História por Rafaela C. Julich | Revisão por Gabriella


Capítulo 1.
                                         There's no feeling like this, If that isn't love...



...” eu sacudia minha amiga. “, acorda!” cochichei desesperada e a empurrava.
“Ah , o que foi?” ela resmungou, colocando o travesseiro sobre seu rosto. Lancei um olhar impaciente a , que estava roendo as unhas de nervosismo ao meu lado.

Estávamos na casa de minha avó, e não eram menos do que uma e meia da manhã. Eu e estávamos nadando e reclamando da preguiça de , quando escutamos uma buzina vinda do lado de fora dos muros da casa.
Eu e nos entreolhamos assustadas, sabíamos quem era. Eles haviam nos ligado à umas duas horas atrás.

“Os meninos estão lá fora, !” falei impaciente e a vi levantar imediatamente da cama, toda descabelada. Previsível.
“O que?? Eles estão lá fora??” dizia afobada, enquanto andava de um lado para o outro naquele quarto de paredes amarelas.
“Sim , e se você falar mais alto, minha avó irá acordar e nós não iremos sair!” falei entre dentes, e minha amiga começou a trocar seu pijama pela roupa que usava antes de dormir. “Vamos...” cochichei e peguei a mão de , que enroscou seu braço no de .
Havia uma gigante janela no quarto, era mais uma porta de vido, que dava para uma sacada de pedra. Lá de cima era possível ver o Pontiac do , e quatro garotos ao seu redor. É claro que meus olhos se prenderam em cima de apenas um. O sorriso brotou imediatamente em meu rosto.
“Hey garotas, desçam!” , escandaloso como sempre, gritou, me fazendo fechar a janela atrás de nós imediatamente.
“Cala essa boca, ! Quantas vezes eu tenho que dizer pra não gritar quando vir aqui?” eu estava cansada de avisá-lo, mas acho que ele estava bêbado demais para lembrar. Os outros garotos pararam de fazer barulho imediatamente.
“Vamos logo!” disse impacientemente feliz, e passou para o outro lado da grade da sacada.
Logo ao lado haviam outras grades com trepadeiras que enfeitavam a casa da minha avó. já descia por elas, e já estava a ajudando logo embaixo.
Depois foi a vez de , e era óbvio que estava animadinho para ajudá-la. Assim que ela chegou ao chão, os dois foram em direção ao carro juntos.
“Hey amigos, obrigada por quererem me ajudar!” protestei a quantidade de pessoas que me ajudariam a descer as trepadeiras. estava ocupado demais cochichando algo para , e e estavam fora do meu campo de visão.
Pude escutar a risada de alguém conhecido, e vi os cabelos de virem em minha direção.
“Venha, gordinha mimada...” ele fez uma careta e eu soltei uma risada cínica. Pulei a grade da sacada em direção às trepadeiras e as desci, com muita fobia, já que alem de alergia por aquelas plantas horríveis (na minha opinião elas deixavam a casa dez vezes mais rústica, mas vovó insistia que aquilo será a nova tendência), eu tinha um incrível medo de altura. O fato de que aquilo tinha apenas dois metros de altura não fazia diferença. Podia ser um degrau com 1 metro que ainda sim eu teria medo.
Quando eu estava a alguns palmos do chão, colocou as mãos na minha cintura e me ajudou a pular.

“Fique sabendo que eu ficarei dois dias sem comer por sua causa, ...” dei um tapa em suas costas enquanto íamos em direção aos outros, que conversavam escandalosamente. Não sei qual a parte do ‘não façam escândalos’ ou ‘calem a boca’ eles não entenderam. Meus amigos sofrem de algum grave problema mental, isso é obvio.
“Você sabe que suas gorduras são seu charme, ...” ele já disse encolhido, sabia que vinha mais tapas.
“Por isso você não namora ninguém, , você é um grosso!” dei um murro em seu braço. Os garotos começaram a rir e zoar o idiota, que me lançou um olhar totalmente assassino. “Um a um, . Estamos empatados...” falei rindo, dando um abraço em meu amigo.
“Deixa você comigo, ...” ele fez uma cara má e me soltou.

“Vamos logo, está nos esperando...” aquela voz me fez arrepiar.
Literalmente. Olhei para trás, e só ai vi que ele estava sentado no capo do Pontiac, com os braços cruzados e aquele olhar inexplicável, que só ELE tinha.
Ben me encarava na mesma intensidade, e o mundo sumiu a minha volta. Aquele par de olhos verdes e aquelas sardas quase invisíveis eram a combinação perfeita. Seu cabelo raspado na maquina 2 tinha um tom loiro escuro e um pequeno topete aumentava o charme. Ele usava uma jaqueta de couro preta por cima de uma regata branca, sempre soube muito bem como escolher as roupas que o deixam perfeito.
O irmão de normalmente era nosso motorista, mas agora ele definitivamente era mais do que isso. Meu coração sempre esquecia de bater toda vez que ele chegava perto de mim, quando eu digo sempre, significa desde quando eu brincava de bonecas com (prima dos ) em seu quintal. E toda aquela história de eu ser apenas a amiguinha de seus irmãos mais novos. Mas de uns tempos para cá, vejo que seu pensamento sobre isso vem mudando.
“Vamos entrando no carro, porque definitivamente o clima pesou aqui...” escutei vagamente a voz de de fundo dos meus pensamentos, seguido por ecos que eu adivinhei como sendo risadas. Vi vultos passarem por mim, eram apenas borrões, já que a única imagem concreta era a de Ben a minha frente.
“Oi ...” sua voz, grave e grossa, soou como poesia. Eu provavelmente estava patética. Não, eu absolutamente estava patética.
“O-oi Ben...” para completar a situação, eu gaguejei.
Não suportava mais olhá-lo, pois já estava tonta. Encarei minhas unhas com esmalte descascado, e o vi se aproximar. Claro que não ousei mudar a direção de meus olhos. Suas mãos tocaram meus cabelos, colocando minha franja atrás da orelha, e logo em seguida senti seus lábios quentes tocarem minha testa. Minhas pernas bobearam, e não sei aonde arranjei forças para continuar de pé.
“Vamos antes que esses animais destruam meu carro...” ele disse divertido. Sorri e o vi abrir a porta do carona para mim. “Saia daí , esse é o lugar da .” Ben deu um tapa na cabeça do garoto (o que fez seu boné amarelo voar longe) e passou por entre os bancos da frente em direção à parte de trás do carro.
estava no colo de (os dois sempre foram os mais avançados nesse sentido), fazia um escândalo dizendo que não iria no colo de , obrigando a sentar em seu colo.
, eu não namoro ninguém porque provavelmente as garotas pensam que eu sou gay” disse entre dentes, totalmente desconfortável no colo do . Gargalhei.
“Eu acho que vocês são um casal magnífico!” falei divertida, escutando a risada escandalosa de todos a fundo. Ben ligou o carro e engatamos em direção à casa de .
Normalmente nossos finais de semana eram assim. Eu, e dormíamos na minha avó (já que ela era, com todo o respeito, mais lerda que meu meus pais, pois nunca percebia nossa ausência nas madrugadas), enquanto esperávamos os pais do saírem para algum baile, ou viajarem para Londres e deixarem a casa às traças. Em dias de sábado era inevitável sua virar o point da cidade, já que espalhava propositalmente o local da festa. Lá virava um verdadeiro palco para bailes.

De madrugada, os garotos pediam a Ben pelo carro, conseqüentemente ele ia junto, já que o Pontiac era sua namorada. sempre ficava no carona e eu ficava de vela no banco de trás.
Mas de uns tempos para cá, Ben vinha exigindo minha presença ao seu lado. Me sinto ilustre, obviamente. Isso soa clichê, mas Benjamin não era um garoto qualquer. Além dos seus vinte e três anos (enquanto eu e os outros tínhamos dezessete), um carro e um rosto indefectível, todas as garotas de Bolton sonhavam em um dia entrar naquele carro. Afinal, tudo o que elas queriam eram ser vistas com alguém de reputação tão impecável.
Eu me sentia incomodada com esse fato, já que isso geraria uma inveja sem tamanho para cima de mim, e eu não gosto nem de ser notada pelas crianças em festas de aniversário, imagina por um bando de promiscuas enraivecidas.
Despertei-me de meus pensamentos quando os Beatles invadiram o carro com Can’t Buy Me Love.
“I DON’T CARE TOO MUCH FOR MONEEEEEY, MONEY CAN’T BUY ME LOOOVE” e Ben se juntaram à cantoria e em mais a voz de nenhum dos Beatles era ouvida.
Depois de quatro músicas, muita gritara e tapas, chegamos na casa do .

Ele morava em um dos condomínios mais nobres da cidade, e por coincidência era meu vizinho.
A música estava altíssima, os vizinhos o odiavam por isso. Os s sabiam das festas que acabavam com sua casa, mas como tem um incrível poder persuasivo, sempre se dava bem.
Todos nós saímos do carro preto reluzente em um pulo, e eu particularmente fui saltitante em direção àquele amontoado de pessoas. e apareceram do meu lado, e nós três fomos em direção à cozinha.
Jailhouse Rock explodia nas caixas de som espalhadas pela casa, e as garotas todas balançavam suas enormes saias coloridas, com os garotos as observando de longe.
pegou a garrafa de Martini Rose que havia escondido para nós no faqueiro, enquanto eu pegava os copos.
“Acharam o Martini?” entrou gritando na cozinha.
“Sim senhor, chame os outros e peça Ben para trazer a tequila...” disse empurrando porta afora. Ele a fechou logo após, para evitar que estranhos entrassem ali. Sim, éramos um grupo de pessoas autista e supostamente drogadas, de acordo com os desocupados de Bolton.
Ben adentrou a cozinha com uma garrafa de tequila na mão, sendo seguido por , , , e uma desconhecida.
Provavelmente alguma garota que achou pelo caminho para passar a noite.
“Vamos logo!” falei impaciente, me levantei e abri a porta dos fundos da cozinha, que dava para a área de lazer.
Além de uma festa geral para ganhar dinheiro extra para nossas bebidas (sim, cobrava umas cinco libras de cada pessoa que entrava em sua casa), gostávamos da nossa festa particular.
A área era gigantesca. Um gramado gigante onde o senhor chamava os amigos para uma partida de futebol, uma churrasqueira com um imenso balcão em um quiosque, e a piscina imensa.
Me sentei em uma espreguiçadeira com , , sentou-se no chão com Ben, e se isolou na beirada da piscina com .
estava em outra espreguiçadeira com a desconhecida em seu colo. Devo frisar que ela era muito bonita. Usava uma saia rodada preta com bolinhas brancas até a canela, uma blusa branca colada em seu corpo seguida por uma faixa preta na cintura. Seus cabelos pretos estavam presos por uma fita de cetim, e sua maquiagem era de se invejar.
Parei de reparar na garota quando pediu por copos, fui entregar a cada um, e depois decidimos tomar a tequila primeiro.
Peguei um limão e um pouco de sal, coloquei uma dose, enquanto esperava os outros se servirem. O primeiro brinde era rotineiro e indispensável para nós.

“Que seja eterno enquanto dure!” falamos em coro antes de cada um morder o limão e jogar a tequila para dentro. Uma careta involuntária apareceu em meu rosto assim que senti minha garganta queimar. Era esse o nosso lema. Não acreditávamos no para sempre mas acreditávamos que cada momento que vivíamos era eterno. E vivíamos cada segundo de nossas vidas intensamente. E sempre juntos.
A musica de dentro da casa era escutada também por nós, e depois da quinta dose de tequila, e eu dançávamos My Generation em cima das cadeiras.
Levantei a barra da minha longa saia amarela com as mãos e a balançava de acordo com o ritmo da música. fazia gestos engraçados enquanto dançava, arrancando risadas de todos ali.
“PEOPLE TRY TO PUT US DOWN, JUST BECAUSE WE GET AROUND, THINGS THEY DO LOOK AWFUL C C COLD, HOPE I DIE BEFORE I GET OOOOLD” Roger Daltrey encarnou literalmente em nossos corpos.
Pude perceber o olhar de Ben sobre mim, hipnotizado. Até pareceu parar de alisar sua garota.
Continuei dançando e inventando passos para a musica, sem me importar com os olhares, afinal o álcool me deixava desinibida.
, desde quando você tem bunda?” escutei gritar e eu apenas lancei-o um olhar mortal.
Quando a musica acabou, não animei a dançar Can’t Explain com .
Deixei minha amiga dançando sozinha com uma colher como microfone, e fui até o balcão do quiosque pegar um copo d’água.

“Não sei como você até hoje não se inscreveu para nenhum dos Dancing Days da cidade...” aquela voz me fez arrepiar, e só por esse fato, sabia que era Benjamin, afinal, que outro garoto tinha esse poder controlador apenas com a voz? Explicando, Dancing Days eram os bailes dançantes anuais e um dos mais tradicionais da cidade, onde haviam varias modalidades de danças, tango, blues, salsa, bolero, rock.
Gargalhei e me virei de frente para o garoto.
“Tenho certeza que você ganharia de todas essas garotas aqui...” ele continuou.
“Bondade sua, ...” mesmo com álcool em excesso no meu cérebro, esse garoto ainda conseguia fazer minhas bochechas corarem. Ele havia tirado sua jaqueta, e agora a regata branca marcava perfeitamente seus músculos.
Vi seus braços fortes envolverem minha cintura, e meu coração palpitou fortemente contra meu peito.
Ben afundou seu rosto em meu pescoço, e tive a impressão de que ele aspirava meu perfume.
“Seu cheiro é bom...” ele disse delicadamente enquanto voltava a me encarar. Sorri tímida e vi sua mão sair da minha cintura em direção ao meu rosto. Ele acariciou minha bochecha carinhosamente com o polegar, me fazendo fechar os olhos automaticamente.
O senti aproximar do meu rosto, e tempo depois sua respiração bateu em minha boca.
“Se importa?” Ben perguntou fracamente, e eu ainda com os olhos fechados, neguei com a cabeça. Foi ai que senti seus lábios quentes e macios tocarem os meus, e esqueci o que era respirar. O cheiro dele me intoxicou, e eu precisei me apoiar em seus ombros para não cair.
Me senti desnorteada, tonta e... apaixonada.


Capítulo 2.
                                         Baby close your eyes and listen to the music drifting through a summer breeze


Por volta das seis e meia da manhã, Ben nos levou (eu, e ) de volta para a casa de minha avó. Isso porque eu estava praticamente dormindo no meio do gramado do campo de futebol. Pessoas normalmente ficam sociáveis e comunicativas depois de alguns goles.
Eu fico autista e totalmente anti-social. Certo, não totalmente, já que Ben me fez companhia a noite toda.
É ótimo conversar com ele. Por ser mais velho, seu papo é diferente dos que eu estou acostumada com , por exemplo. Ele tem uma visão mais ampla do futuro, leva as coisas um pouco mais a sério, diferente do restante de meus amigos.
Quando chegamos em casa, ele abriu a porta do carro para que eu descesse, me deu um beijo de boa noite e me pediu para sonhar com ele. Acho desnecessário pedir, já que obviamente eu sonharia.
Subimos a grade, pulamos na sacada, abri a janela que daria para o quarto.
Nós entramos dando risadas abafadas sobre nada, eu exclamava um ‘shhh’ o tempo todo.
“Calem a boca, minha avó pode acordar...” eu cochichei rindo, vendo tropeçar sobre seus próprios pés.

“Ela já está acordada” de repente a luz do quarto foi ligada, e ai percebi que minha avó estava sentada no sofá que ficava num canto do quarto.
“Onde você estava, ?” sua voz era visivelmente seca e grossa. As meninas me olhavam desesperadas e eu não sabia o que fazer. Minhas mãos começaram a tremer de nervosismo e eu pensava no que dizer.
“Nós... Nós ficamos com fome e resolvemos ir no Paddley Café comer alguma coisa...” falei a primeira coisa que veio a minha cabeça. A feição de minha avó me assustava, ela estava extremamente irritada.
“Não minta para mim, garotinha. As coisas podem ficar bem piores do que já estão! Pensa que não vi o Pontiac do seu amigo as deixando aqui?” sua voz já estava exaltada e eu dei um passo para trás, segurando a mão de minhas amigas, que tremiam igualmente a mim.
Sabíamos quais seriam as conseqüências se nossos pais soubessem que chegamos às seis da manha em casa, no carro de um garoto.
“Vovó, por favor...” eu involuntariamente comecei a chorar, pois sabia o que iria acontecer.
“Você me deixa sem escolhas, . É minha responsabilidade cuidar de vocês, o que os pais de e vão pensar de mim?” ela levantou bruscamente da cadeira. “Estou ligando para os pais de vocês agora.” Eu e as garotas suspiramos desesperadas ao mesmo tempo, e apertou meu braço.
“Vó, por favor, não faça isso!” supliquei. Sabia que não adiantava nada do que eu dissesse, então poupei as palavras. A minha família (assim como a das meninas) era muito tradicional. Cheia de regras, assim como a maioria de nossa época. Se você não cumprisse as regras, você era punido. Simples assim.
Já não me recordo as tantas vezes que fui punida por não cumpri-las.

E assim foi feito. Minha avó ligou para nossos pais, que apareceram minutos depois em sua casa. Os pais de estavam visivelmente irritados e foram bruscos ao levar minha amiga para casa. Os de pediram desculpa pela impertinência à minha avó, e sem uma palavra a levaram. Sabia que ela não sofreria tanto com as conseqüências, já que afinal, ela estava com o primo.
E eu? Bem, são nessas horas que desejei nunca ter nascido.
Meus pais chegaram em seu Mercury Convertible , e o primeiro a sair do carro foi meu pai. Ele estava com um robe azul escuro por cima de provavelmente um pijama. Seus cabelos grisalhos estavam penteados para trás, como sempre, e seu bigode preto se destacava em seu rosto sereno. Ele tinha um charuto em suas mãos, e assim que entrou no hall da casa de minha avó, minha mãe veio logo atrás, seus longos cabelos presos em um coque, e uma expressão vazia, mas seus olhos eram cheios de desgosto, isso era visível.
“Obrigada por ter ligado, Carmen” minha mãe se dirigiu à sogra, mas sem tirar seus olhos de mim. “Vamos para o escritório” ela desviou seu olhar e passou por mim, indo em direção à sala atrás de nós. Assim que meu pai e eu passamos pela porta, ela a fechou.

O escritório estava do mesmo jeito que meu avô deixara antes de falecer. Estantes gigantescas sem espaço por entre os livros. Uma janela de vidro enorme, como a do meu quarto, ficava a fundo, e uma mesa de madeira rústica se encontrava no centro. Meus pais se sentaram nas duas cadeiras em frente à mesa, e quando eu fiz menção de me sentar também:
“Você fica em pé” minha mãe disse friamente, e eu continuei onde estava. Não ousei olhar em seus olhos. “O que você pensa que está fazendo com a sua vida, ?”
“O que a senhora quer dizer com isso?” falei calmamente, ainda sem mudar a direção dos meus olhares.
“Voltando para casa às seis da manhã, trazida ainda por um garoto! Não me importa o fato de ser um dos filhos do senhor , o que pensa que falarão de você?” sua voz começava a ficar alterada.
“Não me importa o que pensam...” continuei serena.
“Mas me importa! Não quero que achem que minha filha é uma vadia!” ela começava a gritar. Olhei boquiaberta para minha mãe, incrédula com o que dizia.
“Não exagere, Mary...” meu pai tirou o charuto para se pronunciar pela primeira vez.
“Não estou exagerando, John. É o que as pessoas pensam!” ela respondeu alterada, se virando para meu pai. Dirigiu-se a mim novamente. “Se você não se importa com a reputação sua e de sua família, alguém tem que se importar por você, . Você está ficando sem limites! E minha casa não tem espaço para rebeldes...” ela se aproximou de mim, e apontou o dedo em minha direção.
“Quer dizer que vai me expulsar?” Perguntei cínica.
“Quer dizer que você vai ficar sem ver seus amigos inconseqüentes por um bom tempo. Incluindo e Franco” ela respondeu entre dentes.
“Você não pode fazer isso!” falei mais alterada que o normal.
“Sim, , eu posso. E a menos que queria ficar sem seu carro, e sem vir à casa de sua avó por um bom tempo, acho melhor me obedecer” Mary continuou autoritária. Tive vontade de pular em seu pescoço, sem ligar pelo fato de que foi ela quem me deu a luz. Eu e minha mãe nunca fomos aquele exemplo de mães e filhas perfeitas dentro de quatro paredes, claro que em publico, ela como esposa de um dos donos da cidade, tinha que manter as aparências e fingir ser a mãe perfeita.
Sim, meu pai era um dos donos da cidade. Por ser dono da maior fabrica, a que inclusive mantinha a situação econômica e política estável dentro de Bolton. Então ele era um senhor de muito respeito, talvez era mais respeitado que o próprio prefeito. E eu, como filha pródiga dos poderosos da cidade, deveria me portar como tal. Deveria. Mas como nunca gostei de seguir padrões, minha mãe tentava de todos os meios me colocar na linha. Inutilmente, é claro.

Mary passou por mim elegante e superior, abrindo a porta do escritório, passando por minha avó e indo direto à saída da enorme casa.
“Vamos, minha filha...” meu pai colocou uma mão em meus ombros, me fazendo acordar dos meus pensamentos revoltantes. Olhei-o decepcionada. Meu pai nunca dizia algo quando minha mãe me punia, ele simplesmente se calava e me olhava afundar.
Ele deu de ombros e me guiou até a saída da casa, onde minha avó nos esperava.
“Boa noite, mamãe” ele deu um beijo na testa de sua mãe e saiu. Eu não me despedi, apenas olhei-a com o mesmo olhar que lancei a meu pai, e ela retribuiu como se pedisse desculpas. Tarde demais.

O caminho até a minha casa foi silencioso. Havia uma maré de repulsa entre mim e minha mãe. Eu estava com minha cabeça encostada no vidro gélido da parte traseira do carro, e o via embaçar de acordo com a minha respiração.
Assim que passamos pelo portão de bronze gigante e pelo jardim de extensão interminável, meu pai parou o carro em frente à nossa casa e entregou a chave ao motorista, para que ele o estacionasse na garagem.
Subi os degraus de pedra correndo, abrindo ferozmente as portas desenhadas de madeira, que dava lugar a um hall maior que o da minha avó.
O chão era tão bem encerado que eu podia ver minha imagem ao passar por ele. As paredes eram pintadas elegantemente em um tom bege, e logo a frente podia-se ver uma escada gigante e bifurcada, que dava para o segundo andar. Por baixo das escadas, haviam portas e portas, que davam para as duas cozinhas, para uma sala de jantar, uma sala de reuniões, a biblioteca, quartos dos empregados, sala de estar. Até hoje acho que não pude conhecer a casa inteira, de tão imensa que era. Eu achava exagerado, claro, por ser apenas eu, meu pai, minha mãe e minha irmã mais nova, Jamie. Certo que abrigávamos os empregados, mas não tinha necessidade de ter tantos.

“Meredith, leve até seu quarto, arrume sua cama e depois o tranque. Ela ficará lá dentro até dizer que irá se comportar a partir de agora. Ela não tomará café da manhã, leve apenas um chá e algumas bolachas a ela às três da tarde, e nada mais” Mary ordenou à minha criada assim que entregou seu casaco a ela. Meredith era minha segunda mãe. Talvez nem segunda, já que a considerava mais minha mãe do que Mary. Fora ela quem me viu andar pela primeira vez e ouvir minhas primeiras palavras.
Meredith me olhou assustada após as palavras de minha mãe e eu apenas dei de ombros.
“Não escutou, Meredith?” Minha mãe repetiu, grossamente.
“Sim senhora” a baixinha de no mínimo cinqüenta anos, respondeu rapidamente.
Subi uma das escadas com passos pesados, sem mesmo olhar para Mary. Ao fim da escada, havia uma nova bifurcação. Para os dois lados, havia milhares de portas, cada uma levava para um quarto, ou uma sala diversa. Virei para o lado direito, onde caminhei até chegar em uma das ultimas portas do corredor. Era uma porta bege e imensa. Abri-a.
Dei de cara com o meu velho quarto. Ele era imenso, outra coisa que pensava ser exagero. As paredes tinham um tom rosa claro, com persianas enormes, e quadros de diversos artistas espalhados por elas. Havia uma cama de casal no meio, com rendas que caiam sobre o teto, tampando-a. Uma escrivaninha enorme, com vários livros, bonecas da minha infância, retratos de meus amigos...
Mais em frente havia um closet e uma porta que dava para meu banheiro.
“O que você fez dessa vez, ?” Meredith me acompanhou entrando no quarto, enquanto eu coloquei minha trouxa de roupas em cima de um sofá ao lado da cama.
“Apenas cheguei em casa às seis da manhã no carro de Benjamin ” falei como se aquilo fosse a coisa mais banal do mundo, e para mim realmente era.
“Apenas? Você ainda acha isso pouco, ? Até parece que você não conhece sua família...” Meredith dizia rapidamente enquanto arrumava a minha cama. Até parece que eu ia dormir...
“Tanto faz...” desdenhei e logo que Meredith terminou, me joguei naquela cama fofa.
“Você subestima seus pais demais , um dia os castigos não serão apenas te trancar no quarto” a governanta parou de pé a minha frente com os braços apoiados na cintura e uma cara de brava.
“Até lá, estarei bem longe daqui, Meredith, fique tranqüila...” falei sem muita empolgação, e abri meu livro Sonho de Uma Noite de Verão de Shakespeare, que eu havia começado a ler um dia atrás.

Eu via muito de mim na personagem Hérmia, onde seu pai a obriga a casar com Demétrio. Hérmia recusa-se a fazer a vontade do pai e por isso é ameaçada pela morte, conforme a lei ateniense que não dá à mulher direito de escolher o marido e pune com a morte a desobediência.

Eu não estava sendo obrigada a casar com ninguém, muito menos sendo ameaçada de morte. Mas eu sentia que toda a minha liberdade de escolha, e principalmente minha liberdade para viver, eram limitadas por meus pais. Hoje não era o primeiro castigo que eu levara. Já ficara sem comer por dias a fio. Eu me recusava a admitir que estava errada, afinal, eu não estava. Eu tinha o direito de viver minha adolescência conforme eu escolhesse.

Meredith saiu do quarto após recolher algumas roupas sujas no banheiro, e conforme minha mãe mandara, trancara a porta, seguido de um sussurro de desculpas.
Seria uma longa e tediosa tarde. Eu não diria o que minha mãe queria ouvir, logo eu não sairia dali. Teria tempo suficiente para terminar minha comédia, e quem sabe começar um novo livro.
Eu posso ser considerada como estranha. Enquanto minhas amigas lêem revistas de moda como Elle ou Vogue, e sonhavam em ser como Marilyn Monroe, eu lia livros que apenas nossos pais liam e sonhava com faculdade. De acordo com meus planos, eu passaria na Escola de Direito de Cambridge.

Perdi noção do tempo enquanto lia, mas provavelmente não eram três horas, já que Meredith ainda não havia trago meu lanche de consolo. Mas fui acordada de minha concentração com um barulho na janela.
“Psiiiu” escutei. Olhei para os lados procurando pela origem do barulho.
“Psiiu!” Mais um barulho pode ser ouvido, tinha certeza de que alguém jogando pedras na minha janela. Clássico.
Levantei-me depressa da cama, e coloquei um robe, já que eu estava apenas de trajes íntimos, e abri a enorme janela do meu quarto. Dei de cara com e parados no jardim em frente.
“Que diabos vocês estão fazendo aqui?” falei baixo mas num tom bravo, olhando para os lados desesperada.
me contou o que aconteceu ontem!” disse alto e eu conseqüentemente fiz um gesto para que ele falasse baixo. “Desculpe, tenho que acostumar a sussurrar. Bom, ela me contou e conseqüentemente imaginamos que você estaria de castigo... Para variar...” ele e soltaram um risinho. Rolei os olhos.
“E daí, ? Não é a primeira vez que fico de castigo” falei impaciente.
“Isso é obvio, ...” ele disse rindo, e parando quando viu que falava alto de novo. Começou a cochichar. “Mas estamos de férias, e temos que comemorar!” ele abria os braços de um modo retardado, fazendo eu e rir.
, nós já todos os dias, . E veja no que deu, estou engaiolada...” bufei e apoiei minha cabeça em minhas mãos.
“É para isso que estamos aqui, começou. “Um dia lindo de verão como esse você não pode ficar enfurnada nessa casa mal assombrada” ele fazia caretas enquanto dizia. “E vamos combinar que sem você as coisas ficam meio sem graças...”
“Own ! O problema é que... Você sabe, se Mary descobre...”
“Ela não vai, ! A trazemos antes do sol se pôr” prometeu.
“Anda, ponha uma roupa e pegue seu biquíni... Maiô... Seja lá o que vocês chamam aquilo” ele fazia gestos confusos com a mão. sempre atualizado.
“Okay, esperem um segundo!” Falei empolgada. Eu simplesmente amava fazer coisas escondidas e proibidas. Era tudo tão mais emocionante. Fui correndo para o closet escolher uma roupa. Se disse para pegar um biquíni, provavelmente iríamos à alguma cachoeira ou rio. Coloquei um short de cós alto, uma camisa branca e amarrei-a para cima do umbigo. Calcei minhas sapatilhas vermelhas preferidas e finalmente, coloquei um chapéu breton branco sobre meus cabelos. Meu maiô estava vestido por baixo da roupa.

Antes de pensar em como sair dali, resolvi escrever um bilhete à Meredith. A mulher simplesmente enfartaria se entrasse em meu quarto e não me visse lá. Eu pediria que ela me acobertasse enquanto eu estava fora, ela sempre fazia isso, mesmo que isso custasse seu emprego. Ela era a favor de toda a minha filosofia de “curtir minha adolescência”.
Deixei o bilhete em cima da escrivaninha de madeira e fui em direção à janela novamente.
“Vocês pensaram em como eu vou descer?” Interrompi a conversa dos dois garotos lá em baixo. Eles se entreolharam. “Não me digam que...”
“Calma, . Nós somos gênios, claro que pensamos nisso” , o pseudo-gênio disse, com um sorriso enorme estampado no rosto. Ele acenou com a cabeça para , e este saiu do meu campo de visão, indo não sei onde. ainda sorria abobadamente e eu me indagava o que diabos esses dois armavam.
De repente apareceu com uma escada de madeira maior que si mesmo (e que mal conseguia carregar, devo frisar).
“Roubamos a escada do seu jardineiro” falou num tom infantil.
Rolei os olhos e esperei colocar a escada defronte à minha janela. Dei uma ultima olhada no quarto antes de descer por ela.
“Você chama isso de plano vindo de um gênio? Garotos, até um garoto de seis anos pensaria em algo assim...” falei assim que me ajudou a descer os últimos degraus.
“Oh , nós não tivemos muito tempo para pensar em algo genial, okay? Essa casa tem muitos seguranças, então tivemos que ser rápidos, e a pressa é inimiga da perfeição” tagarelava enquanto andávamos por entre os arbustos do jardim. “ caiu naquele galpão e fez o maior estardalhaço, ouvimos vozes e viemos correndo.
Provavelmente estão procurando por intrusos” ele dizia de peito estufado e eu parei imediatamente.
“Eles os viram?” perguntei desesperada.
“Não temos certeza... Na verdade acho que não, seus seguranças são bem bobões” disse abafando o riso. Segurei o meu, e voltei minha atenção para como sairíamos dali. Estávamos nos fundos de minha casa, onde havia uma imensa piscina, espreguiçadeiras e uma quadra de tênis mais a fundo. Não haviam saídas por ali.
“Você é um retardado, sabia ?” falei vagamente, coloquei meus óculos na altura do meu nariz enquanto observava o jardim. reclamava qualquer coisa e nenhum plano vinha na minha mente.
“Vamos ter que pular o muro, ...” disse. Certo, isso era obvio.
“Primeiro temos que passar pelos seguranças, ...” deu um tapa em sua cabeça. Pelo menos alguém pensava comigo.
“Vamos ter que passar pelos arbustos da lateral...” apontei para aquelas plantas que ficavam encostadas nos enormes muros.
“Arbustos me dão coceiras...” fez uma careta e olhou suplicante para mim.
“Sem mais opções, vamos” peguei em sua mão e fomos em direção aos muros laterais. Se passássemos por entre os arbustos, seria humanamente impossível de sermos vistos.

Quando chegamos na parte mais baixa dos muros que rodeavam a casa, e se abaixaram e apoiei-me com os pés em cima de cada um, dando impulso para que eu conseguisse pular. Eu quase caí ao chegar do outro lado do muro, e meus óculos saltaram para dois metros longe de mim. Em menos de dez segundos, os dois já me faziam companhia na calçada.
“Vou me coçar pro resto do dia” disse entre dentes enquanto tirava pedaços de folhas de seus cabelos. Ele vestia uma larga calça jeans e uma regata branca simples. , o que se vestia melhor em minha opinião, estava com uma calça igualmente larga, uma blusa preta colada em seu esbelto corpo, e uma boina cinza na cabeça, juntamente com um óculos aviador para completar seu charme.
“Pare de reclamar e vamos” repreendeu o amigo, e nós três fomos em direção ao seu conversível azul.

Estávamos na rodovia que saia da cidade. dirigia, eu estava ao seu lado e ia no banco de traz. Não parou de reclamar sobre como cada parte de seu corpo coçava irritantemente, até estragar uma música do Johnny Cash que tocava no rádio, ele conseguiu.
Eu adorava essa estrada. Tudo ao nosso redor era muito verde, e os campos de margaridas deixavam a paisagem ainda mais perfeita.
O vento insistia em bagunçar meus cabelos, enquanto os de continuavam impecáveis, provavelmente por causa do gel.

estava deitado nos bancos, enquanto eu e embalávamos uma conversa empolgante sobre música.
Meia hora depois, virou à direita num caminho para fora da rodovia. Era uma estradinha de terra, que guiava até dentro de uma densa mata.
“Falta muito, ?” perguntei curiosa, observando as grandes árvores. A floresta era bastante úmida, e eu segurei meu chapéu para que ele não voasse.
“Já estamos chegando...” ele disse com um pequeno sorriso, enquanto dirigia concentrado. se sentou novamente e apoiou os braços entre o meu banco e o de .
“Este lugar é o máximo. Eu e os garotos o descobrimos esses dias. O pessoal já deve estar ai...” disse esboçando aquele enorme e lindo sorriso em seus lábios. Eu amo o jeito como sorri, é tão verdadeiro e... feliz. Sorri de volta e voltei a prestar atenção as arvores e animais ao meu redor. Após alguns minutos, pude ver uma luz mais a frente, e a medida que chegávamos mais perto, pude perceber que a estrada acabava ali. Vi mais dois carros estacionados perto das arvores, onde também estacionou o seu.
Os meninos saíram do carro, e abriu a porta para que eu descesse também.
“Vamos!” disse ele empolgado, pegando na minha mão e seguindo para dentro da mata novamente.
Depois de uma caminhada de cinco minutos, eu pude ouvir risos histéricos de pessoas logo a frente. Passando por mais algumas arvores, vi um pequeno lago, onde meus amigos nadavam. Estavam , , e . Esperava ver outra pessoa em especial, mas ele não estava lá.
“Até que enfim, ! Achei que esses loucos tinham seqüestrado você!” gritou, e eu ri, olhando para os garotos do meu lado. “Anda, vem nadar!” ela ria, enquanto jogava água na mesma.
Comecei a tirar meu short, tirei meu chapéu e a camisa logo em seguida. Vi e também se despiram (com gritos histéricos de e a fundo) e fomos os três correndo em direção ao lago.


“Ai meu Deus, isso ‘tá muito alto!” eu gritava de cima da arvore, onde via meus amigos lá embaixo.
“Anda logo, ! Todos nós pulamos, e viu? Ninguém morreu!” gritava, mas nem assim eu me encorajei. Havia uma corda amarrada em um galho da arvore, e na ponta da corda estava amarrado um pneu. Todos meus amigos já haviam pulado, mas meu medo de altura era maior.
“Eu pulo com você, apareceu atrás de mim.
“Você é louco? Essa arvore quebra com dois obesos como nós!” falei histérica e rindo logo após.
“Obesidade aqui eu só vejo em você, agora deixa a frescura de lado e vamos” nem tive tempo de protestar ou reclamar. segurou firmemente em minha cintura com uma mão, e a outra ele levou até a corda. Deu um salto e voamos em direção ao lago. A ultima coisa que vi antes de cair, foi a cara de deboche dos meus amigos.
Dei um impulso para cima, voltando a superfície e respirando. e riam histericamente.
“Você precisava ver a sua casa de desespero, !” disse entre suas risadas.
“Há-Há, muito engraçado, . Um dia te coloco em um quarto muito escuro, sem luz nenhuma, e você vai ver como é bom sentir medo” ameacei. morria de medo de escuro, isso todo mundo sabia. Ele fechou a cara imediatamente e resmungou alguma coisa que não pude escutar.

