Capítulo 1
A minha vida é um aeroporto por mês e uma governanta em vez de uma escola. Até hoje eu morava no Brasil. Agora estou me despachando para Madri com minha mãe e daqui a dois meses – quem sabe – para Los Angeles. Ri com esse pensamento, embora nada disso fosse interessante pra mim. A minha mãe viaja muito e eu a acompanho, até porque não tenho escolha. Nunca conheci o meu pai. Penso que minha vida poderia ser até mais fixa se o tivesse conhecido. Ou não. Não sei muita coisa sobre ele.
O painel com a lista dos próximos voos mudou de tela. “Voo 324 com destino à Madri. Embarque imediato. Portão 28”. Geralmente, eu não fico tão atenta ao painel, mas hoje a espera estava tão chata que foi impossível não olhar cada vez que ele piscava e soava aquele toque de notificação que eu já não aguentava.
Peguei o meu suco – eu estava em um restaurante dentro do aeroporto – e fui até a minha mãe.
— Vamos, .
Tentei evitar o máximo que pude revirar os olhos para a mamãe. Ela já não é a mesma desde que recebeu uma visita misteriosa. Não fica mais comigo, não pergunta como estou, só sabe ficar trancada no escritório trabalhando ou ficar com aquele ridículo que ela chama de namorado.
— O que você estava fazendo? — perguntou pegando sua mala de mão.
— Fui buscar um suco. Não se preocupe, paguei no débito com o seu cartão. Sabe como é né? Daqui a uns anos, quem sabe, já terei provado dos sucos de todos os aeroportos do mundo — ironizei. — Está com medo que eu fuja, mãe? — peguei a minha mala e coloquei a minha mochila nas costas.
— Não. Que se apaixone. – ergo a sobrancelha. — Que se apaixone pelo lugar. Madri é uma cidade muito bonita. Tenho a impressão que você acha que vai se divertir lá.
— Ah, eu tenho certeza que vou me divertir muito do quarto pra sala, da sala pra cozinha, da cozinha pra sala de jantar e da sala de jantar para o banheiro. Depois, posso até fazer o caminho inverso para não ficar tão monótono. Chama isso de diversão? — Não esperei ela me responder. Saí puxando a minha mala em direção a fila do portão.
Já era noite quando chegamos. Lorenzo, o mordomo da minha mãe, nos esperava no saguão do aeroporto. Assim que nos viu, abriu um sorriso enorme e se ofereceu pra levar o carrinho com nossas malas. Nós o acompanhamos até o carro.
— A propósito, sejam bem-vindas de volta, senhoritas. — disse, abrindo a porta do nosso carro.
— Assim espero. — murmurei, procurando o meu fone e conectando-o no meu celular.
— ! — minha mãe me chamou, com tom de repreensão, fazendo-me tirar os fones. — Já falei que não quero que você escute esse tipo de música!
Vai começar as ladainhas da minha mãe. Quando ela era mais jovem – não que eu esteja chamando-a de velha –, seu pai não a deixava cantar, então nunca conseguiu realizar seu sonho de ser uma grande cantora. Essa frustração recaiu sobre mim. Sou proibida de escutar e cantar qualquer tipo de música, menos a clássica, é claro.
— Mãe — respiro fundo — Não é porque o vovô não te deixou seguir o seu sonho que a senhora pode me proibir de escutar qualquer coisa que te lembre disso — enfatizei a palavra senhora, sabendo que ela odiava ser chamada assim.
— Você é uma insensível — ouvi-a falar. Tudo o que fiz foi virar a cara.
Quando chegamos a casa, fui recebida pelos carinhos enormes de Olga, a empregada que cuidou de mim quando era pequena.
— Minha pequenina — abraçou-me fortemente. — Que saudades eu estava de você!
— Olga… Não… Estou… Conseguindo… Respirar… – ela me soltou, fazendo todos que estavam na sala, inclusive a minha mãe, rirem. — Mas eu também estava morrendo de saudades de vocês — dou um abraço de lado nela e no Lorenzo.
No dia seguinte, acordei com a minha mãe acariciando seu rosto. A forte luz do Sol já a essa hora provocava um efeito brilhante em seus cabelos claros. Parecia até um sonho de tanta luminosidade que havia. Meus olhos ainda estavam sonolentos e fechavam vez ou outra.
— , sei que não estamos tão próximas assim. Me dói muito ver o quanto nos afastamos, mas prometo que é para o seu bem. — suspirou fundo. — Quando acabar toda essa tortura que seu pai está criando, prometo que vamos voltar a ser como antes. Te amo. Feliz aniversário. — beijou a minha testa e saiu do quarto em seguida.
Passei um tempo tentando entender o que tinha acontecido. Quando fiquei mais esperta, de fato, que me levantei e fiz a minha higiene matinal tudo aquilo parecia ter sido coisa da minha cabeça. Ela não esteve no meu quarto. Ela não falou do meu pai. Nunca tinha falado antes. Por que agora?
— , se arrume. Lorenzo irá te levar para o seu primeiro dia de aula. — arregalo os olhos assim que chego na cozinha.
Ok, essa mulher enlouqueceu. Primeiro dia de aula? Ela está querendo dizer que depois de tantos anos eu vou para uma escola? E o que se veste pra ir à escola? Pensava que os alunos já entravam na escola de uniforme e eu não tenho um.
— Não faça essa cara — resmungou. — Vá logo se arrumar. A Olga vai te ajudar. Não quero que chegue atrasada.
Resolvi logo tomar um banho. Quando saí do banheiro, Olga tinha separado duas roupas e deixado em cima da cama. Junto a elas, tinha um sapato que combinava com ambas. Uma das opções era uma camisa rosè caída nos ombros com uma calça branca de cintura alta e a outra era a mesma camisa na cor azul bebê com uma saia. Descartei a última opção. Estava frio.
Lorenzo quem foi me deixar na escola. Segundo a minha mãe, todos os dias será assim. Eu realmente acredito que ela tem medo de que eu fuja.
— Você está de brincadeira? Minha mãe me matriculou numa escola de música? — perguntei para o Lorenzo que tinha acabado de estacionar em frente a um prédio cuja faixada especificava que ali tinha cursos de artes musicais e teatrais. Ele me olhou com uma cara de quem não sabia de nada, mas eu percebi que ele tinha aprontado essa. — Ela não sabe, né? — e ele negou com a cabeça.
— Quer que eu entre com você? — perguntou.
— Por favor — sorri tensa. — É capaz de eu me perder.
É claro que essa não era a minha única preocupação. Eu nunca tinha ido antes a uma escola. Não sei como isso funciona direito e nem é uma escola normal, é uma escola de artes.
Quando desci do carro, me dei conta que muita coisa além da fachada entregava que ali não era uma escola normal. Havia alunos em todos os lugares dançando, cantando, tocando… Ah, parecem tão talentosos. E eu? Passei a minha vida toda tendo o mínimo contato com isso. Vou parecer uma boba. Vou parecer não. Com certeza sou uma. Muitos alunos me encaravam.
— É normal toda essa atenção? — sussurrei pra ele.
— Sim, você é novata. Todos irão te olhar.
Ok, isso não foi nada reconfortante.
— Quero ir pra casa — choraminguei. — Não gosto de ser o centro das atenções.
— Frequentar uma escola é tudo o que você sempre quis e agora vai desistir?
— Sim. — bati o pé no chão e ele riu.
— Vamos fazer assim, — pegou minha mão. — Você frequenta por um mês. Caso você realmente não queira, a gente dá um jeito, ok? – assenti, me dando por vencida. – Agora temos que pegar sua grade horária, seus livros e a senha do seu armário.
— Bom, esta é a sua primeira sala. Seu pai me disse que tem preferência na área musical, onde tomei a liberdade de colocar todas as suas atividades extracurriculares. Mais alguma coisa? – perguntou a diretora ao parar em frente a uma sala.
— Hm… Não… — hesitei. — Mas senhora… – olho para o nome que tinha bordado em sua camisa. — Senhora Sampaio, ele não é meu pai, apenas meu mordomo.
— Ah, perdão. — falou sem graça. — Ele foi tão atencioso…
Mas é quase como se fosse um. Se bem que seria muito estranho que o Lorenzo fosse o meu pai, de fato. A questão é que não tenho um pai, já que a minha mãe sempre evita falar dele, e o Lorenzo era a única figura masculina que eu via mais próxima de ser um para mim.
A Senhora Sampaio entrou comigo na sala. Que eu não tenha que me apresentar. Que não tenha ninguém olhando para mim…
— , vem cá. — ela me chamou e eu percebi que ela já tinha entrado e eu estava plantada no corredor. — Alunos, essa é a Mendes. Ela irá estudar com vocês esses dois anos que restam. Pode se sentar, querida.
Graças a Deus não precisei me apresentar para ninguém. Sentei na única cadeira que estava vaga que obviamente era na frente perto da parede.
— se apresente para a gente, por favor.
Minha mãe sempre disse que não podemos cantar glória antes de acontecer algo realmente bom.
— Ah… Meu nome é Mendes… Estou fazendo 17 anos hoje e… Ah, sou brasileira — gaguejei um pouco por nervosismo. — É isso.
Um menino entrou pela porta no quarto horário de aula. Ele era lindo de olhos azuis meio esverdeados, cabelos lisos, alto e cheio de tatuagens. Sentou-se ao lado de uma menina.
— Atrasado logo no início do ano letivo, senhor Vázquez? — o professor de matemática chega.
O painel com a lista dos próximos voos mudou de tela. “Voo 324 com destino à Madri. Embarque imediato. Portão 28”. Geralmente, eu não fico tão atenta ao painel, mas hoje a espera estava tão chata que foi impossível não olhar cada vez que ele piscava e soava aquele toque de notificação que eu já não aguentava.
Peguei o meu suco – eu estava em um restaurante dentro do aeroporto – e fui até a minha mãe.
— Vamos, .
Tentei evitar o máximo que pude revirar os olhos para a mamãe. Ela já não é a mesma desde que recebeu uma visita misteriosa. Não fica mais comigo, não pergunta como estou, só sabe ficar trancada no escritório trabalhando ou ficar com aquele ridículo que ela chama de namorado.
— O que você estava fazendo? — perguntou pegando sua mala de mão.
— Fui buscar um suco. Não se preocupe, paguei no débito com o seu cartão. Sabe como é né? Daqui a uns anos, quem sabe, já terei provado dos sucos de todos os aeroportos do mundo — ironizei. — Está com medo que eu fuja, mãe? — peguei a minha mala e coloquei a minha mochila nas costas.
— Não. Que se apaixone. – ergo a sobrancelha. — Que se apaixone pelo lugar. Madri é uma cidade muito bonita. Tenho a impressão que você acha que vai se divertir lá.
