Capítulo Único
ATENÇÃO: Os personagens descritos apresentam papéis sociais notáveis, no entanto, não há intenção de crítica a tal. Existem pessoas com caráter e outras não. Não estamos generalizando aqui.
Louis esmurrava a porta sem qualquer delicadeza. Na verdade, era o contrário, usava tanta brutalidade que jurava que ele seria capaz de arrombá-la a qualquer momento.
– , saia agora! – ele ordenava em meio a gritos.
Apesar de assustada e trêmula, a garota não cedeu. Era a primeira vez em sua vida que assistira seu pai tão possesso. Ela, que sempre fora tão obediente e delicada, não estava acostumada a ser alvo de tal ira.
Embora pouco se importasse com o que seu pai sentia quando ela mesma estava destruída por dentro. Seu amor, seu primeiro amor, e talvez, o único, estava entre a vida e a morte em um leito de hospital.
Tudo havia ocorrido rápido demais. Há alguns meses, conheceu , o filho de uma das membras mais fiéis e intensas da igreja de seu pai. Ele não frequentava as reuniões, e por isso não se viam com periodicidade, todavia Deus se encarregou de juntá-los. Ela o encontrava todas as tardes, após seu curso de libras, no armazém, próximo onde o rapaz trabalhava; isso depois de terem trocado telefones em um encontro fortuito na padaria. Seu pai, Louis , não se agradava de qualquer contato entre os jovens. Dizia ele que era um marginal, um fardo para sua mãe que era tão boa serva do Divino, e que a desvirtuaria se ela deixasse-se levar. E apesar dos avisos de seu pai, optou por infringir as regras pelo que ela jurava ser amor.
Semanas e meses de carinhos e afetos se acumularam no calendário do casal. sempre a respeitou, nunca ultrapassando seus limites. Apesar de não ser um devotado seguidor da fé cristã, não se queixava da namorada querer seguir cada Palavra Bíblica ao pé da letra – o que, definitivamente, aconteceu nos primeiros encontros –. De acordo com ele, apenas o amor da garota lhe bastava. acreditava veemente em suas palavras, e certamente se culpava quando, por mais de uma vez, deixou-se levar inebriada pelas carícias do rapaz e acabou em sua cama. As primeiras vezes foram piores, ela admitia; a fornicação era ato contraditório aos princípios cristãos, embora ela já pudesse entender o porquê de tantas pessoas a praticarem constantemente. Um pecado se torna normal quando a consequência não vem de imediato, talvez fosse por isso que não se considerava desvirtuada.
Até pouco, Louis não tinha conhecimento de tais encontros casuais ao crepúsculo. Foi quando Carmen, a mãe virtuosa de , adentrou a igreja, logo após o fim de uma reunião dominical, aos prantos que tudo veio à tona.
– Pa-pastor, pastor! – ela clamava em desespero. – Meu filho. Ore pelo meu filho. – a mulher soluçava.
estava junto ao seu pai, aguardando que os membros se retirassem para que o templo fosse fechado. Assim que ouviu as palavras da outra, aproximou-se dela e a abraçou.
– Acalme-se – tentou dizer sem que aparentasse estar demasiadamente ansiosa. – O que houve, irmã Carmen?
– Me-meu filho. – ela apertava a jovem em seus braços procurando consolo. – Está no ho-hospital.
– O que houve com ? – Louis quem perguntara.
tremia ao se soltar da mulher para que ela pegasse o copo cheio d’água que uma obreira¹ oferecia. Carmen recusou educadamente, afastando com gentileza a mão da moça que insistia em levar o copo a sua boca.
– Obrigado – ela apenas pegou o objeto cheio do líquido e segurou próximo ao busto e esta foi a deixa para que a obreira saísse.
– Tudo vai ficar bem. – a tranquilizava com uma mão em suas costas, como se seu próprio peito não se agitasse atormentado ao ouvi-la falar do filho. No entanto, não conseguia controlar a respiração que se mostrava descompassada.
– Venha a minha sala, irmã. – Louis a chamou. – Falaremos sobre seu filho lá, enquanto tranca as portas.
– Eu quero ajudá-la. – a jovem protestou de imediato.
– Isto não é assunto para crianças, filha.
O pastor já se afastava sendo acompanhado pela mulher chorosa.
– Eu não sou criança. – retrucou em voz alta.
– Vá fechar as portas. – ordenou ríspido, parando de andar para repreendê-la com o olhar.
– Quero saber o que está acontecendo. – sua voz já embargava, sem que pudesse ter controle.
– O que é isto, ? – Louis suspeitou do comportamento da garota.
– Por favor, – ela apertou o passo para alcançar a mãe de seu amado que havia se distanciado com o pastor – Carmen, me conte o que aconteceu.
A mulher a encarou em um misto de emoções. Ao mesmo tempo em que estranhava o nervosismo repentino e digno de preocupação da jovem filha do pastor, sentia compaixão ao perceber sua apreensão. Reconheceu, no entanto, o sentimento transbordante no olhar da mais nova, e facilmente entendeu o que se passava.
Louis já se preparava para repreender a filha com firmeza quando foi interrompido por Carmen.
– Ele estava com amigos – fez uma pausa para recuperar o fôlego – e... Eles foram brincar depois de terem bebido. N-não contaram o que houve direito, mas ele caiu da janela. – a voz diminuiu e seus olhos se encheram de água. – Ele está morrendo, . – soluçou. – O-os médicos disseram que ele não irá acordar mais.
Carmen desmanchou-se em lágrimas novamente, enquanto simplesmente estava em choque.
Era como se o relato da mais velha estivesse se transformado em uma mão invisível capaz de espremer seu coração como um mísero limão. Sem que sequer notasse já chorava copiosamente.
– Não, não, não... – repetia entre soluços. Uma mão aparava seu peito que se mostrava uma clara representação de buraco negro, sugando todas as forças de seu corpo para aquele ponto e gerando-lhe fraqueza. Não achava que seria capaz de ser tão atormentada com apenas a ideia de perdê-lo... Que existisse tanto horror em uma notícia inesperada.
Mesmo antes de se recuperar dos primeiros minutos de surpresa, seu pai já a questionava sobre sua postura. Ao perceber que a jovem não o ouvia, falava mais alto. Sem obter respostas, passou a fazer suposições. Aliás, para ele, estava tudo muito claro naquele momento.
temia o dia em que seu pai descobrisse, porém nunca o havia imaginado daquela forma. Não dava a mínima para o esporro que seu pai lhe aplicava. Na realidade, indignava-se com a capacidade dele de deixar o assunto importante da vez como segundo plano.
– Como pode se preocupar com isso quando tem alguém morrendo em um hospital? – estava em prantos. Não gostaria de admitir que fosse tanto pela situação de quanto pela reação de seu pai que sequer fingia respeitar o desespero da mãe do rapaz.
– Alguém cuja senhorita mantinha um relacionamento escondido! – Louis a apontava com o indicador em riste.
– Meu Deus, pai. Nada disso importa. Vamos orar por ele, por favor. – tentou ao máximo reprimir sua frustração enquanto pedia. Aliás, ainda havia esperança, e e Carmen agarravam-se à fé como solução. – Por favor, ele precisa disso e precisa sair daquele hospital.
Louis calou-se naquela hora. Reuniu-se a Carmen e ao grupo de intercessão da igreja para pedirem a Deus, ao pé do altar, misericórdia pela vida de . No entanto, foi impedida de juntar-se a eles. Enquanto intercediam, ela encarregou-se de atravancar o templo, não deixando de seguir mentalmente com suas próprias preces.
O momento de paz logo esvaiu. A intercessão não poderia durar a noite toda, e mesmo se pudesse Louis não permitiria. Ele precisava tratar do que lhe era de interesse próprio, a conservação de sua boa imagem, cuja sua filha colocava em risco. Carmen já havia partido pela porta detrás, acompanhada do grupo de oração, quando seu pai retornou a questioná-la:
– Vai me explicar o que foi aquilo?
Não houve respostas.
– Quantas vezes eu a avisei, ? Há muitas pessoas na igreja para se relacionar! O que você tem na sua cabeça tola de cair na conversa de um cético? E infringir minhas ordens? – Seu tom subiu duas oitavas. – O que você fez com este garoto? – o velho transpirava, o tom avermelhado subiu por seu rosto no mesmo tempo em que liberou um alarido – O que você fez, ?!
A menina não ousava sequer sibilar algo. Estava temerosa e seu interior gritava para que ela fugisse; se afastasse. Seu pai jamais a entenderia, e por àquela hora, ela só queria estar com .
– Eu estou falando com você! – caminhou em passos pesados até ela.
, por sua vez, deu um passo para trás, intimidada. – Nós nos víamos ás vezes – soltou ligeira quando a proximidade de seu pai se tornou perigosa. – Ao entardecer, depois do curso de libras. Viramos amigos…
– Não minta para mim. – vociferou ele.
– Não estou mentindo. – a menina choramingou. Conteve-se, porém. Seu desejo era mandar tudo para os ares e se lamentar, chorar livremente sem ninguém para julgá-la.
– Você se envolveu com este rapaz? – silêncio sucedeu a pergunta por tempo suficiente para instigar ainda mais a ira do pastor. – Responda!
– Eu me apaixonei por… – ela confessava entre fungos, contudo fora interrompida pelo impacto da mão do homem em sua face.
O tapa desferido pelo pai a levou ao chão e os segundos que sucederam o ato foram preenchidos pelos soluços de em sua total descrença pela reação inusitada do mais velho.
– Eu devia ter desconfiado antes – murmurou o homem. – Sorrisinhos bobos, atrasos acompanhados de explicações ridículas! Eu confiei em você, sua traidorazinha – Ele tentou machucá-la mais uma vez, no entanto ela fora mais rápida.
, prevendo seus movimentos, arrastou-se para longe até conseguir levantar-se. – Pare! – ordenou, erguendo o pequeno castiçal que compunha a decoração do altar para se defender.
– O que pretendia com isso, ? Arruinar-me? Arruinar nossa família e a igreja como a vadia da sua mãe tentou fazer?
– Não fale assim dela! – ousou elevar o tom de voz pela primeira vez. Entretanto, mesmo com palavras firmes, o pranto pintava seu semblante.
– Ainda por cima, com um delinquente, drogado e maldito...
– Como pode dizer estas coisas? Estava ao lado da mãe dele pedindo por sua vida há minutos!
– Nós dois sabemos que quando se trata de pessoas como ele reza nenhuma bastaria. Só resta-lhe o inferno!
encarava-o incrédula. O sentimento em relação a se tornava cada vez mais intenso; o medo de perdê-lo cada vez mais palpável e o amor cada vez mais nítido. Já em relação ao seu pai, transformava-se; a raiva, a incompreensão e a irreverência cresciam tanto que lhe eram causados leves tremores de repulsa. Os laços fraternos não deixariam de existir, todavia naquele momento, não se via como filha daquele homem.
Reconhecia o assombro e o cuidado que ele tinha para com sua imagem perante a sociedade, e que para mantê-la Louis fazia seu papel. Era abnegado e bom na maior parte do tempo com todas as pessoas da igreja, nunca negando nada a ninguém e sempre enchendo os ouvidos alheios com palavras sábias. Contudo, pode-se afirmar veemente que ninguém é perfeito. A bondade de Louis tinha limites quando se tratava de manchar a reputação de sua igreja, sua família ou a própria, e não eram medidos esforços para acabar com qualquer ameaça. A mãe de era um belo exemplo disso.
Antes, Jesus também fora odiado. Certamente, Louis havia se esquecido de tal fato. Qualquer inimigo que se declarasse teria uma resposta definitiva, dada somente por ele e sem nenhum envolvimento celestial.
nunca imaginou que este lado de seu pai fosse tão vivo aponto de machucá-la e não permiti-lo compreender que a vida de alguém era mais importante do que aquela discussão.
– Eu irei vê-lo no hospital.
Ao anunciar a garota já se afastava para alcançar a bolsa sob um dos bancos dispostos na primeira fila.
– Está proibida de vê-lo em qualquer circunstância. – berrou autoritário.
– Isso não é um pedido. – atravessou a bolsa no corpo, sem coragem de olhar nos olhos do mais velho, e seguiu para a saída.
Louis correu furioso para impedi-la. Prevendo que seu pai seria capaz de alcançá-la antes que pudesse destrancar a grande porta e deixar a igreja, refugiou-se na primeira saleta que conseguiu abrir. Trancou-a com mãos apressadas e sobressaltou-se quando o primeiro murro de seu pai repercutiu sobre ela. Começaram então mais gritos.
Sua audácia de momentos atrás pareceu dissipar-se nos primeiros minutos em que se viu trancada ali; o pranto retornou a garganta e olhos quase abruptamente por encontrar-se sem saída e com medo de que seu pai fosse capaz de arrombar a porta e tomá-la em sua fúria.
Entretanto, esses minutos foram o suficiente para que , e somente ele, tornasse a reger seus pensamentos, pois apesar do receio que tinha em relação ao pai, os sentimentos que a guiavam naquela noite eram somente sobre . Com isso, nada diante de seus olhos parecia demasiadamente dificultoso – a amargura se seu pai e a selvageria dele sobre si, ou até mesmo o fato de estar presa e não poder ir de encontro a , aparentavam ser meros detalhes. Estava certa, de todo seu coração, que sairia dali e o veria novamente, o tocaria de novo. Não permitira que fosse diferente.
Determinada como nunca estivera, procurou uma forma de escapar. Nada ao seu redor parecia útil, no entanto – a janela era alta e pequena demais, não havia outra porta e o resto eram livros e alguns papéis –. Mesmo com a balbúrdia que seu pai fazia estando bastante audível, conseguiu pensar em um plano. Sacou o celular da bolsa e ligou para Aylee, a garota do grupo de jovens que esteve na intercessão por mais cedo.
A chamada fora rápida. Aylee estava aguardando o ônibus no ponto quando atendeu. Ela suspeitou do pedido de e dos barulhos que ouvia ao fundo, mas consentiu com a amiga sem fazer muitas perguntas.
Os gritos de seu pai cessaram pouco depois. Concentrando-se, podia ouvir a voz de Aylee quase inaudível, e as respostas do pai soando mais baixas conforme ele se afastava da porta para atender a menina que adentrara o templo.
Um sinal em seu celular era sua deixa. Destrancou cuidadosamente a porta da saleta, e os ruídos foram abafados por uma música que fora colocada naquele momento propositalmente. Aylee e o pastor estavam a alguns bons metros de distância, mais precisamente, ao lado da aparelhagem de som da igreja. Antes que deixasse a saleta por completo, a música subiu de tom notavelmente. A asiática e o pastor se distraiam tentando a todo custo encontrar o botão ou dispositivo que diminuísse o volume estridente.
não era o tipo de garota que fugia das regras, com exceção de seu romance proibido com , ela não era acostumada a armar planos de fuga. Talvez isso justificasse sua tremedeira. Contudo, estava quase confiante que obteria sucesso no plano em questão. Louis nunca permitiria que Aylee ou qualquer outro membro ou colaborador conhecesse outra faceta sua que não fosse a de bom pastor.
Ela apostava que fora por isso que ele não gritara seu nome ou correra para impedi-la de sair quando a percebeu se esgueirando para fora do templo pela porta que Aylee havia largado aberta propositalmente. Ele, certamente, desconfiaria da asiática como cúmplice da fuga, mas nunca revelaria qualquer sentimento ou opinião que contrariasse sua fama de bom samaritano, e isso incluía brigas familiares com sua filha pecaminosa.
Mesmo sabendo disso, o coração de congelou no instante que notou o olhar do pai sobre si. Abaixou a cabeça envergonhada, como se pedisse desculpas antes de partir.
Correu pelas ruas desertas, em partes por ter receio de seu pai resolver tentar pará-la, mas principalmente, por estar ansiosa para estar ao lado de .
O trem não era uma opção daquela vez, pois podia facilmente ser encontrada esperando na estação, caso seu pai já houvesse mudado de ideia em relação à ida dela ao hospital e já tivesse se livrado de Aylee. No entanto, não era fácil encontrar um táxi ou qualquer transporte público às dez horas da noite em Zaanse Schans. Era uma vila pequena e praticamente rural localizada no município de Zaandam na península da Holanda do Norte. Quando encontrou algum, este deixava um turista bêbado na porta de uma pousada, e ela já caminhava à aproximadamente 15 minutos.
Instruiu o motorista jovem e de cabelos castanhos encaracolados a ir até o centro hospitalar mais próximo do munícipio. não sabia onde estava, mas julgava pelo diagnóstico que Carmen havia passado que ele não estaria no pequeno ponto de atendimento a saúde da vila. O lugar oferecia uma bela paisagem holandesa – cabritos, fazendas, moinhos, bicicletas e até tamancos –, entretanto não tinha estrutura para cuidar de alguém com ferimentos graves como os que Carmen havia relatado. Isso era trabalho para os centros municipais urbanizados.
A morena fixou-se em seu reflexo no vidro da janela assim que o automóvel entrou em movimento. Seu rosto estava levemente inchado pelo choro e a maquiagem de seus olhos havia espalhado e borrado a curva do nariz e o alto de suas bochechas. Tentou se limpar, mas sua aparência permanecia próxima de deplorável.
A vibração do celular em seu bolso a despertou de sua autoanálise no reflexo no vidro. Apanhou o celular dentro da bolsa apreensiva em ser o pai a ligar. Agradeceu a Deus em uma breve prece ao avistar o contato de Aylee brilhar na tela, e em seguida arrastou o ícone verde para atender a chamada de voz.
– Olá, – a menina cumprimentou sarcástica em seu sotaque engraçado. – Seu pai já foi para casa, e ainda foi muito gentil em me dar uma carona. Agora você pode me contar o que pensa que está fazendo?
Aylee podia ser três anos mais jovem que , mas ainda sim, era a mais austera entre as duas.
– Estou indo ver no hospital. – respondeu sem qualquer emoção na voz.
– Santo Deus, ! Desde quando você é tão indisciplinada desse jeito? Tenho certeza que seu pai a proibiu de vê-lo.
– Eu não sei. – suspirou. – Eu não sei de nada. Nem o hospital em que ele está! Mas estou disposta a procurar em quantos forem necessários.
– Você é louca. – a outra murmurou.
As duas calaram-se no silêncio mais desordeiro que se podia imaginar.
refletia sobre as palavras de Aylee. Ela sabia que louca, naquele caso, era só outra palavra para impulsiva ou inconsequente. Entretanto, ajudou-a a perceber o quanto havia mudado desde que conhecera . Quase tudo o que ela jurava ser primordial, não fazia mais tanto sentido. Prometera a si mesma que não permitiria se desvirtuar por quem quer que fosse, e estava certa de estar cumprindo tal promessa até aquela noite. não era a mesma de meses atrás, um peso em seu coração lhe indicava isso; ela estava apaixonada agora. E mesmo que não admitisse para si, temia o que tal sentimento lhe causaria.
Ao mesmo tempo. Aylee travava um conflito interno entre ajudar a amiga a tirar aquela loucura da mente ou auxiliá-la em seu objetivo. Temia que fosse capaz de desviar do propósito cristão caso fosse apoiada em seu plano; o pastor Louis havia sido muito convincente em seu sermão indireto durante aquela carona. Contudo, a filha do pastor também a havia convencido com seu tom, de que estava determinada a procurar por em todos os hospitais da região até encontrá-lo.
