Capítulo Único
- Eu estou cansada, por favor, me leva pro quarto? – pediu.
- Claro, meu amor, como quiser.
Calmamente, auxiliou para que ficasse de pé. Ela parecia esgotada, e, vê-la naquele estado fazia-o sentir-se impotente, mas ele tinha que parecer forte, por ela, que embora sempre negasse, precisava dele.
- Não precisa ficar, . Pode descer e continuar com todo mundo, eu só preciso descansar. – comentou ao deitar-se na cama. já acomodava-se também.
- Eu fico aqui com você, estou cansado também.
- Ah, me poupe. Não precisa ficar aqui de babá, me deixa sozinha, . Sai, desce. Vai fazer sala pro pessoal. – despejou impaciente.
Ele não teve escolha. Levantou-se com pesar e a deixou sozinha no cômodo. Suspirou profundamente antes de trancar a porta e após arrumar a camisa, desceu as escadas rumo a sala, onde se encontravam alguns amigos e familiares.
- Achei que fosse ficar com ela. – Bruna, prima de , fez uma afirmativa com sentido de questionamento.
- está arredia. Tem sido difícil para ela. – Os olhos baixos de não escondiam seu descontentamento.
- A gente tem que dar o tempo dela, né? Ela ainda não aceitou... – Bruna se fez ouvir novamente.
- Mas já vai fazer duas semanas. – Bryan murmurou.
- Que seja um ano, uma hora ela vai ter que aceitar e eu vou estar ao lado dela. – completou.
Todos na sala olharam para com pesar. Ninguém conversava abertamente sobre os acontecimentos de duas semanas atrás, e estarem ali, já era uma forma de dizer que os estavam apoiando.
Por um momento os três casais de amigos que estavam na casa fizeram esquecer os minutos anteriores com . Jogaram truco, bebericaram algumas taças de vinho, e já se passava da meia noite quando todos resolveram ir embora.
arrumou um pouco da bagunça que ficou da agitada noite entre amigos e rumou em seguida para um banho quente. Cobrindo o corpo com apenas uma toalha na cintura, , que agora buscava uns shorts folgados para dormir em seu guarda roupa, observou de soslaio a esposa que dormia tranquilamente na cama do casal.
Um sorriso tímido formou-se nos lábios do marido. Apreciar dormindo era uma das coisas mais maravilhosas e encantadoras que ele já tinha visto na vida, e ele queria profundamente que ela estivesse sonhando coisas boas, como os momentos bons que eles viveram ou mesmo sonhando com um futuro mais promissor para ambos.
Embora fingisse ou não mais acreditasse, ele a amava muito. Sempre a amou, desde aquela festa a fantasia da turma de medicina da faculdade em que se conheceram.
Deitando na cama, procurou aninhar-se ao corpo da esposa que automaticamente o rejeitou. Triste com a situação, ele virou-se para o outro lado e buscou adormecer.
~X~
No final da tarde de umas semanas depois, achou que a ideia que Sarah, sua colega de trabalho, tivera era excelente. Apressou-se para ir ao endereço por ela indicado e em menos de cinco minutos admirando alguns cãezinhos, um spitz acinzentado lhe brilhou os olhos. Seria aquele.
Com um adereço em formato de gravata borboleta no pescoço do cãozinho spitz, que ainda não tinha nome, levou-o contente para casa. Sentia e sabia que iria adorar.
Quem sabe assim, com um bichinho para distrair-se, não retomava o sorriso no rosto? Quem sabe ela pudesse voltar a ser uma mulher feliz? Quem sabe ela não seria a mulher dele novamente? A tentativa era válida.
- Fica quietinho, cãozinho, você é uma surpresa para a , então comporte-se até ela te ver. – o cão estava dentro de uma enorme caixa de presente.
Abrindo a porta da casa, notou que estava sentada no sofá da sala olhando alguma coisa qualquer na TV. Não contendo-se, já foi logo falando.
- Oi, amor, que bom te ver aqui. – falou enquanto colocava seus pertences e a caixa em cima da mesa.
- Eu não saio de casa há semanas, . Achei que você soubesse disso. – ela disse secamente. Ele ignorou.
- Eu trouxe uma surpresa pra você. – O homem levou a caixa até o sofá onde estava sentada. – Espero muito que você goste.
sentou-se também, estava ansioso e queria que se interessasse pelo presente. De repente a caixa mexeu-se e num susto a mulher levantou-se assustada.