Brincamos de ‘briga de galo’ (eu e ganhávamos todas), depois improvisamos um piquenique nas margens do rio.
“Certo, agora que todos estão de barriga cheia, é hora de vocês cantarem para gente” sugeri, guardando o resto das comidas dentro da cesta que havia trago. Os meninos concordaram, e foi rapidamente pegar os violões dentro do carro. Logo mais ele voltou e entregou um dos violões à .
Os quatro, , , e , faziam parte de uma banda, o McFly. Eles tocavam apenas por diversão, nós sempre fazíamos musicas juntos, até que um dia sugeriu que eles formassem uma banda. Eles gostaram da idéia, e desde então compõem suas próprias musicas.
Nunca fizeram shows por aí, sempre cantavam suas musicas apenas para mim e as meninas. Eles eram realmente ótimos.
“Essa aqui é só o esboço de uma musica que ainda ‘tô tentando escrever...” disse, começando a melodia de sua musica.

Recently I've been
Hopelessly reaching
Out for this girl
Who's out of this world
Believe me”

As vozes dos garotos se combinavam em perfeita sintonia. Enquanto cantava, ele trocava olhares com os outros meninos, que vez e outra riam.

“She's got a boyfriend
He drives me round the bend
Cos he's 23 he's in the marines
He'd kill me
And so many nights now
I find myself thinking about her now”

Assustei-me um pouco ao ouvir esse trecho da musica. Apenas no trecho em que dizia “Porque ele tem 23 anos”... Era só coincidência, isso era obvio. Ben não era o único garoto com 23 anos na cidade, pensei. cantava de cabeça baixa, olhando atentamente para as cordas do violão, enquanto e trocavam olhares.

“Cos obviously she's out of my league
But how can I win
She keeps dragging me in
And I know I never will be good enough for her (no, no)
I never will be good enough for her.”


Eu particularmente estava amando a musica. E aparentemente, as meninas também, já que olhavam abobadas para e . Eu era fã da voz e das letras de , apesar delas serem totalmente o oposto do que ele era. Sempre cantava músicas com letras de amor, sobre uma certa garota, mas não era o tipo de homem apaixonado. Pelo que conheço do meu amigo, nunca namorara, dizia sempre que queria ‘curtir sua adolescência’ (não como eu, isso era óbvio). Nunca o julguei, só o chamo de mentiroso toda vez que ele termina de compor alguma canção.
“Vocês são ótimos!” bati palmas empolgada e dei um abraço em cada um.
Continuamos ali por mais um tempo, cantando músicas do Elvis junto com os garotos, e vendo o céu ficar cada vez mais escuro.
Quando o sol estava para se pôr, e me levaram para casa como prometido. Ajudaram-me a pular o muro, e eu fiz todo o trajeto de volta até o meu quarto, sem ser notada por nenhum dos seguranças fardados que rodeavam a mansão.

Meu quarto estava intacto, uma bandeja com bolachas em cima da cama. No bilhete que escrevi à Meredith, havia uma resposta: “Meus cabelos estão ficando brancos mais rapidamente por sua culpa, .” Ri e logo depois me joguei na cama, pegando uma bolacha da bandeja. Ninguém seria capaz de me afastar daqueles seis. Nem Deus, nem mesmo minha mãe. Eu preferia morrer a me separar.


Capítulo 3.
                                         I'm what you make me, you've only to take me, and in your arms I will stay


Eu estava de castigo havia três dias. A única coisa que minha mãe permitia que eu comesse era bolachas com chá. Mas John sempre dizia a Meredith levar-me algo mais para eu me sustentar ao longo do dia. Mary sempre entrava em meu quarto e perguntava se eu tinha algo para lhe dizer. Obviamente eu não tinha, muito menos ia ter. Ela já estava desistindo de mim.
me mandava cartas, contando sobre suas excitantes férias, de como ele e estavam quase namorando, contava novidades de , , ...
Nunca mencionava Ben, seu irmão. Esse também não me procurou. Não sei por que estava tão preocupada, afinal, foi só um beijo. Para mim, não fora somente isso. Mas eu não tinha a mínima idéia do que se passava na cabeça de alguém com 23 anos. Se fosse alguém como meus amigos, facilitaria.

Meus pensamentos foram dispersos assim que escutei alguém bater sobre a madeira da porta do meu quarto.
“Entre” falei distraída.
Mary deslizou elegantemente para dentro, impressionante como, apesar de seus quarenta e tantos anos, ela continuava tão jovial. Seus cabelos batiam um pouco abaixo dos ombros, e combinavam perfeitamente com seu tom cor de neve de pele. Seus olhos eram incrivelmente azuis e suas maçãs do rosto eram levemente rosadas. Eu estava sentada em minha cama, com um novo livro em mãos, e minha vitrola invadia o quarto com a linda voz de Presley.

“Vejo que sua rebeldia não cessou...” Mary disse secamente, olhando-me severamente.
“Não sou rebelde, mãe...” bufei e fechei meu livro. Ela começou a andar de um lado para o outro. Seus saltos ecoando no chão de mármore, e sua saia esvoaçava ao longo de seus movimentos.
“Percebi que de nada adianta mantê-la aqui” aquele barulho de seus sapatos me irritava. “Resolvi libertá-la por enquanto. Entretanto, você terá que ir à festa de Charles hoje à noite” Mary falava com calma cada palavra. Ela sabia como eu não suportava sair com ela, já que eu era obrigada a fingir ser a filha perfeita da família perfeita. Fiz uma careta e fui repreendida.
“A não ser que queira continuar trancada durante todos os dias das férias de verão...” ela continuou com seu tom severo.
“Eu irei, mãe” falei irritada.
“Ótimo. Coloque seu Channel preto que comprei semana passada. Ficará esplendida” disse ela por fim, e deixou o quarto rapidamente, não me dando chance de protestar. Encostei minha cabeça atrás da cama e desejei que o tempo passasse muito devagar.


Eram sete da noite e Mary fazia maquiagem em mim. Eu estava mais irritada após ela ter quase esmagado meus órgãos vitais tentando fechar o zíper do vestido. Eu me mexia na cadeira, enquanto ela me dava tapas no braço.
Assim que terminou, levantei-me e fui em direção ao espelho embutido no guarda-roupa. Eu estava... apresentável. Meu vestido era de seda preto até os joelhos, uma faixa abaixo dos seios verde, e tomara-que-caia.
Mary havia feito um elegante coque em meus cabelos, e a maquiagem era igualmente bonita.
“Você está linda...” até me elogiando ela parecia grosseira. Minha mãe estava atrás de mim, e eu podia vê-la através do espelho. Sorri tímida, e ela logo desfez sua feição materna. “Estou te esperando no andar de baixo” e saiu do quarto.
Fiquei me encarando por alguns instantes, pontuando os defeitos até ficar deprimida, e desci.
Meus pais estavam sentados no sofá da sala de entrada.
“Você está deslumbrante, minha filha...” papai disse com um brilho diferente nos olhos. Corei. “Vamos.”
Seguimos até o carro onde o motorista nos aguardava.


A casa dos era tão grande quanto a nossa. Charles era o prefeito de Bolton, o que justificava seu tamanho. A fachada estava decorada com balões e faixas com números e um slogan “Vote !” Era a festa da nova campanha de reeleição do pai de .
Uma musica clássica era tocada a fundo por uma orquestra e haviam garçons zanzando com bandejas de champanhe e comidas estranhas.
!” alguém gritou e antes que eu pudesse perceber que era, vi um chumaço de cabelos tampando minha visão. “Como eu estava com saudades!” me soltou e eu ajeitei o vestido em meu corpo.
“Eu também estava, ” falei meio desanimada, já que não estava com o mínimo de humor para festas. Ela cumprimentou meus pais e depois ignorou meu desanimo, me puxando pelo braço festa adentro. Ela tagarelava sobre seu romance com , contava que fora apresentada a seus pais e coisas do tipo.
Como sempre, ela estava linda. pegou duas taças de champanhe, sem se importar com o fato de que nossos pais estavam ali.

Minha cabeça virava para os lados a procura de alguém em especial. Eu o veria, era inevitável.
Minha amiga me levou para frente do palco improvisado, onde vi meus amigos sorridentes. foi o primeiro a correr em minha direção e me dar um abraço de urso. Ele me tirou do chão enquanto eu me debatia em seu colo.
“Oi boneca” ele disse animado, dando um beijo estalado em minha bochecha.
“Você é um brega, ” rolei os olhos e me soltei de seus braços. também veio em minha direção e me abraçou. acenou.
“Sentimos sua falta, . Ninguém consegue ser mais retardado que você... Nem mesmo o apareceu atrás de mim, passando um braço em meus ombros e o outro em .
“Te odeio, ” me livrei de seu braço e fingi-me emburrada. Os garotos embalaram uma conversa inútil, apenas para não perder o costume e eu fiquei totalmente distraída. Até o ponto em que eu o vi.
Ele conversava com meus pais, com aquele sorriso lindo estampado em seu rosto. Ele estava vestido de um jeito tão sério e responsável, e mesmo assim ficava perfeito.

Ben gargalhava e dava tapinhas no ombro do meu pai. Hora e outra, percebi que elogiava minha mãe também. Corei quando me realizei do motivo para toda aquela bajulação. De repente, seu olhar rodou o enorme salão até parar sobre mim. Seu sorriso foi aberto novamente, e eu fiquei tão desnorteada que esqueci de sorrir de volta.
Ben pediu licença aos meus pais e veio caminhando a meu encontro. Seu andar era perfeito, o modo como suas pernas se moviam de um modo sincronizado era perfeito. Ele tinha o olhar fixo em mim e um pequeno sorriso nos lábios.
Assim que estava relativamente próximo, pegou minha mão e depositou um beijo de leve na mesma. O toque de seus lábios macios e quentes me fez tremer as pernas.
“Boa noite, princesa” se fosse dizendo, eu provavelmente diria novamente o quanto ele era brega, mas não era . Tudo naquela voz perfeita era lindo.
Era incrível como eu ficava sem ação diante de Ben. Talvez ele tivesse um poder hipnotizante ou algo assim.
“Noite...” sussurrei num tom distraído. Escutei alguém reclamar algo atrás de nós, mas eu estava despreocupada demais para saber quem era.
“Dançaria comigo?” ele sugeriu com um enorme sorriso e sobrancelhas arqueadas. Balancei a cabeça como um sim, me sentindo a patética dos patéticos.
Ben me conduziu ate o meio do salão, e senti dezenas de pares de olhos sobre nós. Não me importava, já que os meus estavam concentrados em apenas um.
Uma musica lenta e melosamente romântica tocava, e Ben continuava me conduzindo pelo emaranhado de pessoas. Paramos.
Suas mãos deslizaram do começo da minha nuca até minha cintura, e cada fio de pêlo do meu corpo se arrepiou. Sua outra mão tocou delicadamente a minha.
Graças às minhas aulas de dança no verão passado, eu não cometi nenhuma atrocidade. Nos movimentávamos de modo sincronizado, sua cabeça encostada na minha, e hora ou outra eu sentia seus lábios quentes sobre minha pele.
“Você está uma princesa, ” ele disse num tom suave e doce, bem perto do meu ouvido. Senti meu sangue queimar em minhas maçãs do rosto.
“Obrigada” sussurrei. Qualquer um ficaria sem palavras (e fôlego).

Tive vontade de perguntar-lhe por onde esteve nos últimos dias, o porquê de não ter me procurado, ligado ou ate mesmo mandado um bilhete pelo , mas minha garganta simplesmente se fechava, impossibilitando a saída de uma palavra sequer. Para piorar, suas mãos deslizavam carinhosamente pelas minhas costas.
“O que você fez essa semana?” arrisquei. Meu corpo agora estava mais próximo do de Ben, e eu já sentia correntes elétricas eletrocutarem meus ossos. Ele sorriu e seus lábios aproximaram do meu ouvido, e ele sussurrou;
“Pensei em você... Todos os dias” acho dispensável quaisquer comentário. Minhas bochechas queimaram, obviamente, e eu olhei para o chão em forma de timidez.
Continuamos movimentando em silencio. Eu esperava que ele não pudesse ouvir minha respiração descompassada.
“Posso te ver essa semana?” Ben pediu delicadamente. Era impossível recusar tal oferta. Bufei depois de lembrar do castigo estúpido em que me encontrava.
“Não posso. Estou de castigo” rolei os olhos.
“Esse não é mais um problema. Falei com seus pais e me responsabilizei pelo que aconteceu” ele mostrou todos seus dentes num sorriso impecável. “E pedi permissão para sair com você. Temos um passe livre...” continuou ele. Tive vontade de saltitar como uma criança, mas me contive com um sorriso.
“Como você conseguiu?” perguntei abobada, afinal, aquilo era uma proeza que eu nunca consegui em dezessete anos.
“Digamos que tenho meus charmes...” eu não poderia discordar.
Continuamos nos balançando, eu sentia seu perfume bagunçar os meus sentidos, e aquilo já me irritava. Ate que vi alguém cutucar Ben, mas por ele ser o dobro do meu tamanho, não pude saber quem era.

se virou, então vi que o encarava sem sorrir.
“Posso ter a mão da ?” escutei sua voz soar friamente. Ben também o encarou com a mesma intensidade. Não sabia o motivo, mas podia ver faíscas entre eles.
“Como quiser...” o mais velho finalmente disse, quebrando aquele clima tenso. Ben se virou para mim e fez um gesto cortês antes de me deixar ali com . Eu estava entendendo absolutamente nada.
“O que foi isso, ?” perguntei enquanto ele colocava sua mão em minha cintura.
“O que foi o quê?” ele fez cara de desentendimento e pegou minha outra mão.
“Não responda uma pergunta com outra” falei seca. Coloquei uma mão em seu pescoço e o vi se contrair. Não pude deixar de rir.
“Só te chamei para dançar, oras. Não vejo o problema nisso...” continuou ele inocente. Sua feição era angelical, e seus cabelos ajudava em sua inocência. Rimos juntos, e não nego que sua risada era incrivelmente contagiante.
“Certo...” concordei depois de cessar o riso.
“Você quer dar uma volta?” ele sugeriu nervoso. Sua voz tremia, assim como suas mãos em minha cintura. estava estranho. Concordei acenando a cabeça e ele me puxou pela mão ate fora do salão.
O jardim da casa dos era imenso. A mãe de era viciada em plantas, pode-se dizer.
soltou minha mão e começamos a andar lado a lado, em silencio.
“Você está bem?” coloquei a mão em seu ombro. Ele parecia chateado com algo. Eu e nunca fomos melhores amigos como eu e , mas não deixávamos de ser amigos, e eu me preocupava.
“Estou bem...” ele respondeu vagamente. Não olhava em meus olhos, encarava os próprios pés.
Estávamos no imenso gramado no fundo da mansão, onde grandes arvores e flores de todas as cores nos rodeavam. Mais à frente, havia uma ponte sobre um pequeno lago artificial. Paramos lá. Demorou um tempo ate que aquele silêncio constrangedor sumisse.
“Então...” falamos ao mesmo tempo.
“Você pode achar estranho, mas eu preciso te perguntar...” começou, e me olhou pelo canto do olho. Fiz um sinal com a cabeça para que ele continuasse. “Você está gostando do Benjamin?” Em sua voz, o dome de Ben soou grotesco, com um tom de raiva. Não entendi, já que até onde eu sabia, os dois eram amigos. Hesitei antes de responder.
“Sim...” respondi simplesmente. Ele agora me encarava de frente, me deixando sem graça.
“Muito?” insistiu ele. Eu estava um pouco incomodada com essa curiosidade instantânea de .
“Acho que sim...” falei olhando para qualquer canto do jardim, menos para o rosto do garoto à minha frente. “Mas por que tanta curiosidade, ?”
“Bom... Só curiosidade, nada mais...” ele bagunçou seus cabelos. “Quero dizer... Somos amigos, não somos?” concordei com a cabeça. “Então... Queria ficar por dentro do seu novo relacionamento!” completou ele sorridente.
... Você nunca se interessou pela minha vida... Muito menos em meus relacionamentos! O eu está acontecendo de verdade?” perguntei desconfiada. ficava cada vez mais sem graça, e agora ele apoiava seus braços no suporte da ponte, encarando o lago.
“É só que... Eu não sei, , mas estou preocupado dessa vez...” ele respondeu brincando com os próprios dedos.
“Com o que, ?” me pus ao seu lado, de modo que ele pudesse me olhar. Ele o fez.
“Digamos que Ben não seja o melhor cara com garotas...”
“Eu conheço a fama de Benjamin, ” o interrompi.
“Então... Você pode se machucar... Ele pode te machucar...” ele me encarou profundamente.
“Mas o que te faz pensar que eu seja igual às outras garotas com que ele já saiu?” indaguei incrédula. Digamos que normalmente Ben não saia com meninas de melhores índoles de Bolton.
“Você não é igual à elas! Nunca! Esse é o problema, !” se adiantou, frenético.
“Pois eu não vejo problema algum, . Benjamin me trata extremamente bem, não há motivos para você estar o julgando dessa forma” me afastei, e comecei a andar em direção à casa novamente.
Escutei os passos de atrás de mim. Logo após, senti suas mãos envolverem meu braço, e ele me virar para si. Ficamos bastante próximos, para não dizer fundidos. Eu senti sua respiração bater furiosa contra meu rosto, e seus olhos me encaravam com uma expressão que confundi por sendo como raiva ou preocupação. Ou quem sabe os dois.
“Só me prometa que tomará cuidado” ele disse calmamente cada palavra. Eu fiquei um pouco confusa por conta de toda aquela proximidade, mas voltei a mim em segundos, me soltando de seu braço.
“Não preciso de seus conselhos, . Você é tão igual ao Ben. Para não dizer que é pior. Guarde-os para você” falei friamente, voltando a andar novamente, deixando o garoto ali, parado e sem ação.


Capítulo 4.
                                         I said shake, rattle and roll

Eu curtia meu último mês de férias na piscina da minha casa, com a companhia de e . O sol ardente deixava minha pele vermelha. Eu sabia que aquilo arderia mais tarde, mas não me importava. A preguiça era maior.
Nós três usávamos óculos gigantes e chapéus com grandes abas. com um maiô ultima coleção da Dior, desenhado especialmente para ela. A garota fez questão de deixar isso claro. E eu estava com um biquíni branco e meu chapéu clássico.
Meredith havia nos trazido chá-gelado, e bebíamos enquanto conversávamos empolgadas sobre a volta às aulas. Eu nem tanto, já que previa como esse ano letivo seria extremamente cansativo graças à pressão de passar em uma faculdade. Acho que minhas amigas não se preocupavam muito com isso.
, é essa semana que você sairá com Ben?” não sei como, mas o assunto caiu em mim. me encarava por trás do imenso óculos. Dei um grande gole no meu chá, tentando evitar aquela conversa. Não sei bem o motivo, mas era inevitável eu me sentir tímida ao falar sobre esse assunto.
“Sim...” respondi vagamente, com o intuito de que minha amiga não fizesse mais perguntas. Às vezes sua curiosidade não tinha limites. Ela soltou um grunhido empolgado, seguido de pequenas palmas. Dava a impressão de que aquele seria o meu primeiro encontro. Certo, talvez realmente fosse, mas não vinha ao caso.
“Vocês são o casal mais lindo de Bolton. Depois de mim e , é claro” disse convencida, com um enorme sorriso em seus lábios. Rolei os olhos.
“Não somos um casal, . Pare de ficar falando besteiras” virei meu rosto para encarar a piscina, rezando mentalmente que minha amiga parasse com seus comentários infelizes.
Mas é claro que ela continuou a tagarelar. Então resolvi moldar uma barreira invisível à prova de sons, impedindo que qualquer palavra de entrasse em meus ouvidos. Ela já estava acostumada a conversar sozinha de qualquer maneira, não faria diferença.

As meninas apenas foram embora quando o sol já não estava mais nos iluminando. Quando ele começou a se pôr, fomos para o meu quarto fazer nada de útil, o que era o usual.
Tomei um banho com a água dolorosamente fria. Cada respingo que tocava em minha pele me fazia soltar um gemido de dor. Eu me esqueci que preguiça é um pecado, e pecados geram conseqüências. Duvidava de que conseguiria colocar uma peça de roupa em meu corpo, mas Meredith me convenceu a colocar uma camisola de seda.
Deitei-me com muita dificuldade, e agradeci pelos lençóis serem igualmente de seda, o que fazia minha pele relaxar ao toque frio do tecido.
?” escutei alguém sussurrar em tom desesperado, e eu sabia de onde aquele som vinha. De alguém que se encontrava abaixo da minha janela. Aquilo só podia ser brincadeira! Eu nem de castigo estava para precisar de algum dos meus amigos para me seqüestrar!
?” o individuo insistiu. Desejei não ter escutado, e deixar a pessoa se esgoelando até cansar. Entretanto, pensei na possibilidade de ser algo importante. não apareceria a essa hora em minha casa se fosse algo sem importância, afinal, haviam inventado algo chamado telefone.
Com a mesma dificuldade que me deitei, me levantei. Parecia que minhas juntas haviam sito queimadas assim como minha pele. Devo me lembrar de ir com roupas para um banho de piscina da próxima vez.
Arrastei-me como uma lesma até a imensa janela, enquanto a pessoa insistia em gritar pelo meu nome. Ele nunca fora tão irritante.
Fiquei inevitavelmente surpresa ao ver a figura de parada em frente à minha janela. Ele parecia muito abatido, percebi que seus olhos estavam inchados e vermelhos apesar do escuro.
“O que aconteceu, ?” perguntei preocupada. Ele encarou os próprios pés, talvez não quisesse que eu o visse naquele estado deprimente.
“Você poderia descer aqui?” ele pediu em um tom choroso. Olhei para o relógio enorme pendurado na parede atrás de mim. Oito e meia. Acho que Mary não teria um ataque cardíaco se eu fosse ajudar um amigo desesperado.
“Espere um instante” murmurei antes de adentrar meu quarto novamente para pegar um penhoar.
Saí do quarto rapidamente, desci a interminável escada, até chegar ao escritório de meu pai, onde eu tinha certeza de que ele estaria, lendo algum livro de sua biblioteca pessoal.
“Pai?” o chamei, e vi o mais velho tirar o charuto de sua boca.
“Sim, querida” ele respondeu carinhoso. Aproximei-me dele, até ficar de frente à mesa onde estava sentado.
“Lembra de ?” perguntei, e John assentiu. “Bom, acho que ele está com problemas e ele está na frente de nossa casa... Eu poderia chamá-lo para entrar, assim poderíamos conversar?” supliquei no melhor tom de voz que eu possuía. Era impossível me recusar qualquer coisa quando eu usava aquele tom. Meu pai franziu o cenho e eu aumentei minha expressão de suplica.
“Não acha muito tarde, filha?” ele perguntou olhando no relógio, mas com o mesmo tom carinhoso de antes.
“Sim papai, mas eu não lhe pediria se não fosse realmente importante...” falei apreensiva. Papai alisou seu bigode, ainda com uma expressão incerta, mas no final relaxou sua feição.
“Tudo bem, convide-o para entrar e vão para a sala. Mas não se demorem” ele concluiu e eu sorri, indo em sua direção a fim de dar-lhe um beijo estalado na bochecha.
O mordomo, Noel, foi em direção à porta principal e abriu-a para que eu passasse. Senti-me absurdamente aliviada quando senti um vento gélido soprar a minha face, fazendo com que a ardência desaparecesse por alguns instantes. Procurei por no jardim, até o ver sentado no gramado em frente ao meu quarto.
“Hey!” gritei e desprendeu sua atenção das roseiras ao seu lado e me olhou. Fiz um gesto com a mão para que ele viesse ao meu encontro, e assim o fez.
mantinha suas mãos nos bolsos de sua calça jeans, e vestia uma jaqueta bege para proteger da ventania. Ele realmente estava abatido e triste, e percebi que seus olhos estavam inchados por, definitivamente, chorar.
“Tem algum problema?” ele sussurrou antes de entrar pela grande porta.
“Nenhum” sorri e coloquei a mão em seu ombro, incentivando-o. Ao passar pelo salão de entrada, olhou em direção ao meu pai e acenou, me seguindo até o sofá que ali tinha. Noel se ofereceu à fazer um chá, e foi em direção à cozinha.
“O que aconteceu, ?” perguntei assim que nos sentamos um do lado do outro. O garoto fungou antes de responder.
“É a ... , você sabe o que está acontecendo?” ele mantinha o tom desesperado e percebi que ele estava prestes a chorar. Não entendi muito bem sua pergunta.
Quero dizer, eu não sabia o que estava acontecendo com . Eu havia a visto hoje e não percebi nada de diferente para falar a verdade.
“Porque pergunta?” indaguei curiosa. fungou novamente.
“Ela está estranha, . Fui à sua casa antes de vir aqui, e ela foi tão fria que estava irreconhecível! E no final, ela ainda mandou eu sumir e parar de infernizar a vida dela!” ele já não segurava mais suas lagrimas, e tinha o rosto escondido entre suas mãos. Noel chegou à sala com uma bandeja e a depositou na mesinha redonda de centro. Servi-nos.
“Eu realmente não sei o que dizer ... Quero dizer, hoje ela estava normal aqui em casa... Tirano o fato de que não estava conversando muito. Mas isso é normal em TPM, por exemplo!” falei pensativa. “SIM! É TMP, !” disse com uma certeza na voz, mas no fundo eu estava incerta.
“Não estou muito certo sobre isso...” começou ele cabisbaixo. “Dessa vez foi diferente, . Ela realmente queria isso. Eu pude perceber...” bagunçou seus cabelos nervosamente.
“Eu vou conversar com ela por você, ...” prometi e logo o abracei, sentindo a manda do meu penhoar se molhar com as lagrimas do meu amigo. Ele fez um movimento com a cabeça, concordando, e me apertou fortemente, o que me fez contrair já que eu era a nova torrada humana .
“E eu preciso dizer... Você está um charme assim... Parecendo um pimentão...” ele ironizou em meio de lagrimas. Ri e dei um tapinha em sua cabeça.

Agora eu precisava descobrir o que acontecia com . Nunca pensei que ela pudesse agir dessa maneira com relação a , já que parecia ser tão apaixonada pelo mesmo. Algo sério estava acontecendo...


xxxx


Era a milésima vez que eu trocava de roupa. Estava em frente ao espelho do meu guarda-roupa há duas horas.
Eu não conseguia me decidir entre as peças jogadas em cima da minha cama, parecia que nenhuma ficava bem o suficiente.
Para piorar minha situação, aquele era o meu primeiro encontro. Como agir? O que falar? Eu tinha a absoluta certeza de que eu acabaria falando alguma bobagem, ou pior, não falar nada. Provavelmente eu deixaria Ben falando com as paredes por estar nervosa demais.
Gritei por Meredith a fim de ajuda, e ela veio correndo imediatamente.
“Que roupa usar no primeiro encontro, Mere?” perguntei enquanto ainda me analisava, com um vestido rosa e tomara-que-caia em frente ao meu corpo.
“Acho que devia usar o azul com a faixa branca. Você vai ficar esplendida” ela respondeu em um tom sonhador. Foi em direção à cama e pegou o tal vestido, entregando-me. Peguei de sua mão e coloquei em minha frente, imaginando mentalmente como eu ficaria. Parecendo uma pamonha enrolada, como todos os outros.
“Vamos, vista!” Meredith exigiu, me empurrando ao banheiro para que eu experimentasse o Chanel.
Abri o zíper de traz, e passei as pernas pelo vestido, indo em direção à Meredith novamente, para que ela me ajudasse. Ela subiu o zíper, arrumou o cinto em meu corpo, pegou um sapato branco de verniz, com um pequeno salto.
Admito, caiu bem, milagrosamente. Mere prendeu meus cabelos em um rabo torto para o lado e me virou para que pudesse me observar.
“Não disse? Está maravilhosa!” ela disse triunfante entre palmas. “Agora vamos dar um acabamento final...” foi em direção ao meu banheiro, pegando a maletinha rosa com minhas maquiagens.
Passou um blush rosado em minhas maçãs do rosto, delineador nas pálpebras superiores e para finalizar, o rimel.
“Senhorita?” Noel bateu na porta do meu quarto. “O Sr. a aguarda na sala...” disse formalmente e minhas mãos começaram a suar.
“OH MEU DEUS, MEREDITH!” comecei a dar pulos ridículos e a andar de um lado para o outro.
, se acalme! Você vai ficar toda suada e seu perfume irá embora! Vocês só vão à sorveteria!” ela pareceu uma amiga. Com certeza seria o que diria. Para mim não era uma simples sorveteria... Quero dizer, era a sorveteria com o garoto que sonho em casar!
Tola. Estúpida.
Meredith me segurou pelos ombros e me forçou a olhá-la.
“Vai dar tudo certo, querida! Acalme-se! Respire...” ela inspirou profundamente, me induzindo a fazê-lo também. Contei mentalmente até dez, e finalmente me relaxei. Não no modo literal da palavra, apenas superficialmente.
“Certo. Estou calma” inspirei novamente. “Vamos” agarrei a mão da minha criada, e fomos correndo corredor e escadas abaixo. Meredith reclamando que não tinha mais forma para aquilo.

Quando cheguei no grande salão lá estava ele. Perfeito como eu me lembrava, com o sorriso mais encantador do mundo. Conversava animadamente com a minha mãe, que ria de cada palavra que saía daquela linda boca.
Desci os últimos degraus timidamente, já que nessa hora, os olhos de Benjamin pararam sobre mim. Ele veio ao meu encontro, pegou minha mão e depositou um beijo delicado na mesma.
Minha mãe (e Meredith) assistiam a cena admiradas, como se estivéssemos participando de um lindo filme de romance. O que para mim, era.
Entrelacei o braço no dele, e voltamos ao sofá onde estavam sentados. Sentei-me ao seu lado.
“Então, Benjamin, sei que minha querida está em boas mãos” começou Mary, como se eu fosse o orgulho de sua vida. “Mas preciso que a traga antes das dez. Toque de recolher, você entende, não querido?” ela disse com um imenso sorriso. Falsa.
“Claro, senhora . estará aqui nesse horário, eu prometo” ouvir aquela voz era melhor do que qualquer música clássica. Ele me olhou e sorriu, pegando em minha mão logo em seguida. Não consegui conter minha mandíbula, que se contraiu sem que eu mandasse estímulos para meu cérebro.
“Vamos?” Ben me perguntou.
“Claro...” respondi baixinho, sendo levantada pela mão por ele. Despedi-me de mamãe, que sussurrou algo como ‘Divirta-se’ seguido de um ‘Comporte-se’. Previsível. Relaxe mamãe, tentarei ao máximo não manchar o precioso sobrenome de sua família.
Seguimos de mãos dadas pelo enorme gramado, já fora de casa, até os portões de ferro serem abertos para nossa passagem.

“Você está linda” Ben disse sorridente antes de abrir a porta do carro para mim.
“Você também” falei ao reparar finalmente em sua roupa. O normal.
Calça jeans, uma camiseta com sua jaqueta preta por cima. Era marca registrada de Benjamin . Perfeito.
Ele gargalhou e sentou no banco do motorista, dando partida no carro logo em seguida.
Colocou o radio na Power Hit, onde tocava alguma música do Johnny Cash, a qual Ben começou a cantar de um jeito hilário, me fazendo rir histericamente.
“Mas me diga, vamos para a Nonna’s?” me sentei de lado para encará-lo após a crise de riso. Nonna’s era a sorveteria mais popular de Bolton, onde todas as turmas, dos colégios mais populares da cidade, se encontravam.
“Sim. Mas nossa parada por lá vai ser curta. Há um outro lugar onde quero te levar...” respondeu ele misterioso. Nem preciso dizer que a curiosidade corroeu meus órgãos internos.
“E que lugar seria esse?” fiz uma feição angelical, tentando arrancar a informação dele, apesar de saber que não me contaria.
“Eu já lhe disse para deixar de ser curiosa?” ele indagou rindo e eu soltei um ruído chocado, fingindo-me ofendida.
“Já lhe disse para não responder uma pergunta com outra?” intimidei.
“Percebeu que você acabou de fazer isso?” Ben continuou rindo. Rolei os olhos.
“Você é um chato” voltei à posição normal no banco, cruzando meus braços e fingindo estar emburrada.
“Obrigada, querida” ele disse sem olhar para mim, esticando o braço e começando a fazer cócegas em mim. Eu me contorcia no banco de couro do Pontiac, e implorava para que ele parasse.
“NÃO, BEN, PARE!” eu gritava em meio de risos.
“Fala que eu sou lindo” ele exigiu convencido.
“VOCÊ É LINDO!” continuei a gritar, enquanto ele não cansava o braço para minha infelicidade.
“Fala que está adorando sair comigo” ele continuou com seu joguinho, rindo histericamente do meu sufoco.
“EU...ESTOU...ODIANDO SAIR COM VOCÊ!” falei rindo, entrando em seu jogo. Claro que era mentira, como alguém odiaria um encontro com Benjamin? Não alguém normal... E minha sanidade mental é ótima.
“Menina má” ele parou o carro e se curvou para fazer mais cócegas. Meus pés se debatiam sobre o porta-luva, eu gritava por socorro para as pessoas que passavam na calçada. Esses com certeza não concordavam sobre minha sanidade mental estar tão bem assim...
“OKAY, OKAY!” gritei e Ben afastou suas mãos de mim. Ficou me encarando apreensivo, segurando o riso. “Estou amando sair com você, !” falei num tom sarcástico e rolei os olhos. Ele segurou meu queixo e me fez olhar em seus olhos. Concentre-se, ...
“Eu sabia...” ele falou com o tom mais convencido possível, se contraindo depois que comecei a estapeá-lo.
Ele roubou um selinho antes de sair do carro e ir em direção à minha porta, o que fez todo o sangue do meu corpo se concentrar em minhas bochechas.
Ben abriu a porta e segurou minha mão para que eu saísse, e não a largou enquanto andávamos em direção à entrada da Nonna’s. Como habitual, estava lotado de carros na porta. De todos tipos, cores e marcas.

De fora do recinto era possível escutar a música que tocava. Eu reconheci imediatamente, como a fanática por Elvis que sou.
A fachada da sorveteria era muito moderna, mais do que muitos restaurantes em Bolton. Era rosa, rodeada por vidros onde era possível ver o movimento lá dentro. Haviam mesinhas do lado de fora também, onde ficavam a maioria dos casais apaixonados. Mesinhas azul-piscina, o que combinava com o grande letreiro no telhado, com um reluzente ‘Nonna’s’.
Ben parecia conhecer cada pessoa ali, já que acenava constantemente para alguns que eu jamais havia visto. Eu andava meio cabisbaixa, sempre tive algo como preguiça para cumprimentar as pessoas. Ato anti-social, admito.
abriu a grande porta de vidro cheia de anúncios para mim, e já pude sentir a animação ali dentro.
Era a ultima semana de férias, então todos pensavam em curtir o máximo.
As mesas da sorveteria ficavam entre dois estofados que a contornava, e havia milhares assim espalhados ao logo do recinto. As paredes eram amarelas, com quadros que iam de pin-ups à cardápios de sorvetes. Era tudo muito colorido. Apenas o chão, que eram azulejos brancos e pretos, variava.

Vi muitos rostos familiares ali, os rostos usuais, que eu sempre via quando resolvia sair.
Como uma escola, o Nonna’s também era dividido em grupos.
Em um canto, o grupo das garotas populares e promiscuas do meu colégio, Ladywood School. Em outro, os garotos que cobiçavam essas garotas. Bem poético.
Em outro canto, ficavam os roqueiros e revoltados da cidade. Andando mais um pouco, você via as puritanas, os estudiosos, os modernos, alternativos, e uma interminável lista de estilos.
Vi meus amigos em uma mesa no fundo, e assim que entramos, pude ouvir se esgoelado.
“Esse louco não faz parte da minha família...” Ben sussurrou divertido em meu ouvido. Ri enquanto vi o pequeno se aproximar. A diferença entre ele e seu irmão mais velho era visível. Não tanto na aparência, mas era muito desengonçado, enquanto seu irmão tinha uma silhueta perfeita. O estilo de roupas era totalmente diferente, era mais casual. Mas cada um com seu jeito especial de ser.
“Cunhada!” o garoto me abraçou animado, talvez com a idéia de eu ser sua melhor amiga e estar com seu irmão. Ele deu um murro fraco no ombro de Ben, que bagunçou o cabelo do mais novo.
Cumprimentei o resto do pessoal pelo ombro de , que não percebeu que me tampava, e muito menos se incomodou. tinha uma feição curiosa, provavelmente me ligaria de madrugada para saber os detalhes. encarava as próprias unhas tediosas, a encarava triste e estava conversando com uma garota que nunca havia visto na vida. me encarava inexpressivo, com o rosto apoiado em uma das mãos. Assim que nossos olhos se encontraram, ele fez questão de olhar para outro canto, antes que eu pudesse o cumprimentar. A educação mandou lembranças, .
“Parece que o clima ali está pesado...” comentei como que não quer nada.
“E está. Fiquei feliz que chegaram, assim...” começou empolgado, mas foi cortado pelo irmão.
“Não pense que vai sentar conosco, pirralho. Pode voltar para o seus amiguinhos, hoje é somente eu e ” Ben se adiantou, cortando a felicidade de em mil pedaços. Tive vontade de rir de sua cara tristemente forjada. Ben piscou para o irmão, e fomos em direção à uma mesa vazia, na direção contraria da que meus amigos estavam.
Acenei uma ultima vez à , que sorriu tão empolgada quanto anteriormente.