– ? – chamou parcialmente hesitante, quebrando o silêncio que se instalara por alguns minutos.
– Oi, Aylee.
– Para qual hospital você está indo?
– O hospital do centro da cidade. Por quê?
– não está na cidade.
– Não está na cidade? – já sinalizava para que o taxista parasse.
– Não. Eu acompanhei Carmen até que o carro dela chegasse e a ouvi dando instruções ao motorista para que dirigisse para Amsterdã.
– Amsterdã? – repetia alto para que seu motorista entendesse.
– Sim. Hospital Amstelland, se não me engano.
– Amstelland Hospital em Amsterdã. – ditou para o motorista encaracolado que alterava a rota naquele instante.
– Isso.
– Obrigada Aylee. Você é um anjo. – agradeceu realmente grata pela ajuda.
– Não me traga arrependimentos. – a asiática pediu em seu quase perfeito holandês.
soltou uma risada leve. – Boa noite, Aylee.
– Boa sorte, . – respondeu antes de encerrar a chamada.
O caminho de Zaanse Schans até Amsterdã era feito em aproximadamente vinte minutos, porém eles já haviam se afastado demasiado da vila, o que alongava o tempo até o novo destino. Tempo de sobra para que a apreensão retornasse para atormentá-la. Proibiu-se de entrar em desespero novamente, no entanto. Com isso, tentava alternar os pensamentos para algo ou alguém que não fosse ou Louis. Martha, sua mãe, lhe surgiu e para sua própria surpresa, não tentou espantar a lembrança da mulher como comumente fazia.
Louis a odiava por não ser ela a típica esposa submissa que não tem voz ou vontade própria e é idealizada para ocupar o lugar de mulher do pastor na hierarquia eclesiástica que era implantada naquela igreja. Martha falava, gritava e cantava tudo que sua moral construía, sem se importar se aquilo era contraditório ao que seu marido pregava. Alguns podiam vê-la como histérica, contudo compreendia que ela apenas tinha interpretações divergentes das passagens bíblicas, as quais eram totalmente desprezadas por Louis. Ele cria que as ideologias de Martha não mereciam seu tempo ou atenção e quando ela se cansou de fazer papel de estátua e de ser rebaixada todas às vezes que abria a boca, optou por partir e ser vista como a vadia que abandonou a família ao ser a coitada e robótica esposa de Louis .
Aliás, abandonar era uma palavra muito forte. mantinha contato periódico com a mãe e ambas se tinham como melhor amiga uma da outra. E naquele dia, mais que em todos os outros, ela apoiava a mãe em sua decisão e até sentia sua falta naquele momento em que tudo parecia uma imensa bagunça em seu coração e mente. Fortalecia-se ao imaginá-la, reconfortando-se com a ideia de que não estaria errada só porque seu pai dizia isso, assim como ocorreu com Martha.
O motorista pigarreou para que percebesse que já havia chegado.
– Oh, me desculpe. – desculpou-se enquanto vasculhava sua bolsa para catar algumas notas, como forma de pagamento. Estreitou os olhos para enxergar o taxímetro que marcava o valor a ser pago pela viagem e mordeu o lábio inferior com força ao entender o número expresso.
Demorou um pouco, mas logo havia juntado todos os trocados e entregado ao motorista, ficando somente com cinco euros em sua carteira. Agradeceu a Deus, mais uma vez, por Aylee ter lhe dado uma informação valiosa, caso contrário, procuraria sem o auxílio do taxista.
Desceu do carro despedindo-se do motorista simpático e recebendo uma lufada de vento gelado. O abraço do frio a acompanhou até que adentrasse a recepção do Amstelland Hospital em passos apressados.
Não sabia dizer se sua respiração descompassada era pela ansiedade de vê-lo ou pela preocupação que naquele instante parecia tão real. Mal conseguia falar quando cumprimentou a recepcionista com um aceno de cabeça e pronunciou o nome do rapaz:
– . – disse para a recepcionista que a fitou dos pés a cabeça descaradamente. Encolheu os ombros sem graça pela displicência da outra. – Acredito que ele esteja...
– Qual é o seu nome, por favor? – interrompeu-a.
– .
– Ah, certo. Senhorita , não estamos em horário de visitas. – a ruiva lhe deu um sorriso forçado, nem um pouco simpático.
– E que horas é o horário de visita? – perguntou sentindo um nó incômodo apertar a garganta.
– Amanhã, somente.
– Mas ele está... Bem?
– Não sou eu quem deve fornecer estas informações. – murmurou em resposta.
– E quem fará isso por mim? – conteve ao máximo a irritação que a indiferença da recepcionista fazia refletir em sua voz.
– Ninguém no momento está disponível para receber visitas ou lidar com elas, senhorita .
– Certo. – forçou um sorriso antes de se afastar do balcão.
Ela não poderia ir embora. Para onde iria? Para casa? Nem que lhe forçassem voltaria lá e encararia seu pai em sua revolta. E mesmo que quisesse, só havia cinco míseros euros em sua carteira, o que serviria apenas para uma passagem de trem – e seria útil, se a estação não fosse demasiadamente longe de sua residência e àquela hora não fosse a ideal para uma jovem perambular sozinha por ruas tão desertas.
Não.
Não importava os motivos que ela encontraria mentalmente para não seguir rumo à Zaanse Schans, pois simplesmente não arredaria o pé dali sem antes ter certeza de que ficaria bem. Fora para isso que ela enfrentara seu pai e atravessara Zaandam. Dormiria ali, se necessário. Imploraria por uma notícia ou a chance de uma visita a quem quer fosse. Não estava dando a mínima para seu próprio bem-estar ao tomar sua decisão, permaneceria ali até o dia seguinte e no horário que lhe permitisse, ela o encontraria. O que sucederia não interessava naquele instante.
Encheu um copo d’água no filtro que havia próximo a uma grande porta de vidro, e em seguida se reuniu a alguns poucos pacientes e acompanhantes nos bancos de espera. Sentia o olhar incômodo da recepcionista sobre si constantemente, foram necessários alguns minutos para que se sentisse confiante para retribuir. A ruiva parecia inquieta por trás do balcão, o que despertou sua curiosidade.
No entanto, a atenção de ambas as jovens passou para a porta de vidro que havia se aberto, liberando a passagem para várias senhoras que aparentavam ter em média cinquenta anos de idade, algumas já com cabelos grisalhos. Era inquestionavelmente notável a presença delas ali, pois falavam alto e eram muitas, além de estarem adentrando um recinto em que o silêncio era cortante como um bisturi há segundos.
abaixou a cabeça para evitar examiná-las e com isso parecer desagradável. Mas uma voz em meio aquele escarcéu de outros tons lhe fez erguer a cabeça e procurar sua respectiva reprodutora. Um pouco mais afastada, ainda perto da porta que separava a sala de espera de alguma ala de atendimento, estava a mais baixa dentre as mulheres. Carmen, com seus cabelos tingidos em um vermelho que já se desgastava e se misturava com o castanho de sua raiz, agradecia sem muita intensidade – como uma rosa murcha – àquelas senhoras pela visita e por suas orações.
Quando notou já estava de pé em frente a recepcionista, que tinha suas bochechas tão rubras quanto seus fios naquele momento, não fazendo questão de esconder seu desapontamento.
– Você disse que o horário de visitas havia acabado então o que essas mulheres fazem aqui? – apontou-as descaradamente.
Antes que obtivesse alguma resposta, alguém lhe tocou o ombro. A menina se virou abruptamente para atender o chamado, assuntando a pessoa que a tocava.
– ? – uma das senhoras grisalhas que estava ali. – ? Filha do...
– Isso mesmo. – forçou um sorriso.
Aparentemente, aquela mulher a conhecia por ser da igreja em que seu pai era pastor. “Ótimo.”, pensou sarcasticamente.
– Ora, criança. O que faz aqui em uma hora como essa? – colocou as mãos na cintura, olhando-a como se fosse uma garotinha que aprontara alguma.
Conteve o instinto de revirar os olhos ou ser simplesmente mal-educada. Não estava no clima para lidar com pessoas intrometidas que se consideravam suas responsáveis apenas por ela ser filha do pastor da igreja que frequentavam. sequer sabia o nome daquela mulher.
– Vim ver . Pelo visto, a senhora acabou de deixar o quarto dele. Como ele está? – sua nítida raiva era expressa em seu tom satírico e seu sorriso falso que chegava a parecer torto em seu semblante - grande era o esforço que fazia para colocá-lo ali.
– Oh, sim. – a mulher sorriu fechado, aparentemente não notando a neurastenia de . – Ele não parece muito bem, mas está estável há um bom período. Não sabia que vocês eram amigos.
– Amantes, se preferir. – não conteve a risada. Sua ousadia repentina –e bipolar – era hilária.
A mulher também riu, apesar de aparentar desentendimento. Talvez imaginasse que tudo fosse apenas uma brincadeira por parte da filha do pastor.
– . – outra voz lhe chamara.
Olhou por cima do ombro da mais velha com quem perdia tempo e enxergou Carmen, nada surpresa com sua presença.
– Olá, irmã...
– Seu pai disse que viria. – ela sorriu sem mostrar os dentes.
apesar de repentinamente ansiosa por estar falando com a mãe de , percebeu que a mulher olhava por cima de seu ombro, mais precisamente, para a recepcionista ruiva que a impedira de entrar. Quando captou o que acontecia, a ira retornou ainda mais ardente em si, mais difícil de conter.
– Eu quero vê-lo. – inquiriu firmemente. – Agora.
– Isso não será possível, querida.
– E por que não será possível?
A resposta não veio de imediato. Quando a mulher com quem conversava anteriormente percebeu o que se passava, afastou-se para perto das outras que assistiam a cena a alguns metros.
– Eu e seu pai...
– Não podem me impedir de vê-lo!
– Podemos, querida. – apesar do clima, sua voz era mansa. – E é o que estamos fazendo. Para o seu bem.
– Bem? Afastar-me de alguém que amo em um momento como esse é algo para o meu bem? – ela indagava incrédula.
– Sim, . Você pode não entender isso agora, – tocou no ombro da mais jovem – mas no futuro irá perceber. Meu filho não é o rapaz certo para você. Ele tem problemas...
– Como pode dizer isso do seu próprio filho? O que meu pai fez com você?!
– Não é porque ele é meu filho que eu fecharei os olhos para os pecados dele. Tenho conhecimento de que sua alma herdará o inferno, caso Deus não lhe conceda uma chance de voltar e se arrepender. – a voz dela embargava notoriamente.
se calou por instantes, as palavras daquela mulher pesando em seu coração. Então, realmente, todos criam que não teria salvação... Que ele não seria digno de tal. Só resta lhe o inferno.
– Me surpreende – começou a dizer com olhar perdido em um ponto qualquer atrás de Carmen. – como vocês, que se consideram merecedores da Salvação Divina, podem achar que cabe aos senhores decidir quem vai para o Céu ou para o Inferno. – olhou-a nos olhos enfim. – Não cabe a vocês julgar qualquer pessoa ou destino. Nem vocês sabem o que tem por trás da morte.
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Havia deixado o hospital com uma explícita ameaça: “Eu contarei onde você está ao seu pai”. Não foi Carmen quem disse, mas sim alguma das mulheres que se aglomeravam na entrada do hospital e abominaram sua postura durante a discussão.
ria internamente ao se lembrar do momento em que agarrara o celular da senhora que a ameaçara e jogara no meio da avenida em frente o hospital. A dona do aparelho, indignada, tentou resgatá-lo antes que algum automóvel passasse por cima. Era a parte favorita da jovem na narrativa que fazia mentalmente: dera as costas para o hospital naquele momento, mas a sequência de sons denunciou o que acontecera em seguida. Uma buzina, um grito agudo e crack.
Apenas seguiu seu caminho sem se importar com quem praguejava atrás de si, mas aquele acontecimento lhe consolava. A ira que ela continha não poderia ser guardada daquela vez. Já havia muitos sentimentos ruins com que lidar.
Foi ao perceber o efeito positivo de sua rebeldia que tomou coragem para entrar em um bar de esquina, bastante movimentado. Sentou-se em frente ao balcão iluminado por uma luz vermelha e alcançou os cinco euros em sua bolsa antes de murmurar para o barman:
– Uma cerveja.
Sim, ela iria fazer isso. Como dissera à Carmen, não sabia o que havia depois da morte... Não acreditava em nada naquele momento, pois sua fé não parecia consolá-la, não se ela dizia que seu amado estava destinado ao sofrimento eterno. Ele morreria e queimaria no inferno, era o que os religiosos a sua volta insistiam em dizer. Pois bem, ela estava preparada para seguir pelo mesmo caminho.
Sorveu metade do líquido contido na garrafa de uma vez, dispensando o copo que fora oferecido. O sabor não a agradava em nada, no entanto insistiu em tomar o resto sem desencostar a boca do gargalo por sequer um segundo.
– Hey, gatinha, é melhor ir devagar. – uma voz masculina se pronunciou ao seu lado.
Mirou o homem assim que todo o líquido que restara na garrafa já havia sido transferido para sua boca, causando-lhe uma leve tontura pela pressa em que tudo acontecera. Ele não a encarava, apenas bebericava sua própria bebida de forma despreocupada. Seus olhos estavam na televisão a alguns metros, onde era transmitido um jogo qualquer com coreanos que corriam de um lado para o outro. Não se conteve ao prosseguir em sua análise. Algo era estranho naquele homem de barba por fazer e cabelos negros ajeitadinhos. Suas roupas eram displicentes, quase como os turistas americanos. É... Talvez ele fosse um turista, seu sotaque diferente o denunciava. Um turista que cheirava muito bem, por sinal.
Logo perdeu interesse naquele homem que a ignorava e passou a contar às moedas que tinha de troco.
– Quanto é a cerveja? – perguntou ela ao barman que passava com pressa e acabou por ignorá-la.
– 2,80 – o mesmo rapaz se fez presente novamente. – Se for euro.
– Falta... 60 centavos – constatou em voz alta ao contar as moedas novamente.
O homem riu.
– Eu sou engraçada, senhor? – ela virou-se para ele, dando de cara com seus olhos incrivelmente azuis.
– É sim. – ele afirmou com um sorriso zombeteiro.
arqueou uma sobrancelha, tentando compreender quais eram as intenções daquele homem. Turistas abusados.
– Se está me olhando assim para me seduzir e convencer a te pagar uma bebida, você conseguiu. – ele acenou para o barman na outra ponta do bar e o mesmo acenou de volta pedindo um momento.
– Pode guardar esse seu dinheiro sujo, eu não sou nenhuma colega que vai aceitar ir pra cama com você por causa de uma bebida. – ela piscou esperta. De uma coisa era certa, não precisava envolver ninguém em seu plano de desvirtuação, muito menos alguém que poderia trazer mais perda do que ganho. Já ia recolhendo suas moedas, preparada para sair, quando o ouviu dizer em meio a risos:
– Não esperava menos de você, .
A garota voltou-se para ele, parcialmente assustada. Foram necessários alguns segundos para sua expressão ser alterada da água para o vinho quando disse:
– Você me conhece? – perguntou com um sorriso que não pôde conter quando uma ideia brilhou em sua mente. Era tudo o que ela precisava. Alguém para contar de suas traquinagens para seu pai. Era como um plano de vingança, ou se não, ela mesma o contaria antes de partir de casa – não sabia como faria, mas era um plano que dependia também do estado de .
Ela não era assim. Não tinha vontade de beber todas e permanecer em lugares como aquele, conversando com estranhos que certamente tinham más intenções. Mas aquela nova adrenalina, a sensação do novo – que nem sempre era tão agradável – não permitia que seus pensamentos ficassem presos aos problemas. Aquilo não era uma solução, era um alívio. Tanto para sua preocupação com , quanto para sua ira com as pessoas que o maldiziam. Também era uma forma de dizer que as pessoas não poderiam controlá-la como imaginavam. Ela amava , não importava mais quem estava contra ou a favor, era sua vida que contava. E ela estaria com ele de todas as formas possíveis, faria de tudo para que nada pudesse atrapalhá-los, nem mesmo o que os esperava após a morte.
– Quem não te conhece naquela vila? – ele revirou os olhos.
– Eu não te conheço.
– E está interessada em conhecer, por acaso? – a mirou de canto de olho e soltou um risinho debochado.
– Talvez. Se você tiver coragem de contar tudo o que eu for fazer em detalhes sórdidos para o meu pai...
– Você quer que ele saiba que você esteve aqui? – perguntou surpreso.
– Sim. – afirmou ela com naturalidade.
– Eu estou com cara de mensageiro, senhorita ? – ele franziu a testa.
– Está com cara de quem quer ganhar algo com isso, senhor...
– . – completou. – Me chame de . E não, não quero nada de você – sorriu antes de voltar a se ocupar com sua bebida.
– Como me conhece?
estava confusa. Como ele podia conhecê-la da vila? Jurava que era mais um turista americano exibido. Zaanse Schans era minúscula! Era óbvio que ela saberia se um norte-americano houvesse se mudado para lá.
– Você é a filha do pastor...
– Tudo bem, mas você não frequenta a igreja. Nunca o vi lá, certamente me lembraria.
– Eu pareço ser alguém difícil de esquecer, não? – exibiu-se entre um gole e outro.
– Responda minha pergunta. – pediu soltando um leve riso. – Se possível depois de pagar minha cerveja.
Dessa vez, quem ria era ele, mais intensamente, no entanto.
Depois de ter feito o que ela pediu e o pedido ter sido entregue, ele tornou a falar:
– Eu levei Aylee, algumas vezes a igreja. Ela faz alguma coisa lá, tem até uniforme...
– Aylee? – perguntou surpresa. – É uma das minhas melhores amigas. – Sorveu o primeiro gole da garrafa.
– Sim, eu soube. – suspirou. – Ela é minha filha.
engasgou-se. De forma digna, com direito a cuspe e uma sequência infinita de tosses na tentativa de se salvar de um afogamento. a ajudou, ou tentou da melhor forma possível, repetindo a palavra “calma” diversas vezes. No fim, todos os olhavam e ele não pôde conter a gargalhada.
– Você está bem? – ele mordia o lábio inferior para se controlar ao olhá-la.
– Pai da Aylee?! – indagou em tom de incredulidade. – Você não parece ter idade para isso! Só pode ser uma piada!
– Eu agradeceria se não fosse verdade. Eu realmente me tornei pai muito novo.
– Conheço Aylee, desde minha infância...
– Nunca tive permissão para me apresentar como pai dela, tanto pela mãe, que é uma devota serva de Deus que nunca iria para cama com alguém mais novo e livre de um laço matrimonial, – ele debochou. – quanto, pelos meus empresários. Uma filha aos dezesseis anos nunca fará bem a carreira de alguém, ao que parece.
– Você é famoso, por acaso? – questionou confusa.
– Gosto de vocês. – ele sorriu ao encará-la. – Digo holandeses. A maioria não me conhece aqui.
– Você é famoso. – afirmou para si, revirando os olhos, descontente.
– Não seja tão preconceituosa, – ele gargalhou.
– E por que está revelando um segredo desse porte a mim? – a moça fez uma careta desentendida.
– Quem acreditaria em você quando nem minha filha ou a mãe dela confessam aos mais chegados? – ergueu uma sobrancelha, debochado. – Além disso, você não parece o tipo de garota que perderia tempo espalhando fofocas sobre alguém que você só viu uma única vez em um bar...
