FFOBS - Segundas Chances, por Vicky Reis


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Última atualização:14/10/2024

                                                       

Prólogo

Outubro de 2012, Corvallis, Oregon

P.O.V.


O som suave do alarme ecoou pelo quarto, e eu me virei, sentindo o corpo mais pesado do que o habitual. já estava de pé, como sempre, se espreguiçando ao lado da cama. Ele se virou e sorriu ao me ver abrir os olhos, e eu retribuí o sorriso.
- Bom dia, amor! - Disse, dando um rápido selinho.
- Bom dia! - Choraminguei, me cobrindo mais com o edredom pesado.
O mês estava terminando, e a temperatura fria lá fora só aumentava conforme o inverno se aproximava.
- Não quero ir para a aula hoje - Comentei, ao vê-lo pegando uma camiseta no armário.
- Você tem que ir, amor. É o nosso último ano e falta pouco para o recesso.
- Eu sei, mas ultimamente me sinto tão… cansada - Disse, finalmente me levantando, pois sabia que tinha razão. Não poderia faltar com frequência nesse último ano.
- Faz assim: vamos para a aula e voltamos para casa na hora do almoço, certo? - Ele disse, sentando-se ao meu lado na cama.
- Certo! - Concordei com a cabeça, antes de lhe dar mais um rápido selinho.
- Eu vou tomar banho agora, você pode fazer o nosso café.
- Posso. - Respondi, lançando-lhe um pequeno sorriso.
seguiu para o banheiro e eu fui para a cozinha.
Escutei o registro do chuveiro sendo ligado assim que coloquei a água para ferver.
Em questão de minutos, já estava passando o café, mas o cheiro que antes tanto me agradava agora estava revirando meu estômago. Senti a ânsia subir pela garganta enquanto corria para o banheiro.
Empurrei a porta do banheiro de uma só vez, me ajoelhei de frente ao vaso e coloquei tudo para fora. , que ainda estava distraído no banho, percebeu minha situação e correu até mim, enrolando a toalha em torno de seu quadril.
- Amor, você está bem? - Perguntou, passando a mão em minhas costas e segurando meu cabelo.
Não consegui responder com palavras, só neguei com um aceno de cabeça antes de vomitar novamente.
se ajoelhou ao meu lado e ajudou a me recompor.
- Você comeu algo que não te fez bem? - Ele perguntou, me olhando.
Limpei a boca com a parte de trás da mão enquanto me encostava na parede gelada do banheiro.
- Eu não sei… talvez, mas estou me sentindo estranha há alguns dias.
- Por que não me disse nada? Poderíamos ter ido ao médico.
- Não precisa, é só um mal-estar, já passa.
colocou uma mão em cada lado do meu rosto, fazendo-me olhar para ele.
- Você tem certeza? Podemos ir ao hospital agora.
- Tenho certeza, sim. Vai ficar tudo bem. Eu só preciso descansar.
- Posso ficar aqui com você, caso precise de algo.
- Não, amor, pode ir para a aula. Eu vou ficar bem. - Sorri.
- Certo, mas eu volto o mais rápido possível, tá?!
- Tá bom.
se levantou e estendeu a mão para que eu pudesse fazer o mesmo. Ele seguiu para o quarto enquanto eu escovava os dentes para tirar o amargo do vômito da boca.
Estava deitada no sofá da sala assistindo “Today”, mas sem prestar muita atenção na entrevista.
- Amor, eu já vou indo. Qualquer coisa você me liga, tá?
- Tá bom, amor. Boa aula. - Disse antes que se abaixasse para me beijar.
Ele saiu, me deixando ali sozinha com meus pensamentos… Eu sabia que algo não estava certo, sabia que algo estava errado com meu corpo.

                                                   {…}

O restante da manhã seguiu sem enjoos fortes, mas a sensação de cansaço ainda estava presente; o sono era persistente. Me pegava cochilando várias vezes.
Olhei no relógio e já estava quase na hora de chegar para o almoço. Na situação em que me encontrava, não daria conta de fazer nada para comermos.
Estava prestes a levantar para ir comprar algo, quando meu celular tocou. Olhei no visor e era .

**Ligação**

- Oi, amor. - Disse ao atender.
- Oi, meu amor. Como você está?
- Melhor… só que ainda cansada.
- Hum, entendo. Bom, estou saindo agora e pensei em passar em algum lugar para comprar algo para o almoço. Queria saber o que você quer.
- Amor, você leu meus pensamentos. Eu estava indo atrás de algo agora mesmo. - Sorri. - Eu vou querer só uma salada com frango grelhado e um suquinho de laranja.
- Okay, daqui a pouco chego aí.
- Obrigada. - Agradeci antes de desligar.
Me forcei a levantar para me trocar e dar uma pequena ajeitada na bagunça do apartamento, já que algumas coisas estavam fora do lugar devido ao meu mal-estar de mais cedo.
Comecei ajeitando a bagunça que tinha feito com o café, depois arrumei a cama que estava desfeita, joguei fora alguns lixos e organizei o banheiro, que estava em pura desordem. Depois tomei um banho rápido, que me ajudou a me livrar um pouco da sensação de cansaço.
Estava no quarto penteando o cabelo quando ouvi a porta da sala ser aberta.
- Amor, cheguei.
- Oi. - Disse, indo até ele, que agora estava colocando as sacolas em cima da bancada da cozinha.
- Como você se sente? Tá melhor? - Ele perguntou, fazendo um leve carinho no meu rosto.
- Digamos que sim… Acabei de tomar um banho que parece ter ajudado.
- Que bom, amor. Vamos almoçar? Eu trouxe o que você pediu.
- Vamos!
Ajudei ele a colocar a mesa para almoçarmos, mas algo chamou minha atenção assim que vi o calendário preso na geladeira.
Nele estavam marcadas várias datas importantes, como as provas que teríamos antes do recesso de Ação de Graças, as datas importantes dos nossos estágios e a data prevista para a minha menstruação… Dia 7 de outubro… Hoje é dia 25 de outubro.

Capítulo 1

                              Outubro de 2012, Corvallis, Oregon.