Sentamos lado a lado, Ben passou um braço em meus ombros, e uma garçonete veio nos atender.
Nunca concordei particularmente com o uniforme de trabalho dessas garotas. Tudo curto demais, sexy demais. Isso me fez sentir pouco a vontade, já que a garota encarava Ben descaradamente, pouco se importando com a minha humilde presença.
“O que você vai querer, linda?” ele voltou sua atenção para mim, já que antes conversava animado alguma coisa sem importância para mim, já que eu me menosprezava em pensamento.
“Um milkshake de morango e creme, por favor...” falei ainda de cabeça baixa, brincando com o porta-guardanapo. Benjamin repetiu meu pedido e fez o dele, agradecendo educadamente à garçonete oferecida.
Assim que ela saiu, se virou para mim e deu um beijo em minha testa.
“Tem uma moeda?” perguntei vagamente, o vendo concordar e me entregar.
Levantei-me e fui em direção à jukebox que ficava no fundo da sorveteria. Escutei sussurros sobre mim ao longo do meu caminho até lá, mas fiz questão de ignorar e me manter focada naquele objeto gigante e reluzente. Assim que cheguei, observei o catálogo de músicas, e meus olhares foram diretos à letra “e”. Coloquei a moeda no local indicado, apertei a tal letra, e o número “4”, que indicava a música All Shook Up.
A voz perfeita de Presley invadiu o lugar, e as pessoas ali ficavam cada vez mais empolgadas ao longo da musica.
“Só podia ser a !” escutei a voz de gritar do outro lado da sorveteria. Fiz uma careta e voltei à minha mesa com um humor melhor. Era esse o efeito de Elvis sobre mim.
Fui dançando todo o caminho, vendo Ben rir enquanto eu fazia caras e bocas.
Nossos pedidos já haviam chegado, e meu milkshake esperava ansiosamente para ser ingerido por mim.
Ao longo do nosso lanche, eu roubava pedaços de waffle de Ben, ele me lambuzava de sorvete e calda de chocolate, e conversamos sobre inutilidades aleatórias. Ele pediu a conta, pagou e nos levantamos para ir embora.
Acenei novamente para meus amigos, que continuavam com suas feições de velório, exceto por e que riam escandalosamente.

“Agora você pode me contar pra onde vamos?” continuei com minha curiosidade importuna.
“Meu Deus, como alguém tão pequeno pode ser tão irritante?” ele falou para si mesmo, dando partida no carro. [n/a: plágio, ooi]
“E você continua me respondendo com perguntas” bufei e voltei minha atenção às ruas, vendo o sol se pôr lentamente no horizonte.
Depois de vinte minutos dentro do Pontiac, Ben finalmente parou em uma rua que eu conhecia muito bem.
Ela era igualmente movimentada à Trafford Square, onde ficava a Nonna’s.
Lá estava o Hewlet Bowl, onde nós vínhamos quase todos os sábados jogar boliche, a maioria dos restaurantes da cidade, alguns bares noturnos bem famosos. Normalmente, a Trafford Square era onde os colegiais se encontravam, e na Packard Road concentrava pessoas da idade de Ben ou mais adultos. Eu só a freqüentava com meus pais, ou para o boliche à tarde. Eu era proibida à ir lá, de acordo com Mary, era um lugar inapropriado para a minha idade.
Olhei insegura para Ben, que sorriu e me deu a mão para que eu saísse do carro. Hesitei por alguns instantes, pensando no que poderia acontecer se minha mãe descobrisse. ‘Tudo que é proibido é mais prazeroso’, minha mente esclareceu.
Aceitei a mão de Benjamin, e ele começou a me guiar pela movimentada calçada.
Eu não tinha noção de que uma rua poderia ser tão movimentada, ainda mais às nove da noite (e em um subúrbio como Bolton), já que eu sempre estava acostumada a dormir antes deste horário, o que justificava a minha falta de noção.
Eu olhava maravilhada as vitrines dos pubs e restaurantes, as pessoas mais velhas que eu se divertindo horrores.
O fato de eu ser mais nova (e muito) me incomodou no começo, mas aos poucos, me relaxava com suas conversas distraídas. Andamos um pouco até chegar no final da rua, onde na esquina havia este imenso e chamativo lugar. Sua placa escrito ‘Block Dancing Pub’ piscava a cada segundo, chamando a atenção de toda a rua.
Pessoas e mais pessoas lá entravam, as mulheres com suas saias rodadas, saltitando ao lado de seus belos parceiros.
A cada passada, sentia que estávamos chegando cada vez mais perto ao tal pub, e indagando se Ben tinha em mente o mesmo que eu pensava. Não que eu quisesse, longe de mim.
“Voce não esta pensando em...”
“Sim, estou pensando nisso. Pensando não, nós vamos, ” ele me interrompeu, prevendo o que eu falaria.
“Benjamin, eu...não sei...dançar!” falei pausadamente cada palavra, para ver se conseguia colocar um mínimo de juízo em sua cabeça. Ele gargalhou, e fiquei na duvida se era uma risada divertida ou sarcástica.
“Vamos lá, , nós dois sabemos muito bem que você é ótima dançarina. Já sugeri que você deveria participar do Dancing Days, e como o festival é no final de fevereiro, pensei em começarmos a treinar” ele dizia empolgado, enquanto eu escutava cada palavra em choque.
, eu estava um pouco alterada o dia em que dancei na casa do , você não pode usar isso como álibi!” protestei, parando de andar imediatamente. “Eu não vou participar de festival nenhum! E muito menos dançar ai. Já ouvi falar desse lugar, é onde os melhores dançarinos da cidade se divertem. É muita humilhação para mim.”
“Você é muito dramática, ” ele disse rolando os olhos. “Se você não for por bem... Bom, vai carregada” e antes que eu pudesse resmungar mais alguma coisa, eu estava praticamente de cabeça para baixo, nos ombros de Benjamin, chamando a atenção das pessoas mais do que a placa do Block Dancing.
“ME PÕE NO CHÃO, SEU LOUCO!” eu me debatia e dava tapas nas costas de Ben, enquanto ele se matava de rir. Patética. “Você está impossível hoje, Benjamin Herick !”
“Sua culpa, baby” silibou ele entre risos.


“Duas entradas, por favor” estávamos na bilheteria, e Ben ainda me segurava nos ombros, causando o choque entre as pessoas que passavam por nós.
“NÃO VENDA, MOÇA, POR FAVOR!” eu gritei por entre os ombros do garoto, sem ver a feição da vendedora por detrás do balcão.
Provavelmente ela pensava que Ben era um psicopata e eu, uma louca varrida. Mesmo assim, a mulher não me atendeu.
Ben só me colocou no chão, quando senti o vendo gélido do ar condicionado bater sobre mim.
Luzes de todas as cores saiam do teto, fumaça saia do chão, e as pessoas dançavam na pista à frente. Tocava algum jazz, que pela minha falta de cultura não pude identificar.
Era lindo. Cada um dos casais tinham suas próprias coreografias, dançavam em plena harmonia, com grandes sorrisos estampados em suas faces. Blue Suede Shoes começou a tocar, e imediatamente fui puxara para o meio da pista.
Ben dançava enquanto andava pelas pessoas, e como na sorveteria, ele parecia conhecer todos.
Paramos exatamente no meio da pista, o que tornou as possibilidades de eu dançar, ainda mais remotas.
começou a dançar sozinho, perfeitamente, inventando passos e apontando para mim, me deixando ainda mais embaraçada.
Ele pegou a minha mão, e me rodou, puxando para si mesmo logo após.
“Vamos , mostre à elas quem é que manda aqui” Ben disse apontando com a cabeça às lindas mulheres que dançavam perfeitamente ao nosso redor. Era obvio que qualquer uma delas mandava ali, exceto eu. Rolei os olhos e não resisti à não dançar, isso era impossível, ainda mais com o parceiro que eu tinha.
Começamos a dançar o rockabilly rítmico que tocava, inventando passos tão espontâneos que chegavam a ser magnífico. Ele me girava em alguns passos, nossos pés se moviam igualmente, indo de um lado para outro o tempo todo. Com certeza éramos o casal mais empolgado e, principalmente, o mais louco.
No final da música, Ben me levantou no ar, em um esplendido final.
“Yeah!” ele gritava enquanto eu batia palmas e ria do garoto à minha frente, que parecia ter ganhado algum premio. Depois de seu showzinho, veio em minha direção e me beijou. Assim... de surpresa. Como era de se esperar, minas pernas pareciam não obedecer aos estímulos nervosos que meu cérebro mandava para que elas permanecessem rígidas. Seu beijo era doce e suave... Sua boca se movimentava contra a minha delicadamente, e suas mãos estavam rígidas em meu rosto. Quando ele partiu o beijo, para que eu pudesse finalmente retomar o ar que faltava em meu sangue e pulmões, Ben começou a me encarar.
Meu rosto ainda estava em suas mãos, então nem a liberdade de olhar timidamente para outro lugar eu tinha. Seus olhos azuis pareciam perfurar os meus, tamanha a intensidade de seu olhar.
“Pare com isso...” pedi sem graça, sentindo minhas bochechas queimarem.
Ele abriu um pequeno sorriso antes de me dar um selinho e voltar a me encarar.
“Quer namorar comigo, ?” sua voz aveludada nunca pareceu tão perfeita ao dizer aquelas cinco palavras, com meu nome incluso.


Capítulo 5.
                                          A little more bite and a little less bark

Escutei alguém entrar em meu quarto, mas eu ignorei totalmente a presença desse ser. Depois, escutei o barulho de cortinas serem abertas e agradeci mentalmente por estar com tampões de olhos para me proteger.
“Vamos, , hora de acordar!” reconheci a voz de Meredith, mas resolvi fingir não ter escutado, e tentar voltar a dormir novamente.
A mulher bufou e seus passos ecoaram até bem perto de mim. Tirou o cobertor de cima de mim, arrancando resmungos irritados de mim, obviamente.
“Acorde, garota! As férias acabaram!” a palavra ‘férias’ e ‘acabaram’ não eram a combinação perfeita, e aquela ultima frase me fez pular para fora da cama.
“Porque férias não podem ser eternas?” resmunguei tirando meu tampão e jogando-o em cima de Meredith, propositalmente.
“Porque quem vive de férias não se torna uma grande advogada, então trate de se levantar e preparar seu futuro” ela disse num belo discurso. Dramática.
“Nossa, Mere, como você é extrapolada” resmunguei novamente, colocando minhas pantufas e indo até o banheiro fazer minha higiene e necessidades matinais.
A criada continuava a tagarelar atrás de mim, parecia mais empolgada que eu para o começo do ano letivo. Quero dizer, eu estava zero por cento empolgada para esse fato. Férias deviam ser eternas, definitivamente.
“Sua mãe está chamando para o café. Vista logo o seu uniforme e desça” disse ela serelepe antes de me deixar sozinha.
Tive vontade de deitar-me novamente na cama e fingir que Meredith não havia entrado no quarto. Mas mamãe provavelmente brigaria com ela. Por mais que eu fosse desesperada pelos meus estudos, lembrar que eu teria de enfrentar aquele inferno por mais dois semestres, era assustador. A imagem das lideres de torcida me criticando e derrubando sorvete propositalmente em mim me assombrava à dois verões.
Fiz o que Meredith me mandou, e desci até à sala de jantar, onde uma farta mesa de café da manhã estava posta, com variedades de roscas, cookies, muffins, vitaminas, frutas, quitandas de todos os tipos.
Exagero, como tudo nessa família.

Meu pai estava sentado na ponta, como sempre, e com um jornal diário em suas mãos, o qual lia com seriedade.
Minha mãe, ao seu lado direito, cortava um pão-de-batata ao meio, sem desmanchar aquele jeito frio e indiferente de seu rosto, parecia já estar esculpido em sua vida.
Sentei-me do lado oposto ao da minha mãe, não sem antes dar um beijo na testa de meu pai.
“Bom dia, querida” John esbanjou um imenso sorriso, fazendo suas ligeiras covinhas aparecerem no meio de sua barba um pouco mal feita. Respondi com um sorriso, já que um ‘bom dia’ ele não arrancaria da minha boca. Hoje com certeza não seria um bom dia, o céu escuro me dizia isso. Peguei um pão da mesma cesta onde minha mãe havia pegado o dela, e o enchi de pasta de amendoim. Ela e eu nunca nos desejávamos bom dia, afinal eu não estava interessada em seu dia, então para mim era indiferente se ela tivesse ou não um dia feliz.
Eu não me importava. E aparentemente, nem ela.
“Seu primeiro dia de aula, huh?” meu pai começou sorridente. Acho que todos nesta casa estavam felizes por eu estar voltando ao inferno, talvez estivessem enjoados da minha cara sem graça e sem expressão.
“Pois é...” silibei sem emoção, dando uma enorme mordida em meu sanduíche, trazendo a discórdia ao rosto de Mary.
“Você devia estar animada, ! Oh, como sinto saudades do meu colegial...” John continuou, típico assunto nostálgico de quem já passou dos trinta. Recostei minha cabeça em uma das minhas mãos enquanto eu mastigava, quase dormindo.
“Tire a mão da cabeça, é falta de respeito enquanto come” Mary me reprimiu, olhando-me com desgosto. Suspirei profundamente e me sentei comportada, de acordo com suas normas de etiqueta. Não estava com humor bom o suficiente para argumentar, meu sono e melancolia superavam minha revolta contra minha criadora.
Depois de um longo e silencioso café da manhã, meu pai anunciou que me levaria até o colégio. Despedi-me brevemente de Mary, peguei minha mochila das mãos de Meredith e parti, aos calcanhares de meu pai, para fora da casa.

John tecnicamente me levou até o colégio. Na realidade, havia um motorista no banco da frente, enquanto nós dois estávamos nos de trás. Fomos abraçados ao longo do caminho, e ele continuava com seu discurso nostálgico e abatido, de como sua princesinha havia crescido e se tornado uma linda moça. Ele realmente estava passando seus sentimentos para mim, já que tudo que vinha à minha mente, eram os momentos em que eu havia passado na minha infância. Principalmente dos dias em que John me levava à praça principal de Bolton nos dias em que havia quermesse. Eu sempre fazia escândalos para que ele me levasse em todos os brinquedos possíveis, e o mesmo sempre ia com um grande sorriso estampado em seu rosto. E o melhor era que no final, empanturrávamos de algodão doce azul. Eu me lembro exatamente, eu não suportava comer nenhum algodão que não fosse azul.
Mary nunca presenciava destes momentos, entretanto. Achava perda de tempo, e sempre criticava o espírito criança de meu pai.

“Boa aula, querida” papai depositou um carinhoso beijo em minha testa assim que vi o carro estacionar diante de um enorme terreno. Era agora. Eu não poderia fugir.
“Obrigada, papai” sorri meio incerta, e sai do carro assim que o motorista abriu a porta.
Vi o Mercury sumir por entre muitos outros carros que chegavam ali. Suspirei e contei até dez mentalmente, antes de me virar e encarar o local onde sempre ocorriam minhas divergências.
E a escola continuava a mesma. Tudo que se via de primeira, era o grande muro que a contornava, com uma pintura branca rústica, e no meio, um grande portão de bronze modelado. Esse estava arreganhado, e dezenas de garotas o adentravam, normalmente em bandos, gargalhando e conversando animadamente com as companheiras. Todas com cabelos perfeitamente penteados e brilhantes, com seus sorrisos perfeitos que combinavam com seus corpos.
O Ladywood School era um verdadeiro antro da perfeição, o paraíso para qualquer garoto. Exceto o fato de que ali não havia garotos, esses apenas apareciam durante o intervalo e ficavam pendurados em cima do muro para observas as milhares de meninas deslumbrantes. Eu me sentia sempre incomodada com toda aquela perfeição, principalmente quando ela me olhava e ria da minha patética existência.

A escola em si era gigantesca. Ocupava todo o quarteirão daquela avenida. Havia milhares de blocos com milhares de salas, um refeitório imenso, uma área de lazer, a qual incluía quadras de tênis, lacrosse, vôlei, um ginásio esportivo, piscinas de todos os tamanhos, enfim. Para mim, uma inutilidade. Mas infelizmente, sedentarismo não era opcional, logo, eu sempre me via em situações ridículas por aquelas áreas.

Arrumei a alça de minha mochila em minhas costas, e me juntei às garotas que adentravam o portal bronze. Enquanto eu atravessava o extenso gramado verde florescente, senti um peso sobre mim e vi um chumaço de cabelo tampar meu campo de visão. Essa pessoa só poderia ser uma.
, sua louca! EU VOU CAIR!” eu gritei desesperada e desequilibrada, e antes que eu pudesse agir, nós duas estávamos no chão.
A retardada ria sem parar no chão, e eu me levantei, tirando os pedaços de grama do meu cabelo. As garotas ali já pensavam que eu era uma esquisita e autista, e agora me olhavam abismadas, confirmando seus pensamentos.
“Você precisa de um psicólogo, sabia garota?” falei entre dentes, estendendo a mão à minha amiga que tinha um ataque epiléptico no chão.
“E você precisa de menos ódio no coração” ela bufou e aceitou minha mão de ajuda. Ajeitou seu uniforme, e voltamos a andar em direção ao bando no passeio. “Não agüento mais ver essas patricinhas chatas com suas bolsas da última coleção da Chanel...” disse com desgosto enquanto analisava as meninas que passavam do nosso lado.
, querida... Você é uma patricinha que usa bolsas da ultima coleção da Chanel...” lembrei-a, e apontei para sua enorme mochila com um grande símbolo da marca bordado.
“É...” ela disse pensativa. “Mas eu não sou chata!” completou entusiasmada e com os olhos brilhando para mim.
“De vez em quando não...” fiz uma careta e recebi um tapa da minha amiga.
“Agora me diga...” mudou de assunto, e subimos a escada do primeiro bloco, em direção à aula de filosofia, que era a primeira das nossas obrigações “Você e Ben, Ben e você...” ela articulava de um jeito engraçado. Minhas bochechas coraram no instante em que escutei aquele nome.
“Estamos... você sabe...” comecei sem graça, olhando para os lados vendo se não havia nenhum ser curioso a ponto de prestar atenção em nossa conversa “Namorando” sussurrei animada, dando pequenos pulinhos.
Como de se esperar, minha amiga fez questão de um escândalo. “ESTÃO NAMORANDO? AH MEU DEUS! VOCÊS OUVIRAM, INVEJOSAS? MINHA AMIGA ESTA NAMORANDO BENJAMIN !” gritava olhando à sua volta, e eram visíveis as caretas que as meninas faziam. Tampei sua boca de imediato e a estapeei.
“Conhece a palavra segredo, mulher?” A repreendi, recebendo um olhar de piedade da minha amiga. Rolei os olhos.
Continuamos a andar pela escada interminável, até que chegamos àquele imenso corredor com inúmeros escaninhos presos nas paredes. Chegava a ser irritante todas aquelas garotas reunidas, não era um som muito agradável. Digo, suas vozes misturadas não era a mais perfeita sinfonia.
Finalmente entramos dentro da classe de filosofia, e eu posso dizer que não estava com um pingo de saudades daquele professor gordo e que sempre tinha uma marca de seus óculos escuros em seu rosto.


“Você ficou sabendo da grande novidade, ?” perguntou à minha outra amiga, enquanto tocávamos de roupa no vestiário. Finalmente estávamos no ultimo horário do dia, o que significava estarmos por volta das quatro da tarde.
“Não, qual?” ela disse visivelmente empolgada, parando de colocar suas meias ¾ e nos encarando.
está namorando Ben !” deu pulinhos, mas a reação de não era a esperada. A garota fechou a cara imediatamente e sua feição misturava raiva e desgosto.
“Hm... Que bom” ela forçou. “Sejam felizes” para finalizar, fechou seu escaninho com força e saiu do vestiário apressada e batendo seus pés no chão fortemente.
“O que foi isso?” perguntei à , confusa. Porque diabos teve essa reação? Como , pensei que ela ficaria feliz, afinal, amigas são assim!
“Eu realmente não sei...” minha amiga disse, tão confusa quanto eu. “Provavelmente está com inveja por ainda não tê-la chamado...” ela deu de ombros. Eu balancei a cabeça, e vi minha amiga também sair do vestiário.
Com certeza, esse não era o motivo. Se fosse por , eles estariam namorando há séculos! Toda a conversa que nós tivemos a dias atrás, começava a fazer sentido.
Afastei qualquer pensamento da minha cabeça, arrumei meu uniforme esportivo e tracei o mesmo caminho que as meninas.

, você ficou para o time da Lester...” Jill, o treinador comandou. Preciso dizer que tenho uma paixão secreta e platônica pelo treinador Jill. Ele não passava dos vinte e cinco anos, cabelos lisos que caiam sobre seu rosto, uma barba malfeita e olhos lindos. Azuis. Que hoje estavam tampados por um RayBan aviador. Eu, particularmente, apenas insisto por fazer educação física por ele. Um grande estimulo, devo dizer. Jill me entregou um stick e fui correndo em direção ao grupo de Lester, que se encontrava no lado direito do campo.
Entre todos os esportes que praticamos, lacrosse é o que eu mais odeio, sem sombra de dúvidas. É um esporte idiota que tem como objetivo marcar gols rematando a pequena bola de borracha para dentro da baliza do adversário. Bem idiota e sem senso.
Lester, uma loira alta e de beleza impecável (que no tempo livre se torna líder de torcida para a escola masculina vizinha), me apresentou as estratégias. Concordei como se entendesse tudo, e Jill apitou para que começássemos.
Allison, do nosso time, estava com a bola, e começou a correr em direção à baliza do time de Ellie, o adversário.
e eram adversárias. Eu era encarregada da defesa do time, então eu sempre ficava a guarda de uma pessoa. Fui ordenada a defender , que era atacante de seu time, por ser sempre ágil e ter ótimos movimentos com o stick. Eu a rodeava, e seguia cada movimento seu, impedindo-a de avançar, ou pegar a bola de alguma companheira.
Allison passara a bola a Morgan, que a perdera para Cameron do outro time. A mesma corria para o nosso campo, e eu estava apreensiva do lado de , que possuía a mesma expressão de raiva de antes, e esperava ansiosa pela bola. Cameron atirara a bola para a garota, que começou a correr. Felizmente, eu tenho um bom fôlego e minhas pernas são de um tamanho favorável para uma boa corrida.
Eu corria tão veloz quanto , e consegui ficar a sua frente. Eu podia escutar a voz de Allison de plano de fundo, pedindo para eu tirar a bola do stick de , mas a garota desviava cada vez que eu tentava. Fiquei a sua frente novamente, encurralando-a. Ela claramente não teria outra opção, a não ser enviar a bola para outra pessoa, ou eu podia conseguir tirá-la de seu stick. Mas nenhuma das opções foi feita. Através do protetor de olhos, pude ver a raiva fulminando nos olhos de , e aquilo não podia ser apenas inveja por seu namorando não ter chamado-a para namorar. Não era racionalmente aceitável. Então, senti o peso da garota contra meu corpo, e fui derrubada no chão com força. Senti, no mínimo, duas costelas minhas serem quebradas, e eu torci para não ter uma concussão.
levantou-se rapidamente e correu até a baliza, atirando a bola em sua direção e fazendo um gol.
Todos ali estavam estáticos, inclusive as garotas do seu time.
, VOCÊ PERDEU A CABEÇA?” tirou os protetores e jogou seu stick em qualquer canto, gritando ferozmente com a garota. Não pude ver sua expressão, mas pude escutar bufando.
Jill apitou finalmente e veio em nossa direção. A essa altura do campeonato, todas do meu time me rodeavam e perguntavam se eu estava bem. Apesar da dor horrível em minhas costelas. Levantei-me com muita dificuldade, com ajuda de Allison, e Morgan.
, você sabe muito bem que é proibido contato físico nesse jogo, por que razão você fez isso?” Jill a indagou, visivelmente aborrecido. Vi rolar os olhos, o que fez o treinador se irritar mais. “Você está de licença dos jogos, . Por três meses, isso exclui você do torneio municipal de Lacrosse!”
“Como se eu me importasse...” ela disse cética, jogando com força seu protetor e stick no chão e saindo do gramado rapidamente.
“Quais são os problemas dessa garota?” Jill continuava zangado, fazendo gestos com as mãos. “Oh meu Deus, me desculpe , vamos para a enfermaria!” Lembrou-se de mim, e me colocou no colo, saindo rapidamente do gramado da quadra e andando pelo passeio enorme, que costurava o jardim.


“Isso parece ser muito mais do que simples inveja, ...” comentei, enquanto Preston, o motorista, me ajudava a andar até o carro.
“Ela está louca. Só pode estar usando uma dessas ervas novas que andam surgindo. Não tem outra explicação!” dizia incrédula. No momento em que Preston abriu a porta do carro para mim, pude ver alguém encostado no muro da escola.
Era . Ela estava com uma perna recostada no mesmo, seus braços cruzados e uma cara entediada. Resolvi deixar minha espiritualidade de lado, e enfrentá-la. Eu não era experiente nisso, mas as coisas não poderiam ficar assim. Nós éramos amigas!
, o que está acontecendo?” perguntei em alto tom, recebendo um olhar repreendido de . Vi bufar e aumentar ainda mais a expressão entediada. “Fale comigo!” insisti.
, me faça um favor, e esqueça de mim, okay?” ela disse curta e friamente e começou a andar na direção contraria a mim. Comecei a andar a seus calcanhares com dificuldade.
“Não, , eu não esqueço, não enquanto você não me disser o que tem de errado com você!” falei um pouco mais alterada, segurando seu braço para que ela olhasse para mim. O que me fez arrepender, já que aquela feição cínica estava me irritando tanto quanto fazendo meus punhos se fecharem de aborrecimento.
“O que está errado, ?” ela soltou-se bruscamente do meu braço. “Eu não te suporto, isso é o que está acontecendo! Esse seu jeito bonzinho me irrita!” fazia uma incrível cara de nojo enquanto falava, e eu escutava estática a cada palavra. “Esse jeito meigo como você fala me faz ter dor nos ouvidos! E o modo como você sempre coloca sua blusa para dentro da saia faz parecer que sua mãe a veste!” ela disse cínica apontando para mim e rindo irônica. Olhei para mim mesma. Minha camisa branca de uniforme se prendia dentro da saia rodada azul-marinho. Olhei para . Sua camisa tinha os dois últimos botões abertos, para que ela pudesse amarrá-la acima do umbigo.
“E você pensa que gosta de você? Como alguém pode gostar de você? Só algum idiota como o ! Acorda garota!” ela gritava histérica e seus cabelos começavam a se bagunçar devido aos seus movimentos bruscos.
Mas espera. ? Ela disse que gosta de mim? Eu escutei direito? Como isso é possível?
Espantei da minha cabeça e tentei me concentrar na situação.
... Porque você está agindo assim? O que eu fiz para você?” algumas lagrimas começavam a brotar em meus olhos. Não haviam motivos sensatos para explicar seus atos! Até ontem éramos melhores amigas, o que eu possa ter feito de tão ruim para ser tratada como lixo?
“Pergunte para seu namorado, ” ela disse finalmente com o tom mais frio e cruel que eu já havia escutado. Fitou-me de cima até embaixo com um sorriso cínico nos lábios, deu as costas e se afastou sem mais palavras.

E eu continuei ali, estática. Com milhares de coisas assombrando meus pensamentos.


Capítulo 6.
                                          And I can hardly speak, my heart is beating so

Eu ainda não tinha uma explicação lógica para tudo que vinha acontecendo. A revolta de , as coisas que ela havia dito sobre , sua frase final ‘Pergunte ao seu namorado’. Foi algo tão... insinuante e atormentador.
Eu estava no meu quarto, encarando o teto cor pêssego. Reparei em suas rachaduras, em algumas partes descascadas dele... Tentava me distrair de todos aqueles pensamentos absortos que me consumiam, e que definitivamente não me levariam a nada.
Afinal, era sábado, e sábado é um dia para se ter a cabeça fria e apenas curtir os pequenos momentos sem ter que calcular nada ou qualquer outra coisa que envolva escola. E neste sábado eu teria um encontro com Benjamin. Eu não estava nervosa como antes, na verdade não via a hora de encontrá-lo e fazer o que havia dito. Ouvi algumas batidas na porta de madeira do meu quarto e vi Meredith se aproximar com uma bandeja. Ela a depositou sobre minha cama e foi abrir as cortinas das persianas. Sentei-me e puxei a bandeja para mais perto, pegando as torradas e passando geléia de amora sobre elas.
“Rise and shine, ” Meredith disse incrivelmente animada, e eu fiquei me perguntando como alguém pode ser tão bem humorada de manhã. Não disse nada, só continuei concentrada em meu café da manhã. Os únicos momentos do dia em que minha cabeça fica completamente vazia é quando estou comendo, algo muito estranho para falar a verdade.v “Termine seu café e vista-se. Você tem treino de tênis hoje com seu pai, e ligou dizendo que também irá” Mere anunciou e saiu do quarto. Terminei de comer calmamente e me levantei da cama com muito desgosto, indo em direção ao meu closet pegando meu uniforme de tênis e o vestindo.
Era rotina, todo sábado eu e meu pai íamos ao clube local praticar tênis por diversão. Eu particularmente adorava, meus problemas desapareciam e minha raiva esvaziava toda hora que aquela pequena bola amarela batia contra minha raquete.

O motorista no levou até o clube, onde eu e meu pai fomos direto às quadras de tênis, conversando sobre novas técnicas de aprimoramento no esporte. já estava à nossa espera, eu jogaria com ela e meu pai jogaria com seus amigos multimilionários. Cumprimentei minha amiga com um abraço e começamos a nos preparar. Eu estava com o saque inicial, entao não tardei a lançar a bola em direção à . O som de Ray Charles invadiu todos os campos, como sempre a musica no tênis do clube Itacolomy era indispensável.
rebateu a bola para meu campo, e a imagem de veio em minha cabeça, me dando um impulso a rebater fortemente a bola contra o campo adversário.
“FORA!” gritou o juiz do nosso jogo, e eu limpei uma gota de suor que escorreu sobre minha face.
“Isso tudo é raiva, ?” gritou do outro lado do campo e eu saquei novamente.
“Não é raiva” rebati. “Na verdade não sei o que é. Eu só não consegui entender o comportamento ridículo de ” rebati novamente.
“Já te disse, ela deve estar se drogando com essas coisas novas que andam aparecendo” ela rebateu.
“Isso realmente não justifica, ” rebati fortemente.
“FORA!” o juiz gritou novamente e tive vontade de jogar a bola em sua cara. “Ponto para ” anunciou. levantou a raquete assim como a bola e sacou.
“E hoje vou sair com . Espero que ele tenha uma resposta para isso tudo. Apesar de eu não ver conexão entre os fatos” rebati.
“Você vai me machucar, reclamou com a força que eu estava mandando a bola. Meu pai já era acostumado com os meus acessos de raiva, teria que acostumar também. Era isso, ou ter que agüentar murros e chutes. Acho que ela iria preferir o tênis.
“Desculpa...” balancei minha cabeça tentando espantar aquela raiva que me perseguia.
“Olha , o único jeito de você ter respostas é falando com Benjamin. Remoer isso não vai adiantar de nada!” disse , a sabia. Concordei e tentei não pensar em mais nada e me concentrar no meu esporte favorito, o único jeito que realmente me relaxava e me fazia esquecer do mundo à minha volta.

“Okay, te ligo mais tarde...” despedi-me de , que havia ligado para que seu motorista a pegasse, já que ela tinha um importante jantar de família comemorando o aniversário de 95 anos de sua bisavó.
Resolvi ficar por ali mais um tempo, aquele clube me acalmava. Papai ainda jogava, e se eu estivesse com ele, provavelmente também estaria, mas não tem o mesmo pique que nós dois. Então resolvi nadar na piscina gigante que tinha ali. Eu também gostava de prticar natação, peguei habito desde quando tive uma crise asmática nos meus 5 ou 6 anos…
Fui até o vestiário, coloquei minha roupa de banho e rumei às piscinas gigantes. Sem rodeios, pulei de ponta, sentindo a água fria como um choque em contato à minha pele quente. Comecei a nadar e nadar, ignorando a presença de qualquer pessoa ao meu redor. Piscina me faz lembrar de minha infância, quando eu, e costumávamos brincar, imaginando que éramos sereias, e cada uma tinha o direito de escolher a cor da cauda, top e cabelos. Eu e sempre brigávamos para ter a cauda rosa. Fui mergulhando até a borda lateral da piscina e fui nadando lentamente até a superfície, apoiando meus braços na borda para subir.
Assim que minha cabeça saiu da água, vi alguém sentado com as pernas para dentro da piscina, ali, bem perto de mim. Levei um susto ao ver que essa pessoa era , e que ele estava me encarando descaradamente.
“H-Hey...” cumprimentei-o nervosa antes de dar um impulso para sair da piscina.
“Oi ...” ele sorriu e me acompanhou com o olhar até eu pegar minha toalha na espreguiçadeira ali perto. Resolvi me sentar ali ao lado de , também com as pernas dentro da água.
Houve um silencio meio incomodo entre nós, eu olhava para o movimento das pessoas ali por perto, as crianças brincando animadamente na parte mais rasa da piscina, enquanto eu sentia os olhos de sobre mim. Eu tentava puxar minha saia mais para baixo, envergonhada. Eu tinha a absoluta certeza de que minhas bochechas estavam coradas de um jeito ridículo. Era estranho, eu me sentia estranha perto do garoto ao meu lado. Não estranha de um jeito ruim, mas de um jeito bom, se é que isso existe. Olhei-o pelo canto do olho, e foi só ai que reparei em seus trajes, ou a falta deles. usava apenas um calção que ia um pouco acima do joelho, e vi que seus cabelos estavam molhados e totalmente desarrumados, alguns fios estavam grudados em sua testa, respingando água pelo seu rosto. Meus olhos ficaram um pouco hipnotizados demais com a cena, até que vi um sorriso brotar nos lábios do garoto, e eu cair na realidade novamente, sentindo mais uma vez, minhas maçãs do rosto queimarem. “E-Então...” falei totalmente sem jeito, contraindo meu corpo de vergonha e tentando olhar para qualquer canto que não fosse os olhos (ou o corpo definido) do . Me senti extremamente promiscua com todos os pensamentos que rondavam meu cérebro.
“Então...” ele repetiu e jogou o peso de seu corpo para trás, apoiando-o sobre as mãos, tendo uma visão das minhas costas, o que novamente me deixou extremamente sem graça. Eu comecei a ficar realmente incomodada comigo mesma, pelo fato de não conseguir fazer o sangue concentrado nas minhas bochechas descer. Era uma vergonha constante e que não e deixava em paz. Acho que eu nunca havia ficado assim na presença de ... Quero dizer... Ele é o ! Porque diabos eu tinha que ficar envergonhada perto dele?
“O que está fazendo por aqui?” perguntei, quebrando aquele silencio extremamente constrangedor. Vi se espreguiçar e bocejar antes de me responder.
“Lá em casa tava um tédio, e nenhum dos meninos queria treinar hoje, entao resolvi vim jogar uma sinuca... Nadar...” ele respondeu distraído, olhando para as pessoas por ali, com seus olhos apertados a fim de protegê-los do sol. Ele ficou ainda mais... Lindo. Balancei minha cabeça, tentando espantar novamente os pensamentos nada amigáveis que insistiam em me perseguir.
“Andam escrevendo muitas musicas?” puxei mais assunto, a fim de me distrair.
“Oh sim. Eu ‘to começando a escrever essa, Get Over You... Mas ela ainda tá picada, só tenho o refrão...” disse casualmente.
“Canta ela pra mim!” falei normalmente, encarando-o. Ele me olhou assustado e negou com a cabeça freneticamente.
“De jeito nenhum!” ele se adiantou, agora fazendo gestos exagerados com a mão.
“Hey, por que não? Vergonha é? Como você pretende cantar na frente de milhares de pessoas quando ficar famoso?” fingi-me de brava.
“Não é vergonha é que...” ele parou subitamente de falar e encarou as mãos. “Okay, eu canto. Mas só a parte que escrevi!” concordei com a cabeça e ele fechou os olhos.

