Não o que era um idiota com os amigos, não o que parecia um animal nos jogos, esse.
Vulnerável.
Perdido.
Humano.
No entanto, sei que minhas palavras não podem fazer tanto. A mágoa infligida por seus pais é maior e vem de mais tempo, e a presença deles sempre deixa se sentindo indesejado.
Ele afasta-se um pouco, seus olhares vão para os meus e consigo me afogar naqueles olhos azuis, profundos e intensos.
— Eu preciso de você. — Eu sei o que ele quer dizer, e por um momento, hesito. Mas a necessidade em seus olhos é inegável, e eu não consigo falar não.
... — Começo, mas ele me interrompe com um beijo desesperado.
— Por favor, . Só dessa vez. — Sinto seus lábios, sinto suas mãos entrarem dentro da minha blusa, sinto sua língua, sinto sua dor.
Sinto ele.
Até que ele não sinta nada.

Capítulo 10

Carter


— Mãe, se o médico disse que você não pode pegar peso, então você não pode. — Repito, pelo que parece ser a milésima vez. Minha mãe estava com problemas nos ossos, doença de Paget, para ser mais específico. Ela se recusa a aceitar que precisa de ajuda, mesmo quando as dores são evidentes em seu rosto.
Ela revira os olhos, olhando para mim com aquele olhar de "pare de me tratar como doente", mas ela está doente e eu não posso parar de cuidar dela.
— Eu não sou uma inválida, . — Ela responde, tentando esconder a dor ao levantar uma caixa. — Só preciso de um pouco de exercício.
— Exatamente, e esse exercício deve ser leve. — Digo, tirando a caixa das mãos dela e colocando-a de volta no chão. — Caminhar, fazer alongamentos... não levantar coisas pesadas como se você fosse a parente mais próxima do Hulk.
Ela cruza os braços e me lança um olhar teimoso.
— Você se preocupa demais, garoto. Já disse que estou bem.
Suspiro, sabendo que não adianta argumentar quando ela está assim. Minha mãe carregava toda a teimosia do mundo, por isso vim da Califórnia de forma repentina. Se ela soubesse que eu viria, não me deixaria vir. Eu ainda estaria com meu pai, ela ainda estaria
— Só quero que você fique bem, mãe. — Digo, suavizando a voz. — Não quero te ver piorando.
Ela olha para mim, seus olhos suavizam um pouco e o suspiro que ela solta é mais compreensivo do que teimoso.
— Eu sei, querido. Só me preocupo com você também, você já tem muito com que lidar. Voltar pra essa cidade… Eu não queria que você voltasse depois do que aconteceu, por mais que tenha passado por aquilo, ainda sei que é algo que te perturba.
Antes que eu possa responder, meu celular vibra no bolso. É uma mensagem de . Eu olho para o nome na tela por um momento, a hesitação tomando conta de mim. Eu ainda estou me acostumando com esse lugar de novo, mas não fazia ideia que teria que voltar a me acostumar com essas pessoas.
— Quem é? — Minha mãe pergunta, notando minha expressão.
— Um amigo. — Respondo, colocando o celular de volta no bolso antes que ela veja a notificação. — Vou só ver se ele precisa de alguma coisa e já volto.
Ela acena, mas vejo a preocupação em seus olhos.
— Vá, mas não demore. E nada de bebidas.
— Prometo. — Digo, saindo de casa rapidamente.
Enquanto caminho pela rua, pego o celular novamente e leio a mensagem de .

"Ei, quer sair hoje? Precisamos conversar."