— Ah, eu tenho certeza que vou me divertir muito do quarto pra sala, da sala pra cozinha, da cozinha pra sala de jantar e da sala de jantar para o banheiro. Depois, posso até fazer o caminho inverso para não ficar tão monótono. Chama isso de diversão? — Não esperei ela me responder. Saí puxando a minha mala em direção a fila do portão.
Já era noite quando chegamos. Lorenzo, o mordomo da minha mãe, nos esperava no saguão do aeroporto. Assim que nos viu, abriu um sorriso enorme e se ofereceu pra levar o carrinho com nossas malas. Nós o acompanhamos até o carro.
— A propósito, sejam bem-vindas de volta, senhoritas. — disse, abrindo a porta do nosso carro.
— Assim espero. — murmurei, procurando o meu fone e conectando-o no meu celular.
— ! — minha mãe me chamou, com tom de repreensão, fazendo-me tirar os fones. — Já falei que não quero que você escute esse tipo de música!
Vai começar as ladainhas da minha mãe. Quando ela era mais jovem – não que eu esteja chamando-a de velha –, seu pai não a deixava cantar, então nunca conseguiu realizar seu sonho de ser uma grande cantora. Essa frustração recaiu sobre mim. Sou proibida de escutar e cantar qualquer tipo de música, menos a clássica, é claro.
— Mãe — respiro fundo — Não é porque o vovô não te deixou seguir o seu sonho que a senhora pode me proibir de escutar qualquer coisa que te lembre disso — enfatizei a palavra senhora, sabendo que ela odiava ser chamada assim.
— Você é uma insensível — ouvi-a falar. Tudo o que fiz foi virar a cara.
Quando chegamos a casa, fui recebida pelos carinhos enormes de Olga, a empregada que cuidou de mim quando era pequena.
— Minha pequenina — abraçou-me fortemente. — Que saudades eu estava de você!
— Olga… Não… Estou… Conseguindo… Respirar… – ela me soltou, fazendo todos que estavam na sala, inclusive a minha mãe, rirem. — Mas eu também estava morrendo de saudades de vocês — dou um abraço de lado nela e no Lorenzo.
No dia seguinte, acordei com a minha mãe acariciando seu rosto. A forte luz do Sol já a essa hora provocava um efeito brilhante em seus cabelos claros. Parecia até um sonho de tanta luminosidade que havia. Meus olhos ainda estavam sonolentos e fechavam vez ou outra.
— , sei que não estamos tão próximas assim. Me dói muito ver o quanto nos afastamos, mas prometo que é para o seu bem. — suspirou fundo. — Quando acabar toda essa tortura que seu pai está criando, prometo que vamos voltar a ser como antes. Te amo. Feliz aniversário. — beijou a minha testa e saiu do quarto em seguida.
Passei um tempo tentando entender o que tinha acontecido. Quando fiquei mais esperta, de fato, que me levantei e fiz a minha higiene matinal tudo aquilo parecia ter sido coisa da minha cabeça. Ela não esteve no meu quarto. Ela não falou do meu pai. Nunca tinha falado antes. Por que agora?
— , se arrume. Lorenzo irá te levar para o seu primeiro dia de aula. — arregalo os olhos assim que chego na cozinha.
Ok, essa mulher enlouqueceu. Primeiro dia de aula? Ela está querendo dizer que depois de tantos anos eu vou para uma escola? E o que se veste pra ir à escola? Pensava que os alunos já entravam na escola de uniforme e eu não tenho um.
— Não faça essa cara — resmungou. — Vá logo se arrumar. A Olga vai te ajudar. Não quero que chegue atrasada.
Resolvi logo tomar um banho. Quando saí do banheiro, Olga tinha separado duas roupas e deixado em cima da cama. Junto a elas, tinha um sapato que combinava com ambas. Uma das opções era uma camisa rosè caída nos ombros com uma calça branca de cintura alta e a outra era a mesma camisa na cor azul bebê com uma saia. Descartei a última opção. Estava frio.
Lorenzo quem foi me deixar na escola. Segundo a minha mãe, todos os dias será assim. Eu realmente acredito que ela tem medo de que eu fuja.
— Você está de brincadeira? Minha mãe me matriculou numa escola de música? — perguntei para o Lorenzo que tinha acabado de estacionar em frente a um prédio cuja faixada especificava que ali tinha cursos de artes musicais e teatrais. Ele me olhou com uma cara de quem não sabia de nada, mas eu percebi que ele tinha aprontado essa. — Ela não sabe, né? — e ele negou com a cabeça.
— Quer que eu entre com você? — perguntou.
— Por favor — sorri tensa. — É capaz de eu me perder.
É claro que essa não era a minha única preocupação. Eu nunca tinha ido antes a uma escola. Não sei como isso funciona direito e nem é uma escola normal, é uma escola de artes.
Quando desci do carro, me dei conta que muita coisa além da fachada entregava que ali não era uma escola normal. Havia alunos em todos os lugares dançando, cantando, tocando… Ah, parecem tão talentosos. E eu? Passei a minha vida toda tendo o mínimo contato com isso. Vou parecer uma boba. Vou parecer não. Com certeza sou uma. Muitos alunos me encaravam.
— É normal toda essa atenção? — sussurrei pra ele.
— Sim, você é novata. Todos irão te olhar.
Ok, isso não foi nada reconfortante.
— Quero ir pra casa — choraminguei. — Não gosto de ser o centro das atenções.
— Frequentar uma escola é tudo o que você sempre quis e agora vai desistir?
— Sim. — bati o pé no chão e ele riu.
— Vamos fazer assim, — pegou minha mão. — Você frequenta por um mês. Caso você realmente não queira, a gente dá um jeito, ok? – assenti, me dando por vencida. – Agora temos que pegar sua grade horária, seus livros e a senha do seu armário.
— Bom, esta é a sua primeira sala. Seu pai me disse que tem preferência na área musical, onde tomei a liberdade de colocar todas as suas atividades extracurriculares. Mais alguma coisa? – perguntou a diretora ao parar em frente a uma sala.
— Hm… Não… — hesitei. — Mas senhora… – olho para o nome que tinha bordado em sua camisa. — Senhora Sampaio, ele não é meu pai, apenas meu mordomo.
— Ah, perdão. — falou sem graça. — Ele foi tão atencioso…
Mas é quase como se fosse um. Se bem que seria muito estranho que o Lorenzo fosse o meu pai, de fato. A questão é que não tenho um pai, já que a minha mãe sempre evita falar dele, e o Lorenzo era a única figura masculina que eu via mais próxima de ser um para mim.
A Senhora Sampaio entrou comigo na sala. Que eu não tenha que me apresentar. Que não tenha ninguém olhando para mim…
— , vem cá. — ela me chamou e eu percebi que ela já tinha entrado e eu estava plantada no corredor. — Alunos, essa é a Mendes. Ela irá estudar com vocês esses dois anos que restam. Pode se sentar, querida.
Graças a Deus não precisei me apresentar para ninguém. Sentei na única cadeira que estava vaga que obviamente era na frente perto da parede.
— se apresente para a gente, por favor.
Minha mãe sempre disse que não podemos cantar glória antes de acontecer algo realmente bom.
— Ah… Meu nome é Mendes… Estou fazendo 17 anos hoje e… Ah, sou brasileira — gaguejei um pouco por nervosismo. — É isso.
Um menino entrou pela porta no quarto horário de aula. Ele era lindo de olhos azuis meio esverdeados, cabelos lisos, alto e cheio de tatuagens. Sentou-se ao lado de uma menina.
— Atrasado logo no início do ano letivo, senhor Vázquez? — o professor de matemática chega.
Capítulo 2
Eu nunca tive uma vida social grande o bastante para me apaixonar. Na verdade, nem vida social eu tenho, já que a minha vida sempre aconteceu em casa. Mas de vez em quando eu escapava pra respirar longe da minha mãe. Ficar presa é estressante.
Foi em uma dessas escapadas que aconteceu. Eu ainda estava no Brasil, no Rio de Janeiro, e tinha 15 anos. A minha mãe precisou fazer uma viagem a Arraial do Cabo e como eu não estava com a menor paciência, aproveitei o momento em que ela saiu e fui dar uma volta pelas praias maravilhosas que aquele local tinha.
Lembro que estava andando pelo calçadão da Praia Grande quando o encontrei pela primeira vez. Eu estava tomando um açaí até que nos tombamos.
— Me desculpe. — eu disse, limpando o estrago que o açaí fez no rapaz, mas eu só estava piorando a situação.
— Está tudo bem, gatinha. — seu sotaque revelava que ele não era daqui.
— Eu sou realmente muito desastrada. Sinto muito mesmo. — falei sem graça, olhando pra ele em seguida.
Foi um erro gravíssimo. Ele era lindo. Seus olhos tinham um tom intenso de verde e eu sei que poderia ficar admirando isso pelo resto da minha vida. Só os olhos. Seus cabelos eram castanhos com um brilho maravilhoso e eu tinha muita vontade de tocá-los. Sua beleza era realmente exuberante e eu não soube como reagir.
— Está tudo bem, sério. — ele sorriu.
Bom, isso me deixou mais perdida ainda. Por um momento, eu só conseguia reparar em cada traço perfeito que aquele garoto tinha.
— Você quer dar uma volta?
Ele perguntou e eu fiquei assustada. Dar uma volta com um menino que eu nunca nem vi na minha vida? Minha mãe certamente não gostaria, por isso eu respondi depois de olhar o relógio e antes de sair correndo.
— Agradeço o convite, mas eu preciso voltar pra casa. A minha mãe já deve estar chegando. — saio correndo.
— Tchau, Cinderela. — escutei-o gritar.
Todos os dias, sempre no mesmo horário, eu encontrava esse menino no mesmo local e nós conversávamos sobre tudo. Bom, no início, esses encontros eram por acaso, mas depois que tivemos a consciência de que nos encontraríamos ali sempre, tenho certeza que eles passaram a ser propositais.
Descobri que seu nome era e morava na Espanha, mas estava passando um tempinho no Brasil porque tinha discutido com sua mãe e seu padrasto. Isso me fez pensar que se eu viajasse pra bem longe sempre que eu brigasse com a minha mãe, eu já teria conhecido bem mais lugares que já conheço hoje.
Um dia, quando já se tinha passado pouco mais de um mês, resolvemos sair do calçadão e ir de fato para a orla da praia. Sentamo-nos depois de uma caminhada e enquanto conversávamos sobre o mar, ele procurou minha mão e a segurou. Eu olhei para ele confusa e ele disse que tinha algo para me dizer. Então me beijou. Esse primeiro foi só um selinho e vários outros que vieram depois também, mas é claro que nenhum dos dois se contentou só com isso.