“Cuz you’ve got all the things that I want
and I just can’t explain so
Help me baby I gotta get over you
And now and then she looks in my direction,
Im hoping for a sign of her affection but shes in denile and,
Shes got some worries today
But I think if she'd give me a chance,
I'll pleasantly surprize but,
Help me babe I gotta get over you…”

A voz de era tão perfeita que eu viajava enquanto ele cantava. Era algo de outro mundo escutá-lo cantar. Se eu pudesse, passaria o dia escutando qualquer porcaria que ele quisesse cantar. Qualquer porcaria se tornaria perfeição.
“Bom... É isso!” ele disse sem graça, dando de ombros. Eu ainda estava estática, sem palavras para expressar o que eu sentia. Quero dizer, aquela letra me tocou de alguma forma que eu não podia explicar, e eu simplesmente não poderia dizer o quão magnífico era escutá-lo cantar, afinal, aquilo soaria estranho.
“Está ficando muito boa! Quero escutá-la completa depois...” falei sorrindo sem graça e voltando minha atenção às crianças barulhentas ali. Senti seus olhos pousarem sobre mim, e pelo canto do olho vi que ele sorria.
Olhei-o novamente, disfarçando o máximo possível, apesar de não ser boa nisso. Ele continuava a me encarar.
“O que foi?” perguntei incomodada. Talvez eu estivesse com uma sujeira em algum lugar, ou meu cabelo estava ridicularmente estranho... soltou um risinho e voltou a se sentar normalmente.
“Não é nada... É só que lembrei de algo” ele disse ainda rindo, o que me fez ficar mais intrigada.
“Anda, fala logo!” comecei a rir também, mas só pelo fato de estar escutando a risada dele.
“Você nada de um jeito engraçado...” disse rindo explosivamente. Fiz uma cara de choque e minha mão foi em direção ao seu ombro em um tapa.
“Não tem nada de engraçado, okay ? Eu nado desde os cinco anos, sou quase uma profissional!” falei brava, e nada fazia aquele garoto parar de rir.
“Você parece um sapo, ou algo do tipo...” ele disse, já se contraindo pois sabia que eu iria o estapear. E foi o que eu fiz. “HEY, HEY, EU NÃO TENHO CULPA, OKAY?” continuou ele, rindo. Bufei e decidi ignorá-lo, colocando minhas pernas novamente na água e olhando para frente.
“Engraçado não é sinônimo de feio...” veio em minha direção, também colocando os pés dentro da piscina. Continuei a ignorá-lo. “Porque isso seria totalmente impossível...” ele disse mais baixinho, mas eu pude ouvir e virei para encará-lo. Ele parecia envergonhado, já que começou a bagunçar os cabelos freneticamente. “Quero dizer... Nada em você é... Você sabe... Feio...” já não olhava para mim. Brincava com o cordão de seu calção, e eu vi o quão nervoso ele estava. Um sorriso involuntário apareceu no meu rosto. “Nada que você faz... Enfim... Er... Nada.. terminou ele com pressa. ‘Como alguém pode gostar de você? Só algum idiota como o
“Obrigada...” falei tão sem graça quanto e comecei a encarar meus pés desfigurados na água.
?” escutei alguém me chamar de longe, e eu e nos viramos para ver quem era.
“Sim, papai?” respondi John, que estava atrás de uma cerca que separava a piscina do resto do clube.
“Está ficando tarde, acho melhor irmos...” ele disse e eu o obedeci. Me levantei, enrolando a toalha no meu corpo e calçando meu par de chinelos que estava ali perto. Para minha surpresa, se levantou junto, e pegou minha bolsa (um tanto quanto grande, já que minhas roupas e outras coisas estavam lá dentro) e meu case da raquete na espreguiçadeira, e me acompanhou até onde meu pai estava.
“Senhor ...” o cumprimentou com um aperto de mão, e meu pai abriu um sorriso.
“Hey pequeno , como está seu pai?” John perguntou e me lembrei que ele e o pai de eram grandes amigos. Meu pai sempre freqüentava o bar dele.
“Está bem, de vez em quando reclama que o senhor não anda mais indo lá no bar” respondeu e os dois começaram a conversar animadamente sobre o bar, e o pai de , e eu totalmente absorta no assunto. Deixei os dois ali e fui me trocar, colocando minha roupa suada que antes usei para jogar tênis.
“Bom te ver, . Mande um abraço para o velho e diga que amanhã darei uma passada lá!” meu pai deu alguns tapinhas nas costas do garoto e pegou minhas coisas com ele. Eu esqueci totalmente que ele as carregava e que só o case da minha raquete pesava no mínimo dois quilos. “Pode deixar, senhor !” sorriu e meu pai começou a andar na minha frente, me deixando sozinha com o ‘pequeno ’.
Eu ainda estava envergonhada, não olhava diretamente para , e sim para os meus pés. Percebi entao, que o sol finalmente começava a se pôr, deixando o céu em um tom alaranjado, e os mínimos raios que ele ainda lançava, tocavam o rosto de realçando seus olhos de um jeito incrível. “Bom... Até mais então, ...” ele disse com um sorriso lindo.
“Até...” falei distraída, olhando hipnotizada para seus olhos, que estavam ainda mais claros pela luz fraca que batia em seu rosto. Ele sustentou meu olhar, deixando cada vez mais difícil a minha partida. Balancei minha cabeça negativamente e me aproximei mais do garoto. Coloquei as duas mãos em seu ombro e me estiquei na ponta dos meus pés para alcançar sua bochecha, depositando ali um leve beijo. Não sei o que me levou a fazer isso, impulso... Não sei... Só sei que vi suas bochechas ficarem muito vermelhas, e as minhas não estavam diferentes. Olhei para os meus próprios pés, e comecei a mexer com os pés algumas pedrinhas ali no chão.
“Bom... Adeus...” falei baixinho, ainda sem olhar diretamente para .
“A-Adeus...” ele falou finalmente, com dificuldade.
Sorri envergonhada e dei as costas, correndo em direção ao meu pai que estava à alguns metros de distancia.


Capítulo 7.
                                          I can't help falling in love with you


Fui correndo em direção ao jardim da minha casa, passando apressada por entre os arbustos que contornavam o passeio. A saia do meu vestido insistia em voar, e eu segurava inutilmente sua aba para que não mostrasse algo indescente. Abriram os portões assim que eu me aproximei, e eu acenei à Hank, o porteiro, indo finalmente em direção ao Pontiac parado em frente à minha casa. Ben estava encostado na porta onde eu entraria, e sorriu abertamente quando eu me aproximei. Faziam no mínimo, sete dias em que eu não o via, entao a primeira reação que tive foi pular em seu pescoço. retribuiu meu abraço, me tirando alguns centímetros do chão.
No momento em que senti meus pés em terra firme, senti os lábios de Benjamin tocarem os meus, no mesmo tempo em que eu sentia minhas pernas cambalearem. Ele sorriu no meio do beijo e se afastou, acariciando meu rosto.
“Saudades de você, linda...” ele disse num sussurro, analisando cada parte do meu rosto. Não pude deixar de sorrir e dar-lhe um selinho. “Muita saudade...” falei brincando com seus dedos que estavam entrelaçados nos meus.
“Adoro quando você fica assim... Sem jeito” Ben disse com um sorriso no canto da boca, e colocou sua mão em meu queixo me fazendo encará-lo. Sorri envergonhada e senti minhas bochechas estúpidas corarem.
“Vamos?” falei finalmente para acabar com aquele clima embaraçoso. Ben concordou e abriu a porta para que eu entrasse.
“Tenho algo pra você” disse ele após dar partida no carro. Esticou o braço ate os bancos de trás, sem tirar a atenção da rua, e colocou um pedaço de papel em cima do meu colo.
“O que é isso?” perguntei confusa e o sorriso em seu rosto aumentou de tamanho, mostrando todos seus dentes branquíssimos e impecáveis.
“Leia!” Ben disse empolgado e eu tive que rir da cara que ele fez. Voltei meus olhos para o papel em meu colo. Até que meu queixo caiu ao ver as letras impressas ali. Olhei com uma expressão de choque e raiva ao mesmo tempo, e vi o sorriso enorme no rosto de Benjamin, que começou a gargalhar assim que viu meu rosto.
“Sabia que essa seria sua reação!” ele disse tranqüilo em meio de gargalhadas, e tive vontade de estapeá-lo. Só não o fiz por medo dele perder o controle do carro e eu morrer antes de ter ido em um show do Elvis.
“Como você fez isso comigo, Benjamin ?” gritei histérica e esfreguei o panfleto em seu rosto, e ele continuava a gargalhar. “HUH? PARE DE RIR, ISSO NÃO TEM GRAÇA!”
“Na verdade tem sim!” não agüentei, tive que começar a bater naquela cara perfeitamente irritante.
“Eu NUNCA vou participar do Dancing Days! NUNCA! Ilusão da sua mente em pensar que eu participaria! Trate de anular esse contrato pois eu JAMAIS VOU PARTICIPAR DESSE CONCURSO!” continuei a gritar e tinha certeza que eu estava parecendo uma louca. Mas como não ficar? Benjamin simplesmente havia nos inscrito no MAIOR concurso de dança da região. O MAIOR! Quais eram as possibilidade da gente ganhar? E o pior, nem no meu pior pesadelo eu gostaria de me ver dançando em frente a milhares de pessoas! Dançar era algo muito pessoal para mim, poucas pessoas sabiam que eu dançava, nem mesmo minha mãe sabia desse detalhe da minha vida! E se soubesse que eu iria participar de um concurso como esse, eu poderia esquecer toda a minha vida social e pessoal!
“Você vai sim, e eu não vou anular. Você sabe que tem potencial, !” ele disse convicto e tive vontade de socá-lo.
“Que potencial, ? Huh? Eu danço por diversão, nem profissional eu sou!” falei mais calma agora, tentando mostrar argumentos racionais para fazê-lo desistir dessa idéia maluca.
“É por isso que estamos indo ao Block Dancing. Nossa jornada de treinos começa HOJE!” Ben continuou animado, e confesso que sua animação me contagiou um pouco. UM POUCO!

Ben estacionou o carro em frente ao letreiro chamativo da danceteria que eu já começava a me familiarizar. Desceu e rapidamente abriu a porta do carro para que eu saísse. Me deu a mão e fomos correndo em direção à bilheteria cheia de pessoas. estava impacientemente empolgado, já que ficava na ponta dos pés a fim de ver se nossa vez estava chegando. Hora ou outra gritava palavras feias às pessoas que se demoravam em frente à bonita atendente da bilheteria. Após longos e engraçados cinco minutos, nossa vez chegou e Ben comprou rapidamente nossos ingressos, nem ao menos esperando pelo troco.
Ele pegou em minha mão novamente e me arrastou correndo danceteria à frente. Aquelas luzes coloridas invadiam meus olhos e me deixavam intensamente animada. Tanto quanto Benjamin.
O garoto me olhou e gargalhou, voltando a correr em direção à pista de dança. Eu já conhecia algumas pessoas por ali, entao cumprimentei-as ao longo do caminho. Gritei assim que Johnny B. Goode começou a tocar. Dei até alguns pulinhos ridículos. Ben me colocou no ar, me girando por alguns segundos até que me colocou no chão e começamos a dançar um animado Boogie Woogie. [N/a: se imaginem dançando desse jeito, hein garotas! E ignorem a musica do vídeo e se concentrem na musica do Elvis.]
Um circulo foi formado ao nosso redor, e até a vergonha pareceu desaparecer por completo. A dança com certeza supera a sensação que o tênis me proporciona. Ali, naquela pista de dança, tudo parece desaparecer e eu sinceramente me sinto no céu. Não existe luzes, fumaça, ou muito menos pessoas ao nosso redor. É somente eu, Benjamin e nossos pés. E obviamente Elvis Presley para aumentar o calor dentro de mim, dando a motivação necessária para que meus pés se movimentem sozinhos em sincronia perfeita.
Eu deixava Ben me conduzir, e os gritos e aplausos das pessoas era vagamente escudados por mim.
Eu sorria do modo mais empolgado possível, e via Ben gargalhar e fazer caras e bocas enquanto dançava tão perfeitamente.
Eu não me sentia cansada apensar da minha respiração estar falha. Eu poderia ficar dançando pelo resto da minha vida sem reclamar.
Mas infelizmente, a musica foi ficando cada vez mais vaga, até um ponto em que meus pés pararam de sapatear e as pessoas começarem a aplaudir calorosamente. Meu sorriso já era aberto e descarado, e eu apertava a mão de todos que vinham nos cumprimentar.
Joguei meus cabelos para frente e voltei a cabeça ferozmente para traz, de modo que um pouco de vento passasse pela minha nuca e o calor esvaziasse um pouco.
Ben me olhou após as pessoas começarem a ir para seus devidos lugares e nos deixarem sozinhos. Ele sorriu e veio ao meu encontro, me abraçando fortemente. Foi aí que Can’t Help Falling in Love invadiu o local com sua perfeita melodia, me fazendo envolver o pescoço de Ben com meus braços. Nossos pés se movimentavam lentamente, de acordo com os acordes da música calma. Aquela definitivamente era a musica mais perfeita de todo o universo e era a que mais me tocava. Fechei os olhos a fim de digerir cada palavra cantada naquela poesia.
As mãos de Ben envolviam firmemente minha cintura, e seus lábios estavam grudados em meu pescoço.
Desde quando eu escutei aquela musica pela primeira vez, eu senti cada osso do meu corpo se despedaçar e meu coração acelerar descompassado. Após saber cada palavra de cor e salteado, eu cheguei a uma conclusão. É sempre difícil saber quando realmente estamos apaixonados. Nosso coração pode acelerar por muitas pessoas, mas ele apenas bate para uma. Podemos ter milhares de paixões ao longo de nossa existência, mas ter um amor, acontece apenas uma vez. Sua respiração pode ficar falha perto de qualquer pessoa, mas somente uma pode fazê-la parar sua respiração e fazê-la voltar ao mesmo tempo. Saber diferenciar esses e tantos outros critérios de um apaixonado, é difícil.
Entao, eu apenas saberei a diferença entre o amor e a paixão, quando essa musica tocar e eu poder afirmar que sinto cada palavra tocada nela. Então, no segundo em que escutei os primeiros acordes da musica, meu corpo todo ficou estático. Fechei meus olhos e deixei que ela conduzisse meu coração. Inspirei profundamente, enchendo meus pulmões de ar e esperança, esperando para que meu coração quisesse saltar por entre minhas costelas, esperando o ar ser tirado de mim, sentir tudo o que era expresso no que eu ouvia.
Entretanto, me senti surpresa no momento em que nada senti. Nada de pernas cambalearem, nada de tremedeiras ou suadouros, nada de respiração falha ou coração acelerado. Abri meus olhos bruscamente, e sem pensar afastei alguns centímetros de Ben, encarando-o profundamente nos olhos e esperando sentir algo. Eu só podia estar errada, meu cérebro só podia estar pregando alguma peça comigo.
Mas nada aconteceu. Eu continuava indiferente enquanto a musica tocava e Ben começou a me encarar confuso.
“O que aconteceu, ?” ele me perguntou com um tom de preocupação em sua voz. A musica acabou, e Elvis deu lugar à estrondosa voz de Chuck Berry.
“Nada...” falei absorta em pensamentos. “Não aconteceu absolutamente nada...” continuei mais para mim mesma do que para ele. Ben concordou com a cabeça e voltou a me abraçar. O que isso significou afinal? Tudo o que eu sentia – ou achava que sentia – por Benjamin era pura invenção de uma aliança entre meu cérebro e meu coração?


Após alguns longos e torturantes minutos, Ben me levou em direção ao bar e pediu alguns drinks para nós dois. Assim que eles chegaram, o verdadeiro propósito de eu ter saído com ele veio à minha cabeça. Toda a cena da briga com me veio à cabeça, juntamente com a sua frase intrigante.
“Ben, e eu tivemos essa briga...” comecei enquanto ele tomava enormes goles de seu whisky. “Ela estava agindo de modo muito estranho comigo, até que eu perguntei-a o que havia de errado e ela me disse para perguntar a você...” falei distraída, e no final da minha frase, vi Benjamin engasgar com o liquido que tomava. Me levantei bruscamente do banquinho e fiquei muito próxima à ele, dando leves tapinhas em suas costas a fim de ajudá-lo. Aos poucos foi voltando ao normal.
“Você está bem?” perguntei quando suas tosses cessaram. Ben concordou freneticamente com a cabeça e ficou em silencio enquanto eu ainda o encarava a procura de respostas. Arqueei uma sobrancelha quando percebi que nada ele iria responder. “E entao? O que acha?” falei finalmente. “O que eu acho?” ele se virou chocado para mim. “Eu acho que sua amiga é uma louca!” adiantou ele frenético.
“É... Essa é a minha hipótese...” falei distraída. “Mas o jeito como ela me disse para perguntar a você foi muito estranho...” continuei ao mesmo tempo desconfiada e pensativa. Eu não tinha certeza nenhuma de tudo o que estava acontecendo, e tudo começava a ficar cada vez mais confuso e intrigante para mim.
“Err... Acabei de me lembrar, os pais do deram aquelas viagens estranhas e a casa está solitária, entao ele está dando uma daquelas festas... O que acha de irmos?” ele disse do nada, já se levantando do banco estofado. Antes mesmo de escutar o meu ‘sim’, ele já me arrastava pelo salão, indo em direção à saída.

Devo dizer que o trajeto até a casa do , que era do outro lado da cidade, foi um tanto quanto tensa. Talvez fosse só coisa da minha cabeça, e após a briga com eu havia ficado paranóica, maluca ou algo do tipo. Primeiro, as estranhas sensações perto de . Segundo, escuto a música-trilha-sonora da minha vida com o suposto-homem-da-minha-vida e nada sinto. Terceiro, após comentar sobre a tal briga-causadora-da-minha-insanidade, meu namorado começa a agir um tanto quanto estranho. Sacudi minha cabeça, tentando espantas aqueles pensamentos fantasmas da minha mente. Respirei fundo e vi que Ben me observava pelo canto do olho.
Comecei a encarar a rua cintilante à nossa frente, até que reconheci a rua dos e o típico movimento em frente à sua casa. O carro foi parando devagar, e Ben estacionou o Pontiac entre dois outros carros. Como de costume, ele veio em minha direção e abriu a porta para mim, pegando em minha mão e me conduzindo até à casa gigante do . Ben não soltou minha mão nem por um segundo enquanto costurávamos o amontoado de gente dentro do que antes era a sala de estar da casa. Sabíamos exatamente aonde os outros estaríamos, na piscina, e foi para lá que fomos.
Avistei de longe, entao soltei-me da mão de e fui correndo em direção à minha amiga.
“Eu não senti...” falei baixo perto de seu ouvido, enquanto nos abraçávamos.
“O que??” me perguntou confusa e eu respirei profundamente.
“Escutei Can’t Help abraçada com Ben e não senti!” disse um pouco mais desesperada, e tinha certeza que minha amiga entenderia o que eu queria dizer.
Ela afastou-se de mim, segurando meus ombros em suas mãos. Possuía uma expressão de choque em seu rosto.
“Mas... , isso me deixa confusa! Eu tinha certeza que você e Ben eram algo como almas gêmeas!” disse absorta em pensamentos, enquanto eu também tentava pensar em algo racional para explicar tudo aquilo. “Mas você não devia se desesperar por isso, quero dizer, é só uma musica, !”
, você sabe que não é só uma musica!” rebati. Ela sabia que era verdade. Aquilo era poesia cantada, a expressão de um amor puro e verdadeiro, e o que eu mais ansiava era sentir tudo aquilo descrito na musica. Todos meus amigos sabiam disso. olhou para os próprios pés e sacudiu a cabeça.
Vi se aproximar e pendurar-se em cima de mim.
“O que está havendo?” ele disse animado, alternando o olhar entre e eu.
não sentiu nada com Ben enquanto escutava Can’t Help...” disse fazendo uma cara de reprovação. me fitou assustado.
“Mas eu jurava que vocês eram almas gêmeas!” ele disse chocado, me fazendo bufar e rolar os olhos. “Calma , você ainda vai achar alguém perfeito como o Elvis...” me deu um beijo na testa e começou a me arrastar por entre as pessoas, até chegarmos onde todos os outros da turma estavam.
pulou no meu pescoço assim como havia feito, depois veio em minha direção e também me deu um abraço. Olhei para .
“Hey...” cumprimentei-o sem jeito e o vi abrir um sorriso no canto de seu rosto.
“Hey...” ele respondeu.
“Eu tenho algum tipo de doença contagiosa?” ele me olhou confuso. “Porque todos os outros me abraçam, e você nunca me deu um abraço se quer, em todos esses anos de amizade?” indaguei-o curiosa. Sempre me senti incomodada por esse fato. Quero dizer, é tão meu amigo quanto , e esse sempre me dá abraços de quebrar todos os ossos. Vi abrir e fechar a boda em procura de palavras par se expliquei. Gargalhei e resolvi tomar uma atitude. Abracei-o. Mas desejei não ter o feito.
Me senti zonza ao sentir seu perfume instalar em minhas narinas. Era um perfume tão doce e sedutor ao mesmo tempo. hesitou por alguns instantes antes de envolver minha cintura com seus braços. Devo admitir que o contato de suas mãos com minha pele forrada pelo tecido de cetim fez cada pelo do meu corpo arrepiar. Foi uma sensação única e inédita, já que aquela era a primeira vez em seis anos, que eu e nos abraçávamos. Senti seu queiro pousar em meu ombro lentamente, como se ele tentasse de algum modo disfarçar. Senti também seu nariz chegar bem perto do meu pescoço e respirar profundamente, me fazendo contrair um pouco já que o ato me fez arrepiar mais ainda.
De alguma maneira muito, mas muito estranha, meu coração batia de forma descompassada e acelerada, e esse fato me deixou um tanto quanto incomodada, me fazendo afastar automaticamente de . E assim que o fiz, pude ver a imagem de à alguns metros de nós, com os braços cruzados e sobrancelhas arqueadas. O sorriso cínico em seu rosto fez meu estomago revirar. Balancei a cabeça de forma negativa e sentei ao lado de em uma das milhares mesas espalhadas ao redor da piscina. foi buscar uma batida de morango para mim, enquanto eu tentava inutilmente me focar no assunto dos meninos ali.
Olhei de relance para e vi que ele me encarava, mas que desviou o olhar no momento em que percebi. Sorri involuntariamente com isso. ‘Como alguém pode gostar de você? Só algum idiota como o ’.
“Err, , posso conversar com você um instante?” me levantei da cadeira e esperei que também se levantasse. E ele o fez.
“Claro...” disse ele me acompanhado. Fui andando até um lugar mais calmo, de preferência sem barulho. Fomos até o enorme campo de futebol que tinha ali, e nos sentamos no morrinho que era como uma descida até o campo.
Me contraí um pouco quando senti um vendo gélido passar por nós, e abracei meus joelhos a fim de me proteger do frio, já que eu estava com um vestido tomara-que-caia. Vi tirar seu casaco branco e colocar sobre mim, então sorri em agradecimento.

“Você não acha estranho nós nos conhecermos a tanto tempo e nunca termos nos abraçado?” comecei a falar distraída, olhando para as milhares de luzes espalhadas pela cidade que podiam ser vistas ali de cima. Escutei um riso abafado sair da boca de .
“Eu e você nunca fomos os melhores amigos da turma, ...” ele disse, também encarando a cidade abaixo de nós.
“E daí? Eu e também não somos melhores amigos e ele sempre me abraça” contestei, encarando-o finalmente e arrancando um riso de novamente.
“Entao não sei por que...” ele disse vagamente e virando para me encarar. Mergulhei em seus olhos e pude perceber o quão profundo e secretos eles eram. Sustentei o olhar a fim de tentar lê-los de alguma forma, eu morria de curiosidade para poder decifrá-lo, sempre foi alguém tão misterioso e calado, você nunca poderia saber o que ele sentia ou pensava, a não ser que ele contasse a você. E eu não era sua confidente preferida. As únicas vezes em que conversamos é quando estamos bêbados. E mesmo assim são algumas trocas mínimas de palavras absortas e... Bêbadas.
“E ai... Está saindo com alguma pessoa?” tentei parecer o mais casual possível, sem sucesso obviamente, já que me encarava com um pequeno sorriso no rosto, mas eu não ousava olhá-lo.
“Então agora nos tornaremos amigos? Isso tudo por um abraço, ?” ele disse irônico tentando inutilmente abafar o riso. Senti minhas bochechas ferverem, e estava começando a me irritar com elas.
“Não, é só que... Você sabe, e-eu...”
“Estou brincando, me interrompeu, rindo freneticamente, me fazendo ficar ainda mais envergonhada. “Não, eu não estou saindo com ninguém... Quem eu quero é meio... você sabe, fora do meu alcance” ele disse, olhando para o mesmo lugar que eu. Soltei um som quase inaudível com minha boca. ‘Só algum idiota como o ’...
“Oh... E quem é essa garota? Pode me dizer, talvez eu possa ajudar...” falei fracamente, incerta de cada palavra que dizia. Voltou a me encarar.
“Você não pode me ajudar...” disse num sussurro, me olhando tão profundamente que se eu estivesse em pé, provavelmente cairia.
?” escutei vagamente alguém chamar por mim em algum lugar do espaço. Era apenas um eco atrás de mim...
!” parecia que também não escutava, ou ignorava o chamado assim como eu.
Até que o borrão de alguém foi formado do meu lado, e o mesmo tocou em meu ombro, me fazendo acordar daquela realidade louca e totalmente paralela.
“Sim?” falei meio alheia, virando-me para encarar a pessoa.
“Querem que a gente dance...” vi Ben sorrir para mim e tudo começou a ficar mais claro e menos confuso. Esticou a mão para mim.
“Oh, claro...” agarrei sua mão, e entao ele me ajudou a levantar.
” Ben cumprimentou com um aceno de cabeça e percebi a expressão tranqüila de se transformar em uma totalmente repreensiva. me puxou pela mão para longe dali, mas eu não conseguia parar de olhar para trás, onde ainda jazia sentado no morro de grama e aos poucos, sua figura ia ficando desfigurada à medida que Ben me conduzia por entre as dezenas de pessoas. Entramos dentro da casa dos , e fomos em direção à sala que agora servia de pista de dança. Ben andava com todo aquele jeito popular [n/a:imaginem como o John Travolta andava todo convencido em Grease], acenando para todos a sua frente. Até que, assim como no Block Dancing, fizeram um circulo entre nós, no mesmo tempo que um Jive começava a tocar todos começavam a bater palmas. Não sei como todos ficaram sabendo das minhas habilidades dançantes. Eu particularmente não queria que ninguém soubesse, mas era tarde demais para fugir agora.
Sorri meio tímida, e pude ver as caras animadas de , , e , que batiam palmas empolgadíssimos e gritavam pelo meu nome. Ben pegou minha mão, fez uma referencia para a ‘platéia’ e começamos a dançar. [Se imaginem como o casal de branco :)]
E como sempre, o mundo desabou aos meus pés, e naquele momento tudo foi esquecido. A dança era uma terapia, um relaxamento. Melhor que massagens ou qualquer psicólogo estúpido. Ben me rodava, me fazendo ver os rostos das pessoas como borrões apenas. Eu não podia deixar de gargalhar e gritar para as pessoas que pareciam tão animadas quanto eu. Eu sapateava meus pés e fazia minha saia rodar de forma graciosa. Olhei para e mandei um beijo no ar, e minha amiga pulava toda histérica. segurava em sua cintura e fazia caras e bocas quando eu olhava para ele. e tentavam dançar como nós, arrancando risadas dos que estavam ali perto. Até mesmo estava ali, me olhando e gargalhando a medida que eu também o fazia.
Eu e Ben até arriscamos novos passos, o que levava todos ali ao delírio.
E depois de longos e suados minutos, a musica acabou a ponto de eu poder escutar a salva de palmas de cada pessoa ali no recinto. Exceto de uma: .

’s POV

Ela era extraordinariamente graciosa. Desde o modo como andava a partir do momento que Benjamin a tirou de mim até os movimentos de seus pés a cada passo seu na dança. Eu sabia que ela amava dançar, mas nunca contava a ninguém. Aquele sorriso que ela dava enquanto dançava, era um que ela jamais abrira em qualquer outra situação. gargalhava de modo tão contagiante que me fazia rir juntamente.
Sua saia rodava, deixando a mostra o short preto por baixo de seu vestido. Seus cabelos presos em um coque começavam a afrouxar e cair sobre seus olhos.
Eu via também que Benjamin se quer olhava para ela. Estava afim de ver os rostos das garotas e demais idolatrando-o e nada mais. Mas o que ele não sabia era que tinha todas as atenções. Que ela era a perfeição e objeto de adoração ali, e não ele.
ofuscava toda e qualquer pessoa daquele recinto, e isso era fato.
Entao a musica acabou e a vi soltar os cabelos e jogá-los para frente e para trás, cumprimentando as pessoas que chegavam para elogiá-la. Ela conseguiu mais fama dançando em um dia do que eu e os caras que cantamos há quase um ano.
Mas vi também que ela olhava para mim. Para mim, e eu não pude conter um sorriso besta se formar nos meus lábios, assim como nos dela.
As pessoas começaram a se espalhar, e Benjamin arrastou-a para fora do salão, indo em direção à piscina. Fui até e nós também fomos até lá.
“Você é demais, !” gritou abraçando a garota e tirando-a centímetros do chão enquanto ela gritava e se debatia.
“Minha amiga é uma estrela!” a abraçou histérica assim que a soltou. Ela sorria e agradecia a cada um, respondendo perguntas do tipo ‘Desde quando você dança assim?’
Sentei-me em uma mesa ali perto, vendo todos virem logo em seguida também.
Conversávamos animadamente sobre o espetáculo que havia dado enquanto sentíamos o poder do álcool agir sobre nós. Agir muito em mim, particularmente. Eu já havia bebido no mínimo, uns dez engradados de cerveja sozinho. Um orgulho.
Afrouxei dois botões da minha camisa, vendo olhar disfarçadamente para mim. Para a má sorte dela, eu sigo seus olhos a cada movimento que eles dão. A vi corar, coisa que acho encantadora.

De repente vi sua imagem sumir, já que alguém sentou-se no meu colo e envolveu seus braços em meu pescoço. Provavelmente era uma das varias meninas que eu havia beijado aquela noite, mas levei um susto imenso quando vi os cabelos de caírem sobre meu rosto.
??” perguntei surpreso, vendo-a dar uma gargalhada, chamando a atenção de todos ali na mesa. Literalmente.
“Hey ” ela disse de um modo sensual, bem perto do meu rosto. Engoli seco.
Vi e se entreolharem e sem querer meus olhos passaram por . Minhas mãos começaram a tremer quando vi sua expressão confusa e raivosa ao mesmo tempo. Entao olhei para Ben e . Ela me olhava indignada e eu pude ver a decepção em seus olhos. Mas havia algo mais. Provavelmente era coisa da minha cabeça, apenas imaginação. Mas podia jurar que vi algumas faíscas de ciúme.
Tentei inutilmente tirar do meu colo, e foi ai que empurrou bruscamente sua cadeira e saiu dali pisando fundo. Tentei tirar os braços de sobre meu pescoço, mas ela parecia estar grudada em mim.
Vi balançar sua cabeça com uma feição decepcionada. Encarei-a por alguns instantes, mas ela recusou a sustentar nosso olhar. Saiu da mesa e seguiu os passos de , provavelmente indo procurar o amigo.
!” gritei-a mas ela fingiu não escutar e apressou seus passos. “, com licença por favor?” falei um pouco grosso, mas a garota apenas gargalhou e aproximou seus lábios até minha orelha.
“Hora de esquecer essa burguesa mimada, ...” ela sussurrou em meu ouvido, me fazendo parar com todas as minhas tentativas de tirá-la do meu colo.
Então foi a vez de Benjamin. Ele teve a mesma reação que , empurrou fortemente a cadeira e foi pelo mesmo caminho percorrido por .
“Ela tem o Ben, não precisa de você...” sussurrou novamente, depositando um leve e quente beijo em minha orelha.
Talvez já passasse da hora de seguir os conselhos de sobre esquecer a ... Tudo aquilo acabava sendo dolorido demais para mim, e eu estava cansado daquela dor.


Capítulo 8.
                                          Make the world go away, get it off my shoulder


A partir do momento em que vi sentar no colo de , senti minha respiração se prender sem que eu mandasse. Assim como todos sentados ali na mesa. Quero dizer, desde quando os dois são tão íntimos assim? Vi Ben fechar o pulso sobre a cadeira, mas eu tive a impressão de que não era para eu ter visto, entao ele procurou disfarçar.
A vi aproximar-se do ouvido de e sussurrar algo que não pude escutar, enquanto via me lançar olhares tão confusos quanto os meus. Foi aí que voltei minha atenção à , que comprimia fortemente um lábio contra o outro em uma expressão de raiva. Muita raiva. Entao ele se levantou bruscamente e começou a correr contra a multidão concentrada ali. Meus olhares voltaram para , que me devolveu um totalmente confuso, e tive impressão, uma leve impressão, de que ele não sabia realmente o que estava acontecendo. Balancei minha cabeça negativamente e fui atrás do meu amigo.

O vi no morro de grama do campo de futebol, onde mais cedo eu havia conversado com . Ele estava escorado na parede, com as mãos apoiadas nos joelhos e ele fungava. estava chorando.
Não disse uma palavra, apenas me aproximei e envolvi seus ombros com um de meus braços.
Seus olhos subiram de encontro aos meus e eles estavam vermelhos e inchados. Algo apertou meu coração com força e um espírito protetor se apossou de mim, me fazendo abraçar com mais força, como se aquilo fosse acabar com sua dor.
“Como pode fazer isso comigo, ?” ele disse com a voz tremula mas cheia de raiva. Abri e fechei a boca a procura de respostas, mas a verdade era que eu também não sabia como ele poderia fazer isso com um de seus melhores amigos. Chegava a ser desumano. Mas eu tinha que dizer algo. Era o meu papel, como amiga, dizer palavras para tentar amenizar sua dor.
"Talvez não seja nada demais! Eles são apenas amigos, assim como eu e você!" eu falei num tom meio animado, tentando ME convenser de que aquilo realmente não era nada demais.
"Eles estavam muito intimos para eu acreditar que são apenas amigos!" disse com certa agressividade, voltando a encarar os pés. EU não sabia mais o que fazer ou falar, porque não havia o que dizer! Eu me recusava a acreditar no fato de que e estaríam juntos, apesar disso não ser da minha conta. Porque eu estava me importando, afinal?
"Bom, preciso ir, ..." olhei para meu relógio, que marcavam meia noite, e Ben e Marry combinaram que eu estaria em casa às dez. Eu nunca obedecia de qualquer forma. me olhou apreensivo e apenas concordou levemente com a cabeça, voltando a encarar os sapatos muito bem lustrados. Dei um leve aperto em seu ombro antes de voltar para a área da piscina, e para minha descrença, dar de cara com Benjamin.
", posso te levar até sua casa? Quero dizer, eu tenho que te levar até em casa..." ele deu um leve sorriso maroto e eu neguei com a cabeça e apertei meu cenho com uma mão, esforçando para encontrar alguma desculpa que me livrasse de sua encantadora companhia. Eu não estava entendendo, mas eu não queria sua carona de alguma forma. Eu simplesmente queria... Ficar sozinha, espairecer minhas ideias tão confusas naquele momento.
"Acho melhor não, Ben... Quero dizer, sem querer eu acabei ligando do telefone do para o Jeff e ele está vindo me buscar..." menti descaradamente, tentando me livrar de qualquer maneira do meu namorado. Meu namorado... Que tipo de namorado eu era? A do pior, disso eu tinha certeza. Ben me olhou um tanto quanto disconfiado e hesitante, mas vi sua testa relaxar após um tempo me observando.
"Tem certeza?" ele insistiu e eu concordei um pouco alheia. "Certo. Deixe-me esperar pelo motorista então..." continou com a insistencia. Qual era agora? Mania de perseguição?
"Fique tranqüilo Ben. Minha mãe não vai saber disso..." sorri gentilmente e em segundos, senti o corpo do garoto se colar ao meu, suas maos envolveram meu rosto e levou-o involuntariamente até o seu. Ben me beijou, e eu fiz o maximo que pude, sem motivos, para afastarmos um do outro. Tudo naquele relacionamento havia se tornado tão... indiferentemente normal e ordinário. Nada do que eu sempre li nos meus românces favoritos, nada do que sempre almejei sentir... Ou foi tudo ilusão, ou algo dentro de mim insistia em dizer que nem tudo estava perdido.
Sorri vagamente e dei às costas ao homem mais lindo e perfeito que eu já havia visto na vida. Apertei meus braços contra mim mesma no momento em que senti uma corrente de vento passar por mim, e apertei meu passo para poder chegar logo na saída da casa imensa de .

Finalmente, depois de ser esmagada dezenas de vezes, passei pela porta de entrada e dei de cara com um enorme jardim à minha frente. Foi aí que o desespero bateu em minha porta, pois me realizei de que não havia chamado Jeff coisa nenhuma e que não havia uma alma caridosa se quer para me resgatar dali. Se fosse um pouco menos tarde, e se minha casa não fosse do outro lado de Bolton, eu iria com meus próprios pés.
Bufei impaciente com a minha estupidez e fui em direção aos balanços das irmãzinhas mais novas do , pensando em como eu saíria dessa confusão que eu mesma havia criado. Consequentemente, passei a ocupar minha mente com as cenas vistas há poucos instantes atrás, e para minha surpresa, uma onde de sentimentos inusitantes começou a percorrer meu corpo e fez meus olhos se fecharem fortemente em um gesto de raiva. Raiva?