P.O.V. :


A manhã parecia mais clara do que o normal, como se o mundo estivesse se esforçando para parecer mais otimista do que eu me sentia. As folhas amarelas e laranjas espalhadas pela calçada eram o único sinal de que o outono estava em pleno vigor, mas tudo ao meu redor parecia abafado, como se uma tempestade se aproximasse.
Caminhava a passos mais lentos do que o habitual. O sono da noite mal dormida, o enjoo que envolvia meu estômago e a preocupação estavam me tirando do ritmo frenético em que eu sempre vivi.
- Amor, você consegue caminhar só um pouquinho mais rápido? Nós vamos nos atrasar – disse , olhando para mim enquanto segurava minha mão.
- Amor, eu estou me sentindo mal. Pode ir na frente que eu já chego.
- Você ainda não se sente bem, né? – Ele perguntou, com a expressão de preocupação no rosto.
- É… ainda não. Acho que não coloquei para fora tudo o que me fez mal – tentei disfarçar.
Estava tentando disfarçar o mal-estar contínuo desde a hora em que acordei. Não queria preocupar , muito menos deixar transparecer minhas dúvidas.
Tanto quanto eu estávamos atordoados com problemas envolvendo a faculdade e os estágios. Não precisaríamos de mais uma preocupação no momento.
- Eu vou na frente então. Não posso me atrasar para a primeira aula – disse ele antes de me dar um selinho rápido e seguir em passos acelerados.
Fiquei observando se afastar, seus passos rápidos me lembrando da pressa e das responsabilidades que pareciam nos consumir. Suspirei e continuei caminhando, a sensação de cansaço tornando cada passo um pouco mais pesado. Cada vez que tentava ignorar o enjoo, ele parecia intensificar, como se meu corpo estivesse tentando me dizer algo que eu não queria ouvir.
Enquanto caminhava, observava as lojas tão conhecidas por mim, já que fazia aquele caminho todos os dias há quatro anos. Voltei minha atenção para as pessoas que estavam caminhando e, ao não conseguir mais alcançar com os olhos, atravessei a rua entrando na farmácia.
O corredor estava vazio, e o som dos meus próprios passos ecoava no ambiente. Me peguei olhando involuntariamente para a prateleira de testes de gravidez, e o simples ato de observá-los fez meu estômago revirar. Estava com uma garrafa d'água em uma das mãos e a outra suava enquanto eu a enxugava no jeans. Havia vários tipos e marcas, mas eu só precisava de um. O mais simples e direto possível.
Puxei duas caixas do mais barato e coloquei-as na pequena cesta. Senti um nó na garganta ao olhar para o item, um lembrete cruel do que estava prestes a enfrentar. Estava parada na seção de absorventes, a fim de pegar uma caixa deles para tentar disfarçar ao passar no caixa.
- Bom dia, .
Ouvi alguém falando comigo e, ao me virar, pude ver , uma colega de turma de , me olhando curiosa.
- Bom dia, – disse, jogando uma caixa de absorventes qualquer sobre os testes.
- Tudo bem? Ontem, durante a aula, o estava preocupado com você… e hoje eu te encontro aqui.
- Eu estou bem, . Obrigada por perguntar, mas ontem eu só estava meio abatida por conta da cólica – tentei sorrir, disfarçando.
- Ah, sim, entendo como é… – Ela parecia querer continuar a conversa, mas eu só queria sair dali naquele momento.
- , agora eu preciso mesmo ir, já estou atrasada – disse, olhando para o meu relógio de pulso.
- Certo, também preciso correr. Melhoras, tá?
- Obrigada! – Agradeci, me virando e revirando os olhos.
Nunca gostei de , desde quando comecei a namorar com . Ela sempre quis se fazer presente para ele, dava leves investidas até mesmo na minha frente, sem tentar disfarçar, e eu sei que ela também não gosta de mim.
Quando cheguei ao caixa, a caixa de testes estava escondida sob uma pilha de produtos. A caixa era uma mulher com um sorriso amigável, mas eu mal consegui retribuir o gesto.
- Está tudo bem? – Ela perguntou, notando meu comportamento tenso.
- Sim, só… só uma manhã cansativa – menti, tentando parecer o mais normal possível enquanto pagava pelas compras.
Com a sacola nas mãos, saí apressada. Enquanto caminhava, dessa vez mais rápido, joguei a sacola com as compras dentro da bolsa e segui pelo caminho tão conhecido.
Cheguei à faculdade e havia poucas pessoas entrando em suas salas; as aulas provavelmente já tinham começado há uns 10 minutos. Eu me dirigi para o banheiro mais próximo, buscando um pouco de alívio e privacidade. As paredes brancas e o piso cerâmico refletiam a luz fluorescente, intensificando a sensação de frieza e distanciamento. Respirei fundo e me encostei na pia, tentando me acalmar antes de seguir para a aula. Joguei água no rosto e encarei meu reflexo no espelho. Eu havia envelhecido um mês de ontem para hoje.
Sai do banheiro de cabeça baixa e acabei esbarrando em alguém.
- Descul... – Não terminei de dizer, pois a pessoa levantou meu queixo.
- Amor, você só chegou agora? – A pessoa era .
- Só… – Procurei uma desculpa plausível e lembrei que havia me visto comprando absorventes. – Eu precisei passar na farmácia para comprar absorventes. – Forcei um sorriso que não chegava aos olhos.
- Humm… – Ele murmurou, parecia convencido.
- Agora eu vou indo, já perdi uns 15 minutos. – Disse, já saindo, sem dar tempo dele responder qualquer coisa.                                                       