Conforme os dias se passavam, ficávamos cada vez mais próximos. Nosso ponto de encontro deixou de ser o calçadão para ser o mesmo lugar naquela enorme faixa de areia em que nos beijamos pela primeira vez. Nos pegávamos ali sempre durante as tardes. Eu me sentia cada vez mais envolvida por ele…
Quando se passaram quase três meses desde o nosso primeiro encontro, eu resolvi ir à praia um pouco mais cedo que o habitual. Dessa vez, posso dizer que foi coincidência tê-lo encontrado. Estava tomando banho de mar.
Tudo o que consigo dizer desse dia é que entreguei a minha honra a ele. Fico atordoada só de lembrar que no dia seguinte ele não apareceu e nem no próximo. Fiquei arrasada o suficiente para concordar com a minha mãe em me deixar trancada numa torre e nunca mais quis escapar outra vez.
Eu não consegui prestar atenção na aula, ou pelo menos não em tudo. De vez em quando, corria meus olhos em direção ao menino que chegou atrasado. Com exceção das tatuagens, ele parecia ser a cópia perfeita do . Ou será que era o ?
Foi em uma dessas escapadas que aconteceu. Eu ainda estava no Brasil, no Rio de Janeiro, e tinha 15 anos. A minha mãe precisou fazer uma viagem a Arraial do Cabo e como eu não estava com a menor paciência, aproveitei o momento em que ela saiu e fui dar uma volta pelas praias maravilhosas que aquele local tinha.
Lembro que estava andando pelo calçadão da Praia Grande quando o encontrei pela primeira vez. Eu estava tomando um açaí até que nos tombamos.
— Me desculpe. — eu disse, limpando o estrago que o açaí fez no rapaz, mas eu só estava piorando a situação.
— Está tudo bem, gatinha. — seu sotaque revelava que ele não era daqui.
— Eu sou realmente muito desastrada. Sinto muito mesmo. — falei sem graça, olhando pra ele em seguida.
Foi um erro gravíssimo. Ele era lindo. Seus olhos tinham um tom intenso de verde e eu sei que poderia ficar admirando isso pelo resto da minha vida. Só os olhos. Seus cabelos eram castanhos com um brilho maravilhoso e eu tinha muita vontade de tocá-los. Sua beleza era realmente exuberante e eu não soube como reagir.
— Está tudo bem, sério. — ele sorriu.
Bom, isso me deixou mais perdida ainda. Por um momento, eu só conseguia reparar em cada traço perfeito que aquele garoto tinha.
— Você quer dar uma volta?
Ele perguntou e eu fiquei assustada. Dar uma volta com um menino que eu nunca nem vi na minha vida? Minha mãe certamente não gostaria, por isso eu respondi depois de olhar o relógio e antes de sair correndo.
— Agradeço o convite, mas eu preciso voltar pra casa. A minha mãe já deve estar chegando. — saio correndo.
— Tchau, Cinderela. — escutei-o gritar.
Todos os dias, sempre no mesmo horário, eu encontrava esse menino no mesmo local e nós conversávamos sobre tudo. Bom, no início, esses encontros eram por acaso, mas depois que tivemos a consciência de que nos encontraríamos ali sempre, tenho certeza que eles passaram a ser propositais.
Descobri que seu nome era e morava na Espanha, mas estava passando um tempinho no Brasil porque tinha discutido com sua mãe e seu padrasto. Isso me fez pensar que se eu viajasse pra bem longe sempre que eu brigasse com a minha mãe, eu já teria conhecido bem mais lugares que já conheço hoje.
Um dia, quando já se tinha passado pouco mais de um mês, resolvemos sair do calçadão e ir de fato para a orla da praia. Sentamo-nos depois de uma caminhada e enquanto conversávamos sobre o mar, ele procurou minha mão e a segurou. Eu olhei para ele confusa e ele disse que tinha algo para me dizer. Então me beijou. Esse primeiro foi só um selinho e vários outros que vieram depois também, mas é claro que nenhum dos dois se contentou só com isso.
Conforme os dias se passavam, ficávamos cada vez mais próximos. Nosso ponto de encontro deixou de ser o calçadão para ser o mesmo lugar naquela enorme faixa de areia em que nos beijamos pela primeira vez. Nos pegávamos ali sempre durante as tardes. Eu me sentia cada vez mais envolvida por ele…
Quando se passaram quase três meses desde o nosso primeiro encontro, eu resolvi ir à praia um pouco mais cedo que o habitual. Dessa vez, posso dizer que foi coincidência tê-lo encontrado. Estava tomando banho de mar.
Tudo o que consigo dizer desse dia é que entreguei a minha honra a ele. Fico atordoada só de lembrar que no dia seguinte ele não apareceu e nem no próximo. Fiquei arrasada o suficiente para concordar com a minha mãe em me deixar trancada numa torre e nunca mais quis escapar outra vez.
Eu não consegui prestar atenção na aula, ou pelo menos não em tudo. De vez em quando, corria meus olhos em direção ao menino que chegou atrasado. Com exceção das tatuagens, ele parecia ser a cópia perfeita do . Ou será que era o ?
Capítulo 3
Sendo bem sincera, nos dias que se passaram, eu não consegui tirar da cabeça que aquele menino poderia ser o todos os jeitos, gestos, falas eram iguais. As únicas coisas diferentes eram seu nome e a voz. Isso não me aliviava nadinha. Ele pode ter uma identidade diferente e ter mentido pra mim lá no Brasil. E quanto a voz… Bom, as vozes dos garotos mudam muito, né? A possibilidade de estar estudando com o me deixou assustada, mas precisei respirar bem fundo e não deixar que isso atrapalhasse esse momento tão especial da minha vida – que é finalmente estudar em uma escola (de música).
Quando chegamos no fim do segundo trimestre, a professora de canto explicou que passaria um trabalho para fazer durante as férias de verão que seria em dupla. Ele seria importante para as atividades do terceiro e último semestre, valendo, inclusive, ponto extra na média.
Só em pensar nisso, eu já comecei a suar frio. Eu não tinha amizade com ninguém depois de tanto tempo de aula. A única pessoa com quem eu converso é o inspetor, que inclusive esses dias eu cheguei na escola e ao invés de dizer bom dia, disse tchau. Não havia chance de alguém querer fazer esse trabalho comigo.
— Bom, na próxima aula irei fazer o sorteio das duplas para ser justo com todo mundo. — falou pegando suas coisas em cima da mesa. — Até quinta que vem. — e saiu.
Depois disso, as aulas passaram correndo e o assunto do trabalho em dupla não era esquecido. Todos estão curiosos para saber como é e quem irá ser seu par. Aliás, já tinha gente combinando e por isso imaginei que eu seria a dupla de quem o restante da turma não quis, a não ser que acontecesse um grande milagre. Enquanto estava na fila do almoço, esse não era um pensamento muito legal. Quer dizer, eu já tinha me acostumado a comer sozinha, mas sei lá.
Alguém esbarrou em mim.
— Desculpa, me desculpa mesmo. Eu sou muito desastrado! — disse me entregando a sua bandeja já que a minha estava no chão.
— Tu-do bem, obrigada. — sorri fraco. — Eu também sou às vezes.
Foi quando percebi que a pessoa que estava falando comigo era a cópia do , ou quem sabe o próprio . O meu coração quase saiu pela boca. Eu finalmente estava cara a cara com ele. Ou infelizmente.
— Ei, eu te conheço não? — perguntou confuso, deixando-me mais nervosa ainda. — Você faz aula de matemática e canto comigo não faz?
— Ah sim. – suspirei aliviada. — É, eu faço aula de canto com você. — e saí para evitar mais perguntas, mas ele me seguiu.
— A gente podia, sei lá, almoçar juntos? — sugeriu e eu estranhei. Ninguém nunca me fez esse tipo de convite em meses que estou aqui. — Você sempre fica sozinha. — comentou desnecessariamente, eu acho.
Fechei a cara. Ele está me convidando pra almoçar com ele porque está com pena de mim? Se for assim, prefiro ficar sozinha…
— Desculpa, é que eu sou muito observador. — justificou quando percebeu que não gostei do comentário.
Acabei aceitando. Seria legal para confirmar ou negar todas as minhas suspeitas sobre quem ele é.
Seu nome era e tinha 17 anos. Ele disse que nasceu em Londres por conta de uma viagem de última hora que sua mãe teve que fazer. Ainda assim, não se pode dizer que ele é inglês porque seus pais eram espanhóis que não residiam na Inglaterra e também nem valeria a pena lutar pelo direito de cidadania inglesa já que não ia morar lá.
— Você veio do Brasil mesmo? — perguntou, enquanto me olhava. Encarei-o, como se houvesse motivos para duvidar, já que eu tinha falado sobre isso. — Só escutei boatos. Eu não estava na aula que você se apresentou, lembra?
— Sim, vim do Brasil. — respondo, mexendo nas minhas unhas. — Minha mãe tem uma empresa com sede lá.
— Ah sim. — suspirou. — Sempre tive vontade de conhecer o Brasil. É um país lindo, quero dizer, pelo menos é o que eu via nas fotos do meu irmão.
— Irmão?
Conversamos muito sobre tudo, tipo, tudo mesmo. Como o horário de almoço não é eterno, nossa conversa não pôde durar mais. Então, partimos para a sala de aula. Sim, acabamos seguindo caminhos diferentes porque não pegamos essa matéria juntos.
Estar em uma escola pode ser uma experiência bastante nova pra mim e às vezes sinto muita saudade de ter uma governanta, mas é incrível pensar no tanto de coisas que você aprende, não só das disciplinas como da vida. Nessas três primeiras aulas, eu estava muito distraída pensando nisso. Uma vantagem, que eu não sei até que ponto é boa, é que as chances de eu ser chamada atenção por isso são mínimas, diferente de como seria com a governanta.
No início da quinta aula, a Senhora Sampaio bateu na porta, pediu licença e chamou por mim. A sala ficou tensa. Eu mais ainda. Arrumei o meu material e a acompanhei. Antes que a porta se fechasse, escutei alguns murmúrios que sugeriam que eu tivesse aprontado alguma, mas eu não fiz nada. A minha consciência está limpa, né? Se eu não fiz nada, não tenho com o que me preocupar.
O Lorenzo estava na porta da sala da diretora. Será que tinha acontecido alguma coisa? Ele deve ter percebido que eu estava confusa quando disse, nervoso:
— Antes que me pergunte, não aconteceu nada. Sua mãe pediu que eu viesse justamente para evitar que aconteça.