"Posso me sentar aqui?" uma voz muito familiar soou ali do meu lado e eu não preciser abrir meus olhos para saber quem era. Era ele. Apenas concordei com a cabeça, ainda de olhos fechados por alguma razão... Talvez me proteger do garoto ali do meu lado.
Não respondi coisa alguma, mas ainda sim o menino se sentou no balanço ao meu lado e nos balançávamos de mondo totalmente desordenado: eu para frente enquanto ele ia para trás. Silêncio. Constragedor.
"Nós não temos nada..." a voz de soou do nada, me fazendo acordar do drama profundo que aflorava em minha mente.
"O que disse?" perguntei confusa, sem entender aonde queria chegar. O vi desviar seu olhar para a rua à nossa frente, enquanto eu fitava seu rosto indefectível.
"Eu e ... Nós não temos nada..." ele continuou sem me encarar, e os tormentos que antes rondavam meus pensamentos voltaram. Porque diabos ele estava dizendo aquilo? Por um acaso eu havia lhe perguntado? Ou tinha cara de que queria saber sobre sua fantástica vida amorosa?
"Hm..." jorrei um som qualquer da minha garganta, com a finalidade de mostrar que eu não importava com o assunto. Eu realmente não importava. Não mesmo, que ele casasse com a , tivesse filhos feios e vesgos e fosse feliz para sempre. "Porque está me dizendo isso?" não resisti.
"Só achei que você gostaria de saber..." ele respondeu hesitante e dando de ombros. E pelos calções furados de Merlin, por que raios eu gostaria de saber?
"Não gostaria" simplifiquei minha inquietude. Mais silêncio. Constrangedor novamente, acrescento.
"É que..."
", você não me deve explicações. É sua patética vida amorosa, eu já tenho a minha para preocupar, agradeço" atinge seu limite de grosseria, Marry ficaria orgulhosa. Vi concordar silênciosamente ao meu lado, enquanto continuávamos a nos balançar. Dois patéticos.
"Droga, quero ir embora desse lugar" exclamei minha insatisfação um pouco alto demais, já que fiz desencostar a cabeça das correntes e me encarar.
"O Pontiac do seu namorado está ali..." ele apontou com a cabeça em direção à calçada e então pude ver o reluzente e bem ilustrado carro.
"Não quero ir embora com ele" bufei impaciente. Eu estava me saindo a pessoa mais irritante e insuportável do mundo, me assustava o fato de ver ali ainda.
"Vá com então..." ele sugeriu absorto, remexendo na grama abaixo de nossos pés.
"Ela provavelmente está em algum canto com o , não vai querer ir embora agora..." novamente concordou silêncioso, mas hesitante. "Bom... Eu... Sabe, eu posso... Se você quiser é claro... Eu..."
"Me levar?" adiantei-me animada, e totalmente oferecida. Eu estava burlando todas as normas de etiqueta e de como ser uma mocinha educada e respeitável.
"É..." me pareceu tímido e tive uma vontade inusitada de apertar suas bochechas. Patética. é o ser mais patético de toda a via Láctea.
"YAY, vamos nessa!" saltei inusitavelmente do balanço e uma alegria tão surpreendentemente nova me dominava. Ouvi soltar um riso abafado atrás de mim, mas vindo em minha direção logo em seguida e andando lado a lado comigo. "Então, onde está seu carro?" perguntei, procurando curiosa pelo carro do , não vendo a hora de tirar aquelas horriveis sapatilhas que iriam me causar joanetes um dia.
"Err... Na verdade eu estou de moto..." bagunçou os cabelos nervoso e automaticamente meus olhos se arregalaram.
"Mo-moto? Você quer dizer aquele veículo de duas rodas e sem proteções nas laterais?" eu me ridicularizei novamente. Mas dessa vez era o meu inconsciente falando mais alto. Continueu gaguejando e dando características à uma moto, gaguejando e agindo como completa idiota. Sabia que ria por dentro do meu ato de desespero. Não tenho culpa se motocicletas não me atraem por serem o símbolo do perígo. "Nã-não acho uma bo-boa ídeia, ..." fui me afastando da moto enquanto se aproximava dela com um sorriso um tanto quanto maléfico e se sentou no banco de couro e cruzou seus braços em uma pose que prefiro tirar da minha mente.
"Vamos lá, . Você acha que eu vou deixar algo te acontecer?" ele disse todo confiante e assustei quando uma onde de calma passou por mim. Hestei alguns instantes mais, pensando no que poderia acontecer se eu subisse naquela moto. Uma delas era certa, eu morreria. E Marry daria um jeito de me ressucitar para poder me matar novamente.
"O-okay" me rendi e esperei para que ele me desse um capacete. Peguei um vermelho que prendia-se no queixo e colocou um outro. O vi sorrir abertamente mas eu não estava assim tão feliz. Até mesmo de conversível eu tenho medo de andar. Tenho medo de poder voar dali para o asfalto, e esse fato não é muito convidativo. passou uma perna para o outro lado da moto, posicionando-se para dirigir, e me olhou, esperando para que eu fosse. Suspirei pesadamente e bufei por ver que eu não tinha outra escolha.

Lembrei-me dessa paixão de por motos subitamente. Lembro de quando ele ganhou sua primeira bicicleta motorizada aos quatorze anos e todos os meninos da turma ficaram doidos para aprender a pilotar com o senhor , pai de .
Então fui em direção a moto com as pernas bambeando e meu coração palpitando a mil. Isso não daria certo. Era uma péssima idéia, mas eram quase onze da noite e eu não tinha muitas opções, e minha mae provavelmente estava tendo ataques, se já não tiver ligado para a polícia. Então passei uma perna de cada lado da moto assim como , tendo cuidado com a saia do meu vestido. Friso que meu corpo ao se chocar com o de , por alguma razão inusitada, fez meu coração dobrar seus batimentos. Estranho. Bizarro.
"Pronta?" ele disse em meio de um risinho. Muito engraçado. Ele estava adorando toda essa cituação embarassosa, eu tinha certeza.
"Se você correr, eu te estrangulo, entendeu bem?" falei séria, olhando-o pelo retrovisor e apontando meu dedo indicador mostrando que eu realmente o faria. soltou outra risada e deu partida na moto, me fazendo soltar um grito assim que escutei-a ranger, dando mais motivos para poder gargalhar. "CUIDADO!" gritei e dei um tapa em seu ombro.
", RELAXA!" gritou de volta e então senti o vento forte bagunçar meus cabelos. Agarrei ferozmente nos apoios atrás de mim e fechei os olhos fortemente, na tentativa de fazer tudo desaparecer (inclusive a moto estúpida) e minha casa se materializar em algum lugar qualquer da rua.

Enquanto eu observava as casas e árvores passarem por nós rapidamente como se fossem borrões, senti meu corpo ser jogado para frente bruscamente, e quando olhei para frente desesperada, vi que havia freado em frente ao semáforo. E automaticamente, em um ato de desespero, envolvi o corpo de com minhas mãos, diminuindo a pouca distância que nos separava. Senti o corpo do garoto se enrigecer de uma forma tensa, e foi aí que reparei no que eu estava literalmente agarrada à .
Soltei-o imediatamente, e uma vergonha insana tomou conta de mim. Se eu fosse doida o suficiente ou pelo menos um pouco bêbada, eu pularia daquela moto e sairía correndo para lugar nenhum. Uma pessoa sensata faria isso. Percebi que o garoto à minha frente lançava olhares tão envergonhados quanto os meus pelo retrovisor frontal. Eu... Agarrei... o . Eu o agarrei! Deus!
Mas... Eu gostei. EU GOSTEI? Oh meu santo Deus, me diga o que acontece comigo.Tudo ficava gada vez mais sobrio e... confuso à medida que eu passava o tempo com .
O sinal finalmente ficou verde, então ele engatou novamente e começamos a vagar pela White River Street, onde localizavam-se os mais luxuosos condomínios de Bolton. pigarreou.

"Acho que.. você devia ficar daquele jeito... Você sabe... É mais seguro..." ele disse nervoso e gaguejando. Soltei um pigarro. "Se você quiser... Ficar mais segura, eu digo, claro..." ele deu de ombros.
"Eu quero... Vo-você sabe, eu tenho medo..." falei no mesmo tom de nervosismo. Não sei por que diabos isso saiu da minha boca, essa impulsividade não combinava comigo, mas simplesmente me deixei ser levada pelo momento. O que poderia acontecer, afinal?
Então com as mãos trêmumas envolvi meus braços na cintura de novamente. Ele contraiu-se como antes, mas com o passar dos milésimos senti seu corpo relaxar. Meus ombros encostavam leve e suavemente nos braços definidos do garoto, e agora posso dizer do que gostei. O toque da pele macia de com a minha me fazia sentir coisas tão esquisitas e boas ao mesmo milésimo de segundo. Sentir o cheiro vindo de seu pescoço e minha mão tocando sua barriga, faziam meu estômago revirar a ponto de eu não conseguir explicar nada mais. Por um mísero segundo, vi meu medo ir embora e o mundo se resumir a mim, e aquela moto barulhenta.
O vi sorrir pelo retrovisor, e eu não deixei de fazer o mesmo. Impulsivamente, encostei meu queixo em seu ombro enquanto ainda sentia o vento bagunçar meu cabelo e algumas vezes o fazer espalhar por todo meu rosto.
Minha saia essvoaçava com a brisa forte e a única coisa que nos iluminava eram as luzes pregadas nos postes. se virou um pouco, fazendo com que nossos rostos ficassem perigosamente proximos a ponto de eu sentir sua respiração. Ou talvez era o vento.

"Você está bem?" ele disse em um tom alto para que eu pudesse escutar, já que o vento era um grande ruído entre nós.
"Estou!" gritei de volta, fazendo-o sorrir abertamente e voltar sua atenção na rua deserta. Não nego que o medo ainda tomava conta de mim, mas não completamente. Abraçando , as coisas mudaram. Quem sabe ele não passava segurança por telepatia?
Lentamente, senti a moto diminuir a velocidade e de longe pude ver os grandes portões de bronze da casa dos .
"Está entregue..." disse quando paramos totalmente. Retirou seu capacete e então pude ver seus cabelos bagunçados completamente.
Admito que nunca havia reparado na beleza de antes, e eu estava estática por reparar agora. Ele ainda tinha um sorriso maroto no rosto, o que estava me deixando hipnotizada. Ele desceu da moto e me estendeu uma mão para que eu pudesse descer. Mas eu não o fiz, e como uma retardada, continuei a encará-lo até ver suas bochechas coraem levemente e seus cabelos caiam suavemente em seus olhos.
"Não vai entrar?" ele me despertou do pequeno tranze e eu balancei a cabeça abobada.
"Oh, claro..." respondi vagamente. Olhei para a pequena torre ao lado do portãoe acenei ao porteiro, então as barras de bronze foram abertas. Meu desejo profundo e mais obscuro era de ficar ali, mas algo me dizia que o certo e sensato seria entrar.
sustentou meu oilhar e tive a impressão, de que por um segundo, nós dois tentávamos decifrar o pensamento um do outro. Balancei a cabeça, tentando ficar em sã consciencia e pensar claramente.

Me aproximei do garoto estático e coloquei suavemente minha mão em seu ombro, mas dessa vez ele não se contraiu. Eu ainda estava mortificada em seus olhos, mas tive o impulso de me aproximar de seu rosto e depositar um leve beijo em sua bochecha. Foi tão suave a ponto de fazer fechar os olhos. Inspirei o cheiro doce que vinha de seu pescoço, a fim de guardar aquela fragrância tão apaixonante na minha memória.
"É melhor eu ir..." sussurrei e me afastei, mas percebi que mantinha os olhos fechados e demorou dez segundos até que ele os abriu novamente para me enncarar.
Balançou a cabeça lentamente mas não tive certeza sobre sua concordância. Então me afastei e no mesmo segundo escutei uma voz estridente gritar pelo meu nome. Mas eram apenas ecos, como da última vez em que eu estava sozinha com ele.
", ENTRE JÁ EM CASA!" escutei novamente a voz irritada e irritante, e quando olhei para trás, o encanto se quebrou assim que vi a figura de Marry à alguns metros.
"Oh, droga!" demonstrei meu desespero e vi o sorriso lindo de se abrir. Eu estava oficialmente ferrada. Podia ver a fúria de minha mãe de longe! Mais castigos estavam por vir.
"Vá. Não quero lhe causar nenhum problema..." disse num tom meigo. Sorri abertamente e então dei às costas e corri mansão adentro. Marry tinha as mãos na cintura e uma visível feição irritada que me fez tremer de cima à baixo. Eu estava cansada disso, dessas punições e manias de me tratar como criança. Eu faria 17 anos e era totalmente responsável sobre meus atos, minha tolerância sobre essa proteção exagerada de Marry estava se esgotando aos poucos, e quando ela atingisse seu limite, as coisas ficariam feias.
"O que significa isso?" ela disse entre dentes assim que atingi a varanda de entrada.
"Eu chegando em casa?" fui cínica e a expressão de raiva no rosto de minha mãe aumentou.
"Chegando em casa com um garoto que não é seu namorado! O que você tem na cabeça?" ela rosnou, apontando o dedo indicador em meu rosto. Bufei impaciente e me preparei para o discurso moralista, totalmente ensaiado. "E afinal, quem era aquele?" Marry perguntou desafiadora, com um desgosto em seu rosto.
"Aquele era , mãe!" irritou-me ainda mais o modo como ela se referiu à ele. Meu rosto provavelmente estava vermelho, tanto era o acumulo de raiva em mim.
"? Família ? Aquele filho do dono daquela espelunca chamada de bar? Como tem coragem de andar com um elemento como aquele? E ainda descer da moto dele? Da moto!"
"Ele é meu amigo mãe! E eu tenho muita coragem de andar com ele, pois ele é um ÓTIMO garoto, para a sua informação!" minha ira já percorria cada veia do meu corpo e ela estava prestes a desencadear de mim.
"Ótima desculpa, ! Você acha que os vizinhos vão achar que ele é seu amigo?" Marry continuou, agora gesticulando ferozmente com as mãos.
"O que os vizinhos tem a ver com a minha vida?" comecei a me irritar e meu tom de voz concequentemente se elevou.
"Você tem uma moral a cuidar, ! Um nome a proteger! Eu não vou deixar que você acabe com a reputação dessa família como voce vem fazendo!" minha mãe estava me irritando profundamente! Ela precisava acordar, precisava ver que o mundo estava mudando, que os costumes estavam mudando! Estávamos quase indo para os anos 60, tudo estava mudando, e ela continuava antiquada!
"Essa é minha vida! Não vou deixar que ninguém a viva por mim, nem você, nem os vizinhos!" gritei a enfrentando, dando as costas à minha própria mãe. Não há algo mais frustrante do que ter que se preocupar com o que os cidadãos sem-ter-o-que-fazer dessa cidade pensam de mim ou do que eu faço! Entretanto, senti as mãos frias de Marry puxando meu braço com força. Soltei um gemido.

"Essa não é a sua vida. Você tem uma mãe que não vai permitir que você destrua sua família" ela disse firme e friamente, do modo mais ameaçador e amedrontador possível. Sustentamos um olhar assassino uma para a outra, a qualquer instante eu poderia explodí-la com meu pensamento e vice-versa. Soltei meu braço bruscamente e corri até chegar na escada e desaparecer da vista da pessoa que eu chamava de 'mãe'. Andei a passos pesados e com os olhos embaçados por lágrimas até chegar em uma das últimas portas do corredor. Entrei em mu quarto, batendo a porta fortemente e jogando-me na cama de viúvo. Minha própria mãe pensava que eu era uma ameaça à família! Porque insistir nessa hisória de que a vida é uma reputação? Reputação não era nada, apenas uma máscara usada por burgueses hipócritas fingirem o que não eram ser!
Eu simplesmente me recusava a me comportar dessa maneira. Eu jamais seria como um deles. Eu jamais me tornaria uma mulher como Marry. Meu pai era como eu, mas nunca entendi o porquê de ele nunca enfrentar a fúria de sua esposa. Ele sempre dissera que na vida nós precisávamos de eqüilibrio e saber suportar certos incidentes. Mas tudo tinha seu limite, e Marry estava ultrapassando todos! Deixei minha raiva cair em lágrimsa, e nunca desejei tanto fugir dali. Vesti uma camisola qualquer e tornei a me jogar na cama, afundando fortemente meu rosto no travesseiro.
Subitamente, escutei algo bater em minha janela, mas resolvi ignorar o barulho, era provavelmente o vento. Entretanto, o barulho tornou a invadir meus ouvidos, então percebi que uma pedra havia atravessado minha janela.

", QUE BARULHO É ESSE?" escutei minha mãe gritar do lado de fora do quarto. Me desesperei e tratei de me levantar da cama, andando de um lado para o outro, procurando uma desculpa.
"É... Foi um porta-retrato que caiu, mãe!" respondi nervosa, esperando que ela acreditasse e não resolvesse entrar para conferir.
"Trate de limpar isso!" escutei sua voz autoritária se afastando aos poucos. Suspirei aliviada e fui em direção ao closet à procura de um penhoar. Então, finalmente abri minha persiana para quase cair para trás de susto. Estava chocada por ver aquele semblete de pessoa me encarando no jardim.
"? O que diabos você está fazendo aqui?" sussurrei visivelmente surpresa, mas ele não pareceu estar preocupado.
"Só vim ver se estava tudo bem..." ele disse tranqüilamente, se balançando de frente para trás com as mãos nos bolsos da calça.
"Estava! Mas não vai estar mais se alguém te ver aqui!" olhei para os lados a fim de me certificar que ninguém nos observava. soltou um risinho e olhou para os pés por um momento.
"Você.. Err, poderia descer aqui por um instante?" ele parecia meio incerto. Talvez pela minha resposta. Mordi meu lábio inferior, hesitando e pensando no que eu faria naquele momento. Meu coração me dizia para descer, e que se danasse toda a moralidade que me envolvia. Mas minha razão continuava a dizer que o melhor era não contrariar as vontades de Marry, pois sempre que eu o fazia, algo acabava dando errado. Mas meu coração batia tão forte contra o meu peito, que era impossível escutar qualquer coisa que não fosse ele. "Vamos lá! Só um instantinho!" insistiu, com uma cara impossível de se resistir. Novamente, resolvi agir impulsivamente. O máximo que poderia me acontecer, seria um mês sem sair de casa, e era para isso que serviam as janelas. Pelo menos as minhas.
"Olay, pegue a escada que fica no vão entre a casa e o muro!" apontei para meu esconderijo de fuga. já sabia de cor onde era, por isso sempre que eu escapava da prisão, todo o equipamento já estava a postos. concordou e foi aonde eu indiquei, voltando segundos depois com uma escada imensa de madeira.
"É essa?" ele me perguntou rindo, me fazendo gargalhar, mas imediatamente coloquei uma mão sobre a boca.
"Agora coloque aqui..." indiquei a entrada da minha janela, e ele o fez. "Certo, agora esteja a postos debaixo de mim caso eu caia...." falei vagamente, já me preparando para descer.
"Oh, por favor, não caia!" disse deboxado e eu novamente me segurei para não rir e realmente não cair. Desci com cuidado, mas cheguei rapidamente até o chão, devido aos meus tantos dias de prática. O garoto me ajudou a descer os últimos degraus e rimos sem motivo quando nos encaramos.

"Você precisava ver sua cara quando sua mãe apareceu!" ele disse rindo, mas abafando com as costas da mão.
"Aquela megera me odeia" bufei. Rimos mais um pouco, até que o silêncio nos domou. Encarei meus pés cobertos por uma pantufa ridícula e tive vergonha por parecer tão infantil.
"Gostaria de se sentar comigo... Err..." ele olhou para os lados à procura de algo. "De baixo das palmeiras?" ele disse galanteador. Arqueei minhas sobrancelhas.
"Que inovador!" falei debochada, pegando em sua mão recém-estendida. Andamos de mãos dadas até alguns metros para frente, onde havia uma passarela de palmeiras. A sensação de estar de mãos dadas com foi nova. Foi desesperadora, para ser sincera. Um misto de nervosismo e tranqüilidade, algo que eu jamais havia sentindo com Ben, meu próprio namorado. Com ele, tudo era muito... Indiferente. Eu não sentia esse calor que ao mesmo tempo me dá um frio na espinha, essa intensidade que apenas a mão de causava. Olhei para nossas mãos intrelaçads, e elas pareciam perfeitamente encaixadas. Vi direcionar seu olhar à elas também, então o senti dar um leve apertão nelas.
Sorri e o encarei nos olhos. Aqueles olhos tão profundos e tão cheios de segredos que eu estava louca para decifrar.
Paramos de andar, mas não de nos olhar, muito menos soltamos as mãos. Me bateu um desejo desenfreado por tocá-lo, acariciar suas bochechas rosadas, sentir sua pele... Não sei o porquê desses meus instintos estarem tão impolsivos, e por que eles tentavam me controlar. Eu não gostava de ser inconsciente sobre meus atos, sempre tive o controle sobre minha racionalidade.

"Te chamei para sentar, mas se você quiser ficar de pé debaixo das palmeiras, por mim tudo bem..." sussurrou vagamente com um pequeno sorriso. Soltei um risinho tímido pela minha distração e me sentei rapidamente na grama fofa abaixo de nós, puxando-o para sentar-se também. Ele soltou um suspiro e se apoiou com as mãos para trás numa pose relaxada. Fiquei fitando qualquer coisa que não fossem os olhos hipnotizantes que estavam me encarando.
"Então... O que você quer?" cortei aquele silêncio que me incomodava bastande.
"Quanta educação, ..." riu e eu rolei os olhos, fingindo impaciência.
"Hm. Então você interrompe o sono alheio por tédio? Quanta educação, !" ele riu e eu não pude conter minha risada também.
"Você não estava dormindo... Estava chorando..." ele disse quase num sussurro e eu soltei um gemido de surpresa. O olhava abismada e curiosa ao mesmo tempo.
"Como... Como você..." então fui interrompida pela mão de , que tocou levemente meu rosto, trilhando um caminho dos olhos até o final do meu queixo, um caminho onde antes foi trilhado por lágrimas. Abaixei meu olhar para a grama que eu arrancava por culpa do nervosismo.
"Na verdade eu só queria te ver novamente... Você sabe... Antes de voltarmos a nos tratar como estranhos..." ele disse calmamente, encarando seu All-Star mal cuidado. Todo o sangue do meu corpo se concentrou em minhas bochechas, e tudo o que eu consegui fazer foi encarar minhsa pantufas.
"Mas nós não precisamos ser estranhos..." falei num sussurro e o encarando novamente. Eu não sabia se me concentrava no olho direito, ou no esquerdo, não sabia qual era mais encantador. Senti sua mão ser depositada de leve contra a minha e a apertar suavemente.
"Precisamos, . Nós precisamos..." ele respondeu, e eu não entendi exatamente o que ele queria dizer com isso. Havia mais em seus olhos, algo que ele implorava para que eu pudesse entender, mas eu não conseguia ler o que estava escrito em sua feição triste.
"Porque... Porque eu estou sentindo as coisas mudarem, ?" disse fracamente, encarando nossas mãos dadas em meu colo. Suas unhas eram ligeiramente mal-cuidadas, mas eram perfeitas. Seu toque era tão suave e macio que eu vagamente podia sentir os calos abaixo de seus dedos.
"Elas só estão mudando para você, ... Pra mim sempre foi assim..." disse firmemente, me olhando de um modo tão profundo que me senti fraquejar. Senti meu estômago revirar.


Capítulo 9.
                                          You light my morning sky with burning love...

"Tchau, pai!" gritei já fora do carro e vi meu pai acenar enquanto o carro se afastava. Sorri e entrei correndo para dentro da escola, já estava cinco minutos atrasada. Fui para o terceiro bloco, onde corri desenfreada até a escada e a subi até chegar ao terceiro andar, onde procurei a porta com a placa que dizia 'Orientação Vocacional por Bruce Campbell'. Orientação Vocacional no primeiro horário é pedir para que as alunas durmam.
Bati sutilmente na porta e esperei alguns segundos até o professor Campbell abrir a porta para mim e me dar um pequeno sermão sobre pontualidade antes de me deixar entrar. Eu não tenho culpa se Meredith hoje tenha queimado a mão enquanto fazia minhas panquecas e tenha demorado a me acordar.
Acenei para , que estava sentada do outro lado da sala, onde não havia cadeiras vagas. Então me contentei por ficar ao lado de Cindy Pickett, a garota que não sabia mascar chiclete e não me deixava prestar atenção na aula com os estralos que dava ao estourar uma bola.
Após torturantes cinqüenta minutos, com muito esforço para ficar acordada, o sinal me despertou e percebi que já estava pronta ao meu lado. Rolei os olhos, peguei minha mochila no chão e trilhamos caminho à nossa próxima chata aula que seria 'Assistência Social & Saúde', sorte de que sua próxima aula seria Língua Inglesa.
Nos despedimos quando cheguei até a sala de número 113, e entrei para mais longos minutos de tortura. Me assustei ao ver que estaria na mesma sala que eu, que tolice a minha, é claro que eu sabia. Nós sempre criticávamos o péssimo corte de cabelo da professora Glenanne.
Fui de cabeça baixa até uma cadeira bem afastada da dela, mas sentindo seus olhos pesados sobre mim. Desde o incidente, nós não nos falávamos mais. Nem eu sabia o porquê verdadeiro disso tudo, mas se recusava a conversar comigo. Todas as minhas tentativas de uma argumentação amigável eram descartadas quando a garota me lançava um de seus olhares cheios de ódio e amargura.
A professora entrou, e eu simplesmente abri meu caderno para fingir que prestava atenção no que ela falava. Eu rabiscava o cabeçalho do papel, desenhando coisas aleatórias, alguns tribais, outras vezes um coração. Mas me peguei de surpresa quando escrevi, sem ao menos perceber, a letra inicial de alguém inusitado. Eu havia começado a escrever o nome dele...
Fechei meu caderno bruscamente e me afundei na cadeira, encarando o teto e deixando que aqueles pensamentos, que me perseguiram desde a última vez que eu o vi, me dominassem.

A partir do momento em que eu subi as escadas do meu quarto, quando meu pequeno encontro (um tanto exótico também, acrescento) com acabou, tudo o que me vi fazer durante todos os minutos, era pensar nele. Flashes de toda aquela noite, e de todas as palavras ditas, passavam pela minha cabeça constantemente, e nada no mundo conseguia tirá-los dali. Era desde sua voz, até o toque de sua pele e a cor de seu cabelo. O cheiro de seu perfume parecia estar impregnado em mim... Era como se eu estivesse fugindo de um demônio, de um pecado... Talvez ele fosse meu pecado... Minha sina, meu karma...
Desde então, não consegui uma vez se quer, olhar verdadeiramente dentro dos olhos de Benjamin. Eu o olhava, mas não via nada, era apenas uma figura vazia na minha frente. Sua voz firme e grossa soava extremamente áspera e rude aos meus ouvidos. Eu não conseguia me concentrar em uma palavra que ele dizia. E eu me odiava por isso. Ben sempre foi um garoto tão doce e gentil para mim... Não havia razões para eu tratá-lo assim!

Abri um sorriso inesperado ao lembrar do meu compromisso de hoje após a escola. Já havia avisado Marry que voltaria para casa depois das sete... Os garotos iriam nos buscar ( e eu) na escola para um piquenique nas montanhas de Stahl e veríamos o pôr-do-sol. , , e... E ele.
Às vezes me pego pensando nele às escondidas, me torturando em pensamento por isso. Não era para eu estar assim. E logo depois de me torturar, eu fico me indagando por que diabos eu estava assim, e por que raios esse maldito garoto insistia em me perseguir, até mesmo em meus sonhos. Não ousei a falar isso com . Talvez eu tivesse uma idéia do que ela diria, mas a insegurança era maior. Porque uma garota que já tem um namorado perfeito estaria pensando em outro?
Sem nem mesmo perceber, vi as horas se passarem cada vez mais rápido para minha (in)felicidade. e eu sentamos no mesmo lugar de sempre na hora do almoço, com algumas garotas do nosso curso de música. Elas discutiam de Bethoven à Mozart, pulando para Elvis e Johnny Cash. Mas eu conseguia apenas encarar uma pessoa do outro lado do refeitório. estava sentada com as garotas mais populares do colégio, as mais bonitas por assim dizer. Talvez aquele fosse seu verdadeiro lugar, onde ela realmente pertencia. Sempre andou de nariz empinado, sempre se achou melhor do que as outras, sempre gostou de humilhar os outros. Talvez eu que nunca percebi esse seu lado. Nossos olhares se encontravam às vezes, mas eu não ousava em sustentá-lo.

E assim passou-se o dia, sem muita agitação ou novidades, o ruim de uma escola só de garotas. Não temos muito o que falar ao longo do dia sem os garotos para serem observados...
Mas pelos tantos pedidos que fiz à Deus, o tempo passou rápido e eu e já estávamos saindo da escola lado a lado e com os materiais nas mãos. Na minha mochila, eu carregava um bocado de porcarias: bolachas, pringles, sucos de saquinho, pasta de amendoim e é claro, uma manta de piquenique. Eu tinha a absoluta certeza de que os garotos esqueceriam. levava coisas saudáveis como frutas, barrinhas de cereais... Coisas que continuariam em sua mochila. Nós conversávamos sobre algo aleatório até esbarrarmos em alguém.
"Olá, senhoritas, deixem-me carregar os seus pertences?" escutamos uma voz muito familiar, forçando-se por ser galanteador. estava à nossa frente, com uma pose de cavalheiro, todo curvado e charmoso. Não contive a risada, muito menos . Assim que se desfez da pose em um pulo, entregamos nossos materiais à ele e trilhamos o caminho até o seu carro do outro lado da rua. Com muito empurra-empurra e comentários do sobre as tantas garotas que passavam ali, chegamos até o Fusca vermelho do .
"Oi, princesas!" apareceu ali de fora, dando um abraço em cada uma de nós. Ele, aparentemente, havia superado todo o incidente passado. Assim como eu, não conversava com e havia chegado à um acordo com . Coisas de homens. abriu a porta para nós, juntamente com o banco. De trás, pude ver e sentados lado a lado. entrou correndo, indo de encontro com seu namorado, o qual colocou-a no colo para que houvesse espaço para todos nós. Eu não entrei. Não consegui. Os olhos de não deixaram. Não sei quanto tempo ficamos nos encarando, mas pra mim foi uma eternidade.
"Ande logo, !" gritou do lado de fora, me dando um empurrão indesejado. Para minha vergonha, eu caí bem em cima do colo de , e logo após, senti o banco voltando para seu modo original e se sentou, me fazendo ficar mais desconfortável e me dando pouco espaço para eu poder me sentar ao lado de , não em seu colo.
Minhas bochechas estarem mais vermelhas do que estavam, era impossível. Eu podia sentir a respiração de tão perto de mim, e seus olhos estavam tão próximos dos meus que me senti vesga.
"Oh, desculpe..." falei desnorteada, me remexendo em seu colo e batendo várias vezes no banco de (escutando suas várias reclamações) e tentando me sentar decentemente. tentava me ajudar, ora colocava suas mãos em minha cintura me empurrando, ora se espremia contra a parede do carro para eu poder passar.
"O que vocês estão fazendo? Sexo?" gritou do banco da frente, e assim que consegui finalmente me sentar, dei um murro em sua cabeça.
Olhei para de relance, e o mesmo sorriu abertamente para mim, me fazendo abaixar a cabeça, dar um risinho totalmente envergonhado e colocar uma mecha de cabelo atrás da orelha.
ligou o som do calhambeque em uma rádio que todos nós adorávamos. A Radio Rock Station.
"LORD ALMIGHTY, FEEL MY TEMPERATURE RISIIIIIIING. HIGHER HIGHER, IT'S BURNING THROUGH TO MY SOOOOOOOUL" começamos a cantar no imediato momento em que Burning Love começou a tocar. aumentou o volume do rádio no máximo, a ponto de podermos confundir nossas vozes com a do Rei.
"GIRL GIRL GIRL, YOU GONNA SET ME ON FIIIIIIIIIIRE" cantava apontando para mim. "MY BRAIN IS FLAAAAMING, I DON'T KNOW WITCH WAY TO GOOOOO" Eu fazia caras e bocas enquanto cantava. Fiquei no vão entre e , enquanto fingíamos ser um trio. "YOUT KISSES LIFT ME HIIIIIIGHER LIKE THE SWEET SONG OF A CHOOOOIR. YOU LIGHT MY MORNING SKY" me virei para trás a ponto de ver olhando para mim. "WITH BURNING LOOOOOOOVE" ele gritou alto, mas ainda olhando profundamente para mim. Todos começamos a dar gargalhadas assim que a música acabou, e eu me joguei no banco de trás.
"Devíamos juntar essas duas no McFLY..." disse se curvando para trás e apontando para mim e .
"Concordo plenamente. Cantamos mil vezes melhor do que vocês quatro juntos!" falei de peito estufado e concordou.
"Melhor do que eu impossível" disse ao meu lado, mas um pouco baixo fazendo com que somente eu escutasse.
"Como você é convencido! Claro que eu canto melhor!" revidei toda cheia de mim, fazendo-o gargalhar. Oh, como eu amo aquela risada.
"Eu te provo" ele falou maroto e deu uma piscadela antes de girar sua atenção ao vidro do seu lado direito. Sorri sem motivos e olhei para a direção contrária, e para o meu desconforto, dei de cara com e aos amassos. Eles estavam se engolindo, juro! Ri e passei a mão pelo meu cabelo, bagunçando-o um pouco. Quando depositei a mão em meu colo, devido ao pouco espaço dentro do Fusca, ela tocou levemente na mão de , a qual estava depositada em seu colo. Olhei-o imediatamente, mas ele continuava estático, olhando para a paisagem do lado de fora. Porém, percebi um suave sorriso que se formou no canto de sua boca. Obviamente, senti minhas maçãs do rosto queimarem, e minha mão formigou, pedindo para agarrar a mão que estava ao seu lado. Mas me contentei apenas em um simples e sutil toque. Hora e outra, eu e ele nos remexíamos, fazendo nossas mãos ficarem cada vez mais próximas, a de quase estava totalmente por cima da minha. Mas nada fiz para tirá-la dali. Eu não queria que ela saísse dali.
E assim foi a nossa pequena viagem de meia hora até o topo das montanhas Stahl. Alguns olhares aqui e ali, pigarros de minuto em minuto... Mas nada de desconforto. Por incrível que pareça, eu não senti desconforto algum. Apenas uma plena satisfação e alegria dentro de mim.
e saíram do carro, abriram as portas e subiram os bancos para que pudéssemos sair. saiu do lado do motorista, logo atrás saiu .
me olhou maroto quando viu os quatro se afastarem e eu apenas dei uma risada. Para surpreendê-lo, e não sei para que diabos quis isso, dei um beijo rápido e estalado em sua bochecha, correndo rapidamente e aos risos para fora do carro pelo lado em que havia saído, e o deixando lá dentro, estático e com uma feição desentendida.
Meus quatro amigos estavam a postos, um ao lado do outro, onde dali, eu sabia que seria o penhasco entre uma montanha e outra.
Cuidadosamente, me pus ao lado de e agarrei sua mão. Todos estavam de mãos dadas. Olhei para baixo e uma sensação de liberdade apoderou-se de mim. Estar ali, no topo de uma montanha enorme com os meus melhores amigos, podendo ver o mundo abaixo de nossos pés... Definitivamente era uma sensação libertadora. Eu sentia como se nada, absolutamente nada pudesse nos atingir ali. Como se nada nem ninguém pudesse nos destruir, nos separar. Dali, ninguém poderia acabar com nossos sonhos.
Respirei o ar puro que percorreu entre nós, e senti a corrente de vento bagunçar bruscamente meus cabelos. Olhei para meus amigos, e todos tinham seus olhos fechados e sorrisos enormes estampados nos rostos. Eu os amava. Com toda a minha certeza, eu os amava mais do que tudo. Fiz como eles e fechei meus olhos, deixando escapar um sorriso aberto em meus lábios.
E o senti aumentar assim que senti minha mão livre ser entrelaçada por uma nova mão. E eu sabia de quem era...


Capítulo 10.
                                          Each time we meet love, I find complete love. Let it be me


e eu já havíamos arrumado nosso piquenique, farto de comida. Todos os garotos haviam trago bobagens também. E como eu havia dito, a pobre comida de nem foi tocada. A não ser por ela claro.
"Ew, , coma com a boca fechada!" dei um tapa no ombro do garoto ao meu lado, que toda hora insistia em mostrar o que comia. Só que dentro de sua boca. ", dê um jeito nesse seu namorado nojento!" fiz cara da nojo e vi dar um peteleco na orelha de .
"Vocês são uns ingratos e vão morrer por tanto colesterol!" disse indignada. "Ninguém sequer tocou nas frutas! Olhe só quanta maçã bonita! Porque ninguém come?" indagou ela irritada.
"Bom, eu até comeria a maçã, mas barra de cereal sabor gengibre? Você só pode estar brincando, né, ?" disse debochado, fazendo os demais garotos rirem e se frustrar mais ainda.

