Capítulo Único
Olhei para o cursor piscando na tela do computador e respirei fundo. Passei as mãos na cabeça, apertando as têmporas e a cabeça com a ponta dos dedos e estiquei o corpo, estralando os dedos na frente da tela do notebook e girei o pescoço para os lados, ouvindo-o estralar.
- Ok, vamos lá! Somos eu e você. – Respirei fundo.
“Olá, eu sou Jack Bolzan, Giovanni, na verdade...”, não, parece programa educativo: “oi, gente, eu sou o Barney”.
- Não, acho que não. – Balancei a cabeça, ouvindo barulhos vindo da escada e girei o corpo no banco da cozinha de Jessica e vi Scott aparecendo pela sala vazia. – Ei, você acordou!
- Sim, bom dia! – Ele abriu um largo sorriso e veio em minha direção, dando um rápido beijo em meus lábios. – Como estão os trabalhos? – Ele se virou para a tela do notebook. – “Olá, eu sou...” – Apertei o botão de apagar.
- Não leia, está horrível! – Rimos juntos.
- Você precisa escrever isso logo, é para entregar para o Mike em três dias.
- Três dias, cara! Três dias! Eu estou nisso há um mês! – Bufei, apoiando o cotovelo na mesa, me debruçando sobre a mesma.
- Por que é tão difícil escrever isso? – Ele passou o braço em meus ombros e eu suspirei.
- Você sabe minha história, escrever uma biografia minha antes de conhecer a implica em falar do meu passado e...
- Eu sei! – Ele falou, acariciando meus cabelos. – Mas você concordou com isso. – Suspirei.
- Eu sei. – Neguei com a cabeça. – Mas é difícil. – Dei de ombros. – Eu podia ser o último, né?!
- Nossa, se for assim, esse livro não sai nunca! – Ele gargalhou e eu mostrei a língua para ele. – Lindo! – Sorri. – Pensa bem, você não precisa escrever quase todos os dias da sua vida, fez essa parte.
- Sim, como ela conseguiu? Ela escreveu mil páginas em seis meses e não se esqueceu de nada, nenhum detalhe. – Ele riu fracamente.
- Stone, meu querido Giovanni. Só ela poderia fazer algo assim. – Ele suspirou. – Além de que teve muito tempo livre naquela época do incêndio... – Assenti com a cabeça.
- É, eu vou ver o que sai aqui. – Dei um sorriso de lado.
- Pense que você é a e deixe o espírito de William Shakespeare cair sobre você! – Gargalhei.
- Ah, você consegue ser mais dramático que o ...
- Falando nisso... – Ele olhou para seu relógio. – Eu preciso ir. – Ele deu um rápido beijo em meus lábios. – conseguiu umas audições para mim, preciso estar em Burbank em 40 minutos.
- Já está atrasado! – Olhei o relógio da cozinha de Jessica.
- Eu sei! – Suspirei. – Quer que eu pegue Gemma na casa de Olavo na volta? – Ele perguntou.
- Não precisa, ela deve ligar mais tarde, está com Matheus. – Ele assentiu com a cabeça.
- Ok, então estou indo, eu te amo! – Ele falou saindo correndo pela mansão de Jessica.
- Eu também! – Falei baixo, sabendo que ele já tinha saído. - Bom, somos nós dois novamente. – Soltei a respiração baixa pela boca e endireitei as costas, puxando a alavanca do banco e deixando que ele abaixasse. – Não deve ser tão difícil.
“Fala aí, galera! Jack Bolzan aqui... Ok, pareceu um cantor de rap e sabemos que eu não faço essa parte na banda, mas relevem, já que eu tenho somente três dias para escrever um pouco da minha vida para vocês. Tudo bem que eu tive um mês para fazer isso, então agora vai por bem ou por mal.
Antes de começar, gostaria de deixar meu descontentamento com isso. Sei que quando falamos de fazer uma biografia para comemorar os 15 anos de banda, eu fui o primeiro a topar a ideia, afinal, nós temos muita história e não só as várias músicas de sucesso que vocês escutam, mas nossa vida pessoal, nossa família, que vocês acabaram acolhendo com todo amor e carinho como suas também.
Mas agora, olhando esse maldito cursor preto piscando, eu não consigo pensar em como dizer isso sem parecer muito dramático. Vocês sabem da minha história, principalmente daquela com meu pai, que saiu em todos os jornais depois do julgamento, mas acho que vocês nunca a ouviram do meu ponto de vista e isso me amedronta um pouco, não foi uma época fácil da minha vida, mas foi um dos motivos de eu estar aqui hoje.
Já avisando, eu não sou Stone, aquela biografia que ela escreveu está sensacional, mas espero que eu possa mostrar um pouco do que foram aqueles anos em Turim e os motivos que fizeram com que eu me juntasse à maior banda da atualidade.
me apresenta em Total Stranger lá em 2004, na época eu tinha 19 anos. Me lembro como se fosse hoje do dia em que eu a conheci, aquela garota brasileira e totalmente improvável seria minha chave para o show biz. Acho que ninguém duvidava do potencial dela, sua voz, sua apresentação, sua garra e sua vontade de conseguir, foi o que fez Stone ser o que é hoje.
Na época, eu já tinha passado por todos os problemas da minha vida, bem, com exceção da morte da minha mãe e de quase perder a guarda da minha própria irmã, mas eu nunca tive a vida muito fácil, apesar de crescer em uma família com uma renda muito boa, nem tudo eram rosas na pequena vinícola.
Morávamos eu, minha mãe, meu pai e minha irmã, que é nove anos mais nova do que eu, na época em que tudo começou, ela era somente um bebê gordinho e loiro, que parecia um pequeno fantasminha correndo pelas parreiras, fazendo seus cabelos loiros brilharem por causa do sol forte que batia na cidade.
Meus pais nunca foram um casal de demonstrar afeto em público, mas dava para notar a confiança que emanava entre os dois, ambos eram muito poderosos e sabiam o que queriam, então, juntos, aquilo poderia se transformar em coisas geniais, e foi o que aconteceu com esse vinhedo.
A vinícola surgiu um ano antes do meu nascimento, então em 2004 ela completava 20 anos. Meu avô materno já tinha esse sítio, que foi onde minha mãe e seus seis irmãos mais novos foram criados. Minha mãe parecia um sétimo homem, já que ela era a que mais adorava ajudar nas tarefas da fazenda, tirar leite, pegar ovos e alimentar as galinhas era com ela mesma, então foi com ela que aquela pequena casa com três quartos ficou na divisão dos bens quando meus avós faleceram.
Como toda boa fazenda italiana, até tinha algumas uvas plantadas aqui, mas aquelas docinhas que faziam com que a gente se deliciasse quando criança para comer e fazer geleia, mas nada grande o suficiente para produzir vinho para vender a tonéis. O que aconteceu foi que meu avô começou a comprar as terras na redondeza para juntar mais gado para produção de carne para a família.
A fazenda tinha um hectare, depois dois, três, até que chegou a 10 hectares, mas acabou que meus avôs faleceram, o gado foi vendido e minha mãe ficou solteira com uma casa e uma fazenda sem produção.
É nessa hora que entra meu pai, antes dos louros, ele era vendedor de mudas. Sabe aquelas pessoas que viajam pelas cidades vendendo mudas de plantas frutíferas? É, meu pai trabalhava com isso, principalmente com uvas, obviamente. Ele visitou a fazenda da minha família, ofereceu uma muda e ela acabou aceitando, depois ele ofereceu outra e outra, até que ela percebeu que o interesse do jovem Giovanni era outro.
Com 23 mudas de uvas crescendo na fazenda e três anos depois, eles se casaram. Até que um dia, um conhecido de meu pai contou que fez um curso de vinhos e que tinha amado, foi aí que esse amigo sugeriu a criação da vinícola. Afinal, eles tinham o espaço, algumas mudas, o gosto pelo vinho, faltava só o curso de produção.
Minha mãe era dona de casa e meu pai estava cansado dessa vida de viajante, mas eles começaram a estudar e a produzir. Oito anos depois saiu o vinho que é o carro-chefe da Vinícola Bolzan, dois anos depois eu nasci. Nesse meio tempo eles fizeram faculdades administrativas, se aperfeiçoaram mais no ramo de vinhos e hoje, com 36 anos de vinícola, só crescemos. Principalmente depois da morte da minha mãe e apoio de , ela realmente fez com que a gente entrasse no mapa, ajudando muito mais na exportação do produto.
Mais mudas foram compradas, parreiras foram montadas, galpões e itens para produção feitos e disponíveis, empregados contratados e mais hectares comprados. Em 2004 a vinícola já nos sustentava muito bem, nos dava muito luxo e conforto. A casinha de três quartos virou uma mansão que abriga nossa família e parte dos escritórios, e o sonho de meus pais só crescia.
Até meus 12 anos, éramos a família perfeita. Minha família era bem de vida e éramos felizes em casa, na escola e na cidade. Era tudo que um garoto da minha idade queria na época. Mas foi aí que as coisas começaram a se complicar. Lá em 1997.”
“Bom, vamos voltar a 1995, quando eu era um garotinho magrinho, franzino, com cabelos arrepiados, em uma escola 100 por cento masculina em Turim. Não chegava a ser um internato, mas era integral, e meus pais faziam questão em me colocar em vários cursos extracurriculares para ter melhores oportunidades no futuro, inclusive, foi assim que minhas aulas de canto começaram, mas isso é assunto para outra hora.
Vivendo oito horas do meu dia em uma escola masculina, é de suspeitar que eu pendesse para outro lado, mas ironicamente, foi quando eu tive meu primeiro beijo com uma garota, que eu comecei a suspeitar que tinha algo de errado. Claro que todo primeiro beijo é ruim, não sabemos o que estamos fazendo e as coisas simplesmente acontecem, mas foi muito estranho.
Eu adorava aquela garota. Ela era como uma deusa na escola feminina, que por sinal foi onde minha irmã estudou. Era algo tipo Gossip Girl, a escola masculina e a feminina divididas pelo restaurante, onde podíamos lanchar e almoçar juntos. Nesses tempos, tinha uma menina, ela era do mesmo ano que eu, e eu simplesmente era abismado por ela.
Ela era muito parecia com Emily, pele escura, cabelos curtos cacheados e aquele olhar penetrante. Ela destoava muito das outras meninas claras e loiras da escola, eu sempre gostei do diferente, acho que foi por ela ser diferente de todo mundo que eu gostava dela. Obviamente que, para história ficar mais interessante, ela acabou se tornando popularzinha. Andava com as meninas mais bonitas e fazia questão de jogar aquele olhar para cima de mim. Ah, Winnie, tive bons sonhos com você, pena que eu gostava de outra coisa que você não podia me proporcionar.
Meu primeiro beijo com uma menina e com o menino, se coincidiram de ser no mesmo lugar, embaixo da arquibancada da escola. Eu jogava no time de futebol, o treino acabava por volta das quatro e meia da tarde e depois eu precisava esperar uns 30 minutos para alguém ir me buscar. Em um desses dias, ela ficou comigo.
- Oi, Giovanni! – Virei o rosto para o lado, encontrando-a com um sorriso tímido para mim.
- Ei, Winnie. – Me levantei rapidamente, batendo a cabeça na arquibancada.
- Ai! – Ela falou e eu levei a mão até o local.
- Pode me chamar de Jack. – Ri sem graça. – Giovanni parece meu pai brigando comigo. – Ela riu fracamente.
- Você foi bem no treino hoje. – Sorri.
- Valeu. Tem o torneio com a Escola Raviane na semana que vem, estamos empolgados. – Ela assentiu com a cabeça.
- Parece que vai ser legal.
- Você vai? – Perguntei ansioso.
- Eu não sei... – Ela apertou a mão na mochila. – Você quer que eu vá? – Dei de ombros, mordendo meus lábios, realmente intimidado por ela.
- Seria legal. – Falei tímido e ouvi uma buzina, desviando o rosto para um carro que parava do outro lado da arquibancada. – É minha mãe. – Falei, pegando minha mochila surrada do chão. – A gente se vê.
- Com certeza. – Ela sorriu e eu acenei, batendo a cabeça novamente na arquibancada para sair. – Jack! – Ela me chamou novamente e eu olhei para ela, ainda passando a mão na cabeça, vendo-a se aproximar.
Ela deu alguns passos em minha direção, apoiando a mão em meu ombro e colou os lábios nos meus, me deixando levemente atônito por um momento. Eu não sabia o que fazer, eu não sabia como agir, o que não foi preciso, já que alguns segundos depois, ela se afastou com um sorriso no rosto.
- Até mais. – Ela falou e eu assenti com a cabeça, vendo-a sumir por debaixo da arquibancada.
Balancei a cabeça, abanando o ar com a mão e bufei alto. Aquilo tinha sido estranho. E não estranho de um jeito bom, só estranho. Pareceu que eu estava beijando o pôster de Charlize Theron na parede do meu quarto. Ouvi a buzina novamente e virei para trás, vendo minha mãe acenando para mim.
Senti meu rosto arder pela minha mãe ter visto meu primeiro beijo, mas dei a volta no carro e entrei, puxando a porta em seguida e olhei para a frente. Fingi que não percebi que o carro não estava andando e aumentei o volume de qualquer música estranha que minha mãe estava ouvindo e senti o carro andar.
- Então... – Ela me disse, abaixando o volume. – Quer conversar sobre o que acabou de acontecer? – Virei para ela, respirando fundo. Ela mais que ninguém me entenderia. – Foi seu primeiro beijo?
- Foi... – Falei fracamente, percebendo que ela sorria para mim.
- E como foi? – Bufei, respirando fundo. – Você gosta dela, não gosta?
- Acho que sim. – Franzi os lábios.
- “Acho”? – Ela perguntou.
- Foi péssimo, mãe. Não teve nenhum brilho, calor, felicidade, foi só... Estranho.
- Ah, querido! – Ela pegou minha mão. – Primeiros beijos são estranhos mesmo. – Ela sorriu. – A gente não sabe o que fazer, ficamos nervosos, normalmente é inesperado. – Apertei sua mão. – Mas sabe a melhor parte? – Olhei para ela.
- Qual? – Perguntei.
- Você sempre pode tentar de novo. – Dei um pequeno sorriso e assenti com a cabeça.
- Valeu, mãe! – Ela sorriu e eu voltei a olhar para o caminho de casa.
Bom, eu tentei de novo! Todos os dias na semana que se seguiu, exatamente no mesmo lugar e eu ainda sentia o gosto do pôster da Charlize Theron na minha boca. Outra coisa estranha que me aconteceu é que eu tinha parado de gostar tanto de Winnie. Não sei, ao beijar ela, ela se tornou menos surpreendente, normal igual todas as outras garotas.
É claro que eu fui falar com minha mãe sobre isso. Eu desabafava com Gemma, mas ela só queria saber de morder a boneca dela até arrancar a cabeça e chorar quando isso acontecia. Hoje eu pensava em nossa diferença de idade e nem parecia tanto, em compensação na época, era difícil ter irmãos muito menores.
- Mãe? – Bati no escritório dela e coloquei a cabeça para dentro.
- Oi, querido. Entra, entra! – Ela falou animada, juntando os papéis acumulados na mesa.
- Estou te atrapalhando? – Atravessei o escritório, vendo a mesa de meu pai vazia.
- Claro que não, só fazendo alguns adiantamentos para alguns funcionários. Sente-se! – Ela falou e eu fiz o que ela pediu, pulando na cadeira giratória dela. – Como posso te ajudar?
- Hum, lembra quando eu beijei a Winnie e você disse que primeiros beijos eram estranhos mesmo e que eu não precisava me preocupar? – Vi que ela abriu um sorriso envergonhado, me deixando vermelho.
- Sim, claro que lembro! – Ela pelo menos fingiu seriedade, o que eu agradeço até hoje.
- Deu certo não. – Falei, parando a cadeira giratória e cruzando os braços em cima do corpo, vendo-a rir fracamente.
- Por que não? – Ela perguntou, apoiando os braços na mesa.
- Ainda parece que eu estou beijando a Charlize, mãe. E eu tentei sete vezes.
- Sete vezes? – Ela se fingiu surpresa, parece que ainda consigo ver sua reação sarcástica e amável durante essa conversa. – E o que deu errado?
- Nada, que eu saiba. Você beija e se separa, é isso, não é? Não tem nada a mais...
- É isso mesmo, querido. – Ela falou prontamente.
- E continua horrível, mãe. – Suspirei. – Acho que eu também nem gosto mais dela. – Franzi os lábios.
- Ah, querido. Essas coisas são normais. – Ela sorriu.
- Como normal?
- Ah, simples, você não se apaixona por uma pessoa só pelo que ela é, você também se apaixona se o beijo de vocês é compatível, se você se sente bem quando ela te abraça, quando ela te toca...
- Não sinto nada disso não. – Falei rapidamente e ela riu fracamente.
- Ah, vai ver então que a Winnie não foi feita para você. – Bufei.
- Mas nem o beijo deveria ser bom? Pelo menos um pouco? – Ela sorriu, esticando a mão sobre a mesa e segurando a minha.
- Vai ver você é só diferente, querido. – Ela disse, dando de ombros.
- Diferente como? – Franzi a testa e ela sorriu.
- Isso é algo que você vai precisar descobrir sozinho. – Ela falou e eu suspirei.
Na época eu não sabia o que significava, mas ela foi a primeira pessoa a me fazer pensar que eu realmente poderia ser diferente. Eu não entendi o sentido, na verdade, eu não fazia ideia de que jeito as pessoas podiam ser diferentes, mas quando eu comecei a sentir coisas pelo Filippo, as coisas começaram a fazer sentido.”
“Bem, depois do meu primeiro beijo com a Winnie, eu até tentei mais, não só com ela como outras meninas. Não que eu fosse o maior beijoqueiro de Turim, mas eu era bom no futebol e as meninas gostavam de mim, sabe? Com grandes interesses, mas elas se aproximavam, ficavam perto e rolava alguns selinhos, tá legal?
Mas mesmo assim, nada que eu fazia e nenhuma menina que eu beijava fazia com que eu sentisse as tais borboletas no estômago que as pessoas tanto falavam. Às vezes achava que elas realmente engoliam borboletas para sentir as coisas, porque eu só sentia o gosto da parede com o pôster da Charlize Theron.
Enfim, passaram dois anos dessa falta de entendimento minha com meu corpo e eu cheguei aos meus fatídicos 12 anos. Foi aí que eu comecei a identificar o que minha mãe queria dizer com “ser diferente”.
Na sexta série, entrou um garoto novo na nossa escola, o Filippo, ele era tipo aqueles garotos perfeitinhos, sabe? Cabelo arrumadinho com gel, gravata sempre feita perfeitamente sobre o uniforme azul, mochila ajeitada nas costas e tênis sempre limpos, além de que ele tinha se mudado de Roma, da cidade grande, então ele virou o novo sucesso da escola.
Ele acabou entrando no time de futebol, claro que para um aluno novo, o treinador colocou ele logo na defesa, ou seja, trabalhávamos lado a lado, fazíamos treinos específicos lado a lado, nos trocávamos lado a lado, além dele ser um cara legal. Ele era tipo o James Potter em Harry Potter, era aquele cara bacana que se dava bem com todo mundo.
Bem, em um dos dias em que a gente ficou treinando até mais tarde... Ah, isso me dá tanta vergonha em lembrar, eu praticamente me joguei em cima do garoto, foi o que aconteceu. A gente saiu do treino, fomos para o vestiário, tomamos banho, nos arrumamos e fomos esperar nossos pais embaixo da arquibancada.
- Ele vai acabar te colocando como lateral direita. – Falei, me sentando no gramado, jogando a mochila do lado.
- Será? Acho que meu chute está melhor na esquerda. – Ele comentou se sentando e deixando a mochila em seu colo.
- Você acertou oito chutes a gol na direita e três na esquerda. – Virei para ele que riu fracamente.
- Talvez você tenha razão, mas você é muito melhor do que eu. – Ele suspirou.
- Você entrou tem três meses, eu jogo nesse time desde a segunda série. – Ele riu fraco. – As coisas vão melhorar, além de que eu sou marcador e, de vez em quando, faço um gol. – Ponderei com a cabeça e ele riu.
- Você é bom, e é legal também, dá para entender porque as meninas adoram você. – Bufei.
- Elas me adoram, mas eu não consigo adorar elas, sei lá. É muito confuso para mim. – Dei de ombros.
- Talvez você seja diferente. – Ele copiou meus movimentos.
- Minha mãe me disse a mesma coisa. – Franzi a testa para ele. – O que você sabe sobre isso?
- Bom, meus pais são diferentes. – Ele falou. – Não sei se já reparou, mas eu tenho dois pais e nenhuma mãe. – Coloquei a cabeça para funcionar.
- Acho que nunca reparei nisso. – Ele deu de ombros novamente.
- Meus pais dizem que eles são diferentes das outras pessoas. – Ele suspirou. – Eu não vejo nada de diferente neles, eles se amam e está bom para mim.
- Você acha que eu... – Deixei a frase parar no meio do caminho.