- O que tem ai dentro, ? – parecia nervosa.
- Já disse, amor, uma surpresa pra você, abra! – ele sorria.
- Me fala o que tem ai dentro dessa caixa, eu não quero abrir. – , como sempre impaciente, exigiu.
não respondeu, arrependeu-se porque pensou que ela ficaria feliz, mas já ficou evidente que era o contrário. A caixa mexeu-se um pouco mais, revelando o pequeno cãozinho.
- Eu não posso acreditar que você trouxe um cachorro para essa casa, . – as lágrimas odiosas formaram-se nos olhos de . – Eu não posso acreditar que você trouxe um cachorro para substituir o meu filho. - A mulher gritou com o marido. Gritou e revoltou-se. - Você não tem qualquer noção da dor que estou sentindo, e ainda piora tudo trazendo essa coisa pra nossas vidas. Isso jamais vai substituir a memória do meu filho, jamais!
- Não foi minha intenção, . Eu só queria que você ficasse feliz. – uma voz baixa e um cabisbaixo responderam.
- Eu odeio esse seu vitimismo, . Eu odeio essa sua forma de tentar me ajudar. Essa coisinha fofa de todos os dias pra tentar me agradar. Para! Por favor, para com isso, para de perder o seu tempo! Tudo o que você pode fazer é simplesmente me deixar em paz com a memória do meu filho.
- Ele também era meu filho! – gritou. – Eu também sinto muito por tudo o que aconteceu, . E eu sinto mais ainda porque além de perder meu filho, eu estou perdendo minha esposa.
As palavras de causaram um impacto em que, após alguns segundos para recobrar a fala, ironizou:
- Agora você vai me culpar?
- Ninguém tem culpa do que aconteceu. Foi um acidente, você precisa seguir em frente.
, triste e decepcionado, dirigiu-se a porta da frente, batendo-a atrás de si. Estava sendo difícil toda aquela situação e ele já parecia sem forças para lutar. estava sendo injusta com ele e não percebia que além do sofrimento da perda do filho, sentia-se impotente por não poder ajudá-la. Ele tinha que lidar com tudo aquilo.
No caminho de um bar qualquer, ligou para Bryan que o encontrou. Contou-lhe o desfecho da noite em que esteve em sua casa e a situação vivenciada minutos atrás. Desabafou e até chorou.
- Eu sinto muito. Sinto de verdade. – Bryan tocou o ombro do amigo.
- É o que todos sentem, eu também sinto demais. – levou o copo de cerveja a boca. – A só tem me tratado mal, não me chama mais de amor, não olha nos meus olhos, sempre me critica. E hoje ainda me chamou de vitimista. Sinceramente não sei mais o que fazer.
- Já pensou em dar um tempo pra ela? Não incomodar? Penso que um tempo afastados seria bom. – Bryan tentou aconselhar.
- E deixá-la sozinha? Eu não poderia, Bryan. Eu aguento o que for necessário para vê-la sorrindo de novo. Eu sei que é uma fase que vai passar.
- Desculpa se o que eu vou te falar agora te magoe, mas isso que você está sentindo é culpa. E você não tem culpa, .
- Se eu estivesse com ela em casa, como devia, ela não teria perdido nosso filho.
- Você não tinha como adivinhar isso. – o amigo colocou uma mão no ombro de para confortá-lo.
- Mas eu poderia ter feito alguma coisa.
~X~
Passava das dez da noite daquela segunda no instante em que entrou na casa. Estava cansado, cabisbaixo e pela primeira vez em anos não tinha vontade de estar ali. Era um local silencioso e sem vida, nada parecido com o que era semanas atrás. Ele caminhou até a cozinha e serviu-se de um copo de água, e enquanto bebia olhou assustado para o sofá. A caixa do presente estava ali, mas o cãozinho não.
Por um instante desesperou-se. Como poderia ter esquecido do cãozinho que antes havia rejeitado? O que poderia ter acontecido com ele? Um pânico de minutos tomou o corpo de .
- Está procurando o Joaquim? – apareceu na sala carregando o pequeno animal no colo.
- Joaquim? – perguntou surpreso.
- É, Joaquim, nosso filho. – acariciou o pelo do cão e sorriu para o marido. – Ele não é lindo, amor?