– Alguém que se diz pai da minha amiga! – ela negou com a cabeça, indignada com a novidade.
– Além do mais, é amiga de Aylee, a única pessoa que ela tem além da mãe... Achei que devesse saber. – tentou soar indiferente.
– Você não serve para os meus planos. – murmurou, deixando a segunda garrafa vazia no balcão e se levantando simplesmente.
a deu tempo para sair do bar e se afastar alguns metros da galera que se amontoava na entrada, antes de segui-la.
– Hey, espere – a chamou de longe.
– O que você quer? – perguntou mal-humorada.
Ela o havia achado incrivelmente bonito, perfeito para ser seu objeto de vingança, já que ele mesmo havia sido sua inspiração nessa ideia. Mas isso era só no quesito beleza, já que fazer aquilo sem este ponto a seu favor, sendo ele um total desconhecido, era um pouco mais complicado. A questão era que aquele ponto positivo era o único. Ele não poderia contar o que ela faria a Louis, pois aquilo apenas complicaria sua relação com Aylee. Outro negativo? Era o pai de sua amiga. Como ela a veria depois disso? Sentiria repulsa, ou pior – mesmo que se sentisse traída pela amiga ter omitido algo tão grave, aquilo não se tornava mais correto. Sempre ouvira da boca da menina que o pai havia a largado, o que não era bem verdade de acordo com . Se a relação deles já não parecia boa por que ela tentaria piorar? O último, mas não menos importante: ele era famoso. Não precisava enumerar os problemas que este pequeno detalhe acarretaria. não servia.
– Você não me contou o que quer que seu pai saiba. E o porquê de querer que ele saiba. – aproximou-se dela em uma corridinha.
– Acho que não te devo satisfações. – disse e lhe deu as costas.
– Eu te falei sobre mim! Coisas que você jamais imaginaria...
o ignorou, apertando o passo para que ele saísse de seu encalço.
– Talvez, eu sirva para os seus planos. – insistiu. – Eu estou disposto.
Ela parou. As palavras do homem lhe serviram como uma lâmpada que se acendia sobre sua cabeça. Por que ela estava pesando nos pós e contras com aquele homem? Não queria ser impulsiva? Deveria se aproveitar da primeira oportunidade que tivesse de se rebelar. Ao contrário disso, ela fugia do homem que estava lhe indicando o mau caminho com um olhar e bebidas de graça. Uma parte dela a prendia a Aylee e àqueles a quem não gostaria de decepcionar, mas essa parte se enfraquecia quando mergulhava nos olhos de seu mais novo companheiro de bar.
– Está disposto? – sentiu-se tentada a aceitar. – E o que tem a ganhar com isso?
– Digamos que eu estou prestes a descobrir. – sorriu, expondo seus dentes brancos e alinhados em total divertimento.
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Estava ciente dos riscos que corria ao se deixar levar por alguém que sequer conhecia. Uma voz quase inexistente soprava em seu ouvido o que poderia ser feito com uma moça como ela - infelizmente, mulheres ainda tinham que se preocupar com isso. Mas seu coração palpitava sedento por adrenalina, e o perigo e a censura eram grandes fatores proporcionais a este hormônio. E mesmo que procurasse por isso, não conseguia temer como achou que deveria, talvez fosse porque ele refletia um pouco de Aylee em seu jeito prestativo, preocupado e esperto... Ou porque já estava começando a sentir o álcool fluir em suas veias e dispersar suas ideias. Para ela, que havia colocado apenas um gole de vinho na boca antes daquela noite, já havia passado dos limites.
Ele havia a levado para o hotel em que estava hospedado. Diferente do bar, o local era muito bem iluminado e acolhedor. A fragrância que exalava era familiar a , permitindo que ela se sentisse mais a vontade do que deveria.
havia sido um cavalheiro até o momento. Pediu para que ela contasse seus motivos, e talvez por estar bêbada ou inebriada pela sensação que o quarto de hotel lhe causava, contou quase tudo a ele. Havia omitido a parte sobre seu romance com , e priorizado a briga com seu pai e o desentendimento com as membras da igreja.
– Então se você quiser me roubar, eu só tenho dois euros na minha bolsa. – ela riu, enxugando as lágrimas que escorreram durante o relato.
riu também. Estava desconfiado de que havia mais por trás das palavras da garota, algumas peças em sua história não se encaixavam. Ele a consolou, a abraçou e secou suas lágrimas várias vezes durante o relato. Inicialmente, ele tinha a intensão de ajudar a amiga da filha no que quer que ela estivesse precisando, tentando ao máximo enxergar Aylee nela. Contudo, não era nada parecida com sua filha, e ele não conseguia fazer parecer o que sentia em relação às duas. Culpava-se por isso, no entanto, algo dizia que não era errado enxergá-la da forma que ele fazia.
– O que pretende fazer depois que realizar seu plano de vingança? – olhou-a nos olhos. Os dois estavam bem próximos, sentados em um divã e com vários petiscos ao redor.
– Sei que com a primeira ligação à minha mãe, já terei uma passagem e um lugar para ficar. Meu pai não poderá me impedir de ir, sou de maioridade há tempos. Só quero ter certeza que todos ficaram bem.
, ao seu lado, pareceu ponderar mais nos planos da garota do que ela própria. Era mais experiente para saber que tudo aquilo podia ser apenas passageiro e que futuramente era provável que o arrependimento fosse incurável. Ele gostaria de pensar positivo pela moça, no entanto. Naquele momento, ele reconhecia que ela estava profundamente abalada, e mesmo que talvez ele não conhecesse o real motivo, queria ajudá-la.
– Bem, se você ainda quiser minha perversidade como ajuda, acho que tenho um plano. – ele levantou-se do divã e aproximou-se de algumas bolsas que estavam reunidas ao lado do guarda-roupa. Após vasculhar um pouco, tirou de lá do meio uma câmera.
Os pelos de se arrepiaram com a proposta. Ela estava prestes a aceitar fazer uma loucura por algo que ela jurava ser vingança.
– Com a câmera podemos gravar tudo. Você terá sua mensagem entregue e não poderá ser negada. – ele tentou sorrir. – Mas não precisa fazer isso, .
Ele mesmo não cria que estava propondo isso para a mais nova. Era tão pervertido, tão promíscuo... Principalmente com uma moça como ela, que era considerada reservada e certa aos olhos de uma sociedade que esperava o primeiro tropeço para apontar. Logo, ele sabia que não existia ninguém que era perfeitamente bom, e todos deviam ter essa consciência. De maneira alguma esperava que fosse perfeita, mas conhecendo sua própria filha, não imaginou que a moça fosse muito diferente em questão de virtudes cristãs até vê-la no bar. Não podia negar que tudo aquilo que ele sugeria a ela era resultado da sensação que o tomara desde que a viu sentada com uma garrafa de cerveja na mão, a sensação que ele julgava ser fraterna em um primeiro momento, mas que naquela hora em que propunha algo perigoso, tinha certeza que não era.
Ela assentiu com a cabeça. Não iria voltar atrás, já havia chorado para um desconhecido e jurado em seu ápice de raiva e dor que se rebaixaria ao pior nível e seria tão indigna de salvação quanto qualquer pessoa. Ela estaria no patamar de , e seu pai não poderia contra argumentar. Podia ser chamado de vingança, mas era amor. Fazia aquilo para provar que amava , e que ninguém poderia impedi-la de estar com ele.
– Vamos começar. – foi até a mesa de centro e encheu o copo de conhaque. Deu um sinal e começou a filmar seus pecados.
A jovem respirou fundo, antes de levar o copo a boca e sorver um pouco da bebida. Um pequeno gole foi o necessário para que ela cuspisse em desgosto e terminasse de derrubar metade do conteúdo do copo no tapete.
– Ai, merda. – resmungou procurando um pano para limpar a bebida derramada enquanto ria. – Isso é horrível! – se queixava sobre o conhaque.
– Ei, mais respeito. Isso é conhaque caro. – continuava a rir com a câmera na mão.
– Acho que você não devia falar. – comentava agachada ao chão com um pedaço de tecido qualquer tentando fazer com que o líquido não se espalhasse mais. – Seus fãs podem reconhecer sua voz.
– Acho que consigo tirar o áudio antes de te entregar a fita. Não deve fazer muita diferença já que você não é capaz nem de pronunciar um palavrão digno. – ele zombou.
– Eu não me ofenderei com isso. – ela avisou, levantando-se do chão. – Olha, eu...
– Esquece esse tapete. – abanou as mãos no ar. – Eu pago para alguém limpar isso.
fez uma careta e ele riu para ela.
– Continue com seu plano.
– Eu não sei o que fazer para me mostrar uma rebelde se não consigo nem beber isso. – apontou para a fileira de destilados sobre a mesa de centro.
– Tente uísque com gelo, é o meu favorito. – sugeriu.
Ela procurou a garrafa onde estava escrito o que ele dissera e encheu um copo pela metade, colocando algumas pedras de gelo em seguida.
– Talvez eu tenha gostado desse. – murmurou depois de um tempo de degustação.
Ele sorriu.
– Uma dúvida. – ela fez uma pausa até que ele assentisse. – A mãe de Aylee é da Coréia do Sul, e elas já viveram lá por bastante tempo antes de virem para cá definitivamente. Como vocês se conheceram? Porque pelas minhas observações, você não parece coreano...
– Aylee é holandesa, não coreana.
– Sério? Ela tem sotaque e meus pais sempre disseram o contrário. – franziu o cenho.
– É o que queriam que acreditassem, aparentemente. – soou indiferente.
– E você? – sorveu mais um gole do uísque.
– Canadense.
– Droga! Eu jurava que era norte-americano! – ela exclamou. – Como essa mistura foi acontecer? Digo uma coreana, um canadense e então uma garota holandesa.
– Longa e ferrada história. – suspirou. – Mas o palco de tudo foi a Holanda. A Park estava aqui quando nos conhecemos e enfim... Esse vídeo está um pouco parado. – se queixou ele.
– O que quer que eu faça? – ela terminou de sorver o líquido gelado do copo, sentindo a ardência da bebida descer garganta abaixo pela última vez antes de se levantar.
– Há muitas coisas que uma garota correta, em termos religiosos, não faria.
– Tipo o quê? – ela procurou os olhos dele escondidos por detrás da câmera.
– Tipo masturbação. – ele deu de ombros.
– Você quer que...
– , eu não quero que você faça nada. – abaixou a câmera para olhá-la nos olhos. – Estou apenas...
– Ajudando. Eu sei. – ela tentou sorrir. – E como eu faço?
– Você nunca... An... – ele atrapalhou-se em perguntar.
– Não na frente de um homem que eu mal conheço e com uma câmera. – a moça revirou os olhos.
– Bem, faça da forma que preferir. – deu de ombros. – Com roupas, sem roupas... Com objetos... Não sei!
– Certo. – passou a se despir. O álcool já fluía em suas veias e alternava os comandos de seu cérebro. Enquanto contava tudo a , havia experimentado alguns goles magros de vinhos que somados ao uísque e as cervejas lhe causavam tonturas. Não estava caindo de bêbada, porém não estava em perfeitas condições, longe disso.
Retirou a jaqueta, estando de costas para a câmera. – Eu não sei fazer isso. – suspirou, envergonhada por estar tirando as roupas daquela forma.
– Você não precisa. – a lembrou em um sussurro.
tirou os sapatos e desabotoou a calça com os olhos fechados, repetindo mantras mentalmente para acalmar-se. Aliás, não era a primeira vez que arrancava as roupas na frente de um homem. Tocou na barra da blusa, hesitante em levantá-la. Queria fazer isso, mas não era tão desinibida e audaciosa quanto pensava, nem mesmo quando alcoolizada.
– Ah, eu não consi... – fora interrompida no meio da palavra por uma mão que se pôs sobre a dela e um corpo que colou em suas costas tão repentinamente que a assustara.
– Shiii... – soprou em seu ouvido. – Feche os olhos, .
– E a câmera? – ela questionou ao mesmo tempo que o obedecia, sendo inebriada pelo toque gelado do homem em sua barriga.
– Está posicionada. Pronta para filmar tudo o que você quiser. – ele respondeu baixo, soprando contra a pele do pescoço da garota e a fazendo arrepiar. Ele depositou um beijo ali.
assentiu com a cabeça ao tomar coragem e puxar sua própria blusa pra cima. Jogou a peça no chão e virou-se de frente para . Ao encarar os traços do homem e inspirar mais uma vez, agora mais intensamente, o perfume que seu corpo exalava, sentiu a atração antes contida se propagar em si. Ela não precisou imaginar antes de atacar os lábios carnudos do outro com ferocidade.
O baque de lábios tão repentino assustou que precisou de alguns segundos para retribuir com jeito. Agarrou os cabelos da menina que guiava o beijo com a língua ligeira
– Espere um momento. – afastou-se da cama seguindo até uma estante e tirando de lá a câmera. Foi até a mala e com um pouco de trabalho tirou de lá um suporte que conseguiu montar habilmente e posicionar em frente à cama. – Agora este é o seu palco.
Ele a encarou por minutos que pareceram incontáveis, como se pedisse para que ela confirmasse se era mesmo aquilo que ela queria. Um silêncio perturbador antecedeu qualquer resposta. não queria incentivá-la, sua consciência o repreendia. No entanto, havia escolhido ajudar e em nenhuma hipótese negaria que queria possuí-la como há muito não fazia com nenhuma outra. Não podia entender tal atração, e talvez a temesse de certo modo. Há tempos não se envolvia com ninguém ao ponto de ter a pessoa em seu quarto, mas era o tipo de mulher que ele não desejava por ter um rosto delicado e um sorriso bonito... Estranhamente, eram as feridas dela que o atraiam, como se por acaso ele fosse algum tipo de morfina.
não estava sóbria, e tinha consciência disso. Questionava a si mesma se o desejo que ardia em si era somente o álcool falando, ou se ela se arrependeria posteriormente. Namoradas normais estariam chorando por seus namorados que se encontram internados e com riscos de vidas, e ela estava fazendo exatamente o contrário. Antes daquele momento não tinha culpa em seu coração, pois o que faria seria um sacrifício por amor – ela não tinha prazer em jogar-se na lama, estava disposta àquilo para garantir seu lugar ao lado de onde quer que fosse, e para provar que ninguém poderia culpá-lo pelos pecados dela, com ou sem ele, ela decairia. Contudo, ao sentir a pele de sobre a sua, e após senti-lo tão perto, ela não podia negar que o desejava. Poderia ser o álcool aguçando sua libido, mas ela teria prazer em estar com ele naquela noite, por mais que a culpa passasse a corroer seu interior.
– Eu acredito... Que não seja eu mesma a fazer isso. – murmurou ao alcançar a garrafa de uísque antes de se aproximar do homem perigosamente.
– Você não precisa...
– Mas eu quero. Agora. – ela tomou um gole da bebida pelo gargalo.
Afastou-se do rapaz se desfazendo dos sapatos para subir sobre a cama e ali ficar de pé. Retirou o resto das roupas e as jogou no chão. Se era para fazer, então faria direito. Estava determinada a se entregar. Agora.
– Você vai ficar parado enquanto eu sujo seus lençóis... Sozinha? – ela tentou sorrir com malícia enquanto despejava o conteúdo da garrafa em seu próprio corpo.
– Você está indo bem sozinha, – soou rouco, consequência de sua excitação, que ela já podia ver em suas pupilas dilatadas.
tomou um gole do uísque antes de largar a garrafa vazia sobre os lençóis.
– Não tem graça brincar sozinha, . – aproximou-se da ponta da cama, o chamando com o indicador.
O homem não podia mais se conter. Suas calças já lhe incomodavam, e podia ser sua extensa seca, mas sua boca se enchia d’água ao observar a garota exalando o odor forte do destilado. Não havia mais para onde correr, ele não fingiria que se sentia culpado por estar com ela naquele momento. Ele a queria e a teria, com o consenso de ambos.
aproximou-se da cama e abraçou as pernas esguias e desenhadas com pequenas estrias de , distribuindo beijos e lambidas por sua extensão enquanto ela tinha as mãos nos cabelos dele, os puxando vezes leve e vezes grosseiramente. As mãos do rapaz passaram a passear pela pele dela e distribuir apertões em seus glúteos, coxas e canelas. Ele insinuou que pretendia subir no colchão, e ela se afastou um pouco da beirada para que ele subisse e, então, se colocasse de joelho em frente a ela. O rapaz acelerou as pinceladas com a língua e distribuiu leves chupões, próximo a virilha da moça.
Cada toque quente da língua de em sua pele a fazia suspirar, um fogo acendia-se próximo ao seu ventre e ela mordia o lábio inferior se contendo para não ir rápido demais. Contudo, logo se cansou de ocupar-se somente com os fios castanhos de . Desabotoou o fecho do sutiã sozinha e se livrou dele como havia feito com o resto de suas roupas, em seguida interrompeu os beijos do homem em si para retirar a última peça.
a encarou de cima a baixo assim que estava completamente nua, sorrindo admirado. , aproveitando-se do momento de distração do outro, ajoelhou-se também, ficando cara a cara para ele.
– Eu gosto de rapazes que falam, – disse, deixando de olhá-lo nos olhos para passar a distribuir mordidas no pescoço dele.
Ele a puxou mais para si pela cintura, sentindo os seios nus dela roçarem maravilhosamente em sua camisa. Passou as mãos pelas costas dela e pela lateral de suas pernas antes de invadir sua intimidade repentinamente com um dedo, sendo hábil o suficiente para tocar o ponto certo antes que a surpresa passasse. A moça soltou um gemido com o susto, deitando a cabeça no ombro do homem e ronronando ao sentir-se sendo massageada.
– E eu gosto das moças que gemem, . – sorriu lascivo, acelerando o movimento do dedo, a apertado um pouco mais e arrancando outro gemido dela.
Ela movimentava o quadril, em uma tentativa frustrante de sentir ainda mais o toque do rapaz. Como antes, estava insatisfeita com somente o que sentia naquele momento, com isso, afastou-o um pouco de si, na intenção de livrar-se das roupas dele, dessa vez, fazendo-o parar com a massagem em seu clitóris. Em segundos, a camisa estava aberta e fora de seus braços, e em seguida a camiseta branca que usava por baixo voava pelo quarto indo parar em qualquer canto desinteressante.
percebia a afobação dela e achava graça até, tanto que não podia conter o sorrisinho que despontava de seus lábios.
No entanto, ela não estava ali para brincar, nunca fora de brincar com sexo. O empurrou de forma a fazê-lo entender que devia se deitar. colocou uma perna de cada lado do corpo do homem que ainda vestia os jeans pretos de quando se conheceram oficialmente.
– Eu disse que gosto de palavras, baby. – sussurrou ela, passando a esfregar-se por sobre o membro dele ainda protegido pela roupa.
Ele agarrou-se ao quadril dela, como se para intensificar seus movimentos de vai-e-vem que ainda eram lentos e pouco sugestivos e procuravam torturá-lo. Mesmo assim, ainda sorria.
– O que quer que eu diga, ? – perguntou enrouquecido.
– O que está sentindo? – ela desceu os movimentos para a perna dele, passando a se esfregar ali enquanto tentava abrir o zíper da calça dele, falhando miseravelmente em fazer os dois ao mesmo tempo.
Ele desceu o próprio zíper para ela antes de responder
– Tesão, . – se pôs sentado para que pudesse puxá-la para si, quase desesperado.