{…}

As aulas passaram em um borrão. Eu lutava para me concentrar, meu estômago revirando e minha mente ocupada com o mesmo pensamento inquietante: algo não estava certo. A ideia de adiar o teste de gravidez para mais tarde parecia impossível de ignorar, e cada minuto que passava só aumentava a ansiedade.
O sinal estridente tocou quando o relógio marcava 11 horas. Dei graças a Deus mentalmente; já não aguentava mais ter que fingir que estava prestando atenção no que o professor explicava.
Ainda com os enjoos e a ansiedade me dominando, me forcei a seguir até o jardim, onde eu normalmente me encontro com alguns amigos e minha irmã durante o intervalo. Encontrei o pequeno grupo de quatro pessoas sentadas em um banco um pouco afastado. Todos estavam felizes, rindo e conversando sobre um assunto que eu não fazia ideia do que era. Todos estavam leves, sem uma preocupação imediata.
- ! – Marcella, minha irmã, veio me abraçar assim que me aproximei o suficiente para que ela me visse.
- Mar. – Retribuí o abraço.
- Como você está? Você não veio ontem… comentou que você não estava se sentindo bem.
- Agora eu estou melhor… Acho que comi algo que não me caiu bem. – Sorri de canto.
- Hum, comeu algo que não te fez bem ou te comeram? – Doug, o namorado de Marcella, disse rindo.
Eu apenas revirei os olhos e mostrei o dedo do meio enquanto sorria em tom de deboche.
- Bom dia pra você também. – Ele se levantou e me beijou no rosto.
- Bom dia, coisa. – Respondi. – Bom dia, gente. – Disse cumprimentando Alissa e Tose, o outro casal que fazia parte do nosso grupo.
- Bom dia, ! – Os dois responderam juntos.
Sentei na grama, na direção oposta aos pequenos raios de sol que estavam no céu, e tentei prestar atenção na conversa que eles retomaram. A conversa estava animada e eu realmente tentava me manter a par dos assuntos, mas com o pensamento a milhão.
De repente, apareceu no jardim, com um sorriso no rosto ao me ver.
- Ah, olha quem chegou – disse Marcella, acenando para ele.
- Oi, amor!
- Oi, amor. Como foi o dia? – ele perguntou, vindo em minha direção e me dando um beijo suave.
- Mais ou menos – respondi, tentando esconder o nervosismo. – Só estou um pouco cansada.
- Só um pouco? – ele perguntou, olhando para mim com uma expressão curiosa. – Parecia estar mais cansada quando a vi pela manhã.
- Foi uma manhã complicada – eu forcei um sorriso. – Mas nada que eu não possa lidar.
se sentou ao meu lado enquanto cumprimentava os outros e logo começou a participar da conversa, que agora eu já nem sabia mais do que se tratava.
- Gente, eu estava pensando… Que tal irmos almoçar naquele restaurante novo? – Doug sugeriu.
- Qual deles? – Tose perguntou, já que tinham sido abertos dois novos restaurantes aqui perto.
- Aquele que fica na esquina do prédio das meninas. – Doug apontou para Alissa e Marcella.
- Aquele restaurante parece ser maravilhoso! – Alissa disse.
- Sim! Todos os dias eu sinto um cheiro maravilhoso quando passo por ele. – Marcella completou.
- Então vamos?! Eu super animo de ir! – Tose parecia entusiasmado.
- O que você não anima, não é, Tose?! – tirou sarro do irmão um ano mais novo.
- Não é bem assim, .
- Aham, tá bom. – Alissa entrou na onda.
- Mas enfim, eu gostei da ideia, mas não vou poder ir com vocês. – disse, se levantando.
- Por quê, amor?
- Hoje eu tenho uma reunião no estágio e tenho que acompanhar aquela audiência importante.
- Ah, sim. Tinha me esquecido dela.
- Pois é… Já estou até atrasado, não vou conseguir assistir às duas últimas aulas. – disse, olhando para o relógio.
- Então vai logo! – Disse, encorajando-o.
- Vou mesmo. Tchau, gente, tchau, amor. – Ele me beijou novamente antes de sair.
- Acho que nós também deveríamos ir, né? O sinal já vai tocar. – Marcella disse.
Nós cinco caminhamos juntos até a entrada do prédio principal, onde cada um seguiu para suas respectivas salas.                                                       

{…}
As duas últimas aulas se passaram arrastadas, como as aulas anteriores. A vontade de ir pra casa já estava estampada em minha cara. O sinal tocou e eu recolhi minhas coisas com pressa para sair da sala.
Caminhei com pressa e acabei esbarrando em Doug no corredor.
- Vai com tanta pressa assim pra onde, ?
- Pra casa, Doug. Preciso descansar antes do estágio.
- E o nosso almoço? Você não vai?
- Não… Avisa pro pessoal que eu realmente precisei ir pra casa, tá?!
- Tá, eu aviso sim.
- Obrigada.
Segui o caminho de casa com passos rápidos e, em questão de 15 minutos, já estava com as chaves em mãos para abrir a porta.
- ? – O chamei ao entrar e não obtive resposta.
Sabia que ele não estava em casa, mas queria ter certeza. Coloquei minha bolsa no cabideiro ao lado da porta, mas antes tirei a sacola da farmácia de dentro dela. Segui para o quarto e guardei os testes dentro de uma gaveta da cômoda, deixando-os enrolados em algumas meias. Fui para o banheiro e guardei os absorventes para disfarçar antes de tentar comer algo.

{…}

Estava sentada no banco da janela, olhando as gotas de chuva que escorriam por ela. O tempo realmente tinha se fechado, conforme eu tinha previsto mais cedo. O relógio da sala fazia um tic-tac incessante, o barulho me lembrava que o tempo estava passando e eu tinha coisas a serem feitas. Não tinha ido para o estágio hoje; liguei avisando que estava me sentindo mal e eles recomendaram que eu ficasse em casa pelos próximos dias, o que acabei aceitando.
Passei boa parte da tarde tentando ocupar a cabeça com outras coisas, outros pensamentos, mas nada conseguia tirar da mente os objetos que estavam guardados. Olhei no relógio; ainda estava cedo, só voltaria à noite, depois das 20h.                                                      