Os esfomeados acabaram com a comida em minutos e foram correr um atrás do outro como um bando de gazelas. Gazelas, de verdade. Corriam saltitantes, dando empurrões uns nos outros. Meus amigos são gazelas.
"Às vezes acho que meu namorado tem tendências gays... Você sabe como isso está na moda, acho que ele tá entrando nessa..." cochichou discreta no meu ouvido, e vi que era o mais saltitante e... Alegre entre os demais. "Se ele já não tivesse me provado o quão homem é, eu duvidaria..." disse ela normalmente.
"! Me poupe dos detalhes sórdidos!" dei um tapa em sua coxa, fazendo-a rir. De repente, vimos os quatro garotos se juntarem e cochicharem olhando para nós. Eu me intriguei com isso, odeio que cochichem e deixem na cara que falem sobre mim.
"HEY, OTÁRIOS, O QUE ESTÃO FALANDO?" gritei, atraindo a atenção dos idiotas, que se aproximaram com sorrisos marotos nos rostos. "Ei, por que esses sorrisos idiotas no rosto?" falei desesperada enquanto eles se aproximaram cada vez mais. arqueou as sobrancelhas, dando-o uma expressão maléfica.
"SAIAM DAQUI!" gritou quando eles chegavam cada vez mais perto.
"MUAHAHAHA" gritou antes de correr em nossa direção.
"AAAAAAAAAH!" gritamos juntas e desatamos a correr, vendo os quatro marmanjos, com o dobro do tamanho de nós duas, correrem atrás de nós. Eu não sabia se ria, corria ou gritava, acho que teria um ataque a qualquer momento.
De repente senti alguém me derrubar pelos joelhos, me colocar em seu ombro e começar a correr. Pelos cabelos que tampavam minha visão, percebi que era .
", ME PONHA NO CHÃO AGORA!" esperneei por cima do garoto, escutando suas risadas de fundo e suas mãos apertarem minhas pernas firmemente. "ONDE VOCÊ ESTÁ ME LEVANDO?"
"Sossega ai, " vi passar por nós correndo, e desaparecendo de vista por entre as árvores à nossa frente. Olhei para trás e vi que estávamos descendo a montanha, e estava sendo carregada por e , enquanto esperneava e gritava como eu.
Alcançamos a floresta, e a essa altura eu já havia cansado e resistido por ser carregada por .
"Regime é bom às vezes, " disse ele antes de me colocar delicadamente no chão. Antes de batê-lo, olhei à nossa volta e vi o rio Stahl bem à nossa frente. Não era como o riacho que havíamos ido nas férias, este não era totalmente rodeado por árvores, era em total espaço aberto.
"Vá se danar, " falei alheia, vendo-o se afastar. já estava dentro da água, fazendo gracinhas e jogando água para cima. tirou sua camisa, jogou em minha direção e pude escutá-lo caindo dentro d'água. Sua camisa foi parar em minha cabeça, tampando totalmente minha visão.
Fiquei desnorteada a partir do momento em que senti o cheiro do garoto invadir minhas narinas. Eu não estava me entendendo. Antes de tirá-la do meu rosto, escutei os três restantes passarem correndo por mim e pularem na água também. Assim que tirei a camisa, pude vê-los todos dentro do rio, gargalhando e jogando água um no outro.
"Vamos, entre, !" gritou de longe.
"Vocês escolheram um péssimo dia para nadar. Sabem, problemas femininos..." rolei os olhos e implorei para que eles entendessem. Não estava a fim de explicar o que seriam problemas femininos.
Tirei o chapéu do colégio da minha cabeça e me sentei de uma forma relaxada, observando os cinco se divertindo. Claro que me amaldiçoei mentalmente por ser mulher. Tem milhões de desvantagens.
"Vou dar uma volta!" gritei, mas acho que ninguém me escutou. Me levantei assim mesmo e rumei mata adentro.
Pouca luz chegava ali devido às densas copas das enormes árvores. Além dos gritos dos meus amigos, eu podia escutar o pio de pássaros e o bater de suas asas ao se assustar com a minha presença ali.
Andei mais um pouco até sair da floresta e estar novamente na montanha. Tive que correr um pouco até chegar em seu topo e ficar aonde antes estavam todos os seis.
Comecei a pensar nas tantas coisas que vinham acontecendo. Todas as mudanças, emoções que eu vinha sentindo e principalmente, todo o quebra-cabeça que havia sendo montado no meu coração. Eu só esperava que alguém tivesse a capacidade de montá-lo do jeito certo e desfazer aquele nó enorme que estava em meu estômago.
Eu odeio mudanças. Era por esse motivo que eu sempre tive minha rotina perfeitamente calculada, assim nenhum deslize era cometido da minha parte. Mas ultimamente, todas as regras que haviam sido ditadas à mim, estavam sendo quebradas aos poucos por uma só pessoa: .

"God bless the day I found you... I want to stay around you and so I beg you, let it be me" escutei uma voz soar por trás de mim, uma voz que fez meus olhos se fecharem e meu coração acelerar. "Don't take this heaven from one if you must cling to someone. Now and forever, let it be me" senti suas mãos envolverem cada meus cotovelos e movendo-se lentamente até minhas próprias mãos. "Each time we meet love, I find complete love. Without your sweet love what would life be. So never leave me lonely, tell me you love me only and that you'll always. Let it be me" ele apoiou seu queixo em meu ombro e inspirou uma grande quantidade de ar perto do meu pescoço, me fazendo arrepiar dos pés à cabeça.
entrelaçou seus dedos nos meus, e abriu meus braços lentamente até que eles ficassem abertos como se fossem asas.
Eu mantinha meus olhos fechados, e meus arrepios agora eram causados pelo vento frio que passava por nós e a respiração quente de em meu pescoço.
"Let it me be... " ele repetiu em um sussurro, depositando um leve beijo no local onde antes eu sentia seu nariz.
Abri meus olhos e dei de cara com o vale extremamente verde abaixo de nós, e em momento algum o medo passou perto de mim.
Fechei meus braços lentamente, trazendo os de juntos, e depositei nossas mãos sobre a minha barriga. ainda tinha o queixo apoiado em mim, então quando eu virei suavemente meu rosto, senti meu nariz encostar em sua bochecha e desse jeito fiquei. Ele foi levado levemente para trás quando a bochecha de se moveu para abrir um sorriso nos lábios, fazendo um se abrir nos meus.
Movimentei meu nariz suavemente, acariciando a pele macia do garoto. Soltei uma das mãos e a levei no outro lado do rosto angelical de . Minhas unhas tocaram de leve seu maxilar, trilhando caminhos até sua boca. Subitamente, soltei-me totalmente dele e me virei para ficar à sua frente. O garoto envolveu minha cintura com suas mãos e as minhas estavam espalmadas em seu tórax bem definido. Nossos narizes estavam colados e nossas bocas estavam a milímetros de distância uma da outra. Eu sabia que aquilo era errado, sabia que era muito errado. Mas então por que meu coração palpitava tanto contra meu peito e dizia repetidamente que era tão certo? Porque parecia tão certo, sendo que era errado? Não fazia sentido... Nada tinha sentido... Eu os havia perdido há muito tempo. Eu sentia calafrios percorrerem toda a minha espinha e minhas mãos começarem a suar compulsivamente. Eu não poderia ir contra meu coração. Eu não poderia assassinar o jardim de borboletas que zanzavam no meu estômago. Era simplesmente desumano.
Vi fechar seus olhos e abrir um singelo sorriso no canto de seus lábios. O vi, também, se aproximar lentamente a ponto de quase acabar com toda a distância que havia entre nós. Ele iria me beijar. iria me beijar. O que estava acontecendo? Eu não podia resistir. Eu iria cometer uma atrocidade.
Então pude sentir a ponta de seus lábios macios e úmidos tocarem os meus. Eu estava no paraíso e ninguém me avisou.
Antes de podermos seguir em frente como em um sonho, escutei um barulho vindo da floresta. Automaticamente me afastei de em um pulo, e vi e saírem por entre as árvores.

"Ai estão vocês!" gritou, vindo correndo em nossa direção. Sacudi a cabeça negativamente, caindo finalmente em sã consciência e analisando o que eu estava prestes a fazer. Além de quase ter beijado um dos meus melhores amigos, eu estava prestes a trair o irmão do meu melhor amigo! O meu namorado!
"Me desculpe, não posso fazer isso" falei nervosa, e fui correndo em direção ao Fusca vermelho parado à alguns metros dali.
O que havia de errado com a minha pessoa? O que esse garoto estava fazendo comigo?


Capítulo 11.
                                          Like a river flows surely to the sea, darling so it goes some things are meant to be...


Arrumei a barra da minha saia pela milésima vez, checando se ela estava devidamente dobrada. Olhei pelo retrovisor, arrumando, também pela milésima vez, a faixa que prendia meu cabelo, e limpei o lápis levemente borrado abaixo dos meus olhos. Eu estava pronta. Ou teoricamente pronta. Nunca havia passado por experiência parecida. O que eu devia falar? Fazer? Como agir, como cumprimentá-los, como parecer uma pessoa apresentável?
Com muito esforço, abri um baú que normalmente nunca é tocado no fundo da minha mente. As coisas ditas pela minha mãe. Finalmente encontrei alguma utilidade para toda aquela baboseira que ocupava espaço nos meus neurônios. Os bons modos e etiqueta talvez fossem úteis nessas situações.
“Pronta, senhorita? É que estamos parados aqui há meia hora e eu tenho serviços delimitados pela senhora ...” Jeff tentou parecer paciente e fingiu entender minha situação, mas a intolerância transparecia em seus olhos. Qualquer pessoa ficaria assim quando tivesse tarefas a cumprir à mando de Marry.
“Claro, claro... Me desculpe, Jeff” acordei do meu transe e dei uma ultima ajeitada em minha camisa branca. Jeff disse algo como ‘não se preocupe’ ou coisa do gênero, mas eu estava muito aérea para prestar a devida atenção.

Então, eu estava finalmente parada em frente aos portões da casa dos .
O meu desejo mais profundo era de permanecer em inércia, provando que a física não era de total inutilidade. Mas antes que eu pudesse sair correndo dali, acabando com meu repouso, os portões esculpidos no bronze se abriram, e a partir daí eu não tinha outra escolha a não ser enfrentar o maior desafio da minha vida: conhecer meus sogros. Conhecer a família do meu namorado.
Aquilo soava incrivelmente anormal aos meus ouvidos, ainda mais pelo fato de nem mesmo conhecer suficientemente bem o namorado. O irmão mais novo não havia necessidades de ser apresentado, seria em qualquer outra situação, e isso me confortava.

Um homem de postura muito robusta e feição séria apareceu de algum lugar e vinha vindo em minha direção. Eu realmente não sabia de onde ele havia aparecido. Era calvo e os cabelos brancos mostravam que sua juventude já havia ido embora. Usava também um típico uniforme, parecido com o de Joel em minha casa.
“Seja bem-vinda à propriedade dos , senhorita ” o homem fez uma reverência, o que me fez olhar para os lados, me certificando de que aquilo não era obra do . Acenei brevemente com a cabeça, um pouco tímida e incomodada com os olhares que o suposto mordomo me lançava.
“Siga-me, por favor” disse ele elegante, e me crucifiquei por dentro por perceber que até mesmo o mordomo dos tinha mais classe do que eu.
Empinei meu nariz e comecei a andar de forma totalmente ereta, tentando parecer um pouco mais apresentável, e evitar que fofocas como o quão desengonçada era a filha de Marry . Ela provavelmente ficaria sem sair de casa por um ano inteiro. A população agradeceria.

Então, após atravessar o enorme jardim,que eu já conhecia devido às dezenas de festas de aniversários que eu já havia comparecido ali, chegamos à entrada principal da mansão dos .
O mesmo mordomo abriu a grande porta de madeira (eu pude jurar que as maçanetas eram de ouro) e fez um aceno para que eu entrasse na sala.
Aquele lugar eu já conhecia. Os móveis eram os mesmos, os quadros de Picasso e Van Gogh estavam presos nos mesmos lugares, o enorme lustre de cristal ainda estava parafusado ao teto... Mas aquela não era uma visita como as outras. Para mim, tudo ali era diferente. Eu estava pisando em um território totalmente novo e abrangente, que eu estava prestes a descobri-lo.
Minhas mãos estavam firmemente pregadas na bolsa retangular, e o eco das minhas sapatilhas ao se chocarem com o mármore (que mais parecia um espelho, pois refletia a minha figura perfeitamente) estavam me deixando mais nervosa do que o normal.

Escutei outros passos sendo ecoados por algum dos cômodos ali, e em uma fração de segundo, toda a família estava andando em minha direção.
A mãe de , uma loira alta de lábios carnudos e vermelhos, muito sorridente, vinha à frente de todos. Mais atrás caminhavam os três homens da família. À direita vinha Charles , o líder da família e prefeito da cidade. Continuava com seu bigode espesso e eu tinha a impressão de que ele possuía apenas aquela roupa em seu corpo. Em churrascos, Charles usava terno preto, camisa cinza por baixo, seguida de uma gravata vermelha e para finalizar, uma calça social preta. Festas de aniversários usava terno preto, camisa cinza por baixo, seguida de uma gravata vermelha e para finalizar, uma calça social preta. E assim era para comícios, festas de casamento, e agora descobri que também usava esse traje para receber suas noras.

Eu havia conversado com no dia anterior, atrás de dicas e meios de agradar a família . Mas o único conselho que ela me deu foi: “Seja você mesma, !” Esse não era um conselho muito certeiro a ser seguido, já que ser eu mesma nunca foi uma boa idéia. Eu com certeza não causaria uma boa impressão.

No meio, vinha por ser mais baixo e deixar a escala familiar elegantemente equilibrada. Ele possuía um sorriso maléfico que não pude deixar de notar. Estava tão elegante quanto seu pai, de terno preto, uma camisa branca e gravata preta. Não usava calça social, mas sim uma calça jeans surrada e All-Star preto nos pés. E à esquerda estava ele. Tão lindo quanto a primeira vez que o vi. Usava um sapato reluzente de verniz, calça social preta, camisa branca, gravata preta e terno preto. Parecia a sósia de seu pai, com alguns detalhes a menos e outros a mais, como a falta do bigode e o excesso de cabelos na cabeça.
Mas uma coisa estava diferente em relação à primeira vez que o vi. Eu não sentia minhas mãos suarem. Eu não sentia meu estomago revirar. Se eu olhasse no espelho moldado pregado na parede ao meu lado, eu não poderia ver o mesmo brilho nos meus olhos que ali estavam na primeira vez. Tudo externamente estava igual. Assim como a cara admirada que agora eu forjava. Mas dentro de mim, no lugar mais profundo do meu inconsciente, nada era o mesmo. As sensações tão boas haviam desaparecido sem razões óbvias ou cabíveis. Eu não sabia o porquê. Se alguém me perguntasse, eu não saberia responder. Não saberia responder por que eu não mais suava, não saberia responder por que todas as borboletas no meu estomago estavam mortas, não saberia responder por que eu havia perdido o brilho que sempre habitavam meus olhos ao vê-lo.
Benjamin estava ali, mas não era a pessoa por quem eu havia me apaixonado. Ou talvez eu não era mais a mesma que havia se apaixonado por ele. Das duas, uma.

“Oh, como é bom recebê-la, minha querida!” Joanne, a mãe, veio em minha direção de braços abertos. Me apertou calorosamente contra seu corpo em um abraço chocante e hospitaleiro.
“É um prazer revê-la, senhora ” falei com um meio sorriso, estampando a timidez em meu rosto. Vi pelo canto do olho que não fazia a mínima questão de esconder o quanto estava se divertindo com a minha decadência.
“Cada dia mais bonita, hein, ?” o senhor se pronunciou, dando um passo a frente e dando tapinhas em minhas costas. Típico de político, não poderia esperar outra coisa. “Benjamin é um rapaz de sorte!” ele exclamou com um sorriso quase totalmente escondido pelo seu bigode. Minhas bochechas não poderiam estar mais vermelhas. Foi a vez de .
“Senhorita , cada dia mais encantadora” fez uma reverencia igual à de seu mordomo e nunca tive tanta vontade de estapeá-lo. Ele voltou à sua posição usual, se segurando ao máximo para não soltar umas de suas risadas estridentes e constrangedoras.

Então veio Benjamin. Elegante e galanteador como sempre. Seu porte clássico, robusto e encantador, seu olhar penetrante e aquele pequeno sorriso em seus lábios rosados. Perfeito. Perfeito demais. Talvez houvesse algo em mim que repelisse a perfeição.
Ele me estendeu a mão direita e eu a segurei delicadamente, recebendo um beijo nas costas da minha mão. Um beijo macio, delicado e suave, como todos os outros.
Sorri levemente, e procurei seus olhos, a fim de encontrar tudo aquilo que eu havia perdido. Mas nada encontrei a não ser um vazio, um nada. Não havia absolutamente nada ali que me fizesse sentir tudo o que sentia há um tempo atrás.

“Vamos para a sala de jantar? Fizemos pratos muito finos, ... Posso te chamar de , não é mesmo?” minha sogra soltou uma risada estridente, pior do que a de . Sim, de doer os ouvidos.
Concordei silenciosamente com a cabeça, então ela continuou:
“Como eu sei que você é de uma família muito fina, você irá adorar! Nossa cozinheira é excelente, a contratamos em Paris, quando...” e a partir daí, meu cérebro automaticamente desligou meus funcionamentos da audição. Joanne era uma cópia autenticada de Marry, e eu havia acabado de chegar à tal conclusão. Desde os gestos elegantes, até o tom de batom e o perfume Chanel n° 5 que usava. Comecei até a pensar que o meu destino sempre foi traçado para ser daquela maneira. Viver entre pessoas daquele gênero. Ser uma pessoa daquele gênero. Quem sabe Marry e Joanne não eram amigas desde a infância e combinaram que seus filhotes estariam predestinados a namorarem um com o outro em um futuro próximo? Coisas de melhores amigas adolescentes... Tudo é possível.

E como Joanne havia dito, tudo era realmente muito fino. Exageradamente fino. Os panos sobre a mesa eram de seda pura, os talheres eram dourados e da marca mais cara que pudesse existir.
Havia um mordomo posicionado em cada cadeira, os quais arrastaram-nas para que sentássemos. Murmurei um obrigada e tive a impressão de que fui acompanhada apenas por .
“Aceita vinho, senhorita?” o ‘meu’ mordomo perguntou-me.
Antes mesmo de eu abrir a boca para dizer um ‘sim’, minha sogra interrompeu meu raciocínio com empolgação.
“Oh, mas é claro que aceita! Sauternes Chateau d’Yquem ” Joanne forçou sotaque francês com o típico bico que todo estrangeiro insiste em fazer ao falar qualquer palavra da língua francesa. No exato momento em que escutei o nome Sauternes, minha vontade e apreciação por vinho desapareceram em um segundo. Este era, nada mais nada menos, que um dos vinhos mais caros de que eu já ouvi falar. Se não for o mais caro. E depende de qual Chateau d’Yquem estamos falando.
Quando meu pai realizou o sonho de comprar a primeira garrafa, só não a quebrei por saber que seriam mais de mil libras espalhadas por todo o chão. Eu nunca toquei meus lábios em uma taça que o continha, obviamente. Mas meu pai o tomou em menos de uma semana. John tinha no mínimo, urinado cinqüenta mil libras em toda a sua existência. Uma catástrofe.

“Não, obrigada, senhora . Não tomo bebidas alcoólicas” menti. No exato momento, escutei se engasgar em meio de um riso – quase – discreto.
Ben, que estava sentado ao meu lado, também soltou um risinho, olhado discretamente para mim. Olhei-os de cara feia.

Enquanto os mordomos serviam seus respectivos ‘clientes’ e eu colocava o guardanapo de pano em meu colo, senti que os olhos de Benjamin ainda estavam paralisados sobre mim. Olhei-o de canto algumas vezes, e timidamente pairei meus olhos sobre os seus. Aqueles olhos azuis transpareciam ali, naquele momento, algo que eu jamais havia visto antes. Eu não conseguiria ser especifica e clara se precisasse explicar o que vi.
Havia um brilho novo, uma radiação nunca antes refletida por eles. De repente o vi sorrir suavemente, sem mostrar seus lindos dentes. Então, em um ato totalmente inédito, ele partiu nosso contato visual, encarando os talheres sobre a mesa. Um ato incrivelmente inédito. Em todos esses anos, eu nunca havia visto Benjamin desviar o olhar de alguém. Nunca.
Foi ele que sempre dizia sobre o poder e força que um olhar continha, e que desviá-lo enquanto encara-se alguém era significado de fraqueza, fragilidade...
Em uma fração de segundos, vi Benjamin se tornar em alguém receoso e incerto. Continuei o encarando sem retorno, observando-o dar, debilmente, atenção aos seus joelhos.
O mesmo mordomo que havia arrastado minha cadeira, me despertou de tais pensamentos.
Ele pôs sobre a mesa, um pedaço de cartolina plastificada, percebendo que era uma espécie de cardápio, o qual li os seguintes letreiros:


Cardápio do Dia

·    Escargot de Bourgogne – O típico caramujo, com sua casca cozida na manteiga e salsa.

·    Coq au Vin – Carne de galo ao molho de vinho tinto Chateau.

·    Bouillabisse – Sopa de tomate com peixe do Mediterrâneo ao molho ferrugem.

·    Foie Gras – Fígado de ganso.

·    Tripes à la Mode de Caen – Tripas de cabrito cozidas em molho de vinho tindo Chateau e Calvados.

·    Pieds et Paquets – Pés e tripas de cabrito com molho do Chef.

Minha expressão naquele momento era chocada. Primeiro pelo fato de ter apenas as coisas mais estranhas e bizarras do mundo da culinária em um só recinto. Segundo por eu ter achado que aquele seria um jantar comum. Um jantar normal, que pessoas normais dão para conhecer a namorada normal de seu filho. Onde tem comida normal, como um simples espaguete.
Escutei Joanne ordenar um Tripes à la alguma coisa, Charles optou por Escargot alguma coisa, Ben escolheu o mesmo que a mãe, e quando eu lia indecisa nas varias – horríveis e estranhas – opções, escutei sussurrar perto de mim: “Escolhe Bouillabisse. Vai por mim, você não vai querer comer um caramujo ou tripas de animais” e deu uma piscadela, voltando sua atenção ao mordomo e pedindo o tal Bouilabisse, a sopa. Nem o molho ferrugem, muito menos o peixe do Mediterrâneo soavam saborosos, mas eu realmente não estava com humor ou estomago para comer tanto fígado, pés e tripas ou um caramujo. UM CARAMUJO!
Bouillabisse, por favor” falei discretamente, voltando para prestar atenção no que meus sogros conversavam.
“Estou muito confiante nessas eleições. Tenho certeza de que o povo fará a escolha certa. Pelo amor de Deus, o besta do Parker jamais seria capaz de governar essa cidade com aquelas idéias revolucionarias e socialistas. Quero esses comunistas sujos e mal vestidos longe da minha cidade. Raça ruim essa viu. Poderia existir um segundo Hitler para acabar com todos eles...” Charles soltou uma risada debochada, sendo seguido por Joanne e Benjamin, que concordava ferozmente.
“Propriedade estatal? O que eles querem, quebrar todos nós? Se eles gostam de viver com pouco dinheiro, que vão para a África!” apontou Benjamin, fazendo o pai friccionar a mão na barriga por tanto rir.
“Imagine só o caos que seria se houvesse apenas uma marca de shampoo nas drogarias?” Joanne completou chocada, como se aquilo fosse causar o apocalipse.
Naquela noite, o choque com certeza era minha expressão fixa. O que aquelas pessoas tinham na cabeça? Dinheiro? Sem sombra de dúvidas seus neurônios foram substituídos por moedas.
Continuaram a discutir o quão podre eram esses revolucionários, criticaram todos os autores, sábios e filósofos os quais eu idolatrava, mandaram para o inferno os jovens que lutavam por seus direitos, dizendo que sua única finalidade era estudar e no fim arrumar um emprego para manter o dinheiro correndo nos bancos.
E quando dei minha opinião sobre o assunto, obviamente riram de mim como seu eu estivesse contando uma piada ou sendo sarcástica. No outro momento me ignoraram e continuaram com sua linha hipócrita de raciocínio.
Minha vontade era de correr dali, mandar todos para a rapariga que os havia parido e fazer campanha política para o candidato Parker. Mas coisa que aprendi lendo muito, era que deveríamos respeitar as opiniões, por mais absurdas que fossem, de pessoas alheias. Que fosse.

Depois de muita conversa alienada, os pratos chegaram. Eu honestamente nunca vi coisa tão feia quanto aquela na minha frente. E outro detalhe, com o preço dos ingredientes de cada prato, daria para alimentar um país inteiro, e não estou exagerando. E o mais importante, após tudo isso, minha fome havia se tornado um enjôo e repulsa enorme.
Ao momento em que coloquei a primeira colher de sopa na boca, uma náusea me invadiu, mas com muito esforço e consegui colocar tudo que havia naquele prato dentro da minha boca, enquanto mais ânsia me dominava ao ver Joanne comendo tripas e Charles comendo caramujo.
“Mas então, , o que pretende fazer na faculdade?” Charles se dirigiu à mim após alguns instantes. Toda a mesa voltou sua atenção para mim. Abri a boca para falar.
“A quer fazer a escola de Direito em Cambridge, não é mesmo?” Ben, além de colocar palavras na minha boca, virou-se para mim.
“Hm, Direito é uma profissão de futuro!” Joanne passara por cima da minha resposta também.
“Na verdade a quer fazer Literatura. Mas a mãe dela não concorda...” interrompeu à todos com um tom firme. Olhei-o de relance, em agradecimento por dar voz às minhas palavras. Vi o choque estampar no rosto dos demais.
“Mas ela tem toda razão! Imagine, Literatura? O que você faria? Leria livros para crianças em hospitais? Ensinaria mendigos a ler?” Charles disse com deboche.
“Faria isso se fosse preciso” falei com um pouco de arrogância, sentindo os olhares tortos de Joanne sobre mim. Pelo amor de Deus, meu ouvido não era pinico e eu não tinha obrigação de ser educada com pessoas que debocham minhas idealizações.
“Então você passaria fome” retrucou Charles, ainda com um tom de deboche na voz.
“Com muita satisfação” sustentei a discussão com muito cinismo e raiva. Meu rosto provavelmente estava vermelho de tanta fúria.
“Fique feliz por ter um pai rico para te sustentar então” ele disse com avidez e ironia. Não saberia o que responder. Se eu abrisse a boca, provavelmente o xingaria de todos os nomes feios possíveis da língua inglesa. Provavelmente jogaria, também, o resto de sopa quente do meu prato em seu rosto.
Para a minha salvação, pigarreou ferozmente do meu lado, e tanto eu quanto o senhor Charles balançamos a cabeça a fim de esvaziar a raiva que nos dominava.

“Bom, peço desculpas, mas receio que preciso ir” falei friamente, me levantando da mesa bruscamente, antes que o mordomo resolvesse vir me irritar. Ben se levantou imediatamente.
“Mas já?” Joanne pareceu surpresa “A conversa estava tão agradável!” talvez ela fosse muito lerda ou burra para seguir o andamento de conversas desagradáveis.
“Sim, me desculpe, senhora , mas eu realmente preciso ir” falei com um sorriso forçado, que creio eu, ela não percebeu a ironia contida nele. Senti Ben segurar levemente meu braço e aproximar seu rosto ao meu.
“Por favor, não dê atenção às bobagens que saem da boca de meu pai. Você sabe como são essas pessoas de mais idade, não estão tão atualizadas quanto à essa nova... Fase...” ele sussurrou em meu ouvido, não sendo tão convincente aos meus olhos.
“Não diga que você pensa diferente, Benjamin. Nem mesmo você entende o porquê de eu querer Literatura, você nem ao menos tocou em um livro em toda a sua vida, eu posso apostar” falei entre dentes, sussurrando também para que ninguém além dele pudesse ouvir. Não queria mais um motivo para que aquela família falasse de mim a partir do momento que eu saísse dali. Tirei meu braço de suas mãos discretamente.
“Boa noite. Com licença” acenei com a cabeça à todos ali e andei a passos largos e pesados em direção à saída daquele castelo mal assombrado, sendo seguida pelo mordomo que estava me dando nos nervos.
Escutei novos passos, que não era do velhinho, já que ele estava ao meu lado.
Quando o mais velho abria a porta para mim, senti, mais uma vez, uma mão firme envolver meu braço. Já ia virar para dar boas lições de moral em Benjamin, mas surpreendi ao ver parado ali.
“Te peço verdadeiras desculpas, . Me envergonho de cada palavra que saíram das bocas daquelas pessoas ali” ele apontou com o dedão para a sala onde antes eu estava. “Não dê ouvidos à eles. Você é incrível, e qualquer coisa que você faça vai ser incrível!” ele disse com empolgação, talvez tentando me contagiar. Bufei e soltei meus braços, antes rígidos.
“Obrigada, . Só desculpo porque sei que você não é como eles” falei sinceramente, e sem o meu comando, uma lágrima contornou minha bochecha esquerda.
Automaticamente, como ele sempre fez, envolveu-me com seus largos e fortes braços, protegendo-me do que quer que fosse.
era o melhor amigo que uma pessoa poderia ter, aquele cara que, independente da situação, sempre estaria do seu lado pra te apoiar, te abraçar e proteger quando alguém te magoasse. Ele era o irmão que eu nunca tive. O irmão que eu sempre quis ter.
Então, ele me deu um beijo suave no topo da cabeça e disse:
“Vai com Deus, anjinho.”
Sorri, e corri em direção ao motorista dos , que já me aguardava no portão principal.


xxxx

Eu já havia chegado em casa há algumas horas. Quando Marry me perguntou sobre o jantar, menti e disse que havia sido espetacular. Ela suspirou de alegria.
Meredith sabia que eu mentia apenas me olhando. Ela conhecia cada sorriso irônico e forçado meu. Quando nossos olhares se cruzaram quando eu subia a escada, eu apenas dei de ombros, descrente.
Assim que cheguei a meu quarto, a primeira coisa que fiz foi me jogar na cama, como usual. Aquele era meu recanto, o único lugar onde eu tinha paz para realizar meus desejos em meus sonhos, discutir comigo mesma sobre assuntos os quais nenhuma outra pessoa entenderia meu ponto de vista, pensar em coisas – ou pessoas – que eu não deveria...
Tentei ler um livro, mas não tinha concentração suficiente para realizar uma boa leitura. Tentei jogar paciência com as cartas que escondia na minha cômoda, mas não conseguia desenvolver nenhum desafio. Até palavras-cruzada me arrisquei a fazer, a fim de trazer o sono para mim. Mas tudo foi em vão.
Aquele jantar não saia da minha cabeça. A possibilidade de viver com aquela família, de SER como aquela família, me trazia repulsa e um enjôo enorme. Fiquei imaginando como seria minha vida com Benjamin , como nossos filhos seriam criados. Com ele, teriam os mesmos costumes mesquinhos, os mesmos pensamentos hipócritas, a mesma cultura alienada. E aquilo eu não poderia permitir.

Um som vindo de fora dos portões da casa me chamou a atenção. Resolvi ignorar, imaginando que fosse apenas um dos bares desordenados que tinha por ali.
Tentei voltar ao meu pensamento anterior, mas algo me deixou mais intrigada quando passei a passei a escutar aquele som com mais cautela.

Wise man say only fools rush in…

Eu conhecia aquelas palavras... Eu conhecia aquela sinfonia...

But I can’t help falling in love with you…

Aquela voz era inconfundível.

Shall I stay? Would it be a sin?

Mesmo distorcida pela distância, eu sabia de quem eram aquelas palavras...

If I can’t help falling in love with you…

Era a minha música sendo tocada à alguns metros dali...

Like a river flows surely to the sea
Darling so it goes, some things are meant to be.

Eu precisava descobrir de onde vinha aquele som. Levantei-me imediatamente da cama.

Take my hand
Take my hole life too.

Fui em direção à minha janela a procura da origem daquele som. Olhei para todos os lados, além dos muros da minha casa. Vi os guardas também procurando o causador daquele transtorno à vizinhança.

For I can’t help falling in love with you…

Apertei meus olhos na tentativa de ver melhor, na tentativa de achar uma alma viva naquela escuridão da rua, mas eu não via nada.

Like a river flows surely to the sea
Darling so it goes, some things are meant to be.

Então, após muita procura e aflição, pude identificar atrás do muro esquerdo (o qual fronteirava com o meu quarto), um carro. Um carro que eu jamais havia visto antes, e muito menos conhecia alguém, que conhecesse alguém que tivesse-o.
Possuía os vidros esfumaçados, então era fisicamente impossível enxergar qualquer coisa (ou alguém) dentro do automóvel.
A musica parecia cada vez mais alta, e a voz de Elvis ecoava por toda a White River Street. Várias casas ligaram as luzes frontais e saíram bravas e inconformadas com aquela barbaridade. O que estaria um carro velhote daqueles, tocando um som em volume não permitido àquela hora (os moradores da White River seguiam à risca todas as normas do condomínio) defronte à casa dos ?
Marry já havia acordado e agora andava à passos pesados em direção à portaria.
‘DE ONDE VEM ESSE SOM? QUEM É O IMPERTINENTE QUE ATRAPALHOU MEU SONO?’ ela gritava.

Take my hand
Take my hole life too.

O porteiro apontou para o lugar de onde o som vinha, enquanto minha mãe gesticulava grosseiramente e gritava com os seguranças. De repente, um deles apontou para a janela onde eu estava pendurada, e pude ver o olhar furioso de Marry sobre mim. Por que diabos ele apontou para mim? E por que ela me olhou de maneira furiosa? Sou eu quem estou naquele carro, colocando pra tocar aquela musica?

For I can’t help falling in love with you...

Foi então que percebi… Percebi que a musica estava sendo tocada para mim… Para mim! Aquele calhambeque estava direcionando o som para mim! Eu estava recebendo uma serenata! A primeira serenata da minha vida!
Eu estava maravilhada. Nem ao menos escutava as palavras rudes que Marry gritava abaixo da minha janela. Eu não conseguia tirar os olhos do carro com pintura amarela descascada. Meus lábios estavam abertos em um sorriso débil, minha mente trabalhava à mil por segundo, meu coração batia descompassado e parecia querer saltar do meu peito e ir de encontro ao dono do carro.
Será que a pessoa sabia o quanto eu amava Elvis Presley? Será que era coincidência o fato de que aquela era a musica que mais tocava no meu ponto mais fraco? E a pergunta mais instigante: quem seria o dono do carro?

Vagamente vi alguns seguranças indo correndo em direção ao automóvel e pude escutar o arranco que o carro deu ao dar a partida. Ele engatou primeira marcha, de modo que seus pneus cantassem e soltassem fumaça pelo lugar onde estava estacionado.

E pude perceber, que na ultima frase da musica, o autor de tal escândalo aumentou o volume até o máximo que uma caixa de som poderia agüentar, fazendo com que eu escutasse-a nitidamente...

I can’t help falling in love with you...

Capítulo 12.
                                          Just call my name and I'll be right by your side


Eu andava de um lado para o outro em frente à minha janela. Já havia inventado milhares de coisas para fazer, até limpei o chão, arrumei minhas gavetas, coisa que não fazia há séculos. Achei diários da sexta, sétima, oitava séries e por ai foi... Ri um bocado da minha inocência na época, mais ainda do meu sofrimento de quando Kenny Bulter, minha paixão de infância, me ignorava até a morte.
Mas eu ainda assim andava de um lado para o outro. Eu estava entediada. Nervosa. Ansiosa. Minha janela estava escancarada e de cinco em cinco segundos eu fazia questão de passar em frente à ela para olhar o movimento da rua. Passava mais dez segundos esticando meu pescoço para fora dela, a fim de ver qualquer coisa fora do normal na White River. Mas tudo estava como deveria ser. A grama dos vizinhos continuava irritantemente verde, os vigilantes rondavam cada esquina como sempre, o silencio dominava a rua de acordo com as normas do condomínio.
Aquilo estava me chateando. Qualquer ruído que eu escutasse, tratava de correr, normalmente derrubando tudo que via pela frente, em direção à janela. Mas o estalido acabava por ser um gato subindo em uma árvore, ou um dos vigilantes tossindo ou espirrando. Tudo irritantemente normal.
É, talvez pensar que o incidente do dia anterior fora direcionado à mim era ilusão. E mesmo se fosse, o que me fazia pensar que aconteceria de novo? Ilusão, ilusão e ilusão. Minha mente começava a criar armadilhas para mim. Eu estava tão vidrada e inconformada com a minha situação familiar e amorosa, que começava a imaginar coisas.

Aborrecida com a minha própria idiotice, me joguei na cama, cobrindo meus olhos com um braço.
“O que está acontecendo comigo?” bufei alto. Eu não saberia me responder. Eu estava entrando em um conflito interno, onde minha razão brigava contra minha emoção, causando uma grande catástrofe dentro de mim. A confusão e incerteza eram as vencedoras constantes.