- Eu não acho nada, é você que vai ter que se encontrar, Jack. – Ele suspirou. – Meu pai... Um dos meus pais, me disse que não é algo que alguém pode decidir por você, é preciso que você se encontre.
- E como eu “me encontro”? - Fiz aspas com os dedos, olhando para ele.
- Bom, acho que assim... – Ele me disse e se inclinou em minha direção, grudando a boca na minha por alguns segundos e se afastou, me deixando de olhos arregalados. – É o que meus pais fazem para demonstrar que se gostam.
Eu travei, eu nunca havia pensado nessa possibilidade de ser “diferente”, muito menos beijando outro garoto. Eu cresci com um pai machista, ouvindo frases como “senta igual homem” ou “isso é coisa de mulherzinha”, então, beijar outro homem estava fora de cogitação, mas tinha sido... Diferente.
- Eu tenho que ir, a gente se vê amanhã? – Ele falou, se levantando e eu vi o carro de seus pais parado na rua.
- É, tá! – Foi o que eu consegui falar e o vi sair, me fazendo balançar a cabeça.
- O que aconteceu aqui? – Respirei fundo e ouvi uma buzina, vendo minha mãe parar aonde o carro de Filippo estava anteriormente.
Peguei minhas coisas e saí correndo em direção ao carro, entrando nele e fechando a porta, respirando fundo. Eu queria contar para minha mãe, mas como falar isso? Ela sempre foi muito aberta comigo, mas e se nesse quesito ela fosse igual meu pai? Eu estava com medo de apanhar e ficar de castigo por um mês, mas ela sempre notava que tinha algo de errado comigo, aquela mulher era uma santa. Ah, mãe, que saudades que você me faz.
- O que aconteceu, moço? – Ela perguntou, passando as mãos em meus cabelos e eu olhei para ela, respirando fundo.
- Eu estou tentando entender, mãe. – Falei honestamente, respirando fundo em seguida.
- O que foi?
- Por favor, não briga comigo! – Ela parou o carro no meio da rua, dando um solavanco e virou para mim.
- Por que eu brigaria contigo, Giovanni? – Fiz uma careta.
- Não me chama assim e sai do meio da rua. – Falei, ouvindo uma buzina e ela recuou para uma vaga e desligou o carro, me olhando.
- O que aconteceu? – Suspirei, olhando para o teto do carro por alguns minutos, bufando alto.
- Sabe o Filippo? – Perguntei.
- Sei sim. – Ela falou e eu bufei novamente.
- Bom, ele me beijou. – Falei e ela arregalou os olhos.
- Mesmo?
- Por favor, não briga comigo, ele que me beijou, eu não o beijei. – Ela riu fracamente, negando com a cabeça e segurando minha mão.
- Ah, querido, eu não vou brigar contigo. – Ela abriu um largo sorriso. – Confesso que achava que você daria o primeiro passo em uma situação dessas.
- Como assim? – Franzi a testa. – Era isso que você estava querendo dizer sobre eu ser diferente. – Ela deu um sorriso tímido.
- Era essa opção ou a de não gostar nem de homem ou mulher, o que existe também. – Suspirei. – Mas a questão é: você gostou?
- Eu não sei, mãe. Eu travei, não deu para eu retribuir, sabe? Enquanto eu travei, o pai dele chegou. Ele tem dois pais, sabia?
- Sabia! – Ela falou. – Os encontrei na reunião de pais, pode imaginar o que o seu pai falou quando viu, não é?
- Sim, o que não faz sentido para mim, se eles se gostam, qual é o problema? – Ela assentiu com a cabeça.
- Então, é a mesma coisa que eu vou falar para você, se você gostar de Filippo ou de qualquer outro garoto ou garota, saiba que não tem problema nenhum com isso.
- Aposto que o papai não vai gostar de nada.
- Viva sua vida e deixa que eu cuido do seu pai, estamos combinados? – Sorri, confirmando com a cabeça.
- Estamos! - Sorri e ela deu um beijo em minha testa antes de voltar a dirigir para casa.”
“Bom, depois desse dia eu fiquei meio envergonhado em olhar para Filippo na escola no dia seguinte, ele que tinha me beijado e eu que tinha receio em encontrá-lo. Eu não sabia o que fazer, eu estava confuso, estava pensando no que minha mãe tinha dito, no que ele tinha feito. Naquele momento, eu estava sofrendo com o começo da minha descoberta sobre minha sexualidade, parecia um turbilhão de emoções e que nunca ia passar.
Durante o treino, eu acabei evitando Filippo, éramos do mesmo time, então fazia questão de não passar a bola para ele e o evitar quando ele me chamava para me xingar por não passar a bola para ele ou por perder passes no gol. Então, obviamente, no fim do treino ele foi falar comigo.
- Você está bravo com o que eu fiz, não? – Ele falou baixo enquanto guardávamos nossas coisas após o banho.
- Sim, não, eu não sei! – Falei confuso, enfiando o uniforme e toalha dentro da mochila. – Eu só já tinha conversado sobre isso com minha mãe e ela não tinha me dito que essa era uma das opções, mas eu ainda não sei se é o certo.
- Vai ver só não foi com a pessoa certa ou realmente não é para você. – Ele deu de ombros, batendo seu armário e eu suspirei. – Você não precisa decidir isso agora e se apegar a isso pelo resto da vida, sabia?
- Eu sei... – Suspirei, fechando meu armário também, balançando com a cabeça e o encarei. – Você se importaria em fazer de novo? – Ele franziu a testa.
- Mesmo? De novo? – Ele me perguntou e eu dei de ombros.
- Eu não tive tempo de fazer nada, para falar a verdade. – Ele riu fracamente.
- É, você travou. – Ele riu e olhamos em volta, vendo três alunos que terminavam de se trocar. – Vem. – Ele falou baixo e olhei em volta.
- Tchau, gente. Até amanhã! – Falei para os outros colegas de time.
- Tchau! – Eles responderam e segui Filippo pelo outro lado do vestiário, onde ficavam as cabines e mictórios.
Ele olhou em volta rapidamente, vendo se não via ninguém e fomos para a última cabine. Ele entrou eu fui atrás, trancando a porta em seguida. Jogamos nossas mochilas no chão e ele me encarou novamente.
- Tente aproveitar, ok? – Ele falou me encarando e eu assenti com a cabeça, respirando fundo. – Feche os olhos.
Fechei os olhos e balancei os braços um pouco, tentando relaxar. Senti sua respiração perto do meu rosto e prendi a minha por alguns segundos, sentindo sua boca encostar na minha novamente, me fazendo engolir em seco. Inicialmente eu fiquei travado, até que ele começou a mexer a boca lentamente, fazendo com que eu o acompanhasse devagar.
Ele apoiou as duas mãos em meus ombros e eu levei as minhas para apoiar em sua cintura, somente deixando a mão no local, abrindo um pequeno sorriso quando ele se afastou e eu abri os olhos.
- E então? – Ele me perguntou e eu mordi meu lábio inferior.
- Eu gostei. – Falei fracamente e ele riu, dando de ombros.
- Podemos fazer novamente se você quiser. – Ele disse, pegando sua bolsa no chão.
- Você já tem certeza sobre o que é? – Perguntei e ele deu de ombros.
- Ainda não, mas eu gosto de você. – Ele sorriu e eu senti meu rosto esquentar. – Você foi legal comigo quando eu entrei na escola.
- Que bom! – Foi a única coisa que eu consegui falar.
- A gente se vê! – Ele disse e abriu a cabine devagar, olhando se não tinha ninguém e saiu com sua mochila.”
“Bom, eu realmente gostei do beijo de Filippo, mas eu tinha muitas dúvidas ainda, eu não queria bater o martelo para mim ou para outra pessoa que eu era “diferente”. Eu só tinha 12 anos, o que eu sabia com 12 anos, certo? Então, eu acabei tendo muitas dúvidas, ficava dias fazendo monólogos de prós e contras, falava muito com minha mãe, ela acabou me indicando para uma psicóloga, o que eu passava horas falando com ela, tentando entender o que ela queria dizer. Até minha irmãzinha Gemma, que tinha três anos na época, aguentava meus monólogos, mas acredite, ele era uma ótima conselheira.
- Eu não sei o que fazer, Gemma. Ele é legal, divertido, simpático, engraçado, gosta das mesmas coisas que eu, ele também é um pouco bonitinho, sabe? – Olhei para ela que penteava a cabeça de sua boneca.
- Eu não entendo o problema, Jack. – Ela falou olhando para mim por alguns segundos antes de voltar para sua boneca.
- Como não? – Me ajoelhei ao seu lado. – Eu estou espiralando, Gemma. – Ela riu fracamente, largando a boneca e ficando em pé em minha frente.
- É óbvio, Jack, você gosta dele. – Ela deu de ombros. – O que tem de tão difícil de entender?
- Ele é um menino, Gemma! – Falei um pouco mais baixo.
- E daí? Que problema teria? Eu não vejo, a mamãe também não...
- O papai veria... – Suspirei.
- E você vai fazer tudo o que ele disser para o resto da sua vida? – Ela me encarou com aquele olhar de desprezo que tem até hoje e eu me pergunto como surgiu tão cedo.
- Não... – Franzi o rosto.
- Se você gosta desse Filippo e se ele te faz feliz, então fica com ele. – Ela deu de ombros e pegou um baby liss de brinquedo e voltou a se sentar ao lado de sua boneca, pegando-a no colo novamente.
- Eu te amo, sabia? – Falei para ela, segurando-a pelas bochechas e ela fez uma careta.
- Tá, mas não faz isso. – Ela mostrou a língua e eu ri, me levantando.
- Você que está complicando as coisas, parece simples para mim. Se você gosta dele, fica com ele, principalmente porque ele gosta de você. – Suspirei.
- Eu achava que gostava da Winnie...
- E vimos no fim que deu! – Ela foi irônica e eu ri fracamente. – É quem você é, Jack. – Ela falou mais calma. - Você não deveria ter que esconder. – Suspirei.
- Obrigada, irmãzinha! – Me afastei dela, saindo de seu quarto.
Eu ainda estava confuso, obviamente, mas essa última frase dela ficou marcada em minha cabeça. Ela tinha razão, certo? Eu não precisava me esconder se meu pai não gostava disso. Claro que quando eu pensei nisso, eu não esperava que o negócio fosse complicar tanto.
Bom, dando uma agilizada nas coisas, eu e Filippo começamos um relacionamento meio escondido, a gente ficava junto, trocávamos alguns beijos, mas não tinha nada oficial assim, afinal, tínhamos 12 anos, repito: o que eu sabia da vida? Então, a parte de “namorar” veio um pouco depois.
Filippo se mudou novamente no final da oitava série, com isso eu já tinha 14 anos. Eu fiquei realmente chateado, lá já tínhamos um relacionamento mais sério, mas nunca passou de beijos, não foi com Filippo que eu tive minha primeira vez, foi com Luca. Nessa época algumas pessoas já sabiam de nós, mas só na escola, não tinha aberto para meu pai ainda, minha mãe me alertava muito do receio que ela tinha sobre isso e seus comentários frequentes de mal gosto pioravam cada dia mais.
Com Filippo eu comecei a me descobrir gay, mas foi com Luca que o negócio realmente aconteceu. Luca era um arraso! Ele era tipo o Ross Lynch italiano da minha época. Era loiro, tinha os cabelos compridos, olhos escuros bem intensos e aquela postura meio de bad boy tipo o Patrick Verona em 10 Coisas que Eu Odeio em Você.
Ele entrou no primeiro ano do ensino médio e se tornou o bad boy mal-encarado, então sempre andava sozinho e nunca se enturmava. Ele acabou entrando para o time do futebol, mas era muito ruim, então sempre ficava na reserva, depois de um tempo, ele mal aparecia no treino. Ele aparecia na arquibancada durante os treinos e sempre parecia estar rabiscando em seu caderno, futuramente eu descobri que ele fazia desenhos maravilhosos, muitos meus.
Bom, eu e Luca começamos a nos envolver em uma viagem que teve para a vinícola da minha família. Essa viagem era anual e tradicional da escola durante o verão, íamos com o professor de química para explicar as alterações que a uva sofria em contato com os itens que formam o vinho, não me pergunte quais são, aprendi na excursão e não guardei até hoje. E sim, continuo sendo o presidente dessa vinícola.
Como a excursão durava o dia inteiro, eu não fui para a escola encontrar a turma que viria para a excursão, eu os encontrei aqui na frente da fábrica. Os acompanhei durante a excursão junto de um guia da vinícola, passamos desde a plantação das uvas e seus tipos, até a parte de envasamento.
Quando a viagem acabou, a vinícola oferecia um piquenique que era comum durante as visitas turísticas: queijos, embutidos e suco de uva que era feito com o resto das uvas, após a produção dos vinhos. Nos sentamos na frente da casa grande para comer e o professor de química olhava em volta como se procurasse por alguma pessoa, passei os olhos rapidamente por todos os alunos e senti falta dos cabelos loiros de Luca. Era fácil sentir falta, eles brilhavam com o sol, como os de Gemma.
Enchi a mão com alguns pedaços de queijo e me levantei, falando para o professor que iria atrás dele e ele assentiu com a cabeça. Comecei pelo lado de fora, não estava permitido entrar em casa, então comecei cobrindo o básico, o que foi o suficiente. Dei uma volta ao redor de casa e o encontrei atrás dela, olhando para uma área onde se tinha vista da plantação de girassóis da fazenda do lado.
- Luca! – O chamei e ele se virou. – O professor tá chamando para o piquenique. – Apontei para trás e me aproximei do mesmo.
- Você mora aqui? – Ele perguntou, ignorando totalmente minha pergunta.
- Moro, meu quarto é aquele ali! – Apontei para uma janela no último andar da casa.
- E você ainda tem essa vista? – Ele perguntou e eu ri fracamente.
- Tenho, dos girassóis e das uvas do outro lado. – Dei de ombros. – Mas os girassóis não ficam bonitos sempre, esse produtor faz óleo de girassol, então ele espera secar para tirar as sementes e produzir óleo.
- Que triste! – Ele falou e eu dei de ombros.
- É, fica bem mórbido quando chega o outono. – Ri fracamente e vi seu caderno com o desenho da plantação. – Você desenha bem.
- Valeu!
- É o que você faz quando vai aos jogos? – Perguntei e ele virou algumas páginas, estendendo o caderno para mim e vi um desenho meu falando com a minha equipe, eu tinha a mão esticada e parecia falar bem firme com as pessoas que o desenho não mostrava. – Uau! – Falei surpreso. – Você tem futuro. – Ele riu fracamente.
- Eu mostro um desenho teu e você fala que eu tenho futuro? – Franzi a testa.
- O que preferia que eu falasse? – Ri fracamente.
- Algumas pessoas comentaram que você tinha um namorado ano passado. – Virei para trás, vendo se não tinha ninguém em volta.
- Tinha e prefiro que não fale disso aqui, meu pai não sabe. – Suspirei.
- Desculpe. – Ele assentiu com a cabeça. – Mas é verdade?
- É, ele se mudou no fim da oitava série. – Dei de ombros. – O que você tem a ver com isso?
- Talvez esteja na hora de você ter outro namorado. – Ele comentou e eu franzi a testa.
- Você? – Perguntei, nessa época eu já tinha mais firmeza para abordar esse assunto.
- Por que não? Eu vejo como você me olha. – Ele falou e eu ri fracamente.
- Como a escola inteira te olha, você quer dizer. – Entrei na brincadeira.
- Bom, eu quero você! – Ele falou firme.
- E você costuma ter o que quer? – Perguntei, dando um passo em sua direção e ele deu de ombros.
- Normalmente sim.
- Talvez mais uma não tenha problema! – Falei e levei minha mão até sua nuca, colando meus lábios nos dele.
Ele me puxou mais firme pela cintura e colou seu corpo no meu. O beijo era bem mais firme dos que eu dava em Filippo, com Filippo era brincadeira de criança, Luca tinha uma pegada muito forte e muito boa. Scott, se você estiver lendo isso, você é melhor, ok?! Só que Luca foi meu primeiro em muitas coisas, acabou marcando um pouco, mas é você que eu amo.
Quando a gente se afastou, minha respiração estava descompassada e acelerada e a boca de Luca vermelha. Ele deu um sorriso para mim, pegando suas coisas no chão e colocou sua mochila nas costas.
- A gente se vê, Jack. – Ele disse e abanou com a mão, se afastando.
Olha, confesso que até hoje eu me perguntava como essas coisas aconteciam comigo, eu tive dois caras ótimos na minha vida, mais, na verdade. Com exceção do meu Anthony, todos tinham sido ótimos, mas eles vinham atrás de mim, eles que me encontravam e as coisas aconteciam.
Voltamos para o piquenique e logo depois a excursão foi embora, acredite, eu preferia que não tivessem ido, o que aconteceu em seguida foi o começo de uma das dores de cabeça mais longas da minha vida. Só a primeira, obviamente.”
“Vi o ônibus da escola sair e acenei para ele, voltando a encarar a casa grande e entrei no mesmo, encontrando minha mãe tricotando na sala de TV e me joguei no sofá ao seu lado, abrindo um largo sorriso. Ela riu da minha reação e franziu a testa.
- O que aconteceu? – Me perguntou e eu ri fracamente.
- Sabe o Luca? Aquele garoto que eu sempre comentei? – Perguntei franzindo os lábios e ela assentiu com a cabeça.
- Vocês... – Ela começou a dizer, mas fomos interrompidos com um grito vindo da escada.
- Giovanni Bolzan! – Arregalei os olhos, me levantando de prontidão com minha mãe do meu lado e observamos meu pai descer até vermelho de raiva.
- Gigi, o que houve? – Minha mãe perguntou para meu pai, se aproximando dele que vinha muito rápido em minha direção.
- Você sabe o que seu filho tem feito, Branca? O que ele tem feito em nossas costas? – Ele falou firme e eu sabia naquele momento que havia sido desmascarado. A janela do escritório também dava para a plantação de girassóis, só não sabia que ele estava lá.
- Pai, eu...
- Não fale comigo, sua bichinha!
- Giovanni! – Minha mãe falou firme.
- Não me interrompa, Branca! Esse garoto precisa aprender que aqui em casa não é lugar para mulherzinha. – Ele se soltou de minha mãe e veio em minha direção, dando um primeiro tapa em minha cara.
- Giovanni! – Minha mãe tentou segurá-lo e ele se desvencilhou com o cotovelo, acertando seu rosto e derrubando-a para trás.
- Mãe! – Falei firmemente, me aproximando dela, mas meu pai me puxou pelo braço, começando a bater em mim com os punhos cerrados. Uma, duas, três vezes. Minha cabeça começava a pesar muito, o sangue saía de alguma parte de meu rosto e eu já estava com a visão turva.
- Pare, Giovanni! Pare agora! – Só ouvia os gritos fortes de minha mãe enquanto eu levava chutes derrubado no chão.
- Ele é uma bichinha, Branca. Ele não tem lugar para essa casa. – Sentia que minha respiração faltava aos poucos. – Não quero você nunca mais aqui.
- Pare agora! – Minha mãe se esgoelou, mas logo depois eu senti um chute em meu rosto e apaguei.
Vocês não sabiam que tinha sido tão feio assim, não é? Acredite, não é algo que eu desejo nem para o meu pior inimigo. Eu tinha 15 anos, apanhei até desmaiar do meu próprio pai, do homem que me teve e me criou. Acordei 23 dias depois no hospital com minha mãe chorando na cama.
Abri os olhos devagar, sentindo que meu olho direito não se abria completamente e percebi que o mesmo ainda estava um pouco inchado. Olhei em volta e só conseguia ver branco e azul claro para qualquer lado que eu olhava. De um lado tinha máquinas e do outro encontrei minha mãe com o rosto avermelhado enquanto olhava para uma revista.
Tentei falar, mas percebi que eu tinha um cano enfiado em minha boca, então tentei mexer a mão devagar, tocando seu braço que estava apoiado na cama, raspando a ponta da unha na mesma. Ela me olhou assustada e se levantou rapidamente, me abraçando.
- Finalmente! – Ela disse chorando em ouvido. – Ah, você acordou, meu filho! Graças a Deus! – Ela falava repetidamente e se afastou, olhando para mim. – Não tente falar, ok?! Você está entubado. – Ela disse e eu senti um beijo dela em minha testa que latejou com o ato.
Como não podia falar, arqueei os ombros e as mãos tentando perguntar o que aconteceu, ela captou rapidamente.
- Seu pai te viu beijando o Luca e surtou porque você é diferente. – Ela tentou falar calmamente, passando a mão em meus cabelos que estavam compridos. – Ele te bateu, filho, muito. – Ela voltou a chorar novamente. – Você ficou em coma por 23 dias. – Ela soltou a respiração fortemente. – Eu pensei que tinha te perdido. – Ela passou a mão em meu rosto e eu ergui a mão com o monitor em meu dedo para segurar seu braço, mesmo que fracamente. – Alguns funcionários me ouviram gritando e tiraram ele de cima de você, não sei o que aconteceria se ele continuasse... – Neguei com a cabeça, pedindo para ela parar, pois eu também já estava chorando.