{…}

Havia uns 10 minutos que eu estava ali, encarando aquela bendita gaveta fechada e com medo de abri-la. Mas algo dentro de mim me dizia que eu não podia mais esperar, então suspirei fundo e fui até ela.
- Eu preciso fazer isso. – Murmurei para mim mesma, como se dizendo as palavras em voz alta pudesse me dar a coragem que me faltava. Respirei fundo e, com as mãos trêmulas, finalmente abri a gaveta. O pequeno objeto branco parecia inofensivo, mas pesava toneladas em minhas mãos.
Com o coração pesado, fui até o banheiro, cada passo ecoando como um martelo na minha mente. Fechei a porta e me apoiei na pia por um momento, olhando meu reflexo no espelho. O rosto que me encarava parecia cansado, os olhos mais fundos do que o normal, a pele pálida.
- Será que você está preparada para qualquer que seja o resultado que venha a seguir? – Perguntei ao meu reflexo, na esperança de que ele pudesse me ajudar.
Tirei o teste da embalagem com cuidado, seguindo as instruções sem pensar muito, como se estivesse em piloto automático. Os segundos se arrastaram enquanto esperava, cada tic-tac do relógio me lembrando da gravidade do que estava prestes a descobrir.
Fiz os dois testes de uma só vez; precisava da confirmação dupla.
Três minutos haviam se passado e finalmente o pequeno visor começou a mudar, fazendo meu coração bater mais rápido. Coloquei os testes na pia, fechei os olhos e respirei fundo. Não queria olhar, mas sabia que não podia fugir para sempre.
Abri os olhos lentamente e olhei para o resultado. Duas linhas. Nos dois testes.
Meu corpo congelou. O ar parecia ser sugado do banheiro, e o silêncio era ensurdecedor. 
"Estou grávida."
Era apenas isso que soava dentro da minha cabeça. As palavras ecoaram na minha mente, e antes que eu pudesse processá-las completamente, senti as lágrimas escorrendo pelo meu rosto. Não sabia se eram de medo, alívio, ou simplesmente pelo impacto da notícia que mudaria tudo.
Ainda paralisada, ouvi a porta da frente se abrir e os passos de se aproximando. Ele entrou no apartamento, chamando meu nome.
- ! – A voz dele soou do outro lado da porta do banheiro, carregada de preocupação.
- Amor, estou aqui. Vou entrar no banho agora. – Inventei uma desculpa; não queria que ele me visse assim e nem queria contar isso agora.
- Tudo bem, eu só vim em casa buscar uns documentos e já estou indo para o escritório. – Ele disse do outro lado da porta.
- Tá bom. Bom trabalho.
- Obrigado. Eu compro algo pra gente comer quando estiver voltando.
- Ah sim, obrigada.
- Por nada, tchau.
- Tchau.
Escutei a porta sendo fechada e pude respirar mais aliviada, deixando as lágrimas voltarem a escorrer
Antes de sair do banheiro, juntei as embalagens e os testes, limpei a bagunça e escondi qualquer vestígio. Senti um peso no peito, sabendo que, apesar de precisar contar a verdade para , precisava de tempo para processar toda essa informação e encontrar o momento certo para revelar a notícia.
Com o coração ainda acelerado e a mente turva, saí do banheiro e me sentei no sofá. Olhei para o vazio, tentando organizar meus pensamentos e encontrar uma maneira de lidar com a situação. A noite seria longa, mas estava decidida a enfrentar essa nova fase da minha vida com coragem, mesmo que isso significasse enfrentar desafios inesperados, principalmente, essa gravidez.


                                     

Capítulo 2

Outubro de 2012, Corvallis, Oregon.


P.O.V :