E quando todas as minhas esperanças de um descarrego desapareceram, o mesmo toque que eu havia escutado ontem, às onze e vinte e três, eu escutei novamente.
Meu coração pulou, assim como eu, que no outro momento estava de cara com a rua, vendo o mesmo carro de pintura amarela descascada estacionado frontalmente à minha janela.
Tudo pareceu embaralhar na minha cabeça, pois ao mesmo tempo em que tive uma vontade incrível de chorar, um riso explosivo de felicidade saiu da minha boca.
Eu ria pelo fato de que, todos os conflitos que me atormentavam, todas as emoções agonizantes, tudo de ruim que vagava pela minha cabeça, simplesmente sumiram. Eu poderia simplesmente colocar a vitrola para tocar Elvis Presley no meu quarto, mas a sensação de alivio não seria a mesma.
O fato de pensar que alguém se importava comigo, não importava quem fosse esse alguém, fazia com que nada de ruim pairasse sobre minha mente. É como se eu fosse à um terapeuta e ele fizesse algum tipo de hipnose...

Sibilei a canção enquanto ela tocava, vendo toda minha desordem interna extravasar.
Mas eu ainda assim estava instigada. Eu queria descer e ver quem era o autor da serenata, eu queria perguntá-lo o porquê disso tudo!
Em um impulso eu saí correndo do meu quarto, no mesmo tempo em que vi Marry sair aborrecida de seu aposento, toda descabelada e com olhos inchados.
“Quem é esse impertinente, ?” ela rosnou furiosa, descendo rapidamente as escadas, assim como eu.
“Eu não sei!” falei divertida, rindo da situação em que Marry se encontrava. Rindo do que uma simples serenata estava causando dentro daquele lar e com as pessoas que lá moravam.
“Mas você tem que saber! Que falta de vergonha é essa? Ele por acaso é seu namorado? Tenho certeza que não, já que Benjamin jamais andaria em um calhambeque como aquele!” ela continuou raivosa, e nessa hora, nós já competíamos entre quem chegaria aos portões primeiro.

Eu corria ao mesmo tempo em que gargalhava. Eu não saberia explicar por que aquela situação estava sendo tão divertida para mim...
“Abra os portões!” gritei para o vigilante em cima da pequena torre, o qual também estava visivelmente intrigado com o tal calhambeque.
“Quer que eu a acompanhe, senhorita?” um dos seguranças vinha me seguindo, enquanto eu corria em direção ao carro.
“Não, fique onde está!” falei rindo, podendo escutar os gritos de Marry atrás de mim.
“Segurem-na! Segurem-na! , volte aqui AGORA!” ela berrava inutilmente. O som do carro estava cada vez mais alto, à medida que eu me aproximava dele. Eu forçava minha visão para poder enxergar algo lá dentro, mas era fisicamente impossível.
Além da musica, eu podia escutar os murmúrios dos vizinhos, mas para mim aquilo era descartável.
Parei a alguns metros do veículo, ainda com um sorriso nada discreto no rosto.
Aquele carro, aquele simples carro infrator das regras implantadas no condomínio, era sinônimo de libertação para mim. Era como se o mundo fosse minha mente. Eu era o consciente, o dominador da razão. Era eu, pessoa, quem dizia que o certo era ignorar aquela serenata. Que o certo era mandar prendê-lo. Que o certo era obedecer Marry. E aquele que estava no calhambeque era o meu inconsciente. Ele infringia por mim, todas as regras que eu morria de vontade de burlar. Ele dizia um grande dane-se à Marry e à todos aqueles moradores hipócritas e fúteis que cochichavam a meu respeito.

Resolvi não dar nem mais um passo. Era bom que continuasse daquele jeito. Se eu descobrisse quem era o meu inconsciente, as coisas não teriam a mesma graça, a mesma malicia, a mesma razão... Quem sabe não era isso o divertido da historia. Quem sabe, o infrator não conhecia de mim mais do que eu mesma, e estivesse tentando me mostrar quem sou?

Os faróis dianteiros piscaram duas vezes, e Can’t Help continuava a tocar, dando uma trilha sonora para aquele momento.
A curiosidade culminou dentro de mim, ela era mais forte do que eu. Eu precisava saber quem era o infrator, eu precisava perguntá-lo o que ele sabia sobre mim, eu precisava de respostas...

Dei passos lentos em direção ao carro, os faróis ainda acesos e a musica ainda alta. Eu chegava cada vez mais perto e nenhuma reação do infrator.
Eu sabia que Marry gritava de fundo, mas eu estava muito concentrada em abrir ou não aquela maçaneta, indecisa se estragava ou não com aquele momento excitante. O carro continuou parado, a musica continuou tocando, como se esperasse por uma decisão minha.

Acho que ele sabia minha decisão antes que eu a tomasse, pois assim que me afastei da porta do carona, o escutei cantar pneus como da primeira vez, formar todo aquele escarcéu para sair do lugar, e ao quebrar a esquina aumentou o som no ultimo e certeiro verso da musica.

I can’t help falling in love with you.

No mesmo momento em que eu transbordava felicidade, senti algo agarrar o meu braço e percebi por sendo a mão áspera e fina de Marry. Ela começou a me puxar pelo mesmo com uma força que nunca imaginei que ela pudesse ter.
“Me solta, você tá me machucando!” falei exaltada, tentando em desvencilhar de seus dedos, que mais pareciam palitos de fósforo.
“Cale essa boca” ela disse rígida, sem alterar seu tom de voz. Olhei para os lados e os vizinhos sem ter o que fazer continuavam a, ora cochichar, ora olhar para mim com reprovação. Marry olhava para todos e lançava um sorriso forçado e nervoso, foi ai que percebi o quão encurralada eu estava.
Ela continuava andando a passos largos e furiosos, sua têmpora estava dilatada, e eu tive a impressão de que ela poderia explodir a qualquer momento.
Era inútil tentar tirar sua mão do meu braço, que já estava todo arranhado, vermelho e ardia. O máximo que eu poderia fazer era andar na velocidade que ela.
Assim que passamos pelo portão de entrada da casa, Marry me empurrou sem o menor cuidado e eu tive que me equilibrar em uma das mesinhas decorativas do saguão.

“O que você pensa que está fazendo?” ela perguntou lentamente, passando a mão em sua testa em um movimento nervoso. Eu sabia que ela estava se controlando o máximo para não avançar em mim.
“Eu não estou fazendo nada” respondi simplesmente, o que haveria de responder afinal? Eu realmente não estava fazendo nada, além de encará-la com uma enorme vontade de rir. Eu estava brincando com fogo sem medo de ser queimada. O efeito-serenata ainda afetava meus sentidos naquele momento.
“Vou te perguntar mais uma vez, . O que você pensa que está fazendo?” ela me encarou com todo ódio do mundo. Eu ainda me contorcia para não rir de tudo aquilo.
“Eu não...” antes que eu pudesse responder, num piscar de olhos, senti o lado esquerdo do meu rosto arder. Eu sabia que ela poderia me atacar, mas não acreditava que ela seria capaz. Não sou capaz de explicar o que senti no momento, demorei alguns segundos a raciocinar o fato de que Marry acabara de me dar um tapa no rosto.
“Você é uma vadiazinha, não é mesmo? Tem um namorado, educado, de família boa E RICA POR SINAL, e fica dando trela para qualquer garoto que passe na sua frente! Como eu pude criar alguém assim, meu Deus, como um monstro desse pode sair de mim?” ela estava totalmente descontrolada. Fazia gestos nervosos com a mão, andava de um lado para o outro e estava a ponto de se descabelar. Eu massageava o local onde levei um tapa, e tinha certeza que a marca dos seus cinco dedos estavam carimbados naquele lado do rosto.
“O QUE ESTÁ ACONTECENDO AQUI?” meu pai apareceu de penhoar no saguão, sua expressão entregava que ele havia acabado de acordar. Mas o choque também dominava seu rosto, e ele desceu rapidamente as escadas, parando ao meu lado.
“SUA FILHA, JOHN, ESSA SUA FILHA É UMA VADIAZINHA BARATA! SUA FILHA, PORQUE ELA SIMPLESMENTE NÃO PODE TER SAÍDO DO MEU VENTRE!” ela gritava ferozmente, apontando o dedo indicador na cara do meu pai, que envolveu seu braço em meus ombros, o que me fez encolher a fim de me proteger de Marry.
“ELA QUER ACABAR COM A NOSSA MORAL, COM A NOSSA DIGNADE, QUE DEMORAMOS ANOS PARA CONSTRUIR! VOCÊ SABE O QUE VÃO FALAR AMANHÃ NO SEU TRABALHO, JOHN? QUE NÓS NÃO SOUBEMOS CRIAR ESSA MENINA, QUE SOMOS INDIGNOS DESSA VIDA QUE LEVAMOS!” ela continuava exaltada, colocava a mão sobre o lado esquerdo do peito, como se a qualquer momento fosse ter um ataque. Eu estava tão chocada e absorta com todas aquelas palavras, que não tinha a mínima condição de responder qualquer coisa à meu favor. Eu não conseguia entender por que todo aquele alvoroço por conta de uma serenata, que eu realmente não sabia o autor dela! O que eu tinha a ver com isso? Só porque eu recebia uma serenata me condenava à taxa de vadia?
“CALE ESSA BOCA, MARRY! PÁRE DE FALAR BOBAGENS!” foi a vez de John se exaltar. Olhei para cima e ele estava tão nervoso quanto minha mãe, entretanto, visivelmente ao meu favor.
“BOBAGENS? BOBAGENS, JOHN?” ela se aproximou de nós dois, e eu abracei meu pai no mesmo instante. Ele não deixaria que aquela louca tocasse mais um dedo em mim, eu tinha certeza. “VOCÊ ESCUTOU O QUE LORI MOORE FOFOCAVA COM AQUELA RIDICULA DA ADRIANNA! QUE A PRÓPRIA JOANNE HAVIA DITO O QUE O JANTAR FORA UM FIÁSCO! MARRY NÃO DÁ EDUCAÇÃO À SUA FILHA! MARRY NÃO SABE COMO CRIAR UMA CRIANÇA! MARRY DEVIA TER VERGONHA! E EU TENHO! EU TENHO VERGONHA DE DIZER QUE ESSA GAROTA É MINHA FILHA! FIQUEI SABENDO QUE ELA DEFENDEU COMUNISTAS EM UMA DISCUSSÃO COM O PRÓPRIO CHARLES COMO ISSO É POSSÍVEL?” Marry gritava histérica, parecia oficialmente uma louca varrida, todos os empregados já assistiam o espetáculo.
“EU POUCO ME IMPORTO COM O QUE DIZEM. E DIRIA À MINHA FILHA PARA DEFENDER NOVAMENTE OS COMUNISTAS, AINDA MAIS SE FOR EM UMA DISCUSSÃO COM O PORCO DO CHARLES! DEIXE DE SER MALUCA, MARRY!” ele continuou no mesmo tom que a mulher, enquanto eu apenas não chorava devido à segurança que John estava me passando.
“Não vou deixar que vocês dois acabem com essa família” ela novamente chegou perto de nós dois, num tom mais ameaçador do que nunca. Então a vi subir rapidamente as escadas, deixando eu e meu pai no saguão, os dois absortos com o surto de Marry. Ela estava louca. Definitivamente louca. A ambição e a sociedade acabaram com toda a razão que ainda restava nela.

Senti os dois braços fortes do meu pai me envolverem e eu agarrei em sua cintura, afogando minha cabeça em seu peito. Eu soluçava de desespero e decepção.
Que tipo de mãe trata sua filha como lixo? Que tipo de mãe insiste em dizer que sua filha é a razão de sua vergonha, a razão da decadência de uma família? Que coragem teria eu de acabar com aquela família, meu Deus? Aqueles eram meus criadores, as pessoas por quem eu era mais grata por tudo que me proporcionaram! Eu poderia ser contra todos os ideais de minha mãe, mas eu jamais faria algo que a prejudicaria! Como ela não era capaz de ver que moral não era tudo? Que não podíamos viver de acordo com os pensamentos alheios, que devíamos moldar nossa felicidade de acordo com o que acreditamos!

Meu pai apalpava carinhosamente minha cabeça, depositando leves beijos na mesma, e dizia palavras confortantes para eu poder me acalmar.
Se tinha alguém que eu mais amasse no mundo, esse alguém era John . Eu idolatrava cada suspiro, cada expressão, cada palavra que saía da boca daquele homem. Era um amor incondicional, que ia além de todas as fronteiras bióticas. Ele era meu anjo da guarda em forma humana, e não existia algo no mundo que eu não faria por ele.
“Não pense em dar ouvidos à ela, minha querida. Não sei o que está acontecendo com a sua mãe, mas tenho certeza que vai passar... Acalme-se” senti incerteza em sua voz, mas eu ainda assim tinha a possibilidade de acreditar que aquele momento passaria. Mesmo essa possibilidade sendo quase remota.
“O senhor escutou o que ela disse, pai... Eu sou uma vergonha! Ela sente vergonha de ser minha mãe!” eu tropecei nas palavras, entre soluços e lágrimas, eu não era capaz de me acalmar. Mil facas atravessaram todas as partes do meu corpo a cada palavra dita por minha própria mãe.
“Não diga bobagens, ! Você não é uma vergonha, páre de drama! Você sabe que é o maior orgulho da minha vida...” ele começou apreensivo, segurando meu rosto entre as mãos. “Nenhum dinheiro me dá tanta alegria quanto você. Nenhuma conquista financeira me deu tanta felicidade quanto ver você nascer, crescer e se tornar nessa mulher madura e inteligente que você é!” John tinha um brilho nos olhos que fazia tudo dentro de mim espairecer. “Não importa o que ela pensa, não dê ouvidos ao que uma louca varrida diz! É em mim que você tem que acreditar. E eu te digo, você é quem me dá forças pra continuar nessa sociedade horrível e egoísta, minha filha. Eu te idolatro pelo fato de você não estar nem aí com o que esses doidos pensam, eu te idolatro por você fazer o que quer e, ao mesmo tempo, sempre fazer o certo! Porque eu, EU me deixei levar por toda essa futilidade, meu casamento é uma prova disso! Então não pense que você é uma vergonha... Pense que você é uma heroína por agüentar tudo isso, e você realmente é!”

A esse ponto eu não conseguia mais me controlar e as lagrimas caíam livremente em meu rosto. Mas não era por decepção ou desespero. Era de conforto por ter alguém como John por perto, por ter ele como meu pai. Ele sim era uma pessoa digna à ser herói. Ele simplesmente estava pagando alguma sina do passado por estar casado com Marry, eu presumia.
Abracei-o com todas as forças que em meus braços continha, e eu poderia ficar daquele jeito por toda uma eternidade e mais. Eu sabia que com meu pai, nada de ruim poderia me atingir, nada de ruim poderia nos acontecer.

“Agora vamos dormir. Você precisa estar preparada para terminar seu namoro amanhã” ele disse simplesmente, andando em direção à escada enquanto eu permanecia em meu lugar sem entender o que ele queria dizer. John virou-se para mim com um sorriso. “Afinal, nós dois sabemos que ele não é para você. Minha filha merece algo melhor do que um riquinho mimado e com cabeça desmiolada. Minha filha merece alguém como... Como a pessoa que anda vindo passar serenatas ultimamente...” ele deu uma piscadela e voltou seu caminho em direção às escadas, e num piscar de olhos ele já estava virando o corredor da esquerda, onde levava aos seus aposentos. John e Marry não dormiam mais no mesmo quarto, e isso não era de agora. Eles ainda estavam juntos apenas por... comodidade. E John, no fundo de seu coração, sentia pena de Marry, quem sabe por essa razão não continuava com ela, pois sabia que se divorciasse dela, a mesma suicidaria. Mulheres divorciadas eram, de acordo com a sua lógica, o exemplo da decadência feminina. Meu pai não gostaria de ter o peso de Marry em suas costas, comprovando minha tese de que ele era um anjo em forma humana.

Mas o que me intrigou profundamente, foi seu conselho sem fundamento. Certo que o que eu mais queria, no fundo do meu inconsciente, era acabar com toda aquela palhaçada que estava acontecendo entre eu e Benjamin.
Mas eu sou tola, eu acredito profundamente no potencial das pessoas. Eu acredito que elas, em um ponto de suas vidas, realizarão do quão patéticas elas são e mudarão de comportamento. Entretanto, eu acreditava que a tola da história seria eu. Que eu estava com o amor da minha vida na minha frente, mas me faltava realizar-me disso. Mas nada acontecia, nada me fazia acreditar que Ben seria tudo aquilo que eu precisava. Egoísta, eu precisava de mais. Mais do que ele podia me oferecer.

Eu sempre acreditei em meu pai, e não seria agora que eu desacreditaria. Se ele dizia que eu precisava estar preparada para acabar com esse namoro falso, eu acabaria. Estava passando da hora.



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Estávamos saindo, e eu, de mais um dia de escola. Eu já havia contado à ela sobre o dia anterior, sobre as serenatas e todo o andamento da discussão com Marry. Ela inclusive deu apoio ao conselho do meu pai, então eu estava mais convicta do que tudo à terminar meu pseudo-namoro. Podia não estar sendo uma farsa para Benjamin, mas eu, ao continuar com ele, estava mentindo para mim mesma, acabando com as possibilidades de encontrar uma outra pessoa que satisfizesse meus anseios.

Despedi-me de e, inclusive, dispensei Joel de seus serviços. Eu iria à pé até a casa de Benjamin, assim eu teria mais tempo para fazer meu discurso de término.
Eu estava nervosa. Minto, eu estava apavorada. Era meu primeiro namoro e, conseqüentemente, a primeira vez que terminaria um. O que eu diria, como escolher as palavras que expressarem tudo o que eu sentia, mas que ao mesmo tempo não magoassem o garoto? Afinal, apesar de todas nossas diferenças e contratempos, Benjamin fora um grande amigo ao longo desses – pequenos – meses.

Eu mexia nervosamente nas alças da minha mochila, olhava para meus próprios pés e sussurrava mentalmente tudo o que eu falaria, a fim de decorar meu discurso e não cometer nenhuma asneira.

Contudo, quando eu já estava à duas quadras do colégio e ia dobrar a esquina, algo me chamou a atenção.
Uma risada estridente e debochada chegou aos meus ouvidos, e uma eu soube reconhecer. Era a de .
Uma saudade insana tomou conta de mim, como eu adorava aquela risada! Como eu sentia falta de escutá-la!
Com todos esses tormentos, eu havia esquecido completamente da falta que ela me fazia, da falta que eu sentia de escutar aquela mesma risada após uma briga com minha mãe, por exemplo.
Em um impulso, toda essa saudade me fez realizar do quão idiota nós éramos de destruir uma amizade como a nossa por motivos quem nem nós mesmas sabíamos. Eu sorria por dentro com a possibilidade de poder ter minha amiga novamente. No entanto, antes que eu pudesse virar a esquina para encontrá-la, escutei algo mais.

“Então foi assim mesmo? Eu sabia que ia ser um fiasco!” uma segunda voz riu. “A não iria me decepcionar, eu tinha certeza! Ela é tão previsível!” riu debochada. Ao escutar meu nome, minha respiração se prendeu no mesmo instante. A não seria eu, não é mesmo? Existiam milhares de ’s no mundo, por que haveria de ser eu?
“Ela veio com todo aquele papo de idealismo, literatura, e todas aquelas coisas ridículas, sem nexo e entediantes de sempre. Eu sabia que ia dar no que deu” a segunda voz se comunicou finalmente, e eu definitivamente parei de respirar e meu coração parou de bater. Meus olhos saltariam das órbitas a qualquer momento, e um enjôo enorme me dominou assim que escutei aquela voz.
“Agora, quem sabe sua mãe não vê que quem é melhor para o filhinho dela não é aquela retardada, e que tem outra mais linda e encantadora que cai de amores por ele?” a escutei dizer lentamente e de um modo que parecia ser sensual.

Meu coração não se decidia entre bater fortemente contra meu peito ou não bater. Minha respiração já estava ofegante e minhas mãos tremiam.
Levei a mão até a boca, tentando disfarçar para mim mesma o choque ao ouvir aquelas palavras. Não era possível que estariam falando de mim. Não era possível que a segunda voz que eu ouvia era mesmo quem eu pensava ser. Não podia ser. Não era justo ser.

Tomei coragem, e devagar fui dando passos até a esquina, incerta do que estava preste a fazer. Eu tremia por dentro e por fora, minhas mãos suavam e eu sentia que minhas pernas desabariam a qualquer momento sem a minha permissão. Meu estômago revirava tamanho era o nervosismo, ansiedade, angustia, revolta e todo esse mixo de emoções negativas dentro de mim.
Finalmente cheguei, ainda hesitante, até o cunhal da rua, onde senti meu mundo dar milhões de voltas horárias e anti-horárias no instante em que vi o famoso Pontiac preto e bem lustrado juntamente com seu dono, o qual encostava-se à porta do carona e tinha a minha – antiga – amiga o pressionando contra o mesmo. Benjamin possuía as mãos firmemente envolvidas na cintura da garota, e os dois se beijavam calorosamente.
Eu estava estática.
Meu consciente ainda tentava racionar aquela fração de instante, eu procurava motivos para desacreditar no que eu estava vendo. Pensei que poderia ser fruto da minha imaginação, pensei estar sonhando e de tanto querer que algo de errado acontecesse no meu namoro para eu ter uma razão de término, aquilo estaria me perseguindo. Mas era tudo muito real. Eu nunca havia tido um sonho tão real como aquele...

‘Acorde, eu dizia à mim mesma, forçando meus olhos um contra o outro. Eu tinha certeza de que quando os abrisse, tudo aquilo sumiria e eu acordaria com a convicção de terminar normalmente com Ben.

Os abri, um pouco mais calma, mas me assustei ao ver que aquela imagem de Benjamin beijando promiscuamente à minha frente. Eu não sentia coisa alguma. De repente senti um clarão em minha mente e não me via mais como um ser racional.
“BENJAMIN!” eu tive a capacidade de gritar, e agora me pergunto de onde tirei aquela coragem. Repito, o choque fora tão grande que eu não estava mais em plena consciência. Eu não estava mais sã.
Os dois indivíduos se afastaram imediatamente, e um me olhava com mais choque que o outro. arrumou sua roupa, amassada pelo fato de estar quase fazendo sexo com meu namorado em plena rua publica. Benjamin limpou a boca e veio correndo em minha direção, mas eu não fiquei parada. Corri pela direção contraria, eu não queria vê-lo, não queria escutá-lo, não queria saber que um dia ele possa ter existido.
Meus olhos estavam embaçados e ficava cada vez mais difícil de enxergar algo à minha frente. Eu não chorava, eu urrava. Urrava pela dor da traição.
, ESPERE!” ele gritou. Escutei uma outra voz gritar por mim, mas fiz questão de ignorar e continuar correndo.
Eu queria fugir dali, queria correr para o lugar mais distante e desabitado de Bolton.
!” agora a voz feminina ficava cada vez mais perto de mim, mas eu não pararia. Eu jamais pararia. Entretanto, minhas pernas não pareciam obedecer. Elas não queriam correr mais do que aquilo, mas eu precisava que elas o fizessem!
Senti que eu poderia cair a qualquer momento, uma vez que as lágrimas me impediam de ver tudo com nitidez.
“Você irá me escutar, garota” escutei claramente atrás de mim, no mesmo instante em que senti meu braço ser puxado por alguém.
Dei de cara com , do mesmo jeito que eu me lembrava, porém ela parecia um ser nojento, sem escrúpulos.
“ME SOLTE!” gritei ferozmente, tentando desvencilhar de suas mãos tão firmes e finas quanto as de Marry. O pranto ainda rolava em meu rosto, mais de raiva do que de dor. Talvez tanto de raiva quanto de dor.
Mas ela não me soltou. Continuou a me segurar fortemente enquanto eu me debatia.
“PÁRE DE SER TÃO INFANTIL!” ela gritou contra mim. Eu não tinha forças. Não sabia se chorava, se tentava me livrar de ou se parava em pé. Não daria conta de fazer os três ao mesmo tempo. “SUA IDIOTA! TROUXA! POR QUE ESTÁ CHORANDO?” ela continuou agressiva, eu não tinha capacidade de responder. Ora soluçava. Ora me debatia. Implorava para que ela me soltasse silenciosamente, mas ela não iria me atender. “VOCÊ NÃO TEVE A CAPACIDADE DE PENSAR QUE BENJAMIN GOSTAVA DE VOCÊ, NÃO É MESMO? ESSA POSSIBILIDADE NÃO PASSOU PELA SUA CABEÇA, POR FAVOR, ME DIGA QUE NÃO! SE SIM, EU ACABO DE PROVAR O QUÃO RIDICULA E INGÊNUA VOCÊ É!” soltou uma risada extremamente cínica e estridente, que quase fez meus tímpanos estourarem.
“Por que você acha que ele estava com você?” ela olhou profundamente em meus olhos, mas eu desviei meu roso, olhando para meus sapatos, ainda chorando silenciosamente e incapacitada de dizer uma coisa se quer. “Hein?” ela insistiu, balançando-me pelos ombros.
...” Benjamin a chamou.
“NÃO, BENJAMIN! ELA TEM QUE ESCUTAR! EU QUERO QUE ELA ESCUTE TUDO, CADA PALAVRA! QUERO ACORDAR ESSA GAROTA PARA A VIDA!” outra risada sarcástica. “Você é rica, minha querida. Você tem essa sorte. Se não fosse por isso, quem teria a coragem de chegar perto de alguém tão patético? Vamos lá, olhe-se no espelho! Nem para o prefeito você conseguiu fingir um pouco de educação! Você é alienada, vive nesse mundo de sonhos esperanto seu príncipe encantado! Pare de sonhar e acorde para a vida! Não há príncipes encantados para pessoas perdedoras como você, . Nunca haverá! Você não é Julieta nem nunca será! Benjamin a tratava como tal apenas porque sabia que você cairia de quatro por ele e assim, quem sabe casar, ter filhos e colocar a mão na sua herança, huh? Mas sabe quem seria o grande amor da vida dele? EU! Sabe quem é a Julieta da história? SOU EU! Sabe em quem ele pensaria todas as noites antes de dormir? EM MIM! SEMPRE FOI EU, EU E SOMENTE EU NA VIDA DELE, ! E VOCÊ APARECEU PARA ESTRAGAR TUDO! ESTRAGAR O MEU CONTO DE FADAS, SÓ PORQUE VOCÊ NUNCA CONSEGUIRIA UM PARA VOCÊ!” cuspia friamente a verdade em minha cara. O ódio me consumia. A antipatia me dominava. Eu havia levado dois tapas na cara de uma vez só. Um da minha melhor amiga e outro do meu namorado.

Quem sabe ela realmente não havia atingido o objetivo dela? Aquelas verdades serviram como um grande balde d’água para de me acordar de um sonho que nunca existiu.

Funguei, e com todas as minhas forças restantes, relutei contra as lagrimas cheias de ódio que ainda rolavam em minha face. Fechei meus olhos e meus punhos, me contendo de cometer qualquer ato de tão baixo nível quanto o de . Eu respirava profundamente, sentindo meu peito inchar e desinchar lentamente. Em segundos atingi a calma.
‘Nunca deixe que alguém roube sua fé e seus sonhos, lembrei-me das palavras de meu pai. ‘Nunca deixe que alguém lhe tire o que há de mais precioso na vida. Ninguém tem esse direito. Nem mesmo você.’

“Quem é você para me falar sobre alienação?” falei lentamente, ainda de olhos fechados. “Alguém como você? Tão inteligente quanto uma porta?” olhei-a fixamente. Vi que estava incrédula com a minha audácia repentina. “Quem é você para se comparar à Julieta quando ao sabe nem ao menos o que é amar? Quem te garante que Benjamin não irá te trocar amanhã por alguma mais rica do que eu? Você é quem precisa acordar para o mundo . Não eu.” Conclui friamente, dessa vez jogando toda a verdade, fria e cruel do modo como ela era. A vi abrir e fechar a boca algumas vezes, procurando algo para rebater, mas não havia respostas. Eu tinha certeza de todas as respostas, e parecia refletir chocada sobre os fatos. Soltei meu braço bruscamente de suas mãos, dei as costas e andei a passos largos na direção oposta àquelas duas pessoas desprezíveis. Mas um deles fez mais. Novamente senti meu braço ser puxado e a figura de Benjamin se formar à minha frente. Eu queria cuspir em seu rosto de tamanha a minha repulsão.
“Espere, , deixe-me explicar” ele começou mas eu cheguei à conclusão de que jamais gostaria de escutar uma palavra sequer vinda daquela boca.
“Seja feliz, Benjamin” falei simplesmente e dei as costas novamente.

Comecei a vagar por aquelas ruas movimentadas do centro da cidade.
Eu ainda estava incrédula. Certo, eu queria terminar tudo, mas não dessa maneira. Eu preferia não ter visto aquilo. Eu preferia não ter sido duplamente apunhalada. Mas estava tudo finalmente acabado, não estava?
Agora eu poderia tirar um peso das minhas costas e colocar um mais carregado.
Coloquei as mãos dentro dos bolsos do meu moletom e senti minha raiva passar à medida que eu andava. Não havia nada que eu pudesse fazer sobre aquilo. O que estava feito, estava feito, não tinha como mudar. Mais um sonho despedaçado.

Prefiro pensar que era para acontecer. Simples assim.
As coisas não acontecem por acaso... Para tudo há uma razão...

Não sabia onde eu estava. Talvez a umas dez quadras do colégio. Ou mais. Ou menos. Agora, somente a decepção era minha companheira. Ela andava lado a lado comigo.
Olhei em meu relógio de pulso e ele marcava uma e quinze da tarde. Eu não iría almoçar, não estava com um pingo de fome. Depois inventaria alguma desculpa para me justificar com Marry.
Resolvi continuar com minha caminhada.

Só realizei onde estava quando comecei a ver o movimento de carros diminuir e o asfalto ser substituído por pedregulhos.
Eu havia andado esse tanto mesmo?
Estava chegando perto do Cegran Lake, o lago que corta a cidade de Bolton. Eu realmente havia ido longe.

Andei pela trilha que dava direto ao lago, e uma sensação de alivio me invadiu no imediato momento em que eu adentrei aquele parque.
Eu sabia o porquê de estar lá. Minhas pernas me levaram automaticamente.
Desde que me entendo por gente e aprendi a andar sozinha pela cidade, o Cegran Lake se tornou meu abrigo após meus conflitos ao longo da vida. Depois de brigas com Marry, aquele lugar sempre era minha parada obrigatória.

Havia um enorme gramado em torno do lago, onde havia bancos espalhados em todo canto e os casais se sentavam e trocavam caricias. Talvez aquela não fosse à imagem que eu gostaria de ver naquele momento.
Também havia pessoas espalhadas pelo gramado, algumas lendo debaixo das sombras das arvores, outras faziam animados piqueniques.

Caminhei até a beira do lago e ali me sentei. Eu escutava o murmúrio das pessoas ao meu redor e o canto dos patos a minha frente, mas o eco na minha cabeça era maior. Nem sabia ou entendia o que rolava ali de tão anestesiada que eu estava.
Passaram-se dez, vinte, trinta minutos, não tinha a mínima idéia, tentando apenas montar aquele quebra-cabeça que havia se formado em minha mente, mas a presença de alguém ao meu lado me despertou. Não me dei ao trabalho de ver quem era, não me importava.

Fechei um pouco os olhos, protegendo-os dos feixes de luz que refletiam no lago a minha frente, e apertei os joelhos contra meu corpo, fazendo-os de encosto para minha cabeça.
“Dia difícil?” escutei essas palavras vindas da pessoa ali do meu lado. Inevitavelmente arregalei meus olhos.
“O que você está fazendo aqui?” perguntei visivelmente assustada ao ver quem era. . Por que ele tinha essa mania de aparecer do nada nos lugares?
O vi virar a cabeça em direção ao lago, de modo que a luz do sol batia em seu rosto e deixavam seus olhos mais claros que o normal. Ele os fechou um pouco.
“Eu gosto de vir aqui. Sempre venho” ele disse simplesmente.
Eu sempre venho aqui. Nunca te vi” o desmenti. E era verdade. Eu venho a esse parque há muitos anos e jamais havia visto ou qualquer um dos meus amigos ali. Talvez eles nem soubessem da existência daquele lago.
“Você nunca me percebeu. É diferente” continuou ele sinuoso, com um tom divertido em sua voz e um pequeno sorriso em seus lábios. Fiquei um pouco envergonhada. Seria verdade? “Mas eu sempre te percebi aqui. Você sempre fica sentada aqui, e eu sempre fico sentado ali” ele apontou para uma árvore a uns três metros de onde estávamos. “Você sempre chega batendo os pés de raiva, algumas vezes chega a arrancar alguns cabelos antes de sentar...” continuou com aquele tom divertido e seu sorriso agora era menos discreto e minha vergonha era maior. “Daí tem vezes que você se espalha no chão e começa a chorar. Sabe, teve um dia que você soluçava tanto que pensei em ir até você e perguntar se estava tudo bem, mas fiquei com medo de apanhar...” ele finalmente virou seu rosto para mim, e somente um lado de seu rosto estava iluminado, dando realce aos seus cabelos
“Me desculpe por nunca te perceber aqui... Na verdade nunca percebo ninguém...” ri nervosa, vendo-o soltar um riso abafado. “Normalmente quando venho, é porque algo de ruim aconteceu... Como você disse, um dia difícil...” olhei para frente, evitando o par de olhos de sobre mim, me questionando silenciosamente.
“É, eu percebo isso... Você sempre está tensa quando vem aqui...” de relance, o vi desviar seu rosto para frente também. “Se quiser conversar, estou aqui...”
Nada respondi. Mantive o silêncio entre nós. Eu não queria conversar sobre aquilo, preferia esquecer, apagar todos os flashes de hoje da minha cabeça. Nunca mais ter que lembrar desse dia.
Mas quem sabe, se eu desabafasse com alguém, aquela angustia que amarrava meu peito não passasse? Mas conversar com ? Não seria mais cabível conversar com , minha melhor amiga?
“Benjamin é o ser mais desprezível que eu já conheci!” vomitei as palavras de uma vez. Eu não agüentaria guardar aquilo só para mim. Eu precisava descontar minha raiva em alguém. Eu continuava a olhar em direção ao lago, e vi prestar atenção em mim. Continuei. “Todo esse tempo ele estava com ! Com a ! Dá para acreditar? Agora tudo faz sentido! Agora sei porque ela estava tão agressiva comigo! Eu supostamente estraguei o romancezinho entre ela e Benjamin! E a otária aqui acreditando que ele poderia sentir algo por mim, que um dia casaríamos e formaríamos uma família? Olhe o quão ridícula eu sou! Nunca fui tão humilhada na vida quando vi os dois se beijando!” falei tudo tão rapidamente que não sabia se entendera uma palavra do que eu disse. Bufei e segurei meu rosto com as duas mãos, envergonhada tanto com o meu surto, quanto a admissão do meu próprio fracasso. Não escutei nada vindo de , talvez ele não tivesse entendido bulhufas do que eu havia dito...
“Até que enfim...” ele disse vagamente, olhando novamente para o lago.
“O que disse?”
“Até que enfim você descobriu” ele repetiu, agora acrescentando algumas palavras e me deixando chocada. Até que enfim eu descobri? Isso quer dizer que ele sabia que eu era uma otária e não havia me contado?
“Você sabia?” eu falei em um tom mais alterado, meu rosto expressava a minha fúria. Ele concordou silenciosamente, aumentando ainda mais a minha raiva.
“VOCÊ SABIA QUE BENJAMIN ME TRAÍA COM UMA DAS MINHAS MELHORES AMIGAS E NÃO ME DISSE NADA? O QUE É? ERA ENGRAÇADO ME VER COM CARA DE PALHAÇA APAIXONADA E O VER FINGINDO ENQUANTO SAÍAMOS?” me levantei bruscamente e comecei a gritar em pleno parque. Todos me encaravam como se eu fosse louca, mas naquele momento eu não estava me importando muito.
continuava sentado, com aquela expressão tranqüila no rosto que estava me irritando profundamente. “QUE É, NÃO VAI ME RESPONDER? VAI ME DEIXAR PARECENDO UMA LOUCA CONVERSANDO SOZINHA?” o sacudi e então ele me olhou sério.
“O que você queria que eu fizesse, ? Era você quem namorava Benjamin, não eu. Eu pelo menos sabia muito bem como ele era, mas você estava cega demais para enxergar quem era o verdadeiro Ben disse friamente, agora sem me encarar.
“E você achou que seria certo me deixar cega esse tempo todo? Que grande amigo você é!” continuei no mesmo tom agressivo, agora mais irritada do que nunca com o modo que ele apresentava os fatos. Então, bruscamente, ele se levantou e ficou de frente para mim. Muito perto de mim.
“Amigo? Quem é que sempre fez questão de deixar claro que nós nunca fomos amigos? Eu, ? Huh? Não que eu me lembre!” respondeu rispidamente, no mesmo tom irritado que eu. Admito que me assustei, jamais vi alterado daquela maneira. Acho que talvez eu tenha passado dos limites e descontado minha raiva em cima dele... Não importava, a discussão já estava em andamento. “E eu pensava que você era esperta o suficiente de descobrir por si só” ele disse, como se finalizasse nosso bate-boca. O vi dar as costas para mim, mas eu não o deixaria partir assim. Eu precisava de respostas!
“Desculpe a decepção, , mas eu nunca fui esperta o suficiente! Eu sempre fui essa otária e ingênua que acredita em cada palavra dita por todos! Já que você se julga tão esperto, não pense que todos têm que ser como você!” falei assim que o puxei pelo braço, fazendo-o virar de frente para mim. Acho que o deixei sem palavras, já que ele ficou alguns instantes sem dizer nada. Eu estava tão tensa que minha respiração saia em pesada, e meu peito movia-se rapidamente.
“Me desculpe. Eu não devia ter dito isso” ele disse vagamente. Não me encarava, olhava para os próprios pés, deixando alguns fios de sua franja caírem sobre sua face.
“Não. Você tem razão” e ele realmente tinha. Eu deveria ter prestado atenção nos sinais, que estavam tão óbvios e estampados na minha cara.
“Não, não tenho! Benjamin é um ótimo ator, . Qualquer um acreditaria nele. Na verdade, todo mundo acredita. Eu sou o único que sabia do caso dele com a , , mas somente porque os flagrei um dia desses. Na verdade, faz um bom tempo. Por isso fiquei tão assustado quando descobri que ele havia te pedido em namoro, pois eu sabia que ele ainda estava com a ...” disse, agora encarando novamente o lago, enquanto eu o olhava apreensiva. “Não pense que eu não te contei porque queria a ver sofrer ou algo do gênero. Nunca!” ele, agora, me encarava com avidez. “Se eu pudesse, teria te contado no primeiro segundo depois dele ter a pedido, mas eu não podia, . Simplesmente não podia!” parecia agoniado, vi que seus punhos estavam fechados com voracidade, mostrando sua inquietude.
“Por que não?” havia uma curiosidade e nervosismo na minha voz, e eu implorava para que ele continuasse. balançou sua cabeça, movendo seus cabelos juntamente.
“Benjamin pode se tornar muito perigoso e ambicioso quando se trata de algo que ele quer, . Quando ele quer algo, ele simplesmente consegue. Está na natureza dele, na educação que os o deram. Como ele sabia que eu estava ciente do romance dele com a ao mesmo tempo em que ele mantinha um com você, ele fez questão de ter certeza que eu manteria minha boca fechada. E o jeito que ele conseguiu fazer isso, foi me ameaçando...” a cada palavra que dizia, mais chocada que ficava. O olhei apreensiva, pedindo para que continuasse. Ele o fez. “Ele ameaçou fechar o bar do meu pai... Você sabe que Benjamin é muito convincente, e ainda mais tendo o pai como prefeito, eu sabia que ele seria capaz de fazer isso se eu dissesse um pio à você. Eu não poderia me arriscar, . Aquele bar é tudo para o meu pai desde que a minha mãe faleceu. É a vida dele, a única válvula de escape que ele tem para esquecer de tudo à volta dele. Você não imagina o quão feliz ele fica ao acordar e saber que vai para lá, e o quão triste ele fica ao sair...” tinha um tom de voz incrivelmente infeliz, a cada palavra dita eu sentia meu coração apertar. Ele não olhava diretamente para mim, nem sabia se ele estava conversando comigo ou se estava pensando alto.