, embora momentaneamente contente, assustou-se com a cena. não o queria e agora o cão tinha até nome. E nome de gente. O nome que eles tinham pensado para o filho deles, caso nascesse menino.
- Não precisa ficar assustado, amor. Depois que você saiu, o Joaquim e eu começamos a brincar e eu vi nele o sorriso outra vez. E fica tranquilo que eu não estou tendo nenhum surto psicológico não, eu sei que ele é apenas um cachorrinho.
- Mas Joaquim, ? – não conteve-se de tristeza, agora ele parecia perplexo com as escolhas que ele mesmo fizera.
- Sim, amor. Joaquim. Você não gostou? – agarrou-se com o pequeno spitz e mirou o marido com olhos pedintes.
- Esse era o nome dele... – não conseguiu mencionar a criança que estava por vir.
- Eu sei. – colocou o cãozinho no chão e aproximou-se do marido. – E se você não gostou do nome, podemos escolher outro, não tem problema. Eu só acho que ele tem cara de Joaquim – e ela sorria, com os olhos brilhantes, coisa que não via há alguns meses.
abraçou o marido, e ali ele desmoronou. Envolveu-a também no seu abraço e chorava copiosamente como se criança fosse. também tinha lágrimas nos olhos, mas procurou calar-se enquanto via o marido desmanchar-se. Era a vez dele de sentir a dor. Era o momento em que ele poderia sofrer, enfim, a perda que tiveram.
Minutos passaram-se até que afrouxou o abraço forte que mantinha sobre . Envergonhado, com as costas da mão direita limpou as lágrimas que ainda teimavam em cair.
- Me perdoa por isso. Eu, eu...
- Eu que tenho que te pedir desculpas, meu amor. Eu não fui uma boa esposa esses últimos dias.
- Você estava sofrendo.
- Você um pouco mais. – os olhos vermelhos denunciavam que novas lágrimas viriam, mas ela segurou. – Eu fui injusta e egoísta, pensei mais em mim e no que eu estava sentindo e não pensei que você também sofria. Eu quero muito que você me perdoe para que possamos recomeçar.
- Eu me culpo por não estar aqui quando tudo aconteceu. Você não tinha que ter passado por tudo aquilo sozinha. – ainda lamentava.
- Ninguém tem culpa de nada, hoje eu quero acreditar que se tudo aconteceu da forma como aconteceu é porque ainda não estávamos preparados. Pensa, podemos tentar outras vezes até conseguirmos. – outro sorriso brotou nos lábios da mulher, daqueles tentadores, desejosos, e como gostava daquele sorriso.
- Quantas vezes você quiser. – ele respondeu. Os lábios selaram-se num beijo salgado pelas lágrimas que ambos ainda teimaram em derramar. Mas era um beijo de reconciliação com o passado de ambos, um beijo de amor e de saudade.
~X~
- Ai meu Deus! – estava nervosa ao observar os dois tracinhos vermelhos que denunciavam o que ela já sabia que significava.
- O que foi, amor? – mantinha a cabeça grudada na porta do banheiro enquanto segurava Joaquim, agora com seis meses e já aderindo a cor amarronzada característica dos spitz.
abriu a porta do banheiro com o teste em mãos. Sua face estava tão pálida como nunca esteve e ela não esboçava qualquer reação. largou o cachorro no chão, que logo correu para entrelaçar-se aos pés de , e o marido tomou de suas mãos o teste que revelava o que eles já esperavam.
- Estamos grávidos! – sorriu, abertamente, largamente, felizmente.
- Vamos ser papais de novo. – pegou o cachorro em seu colo, abraçando o marido que a rodopiou.
- Dessa vez eu não vou sair do seu lado. Ficaremos grávidos juntos, posso até tomar mais cerveja pra você não se sentir tão sozinha com um barrigão. – sorriu e beijou a esposa ao terminar a fala. – Eu amo você e todos os quilos que você ganhará também.
- Eu não acho que você está me ajudando não, amor. Mas eu vou amar você do meu lado todo o tempo.
~X~
- Se você não chegar aqui agora eu vou te matar, . Eu juro que te mato! – gritava no telefone enquanto era pressionada pelo médico a forçar a criança sair do seu ventre.