Algo no tom da mensagem me faz sentir que é sério. Na verdade, não sei se é o tom da mensagem ou apenas a mensagem. Nós não nos falávamos há muito tempo e desde que houve uma confusão entre a gente, as coisas ficaram ainda mais complicadas.
Chego ao parque alguns minutos depois e vejo sentado em um banco, olhando para o chão. Ele parece estar perdido, mas não consigo lembrar de nenhuma vez em que ele não esteve.
— Ei. — Digo, sentando ao lado dele.
Ele levanta a cabeça e me dá um sorriso cansado.
— E aí, cara. — Ele murmura, claramente abatido. — Desculpe te chamar assim do nada.
— Sem problemas. O que aconteceu?
suspira, passando a mão pelos cabelos.
— Meus pais. Eles estão em cima de mim de novo, falando sobre as notas, meu futuro... É sempre a mesma coisa.
— Não acho que você tenha me chamado aqui pra falar das suas preocupações com a família, .
— Tem razão, não foi isso. Acho que eu queria me desculpar.
Espero que ele continue, não sei muito bem o que esperar. Eu e éramos amigos e, normalmente, íamos juntos a todos os lugares, até que um dia atropelamos alguém.
Tínhamos bebido demais, as coisas ficaram muito rápidas, as brincadeiras ficaram cada vez mais pesadas e, quando vimos, tínhamos um carro amassado, sangue no chão e uma pessoa desmaiada. Eu tinha 14 anos e nunca deveria ter aceitado dirigir, tinha 15 e também não devia sequer ter pegado o carro dos pais, mas nada justifica o que fizemos e menos ainda o que deixamos de fazer.
Fugimos do lugar.
A pessoa não morreu, liguei para todos os hospitais no dia seguinte e inspecionei cada meio de notícia para me assegurar disso, mas não consegui conviver com a culpa. sim. Eu me afastei dele, fui embora e, agora que voltei, esperava que as lembranças não voltassem também.
— Eu sinto muito, . — finalmente diz, consigo sentir uma certa verdade espremida nas palavras, mas não consigo acreditar. Às vezes realmente sentimos muito, mas nem sempre é pelo motivo certo. Se ele sentia muito por mim ou pela nossa amizade, era o motivo errado. Ele devia sentir muito pela vítima. Por quase termos tirado a vida de alguém. — Eu sei que fui um idiota. Não devia ter te colocado naquela situação.
Minha garganta se aperta com a lembrança daquela noite. Lembro do desespero, de como cheguei em casa assustado e fiquei trancado por, pelo menos, uns dois dias, apenas esperando que a polícia viesse me buscar.
— Foi um erro. — Digo, tentando manter a calma. — Mas não podemos mudar o que aconteceu. Só podemos aprender com isso.
balança a cabeça, concordando.
— Eu sei. Só quero que saiba que sinto muito. E que estou tentando ser uma pessoa melhor. Por .
Sinto uma pontada de inveja, mas reprimo o sentimento, não tenho direito algum de me sentir incomodado. merece alguém que a trate bem, que a valorize. E por mais que esteja tentando, às vezes sinto que ele não é suficiente para ela.
— Ela é uma garota incrível. — Concordo, minha voz é mais firme do que meus pensamentos. — Você tem sorte de tê-la.
— Eu sei. — Ele diz, olhando para o chão. — E estou tentando não estragar tudo.
Olhando para ele, vejo a sinceridade em seus olhos. sempre foi um pouco mimado e egocêntrico, mas talvez, só talvez, ele estivesse disposto a aprender com a droga dos erros dele e das consequências que isso trazia para as pessoas.
— Eu acredito em você. — Digo finalmente.
— Sinto falta de sairmos juntos. — Ele admite, mas não sei o que pensar sobre isso. Talvez eu tenha associado muitas coisas do acidente a ele e a nossa amizade, mas tirando esse episódio, acho que fomos amigos. — Qual é. Você precisa de amigos, aquela escola está uma porcaria desde que a nova diretora assumiu.
Ele tinha razão. A nova diretora havia transformado a escola em um ambiente rígido e sufocante, e a falta de liberdade só fazia com que eu sentisse ainda mais falta dos momentos despreocupados que tínhamos antes de tudo dar errado.
— É, você está certo. — Admito, suspirando. — As coisas mudaram muito, e às vezes parece que tudo está desmoronando.
me olha com uma certa compreensão, não era surpresa que ele soubesse o estado da minha mãe, afinal o tratamento que fazíamos era na clínica dos pais dele.
— Não queria que fosse assim, . Sério.
Eu queria acreditar nisso. Queria acreditar que podíamos deixar o passado para trás e reconstruir nossa amizade, mas essa é a coisa que ninguém fala sobre sentimentos ruins. Eles não somem só porque você quer seguir em frente.
— Vamos sair hoje à noite? Como nos velhos tempos.
Penso por um momento, penso nas possibilidades. Talvez um pouco de normalidade fosse exatamente o que precisávamos.
— Vamos.



Continua...



Nota da autora: Sem nota.





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