- Então, alguém acordou! – O médico falou entrando no quarto. – Bom te ver com os olhos abertos, Jack! – Ele falou olhando para minha mãe que deu um largo sorriso para o médico. – Vejo que está respirando por conta, vamos tirar isso aqui de você para batermos um papo? – Ele falou se aproximando de mim e começando a desrosquear os aparelhos. – Tussa o mais forte que conseguir, ok?! – Ele falou, começando a puxar e automaticamente eu senti vontade de tossir, vendo o tubo sair de minha boca e vi dois enfermeiros entrarem no quarto. – Pronto, pronto! – A enfermeira passou um pano em minha boca, provavelmente limpando a baba. – Não vamos abusar, ok?! Só fale o necessário. – Assenti com a cabeça. – Que bom, aprende rápido. – Minha mãe riu fracamente. – Sua mãe já te explicou o que aconteceu?
- Sim. – Falei, sentindo minha voz sair muito fraca e mais grossa que o normal.
- Você sente alguma dor? Algum incômodo?
- Minha cabeça. – Levei a mão à cabeça e depois desci para meu abdome. – Barriga. – Falei fracamente.
- Essas foram suas áreas mais afetadas, você levou chutes e socos nessas duas regiões, além de alguns pontos esporádicos. – Ele falava calmamente. – Você fraturou duas costelas, torceu o tornozelo, teve severos cortes no rosto, incluindo esse olho inchado que ainda não reduziu. Como está sua visão?
- Normal, eu acho. – Falei, levando uma mão em cada olho, vendo se a visão ficava embaçada ou escura.
- Que bom, isso são boas notícias. – Ele sorriu. – Mas o mais severo foi a perda de um rim. – Ele disse e eu olhei para minha mãe. – É possível viver normalmente com um rim só, mas é necessário ter alguns cuidados para não perdê-lo, do contrário, sua situação ficaria crítica. - Ele brincou e eu dei um pequeno sorriso. - Vou te explicar melhor depois. - Assenti com a cabeça. – Bom, como seu caso é considerado abuso de menor, tem uma assistente social que quer falar com você. – Minha mãe assentiu com a cabeça. – Você pode recebê-la agora?
- Posso?! – Falei um tanto indeciso, não sabia o que podia falar com a assistente social.
- Depois eu volto para fazer alguns exames, mas não abuse, ok?! – Assenti com a cabeça. – E beba água, vai ajudar com que sua voz volte ao normal.
Ele se retirou e a assistente social entrou. Ela não falou nada do que a gente não saiba, ela perguntou o que aconteceu, se era frequente, o que causou essa reação exagerada e perguntou se gostaríamos de denunciar. Minha mãe preferiu responder que conversaríamos ainda, já que eu tinha literalmente acabado de acordar do coma. Eu não sabia o que fazer, ele era meu pai, certo? O que se faz em uma situação dessas?
Eu acabei ficando mais duas semanas no hospital, eles queriam monitorar minha fratura nas costelas que ainda não haviam sido curadas de completo e ainda podiam afetar algum outro órgão, além da minha visão que ainda era uma preocupação para o médico. Acabei recebendo visitas de Gemma e de meus tios, onde Gemma estava ficando, de alguns amigos da escola e de Luca que se sentia muito culpado com o que tinha acontecido.
- Me desculpe, Jack, se eu soubesse que...
- Não! – Abanei com a cabeça. – Você não tem culpa de nada. Quem imaginaria que meu pai era louco a esse ponto? – Falei e ele suspirou.
- Você vai ficar bem, não vai? – Sorri.
- Vou sim! – Assenti com a cabeça. – Mais alguns dias e eu volto para casa, para a escola, só estou aqui por precaução dos médicos.
- Foi muito feio o que houve, Jack. Eu vim aqui no dia em que eu soube, acho que foi dois ou três dias depois do acontecido, você estava irreconhecível. – Suspirei. – Não deixe que ele faça isso de novo contigo, ok?!
- Pode ter certeza que isso nunca mais vai acontecer. – Minha mãe entrou no quarto. – Luca, certo?
- Sou eu, senhora. – Ele sorriu e minha mãe o cumprimentou com um aperto de mão.
- É muito bom conhecer o homem que me mostrou o monstro com quem eu sou casada e que fez meu filho feliz um pouco. – Luca sorriu envergonhado e minha mãe se sentou na poltrona novamente.
- Obrigado, senhora. – Ele sorriu. – Bom, melhor eu ir. – Ele falou, mas antes tirou seu caderno da mochila e me entregou. – Fica com ele, eu fiz alguns desenhos durante sua ausência.
- Obrigado. – Sorri.
- Me deem notícias, por favor. – Ele sorriu acenando e saiu do quarto.
- Pode deixar. – Minha mãe retribuiu. – Bom, agora somos eu e você, querido. O que você quer fazer sobre isso?
- Eu não sei, mãe. Ele é meu pai, não é?
- Sim, mas você não precisa conviver mais com ele se não quiser.
- Eu não quero, eu estou com medo dele, não posso viver com ele. – Ela suspirou.
- Bom, eu já falei com meus advogados e acho que sei de uma solução ideal para isso. Mas fique bem antes, ok?! Preciso de você pronto para enfrentar seu pai. – Ela segurou minha mão e eu sorri, confirmando com a cabeça.
- Eu te amo, mãe. Obrigado por tudo! – Ela negou com a cabeça.
- Xí. – Ela disse e eu assenti com a cabeça.”
“Depois das minhas duas semanas de observação, eu já estava quase bom. O inchaço sumiu por completo, mas ainda tinha algumas cicatrizes no rosto, que sumiriam conforme o passar dos dias, ainda usava a botinha por causa da torção do tornozelo e teria uma cicatriz na minha barriga pelo resto da vida pela retirada do rim, mas eu estava bem. Estava mais forte, um pouco mais ágil e pronto para voltar para casa.
Minha mãe não havia voltado para casa desde o acontecido, ela ficava quase todos os dias comigo, só saía para tomar um banho na minha tia e Gemma ficava de acompanhante por algumas horas para ela descansar. Hoje voltaríamos para a vinícola. A única notícia que sabíamos, era que os empregados também não voltaram para a empresa depois do acesso de fúria de meu pai, ou quem aquele homem seja.
Minha mãe sabia que não seria difícil simplesmente voltar, legalmente, ela era a dona de tudo da Vinícola Bolzan, o terreno é da família dela, a escritura da casa está em seu nome e todos os arquivos administrativos estavam em seu nome, além de que ela estava muito disposta a comprar a parte de Giovanni pai para que ele nunca mais nos atrapalhasse.
Por isso, voltamos para casa com o advogado que estava cuidando do divórcio de minha mãe e escolta policial por precaução. Não sabíamos qual seria sua reação, mas ninguém queria sair machucado novamente. Quando chegamos à casa, minha mãe e o advogado saíram do carro e a polícia chegou logo atrás. Um deles até me ajudou com as muletas.
- Obrigado! – Falei assentindo com a cabeça e andei até minha mãe, me apoiando com as muletas e mantendo o pé fora do chão.
Olhei rapidamente em volta, para a plantação de uvas vazia e até um pouco amareladas, ficamos mais de um mês fora, a empresa estava largada. Ouvi o barulho das portas serem abertas, portas que costumavam só fechar à noite, e minha mãe entrou com seu advogado, começando a gritar pelo meu pai.
- Giovanni! Giovanni! – Ouvi sua voz ecoar pela casa vazia e segui até eles, com os policiais me acompanhando a cada passo ou pulo, dependendo do ponto de vista.
- Quem está aqui? – Ouvi sua voz e senti meu corpo tremer, olhei para o policial ao meu lado e ele me encarou.
- Está tudo bem? – Assenti com a cabeça, encostando o corpo no lado fechado da porta dupla.
- Ah, finalmente voltou para casa, não é? – O vi no andar de cima e ele logo começou a descer as escadas. – E ainda veio acompanhada? – Ele foi irônico. – Ele não é mais bem-vindo nessa casa.
- Essa casa é minha, Giovanni, e ele é bem-vindo! – Minha mãe falou firme, cruzando os braços.
- Ele não vai mais viver no mesmo teto que eu. – Ele falou como se fosse óbvio.
- Bom, então só temos uma solução, não é? – Minha mãe se mexeu devagar, dando alguns passos para trás.
- Você está educadamente me expulsando de casa? – Minha mãe riu fracamente.
- O que você esperava? Você espancou meu filho como se ele não valesse nada, seu filho...
- Ele não é meu filho e ele não vale nada. – Minha mãe riu sarcasticamente.
- Que bom que estamos decididos quanto a isso. Pode arrumar suas coisas e ir embora agora! – Ela falou firme.
- Eu não vou a lugar nenhum, essa casa também é minha.
- Não segundo os documentos, senhor Bolzan. – O advogado falou pela primeira vez e meu pai ficou chocado, olhando da minha mãe para o advogado.
- Você está escolhendo essa bichinha ao invés do seu marido? – Meu pai se aproximou da minha mãe e os policiais se aproximaram.
- Não, eu estou protegendo o meu filho de um monstro que eu tive o azar de me casar. – Ela falou quase como se cuspisse nele.
- Ah, sua...
- Ah, além disso. – Ela o interrompeu. – Eu quero o divórcio, ficarei muito feliz se colocar um preço na sua parte da empresa, pois eu irei comprá-la e eu tenho uma ordem restritiva contra você.
- Que deverá ser cumprida à partir de agora. – O advogado falou novamente.
- Senhor Bolzan, o senhor está preso por abuso de menor e violação de ordem restritiva. – Um dos policiais falou e o rosto de meu pai ficou vermelho automaticamente.
- Sua puta! Você não pode fazer isso comigo. – Minha mãe somente respirou fundo. – Você vai deixar esse viado destruir nossa família. – Ele gritava enquanto os policiais colocavam algemas nele.
- Não, Giovanni, eu não vou deixar você destruir minha família. Pena que eu não vi antes. – Ela suspirou. – Mas obrigada pelos meus filhos, eles são as melhores coisas que já me aconteceram. – Ela respirou fundo. – Podem levá-lo.
- Você não pode fazer isso! – Ele gritava enquanto era puxado para fora e eu me afastei da porta para não ser atingido, já que ele estava bem arredio.
- Eu vou cuidar dos trâmites legais e voltamos a nos falar sobre a sociedade da empresa e do seu divórcio. – O advogado falou e minha mãe assentiu com a cabeça.
- Obrigada, Brad. Você foi fantástico. – Ele assentiu com a cabeça e se afastou.
- Um bom dia para vocês. E que o senhor se recupere bem, senhor Bolzan. – O advogado falou e eu assenti com a cabeça, sorrindo.
- Obrigada! – Minha mãe falou e eu me aproximei dela, sentindo-a passar o braço em meu ombro. – Eu prometo, meu querido. Ninguém nunca mais vai relar a mão em você! – Ela disse, estalando um beijo em minha bochecha. – Vamos recomeçar.
- Sim, mãe! – Suspirei. – Um dia de cada vez. – Suspiramos juntos.
- Bom, vamos organizar isso. Preciso ligar para os empregados, falar com a administração, fazer gerenciamento de causa. – Ela suspirou. – Vou trazer travesseiros e cobertas para você, vamos organizar sua cama aqui na sala até esse pé melhorar.
- Obrigado. – Sorri. – Vai resolver suas coisas, eu estou bem! – Sentei no sofá e deixei as muletas de lado.
- Ok, pode deixar!”
“Bom, depois daí a gente ainda teve algumas dores de cabeça. Meu pai não queria assinar o divórcio, depois ele implicou que não venderia sua parte, depois brigou pela guarda da Gemma pela primeira vez, depois tentou fazer alienação parental com Gemma, mas ela sempre foi muito esperta, então isso não funcionou.
Em torno de seis meses as coisas melhoraram, foi até estranho o dia em que o advogado de minha mãe não entrou mais em contato e mandou todos os processos finalizados. Ninguém acreditava que pudéssemos ter paz por um tempo. Os funcionários voltaram, a empresa voltou a prosperar e as coisas voltaram a caminhar da melhor forma possível.
Nisso eu já estava no segundo ano do Ensino Médio já e eu me assumi para o mundo. Eu gostava muito de Luca e ele tinha aquele senso protetor, principalmente logo que eu voltei para a escola após o acontecido. Acabamos entrando em um relacionamento convencional.
Foi com Luca que eu tive minha primeira vez aos 16 anos. Não vou entrar em detalhes desse momento da minha vida, nem insinuar como fez, mas foi estranho! Isso eu não posso negar, mas como a gente da banda diz: toda primeira vez é estranha. Primeiro beijo, primeira vez, entre outros. Eu tentei dar e receber, mas acabei preferindo a parte de dar, acho que é por isso que eu e Scott demos muito bem, já Luca também preferia dar, então era bem estranho.
Bom, estranho é eu falar das minhas preferências sexuais com vocês.”
- Ei, ! – Gritei, erguendo o rosto do computador. – Qual vai ser a classificação indicativa desse livro?
- Menos que 18, Jack, sem sexo explícito! – Ela ergueu o olhar de seu caderno de músicas e eu suspirei.
- Ok, ok! – Abanei a mão e voltei os olhos para a tela do computador.
“Não foi pela nossa preferência sexual que a gente não deu certo. Eventualmente eu acabei descobrindo que ele jogava nos dois times, mas preferia muito mais as mulheres, então nosso relacionamento acabou esfriando ainda no segundo ano. Ainda mantivemos contato até eu vir para Los Angeles.
Eu não tive nenhum interesse amoroso no terceiro ano e me formei bem, com várias recuperações, mas deu para eu passar e ainda conseguir 25 por cento de bolsa em uma faculdade particular de administração aqui em Turim mesmo. A única certeza da minha vida era que eu ajudaria minha mãe no vinhedo.
Depois do acontecido com meu pai, meu tornozelo demorou muito para melhorar, então eu acabei saindo do time de futebol. Confesso que dei graças a Deus, estava um tanto enjoado já sempre da mesma coisa, queria alguma coisa nova na vida, então acabei entrando no coral da escola. Minha escola já tinha aulas de música desde meus três anos, mas eu nunca dei muita moral, sempre fui viciado no futebol, mas quando eu entrei no coral, as coisas deram uma guinada.
Primeiro como voz de apoio e eventualmente fui descobrindo que eu realmente tinha jeito para a coisa, acho minha voz muito parecida com a do Adam Levine, tanto que as pessoas comparam até hoje. Então, depois de formado, eu continuei com as aulas de canto no conservatório da cidade e comecei a me apresentar em barzinhos, conseguindo até uma graninha extra com isso.
Mas foi aos meus 18 anos que eu tive outro baque na minha vida: o aparecimento do câncer da minha mãe. “
“Como vocês sabem, eu cheguei na aos 19 anos e minha mãe já estava doente. Na linha do tempo, estamos há pouco mais de um ano desse encontro.
Com a chegada dos 50 anos de minha mãe, ela começou a fazer aqueles exames frequentes que toda mulher faz e, em um desses exames, descobrimos vários cistos em suas duas mamas. Podíamos pagar o tratamento, mas aquilo foi difícil para gente. Agora éramos só nós três, não é? Gemma já tinha nove anos, mas aquilo era complicado para ela entender.
- Bom, senhora Bolzan, os exames mostraram um carcinoma ductal invasivo. – Franzi a testa.
- Isso quer dizer... – Perguntei.
- Câncer? – Minha mãe perguntou e a médica afirmou com a cabeça.
- Esse câncer é o mais comum dos invasivos, ele se inicia em um duto de leite e cresce do tecido adiposo da mama...
- Isso tem cura? – Perguntei rapidamente.
- Nós faremos exames mais invasivos para ter certeza da extensão do carcinoma, mas precisaremos retirar suas mamas. – Minha mãe travou e eu segurei sua mão.
- As duas? – Minha mãe perguntou baixo.
- Sim. Esse câncer pode se espalhar facilmente pelo sistema linfático e circulação sanguínea, então queremos evitar que isso aconteça. – Ela disse.
- E depois? – Minha mãe perguntou baixo, mas eu estava travado na minha cadeira.
- Caso haja necessidade, faremos tratamento com quimioterapia e radioterapia. Mas descobrimos cedo, a senhora tem boas chances. – Respirei fundo.
- Podemos ficar sozinhos por um tempo? – Perguntei e a médica assentiu com a cabeça e se levantou, saindo da pequena sala de exames.
- Eu não sei o que dizer. – Minha mãe falou e eu segurei sua mão.
- Eu não consigo acreditar, mãe. Primeiro lutamos contra o papai, agora contra isso? Quando a vida vai nos dar uma folga? – Falei um tanto alto demais, sentindo as lágrimas escorrerem pelo meu rosto.
- Nós vamos lidar com isso da mesma forma que lidamos com seu pai. – Ela respirou fundo. – Juntos.
- Você parece calma demais, mãe. É um câncer! – Respirei fundo. – Eu não posso perder.
- Você não vai, querido. – Ela acariciou meu rosto. – Mas também não há que fazer, precisamos lutar contra isso. E eu sei que com você e Gemma tudo ficará muito mais fácil.
- Ah, mãe! – A abracei apertado. – Eu estarei aqui sempre contigo.
Passamos pela cirurgia, minha mãe se recuperou bem, mas já tinha se espalhados para outros órgãos, o que ela precisou fazer outros tipos de tratamento, perdendo seus cabelos e pelos. Esse câncer dela entrou em remissão quando eu tinha 20 anos e voltou severo pouco antes dela morrer.
Mas algo que o tratamento não tirou dela foi seu ânimo. Parece que com meu pai ela vivia enclausurada dentro de uma gaiola, depois dele, ela era muito mais animada, feliz, livre. E o câncer não tirou isso dela nem antes dela falecer.
Depois das sessões de quimioterapia, ela ficava muito cansada, então algo que ela sempre falava que a animava, era me ouvir cantar e me inspirou a tentar seguir carreira nessa área.
- Deita, mãe! Eu vou pegar água para você. – Falei, vendo Gemma se ajoelhar ao seu lado.
- Eu estou bem! – Ela falou segurando minha mão e tossiu algumas vezes. – Canta para mim? – Abri um pequeno sorriso.
- De novo? – Perguntei, me sentando na mesinha de centro, de frente a ela.
- Eu adoro te ouvir cantar, querido. – Ela sorriu fracamente.
- Eu também! – Gemma se sentou ao meu lado e eu ri.
- O que você quer que eu cante? – Ela girou no sofá, olhando para mim e eu segurei sua mão.
- Imbranato. – Ela disse e eu respirei fundo, assentindo com a cabeça.
- Ok, exigente! – Brinquei e ela riu fracamente. Respirei fundo antes de começar a cantar aquela música que eu já sabia de cor. - È iniziato tutto per un tuo capriccio, io non mi fidavo era solo sesso. Ma il sesso è un'attitudine, come l'arte in genere, e forse l'ho capito e sono qui. – Ela tinha um largo sorriso no rosto e eu segurava sua mão firme. - Scusa sai se provo a insistere, divento insopportabile. Ma ti amo, ti amo, ti amo, ci risiamo vabbè, è antico, ma ti amo. – Puxei o ar mais forte. - E scusa se ti amo e se ci conosciamo da due mesi o poco più... – Alonguei a frase. - E scusa se non parlo piano, ma se non urlo muoio. Non so se sai che ti amo. E scusami se rido, dall'imbarazzo cedo, ti guardo fisso e tremo. – Fechei os olhos. - All'idea di averti accanto, e sentirmi tuo soltanto. E sono qui che parlo emozionato, e... – Olhei para ela novamente. - E sono un imbranato. E sono un imbranato.
- Lindo! – Minha mãe falou e Gemma me aplaudiu, me fazendo sorrir. – Você deveria seguir carreira na área, querido.
- Não, mãe. Você precisa da minha ajuda aqui! – Ela negou com a cabeça.
- Não pense em mim, Jack. Siga seus sonhos. Um dia eu não estarei mais aqui e não quero que você pense que perdeu tempo por causa de mim. – Ela suspirou.
- Não fala isso, mãe. – Neguei com a cabeça.
- Eu não digo sobre a doença, digo sobre o curso natural da vida. Quero vocês realizados quando isso acontecer. – Suspirei, assentindo com a cabeça.
- Eu apoio, você faria muito sucesso, igual Tiziano! – Gemma disse e eu passei a mão livre pelos seus ombros.
- Eu vou pensar, ok?! Prometo! – Falei e as duas confirmaram com a cabeça. – Agora descansa, mãe. Vou ver se Milena precisa de alguma ajuda e depois prepararei algo para você lanchar. Pode ser?
- Pode sim. Obrigada! – Ela falou. – Gemma, lição de casa. – Ela assentiu com a cabeça.
- Já vou! – Ela falou e levantamos, seguindo com nossas vidas.