No caminho, criei várias teorias que me ajudassem a entender melhor, mas nenhuma delas faziam o menor sentido. Então, insisti para que o Lorenzo me explicasse. Pelo que ele disse, havia acontecido um assalto no bairro. Quando ela soube, ficou louca. Bom, isso faz mais sentido que tudo que eu tinha imaginado. Ela nunca tinha me deixado sair de casa e, de repente, algo assim acontece bem perto de mim. Claro que ficou preocupada, mas existia maneiras muito mais práticas de saber se eu estava bem, sem me tirar da aula.
Chegando em casa, ele me mandou ir direto para o meu quarto e depois eu falaria com a minha mãe. Assim eu faria, mas uma voz que vinha do escritório dela me chamou a atenção. Poderia ser algum cliente da empresa dela, mas muito dificilmente ela recebe clientes em casa. As reuniões sempre acontecem na empresa.
— Eu quero vê-la, Heloísa.
— Você não vai! — gritou. — Eu não vou deixar!
— Você me proibiu todos esses anos! 16 anos!
— E vou proibir enquanto estiver viva.
Isso me deixou assustada. Nunca tinha ouvido minha mãe falar assim com alguma visita. Quem seria essa pessoa? Talvez se eu abrisse a porta...
— ! — o Lorenzo apareceu — O que ainda está fazendo aqui?
Fui para o meu quarto e me arrumei para o jantar. Nesse meio tempo, me veio à cabeça que esse homem poderia ser o meu pai. Só que não é possível. A minha mãe me falou que eles tinham perdido o contato.
Tentei não pensar nisso por muito tempo, mas a minha mãe ficou estranha e não me deixou sair de casa por uma semana. Depois do que escutei, passei a duvidar se realmente havia acontecido esse assalto, inclusive procurei na internet alguma notícia sobre. Bom, não encontrei nada. Talvez não fosse como no Brasil. Se não encontrei não significa que não tenha acontecido, mas agora eu tenho muito mais motivos para desconfiar.
Na quinta-feira finalmente voltei para a escola. Meus colegas e professores ficavam me perguntando o que tinha acontecido e, para não dizer o que realmente foi, eu respondia que tinha adoecido. A minha mãe parece ter dispensado o Lorenzo de qualquer outro tipo de tarefa para que ele ficasse me esperando o dia inteiro na escola. A diretora Sampaio disse que não havia problema algum desde que ele não ficasse me acompanhando todo o tempo dentro da escola nem nas aulas.
— Bom dia, classe. — a professora nos cumprimentou sorrindo, colocando suas coisas em cima da mesa. — Prontos para saber como vai ser o trabalho e conhecer as suas duplas?
Ela tinha previamente preparado uma caixinha de sorteio com o nome dos alunos dentro. Tirava um nome seguido de outro e assim as duplas eram formadas. Uns ficavam tristes, outros felizes e eu seguia assustada porque o meu nome não era falado.
Até que só restaram dois papéis na caixinha. Finalmente eu seria chamada. Também não descarto a possibilidade de a professora ter se esquecido de mim.
— E por último... — pegou esses dois papéis — e .
Eu fiquei tão aliviada e ao mesmo tempo tão nervosa com esse sorteio. É sério que em nenhum momento eu notei que ele não estava sendo chamado?
— Oi, parceira. — ele se aproximou, puxando a cadeira ao meu lado. — Você sumiu. O que aconteceu?
— Estava doente. — dou de ombros, prestando atenção na explicação da professora.
“Assim que voltarmos das férias de verão, vocês apresentarão para a turma uma música completamente autoral. Quero que seja completa. Letra, melodia, harmonia... Tudo. O instrumento a ser usado é da escolha de vocês. Esse trabalho é extra e essencial para o desenvolvimento das nossas aulas no próximo trimestre”.
Quando chegamos no fim do segundo trimestre, a professora de canto explicou que passaria um trabalho para fazer durante as férias de verão que seria em dupla. Ele seria importante para as atividades do terceiro e último semestre, valendo, inclusive, ponto extra na média.
Só em pensar nisso, eu já comecei a suar frio. Eu não tinha amizade com ninguém depois de tanto tempo de aula. A única pessoa com quem eu converso é o inspetor, que inclusive esses dias eu cheguei na escola e ao invés de dizer bom dia, disse tchau. Não havia chance de alguém querer fazer esse trabalho comigo.
— Bom, na próxima aula irei fazer o sorteio das duplas para ser justo com todo mundo. — falou pegando suas coisas em cima da mesa. — Até quinta que vem. — e saiu.
Depois disso, as aulas passaram correndo e o assunto do trabalho em dupla não era esquecido. Todos estão curiosos para saber como é e quem irá ser seu par. Aliás, já tinha gente combinando e por isso imaginei que eu seria a dupla de quem o restante da turma não quis, a não ser que acontecesse um grande milagre. Enquanto estava na fila do almoço, esse não era um pensamento muito legal. Quer dizer, eu já tinha me acostumado a comer sozinha, mas sei lá.
Alguém esbarrou em mim.
— Desculpa, me desculpa mesmo. Eu sou muito desastrado! — disse me entregando a sua bandeja já que a minha estava no chão.
— Tu-do bem, obrigada. — sorri fraco. — Eu também sou às vezes.
Foi quando percebi que a pessoa que estava falando comigo era a cópia do , ou quem sabe o próprio . O meu coração quase saiu pela boca. Eu finalmente estava cara a cara com ele. Ou infelizmente.
— Ei, eu te conheço não? — perguntou confuso, deixando-me mais nervosa ainda. — Você faz aula de matemática e canto comigo não faz?
— Ah sim. – suspirei aliviada. — É, eu faço aula de canto com você. — e saí para evitar mais perguntas, mas ele me seguiu.
— A gente podia, sei lá, almoçar juntos? — sugeriu e eu estranhei. Ninguém nunca me fez esse tipo de convite em meses que estou aqui. — Você sempre fica sozinha. — comentou desnecessariamente, eu acho.
Fechei a cara. Ele está me convidando pra almoçar com ele porque está com pena de mim? Se for assim, prefiro ficar sozinha…
— Desculpa, é que eu sou muito observador. — justificou quando percebeu que não gostei do comentário.
Acabei aceitando. Seria legal para confirmar ou negar todas as minhas suspeitas sobre quem ele é.
Seu nome era e tinha 17 anos. Ele disse que nasceu em Londres por conta de uma viagem de última hora que sua mãe teve que fazer. Ainda assim, não se pode dizer que ele é inglês porque seus pais eram espanhóis que não residiam na Inglaterra e também nem valeria a pena lutar pelo direito de cidadania inglesa já que não ia morar lá.
— Você veio do Brasil mesmo? — perguntou, enquanto me olhava. Encarei-o, como se houvesse motivos para duvidar, já que eu tinha falado sobre isso. — Só escutei boatos. Eu não estava na aula que você se apresentou, lembra?
— Sim, vim do Brasil. — respondo, mexendo nas minhas unhas. — Minha mãe tem uma empresa com sede lá.
— Ah sim. — suspirou. — Sempre tive vontade de conhecer o Brasil. É um país lindo, quero dizer, pelo menos é o que eu via nas fotos do meu irmão.
— Irmão?
Conversamos muito sobre tudo, tipo, tudo mesmo. Como o horário de almoço não é eterno, nossa conversa não pôde durar mais. Então, partimos para a sala de aula. Sim, acabamos seguindo caminhos diferentes porque não pegamos essa matéria juntos.
Estar em uma escola pode ser uma experiência bastante nova pra mim e às vezes sinto muita saudade de ter uma governanta, mas é incrível pensar no tanto de coisas que você aprende, não só das disciplinas como da vida. Nessas três primeiras aulas, eu estava muito distraída pensando nisso. Uma vantagem, que eu não sei até que ponto é boa, é que as chances de eu ser chamada atenção por isso são mínimas, diferente de como seria com a governanta.
No início da quinta aula, a Senhora Sampaio bateu na porta, pediu licença e chamou por mim. A sala ficou tensa. Eu mais ainda. Arrumei o meu material e a acompanhei. Antes que a porta se fechasse, escutei alguns murmúrios que sugeriam que eu tivesse aprontado alguma, mas eu não fiz nada. A minha consciência está limpa, né? Se eu não fiz nada, não tenho com o que me preocupar.
O Lorenzo estava na porta da sala da diretora. Será que tinha acontecido alguma coisa? Ele deve ter percebido que eu estava confusa quando disse, nervoso:
— Antes que me pergunte, não aconteceu nada. Sua mãe pediu que eu viesse justamente para evitar que aconteça.
No caminho, criei várias teorias que me ajudassem a entender melhor, mas nenhuma delas faziam o menor sentido. Então, insisti para que o Lorenzo me explicasse. Pelo que ele disse, havia acontecido um assalto no bairro. Quando ela soube, ficou louca. Bom, isso faz mais sentido que tudo que eu tinha imaginado. Ela nunca tinha me deixado sair de casa e, de repente, algo assim acontece bem perto de mim. Claro que ficou preocupada, mas existia maneiras muito mais práticas de saber se eu estava bem, sem me tirar da aula.
Chegando em casa, ele me mandou ir direto para o meu quarto e depois eu falaria com a minha mãe. Assim eu faria, mas uma voz que vinha do escritório dela me chamou a atenção. Poderia ser algum cliente da empresa dela, mas muito dificilmente ela recebe clientes em casa. As reuniões sempre acontecem na empresa.
— Eu quero vê-la, Heloísa.
— Você não vai! — gritou. — Eu não vou deixar!
— Você me proibiu todos esses anos! 16 anos!
— E vou proibir enquanto estiver viva.
Isso me deixou assustada. Nunca tinha ouvido minha mãe falar assim com alguma visita. Quem seria essa pessoa? Talvez se eu abrisse a porta...
— ! — o Lorenzo apareceu — O que ainda está fazendo aqui?
Fui para o meu quarto e me arrumei para o jantar. Nesse meio tempo, me veio à cabeça que esse homem poderia ser o meu pai. Só que não é possível. A minha mãe me falou que eles tinham perdido o contato.
Tentei não pensar nisso por muito tempo, mas a minha mãe ficou estranha e não me deixou sair de casa por uma semana. Depois do que escutei, passei a duvidar se realmente havia acontecido esse assalto, inclusive procurei na internet alguma notícia sobre. Bom, não encontrei nada. Talvez não fosse como no Brasil. Se não encontrei não significa que não tenha acontecido, mas agora eu tenho muito mais motivos para desconfiar.
Na quinta-feira finalmente voltei para a escola. Meus colegas e professores ficavam me perguntando o que tinha acontecido e, para não dizer o que realmente foi, eu respondia que tinha adoecido. A minha mãe parece ter dispensado o Lorenzo de qualquer outro tipo de tarefa para que ele ficasse me esperando o dia inteiro na escola. A diretora Sampaio disse que não havia problema algum desde que ele não ficasse me acompanhando todo o tempo dentro da escola nem nas aulas.