– Por quem? – insistiu ela.
– Por você, – ele a observou acelerar os movimentos sobre sua perna e morder o lábio inferior com força no calor de suas sensações. Ele inclinou o dorso para alcançar a nuca da garota com uma mão e puxar seu rosto para um beijo.
O beijo se desenrolou entre suspiros e gemidos com ela o fazendo deitar novamente e terminando com seu vai-e-vem até alcançar o ápice. O fogo que sentia queimar em cada milímetro de pele era aliviado pelos espasmos que tomaram seu corpo. Para recuperar-se, ela tinha os dois braços estendidos um de cada lado do corpo de , apoiando seu dorso enquanto tentava normalizar sua própria respiração.
– Você disse que seu favorito era o uísque. – ela sussurrou, ainda com a respiração descompassada. – Então por que não está consumindo? – indagou ela, encarando seu próprio colo.
contorcia-se abaixo dela. Seus instintos ordenavam que ele invertesse as posições e a possuísse com força até arrancar dela o gemido que ela ainda continha. Mas ao contrário disso, tinha prazer em tê-la o torturando, mandando que ele fizesse as coisas do jeito que era somente dela. Ao ouvi-la falar aquelas palavras, ele avançara com tanto vigor sobre os seios da jovem que sentiu quando ela soltou um leve soluço pelo susto. Cravou os dentes e sugou, enterrando o próprio rosto entre os montes dela. Apertava um dos seios com uma mão e a outra mão estava nas costas suadas dela, forçando ainda mais o dorso de contra seu rosto.
– – ela o chamou em êxtase – O-olhe para mim. – pediu segurando com firmeza os cabelos suados da nuca do rapaz.
Ele se afastou o suficiente para encará-la e surpreendeu-se quando ela o beijou, não ferozmente como das outras vezes, ele podia sentir o gosto da boca dela misturado ao uísque dessa vez.
– Promete que não irá me impedir de nada, como todos os outros tentaram fazer. – pediu já na tentativa de se livrar da calça dele.
– Eu não irei impedi-la, linda – ele ajudou-a a livrar-se do jeans, afastando-a por torturantes segundos.
Quando já estava completamente nu puxou-a para seu colo, tomando seu pescoço em beijos molhados enquanto ela encaixava o membro dele em si.
– Promete? – ela pediu, cortando o beijo que se mesclava com os suspiros que as primeiras quicadas dela causavam em ambos.
– Prometo. – confirmou entre um gemido e outro, agarrando com força o quadril da moça.
A cama movimentava-se freneticamente com o movimento dos corpos – de modo que a garrafa de destilado que fora abandonada no colchão caíra no chão em um estrondo – e os gemidos preenchiam o cômodo. Quando começara a desacelerar, ele tomou a liberdade de inverter as posições e investir contra ela. Ele controlou-se para não chegar ao clímax antes dela, mas não demorou para que ela estivesse tão pronta quanto ele para tal. sabia, pois havia gemido um nome em seu ápice de prazer. E não era o dele.
♠♠♠
Como se tivesse tido um pesadelo, abrira os olhos em um súbito. Sua respiração e batimentos cardíacos descompassados lhe confundiram nos primeiros momentos em que despertara do sono. O negro havia domado sua mente enquanto dormia, por que acordara com aquela sensação angustiante? Observou a bagunça do quarto, que era iluminado apenas pelas luzes da rua que atravessavam as janelas de vidro, para localizar-se.
Nada fora do comum, exceto as roupas femininas jogadas ao pé da cama. Ligou rapidamente os tecidos á sua respectiva dona, e ao notar que a mesma não jazia ao seu lado na cama, a sensação que o tirara do sono, angústia e ansiedade, voltaram a acumularem-se em seu peito.
– . – chamou-a alto, de forma que a jovem pudesse escutar em qualquer canto da suíte espaçosa. Porém, não obteve qualquer resposta.
Levantou-se, lutando contra a tontura que o abateu, e arrastou-se pelo quarto procurando qualquer sinal da garota. Encostou-se a porta do banheiro e ouviu a água jorrar, provavelmente na banheira. Soltou um suspiro de alívio.
– ? – tornou a chamá-la, dando leves batidas na porta.
Mais uma vez não houve respostas. esperou por um tempo, repetiu algumas vezes, e nada. Estava tonto com a dor que se alastrava por sua cabeça e sentia o corpo pesado, consequência das bebidas que ingerira após a transa, com certeza. Escorou as costas na porta, tentando inutilmente espantar a tonteira. Apertou os olhos com as mãos algumas vezes e tentava focar a visão olhando para frente. Foi naquela hora que sentiu falta de algo no horizonte do quarto que observava. Um elemento central, que deixava um vazio em sua ausência... A câmera.
Quando a percepção lhe atingiu, pela terceira vez naquela noite, seu coração acelerava-se e ele se via em um estado de assombro. Virou-se para a porta e tentou abri-la, no entanto, estava trancada. Socou ainda mais forte a madeira, permitindo que o tom de seus gritos por arranhasse sua garganta. Sua mão doía quando optou por derrubar a porta com o pé. Quatro chutes sem controle foram necessários para danificar a fechadura e permitir a entrada do rapaz no cômodo.
A primeira coisa que avistou fora a câmera presa ao suporte e posicionada estrategicamente para filmar a banheira. Choque percorreu sua espinha quando avistara o que a câmera capturava. A água que ele ouvia jorrar estava inundando o chão e transbordava da banheira em um tom diferente da habitual transparência; estava avermelhado.
Um soluço de susto foi inevitável. Talvez mais tarde não admitisse, todavia seu rosto se inundou de lágrimas instantaneamente enquanto se aproximava da garota apagada e a tomava em seu colo. Não se preocupou em desligar a água que jorrava pela torneira, e muito menos em calçar sapatos antes de cobri-la superficialmente com um roupão do hotel e sair pelo corredor iluminado clamando por ajuda.
Seu coração que tamborilava no peito ditava a velocidade com que tudo acontecia. acionou o botão do elevador, e no aguardo ele gritava a qualquer um que pudesse ajudá-lo. Dos braços de ainda escapava sangue, observando isso, ele a deixou no chão com as costas escoradas a parede do elevador e tentou conter o fluxo com a camiseta que ele mesmo vestia, ficando somente com uma camisa branca. Uma senhora, vestida em seu hobby de seda branco, os encontrou e apavorada correu para o interfone que era disponibilizado em seu quarto. Com a chegada do elevador, ergueu o corpo desfalecido de com certa dificuldade e adentrou o cubículo, logo pressionando o botão que indicava o térreo com o cotovelo.
Quando as portas se abriram no hall do hotel, pessoas uniformizadas já corriam em direção a eles. Uma maca surgiu em meio à desordem e fora induzido a deixá-la lá. Com passos apressados e empurrões, aquelas pessoas levavam a maca ao veículo branco e espaçoso, que não tinha nenhuma marca ou logo, mas que provavelmente pertencia à equipe hoteleira. insistiu, e até mesmo ameaçou bater em quem o impedisse de acompanhá-la.
O Amstelland Hospital tinha a área emergencial deserta, até o chamado do hotel. Alguns da equipe médica que estavam de plantão naquela noite já se enfileiravam a porta para receber a paciente noturna, preparados. O veículo alvo fora estacionado ligeiramente e logo a maca já estava dentro do hospital, correndo pelos corredores com médicos e os prováveis paramédicos do hotel que entregavam um corrido diagnóstico superficial.
avançou sem ser impedido até uma sala equipada e não muito próxima da entrada emergencial do hospital. Uma jovem, baixinha e rechonchuda, o barrou. Ela dizia algo que ele não podia entender, pois grande era a aflição em ver daquela forma. Deixou-se levar pela enfermeira que tentava o acalmar quando a porta da sala que abrigava se fechou em um baque, e a única coisa que ele podia fazer por ela era rezar.
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Em pouco tempo, que para ele parecia milênios, a equipe médica inteira chegava para dar a notícia do estado de saúde de .
Até aquela vez, não se recordava qual fora o dia mais turbulento de sua vida. O dia 27 de fevereiro de 2018, aquela noite, estava em potencial vantagem em relação a qualquer uma em suas lembranças. Enquanto o temor pela vida de , uma jovem tão perdida em sentimentos e tão mal vivida até então, apoderava-se de seu ser, uma terrível bolha o envolvia, onde sua enxaqueca e corpo mole complementavam o pacote “deplorável”.
Ao que parecia, não era somente ele que aguardava notícias, mas sim toda a América. Seu celular teve de ser desligado, pois seus empresários não o davam descanso. Todos sabiam sobre ele e . Os vídeos haviam sido expostos na internet – provavelmente, por alguém que adentrara o quarto de hotel dele que havia sido deixado aberto –, e a América, que ainda não havia dormido, pipocava com a notícia de um vídeo erótico estrelando e uma jovem desconhecida que fora parar no hospital após a farra. Boatos corriam e teorias eram formadas, provavelmente agora ele era um sádico ninfomaníaco da internet. Como se ele realmente precisasse de mais dor de cabeça.
Contudo, só conseguira pensar nos motivos que levaram a garota a se machucar. Ela realmente queria tirar a própria vida ou fazia parte de sua encenação? Se fosse a primeira opção, não fazia sentido o porquê da escolha do suicídio. Como ele não enxergara tanta fraqueza nela? Estava confuso e precisava urgentemente de respostas. Sabia que havia ocultado algo em sua narrativa, mas não podia imaginar o que a faria chegar àquele ponto tão repentinamente.
Os médicos e enfermeiros que o encaravam com sorrisinhos contidos, não pareciam saber de sua nova reputação – já que traziam chinelos para que ele usasse a vista de que havia saído descalço do hotel –, porém aparentavam ter boas notícias. se pôs de pé para recebê-los.
– ? – uma das mulheres, a baixinha e de cabelos castanhos que havia gentilmente lhe entregado o par de chinelos, inquiriu mais simpática do que o normal para um profissional.
– Sim. – ele tentou soar afável também.
– A garota que o acompanhou...
– . O nome dela é . – a interrompeu.
– Sim. Ela está bem. Perdeu bastante sangue e por isso estava desacordada. – explicava tranquila, gesticulando com as mãos. – Havia álcool em seu sangue e por isso o processo foi um pouco mais demorado, mas agora ela está descansando no quarto e tomando sangue pela veia. Acreditamos que logo ela venha acordar.
– Muito obrigado. – agradeceu.
Sentia o peso em suas costas diminuir. Um sedento desejo de olhar nos olhos grandes de e reconhecer se ela realmente estava bem, sendo física ou emocionalmente, infringiu seu interior.
– Eu posso vê-la?
– Claro, eu te guio. - a mulher sorriu exibindo os dentes manchados de café e saiu à frente do rapaz.
As mãos de estavam molhadas de suor enquanto percorria o caminho até o quarto onde estava internada. Precisava vê-la com os próprios olhos, confirmar a veracidade do diagnóstico dos médicos. Mas não era somente isso, além de sua saúde física, ele precisava saber se ela estava curada de sua raiva ou se o odiava por tê-la incentivado àquela insanidade. Talvez isso justificasse sua repentina inquietude.
Ao cruzarem a esquina a jovem médica empacara seus passos. Vozes estridentes escapavam de algum dos quartos, o quê a espantou. Era um hospital calmo, não havia nada fora do normal há meses, e então em uma bela madrugada uma garota tenta suicidar-se e quem a acompanha é um artista americano mundialmente conhecido – por mais que ela mesma nunca houvesse ouvido falar, os seguidores do rapaz no Twitter falavam por si –. Agora ela tinha que lidar com uma baderna na ala que era para ser de repouso. Inconvenientemente, todo o barulho tinha como matriz a sala da paciente que acompanhava.
– An, senhor poderia seguir sem mim? Parece que tenho um problema a resolver. – sorriu fechado, colocando uma mão nas costas do homem e o guiando para o lado contrário de onde vinham os gritos. – Pode seguir em frente, lá no final terá uma escada. É no terceiro andar.
Ela o faria dar uma volta desnecessária pelo hospital para encobrir a falha de algum funcionário que permitira um visitante adentrar o quarto antes mesmo do acompanhante. Não admitiria que aquele astro saísse se queixando de seu local de trabalho de forma alguma.
seguiu o caminho indicado em sua bolha de tensão e dores de cabeça. Assim que chegou ao segundo andar fez uma parada para beber água antes de subir mais rápido do que anteriormente. Ao chegar ao terceiro andar, pediu auxílio para a recepcionista negra e bem arrumada que visualizava a tela do computador.
– ? – pediu confirmação, recebendo um aceno de cabeça por parte de . – Ela tem uma consulta marcada para hoje à tarde, mas não está aqui agora.
– Uma das médicas me disse que ela estaria recebendo sangue por aqui.
– Sinto muito, senhor. Esta é a ala psiquiátrica, não temos ninguém aqui nesse estado. – a mulher explicou e por fim lhe sorriu gentilmente.
– Onde posso encontrá-la? – perguntou comedindo a irritação na voz por ter sido enrolado.
– Aparentemente, no primeiro andar. Fica depois da sala de visita e antes da ala dos pós-operatórios.
– Obrigado. – tentou sorrir para ela antes de se retirar.
Optou por usar o elevador desta vez. Não gostaria de admitir, entretanto estava fadigado ao extremo. Desejaria sua cama, sua casa e sua família constantemente se não houvesse culpa em tal anseio. Ele tinha ajudado a provocar aquela situação, e como um homem, herdaria com todas as consequências viáveis a ele, e a família. Havia tempo que não saia da linha, fora a primeira em anos em sua cama, e até então seu maior problema.
Pressionou o botão do primeiro andar assim que já estava dentro do cubículo metálico e escorou-se próximo ao painel dos botões. Tinha a cabeça baixa quando a porta se abriu, mas avistou os pés calçados em sapatos sociais impecavelmente engraxados de quem aguardava o elevador no primeiro andar. Não pôde conter o passo para trás que o susto lhe causara quando reconheceu aquele velho. Louis , sem dúvidas, carregava uma carranca nada agradável e tinha atrás de si uma mulher robusta que parecia fazer parte da equipe de segurança.
Para felicidade de , o pastor não o reconhecera – o que já era esperado – e muito menos suspeitara de seu sobressalto. Assim que deixou o elevador e ouviu o baque das portas se fechando e levando o velho para longe os fatos se interligaram em sua cabeça. Os gritos, a mentira da médica e a presença de Louis eram pontos em um mesmo plano.
Concluindo isso, acelerou o passo para se encontrar com . Praticamente correu pelos corredores alvos, atraindo atenção das pessoas que se acumulavam próximas ao seu destino. Quando adentrou o quarto que julgava ser o certo, não encontrou ninguém. A cama estava vazia e desarrumada e a bolsa de sangue estava abandonada ao lado. Após mais um sobressalto, estava ele percorrendo novamente os corredores a procura da morena. Medo tomou conta de seu peito, pois não podia perdê-la de vista.
Quase como um canto de sereia, o choro da moça o havia atraído para um quarto em outra ala do hospital, onde jazia o corpo de um rapaz de cabelos escuros sobre o leito. tinha o rosto enterrado ao lado do jovem e não havia percebido a presença dele ali por estar de costas. Ela murmurava entre as lágrimas, falando com o homem que tinha os olhos fechados.
– Eu estou aqui. – ele pôde entendê-la repetir. – Todos esses erros, mas ainda estou bem aqui. – levantou a cabeça para fitar o rosto pleno do rapaz e acariciá-lo com as costas da mão.
continha a respiração sem que ao menos percebesse. Observou os curativos pela metade que estavam em seu braço, ela havia tentado tirá-los. Seu coração doía, e não podia afirmar exatamente o porquê aquela cena o causava tal sensação.
– Eu não tenho as respostas. – ela fungou. – Mas a pergunta é clara.
já se preparava para deixar o quarto, incapaz de suportar a dor que lhe infringia. Não podia mais assisti-la, sem querer impedi-la como todos os outros tentaram. Queria tirá-la dali e afastá-la daquele homem que sequer sabia quem era.
– Me deixe perguntar – soou mais alta e quando voltou a mirá-la, o olhar dela estava em si. A pergunta demorou um pouco para vir, e nesse tempo o olhar da garota perdeu-se em um ponto qualquer. – Para onde todos vão quando partem?
Então ela pretendia partir. E por que ele sentia-se tão desesperado com aquela ideia?
– Ele... É o ? – tentou perguntar sem soar satírico e acabou por falhar.
– Não. – respondeu ela ao levantar-se da cadeira adjacente à cama. – morreu nessa madrugada. – assim como a tentativa de , falhou em sua meta de pronunciar as palavras sem prantear. Ela soluçou audivelmente e cobriu o rosto com ambas as mãos, precisando de alguns minutos de recuperação para conseguir dizer. – E eu queria seguir pelo mesmo caminho...
– Isso não é amor, . – foi o que conseguiu dizer o homem.
– Eu não posso viver em um mundo onde pessoas como ele não merecem uma chance. Nós somos iguais! – soluçou. – E se ele não merece viver, eu também não.
– Você não vai fazer isso. – ele ditou a ordem, dando um passo em direção a ela.
– Você não pode me impedir. Prometeu que nunca o faria. – ela tentou sorrir.
Era sincera sua promessa quando dita. Naquele momento quando professada, ele acreditava que não poderia magoá-la com o sentimento doce e suave que carregava pela jovem. Tal sentimento ele não sabia interpretar ainda, mas sabia que era ele que o faria quebrar promessas.
– Você é tão egoísta. – decidiu mudar de estratégia. – Sabe o que aconteceria a mim se você morresse no meu quarto de hotel? Sabe o que já está acontecendo por terem encontrado o vídeo da noite passada? – ele aumentou o tom de voz, fingindo uma raiva que estranhamente ele não sentia. Estava ocupado demais se preocupando com ela no momento.
– É só com isso que vocês se importam, não é? Só com vocês mesmos. – ela enxugou as lágrimas com raiva. – Tanto faz se eu estivesse morta, contanto que não prejudique ninguém. Eu vou lembrar isso da próxima vez. – murmurou sarcástica.
Ele riu descrente.
– Você queria que eu me preocupasse com você? Para quê? Para sentir doer em mim quando você tentasse se machucar por outro homem? – silêncio. – Parabéns, . Você conseguiu o que queria! Mas isso não me faz menos egoísta, não é? Só mais idiota. – ele cuspiu, antes de deixar o quarto de um completo desconhecido em passos raivosos.
estava dilacerado. Ainda que tentasse culpá-la por seu coração partido, sabia que na verdade a culpa era somente dele. Por sua atração ou tenra bondade, ele havia se envolvido com alguém que o quebrara sem pestanejar.
Já , não chorava mais. Fitava a porta por qual saíra, fixamente, como se estivesse hipnotizada. Ela era indigna de respeito e também de Salvação Divina, estava completamente suja de lama. Ela havia conseguido o que queria, e só lhe restava à resposta para a pergunta...
Para onde todos vão quando partem?
¹ O obreiro, nas igrejas, é o auxiliar do pastor, é visto como uma autoridade espiritual e eclesiástica.
Louis esmurrava a porta sem qualquer delicadeza. Na verdade, era o contrário, usava tanta brutalidade que jurava que ele seria capaz de arrombá-la a qualquer momento.
– , saia agora! – ele ordenava em meio a gritos.
