Capítulo Único

Silêncio. Passos ao longe, um choro baixo. A sensação delicada de algo tocando sua mão, fazendo choques percorrem lentamente todo seu corpo até seus dedos do pé. Ela queria mover os dedos, queria saber o que a tocava daquela forma. Ela forçava suas pálpebras, tentava abri-las, sem sucesso, e continuava sem saber onde estava e porque estava ali. Ela sabia, porém, que haviam diferentes toques. Sabia que, às vezes, os choques percorriam seu corpo por completo e outras vezes não. Sentia certa familiaridade, certa ânsia por sentir aquilo novamente. Parecia que pequenos pedaços dela voltavam aos poucos para sua mente. Mesmo sem entender muito, ela sabia que seu nome era .

, , .

Quantos anos ela tinha?
De onde viera, o que fazia?
Quem era ela?
E o mais importante: De quem era o toque que fazia todo o seu corpo vibrar?

Ela não sabia quanto tempo se passara, não sabia o que era de fato tempo, mas tudo parecia ir e vir muito rápido ou muito devagar. As vozes, aos poucos, começavam a fazer mais sentido, ficavam mais nítidas e ela conseguia entender uma ou duas palavras.
Três.
Quatro.
Cinco.
Eu amo você.
A cada dia as chances dela acordar diminuem drasticamente.
Se ela tivesse sido encontrada um minuto depois, certamente não teria chegado até o hospital com vida.
Eu deveria ter ido com ela, ela não deveria estar sozinha naquela estrada as duas da manhã, é tudo minha culpa.

Pausa.

A voz, aquela voz. Era ele. O toque, os choques, a ânsia.
Diga de novo, repita, por favor, eu estou aqui.
Eu estou aqui, .
Por favor, eu estou aqui.

Mesmo não sabendo que som era aquela, ela sabia que a acalmava. E sempre repetia aquele som de tempos em tempos, fazendo com que ela vibrasse e forçasse ainda mais suas pálpebras. não sabia quem ele era, mas sabia que o amava incondicionalmente com cada célula de seu corpo quebrado.
Quebrado.
Ela se lembrava do carro virando, das ferragens se contorcendo e formando um casulo ao seu redor. Do frio, o frio intenso que quase levou tudo embora.
Mas já não estava mais frio ali.
E era novamente difícil organizar seus pensamentos ou reconhecer toques e vozes.
Quanto tempo havia se passado?
Muito, muito tempo.

As vozes começaram a ficar mais fortes.
E em especial , que continuava sempre ali, sempre cantando. Agora ela já sabia o que ele fazia, o que era aquele som que a fazia sair do ar e vibrar: ele cantava para ela.
Quando ele tocava sua mão, ela poderia dizer claramente que era uma mão também, sabia que ele a segurava forte e que ela poderia segurar de volta se apenas tentasse um pouquinho mais.

Eu sinto muito, mas não vemos melhora no quadro dela.

Ela pode me ouvir?
Não pare de falar, meu amor, não pare. Sua voz é tudo que ainda me prende aqui.

Eles não podiam ver, mas ela sentia toda vez que os dedos do pé se mexiam.
Ela conseguia mexê-los, lentamente.
E queria gritar: Ei, olhem para os meu pés, vejam, eles se movem!
Eu estou aqui!
Ainda estou viva.
Não vá embora, .

Eu preciso acordar.

Estava frio de novo e ela sentia que a mão dele na sua era a única coisa que poderia a trazer de volta. Ele não parava de vir, mas sua voz parecia cada vez mais cansada. tinha muito medo.

Talvez seja a hora de dizer adeus. Se você decidir desligar os aparelhos, estaremos aqui para apoiá-lo. Seria um final mais digno.

Ela não vai voltar, .

, meu amor. Tudo bem se você precisar ir, eu vou ficar bem. Você pode me ouvir? Eu sempre estive aqui. Eu amo você. Descanse.

Eu estou aqui, , não me deixe ir, eu vou acordar.

Por favor, não me deixe.

Eles iriam mandá-la embora.
Ele apertou a mão dela naquele dia ainda frio com tanta força e soube que precisava acordar naquele exato momento ou seria tarde demais. Ela apertou de volta, ela gritou, gritou, ela gritou que o amava e que ainda estava ali.
E ele gritou de volta.
Médicos, enfermeiras.
Os pés dela mexiam.
Não são espasmos, não são espamos, doutor, ela está aqui.
E então a claridade invadiu sua cabeça, o grande quarto branco se projetava ao seu redor e a única coisa que parecia fazer sentido ali eram os olhos dele, o mar azul dos olhos dele olhando dentro dos seus enquanto todos encarava, descrédulos, enquanto ela tentava se acostumar com a claridade e mover novamente seus pés e mãos.
Ela abriu a boca, mas nenhum som queria sair.
Descanse, descanse, eles disseram.
Mas ela precisava dizer, ela precisava que ele e todos soubessem.

- Eu sempre estive aqui.





Fim.



Nota da autora: Querem falar comigo? Algum erro, comentário, elogio ou crítica? Podem me encontrar no meu Facebook e no meu email. xx





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