Capítulo Único

Can anybody tell me why I'm lonely like a satellite?


- Já faz um mês, . Você precisa sair de casa, respirar fundo e fazer alguma coisa com sua vida.
sorria gentilmente enquanto olhava dentro dos olhos da amiga, tentando fazer com que as palavras não soassem como um julgamento ou qualquer coisa do gênero, o que definitivamente não era sua intenção.
- Eu sei, . Eu vou fazer, volto ao trabalho amanhã.
- Isso é ótimo! Porque não me contou?
- Estou te contando agora, foi por isso que te chamei aqui. E também porque preciso de um favor.
- O que estiver ao meu alcance, estou aqui.
- Eu tenho uma consulta às três e não consigo fazer isso sozinha. - engoliu o choro pela milésima vez naquele dia enquanto dizia aquelas palavras.
Fazia exatamente um mês que seu noivo e companheiro há quinze anos - isso mesmo, quinze anos! - havia juntado suas trouxas e ido morar com outra mulher do outro lado do país, deixando para trás uma arrasada e com várias consultas marcadas com uma especialista em fertilidade e concepção. É claro que após tantos anos juntos o desejo de expandir a família apareceu.
Os dois conheciam um ao outro como a palma da mão - ou ao menos ela pensava isso até ele fugir com outra -, tinham uma casa, empregos estáveis e toda estrutura para ter um filho. Desde o momento em que aquela decisão foi tomada, começou a projetar cada detalhe da sua vida para gerar um filho: sua alimentação, rotina, grandes vidros de vitaminas e consultas em todos os tipos de médico. Porém, após quase um ano de tentativas falhas, os dois decidiram procurar uma especialista para ver se havia algo errado com um dos dois e tentar solucionar o problema. E, bom, a consulta com o resultado dos exames era naquela tarde.
Ela poderia simplesmente ligar e cancelar, mas ela queria de fato saber o resultado dos seus exames. Ela já tinha trinta e sete anos e algo dentro dela gritava que aquela era a hora exata para um bebê e que talvez seu relógio biológico não pudesse esperar mais um ano. E agora, mesmo sem ter quem adentrasse com ela nessa jornada, ela gostaria de saber se se ela sequer poderia engravidar. Talvez estivesse velha demais, talvez fosse infértil ou qualquer merda assim, isso explicaria o último ano. De qualquer forma, ela precisava saber, mesmo que isso partisse ainda mais seu coração.
- É claro, . Mas você sabe que não precisa ir, certo?
- Eu quero ir.
Ela não disse mais nada, apenas se levantou do sofá e rumou até o banheiro para tomar um banho longo e se preparar psicologicamente para sair de casa pela primeira vez em dias.

...


- Então, ! Bom te ver novamente. Como vão as coisas?
- Não muito bem no momento, mas prefiro falar sobre meus exames. - ela sorriu, sem graça. a esperava do lado de fora, já que no final das contas achou melhor entrar sozinha.
- Certo. - a médica disse com uma sobrancelha arqueada - Fico feliz em te dizer que tudo está perfeito! Seus exames não apresentaram nada de anormal, assim como os do…
- Eu não quero saber dos exames dele. Não estamos mais juntos.
- Ah, eu… Eu sinto muito, , de verdade. Bom eu…
- Meus exames estão mesmos perfeitos?
- Sim, não vejo nada que poderia dificultar a concepção no seu corpo.
- Eu…
respirou fundo e encarou as próprias mãos, com lágrimas nos olhos. A médica a olhava com carinho e atenção e isso era tudo que a mulher precisava para tirar de si todo medo que pairava no seu coração.
- Eu estou ficando velha, doutora. Tenho medo de que se eu esperar alguém entrar novamente na minha vida, seja tarde demais. Eu quero ser mãe e me sinto preparada para isso agora. Tenho minha própria empresa, meu apartamento e muito amor para dar. Eu sinto que não posso mais esperar, você entende?
- Querida, você tem opções a considerar. Posso te ajudar nesse caminho, se for o que você realmente quer.
- Eu quero. - ela disse sem pensar mais sequer uma vezes - Eu quero ter um filho.

...


- Você está pronta, ? – exclamou animada enquanto as duas entravam no carro. – Você está ovulando! Ovulando! É hoje que vamos fazer esse bebê! – ela sorria de ponta a ponta do rosto.
- Eu estou cem por cento pronta, apesar de morrendo de medo. – ela riu – Vamos fazer esse bebê.
dirigiu com a amiga até clínica no centro da cidade onde faria a inseminação. As duas viraram noites tentando escolhendo o doador perfeito de esperma para no final das contas, sortearem uma das fichas sem ler sequer uma página. A verdade era que não fazia diferença, aquele filho não teria – e não precisaria – de um pai, então não importava quem fosse o doador. Características físicas também eram completamente irrelevantes ao ponto de vista de , então não fazia sentido passar dias escolhendo entre as milhares de fichas que haviam lhe dado.
A mulher passou semanas fazendo testes diários para conferir se estava ovulando até que, finalmente, pôde ligar desesperada para a clínica tentando marcar um horário. era sua companheira fiel e inseparável a todo e qualquer momento, ajudando-a em cada detalhe da nova – e louca! – jornada da vida da amiga.
Quando entraram juntas no consultório, as pernas de tremiam tanto que ela tinha medo de cair no chão a qualquer segundo. sorria, amigável, e segurava sua mão a todo instante.
- Bom dia, garotas. Ansiosas?
- Muito! – respondeu sem conter um sorriso enquanto o médico ajeitava tudo e sentava-se a frente dela.
- Há quanto tempo estão juntas?
- Juntas?! – as duas se entreolharam e caíram no riso – Não, não! Somos melhores amigas.
- Ah, certo, sinto muito! – o homem riu e elas riram com ele – Prontas?
- Sim! – disseram juntas.

...


- ? Você está trancada há quase quarenta minutos. Já sequer olhou?
- Ainda não.
estava sentada no vaso, segurando o teste de gravidez na mão, porem sem coragem para de fato olhá-lo. Ela respirou fundo mil vezes, as pernas tremendo e o coração querendo pular do peito. continuava batendo na porta e falando palavras que, para , pareciam desconexas. Ali na sua mão estava a única resposta que ela precisava no momento, a única coisa pela qual ela levantava da cama todos os dias por desde a inseminação.
Respirou fundo mais algumas vezes, fechou os olhos e segurou o teste na frente do rosto. Abriu lentamente os olhos, soltando o ar pelo canto da boca.

Uma,
duas.

Duas listras.





FIM?



Nota da autora: Sem nota.
Querem falar comigo? Algum erro, comentário, elogio ou crítica? Podem me encontrar no meu Facebook e no meu email. xx





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