- Calma, amor. Estou chegando. – , também desesperado, apressava o táxi para traçar uma rota alternativa.
desligou o telefone exasperada. Tinha em mente que queria vivenciar aquele momento ao lado do marido que esteve com ela durante toda a gravidez. Ele não poderia deixá-la sozinha naquele instante, logo quando o neném que tanto esperaram viria ao mundo.
- Oi, boa tarde. O quarto em que minha esposa, digo, Vieira, se encontra, por favor!
ouviu o número do quarto e sequer anunciou a sua chegada, já foi logo tomando a mão da esposa que a apertou fortemente. Ele segurou o grito, e balbuciou para a esposa:
- Realmente estamos ganhando um neném, não é? Você quer mesmo que eu sinta sua dor. – Ele tentou sorrir, ela apertou a mão dele novamente e gritou para que ele calasse a boca.
O obstetra pediu para que continuasse o que quer que estivesse fazendo para que ajudasse com que ela continuasse colocando toda a força necessária. sabia como deixá-la irritada, mas naquele momento, vendo seu sofrimento, só queria sentir a dor por ela. Ele chorava, e não sabia se pela dor em sua mão ou pelo desespero de ver naquele estado.
Mesmo assim, ele fez o que lhe foi pedido e não demorou muito até que se ouvisse o choro peculiar do nascimento.
- Uma menininha! – o médico anunciou.
O sexo do bebê foi ouvido com emoção. e choraram e logo o obstetra colocou a criança nos braços da mulher que não estava muito preocupada com sua aparência.
- Nossa filha, . – acariciou a cabecinha já cabeluda da criança.
- Nem acredito que sou pai de uma princesinha. – não continha as lágrimas. – Qual nome vamos dar para ela?
- Alice. – olhou para o marido que restou perplexo. – Alice Assunção Vieira.
- O nome da minha mãe. – colocou os olhos na pequena garotinha e sussurrou baixinho – Alice Assunção Vieira, assim como a vovó que está no céu.
O homem uma vez mais não se conteve e chorou, vindo a beijar a esposa em seguida. Era, sem dúvida, o dia mais feliz da vida de ambos e estava mais feliz ainda por poder proporcionar a maior homenagem para sua sogra, que, com certeza, estava em um ótimo lugar e também para o seu marido que ela amava mais que tudo na vida. Bom, agora tinha alguém que amava tanto quanto ele.
~X~
Como narradora dessa história simples e curta que você acabou de ler, posso dizer que e vivenciaram outros muitos momentos felizes. E vários outros tristes também, pois a vida não é perfeita.
Alice foi uma criança puramente saudável, que desde muito pequena se afeiçoou ao “irmãozinho” Joaquim. Aderiu da mãe cabelos escuros e ondulados e do pai os olhos expressivos e marcantes. Posso dizer a você que Alice era adorável, fisicamente e emocionalmente e pudera, visto que seus pais a educaram muito bem.
Ao completar quatro aninhos, a menina ganhou outro irmãozinho. Dessa vez era Benjamim, um pelado, como dizia Alice (diferentemente dela, ele nasceu completamente careca). Nasceu gordinho e se não fosse o obstetra afirmando que aquele ato era espasmo, diria perfeitamente que era sorriso de felicidade, afinal estar naquela família era garantia de momentos felizes.
logo disse que se fossem ter mais um filho precisaria realizar uma tomografia da mão, não aguentava mais a dor da força que estabelecia enquanto desesperava-se no parto natural.
Eu sinceramente não sei como terminar essa história, pois realmente queria escrever muito mais sobre essa família que tanto amei acompanhar. Mas assim como eu, fique com essa imagem na mente: Uma menina no jardim brincando com seu cãozinho, um homem empilhando madeiras para montar a tão sonhada casinha de boneca da criança e uma mulher sentada na varanda com seu neném adormecido no colo, sorrindo para a cena de sua família desenhada em sua frente.
- Claro, meu amor, como quiser.
Calmamente, auxiliou para que ficasse de pé. Ela parecia esgotada, e, vê-la naquele estado fazia-o sentir-se impotente, mas ele tinha que parecer forte, por ela, que embora sempre negasse, precisava dele.
- Não precisa ficar, . Pode descer e continuar com todo mundo, eu só preciso descansar. – comentou ao deitar-se na cama. já acomodava-se também.
- Eu fico aqui com você, estou cansado também.
- Ah, me poupe. Não precisa ficar aqui de babá, me deixa sozinha, . Sai, desce. Vai fazer sala pro pessoal. – despejou impaciente.