Apesar de assustada e trêmula, a garota não cedeu. Era a primeira vez em sua vida que assistira seu pai tão possesso. Ela, que sempre fora tão obediente e delicada, não estava acostumada a ser alvo de tal ira.
Embora pouco se importasse com o que seu pai sentia quando ela mesma estava destruída por dentro. Seu amor, seu primeiro amor, e talvez, o único, estava entre a vida e a morte em um leito de hospital.
Tudo havia ocorrido rápido demais. Há alguns meses, conheceu , o filho de uma das membras mais fiéis e intensas da igreja de seu pai. Ele não frequentava as reuniões, e por isso não se viam com periodicidade, todavia Deus se encarregou de juntá-los. Ela o encontrava todas as tardes, após seu curso de libras, no armazém, próximo onde o rapaz trabalhava; isso depois de terem trocado telefones em um encontro fortuito na padaria. Seu pai, Louis , não se agradava de qualquer contato entre os jovens. Dizia ele que era um marginal, um fardo para sua mãe que era tão boa serva do Divino, e que a desvirtuaria se ela deixasse-se levar. E apesar dos avisos de seu pai, optou por infringir as regras pelo que ela jurava ser amor.
Semanas e meses de carinhos e afetos se acumularam no calendário do casal. sempre a respeitou, nunca ultrapassando seus limites. Apesar de não ser um devotado seguidor da fé cristã, não se queixava da namorada querer seguir cada Palavra Bíblica ao pé da letra – o que, definitivamente, aconteceu nos primeiros encontros –. De acordo com ele, apenas o amor da garota lhe bastava. acreditava veemente em suas palavras, e certamente se culpava quando, por mais de uma vez, deixou-se levar inebriada pelas carícias do rapaz e acabou em sua cama. As primeiras vezes foram piores, ela admitia; a fornicação era ato contraditório aos princípios cristãos, embora ela já pudesse entender o porquê de tantas pessoas a praticarem constantemente. Um pecado se torna normal quando a consequência não vem de imediato, talvez fosse por isso que não se considerava desvirtuada.
Até pouco, Louis não tinha conhecimento de tais encontros casuais ao crepúsculo. Foi quando Carmen, a mãe virtuosa de , adentrou a igreja, logo após o fim de uma reunião dominical, aos prantos que tudo veio à tona.
– Pa-pastor, pastor! – ela clamava em desespero. – Meu filho. Ore pelo meu filho. – a mulher soluçava.
estava junto ao seu pai, aguardando que os membros se retirassem para que o templo fosse fechado. Assim que ouviu as palavras da outra, aproximou-se dela e a abraçou.
– Acalme-se – tentou dizer sem que aparentasse estar demasiadamente ansiosa. – O que houve, irmã Carmen?
– Me-meu filho. – ela apertava a jovem em seus braços procurando consolo. – Está no ho-hospital.
– O que houve com ? – Louis quem perguntara.
tremia ao se soltar da mulher para que ela pegasse o copo cheio d’água que uma obreira¹ oferecia. Carmen recusou educadamente, afastando com gentileza a mão da moça que insistia em levar o copo a sua boca.
– Obrigado – ela apenas pegou o objeto cheio do líquido e segurou próximo ao busto e esta foi a deixa para que a obreira saísse.
– Tudo vai ficar bem. – a tranquilizava com uma mão em suas costas, como se seu próprio peito não se agitasse atormentado ao ouvi-la falar do filho. No entanto, não conseguia controlar a respiração que se mostrava descompassada.
– Venha a minha sala, irmã. – Louis a chamou. – Falaremos sobre seu filho lá, enquanto tranca as portas.
– Eu quero ajudá-la. – a jovem protestou de imediato.
– Isto não é assunto para crianças, filha.
O pastor já se afastava sendo acompanhado pela mulher chorosa.
– Eu não sou criança. – retrucou em voz alta.
– Vá fechar as portas. – ordenou ríspido, parando de andar para repreendê-la com o olhar.
– Quero saber o que está acontecendo. – sua voz já embargava, sem que pudesse ter controle.
– O que é isto, ? – Louis suspeitou do comportamento da garota.
– Por favor, – ela apertou o passo para alcançar a mãe de seu amado que havia se distanciado com o pastor – Carmen, me conte o que aconteceu.
A mulher a encarou em um misto de emoções. Ao mesmo tempo em que estranhava o nervosismo repentino e digno de preocupação da jovem filha do pastor, sentia compaixão ao perceber sua apreensão. Reconheceu, no entanto, o sentimento transbordante no olhar da mais nova, e facilmente entendeu o que se passava.
Louis já se preparava para repreender a filha com firmeza quando foi interrompido por Carmen.
– Ele estava com amigos – fez uma pausa para recuperar o fôlego – e... Eles foram brincar depois de terem bebido. N-não contaram o que houve direito, mas ele caiu da janela. – a voz diminuiu e seus olhos se encheram de água. – Ele está morrendo, . – soluçou. – O-os médicos disseram que ele não irá acordar mais.
Carmen desmanchou-se em lágrimas novamente, enquanto simplesmente estava em choque.
Era como se o relato da mais velha estivesse se transformado em uma mão invisível capaz de espremer seu coração como um mísero limão. Sem que sequer notasse já chorava copiosamente.
– Não, não, não... – repetia entre soluços. Uma mão aparava seu peito que se mostrava uma clara representação de buraco negro, sugando todas as forças de seu corpo para aquele ponto e gerando-lhe fraqueza. Não achava que seria capaz de ser tão atormentada com apenas a ideia de perdê-lo... Que existisse tanto horror em uma notícia inesperada.
Mesmo antes de se recuperar dos primeiros minutos de surpresa, seu pai já a questionava sobre sua postura. Ao perceber que a jovem não o ouvia, falava mais alto. Sem obter respostas, passou a fazer suposições. Aliás, para ele, estava tudo muito claro naquele momento.
temia o dia em que seu pai descobrisse, porém nunca o havia imaginado daquela forma. Não dava a mínima para o esporro que seu pai lhe aplicava. Na realidade, indignava-se com a capacidade dele de deixar o assunto importante da vez como segundo plano.
– Como pode se preocupar com isso quando tem alguém morrendo em um hospital? – estava em prantos. Não gostaria de admitir que fosse tanto pela situação de quanto pela reação de seu pai que sequer fingia respeitar o desespero da mãe do rapaz.
– Alguém cuja senhorita mantinha um relacionamento escondido! – Louis a apontava com o indicador em riste.
– Meu Deus, pai. Nada disso importa. Vamos orar por ele, por favor. – tentou ao máximo reprimir sua frustração enquanto pedia. Aliás, ainda havia esperança, e e Carmen agarravam-se à fé como solução. – Por favor, ele precisa disso e precisa sair daquele hospital.
Louis calou-se naquela hora. Reuniu-se a Carmen e ao grupo de intercessão da igreja para pedirem a Deus, ao pé do altar, misericórdia pela vida de . No entanto, foi impedida de juntar-se a eles. Enquanto intercediam, ela encarregou-se de atravancar o templo, não deixando de seguir mentalmente com suas próprias preces.
O momento de paz logo esvaiu. A intercessão não poderia durar a noite toda, e mesmo se pudesse Louis não permitiria. Ele precisava tratar do que lhe era de interesse próprio, a conservação de sua boa imagem, cuja sua filha colocava em risco. Carmen já havia partido pela porta detrás, acompanhada do grupo de oração, quando seu pai retornou a questioná-la:
– Vai me explicar o que foi aquilo?
Não houve respostas.
– Quantas vezes eu a avisei, ? Há muitas pessoas na igreja para se relacionar! O que você tem na sua cabeça tola de cair na conversa de um cético? E infringir minhas ordens? – Seu tom subiu duas oitavas. – O que você fez com este garoto? – o velho transpirava, o tom avermelhado subiu por seu rosto no mesmo tempo em que liberou um alarido – O que você fez, ?!
A menina não ousava sequer sibilar algo. Estava temerosa e seu interior gritava para que ela fugisse; se afastasse. Seu pai jamais a entenderia, e por àquela hora, ela só queria estar com .
– Eu estou falando com você! – caminhou em passos pesados até ela.
, por sua vez, deu um passo para trás, intimidada. – Nós nos víamos ás vezes – soltou ligeira quando a proximidade de seu pai se tornou perigosa. – Ao entardecer, depois do curso de libras. Viramos amigos…
– Não minta para mim. – vociferou ele.
– Não estou mentindo. – a menina choramingou. Conteve-se, porém. Seu desejo era mandar tudo para os ares e se lamentar, chorar livremente sem ninguém para julgá-la.
– Você se envolveu com este rapaz? – silêncio sucedeu a pergunta por tempo suficiente para instigar ainda mais a ira do pastor. – Responda!
– Eu me apaixonei por… – ela confessava entre fungos, contudo fora interrompida pelo impacto da mão do homem em sua face.
O tapa desferido pelo pai a levou ao chão e os segundos que sucederam o ato foram preenchidos pelos soluços de em sua total descrença pela reação inusitada do mais velho.
– Eu devia ter desconfiado antes – murmurou o homem. – Sorrisinhos bobos, atrasos acompanhados de explicações ridículas! Eu confiei em você, sua traidorazinha – Ele tentou machucá-la mais uma vez, no entanto ela fora mais rápida.
, prevendo seus movimentos, arrastou-se para longe até conseguir levantar-se. – Pare! – ordenou, erguendo o pequeno castiçal que compunha a decoração do altar para se defender.
– O que pretendia com isso, ? Arruinar-me? Arruinar nossa família e a igreja como a vadia da sua mãe tentou fazer?
– Não fale assim dela! – ousou elevar o tom de voz pela primeira vez. Entretanto, mesmo com palavras firmes, o pranto pintava seu semblante.
– Ainda por cima, com um delinquente, drogado e maldito...
– Como pode dizer estas coisas? Estava ao lado da mãe dele pedindo por sua vida há minutos!
– Nós dois sabemos que quando se trata de pessoas como ele reza nenhuma bastaria. Só resta-lhe o inferno!
encarava-o incrédula. O sentimento em relação a se tornava cada vez mais intenso; o medo de perdê-lo cada vez mais palpável e o amor cada vez mais nítido. Já em relação ao seu pai, transformava-se; a raiva, a incompreensão e a irreverência cresciam tanto que lhe eram causados leves tremores de repulsa. Os laços fraternos não deixariam de existir, todavia naquele momento, não se via como filha daquele homem.
Reconhecia o assombro e o cuidado que ele tinha para com sua imagem perante a sociedade, e que para mantê-la Louis fazia seu papel. Era abnegado e bom na maior parte do tempo com todas as pessoas da igreja, nunca negando nada a ninguém e sempre enchendo os ouvidos alheios com palavras sábias. Contudo, pode-se afirmar veemente que ninguém é perfeito. A bondade de Louis tinha limites quando se tratava de manchar a reputação de sua igreja, sua família ou a própria, e não eram medidos esforços para acabar com qualquer ameaça. A mãe de era um belo exemplo disso.
Antes, Jesus também fora odiado. Certamente, Louis havia se esquecido de tal fato. Qualquer inimigo que se declarasse teria uma resposta definitiva, dada somente por ele e sem nenhum envolvimento celestial.
nunca imaginou que este lado de seu pai fosse tão vivo aponto de machucá-la e não permiti-lo compreender que a vida de alguém era mais importante do que aquela discussão.
– Eu irei vê-lo no hospital.
Ao anunciar a garota já se afastava para alcançar a bolsa sob um dos bancos dispostos na primeira fila.
– Está proibida de vê-lo em qualquer circunstância. – berrou autoritário.
– Isso não é um pedido. – atravessou a bolsa no corpo, sem coragem de olhar nos olhos do mais velho, e seguiu para a saída.
Louis correu furioso para impedi-la. Prevendo que seu pai seria capaz de alcançá-la antes que pudesse destrancar a grande porta e deixar a igreja, refugiou-se na primeira saleta que conseguiu abrir. Trancou-a com mãos apressadas e sobressaltou-se quando o primeiro murro de seu pai repercutiu sobre ela. Começaram então mais gritos.
Sua audácia de momentos atrás pareceu dissipar-se nos primeiros minutos em que se viu trancada ali; o pranto retornou a garganta e olhos quase abruptamente por encontrar-se sem saída e com medo de que seu pai fosse capaz de arrombar a porta e tomá-la em sua fúria.
Entretanto, esses minutos foram o suficiente para que , e somente ele, tornasse a reger seus pensamentos, pois apesar do receio que tinha em relação ao pai, os sentimentos que a guiavam naquela noite eram somente sobre . Com isso, nada diante de seus olhos parecia demasiadamente dificultoso – a amargura se seu pai e a selvageria dele sobre si, ou até mesmo o fato de estar presa e não poder ir de encontro a , aparentavam ser meros detalhes. Estava certa, de todo seu coração, que sairia dali e o veria novamente, o tocaria de novo. Não permitira que fosse diferente.
Determinada como nunca estivera, procurou uma forma de escapar. Nada ao seu redor parecia útil, no entanto – a janela era alta e pequena demais, não havia outra porta e o resto eram livros e alguns papéis –. Mesmo com a balbúrdia que seu pai fazia estando bastante audível, conseguiu pensar em um plano. Sacou o celular da bolsa e ligou para Aylee, a garota do grupo de jovens que esteve na intercessão por mais cedo.
A chamada fora rápida. Aylee estava aguardando o ônibus no ponto quando atendeu. Ela suspeitou do pedido de e dos barulhos que ouvia ao fundo, mas consentiu com a amiga sem fazer muitas perguntas.
Os gritos de seu pai cessaram pouco depois. Concentrando-se, podia ouvir a voz de Aylee quase inaudível, e as respostas do pai soando mais baixas conforme ele se afastava da porta para atender a menina que adentrara o templo.
Um sinal em seu celular era sua deixa. Destrancou cuidadosamente a porta da saleta, e os ruídos foram abafados por uma música que fora colocada naquele momento propositalmente. Aylee e o pastor estavam a alguns bons metros de distância, mais precisamente, ao lado da aparelhagem de som da igreja. Antes que deixasse a saleta por completo, a música subiu de tom notavelmente. A asiática e o pastor se distraiam tentando a todo custo encontrar o botão ou dispositivo que diminuísse o volume estridente.
não era o tipo de garota que fugia das regras, com exceção de seu romance proibido com , ela não era acostumada a armar planos de fuga. Talvez isso justificasse sua tremedeira. Contudo, estava quase confiante que obteria sucesso no plano em questão. Louis nunca permitiria que Aylee ou qualquer outro membro ou colaborador conhecesse outra faceta sua que não fosse a de bom pastor.
Ela apostava que fora por isso que ele não gritara seu nome ou correra para impedi-la de sair quando a percebeu se esgueirando para fora do templo pela porta que Aylee havia largado aberta propositalmente. Ele, certamente, desconfiaria da asiática como cúmplice da fuga, mas nunca revelaria qualquer sentimento ou opinião que contrariasse sua fama de bom samaritano, e isso incluía brigas familiares com sua filha pecaminosa.
Mesmo sabendo disso, o coração de congelou no instante que notou o olhar do pai sobre si. Abaixou a cabeça envergonhada, como se pedisse desculpas antes de partir.
Correu pelas ruas desertas, em partes por ter receio de seu pai resolver tentar pará-la, mas principalmente, por estar ansiosa para estar ao lado de .
O trem não era uma opção daquela vez, pois podia facilmente ser encontrada esperando na estação, caso seu pai já houvesse mudado de ideia em relação à ida dela ao hospital e já tivesse se livrado de Aylee. No entanto, não era fácil encontrar um táxi ou qualquer transporte público às dez horas da noite em Zaanse Schans. Era uma vila pequena e praticamente rural localizada no município de Zaandam na península da Holanda do Norte. Quando encontrou algum, este deixava um turista bêbado na porta de uma pousada, e ela já caminhava à aproximadamente 15 minutos.
Instruiu o motorista jovem e de cabelos castanhos encaracolados a ir até o centro hospitalar mais próximo do munícipio. não sabia onde estava, mas julgava pelo diagnóstico que Carmen havia passado que ele não estaria no pequeno ponto de atendimento a saúde da vila. O lugar oferecia uma bela paisagem holandesa – cabritos, fazendas, moinhos, bicicletas e até tamancos –, entretanto não tinha estrutura para cuidar de alguém com ferimentos graves como os que Carmen havia relatado. Isso era trabalho para os centros municipais urbanizados.
A morena fixou-se em seu reflexo no vidro da janela assim que o automóvel entrou em movimento. Seu rosto estava levemente inchado pelo choro e a maquiagem de seus olhos havia espalhado e borrado a curva do nariz e o alto de suas bochechas. Tentou se limpar, mas sua aparência permanecia próxima de deplorável.
A vibração do celular em seu bolso a despertou de sua autoanálise no reflexo no vidro. Apanhou o celular dentro da bolsa apreensiva em ser o pai a ligar. Agradeceu a Deus em uma breve prece ao avistar o contato de Aylee brilhar na tela, e em seguida arrastou o ícone verde para atender a chamada de voz.
– Olá, – a menina cumprimentou sarcástica em seu sotaque engraçado. – Seu pai já foi para casa, e ainda foi muito gentil em me dar uma carona. Agora você pode me contar o que pensa que está fazendo?
Aylee podia ser três anos mais jovem que , mas ainda sim, era a mais austera entre as duas.
– Estou indo ver no hospital. – respondeu sem qualquer emoção na voz.
– Santo Deus, ! Desde quando você é tão indisciplinada desse jeito? Tenho certeza que seu pai a proibiu de vê-lo.
– Eu não sei. – suspirou. – Eu não sei de nada. Nem o hospital em que ele está! Mas estou disposta a procurar em quantos forem necessários.
– Você é louca. – a outra murmurou.
As duas calaram-se no silêncio mais desordeiro que se podia imaginar.
refletia sobre as palavras de Aylee. Ela sabia que louca, naquele caso, era só outra palavra para impulsiva ou inconsequente. Entretanto, ajudou-a a perceber o quanto havia mudado desde que conhecera . Quase tudo o que ela jurava ser primordial, não fazia mais tanto sentido. Prometera a si mesma que não permitiria se desvirtuar por quem quer que fosse, e estava certa de estar cumprindo tal promessa até aquela noite. não era a mesma de meses atrás, um peso em seu coração lhe indicava isso; ela estava apaixonada agora. E mesmo que não admitisse para si, temia o que tal sentimento lhe causaria.
Ao mesmo tempo. Aylee travava um conflito interno entre ajudar a amiga a tirar aquela loucura da mente ou auxiliá-la em seu objetivo. Temia que fosse capaz de desviar do propósito cristão caso fosse apoiada em seu plano; o pastor Louis havia sido muito convincente em seu sermão indireto durante aquela carona. Contudo, a filha do pastor também a havia convencido com seu tom, de que estava determinada a procurar por em todos os hospitais da região até encontrá-lo.
– ? – chamou parcialmente hesitante, quebrando o silêncio que se instalara por alguns minutos.
– Oi, Aylee.
– Para qual hospital você está indo?
– O hospital do centro da cidade. Por quê?
– não está na cidade.
– Não está na cidade? – já sinalizava para que o taxista parasse.
– Não. Eu acompanhei Carmen até que o carro dela chegasse e a ouvi dando instruções ao motorista para que dirigisse para Amsterdã.
– Amsterdã? – repetia alto para que seu motorista entendesse.