— Bom dia, classe. — a professora nos cumprimentou sorrindo, colocando suas coisas em cima da mesa. — Prontos para saber como vai ser o trabalho e conhecer as suas duplas?
Ela tinha previamente preparado uma caixinha de sorteio com o nome dos alunos dentro. Tirava um nome seguido de outro e assim as duplas eram formadas. Uns ficavam tristes, outros felizes e eu seguia assustada porque o meu nome não era falado.
Até que só restaram dois papéis na caixinha. Finalmente eu seria chamada. Também não descarto a possibilidade de a professora ter se esquecido de mim.
— E por último... — pegou esses dois papéis — e .
Eu fiquei tão aliviada e ao mesmo tempo tão nervosa com esse sorteio. É sério que em nenhum momento eu notei que ele não estava sendo chamado?
— Oi, parceira. — ele se aproximou, puxando a cadeira ao meu lado. — Você sumiu. O que aconteceu?
— Estava doente. — dou de ombros, prestando atenção na explicação da professora.
“Assim que voltarmos das férias de verão, vocês apresentarão para a turma uma música completamente autoral. Quero que seja completa. Letra, melodia, harmonia... Tudo. O instrumento a ser usado é da escolha de vocês. Esse trabalho é extra e essencial para o desenvolvimento das nossas aulas no próximo trimestre”.
Capítulo 4
Início do verão
Hoje no Brasil é o dia mais curto do ano. Aqui está sendo totalmente o contrário: parece que o dia não acaba nunca. Nunca fui muito fã do verão e o seu começo agora me causava um mal estar, pois junto a ele começava também a semana de provas e a entrega dos trabalhos. Ah, claro, o que me dá mais medo ainda que é o trabalho da professora de canto.
Nós não tínhamos começado por motivos bem óbvios. A minha mãe não me deixava sair de casa, então combinamos que cada um faria uma parte e com certeza isso não deu certo. Confesso que iniciei uma letra, mas quando tentei colocá-la numa melodia foi que ficou muito feio.
— Por favor, Lorenzo. — implorei para que ele me deixasse na casa do . — Você pode ficar me esperando no carro. Eu preciso fazer esse trabalho.
No fim das contas, ele me levou na casa do . Dei de cara com uma casa simples, mas moderna e perfeita, ao meu ver. Se algum dia eu fosse morar sozinha, eu escolheria uma casa assim.
Quando toquei a campainha, uma senhora muito fofa me atendeu, dizendo que ele estava me esperando no estúdio dele. Ele tinha um estúdio dentro de casa?
— Olha só quem conseguiu vir! — exclamou sorrindo. — Quando me mandou mensagem, eu nem acreditei.
Ficamos amigos durante esse tempo. O me ajudou muito a dar conta dos trabalhos que precisamos fazer no final do segundo trimestre. Isso meio que deu brecha para que conversássemos um pouco sobre coisas que não envolviam a escola. Hoje, ele sabe muita coisa sobre mim, inclusive sobre o que aconteceu lá em Arraial do Cabo. Por todo esse tempo em que estivemos próximos e principalmente pela sua reação quando eu contei essa história, eu tive certeza de que ele não era o . Tudo bem que ele tinha me dito que nunca foi ao Brasil, mas no início eu ainda tinha as minhas dúvidas. Hoje nem tanto. Ah, a única coisa que escondi da história foi o nome do garoto.
— Eu disse que conseguiria vir. — sentei-me ao seu lado. — Criei algumas coisas, mas não sei se está bom.
Mostrei a ele a melhorzinha das minhas tentativas e eu não estava muito satisfeita com ela, mas...
— , tudo o que você faz é bom. — afirmou, deixando-me levemente corada. — Digo, você é uma das melhores alunas, não é? — sorrio fraco agradecendo o elogio, embora eu acreditasse que fosse algo que estivesse apenas na cabeça dele. — Bom, vamos começar?
Nos concentramos na melodia, sempre achando um momento para brincadeiras. O sempre tinha tudo na ponta dos dedos, uma ideia que se encaixava com a minha e isso fez com que o trabalho ficasse melhor e evoluísse.
— Você não tem nenhuma ideia de quem seja o seu pai? — perguntou enquanto íamos pra cozinha.
— Nenhuma. — suspiro. — Ele sumiu quando eu tinha apenas meses de vida e nunca mais apareceu.
– Eu entendo. Quer dizer, um pouco. Meu pai também me abandonou, sou criado pelo meu padrasto. Nem é tão ruim assim, sabe? Ele gosta muito da gente.
Foi inevitável não pensar na minha mãe e no seu namorado. Aquele cara estava muito longe de ser um pai para mim, fica me paparicando só para agradá-la.
Quando chegamos na cozinha, havia um homem alto e forte na cozinha, devia ser o padrasto dele, mas me deu medo mesmo assim. Pelo que o me contou, é idiotice ter medo desse homem.
— Oi, Ethan. — o cumprimentou. — Não foi trabalhar hoje?
— Não. — essa voz não me parece muito estranha. — Trabalho leve, , resolvi fazer em casa. Quem é essa menina?
— Ah, a mamãe não te avisou? — perguntou com vergonha, parecendo uma pimentinha. — Essa é a , a minha dupla em um trabalho da escola.
— Prazer, . Sou Ethan, quase pai desse doido aqui. — bagunçou o cabelo do menino, o que me fez rir. — Se ele fizer alguma coisa que te magoe você me avisa, combinado?
— O prazer é todo meu. — respondi sem graça.
Antes que eu pudesse falar que ele não tinha com o que se preocupar porque eu e o não temos nada, alguém entrou na cozinha. Alguém que eu conhecia.
— O que é isso? O está de namorada nova e eu não fico sabendo de... — nossos olhares se encontraram — Nada?
Era ele, o . Eu não acreditava que o encontraria depois de tanto tempo. O mundo é realmente muito pequeno. Não soube como reagir e mesmo que soubesse não poderia fazer nada, né?
— Tem um carro lá fora esperando uma tal de... — essa família tem mania de começar a falar e não terminar? — Ah não. — resmungou. No mínimo, me reconheceu.
— Deve ser o meu. — falei rápido, arrumando as minhas coisas. — Tchau, , falo contigo mais tarde.
Ando de pressa para o portão, mas ele me alcança.
— ...
— Agora não, .
Entro no carro, ignorando o que ele me fala e peço para o Lorenzo sair dali o mais rápido possível.
Naquela noite, me ligou, queria saber o que tinha acontecido para eu sair tão desenfreada da casa dele. Foi porque eu não conseguiria ficar por muito tempo no mesmo ambiente que o . Estava ficando tudo bem e ele resolveu aparecer assim, de repente. Desde o dia em que vi o pela primeira vez na escola, eu me senti mal porque era como se o estivesse perto. Eu não estava errada e ele chegou agora para acentuar o que eu sinto por ele: nojo.
Mas é claro que eu não disse isso para o .
— Você saiu tão rápido daqui que nem tive tempo de apresentar o meu irmão, aquele menino que entrou na cozinha de repente. — informou, antes de me perguntar o que tinha acontecido.
Por isso eu não falei. Eles são irmãos. Isso explica muita coisa. Agora tudo parece fazer sentido na minha cabecinha. E pensar que achei que o fosse a verdadeira identidade do , que teria mentido para mim.
Tínhamos mais três semanas de férias pela frente. Para não dizer que não voltei na casa do depois desse lamentável episódio, fui para lá em um domingo por causa de um convite da mãe dele. Tentei ao máximo evitar isso, mas não dava certo. Ele insistiu até que eu dissesse sim.
Fiquei o tempo inteiro ao lado do , esquivando-me ao máximo de ficar em qualquer ângulo que desse para ver o rosto do . Às vezes era impossível, o maldito sempre era citado nas conversas e pelo que me parece ele não tem uma relação muito boa com os pais. Na verdade, isso para mim ficou bem óbvio quando ele me disse que tinha ido ao Brasil só porque tinha brigado com eles.
Muito ao contrário de como era com o , o tinha um convívio maravilhoso com sua mãe e seu padrasto. Vez ou outra, ele até o chama de pai...
E falando nisso, lembrei-me que hoje é o segundo domingo de agosto, dia dos pais no Brasil. Não que fizesse muita diferença estar sem meu pai hoje porque nunca compartilhamos esse dia. É mais um dia normal sem ele. É menos um dia especial que eu poderia passar com ele.
Estávamos todos no jardim da casa deles. e sua mãe brincando com um cachorrinho que eu não tinha visto na primeira vez que vim, Ethan cuidando de algumas plantas e o ... É, ele veio atrás de mim e não deu pra escapar.
— Posso te pedir uma coisa? — perguntou, sentando-se ao meu lado. Eu estava na grama, observando.
— Não. — fui direta, evitando contato visual.
— Não comenta nada com eles — falou mesmo assim.
— Do que você está falando? — me fiz de tonta. Queria ver o que ele diria.
— Arraial do Cabo.
— Nunca fui.
— Você não presta.
— Eu não sou você. — o olhei enfim.
Nos encaramos e com um gesto apontou para o . Ele tinha parado de brincar com o cachorro e agora nos olhava. Sorri para ele e o foi embora, bufando. retornou a brincadeira.
Quem se sentou ao meu lado logo após o sair foi o sr. Ethan, todo relaxado, mas cansado.
— Essas plantas me dão um trabalho. — proferiu, esticando as pernas e eu ri.
O senhor Ethan perguntou se o tinha me incomodado, disse que ele costuma ser inconveniente às vezes. Também falou muito sobre seu enteado não ter superado o sumiço do pai. O é o mais velho e ficou revoltado com o que tinha acontecido, não aceitando de nenhuma maneira que alguém ocupasse o espaço do seu pai. Já o não. Segundo o sr. Ethan, doeu nele também, ainda mais porque não entendia, mas aceitou de bom grado ter outra pessoa em sua vida.
— Ele me falou muito de você também. — hesitou — , certo?
Assenti.
— Contou-me sobre a pessoa incrível que você é. Seus pais devem ter muito orgulho de você.
Baixei a cabeça, triste. Minha mãe deve se decepcionar comigo. Se não agora, depois. Estou mentindo para ela, afinal. Estou estudando música e socializando, tudo o que ela não queria que acontecesse. Sobre meu pai, nem preciso falar, eu acho.
— O meu pai... — respirei fundo, como se fosse criar forças — Me abandonou.
Ele fez uma reação de surpresa. Não dei mais detalhes, até porque eu não tinha conhecimento de tantos.