Ele não teve escolha. Levantou-se com pesar e a deixou sozinha no cômodo. Suspirou profundamente antes de trancar a porta e após arrumar a camisa, desceu as escadas rumo a sala, onde se encontravam alguns amigos e familiares.
- Achei que fosse ficar com ela. – Bruna, prima de , fez uma afirmativa com sentido de questionamento.
- está arredia. Tem sido difícil para ela. – Os olhos baixos de não escondiam seu descontentamento.
- A gente tem que dar o tempo dela, né? Ela ainda não aceitou... – Bruna se fez ouvir novamente.
- Mas já vai fazer duas semanas. – Bryan murmurou.
- Que seja um ano, uma hora ela vai ter que aceitar e eu vou estar ao lado dela. – completou.
Todos na sala olharam para com pesar. Ninguém conversava abertamente sobre os acontecimentos de duas semanas atrás, e estarem ali, já era uma forma de dizer que os estavam apoiando.
Por um momento os três casais de amigos que estavam na casa fizeram esquecer os minutos anteriores com . Jogaram truco, bebericaram algumas taças de vinho, e já se passava da meia noite quando todos resolveram ir embora.
arrumou um pouco da bagunça que ficou da agitada noite entre amigos e rumou em seguida para um banho quente. Cobrindo o corpo com apenas uma toalha na cintura, , que agora buscava uns shorts folgados para dormir em seu guarda roupa, observou de soslaio a esposa que dormia tranquilamente na cama do casal.
Um sorriso tímido formou-se nos lábios do marido. Apreciar dormindo era uma das coisas mais maravilhosas e encantadoras que ele já tinha visto na vida, e ele queria profundamente que ela estivesse sonhando coisas boas, como os momentos bons que eles viveram ou mesmo sonhando com um futuro mais promissor para ambos.
Embora fingisse ou não mais acreditasse, ele a amava muito. Sempre a amou, desde aquela festa a fantasia da turma de medicina da faculdade em que se conheceram.
Deitando na cama, procurou aninhar-se ao corpo da esposa que automaticamente o rejeitou. Triste com a situação, ele virou-se para o outro lado e buscou adormecer.
No final da tarde de umas semanas depois, achou que a ideia que Sarah, sua colega de trabalho, tivera era excelente. Apressou-se para ir ao endereço por ela indicado e em menos de cinco minutos admirando alguns cãezinhos, um spitz acinzentado lhe brilhou os olhos. Seria aquele.
Com um adereço em formato de gravata borboleta no pescoço do cãozinho spitz, que ainda não tinha nome, levou-o contente para casa. Sentia e sabia que iria adorar.
Quem sabe assim, com um bichinho para distrair-se, não retomava o sorriso no rosto? Quem sabe ela pudesse voltar a ser uma mulher feliz? Quem sabe ela não seria a mulher dele novamente? A tentativa era válida.
- Fica quietinho, cãozinho, você é uma surpresa para a , então comporte-se até ela te ver. – o cão estava dentro de uma enorme caixa de presente.
Abrindo a porta da casa, notou que estava sentada no sofá da sala olhando alguma coisa qualquer na TV. Não contendo-se, já foi logo falando.
- Oi, amor, que bom te ver aqui. – falou enquanto colocava seus pertences e a caixa em cima da mesa.
- Eu não saio de casa há semanas, . Achei que você soubesse disso. – ela disse secamente. Ele ignorou.
- Eu trouxe uma surpresa pra você. – O homem levou a caixa até o sofá onde estava sentada. – Espero muito que você goste.
sentou-se também, estava ansioso e queria que se interessasse pelo presente. De repente a caixa mexeu-se e num susto a mulher levantou-se assustada.
- O que tem ai dentro, ? – parecia nervosa.
- Já disse, amor, uma surpresa pra você, abra! – ele sorria.
- Me fala o que tem ai dentro dessa caixa, eu não quero abrir. – , como sempre impaciente, exigiu.
não respondeu, arrependeu-se porque pensou que ela ficaria feliz, mas já ficou evidente que era o contrário. A caixa mexeu-se um pouco mais, revelando o pequeno cãozinho.