– Sim. Hospital Amstelland, se não me engano.
– Amstelland Hospital em Amsterdã. – ditou para o motorista encaracolado que alterava a rota naquele instante.
– Isso.
– Obrigada Aylee. Você é um anjo. – agradeceu realmente grata pela ajuda.
– Não me traga arrependimentos. – a asiática pediu em seu quase perfeito holandês.
soltou uma risada leve. – Boa noite, Aylee.
– Boa sorte, . – respondeu antes de encerrar a chamada.
O caminho de Zaanse Schans até Amsterdã era feito em aproximadamente vinte minutos, porém eles já haviam se afastado demasiado da vila, o que alongava o tempo até o novo destino. Tempo de sobra para que a apreensão retornasse para atormentá-la. Proibiu-se de entrar em desespero novamente, no entanto. Com isso, tentava alternar os pensamentos para algo ou alguém que não fosse ou Louis. Martha, sua mãe, lhe surgiu e para sua própria surpresa, não tentou espantar a lembrança da mulher como comumente fazia.
Louis a odiava por não ser ela a típica esposa submissa que não tem voz ou vontade própria e é idealizada para ocupar o lugar de mulher do pastor na hierarquia eclesiástica que era implantada naquela igreja. Martha falava, gritava e cantava tudo que sua moral construía, sem se importar se aquilo era contraditório ao que seu marido pregava. Alguns podiam vê-la como histérica, contudo compreendia que ela apenas tinha interpretações divergentes das passagens bíblicas, as quais eram totalmente desprezadas por Louis. Ele cria que as ideologias de Martha não mereciam seu tempo ou atenção e quando ela se cansou de fazer papel de estátua e de ser rebaixada todas às vezes que abria a boca, optou por partir e ser vista como a vadia que abandonou a família ao ser a coitada e robótica esposa de Louis .
Aliás, abandonar era uma palavra muito forte. mantinha contato periódico com a mãe e ambas se tinham como melhor amiga uma da outra. E naquele dia, mais que em todos os outros, ela apoiava a mãe em sua decisão e até sentia sua falta naquele momento em que tudo parecia uma imensa bagunça em seu coração e mente. Fortalecia-se ao imaginá-la, reconfortando-se com a ideia de que não estaria errada só porque seu pai dizia isso, assim como ocorreu com Martha.
O motorista pigarreou para que percebesse que já havia chegado.
– Oh, me desculpe. – desculpou-se enquanto vasculhava sua bolsa para catar algumas notas, como forma de pagamento. Estreitou os olhos para enxergar o taxímetro que marcava o valor a ser pago pela viagem e mordeu o lábio inferior com força ao entender o número expresso.
Demorou um pouco, mas logo havia juntado todos os trocados e entregado ao motorista, ficando somente com cinco euros em sua carteira. Agradeceu a Deus, mais uma vez, por Aylee ter lhe dado uma informação valiosa, caso contrário, procuraria sem o auxílio do taxista.
Desceu do carro despedindo-se do motorista simpático e recebendo uma lufada de vento gelado. O abraço do frio a acompanhou até que adentrasse a recepção do Amstelland Hospital em passos apressados.
Não sabia dizer se sua respiração descompassada era pela ansiedade de vê-lo ou pela preocupação que naquele instante parecia tão real. Mal conseguia falar quando cumprimentou a recepcionista com um aceno de cabeça e pronunciou o nome do rapaz:
– . – disse para a recepcionista que a fitou dos pés a cabeça descaradamente. Encolheu os ombros sem graça pela displicência da outra. – Acredito que ele esteja...
– Qual é o seu nome, por favor? – interrompeu-a.
– .
– Ah, certo. Senhorita , não estamos em horário de visitas. – a ruiva lhe deu um sorriso forçado, nem um pouco simpático.
– E que horas é o horário de visita? – perguntou sentindo um nó incômodo apertar a garganta.
– Amanhã, somente.
– Mas ele está... Bem?
– Não sou eu quem deve fornecer estas informações. – murmurou em resposta.
– E quem fará isso por mim? – conteve ao máximo a irritação que a indiferença da recepcionista fazia refletir em sua voz.
– Ninguém no momento está disponível para receber visitas ou lidar com elas, senhorita .
– Certo. – forçou um sorriso antes de se afastar do balcão.
Ela não poderia ir embora. Para onde iria? Para casa? Nem que lhe forçassem voltaria lá e encararia seu pai em sua revolta. E mesmo que quisesse, só havia cinco míseros euros em sua carteira, o que serviria apenas para uma passagem de trem – e seria útil, se a estação não fosse demasiadamente longe de sua residência e àquela hora não fosse a ideal para uma jovem perambular sozinha por ruas tão desertas.
Não.
Não importava os motivos que ela encontraria mentalmente para não seguir rumo à Zaanse Schans, pois simplesmente não arredaria o pé dali sem antes ter certeza de que ficaria bem. Fora para isso que ela enfrentara seu pai e atravessara Zaandam. Dormiria ali, se necessário. Imploraria por uma notícia ou a chance de uma visita a quem quer fosse. Não estava dando a mínima para seu próprio bem-estar ao tomar sua decisão, permaneceria ali até o dia seguinte e no horário que lhe permitisse, ela o encontraria. O que sucederia não interessava naquele instante.
Encheu um copo d’água no filtro que havia próximo a uma grande porta de vidro, e em seguida se reuniu a alguns poucos pacientes e acompanhantes nos bancos de espera. Sentia o olhar incômodo da recepcionista sobre si constantemente, foram necessários alguns minutos para que se sentisse confiante para retribuir. A ruiva parecia inquieta por trás do balcão, o que despertou sua curiosidade.
No entanto, a atenção de ambas as jovens passou para a porta de vidro que havia se aberto, liberando a passagem para várias senhoras que aparentavam ter em média cinquenta anos de idade, algumas já com cabelos grisalhos. Era inquestionavelmente notável a presença delas ali, pois falavam alto e eram muitas, além de estarem adentrando um recinto em que o silêncio era cortante como um bisturi há segundos.
abaixou a cabeça para evitar examiná-las e com isso parecer desagradável. Mas uma voz em meio aquele escarcéu de outros tons lhe fez erguer a cabeça e procurar sua respectiva reprodutora. Um pouco mais afastada, ainda perto da porta que separava a sala de espera de alguma ala de atendimento, estava a mais baixa dentre as mulheres. Carmen, com seus cabelos tingidos em um vermelho que já se desgastava e se misturava com o castanho de sua raiz, agradecia sem muita intensidade – como uma rosa murcha – àquelas senhoras pela visita e por suas orações.
Quando notou já estava de pé em frente a recepcionista, que tinha suas bochechas tão rubras quanto seus fios naquele momento, não fazendo questão de esconder seu desapontamento.
– Você disse que o horário de visitas havia acabado então o que essas mulheres fazem aqui? – apontou-as descaradamente.
Antes que obtivesse alguma resposta, alguém lhe tocou o ombro. A menina se virou abruptamente para atender o chamado, assuntando a pessoa que a tocava.
– ? – uma das senhoras grisalhas que estava ali. – ? Filha do...
– Isso mesmo. – forçou um sorriso.
Aparentemente, aquela mulher a conhecia por ser da igreja em que seu pai era pastor. “Ótimo.”, pensou sarcasticamente.
– Ora, criança. O que faz aqui em uma hora como essa? – colocou as mãos na cintura, olhando-a como se fosse uma garotinha que aprontara alguma.
Conteve o instinto de revirar os olhos ou ser simplesmente mal-educada. Não estava no clima para lidar com pessoas intrometidas que se consideravam suas responsáveis apenas por ela ser filha do pastor da igreja que frequentavam. sequer sabia o nome daquela mulher.
– Vim ver . Pelo visto, a senhora acabou de deixar o quarto dele. Como ele está? – sua nítida raiva era expressa em seu tom satírico e seu sorriso falso que chegava a parecer torto em seu semblante - grande era o esforço que fazia para colocá-lo ali.
– Oh, sim. – a mulher sorriu fechado, aparentemente não notando a neurastenia de . – Ele não parece muito bem, mas está estável há um bom período. Não sabia que vocês eram amigos.
– Amantes, se preferir. – não conteve a risada. Sua ousadia repentina –e bipolar – era hilária.
A mulher também riu, apesar de aparentar desentendimento. Talvez imaginasse que tudo fosse apenas uma brincadeira por parte da filha do pastor.
– . – outra voz lhe chamara.
Olhou por cima do ombro da mais velha com quem perdia tempo e enxergou Carmen, nada surpresa com sua presença.
– Olá, irmã...
– Seu pai disse que viria. – ela sorriu sem mostrar os dentes.
apesar de repentinamente ansiosa por estar falando com a mãe de , percebeu que a mulher olhava por cima de seu ombro, mais precisamente, para a recepcionista ruiva que a impedira de entrar. Quando captou o que acontecia, a ira retornou ainda mais ardente em si, mais difícil de conter.
– Eu quero vê-lo. – inquiriu firmemente. – Agora.
– Isso não será possível, querida.
– E por que não será possível?
A resposta não veio de imediato. Quando a mulher com quem conversava anteriormente percebeu o que se passava, afastou-se para perto das outras que assistiam a cena a alguns metros.
– Eu e seu pai...
– Não podem me impedir de vê-lo!
– Podemos, querida. – apesar do clima, sua voz era mansa. – E é o que estamos fazendo. Para o seu bem.
– Bem? Afastar-me de alguém que amo em um momento como esse é algo para o meu bem? – ela indagava incrédula.
– Sim, . Você pode não entender isso agora, – tocou no ombro da mais jovem – mas no futuro irá perceber. Meu filho não é o rapaz certo para você. Ele tem problemas...
– Como pode dizer isso do seu próprio filho? O que meu pai fez com você?!
– Não é porque ele é meu filho que eu fecharei os olhos para os pecados dele. Tenho conhecimento de que sua alma herdará o inferno, caso Deus não lhe conceda uma chance de voltar e se arrepender. – a voz dela embargava notoriamente.
se calou por instantes, as palavras daquela mulher pesando em seu coração. Então, realmente, todos criam que não teria salvação... Que ele não seria digno de tal. Só resta lhe o inferno.
– Me surpreende – começou a dizer com olhar perdido em um ponto qualquer atrás de Carmen. – como vocês, que se consideram merecedores da Salvação Divina, podem achar que cabe aos senhores decidir quem vai para o Céu ou para o Inferno. – olhou-a nos olhos enfim. – Não cabe a vocês julgar qualquer pessoa ou destino. Nem vocês sabem o que tem por trás da morte.
Havia deixado o hospital com uma explícita ameaça: “Eu contarei onde você está ao seu pai”. Não foi Carmen quem disse, mas sim alguma das mulheres que se aglomeravam na entrada do hospital e abominaram sua postura durante a discussão.
ria internamente ao se lembrar do momento em que agarrara o celular da senhora que a ameaçara e jogara no meio da avenida em frente o hospital. A dona do aparelho, indignada, tentou resgatá-lo antes que algum automóvel passasse por cima. Era a parte favorita da jovem na narrativa que fazia mentalmente: dera as costas para o hospital naquele momento, mas a sequência de sons denunciou o que acontecera em seguida. Uma buzina, um grito agudo e crack.
Apenas seguiu seu caminho sem se importar com quem praguejava atrás de si, mas aquele acontecimento lhe consolava. A ira que ela continha não poderia ser guardada daquela vez. Já havia muitos sentimentos ruins com que lidar.
Foi ao perceber o efeito positivo de sua rebeldia que tomou coragem para entrar em um bar de esquina, bastante movimentado. Sentou-se em frente ao balcão iluminado por uma luz vermelha e alcançou os cinco euros em sua bolsa antes de murmurar para o barman:
– Uma cerveja.
Sim, ela iria fazer isso. Como dissera à Carmen, não sabia o que havia depois da morte... Não acreditava em nada naquele momento, pois sua fé não parecia consolá-la, não se ela dizia que seu amado estava destinado ao sofrimento eterno. Ele morreria e queimaria no inferno, era o que os religiosos a sua volta insistiam em dizer. Pois bem, ela estava preparada para seguir pelo mesmo caminho.
Sorveu metade do líquido contido na garrafa de uma vez, dispensando o copo que fora oferecido. O sabor não a agradava em nada, no entanto insistiu em tomar o resto sem desencostar a boca do gargalo por sequer um segundo.
– Hey, gatinha, é melhor ir devagar. – uma voz masculina se pronunciou ao seu lado.
Mirou o homem assim que todo o líquido que restara na garrafa já havia sido transferido para sua boca, causando-lhe uma leve tontura pela pressa em que tudo acontecera. Ele não a encarava, apenas bebericava sua própria bebida de forma despreocupada. Seus olhos estavam na televisão a alguns metros, onde era transmitido um jogo qualquer com coreanos que corriam de um lado para o outro. Não se conteve ao prosseguir em sua análise. Algo era estranho naquele homem de barba por fazer e cabelos negros ajeitadinhos. Suas roupas eram displicentes, quase como os turistas americanos. É... Talvez ele fosse um turista, seu sotaque diferente o denunciava. Um turista que cheirava muito bem, por sinal.
Logo perdeu interesse naquele homem que a ignorava e passou a contar às moedas que tinha de troco.
– Quanto é a cerveja? – perguntou ela ao barman que passava com pressa e acabou por ignorá-la.
– 2,80 – o mesmo rapaz se fez presente novamente. – Se for euro.
– Falta... 60 centavos – constatou em voz alta ao contar as moedas novamente.
O homem riu.
– Eu sou engraçada, senhor? – ela virou-se para ele, dando de cara com seus olhos incrivelmente azuis.
– É sim. – ele afirmou com um sorriso zombeteiro.
arqueou uma sobrancelha, tentando compreender quais eram as intenções daquele homem. Turistas abusados.
– Se está me olhando assim para me seduzir e convencer a te pagar uma bebida, você conseguiu. – ele acenou para o barman na outra ponta do bar e o mesmo acenou de volta pedindo um momento.
– Pode guardar esse seu dinheiro sujo, eu não sou nenhuma colega que vai aceitar ir pra cama com você por causa de uma bebida. – ela piscou esperta. De uma coisa era certa, não precisava envolver ninguém em seu plano de desvirtuação, muito menos alguém que poderia trazer mais perda do que ganho. Já ia recolhendo suas moedas, preparada para sair, quando o ouviu dizer em meio a risos:
– Não esperava menos de você, .
A garota voltou-se para ele, parcialmente assustada. Foram necessários alguns segundos para sua expressão ser alterada da água para o vinho quando disse:
– Você me conhece? – perguntou com um sorriso que não pôde conter quando uma ideia brilhou em sua mente. Era tudo o que ela precisava. Alguém para contar de suas traquinagens para seu pai. Era como um plano de vingança, ou se não, ela mesma o contaria antes de partir de casa – não sabia como faria, mas era um plano que dependia também do estado de .
Ela não era assim. Não tinha vontade de beber todas e permanecer em lugares como aquele, conversando com estranhos que certamente tinham más intenções. Mas aquela nova adrenalina, a sensação do novo – que nem sempre era tão agradável – não permitia que seus pensamentos ficassem presos aos problemas. Aquilo não era uma solução, era um alívio. Tanto para sua preocupação com , quanto para sua ira com as pessoas que o maldiziam. Também era uma forma de dizer que as pessoas não poderiam controlá-la como imaginavam. Ela amava , não importava mais quem estava contra ou a favor, era sua vida que contava. E ela estaria com ele de todas as formas possíveis, faria de tudo para que nada pudesse atrapalhá-los, nem mesmo o que os esperava após a morte.
– Quem não te conhece naquela vila? – ele revirou os olhos.
– Eu não te conheço.
– E está interessada em conhecer, por acaso? – a mirou de canto de olho e soltou um risinho debochado.
– Talvez. Se você tiver coragem de contar tudo o que eu for fazer em detalhes sórdidos para o meu pai...
– Você quer que ele saiba que você esteve aqui? – perguntou surpreso.
– Sim. – afirmou ela com naturalidade.
– Eu estou com cara de mensageiro, senhorita ? – ele franziu a testa.
– Está com cara de quem quer ganhar algo com isso, senhor...
– . – completou. – Me chame de . E não, não quero nada de você – sorriu antes de voltar a se ocupar com sua bebida.
– Como me conhece?
estava confusa. Como ele podia conhecê-la da vila? Jurava que era mais um turista americano exibido. Zaanse Schans era minúscula! Era óbvio que ela saberia se um norte-americano houvesse se mudado para lá.
– Você é a filha do pastor...
– Tudo bem, mas você não frequenta a igreja. Nunca o vi lá, certamente me lembraria.
– Eu pareço ser alguém difícil de esquecer, não? – exibiu-se entre um gole e outro.
– Responda minha pergunta. – pediu soltando um leve riso. – Se possível depois de pagar minha cerveja.
Dessa vez, quem ria era ele, mais intensamente, no entanto.
Depois de ter feito o que ela pediu e o pedido ter sido entregue, ele tornou a falar:
– Eu levei Aylee, algumas vezes a igreja. Ela faz alguma coisa lá, tem até uniforme...
– Aylee? – perguntou surpresa. – É uma das minhas melhores amigas. – Sorveu o primeiro gole da garrafa.
– Sim, eu soube. – suspirou. – Ela é minha filha.
engasgou-se. De forma digna, com direito a cuspe e uma sequência infinita de tosses na tentativa de se salvar de um afogamento. a ajudou, ou tentou da melhor forma possível, repetindo a palavra “calma” diversas vezes. No fim, todos os olhavam e ele não pôde conter a gargalhada.
– Você está bem? – ele mordia o lábio inferior para se controlar ao olhá-la.
– Pai da Aylee?! – indagou em tom de incredulidade. – Você não parece ter idade para isso! Só pode ser uma piada!
– Eu agradeceria se não fosse verdade. Eu realmente me tornei pai muito novo.
– Conheço Aylee, desde minha infância...
– Nunca tive permissão para me apresentar como pai dela, tanto pela mãe, que é uma devota serva de Deus que nunca iria para cama com alguém mais novo e livre de um laço matrimonial, – ele debochou. – quanto, pelos meus empresários. Uma filha aos dezesseis anos nunca fará bem a carreira de alguém, ao que parece.
– Você é famoso, por acaso? – questionou confusa.
– Gosto de vocês. – ele sorriu ao encará-la. – Digo holandeses. A maioria não me conhece aqui.
– Você é famoso. – afirmou para si, revirando os olhos, descontente.
– Não seja tão preconceituosa, – ele gargalhou.
– E por que está revelando um segredo desse porte a mim? – a moça fez uma careta desentendida.
– Quem acreditaria em você quando nem minha filha ou a mãe dela confessam aos mais chegados? – ergueu uma sobrancelha, debochado. – Além disso, você não parece o tipo de garota que perderia tempo espalhando fofocas sobre alguém que você só viu uma única vez em um bar...
– Alguém que se diz pai da minha amiga! – ela negou com a cabeça, indignada com a novidade.
– Além do mais, é amiga de Aylee, a única pessoa que ela tem além da mãe... Achei que devesse saber. – tentou soar indiferente.
– Você não serve para os meus planos. – murmurou, deixando a segunda garrafa vazia no balcão e se levantando simplesmente.
a deu tempo para sair do bar e se afastar alguns metros da galera que se amontoava na entrada, antes de segui-la.