— Nesse caso, , quem está perdendo é ele.
Sorri fraco.
Para não correr o risco de não me esbarrar outra vez com o , o passou a vir na minha casa. A desculpa que eu dei para que isso acontecesse foi que a minha mãe me proibiu de sair. Pelo menos ele acreditou.
— Para continuar essa parte aqui — indico com o dedo: — Pintaré un oasis en tu desierto, pode ser assim, que este verano dure eternamente que no me vaya nunca de tu mente.
— Muito bom, . — sorriu. — Está apaixonada, é?
— Não, claro que não — digo rapidamente. — Só entrei na mús... — escutei um barulho de salto alto subindo a escada — Se esconde tudo e pega o material que te pedi para trazer.
Minha mãe tinha acabado de chegar e se visse tudo em cima da minha cama ia acabar surtando e descobrindo tudo. Ela aparece na porta assim que terminamos de guardar tudo.
— O que estão estudando? — perguntou se aproximando.
— Matemática. — respondemos juntos.
— Ah sim. — sorriu, mas fechou a cara em seguida. — , vocês podem terminar depois? Temos um compromisso agora.
— Temos? – falo confusa. — Ok.
Levei o até porta e quando fomos nos despedir acabou acontecendo um selinho, o que nos deixou muito sem graça.
— Eu vi, mocinha. — Olga aparece atrás de mim me dando susto. — Todo esse momento romântico de vocês com essas declarações e até um beijo. Por que não me contou que estava namorando?
— Não exagera, Olga. — exprimi, completamente envergonhada. — Ele é apenas um amigo.
— Amigo, sei.
Fiquei a tarde inteira pensando no que tinha acontecido com o . Eu não queria acreditar no acaso de me apaixonar, ainda mais porque ele é irmão do canalha do . Eles não são iguais, isso é fato, mas quem me garante que isso é seguro? Quem me garante que ele não usa o mesmo joguinho do irmão?
É claro que não usa, supus. Se usasse, o Ethan não teria falado tão bem dele. Mas o Ethan pode não saber. Não pensa mais nisso.
O tal compromisso que minha mãe disse era um evento da empresa dela, onde ela receberia uma condecoração por uma boa administração da empresa. Chega a ser contraditório ela saber administrar melhor a empresa do que a própria vida.
Essas festas são um saco. Nunca gostei, mas a minha mãe sempre fez muita questão. Preferia estar deitada na minha cama, escutando música do que ficar sorrindo forçada e falar um monte de mentiras.
— ? — alguém me chamou enquanto eu estava no jardim do salão, longe de todo mundo. Virei para trás e vi que tinha sido o . Ele sentou-se no balanço ao meu lado. Fiquei surpresa. — Meu irmão trabalha para essa empresa. O que está fazendo aqui?
— Minha mãe vai receber uma condecoração — ri pelo nariz.
Conversamos por horas sobre vários assuntos, mas em nenhum momento nos atrevemos a falar sobre que tinha acontecido ainda hoje na minha casa. Foi embaraçoso para os dois. Até sugerir que o está gostando de mim, ele sugeriu.
— ... — olho para ele. — Eu preciso fazer uma coisa.
— Faz.
Ele colocou uma mecha do meu cabelo para trás da orelha, aproximando-se. Acariciou minha bochecha e automaticamente fechei os meus olhos para me concentrar apenas na sensação boa que isso provocava. Então, ele me beijou.
Semanas se passaram e ainda estávamos tentando escrever a letra. Não conseguíamos nos concentrar porque tudo acabava em beijo. Eu sabia que tinha sido errado dar uma chance para ele, mas estava sentindo alguma coisa por ele. Minha mãe foi premiada com mais uma mentira.
Ah, ela surtou hoje, disse que precisávamos de um momento só nosso e me levou ao shopping. Não confiava muito nisso. Estava esperando cair uma nevasca em pleno verão. Mamãe estava quieta dirigindo o carro concentrada no trânsito enquanto uma música chata tocava na rádio, não era tão chata, mas não era do meu estilo.
— Vamos comprar roupas para você. — disse, trancando o carro. — Nem adianta reclamar.
Ela realmente surtou. Está tão acostumada que eu a contrarie que nem sabe que eu jamais reclamaria de comprar roupa, inclusive estou até precisando. Não tem uniforme na escola que eu estudo e as minhas roupas já estão todas gastas.
Passamos em todas as lojas e compramos tanta coisa que chegamos ao ponto de ter que colocar as sacolas no carro por não ter como segurar. Depois voltamos para o shopping.
— Estou com fome, mãe. — digo baixo. — Podemos comer alguma coisa?
Fomos em direção a praça de alimentação enquanto a minha mãe falava ao telefone com um dos seus funcionários. Pedimos nossos lanches e eu me senti vitoriosa em convencer a minha mãe a comer coisas gordas que não fazem bem para a saúde. A bebida teve que ser suco porque ela disse que era suicídio beber refrigerante com comida gorda.
O que me deixou mais triste foi que estávamos uma de frente para a outra, comendo, e ao invés de conversar comigo, ela falava com um funcionário ao telefone. A ideia não era que ela passasse um tempo comigo? Tive que esperá-la. Quando me levantei, bati sem querer a cadeira em uma senhora, que começou a dar chilique.
— Tinha que ser. — murmurou minha mãe, revirando os olhos.
— Desculpe, senhora. Foi totalmente sem querer.
— Vamos, . Você não fez nada, filha — minha mãe disse juntando as suas coisas.
Já tinha virado de costas quando a mulher me chamou. Ao olhar bem, percebi que se tratava da Cristina, a mãe do .
— ? A Heloísa é a sua mãe? — ela perguntou e eu só assenti com a cabeça.
— Vocês se conhecem? — perguntei confusa.
— Infelizmente. Sinto muito por isso, . A sua mãe não merece a menina de ouro que você é.
Senti meu sangue esquentar. Só eu falo da minha mãe porque só eu sinto. Ah, e eu jamais diria algo assim, apesar de tudo. E quem é a Cristina na fila do pão? A minha mãe deve ter pensado o mesmo, pois perguntou:
— Por que se acha no direito de falar da minha filha se nem a conhece?
— Ela é a namorada do meu filho, estuda canto com ele. Além de ter ido lá em casa algumas vezes.
— A foi na sua casa? — minha mãe perguntou, tensa.
— Ah sim. Não precisa ficar nervosa, Heloísa. Ela se deu muito bem com o pai.
— Pai? — olhei para a minha mãe.
— Canto, ? Namorado?
Hoje no Brasil é o dia mais curto do ano. Aqui está sendo totalmente o contrário: parece que o dia não acaba nunca. Nunca fui muito fã do verão e o seu começo agora me causava um mal estar, pois junto a ele começava também a semana de provas e a entrega dos trabalhos. Ah, claro, o que me dá mais medo ainda que é o trabalho da professora de canto.
Nós não tínhamos começado por motivos bem óbvios. A minha mãe não me deixava sair de casa, então combinamos que cada um faria uma parte e com certeza isso não deu certo. Confesso que iniciei uma letra, mas quando tentei colocá-la numa melodia foi que ficou muito feio.
— Por favor, Lorenzo. — implorei para que ele me deixasse na casa do . — Você pode ficar me esperando no carro. Eu preciso fazer esse trabalho.
No fim das contas, ele me levou na casa do . Dei de cara com uma casa simples, mas moderna e perfeita, ao meu ver. Se algum dia eu fosse morar sozinha, eu escolheria uma casa assim.
Quando toquei a campainha, uma senhora muito fofa me atendeu, dizendo que ele estava me esperando no estúdio dele. Ele tinha um estúdio dentro de casa?
— Olha só quem conseguiu vir! — exclamou sorrindo. — Quando me mandou mensagem, eu nem acreditei.
Ficamos amigos durante esse tempo. O me ajudou muito a dar conta dos trabalhos que precisamos fazer no final do segundo trimestre. Isso meio que deu brecha para que conversássemos um pouco sobre coisas que não envolviam a escola. Hoje, ele sabe muita coisa sobre mim, inclusive sobre o que aconteceu lá em Arraial do Cabo. Por todo esse tempo em que estivemos próximos e principalmente pela sua reação quando eu contei essa história, eu tive certeza de que ele não era o . Tudo bem que ele tinha me dito que nunca foi ao Brasil, mas no início eu ainda tinha as minhas dúvidas. Hoje nem tanto. Ah, a única coisa que escondi da história foi o nome do garoto.
— Eu disse que conseguiria vir. — sentei-me ao seu lado. — Criei algumas coisas, mas não sei se está bom.
Mostrei a ele a melhorzinha das minhas tentativas e eu não estava muito satisfeita com ela, mas...
— , tudo o que você faz é bom. — afirmou, deixando-me levemente corada. — Digo, você é uma das melhores alunas, não é? — sorrio fraco agradecendo o elogio, embora eu acreditasse que fosse algo que estivesse apenas na cabeça dele. — Bom, vamos começar?
Nos concentramos na melodia, sempre achando um momento para brincadeiras. O sempre tinha tudo na ponta dos dedos, uma ideia que se encaixava com a minha e isso fez com que o trabalho ficasse melhor e evoluísse.
— Você não tem nenhuma ideia de quem seja o seu pai? — perguntou enquanto íamos pra cozinha.
— Nenhuma. — suspiro. — Ele sumiu quando eu tinha apenas meses de vida e nunca mais apareceu.
– Eu entendo. Quer dizer, um pouco. Meu pai também me abandonou, sou criado pelo meu padrasto. Nem é tão ruim assim, sabe? Ele gosta muito da gente.
Foi inevitável não pensar na minha mãe e no seu namorado. Aquele cara estava muito longe de ser um pai para mim, fica me paparicando só para agradá-la.
Quando chegamos na cozinha, havia um homem alto e forte na cozinha, devia ser o padrasto dele, mas me deu medo mesmo assim. Pelo que o me contou, é idiotice ter medo desse homem.
— Oi, Ethan. — o cumprimentou. — Não foi trabalhar hoje?
— Não. — essa voz não me parece muito estranha. — Trabalho leve, , resolvi fazer em casa. Quem é essa menina?
— Ah, a mamãe não te avisou? — perguntou com vergonha, parecendo uma pimentinha. — Essa é a , a minha dupla em um trabalho da escola.
— Prazer, . Sou Ethan, quase pai desse doido aqui. — bagunçou o cabelo do menino, o que me fez rir. — Se ele fizer alguma coisa que te magoe você me avisa, combinado?
— O prazer é todo meu. — respondi sem graça.
Antes que eu pudesse falar que ele não tinha com o que se preocupar porque eu e o não temos nada, alguém entrou na cozinha. Alguém que eu conhecia.