- Eu não posso acreditar que você trouxe um cachorro para essa casa, . – as lágrimas odiosas formaram-se nos olhos de . – Eu não posso acreditar que você trouxe um cachorro para substituir o meu filho. - A mulher gritou com o marido. Gritou e revoltou-se. - Você não tem qualquer noção da dor que estou sentindo, e ainda piora tudo trazendo essa coisa pra nossas vidas. Isso jamais vai substituir a memória do meu filho, jamais!
- Não foi minha intenção, . Eu só queria que você ficasse feliz. – uma voz baixa e um cabisbaixo responderam.
- Eu odeio esse seu vitimismo, . Eu odeio essa sua forma de tentar me ajudar. Essa coisinha fofa de todos os dias pra tentar me agradar. Para! Por favor, para com isso, para de perder o seu tempo! Tudo o que você pode fazer é simplesmente me deixar em paz com a memória do meu filho.
- Ele também era meu filho! – gritou. – Eu também sinto muito por tudo o que aconteceu, . E eu sinto mais ainda porque além de perder meu filho, eu estou perdendo minha esposa.
As palavras de causaram um impacto em que, após alguns segundos para recobrar a fala, ironizou:
- Agora você vai me culpar?
- Ninguém tem culpa do que aconteceu. Foi um acidente, você precisa seguir em frente.
, triste e decepcionado, dirigiu-se a porta da frente, batendo-a atrás de si. Estava sendo difícil toda aquela situação e ele já parecia sem forças para lutar. estava sendo injusta com ele e não percebia que além do sofrimento da perda do filho, sentia-se impotente por não poder ajudá-la. Ele tinha que lidar com tudo aquilo.
No caminho de um bar qualquer, ligou para Bryan que o encontrou. Contou-lhe o desfecho da noite em que esteve em sua casa e a situação vivenciada minutos atrás. Desabafou e até chorou.
- Eu sinto muito. Sinto de verdade. – Bryan tocou o ombro do amigo.
- É o que todos sentem, eu também sinto demais. – levou o copo de cerveja a boca. – A só tem me tratado mal, não me chama mais de amor, não olha nos meus olhos, sempre me critica. E hoje ainda me chamou de vitimista. Sinceramente não sei mais o que fazer.
- Já pensou em dar um tempo pra ela? Não incomodar? Penso que um tempo afastados seria bom. – Bryan tentou aconselhar.
- E deixá-la sozinha? Eu não poderia, Bryan. Eu aguento o que for necessário para vê-la sorrindo de novo. Eu sei que é uma fase que vai passar.
- Desculpa se o que eu vou te falar agora te magoe, mas isso que você está sentindo é culpa. E você não tem culpa, .
- Se eu estivesse com ela em casa, como devia, ela não teria perdido nosso filho.
- Você não tinha como adivinhar isso. – o amigo colocou uma mão no ombro de para confortá-lo.
- Mas eu poderia ter feito alguma coisa.
Passava das dez da noite daquela segunda no instante em que entrou na casa. Estava cansado, cabisbaixo e pela primeira vez em anos não tinha vontade de estar ali. Era um local silencioso e sem vida, nada parecido com o que era semanas atrás. Ele caminhou até a cozinha e serviu-se de um copo de água, e enquanto bebia olhou assustado para o sofá. A caixa do presente estava ali, mas o cãozinho não.
Por um instante desesperou-se. Como poderia ter esquecido do cãozinho que antes havia rejeitado? O que poderia ter acontecido com ele? Um pânico de minutos tomou o corpo de .
- Está procurando o Joaquim? – apareceu na sala carregando o pequeno animal no colo.
- Joaquim? – perguntou surpreso.
- É, Joaquim, nosso filho. – acariciou o pelo do cão e sorriu para o marido. – Ele não é lindo, amor?
, embora momentaneamente contente, assustou-se com a cena. não o queria e agora o cão tinha até nome. E nome de gente. O nome que eles tinham pensado para o filho deles, caso nascesse menino.
- Não precisa ficar assustado, amor. Depois que você saiu, o Joaquim e eu começamos a brincar e eu vi nele o sorriso outra vez. E fica tranquilo que eu não estou tendo nenhum surto psicológico não, eu sei que ele é apenas um cachorrinho.
- Mas Joaquim, ? – não conteve-se de tristeza, agora ele parecia perplexo com as escolhas que ele mesmo fizera.
- Sim, amor. Joaquim. Você não gostou? – agarrou-se com o pequeno spitz e mirou o marido com olhos pedintes.