O alarme do celular tocou às sete em ponto, rompendo o suave silêncio da manhã. Abri os olhos lentamente, tentando ajustar minha mente à realidade. Ao meu lado, ainda dormia, o rosto sereno, alheio ao turbilhão que girava dentro de mim. Já fazia três dias que eu me programava para acordar antes dele, tentando disfarçar toda a minha inquietude. Três dias desde que havia recebido o positivo.
Desliguei o alarme e, antes de me levantar, olhei mais uma vez para . Seu rosto permanecia relaxado em um sono tranquilo. Seus cabelos estavam desarrumados, e o leve ronco que emitia era quase reconfortante. Um sorriso discreto brotou em meus lábios ao vê-lo assim. Tentei me levantar sem fazer barulho, movendo-me com delicadeza para não acordá-lo.
Caminhei em direção ao banheiro, sentindo o frio do piso matinal contrastar com o calor dos lençóis ainda quentes. O vapor começou a subir assim que liguei o chuveiro, envolvendo o ambiente em uma névoa acolhedora. Passei a mão no espelho para enxergar meu reflexo. Meu cabelo estava despenteado, e as olheiras, mais marcadas do que o habitual, entregavam as noites mal dormidas. Suspirei enquanto prendia o cabelo em um coque, evitando molhá-lo ao entrar debaixo do chuveiro, buscando aliviar a tensão.
O som da água quente caindo sobre meu corpo e o aroma do sabonete me proporcionavam um ambiente tranquilo, quase meditativo — tão relaxante que me fazia esquecer tudo o que estava por vir naquele dia.
Mas como nem tudo se resolve tão facilmente, precisei sair do transe após quinze minutos.
Saí do banheiro enrolada na toalha, já com uma leve maquiagem no rosto, tentando disfarçar o cansaço acumulado que o banho não conseguiu levar embora.
Cheguei no quarto e já estava acordado, mas ainda deitado.
- Bom dia, amor.-  Ele disse com a voz ainda rouca de sono, estendendo os braços para que eu me juntasse a ele.
- Bom dia!-  Forcei um sorriso enquanto me aconchegava em seus braços.
- Acordou cedo de novo.-  Ele disse, beijando meu pescoço.
- Estava me atrasando demais esses últimos dias.-  Inventei uma desculpa que não deixava de ser verdade.
- É... Você tem razão.-  Ele sorriu.  - Mas eu queria ficar mais um pouquinho aqui com você.
Era tudo o que eu mais queria naquele momento. Queria me aconchegar ainda mais nos braços dele e esquecer, nem que fosse por um instante, todo o peso que eu estava carregando.
- Eu também, amor... Mas já está ficando tarde.-  Disse, me levantando, mas me puxou pelo braço e selou nossos lábios.
- Pronto, agora posso começar o dia!-  Ele sorriu antes de jogar a coberta para o lado e se levantar.
- Vou me trocar e fazer nosso café enquanto você se arruma, tá? - Tudo bem, amor.
foi para o banheiro enquanto eu pegava algumas peças de roupa. Olhei para a última gaveta do armário, rezando para que ele não a abrisse para pegar nada.  Não queria correr o risco de ele descobrir antes do que eu esperava.
Assim que entrou no banheiro, senti meu corpo relaxar um pouco. Aquela troca de carinho entre nós me trouxe uma sensação agridoce. Era conforto, mas também um lembrete do quanto eu ainda estava adiando essa conversa. Três dias. Três dias em que, a cada vez que ele me abraçava, eu me sentia dividida entre o medo e a alegria. Entre a certeza de que estávamos prestes a dar um salto gigantesco em nossas vidas e o receio de que ele não estivesse pronto para recebê-lo.
Vesti-me rapidamente, escolhendo um suéter confortável e jeans. Mas minha mente estava longe da simplicidade da roupa. A cada movimento, a cada pequeno gesto, sentia um peso invisível crescer sobre meus ombros Como seria quando eu finalmente dissesse a ele? Como ele reagiria?
Peguei a caixa de chá que estava na prateleira da cozinha, tentando focar em qualquer coisa prática. Minhas mãos ainda estavam trêmulas quando coloquei a chaleira no fogão.
"Respira, ," pensei.
"Só mais um dia. Ou talvez dois." Queria esperar o momento certo, mas ele parecia nunca chegar.
O som da porta do banheiro se abrindo me tirou dos pensamentos. apareceu na cozinha, ainda com o cabelo úmido e uma expressão tranquila. Ele veio até mim, beijou minha testa e sorriu daquele jeito despreocupado.
Tão fácil para ele, enquanto eu me sentia um caos por dentro.
- O cheiro está ótimo!-  Ele disse, pegando uma caneca no armário e se servindo.
Eu não disse nada, apenas lancei um pequeno sorriso.
-  Amor, está tudo bem? -  largou a caneca no balcão e segurou minhas mãos.
- Está sim, amor... Só estou cansada. Sobrecarregada com tudo.- Tentei disfarçar as lágrimas que começavam a se formar nos cantos dos meus olhos.
- Oh, meu amor, vem cá.- Ele me puxou para um abraço e beijou minha cabeça.
Eu me sentia tão segura ali. A vontade que eu tinha naquele momento era de soltar tudo o que estava guardado nesses últimos dias. Aquele peso estava me matando.
- ...-  Me afastei do seu abraço para olhar em seus olhos. Não queria mais esperar. -  Eu...
Estava prestes a falar, mas o barulho do celular dele tocando quebrou toda a minha coragem.
- Preciso atender.-  Ele disse, olhando para o número no visor.
se afastou, me deixando sozinha na cozinha. Enxuguei as lágrimas teimosas e respirei fundo.
"Melhor assim, você ainda não está pronta!" pensei enquanto me servia com chá de hortelã.
Tentei me concentrar no aroma do chá enquanto falava ao telefone no corredor. A conversa parecia breve, mas a interrupção foi suficiente para me tirar do momento. Mexi lentamente a xícara, observando as pequenas ondas formadas pelo movimento da colher, como se isso fosse capaz de organizar o caos dentro de mim.