– Hey, espere – a chamou de longe.
– O que você quer? – perguntou mal-humorada.
Ela o havia achado incrivelmente bonito, perfeito para ser seu objeto de vingança, já que ele mesmo havia sido sua inspiração nessa ideia. Mas isso era só no quesito beleza, já que fazer aquilo sem este ponto a seu favor, sendo ele um total desconhecido, era um pouco mais complicado. A questão era que aquele ponto positivo era o único. Ele não poderia contar o que ela faria a Louis, pois aquilo apenas complicaria sua relação com Aylee. Outro negativo? Era o pai de sua amiga. Como ela a veria depois disso? Sentiria repulsa, ou pior – mesmo que se sentisse traída pela amiga ter omitido algo tão grave, aquilo não se tornava mais correto. Sempre ouvira da boca da menina que o pai havia a largado, o que não era bem verdade de acordo com . Se a relação deles já não parecia boa por que ela tentaria piorar? O último, mas não menos importante: ele era famoso. Não precisava enumerar os problemas que este pequeno detalhe acarretaria. não servia.
– Você não me contou o que quer que seu pai saiba. E o porquê de querer que ele saiba. – aproximou-se dela em uma corridinha.
– Acho que não te devo satisfações. – disse e lhe deu as costas.
– Eu te falei sobre mim! Coisas que você jamais imaginaria...
o ignorou, apertando o passo para que ele saísse de seu encalço.
– Talvez, eu sirva para os seus planos. – insistiu. – Eu estou disposto.
Ela parou. As palavras do homem lhe serviram como uma lâmpada que se acendia sobre sua cabeça. Por que ela estava pesando nos pós e contras com aquele homem? Não queria ser impulsiva? Deveria se aproveitar da primeira oportunidade que tivesse de se rebelar. Ao contrário disso, ela fugia do homem que estava lhe indicando o mau caminho com um olhar e bebidas de graça. Uma parte dela a prendia a Aylee e àqueles a quem não gostaria de decepcionar, mas essa parte se enfraquecia quando mergulhava nos olhos de seu mais novo companheiro de bar.
– Está disposto? – sentiu-se tentada a aceitar. – E o que tem a ganhar com isso?
– Digamos que eu estou prestes a descobrir. – sorriu, expondo seus dentes brancos e alinhados em total divertimento.
Estava ciente dos riscos que corria ao se deixar levar por alguém que sequer conhecia. Uma voz quase inexistente soprava em seu ouvido o que poderia ser feito com uma moça como ela - infelizmente, mulheres ainda tinham que se preocupar com isso. Mas seu coração palpitava sedento por adrenalina, e o perigo e a censura eram grandes fatores proporcionais a este hormônio. E mesmo que procurasse por isso, não conseguia temer como achou que deveria, talvez fosse porque ele refletia um pouco de Aylee em seu jeito prestativo, preocupado e esperto... Ou porque já estava começando a sentir o álcool fluir em suas veias e dispersar suas ideias. Para ela, que havia colocado apenas um gole de vinho na boca antes daquela noite, já havia passado dos limites.
Ele havia a levado para o hotel em que estava hospedado. Diferente do bar, o local era muito bem iluminado e acolhedor. A fragrância que exalava era familiar a , permitindo que ela se sentisse mais a vontade do que deveria.
havia sido um cavalheiro até o momento. Pediu para que ela contasse seus motivos, e talvez por estar bêbada ou inebriada pela sensação que o quarto de hotel lhe causava, contou quase tudo a ele. Havia omitido a parte sobre seu romance com , e priorizado a briga com seu pai e o desentendimento com as membras da igreja.
– Então se você quiser me roubar, eu só tenho dois euros na minha bolsa. – ela riu, enxugando as lágrimas que escorreram durante o relato.
riu também. Estava desconfiado de que havia mais por trás das palavras da garota, algumas peças em sua história não se encaixavam. Ele a consolou, a abraçou e secou suas lágrimas várias vezes durante o relato. Inicialmente, ele tinha a intensão de ajudar a amiga da filha no que quer que ela estivesse precisando, tentando ao máximo enxergar Aylee nela. Contudo, não era nada parecida com sua filha, e ele não conseguia fazer parecer o que sentia em relação às duas. Culpava-se por isso, no entanto, algo dizia que não era errado enxergá-la da forma que ele fazia.
– O que pretende fazer depois que realizar seu plano de vingança? – olhou-a nos olhos. Os dois estavam bem próximos, sentados em um divã e com vários petiscos ao redor.
– Sei que com a primeira ligação à minha mãe, já terei uma passagem e um lugar para ficar. Meu pai não poderá me impedir de ir, sou de maioridade há tempos. Só quero ter certeza que todos ficaram bem.
, ao seu lado, pareceu ponderar mais nos planos da garota do que ela própria. Era mais experiente para saber que tudo aquilo podia ser apenas passageiro e que futuramente era provável que o arrependimento fosse incurável. Ele gostaria de pensar positivo pela moça, no entanto. Naquele momento, ele reconhecia que ela estava profundamente abalada, e mesmo que talvez ele não conhecesse o real motivo, queria ajudá-la.
– Bem, se você ainda quiser minha perversidade como ajuda, acho que tenho um plano. – ele levantou-se do divã e aproximou-se de algumas bolsas que estavam reunidas ao lado do guarda-roupa. Após vasculhar um pouco, tirou de lá do meio uma câmera.
Os pelos de se arrepiaram com a proposta. Ela estava prestes a aceitar fazer uma loucura por algo que ela jurava ser vingança.
– Com a câmera podemos gravar tudo. Você terá sua mensagem entregue e não poderá ser negada. – ele tentou sorrir. – Mas não precisa fazer isso, .
Ele mesmo não cria que estava propondo isso para a mais nova. Era tão pervertido, tão promíscuo... Principalmente com uma moça como ela, que era considerada reservada e certa aos olhos de uma sociedade que esperava o primeiro tropeço para apontar. Logo, ele sabia que não existia ninguém que era perfeitamente bom, e todos deviam ter essa consciência. De maneira alguma esperava que fosse perfeita, mas conhecendo sua própria filha, não imaginou que a moça fosse muito diferente em questão de virtudes cristãs até vê-la no bar. Não podia negar que tudo aquilo que ele sugeria a ela era resultado da sensação que o tomara desde que a viu sentada com uma garrafa de cerveja na mão, a sensação que ele julgava ser fraterna em um primeiro momento, mas que naquela hora em que propunha algo perigoso, tinha certeza que não era.
Ela assentiu com a cabeça. Não iria voltar atrás, já havia chorado para um desconhecido e jurado em seu ápice de raiva e dor que se rebaixaria ao pior nível e seria tão indigna de salvação quanto qualquer pessoa. Ela estaria no patamar de , e seu pai não poderia contra argumentar. Podia ser chamado de vingança, mas era amor. Fazia aquilo para provar que amava , e que ninguém poderia impedi-la de estar com ele.
– Vamos começar. – foi até a mesa de centro e encheu o copo de conhaque. Deu um sinal e começou a filmar seus pecados.
A jovem respirou fundo, antes de levar o copo a boca e sorver um pouco da bebida. Um pequeno gole foi o necessário para que ela cuspisse em desgosto e terminasse de derrubar metade do conteúdo do copo no tapete.
– Ai, merda. – resmungou procurando um pano para limpar a bebida derramada enquanto ria. – Isso é horrível! – se queixava sobre o conhaque.
– Ei, mais respeito. Isso é conhaque caro. – continuava a rir com a câmera na mão.
– Acho que você não devia falar. – comentava agachada ao chão com um pedaço de tecido qualquer tentando fazer com que o líquido não se espalhasse mais. – Seus fãs podem reconhecer sua voz.
– Acho que consigo tirar o áudio antes de te entregar a fita. Não deve fazer muita diferença já que você não é capaz nem de pronunciar um palavrão digno. – ele zombou.
– Eu não me ofenderei com isso. – ela avisou, levantando-se do chão. – Olha, eu...
– Esquece esse tapete. – abanou as mãos no ar. – Eu pago para alguém limpar isso.
fez uma careta e ele riu para ela.
– Continue com seu plano.
– Eu não sei o que fazer para me mostrar uma rebelde se não consigo nem beber isso. – apontou para a fileira de destilados sobre a mesa de centro.
– Tente uísque com gelo, é o meu favorito. – sugeriu.
Ela procurou a garrafa onde estava escrito o que ele dissera e encheu um copo pela metade, colocando algumas pedras de gelo em seguida.
– Talvez eu tenha gostado desse. – murmurou depois de um tempo de degustação.
Ele sorriu.
– Uma dúvida. – ela fez uma pausa até que ele assentisse. – A mãe de Aylee é da Coréia do Sul, e elas já viveram lá por bastante tempo antes de virem para cá definitivamente. Como vocês se conheceram? Porque pelas minhas observações, você não parece coreano...
– Aylee é holandesa, não coreana.
– Sério? Ela tem sotaque e meus pais sempre disseram o contrário. – franziu o cenho.
– É o que queriam que acreditassem, aparentemente. – soou indiferente.
– E você? – sorveu mais um gole do uísque.
– Canadense.
– Droga! Eu jurava que era norte-americano! – ela exclamou. – Como essa mistura foi acontecer? Digo uma coreana, um canadense e então uma garota holandesa.
– Longa e ferrada história. – suspirou. – Mas o palco de tudo foi a Holanda. A Park estava aqui quando nos conhecemos e enfim... Esse vídeo está um pouco parado. – se queixou ele.
– O que quer que eu faça? – ela terminou de sorver o líquido gelado do copo, sentindo a ardência da bebida descer garganta abaixo pela última vez antes de se levantar.
– Há muitas coisas que uma garota correta, em termos religiosos, não faria.
– Tipo o quê? – ela procurou os olhos dele escondidos por detrás da câmera.
– Tipo masturbação. – ele deu de ombros.
– Você quer que...
– , eu não quero que você faça nada. – abaixou a câmera para olhá-la nos olhos. – Estou apenas...
– Ajudando. Eu sei. – ela tentou sorrir. – E como eu faço?
– Você nunca... An... – ele atrapalhou-se em perguntar.
– Não na frente de um homem que eu mal conheço e com uma câmera. – a moça revirou os olhos.
– Bem, faça da forma que preferir. – deu de ombros. – Com roupas, sem roupas... Com objetos... Não sei!
– Certo. – passou a se despir. O álcool já fluía em suas veias e alternava os comandos de seu cérebro. Enquanto contava tudo a , havia experimentado alguns goles magros de vinhos que somados ao uísque e as cervejas lhe causavam tonturas. Não estava caindo de bêbada, porém não estava em perfeitas condições, longe disso.
Retirou a jaqueta, estando de costas para a câmera. – Eu não sei fazer isso. – suspirou, envergonhada por estar tirando as roupas daquela forma.
– Você não precisa. – a lembrou em um sussurro.
tirou os sapatos e desabotoou a calça com os olhos fechados, repetindo mantras mentalmente para acalmar-se. Aliás, não era a primeira vez que arrancava as roupas na frente de um homem. Tocou na barra da blusa, hesitante em levantá-la. Queria fazer isso, mas não era tão desinibida e audaciosa quanto pensava, nem mesmo quando alcoolizada.
– Ah, eu não consi... – fora interrompida no meio da palavra por uma mão que se pôs sobre a dela e um corpo que colou em suas costas tão repentinamente que a assustara.
– Shiii... – soprou em seu ouvido. – Feche os olhos, .
– E a câmera? – ela questionou ao mesmo tempo que o obedecia, sendo inebriada pelo toque gelado do homem em sua barriga.
– Está posicionada. Pronta para filmar tudo o que você quiser. – ele respondeu baixo, soprando contra a pele do pescoço da garota e a fazendo arrepiar. Ele depositou um beijo ali.
assentiu com a cabeça ao tomar coragem e puxar sua própria blusa pra cima. Jogou a peça no chão e virou-se de frente para . Ao encarar os traços do homem e inspirar mais uma vez, agora mais intensamente, o perfume que seu corpo exalava, sentiu a atração antes contida se propagar em si. Ela não precisou imaginar antes de atacar os lábios carnudos do outro com ferocidade.
O baque de lábios tão repentino assustou que precisou de alguns segundos para retribuir com jeito. Agarrou os cabelos da menina que guiava o beijo com a língua ligeira
– Espere um momento. – afastou-se da cama seguindo até uma estante e tirando de lá a câmera. Foi até a mala e com um pouco de trabalho tirou de lá um suporte que conseguiu montar habilmente e posicionar em frente à cama. – Agora este é o seu palco.
Ele a encarou por minutos que pareceram incontáveis, como se pedisse para que ela confirmasse se era mesmo aquilo que ela queria. Um silêncio perturbador antecedeu qualquer resposta. não queria incentivá-la, sua consciência o repreendia. No entanto, havia escolhido ajudar e em nenhuma hipótese negaria que queria possuí-la como há muito não fazia com nenhuma outra. Não podia entender tal atração, e talvez a temesse de certo modo. Há tempos não se envolvia com ninguém ao ponto de ter a pessoa em seu quarto, mas era o tipo de mulher que ele não desejava por ter um rosto delicado e um sorriso bonito... Estranhamente, eram as feridas dela que o atraiam, como se por acaso ele fosse algum tipo de morfina.
não estava sóbria, e tinha consciência disso. Questionava a si mesma se o desejo que ardia em si era somente o álcool falando, ou se ela se arrependeria posteriormente. Namoradas normais estariam chorando por seus namorados que se encontram internados e com riscos de vidas, e ela estava fazendo exatamente o contrário. Antes daquele momento não tinha culpa em seu coração, pois o que faria seria um sacrifício por amor – ela não tinha prazer em jogar-se na lama, estava disposta àquilo para garantir seu lugar ao lado de onde quer que fosse, e para provar que ninguém poderia culpá-lo pelos pecados dela, com ou sem ele, ela decairia. Contudo, ao sentir a pele de sobre a sua, e após senti-lo tão perto, ela não podia negar que o desejava. Poderia ser o álcool aguçando sua libido, mas ela teria prazer em estar com ele naquela noite, por mais que a culpa passasse a corroer seu interior.
– Eu acredito... Que não seja eu mesma a fazer isso. – murmurou ao alcançar a garrafa de uísque antes de se aproximar do homem perigosamente.
– Você não precisa...
– Mas eu quero. Agora. – ela tomou um gole da bebida pelo gargalo.
Afastou-se do rapaz se desfazendo dos sapatos para subir sobre a cama e ali ficar de pé. Retirou o resto das roupas e as jogou no chão. Se era para fazer, então faria direito. Estava determinada a se entregar. Agora.
– Você vai ficar parado enquanto eu sujo seus lençóis... Sozinha? – ela tentou sorrir com malícia enquanto despejava o conteúdo da garrafa em seu próprio corpo.
– Você está indo bem sozinha, – soou rouco, consequência de sua excitação, que ela já podia ver em suas pupilas dilatadas.
tomou um gole do uísque antes de largar a garrafa vazia sobre os lençóis.
– Não tem graça brincar sozinha, . – aproximou-se da ponta da cama, o chamando com o indicador.
O homem não podia mais se conter. Suas calças já lhe incomodavam, e podia ser sua extensa seca, mas sua boca se enchia d’água ao observar a garota exalando o odor forte do destilado. Não havia mais para onde correr, ele não fingiria que se sentia culpado por estar com ela naquele momento. Ele a queria e a teria, com o consenso de ambos.
aproximou-se da cama e abraçou as pernas esguias e desenhadas com pequenas estrias de , distribuindo beijos e lambidas por sua extensão enquanto ela tinha as mãos nos cabelos dele, os puxando vezes leve e vezes grosseiramente. As mãos do rapaz passaram a passear pela pele dela e distribuir apertões em seus glúteos, coxas e canelas. Ele insinuou que pretendia subir no colchão, e ela se afastou um pouco da beirada para que ele subisse e, então, se colocasse de joelho em frente a ela. O rapaz acelerou as pinceladas com a língua e distribuiu leves chupões, próximo a virilha da moça.
Cada toque quente da língua de em sua pele a fazia suspirar, um fogo acendia-se próximo ao seu ventre e ela mordia o lábio inferior se contendo para não ir rápido demais. Contudo, logo se cansou de ocupar-se somente com os fios castanhos de . Desabotoou o fecho do sutiã sozinha e se livrou dele como havia feito com o resto de suas roupas, em seguida interrompeu os beijos do homem em si para retirar a última peça.
a encarou de cima a baixo assim que estava completamente nua, sorrindo admirado. , aproveitando-se do momento de distração do outro, ajoelhou-se também, ficando cara a cara para ele.
– Eu gosto de rapazes que falam, – disse, deixando de olhá-lo nos olhos para passar a distribuir mordidas no pescoço dele.
Ele a puxou mais para si pela cintura, sentindo os seios nus dela roçarem maravilhosamente em sua camisa. Passou as mãos pelas costas dela e pela lateral de suas pernas antes de invadir sua intimidade repentinamente com um dedo, sendo hábil o suficiente para tocar o ponto certo antes que a surpresa passasse. A moça soltou um gemido com o susto, deitando a cabeça no ombro do homem e ronronando ao sentir-se sendo massageada.
– E eu gosto das moças que gemem, . – sorriu lascivo, acelerando o movimento do dedo, a apertado um pouco mais e arrancando outro gemido dela.
Ela movimentava o quadril, em uma tentativa frustrante de sentir ainda mais o toque do rapaz. Como antes, estava insatisfeita com somente o que sentia naquele momento, com isso, afastou-o um pouco de si, na intenção de livrar-se das roupas dele, dessa vez, fazendo-o parar com a massagem em seu clitóris. Em segundos, a camisa estava aberta e fora de seus braços, e em seguida a camiseta branca que usava por baixo voava pelo quarto indo parar em qualquer canto desinteressante.
percebia a afobação dela e achava graça até, tanto que não podia conter o sorrisinho que despontava de seus lábios.
No entanto, ela não estava ali para brincar, nunca fora de brincar com sexo. O empurrou de forma a fazê-lo entender que devia se deitar. colocou uma perna de cada lado do corpo do homem que ainda vestia os jeans pretos de quando se conheceram oficialmente.
– Eu disse que gosto de palavras, baby. – sussurrou ela, passando a esfregar-se por sobre o membro dele ainda protegido pela roupa.
Ele agarrou-se ao quadril dela, como se para intensificar seus movimentos de vai-e-vem que ainda eram lentos e pouco sugestivos e procuravam torturá-lo. Mesmo assim, ainda sorria.
– O que quer que eu diga, ? – perguntou enrouquecido.
– O que está sentindo? – ela desceu os movimentos para a perna dele, passando a se esfregar ali enquanto tentava abrir o zíper da calça dele, falhando miseravelmente em fazer os dois ao mesmo tempo.
Ele desceu o próprio zíper para ela antes de responder
– Tesão, . – se pôs sentado para que pudesse puxá-la para si, quase desesperado.
– Por quem? – insistiu ela.
– Por você, – ele a observou acelerar os movimentos sobre sua perna e morder o lábio inferior com força no calor de suas sensações. Ele inclinou o dorso para alcançar a nuca da garota com uma mão e puxar seu rosto para um beijo.