- Esse era o nome dele... – não conseguiu mencionar a criança que estava por vir.
- Eu sei. – colocou o cãozinho no chão e aproximou-se do marido. – E se você não gostou do nome, podemos escolher outro, não tem problema. Eu só acho que ele tem cara de Joaquim – e ela sorria, com os olhos brilhantes, coisa que não via há alguns meses.
abraçou o marido, e ali ele desmoronou. Envolveu-a também no seu abraço e chorava copiosamente como se criança fosse. também tinha lágrimas nos olhos, mas procurou calar-se enquanto via o marido desmanchar-se. Era a vez dele de sentir a dor. Era o momento em que ele poderia sofrer, enfim, a perda que tiveram.
Minutos passaram-se até que afrouxou o abraço forte que mantinha sobre . Envergonhado, com as costas da mão direita limpou as lágrimas que ainda teimavam em cair.
- Me perdoa por isso. Eu, eu...
- Eu que tenho que te pedir desculpas, meu amor. Eu não fui uma boa esposa esses últimos dias.
- Você estava sofrendo.
- Você um pouco mais. – os olhos vermelhos denunciavam que novas lágrimas viriam, mas ela segurou. – Eu fui injusta e egoísta, pensei mais em mim e no que eu estava sentindo e não pensei que você também sofria. Eu quero muito que você me perdoe para que possamos recomeçar.
- Eu me culpo por não estar aqui quando tudo aconteceu. Você não tinha que ter passado por tudo aquilo sozinha. – ainda lamentava.
- Ninguém tem culpa de nada, hoje eu quero acreditar que se tudo aconteceu da forma como aconteceu é porque ainda não estávamos preparados. Pensa, podemos tentar outras vezes até conseguirmos. – outro sorriso brotou nos lábios da mulher, daqueles tentadores, desejosos, e como gostava daquele sorriso.
- Quantas vezes você quiser. – ele respondeu. Os lábios selaram-se num beijo salgado pelas lágrimas que ambos ainda teimaram em derramar. Mas era um beijo de reconciliação com o passado de ambos, um beijo de amor e de saudade.
- Ai meu Deus! – estava nervosa ao observar os dois tracinhos vermelhos que denunciavam o que ela já sabia que significava.
- O que foi, amor? – mantinha a cabeça grudada na porta do banheiro enquanto segurava Joaquim, agora com seis meses e já aderindo a cor amarronzada característica dos spitz.
abriu a porta do banheiro com o teste em mãos. Sua face estava tão pálida como nunca esteve e ela não esboçava qualquer reação. largou o cachorro no chão, que logo correu para entrelaçar-se aos pés de , e o marido tomou de suas mãos o teste que revelava o que eles já esperavam.
- Estamos grávidos! – sorriu, abertamente, largamente, felizmente.
- Vamos ser papais de novo. – pegou o cachorro em seu colo, abraçando o marido que a rodopiou.
- Dessa vez eu não vou sair do seu lado. Ficaremos grávidos juntos, posso até tomar mais cerveja pra você não se sentir tão sozinha com um barrigão. – sorriu e beijou a esposa ao terminar a fala. – Eu amo você e todos os quilos que você ganhará também.
- Eu não acho que você está me ajudando não, amor. Mas eu vou amar você do meu lado todo o tempo.
- Se você não chegar aqui agora eu vou te matar, . Eu juro que te mato! – gritava no telefone enquanto era pressionada pelo médico a forçar a criança sair do seu ventre.
- Calma, amor. Estou chegando. – , também desesperado, apressava o táxi para traçar uma rota alternativa.
desligou o telefone exasperada. Tinha em mente que queria vivenciar aquele momento ao lado do marido que esteve com ela durante toda a gravidez. Ele não poderia deixá-la sozinha naquele instante, logo quando o neném que tanto esperaram viria ao mundo.
- Oi, boa tarde. O quarto em que minha esposa, digo, Vieira, se encontra, por favor!
ouviu o número do quarto e sequer anunciou a sua chegada, já foi logo tomando a mão da esposa que a apertou fortemente. Ele segurou o grito, e balbuciou para a esposa:
- Realmente estamos ganhando um neném, não é? Você quer mesmo que eu sinta sua dor. – Ele tentou sorrir, ela apertou a mão dele novamente e gritou para que ele calasse a boca.