Como tudo que minha mãe sugeria para mim, eu acabei acatando a ideia de seguir como cantor. Eu sabia que cantava bem, tinha uma voz um pouco mais fina, atingindo algumas notas mais agudas. Foi nessa época que comecei a cantar em bares e karaokês, até que um olheiro gostou de mim e me ofereceu um contrato.”
“- Jack, você o próximo! – O dono do bar falou e eu me levantei, ouvindo meus amigos gritarem em torcida para mim e subi rapidamente no palco.
Peguei o microfone de fio, tirando-o do pedestal e afastei o mesmo para o canto do palco, abrindo um pouco mais de espaço para mim em cima do palco e apontei para o controlador de som, ouvindo-o liberar a música This Love do Maroon 5 para mim. Já haviam me comparado com o vocalista, então por que não aproveitar?
- I was so high, I did not recognize, the fire burning in her eyes, the chaos that controlled my mind. - Comecei a cantar, segurando o fio com uma mão e o microfone com a outra. - Whispered goodbye as she got on a plane, never to return again but always in my heart. This love has taken its toll on me, she said goodbye too many times before. – Deixei minha voz fluir, ouvindo as pessoas do bar gritarem por mim. - And her heart is breaking in front of me, I have no choice, 'cause I won't say goodbye anymore, woah, woah, woah. – Movimentei o corpo no ritmo da música, me empolgando.
- I tried my best to feed her appetite, keep her coming every night, so hard to keep her satisfied. Oh, kept playing love like it was just a game, pretending to feel the same, then turn around and leave again, but, oh! – Movimentei as mãos animadamente, ao som da música. - This love has taken its toll on me, she said goodbye too many times before, and her heart is breaking in front of me, I have no choice, 'cause I won't say goodbye anymore woah, woah, woah. – Eu era péssimo de dança coreografada, mas me soltava bastante com um bom rimo.
- I'll fix these broken things, repair your broken wings, and make sure everything is alright. – Estiquei as mãos, ouvindo o pessoal do bar se animar comigo. - My pressure on your hips, sinking my fingertips, into every inch of you, 'cause I know that's what you want me to do. – Sacudi a cabeça.
- This love has taken its toll on me, she said goodbye too many times before. Her heart is breaking in front of me, I have no choice, 'cause I won't say goodbye anymore. This love has taken its toll on me, she said goodbye too many times before. My heart is breaking in front of me, she said goodbye too many times before. This love has taken its toll on me, she said goodbye too many times before, her heart is breaking in front of me, I have no choice, 'cause I won't say goodbye anymore. – Finalizei a música, ouvindo o pessoal me aplaudir animadamente e fiz uma flexão para frente, agradecendo e deixei o microfone no pedestal e saí do mesmo.
- Você foi muito bem, Jack! – Alex falou e eu o cumprimentei rapidamente. Depois cumprimentei Charlie e nos sentamos à mesa.
- Mais uma rodada, por favor! – Charlie falou para a garçonete e logo ela trouxe canecas de chope para gente.
- Falando sério agora, você precisa estourar, cara! Você canta muito bem.
- Eu sei, tenho melhorado cada vez mais com o professor, mas não é como se isso fosse cair na minha cabeça, sabe? Além de que eu nem sei como me divulgar. – Roubei um pedaço de queijo da tábua de frios na mesa.
- Você poderia começar gravando uma demo. – Ouvi uma voz atrás de mim e virei o corpo, vendo um cara sentado na mesa ao lado, com o braço apoiado no encosto da mesma.
- Quem é você? – Alex perguntou um tanto grosseiro e o cara se levantou.
- Andre Terriani. – Ele falou, estendendo a mão para mim e eu apertei. – Eu sou olheiro da Virgin Records Itália. – Arregalei os olhos.
- Por que a gente não deixa eles conversarem? – Charlie falou para Alex e ambos se levantaram rapidamente e Andre se sentou ao meu lado.
- Você canta muito bem, senhor...
- Bolzan. Jack Bolzan! – Falei rapidamente.
- Ouvi que você quer seguir carreira.
- Sim, é algo recente, mas estou tentando, cantando em bares, restaurantes, alguns eventos corporativos. – Falei ponderando com a cabeça.
- Aqui na Itália trabalhamos com poucos nomes, mas se você quiser se afiliar conosco, podemos te colocar no nosso banco de dados internacionais e você ser chamado para trabalhos pontuais. Desde apoio para algum artista, até uma gravação solo.
- Mesmo? – Falei empolgado.
- Não é algo tão legal como você está pensando, mas é uma chance de você começar, além de que você não precisa se prender a nós. Por ser trabalhos esporádicos, você pode conseguir outras coisas.
- Isso é legal sim! – Falei. – Como funciona pagamento e afins?
- Por trabalho. Por enquanto te colocamos no banco de dados e quem sabe não te chamam para algo? – Ele falou. – É uma afiliação gratuita, meio que um banco de talentos mais profissional e o que eu vi aqui hoje é muito profissional.
- Nossa, obrigado, Andre! Fico muito feliz! – Assenti com a cabeça.
- Eu gravei sua apresentação aqui hoje, então já dá para usar, mas se puder comparecer à gravadora em Roma para uma gravação de voz, desempenho, além de fazer um pequeno cadastro conosco, seria legal.
- Claro! Vamos marcar! – Ele tirou um cartão do bolso e me entregou.
- Ligue para mim na segunda-feira, sim? – Ele me estendeu a mão novamente e eu o cumprimentei novamente.
- Obrigado! – Falei, vendo-o se retirar e logo a mesa se encheu com Alex e Charlie.
- O que aconteceu? – Eles perguntaram quase juntos.
- Eu acho que estou no banco de dados da Virgin Records.
- Cara, isso é fantástico! Precisamos comemorar! – Charlie falou e eu ri.
Daí você pode ter imaginado o que aconteceu. Fui para Roma, fiz esse cadastro no banco de dados, gravei cinco músicas no estúdio deles, de vários ritmos, e uma gravação de apresentação, meio semelhante ao que eu apresentei naquele dia, agora era só esperar.”
“Eu não fui chamado nenhuma vez durante seis meses, achei até que aquilo havia sido em vão, mas eu não pagava nada para estar naquele banco de dados, então eu nem reclamava. Mas foi tipo um balde de água fria, eu imaginava que seria tipo fechar um contrato, como contou que fechou o dela, mas o negócio não foi bem assim.
Nesse meio tempo, eu fazia faculdade de administração à distância, para facilitar o cuidado de minha mãe e da empresa, fazia aulas de canto duas vezes por semana para melhorar minha potência vocal e cantava em alguns bares pela cidade, restaurantes e as vezes alguns eventos que apareciam, não muitos, gostaria de deixar claro.
Até que Stone apareceu na minha vida. Parece que eu estou vendo o tombo que eu levei quando recebi a ligação do pessoal da gravadora falando que eu havia sido selecionado, as funcionárias da empresa que estavam limpando a casa ficaram realmente preocupadas que eu tivesse quebrado novamente o tornozelo.
- Eu atendo! – Falei ao ouvir o telefone tocando, depois lembrei que eu estava sozinho em casa. Minha mãe foi visitar minha tia e Gemma estava na escola. Desci o primeiro lance de escadas e peguei o telefone. – Alô?
- Olá, gostaria de falar com Jack Bolzan? – A menina falou do outro lado da linha.
- Sou eu! – Falei.
- É da Virgin Records Itália, eu estou ligando, pois você foi selecionado para fazer parte de uma banda que está se formando em Los Angeles, você teria interesse?
- Oi? Los Angeles? Isso é sério? – Arregalei os olhos, me apoiando no corrimão.
- Sim, senhor. – Ela riu fracamente. – Seu currículo foi escolhido pela equipe de lá e eles querem que você seja o backing vocal de uma cantora que está prestes a ser lançada.
- Nossa! Uau! – Falei empolgado e surpreso ao mesmo tempo. – Como funciona?
- Foi enviado pelo correio as informações de contrato e tudo mais, deve chegar em alguns dias, mas adiantando, é um contrato de emprego com a Virgin Records americana, incluindo todas as despesas de transferência e mudança para os Estados Unidos, moradia, além de todo treinamento, aulas e outros itens descritos detalhadamente no contrato.
- Uau! – Respirei fundo. – Caso eu decida aceitar, qual meu próximo passo?
- Inicialmente, você espera o contrato chegar em sua casa, depois analise, aguardamos sua resposta em até 15 dias.
- Nossa, obrigado! Obrigado mesmo! – Falei, desligando o telefone e dei um grito assim que o fiz, chamando a atenção das auxiliares de limpeza.
- Está tudo bem, senhor Bolzan? – Uma delas perguntou.
- Está ótimo, Rita! Está tudo maravilhoso! – Dei um pulo alto, caindo em falso e tropecei nos últimos quatro degraus da escada, dando de cara no chão.
- Jack! – As duas gritaram, vindo em minha direção e eu me levantei rapidamente.
- Está tudo bem, está tudo bem! – Falei rindo. – Eu consegui um contrato, mulheres! Eu vou cantar numa banda famosa! – Falei animado e elas gritaram e me abraçaram, me fazendo rir. – Só preciso falar com minha mãe.”
“Depois que o ânimo sumiu, eu me apavorei. Eu estava com muito medo de falar com a minha mãe, porque ela estava doente e agora eram só nós três e do nada eu me mudaria para Los Angeles para viver uma vida totalmente diferente? Não me parecia muito justo, sendo que o motivo de ela ter pedido divórcio de meu pai para começo de conversa, foi por mim.
Eu esperei elas chegarem enquanto tentava me manter o mais calmo possível. O que estava sendo um tanto difícil, em minutos eu criei a habilidade da continência urinária e levantava para ir no banheiro a cada cinco minutos.
- Jack, chegamos! – Ouvi Gemma falar e me levantei rapidamente, encontrando-as deixando algumas sacolas na cozinha.
- Ei, como foi a aula? – Perguntei para Gemma que tinha entrado para a aula de inglês.
- Legal! – Ela deu de ombros. – É só o começo! – Rimos juntos.
- Eu tenho algo para contar para vocês! – Falei com um largo sorriso no rosto, desviando o olhar de uma para outra.
- Você está me assustando. – Gemma disse.
- O que houve, querido? – Minha mãe se aproximou, tirando a bandana de sua cabeça.
- O pessoal da Virgin ligou, mãe. – Falei. – Eles têm um contrato para me oferecer!
- O quê? Não acredito! – Ela me abraçou fortemente. – Como? Onde?
- Eles querem que eu seja backing vocal de uma nova cantora que será lançada em breve...
- Ah, querido, isso é ótimo!
- ...Em Los Angeles! – Finalizei.
- Oh! – Gemma falou e eu respirei fundo.
- O que você acha, mãe? – Segurei suas mãos.
- Eles especificaram como vai ser?
- Eles enviaram o contrato pelo correio, é para estar chegando, mas eles disseram que custeiam todos os gastos, moradia, tem contrato de emprego com a gravadora... É tudo certinho, mãe! – Respirei fundo.
- Ah, querido! – Ela me abraçou novamente. – Se você quer isso, eu o apoio sempre! – Ela disse. – Não se preocupe comigo, nem com Gemma, sabemos nos cuidar, além de que temos condições para ir te visitar regularmente.
- E quando você tiver muito dinheiro, visitar a gente! – Gemma falou e eu ri fracamente, bagunçando seus cabelos.
- Então, vocês acham que eu devo ir?
- Acho que devemos esperar esse contrato chegar e analisar a veracidade das informações, se for algo legal e sério, eu acho que deve ir sim. – Ela sorriu. – Eu disse para ir atrás dos seus sonhos, certo?
- Certo! – Sorri.
- Agora vá realizá-lo. – Assenti com a cabeça sorrindo.
- Obrigado! – Suspirei.”
“As organizações para que eu fosse para Los Angeles ainda demoraram um mês, minha mãe estava bem, a quimioterapia tinha dado efeito, organizamos as coisas na vinícola, contratamos mais uma pessoa para ajudar minha mãe na parte administrativa, Gemma entrou de férias de meio de ano e fomos para Los Angeles.
Eu não sabia com o que eu estava mais empolgado: em conhecer Los Angeles, já que eu nunca havia saído da Itália, ou em começar a trabalhar e conhecer a tal cantora que eles haviam dito. No contrato só dizia que ela tinha 17 anos, era brasileira e havia optado por dar chance a estrangeiros, assim como ela.
Chegamos três dias antes, no primeiro dia eu dormi, o fuso-horário era totalmente diferente, eles estavam sete horas para trás, então aquilo me confundiu tudo. No segundo dia, tiramos o dia para turistar, visitamos o Sinal de Hollywood, a Calçada da Fama, o Píer de Santa Monica, entre outros. De pensar que anos depois fomos inseridos na calçada da fama, parece loucura agora.
Até que o dia finalmente chegou. Combinamos de nos encontrar após o almoço na Virgin Records, minha mãe e minha irmã foram comigo. Cheguei lá, ficando abismado com o tamanho do local e encontrei uma recepcionista logo depois de sair do elevador.
- Olá, buongiorno! – Falei com forte sotaque italiano.
- Olá, no que posso ajudar?
- Temos uma reunião com Jessica Stone. – Falei.
- Claro! Qual seu nome?
- Jack Bolzan. – Falei e ela assentiu com a cabeça, discando rapidamente no telefone e colocando na orelha.
- Jessica? Jack está aqui. – Ela falou, confirmando a resposta com a boca e logo desligou.
- Pode seguir aqui pelo lado esquerdo, ela vai te encontrar no lobby. – Ela falou e eu confirmei com a cabeça.
- Obrigado! – Falei, seguindo para onde ela tinha falado e encontrei um grande lobby do outro lado da porta, com várias portas nas paredes com nomes de produtores, salas de som, etc...
- Jack? – Observei uma loira muito bem-arrumada, com os cabelos lisos, olhos azuis e uma pele acobreada, bem cara de americana mesma. – Eu sou Jessica Stone. É muito bom tê-lo aqui! – Ela esticou o braço.
- É muito bom! Obrigado pela oportunidade.
- Essa é sua mãe? – Ela olhou para minha mãe.
- Branca!
- Gemma! – Elas falaram e Jessica sorriu.
- É um prazer! Bom, Jack você já recebeu as instruções, não é mesmo? Sabe como tudo vai funcionar, mais tarde te levarei para você conhecer sua moradia, é junto da nossa cantora principal, então será bom para vocês enturmarem. – Ela falou e eu assenti com a cabeça.
- Sim, tinha tudo no contrato que me foi entregue. – Assenti com a cabeça.
- Perfeito! Bom, chega daqui a pouco, assim vocês já se conhecem e começamos logo os trabalhos, pode ser? Com o passar dos dias eu vou te apresentando outras coisas.
- Claro! – Sorri. – É, eu só queria saber quem é . – Falei e ela riu.
- Claro, claro! Deixa eu te mostrar algo aqui. – Ela abriu o computador eu estava em sua mão e procurou por um arquivo, abrindo o mesmo e me entregando o mesmo.
Era um vídeo dela em um dos ensaios que eles fizeram durante seu treino aqui na Virgin. Ela estava no estúdio, com um lado do fone colocado em sua orelha e a mão em cima do mesmo, ela cantava uma música da Avril Lavigne. Ela era muito bonita, não uma beleza exuberante, mas bonita, cabelos e olhos castanhos, um sorriso muito bonito, além de uma potência vocal muito boa, não a potência que ela tem hoje, mas para mim, naquela época já era perfeita.
- Uau, ela é muito boa! – Falei rindo fracamente.
- Ela é a nossa cantora principal, vocês vão se divertir, ela é ótima. – Ela sorriu. – Falando nela. – Ela indicou a entrada e a vi entrar com um homem.
- ... E nem tente mexer no meu cabelo enquanto eu estiver dormindo! – Ouvi sua voz mais perto.
- Querida, você chegou! – Ela me avistou e o homem que estava com ela se sentou em uma das poltronas. – Quero que você conheça uma pessoa. – Jessica falou e ela se aproximou, olhando para nós quatro.
- Jack Bolzan. – Falei e ela sorriu.
- Essa é , nossa garota principal. – Jessica sorriu e ela se aproximou de mim.
- É um prazer conhecê-lo, você tem uma voz maravilhosa. – Ela disse e eu não pude evitar em sorrir.
- Eles estavam me mostrando seu vídeo e eu achei você extraordinária! – Ela sorriu envergonhada e assentiu com a cabeça.
- É sua família? – Ela disse para minha família.
- Sim! – Disse. – Minha mãe Branca e minha irmã Gemma.
- É um prazer conhecê-los. – Ela deu um beijo em cada uma, sorrindo.
- Eu adorei a sua iniciativa em trazer pessoas de outras nacionalidades para a banda, e fico feliz que tenha escolhido meu filho. – Branca falou e ela abri um largo sorriso.
- O ponto alto de escolha foi o talento, mas foi muito bom ele fazer parte da diversidade. – Ela riu. – E você, qual sua idade? – Ela perguntou para minha irmã que estava quieta no canto.
- Eu tenho 10. – Gemma sorriu.
- Você é uma graça, sabia? – Ela disse e eu sorri fracamente.
- Eu sei que vocês têm muito que fazer, tem que se conhecer melhor, mas você tem outro compromisso agora, . – Jessica falou, conferindo seu relógio e ela fez um bico, derrubando os ombros para frente.
- Eu não aguento mais! – Ela reclamou e eu soltei uma risada.
- Só mais dois meses. – Jessica disse.
- O que eu tenho agora? – Ela perguntou, suspirando longamente.
- Aula de dança 101. – Ela fez uma careta.
- Oh meu Deus! Eu pareço uma pata dançando! – Ela disse e eu e Gemma seguramos as risadas.
- Vamos mudar isso! – Jessica sorriu. – E você pode vir junto, Jack, assim vocês vão se conhecendo.
- Oh não, eu não danço! – Falei erguendo as mãos.
- Vamos mudar isso! – repetiu a frase de Jessica e eu ri fracamente.
Bom, o resto é história! Depois daí temos toda aquela história de fazer parte de uma bandinha de sucesso conhecida pelo mundo. Vocês devem conhecer, se não, não adquiririam esse livro! Rá, rá, rá!
Bem, piadas à parte, espero que tenham conhecido um pouco da minha história antes de encontrar Stone. Confesso que depois que isso aconteceu, apesar de alguns percalços pelo meio do caminho, é a melhor parte da minha vida.”
- O que você acha? – Perguntei para quando ela terminou de ler e soltou um longo suspiro.
- Está incrível, Jack, só estou triste por saber detalhes sobre sua história com seu pai dessa forma. – Ela franziu os lábios e virou no banco. – Tem certeza que quer publicar assim mesmo?
- Tenho sim! – Suspirei, sentindo-a me abraçar pela cintura. – É a minha história, eu não posso mudar, além de que é uma conscientização para esse mundo intolerante que estamos vivendo nos dias de hoje. – Ela assentiu com a cabeça. – Eu sou conhecido, famoso, tenho dinheiro e as pessoas me tratam diferente por isso, mas e aqueles que não tem essa vantagem?
- Está certo, Jack! – Ela sorriu. – Entra em toda conscientização para tentar fazer um mundo melhor a cada dia! – Assenti com a cabeça e dei um beijo em minha cabeça.
- Obrigado! – Suspirei. – Foi difícil, mas foi bom relembrar de quando a gente ainda podia sair de casa sem ser reconhecido. – Brinquei e ela gargalhou.
- Entregue para Mike, pode ser?
- Vou lá agora. – Falei. – E como você está hoje?
- Estou bem! Um dia de cada vez, não é?! – Ela suspirou e eu fechei o notebook, pegando-o.
Saí pela porta da cozinha e fui para varanda, encontrando Mike com seu violão no colo, dedilhando algumas coisas e escrevendo em uma partitura.
- Mike! – O chamei e ele ergueu o rosto. – Presente para você! – Sacudi o notebook.
- Ah, finalmente terminou, é?! Que demora, hein?! – Ele brincou e eu gargalhei, esticando o notebook para ele.
- Só te desejo sorte, porque foi muito difícil! – Falei rindo.
- Valeu, preciso pensar como eu vou começar isso ainda.
- Você disse que ia contar sua história e da Lacey. – Ele suspirou.
- É a única parte relevante da minha vida, eu não tenho uma história trágica ou emocionante igual a sua e de sua família, o problemático é o Mack, esqueceu? – Rimos juntos.
- Boa sorte! – Falei. – Depois você entrega para o Louis! – Falei e acenei com a cabeça, voltando para dentro de casa, rindo fracamente.
- Ok, vamos lá! Somos eu e você. – Respirei fundo.
“Olá, eu sou Jack Bolzan, Giovanni, na verdade...”, não, parece programa educativo: “oi, gente, eu sou o Barney”.
- Não, acho que não. – Balancei a cabeça, ouvindo barulhos vindo da escada e girei o corpo no banco da cozinha de Jessica e vi Scott aparecendo pela sala vazia. – Ei, você acordou!
- Sim, bom dia! – Ele abriu um largo sorriso e veio em minha direção, dando um rápido beijo em meus lábios. – Como estão os trabalhos? – Ele se virou para a tela do notebook. – “Olá, eu sou...” – Apertei o botão de apagar.
- Não leia, está horrível! – Rimos juntos.
- Você precisa escrever isso logo, é para entregar para o Mike em três dias.
- Três dias, cara! Três dias! Eu estou nisso há um mês! – Bufei, apoiando o cotovelo na mesa, me debruçando sobre a mesma.
- Por que é tão difícil escrever isso? – Ele passou o braço em meus ombros e eu suspirei.
- Você sabe minha história, escrever uma biografia minha antes de conhecer a implica em falar do meu passado e...
- Eu sei! – Ele falou, acariciando meus cabelos. – Mas você concordou com isso. – Suspirei.
- Eu sei. – Neguei com a cabeça. – Mas é difícil. – Dei de ombros. – Eu podia ser o último, né?!
- Nossa, se for assim, esse livro não sai nunca! – Ele gargalhou e eu mostrei a língua para ele. – Lindo! – Sorri. – Pensa bem, você não precisa escrever quase todos os dias da sua vida, fez essa parte.
- Sim, como ela conseguiu? Ela escreveu mil páginas em seis meses e não se esqueceu de nada, nenhum detalhe. – Ele riu fracamente.
- Stone, meu querido Giovanni. Só ela poderia fazer algo assim. – Ele suspirou. – Além de que teve muito tempo livre naquela época do incêndio... – Assenti com a cabeça.
- É, eu vou ver o que sai aqui. – Dei um sorriso de lado.
- Pense que você é a e deixe o espírito de William Shakespeare cair sobre você! – Gargalhei.
- Ah, você consegue ser mais dramático que o ...
- Falando nisso... – Ele olhou para seu relógio. – Eu preciso ir. – Ele deu um rápido beijo em meus lábios. – conseguiu umas audições para mim, preciso estar em Burbank em 40 minutos.
- Já está atrasado! – Olhei o relógio da cozinha de Jessica.
- Eu sei! – Suspirei. – Quer que eu pegue Gemma na casa de Olavo na volta? – Ele perguntou.
- Não precisa, ela deve ligar mais tarde, está com Matheus. – Ele assentiu com a cabeça.
- Ok, então estou indo, eu te amo! – Ele falou saindo correndo pela mansão de Jessica.
- Eu também! – Falei baixo, sabendo que ele já tinha saído. - Bom, somos nós dois novamente. – Soltei a respiração baixa pela boca e endireitei as costas, puxando a alavanca do banco e deixando que ele abaixasse. – Não deve ser tão difícil.
“Fala aí, galera! Jack Bolzan aqui... Ok, pareceu um cantor de rap e sabemos que eu não faço essa parte na banda, mas relevem, já que eu tenho somente três dias para escrever um pouco da minha vida para vocês. Tudo bem que eu tive um mês para fazer isso, então agora vai por bem ou por mal.
Antes de começar, gostaria de deixar meu descontentamento com isso. Sei que quando falamos de fazer uma biografia para comemorar os 15 anos de banda, eu fui o primeiro a topar a ideia, afinal, nós temos muita história e não só as várias músicas de sucesso que vocês escutam, mas nossa vida pessoal, nossa família, que vocês acabaram acolhendo com todo amor e carinho como suas também.
Mas agora, olhando esse maldito cursor preto piscando, eu não consigo pensar em como dizer isso sem parecer muito dramático. Vocês sabem da minha história, principalmente daquela com meu pai, que saiu em todos os jornais depois do julgamento, mas acho que vocês nunca a ouviram do meu ponto de vista e isso me amedronta um pouco, não foi uma época fácil da minha vida, mas foi um dos motivos de eu estar aqui hoje.
Já avisando, eu não sou Stone, aquela biografia que ela escreveu está sensacional, mas espero que eu possa mostrar um pouco do que foram aqueles anos em Turim e os motivos que fizeram com que eu me juntasse à maior banda da atualidade.
me apresenta em Total Stranger lá em 2004, na época eu tinha 19 anos. Me lembro como se fosse hoje do dia em que eu a conheci, aquela garota brasileira e totalmente improvável seria minha chave para o show biz. Acho que ninguém duvidava do potencial dela, sua voz, sua apresentação, sua garra e sua vontade de conseguir, foi o que fez Stone ser o que é hoje.
Na época, eu já tinha passado por todos os problemas da minha vida, bem, com exceção da morte da minha mãe e de quase perder a guarda da minha própria irmã, mas eu nunca tive a vida muito fácil, apesar de crescer em uma família com uma renda muito boa, nem tudo eram rosas na pequena vinícola.
Morávamos eu, minha mãe, meu pai e minha irmã, que é nove anos mais nova do que eu, na época em que tudo começou, ela era somente um bebê gordinho e loiro, que parecia um pequeno fantasminha correndo pelas parreiras, fazendo seus cabelos loiros brilharem por causa do sol forte que batia na cidade.
Meus pais nunca foram um casal de demonstrar afeto em público, mas dava para notar a confiança que emanava entre os dois, ambos eram muito poderosos e sabiam o que queriam, então, juntos, aquilo poderia se transformar em coisas geniais, e foi o que aconteceu com esse vinhedo.
A vinícola surgiu um ano antes do meu nascimento, então em 2004 ela completava 20 anos. Meu avô materno já tinha esse sítio, que foi onde minha mãe e seus seis irmãos mais novos foram criados. Minha mãe parecia um sétimo homem, já que ela era a que mais adorava ajudar nas tarefas da fazenda, tirar leite, pegar ovos e alimentar as galinhas era com ela mesma, então foi com ela que aquela pequena casa com três quartos ficou na divisão dos bens quando meus avós faleceram.
Como toda boa fazenda italiana, até tinha algumas uvas plantadas aqui, mas aquelas docinhas que faziam com que a gente se deliciasse quando criança para comer e fazer geleia, mas nada grande o suficiente para produzir vinho para vender a tonéis. O que aconteceu foi que meu avô começou a comprar as terras na redondeza para juntar mais gado para produção de carne para a família.
A fazenda tinha um hectare, depois dois, três, até que chegou a 10 hectares, mas acabou que meus avôs faleceram, o gado foi vendido e minha mãe ficou solteira com uma casa e uma fazenda sem produção.
É nessa hora que entra meu pai, antes dos louros, ele era vendedor de mudas. Sabe aquelas pessoas que viajam pelas cidades vendendo mudas de plantas frutíferas? É, meu pai trabalhava com isso, principalmente com uvas, obviamente. Ele visitou a fazenda da minha família, ofereceu uma muda e ela acabou aceitando, depois ele ofereceu outra e outra, até que ela percebeu que o interesse do jovem Giovanni era outro.
Com 23 mudas de uvas crescendo na fazenda e três anos depois, eles se casaram. Até que um dia, um conhecido de meu pai contou que fez um curso de vinhos e que tinha amado, foi aí que esse amigo sugeriu a criação da vinícola. Afinal, eles tinham o espaço, algumas mudas, o gosto pelo vinho, faltava só o curso de produção.
Minha mãe era dona de casa e meu pai estava cansado dessa vida de viajante, mas eles começaram a estudar e a produzir. Oito anos depois saiu o vinho que é o carro-chefe da Vinícola Bolzan, dois anos depois eu nasci. Nesse meio tempo eles fizeram faculdades administrativas, se aperfeiçoaram mais no ramo de vinhos e hoje, com 36 anos de vinícola, só crescemos. Principalmente depois da morte da minha mãe e apoio de , ela realmente fez com que a gente entrasse no mapa, ajudando muito mais na exportação do produto.
Mais mudas foram compradas, parreiras foram montadas, galpões e itens para produção feitos e disponíveis, empregados contratados e mais hectares comprados. Em 2004 a vinícola já nos sustentava muito bem, nos dava muito luxo e conforto. A casinha de três quartos virou uma mansão que abriga nossa família e parte dos escritórios, e o sonho de meus pais só crescia.
Até meus 12 anos, éramos a família perfeita. Minha família era bem de vida e éramos felizes em casa, na escola e na cidade. Era tudo que um garoto da minha idade queria na época. Mas foi aí que as coisas começaram a se complicar. Lá em 1997.”
“Bom, vamos voltar a 1995, quando eu era um garotinho magrinho, franzino, com cabelos arrepiados, em uma escola 100 por cento masculina em Turim. Não chegava a ser um internato, mas era integral, e meus pais faziam questão em me colocar em vários cursos extracurriculares para ter melhores oportunidades no futuro, inclusive, foi assim que minhas aulas de canto começaram, mas isso é assunto para outra hora.
Vivendo oito horas do meu dia em uma escola masculina, é de suspeitar que eu pendesse para outro lado, mas ironicamente, foi quando eu tive meu primeiro beijo com uma garota, que eu comecei a suspeitar que tinha algo de errado. Claro que todo primeiro beijo é ruim, não sabemos o que estamos fazendo e as coisas simplesmente acontecem, mas foi muito estranho.
Eu adorava aquela garota. Ela era como uma deusa na escola feminina, que por sinal foi onde minha irmã estudou. Era algo tipo Gossip Girl, a escola masculina e a feminina divididas pelo restaurante, onde podíamos lanchar e almoçar juntos. Nesses tempos, tinha uma menina, ela era do mesmo ano que eu, e eu simplesmente era abismado por ela.
Ela era muito parecia com Emily, pele escura, cabelos curtos cacheados e aquele olhar penetrante. Ela destoava muito das outras meninas claras e loiras da escola, eu sempre gostei do diferente, acho que foi por ela ser diferente de todo mundo que eu gostava dela. Obviamente que, para história ficar mais interessante, ela acabou se tornando popularzinha. Andava com as meninas mais bonitas e fazia questão de jogar aquele olhar para cima de mim. Ah, Winnie, tive bons sonhos com você, pena que eu gostava de outra coisa que você não podia me proporcionar.
Meu primeiro beijo com uma menina e com o menino, se coincidiram de ser no mesmo lugar, embaixo da arquibancada da escola. Eu jogava no time de futebol, o treino acabava por volta das quatro e meia da tarde e depois eu precisava esperar uns 30 minutos para alguém ir me buscar. Em um desses dias, ela ficou comigo.
- Oi, Giovanni! – Virei o rosto para o lado, encontrando-a com um sorriso tímido para mim.
- Ei, Winnie. – Me levantei rapidamente, batendo a cabeça na arquibancada.
- Ai! – Ela falou e eu levei a mão até o local.
- Pode me chamar de Jack. – Ri sem graça. – Giovanni parece meu pai brigando comigo. – Ela riu fracamente.
- Você foi bem no treino hoje. – Sorri.
- Valeu. Tem o torneio com a Escola Raviane na semana que vem, estamos empolgados. – Ela assentiu com a cabeça.
- Parece que vai ser legal.
- Você vai? – Perguntei ansioso.
- Eu não sei... – Ela apertou a mão na mochila. – Você quer que eu vá? – Dei de ombros, mordendo meus lábios, realmente intimidado por ela.
- Seria legal. – Falei tímido e ouvi uma buzina, desviando o rosto para um carro que parava do outro lado da arquibancada. – É minha mãe. – Falei, pegando minha mochila surrada do chão. – A gente se vê.
- Com certeza. – Ela sorriu e eu acenei, batendo a cabeça novamente na arquibancada para sair. – Jack! – Ela me chamou novamente e eu olhei para ela, ainda passando a mão na cabeça, vendo-a se aproximar.
Ela deu alguns passos em minha direção, apoiando a mão em meu ombro e colou os lábios nos meus, me deixando levemente atônito por um momento. Eu não sabia o que fazer, eu não sabia como agir, o que não foi preciso, já que alguns segundos depois, ela se afastou com um sorriso no rosto.
- Até mais. – Ela falou e eu assenti com a cabeça, vendo-a sumir por debaixo da arquibancada.
Balancei a cabeça, abanando o ar com a mão e bufei alto. Aquilo tinha sido estranho. E não estranho de um jeito bom, só estranho. Pareceu que eu estava beijando o pôster de Charlize Theron na parede do meu quarto. Ouvi a buzina novamente e virei para trás, vendo minha mãe acenando para mim.
Senti meu rosto arder pela minha mãe ter visto meu primeiro beijo, mas dei a volta no carro e entrei, puxando a porta em seguida e olhei para a frente. Fingi que não percebi que o carro não estava andando e aumentei o volume de qualquer música estranha que minha mãe estava ouvindo e senti o carro andar.
- Então... – Ela me disse, abaixando o volume. – Quer conversar sobre o que acabou de acontecer? – Virei para ela, respirando fundo. Ela mais que ninguém me entenderia. – Foi seu primeiro beijo?
- Foi... – Falei fracamente, percebendo que ela sorria para mim.
- E como foi? – Bufei, respirando fundo. – Você gosta dela, não gosta?
- Acho que sim. – Franzi os lábios.
- “Acho”? – Ela perguntou.
- Foi péssimo, mãe. Não teve nenhum brilho, calor, felicidade, foi só... Estranho.
- Ah, querido! – Ela pegou minha mão. – Primeiros beijos são estranhos mesmo. – Ela sorriu. – A gente não sabe o que fazer, ficamos nervosos, normalmente é inesperado. – Apertei sua mão. – Mas sabe a melhor parte? – Olhei para ela.
- Qual? – Perguntei.
- Você sempre pode tentar de novo. – Dei um pequeno sorriso e assenti com a cabeça.
- Valeu, mãe! – Ela sorriu e eu voltei a olhar para o caminho de casa.
Bom, eu tentei de novo! Todos os dias na semana que se seguiu, exatamente no mesmo lugar e eu ainda sentia o gosto do pôster da Charlize Theron na minha boca. Outra coisa estranha que me aconteceu é que eu tinha parado de gostar tanto de Winnie. Não sei, ao beijar ela, ela se tornou menos surpreendente, normal igual todas as outras garotas.
É claro que eu fui falar com minha mãe sobre isso. Eu desabafava com Gemma, mas ela só queria saber de morder a boneca dela até arrancar a cabeça e chorar quando isso acontecia. Hoje eu pensava em nossa diferença de idade e nem parecia tanto, em compensação na época, era difícil ter irmãos muito menores.
- Mãe? – Bati no escritório dela e coloquei a cabeça para dentro.
- Oi, querido. Entra, entra! – Ela falou animada, juntando os papéis acumulados na mesa.
- Estou te atrapalhando? – Atravessei o escritório, vendo a mesa de meu pai vazia.
- Claro que não, só fazendo alguns adiantamentos para alguns funcionários. Sente-se! – Ela falou e eu fiz o que ela pediu, pulando na cadeira giratória dela. – Como posso te ajudar?
- Hum, lembra quando eu beijei a Winnie e você disse que primeiros beijos eram estranhos mesmo e que eu não precisava me preocupar? – Vi que ela abriu um sorriso envergonhado, me deixando vermelho.
- Sim, claro que lembro! – Ela pelo menos fingiu seriedade, o que eu agradeço até hoje.
- Deu certo não. – Falei, parando a cadeira giratória e cruzando os braços em cima do corpo, vendo-a rir fracamente.
- Por que não? – Ela perguntou, apoiando os braços na mesa.
- Ainda parece que eu estou beijando a Charlize, mãe. E eu tentei sete vezes.
- Sete vezes? – Ela se fingiu surpresa, parece que ainda consigo ver sua reação sarcástica e amável durante essa conversa. – E o que deu errado?
- Nada, que eu saiba. Você beija e se separa, é isso, não é? Não tem nada a mais...
- É isso mesmo, querido. – Ela falou prontamente.
- E continua horrível, mãe. – Suspirei. – Acho que eu também nem gosto mais dela. – Franzi os lábios.
- Ah, querido. Essas coisas são normais. – Ela sorriu.
- Como normal?
- Ah, simples, você não se apaixona por uma pessoa só pelo que ela é, você também se apaixona se o beijo de vocês é compatível, se você se sente bem quando ela te abraça, quando ela te toca...
- Não sinto nada disso não. – Falei rapidamente e ela riu fracamente.
- Ah, vai ver então que a Winnie não foi feita para você. – Bufei.
- Mas nem o beijo deveria ser bom? Pelo menos um pouco? – Ela sorriu, esticando a mão sobre a mesa e segurando a minha.
- Vai ver você é só diferente, querido. – Ela disse, dando de ombros.
- Diferente como? – Franzi a testa e ela sorriu.
- Isso é algo que você vai precisar descobrir sozinho. – Ela falou e eu suspirei.
Na época eu não sabia o que significava, mas ela foi a primeira pessoa a me fazer pensar que eu realmente poderia ser diferente. Eu não entendi o sentido, na verdade, eu não fazia ideia de que jeito as pessoas podiam ser diferentes, mas quando eu comecei a sentir coisas pelo Filippo, as coisas começaram a fazer sentido.”
“Bem, depois do meu primeiro beijo com a Winnie, eu até tentei mais, não só com ela como outras meninas. Não que eu fosse o maior beijoqueiro de Turim, mas eu era bom no futebol e as meninas gostavam de mim, sabe? Com grandes interesses, mas elas se aproximavam, ficavam perto e rolava alguns selinhos, tá legal?
Mas mesmo assim, nada que eu fazia e nenhuma menina que eu beijava fazia com que eu sentisse as tais borboletas no estômago que as pessoas tanto falavam. Às vezes achava que elas realmente engoliam borboletas para sentir as coisas, porque eu só sentia o gosto da parede com o pôster da Charlize Theron.
Enfim, passaram dois anos dessa falta de entendimento minha com meu corpo e eu cheguei aos meus fatídicos 12 anos. Foi aí que eu comecei a identificar o que minha mãe queria dizer com “ser diferente”.
Na sexta série, entrou um garoto novo na nossa escola, o Filippo, ele era tipo aqueles garotos perfeitinhos, sabe? Cabelo arrumadinho com gel, gravata sempre feita perfeitamente sobre o uniforme azul, mochila ajeitada nas costas e tênis sempre limpos, além de que ele tinha se mudado de Roma, da cidade grande, então ele virou o novo sucesso da escola.
Ele acabou entrando no time de futebol, claro que para um aluno novo, o treinador colocou ele logo na defesa, ou seja, trabalhávamos lado a lado, fazíamos treinos específicos lado a lado, nos trocávamos lado a lado, além dele ser um cara legal. Ele era tipo o James Potter em Harry Potter, era aquele cara bacana que se dava bem com todo mundo.
Bem, em um dos dias em que a gente ficou treinando até mais tarde... Ah, isso me dá tanta vergonha em lembrar, eu praticamente me joguei em cima do garoto, foi o que aconteceu. A gente saiu do treino, fomos para o vestiário, tomamos banho, nos arrumamos e fomos esperar nossos pais embaixo da arquibancada.
- Ele vai acabar te colocando como lateral direita. – Falei, me sentando no gramado, jogando a mochila do lado.
- Será? Acho que meu chute está melhor na esquerda. – Ele comentou se sentando e deixando a mochila em seu colo.
- Você acertou oito chutes a gol na direita e três na esquerda. – Virei para ele que riu fracamente.
- Talvez você tenha razão, mas você é muito melhor do que eu. – Ele suspirou.
- Você entrou tem três meses, eu jogo nesse time desde a segunda série. – Ele riu fraco. – As coisas vão melhorar, além de que eu sou marcador e, de vez em quando, faço um gol. – Ponderei com a cabeça e ele riu.
- Você é bom, e é legal também, dá para entender porque as meninas adoram você. – Bufei.
- Elas me adoram, mas eu não consigo adorar elas, sei lá. É muito confuso para mim. – Dei de ombros.
- Talvez você seja diferente. – Ele copiou meus movimentos.
- Minha mãe me disse a mesma coisa. – Franzi a testa para ele. – O que você sabe sobre isso?
- Bom, meus pais são diferentes. – Ele falou. – Não sei se já reparou, mas eu tenho dois pais e nenhuma mãe. – Coloquei a cabeça para funcionar.
- Acho que nunca reparei nisso. – Ele deu de ombros novamente.
- Meus pais dizem que eles são diferentes das outras pessoas. – Ele suspirou. – Eu não vejo nada de diferente neles, eles se amam e está bom para mim.
- Você acha que eu... – Deixei a frase parar no meio do caminho.
- Eu não acho nada, é você que vai ter que se encontrar, Jack. – Ele suspirou. – Meu pai... Um dos meus pais, me disse que não é algo que alguém pode decidir por você, é preciso que você se encontre.
- E como eu “me encontro”? - Fiz aspas com os dedos, olhando para ele.
- Bom, acho que assim... – Ele me disse e se inclinou em minha direção, grudando a boca na minha por alguns segundos e se afastou, me deixando de olhos arregalados. – É o que meus pais fazem para demonstrar que se gostam.
Eu travei, eu nunca havia pensado nessa possibilidade de ser “diferente”, muito menos beijando outro garoto. Eu cresci com um pai machista, ouvindo frases como “senta igual homem” ou “isso é coisa de mulherzinha”, então, beijar outro homem estava fora de cogitação, mas tinha sido... Diferente.
- Eu tenho que ir, a gente se vê amanhã? – Ele falou, se levantando e eu vi o carro de seus pais parado na rua.
- É, tá! – Foi o que eu consegui falar e o vi sair, me fazendo balançar a cabeça.
- O que aconteceu aqui? – Respirei fundo e ouvi uma buzina, vendo minha mãe parar aonde o carro de Filippo estava anteriormente.
Peguei minhas coisas e saí correndo em direção ao carro, entrando nele e fechando a porta, respirando fundo. Eu queria contar para minha mãe, mas como falar isso? Ela sempre foi muito aberta comigo, mas e se nesse quesito ela fosse igual meu pai? Eu estava com medo de apanhar e ficar de castigo por um mês, mas ela sempre notava que tinha algo de errado comigo, aquela mulher era uma santa. Ah, mãe, que saudades que você me faz.
- O que aconteceu, moço? – Ela perguntou, passando as mãos em meus cabelos e eu olhei para ela, respirando fundo.
- Eu estou tentando entender, mãe. – Falei honestamente, respirando fundo em seguida.
- O que foi?
- Por favor, não briga comigo! – Ela parou o carro no meio da rua, dando um solavanco e virou para mim.
- Por que eu brigaria contigo, Giovanni? – Fiz uma careta.
- Não me chama assim e sai do meio da rua. – Falei, ouvindo uma buzina e ela recuou para uma vaga e desligou o carro, me olhando.
- O que aconteceu? – Suspirei, olhando para o teto do carro por alguns minutos, bufando alto.
- Sabe o Filippo? – Perguntei.
- Sei sim. – Ela falou e eu bufei novamente.
- Bom, ele me beijou. – Falei e ela arregalou os olhos.
- Mesmo?
- Por favor, não briga comigo, ele que me beijou, eu não o beijei. – Ela riu fracamente, negando com a cabeça e segurando minha mão.
- Ah, querido, eu não vou brigar contigo. – Ela abriu um largo sorriso. – Confesso que achava que você daria o primeiro passo em uma situação dessas.
- Como assim? – Franzi a testa. – Era isso que você estava querendo dizer sobre eu ser diferente. – Ela deu um sorriso tímido.
- Era essa opção ou a de não gostar nem de homem ou mulher, o que existe também. – Suspirei. – Mas a questão é: você gostou?
- Eu não sei, mãe. Eu travei, não deu para eu retribuir, sabe? Enquanto eu travei, o pai dele chegou. Ele tem dois pais, sabia?
- Sabia! – Ela falou. – Os encontrei na reunião de pais, pode imaginar o que o seu pai falou quando viu, não é?
- Sim, o que não faz sentido para mim, se eles se gostam, qual é o problema? – Ela assentiu com a cabeça.
- Então, é a mesma coisa que eu vou falar para você, se você gostar de Filippo ou de qualquer outro garoto ou garota, saiba que não tem problema nenhum com isso.
- Aposto que o papai não vai gostar de nada.
- Viva sua vida e deixa que eu cuido do seu pai, estamos combinados? – Sorri, confirmando com a cabeça.
- Estamos! - Sorri e ela deu um beijo em minha testa antes de voltar a dirigir para casa.”
“Bom, depois desse dia eu fiquei meio envergonhado em olhar para Filippo na escola no dia seguinte, ele que tinha me beijado e eu que tinha receio em encontrá-lo. Eu não sabia o que fazer, eu estava confuso, estava pensando no que minha mãe tinha dito, no que ele tinha feito. Naquele momento, eu estava sofrendo com o começo da minha descoberta sobre minha sexualidade, parecia um turbilhão de emoções e que nunca ia passar.
Durante o treino, eu acabei evitando Filippo, éramos do mesmo time, então fazia questão de não passar a bola para ele e o evitar quando ele me chamava para me xingar por não passar a bola para ele ou por perder passes no gol. Então, obviamente, no fim do treino ele foi falar comigo.
- Você está bravo com o que eu fiz, não? – Ele falou baixo enquanto guardávamos nossas coisas após o banho.
- Sim, não, eu não sei! – Falei confuso, enfiando o uniforme e toalha dentro da mochila. – Eu só já tinha conversado sobre isso com minha mãe e ela não tinha me dito que essa era uma das opções, mas eu ainda não sei se é o certo.
- Vai ver só não foi com a pessoa certa ou realmente não é para você. – Ele deu de ombros, batendo seu armário e eu suspirei. – Você não precisa decidir isso agora e se apegar a isso pelo resto da vida, sabia?
- Eu sei... – Suspirei, fechando meu armário também, balançando com a cabeça e o encarei. – Você se importaria em fazer de novo? – Ele franziu a testa.
- Mesmo? De novo? – Ele me perguntou e eu dei de ombros.
- Eu não tive tempo de fazer nada, para falar a verdade. – Ele riu fracamente.
- É, você travou. – Ele riu e olhamos em volta, vendo três alunos que terminavam de se trocar. – Vem. – Ele falou baixo e olhei em volta.
- Tchau, gente. Até amanhã! – Falei para os outros colegas de time.
- Tchau! – Eles responderam e segui Filippo pelo outro lado do vestiário, onde ficavam as cabines e mictórios.
Ele olhou em volta rapidamente, vendo se não via ninguém e fomos para a última cabine. Ele entrou eu fui atrás, trancando a porta em seguida. Jogamos nossas mochilas no chão e ele me encarou novamente.
- Tente aproveitar, ok? – Ele falou me encarando e eu assenti com a cabeça, respirando fundo. – Feche os olhos.
Fechei os olhos e balancei os braços um pouco, tentando relaxar. Senti sua respiração perto do meu rosto e prendi a minha por alguns segundos, sentindo sua boca encostar na minha novamente, me fazendo engolir em seco. Inicialmente eu fiquei travado, até que ele começou a mexer a boca lentamente, fazendo com que eu o acompanhasse devagar.
Ele apoiou as duas mãos em meus ombros e eu levei as minhas para apoiar em sua cintura, somente deixando a mão no local, abrindo um pequeno sorriso quando ele se afastou e eu abri os olhos.
- E então? – Ele me perguntou e eu mordi meu lábio inferior.
- Eu gostei. – Falei fracamente e ele riu, dando de ombros.
- Podemos fazer novamente se você quiser. – Ele disse, pegando sua bolsa no chão.
- Você já tem certeza sobre o que é? – Perguntei e ele deu de ombros.
- Ainda não, mas eu gosto de você. – Ele sorriu e eu senti meu rosto esquentar. – Você foi legal comigo quando eu entrei na escola.
- Que bom! – Foi a única coisa que eu consegui falar.
- A gente se vê! – Ele disse e abriu a cabine devagar, olhando se não tinha ninguém e saiu com sua mochila.”
“Bom, eu realmente gostei do beijo de Filippo, mas eu tinha muitas dúvidas ainda, eu não queria bater o martelo para mim ou para outra pessoa que eu era “diferente”. Eu só tinha 12 anos, o que eu sabia com 12 anos, certo? Então, eu acabei tendo muitas dúvidas, ficava dias fazendo monólogos de prós e contras, falava muito com minha mãe, ela acabou me indicando para uma psicóloga, o que eu passava horas falando com ela, tentando entender o que ela queria dizer. Até minha irmãzinha Gemma, que tinha três anos na época, aguentava meus monólogos, mas acredite, ele era uma ótima conselheira.
- Eu não sei o que fazer, Gemma. Ele é legal, divertido, simpático, engraçado, gosta das mesmas coisas que eu, ele também é um pouco bonitinho, sabe? – Olhei para ela que penteava a cabeça de sua boneca.
- Eu não entendo o problema, Jack. – Ela falou olhando para mim por alguns segundos antes de voltar para sua boneca.
- Como não? – Me ajoelhei ao seu lado. – Eu estou espiralando, Gemma. – Ela riu fracamente, largando a boneca e ficando em pé em minha frente.
- É óbvio, Jack, você gosta dele. – Ela deu de ombros. – O que tem de tão difícil de entender?
- Ele é um menino, Gemma! – Falei um pouco mais baixo.
- E daí? Que problema teria? Eu não vejo, a mamãe também não...
- O papai veria... – Suspirei.
- E você vai fazer tudo o que ele disser para o resto da sua vida? – Ela me encarou com aquele olhar de desprezo que tem até hoje e eu me pergunto como surgiu tão cedo.
- Não... – Franzi o rosto.
- Se você gosta desse Filippo e se ele te faz feliz, então fica com ele. – Ela deu de ombros e pegou um baby liss de brinquedo e voltou a se sentar ao lado de sua boneca, pegando-a no colo novamente.
- Eu te amo, sabia? – Falei para ela, segurando-a pelas bochechas e ela fez uma careta.
- Tá, mas não faz isso. – Ela mostrou a língua e eu ri, me levantando.
- Você que está complicando as coisas, parece simples para mim. Se você gosta dele, fica com ele, principalmente porque ele gosta de você. – Suspirei.
- Eu achava que gostava da Winnie...
- E vimos no fim que deu! – Ela foi irônica e eu ri fracamente. – É quem você é, Jack. – Ela falou mais calma. - Você não deveria ter que esconder. – Suspirei.
- Obrigada, irmãzinha! – Me afastei dela, saindo de seu quarto.
Eu ainda estava confuso, obviamente, mas essa última frase dela ficou marcada em minha cabeça. Ela tinha razão, certo? Eu não precisava me esconder se meu pai não gostava disso. Claro que quando eu pensei nisso, eu não esperava que o negócio fosse complicar tanto.
Bom, dando uma agilizada nas coisas, eu e Filippo começamos um relacionamento meio escondido, a gente ficava junto, trocávamos alguns beijos, mas não tinha nada oficial assim, afinal, tínhamos 12 anos, repito: o que eu sabia da vida? Então, a parte de “namorar” veio um pouco depois.
Filippo se mudou novamente no final da oitava série, com isso eu já tinha 14 anos. Eu fiquei realmente chateado, lá já tínhamos um relacionamento mais sério, mas nunca passou de beijos, não foi com Filippo que eu tive minha primeira vez, foi com Luca. Nessa época algumas pessoas já sabiam de nós, mas só na escola, não tinha aberto para meu pai ainda, minha mãe me alertava muito do receio que ela tinha sobre isso e seus comentários frequentes de mal gosto pioravam cada dia mais.
Com Filippo eu comecei a me descobrir gay, mas foi com Luca que o negócio realmente aconteceu. Luca era um arraso! Ele era tipo o Ross Lynch italiano da minha época. Era loiro, tinha os cabelos compridos, olhos escuros bem intensos e aquela postura meio de bad boy tipo o Patrick Verona em 10 Coisas que Eu Odeio em Você.
Ele entrou no primeiro ano do ensino médio e se tornou o bad boy mal-encarado, então sempre andava sozinho e nunca se enturmava. Ele acabou entrando para o time do futebol, mas era muito ruim, então sempre ficava na reserva, depois de um tempo, ele mal aparecia no treino. Ele aparecia na arquibancada durante os treinos e sempre parecia estar rabiscando em seu caderno, futuramente eu descobri que ele fazia desenhos maravilhosos, muitos meus.
Bom, eu e Luca começamos a nos envolver em uma viagem que teve para a vinícola da minha família. Essa viagem era anual e tradicional da escola durante o verão, íamos com o professor de química para explicar as alterações que a uva sofria em contato com os itens que formam o vinho, não me pergunte quais são, aprendi na excursão e não guardei até hoje. E sim, continuo sendo o presidente dessa vinícola.
Como a excursão durava o dia inteiro, eu não fui para a escola encontrar a turma que viria para a excursão, eu os encontrei aqui na frente da fábrica. Os acompanhei durante a excursão junto de um guia da vinícola, passamos desde a plantação das uvas e seus tipos, até a parte de envasamento.
Quando a viagem acabou, a vinícola oferecia um piquenique que era comum durante as visitas turísticas: queijos, embutidos e suco de uva que era feito com o resto das uvas, após a produção dos vinhos. Nos sentamos na frente da casa grande para comer e o professor de química olhava em volta como se procurasse por alguma pessoa, passei os olhos rapidamente por todos os alunos e senti falta dos cabelos loiros de Luca. Era fácil sentir falta, eles brilhavam com o sol, como os de Gemma.
Enchi a mão com alguns pedaços de queijo e me levantei, falando para o professor que iria atrás dele e ele assentiu com a cabeça. Comecei pelo lado de fora, não estava permitido entrar em casa, então comecei cobrindo o básico, o que foi o suficiente. Dei uma volta ao redor de casa e o encontrei atrás dela, olhando para uma área onde se tinha vista da plantação de girassóis da fazenda do lado.
- Luca! – O chamei e ele se virou. – O professor tá chamando para o piquenique. – Apontei para trás e me aproximei do mesmo.
- Você mora aqui? – Ele perguntou, ignorando totalmente minha pergunta.
- Moro, meu quarto é aquele ali! – Apontei para uma janela no último andar da casa.
- E você ainda tem essa vista? – Ele perguntou e eu ri fracamente.
- Tenho, dos girassóis e das uvas do outro lado. – Dei de ombros. – Mas os girassóis não ficam bonitos sempre, esse produtor faz óleo de girassol, então ele espera secar para tirar as sementes e produzir óleo.
- Que triste! – Ele falou e eu dei de ombros.
- É, fica bem mórbido quando chega o outono. – Ri fracamente e vi seu caderno com o desenho da plantação. – Você desenha bem.
- Valeu!
- É o que você faz quando vai aos jogos? – Perguntei e ele virou algumas páginas, estendendo o caderno para mim e vi um desenho meu falando com a minha equipe, eu tinha a mão esticada e parecia falar bem firme com as pessoas que o desenho não mostrava. – Uau! – Falei surpreso. – Você tem futuro. – Ele riu fracamente.
- Eu mostro um desenho teu e você fala que eu tenho futuro? – Franzi a testa.
- O que preferia que eu falasse? – Ri fracamente.
- Algumas pessoas comentaram que você tinha um namorado ano passado. – Virei para trás, vendo se não tinha ninguém em volta.
- Tinha e prefiro que não fale disso aqui, meu pai não sabe. – Suspirei.
- Desculpe. – Ele assentiu com a cabeça. – Mas é verdade?
- É, ele se mudou no fim da oitava série. – Dei de ombros. – O que você tem a ver com isso?
- Talvez esteja na hora de você ter outro namorado. – Ele comentou e eu franzi a testa.
- Você? – Perguntei, nessa época eu já tinha mais firmeza para abordar esse assunto.
- Por que não? Eu vejo como você me olha. – Ele falou e eu ri fracamente.
- Como a escola inteira te olha, você quer dizer. – Entrei na brincadeira.
- Bom, eu quero você! – Ele falou firme.
- E você costuma ter o que quer? – Perguntei, dando um passo em sua direção e ele deu de ombros.
- Normalmente sim.
- Talvez mais uma não tenha problema! – Falei e levei minha mão até sua nuca, colando meus lábios nos dele.
Ele me puxou mais firme pela cintura e colou seu corpo no meu. O beijo era bem mais firme dos que eu dava em Filippo, com Filippo era brincadeira de criança, Luca tinha uma pegada muito forte e muito boa. Scott, se você estiver lendo isso, você é melhor, ok?! Só que Luca foi meu primeiro em muitas coisas, acabou marcando um pouco, mas é você que eu amo.
Quando a gente se afastou, minha respiração estava descompassada e acelerada e a boca de Luca vermelha. Ele deu um sorriso para mim, pegando suas coisas no chão e colocou sua mochila nas costas.
- A gente se vê, Jack. – Ele disse e abanou com a mão, se afastando.
Olha, confesso que até hoje eu me perguntava como essas coisas aconteciam comigo, eu tive dois caras ótimos na minha vida, mais, na verdade. Com exceção do meu Anthony, todos tinham sido ótimos, mas eles vinham atrás de mim, eles que me encontravam e as coisas aconteciam.
Voltamos para o piquenique e logo depois a excursão foi embora, acredite, eu preferia que não tivessem ido, o que aconteceu em seguida foi o começo de uma das dores de cabeça mais longas da minha vida. Só a primeira, obviamente.”
“Vi o ônibus da escola sair e acenei para ele, voltando a encarar a casa grande e entrei no mesmo, encontrando minha mãe tricotando na sala de TV e me joguei no sofá ao seu lado, abrindo um largo sorriso. Ela riu da minha reação e franziu a testa.
- O que aconteceu? – Me perguntou e eu ri fracamente.
- Sabe o Luca? Aquele garoto que eu sempre comentei? – Perguntei franzindo os lábios e ela assentiu com a cabeça.
- Vocês... – Ela começou a dizer, mas fomos interrompidos com um grito vindo da escada.
- Giovanni Bolzan! – Arregalei os olhos, me levantando de prontidão com minha mãe do meu lado e observamos meu pai descer até vermelho de raiva.
- Gigi, o que houve? – Minha mãe perguntou para meu pai, se aproximando dele que vinha muito rápido em minha direção.
- Você sabe o que seu filho tem feito, Branca? O que ele tem feito em nossas costas? – Ele falou firme e eu sabia naquele momento que havia sido desmascarado. A janela do escritório também dava para a plantação de girassóis, só não sabia que ele estava lá.
- Pai, eu...
- Não fale comigo, sua bichinha!
- Giovanni! – Minha mãe falou firme.
- Não me interrompa, Branca! Esse garoto precisa aprender que aqui em casa não é lugar para mulherzinha. – Ele se soltou de minha mãe e veio em minha direção, dando um primeiro tapa em minha cara.
- Giovanni! – Minha mãe tentou segurá-lo e ele se desvencilhou com o cotovelo, acertando seu rosto e derrubando-a para trás.
- Mãe! – Falei firmemente, me aproximando dela, mas meu pai me puxou pelo braço, começando a bater em mim com os punhos cerrados. Uma, duas, três vezes. Minha cabeça começava a pesar muito, o sangue saía de alguma parte de meu rosto e eu já estava com a visão turva.
- Pare, Giovanni! Pare agora! – Só ouvia os gritos fortes de minha mãe enquanto eu levava chutes derrubado no chão.
- Ele é uma bichinha, Branca. Ele não tem lugar para essa casa. – Sentia que minha respiração faltava aos poucos. – Não quero você nunca mais aqui.
- Pare agora! – Minha mãe se esgoelou, mas logo depois eu senti um chute em meu rosto e apaguei.
Vocês não sabiam que tinha sido tão feio assim, não é? Acredite, não é algo que eu desejo nem para o meu pior inimigo. Eu tinha 15 anos, apanhei até desmaiar do meu próprio pai, do homem que me teve e me criou. Acordei 23 dias depois no hospital com minha mãe chorando na cama.
Abri os olhos devagar, sentindo que meu olho direito não se abria completamente e percebi que o mesmo ainda estava um pouco inchado. Olhei em volta e só conseguia ver branco e azul claro para qualquer lado que eu olhava. De um lado tinha máquinas e do outro encontrei minha mãe com o rosto avermelhado enquanto olhava para uma revista.
Tentei falar, mas percebi que eu tinha um cano enfiado em minha boca, então tentei mexer a mão devagar, tocando seu braço que estava apoiado na cama, raspando a ponta da unha na mesma. Ela me olhou assustada e se levantou rapidamente, me abraçando.
- Finalmente! – Ela disse chorando em ouvido. – Ah, você acordou, meu filho! Graças a Deus! – Ela falava repetidamente e se afastou, olhando para mim. – Não tente falar, ok?! Você está entubado. – Ela disse e eu senti um beijo dela em minha testa que latejou com o ato.
Como não podia falar, arqueei os ombros e as mãos tentando perguntar o que aconteceu, ela captou rapidamente.
- Seu pai te viu beijando o Luca e surtou porque você é diferente. – Ela tentou falar calmamente, passando a mão em meus cabelos que estavam compridos. – Ele te bateu, filho, muito. – Ela voltou a chorar novamente. – Você ficou em coma por 23 dias. – Ela soltou a respiração fortemente. – Eu pensei que tinha te perdido. – Ela passou a mão em meu rosto e eu ergui a mão com o monitor em meu dedo para segurar seu braço, mesmo que fracamente. – Alguns funcionários me ouviram gritando e tiraram ele de cima de você, não sei o que aconteceria se ele continuasse... – Neguei com a cabeça, pedindo para ela parar, pois eu também já estava chorando.
- Então, alguém acordou! – O médico falou entrando no quarto. – Bom te ver com os olhos abertos, Jack! – Ele falou olhando para minha mãe que deu um largo sorriso para o médico. – Vejo que está respirando por conta, vamos tirar isso aqui de você para batermos um papo? – Ele falou se aproximando de mim e começando a desrosquear os aparelhos. – Tussa o mais forte que conseguir, ok?! – Ele falou, começando a puxar e automaticamente eu senti vontade de tossir, vendo o tubo sair de minha boca e vi dois enfermeiros entrarem no quarto. – Pronto, pronto! – A enfermeira passou um pano em minha boca, provavelmente limpando a baba. – Não vamos abusar, ok?! Só fale o necessário. – Assenti com a cabeça. – Que bom, aprende rápido. – Minha mãe riu fracamente. – Sua mãe já te explicou o que aconteceu?
- Sim. – Falei, sentindo minha voz sair muito fraca e mais grossa que o normal.
- Você sente alguma dor? Algum incômodo?
- Minha cabeça. – Levei a mão à cabeça e depois desci para meu abdome. – Barriga. – Falei fracamente.
- Essas foram suas áreas mais afetadas, você levou chutes e socos nessas duas regiões, além de alguns pontos esporádicos. – Ele falava calmamente. – Você fraturou duas costelas, torceu o tornozelo, teve severos cortes no rosto, incluindo esse olho inchado que ainda não reduziu. Como está sua visão?
- Normal, eu acho. – Falei, levando uma mão em cada olho, vendo se a visão ficava embaçada ou escura.
- Que bom, isso são boas notícias. – Ele sorriu. – Mas o mais severo foi a perda de um rim. – Ele disse e eu olhei para minha mãe. – É possível viver normalmente com um rim só, mas é necessário ter alguns cuidados para não perdê-lo, do contrário, sua situação ficaria crítica. - Ele brincou e eu dei um pequeno sorriso. - Vou te explicar melhor depois. - Assenti com a cabeça. – Bom, como seu caso é considerado abuso de menor, tem uma assistente social que quer falar com você. – Minha mãe assentiu com a cabeça. – Você pode recebê-la agora?
- Posso?! – Falei um tanto indeciso, não sabia o que podia falar com a assistente social.
- Depois eu volto para fazer alguns exames, mas não abuse, ok?! – Assenti com a cabeça. – E beba água, vai ajudar com que sua voz volte ao normal.
Ele se retirou e a assistente social entrou. Ela não falou nada do que a gente não saiba, ela perguntou o que aconteceu, se era frequente, o que causou essa reação exagerada e perguntou se gostaríamos de denunciar. Minha mãe preferiu responder que conversaríamos ainda, já que eu tinha literalmente acabado de acordar do coma. Eu não sabia o que fazer, ele era meu pai, certo? O que se faz em uma situação dessas?
Eu acabei ficando mais duas semanas no hospital, eles queriam monitorar minha fratura nas costelas que ainda não haviam sido curadas de completo e ainda podiam afetar algum outro órgão, além da minha visão que ainda era uma preocupação para o médico. Acabei recebendo visitas de Gemma e de meus tios, onde Gemma estava ficando, de alguns amigos da escola e de Luca que se sentia muito culpado com o que tinha acontecido.
- Me desculpe, Jack, se eu soubesse que...
- Não! – Abanei com a cabeça. – Você não tem culpa de nada. Quem imaginaria que meu pai era louco a esse ponto? – Falei e ele suspirou.
- Você vai ficar bem, não vai? – Sorri.
- Vou sim! – Assenti com a cabeça. – Mais alguns dias e eu volto para casa, para a escola, só estou aqui por precaução dos médicos.
- Foi muito feio o que houve, Jack. Eu vim aqui no dia em que eu soube, acho que foi dois ou três dias depois do acontecido, você estava irreconhecível. – Suspirei. – Não deixe que ele faça isso de novo contigo, ok?!
- Pode ter certeza que isso nunca mais vai acontecer. – Minha mãe entrou no quarto. – Luca, certo?
- Sou eu, senhora. – Ele sorriu e minha mãe o cumprimentou com um aperto de mão.
- É muito bom conhecer o homem que me mostrou o monstro com quem eu sou casada e que fez meu filho feliz um pouco. – Luca sorriu envergonhado e minha mãe se sentou na poltrona novamente.
- Obrigado, senhora. – Ele sorriu. – Bom, melhor eu ir. – Ele falou, mas antes tirou seu caderno da mochila e me entregou. – Fica com ele, eu fiz alguns desenhos durante sua ausência.
- Obrigado. – Sorri.
- Me deem notícias, por favor. – Ele sorriu acenando e saiu do quarto.
- Pode deixar. – Minha mãe retribuiu. – Bom, agora somos eu e você, querido. O que você quer fazer sobre isso?
- Eu não sei, mãe. Ele é meu pai, não é?
- Sim, mas você não precisa conviver mais com ele se não quiser.
- Eu não quero, eu estou com medo dele, não posso viver com ele. – Ela suspirou.
- Bom, eu já falei com meus advogados e acho que sei de uma solução ideal para isso. Mas fique bem antes, ok?! Preciso de você pronto para enfrentar seu pai. – Ela segurou minha mão e eu sorri, confirmando com a cabeça.
- Eu te amo, mãe. Obrigado por tudo! – Ela negou com a cabeça.
- Xí. – Ela disse e eu assenti com a cabeça.”
“Depois das minhas duas semanas de observação, eu já estava quase bom. O inchaço sumiu por completo, mas ainda tinha algumas cicatrizes no rosto, que sumiriam conforme o passar dos dias, ainda usava a botinha por causa da torção do tornozelo e teria uma cicatriz na minha barriga pelo resto da vida pela retirada do rim, mas eu estava bem. Estava mais forte, um pouco mais ágil e pronto para voltar para casa.
Minha mãe não havia voltado para casa desde o acontecido, ela ficava quase todos os dias comigo, só saía para tomar um banho na minha tia e Gemma ficava de acompanhante por algumas horas para ela descansar. Hoje voltaríamos para a vinícola. A única notícia que sabíamos, era que os empregados também não voltaram para a empresa depois do acesso de fúria de meu pai, ou quem aquele homem seja.
Minha mãe sabia que não seria difícil simplesmente voltar, legalmente, ela era a dona de tudo da Vinícola Bolzan, o terreno é da família dela, a escritura da casa está em seu nome e todos os arquivos administrativos estavam em seu nome, além de que ela estava muito disposta a comprar a parte de Giovanni pai para que ele nunca mais nos atrapalhasse.
Por isso, voltamos para casa com o advogado que estava cuidando do divórcio de minha mãe e escolta policial por precaução. Não sabíamos qual seria sua reação, mas ninguém queria sair machucado novamente. Quando chegamos à casa, minha mãe e o advogado saíram do carro e a polícia chegou logo atrás. Um deles até me ajudou com as muletas.
- Obrigado! – Falei assentindo com a cabeça e andei até minha mãe, me apoiando com as muletas e mantendo o pé fora do chão.
Olhei rapidamente em volta, para a plantação de uvas vazia e até um pouco amareladas, ficamos mais de um mês fora, a empresa estava largada. Ouvi o barulho das portas serem abertas, portas que costumavam só fechar à noite, e minha mãe entrou com seu advogado, começando a gritar pelo meu pai.
- Giovanni! Giovanni! – Ouvi sua voz ecoar pela casa vazia e segui até eles, com os policiais me acompanhando a cada passo ou pulo, dependendo do ponto de vista.
- Quem está aqui? – Ouvi sua voz e senti meu corpo tremer, olhei para o policial ao meu lado e ele me encarou.
- Está tudo bem? – Assenti com a cabeça, encostando o corpo no lado fechado da porta dupla.
- Ah, finalmente voltou para casa, não é? – O vi no andar de cima e ele logo começou a descer as escadas. – E ainda veio acompanhada? – Ele foi irônico. – Ele não é mais bem-vindo nessa casa.
- Essa casa é minha, Giovanni, e ele é bem-vindo! – Minha mãe falou firme, cruzando os braços.
- Ele não vai mais viver no mesmo teto que eu. – Ele falou como se fosse óbvio.
- Bom, então só temos uma solução, não é? – Minha mãe se mexeu devagar, dando alguns passos para trás.
- Você está educadamente me expulsando de casa? – Minha mãe riu fracamente.
- O que você esperava? Você espancou meu filho como se ele não valesse nada, seu filho...
- Ele não é meu filho e ele não vale nada. – Minha mãe riu sarcasticamente.
- Que bom que estamos decididos quanto a isso. Pode arrumar suas coisas e ir embora agora! – Ela falou firme.
- Eu não vou a lugar nenhum, essa casa também é minha.
- Não segundo os documentos, senhor Bolzan. – O advogado falou pela primeira vez e meu pai ficou chocado, olhando da minha mãe para o advogado.
- Você está escolhendo essa bichinha ao invés do seu marido? – Meu pai se aproximou da minha mãe e os policiais se aproximaram.
- Não, eu estou protegendo o meu filho de um monstro que eu tive o azar de me casar. – Ela falou quase como se cuspisse nele.
- Ah, sua...
- Ah, além disso. – Ela o interrompeu. – Eu quero o divórcio, ficarei muito feliz se colocar um preço na sua parte da empresa, pois eu irei comprá-la e eu tenho uma ordem restritiva contra você.
- Que deverá ser cumprida à partir de agora. – O advogado falou novamente.
- Senhor Bolzan, o senhor está preso por abuso de menor e violação de ordem restritiva. – Um dos policiais falou e o rosto de meu pai ficou vermelho automaticamente.
- Sua puta! Você não pode fazer isso comigo. – Minha mãe somente respirou fundo. – Você vai deixar esse viado destruir nossa família. – Ele gritava enquanto os policiais colocavam algemas nele.
- Não, Giovanni, eu não vou deixar você destruir minha família. Pena que eu não vi antes. – Ela suspirou. – Mas obrigada pelos meus filhos, eles são as melhores coisas que já me aconteceram. – Ela respirou fundo. – Podem levá-lo.
- Você não pode fazer isso! – Ele gritava enquanto era puxado para fora e eu me afastei da porta para não ser atingido, já que ele estava bem arredio.
- Eu vou cuidar dos trâmites legais e voltamos a nos falar sobre a sociedade da empresa e do seu divórcio. – O advogado falou e minha mãe assentiu com a cabeça.
- Obrigada, Brad. Você foi fantástico. – Ele assentiu com a cabeça e se afastou.
- Um bom dia para vocês. E que o senhor se recupere bem, senhor Bolzan. – O advogado falou e eu assenti com a cabeça, sorrindo.
- Obrigada! – Minha mãe falou e eu me aproximei dela, sentindo-a passar o braço em meu ombro. – Eu prometo, meu querido. Ninguém nunca mais vai relar a mão em você! – Ela disse, estalando um beijo em minha bochecha. – Vamos recomeçar.
- Sim, mãe! – Suspirei. – Um dia de cada vez. – Suspiramos juntos.
- Bom, vamos organizar isso. Preciso ligar para os empregados, falar com a administração, fazer gerenciamento de causa. – Ela suspirou. – Vou trazer travesseiros e cobertas para você, vamos organizar sua cama aqui na sala até esse pé melhorar.
- Obrigado. – Sorri. – Vai resolver suas coisas, eu estou bem! – Sentei no sofá e deixei as muletas de lado.
- Ok, pode deixar!”
“Bom, depois daí a gente ainda teve algumas dores de cabeça. Meu pai não queria assinar o divórcio, depois ele implicou que não venderia sua parte, depois brigou pela guarda da Gemma pela primeira vez, depois tentou fazer alienação parental com Gemma, mas ela sempre foi muito esperta, então isso não funcionou.
Em torno de seis meses as coisas melhoraram, foi até estranho o dia em que o advogado de minha mãe não entrou mais em contato e mandou todos os processos finalizados. Ninguém acreditava que pudéssemos ter paz por um tempo. Os funcionários voltaram, a empresa voltou a prosperar e as coisas voltaram a caminhar da melhor forma possível.
Nisso eu já estava no segundo ano do Ensino Médio já e eu me assumi para o mundo. Eu gostava muito de Luca e ele tinha aquele senso protetor, principalmente logo que eu voltei para a escola após o acontecido. Acabamos entrando em um relacionamento convencional.
Foi com Luca que eu tive minha primeira vez aos 16 anos. Não vou entrar em detalhes desse momento da minha vida, nem insinuar como fez, mas foi estranho! Isso eu não posso negar, mas como a gente da banda diz: toda primeira vez é estranha. Primeiro beijo, primeira vez, entre outros. Eu tentei dar e receber, mas acabei preferindo a parte de dar, acho que é por isso que eu e Scott demos muito bem, já Luca também preferia dar, então era bem estranho.
Bom, estranho é eu falar das minhas preferências sexuais com vocês.”
- Ei, ! – Gritei, erguendo o rosto do computador. – Qual vai ser a classificação indicativa desse livro?
- Menos que 18, Jack, sem sexo explícito! – Ela ergueu o olhar de seu caderno de músicas e eu suspirei.
- Ok, ok! – Abanei a mão e voltei os olhos para a tela do computador.
“Não foi pela nossa preferência sexual que a gente não deu certo. Eventualmente eu acabei descobrindo que ele jogava nos dois times, mas preferia muito mais as mulheres, então nosso relacionamento acabou esfriando ainda no segundo ano. Ainda mantivemos contato até eu vir para Los Angeles.
Eu não tive nenhum interesse amoroso no terceiro ano e me formei bem, com várias recuperações, mas deu para eu passar e ainda conseguir 25 por cento de bolsa em uma faculdade particular de administração aqui em Turim mesmo. A única certeza da minha vida era que eu ajudaria minha mãe no vinhedo.
Depois do acontecido com meu pai, meu tornozelo demorou muito para melhorar, então eu acabei saindo do time de futebol. Confesso que dei graças a Deus, estava um tanto enjoado já sempre da mesma coisa, queria alguma coisa nova na vida, então acabei entrando no coral da escola. Minha escola já tinha aulas de música desde meus três anos, mas eu nunca dei muita moral, sempre fui viciado no futebol, mas quando eu entrei no coral, as coisas deram uma guinada.
Primeiro como voz de apoio e eventualmente fui descobrindo que eu realmente tinha jeito para a coisa, acho minha voz muito parecida com a do Adam Levine, tanto que as pessoas comparam até hoje. Então, depois de formado, eu continuei com as aulas de canto no conservatório da cidade e comecei a me apresentar em barzinhos, conseguindo até uma graninha extra com isso.
Mas foi aos meus 18 anos que eu tive outro baque na minha vida: o aparecimento do câncer da minha mãe. “
“Como vocês sabem, eu cheguei na aos 19 anos e minha mãe já estava doente. Na linha do tempo, estamos há pouco mais de um ano desse encontro.
Com a chegada dos 50 anos de minha mãe, ela começou a fazer aqueles exames frequentes que toda mulher faz e, em um desses exames, descobrimos vários cistos em suas duas mamas. Podíamos pagar o tratamento, mas aquilo foi difícil para gente. Agora éramos só nós três, não é? Gemma já tinha nove anos, mas aquilo era complicado para ela entender.
- Bom, senhora Bolzan, os exames mostraram um carcinoma ductal invasivo. – Franzi a testa.
- Isso quer dizer... – Perguntei.
- Câncer? – Minha mãe perguntou e a médica afirmou com a cabeça.
- Esse câncer é o mais comum dos invasivos, ele se inicia em um duto de leite e cresce do tecido adiposo da mama...
- Isso tem cura? – Perguntei rapidamente.
- Nós faremos exames mais invasivos para ter certeza da extensão do carcinoma, mas precisaremos retirar suas mamas. – Minha mãe travou e eu segurei sua mão.
- As duas? – Minha mãe perguntou baixo.
- Sim. Esse câncer pode se espalhar facilmente pelo sistema linfático e circulação sanguínea, então queremos evitar que isso aconteça. – Ela disse.
- E depois? – Minha mãe perguntou baixo, mas eu estava travado na minha cadeira.
- Caso haja necessidade, faremos tratamento com quimioterapia e radioterapia. Mas descobrimos cedo, a senhora tem boas chances. – Respirei fundo.
- Podemos ficar sozinhos por um tempo? – Perguntei e a médica assentiu com a cabeça e se levantou, saindo da pequena sala de exames.
- Eu não sei o que dizer. – Minha mãe falou e eu segurei sua mão.
- Eu não consigo acreditar, mãe. Primeiro lutamos contra o papai, agora contra isso? Quando a vida vai nos dar uma folga? – Falei um tanto alto demais, sentindo as lágrimas escorrerem pelo meu rosto.
- Nós vamos lidar com isso da mesma forma que lidamos com seu pai. – Ela respirou fundo. – Juntos.
- Você parece calma demais, mãe. É um câncer! – Respirei fundo. – Eu não posso perder.
- Você não vai, querido. – Ela acariciou meu rosto. – Mas também não há que fazer, precisamos lutar contra isso. E eu sei que com você e Gemma tudo ficará muito mais fácil.
- Ah, mãe! – A abracei apertado. – Eu estarei aqui sempre contigo.
Passamos pela cirurgia, minha mãe se recuperou bem, mas já tinha se espalhados para outros órgãos, o que ela precisou fazer outros tipos de tratamento, perdendo seus cabelos e pelos. Esse câncer dela entrou em remissão quando eu tinha 20 anos e voltou severo pouco antes dela morrer.
Mas algo que o tratamento não tirou dela foi seu ânimo. Parece que com meu pai ela vivia enclausurada dentro de uma gaiola, depois dele, ela era muito mais animada, feliz, livre. E o câncer não tirou isso dela nem antes dela falecer.
Depois das sessões de quimioterapia, ela ficava muito cansada, então algo que ela sempre falava que a animava, era me ouvir cantar e me inspirou a tentar seguir carreira nessa área.
- Deita, mãe! Eu vou pegar água para você. – Falei, vendo Gemma se ajoelhar ao seu lado.
- Eu estou bem! – Ela falou segurando minha mão e tossiu algumas vezes. – Canta para mim? – Abri um pequeno sorriso.
- De novo? – Perguntei, me sentando na mesinha de centro, de frente a ela.
- Eu adoro te ouvir cantar, querido. – Ela sorriu fracamente.
- Eu também! – Gemma se sentou ao meu lado e eu ri.
- O que você quer que eu cante? – Ela girou no sofá, olhando para mim e eu segurei sua mão.
- Imbranato. – Ela disse e eu respirei fundo, assentindo com a cabeça.
- Ok, exigente! – Brinquei e ela riu fracamente. Respirei fundo antes de começar a cantar aquela música que eu já sabia de cor. - È iniziato tutto per un tuo capriccio, io non mi fidavo era solo sesso. Ma il sesso è un'attitudine, come l'arte in genere, e forse l'ho capito e sono qui. – Ela tinha um largo sorriso no rosto e eu segurava sua mão firme. - Scusa sai se provo a insistere, divento insopportabile. Ma ti amo, ti amo, ti amo, ci risiamo vabbè, è antico, ma ti amo. – Puxei o ar mais forte. - E scusa se ti amo e se ci conosciamo da due mesi o poco più... – Alonguei a frase. - E scusa se non parlo piano, ma se non urlo muoio. Non so se sai che ti amo. E scusami se rido, dall'imbarazzo cedo, ti guardo fisso e tremo. – Fechei os olhos. - All'idea di averti accanto, e sentirmi tuo soltanto. E sono qui che parlo emozionato, e... – Olhei para ela novamente. - E sono un imbranato. E sono un imbranato.
- Lindo! – Minha mãe falou e Gemma me aplaudiu, me fazendo sorrir. – Você deveria seguir carreira na área, querido.
- Não, mãe. Você precisa da minha ajuda aqui! – Ela negou com a cabeça.
- Não pense em mim, Jack. Siga seus sonhos. Um dia eu não estarei mais aqui e não quero que você pense que perdeu tempo por causa de mim. – Ela suspirou.
- Não fala isso, mãe. – Neguei com a cabeça.
- Eu não digo sobre a doença, digo sobre o curso natural da vida. Quero vocês realizados quando isso acontecer. – Suspirei, assentindo com a cabeça.
- Eu apoio, você faria muito sucesso, igual Tiziano! – Gemma disse e eu passei a mão livre pelos seus ombros.
- Eu vou pensar, ok?! Prometo! – Falei e as duas confirmaram com a cabeça. – Agora descansa, mãe. Vou ver se Milena precisa de alguma ajuda e depois prepararei algo para você lanchar. Pode ser?
- Pode sim. Obrigada! – Ela falou. – Gemma, lição de casa. – Ela assentiu com a cabeça.
- Já vou! – Ela falou e levantamos, seguindo com nossas vidas.
Como tudo que minha mãe sugeria para mim, eu acabei acatando a ideia de seguir como cantor. Eu sabia que cantava bem, tinha uma voz um pouco mais fina, atingindo algumas notas mais agudas. Foi nessa época que comecei a cantar em bares e karaokês, até que um olheiro gostou de mim e me ofereceu um contrato.”
“- Jack, você o próximo! – O dono do bar falou e eu me levantei, ouvindo meus amigos gritarem em torcida para mim e subi rapidamente no palco.
Peguei o microfone de fio, tirando-o do pedestal e afastei o mesmo para o canto do palco, abrindo um pouco mais de espaço para mim em cima do palco e apontei para o controlador de som, ouvindo-o liberar a música This Love do Maroon 5 para mim. Já haviam me comparado com o vocalista, então por que não aproveitar?
- I was so high, I did not recognize, the fire burning in her eyes, the chaos that controlled my mind. - Comecei a cantar, segurando o fio com uma mão e o microfone com a outra. - Whispered goodbye as she got on a plane, never to return again but always in my heart. This love has taken its toll on me, she said goodbye too many times before. – Deixei minha voz fluir, ouvindo as pessoas do bar gritarem por mim. - And her heart is breaking in front of me, I have no choice, 'cause I won't say goodbye anymore, woah, woah, woah. – Movimentei o corpo no ritmo da música, me empolgando.
- I tried my best to feed her appetite, keep her coming every night, so hard to keep her satisfied. Oh, kept playing love like it was just a game, pretending to feel the same, then turn around and leave again, but, oh! – Movimentei as mãos animadamente, ao som da música. - This love has taken its toll on me, she said goodbye too many times before, and her heart is breaking in front of me, I have no choice, 'cause I won't say goodbye anymore woah, woah, woah. – Eu era péssimo de dança coreografada, mas me soltava bastante com um bom rimo.
- I'll fix these broken things, repair your broken wings, and make sure everything is alright. – Estiquei as mãos, ouvindo o pessoal do bar se animar comigo. - My pressure on your hips, sinking my fingertips, into every inch of you, 'cause I know that's what you want me to do. – Sacudi a cabeça.
- This love has taken its toll on me, she said goodbye too many times before. Her heart is breaking in front of me, I have no choice, 'cause I won't say goodbye anymore. This love has taken its toll on me, she said goodbye too many times before. My heart is breaking in front of me, she said goodbye too many times before. This love has taken its toll on me, she said goodbye too many times before, her heart is breaking in front of me, I have no choice, 'cause I won't say goodbye anymore. – Finalizei a música, ouvindo o pessoal me aplaudir animadamente e fiz uma flexão para frente, agradecendo e deixei o microfone no pedestal e saí do mesmo.
- Você foi muito bem, Jack! – Alex falou e eu o cumprimentei rapidamente. Depois cumprimentei Charlie e nos sentamos à mesa.
- Mais uma rodada, por favor! – Charlie falou para a garçonete e logo ela trouxe canecas de chope para gente.
- Falando sério agora, você precisa estourar, cara! Você canta muito bem.
- Eu sei, tenho melhorado cada vez mais com o professor, mas não é como se isso fosse cair na minha cabeça, sabe? Além de que eu nem sei como me divulgar. – Roubei um pedaço de queijo da tábua de frios na mesa.
- Você poderia começar gravando uma demo. – Ouvi uma voz atrás de mim e virei o corpo, vendo um cara sentado na mesa ao lado, com o braço apoiado no encosto da mesma.
- Quem é você? – Alex perguntou um tanto grosseiro e o cara se levantou.
- Andre Terriani. – Ele falou, estendendo a mão para mim e eu apertei. – Eu sou olheiro da Virgin Records Itália. – Arregalei os olhos.
- Por que a gente não deixa eles conversarem? – Charlie falou para Alex e ambos se levantaram rapidamente e Andre se sentou ao meu lado.
- Você canta muito bem, senhor...
- Bolzan. Jack Bolzan! – Falei rapidamente.
- Ouvi que você quer seguir carreira.
- Sim, é algo recente, mas estou tentando, cantando em bares, restaurantes, alguns eventos corporativos. – Falei ponderando com a cabeça.
- Aqui na Itália trabalhamos com poucos nomes, mas se você quiser se afiliar conosco, podemos te colocar no nosso banco de dados internacionais e você ser chamado para trabalhos pontuais. Desde apoio para algum artista, até uma gravação solo.
- Mesmo? – Falei empolgado.
- Não é algo tão legal como você está pensando, mas é uma chance de você começar, além de que você não precisa se prender a nós. Por ser trabalhos esporádicos, você pode conseguir outras coisas.
- Isso é legal sim! – Falei. – Como funciona pagamento e afins?
- Por trabalho. Por enquanto te colocamos no banco de dados e quem sabe não te chamam para algo? – Ele falou. – É uma afiliação gratuita, meio que um banco de talentos mais profissional e o que eu vi aqui hoje é muito profissional.
- Nossa, obrigado, Andre! Fico muito feliz! – Assenti com a cabeça.
- Eu gravei sua apresentação aqui hoje, então já dá para usar, mas se puder comparecer à gravadora em Roma para uma gravação de voz, desempenho, além de fazer um pequeno cadastro conosco, seria legal.
- Claro! Vamos marcar! – Ele tirou um cartão do bolso e me entregou.
- Ligue para mim na segunda-feira, sim? – Ele me estendeu a mão novamente e eu o cumprimentei novamente.
- Obrigado! – Falei, vendo-o se retirar e logo a mesa se encheu com Alex e Charlie.
- O que aconteceu? – Eles perguntaram quase juntos.
- Eu acho que estou no banco de dados da Virgin Records.
- Cara, isso é fantástico! Precisamos comemorar! – Charlie falou e eu ri.
Daí você pode ter imaginado o que aconteceu. Fui para Roma, fiz esse cadastro no banco de dados, gravei cinco músicas no estúdio deles, de vários ritmos, e uma gravação de apresentação, meio semelhante ao que eu apresentei naquele dia, agora era só esperar.”
“Eu não fui chamado nenhuma vez durante seis meses, achei até que aquilo havia sido em vão, mas eu não pagava nada para estar naquele banco de dados, então eu nem reclamava. Mas foi tipo um balde de água fria, eu imaginava que seria tipo fechar um contrato, como contou que fechou o dela, mas o negócio não foi bem assim.
Nesse meio tempo, eu fazia faculdade de administração à distância, para facilitar o cuidado de minha mãe e da empresa, fazia aulas de canto duas vezes por semana para melhorar minha potência vocal e cantava em alguns bares pela cidade, restaurantes e as vezes alguns eventos que apareciam, não muitos, gostaria de deixar claro.
Até que Stone apareceu na minha vida. Parece que eu estou vendo o tombo que eu levei quando recebi a ligação do pessoal da gravadora falando que eu havia sido selecionado, as funcionárias da empresa que estavam limpando a casa ficaram realmente preocupadas que eu tivesse quebrado novamente o tornozelo.
- Eu atendo! – Falei ao ouvir o telefone tocando, depois lembrei que eu estava sozinho em casa. Minha mãe foi visitar minha tia e Gemma estava na escola. Desci o primeiro lance de escadas e peguei o telefone. – Alô?
- Olá, gostaria de falar com Jack Bolzan? – A menina falou do outro lado da linha.
- Sou eu! – Falei.
- É da Virgin Records Itália, eu estou ligando, pois você foi selecionado para fazer parte de uma banda que está se formando em Los Angeles, você teria interesse?
- Oi? Los Angeles? Isso é sério? – Arregalei os olhos, me apoiando no corrimão.
- Sim, senhor. – Ela riu fracamente. – Seu currículo foi escolhido pela equipe de lá e eles querem que você seja o backing vocal de uma cantora que está prestes a ser lançada.
- Nossa! Uau! – Falei empolgado e surpreso ao mesmo tempo. – Como funciona?
- Foi enviado pelo correio as informações de contrato e tudo mais, deve chegar em alguns dias, mas adiantando, é um contrato de emprego com a Virgin Records americana, incluindo todas as despesas de transferência e mudança para os Estados Unidos, moradia, além de todo treinamento, aulas e outros itens descritos detalhadamente no contrato.
- Uau! – Respirei fundo. – Caso eu decida aceitar, qual meu próximo passo?
- Inicialmente, você espera o contrato chegar em sua casa, depois analise, aguardamos sua resposta em até 15 dias.
- Nossa, obrigado! Obrigado mesmo! – Falei, desligando o telefone e dei um grito assim que o fiz, chamando a atenção das auxiliares de limpeza.
- Está tudo bem, senhor Bolzan? – Uma delas perguntou.
- Está ótimo, Rita! Está tudo maravilhoso! – Dei um pulo alto, caindo em falso e tropecei nos últimos quatro degraus da escada, dando de cara no chão.
- Jack! – As duas gritaram, vindo em minha direção e eu me levantei rapidamente.
- Está tudo bem, está tudo bem! – Falei rindo. – Eu consegui um contrato, mulheres! Eu vou cantar numa banda famosa! – Falei animado e elas gritaram e me abraçaram, me fazendo rir. – Só preciso falar com minha mãe.”
“Depois que o ânimo sumiu, eu me apavorei. Eu estava com muito medo de falar com a minha mãe, porque ela estava doente e agora eram só nós três e do nada eu me mudaria para Los Angeles para viver uma vida totalmente diferente? Não me parecia muito justo, sendo que o motivo de ela ter pedido divórcio de meu pai para começo de conversa, foi por mim.
Eu esperei elas chegarem enquanto tentava me manter o mais calmo possível. O que estava sendo um tanto difícil, em minutos eu criei a habilidade da continência urinária e levantava para ir no banheiro a cada cinco minutos.
- Jack, chegamos! – Ouvi Gemma falar e me levantei rapidamente, encontrando-as deixando algumas sacolas na cozinha.
- Ei, como foi a aula? – Perguntei para Gemma que tinha entrado para a aula de inglês.
- Legal! – Ela deu de ombros. – É só o começo! – Rimos juntos.
- Eu tenho algo para contar para vocês! – Falei com um largo sorriso no rosto, desviando o olhar de uma para outra.
- Você está me assustando. – Gemma disse.
- O que houve, querido? – Minha mãe se aproximou, tirando a bandana de sua cabeça.
- O pessoal da Virgin ligou, mãe. – Falei. – Eles têm um contrato para me oferecer!
- O quê? Não acredito! – Ela me abraçou fortemente. – Como? Onde?
- Eles querem que eu seja backing vocal de uma nova cantora que será lançada em breve...
- Ah, querido, isso é ótimo!
- ...Em Los Angeles! – Finalizei.
- Oh! – Gemma falou e eu respirei fundo.
- O que você acha, mãe? – Segurei suas mãos.
- Eles especificaram como vai ser?
- Eles enviaram o contrato pelo correio, é para estar chegando, mas eles disseram que custeiam todos os gastos, moradia, tem contrato de emprego com a gravadora... É tudo certinho, mãe! – Respirei fundo.
- Ah, querido! – Ela me abraçou novamente. – Se você quer isso, eu o apoio sempre! – Ela disse. – Não se preocupe comigo, nem com Gemma, sabemos nos cuidar, além de que temos condições para ir te visitar regularmente.
- E quando você tiver muito dinheiro, visitar a gente! – Gemma falou e eu ri fracamente, bagunçando seus cabelos.
- Então, vocês acham que eu devo ir?
- Acho que devemos esperar esse contrato chegar e analisar a veracidade das informações, se for algo legal e sério, eu acho que deve ir sim. – Ela sorriu. – Eu disse para ir atrás dos seus sonhos, certo?
- Certo! – Sorri.
- Agora vá realizá-lo. – Assenti com a cabeça sorrindo.
- Obrigado! – Suspirei.”
“As organizações para que eu fosse para Los Angeles ainda demoraram um mês, minha mãe estava bem, a quimioterapia tinha dado efeito, organizamos as coisas na vinícola, contratamos mais uma pessoa para ajudar minha mãe na parte administrativa, Gemma entrou de férias de meio de ano e fomos para Los Angeles.
Eu não sabia com o que eu estava mais empolgado: em conhecer Los Angeles, já que eu nunca havia saído da Itália, ou em começar a trabalhar e conhecer a tal cantora que eles haviam dito. No contrato só dizia que ela tinha 17 anos, era brasileira e havia optado por dar chance a estrangeiros, assim como ela.
Chegamos três dias antes, no primeiro dia eu dormi, o fuso-horário era totalmente diferente, eles estavam sete horas para trás, então aquilo me confundiu tudo. No segundo dia, tiramos o dia para turistar, visitamos o Sinal de Hollywood, a Calçada da Fama, o Píer de Santa Monica, entre outros. De pensar que anos depois fomos inseridos na calçada da fama, parece loucura agora.
Até que o dia finalmente chegou. Combinamos de nos encontrar após o almoço na Virgin Records, minha mãe e minha irmã foram comigo. Cheguei lá, ficando abismado com o tamanho do local e encontrei uma recepcionista logo depois de sair do elevador.
- Olá, buongiorno! – Falei com forte sotaque italiano.
- Olá, no que posso ajudar?
- Temos uma reunião com Jessica Stone. – Falei.
- Claro! Qual seu nome?
- Jack Bolzan. – Falei e ela assentiu com a cabeça, discando rapidamente no telefone e colocando na orelha.
- Jessica? Jack está aqui. – Ela falou, confirmando a resposta com a boca e logo desligou.
- Pode seguir aqui pelo lado esquerdo, ela vai te encontrar no lobby. – Ela falou e eu confirmei com a cabeça.
- Obrigado! – Falei, seguindo para onde ela tinha falado e encontrei um grande lobby do outro lado da porta, com várias portas nas paredes com nomes de produtores, salas de som, etc...
- Jack? – Observei uma loira muito bem-arrumada, com os cabelos lisos, olhos azuis e uma pele acobreada, bem cara de americana mesma. – Eu sou Jessica Stone. É muito bom tê-lo aqui! – Ela esticou o braço.
- É muito bom! Obrigado pela oportunidade.
- Essa é sua mãe? – Ela olhou para minha mãe.
- Branca!
- Gemma! – Elas falaram e Jessica sorriu.
- É um prazer! Bom, Jack você já recebeu as instruções, não é mesmo? Sabe como tudo vai funcionar, mais tarde te levarei para você conhecer sua moradia, é junto da nossa cantora principal, então será bom para vocês enturmarem. – Ela falou e eu assenti com a cabeça.
- Sim, tinha tudo no contrato que me foi entregue. – Assenti com a cabeça.
- Perfeito! Bom, chega daqui a pouco, assim vocês já se conhecem e começamos logo os trabalhos, pode ser? Com o passar dos dias eu vou te apresentando outras coisas.
- Claro! – Sorri. – É, eu só queria saber quem é . – Falei e ela riu.
- Claro, claro! Deixa eu te mostrar algo aqui. – Ela abriu o computador eu estava em sua mão e procurou por um arquivo, abrindo o mesmo e me entregando o mesmo.
Era um vídeo dela em um dos ensaios que eles fizeram durante seu treino aqui na Virgin. Ela estava no estúdio, com um lado do fone colocado em sua orelha e a mão em cima do mesmo, ela cantava uma música da Avril Lavigne. Ela era muito bonita, não uma beleza exuberante, mas bonita, cabelos e olhos castanhos, um sorriso muito bonito, além de uma potência vocal muito boa, não a potência que ela tem hoje, mas para mim, naquela época já era perfeita.
- Uau, ela é muito boa! – Falei rindo fracamente.
- Ela é a nossa cantora principal, vocês vão se divertir, ela é ótima. – Ela sorriu. – Falando nela. – Ela indicou a entrada e a vi entrar com um homem.
- ... E nem tente mexer no meu cabelo enquanto eu estiver dormindo! – Ouvi sua voz mais perto.
- Querida, você chegou! – Ela me avistou e o homem que estava com ela se sentou em uma das poltronas. – Quero que você conheça uma pessoa. – Jessica falou e ela se aproximou, olhando para nós quatro.
- Jack Bolzan. – Falei e ela sorriu.
- Essa é , nossa garota principal. – Jessica sorriu e ela se aproximou de mim.
- É um prazer conhecê-lo, você tem uma voz maravilhosa. – Ela disse e eu não pude evitar em sorrir.
- Eles estavam me mostrando seu vídeo e eu achei você extraordinária! – Ela sorriu envergonhada e assentiu com a cabeça.
- É sua família? – Ela disse para minha família.
- Sim! – Disse. – Minha mãe Branca e minha irmã Gemma.
- É um prazer conhecê-los. – Ela deu um beijo em cada uma, sorrindo.
- Eu adorei a sua iniciativa em trazer pessoas de outras nacionalidades para a banda, e fico feliz que tenha escolhido meu filho. – Branca falou e ela abri um largo sorriso.
- O ponto alto de escolha foi o talento, mas foi muito bom ele fazer parte da diversidade. – Ela riu. – E você, qual sua idade? – Ela perguntou para minha irmã que estava quieta no canto.
- Eu tenho 10. – Gemma sorriu.
- Você é uma graça, sabia? – Ela disse e eu sorri fracamente.
- Eu sei que vocês têm muito que fazer, tem que se conhecer melhor, mas você tem outro compromisso agora, . – Jessica falou, conferindo seu relógio e ela fez um bico, derrubando os ombros para frente.
- Eu não aguento mais! – Ela reclamou e eu soltei uma risada.
- Só mais dois meses. – Jessica disse.
- O que eu tenho agora? – Ela perguntou, suspirando longamente.
- Aula de dança 101. – Ela fez uma careta.
- Oh meu Deus! Eu pareço uma pata dançando! – Ela disse e eu e Gemma seguramos as risadas.
- Vamos mudar isso! – Jessica sorriu. – E você pode vir junto, Jack, assim vocês vão se conhecendo.
- Oh não, eu não danço! – Falei erguendo as mãos.
- Vamos mudar isso! – repetiu a frase de Jessica e eu ri fracamente.
Bom, o resto é história! Depois daí temos toda aquela história de fazer parte de uma bandinha de sucesso conhecida pelo mundo. Vocês devem conhecer, se não, não adquiririam esse livro! Rá, rá, rá!
Bem, piadas à parte, espero que tenham conhecido um pouco da minha história antes de encontrar Stone. Confesso que depois que isso aconteceu, apesar de alguns percalços pelo meio do caminho, é a melhor parte da minha vida.”
- O que você acha? – Perguntei para quando ela terminou de ler e soltou um longo suspiro.
- Está incrível, Jack, só estou triste por saber detalhes sobre sua história com seu pai dessa forma. – Ela franziu os lábios e virou no banco. – Tem certeza que quer publicar assim mesmo?
- Tenho sim! – Suspirei, sentindo-a me abraçar pela cintura. – É a minha história, eu não posso mudar, além de que é uma conscientização para esse mundo intolerante que estamos vivendo nos dias de hoje. – Ela assentiu com a cabeça. – Eu sou conhecido, famoso, tenho dinheiro e as pessoas me tratam diferente por isso, mas e aqueles que não tem essa vantagem?
- Está certo, Jack! – Ela sorriu. – Entra em toda conscientização para tentar fazer um mundo melhor a cada dia! – Assenti com a cabeça e dei um beijo em minha cabeça.
- Obrigado! – Suspirei. – Foi difícil, mas foi bom relembrar de quando a gente ainda podia sair de casa sem ser reconhecido. – Brinquei e ela gargalhou.
- Entregue para Mike, pode ser?
- Vou lá agora. – Falei. – E como você está hoje?
- Estou bem! Um dia de cada vez, não é?! – Ela suspirou e eu fechei o notebook, pegando-o.
Saí pela porta da cozinha e fui para varanda, encontrando Mike com seu violão no colo, dedilhando algumas coisas e escrevendo em uma partitura.
- Mike! – O chamei e ele ergueu o rosto. – Presente para você! – Sacudi o notebook.
- Ah, finalmente terminou, é?! Que demora, hein?! – Ele brincou e eu gargalhei, esticando o notebook para ele.
- Só te desejo sorte, porque foi muito difícil! – Falei rindo.
- Valeu, preciso pensar como eu vou começar isso ainda.
- Você disse que ia contar sua história e da Lacey. – Ele suspirou.
- É a única parte relevante da minha vida, eu não tenho uma história trágica ou emocionante igual a sua e de sua família, o problemático é o Mack, esqueceu? – Rimos juntos.
- Boa sorte! – Falei. – Depois você entrega para o Louis! – Falei e acenei com a cabeça, voltando para dentro de casa, rindo fracamente.
Continua em Uma História de Mike Derrick.
Nota da autora: Ah que delícia ver essa short finalmente postada! <3 Eu venho pensando sobre esse projeto de Total Stranger há cerca de um ou dois anos, mais ou menos. Apesar de TS ser uma história muito grande, ela tem vários personagens, então era normal que surgissem outros enredos em minha cabeça!
A história do Jack é um tanto triste demais, mas é só um pouco do que se passa na casa de diversas famílias da atualidade que não aceitam o simples fato de seu filho ser gay.
Espero que tenham gostado e não se esqueçam de comentar e compartilhar experiências.
Beijos. ♥
Outras Fanfics:
Total Stranger
Nota da beta: Nossa que cena forte foi o pai (se é que a gente pode chamar aquele monstro de pai) batendo no Jack, fiquei em agonia, quase matou o próprio filho, meu Deus! Mas foi bom conhecer a história dele! <3
Lembrando que qualquer erro nessa atualização e reclamações somente no e-mail.
A história do Jack é um tanto triste demais, mas é só um pouco do que se passa na casa de diversas famílias da atualidade que não aceitam o simples fato de seu filho ser gay.
Espero que tenham gostado e não se esqueçam de comentar e compartilhar experiências.
Beijos. ♥
Outras Fanfics:
Lembrando que qualquer erro nessa atualização e reclamações somente no e-mail.