O beijo se desenrolou entre suspiros e gemidos com ela o fazendo deitar novamente e terminando com seu vai-e-vem até alcançar o ápice. O fogo que sentia queimar em cada milímetro de pele era aliviado pelos espasmos que tomaram seu corpo. Para recuperar-se, ela tinha os dois braços estendidos um de cada lado do corpo de , apoiando seu dorso enquanto tentava normalizar sua própria respiração.
– Você disse que seu favorito era o uísque. – ela sussurrou, ainda com a respiração descompassada. – Então por que não está consumindo? – indagou ela, encarando seu próprio colo.
contorcia-se abaixo dela. Seus instintos ordenavam que ele invertesse as posições e a possuísse com força até arrancar dela o gemido que ela ainda continha. Mas ao contrário disso, tinha prazer em tê-la o torturando, mandando que ele fizesse as coisas do jeito que era somente dela. Ao ouvi-la falar aquelas palavras, ele avançara com tanto vigor sobre os seios da jovem que sentiu quando ela soltou um leve soluço pelo susto. Cravou os dentes e sugou, enterrando o próprio rosto entre os montes dela. Apertava um dos seios com uma mão e a outra mão estava nas costas suadas dela, forçando ainda mais o dorso de contra seu rosto.
– – ela o chamou em êxtase – O-olhe para mim. – pediu segurando com firmeza os cabelos suados da nuca do rapaz.
Ele se afastou o suficiente para encará-la e surpreendeu-se quando ela o beijou, não ferozmente como das outras vezes, ele podia sentir o gosto da boca dela misturado ao uísque dessa vez.
– Promete que não irá me impedir de nada, como todos os outros tentaram fazer. – pediu já na tentativa de se livrar da calça dele.
– Eu não irei impedi-la, linda – ele ajudou-a a livrar-se do jeans, afastando-a por torturantes segundos.
Quando já estava completamente nu puxou-a para seu colo, tomando seu pescoço em beijos molhados enquanto ela encaixava o membro dele em si.
– Promete? – ela pediu, cortando o beijo que se mesclava com os suspiros que as primeiras quicadas dela causavam em ambos.
– Prometo. – confirmou entre um gemido e outro, agarrando com força o quadril da moça.
A cama movimentava-se freneticamente com o movimento dos corpos – de modo que a garrafa de destilado que fora abandonada no colchão caíra no chão em um estrondo – e os gemidos preenchiam o cômodo. Quando começara a desacelerar, ele tomou a liberdade de inverter as posições e investir contra ela. Ele controlou-se para não chegar ao clímax antes dela, mas não demorou para que ela estivesse tão pronta quanto ele para tal. sabia, pois havia gemido um nome em seu ápice de prazer. E não era o dele.
Como se tivesse tido um pesadelo, abrira os olhos em um súbito. Sua respiração e batimentos cardíacos descompassados lhe confundiram nos primeiros momentos em que despertara do sono. O negro havia domado sua mente enquanto dormia, por que acordara com aquela sensação angustiante? Observou a bagunça do quarto, que era iluminado apenas pelas luzes da rua que atravessavam as janelas de vidro, para localizar-se.
Nada fora do comum, exceto as roupas femininas jogadas ao pé da cama. Ligou rapidamente os tecidos á sua respectiva dona, e ao notar que a mesma não jazia ao seu lado na cama, a sensação que o tirara do sono, angústia e ansiedade, voltaram a acumularem-se em seu peito.
– . – chamou-a alto, de forma que a jovem pudesse escutar em qualquer canto da suíte espaçosa. Porém, não obteve qualquer resposta.
Levantou-se, lutando contra a tontura que o abateu, e arrastou-se pelo quarto procurando qualquer sinal da garota. Encostou-se a porta do banheiro e ouviu a água jorrar, provavelmente na banheira. Soltou um suspiro de alívio.
– ? – tornou a chamá-la, dando leves batidas na porta.
Mais uma vez não houve respostas. esperou por um tempo, repetiu algumas vezes, e nada. Estava tonto com a dor que se alastrava por sua cabeça e sentia o corpo pesado, consequência das bebidas que ingerira após a transa, com certeza. Escorou as costas na porta, tentando inutilmente espantar a tonteira. Apertou os olhos com as mãos algumas vezes e tentava focar a visão olhando para frente. Foi naquela hora que sentiu falta de algo no horizonte do quarto que observava. Um elemento central, que deixava um vazio em sua ausência... A câmera.
Quando a percepção lhe atingiu, pela terceira vez naquela noite, seu coração acelerava-se e ele se via em um estado de assombro. Virou-se para a porta e tentou abri-la, no entanto, estava trancada. Socou ainda mais forte a madeira, permitindo que o tom de seus gritos por arranhasse sua garganta. Sua mão doía quando optou por derrubar a porta com o pé. Quatro chutes sem controle foram necessários para danificar a fechadura e permitir a entrada do rapaz no cômodo.
A primeira coisa que avistou fora a câmera presa ao suporte e posicionada estrategicamente para filmar a banheira. Choque percorreu sua espinha quando avistara o que a câmera capturava. A água que ele ouvia jorrar estava inundando o chão e transbordava da banheira em um tom diferente da habitual transparência; estava avermelhado.
Um soluço de susto foi inevitável. Talvez mais tarde não admitisse, todavia seu rosto se inundou de lágrimas instantaneamente enquanto se aproximava da garota apagada e a tomava em seu colo. Não se preocupou em desligar a água que jorrava pela torneira, e muito menos em calçar sapatos antes de cobri-la superficialmente com um roupão do hotel e sair pelo corredor iluminado clamando por ajuda.
Seu coração que tamborilava no peito ditava a velocidade com que tudo acontecia. acionou o botão do elevador, e no aguardo ele gritava a qualquer um que pudesse ajudá-lo. Dos braços de ainda escapava sangue, observando isso, ele a deixou no chão com as costas escoradas a parede do elevador e tentou conter o fluxo com a camiseta que ele mesmo vestia, ficando somente com uma camisa branca. Uma senhora, vestida em seu hobby de seda branco, os encontrou e apavorada correu para o interfone que era disponibilizado em seu quarto. Com a chegada do elevador, ergueu o corpo desfalecido de com certa dificuldade e adentrou o cubículo, logo pressionando o botão que indicava o térreo com o cotovelo.
Quando as portas se abriram no hall do hotel, pessoas uniformizadas já corriam em direção a eles. Uma maca surgiu em meio à desordem e fora induzido a deixá-la lá. Com passos apressados e empurrões, aquelas pessoas levavam a maca ao veículo branco e espaçoso, que não tinha nenhuma marca ou logo, mas que provavelmente pertencia à equipe hoteleira. insistiu, e até mesmo ameaçou bater em quem o impedisse de acompanhá-la.
O Amstelland Hospital tinha a área emergencial deserta, até o chamado do hotel. Alguns da equipe médica que estavam de plantão naquela noite já se enfileiravam a porta para receber a paciente noturna, preparados. O veículo alvo fora estacionado ligeiramente e logo a maca já estava dentro do hospital, correndo pelos corredores com médicos e os prováveis paramédicos do hotel que entregavam um corrido diagnóstico superficial.
avançou sem ser impedido até uma sala equipada e não muito próxima da entrada emergencial do hospital. Uma jovem, baixinha e rechonchuda, o barrou. Ela dizia algo que ele não podia entender, pois grande era a aflição em ver daquela forma. Deixou-se levar pela enfermeira que tentava o acalmar quando a porta da sala que abrigava se fechou em um baque, e a única coisa que ele podia fazer por ela era rezar.
Em pouco tempo, que para ele parecia milênios, a equipe médica inteira chegava para dar a notícia do estado de saúde de .
Até aquela vez, não se recordava qual fora o dia mais turbulento de sua vida. O dia 27 de fevereiro de 2018, aquela noite, estava em potencial vantagem em relação a qualquer uma em suas lembranças. Enquanto o temor pela vida de , uma jovem tão perdida em sentimentos e tão mal vivida até então, apoderava-se de seu ser, uma terrível bolha o envolvia, onde sua enxaqueca e corpo mole complementavam o pacote “deplorável”.
Ao que parecia, não era somente ele que aguardava notícias, mas sim toda a América. Seu celular teve de ser desligado, pois seus empresários não o davam descanso. Todos sabiam sobre ele e . Os vídeos haviam sido expostos na internet – provavelmente, por alguém que adentrara o quarto de hotel dele que havia sido deixado aberto –, e a América, que ainda não havia dormido, pipocava com a notícia de um vídeo erótico estrelando e uma jovem desconhecida que fora parar no hospital após a farra. Boatos corriam e teorias eram formadas, provavelmente agora ele era um sádico ninfomaníaco da internet. Como se ele realmente precisasse de mais dor de cabeça.
Contudo, só conseguira pensar nos motivos que levaram a garota a se machucar. Ela realmente queria tirar a própria vida ou fazia parte de sua encenação? Se fosse a primeira opção, não fazia sentido o porquê da escolha do suicídio. Como ele não enxergara tanta fraqueza nela? Estava confuso e precisava urgentemente de respostas. Sabia que havia ocultado algo em sua narrativa, mas não podia imaginar o que a faria chegar àquele ponto tão repentinamente.
Os médicos e enfermeiros que o encaravam com sorrisinhos contidos, não pareciam saber de sua nova reputação – já que traziam chinelos para que ele usasse a vista de que havia saído descalço do hotel –, porém aparentavam ter boas notícias. se pôs de pé para recebê-los.
– ? – uma das mulheres, a baixinha e de cabelos castanhos que havia gentilmente lhe entregado o par de chinelos, inquiriu mais simpática do que o normal para um profissional.
– Sim. – ele tentou soar afável também.
– A garota que o acompanhou...
– . O nome dela é . – a interrompeu.
– Sim. Ela está bem. Perdeu bastante sangue e por isso estava desacordada. – explicava tranquila, gesticulando com as mãos. – Havia álcool em seu sangue e por isso o processo foi um pouco mais demorado, mas agora ela está descansando no quarto e tomando sangue pela veia. Acreditamos que logo ela venha acordar.
– Muito obrigado. – agradeceu.
Sentia o peso em suas costas diminuir. Um sedento desejo de olhar nos olhos grandes de e reconhecer se ela realmente estava bem, sendo física ou emocionalmente, infringiu seu interior.
– Eu posso vê-la?
– Claro, eu te guio. - a mulher sorriu exibindo os dentes manchados de café e saiu à frente do rapaz.
As mãos de estavam molhadas de suor enquanto percorria o caminho até o quarto onde estava internada. Precisava vê-la com os próprios olhos, confirmar a veracidade do diagnóstico dos médicos. Mas não era somente isso, além de sua saúde física, ele precisava saber se ela estava curada de sua raiva ou se o odiava por tê-la incentivado àquela insanidade. Talvez isso justificasse sua repentina inquietude.
Ao cruzarem a esquina a jovem médica empacara seus passos. Vozes estridentes escapavam de algum dos quartos, o quê a espantou. Era um hospital calmo, não havia nada fora do normal há meses, e então em uma bela madrugada uma garota tenta suicidar-se e quem a acompanha é um artista americano mundialmente conhecido – por mais que ela mesma nunca houvesse ouvido falar, os seguidores do rapaz no Twitter falavam por si –. Agora ela tinha que lidar com uma baderna na ala que era para ser de repouso. Inconvenientemente, todo o barulho tinha como matriz a sala da paciente que acompanhava.
– An, senhor poderia seguir sem mim? Parece que tenho um problema a resolver. – sorriu fechado, colocando uma mão nas costas do homem e o guiando para o lado contrário de onde vinham os gritos. – Pode seguir em frente, lá no final terá uma escada. É no terceiro andar.
Ela o faria dar uma volta desnecessária pelo hospital para encobrir a falha de algum funcionário que permitira um visitante adentrar o quarto antes mesmo do acompanhante. Não admitiria que aquele astro saísse se queixando de seu local de trabalho de forma alguma.
seguiu o caminho indicado em sua bolha de tensão e dores de cabeça. Assim que chegou ao segundo andar fez uma parada para beber água antes de subir mais rápido do que anteriormente. Ao chegar ao terceiro andar, pediu auxílio para a recepcionista negra e bem arrumada que visualizava a tela do computador.
– ? – pediu confirmação, recebendo um aceno de cabeça por parte de . – Ela tem uma consulta marcada para hoje à tarde, mas não está aqui agora.
– Uma das médicas me disse que ela estaria recebendo sangue por aqui.
– Sinto muito, senhor. Esta é a ala psiquiátrica, não temos ninguém aqui nesse estado. – a mulher explicou e por fim lhe sorriu gentilmente.
– Onde posso encontrá-la? – perguntou comedindo a irritação na voz por ter sido enrolado.
– Aparentemente, no primeiro andar. Fica depois da sala de visita e antes da ala dos pós-operatórios.
– Obrigado. – tentou sorrir para ela antes de se retirar.
Optou por usar o elevador desta vez. Não gostaria de admitir, entretanto estava fadigado ao extremo. Desejaria sua cama, sua casa e sua família constantemente se não houvesse culpa em tal anseio. Ele tinha ajudado a provocar aquela situação, e como um homem, herdaria com todas as consequências viáveis a ele, e a família. Havia tempo que não saia da linha, fora a primeira em anos em sua cama, e até então seu maior problema.
Pressionou o botão do primeiro andar assim que já estava dentro do cubículo metálico e escorou-se próximo ao painel dos botões. Tinha a cabeça baixa quando a porta se abriu, mas avistou os pés calçados em sapatos sociais impecavelmente engraxados de quem aguardava o elevador no primeiro andar. Não pôde conter o passo para trás que o susto lhe causara quando reconheceu aquele velho. Louis , sem dúvidas, carregava uma carranca nada agradável e tinha atrás de si uma mulher robusta que parecia fazer parte da equipe de segurança.
Para felicidade de , o pastor não o reconhecera – o que já era esperado – e muito menos suspeitara de seu sobressalto. Assim que deixou o elevador e ouviu o baque das portas se fechando e levando o velho para longe os fatos se interligaram em sua cabeça. Os gritos, a mentira da médica e a presença de Louis eram pontos em um mesmo plano.
Concluindo isso, acelerou o passo para se encontrar com . Praticamente correu pelos corredores alvos, atraindo atenção das pessoas que se acumulavam próximas ao seu destino. Quando adentrou o quarto que julgava ser o certo, não encontrou ninguém. A cama estava vazia e desarrumada e a bolsa de sangue estava abandonada ao lado. Após mais um sobressalto, estava ele percorrendo novamente os corredores a procura da morena. Medo tomou conta de seu peito, pois não podia perdê-la de vista.
Quase como um canto de sereia, o choro da moça o havia atraído para um quarto em outra ala do hospital, onde jazia o corpo de um rapaz de cabelos escuros sobre o leito. tinha o rosto enterrado ao lado do jovem e não havia percebido a presença dele ali por estar de costas. Ela murmurava entre as lágrimas, falando com o homem que tinha os olhos fechados.
– Eu estou aqui. – ele pôde entendê-la repetir. – Todos esses erros, mas ainda estou bem aqui. – levantou a cabeça para fitar o rosto pleno do rapaz e acariciá-lo com as costas da mão.
continha a respiração sem que ao menos percebesse. Observou os curativos pela metade que estavam em seu braço, ela havia tentado tirá-los. Seu coração doía, e não podia afirmar exatamente o porquê aquela cena o causava tal sensação.
– Eu não tenho as respostas. – ela fungou. – Mas a pergunta é clara.
já se preparava para deixar o quarto, incapaz de suportar a dor que lhe infringia. Não podia mais assisti-la, sem querer impedi-la como todos os outros tentaram. Queria tirá-la dali e afastá-la daquele homem que sequer sabia quem era.
– Me deixe perguntar – soou mais alta e quando voltou a mirá-la, o olhar dela estava em si. A pergunta demorou um pouco para vir, e nesse tempo o olhar da garota perdeu-se em um ponto qualquer. – Para onde todos vão quando partem?
Então ela pretendia partir. E por que ele sentia-se tão desesperado com aquela ideia?
– Ele... É o ? – tentou perguntar sem soar satírico e acabou por falhar.
– Não. – respondeu ela ao levantar-se da cadeira adjacente à cama. – morreu nessa madrugada. – assim como a tentativa de , falhou em sua meta de pronunciar as palavras sem prantear. Ela soluçou audivelmente e cobriu o rosto com ambas as mãos, precisando de alguns minutos de recuperação para conseguir dizer. – E eu queria seguir pelo mesmo caminho...
– Isso não é amor, . – foi o que conseguiu dizer o homem.
– Eu não posso viver em um mundo onde pessoas como ele não merecem uma chance. Nós somos iguais! – soluçou. – E se ele não merece viver, eu também não.
– Você não vai fazer isso. – ele ditou a ordem, dando um passo em direção a ela.
– Você não pode me impedir. Prometeu que nunca o faria. – ela tentou sorrir.
Era sincera sua promessa quando dita. Naquele momento quando professada, ele acreditava que não poderia magoá-la com o sentimento doce e suave que carregava pela jovem. Tal sentimento ele não sabia interpretar ainda, mas sabia que era ele que o faria quebrar promessas.
– Você é tão egoísta. – decidiu mudar de estratégia. – Sabe o que aconteceria a mim se você morresse no meu quarto de hotel? Sabe o que já está acontecendo por terem encontrado o vídeo da noite passada? – ele aumentou o tom de voz, fingindo uma raiva que estranhamente ele não sentia. Estava ocupado demais se preocupando com ela no momento.
– É só com isso que vocês se importam, não é? Só com vocês mesmos. – ela enxugou as lágrimas com raiva. – Tanto faz se eu estivesse morta, contanto que não prejudique ninguém. Eu vou lembrar isso da próxima vez. – murmurou sarcástica.
Ele riu descrente.
– Você queria que eu me preocupasse com você? Para quê? Para sentir doer em mim quando você tentasse se machucar por outro homem? – silêncio. – Parabéns, . Você conseguiu o que queria! Mas isso não me faz menos egoísta, não é? Só mais idiota. – ele cuspiu, antes de deixar o quarto de um completo desconhecido em passos raivosos.
estava dilacerado. Ainda que tentasse culpá-la por seu coração partido, sabia que na verdade a culpa era somente dele. Por sua atração ou tenra bondade, ele havia se envolvido com alguém que o quebrara sem pestanejar.
Já , não chorava mais. Fitava a porta por qual saíra, fixamente, como se estivesse hipnotizada. Ela era indigna de respeito e também de Salvação Divina, estava completamente suja de lama. Ela havia conseguido o que queria, e só lhe restava à resposta para a pergunta...
Para onde todos vão quando partem?
¹ O obreiro, nas igrejas, é o auxiliar do pastor, é visto como uma autoridade espiritual e eclesiástica.
FIM.
Nota da autora: Olá! Bem, este foi meu primeiro ficstape (porém, não o único), e espero de todo o coração que tenham gostado! Mudei esse finalzinho tantas vezes, e este foi o único desfecho que me agradou hahaha... Espero não ter decepcionado muito.
Para quem nunca ouviu I Am Here da P!nk, convido a escutar. É ótima! A inspiração para esta estória veio logo da primeira vez em que li a tradução...
Obrigada a quem leu até aqui e a toda equipe por trás do ficstape de “Beautiful Trauma”!
Outras Fanfics:
- SNUFF (Andamento/Outros)
Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.
Para quem nunca ouviu I Am Here da P!nk, convido a escutar. É ótima! A inspiração para esta estória veio logo da primeira vez em que li a tradução...
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