Um sentimento muito forte percorreu todo meu corpo, um sentimento de proteção, de amparo... Eu não poderia deixá-lo naquele estado... Como eu era egoísta de pensar somente em mim, de acusá-lo injustamente e pensar que tudo estava tão ruim sem me realizar o quão banal aquilo parecia ser perto das coisas que dissera...
O sentimento protecionista dentro de mim eclodiu, e de repente eu vi minha própria mão indo de encontro à do garoto. Ele ainda tinha seu punho fechado ferozmente, mas assim que ele sentiu o toque de minha mão, pareceu relaxar os músculos. Ele ainda não me olhava, continuava a encarar o nada com uma feição tristonha... Então eu entrelacei os nossos dedos sinuosamente, do modo mais delicado possível, a fim de mostrá-lo que eu estava ali para ajudá-lo no que fosse preciso. O senti apertar minha mão com cuidado, como se aquilo fosse uma resposta...
“Desculpe-me por esconder isso de você, ...” vi fechar seus olhos fortemente, enrugando sua testa como se forçassem-nos a se manterem fechados. “Você não tem idéia do quanto eu me martirizava a cada dia que o via te tratar como princesa, mas no fundo era tudo puro interesse... Me doía tanto te ver com aquele sorriso imenso perto dele, enquanto ele não merecia nem um aperto de mão vindo de você... Por favor, diz que me perdoa...” ele mantinha os olhos fechados e sua voz estava rouca. Eu pensei que ele poderia chorar ou desabar a qualquer momento... Não havia o que se perdoar. Eu é quem deveria estar pedindo desculpas pelo meu cego egocentrismo!

[coloquem essa música para tocar agora]

“Eu é quem te peço desculpas pelo modo como falei com você, ...” falei baixinho, olhando envergonhada para os meus próprios pés. Senti os dedos dele acariciarem minha mão. Naquele momento, eu me sentia aliviada... Sentia que o mundo havia saído de cima de minhas costas e não havia mais nada ao nosso redor.
“Por favor, apenas diga que me perdoa...” ele falou no mesmo tom, olhando-me nos olhos finalmente. Percebi que estes estavam vermelhos e intensos e eu não conseguiria encará-los por muito tempo...
“Eu perdôo...” respondi tão vagamente que quase não me escutei.
Vi um sorriso singelo brotar em seus lábios e sem que eu mandasse, um apareceu nos meus também.
Vi sua mão livre se levantar lentamente, e a senti encostar-se a meu rosto. Foi inevitável fechar meus olhos assim que ele começou a acariciar carinhosamente uma de minhas bochechas. O sorriso modesto ainda estava estampado na minha cara, e eu sentia que a qualquer momento ele poderia aumentar.
levou sua mão até meus cabelos e colocou alguns fios de minha franja atrás da orelha. A cada toque seu, eu sentia minhas pernas bobearem, sentia minhas mãos pingarem de nervosismo, sentia meu estômago revirar dentro de mim... Eu não ousei abrir meus olhos e dar de cara com os dele, eu sabia que não agüentaria vê-los tão de perto...
Mas pude sentir que ele se aproximava à medida que podia escutar sua respiração pesada. Chegou a um ponto em que eu podia senti-la bater contra meu próprio nariz, e no mesmo instante pensei que iria desmaiar de tão entorpecida... O cheiro dele me invadiu, fazendo-me questionar o porquê de ainda conseguir estar de pé.
Agora, suas duas mãos estavam concentradas em meu rosto e sua testa se tocou com a minha, assim como nossos narizes.
Eu simplesmente me deixei levar pelo momento. Talvez eu estivesse um pouco frágil demais, carente demais, entorpecida demais... Irracional demais...
Por alguns instantes eu esquecia quais eram os movimentos que eu deveria fazer para poder respirar, pois o ar que entrava dentro dos meus pulmões, saía totalmente desordenado e descompassado.
Isso tudo piorou no momento em que senti seus lábios quentes tocarem minha bochecha esquerda. E piorou um pouco mais quando ele tocou a direita. E gradativamente quando tocaram minha testa.
Inconscientemente, levei minhas mãos até às dele, segurando-as com firmeza, mas sem tirá-las do lugar. Apenas movi uma sutilmente de encontro com meus lábios, de modo que pude dar alguns leves beijos sobre a mesma, enquanto sentia sua respiração ficar mais pesada ao longo dos segundos.

De repente, elas se afastaram de mim, mas as senti sendo apertadas ferozmente contra minha cintura, no mesmo tempo em que senti meu corpo sendo pressionado contra o de . Imediatamente envolvi sem pescoço com meus braços e afundei meu rosto em seu pescoço, inalando o máximo de seu cheiro que eu conseguia.
Senti seu nariz encostar de leve em minha bochecha e sua boca se aproximar de minha orelha, me fazendo arrepiar a cada milésimo. E então, escutei sua voz soar como canção bem perto de mim, dizendo:
“Eu sempre vou estar aqui, ... Até mesmo nos dias em que você não me perceber...”



Capítulo 13.
                                          Can't stop the train, gotta let it roll on


Eu e ficamos no parque até o guarda do local nos expulsar, dizendo que era hora de fechar. Foi só ai que percebi que eram oito da noite e eu não tinha dado sinal de vida para minha família. Eu iria escutar muito assim que pisasse na mansão. Pouco me importava.

O próprio havia me dado um bom conselho hoje. Na verdade ele sempre parece dizer as coisas certas no momento certo... Chegava a ser meio estranho. Nem mesmo me dizia coisas tão profundas que me fizessem refletir tanto.

“O ser humano é o animal mais azarado do mundo” ele disse. “Por ele ser pensante, tem a capacidade de carregar um fardo do passado, pensando no futuro. Isso é algo lógico para nós, mas muitas vezes esquecemos do presente, de viver este instante, por medo do que isso poderá acarretar no futuro... Não vivemos o presente por medo de cometer os mesmos erros do passado, enquanto devíamos estar preocupados em concertá-los ou aprender com eles... Esqueça tudo sobre o que pode acontecer... Possibilidades são relativas. Você pode fazer acontecer. Você pode escolher ficar arrasada por causa de Benjamin, chorar até que seus olhos caíssem e nunca mais se relacionar com alguém. Ou você pode escolher esquecer, ignorar, aprender algo com tudo isso que aconteceu. Se tornar mais forte. Rir da situação; Colocar isso no passado e deixar lá pra sempre! E por fim, procurar alguém que te mereça. Acho que essa é a parte mais difícil...” essas foram suas palavras. Me tocaram profundamente, devo admitir.

Eu sempre vivi do meu passado, pensando no meu futuro, mas nunca vivenciei necessariamente o presente. Pensando nas conseqüências dos meus atos, no que isso poderia acarretar no momento seguinte... Como havia dito: somos seres pensantes. Eu era pensante demais. Nunca agi impulsivamente, nunca deixei uma emoção me dominar completamente, nunca havia me entregado à alguém inteiramente... Precisava de uma vida de cão. Literalmente.

“Por que será difícil de encontrar?” lembrei-me de ter perguntado, desanimada por essas palavras finais.
“Porque não sei se existe alguém que realmente te mereça” ele respondeu simplório, sem me encarar. Naquele momento, o sol começava a se pôr, dando lugar a um céu alaranjado com rajadas vermelhas. Estávamos deitados na grama e olhávamos para cima sem nos encaramos.
“Se você pensar assim, eu vou morrer velha, careca e com os peitos caídos...” falei meio alheia, rindo da baboseira que havia dito logo após. Fui acompanhada por uma risada estridente do meu lado.
“Seria um desperdiço” disse depois de cessar as risadas. Suspirou e colocou uma mão sobre seu tórax. “O que eu quero dizer é que a pessoa que te merece, tem que ser praticamente perfeito” ele completou, ainda olhando para o céu sobre nós.
“Não quero alguém perfeito. Perfeição tem seus limites” falei mais para mim mesma que para .
“Já é um começo” o garoto disse, apoiando os braços atrás da cabeça. Não entendi o que ele quis dizer com isso e ainda pensei tê-lo escutado dizer algo como “bom para mim”, mas acho que foi impressão. pode parecer meio louco às vezes.

Silencio.

“O que eu mereço, ?” cortei o silencio agradável, onde só escutávamos o canto dos grilos ao nosso redor. O céu já estava parcialmente escuro, mas alguns feixes de luzes ainda persistiam lá em cima e brilhavam contra o rosto de . Agora eu o encarava sem receio. Mas arrependi-me no momento seguinte em que percebi o tamanho da perfeição que dele reluzia. mantinha os olhos cerrados, mas eu ainda assim podia ver o brilho que neles continham. Seu nariz era tão bem moldado que senti uma pontada de inveja. Suas bochechas levemente rosadas, sua boca entreaberta, seus cabelos bagunçados de uma forma tão charmosa e alguns fios caiam sobre sua face... Tudo parecia impecável... Indefectível...

Continuei a encará-lo admirando o nada, esperando ansiosa por uma resposta. Então vi seu rosto mover-se lentamente para meu lado, ficando perigosamente próximo. Eu novamente senti-me tonta, frágil, fraca...

“Você vai ter que descobrir o que é melhor para você...” ele respondeu vagamente, quase que em um sussurro.

Engoli seco.

“Será que... você poderia me ajudar a descobrir?” falei no mesmo tom, vendo a busca por palavras ser um desafio enorme. Meus olhos se decidiam entre os dele e sua boca, não sabendo para qual dar mais atenção.
sutilmente balançou a cabeça de modo negativo. Eu teria que descobrir.
Será que seria algo tão difícil a fazer?

E foi ai que o guarda nos interrompeu.

No momento em que eu ainda estava louca por respostas e mais tempo com o garoto ali do meu lado.
Nesse dia, percebi o quão misterioso era, e o quão doida eu estava para desvendar todos seus mistérios.
“Vamos, deixe-me te levar até em casa...” ele disse após o guarda nos avisar sobre o fechamento do parque. se levantou e estendeu uma mão para me ajudar a fazer o mesmo.
“Você está de moto... de novo?” perguntei com um pouco de insegurança enquanto caminhávamos para a saída do local.
“Não me diga que ainda tem medo!” ele disse com um tom de deboche e eu tive que negar para não parecer muito ridícula.

Enquanto caminhávamos, senti que havia um monstro uivando dentro de mim. Senti minhas bochechas rosarem drasticamente, já que foi um barulho estrondoso e me olhou no mesmo instante.

“Você está bem?” ele perguntou preocupado. Lembrei-me de um pequeno detalhe: eu estava sem comer desde o café da manhã. Como eu me mantive de pé por todo esse tempo?
“Sim, por que não estaria?” forcei uma expressão qualquer, enquanto sento minhas pernas bambearem e minha cabeça girar.
“Você por um acaso almoçou hoje, ?” perguntou, soando autoritário, exatamente como John.
Olhei para as árvores à nossa volta, ignorando totalmente sua pergunta.
“Como eu sou tão idiota de te deixar sem comer a tarde inteira?” ele falou um tanto irritado para si mesmo. Achei uma graça toda aquela preocupação, e eu sabia que estava sorrindo debilmente. Fome me deixa retardada, essa era a única explicação.

gentilmente me ajudou a subir na moto, subiu em seguida e a engatou. “Segure-se firme em mim” ele disse um pouco alto e eu imediatamente fiz o que mandou. Envolvi, sem vergonha alguma, minhas mãos em sua cintura, juntando nossos corpos o máximo que aquele pequeno espaço permitia. Mas não foi só isso. Encostei minha cabeça em suas costas, bem perto de sua nuca. Não sei se era a fome que crescia ou era o cheiro que vinha do pescoço de que estava me deixando mais tonta. Acho que até dormi...
Não sei ao certo quanto tempo demorou, mas de repente estávamos em uma praça movimentada da cidade, onde havia um pequeno parque de diversões e várias barraquinhas de comidas e bugigangas.
me ajudou a tirar o capacete e a descer da moto, dando-me o braço em seguida para que eu me apoiasse.

“O que você quer comer?” ele me perguntou enquanto andávamos entre o amontoado de gente. Eu não estava muito em condições de escolher, o que colocassem na minha frente, eu devoraria. Mas um incrível cheiro de cachorro-quente invadiu minhas narinas e eu me senti tentada.
Puxei a mão do garoto e corri em direção à barraquinha mais próxima, podendo escutar seus risos atrás de mim.
“Um completo?” perguntei a ele assim que chegamos.
“Não estou com fome” respondeu singelo com um sorriso. Não estava em condições de discutir, então simplesmente me virei e pedi um cachorro-quente completo para mim.
Eu esperei ansiosamente por ele, posso dizer que foram os cinco minutos mais demorados da minha vida.
“Por que não vai pegar uma mesinha para a gente? Eu pego seu cachorro-quente” senti uma mão ser depositada na minha cintura e o hálito quente de bater contra minha orelha. Concordei e apalpei meus bolsos a procura de algumas moedas para pagar minha refeição. No mesmo tempo, vi pegar sua carteira e dar uma nota à moça do balcão.
“Hey, o que está fazendo?” perguntei indignada, vendo-o me ignorar totalmente e pedir um refrigerante. Ele agradeceu a moça, pegou meu lanche e o refrigerante e se virou para mim.
“Te pagando um jantar” ele disse divertido, indo em direção às mesinhas que ficavam ao redor das barracas. Não tive como contestar já que ele disparou na minha frente, então resolvi simplesmente o seguir.
Assim que nos sentamos, não pude evitar, tive que devorar aquele sanduíche na minha frente, depois eu me preocuparia com os bons modos.
Eu comia com todo o gosto do mundo, como se aquela fosse a ultima refeição da minha vida.

Percebi que me observava e uma ponta de vergonha me abateu. Diminui a velocidade das mordidas e limpei os cantos da minha boca com um guardanapo.
“O que foi?” perguntei meio sem graça, olhando para os lados a fim de disfarçar minha timidez. soltou um risinho e mexeu a cabeça negativamente, sem responder. “Fala!” insisti agoniada.
“Não é nada!” outro risinho. Encostei o cachorro-quente na mesa e cruzei os braços. “Não pare de comer por minha causa, vamos! É bonitinho ver você comer...” ele disse com um sorriso.
Aquilo era um tanto quanto... Bizarro.
“Você é meio estranho, ...” rolei os olhos e continuei comendo. Minha fome era maior que qualquer outra coisa. “Hm, exe é u melhor xantar que eu xá tive!” falei de boca cheia, podendo escutar os risos de . Posso dizer que aquilo era muito melhor que um jantar de cinco estrelas com a família , que me desculpasse.
“Um dia vou te dar um jantar decente” escutei dizer e inconscientemente senti minha garganta fechar e engasguei. Enquanto sofria um ataque e quase morria, o garoto à minha frente apenas colocou um sorriso simples em seu rosto.
“Um jantar... de verdade? Você quer dizer como em um encontro?” gaguejei debilmente. Será que era isso mesmo que ele queria dizer? E se fosse, o que eu deveria responder?
balançou a cabeça afirmando meus pensamentos.
“Você aceitaria?” me perguntou. E essa era a pergunta que eu temia responder. Eu ainda estava confusa com os pensamentos totalmente embaralhados e emoções distorcidas. Uma parte de mim pulsava em dizer sim, enquanto a outra lutava em recusar. Eu era um poço de contradições.
“Não precisa responder agora” ele disse após alguns instantes esperando uma resposta minha. Respirei aliviada e procurei olhar algo que não fossem aqueles olhos tão persuasivos.
“Quer dar uma volta?” ele novamente quebrou o silencio entre nós.

Eu na verdade precisava ir embora. A companhia de era esplendida e confortante, mas eu precisava de alguns momentos me torturando sozinha, buscando alguma solução para as minhas complicações. E, além disso, eram quase onze da noite e apenas uma coisa me preocupava: perder meu show particular. Sim, eu me referia às serenatas.
Durante todos os dias da semana, sem falta alguma e total pontualidade, às vinte e três horas e vinte e três minutos, o mesmo carro de pintura amarela descascada continuava a alegrar minhas noites e infernizar as de Marry. Eu já havia me despreocupado em saber quem era o autor, realmente não importava. Tudo que fazia diferença era o modo como ele me fazia sentir: anestesiada... aliviada...
Eu não entendia como uma simples serenata mexia tanto comigo. Na verdade havia muitas coisas as quais eu não entendia ultimamente.

“Só me leve para casa, por favor...” falei simplesmente. deu de ombros e sibilou um ‘okay’.
“Vai jogar boliche amanha conosco?” me perguntou enquanto andávamos desapressados pela praça, que já estava praticamente vazia. Havia alguns brinquedos abertos onde suas luzes coloridas piscavam cintilantes.
“Acho que sim... vai me buscar em casa...” respondi olhando para as poucas pessoas que ainda passavam por nós. apenas murmurou ao meu lado.

Ao chegarmos na moto, o garoto me entregou o capacete e me ajudou a subir na moto. Eu estava realmente ficando desinibida para andar naquela coisa... Na verdade quando se acostuma, quando se perde o medo, andar naquela moto pode ser algo realmente libertador.
enguiçou-a e entramos em movimento. Agarrei-o imediatamente sem pudor algum. Ele estava com uma jaqueta preta de couro sobre o corpo, mas aquilo não me impedia de sentir o toque de sua pele contra a minha, ou pelo menos imaginar... O vento corria ao nosso lado, me fazendo arrepiar algumas vezes por estar gelado. As luzes dos postes passavam rapidamente por nós assim como as pessoas. Por ser uma sexta-feira à noite, as ruas estavam bastante movimentadas e a cada bar que passávamos, podíamos escutar uma música diferente. Queria poder descer em algum, mas o tempo realmente não era meu amigo, e minha mãe também não seria assim que eu pisasse naquela casa.

Apertei mais meu corpo contra o de a fim de me esquentar um pouco, aquele vento gélido estava começando a me incomodar. O vi olhar-me pelo retrovisor e dar um pequeno sorriso, o qual eu retribuí sinceramente. Após alguns minutos senti a moto diminuir a velocidade e eu reconheci aquele maldito bairro... estacionou de vez o veículo e, como sempre, me ajudou a descer.
"Obrigada pela carona, ... E pelo jantar... E pela conversa... Enfim, pelo ótimo dia..." falei simplória com um sorriso tímido em meus lábios. Eu olhava para meus pés já que nas últimas horas os olhos de se transformaram em um desafio difícil de se encarar.
"Eu que agradeço, " ele disse de volta, colocando as mãos dentro dos bolsos de sua jaqueta e sorrindo de maneira angelical, fazendo-me até perder um pouco a noção de tempo e espaço.
"Bom..." balancei a cabeça, espantando qualquer tipo de pensamento. "Tenho que entrar, já está tarde. E além do mais, tenho uma fera para enfrentar agora..." riu.
"Sei. Qualquer coisa pula a janela e aparece lá no bar do meu pai..." ele disse, e eu não achei que fosse uma má idéia. Dei alguns passos até chegar relativamente perto de , e no mesmo tempo em que fui para a direita, para dar-lhe um beijo na bochecha, foi para a esquerda, fazendo com que nós quase beijássemos, o que acelerou relativamente meu coração. Fui para a esquerda e o garoto foi para a direita, fazendo nossas bocas quase se chocarem novamente. Não contive meu riso, nem ele. Segurei seu rosto com uma mão e dei um beijo em sua bochecha finalmente.
Dei as costas e passei pelo portão de bronze assim que ele foi aberto para mim. Não me contive em olhar para trás e dar um ultimo 'tchau' à , o qual ainda me encarava, com as mãos nos bolsos e um singelo sorriso no rosto. Comecei a andar a passos largos em direção à casa, com um sorriso de orelha a orelha.


Como esperado, Marry falou em meu ouvido até ele ficar bem vermelho e quente. Eu havia aprendido uma nova arte: a de ignorar as pessoas. Aquele velho ditado de 'entrar em um ouvido e sair pelo outro' realmente funciona, todos deviam usá-lo de vez em... sempre. Com pessoas que te irritam e falam as mesmas abobrinhas de sempre, aquelas que não te levarão a lugar nenhum.
Após escutar uns quinze minutos de muita baboseira, vi no grande relógio pregado no centro da parede da sala marcar onze e vinte e poucas. Concordei com tudo que Marry tinha a falar, acho que ela até se cansou de tanto gritar sem ter uma resposta minha e simplesmente me deixou correr pelas escadas até meu quarto.
Quando lá cheguei, abri rapidamente minha janela e em menos de dez segundos pude ver o carro se aproximando da minha casa. E com mais cinco segundos, a minha música disparou a tocar. Os guardas nem mais se preocupavam em tentar impedi-lo ou persegui-lo, aquilo já havia virado rotina diária da White River Street. Alguns vizinhos até ficavam a postos em suas janelas para também curtirem o espetáculo como eu. Algumas mulheres já haviam me abordado na rua e queixaram-se de sua inveja sobre mim, por ter alguém tão apaixonado e romântico me passando serenatas todas as noites. Eu não encarava aquilo como um ato romântico ou apaixonado. Aquelas serenatas eram como psicanálises para mim.
O que eu quero dizer é que nem Marry se importava mais. Não tanto quanto antes. Ela arranjara alguns tampões de ouvido para - tentar - solucionar o problema, já que o infrator não desistiria.
Então fiquei, como sempre fazia, admirando a musica e pensando no meu dia turbulento. Ou talvez nem isso. Essas serenatas me faziam refletir, filosofar, essa era a verdade.
E agora sozinha eu pensava: como nós, mulheres, somos inocentes. Como sempre acreditamos em cada palavra dita quando estamos apaixonadas. Deixamos um homem nos dominar completamente, fazemos por eles o que não sabemos se fariam por nós. E é ai que vejo o quão supérfluas são as palavras. O que elas significam, afinal? Absolutamente nada. São cheias de malícia, mentiras e maldades. São enganadoras. Por que acreditar em simples palavras já que elas nada provam? Palavras não provam amor, não demonstram carinho. Elas, um dia, irão te machucar pois irá descobrir que eram nada além de calúnias.
A partir de hoje, eu não acreditaria mais em palavras. Meu príncipe encantado teria de saber como agir.


xxxx



Escutei uma música alta me despertar de meus sonhos. Se não tivesse reconhecido The Wonder of You imediatamente, teria jogado meu rádio muito longe. Ele estava totalmente louco, começava a tocar músicas do nada. Acho que ele estava possuído ou algo assim. Certo dia acordei ao som de uma nova banda que começava a fazer sucesso na Inglaterra, Beatho... Beats... Beates... Não, Beatles! Eles são realmente bons... E certa vez coloquei Chuck Berry para tocar em alto e bom som dentro do meu quarto. Marry imediatamente entrou e desligou o radio sem minha permissão, gritando que aquele não era o tipo de música que eu deveria estar escutando, que aquilo não era para pessoas como nós. Pessoas mesquinhas e ignorantes, ela quis dizer.

Bom, então eu acordei. Faziam séculos que eu não acordava nesse horário. Havia esquecido o quanto é bom dormir até as dez da manhã. Deveriam fazer uma lei proibindo as pessoas de acordarem antes deste horário... Todos seriam mais felizes. Subi em cima da cama e comecei a pular e a dançar enquanto a música tocava com veemência. Como alguém poderia ficar tão feliz após descobrir uma traição de seu namorado com sua melhor amiga? Talvez eu fosse anormal... Ou tivesse um alto poder de regeneração.
Qualquer uma das opções me parecia aceitáveis, contando que Benjamin ficasse fora delas.

Vi que Meredith estava no batente da porta me encarando como se eu tivesse pirado de vez.
“Venha pular comigo, Mere!” gritei sorridente, a vendo boquiaberta e gesticular fervorosamente com as mãos.
“Não cheguei a esse grau de loucura” ela disse firme, mas eu sabia que no fundo sua vontade era de pirar junto, entretanto, o medo de que Marry a surpreendesse no quarto e a demitisse era maior.
“Vamos lá, não seja tola” pulei no chão e fui de encontro à mulher, puxando-a pela mão em seguida e podendo escutar seus gritinhos de desespero.
Joguei-a na cama e pulei na mesma em seguida, obrigando-a a se levantar e ficar de frente a mim. Peguei em suas mãos.
“Pule” falei apreensiva, mas com um sorriso no canto dos lábios.
“Já disse que não, , mas que coisa!” Mere disse brava, no entanto, deixando transparecer sua inquietude. Comecei a pular sem soltar suas mãos, e a mais velha novamente soltou gritinhos abafados e histéricos.
, eu vou cair!” ela gritou e eu comecei a pular fortemente contra o colchão, afundando-o cada vez mais, à medida que meus pés batiam no mesmo.
Vi Meredith se desequilibrar, e em um piscar de olhos, me vi em cima dela, escutando sua risada estridente em meu ouvido. Não me contive, e comecei a rir tão alto quanto a mulher.
“Oh meu Deus” Mere suspirou após bons segundos de risadas intermináveis. “Não me contamine mais com a sua loucura, ” disse retomando sua postura robusta e feição séria. “Vamos, levante-se e venha tomar seu café” Meredith completou, saindo em seguida do quarto e me deixando deitada na cama.
Soltei um grande suspiro antes de me levantar em um pulo. Fui em direção ao closet e peguei meu penhoar e pantufas de porquinho. Algum dia eu deixaria de ser criança...

Ao chegar na sala de refeições, com um grande sorriso nos lábios e com a certeza de que nada estragaria meu dia, tive uma grande decepção. A imagem de Benjamin tomando chá com Marry foi o bastante para acabar com toda aquela certeza.
Ben abriu aquele sorriso devastador de sempre, que faria meu coração acelerar abruptamente, mas que nada me fez sentir além de repulsa. E um tremendo desejo de meter-lhe um tapa na cara.

“O que você está fazendo aqui?” tentei manter a calma, mas não conseguiria por muito tempo. Demonstrei meu choque tanto em meu tom de voz quanto em minha feição. Eu sabia que ele era descarado e cínico, mas a esse ponto?
!” mamãe me repreendeu, mas eu realmente não iria dar atenção.
“Depois de tudo você ainda tem a cara-de-pau de aparecer aqui?” aumentei meu tom gradativamente, ainda indignada. Benjamin mantinha uma expressão calma que estava me irritando ainda mais.
, sente-se aqui!” escutei Marry dizer um tanto quanto enraivecida, fazendo-me chegar ao meu estopim.
“NÃO MÃE, EU NÃO VOU ME SENTAR PERTO DESSE ESCRÚPULO!” gritei ferozmente e apontei para Ben, que encarava sua xícara de chá como se fosse a vítima daquele ambiente. Marry levantou-se bruscamente de sua cadeira.
“TENHA MODOS, GAROTA!” gritou de volta, apontando seu dedo indicador à minha face, ameaçadoramente.
“Você sabe o que esse garoto me fez?” aproximei-me dela, sem medo de qualquer ameaça. Minha raiva era tamanha que chagava a me encorajar.
“O que quer que ele tenha feito, está arrependido e veio conversar” a mais velha disse entre dentes, deixando claro sua ordem para que eu escutasse as lorotas que viriam da boca de Benjamin.
Confesso, não contive uma risada cínica e estridente de sair da minha boca.
“Arrependido? ARREPENDIDO? Foi isso que ele disse à senhora? Francamente mãe, NÃO SEJA TOLA!” eu estava cada vez mais exaltada e tinha certeza que toda vizinhança podia escutar nossa discussão.

De repente, vi o rosto de Marry se avermelhar de raiva e, em um segundo, meus braços eram apertados ferozmente por suas mãos magras e frias.
“Olhe bem como fala comigo, . Isso é falta de boas corretadas, e já que eu claramente falhei em sua educação, vamos ver se agora você aprende a me respeitar” ela estava claramente tão aborrecida quanto eu, seu ódio exaltando de suas órbitas. Começou a me arrastar pelo braço para fora daquele salão, e eu sabia que levaria uma surra das boas daqui alguns momentos. Entretanto, eu me manteria forte. Apanharia, mas não abaixaria a cabeça para nenhum marmanjo que quer, pela segunda vez, me enganar. Eu não seria enganada novamente. Não o deixaria ao menos ter a chance de tentar. Que eu fosse espancada por uma boa causa.

“Senhora , por favor, não puna ” escutei a voz grave de Benjamin fazer Marry parar de andar aos poucos. “Ela tem razão de estar assim, eu realmente fiz algo de que me envergonho muito, e só quero me desculpar...” a mulher foi desencravando suas unhas de meus braços lentamente. “Por favor, não a puna...” Benjamin repetiu pesaroso, e se eu não o conhecesse, teria pena.
Mas senti uma enorme vontade de pedir a Marry que me surrasse agora mesmo! Cínico ou não, ele estava me irritando profundamente, e se eu escutasse sua voz por mais algum tempo, não me responsabilizaria por meus atos.
“Pois bem. Se não quiser levar um castigo bem diferente de todos que já levou, sugiro que sente-se e ouça o que Benjamin tem a dizer” Marry disse friamente, me olhando com pleno desgosto. Aquilo não era uma sugestão. Era um mandato.

Sutilmente, a mulher deixou o recinto sem mais palavras, deixando o mesmo cair em profundo silêncio. E da minha parte, continuaria assim.
...” o garoto começou, e sua voz pareceu estourar meus tímpanos. Eu não poderia agüentar mais isso. Eu estava farta. Completamente farta. De tudo. De Marry e sua ridícula maneira de querer me criar, de Benjamin e sua incrível falsidade, de por se achar a garota mais perfeita do mundo, a Guerra Fria me irritava – principalmente o Reino Unido por só agora se tocarem que não mais eram os donos do mundo –, o exército dos Estados Unidos me irritavam mais ainda por obrigarem meu Rei – Elvis Presley – a se recrutar. Eu precisava sair dali. Eu o mataria estrangulado, e eu não tinha duvidas disso!
“Benjamin, você aguardaria um instante para eu poder me trocar?” achei o fato de eu estar apenas de penhoar uma ótima desculpa para sumir dali.
“Claro...” ele respondeu simplório e, sem cerimônias, me levantei da mesa e fui em direção à sala de entrada, no entanto, fui barrada por um dos seguranças quando fiz menção de subir as escadas.
“Me desculpe senhorita, mas tenho ordens de não deixá-la sair desta sala enquanto o senhor não for embora...” o homem disse firme, se contrapondo à mim e à escada.
Pronto. Esse era o máximo que eu poderia agüentar. A terceira Guerra Mundial aconteceria naquele instante!
“O QUE? AGORA SOU PRISIONEIRA NA MINHA PRÓPRIA CASA?” gritei, totalmente revoltada e entorpecida pelo ódio. ÓDIO, ÓDIO, ÓDIO! Não conseguiria expressar minha sensação naquele momento, apenas sei que se tivesse uma faca ou qualquer objeto afiado, eu mataria todos naquela casa! O que havia de errado com todos ali? Era difícil entender que eu não queria, e não iria conversar com uma pessoa que simplesmente pegou meu coração e o trucidou da pior forma possível? Era?
Em um ato de puro reflexo e nervosismo, peguei um vaso de porcelana que estava sobre uma prateleira próxima e simplesmente o arremessei contra a parede, causando um barulho estrondoso.
O segurança se assustou e deu um passo para trás, e aquela foi minha deixa para poder sair dali.
Corri os degraus daquela escada o mais rápido que pude, e em segundos depois, eu já estava em meu quarto. Eu ainda bufava de raiva e minha têmpora latejava.
Fui ao closet e peguei as primeiras roupas que vi pela frente, algumas calças jeans, regatas, calcinhas, e joguei tudo dentro de uma mochila velha. Coloquei uma calça e blusa quaisquer, calcei um tênis surrado e joguei a mochila em minhas costas.
Eu não pularia a janela. Eu não sairia despercebida. Queria que Marry me visse partindo. Não era uma fuga, era um decreto de impaciência e revolta. Eu, , não ficaria mais dentro daquela casa mais um segundo sequer sendo tratada daquela forma.

Novamente desci a escada principal em um piscar de olhos, e pude ver Marry gritando com o segurança, descabelada e totalmente fora de controle. Veríamos quem era a dona de mim.
“O QUE VOCÊ TEM NA CABEÇA? ESTÁ SE DROGANDO, É ISSO? BEM QUE TODOS ME DIZIAM, MAS EU ME RECUSAVA A ACREDITAR E...”
“CHEGA! CHEGA MARRY! EU ESTOU FARTA! ESTOU FARTA DO QUE TODOS DIZIAM OU DIZEM AO MEU RESPEITO, ESTOU FARTA DE SER TRATADA COMO UMA MARIONETE DESSA SOCIEDADE RIDÍCULA, ESTOU FARTA DE COBRAS AO MEU REDOR, E PRINCIPALMENTE, ESTOU FARTA DE VOCÊ” fiz questão de dizer as ultimas palavras da maneira mais lenta e fria possível. A guerra dentro de mim já havia sido despertada. A revolta já havia tomado conta de mim.
Vi a mulher partir para cima de mim, mas eu simplesmente segurei suas mãos, impedindo-a de fazer qualquer coisa contra minha pessoa.
“Eu estou indo embora. E nada me traz de volta para essa casa” falei ameaçadoramente, olhando tão profundamente em seus olhos como nunca. Aqueles olhos azuis cintilavam ódio, mas não chegava perto dos meus. “Pode inventar para suas amigas que fui para um internato, ou até mesmo que me expulsou porque estava fumando maconha dentro daqui. Diga o que quiser. Mas no mesmo teto que você, eu não fico mais.”

Empurrei seu corpo sutilmente do meu, e lancei-a um ultimo olhar, esperando apenas sua próxima reação. Ela nada fez. A guerra estava declarada.
Respirei fundo e passei pela mulher de cabeça erguida, passando sem olhar para o segurança que antes me barrara, e encarando Benjamin por fim. O garoto possuía um vazio em seu olhar, nada pude ler em sua expressão. Que se danasse o que ele estava pensando. Se pensara que eu era mais uma tola a enganar, o enganado foi ele.


Bati fortemente a grande porta de madeira antes de sair e ir para lugar algum.


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