O obstetra pediu para que continuasse o que quer que estivesse fazendo para que ajudasse com que ela continuasse colocando toda a força necessária. sabia como deixá-la irritada, mas naquele momento, vendo seu sofrimento, só queria sentir a dor por ela. Ele chorava, e não sabia se pela dor em sua mão ou pelo desespero de ver naquele estado.
Mesmo assim, ele fez o que lhe foi pedido e não demorou muito até que se ouvisse o choro peculiar do nascimento.
- Uma menininha! – o médico anunciou.
O sexo do bebê foi ouvido com emoção. e choraram e logo o obstetra colocou a criança nos braços da mulher que não estava muito preocupada com sua aparência.
- Nossa filha, . – acariciou a cabecinha já cabeluda da criança.
- Nem acredito que sou pai de uma princesinha. – não continha as lágrimas. – Qual nome vamos dar para ela?
- Alice. – olhou para o marido que restou perplexo. – Alice Assunção Vieira.
- O nome da minha mãe. – colocou os olhos na pequena garotinha e sussurrou baixinho – Alice Assunção Vieira, assim como a vovó que está no céu.
O homem uma vez mais não se conteve e chorou, vindo a beijar a esposa em seguida. Era, sem dúvida, o dia mais feliz da vida de ambos e estava mais feliz ainda por poder proporcionar a maior homenagem para sua sogra, que, com certeza, estava em um ótimo lugar e também para o seu marido que ela amava mais que tudo na vida. Bom, agora tinha alguém que amava tanto quanto ele.
Como narradora dessa história simples e curta que você acabou de ler, posso dizer que e vivenciaram outros muitos momentos felizes. E vários outros tristes também, pois a vida não é perfeita.
Alice foi uma criança puramente saudável, que desde muito pequena se afeiçoou ao “irmãozinho” Joaquim. Aderiu da mãe cabelos escuros e ondulados e do pai os olhos expressivos e marcantes. Posso dizer a você que Alice era adorável, fisicamente e emocionalmente e pudera, visto que seus pais a educaram muito bem.
Ao completar quatro aninhos, a menina ganhou outro irmãozinho. Dessa vez era Benjamim, um pelado, como dizia Alice (diferentemente dela, ele nasceu completamente careca). Nasceu gordinho e se não fosse o obstetra afirmando que aquele ato era espasmo, diria perfeitamente que era sorriso de felicidade, afinal estar naquela família era garantia de momentos felizes.
logo disse que se fossem ter mais um filho precisaria realizar uma tomografia da mão, não aguentava mais a dor da força que estabelecia enquanto desesperava-se no parto natural.
Eu sinceramente não sei como terminar essa história, pois realmente queria escrever muito mais sobre essa família que tanto amei acompanhar. Mas assim como eu, fique com essa imagem na mente: Uma menina no jardim brincando com seu cãozinho, um homem empilhando madeiras para montar a tão sonhada casinha de boneca da criança e uma mulher sentada na varanda com seu neném adormecido no colo, sorrindo para a cena de sua família desenhada em sua frente.
Fim.
Nota da autora: Olá leitor (a), tudo bem? Não sei bem o que escrever nessa N/A foi uma estorinha que tive um prazer enorme de escrever. E um medo enorme de não conseguir entregar a tempo, e não conto também os contratempos, pois passei por uma situação essa semana não muito feliz e imaginar o amor desse casal me fez acreditar em coisas boas novamente. De certa forma, terminar a leitura de Fortune Teller (posso apostar que essa entrou no rol de Fanfic Favorita) foi também uma inspiração e tanto para, sei lá, conseguir amolecer meu coração um pouco amargo. Eu espero que você goste da estória, e se puder me deixa um comentário, isso me deixa feliz também, rs. Que você tenha tido boas festas, e que seu 2018 seja maravilhoso. Ah, pense sempre positivo, a vida dá certo quando pensamos que tudo vai dar certo!
Outras Fanfics:
02. Pillowtalk (Ficstape #050: Zayn – Mind Of Mine)
07. Holding on for life (Ficstape #061 – Ellie Golding – Delirium - Continuação 02. Pillowtalk)
03. Keep on dancin’ (Ficstape #061 – Ellie Golding – Delirium)
09. Foward (Ficstape #064 – Beyoncé – Lemonade)
A Fotografia (Restritas - Outros/Shortfics)
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