Quando voltou à cozinha, ele parecia tranquilo, mas seus olhos analisavam cada detalhe do meu rosto. Eu sabia que ele sentia que algo estava fora do lugar, mas eu ainda não tinha forças para falar sobre isso.
- Desculpa, era algo rápido do estágio- disse ele, pegando a caneca que havia deixado no balcão. -Você estava dizendo algo antes de o telefone tocar...?
Balancei a cabeça, tentando parecer despreocupada.
- Nem lembro... Provavelmente algo sem importância.- Forcei um sorriso de lado enquanto dava um pequeno gole no líquido quente.
- Bom, quando lembrar, me fala.-  Ele se serviu de algumas torradas.
Tomamos o café rapidamente, porque, mesmo acordando cedo, conseguíamos nos atrasar.
- Acho melhor irmos de carro hoje.- Falei, olhando para o céu enquanto fechava a porta do apartamento.
Nosso apartamento ficava em um prédio aberto, com vários apartamentos universitários ao redor.
- Será que vai chover? - Provavelmente.
- Vou pegar as chaves e um outro casaco. Você quer? - Só mais uma jaqueta.
- Tá.
entrou novamente enquanto eu o esperava do lado de fora. Olhei para o céu nublado, a típica cor acinzentada de Oregon prometendo chuva a qualquer momento. Apertei a alça da minha mochila, pensando na quantidade de coisas que ainda precisávamos resolver naquela semana. As aulas, o estágio de , o meu estágio, as leituras que eu ainda não tinha começado... Tudo se acumulava de maneira sufocante, mas a rotina não deixava espaço para pensar em outra coisa, ou pelo menos, era isso que deveria acontecer.
voltou em poucos minutos, com as chaves na mão e um casaco extra pendurado no braço.
- Aqui está sua jaqueta - ele disse, me entregando enquanto fechava a porta.-  Vamos nessa?
Vesti a jaqueta rapidamente e seguimos até o carro. O vento estava ficando mais forte, o que confirmava minha suspeita de que a chuva viria logo. Assim que entramos, ligou o carro e o CD que estava no som começou a tocar.
Aquele CD era o nosso CD.
Tínhamos gravado anos antes, antes mesmo de darmos o primeiro beijo. A música que tocava naquele momento era "Wherever You Will Go". Olhei para , que já estava cantando animado, o que me arrancou uma risada anasalada. Vê-lo feliz e distante de tudo o que estava acontecendo era um alívio. Um alívio que eu também queria sentir.
Estávamos quase chegando quando percebi que estava pegando um caminho diferente do habitual.
- Ainda temos que passar na biblioteca, né? - perguntei, ajeitando o cinto que incomodava meu abdome.
- Sim, e preciso devolver um livro antes que a multa fique maior - ele respondeu, sorrindo de lado.
- Você e suas multas por atraso. - Balancei a cabeça, rindo.
Aquele caminho era o mais movimentado nesse horário, com vários alunos a caminho de suas primeiras aulas do dia. Eu observava os rostos apressados, as mochilas pesadas, e sentia que fazíamos parte de uma rotina incessante, onde os dias se misturavam.
estacionou o carro no pequeno espaço que encontramos e saímos rapidamente, apressados para chegar antes que a aula começasse. O campus já estava cheio, com grupos de alunos caminhando de um lado para o outro, a maioria com os olhos fixos em celulares ou livros.
A gente se encontra depois da aula? - perguntei, tentando organizar mentalmente o resto do dia.
Sim, te vejo no intervalo - ele respondeu, dando-me um beijo rápido antes de se afastar em direção ao prédio onde teria aula.
Tchau. - Sussurrei enquanto ele corria para não se atrasar.
sempre foi perfeccionista em tudo. Nunca se atrasava para nada e jamais perdia uma aula. Seu foco nos estudos e na carreira era algo de se admirar. Ele era o filho que toda mãe teria orgulho de ter.
Enquanto se afastava, eu fiquei ali por um momento, deixando o vento frio, que anunciava a chegada da chuva, me envolver. O som de vozes ao redor me trouxe de volta à realidade, e eu segui em direção ao meu prédio.
A sala já estava cheia quando entrei. Encontrei um lugar perto da janela, sentei e organizei meus livros sobre a mesa. O professor chegou logo em seguida, iniciando a aula com sua voz firme, discutindo os temas da leitura obrigatória. Abri o caderno e comecei a tomar notas, focando no conteúdo.
Depois de falar sobre a extensa lista de leituras, o professor iniciou outro tópico. No entanto, era difícil me concentrar. Ele falava sobre um estudo de caso importante, e enquanto eu tentava anotar suas palavras, minha mente divagava para o momento em que teria que contar a verdade a . O "quando" e o "como" pareciam impossíveis de decidir. A aula passou como um borrão.
Quando o sinal tocou, indicando o fim da aula, olhei para o relógio e percebi que estava na hora do intervalo. Peguei minhas coisas e fui para o refeitório, onde já deveria estar com os outros.
Ao entrar, meus olhos o encontraram imediatamente. Ele estava sentado numa mesa perto da janela, sorrindo e gesticulando animadamente. Era reconfortante, como se tudo estivesse normal, mesmo que eu soubesse que minha vida estava prestes a mudar de uma forma que ninguém imaginava.
- Ei, amor! - Ele disse antes de selar nossos lábios rapidamente assim que me aproximei. Seus braços envolveram minha cintura de maneira protetora, e por um momento me senti mais leve.
- Olha quem apareceu! - Marcela disse, sorrindo divertida enquanto ajeitava a jaqueta no colo e segurava um sanduíche. - Achei que ia se perder em algum livro por aí.
- Não hoje, pelo menos – respondi, rindo. - Estava na sala de seminários. E você? Como está indo o seu dia?
Marcela suspirou dramaticamente, rolando os olhos.
- Ah, você sabe... só mais leituras. Estou correndo contra o relógio para entregar um trabalho.
- Nem me fala - resmungou Tose, que estava ao lado de , jogando o resto do sanduíche na bandeja. - Estou quase desistindo de engenharia, mas, pelo menos, o fim de semana está chegando.
- Nem pensa em desistir, Tose. Você sabe o que a mamãe faria com você! - disse , rindo e dando um leve tapa na nuca do irmão.
- É o que está me mantendo na faculdade - Tose fingiu chorar.
- E você, Doug? Tá tão quieto. Deve estar doente. - Olhei para o namorado da minha irmã. Ele estava distante, fixo em algum ponto.
- Estou com medo! - Ele disse, sem nem me olhar.
- Medo de quê? - Marcela o encarou, franzindo a testa.
- Dos seminários antes do recesso. - Ele fingiu chorar de novo.
-  Talvez se você não deixasse tudo para a última hora... - Aly se pronunciou. Doug e Aly faziam o mesmo curso e sempre formavam dupla para trabalhos e provas. Todos sabiam que Aly era quem mantinha as datas em dia.
- Não é bem assim! - Ele tentou se defender.
- Amor, nem adianta... Nós te conhecemos - Marcela brincou, fazendo carinho no rosto dele.
- Droga! - Doug murmurou, arrancando risadas de todos.
Continuamos a conversar sobre assuntos aleatórios, fazendo piadas, especialmente às custas de Doug. Estava tudo tranquilo até que Marcela parou e me encarou por um instante.
- , você não vai comer nada? - perguntou ela, com uma expressão preocupada, enquanto pegava um pedaço de fruta de sua bandeja.
A pergunta me pegou de surpresa. Estava tão focada em tentar parecer normal que nem percebi que não havia tocado na comida.
- Ah, não - respondi rapidamente, tentando sorrir de forma convincente. - Não estou com fome.
- Não parece, - disse Aly, com um olhar atento. - Você está pálida e mal tocou na comida. Está tudo bem?
- Sim, está tudo bem! - Forcei mais um sorriso, mas me olhou com suspeita.
- Ela não vem se alimentando direito há dias - ele comentou.
- Não é isso! - Comecei a me defender, mas Marcela me olhou ainda mais preocupada.
- ... - Sabia o que ela estava pensando, então tratei logo de despreocupar todos.
- Só não estou me sentindo bem, mas em alguns dias eu vou estar melhor.
- Tem certeza de que é só isso? Você sabe... - Não deixei que ela continuasse.
- Sim, Mar, é só isso! Eu entendia a preocupação genuína de Marcela, mas não queria tocar naquele assunto. Minha falta de apetite não tinha nada a ver com os problemas alimentares que tive no passado.
Dei graças a Deus quando o sinal tocou novamente, indicando que as próximas aulas começariam em breve. Eu não estava nem um pouco a fim de assistir a mais uma aula de fisioterapia esportiva, mas a vontade de enfrentar aquela conversa era ainda menor.
— Bom, eu vou indo. Preciso passar na biblioteca antes de ir para a sala de aula — disse ao me levantar.
— Quer que eu vá com você? — se ofereceu.
— Não precisa, obrigada — respondi, dando-lhe um beijo rápido. — Tchau, gente. — Me despedi antes de sair apressadamente.
Com passos rápidos, fui direto para a biblioteca, onde precisava pegar alguns livros que estavam reservados para meu próximo trabalho. O ambiente tranquilo ali dentro era um contraste bem-vindo com a correria lá fora, e eu me permiti alguns segundos para respirar fundo enquanto caminhava até a seção de que precisava.
Peguei os livros com cuidado, conferindo as anotações que tinha feito no celular sobre os capítulos que precisava revisar.
Carregando três volumes pesados nos braços, fui até uma das mesas próximas e sentei-me. Meu tempo estava curto, então não podia perder um minuto. Abri o primeiro livro e comecei a anotar os pontos principais, com o som suave de folhas sendo viradas e o ocasional clique de teclados ao meu redor.
O segundo sinal tocou, indicando que os professores já iriam começar as explicações. Minha vontade era de ficar ali na biblioteca, debruçada sobre os livros de neuro, mas todas as horas de aula eram indispensáveis naquele último ano. Peguei os livros novamente, segui para o balcão a fim de oficializar o empréstimo e depois fui para a sala de aula.
No caminho, senti meu celular vibrando no bolso de trás do meu jeans. Peguei-o com dificuldade, mas consegui ler a mensagem de :
"Está tudo bem mesmo? Não queria te pressionar, só estou preocupado. Te amo."
Suspirei ao ler as palavras. Eu sabia que ele estava certo, mas lidar com a preocupação de todos só aumentava minha própria ansiedade. Digitei uma resposta breve, prometendo que falaria com ele mais tarde. Talvez fosse melhor contar logo, acabar com esse peso. Mas não agora. Não naquele corredor lotado de estudantes. Continuei meu caminho, mas acabei esbarrando em Marcela, que estava saindo da sala da coordenação de seu curso.
- - ela disse, se aproximando de mim.
- Oi, Mar.
- Você sabe que não precisa fingir e nem esconder nada da gente, né?
Olhei para ela, surpresa pelo tom direto, mas ao mesmo tempo, agradecida.
-  Eu sei, Mar. Só preciso de um tempo para organizar as coisas... Na minha cabeça- respondi baixinho, sem muita convicção, com algumas lágrimas se formando em meus olhos. Malditos hormônios.
- Se precisar de ajuda, eu e todos estamos aqui.
Algo dentro de mim gritava para eu me abrir com alguém, dividir aquela notícia, pedir ajuda para lidar com a situação, mas eu não podia fazer isso ali.
- Obrigada, mana- forcei um sorriso. - Agora preciso ir, já perdi uns 20 minutos de aula.
- Vai lá, então.
- Tchau.
- Tchau.
Segui para minha sala e, como já era esperado, o professor estava bem adiantado com a matéria, e os únicos lugares disponíveis eram ao fundo. Sentei-me em um dos lugares vagos e tentei prestar atenção no conteúdo que estava sendo explicado, mas meus pensamentos continuavam a mil, como nos últimos dias.

                                                      {…}

Depois da última aula, encontrei me esperando do lado de fora da sala. Ele estava lá para irmos embora juntos.
- Vamos?-  Ele disse, estendendo a mão.
- Vamos-  respondi, entrelaçando nossos dedos.  - Amor, você tem planos para mais tarde?-  perguntei antes de entrarmos no carro.
- Bom, hoje não tem estágio, então só vou estudar as matérias acumuladas. Por quê?
- Por nada, só queria... sei lá, fazer algo diferente depois que eu chegar.
- Podemos, sim- ele disse, me dando um pequeno beijo antes de começar a dirigir.
O caminho até em casa foi rápido e tranquilo. Naquele horário, muitos alunos já tinham ido embora, e outros ainda almoçavam no refeitório.
- Eu vou preparar algo para o nosso almoço, tá?-  disse assim que entramos em casa.-  Assim você descansa um pouco antes de ir.
- Muito obrigada, amor-  agradeci com um beijo.
- De nada -  ele sorriu antes de eu seguir para o quarto.
Deitei-me e, antes de fechar os olhos, programei o despertador para tocar em uma hora. Tempo suficiente para um cochilo reparador.

                                                 {...}

A casa estava silenciosa quando acordei. O som vindo da cozinha havia cessado, indicando que já tinha terminado de preparar o almoço. Fui ao banheiro, sentindo uma onda de enjoo novamente.
- Meu Deus, quando isso vai passar?-  murmurei, encarando meu reflexo, quase idêntico ao que havia visto mais cedo.
Lutei contra a ânsia de vômito, e dessa vez consegui vencer. Tomei um banho mais frio do que o normal; meu corpo estava implorando por algo diferente, e essa era a única coisa ao meu alcance no momento.
Depois do banho, prendi o cabelo em um rabo de cavalo alto e passei um pouco de maquiagem no rosto. Enrolada na toalha, saí do banheiro. Estava apenas de calcinha e sutiã quando entrou no quarto, então rapidamente vesti a parte de cima do meu scrub. Minha barriga ainda não mostrava sinais visíveis, mas só o fato de saber que havia uma vida crescendo ali me assustava. Eu temia que alguém notasse algo.
- Amor, esqueci de te avisar-  disse, levantando os olhos do celular. Agradeci mentalmente por ele não ter reparado minha pressa em me vestir.
- Avisar o quê?- perguntei enquanto colocava a calça.
- Mais tarde vou fazer um trabalho em grupo com a . A gente combinou de se encontrar na biblioteca por volta das seis.
- Às seis? Não dava pra ser mais cedo?
- Não, ela tem uma audiência importante no estágio hoje.
- Ah, tudo bem então-  respondi, com a tristeza evidente na minha voz.
A conversa que eu tanto estava evitando, e para a qual finalmente tinha tomado coragem, teria que esperar.
- Você ficou chateada?-  Ele segurou meu rosto pelo queixo.
- Não!- balancei a cabeça.
- Certeza?
- Sim!-  respondi novamente, me afastando para terminar de me arrumar. , percebendo meu incômodo, saiu do quarto sem dizer mais nada. No fundo, ele sabia que eu estava chateada.
Passei um perfume suave, peguei minha bolsa e meu celular antes de sair do quarto. Fui até a cozinha para pegar minha garrafa de água e calcei meus tênis que estavam próximos à porta.
- Você não vai almoçar?-  perguntou, ao me ver calçando o primeiro tênis.
- Não, estou atrasada- respondi sem olhá-lo.
- Mas ainda são 13h40. Você só entra às 14h45!
- Preciso resolver umas pendências antes-  o que não deixava de ser verdade, já que eu precisava fazer o exame de sangue.
- Certo!- Agora era ele quem parecia chateado. - Tchau, meu amor.
- Tchau, -  disse antes de pegar as chaves do carro no aparador ao lado da porta.
Assim que entrei no carro, uma onda de ansiedade tomou conta de mim. A ideia de que a conversa que eu tanto temia estava se aproximando me deixava inquieta. A gravidez era uma verdade inegável, e quanto mais tempo eu demorasse para contar a , mais complicada a situação ficaria.
Dirigi até o laboratório, tentando focar na estrada. Cada sinal vermelho parecia durar uma eternidade, enquanto meus pensamentos giravam em torno de e . O que aconteceria se ele se interessasse mais por ela? A ideia me perturbava, e eu sacudi a cabeça, tentando afastar esses pensamentos negativos. Eu estava sendo ridícula; os hormônios já estavam afetando minha cabeça!
Ao chegar ao laboratório, a tensão aumentou. Entrei na sala de espera e observei as pessoas ao meu redor, tentando me distrair no celular. Quando meu nome foi chamado, senti um frio na barriga. O exame foi rápido, mas minha mente estava a mil. Cada movimento da enfermeira parecia prolongar a espera pelo resultado, e a confirmação do que eu já sabia pesava sobre mim.
Saí do laboratório com uma mistura de alívio e apreensão. Precisava me distrair, então fui até uma cafeteria. O aroma de café fresco preenchia o ar, mas eu não tinha apetite. Pedi um chá gelado e me sentei, observando o movimento lá fora, tentando encontrar alguma normalidade em meio ao caos que sentia por dentro.
Depois de mais alguns minutos perdida em pensamentos, percebi que já estava me atrasando. Levantei e apressei o passo, aproveitando os minutos que ainda me restavam.
Quando cheguei ao hospital e estacionei, respirei fundo, tentando afastar a ansiedade. O cheiro de desinfetante e a agitação dos corredores eram familiares, mas hoje tudo parecia mais intenso. Assim que entrei na recepção, cumprimentei meus colegas, mas a conversa leve ao redor não aliviava o peso no meu peito.
Comecei minhas atividades e, assim, consegui me sentir um pouco mais leve. Eu amava o que fazia, e isso era capaz de tirar, mesmo que momentaneamente, o peso que estava me sobrecarregando. O dia estava tranquilo, mesmo que o estágio de hoje não fosse em uma área que eu realmente pretendia seguir.
Durante um dos atendimentos, uma paciente mais velha começou a compartilhar histórias sobre seus netos. Enquanto ela falava sobre as alegrias da maternidade, eu sentia uma mistura de emoção e medo. Era como se suas palavras refletissem meus próprios anseios, mas eu ainda estava presa na dúvida sobre o que realmente queria.
Depois de um dia exaustivo, finalmente cheguei ao final do meu turno. A sensação de alívio misturava-se com a ansiedade que ainda me acompanhava. Antes de sair, passei pela sala de descanso e vi alguns dos meus colegas conversando animadamente. O ambiente, normalmente reconfortante, agora parecia sufocante. Era como se eu estivesse presa em um lugar onde ninguém entendia a luta interna que eu enfrentava.
Quando finalmente saí do hospital e entrei no carro, a realidade do que estava por vir começou a me atingir. Dirigi devagar, pensando em como faria aquela conversa acontecer. A cada quarteirão que passava, a urgência aumentava. Era hora de enfrentar a verdade, não apenas para mim, mas também para . Com esse pensamento, as emoções começaram a transbordar.
Ao entrar em casa, fui recebida pelo silêncio absoluto. As luzes estavam apagadas, e a única iluminação vinha da luz fraca da rua, que atravessava as cortinas da sala. Soltei um suspiro, como se o peso do dia finalmente estivesse me alcançando. Fechei a porta atrás de mim e chamei pelo nome de , já sabendo que ele não estava ali.
- ?- O chamei mesmo sabendo que não obteria respostas.
 Coloquei minha bolsa no sofá e olhei ao redor, tentando me reconectar com a ideia de que em breve ele estaria de volta. A cozinha estava arrumada, provavelmente ele havia limpado antes de sair para a biblioteca. Olhei para o relógio: 18h15. Ainda faltava algum tempo até que ele voltasse.
Deixei meu corpo cair no sofá, sentindo o cansaço finalmente pesar sobre mim. Minha cabeça rodava com todos os pensamentos que eu tinha evitado ao longo do dia. A gravidez, a conversa que eu precisava ter, o medo do desconhecido. O sofá, normalmente tão confortável, parecia sufocante agora, como se me puxasse para a realidade que eu estava lutando para evitar.
Fechei os olhos por um momento, ouvindo apenas minha própria respiração. "Eu preciso contar a ele." A frase ecoava na minha cabeça como uma batida constante. Meu coração acelerava só de pensar em como ele reagiria. era carinhoso e compreensivo, mas isso era diferente. Era algo que mudaria tudo.
Abri os olhos e me forcei a levantar. Caminhei até a cozinha, tentando me distrair. Peguei um copo d'água e bebi devagar, deixando o líquido frio acalmar minha garganta. Talvez eu pudesse organizar meus pensamentos antes de chegar. Talvez, se eu ensaiasse a conversa, ela não pareceria tão assustadora. Mas, por mais que eu tentasse, a ansiedade não cedia.
Fui até o quarto e comecei a trocar de roupa, tirando o uniforme do hospital e colocando algo mais confortável. Enquanto me olhava no espelho, não pude deixar de observar minha barriga. Ainda parecia a mesma de sempre, mas o que ela escondia era enorme, maior do que qualquer outra coisa que já vivi.
Eu precisava estar pronta para o que viria a seguir.
Sentei-me na beira da cama, sentindo o nervosismo tomar conta de mim mais uma vez. Peguei meu celular e, sem pensar muito, enviei uma mensagem para :
“A gente precisa conversar quando você chegar. É importante.”



Continua...



Nota da autora: nomes estão em uso, como: Marcella (Mar), Douglas (Doug), Tose, Alissa (Aly), Eleanor, Evelyn e John.

Nota da scripter: ANSIOSA PARA PEGAR RANÇO DO REGÉ!!!!!

Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.