— O que é isso? O está de namorada nova e eu não fico sabendo de... — nossos olhares se encontraram — Nada?
Era ele, o . Eu não acreditava que o encontraria depois de tanto tempo. O mundo é realmente muito pequeno. Não soube como reagir e mesmo que soubesse não poderia fazer nada, né?
— Tem um carro lá fora esperando uma tal de... — essa família tem mania de começar a falar e não terminar? — Ah não. — resmungou. No mínimo, me reconheceu.
— Deve ser o meu. — falei rápido, arrumando as minhas coisas. — Tchau, , falo contigo mais tarde.
Ando de pressa para o portão, mas ele me alcança.
— ...
— Agora não, .
Entro no carro, ignorando o que ele me fala e peço para o Lorenzo sair dali o mais rápido possível.
Naquela noite, me ligou, queria saber o que tinha acontecido para eu sair tão desenfreada da casa dele. Foi porque eu não conseguiria ficar por muito tempo no mesmo ambiente que o . Estava ficando tudo bem e ele resolveu aparecer assim, de repente. Desde o dia em que vi o pela primeira vez na escola, eu me senti mal porque era como se o estivesse perto. Eu não estava errada e ele chegou agora para acentuar o que eu sinto por ele: nojo.
Mas é claro que eu não disse isso para o .
— Você saiu tão rápido daqui que nem tive tempo de apresentar o meu irmão, aquele menino que entrou na cozinha de repente. — informou, antes de me perguntar o que tinha acontecido.
Por isso eu não falei. Eles são irmãos. Isso explica muita coisa. Agora tudo parece fazer sentido na minha cabecinha. E pensar que achei que o fosse a verdadeira identidade do , que teria mentido para mim.
Tínhamos mais três semanas de férias pela frente. Para não dizer que não voltei na casa do depois desse lamentável episódio, fui para lá em um domingo por causa de um convite da mãe dele. Tentei ao máximo evitar isso, mas não dava certo. Ele insistiu até que eu dissesse sim.
Fiquei o tempo inteiro ao lado do , esquivando-me ao máximo de ficar em qualquer ângulo que desse para ver o rosto do . Às vezes era impossível, o maldito sempre era citado nas conversas e pelo que me parece ele não tem uma relação muito boa com os pais. Na verdade, isso para mim ficou bem óbvio quando ele me disse que tinha ido ao Brasil só porque tinha brigado com eles.
Muito ao contrário de como era com o , o tinha um convívio maravilhoso com sua mãe e seu padrasto. Vez ou outra, ele até o chama de pai...
E falando nisso, lembrei-me que hoje é o segundo domingo de agosto, dia dos pais no Brasil. Não que fizesse muita diferença estar sem meu pai hoje porque nunca compartilhamos esse dia. É mais um dia normal sem ele. É menos um dia especial que eu poderia passar com ele.
Estávamos todos no jardim da casa deles. e sua mãe brincando com um cachorrinho que eu não tinha visto na primeira vez que vim, Ethan cuidando de algumas plantas e o ... É, ele veio atrás de mim e não deu pra escapar.
— Posso te pedir uma coisa? — perguntou, sentando-se ao meu lado. Eu estava na grama, observando.
— Não. — fui direta, evitando contato visual.
— Não comenta nada com eles — falou mesmo assim.
— Do que você está falando? — me fiz de tonta. Queria ver o que ele diria.
— Arraial do Cabo.
— Nunca fui.
— Você não presta.
— Eu não sou você. — o olhei enfim.
Nos encaramos e com um gesto apontou para o . Ele tinha parado de brincar com o cachorro e agora nos olhava. Sorri para ele e o foi embora, bufando. retornou a brincadeira.
Quem se sentou ao meu lado logo após o sair foi o sr. Ethan, todo relaxado, mas cansado.
— Essas plantas me dão um trabalho. — proferiu, esticando as pernas e eu ri.
O senhor Ethan perguntou se o tinha me incomodado, disse que ele costuma ser inconveniente às vezes. Também falou muito sobre seu enteado não ter superado o sumiço do pai. O é o mais velho e ficou revoltado com o que tinha acontecido, não aceitando de nenhuma maneira que alguém ocupasse o espaço do seu pai. Já o não. Segundo o sr. Ethan, doeu nele também, ainda mais porque não entendia, mas aceitou de bom grado ter outra pessoa em sua vida.
— Ele me falou muito de você também. — hesitou — , certo?
Assenti.
— Contou-me sobre a pessoa incrível que você é. Seus pais devem ter muito orgulho de você.
Baixei a cabeça, triste. Minha mãe deve se decepcionar comigo. Se não agora, depois. Estou mentindo para ela, afinal. Estou estudando música e socializando, tudo o que ela não queria que acontecesse. Sobre meu pai, nem preciso falar, eu acho.
— O meu pai... — respirei fundo, como se fosse criar forças — Me abandonou.
Ele fez uma reação de surpresa. Não dei mais detalhes, até porque eu não tinha conhecimento de tantos.
— Nesse caso, , quem está perdendo é ele.
Sorri fraco.
Para não correr o risco de não me esbarrar outra vez com o , o passou a vir na minha casa. A desculpa que eu dei para que isso acontecesse foi que a minha mãe me proibiu de sair. Pelo menos ele acreditou.
— Para continuar essa parte aqui — indico com o dedo: — Pintaré un oasis en tu desierto, pode ser assim, que este verano dure eternamente que no me vaya nunca de tu mente.
— Muito bom, . — sorriu. — Está apaixonada, é?
— Não, claro que não — digo rapidamente. — Só entrei na mús... — escutei um barulho de salto alto subindo a escada — Se esconde tudo e pega o material que te pedi para trazer.
Minha mãe tinha acabado de chegar e se visse tudo em cima da minha cama ia acabar surtando e descobrindo tudo. Ela aparece na porta assim que terminamos de guardar tudo.
— O que estão estudando? — perguntou se aproximando.
— Matemática. — respondemos juntos.
— Ah sim. — sorriu, mas fechou a cara em seguida. — , vocês podem terminar depois? Temos um compromisso agora.
— Temos? – falo confusa. — Ok.
Levei o até porta e quando fomos nos despedir acabou acontecendo um selinho, o que nos deixou muito sem graça.
— Eu vi, mocinha. — Olga aparece atrás de mim me dando susto. — Todo esse momento romântico de vocês com essas declarações e até um beijo. Por que não me contou que estava namorando?
— Não exagera, Olga. — exprimi, completamente envergonhada. — Ele é apenas um amigo.
— Amigo, sei.
Fiquei a tarde inteira pensando no que tinha acontecido com o . Eu não queria acreditar no acaso de me apaixonar, ainda mais porque ele é irmão do canalha do . Eles não são iguais, isso é fato, mas quem me garante que isso é seguro? Quem me garante que ele não usa o mesmo joguinho do irmão?
É claro que não usa, supus. Se usasse, o Ethan não teria falado tão bem dele. Mas o Ethan pode não saber. Não pensa mais nisso.
O tal compromisso que minha mãe disse era um evento da empresa dela, onde ela receberia uma condecoração por uma boa administração da empresa. Chega a ser contraditório ela saber administrar melhor a empresa do que a própria vida.
Essas festas são um saco. Nunca gostei, mas a minha mãe sempre fez muita questão. Preferia estar deitada na minha cama, escutando música do que ficar sorrindo forçada e falar um monte de mentiras.
— ? — alguém me chamou enquanto eu estava no jardim do salão, longe de todo mundo. Virei para trás e vi que tinha sido o . Ele sentou-se no balanço ao meu lado. Fiquei surpresa. — Meu irmão trabalha para essa empresa. O que está fazendo aqui?
— Minha mãe vai receber uma condecoração — ri pelo nariz.
Conversamos por horas sobre vários assuntos, mas em nenhum momento nos atrevemos a falar sobre que tinha acontecido ainda hoje na minha casa. Foi embaraçoso para os dois. Até sugerir que o está gostando de mim, ele sugeriu.
— ... — olho para ele. — Eu preciso fazer uma coisa.
— Faz.
Ele colocou uma mecha do meu cabelo para trás da orelha, aproximando-se. Acariciou minha bochecha e automaticamente fechei os meus olhos para me concentrar apenas na sensação boa que isso provocava. Então, ele me beijou.
Semanas se passaram e ainda estávamos tentando escrever a letra. Não conseguíamos nos concentrar porque tudo acabava em beijo. Eu sabia que tinha sido errado dar uma chance para ele, mas estava sentindo alguma coisa por ele. Minha mãe foi premiada com mais uma mentira.
Ah, ela surtou hoje, disse que precisávamos de um momento só nosso e me levou ao shopping. Não confiava muito nisso. Estava esperando cair uma nevasca em pleno verão. Mamãe estava quieta dirigindo o carro concentrada no trânsito enquanto uma música chata tocava na rádio, não era tão chata, mas não era do meu estilo.
— Vamos comprar roupas para você. — disse, trancando o carro. — Nem adianta reclamar.
Ela realmente surtou. Está tão acostumada que eu a contrarie que nem sabe que eu jamais reclamaria de comprar roupa, inclusive estou até precisando. Não tem uniforme na escola que eu estudo e as minhas roupas já estão todas gastas.
Passamos em todas as lojas e compramos tanta coisa que chegamos ao ponto de ter que colocar as sacolas no carro por não ter como segurar. Depois voltamos para o shopping.
— Estou com fome, mãe. — digo baixo. — Podemos comer alguma coisa?
Fomos em direção a praça de alimentação enquanto a minha mãe falava ao telefone com um dos seus funcionários. Pedimos nossos lanches e eu me senti vitoriosa em convencer a minha mãe a comer coisas gordas que não fazem bem para a saúde. A bebida teve que ser suco porque ela disse que era suicídio beber refrigerante com comida gorda.
O que me deixou mais triste foi que estávamos uma de frente para a outra, comendo, e ao invés de conversar comigo, ela falava com um funcionário ao telefone. A ideia não era que ela passasse um tempo comigo? Tive que esperá-la. Quando me levantei, bati sem querer a cadeira em uma senhora, que começou a dar chilique.
— Tinha que ser. — murmurou minha mãe, revirando os olhos.
— Desculpe, senhora. Foi totalmente sem querer.
— Vamos, . Você não fez nada, filha — minha mãe disse juntando as suas coisas.
Já tinha virado de costas quando a mulher me chamou. Ao olhar bem, percebi que se tratava da Cristina, a mãe do .
— ? A Heloísa é a sua mãe? — ela perguntou e eu só assenti com a cabeça.
— Vocês se conhecem? — perguntei confusa.
— Infelizmente. Sinto muito por isso, . A sua mãe não merece a menina de ouro que você é.
Senti meu sangue esquentar. Só eu falo da minha mãe porque só eu sinto. Ah, e eu jamais diria algo assim, apesar de tudo. E quem é a Cristina na fila do pão? A minha mãe deve ter pensado o mesmo, pois perguntou:
— Por que se acha no direito de falar da minha filha se nem a conhece?
— Ela é a namorada do meu filho, estuda canto com ele. Além de ter ido lá em casa algumas vezes.
— A foi na sua casa? — minha mãe perguntou, tensa.
— Ah sim. Não precisa ficar nervosa, Heloísa. Ela se deu muito bem com o pai.
— Pai? — olhei para a minha mãe.
— Canto, ? Namorado?
Capítulo 5
Oi, ,
Para ser bem sincera com você, eu não sei como começar essa carta porque não consigo organizar as informações na minha cabeça. Tudo aconteceu muito rápido. Sinto muito por não ter conseguido me despedir.
A primeira coisa que eu gostaria de dizer, e talvez a que mais me exija coragem, é sobre o garoto lá de Arraial do Cabo. Nunca me atrevi a te falar antes porque existia uma chance muito grande de você não acreditar em mim. Agora não faz a menor diferença: estaremos distantes de todo jeito. O garoto era o , por isso o receio em me aproximar de você no início e a necessidade de me afastar de sua casa depois.
Foi por causa dele que meu coração fechou. Por sorte, você encontrou a chave…
Ah, espero que por aí esteja tudo bem. Aqui não está. Penso que posso ter sido muito egoísta por sempre insistir que o Lorenzo fizesse o que eu queria, incluindo mentir para minha mãe. Sim, foi ele quem me matriculou na escola, mas eu poderia ter desistido logo, né? Caso desse errado – e deu –, eu continuaria sendo filha da minha mãe, mas ele poderia ser demitido. No caso, ainda não foi, mas quem me garante que não será?
De qualquer maneira, a minha mãe também mentiu para mim. Ela sempre me disse que não tinha contato algum com o meu pai e outro dia ele esteve lá em casa. Lembro-me que ela tentou até o último momento mudar o local da viagem, deve ter sido por isso. Não sei como o Ethan descobriu que eu tinha vindo com ela, mas ele não me reconheceu quando me viu, . Isso significa muita coisa.
Ele lembra que eu existo, mas eu era tão pequena quando ele me abandonou que não se lembra de mim, de fato. Eu também não me lembro dele. Não tenho nenhuma lembrança em que ele estivesse perto. O meu pai não me criou e nem cuidou de mim porque estava cuidando de outra família. Tem noção de como isso dói?
Eu sempre quis saber quem era o meu pai e agora que sei… Bom, encontro-me em um dilema muito grande. É o Ethan e ele parece ser muito legal, mas não anula o que ele fez, o fato de que ele deixou a família que tinha para trás.
Agora eu preciso mesmo ir embora e vou ter que levar algumas lembranças desagradáveis na bagagem, infelizmente. Mas também tenho lembranças incríveis e essas eu quero levar por onde eu passar porque eu sei que são únicas e que jamais viverei algo igual. Você está em todas elas.
Vou deixar pra você uma música. Foi um rascunho que fiz para o nosso trabalho, mas na época eu não tinha gostado o suficiente. Antes de ir, eu queria te dar algo, além da carta, mas eu não teria tempo de preparar nada. Então encontrei essa música que, ainda que não esteja completa, me pareceu perfeita.
Mesmo que eu vá para outros lados, eu sou muito feliz por ter encontrado. Mesmo que não seja certo que voltemos a nos ver, essa música é pra você.
Não duvide do amor que sinto. Você quem tem asas, mas hoje sou eu quem voarei pelos céus. Então, é isso. Queria poder ficar com você, mas já que preciso ir, não vou te esquecer.
— ? Está preparado? — a professora perguntou e eu assenti com a cabeça, posicionando o violão no meu colo. — Pode começar.
Yo te conocí en primavera
Me miraste tú de primera
De un verano eterno me enamoré
Y esa despedida en septiembre
En octubre sí que se siente
Noviembre sin ti me dolió también
Llegará diciembre, sigues en mi mente
Fueron seis meses y por fin volveré a verte
Llegará febrero, yo seré el primero
En darte flores y decirte que te quiero
Puede que pase un año más de una vez
Sin que te pueda ver
Pero el amor es más fuerte
Puede que el tiempo nos aleje otra vez
Sin saber dónde estés
Pero el amor es más fuerte
Oooh, ooh, ooh
Te esperaré porque el amor es más fuerte
Ya le dije a mis amigos
Yo no necesito nada
Y solo tú estás en mi mente
Mil kilómetros se restan
Cuando dos almas se suman
A lo lejos puedo ver
Solo pienso, solo pienso en ti
Solo pienso, solo pienso en ti
Ya mis primos saben tu apellido
Que por ti yo estoy perdido
Espero que también te pase a ti
Llegará diciembre, sigues en mi mente
Fueron seis meses y por fin volveré a verte
Llegará febrero, yo seré el primero
En darte flores y decirte que te quiero
Puede que pase un año más de una vez
Sin que te pueda ver
Pero el amor es más fuerte
Puede que el tiempo nos aleje otra vez
Sin saber dónde estés
Pero el amor es más fuerte
Oooh, ooh, ooh
Te esperaré porque el amor es más fuerte
Oooh, ooh, ooh
Te esperaré porque el amor es más fuerte
Y yo te conocí en primavera
Me miraste tú de primera
Para ser bem sincera com você, eu não sei como começar essa carta porque não consigo organizar as informações na minha cabeça. Tudo aconteceu muito rápido. Sinto muito por não ter conseguido me despedir.
A primeira coisa que eu gostaria de dizer, e talvez a que mais me exija coragem, é sobre o garoto lá de Arraial do Cabo. Nunca me atrevi a te falar antes porque existia uma chance muito grande de você não acreditar em mim. Agora não faz a menor diferença: estaremos distantes de todo jeito. O garoto era o , por isso o receio em me aproximar de você no início e a necessidade de me afastar de sua casa depois.
Foi por causa dele que meu coração fechou. Por sorte, você encontrou a chave…
Ah, espero que por aí esteja tudo bem. Aqui não está. Penso que posso ter sido muito egoísta por sempre insistir que o Lorenzo fizesse o que eu queria, incluindo mentir para minha mãe. Sim, foi ele quem me matriculou na escola, mas eu poderia ter desistido logo, né? Caso desse errado – e deu –, eu continuaria sendo filha da minha mãe, mas ele poderia ser demitido. No caso, ainda não foi, mas quem me garante que não será?
De qualquer maneira, a minha mãe também mentiu para mim. Ela sempre me disse que não tinha contato algum com o meu pai e outro dia ele esteve lá em casa. Lembro-me que ela tentou até o último momento mudar o local da viagem, deve ter sido por isso. Não sei como o Ethan descobriu que eu tinha vindo com ela, mas ele não me reconheceu quando me viu, . Isso significa muita coisa.
Ele lembra que eu existo, mas eu era tão pequena quando ele me abandonou que não se lembra de mim, de fato. Eu também não me lembro dele. Não tenho nenhuma lembrança em que ele estivesse perto. O meu pai não me criou e nem cuidou de mim porque estava cuidando de outra família. Tem noção de como isso dói?
Eu sempre quis saber quem era o meu pai e agora que sei… Bom, encontro-me em um dilema muito grande. É o Ethan e ele parece ser muito legal, mas não anula o que ele fez, o fato de que ele deixou a família que tinha para trás.
Agora eu preciso mesmo ir embora e vou ter que levar algumas lembranças desagradáveis na bagagem, infelizmente. Mas também tenho lembranças incríveis e essas eu quero levar por onde eu passar porque eu sei que são únicas e que jamais viverei algo igual. Você está em todas elas.
Vou deixar pra você uma música. Foi um rascunho que fiz para o nosso trabalho, mas na época eu não tinha gostado o suficiente. Antes de ir, eu queria te dar algo, além da carta, mas eu não teria tempo de preparar nada. Então encontrei essa música que, ainda que não esteja completa, me pareceu perfeita.
Mesmo que eu vá para outros lados, eu sou muito feliz por ter encontrado. Mesmo que não seja certo que voltemos a nos ver, essa música é pra você.
Não duvide do amor que sinto. Você quem tem asas, mas hoje sou eu quem voarei pelos céus. Então, é isso. Queria poder ficar com você, mas já que preciso ir, não vou te esquecer.
(Lembre-se de mim também.)
Com amor,
.
Com amor,
.
— ? Está preparado? — a professora perguntou e eu assenti com a cabeça, posicionando o violão no meu colo. — Pode começar.
Me miraste tú de primera
De un verano eterno me enamoré
Y esa despedida en septiembre
En octubre sí que se siente
Noviembre sin ti me dolió también
Llegará diciembre, sigues en mi mente
Fueron seis meses y por fin volveré a verte
Llegará febrero, yo seré el primero
En darte flores y decirte que te quiero
Puede que pase un año más de una vez
Sin que te pueda ver
Pero el amor es más fuerte
Puede que el tiempo nos aleje otra vez
Sin saber dónde estés
Pero el amor es más fuerte
Oooh, ooh, ooh
Te esperaré porque el amor es más fuerte
Ya le dije a mis amigos
Yo no necesito nada
Y solo tú estás en mi mente
Mil kilómetros se restan
Cuando dos almas se suman
A lo lejos puedo ver
Solo pienso, solo pienso en ti
Solo pienso, solo pienso en ti
Ya mis primos saben tu apellido
Que por ti yo estoy perdido
Espero que también te pase a ti
Llegará diciembre, sigues en mi mente
Fueron seis meses y por fin volveré a verte
Llegará febrero, yo seré el primero
En darte flores y decirte que te quiero
Puede que pase un año más de una vez
Sin que te pueda ver
Pero el amor es más fuerte
Puede que el tiempo nos aleje otra vez
Sin saber dónde estés
Pero el amor es más fuerte
Oooh, ooh, ooh
Te esperaré porque el amor es más fuerte
Oooh, ooh, ooh
Te esperaré porque el amor es más fuerte
Y yo te conocí en primavera
Me miraste tú de primera
Fim.
Nota da autora: Essa foi a história mais complicada e gostosa de fazer, passei por tantas coisas durante o processo dela que simplesmente foi uma superação em conseguir entregá-la.. Espero que vocês gostem igual amei de escrever ✨
Outras Fanfics:
Childhood Friends – Tom Holland (Em andamento)
My Sexy Doctor – Harry Styles (Finalizada)
Amor de interior (Ficstape)
Nota da beta: Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.
Outras Fanfics: