ATENÇÃO:
Essa é uma obra de ficção e os envolvidos em sua criação não compactuam com o uso de substâncias ilícitas,
tão pouco pretendem incentivar o uso.

Capítulo 1

?
? Ela voltou?
ouvia os cochichos de seus colegas de classe, enquanto tentava, sem sucesso, prestar atenção na aula de Literatura. Não que fosse adiantar alguma coisa, já estavam no meio do semestre e ele sabia que tinha repetido, mas também não queria ouvir nada sobre os boatos que rondavam a Cambridge High School desde o início da semana. Ele não queria ouvir o nome dela. Muito menos que ela estava de volta na cidade. Doía demais, seu estômago queimava e ele tamborilava os dedos na mesa, contando os segundos para o sinal tocar. Faltavam dois minutos.
Antes que qualquer aluno se levantasse das carteiras, já estava do lado de fora, tentando respirar fundo e digerir tudo o que estava acontecendo. Todas as memórias daquele maldito dia que ele tentava todos os dias esquecer, estavam voltando. Tudo por causa dela.
Ele caminhava pelos corredores da escola, sem realmente enxergar o que estava acontecendo. Precisava de um escape, qualquer coisa que o acordasse daquele pesadelo. Acabou esbarrando com , sua melhor amiga — melhor amiga de também, no passado —, que percebeu que o amigo não estava nada bem.
— Eu sei. — Ela suspirou.
Por muitas vezes, ela entendia os sentimentos de , mesmo que ele não os verbalizasse. Os dois tinham se aproximado muito desde o maldito dia.
Caminharam em silêncio para a área escondida atrás do ginásio, era o esconderijo deles, onde eles podiam ser eles mesmos. Por muito tempo, depois que foi embora, os dois se escondiam ali, para fugirem dos olhares de pena que todos os estudantes da escola dirigiam para eles. Principalmente para .
— É verdade? — Ele perguntou, colocando um cigarro na boca e o acendendo.
não conseguia sequer olhar nos olhos, então ele soube que era verdade. resolveu dar as caras depois de dois anos que ela tinha ido embora, sem se importar em se despedir — não que fosse adiantar algo, já que para , a menina estava morta.
Ele sentia seus dedos formigarem e seu corpo inteiro tremer, definitivamente não estava pronto para encarar novamente. Não podia conviver com ela novamente sem que todas as lembranças voltassem para sua cabeça. A dor que a menina trazia era grande demais.
— Ela vai tentar falar com você. — sentou ao seu lado e balançou a cabeça, prontamente se levantando. Ele não precisava de consolo. Sabia da única coisa que o acalmaria. — … por favor! — Mas ele não escutava mais a voz da amiga.
Os últimos horários seriam de Educação Física, então o garoto pegou sua mochila no armário e voltou para os fundos da escola, certificando-se de que a inspetora não estava por ali. A câmera de segurança que protegia aquela área estava esquecida e estragada havia pelo menos dez anos, então não era uma preocupação de , que já estava acostumado a pular o muro nas suas crescentes fugidas da escola.
Já tinha feito a ligação no caminho, então quando chegou na porta da casa de Damien, o garoto abriu a porta antes que ele precisasse bater.
— Você sumiu, cara! — Ele sorriu e abriu os braços para , como se fosse abraçá-lo.
Damien era um cara estranho, tinha os dentes tortos e uma cicatriz no rosto. Sua feição era amigável, mas seus olhos eram sombrios e causavam arrepios até mesmo a .
— O que vai ser hoje?
— O mesmo de sempre. — passou o dinheiro para o garoto, que entregou o conteúdo em um pequeno plástico.
Antes que virasse as costas para voltar pro carro, Damien não perdeu a oportunidade de provocá-lo:
— Tenho o pressentimento que vou voltar a te ver em breve, cacique… Já que a está de volta.
Um tremor passou pelo corpo de , mas ele não se virou para responder. Estava interessado no conteúdo do plástico mais do que tudo, depois que usasse, nada mais importava. Ele só queria estar entorpecido o suficiente para não se lembrar da dor que causava e voltaria a causar. Era só isso que ela trazia com ela: dor e sofrimento.
Ao chegar em casa, jogou sua mochila de qualquer jeito na sala e já subiu as escadas engolindo o pequeno comprimido. Quanto mais rápido fizesse o efeito, melhor.
Deitou-se na cama, olhando para o teto, que em poucos minutos já começou a rodar e suas vistas ficaram embaçadas.

! ! Vamos lá, você nem está prestando atenção. Eu preciso que você me ajude nisso! — A voz de era estridente. Ela já estava enchendo o saco com aquela coreografia estúpida.
— Não preciso. — respondeu, sorrindo. — Já está perfeita! Você repassou isso mil vezes.
— Não está perfeito! Está longe de ser perfeito e você não me ajuda em nada! — A garota começou a entrar em desespero e sabia que logo começaria a chorar se ele não a acalmasse.
— Vem, tenho uma ideia melhor... — sorriu e puxou a garota para um beijo.

, já inconsciente, mexia-se na cama, mas não conseguia acordar.

— O que você fez? O que você fez? Você a matou! — berrava, enquanto chorava.
— Eu não queria… não foi culpa minha! — A garota tentava segurá-lo, mas a empurrava, sem se preocupar se ela estava machucada ou não.
Ela estava viva e sua irmã não. Lily estava morta, bem na frente dele.

! !
Ele ouvia a voz de , mas não conseguia abrir os olhos, ainda estava preso no sonho, que não eram bem um sonho. Eram lembranças. não queria acordar, não queria sentir a realidade, mas sentiu um baque na cara e abriu os olhos de sobressalto. O filho da puta tinha dado uma travesseirada nele!
— Caralho! — xingou e se sentou na cama.
Seu melhor amigo o olhava com os braços cruzados e uma expressão raivosa no rosto.
, que inferno… ? — arregalou os olhos, finalmente percebendo que era mesmo , seu melhor amigo de infância que estava parado na frente dele.
Sem pensar duas vezes, os dois garotos se abraçaram. , sem perceber, começou a chorar copiosamente, enquanto o amigo tentava acalmá-lo, passando a mão pelos seus cabelos, sem soltar do abraço. soluçava e tentava parar, mas as lágrimas desciam pelos seus olhos antes que ele pudesse se controlar.
Ele não gostava de chorar, muito menos na frente de outras pessoas, mas não pode se conter quando viu . Ele provavelmente era pessoa que ele mais sentia falta na vida, depois de Lily. Quando ele foi embora para estudar seis meses na Grécia, ficou totalmente sozinho. e Lily-Anne eram a única família dele.
Ao pensar novamente na sua irmã, sentiu um repuxo no estômago e se soltou rapidamente do amigo, correndo para o banheiro. Vomitou violentamente no vaso, enquanto sentia os olhos de nas suas costas. Sabia que levaria um esporro quando melhorasse.
O garoto recostou no vaso, limpando a boca com as costas da mão e pendendo a cabeça para o lado, com os olhos fechados.
— Ela voltou. — Suspirou, ainda sem abrir os olhos. — E você também. — Conseguiu sorrir um pouco de lado.
Ele sabia que não tinha voltado simplesmente porque estava com saudades ou porque se cansou da Grécia, ele voltou, porque sabia que estava de volta e a vida de viraria de cabeça para baixo de novo. Voltou, porque sabia que não conseguiria conter os expulsos e os vícios de sozinha.
Era doloroso para ver o amigo naquela situação e ele sabia que a volta de faria voltar a ser sua pior versão: amargurado, sozinho, viciado e violento.



Capítulo 2

encarava o teto do seu quarto sem a menor vontade de se levantar. Ele sabia que estava vinte minutos atrasado e que se não se apressasse, levaria outra anotação por atraso, o que o deixava por um fio de ser suspenso — não que ele se importasse muito com isso. Ele não tinha pais e nem um adulto que realmente se preocupasse o suficiente com seu desempenho escolar.
Depois da morte dos seus pais, e Lily ficaram por conta própria. O tio deles, John , tinha tido a felicidade de herdar boa parte das Indústrias , então ele passava a maior parte do tempo viajando e fazendo negócios, era o último parente vivo de e não se importava muito com o que o garoto fazia ou deixava de fazer, visitava-o de tempos em tempos para saber se ele estava vivo e administrava a herança do garoto, além de lembrá-lo por e-mail de comparecer aos eventos sociais de Cambridge, que eram muito importantes para a memória das famílias fundadoras da cidade. Só. Nenhum apego. Nenhum sentimentalismo. Mas não se abalava com isso, já estava anestesiado com a sensação de abandono.
Ele permanecia preso na cama, mal conseguindo se mexer. conhecia a sensação, era comum para ele sentir seus pés e mãos formigando e a cabeça latejando de dor, e ainda assim, não conseguir se mover. Ele tinha isso o tempo todo, seu corpo e sua mente eram movidas pela dor, pelo pesar e pela perda.
era uma máquina de perder pessoas.
estava de volta e ela estaria na escola hoje, caso os boatos fossem verdadeiros. Ele não tinha vontade e nem sequer forças para encará-la. Parecia um insulto ter a garota desfilando sã, salva, viva e isenta de qualquer culpa naquele colégio, depois de ter sido a responsável pela morte de sua irmã mais nova. Mas era assim que as coisas funcionavam na Cambridge High School, principalmente se você pertencia a alguma família fundadora, como eram os .
poderia estudar facilmente em qualquer colégio do mundo, como tinha feito nos últimos anos, mas não, escolheu voltar para perturbá-lo. Era isso que a garota fazia: perturbava as pessoas, perturbava !
O garoto quase conseguia ouvir a voz de sua irmã na cabeça dele, Lily-Anne com certeza colocaria a mão na cintura, do jeito que ela sempre fazia quando estava brava e com razão, e diria “Vamos, , seu idiota! Você não pode guardar rancor para sempre!”. Mas o coração dele não era tão bom quanto o de sua irmã, seu pesar era grande demais para ser ignorado. Seu ódio por duraria até o fim dos seus dias — a menina que ele sempre achou que pertenceria até que a morte o abraçasse.
Todo seu amor por ela acabou no a dia que tirou a vida da melhor parte dele.
Em um impulso, conseguir se levantar da cama. Separou o uniforme do colégio antes de entrar para o banho e fazer sua higiene matinal. Ao terminar, acendeu o primeiro cigarro do dia, enquanto recolhia seus materiais. A casa estava silenciosa, como todos os dias. Talvez ele convidasse para morar com ele, já que o amigo sempre vivia ali mesmo. Conseguiu sorrir ao se lembrar das tardes que ele e passavam em casa jogando vídeo game e escrevendo músicas, parecia um tempo tão distante.
se sentia velho e cansado, mesmo que tivesse apenas dezoito anos, suas feridas eram tão grandes que parecia que ele tinha mais tempo de vida, quando, na verdade, ele só queria ter menos. Sentia que sua vida era um desperdício na Terra, ele não tinha nada, não tinha ninguém. Qual era o propósito dele estar vivo? Mas ele não conseguia tirar a própria vida, estava fadado a sofrer até a morte buscá-lo.
Sem conseguir mais adiar, apagou o cigarro e apanhou sua mochila, dirigiu até a escola com o olhar perdido e um incômodo pertinente no estômago. Ela estaria lá.
Ao chegar, caminhou tranquilamente pelos corredores, estava adiando ao máximo sua entrada na sala de aula, mesmo que já estivesse bem atrasado. Passou na aria para pegar a anotação, recebendo um olhar severo da pedagoga. Sua vida boa na Cambridge estava por um fio e ele não se importava nem um pouco com isso.
Quanto mais perto chegava da porta, mais forte seu coração batia, suas pernas não pareciam obedecê-lo, ele queria correr, queria estar o mais longe dali, mas não podia, afinal, para onde ele iria?
Ao bater na porta, recebeu um olhar temeroso da senhora , professora de Cálculo II, e soube que tinha chegado a hora. Ela estava ali.
soltou o ar e entregou a anotação à professora, ele tentou não olhar em volta e procurar, mas antes que ele pudesse se conter, seu olhar o traiu e ele olhou em volta, enquanto caminhava para sua carteira ao fundo da sala. A fração de segundos que seus olhos se encontram com os de foram o suficiente para que ele fosse atingido como se tivesse tomado um tiro. Era real, estava ali. Ela tinha voltado.

podia sentir os olhos de todos seus colegas de classe passando dela para . Todos ali tinham crescido juntos. Cambridge era uma cidade pequena, limitada pelas atividades ligadas à população estudantil por causa da Universidade, que era o inevitável destino de todos ali. Desde crianças sendo preparados para honrar o nome de suas famílias e da cidade estudando na universidade de Cambridge.
Todas as crianças haviam crescido juntas, principalmente as filhas das famílias fundadoras, eram todos amigos até o dia do incidente que mudou a vida de todos.
Algumas pessoas olhavam desconfiadas para , outras com desdém e o resto apenas estava curioso, tentando adivinhar qual seria a reação do garoto. estava curiosa acerca disso também, esfregava suas mãos suadas uma na outra, enquanto mantinha seu olhar baixo.
Nos segundos em que seus olhos se encontram com os de , ela pôde perceber o quão diferente ele estava: mais magro, cabelos curtos — ele tinha abandonado o corte estilo Justin Bieber em dois mil e dez — e embora suas olheiras estivessem fundas e roxas, o uniforme de permanecia extremamente alinhado, como ditavam as regras da escola.

Ele estava sentado no fundo da sala, dessa forma, não havia perigo algum de seus olhares cruzarem novamente, mesmo assim, o garoto permaneceu olhando fixamente para a professora, mas suas pernas que não paravam quietas denunciavam que sua cabeça estava bem longe dali.
não podia acreditar que estava de volta. Era real, ela estava ali, na mesma sala que ele, respirando o mesmo ar que ele; ar este que parecia estar faltando nos pulmões de , que lutava para manter os olhos na senhora , que falava e escrevia coisas no quadro das quais ele não estava ouvindo e muito menos entendendo.
Seus ouvidos zumbiam e sua cabeça doía desde a testa até a nuca, sua mandíbula estava completamente travada e seus punhos cerrados. Ele não podia ficar ali, era demais para ele.
Sem perceber, desviou o olhar para novamente, ela estava sentada mais à frente, de costas para ele. O garoto podia ver que as pessoas não paravam de olhar para ele e depois desviarem o olhar para ela, como se esperassem uma reação, um movimento da parte de um dos dois.
estava diferente, seus cabelos estavam mais longos e mais escuros e ela tinha engordado, provavelmente tinha se desintoxicado das drogas que usava. sequer sabia para onde a garota tinha ido nesse tempo todo, não o interessava. Dois dias depois do enterro de sua irmã, ela simplesmente sumiu e nunca mais deu notícias a ninguém… até então.
O garoto sentia seu celular vibrar, mas não tinha forças para pegá-lo. Ele estava completamente petrificado. Não podia lidar de jeito nenhum com essa situação, não queria ter ali para lembrá-lo que ele estava sozinho, sem seus pais e sem sua irmã. Lily-Anne era tudo que ele tinha. Tudo de mais precioso para ele.
sentiu seu estômago repuxar e pressentiu o que iria acontecer, levantou-se rapidamente, murmurando um rápido “com licença, professora” para a senhora e disparou para fora da sala, entrando no banheiro masculino mais próximo. O garoto abriu a porta da primeira cabine, indo diretamente para o vaso e vomitando seu café da manhã violentamente, ele tremia e as lágrimas já desciam sem aviso sobre seu rosto.
Era doloroso demais para ele aguentar aquilo.
? — Ouviu aquela voz conhecida e no mesmo instante seus batimentos cardíacos pareceram desacelerar. tinha esse poder sobre ele.
— Você está no banheiro masculino. — Conseguiu sorrir de lado e respondeu com a voz baixa.
— Você está bem? Está pálido! — A garota colocou as costas da mão na testa suada de , como se verificasse sua temperatura. — Ela está aqui, não é? — Cruzou os braços na altura do peito e se recostou na pia, enquanto permanecia sentado ao lado do vaso sanitário.
O garoto não respondeu, apenas fechou os olhos com força por um momento e depois os abriu, limpando as lágrimas do rosto com a barra da camisa social, que já estava para fora da calça.
— Pelo menos temos o de volta... — tentou mudar de assunto.
? O quê? Aquele… filho da puta! — sorriu de orelha a orelha. Essa era a melhor reação que ela poderia ter pela volta do amigo.
com certeza era a luz que ela e precisavam. Os dias tinham se tornado sombrios demais desde o dia do acidente e a mudança de só piorou a situação, o garoto funcionava como um alicerce para a dupla.
se levantou e lavou o rosto na pia, tentando controlar ao máximo o tremor em suas mãos, mas seu corpo insistia em traí-lo.
— Vai ficar do meu lado? — Perguntou baixinho para a amiga, encarando-a com seus olhos azuis intensos.
Ele detestava ser sentimental e demonstrar fraqueza, mas era a única coisa boa que tinha restado para ele. O garoto não podia se dar ao luxo de ter ela afastada dele, só porque ele era um merda e tinha dificuldade em manter as pessoas por perto. Se ele ainda estava vivo, era por causa dela.
— Sempre, cricket! — A garota sorriu e o abraçou, tentando não transparecer seu nervosismo.
Ela não queria que pensasse que ela não era forte para ajudá-lo nessa situação, mas também estava quebrada e preocupada. A volta de relembrava coisas que ela não queria e a deixava três vezes mais preocupada com .
— Agora vamos sair daqui, antes que a inspetora me veja aqui e eu tenha que dizer “não é nada disso que a senhora está pensando”. — Os dois riram e saíram abraçados do banheiro, indo em direção ao refeitório.

tentava, sem sucesso, fazer com que a máquina de doces do colégio funcionasse. Os anos se passavam e aquela merda continuava quebrada, a garota sempre se perguntava onde a Cambridge colocava o dinheiro que deveria ser investido em melhorias para a escola... ela precisava urgentemente de comer um doce para continuar enfrentando aquele dia, era o vício que a garota tinha substituído. Antes um chocolate, do que um comprimido de LSD — esse era o lema dela.
As pessoas no geral a receberam bem, a maioria parecia ter superado ou esquecido o acontecido, ou simplesmente não se importam. Mas antes de tudo acontecer, era uma pessoa extremamente querida na escola, apesar de ser problemática na mesma medida. Era capitã das líderes de torcida, vice-presidente do grêmio estudantil e do clube de teatro, e a melhor anfitriã de todas as festas. Mas ela sabia que esse carinho era vazio e preenchido de interesse, seja pela posição social que ela tinha na cidade, por ser de uma família fundadora e dona de um “império”, ou pela sua popularidade na escola. sabia mais do que ninguém que não era amada pela sua personalidade. A única pessoa que a amava independente de tudo, era .

, ! Vamos lá, você nem está prestando atenção. Eu preciso que você me ajude nisso! — A voz de era estridente. Ela já estava enchendo o saco com aquela coreografia estúpida.
— Não preciso. — respondeu, sorrindo. — Já está perfeita! Você repassou isso mil vezes.
— Não está perfeito! Está longe de ser perfeito e você não me ajuda em nada! — A garota começou a entrar em desespero e sabia que logo começaria a chorar se ele não a acalmasse.
— Vem, tenho uma ideia melhor! — Sorriu e puxou a garota para um beijo.
— Não! — não permitiu que seus lábios se colassem por meio segundo e quebrou o beijo, fazendo com que rolasse os olhos. Ela conseguia ser impossível às vezes. — Você precisa me ajudar! — Sorriu de lado e deu um selinho no garoto.
— Ok! — olhou para cima, como se pedisse ajuda aos céus e suspirou, antes de começar a imitar os passos de com uma surpreendente maestria, o que fez a garota rir.

As lembranças de foram afastadas com o barulho da máquina de doces sendo espancada, fazendo a garota pular de susto.
— Tem que bater, esqueceu?
Ouviu uma voz conhecida, que ela sabia que vinha com um sorriso, mesmo que ela ainda não tivesse feito contato visual.
— É, faz tempo... — a garota respondeu sem jeito, não esperava que falasse com ela e muito menos a ajudasse com alguma coisa.
— Fico feliz que você tenha voltado, . — Ele sorriu largamente, mostrando os dentes.
Quando o garoto sorria, seus olhos fechavam-se junto e ficava com uma aparência quase infantil, os dois costumavam sempre brincar sobre isso.
— Espero que as coisas se acertem! — O garoto entregou o chocolate nas mãos de e saiu com as mãos no bolso, deixando-a estática de frente para a máquina.

a observava de longe, encostado em uma árvore do lado de fora do refeitório, que ainda assim lhe dava uma visão da garota. Ela parecia a mesma pessoa de sempre, seu jeito de andar, de sorrir para as pessoas que passavam por ela. Aquilo era de embrulhar o estômago. Como as pessoas podiam achar normal que ela estivesse de volta? Todos agiriam como se nada tivesse acontecido? não se sentia capaz de fazer isso de forma alguma.
Sentiu suas mãos tremendo e temeu vomitar novamente. Ele não podia conviver com aquilo, sabia que não aguentaria sozinho. Precisaria urgentemente visitar Damien após as aulas.
nunca foi o tipo de cara que usava drogas, nem quando seus pais morreram o garoto recorreu a isso. Seu primeiro contato com entorpecentes foi depois da morte de sua irmã, onde os comprimidos e o cigarro lhe pareciam seu último refúgio, a única forma de ficar em paz, pelo menos no tempo que faziam efeito. No entanto, ele estava conseguindo segurar a barra, estava havia meses sem visitar Damien, o traficante que supria todas as necessidades de metade dos alunos da Cambridge, que de forma alguma eram pobres.
A escola era famosa por ter alunos de elite, filhos de políticos, de banqueiros e é claro, os filhos dos fundadores da cidade — perturbados demais para conseguirem carregar o fardo de suas vidas cheias de privilégios e cobranças sozinhos, usavam as drogas como refúgio. Damien era um desses alunos, filho do prefeito Richard Lockwood, descendente das famílias fundadoras de Cambridge, assim como , e . Mas ele não frequentava a escola mais, desistiu quando eles entraram no ensino médio e decidiu se dedicar integralmente a ser um traficante, mesmo que não precisasse do dinheiro.
Isso era o que mais intrigava , ele simplesmente não entendia o porquê do garoto fazer isso, mas nunca foram amigos o suficiente para que Damien se abrisse com ele, apenas desconfiava que a família não se importava com o garoto e ele fazia esse tipo de coisa para chamar atenção dos pais, já que ele sabia que jamais seria preso por ser filho do prefeito. Mesmo que ele fosse traficante, o mesmo que vendeu as drogas para naquele dia, mas simplesmente não o culpava. Na sua cabeça, se não fosse Lockwood, outro quem venderia. Ninguém tinha culpa na morte de Lily além de .
— Merda! — pisou na bituca de cigarro com força, tentando afastar seus pensamentos o máximo possível. Com certeza visitaria Damien no final da tarde.

Bien, bien, ela está mesmo de volta!
não precisou levantar os olhos para perceber quem estava falando com ela.
, a rainha de Cambridge High School, herdeira do “Império ”...
— O que você quer, Meredith? — levantou os olhos para encarar a garota na sua frente.
Meredith Brown a olhava de cima para baixo, estava vestida com o uniforme completo das líderes de torcida. A garota era extremamente bonita, sua pele negra parecia porcelana e seus cabelos tinham um brilho que invejava qualquer um, seu corpo parecia ter sido desenhado pelos anjos e ela sabia disso, por isso tinha um olhar esnobe estampado no rosto.
— Vim te dar as boas-vindas! — Exclamou de forma inocente, mas sabia que ela estava mentindo.
Brown era uma das pessoas que tinha agradecido pela mudança de , que abriu caminho para que ela se tornasse a nova capitã das líderes de torcida.
— Tudo bem, eu não consigo sustentar isso. — A garota riu, acenando as mãos e abandonando a falsa postura de boa moça. — Infelizmente, você é uma espécie de lenda nesse colégio... — torceu o nariz e arqueou as sobrancelhas, divertindo-se com a situação. — Isso quer dizer que já que você voltou, está oficialmente convidada a voltar para o time.
— Por mais que eu esteja lisonjeada... — riu e a garota em sua frente rolou os olhos. — Não acho que seja uma boa ideia.
— Ah, corta essa, ! — Meredith respondeu, impaciente. — Nós sabemos que você voltou para tomar conta de tudo novamente, essa postura que boa moça não vai durar, Serena Van der Woodsen. — Rolou os olhos, fazendo uma referência porca à Gossip Girl, mas que arrancou um sorriso perverso de .
Realmente, não estava nos planos da garota voltar para as líderes de torcida, sua cabeça estava cheia e ela precisava focar no seu verdadeiro objetivo, mas não seria má ideia tirar aquela postura petulante da garota parada na sua frente e mostrá-la quem era a rainha daquele colégio.
— Já que você insiste tanto… — sorriu e concordou com a cabeça, fazendo Meredith bufar e girar os calcanhares para voltar de onde ela tinha vindo, mas a deteve. — Mas com uma condição. — Sorriu, vendo a garota virar-se lentamente, temendo o que falaria.

•••

— Vamos comigo, Lily… não vai demorar, eu prometo! — sorria perversamente, enquanto tentava convencer a mais nova a ir com ela para a casa de Damien. — O não quer ir comigo, mas eu preciso! — Exclamou com urgência. Aquela era uma grande mentira, mas ela precisava convencer Lily-Anne.
Era a véspera do final do campeonato daquele ano, o time tinha a enorme responsabilidade de vencer a partida, que seria no campo adversário e é claro, as torcedoras estavam nervosas por terem que animar em um jogo que a maioria da torcida seria para o outro time. estava uma pilha de nervos, suas mãos tremiam tanto de nervoso quanto de abstinência. A única coisa que a acalmaria eram os comprimidos de Damien.
não sabia que ela estava fazendo aquilo, muito menos que estava arrastando a irmã mais nova dele junto, mas ela não podia ir sozinha e Lily não era mais criança. Podia lidar com aquilo. tinha certeza.

A garota acordou de sobressalto, já era a décima noite que ela acordava com a mesma lembrança, sempre a mesma. Naquela noite, Lily-Anne havia morrido por causa da sua insistência.
não se lembrava de quase nada daquela noite, tudo lhe parecia um borrão enorme e suas lembranças eram confusas e quase sempre se misturavam com a realidade, mas os fatos eram que a morte da mais nova tinha sido constatada como overdose. Mas todos sabiam que a menina não usava drogas, só tinha quatorze anos na época e era mais madura que , na maior parte do tempo.
A morte dos pais dos tinha feito os dois amadurecem mais rápido do que o normal e Lily tinha a cabeça no lugar, mas mesmo assim, esse foi o destino dela.

— Você precisa me dizer exatamente o que aconteceu. — O delegado Shawn Wattes olhava fixamente para , coçando a barba.
Ele estava furioso de ter tido que levantar da cama às duas da manhã para resolver um crime e quando chegou na cena, quase perdeu o fôlego. A filha mais nova dos estava morta na calçada dos , enquanto o mais velho berrava chamando pela irmã, mole e pálida em seus braços.
o encarava com os olhos injetados, o efeito das drogas já havia passado, mas a garota ainda tremia, suas lágrimas haviam secado, mas seu rosto ainda estava sujo da maquiagem que escorreu dos olhos, sua boca estava seca e ela ainda estava em choque. Lily-Anne estava morta.
— Nós fomos para a casa de Damien Lockwood… — ela começou a dizer e depois seu corpo resetou. Ela teria que contar, não tinha como esconder isso do delegado da cidade, não demoraria muito para ele ligar os fatos de qualquer forma. Seus pais estavam do lado de fora e ela não queria ter que encará-los. Estava encurralada. — Comprar drogas para mim.
— Continue...
— Eu não sei, eu… eu não me lembro! Eu juro, por favor… eu estou tão confusa, Lily está morta, eu preciso falar com , eu…
— Você não vai a lugar algum, mocinha!
Ouviu aquela voz horrível atrás de si e em seguida uma pancada na cabeça, deixando-a desacordada.

pulou da cama novamente, tinha caído no sono de novo. A garota balançou a cabeça negativamente e se levantou da cama. Ainda estava se adaptando ao seu antigo e ao mesmo tempo novo quarto. A decoração parecia não combinar com sua personalidade, não era mais a mesma pessoa e sabia disso, os quadros na sua parede ou os livros na sua estante não a definiam mais.
Decidiu tomar um banho, mesmo que ainda fosse cedo para começar a se arrumar para a escola, visto que ainda estava escuro do lado de fora, mas de forma alguma ela voltaria a dormir para ser assombrada nos seus sonhos. Enquanto a água quente descia pelo seu corpo, a garota começou a pensar no convite de Meredith, seria certo que ela voltasse para o time? Qual seria a reação das pessoas?
Eram nesses momentos de indecisão que ela sentia falta de . As duas sempre foram melhores amigas, desde quando a se mudou para a cidade quando tinha apenas quatro anos de idade. A conexão entre as duas foi instantânea quando se conheceram no jardim de infância. Confidenciavam tudo uma pra outra e passavam os momentos mais difíceis juntas também, como quando o pai de foi embora quando elas tinham apenas doze anos ou quando teve seu primeiro porre, eram inseparáveis.
sentia falta das tardes e das festas do pijama que as duas faziam, mas sabia que o acidente tinha destruído tudo entre elas da mesma forma que com , que também tinha um elo inquebrável com , algumas vezes até maior que as duas garotas tinham. Os dois se entendiam como ninguém, o que às vezes até causava crises de ciúme em , mas tudo sempre era resolvido entre eles, até que tudo aconteceu.
— Ridículo! — A garota bufou ao vestir o uniforme do colégio.
Sempre odiou a obrigatoriedade da saia azul-marinho acima do joelho, camisa social abotoada e a gravata da mesma cor da saia. Cambridge tentava ensinar os alunos sobre etiqueta e disciplina, mas não era muito eficiente nisso, visto que todos naquela escola tinham uma máscara, seja para enganar os pais ou a si mesmos. Inclusive ela. não era aquela pessoa refletida no espelho, ela se sentia muito além dos padrões da escola ou que seus pais tentavam a colocar.
, herdeira e sucessora do Império ... ela não queria nada daquilo, queria mais, queria se libertar das suas obrigações nos eventos e tudo que a prendia naquela cidade, mas não dependia só dela e isso deixava a garota doente, toda aquela cobrança e obrigação de ser perfeita sempre prejudicou a vida da menina. Por isso que ela sempre se envolvia em confusões no passado, sempre relacionada com drogas ou bebida. Seus pais sempre tentavam mascarar isso, dizendo para si mesmos que era uma fase, que ela fazia aquilo para chamar atenção, mas chegou ao fundo do poço e a única coisa que a fez procurar por ajuda foi a morte de Lily-Anne.

— Podemos mandar você para qualquer internato, qualquer lugar da Europa que você quiser! — Emma falava sem parar, andando de um lado para o outro na sala. — Até para os Estados Unidos, você pode estudar em Los Angeles, sempre gostou de lá, não é? — Parou para encarar a filha, que continuava sentada na mesma posição no sofá e ainda com a mesma roupa que tinha sido escolhida para usar no enterro de Lily, do qual ela tinha sido expulsa aos berros.
Não estava ouvindo uma palavra que a mãe dizia.
! — Emma, já com as lágrimas nos olhos.
Ela sabia que não era a melhor mãe do mundo, mas ver a filha daquela forma estava machucando seu coração de uma forma inimaginável.
— Para onde você achar melhor, mamãe. — sussurrou e comprimiu os lábios, sabendo que não seguraria as lágrimas por muito tempo.
Fechou os olhos e sentiu o abraço da mãe, permitiu-se chorar no colo dela como há muito tempo não fazia.
— Me desculpe por tudo, eu não queria que nada disso acontecesse. — Murmurava em meio às lágrimas, enquanto sua mãe dizia palavras de apoio e acariciava seus cabelos, dizendo que ela não tinha o que temer.

se assustou ao olhar no relógio, por mais que tivesse se levantado antes do horário previsto, faltava pouco para que ela se atrasasse. Pegou suas coisas que já estavam arrumadas e desceu as escadas, não encontrou seus pais na cozinha e deduziu que eles já tinham saído para o trabalho.
A garota pegou apenas um iogurte na geladeira e saiu porta afora, resolvendo ir caminhando para a escola, que ficava apenas quinze minutos de sua casa.
Quando virou a segunda esquina, esbarrou feio com a última pessoa que ela queria ver na vida.
— Ora, ora! — O garoto com a cicatriz horrenda no rosto sorriu de forma perversa para ele. — Olha só quem está de volta! — Damien pegou uma mecha de cabelo rebelde da garota, mas antes que colocasse atrás da orelha dela, se esquivou. — Devo dizer que fiquei decepcionado por você não ter ido me visitar… — ele fez um biquinho com a boca, o que deixava sua aparência ainda mais assustadora.
— Não fale comigo. — A garota conseguiu dizer entredentes, mas suas mãos estavam suadas e tremiam.
Ela sabia que Damien oferecia perigo e não entendia direito o porquê, mas sentia um medo descomunal do garoto.
— Você não era assim, ! — Ele continuou sorrindo e impedindo que a garota seguisse seu caminho, bloqueando-a sempre que ela tentava ultrapassá-lo. — Nos vemos por aí… quem sabe uma festinha particular com você e o ? Ele tem gostado de me visitar. — Deu uma piscadela e um beijo no rosto de , e antes que ela pudesse ter qualquer reação, ele sumiu das vistas da garota, sumindo em um beco qualquer.
ofegava e tremia, sem conseguir controlar sua respiração. Seu estômago embrulhava e ela estava zonza, como se fosse desmaiar a qualquer momento. Como assim “ tem gostado de me visitar?”, pensou, enquanto tentava respirar fundo para que pudesse continuar seguindo seu caminho.
Depois de uns bons minutos tentando desacelerar seus batimentos cardíacos, caminhou depressa para a escola, suspirando de alívio quando passou pelos portões, não sem antes olhar por cima do ombro, para ter certeza que não estava sendo seguida.

estava tirando um tempo para fumar um cigarro antes da primeira aula, na esperança de que isso o deixasse mais calmo antes de enfrentar novamente os olhos de . Ele estava distraído, tentando fazer desenhos com a fumaça que saía de sua boca e se perdendo nos desenhos, já se sentindo melhor. O cigarro parecia ser seu melhor amigo, ainda que fosse um saco não ter mais o mesmo fôlego no futebol, que era algo que ele amava, ou tossir tanto algumas vezes que lhe faltava o ar.
Passou a tragar com mais força e mais rápido, quando percebeu que iria se atrasar, e ao amassar a bituca com seu sapato, sentiu o celular vibrar no bolso. Ao ler o conteúdo da mensagem, imediatamente suas mãos começaram a tremer e seu coração acelerou de tal forma que em outra situação o garoto até temeria que estivesse tendo um ataque cardíaco, mas dessa vez, ele estava tomado pelo ódio.
A senhora já tinha começado a aula quando um enfurecido entrou na sala, sem bater na porta. E sem aviso prévio, caminhou a passos duros até a cadeira de . Quem aquela garota pensava que era? estava vermelho e suado, suas mãos tremiam e seus olhos estavam arregalados, cheios de mágoa e ódio. Todos o olhavam estáticos e assustados, incapazes de terem qualquer reação, até mesmo a professora estava tomada pelo choque.
— POR QUE VOCÊ FEZ ISSO? — berrou, enquanto o fitava com os olhos confusos e medrosos. — Já não basta você ter voltado para infernizar minha vida? Já não basta você ter matado a minha irmã? O que você quer, ? Me perturbar? Me matar?
— Eu não sei do que você está falando. — tentou parecer firme, mas suas mãos também tremiam.
— Sonsa! Não se finja de sonsa, ! — deu um tapa forte na mesa da garota, que fez todas as pessoas em volta pularem de susto.
apenas fechou os olhos e levantou, ficando cara a cara com o garoto, que recuou alguns passos. Ele podia estar nervoso, mas não era capaz de fazer nada para machucá-la.
Ao mesmo tempo, colocou a mão no ombro do amigo, a fim de puxá-lo, mas se desvencilhou com tamanha força que fez cambalear para trás.
, por favor. Eu não sei do que você está falando. — Ela repetiu. — Por favor…
— Cala a boca! Cala a sua boca! — gritou e nesse momento, grossas lágrimas começaram a cair pelo rosto do garoto, mas ele estava tão transtornado que nem percebeu.
estava tomado pelo ódio, assistido por todas as pessoas da sala, alguns o olhavam com medo, outros com pena e um no fundo da sala, observava tudo com os olhos divertidos e esperançosos, como se estivesse assistindo um filme de ação, mas ninguém prestava atenção nele.
— Você é um verme! Uma praga! Pode não ter sido presa pela morte de Lily, mas você é sim uma assassina!
— Já chega, ! — A professora finalmente pareceu acordar do transe e se interpôs entre e .
O garoto riu, uma risada alta e incrédula, como se não acreditasse naquela cena.
— Vocês vão resolver isso na sala do diretor, de forma civilizada. — Ela lançou um olhar severo ao garoto, mas ele estava tão descontrolado, que ela duvidava que ele tinha ouvido alguma palavra.
apenas balançou a cabeça negativamente e saiu porta afora, sem deixar que ninguém o alcançasse, deixando a sala em completo silêncio, que logo foi preenchido pelos soluços de , que parecia ter levado um choque. A garota tremia e chorava, sendo abraçada pela Senhora .
caminhou em direção ao seu esconderijo, precisava ficar sozinho e descarregar todo o ódio que aquela maldita mensagem tinha despertado nele. Fitou novamente o celular, em vão, pois tinha sido mandada de um número desconhecido e continha apenas uma frase:

» Número Restrito: Não foi quem matou Lily-Anne.



Capítulo 3

— Onde está Lily-Anne? — perguntou ao .
O amigo estava jogado no sofá com os pés para cima, assistindo a um jogo de futebol.
— Estou ligando e ela não atende de jeito nenhum.
— Deve estar com alguma amiga. — O garoto respondeu, sem tirar os olhos da televisão. — Você não precisa ficar rastreando a garota o tempo todo como se fosse o pai dela... — bufou.
era extremamente protetor com a irmã mais nova e muitas vezes exagerava nas suas reações. Ele parecia estar sempre em negação ao pensar que ela não era mais uma criancinha.
— Tecnicamente, é quase isso, já que nossos pais estão mortos e o Tio John está do outro lado do mundo. — rolou os olhos e ligou de novo no celular da irmã mais nova. — Lily-Anne , onde é que você está, caralho? Me liga de volta e é melhor você ter uma boa desculpa para não ter chegado em casa ainda! — Deixou o recado com a voz firme e ao mesmo tempo preocupada, pois sua irmã nunca se atrasava, nunca saía sem avisar e nunca deixava de atender o celular.
sentia que tinha algo errado.

balançou a cabeça, afastando as lembranças daquele dia e soprou a fumaça do cigarro para cima. Ele estava com vontade de bater em alguém ou alguma coisa, seu coração batia tão forte que ele sentia como se fosse explodir a qualquer momento
, o que diabos aconteceu? — Ouviu a voz de e levantou os olhos para encará-lo. O amigo estava com os cabelos bagunçados e os olhos arregalados. — Cacete, você estava descontrolado! — Soltou uma risada nervosa, ainda estava chocado com o que tinha acontecido na sala de aula.
— Isso. — suspirou e entregou o celular ao amigo, para que o mesmo lesse a mensagem.
encarou o aparelho por um bom tempo antes de falar alguma coisa, parecia estar escolhendo bem as palavras para que o amigo não tivesse um acesso de raiva novamente. Mas, para ele, não fazia sentido que tivesse mandado aquela mensagem. Tinha que ser alguém de fora.
— Eu sei que você gosta da… ... — cuspiu o sobrenome da garota como se fosse um terrível palavrão. — Mas ela fez isso para tentar limpar a barra dela. — Tragou forte dessa vez e soprou a fumaça para cima, antes de encarar o melhor amigo com os olhos cheios de raiva.
Ele simplesmente não entendia como não podia achar a responsável pelo acidente e sempre tentar encontrar razões para a morte de Lily sem que a garota levasse a culpa, mas nunca conseguia convencer a .
— Quem mais poderia ter mandado isso? É uma puta brincadeira de mal gosto, cara! — Tentou controlar sua voz para não começar a chorar novamente. Já estava ficando de saco cheio das lágrimas que saíam dos seus olhos antes que ele pudesse contê-las.
— Eu não sei... — foi sincero, ele estava tentando pensar em alguém que tivesse motivo para mandar aquilo para , mas não encontrava nenhum, então desistiu e se sentou ao lado do amigo, mesmo que a fumaça do cigarro o incomodasse e mesmo que ele soubesse que odiava demonstrar afeto, abraçou-o de lado, o que fez o choro do amigo aumentar a intensidade.
O corpo de se balançava com os soluços, enquanto passava a mão pelas costas dele, murmurando palavras de apoio ao mesmo tempo que tentava conter suas próprias lágrimas, sentindo a culpa cair sobre seus ombros ao ver o amigo daquela forma.
— Me desculpe. — Sussurrou, pensando que não ouviria, mas o garoto levantou a cabeça e olhou, enxugando as lágrimas com as costas da mão
— Pelo o quê?
— Por ter ido embora. — Respondeu, sem conseguir olhar para nos olhos e ao invés de palavras, recebeu outro abraço, esse mais apertado e sincero que o outro, fazendo com que ele se desmanchasse em lágrimas também.
— Mas que ceninha deprimente... — o garoto que os observava de longe murmurou, rolando os olhos e tirando uma foto, seria bom deixá-la guardada na galeria para usar quando lhe fosse oportuno.
Antes que o abraço dos dois amigos cessasse, o espião saiu do esconderijo antes que fosse visto e voltou caminhando tranquilamente para a ala das salas de aula.

chegou em casa já ouvindo a risada nasalada da sua mãe vinda da cozinha, o que denunciava que tinha visita, já que Emma nunca passava tempo naquele cômodo da casa, a não ser quando tinha gente em casa, onde ela servia um chá ou café com biscoitos. Do contrário, quem cuidava das refeições era a Joanne, empregada da família desde quando a garota tinha nascido.
, que bom que chegou, filha! — Emma a recepcionou assim que a garota entrou em seu campo de visão, ela estava sentada de frente para a ilha que ficava no meio da cozinha, na companhia da mulher que a garota reconheceu de imediato: Melanie , mãe do . — Estávamos falando de você!
— Oi… — as cumprimentou de forma desanimada, ainda estava com a cabeça cheia pelo acontecido na escola e só queria ir para seu quarto, mas sabia que seria repreendida pela sua mãe caso não tivesse modos e cumprimentasse a visita. Estava no código de etiqueta dos . — Falando o quê?
— Sobre a festa dos fundadores e amostras de heranças do próximo final de semana, querida, você voltou bem na hora! — Melanie respondeu animada e correspondeu com falsa animação.
A verdade era que ela estava bem cansada daquilo, por toda sua vida aqueles eventos aconteciam na cidade e ela e os amigos eram obrigados a participar, já que eram descendentes dos fundadores. Quando eram crianças, era só mais uma festa para brincarem de esconder ou jogarem videogame, mas com a idade, as obrigações e esses eventos acabaram ficando chatos.
— Sem contar que esse ano é a vez da participar do Miss Cambridge! — Emma disse com o mesmo tom de animação, o que fez rolar os olhos, a mãe falava da importância de ganhar esse concurso desde quando a garota tinha nascido, as meninas da família tinham esse legado desde a fundação da cidade, em mil seiscentos e trinta.
— Mal posso esperar! — sorriu de lado e pediu licença, subindo as escadas correndo para seu quarto, fechando e trancando a porta atrás de si. Nessa altura, as lágrimas já desciam pelo seu rosto.
“Você é um verme! Uma praga! Pode não ter sido presa pela morte de Lily, mas você é sim uma assassina!”, as palavras de pareciam fazer eco na sua cabeça, enquanto ela chorava e em uma reação ao nervosismo, passou a puxar seus próprios cabelos e arrancá-los.
Suas mãos estavam tremendo e a garota via apenas borrões na sua frente, as lágrimas atrapalhando sua visão enquanto ela se debatia, a dor dos puxões nos cabelos não era nada perto da dor que ela sentia no coração, o ritmo acelerado que ele batia se assimilava a facadas, a dor era demais para que ela suportasse.
“Você é sim uma assassina!”
Era isso que ela tinha se tornado para ele: uma assassina.

— Por que você está aqui? — A voz do médico era calma e baixa, ele a olhava com atenção por cima das hastes dos óculos de grau, mas seu rosto estava inexpressivo, ao contrário dela, que estava um trapo: olheiras fundas e arroxeadas, olhos inchados e a boca seca.
Suas pernas balançavam em um ritmo acelerado, uma reação a ansiedade e a vontade de sair daquele consultório o mais rápido possível.
— Porque eu matei a irmã do meu namorado.
— Você não fez isso. — Ele disse, ainda com a voz baixa, ainda inexpressivo.
— Mas foi minha culpa. — Respondeu, encarando-o, desafiando o doutor a contrariá-la. — Foi eu quem levou Lily-Anne até a casa do Lockwood, não foi? — Perguntou, torcendo a boca. — Não foi, doutor?
— Sim, .
— E se ela estivesse ficado em casa, ela estaria morta agora?
— Você não pode afirmar isso. — Ponderou. — O que aconteceu realmente naquele dia?
— Eu não sei. Não me lembro. — se endireitou na cabeça e cruzou os braços, desviando seu olhar para o aquário sujo do consultório.
— Você precisa se esforçar para se lembrar, antes que seja tarde.

— Seu relógio está quebrado? — ironizou, quando ouviu a porta da frente da sua casa se fechar em um baque e depois de alguns segundos, a figura de sua melhor amiga aparecer na cozinha, que era separada da sala apenas por uma ilha.
— Eu tenho mais coisas a fazer do que ficar vindo na sua casa assistir você coçar o saco, . — respondeu no mesmo tom e deu um beijo no rosto do amigo, que fazia panquecas no fogão cooktop.
Ela tinha percebido que os olhos dele estavam vermelhos e a fala arrastada demais, denunciando o baseado que ele tinha fumado um pouco antes dela chegar, mas decidiu não entrar nesse assunto.
— Você não sabe comer outra coisa? — Rolou os olhos e observou por cima do ombro do amigo, o cheiro pelo menos estava bom e ela estava faminta. — Quer me contar o que aconteceu hoje? — Arriscou perguntar e percebeu que endireitou o corpo e pareceu mais interessado do que nunca em virar suas panquecas. — Não precisa falar se não quiser... — essa uma das melhores coisas na sua amizade com : os dois respeitavam o tempo do outro. Por isso eram tão bons confidentes, só falava quando se sentia pronto e o mesmo acontecia com ela, a amizade dos dois tinha começado dessa forma.

— O que foi, ? — A garotinha de vestido vermelho e sapatilhas pretas sentou-se ao lado de , que estava sentado em um balanço embaixo da enorme árvore do quintal dos Lockwood, onde estava acontecendo mais um dos eventos dos fundadores da cidade. — Por que parou de brincar? — Ela tinha percebido que ele tinha se afastado de todas as crianças e curiosa como era, resolveu ir atrás dele para saber o que estava acontecendo. Não eram melhores amigos, mas todos iam ao jardim de infância juntos desde muito pequenos.
— Sai daqui, ! — Ele disse, seu rosto estava todo vermelho, entregando que ele já havia chorado. — Não quero falar com ninguém! — Sua boca se transformou em um muxoxo, enquanto ele cruzava os braços.
— Não precisa falar nada... — ela ergueu uma das sobrancelhas, coisa que todos achavam incrível, pois só ela conseguia fazer. — Mas eu não vou sair daqui!

sorriu ao relembrar aquele momento. Daria tudo para que eles tivessem oito anos de idade de novo e não as preocupações e cicatrizes que eles tinham agora. Pareciam ser mais fortes quando eram crianças e agora estavam à beira do fundo do poço, prestes a afundar e sem ninguém para salvá-los.
A garota sempre pensava nisso. Naquele momento de sua vida, a pessoa que ela mais podia contar era , eram os dois contra o mundo. O garoto parecia ser tudo o que ela tinha, já que seu pai a abandonou quando ela tinha apenas doze anos de idade e sua mãe passava mais tempo viajando do que em casa. Ela não a condenava por isso, sabia que a vida de Elizabeth jamais tinha sido a mesma, afinal, ser abandonada pelo marido com uma criança não devia ser mais fácil do que perder um pai, ela entendia que o trabalho de sua mãe era seu refúgio, a única coisa a mantinha sã, ainda que o preço que ela pagasse fosse alto demais.
— Ei, o que foi? — desligou o fogão e percebeu que a amiga estava parada, olhando para o nada com uma expressão triste no rosto.
— Nada... — ela balançou a cabeça, parecendo voltar para a realidade. — Só estou feliz por ter você! — Sorriu e deu um soquinho no ombro de , roubando as panquecas dele e saindo em disparada para a sala antes que ele a alcançasse. — Onde o se meteu? Achei que ele já estava fazendo o “QG de morada. — Comentou, enquanto se deliciava.
As panquecas da família de faziam um imenso sucesso na cidade, eram a marca registrada deles e, consequentemente, a única coisa que o garoto tinha se empenhado em aprender.
— Eu não sei... — respondeu, franzindo a testa. — Ele anda estranho desde que voltou. — Comentou, fazendo carinho na cabeça da amiga.
— É que agora ele arruma o cabelo... — os dois riram ao mesmo tempo que abriu a porta e passou por ela, com uma expressão estranha no rosto, mas que se iluminou quando viu . Os dois ainda não tinham tido a chance de matar a saudade desde que ele estava de volta na cidade
— Senti sua falta, boneca! — Sorriu e a pegou no colo, rodando-a no ar, enquanto apenas sorria, ele ainda estava sob o efeito da maconha, então estava leve e anestesiado, o que o permitia aproveitar momentos como aquele.
Estava feliz de ter seu melhor amigo de volta e poderia passar o resto da vida dele ali, na sua sala, comendo panquecas com as duas pessoas mais importantes do mundo pra ele. Queria que aquele momento fosse infinito.

— Lily... — sussurrou para a mais nova, que estava ajoelhada ao seu lado com os olhos arregalados e o rosto vermelho, seu coração batia tão forte que parecia querer sair do peito, mas ela olhou com atenção para a mais velha, que fez sinal de silêncio com o dedo indicador sobre a boca para ela e mostrou o celular, que continha uma mensagem de texto. — Está vendo? Ele está vindo nos buscar, não se preocupe! — Disse, tentando tranquilizá-la ao mesmo tempo que não queria demonstrar que ela estava mortificada de medo.
O esconderijo das duas dentro do closet não duraria muito tempo. Ela podia ouvir os passos e as vozes no andar debaixo, mas ela jamais imaginaria que o destino das duas seria aquele.
puxou o braço de Lily, para que o corpo da garota ficasse mais junto ao seu, em um abraço, mas quando seus braços a envolveram, a porta do closet abriu com tudo e antes que elas piscassem, tudo ficou escuro.

Os olhos de estavam inchados demais e seu quarto de cabeça pra baixo, todos os livros de sua estante estavam no chão, seus porta-joias e porta-retratos quebrados, resultado da reação dela, enquanto as palavras de não paravam de ecoar pela sua mente.
Quando se cansou, sentou-se no pé da cama, abraçando os joelhos e só parou de chorar quando parecia não ter mais água em seu corpo. Mas ela estava cansada. Estava cansada de se sentir culpada. Tinha passado dois anos inteiros tentando se recuperar da culpa, para finalmente voltar para casa e tentar resolver as coisas, mas ela parecia estar cada vez mais perto do fundo do poço novamente.
— Eu não voltei até aqui pra isso... — sussurrou para si mesma. — Não se esqueça dos seus objetivos, ! — Continuou dizendo e se levantou, para olhar a sua própria imagem no espelho antes de dizer: — Não seja fraca. — Dito isso, começou a juntar suas coisas, olhou em volta para a bagunça do quarto e decidiu arrumar tudo depois, precisava começar a se mover se quisesse que as coisas voltassem ao normal.
Saiu do quarto e não ouviu mais a voz da mãe, o que denunciava que Emma tinha saído, o que explicaria ela não ter vindo no quarto checar, enquanto ela destruía a mobília.
Pegou suas chaves e rapidamente saiu pela porta, usando o seu carro na garagem ao invés de ir a pé.

— O que você quer, ? — Meredith abriu a porta da frente de sua casa e recebeu com frieza, sabia o que ela queria e não se importava nem um pouco em tratá-la com educação.
— Você é tão rude, Mer-Mer! — debochou da garota, enquanto dava um sorriso falso e entrava na casa sem ser convidada, deixando Meredith parada na porta por um minuto antes de fechá-la e encarar a morena, que já estava confortavelmente sentada no sofá com as pernas cruzadas e uma expressão divertida no rosto. — Eu só preciso da sua ajuda com algumas coisas...
— Só vou te ajudar com uma condição, : — uma ideia pareceu acender na cabeça de Meredith, que sorriu e se sentou ao lado de no sofá, que esperou que ela continuasse. — Se você resolver voltar para o time, eu não quero deixar de ser a capitã. Eu mereci estar onde estou agora. — Nesse momento, ela pareceu abandonar a sua pose arrogante habitual e parecia realmente estar falando sério.
Torcer era uma coisa que Brown realmente amava, do jeito que amou um dia, mas que agora não era nem de longe sua prioridade.
— Eu não vou roubar seu lugar de capitã, não é isso que me interessa... — a tranquilizou, baixando a guarda e abandonando o cinismo, sabia que a garota era a única que poderia ajudá-la naquele momento. — Eu preciso que você me atualize sobre tudo o que aconteceu nos tempos em que eu estive fora. — Continuou cruzando suas mãos e as encarando.
— Não sou fofoqueira, ! — Meredith respondeu com a voz afetada, o que fez levantar os olhos para olhá-la com descaso
— Me poupe, Brown. Você é a pessoa que sabe da vida de todas as pessoas dessa cidade, não se faça de cínica pra cima de mim! — abandonou a paciência e se levantou. — Se não quer me ajudar, é só dizer! Mas não se esqueça que eu sei do seu segredo. — Ergueu as sobrancelhas e sorriu vitoriosa ao ver que a pose de Meredith tinha vacilado.
Ameaçou se dirigir para a porta de entrada, mas a garota segurou seu braço.
— O que você quer saber? — Perguntou temerosa, o que arrancou um sorriso malicioso dos lábios de , que voltou a se sentar no sofá.
Tudo.

estava absorto com os papéis na sua frente, tentando encontrar o que precisava, mas não era exatamente a tarefa mais fácil do mundo. Todas aquelas informações médicas misturadas… ele tentava encontrar algo que o servisse de pista, mas não era um garoto muito esperto.
— Eu sou um detetive de merda! — Balbuciou e logo após reprimiu a si mesmo. e estavam dormindo no andar de baixo e ele não queria que os dois acordassem.
Estava feliz por estar de volta e reencontrar os amigos, mas sentia os dois distantes, frios e irreconhecíveis. se culpava imensamente por tê-los deixado e fugido para a Grécia como um covarde, mas aquela coisa toda era demais para que ele suportasse. Tinha decidido voltar para passar uma borracha no passado e compensar todo sofrimento que os amigos tinham passado na ausência dele, mas não estava sendo fácil. A única maneira de fazer tudo voltar ao normal era descobrindo o que realmente tinha acontecido naquela noite, mas era impossível fazer isso sozinho. Ele precisava de ajuda de uma pessoa em específico, mas não sabia como chegar até ela sem que os amigos descobrissem.
— Merda, Annie! — cobriu o rosto com as mãos. — Como eu queria que você estivesse aqui... — sussurrou e as lágrimas brotaram dos seus olhos antes que ele pudesse contê-las, tirou as mãos do rosto e olhou em volta apenas para se certificar que ainda estava sozinho no quarto e desabou, na esperança que o choro levasse embora a culpa do segredo que ele carregava.

— O que é isso?
ouviu a voz estridente da mais nova, mas não se virou.
— Não está me ouvindo?
A garotinha entrou no seu campo de visão e ele rolou os olhos.
— Você está tirando minha concentração, Annie!
— Little Joanna’s got big blue eyes, coconut cream and coffee coloured things... — Lily fez uma careta e riu, tentando tirar o papel das mãos dela. — I could die lying in her arms…
— E aí? Estou escrevendo para… — ele começou a dizer, mas lembrou com quem estava falando e se calou, baixando os olhos envergonhados. Mas como esperado, era impossível que alguma coisa passasse despercebido por Lily-Anne.
— Isso é autossabotagem! Você não deveria fazer isso. — Ela ergueu uma das sobrancelhas, era irritante o modo como ela fazia aquilo.
— Você nem sabe o que isso significa! — riu e deu um peteleco fraco na testa da garota, que devolveu com outro.
— Claro que eu sei! É estupidamente estúpido você estar apaixonado pela namorada do seu melhor amigo.

— Merda, Annie! — afastou todos os papéis que estavam na sua frente e chutou a primeira coisa que apareceu no seu caminho também. Seu rosto estava vermelho e as lágrimas continuavam a cair pelo seu rosto, como se ele pudesse chorar por dias. — Por que você fez isso? — Perguntou olhando para cima, como se esperasse que a garota respondesse, mas tudo que recebeu de volta foi o silêncio e o barulho da chuva que começava a cair do lado de fora.



Capítulo 4

— Você consegue, vamos lá! — dizia para si mesma, enquanto encarava o espelho sujo do banheiro feminino da escola.
Ela estava bem. O cabelo perfeitamente alinhado em um rabo de cavalo alto, as maçãs do rosto e o nariz rosados pelo blush que ela tinha passado, e o gloss impecável em seus lábios desenhados. Mas sua testa franzida e a boca torcida de lado, denunciavam seu nervosismo.
O uniforme das líderes de torcida da Cambridge não havia mudado nada: as cores do colégio estampavam a saia curta e a camiseta que levava o nome da cidade. Em razão do frio, ela também vestia o casaco usado pelos jogadores de futebol.
Era o primeiro jogo dela desde a sua volta, havia uma semana. Tinha tido pouco tempo para ensaiar, mas as acrobacias pareciam-lhe algo natural, então não teve dificuldade alguma em pegar as novas coreografias.
Todas as garotas da torcida a recepcionaram bem e, embora Meredith pegasse mais no pé dela que o necessário, as duas não estavam enfrentando grandes problemas de convivência. No entanto, era a primeira vez desde a sua volta, que sentiu a necessidade intensa de usar as drogas que a deixavam mais calma: os comprimidos mágicos de Damien, que ela costumava tomar antes dos jogos.

? ? — A voz de não passava de um zumbido nos ouvidos de , que tentava se concentrar em sua imagem no espelho, que estava completamente distorcida.
A garota soltou uma risada nervosa, antes de se virar com dificuldade para o namorado.
— Não acredito nisso! — Ele sussurrou e a puxou pelo braço, para ficar junto dele, enquanto ele a levava para fora, abraçando-a e escondendo seu rosto para que as pessoas em volta não percebessem a situação em que a menina se encontrava.
encontrou uma sala vazia e entrou, fechando a porta atrás de si.
— O que você está pensando? Pensei que tinha parado com isso. — Sua expressão era um misto de raiva e preocupação. Já tinha visto a garota assim outras vezes, mas, nos últimos tempos, ela parecia ter entrado nos eixos.
Ao perceber o quão bravo estava com ela, pareceu se recuperar um pouco do torpor e encarou, seus olhos já começando a encher de lágrimas. A reprovação dele era uma das coisas que mais a derrubava.
— Eu te decepcionei de novo... — sussurrou, enquanto procurava o pescoço do garoto para abraçá-lo. — Me desculpe, … eu não consigo ser boa para você. — Falou, enquanto o puxava para mais perto e as lágrimas caiam em sua blusa, molhando-a.
— Está tudo bem... — ele disse, tentando tranquilizá-la. Já tinha feito aquilo mais vezes do que gostaria. — Mas você precisa se recompor. O jogo começa em dez minutos.

! — Ao ouvir seu sobrenome, a garota deu um pulo, recobrando a consciência, que tinha viajado para três anos atrás.
— Estou te chamando há pelo menos duas horas! — A voz irritante de Meredith entrou em seus ouvidos e recompôs sua postura, checando pela última vez no espelho se estava tudo dentro dos conformes.
— Faltam dez minutos, madame. Ou você acha que o jogo vai ficar parado, até você resolver entrar em formação?
apenas ignorou a implicância da garota e saiu pela porta do banheiro, tentando controlar a raiva, sem prestar muita atenção no caminho, o que a fez se chocar contra alguém.
— Só pode ser brincadeira! — Ouviu a voz baixa e rouca que ela conhecia muito bem, mas que agora estava em tom de raiva.
— Me desculpe... — não ousou olhar nos olhos de e manteve sua visão nos tênis vermelhos do garoto.
Ele era um desses amantes de tênis. Tinha vários e vários pares e um carinho e cuidado enorme. O par que ele estava usando naquele dia era um dos seus favoritos.
— Por que você está aqui, ? — Ele perguntou, impedindo a passagem da garota.
Os dois não estavam tão próximos, mas ela conseguia sentir o cheiro do perfume dele misturado com o fedor de cigarro.
— Eu… eu…. … — ela finalmente tomou coragem para levantar os olhos e fitar o mar azul que eram os olhos de , mas se arrependeu logo em seguida.
O olhar esperançoso e divertido que ele tinha, tinha dado lugar a olhos tristes e sombrios, combinados a uma feição de raiva e dor. Não era o mesmo garoto que ela tinha se apaixonado.
— Eu não vim causar mais dor, eu juro! — Disse, com a voz quase inaudível.
Seu coração batia acelerado tanto quanto o de , que tremia e parecia que explodir a qualquer momento.
— Você é… inacreditável! — Ele soltou uma risada de desgosto e saiu de perto da menina a passos duros, deixando-a sozinha no corredor.
respirou fundo e encostou na parede. Precisava se recompor e ir para a quadra onde aconteceria o jogo, Brown com certeza estava a ponto de arrancar sua cabeça e as coisas ficariam ruins se ela se atrasasse mais, mas seu corpo não a obedecia. A presença de a deixava tonta e o ódio explícito que ele tinha por ela só piorava as coisas. Ela só conseguia pensar o quanto queria um comprimido ou um baseado qualquer, só para que ela pudesse se livrar daquela sensação.
Só depois de repetir três vezes a técnica de respiração ensinada pelo seu terapeuta, que a garota foi capaz de se recompor e correr para a quadra de futebol, onde os times estavam se preparando para começar o jogo.
Em um timing perfeito, o juiz apitou e entrou em formação, ignorando o olhar de reprovação que recebeu de Meredith.
Era o primeiro jogo das semifinais do campeonato daquele ano. O time da Cambridge era uma tradição, como tudo naquela cidade, e raramente ficava fora das finais. Mas no último ano tinha tido duas baixas: que se mudou para Grécia e que foi banido do time por jogar bêbado e drogado, apenas meses depois da morte de Lily. Eles tinham conseguido chegar nas semifinais aos trancos e barrancos, mas a volta de , que já estava no banco de reservas, tinha reacendido a chama da escola e eles estavam animados.
O barulho era intenso, a banda da escola em conjunto com as torcedoras e a equipe jogavam o time para cima. O adversário era um velho conhecido deles: os Suffolks, eles eram um dos rivais de Cambridge por serem da cidade vizinha, então todos os encontros rendiam grandes emoções para os torcedores dos dois lados. O futebol era uma questão de honra para a cidade inteira e era levado muito a sério, por isso a torcida estava completamente insana, deixando o ambiente propício para que eles ganhassem o jogo.
O suor já brotava na testa de nas primeiras acrobacias, mas ela estava se deixando levar pela coreografia, dando tudo de si e focando apenas nos movimentos e não no misto de emoções que sua cabeça estava. Ela amava estar nas quadras, sentir o calor do jogo e da torcida, era uma das suas coisas preferidas no mundo. Aquela atmosfera a fazia se sentir viva e era disso que ela estava precisando.
Não demorou para que o time da casa estufasse as redes, o que fez com que o som de comemoração explodisse nas arquibancadas e a banda tocasse cada vez mais forte, incentivando os jogadores a marcarem mais um gol.
— Agora! — Meredith a alertou e respirou fundo.
Era hora da pirâmide e ela tinha sido escolhida para ficar no topo. Já tinha feito aquilo um milhão de vezes, mas mesmo assim ficava nervosa em todas elas. Seu índice de aproveitamento era cem por cento, o que quase nenhuma torcedora conseguia, mas é claro que ela parecia ter nascido para fazer aquilo.
— Ok. — Disse para si mesma e tomou impulso para subir, chegando ao topo com facilidade.
Deixou um sorriso aberto escapar para a torcida à sua frente, que batia palmas e gritavam para ela, mas sua feição se fechou em medo quando ela viu um rosto conhecido em meio à multidão na arquibancada. lutou para manter suas pernas no lugar e não tremer, temendo cair, mas aqueles olhos escuros a encaravam intensamente, com um sorriso torto no rosto. Ninguém em volta parecia reparar nele, mas ela sim, jamais ia esquecer.
A garota fechou os olhos para respirar fundo e quando abriu, o homem já não estava mais lá.
— O que houve, ? Está com cara que viu um fantasma. — Ellie, uma das torcedoras que fazia a base da pirâmide, disse quando desceu, mas a garota pareceu não ouvir. Estava desnorteada demais, só sabia que precisava sair dali naquele instante.
Sem se importar com que Meredith ia dizer, a garota saiu correndo, atraindo alguns olhares curiosos, mas ninguém pareceu ir atrás dela. Um nó enorme já se formava na sua garganta e ela só queria chegar logo em casa e se trancar no seu quarto. Seu corpo já estava tomado pelo medo e suas mãos tremiam. Ela estava se sentindo em um daqueles sonhos, onde você tenta correr, mas suas pernas não te acompanham. Ainda assim, ela se viu no estacionamento, que não ficava longe de onde o jogo estava acontecendo.
Quando estava prestes a entrar no carro, ouviu uma mão puxar seu ombro e antes que visse quem era, a garota gritou e tentou correr, sendo segurada pela pessoa.
— Calma! Sou eu, calma! — A voz de não foi suficiente para que a garota se acalmasse, seus olhos ainda estavam arregalados e seu coração acelerado.
Ela se desvencilhou de , como se fugisse das mãos geladas do garoto, que antes estavam em seus ombros.
— Você não chega em uma pessoa de fininho assim, . Quer me matar? Que inferno, eu preciso ir! — Ela disse, tentando abrir a porta do carro, mas sendo impedida por ele.
— Eu fiquei preocupado com você, ficou branca como um fantasma e depois saiu correndo, só quis checar se você estava bem… me desculpe! — Ele sorriu, desajeitado, passando uma das mãos pelo cabelo.
— Você estava prestando tanta atenção em mim assim? — relaxou sua postura e sorriu ao ver que corou as bochechas.
— Foi uma ótima pirâmide! — Ele sorriu também, olhando para baixo ao invés de encarar os olhos da garota. — Ia me oferecer para te levar em casa, mas…
— Eu quero! Mas você vai perder o jogo…
— Nah, eles estão bem sem mim... — sorriu de novo, trazendo a risada da garota junto.
Deus! Como ele sentia falta daquilo, apesar de todos os problemas, sempre foi uma garota muito divertida e sua risada era uma das coisas que mais o encantavam.
A garota entregou a chave do carro para ele e entrou no banco do carona. Por um momento, ela tinha se esquecido do susto que tinha levado e do porque precisava chegar em casa o mais rápido possível, estava encantada por ter sido tão solícito, já que ele era melhor amigo de e ela esperava que ele a tratasse com indiferença ou até mesmo desprezo pelo que tinha acontecido. Mas era diferente, sempre tinha sido.

— Trouxe pra você, ! — O garoto de olhos verdes e cabelo bagunçado entrou no campo de visão da menina, que tentava decorar suas falas, enquanto andava de um lado para o outro na varanda de casa.
— Que susto! — Ela deixou o script em suas mãos cair e se virou com a feição brava para o amigo, mas que logo se iluminou quando viu o que ele trazia em mãos. — Não me diga que você fez os cookies pra mim! Você é o melhor amigo de todos, ! — Ela pulou no garoto para lhe dar um abraço, quase o derrubando. — Só Deus sabe o quanto eu queria um desses... — ela arrancou a caixinha das mãos dele e se sentou na cadeira de balanço que havia em sua varanda, pronta para deliciar os biscoitos, que eram especialidades de .
— Que bom que gostou! — Ele sorriu, maravilhado com a reação dela. Tudo nela a deixava assim, bobo e sorridente e qualquer coisa que ele pudesse fazer para deixá-la feliz, ele fazia. — Na verdade, eu vim também te mostrar uma música… estou trabalhando nela há uns dias.

— Onde está sua mente, pequena ? — Despertou-se das lembranças, quando falou pela primeira vez desde que entraram no carro.
— Estava me lembrando de quando você escreveu aquela música… Little Joanna, huh? — Sorriu olhando para baixo.
No fundo, ela sabia que tinha sido para ela, mas ignorava isso o máximo possível. Nunca teve sentimentos por além de amizade, até mesmo pelo fato de ser completamente apaixonada pelo melhor amigo dele. Mas fazia o possível para que nada estragasse a amizade dela com o garoto, já que ela o considerava como um irmão mais velho. Nessa altura, ela esperava que ele já tivesse superado os sentimentos que tinha por ela, mas a julgar pela reação dele quando citou a música, talvez ele não estivesse superado tanto assim.
ficou em silêncio por alguns minutos, o que deixou a garota incomodada, mas ela também não disse nada. Ele só tomou coragem para abrir a boca quando eles já estavam parados em frente à casa de .
deu um longo suspiro antes de se virar para e dizer:
— Foi pra você.

— Você está de olho na garota? — A voz do outro lado da linha era grossa e um pouco rouca, como se a pessoa fumasse dois maços de cigarro por dia, e soava impaciente.
— Sim, estou! — A resposta veio de uma voz mais nova e feminina. — Mas a está tão sem graça sem as drogas... — riu perversamente.
— Ela deu sinais de que se lembra de alguma coisa?
— Não. Está tapada feito um nabo, estou te dizendo! — A mais nova respondeu, enquanto descascava suas unhas, despreocupada.
— Não perca ela de vista. — E com isso desligou, fazendo a garota voltar para seu lugar.
O jogo estava no finalzinho e Cambridge havia conquistado a vitória e estava perto da final, mas os burburinhos curiosos eram sobre , que havia saído correndo após a pirâmide, com saindo do banco de reservas e indo na sua direção. Todos queriam saber o que estava rolando entre os dois.

… — suspirou. Não estava no clima para ter qualquer discussão com o garoto.
— Está tudo bem! — Ele sorriu, mas seu semblante era de tristeza e até mesmo dor. Só ele sabia a intensidade dos sentimentos que ele carregava dentro de si. — Bom, está entregue… até mais, . — Entregou as chaves para a garota e desceu do carro, pegando a esquerda em direção à sua casa, que não ficava muito longe dali. Ele se virou apenas para sorrir para ela, que ainda estava estática sentada no banco do carona. — Te vejo na mostra de velharias amanhã! — Bateu continência e girou os calcanhares, caminhando tranquilamente com as mãos no bolso.
tinha se esquecido completamente que a festa dos fundadores era nesse final de semana; toda agitação dos treinos e das aulas não tinha deixado a garota pensar muito sobre o assunto, mas agora que tinha sido lembrada, seria mais uma preocupação. Primeiro, porque ela sabia que sua mãe a obrigaria a ir e segundo que todos estariam lá. Ele estaria lá.
— Oi, filha! — Sua mãe, ao contrário dela, estava até vermelha de animação quando ela passou pela porta da frente, indo em direção à cozinha para lavar as mãos e fazer um lanche com Emma em seu alcance. — Onde está Joanne? — Perguntou, enquanto procurava algo interessante na geladeira.
— Saiu para fazer o mercado. — A mãe abanou as mãos, como se aquilo não tivesse importância naquele momento. — Comprei um vestido novo para você usar amanhã! — Bateu palmas, animada, enquanto enfiava metade de um sanduíche na boca, para que não precisasse falar nada. — Onde estão seus modos, mocinha? — Emma fez uma cara de reprovação, enquanto a filha revirava os olhos. — Só estou dizendo que vai ser ótimo! É seu primeiro evento desde... — ela se deteve no meio da frase, engolindo em seco
— Desde que eu fui embora, porque todos acham que eu matei a irmã do meu ex-namorado? — completou com um sorriso sarcástico, o que fez Emma torcer a boca desconfortável.
— Não diga isso, ! Pelo amor de Deus, minha filha…
A garota se arrependeu das palavras no minuto que ouviu sua mãe suplicar já com a voz embargada. Era muito difícil para Emma ter que lidar com aquela situação. Ela sentia que tinha errado na criação da filha, sentia-se culpada por todas as coisas ruins que tinham acontecido com , ainda que ela fosse uma menina tão nova.
— Eu sei que sou uma mãe terrível… — ela continuou, com as lágrimas já caindo livremente por suas bochechas. — Mas eu só quero que você seja vista como uma … essa festa é tão importante para nós, significava tanto para sua avó… — e então o choro se transformou em uma tempestade.
Emma soluçava, enquanto a filha tentava consolá-la com um abraço. A mãe sempre foi uma mulher sensível, mas nesses últimos tempos ela desabava por qualquer coisa, a garota não sabia mais o que fazer.
Shhh, está tudo bem… eu vou! Não se preocupe. Shhh! — Deu um beijo na testa da mãe, que fechou os olhos e a abraçou mais forte.

•••

— Caramba, , mas que inferno!
Essa foi a primeira frase que ouviu, quando abriu seus olhos naquela, surpreendentemente, manhã ensolarada de sábado.
estava ajoelhada na cama de casa dele, com o travesseiro que ela tinha acabado de bater na cara do amigo em mãos e uma feição de raiva no rosto.
— Estou tentando te acordar a horas! Achei que você estivesse morto! — A voz dela falhou na última palavra, o que fez reprimir o riso em sua garganta e puxar a melhor amiga para um abraço.
— Estou bem vivo! — Beijou sua testa e se levantou em um pulo, arrependendo-se logo em seguida por causa da tontura que lhe deu.
percebeu e fez um muxoxo com a boca, preocupada.
— Qual foi sua última refeição?
— Hmm… — ele fingiu pensar. — Café da manhã! — Sorriu, abrindo os braços e o encarou com descaso. — De ontem… Qual, é, vem aqui… me desculpe! — riu, quando a amiga fez menção de se levantar e ir embora.
Ele achava super engraçado quando ela tentava bancar a mãe e fazia o possível para tirá-la do sério. Mas sabia que ela só estava se preocupando com ele, mais do que ele merecia.
— Alguém tem que se preocupar com você, ! — Ela suspirou, como se tivesse lido sua mente.
— Vamos, vou preparar umas panquecas pra gente... — sorriu e empurrou a amiga de leve.
— Escove os dentes e tome um banho antes, porco. Eu vou preparando a massa! — Foi a vez dela de empurrar o garoto, que se dirigiu ao banheiro do quarto sem reclamar.
Ela balançou a cabeça negativamente e desceu as escadas, tentando esquecer o desconforto que sentiu ao ver deitado daquela forma imóvel na cama. Às vezes ela parecia chata e implicante, pegando no pé dele pelas menores coisas, mas já tinha passado por isso, não com ele e sim com . Houve uma época em que as duas eram inseparáveis e a garota sempre ficava responsável por consertar as merdas de : por onde o furacão passasse, estava lá para reparar os danos. Isso tinha feito a garota pensar que ela sempre estava ali para cuidar dos outros, não de si mesma, mas ela não se importava, amava muito os seus amigos e alguém tinha que olhar por eles, principalmente , que não tinha mais ninguém.
Ela sentia falta de na maior parte do tempo, apesar de tudo, era a pessoa que ela podia confidenciar segredos, contar sobre as experiências com garotos e fazer coisas que e jamais fariam com ela, apesar que depois da morte de Lily, a garota conseguiu fazer com que os dois achassem aceitável fazer uma festa do pijama sábado à noite, ao invés de sair para encher a cara. Mas na maior parte do tempo, a saída de da vida de tinha deixado um buraco na mesma, que parecia que nunca mais seria preenchido.

— Amostra de antiguidades dos fundadores, huh? — A garota balançou o convite, quando apareceu em seu campo de visão. Estava em cima da bancada e ela tinha tomado liberdade de ler.
— Ainda bem que você me lembrou, cricket! — Ele coçou os cabelos molhados pelo banho. — Eu tenho que levar o magnífico relógio da família ... — zombou, enquanto rolava os olhos misturando a massa de panqueca. — Chega pra lá, você vai estragar a receita. — Sorriu para a amiga e depois a empurrou com o quadril, recebendo um peteleco em seguida. — Você vem na festa comigo? — Perguntou, seu semblante dessa vez se mostrava preocupado.
Sabia que era a mãe de que ajudava a organizar essas festas, então com certeza ela estaria lá. A presença da melhor amiga a deixaria mais calmo, já que dessa vez nunca parecia estar perto o suficiente. Os dois quase não se viam e o mais velho estava agindo de forma estranha, mas não ainda não tinha tido a oportunidade de chamá-lo pra conversar.
— Não perderia por nada, boy! — Ela murmurou, talvez com os pensamentos conectados com os dele novamente.

O sol já estava se pondo, quando as primeiras pessoas começaram a chegar à Biblioteca Pública, que ficava no centro da cidade de frente para uma grande praça. Era lá que o evento estava acontecendo.
Melanie , a mãe de , tinha ficado encarregada da organização, já que ela era a administradora. Porém, obviamente tinha contado com a ajuda de Emma, que nunca ficava de fora de nenhum evento da cidade.
já estava lá, sentada em uma mesa, enquanto conversava com o pai, que tinha acabado de voltar de uma viagem de negócios. Ela estava feliz por ele estar de volta, já que não tinham tido de tempo de realmente passar tempo juntos. Joe era com certeza a pessoa favorita dela no mundo inteiro, mas não se fazia muito presente nos últimos anos.
— Sua mãe sempre exagera nas decorações, né? — Ele riu e cutucou o braço da filha, apontando para o enorme painel de flores que decorava a entrada da Biblioteca, colocado ali para que as pessoas pudessem tirar fotos logo que chegassem.
O interior estava bem elegante, cheio de amostras e artefatos que glorificavam a cidade e, é claro, as famílias fundadoras.
riu por educação, mas não via a hora de ir embora, estava se sentindo muito incomodada e com uma sensação estranha. Seu estômago já doía, uma reação à sua ansiedade e suas pernas não paravam quietas.
— Já volto, papai! — Dito isso, levantou-se para dar uma volta. Não estava aguentando mais ficar ali e sabia que seria uma longa noite.
Emma já tinha dado um ataque de pânico no dia anterior e ela não queria que se repetisse se ela resolvesse simplesmente ir embora, então a garota continuou, sorrindo para uma pessoa ou outra da escola que passava por ela.
Antes de perceber que estava sendo seguida, seguiu para os fundos da biblioteca, onde costumava ter um playground quando ela era criança, mas hoje em dia tinha sido transformado em um espaço para as pessoas lerem ao ar livre. Antes que ela se sentasse em uma das cadeiras aconchegantes de leitura, sentiu seu braço ser puxado fortemente e sua boca foi tampada para que ela não gritasse. Nesse momento, seus olhos já estavam arregalados de medo, mas ela não conseguia reagir, só deixou a pessoa levá-la para o canto, onde não podiam ser vistos.
— Eu não vou te machucar, calma, por favor não grite. — A voz era masculina e jovem, ele a virou para que a garota visse seu rosto.
Ela não o reconhecia, mas ele era jovem e bonito, seus olhos verdes chamavam atenção na sua pele negra não-retinta, mas estes estavam alarmados e sua voz tinha tom de urgência.
— Eu preciso falar com você e tem que ser rápido. Vou tirar as mãos da sua boca e não vou te segurar, mas você precisa me ouvir… por favor, … não temos muito tempo, você não tem muito tempo. — Dito isso, o garoto soltou a mais nova, que ainda estava com os olhos arregalados e sua voz parecia ter sumido. Mas no mesmo instante que suas mãos deixaram de segurá-la, aproveitou a fração de distração do garoto e saiu correndo.
Ela sabia que ele não a seguiria, pois, as pessoas veriam, mas não se importava. Cada batida forte do seu coração a alertava que ele era perigoso e que ela precisava fugir dele.
suava frio, quando finalmente conseguiu encontrar o banheiro e entrar na primeira cabine. O choro dessa vez não foi reprimido, as lágrimas e os soluços vinham como uma enxurrada, enquanto ela tentava se controlar para não fazer muito barulho, mas o medo e o susto eram grandes demais, ela não sabia o que fazer, não sabia com quem falar.
— Oh céus, como eu preciso de um comprimido... — bradou baixinho em meios aos soluços e se assustou ao ouvir o barulho da porta do banheiro sendo aberta.
— Olá? — Ouviu uma voz feminina conhecida e suspirou de alívio, ao mesmo tempo que tentava secar suas lágrimas com o papel higiênico, mas estava fazendo uma enorme bagunça.
respirou fundo e abriu a porta, dando de cara com sua ex melhor amiga, , que primeiro a olhou abriu a boca ao ver seu estado, mas fechou rapidamente e sua feição se tornou confusa.
— Desculpe, está livre. — murmurou. Não estava com cabeça para se chatear com o fato que uma das pessoas mais importantes do mundo para ela não a suportava. Só queria ir para casa e se proteger debaixo de seus travesseiros.
Sentiu o olhar de sobre suas costas, quando ela foi lavar as mãos na pia, e então, em uma atitude totalmente inesperada, a garota disse:
— Toma, sempre levo um desses na bolsa. — E a entregou uma caixinha de lenços de papel, sem olhar nos seus olhos.
— Obrigada… — conseguiu dizer e dar um meio sorriso para antes de sair pela porta, mas aquele sábado não estava sendo muito gentil com ela e sua sorte parecia ter a abandonado, porque logo quando ela se virou deu de cara com o seu pior pesadelo: Damien Lockwood.
— Oh, ! — Ele sorriu de lado e um arrepio correu pela espinha da garota. — Eu estava te procurando, que maravilha te encontrar por aqui... — cercou-a quando ela tentou passar por ele. — Senti sua falta… — passou a mão pelo rosto dela, antes que a garota pudesse deter.
— Me deixe em paz, Damien! — Ela conseguiu murmurar em meio a voz trêmula e o medo que ele a causava.
— Senão você vai fazer o quê? — Sua feição se fechou e sua cicatriz ficou ainda mais assustadora, a garota deu um passo para trás, encurralada. Mas quando Damien ameaçou avançar sobre ela, ouviu uma voz que a salvou pela segunda vez na semana.
— Ela eu não sei, mas se você não a deixar em paz, eu vou ter motivos o suficiente para quebrar sua cara, Lockwood. — disse com uma expressão raivosa no rosto, sua mandíbula estava travada e os punhos cerrados.
Damien desviou a atenção do rosto de e encarou , mas ao contrário do que se imaginava, não iniciou nenhuma briga. O garoto simplesmente soltou uma risada e um olhar de deboche, antes de se dirigir ao outro.
— Ai, … você é sempre tão brincalhão... — estalou um beijo no rosto de e saiu andando tranquilamente com as mãos nos bolsos.
— Você está bem, ? — andou preocupado até a garota, que se esquivou um pouco, mas depois se deixou levar pelo abraço do mais velho, que mantinha os braços firmes em volta dos seus ombros.
depositou um beijo delicado no topo da cabeça dela, que já sentia as lágrimas descerem pelo seu rosto novamente.
já estava começando a ficar irritada com aquilo tudo, ela parecia estar sempre abalada e chorando, não entendia o porquê da perseguição de Damien ou por que tinham pessoas querendo fazer mal a ela. Não sabia o que tinha de errado.
— Quer dar uma volta, huh?
A garota parecia estar em transe, muito abalada para responder qualquer coisa, então a pegou pela mão e a puxou para o lado de fora para que ela respirasse ar fresco.

— Por que demorou tanto? — perguntou à , quando ela se juntou a ele na mesa reservada para os : um tanto quanto irônico.
— Eu estava no banheiro e… — a garota hesitou em contar a verdade sobre o que tinha visto e ouvido, porque sabia que o amigo não ia reagir da melhor maneira. Além disso, estava melhor, mesmo depois do último acontecimento envolvendo a mensagem de texto e a volta de , ele parecia estar tentando ficar bem e ela não queria estragar isso. — A fila estava grande. — Sorriu fechado e deu de ombros.
Ele podia ser um tanto quanto tapado às vezes, porque o rosto de era muito fácil de ler e a única coisa que passava pela sua mente era por que raios estava chorando tanto no banheiro e por que Damien estava a perseguindo. E o mais importante: por que sentiu necessidade de defendê-la daquela forma, principalmente depois de tudo que ela tinha causou…
Ela precisaria ter uma conversa séria com ele em outro momento.
— Hey, cricket… Nossa música! — sorriu abertamente e puxou para que a garota se levantasse, quando os acordes de Put Your Records On começaram.
, pelo amor de Deus, não tem ninguém dançando! — Ela disse envergonhada, mas se rendeu aos passos do garoto, que por sinal era um ótimo dançarino.
deu um rodopio e fez a garota soltar uma gargalhada. Sorrindo ele pegou a mão da amiga e a rodou, sorria abertamente, já se esquecendo da cena que a preocupou em outro momento.
Girl, put your records on, tell me your favorite song, you go ahead, let your hair down... — o garoto cantarolou, enquanto balançava a cabeça no ritmo da música.
Eles tinham uma história e tanto com ela, e sempre que tocava, fazia questão de dançá-la, e Deus, como ele queria que aquele momento fosse infinito, sem se importar com as pessoas rindo deles ou apontando com pensamentos maldoso. Depois de semanas sem sentir bem, era justamente aquilo que ele precisava. Um momento feliz com sua melhor amiga.
— Eu amo você! — Sussurrou.
— Também amo você, Cricket.

— Está mais calma? — colocou as mãos em volta de novamente, quando eles se sentaram na cadeira de balanço nos fundos da Biblioteca.
Ela ainda não conseguia falar, mas suas lágrimas já estavam secas e aos poucos ela parava de tremer. A menina se limitou a balançar a cabeça positivamente e tentou sorrir para ele. Estava feliz e aliviada de tê-lo ali. Não sabia o que Damien estava planejando fazer com ela, mas aquela perseguição já estava dando nos nervos da garota. Ela sabia que teria que fazer algo a respeito e rápido. Além disso, ainda estava assustada por causa do garoto que a abordou mais cedo. O que ele queria com ela? Por que ela estaria correndo perigo?
… eu… — começou a dizer, mas travou quando a mais nova o encarou intensamente. Seus rostos estavam pertos demais e os olhos de simplesmente o deixavam encantado.
Ela ainda o olhava com atenção, quando ouviram um barulho vindo do interior do prédio. Era um barulho que a garota conhecia bem. Um tiro tinha sido disparado.
Os acontecimentos após o tiro se tornaram um borrão na cabeça de a medida que ela e corriam para o lado de dentro para ver o que tinha acontecido. As pessoas gritavam alarmadas, as mães chamavam pelos seus filhos e os seguranças corriam para o andar de cima, onde supostamente o tiro tinha sido disparado.
topou com seus pais no meio do caminho, eles tentaram segurá-la, mas a garota sentiu que precisava ver. No fundo, ela já sabia quem estava estirado no chão em cima de uma poça enorme de sangue, mas mesmo assim, suas vistas escureceram e ela desmaiou nos braços de alguém quando finalmente chegou no andar superior da Biblioteca, onde as amostras estavam sendo feitas.
Em uma sala vazia, próxima aos banheiros, os olhos verdes do homem estirado no chão ainda estavam abertos em seu rosto sem vida. Era ele. O mesmo que havia a abordado mais cedo. Estava morto com um tiro certeiro no coração.



Capítulo 5

— Filha, por favor, acorde! ! — A voz de Emma soava longe, enquanto a garota tentava acordar.
Seus olhos foram se abrindo aos poucos em meio a várias piscadas, mas quando se deu conta do que estava acontecendo, fechou os olhos novamente. Seus pais, e um paramédico estavam à sua volta, com semblantes preocupados.
A mãe de estava desesperada, as mãos tremendo e as lágrimas descendo livremente pelo seu rosto. Sabia que era demais para que pudesse aguentar e tinha medo do que o acidente faria com a filha. Não podia perdê-la novamente.
sentiu uma superfície macia embaixo de si, o que presumiu ser uma maca ou um sofá. Aquilo não podia estar acontecendo. Ela não queria acordar de jeito nenhum e ter que encarar a todos novamente. Por meio segundo, desejou estar inconsciente, só para não ter que olhar para ninguém. Além de envergonhada, estava com medo. Sabia que enfrentaria uma chuva de perguntas. Não queria passar por nada daquilo de novo… parecia que as coisas estavam se repetindo, exatamente como na noite em que Lily-Anne havia morrido.
Ao abrir os olhos, constatou a sua preocupação: entre as novas pessoas que a encaravam, estava o delegado da cidade.
, eu sei que é muito pra você… Sei que você deve estar assustada. — Shawn coçou a barba de um jeito desconfortável. — Mas preciso saber… você conhecia este garoto?
— Não. — A garota sussurrou com dificuldade.
Ela não queria que ninguém soubesse que ela teve contato com o homem dos olhos verdes antes que ele fosse morto. A última coisa que ela precisava, era ser responsabilizada por mais uma morte.
— Tudo bem. — Ele suspirou e coçou a barba novamente, não parecia estar convencido. Sabia que a garota estava escondendo alguma coisa. Mas pelo o estado em que ela estava, não poderia forçá-la a ir para a delegacia dar explicações.
Trocou um rápido olhar com o pai de e saiu para conversar com um dos oficiais, ao mesmo tempo que Joe já carregava a filha para o carro.
A garota fechou os olhos, querendo sumir daquele pesadelo.

Nas escadas da entrada principal da biblioteca, e esperavam pelo amigo , que estava do lado de dentro com os pais de . Ao saírem, veio logo atrás, com as mãos nos bolsos e o semblante perceptível de preocupação com a garota, o que foi suficiente para irritar .
— Preocupado com sua amiguinha assassina? — Perguntou rudemente ao amigo, quando o mesmo se aproximou, após se despedir dos pais de e afagar as bochechas da menina, que ainda tinha os olhos fechados.
Ao ver a cena, estremeceu e apertou os olhos. Não podia acreditar naquilo.
— Ela não fez isso, . — respondeu cansado.
Não queria ter uma discussão com o melhor amigo naquele momento. Especialmente depois daquele acontecimento bizarro. Uma pessoa havia sido assassinada! Bem debaixo dos olhos deles. A mente de estava profundamente perturbada, de um jeito que ele não podia compartilhar com ninguém.
— Como você pode ter certeza? — indagou, já sabendo a resposta, mas queria ouvi-la de .
Seria o momento perfeito para confrontá-lo sobre a aproximação com e a discussão que o garoto teve com Damien mais cedo.
— Porque ela estava comigo na hora do tiro. — respondeu com sinceridade. — Olha só, podemos discutir isso mais tarde? Uma pessoa acabou de morrer. Não estou com cabeça para ouvir vocês dizerem o quanto odeiam a . — Dito isso, deu as costas aos melhores amigos, dirigindo-se à vaga onde seu carro estava estacionado
— Você é bom em fugir, cara! — disse com raiva na voz e também deu as costas, puxando consigo.

•••

acordou gritando e chorando pela segunda vez naquela noite. Tinha sonhado mais uma vez com o homem misterioso dos olhos verdes, que agora estava morto. As cenas horríveis do dia anterior ainda estavam na sua cabeça e não a deixavam dormir, por mais que ela tivesse tomado um número preocupante de calmantes e chás tranquilizantes que sua mãe a deu, deixando claro que não a faria mal. não estava em condições de questionar ou pesquisar a precedência dos medicamentos, então confiou em sua mãe. Mas nada parecia ajudá-la.
— Está tudo bem agora, shh...
só chorou mais, quando sentiu os braços de seu pai te envolvendo. Ele tinha ouvido os gritos da garota e se levantou para abraçá-la, o que era comum nas noites após a morte de Lily, em que a filha não dormia e quando o fazia, acordava aos gritos por causa dos pesadelos.
Joe estava desolado por ver a filha daquela forma novamente. Mesmo com todos os problemas que causou no passado, não acreditava de forma alguma que a filha estivesse envolvida com esses assassinatos. Sabia que ela estava abalada por algo que não queria dizer, mas nunca a forçaria. Com isso, ficava sempre de mãos atadas, sem saber o que fazer.

— Não há mais nada que eu possa fazer, Joe! — Shawn tomou um gole de seu café e encarou o senhor , que andava inquieto de um lado para o outro na sala abafada do delegado. — Não há nenhuma prova.
— Você conhece a minha filha, Shawn, desde quando ela era uma criança… sabe que jamais faria isso. — Joe disse com a voz embargada. — Precisa descobrir quem fez isso.
— Eu sei… eu conheço muito bem, já aliviei a barra dela várias vezes com as drogas, Joe! — Ele disse, de forma rude, mas não deixava de ser verdade. — Também não acredito que ela tenha feito isso e nem há provas. Lily morreu de overdose… — ele tossiu desconfortável e Joe rolou os olhos.
Absolutamente ninguém acreditava nisso. Nem mesmo o delegado. Lily-Anne era um exemplo para a família , mais ajuizada até mesmo que o irmão mais velho.
— E talvez seria melhor que você tirasse a da cidade, pelo menos até a poeira abaixar. Não vai ser fácil para ela.

— Por que essas coisas continuam acontecendo, papai? — A garota sussurrou em meio aos soluços.
Mas ele não tinha respostas. Ninguém tinha.

•••

— Olharam todas as câmeras, Emma… não há nada! Alguém apagou a filmagem. — Joe tentava falar baixo, enquanto estavam na cozinha, sem perceber que ouvia tudo atrás da porta.
— Como isso é possível? — A mãe de indagou, inconformada. — Alguém entrar com uma arma, adulterar as câmeras de segurança e ninguém perceber nada! Pelo amor de Deus, Joe! Uma pessoa foi morta bem debaixo dos nossos olhos… — a voz dela falhou na última palavra.
Emma era uma pessoa sensível. Todo aquele alvoroço lhe lembrou o inferno que passaram quando Lily-Anne morreu. Ela não conseguia lidar com aquilo, por mais que fosse claro que sua filha não teve envolvimento nenhum, a mulher ainda estava muito sensível acerca desse assunto.
Quando sua mãe começou a chorar copiosamente, com soluços que ecoavam por toda a cozinha, saiu de onde estava escondida e subiu para seu quarto, não queria ver e nem ouvir mais nada. Queria apenas se livrar do pesadelo que sua vida tinha se tornado. Não queria sentir absolutamente mais nada. Estava cansada de tentar ser normal, tentar recomeçar e as coisas ruins continuarem acontecendo. Sua vida tinha se tornado um filme de terror sem fim.
As lágrimas que já desciam dos seus olhos eram produto de uma mistura de medo, arrependimento e culpa. Nada disso estaria acontecendo, se ela não tivesse arrastado Lily com ela; nada disso estaria acontecendo, se ela não fosse tão tóxica para todos à sua volta. era um peso na vida de todos!
A garota enxugou as lágrimas com as costas da mão e vestiu seu casaco, já passava das dez da noite, mas ela não estava se importando. Aquilo acabaria naquela noite.
pegou seu celular e discou para a última pessoa que ela pensaria:
— Eu sabia que você me ligaria em algum momento, linda. — A voz do outro lado da linha era sarcástica e doentia.
— Não quero ouvir suas piadinhas, Damien. — Ela respondeu ríspida. — Preciso de algo que só você tem.

— Onde você estava quando tudo aconteceu? — Shawn encarou Damien, que estava sentado de forma desleixada na cadeira, com uma falsa feição de tédio.
Por trás de seu semblante sarcástico, estava um garoto mortificado de medo com o que havia acontecido naquela noite.
— Meu filho não vai dizer nada sem a presença de um advogado, Shawn. — O prefeito Lockwood abriu a porta da sala do delegado com violência, sem se importar em bater.
Embora ele estivesse vestido perfeitamente como manda o figurino: terno alinhado e gravata apertada, seus olhos estavam arregalados e sua testa suava. Não podia acreditar no telefonema que o tinha levado até ali.
— Não precisava ter se importado em vir pra cá. — Damien resmungou.
A relação com seu pai não era das melhores. Para ser mais exato, não havia relação nenhuma entre os dois. O garoto era visto apenas como um peso.
— Talvez você tenha razão... mas sua mãe não pararia de falar na minha cabeça. — Richard cuspiu as palavras para o filho e voltou a se dirigir ao delegado.

As mãos de Damien estavam estranhamente suadas, enquanto ele esperava que batesse à sua porta, embora ele não estivesse surpreso — sabia que era questão de tempo até que a garota o procurasse. Ela sempre foi o elo mais fraco naquela equação, o bode expiatório perfeito para qualquer situação errada que eles se envolvessem; como quando aprontavam na escola e a garota levava toda a culpa, afinal, ela jamais seria expulsa. Ou quando os dois foram detidos pela polícia por porte de bebidas alcoólicas e baseados, e o delegado fez vista grossa por ser ela: . Força irreprimível da natureza e a herdeira de um império. A garota era inabalável. Seu ponto mais fraco era ela mesma. E, é claro, .
Ele não conseguia entender a fixação que a tinha com , ela parecia estar ligada a ele de um jeito inexplicável, quase doentio. E isso o incomodava profundamente, mas o garoto não tinha coragem alguma de admitir por que o amor de por o irritava tanto, ele reprimia seus sentimentos de tal forma, que isso o causava dor física. Mas era melhor do que se sentir fraco. Melhor do que admitir um amor não recíproco.
A respiração de Damien falhou, quando o garoto ouviu a campainha de sua casa tocar, a garota estava totalmente impaciente do lado de fora, suas mãos tremiam e seus olhos estavam vermelhos. Do lado de dentro, Lockwood respirou fundo e mudou sua expressão para o sorriso torto e os olhos sarcásticos que ele tinha costume de fingir que tinha. Ele precisava que sentisse medo e ódio dele.
— Sempre um prazer vê-la, ! — Sorriu abertamente ao abrir a porta.

— Isso não parece certo. — observou, enquanto se preparava para iniciar o filme.
Os dois estavam prestes a cumprir uma tradição que seguiam desde a primeira vez que assistiram How I Met Your Mother: maratonar os filmes de Star Wars de três em três anos, sempre projetando como queriam estar nos três próximos anos. Era um programa que havia sugerido, então a garota se sentia mal de estar fazendo aquilo sem ele, mas ainda não tinham conversado desde a noite anterior e estava impassível.
— Ele não quer estar aqui, . — murmurou.
Estava cansado da amiga tentar convencê-lo a ligar para . Ele não estava errado. Não daria o braço a torcer.
Quando abriu a boca para argumentar, a campainha da casa tocou e a garota se levantou para abrir, dando de cara com vestido com roupa de camping e com uma cesta enorme de piquenique. Ele estava sério, mas seus olhos eram divertidos. Ele tinha ido ali para fazer as pazes.
e … — anunciou, entrando na casa, sem se importar com a cara amarrada de . — Coloquem seus tênis… nós vamos acampar! — Abriu os braços, mas não recebeu gritos de animação de volta, mas sim, uma tentando segurar o riso e um com o rosto começando a ficar vermelho. — Olha só, me desculpem, ok? Eu não estive exatamente aqui por vocês e sinto muito… Sinto muito por ter sido fraco, por ter deixado vocês quando mais precisaram de mim. — suspirou, as lágrimas já começaram a brotar no canto dos seus olhos.
Ele era um garoto sensível. E a ideia de ter os dois melhores amigos bravos e decepcionados com ele não era acolhedora.
— E eu sinto muito, de verdade, mas não acredito que seja culpada… — antes que terminasse, arfou e subiu as escadas, antes trombando em seu ombro, desequilibrando-o.
… — lamentou, mas o amigo não a ouviu e bateu a porta de seu quarto, fazendo a garota pular.
Nesse ponto, já estava sentado no sofá, soluçando em meio às lágrimas
— Eu não queria que as coisas fossem assim, mas acredite em mim, , eu não estou contra vocês! — Exclamou em meio a um soluço e outro. — Por favor, me ajude... — sussurrou e se deixou envolver pelo abraço de .
Tinha dor demais ali. Dor, culpa e pesar por tudo que tinham passado. se sentia verdadeiramente fraco e culpado por ter ido embora, mesmo que ele tivesse tido seus motivos, dos quais ele não podia confiar a ninguém — seu maior segredo e também seu maior fardo.
— Eu sinto muito. — Sussurrou novamente para a amiga, que agora também chorava abraçada a ele.
não respondeu. Naquele momento, ela só queria que toda a dor, todo o ressentimento que ela tinha por ter partido fosse embora. Ela precisava perdoá-lo para ajudar a perdoá-lo também.
— Você levou uma parte de mim com você, quando você foi embora. — A garota sussurrou no ouvido do amigo.
Ela estava relutante em tirar aquelas palavras do seu coração, de dizer coisas que ela nunca disse para ninguém. Mas ela precisava. Aquele era o momento.
— Você me deixou, . Não pensou no que aconteceria comigo sem você.
Ele se sentiu incapaz de responder àquelas palavras. Agora se sentia cada vez mais culpado. Nunca imaginou que pudesse estar tão quebrada como ela mostrava estar agora, vulnerável, perdida. Ela sempre foi a mais forte, a mais sensata e disposta a ajudar a todos do grupo com seus dilemas, não demonstrava fraqueza ou medo em nenhuma situação e agora estava ali diante dele, assumindo o quando estava quebrada.
— Todos esperam que eu seja forte… — ela continuou, como se o garoto tivesse lido seus pensamentos. — Mas ninguém lembra que eu perdi minha melhor amiga, eu perdi Lily, que era uma parte de mim também. E eu perdi você, meu melhor amigo. A pessoa que eu corria para contar do garoto que eu gostava ou para assistir um jogo de futebol comigo. Você me deixou. Sozinha. parou para respirar fundo e conter as lágrimas que desciam descontroladas pelo seu rosto, ela estava começando a ficar sem ar também, mas não deixaria de falar tudo estava entalado desde o dia que o garoto fora embora. — Eu tive que cuidar de sozinha. Ele passou dias trancado no quarto e quando saiu, mal falava, mal abria os olhos. Eu passei dias indo buscá-lo, após ele encher o corpo de drogas e não conseguir se lembrar nem do seu nome. Tive que levá-lo ao hospital sozinha quando ele ficou desidratado, passei noites e noites sem dormir, enquanto ele sumia e logo depois aparecia na minha porta, machucado, porque tinha se envolvido em uma briga. E você não estava aqui. Você foi embora.
ouvia tudo calado. Ele sabia que merecia. Embora as palavras da amiga o atingissem em cheio no peito, ele sabia que ela tinha sofrido mil vezes mais do que ele estava sofrendo agora.
— Você fugiu, enquanto o resto de nós teve que encarar as coisas. Eu não sei como, mas eu preciso te perdoar por isso. Porque agora está de volta e eu estou perdida. Estou à deriva. E eu preciso de você. precisa de você. — A garota pegou o rosto do amigo e fez com que ele o encarasse. — tem pessoas demais para cuidar dela. Nós precisamos de você.
— Estou aqui. Prometo. — O garoto se inclinou e beijou o topo da cabeça da amiga, tentando ignorar o aperto no peito e o nó em sua garganta. — Eu nunca mais vou te abandonar.
— Assim eu espero. — A garota respondeu com sinceridade, puxando o amigo para mais um abraço.
, no topo da escada, silencioso demais para que os amigos o ouvissem, também chorava baixinho.

— Entre. — Damien expandiu o sorriso, quando se limitou a balançar a cabeça.
Seu rosto estava sombrio, os olhos inchados, provavelmente de choro. Ela também tinha olheiras fundas e suas bochechas estavam avermelhadas. A garota estava um caco.
— Podemos fazer um tour, se você quiser… fiz algumas reformas desde a última vez. — Sua voz falhou mais do que ele gostaria na última frase, mas não pareceu perceber. Ela estava alheia demais.
— Eu não quero saber da sua nova mobília, Lockwood. — Disse, com a voz rouca.
Ela se sentia extremamente fraca e tonta; a presença de Damien ali a deixava com medo, desprotegida. Mas ela não mudaria de ideia. Estava esgotada.
— Você sabe para o que eu vim. Tenho certeza que estava ansioso por isso.
— Você não sabe de nada, . — Damien respondeu de forma ríspida e foi em direção à cozinha, que era separada da sala de estar por uma ilha, pegando dois copos e colocando em cima da mesa.
permaneceu parada na mesma posição, encarando o garoto. Ela não estava pensando muito sobre o que estava fazendo, ao contrário de antes, seu cérebro não estava lhe dando nenhum alerta, nenhuma voz em sua cabeça a dizia para correr, sair logo daquele lugar. Ela estava presa ali.
— Ainda gosta de uísque? — Riu, quando franziu a testa, como se ponderasse a pergunta.
— Não. — Suspirou, por fim.
— Realmente fizeram uma lavagem cerebral em você, huh? — O garoto riu novamente, mas agora verdadeiramente.
era uma das poucas garotas que apreciavam um bom Bourbon. Essa era uma das coisas que o encantava nela.
— Eu não vim aqui para bater papo com você, Lockwood. — A garota perdeu a paciência de vez e jogou dinheiro na ilha. — Preciso de morfina.
— Bom… — o traficante deixou o sorriso sumir do seu rosto e encarou a nota de cem. — Vai ter que procurar em outro lugar. — Bebeu um gole do seu uísque e observou com certo prazer a feição de se tornar confusa.
Era divertido vê-la baixar a guarda e franzir a testa.
— Não vou ser responsável pela sua ruína.
— Você já destruiu minha vida antes, Damien. Que diferença vai fazer agora? — respondeu, agora ela estava com raiva.
Seu maxilar estava travado e suas mãos se fecharam. Ela daria um soco nele se conseguisse.
— Você não se importava nem um pouco em ser meu traficantezinho particular no passado. O que mudou agora? — Continuou, aproximando-se de Damien, que pareceu ficar extremamente desconfortável. — Você, Damien Lockwood, me vendeu as drogas que ajudaram a matar a irmã do meu namorado. Você. E sou eu que estou nesse inferno. Você é tão culpado quanto eu. E ninguém te chama de assassino. Você não perdeu NADA! — estava de frente para o garoto agora, ela era vários centímetros mais baixa que ele, mas isso não a impedia de olhá-lo nos olhos, com a cabeça erguida.
Já tinha passado da hora de perder o medo que ela sentia. Damien era o culpado de tudo. Não ela. Ele também tinha destruído sua vida.
— Então, o mínimo que você precisa fazer, é me vender a DROGA da MORFINA, seu verme! — A garota cuspiu as últimas palavras, que foram suficientes para acordar Damien do transe.
O garoto piscou algumas vezes e sua feição se transformou em raiva.
— Escuta aqui. — Ele chegou mais perto e encarou com um olhar perturbador, acentuado pela sua cicatriz. — Você não faz ideia do inferno que eu passei quando a pequena morreu. Não faz ideia. Não venha me culpar pela sua vidinha de merda, eu nunca te obriguei a comprar drogas comigo. Você se destruiu, . Você cavou sua própria cova. Assuma suas responsabilidades pelo menos uma vez na sua vida. — Damien saiu da cola de e caminhou em direção à porta, abrindo-a e se virando para dizer: — Eu não vou te ajudar a desistir de tudo, quando você tem a chance de reconstruir. Você tem uma chance, . Você tem pais que se importam com você. Não jogue isso fora. Não seja burra.
A garota ficou estática. Não conseguia acreditar que Damien Lockwood estava se importando o suficiente com ela para até mesmo para a aconselhar. Apesar da feição assustadora, ele parecia, de alguma forma, estar sendo sincero, o que deixou a menina mil vezes mais confusa.
forçou suas pernas para conseguir caminhar até a porta, que permanecia aberta e, sem saber o que dizer, apenas balançou a cabeça para o garoto, antes de sumir na chuva que começava a cair.
— Você cometeu um grande erro. — Damien ouviu a voz atrás de si e não precisava se virar para saber quem era.
Sabia que ele tinha ouvido toda a conversa.

— Você não precisava ter feito isso! — A voz feminina dentro da sala apertada e escura era estridente. — Jesse não tinha nada a ver com aquela garota estúpida!
— Ele ia contar tudo a ela. Cavou a própria cova. — A voz masculina, por sua vez, era calma e sombria. — E você, se recomponha. O chefe não gosta de escândalo. — Ao dizer isso, os dois ouviram o barulho da porta se abrindo e se calaram.
O barulho das botas caminhando passou a ser o único na sala.
— Jesse teve o que mereceu. — A voz grossa e rouca disse. — Ninguém o mandou abrir o bico. E você, mocinha… — dirigiu-se à garota, que agora estava encolhida. — Cuidado com o que diz. A próxima pode ser você.
— Tudo bem, senhor. — Ela sussurrou, a contragosto.
— Agora sumam da minha frente e fiquem de olho no Lockwood. Aquele garoto imbecil está aprontando.
— Sim, senhor. — Os dois responderam e saíram apressados, quase correndo, deixando o homem sozinho na sala escura. — Bom, agora vamos nos divertir. — Sorriu maldoso, enquanto digitava uma mensagem no celular.



Capítulo 6

N/A: Oi, pessoal, só um aviso antes da leitura para vocês não ficarem confusxs: o capítulo inteiro é um flashback!

Quinta-feira, 9 de julho de 2015:

estava animado com o tempo. Raramente eles podiam aproveitar o sol em Cambridge, que quase sempre contemplava a chuva ou um céu nublado. Mas hoje o céu estava limpo, sem nuvens e o sol, ainda que não fizesse um calor absurdo, estava presente.
Era véspera da final do campeonato, então ele já estava na escola antes do horário das aulas, para um último treino. O treinador berrava a plenos pulmões, enquanto o garoto tentava se concentrar na sua corrida. Com certeza aquela era sua melhor forma e ele estava animada para levar a escola ao quinto campeonato, principalmente porque isso lhe renderia créditos extras na faculdade, embora ele soubesse que apenas o seu sobrenome era suficiente para colocá-lo em qualquer faculdade do país, queria conseguir as coisas pelo seu próprio mérito. Era o que seu pai o havia ensinado.
Deus, como ele sentia falta do pai; sabia que se James estivesse vivo ele com certeza estaria surtando, acompanhando-o nos treinos e contando pela décima vez a história de quando ele mesmo vestiu as cores da Cambridge High School para levar a escola à final do campeonato. Ele era uma estrela e queria seguir os passos dele.
Mas ele estava nervoso, sentindo um incômodo no estômago e suas noites não estavam sendo bem aproveitadas, mas tudo ficaria bem e valeria a pena depois do jogo.
— Vamos, corram! Vocês parecem umas mocinhas! — O treinador berrou ao mesmo tempo que as torcedoras chegavam, trocou um rápido olhar divertido com , porque ele sabia o que aconteceria no momento em que viu a sua namorada arquear as sobrancelhas.
— Veja bem, treinador… — sorriu docemente, mas seus olhos estavam raivosos.
Ela odiava aquele homem machista.
— Se eles fossem mocinhas… não conseguiriam fazer isso. — Com certa maestria, deslizou pela quadra completando três incríveis mortais, aterrissando sem nenhuma dificuldade. — O treino acabou, meninos! — Sorriu novamente e deu uma piscadela para o namorado, que ria.
— Te vejo mais tarde.
Com a cara amarrada, o treinador Thomas encerrou a preparação do time, murmurando alguma coisa inaudível e saiu pisando duro, enquanto ainda ria. Ele amava o quanto conseguia exercer seu poder e não abaixava a cabeça pra ninguém.
— Até. — Estalou um beijo na testa da namorada e se dirigiu para o vestiário, com o em seu alcance.
— A parece estar bem hoje. — Comentou e assentiu.
— Ela está bem, ela prometeu. — Limitou-se a responder isso, mas estava preocupado.
Tinha medo que a menina tivesse uma recaída e ele não estivesse por perto para ajudá-la, mas ela parecia bem. Ia ficar bem.
— Vamos ficar bem. — Disse, mais para si mesmo do que para o amigo, enquanto o mesmo balançava a cabeça em afirmação.
também torcia por isso mais do que ele podia contar.

entrou no vestiário e foi direto para o chuveiro, ansioso para tomar um banho frio e desligar um pouco a mente. Por muitas vezes ele queria se desligar totalmente, esquecer todas suas preocupações, medos e inseguranças. Desde a morte de seus pais, ele se forçou a mudar, a crescer, a cuidar da sua irmã mais nova e além disso, da sua namorada. era totalmente dependente da ajuda dele. Ele sabia que isso era errado e que ele não podia se colocar nessa posição para a garota, mas ele a amava tanto, que não conseguia se desprender disso.
Não sabia ao certo em que momento ele se viu totalmente apaixonado pela menina, mas isso o consumia de dentro para fora. Ela era o amor da vida dele.

, isso aqui não é sua casa! — Rolou os olhos ao ouvir a reclamação do lado de fora e fechou o chuveiro, saindo rapidamente com a toalha amarrada na cintura, ignorando as reclamações do companheiro de time.
Pegou seu uniforme e seu celular no armário e se sentou, ainda de toalha, em um dos bancos de frente para os armários. Ao ver a hora no aparelho discou o segundo número na discagem rápida.
— Acorde e brilhe, coisa linda! — Sorriu, quando foi recepcionado por um palavrão ao ser atendido. — Vai se atrasar…
— Eu coloquei o despertador, ! — Lily-Anne resmungou. — Já estou levantando.
vai passar pra te dar uma carona. — ignorou o mau-humor da irmã e continuou falando. — Seu café da manhã está no microondas. — Falou sério, sua testa franzindo, mesmo que a garota não pudesse ver. — E eu vou saber se você não comer. — Ameaçou.
Estava preocupado com ela desde os últimos problemas. Lily era tão centrada e tão inteligente, mas a adolescência sem a presença dos pais não estava sendo tão fácil para ela; recentemente, a garota tinha desenvolvido alguns traços de transtornos alimentares, o que tinha deixado louco. Em algumas situações, ele ainda não sabia como lidar ou conversar com ela, apesar de serem extremamente próximos e abertos um com o outro. Era ali que a conselheira e psicóloga da escola tinha ajudado, orientando os dois na melhor forma de lidar com aquilo. Até então, ela estava indo bem, mas nada tirava a preocupação de .
— Eu vou comer... — ele não a via, mas sabia que ela tinha revirado os olhos. — Vou me arrumar, te amo daqui até a .
— Ida e volta. — sussurrou e desligou o celular, levantando rapidamente para vestir seu uniforme antes que se atrasasse para a aula.
Antes de se dirigir para a classe da senhora , o garoto passou pelo treino das líderes de torcida só para dar mais uma checada na namorada, que estava vermelha e dando ordens para as demais garotas. Tudo parecia dentro dos conformes e ele esperava que continuasse assim.
estava se deliciando com um bagel gigantesco, enquanto observava o treino das líderes de torcida. Era o seu café da manhã, já que ela tinha se atrasado e não conseguiu comer em casa. Ela observava as piruetas com os olhos apertados, já que também tinha esquecido seus óculos em casa. Estava quase no fim do treino e ela aproveitou a oportunidade para esperar a melhor amiga, para que ela não fosse para a classe sozinha.
— Bom dia, raio de sol! — Escutou a voz galanteadora que ela conhecia muito bem, mas não se virou para olhar o garoto, esperou que ele se sentasse ao seu lado na arquibancada, não tão perto, mas não tão longe. — Está pensando em um jeito de contar pra ela? — Ele apontou para com a cabeça e sorriu.
— Não. Eu já te disse que não vou contar pra ninguém agora. — fechou a cara, já estava cansada daquela discussão. — Você prometeu. — Ela sussurrou, cansada.
— Me desculpe. — O garoto respondeu. — É que eu estou cansado de me encontrar com você sempre me escondendo, me espreitando. — Bufou, frustrado.
— Não se esqueça que foi você mesmo que se colocou nessa situação... — respondeu, já juntando suas coisas para se levantar. — E deu sorte que eu te dei uma segunda chance. — Suas duras palavras foram suficientes para que se calasse e baixasse os olhos.
Ele sabia que estava errado e também sabia que teria que agir de acordo com as regras dela se a quisesse realmente de volta.
— Ei, ! — A menina se virou ao ouvir a voz de , que tinha as mãos na cintura e um olhar de desprezo direcionado ao garoto. — Não sabia que você falava com os animais agora!
— Como não, ? Ela é sua melhor amiga e você é uma vaca. — não deixou passar e respondeu a garota, recebendo um belo dedo do meio como resposta e uma feição zangada da namorada.
— Vamos embora, ! — se limitou a dizer isso e desceu as escadas da arquibancada rapidamente, arrastando a amiga junto com ela em direção ao vestiário.
— Sinceramente, , eu não sei por que você ainda dá papo para aquele imbecil, já não basta tudo que ele fez? Agora que você se reconstruiu, ele quer ir atrás de você?
— As coisas não são tão simples, ... — agora a menina estava com raiva.
A amiga sempre dava pitacos demais nos relacionamentos dela, principalmente neste último, já que os dois não se bicavam de jeito nenhum.
— Nem todo namoro é perfeito como o seu. — Respondeu sem pensar e logo se arrependeu.
— Meu namoro não é perfeito, !
— Eu sei que não, me desculpe, é só que você não consegue se colocar no meu lugar, isso é irritante às vezes! — A garota desabafou, enquanto observava entrar rapidamente no banho.
— Me desculpe, mas eu sou sua melhor amiga, você precisa me ouvir! — respondeu.
Ela conseguia ser muito teimosa quando queria e nem sempre respeitava o espaço de . Era óbvio que ela queria o bem da amiga, mas o grande defeito da garota era pecar pelo excesso.
— Problemas no paraíso, ? — Meredith, a garota insuportável da torcida, se intrometeu no assunto, enquanto pegava suas roupas no armário.
— Cuide da sua própria vida, Mer-Mer. — respondeu com desprezo, enquanto a morena ria e saía do vestiário rebolando.
Ela era o tipo de pessoa que gostava de incomodar os outros por puro prazer.
— Eu não sei como você aguenta essa garota... — comentou, quando saiu do chuveiro. — Ela é simplesmente tudo de ruim! — A mais velha parou de reclamar, quando percebeu que a amiga tremia e seu rosto estava pálido. — , o que foi? Você está bem? — Demorou um minuto para que o rosto de voltasse ao normal e, apesar de ainda tremer, a garota lançou um falso sorriso tranquilizador para a amiga.
— Eu estou bem, foi só uma… queda de pressão. — Não se preocupou em ser convincente, sabia que não acreditaria. — Tá tudo bem, ok? Só vamos pra aula.
sabia que era melhor não insistir, então se limitou a pegar seu celular e enviar uma mensagem, enquanto as duas caminhavam lado a lado para a aula do próximo tempo.
» : Fique de olho na . Ela agiu estranho no vestiário.

Essa foi a mensagem que fez , antes despreocupado e satisfeito com o seu desempenho nos treinos, ficasse ansioso e preocupado com o estado da namorada. Não podia lidar com uma recaída de naquele momento tão importante dos dois. Aquilo não podia acontecer de jeito nenhum.
O garoto perdeu completamente o foco da aula, já não ouvia mais o que a professora dizia. Tudo que importava era que ele precisava pensar num plano rápido para fazer a namorada se sentir melhor, antes que ela fizesse besteira e estragasse tudo.

» : Vamos matar aula hoje? Tenho uma coisa pra você!

Ele sabia que ela aceitaria. nunca negava um convite dele, quanto mais um desses.
Enquanto a namorada não respondia, ele se levantou e pediu à senhora licença para ir ao banheiro, ela o olhou desconfiada, já que ele tinha acabado de voltar do treino, mas deixou passar. respirou aliviado e saiu em direção ao seu esconderijo, onde ele e os amigos costumavam matar aula e às vezes pular o muro para fugir. Ali era o ponto cego da escola inteira, o único lugar que as câmeras não funcionavam.
— Oi, lindinho! — Escutou a voz da garota e automaticamente suas preocupações sumiram.
Ela estava bem. Estava linda aquele dia, como todos os outros: o cabelo estava preso em um rabo de cavalo alto; ela não usava maquiagem, mas estava com as bochechas rosadas, vestia um vestido amarelo que lhe caía extremamente bem e sua mochila pendia de um lado do braço apenas. Ele era um cara de sorte.
— Senti saudades! — Sussurrou e a puxou para um beijo apaixonado.
amava beijar . Amava senti-la nos seus braços, amava saber que ela era sua e que ela o amava também.
— Vamos! — Pegou a namorada pela mão na intenção de pular o muro, mas freou o passo e o olhou com as sobrancelhas erguidas.
— Não é como se eu nunca tivesse visto sua calcinha, . — rolou os olhos e arrancou uma risada da garota.
Deus! Como ele a amava.
— Vamos logo. — Puxou-a novamente e os dois pularam o muro rapidamente, a garota com um pouco mais de dificuldade, enquanto tentava se equilibrar e tampar sua calcinha, mas, no fim, conseguiram chegar até o outro lado do muro sem serem vistos.
— Parece que você leu minha mente, amor... — riu e pegou a mão do namorado. — Eu estava pensando em matar aula depois do almoço para repassar algumas coreografias, agora você pode me ajudar!
— E o que eu ganho com isso? — brincou, depositando um beijo nas costas da mão da menina.
— Um monte de panquecas que você mesmo fará e eu vou ficar só olhando... — sorriu e bateu palmas, como se tivesse tido a melhor ideia do mundo, mas apenas revirou os olhos. — É brincadeira, lindo! Amanhã à noite, se ganharmos o jogo, você vai ser muito bem recompensado! — Depositou um beijo rápido nos lábios do rapaz, mas antes que se desvencilhasse, a puxou pela cintura, para que ela ficasse mais perto dele.
— Eu amo você! — Sussurrou, apertando-a mais forte contra si.
Se pudesse, ficaria ali pra sempre.
— Eu sei, bobinho. — Ela nunca falava “eu te amo” ou “também te amo”, era sempre isso e, no geral, não se importava.
Ela já tinha dito antes, na verdade, tinha sido a primeira a dizer, mas sempre argumentava que quando se falava demais, as palavras se tornavam comuns e ela queria que fossem sempre extraordinárias, então quase nunca dizia. Era sempre “eu sei, bobinho”, porque ela sabia. Sabia que daria a sua vida pela dela. Sabia que ele a amava mais que ela amava a si mesma.
— Mas que porra… — abriu os olhos assustado, após sentir algo macio chocando rapidamente contra seus lábios. — ? Você está maluca? Isso é assédio!
— Você não devia ficar dando sopa assim, gatinho… — a menina riu e se sentou no banco em que o amigo antes estava deitado. — Qual foi, … foi só um selinho!
— É… — ele olhou pra baixo envergonhado, mas se deixou levar pela brincadeira da amiga, roubando um selinho de volta. — Eu só peguei de volta! — Riu, enquanto o estapeava.
— Fiquei preocupada com a hoje… — a garota mudou de assunto de uma hora para outra, ela era mestre em fazer aquilo. — Ela ficou tão estranha, estou com medo que ela volte… eu, pode parecer egoísta, tá legal? Mas eu não consigo lidar com isso agora. não pode ter uma recaída agora.
— Ela não vai ter, cricket! — estava confiante na recuperação de dessa vez… ela parecia ter entrado nos eixos. — Relaxe… você está muito tensa, precisando de uma ação! — Seus olhos brilharam e ele deu uma piscadela para a amiga, que riu ao entender a piada.
— Você é um garoto pervertido, ! — Riu novamente, mas seu semblante se fechou imediatamente ao ver a figura que os observava de longe. Droga. — Eu tenho que ir… — falou baixinho para o amigo, que também percebeu que não estavam mais sozinhos e obviamente tinham perdido seu momento.
— É… te vejo mais tarde! — Depositou um beijo na testa da amiga e se distanciou em direção ao refeitório.
! Vamos lá, você nem está prestando atenção. Eu preciso que você me ajude nisso! — A voz de era estridente. Ela já estava enchendo o saco com aquela coreografia estúpida.
tinha a tirado da escola com intuito de se divertirem, mas a namorada havia transformado a tarde deles em um ensaio.
— Não preciso. — Respondeu, sorrindo. — Já está perfeito! Você repassou isso mil vezes.
— Não está perfeito! Está longe de ser perfeito e você não me ajuda em nada! — A garota começou a entrar em desespero e sabia que logo começaria a chorar se ele não a acalmasse.
— Vem, eu tenho uma ideia melhor! — Sorriu e puxou a garota para um beijo.
— Não! — não permitiu que seus lábios se colassem por nem meio segundo e quebrou o beijo, fazendo com que rolasse os olhos. Ela conseguia ser impossível às vezes. — Você precisa me ajudar! — Sorriu de lado e deu um selinho no garoto.
— Ok! — olhou para cima, como se pedisse ajuda aos céus e suspirou, antes de começar a imitar os passos da coreografia com uma surpreendente maestria, o que fez a garota rir.
— Você é melhor nisso do que a Meredith… talvez ela se dê melhor no seu lugar no time e pare de me encher o saco na torcida!
riu ao ouvir a fala da namorada, mas estava realmente falando sério.
— O quão bom seria ter o namorado torcendo comigo? — Bateu palmas animada, ignorando totalmente a expressão enojada do amado.
— Mas, aí, você não teria o melhor jogador do mundo no time, torceriam para um bando de pernas de pau e o teria que fazer tudo sozinho... — o garoto argumentou.
— Você é muito prepotente, ! — balançou a cabeça negativamente, mas se lançou nos braços do namorado. — As olheiras da Cambridge estarão aqui amanhã... — sussurrou.
Ela estava morrendo de medo. Era sua chance de se destacar na torcida e praticamente se garantir no time das cheerleaders da faculdade da cidade. Sua família inteira tinha sido, esse era seu destino.
— Já está no papo, amor… assim como o Miss Cambridge quando você estiver na idade certa. É seu destino natural. Você é uma .
— É… — essa era uma das frases que a garota mais ouvia: “Você não devia fazer isso, é uma ”, “Não se comporte dessa forma, você é uma ”.
Era verdade que seu sobrenome e posição social te davam muitos privilégios, mas, na maior parte do tempo, ela se sentia apenas sufocada. Sua única escapatória eram seus comprimidos. Mas estes não a faziam ter um bom relacionamento, nem com seus amigos, muito menos com o namorado. Além disso, ela não queria ser “a filha drogada dos ”. Ela queria grandeza, não era estúpida, mas o fardo era grande demais para ela.
— Precisamos voltar pra escola, o Richard vai me buscar hoje e não posso me atrasar, senão Emma me mata. — Ela disse, estavam bem adiantados, mas ela não queria mais ficar ali, precisava de um tempo sozinha.
— Ok. — percebeu a estranheza da namorada, mas decidiu não questionar, ela parecia bem. Só estava nervosa. — Tudo vai ficar bem. — Beijou o topo da cabeça de .
Tudo precisava ficar bem.
— Não vai adiantar olhar pra mim com essa cara, ! — A garota no banco do carona cruzou os braços, um beicinho já se formando em sua boca. — é meu amigo. Nunca vai deixar de ser. E você não é mais meu namorado.
— Só estou tentando te proteger... — o garoto parecia escolher bem as palavras, suas mãos seguravam o volante com força, enquanto ele dirigia para deixar a menina em casa.
— Proteger do quê? — Ela respondeu, erguendo uma das sobrancelhas.
era um dos seus porto-seguro, eram amigos desde a infância. Ela sabia que podia confiar nele para tudo. No entanto, não sabia o motivo da aversão do ex-namorado contra ele.
— Você tem essa mania irritante de não gostar dos meus amigos, talvez o problema seja você!
— Ou você que não sabe escolher com quem anda! — Ele respondeu no mesmo tom. — Só estou te dizendo que talvez não seja o anjo que vocês todos pensam que ele é… — ele disse, com raiva, mas pareceu se arrepender quando o olhou com raiva. — Tá… tá na cara que ele gosta de você!
— Então é isso? Tudo se resume a… ciúme? Eu não posso acreditar que eu esteja escutando isso! É por esse e ‘n’ outros motivos que a gente simplesmente não funciona! Eu estou cansada disso, ! — A voz da garota falhou na última palavra.
Era doloroso demais admitir aquilo, mas ela e o garoto dos seus sonhos não davam certo juntos.
— Não diga isso, por favor, eu te amo tanto… eu… eu preciso melhorar, sei disso! Sei que posso. — Falou, ao mesmo tempo que estacionava de frente para a casa da garota. — Olha só, por favor, não desista de nós ainda… Eu prometo que… — mas antes que terminasse a frase, seu celular tocou.
O garoto engoliu em seco ao ler a mensagem, mas depois tentou se recuperar e voltar os olhos para a ex, que o olhava num misto de tristeza, raiva e, é claro, curiosidade.
— Eu preciso ir. — sussurrou. — Mas por favor, por favor, eu imploro, não desista da gente ainda.
— É sempre assim, você nunca está, sempre some quando eu preciso. — As lágrimas desciam do rosto da garota e pareciam acertar em cheio, mas ele não podia fugir daquilo.
… — a garota não esperou e desceu do carro, batendo a porta com força.
Não olhou para trás até entrar em casa, onde subiu as escadas correndo, deixando sua mãe, que estava na cozinha, sem entender nada. Num timing quase perfeito, ao mesmo tempo que batia e trancava a porta de seu quarto, sua mãe recebeu uma mensagem de texto que dizia:

» Número Restrito: Algo ruim está por vir. Não deixe a sair de casa por nada.
aproveitou para matar o restante das aulas no campo de futebol e assim ficou até que começasse a escurecer. Ninguém o repreenderia se o visse ali, pois era fácil dizer que ele estava entrando em forma para o grande jogo. O futebol mexia até com a cabeça dos professores dali.
Ele sabia que estava bem fisicamente e mentalmente para o jogo, não tinha a menor possibilidade de perderem aquela final, se dependesse dele. Mas as outras preocupações ecoavam na sua cabeça; ele se preocupava o tempo inteiro com a irmã mais nova, com a namorada e com a melhor amiga, , que também estava passando por tempos difíceis. Sabia que sua irmã já estava em sua casa, com . e também, ele tinha se certificado disso, justamente porque se preocupava o tempo todo. Sobrava pouco tempo para que ele se preocupasse com si mesmo e se permitisse ser vulnerável. Mas ele era.
Ele se sentia fraco e sozinho às vezes, sentia uma saudade esmagadora de chegar em casa e encontrar seus pais na cozinha fazendo as famosas panquecas dos , sentia falta de quando seu pai levava ele, e Lily-Anne para fazer trilha, sentia saudades dos conselhos de sua mãe em relação a garotas — tinha sido dela a ideia do pedido de namoro que ele havia feito para . Não tinha ninguém no mundo como James e Pearl … e agora eles estavam mortos e ele tinha que cuidar de tudo.
Tinha dias que o garoto mal respirava, mas suportava tudo, porque precisava cuidar da sua irmã mais nova. Lily precisava dele. E ele precisava dela. Se a garotinha não existisse, ele nem saberia o que fazer. Lily era a pessoa mais autêntica, inteligente e espirituosa que ele conhecia. Ele sempre dizia que ela era um sorvete de pistache (seu favorito) em um dia de calor. Ela trazia felicidade a todos em sua volta.
voltou à realidade, quando seu celular começou a tocar, ao ver quem era atendeu rapidamente.
— Preciso que você venha até minha casa! — pediu, sua voz denunciava que ela estava chorando.
— Chego em cinco minutos.

A chuva fina caía paulatinamente, enquanto dirigia para casa rapidamente, tinha recebido uma mensagem da irmã no caminho para casa de , dizendo apenas que iria sair com uma amiga e estava desconfiado e preocupado, porque agora ela não atendia o celular e já eram quase oito da noite. Ele tinha ficado mais tempo do que o planejado na casa da melhor amiga, que estava inconsolável, mais uma vez, pelas atitudes do namorado. não sabia mais o que fazer em relação a isso. Não gostava de violência, mas estava a ponto de apelar para um soco na cara de . Ele odiava aquele garoto com todas as forças.

— Onde está Lily-Anne? — Perguntou a assim que entrou em casa.
O amigo estava jogado no sofá com os pés para cima, assistindo a um jogo de futebol.
— Estou ligando e ela não atende de jeito nenhum.
— Deve estar com alguma amiga. — O garoto respondeu, sem tirar os olhos da televisão. — Você não precisa ficar rastreando a garota o tempo todo como se fosse o pai dela… — bufou.
era extremamente protetor com a mais nova e muitas vezes exagerava nas suas reações. Na visão de , ele parecia estar sempre em negação ao pensar que ela não era mais uma criancinha.
— Tecnicamente, é quase isso, já que nossos pais estão mortos e o Tio John está do outro lado do mundo... — rolou os olhos e ligou de novo no celular da irmã mais nova. — Lily-Anne , onde é que você está, caralho? Me liga de volta e é melhor você ter uma boa desculpa para não ter chegado em casa ainda! — Deixou o recado com a voz firme, mas estava preocupado. Lily nunca se atrasava, nunca saía sem avisar e nunca deixava de atender o celular.
sabia que tinha algo errado.
— Talvez ela esteja com aquela amiga dela… Michelle? — tirou os olhos da televisão e voltou para , agora ele estava realmente preocupado.
— Tem razão. Ligue para ela, enquanto eu vejo se Lily disse algo para . — Sabia que a irmã e a namorada eram próximas, se Lily tivesse mentido para se encontrar com algum garoto, com certeza saberia.
Mas ela também não atendeu o celular.
— O que está acontecendo com essas garotas hoje?
— Michelle também não sabe dela... — coçou a cabeça, preocupado.
— Qual foi a última vez que você a viu? Você estava em casa! — disse, seu rosto já estava vermelho num misto de raiva e preocupação
— À tarde, eu estava escrevendo, ela criticou minha música, depois eu subi para descansar e não a vi mais. — justificou.
Agora estava se sentindo culpado por não ter se preocupado com o paradeiro da mais nova. Lily nunca pareceu ser o tipo de adolescente que aprontava ou sumia.
— Tudo bem… tudo bem… — tentava respirar fundo. — Não deve ser nada demais, ela deve estar com algum garoto e ficou com medo de me contar… talvez seja isso, certo? — Sua respiração estava pesada e ele estava começando a ficar tonto. Precisava ver sua irmã naquele instante.
— Vamos sair para procurá-la, vou ligar pra .
— Continue tentando falar com a . — disse para o amigo do outro lado da linha. — Estou a caminho. — Disse.
Embora estivesse preocupada, sabia que estava uma pilha de nervos, então precisava ficar calma e pensar com clareza. Tinha certeza que Lily estava fazendo coisas de adolescente normal, que eles faziam quando tinham a idade dela e estava exagerando. Talvez o celular dela só estivesse sem bateria.
— Mãe, estou indo no , a irmã dele saiu sem dar notícias e vou ajudar a procurar.
— Não! — Elizabeth levantou alarmada e entrou na frente da filha, que recuou, primeiramente assustada com a reação da mãe, mas depois soltou uma risada incrédula.
— Desde quando você se importa se eu vou sair ou não? — Perguntou, cruzando os braços.
— Desde agora, . Você não vai sair. E nem tente me desafiar. — A mãe cruzou os braços da mesma forma, o que fez a garota apertar os lábios para não rir novamente.
— Ai, mãe… eu adoraria participar dessa nova crise sua de mãe superprotetora que se importa com a filha de dois em dois anos, mas dessa vez não vai dar, ok? Tem algo realmente rolando e meus amigos precisam de mim, então… — bateu continência para a mãe e saiu andando.
Elizabeth tentou impedi-la, mas a garota foi mais rápida.
, POR FAVOR, TOME CUIDADO! — A menina pensou ter ouvido a voz da mãe falhar em choro, mas não tinha tempo para se preocupar com os dramas de Elizabeth, precisava achar Lily-Anne.
Quando chegou na casa dos , os amigos já estavam do lado de fora. A expressão de denunciava aflição e desespero, enquanto estava prestes a começar a chorar.
— Eu preciso que vocês fiquem calmos, ok? Nós vamos achá-la! — Sorriu, tentando tranquilizá-los. — Vocês já falaram com a ? — Perguntou e o rosto de pareceu sair de um transe.
— Não… eu estava, estou tão... tão… que me esqueci. Vou ligar. — saiu de perto dos amigos e discou o número da namorada, caminhando de um lado para o outro, enquanto ouvia os toques.
Até que os mesmos caíram na caixa postal.
, por favor, Lily-Anne sumiu, eu preciso que você atenda essa merda.
— Nada? — perguntou, quando o amigo voltou cabisbaixo.
apenas balançou a cabeça negativamente, cansado.
— Vamos procurá-la. Relaxa. A gente vai tentando falar com a pelo caminho. — A garota deu dois tapinhas nas costas do amigo, tentando tranquilizá-lo, e os dois foram em direção ao carro, enquanto se distanciava para atender o celular.
Quando o garoto voltou, parecia assustado e ainda mais pálido do que o costume, mas os amigos não pareceram perceber, enquanto ele lutava para disfarçar.
— Vamos. — decidiu dirigir, enquanto foi para o banco do carona, ainda ligando para a namorada e para irmã, sem sucesso.
Eles passaram de carro por toda a cidade, nas praças, no hospital, até mesmo no cemitério onde Lily costumava ir para visitar os pais. Nada. Nenhuma pista.
, acho que agora é a hora de ligar para a polícia. — sussurrou, ela estava assustada e preocupada, mas estava tentando pensar com clareza.
— QUE MERDA! — berrou, as lágrimas finalmente começaram a cair dos seus olhos.
Ele estava no seu limite. Não conseguia lidar com aquilo. Não queria acreditar que sua irmãzinha estava desaparecida. Merda! Era dever dele cuidar dela, como ela tinha sumido assim? Debaixo dos seus olhos?
— Onde está minha irmã? ONDE ESTÁ MINHA IRMÃ?
… — tentou acalmá-lo, mas sabia que não encontraria as palavras certas. Sabia da única pessoa que poderia fazer isso, mas ela não estava lá, como sempre. — Ah… — arfou e de repente tudo pareceu fazer sentido em sua cabeça. — . Eu acho que sei onde Lily pode estar… e você não vai gostar nada. — Sem saber o que os esperava, deu ré no carro e dirigiu rapidamente para a casa da última pessoa que eles imaginariam: Damien Lockwood.
O barulho irritante de um celular tocando incessantemente foi o suficiente para fazer Shawn despertar e bufar irritado. Meia-noite. Ele já estava dormindo depois das duas doses de Bourbon que tinha tomado.
— O que é, inferno? — Atendeu o telefone rispidamente.
— Senhor… você precisa vir. — Ouviu a voz do tenente Ryan, estava falha.
Ele era um garoto que se assustava fácil com qualquer ocorrência. Shawn ainda não sabia o que o garoto tinha ido fazer na polícia, mas ainda tinha esperanças que ele se tornasse um policial casca grossa, assim como ele era.
— Você não pode resolver sozinho? — Rolou os olhos, já procurando suas calças.
— Senhor… é uma tragédia. Você precisa vir para a casa dos agora. — Ryan respondeu ao mesmo tempo que um grito atravessou a linha, fazendo o policial desligar.
Isso foi suficiente para que o delegado se apressasse para vestir suas roupas e correr para o lugar indicado.
Ao chegarem na casa de Lockwood, todas as janelas estavam fechadas e a casa toda apagada. Não havia nenhum sinal de que tinha alguém em casa. Mas era muito boa ouvinte, ela estava ouvindo passos do lado de dentro. Uma pessoa estava inquieta, provavelmente andando de um lado para o outro, agitada.
— Damien! — bateu na porta insistentemente. — Eu sei que você está aí! Abre a porra da porta! — Foram necessárias mais três batidas para que o garoto finalmente abrisse a porta.
Ele estava pálido. Mortificado. Na sua sala de estar haviam garrafas quebradas por toda parte.
— O que houve aqui dentro? — perguntou, mas não ouviu resposta.
— Lockwood, minha irmã esteve aqui? Com ? Responda logo, antes que eu te dê uma surra e eu não estou brincando. — disse, segurando o garoto pelo colarinho.
— Sua amada esteve aqui, … com a loirinha. — Damien engoliu em seco. — Mas já foram.
— Damien. — olhou para o garoto da cicatriz friamente e Lockwood abriu um meio sorriso, como se debochasse de . — Você vendeu drogas para elas?
— Os preferidos de , apenas. — Respondeu com simplicidade e socou a porta, assustando a todos.
— Você é um imbecil. — cuspiu as palavras e puxou o amigo para o carro, afim de irem embora dali antes que fizesse besteira.
ficou para trás, dizendo alguma coisa para Lockwood, mas logo correu para o carro, sua feição estava assustada. Mas ninguém, novamente, pareceu perceber. Estavam preocupados demais com Lily.
— Vamos para a casa de , provavelmente ela ficou maluca e Lily cuidou dela, e por isso não atenderam o celular. Não é difícil imaginar isso. Sempre acontece. — disse, era sua melhor versão, se fosse aquilo, poderiam lidar, pois sempre aprontava uma dessas e dessa vez a babá a pagar o pato foi Lily.
não respondeu. Estava bravo demais. Bravo demais por ter arrastado sua irmãzinha para as bagunças dela. Era baixo demais. Típica atitude desesperada de uma viciada.
Mas quando se aproximaram da enorme mansão dos , tudo pareceu ficar em câmera lenta. As luzes e o barulho dos carros de polícia, duas ambulâncias que chegavam rapidamente, os paramédicos na calçada, debruçados sob uma silhueta pálida e um grito horripilante de uma garota que chorava. . Ela estava ali, chorando e berrando incansavelmente. Nesse momento, as pernas de pareciam não seguir seus comandos, seu coração batia tão acelerado que doía, sua garganta estava seca e seus olhos desfocados. No fundo, ele já sabia. Mas só quando se aproximou da calçada, que tudo pareceu voltar para sua velocidade normal. O corpo pálido estendido no chão era sua irmã. Sua irmãzinha.
— Eu sinto muito, não há nada que possamos fazer.
— Chegamos tarde demais
— Eu sinto muito! Eu sinto muito!
ouvia tudo ao mesmo tempo, mas não conseguia focar em nada. De repente, ele estava sozinho ali, encarando o corpo da irmã. Ela não parecia estar em paz. Lily não se mexia. Seus olhos estavam fechados e a boca semiaberta. Ela parecia uma boneca.
ajoelhou no chão e quando suas mãos tocaram a garota, a ficha caiu. Lily-Anne estava morta. Ali. Bem nos seus braços. Morta.
, por favor, eu sinto muito. Eu sinto muito. Por favor! — A voz da garota pareceu mais clara agora. Como se tivesse saído de um transe.
O garoto focalizou seus olhos na namorada. Que chorava e pedia desculpas, suas roupas estavam rasgadas, seus olhos vermelhos e ela estava claramente machucada. Mas não prestava atenção em nada disso. Tudo que importava era que sua irmã estava morta. E ele sabia quem era a culpada.
— SAI DE PERTO DE MIM! — Berrou, fazendo todos a sua volta se assustarem. — SAI DAQUI, VOCÊ MATOU A MINHA IRMÃ, VOCÊ É UMA ASSASSINA! SAI DAQUI! ASSASSINA
, por favor… por favor, eu sinto muito, eu…
— SAI DAQUI, SAI DAQUI! — As lágrimas gordas caíam dos olhos de , enquanto ele gritava com , que não conseguia mais falar em meio aos soluços.
e estavam parados, em choque, mortificados com a cena horrível que estavam presenciando. Nas sombras, uma silhueta passava despercebido com toda a confusão. Ninguém prestava atenção nele. O homem tirou uma foto da cena e enviou com a seguinte mensagem:

» Número Restrito: Está feito.


Capítulo 7

— Obrigada por me atender no domingo, doutor. — sorriu agradecida para seu psicólogo.
Apesar dos fios brancos na cabeça e o semblante cansado, doutor Marcus tinha um sorriso encantador e acolhedor. Ele era uma das poucas pessoas que ela podia realmente ser vulnerável e expor seus medos e inseguranças. Ela tinha contato com ele desde quando foi para o internato e agora, por sorte, ele tinha sido transferido para o hospital em Londres, que ficava a cinquenta minutos de trem.
Era sua primeira sessão desde que tinha voltado e se sentia melhor, estava feliz em poder tomar o trem. Emma havia insistido para que ela fosse com o motorista, mas a garota não quis. Queria se sentir livre e, pra variar, uma pessoa normal. Não gostava de ser levada para todo canto pelo motorista.
— Não há de que, . Então, me conte o que aconteceu… — disse, com a voz suave, o que deu terreno para que contasse sobre as lembranças que estavam se misturando com sonhos na sua cabeça, o seu medo irracional de Damien e, é claro, sua recaída.
O doutor Marcus ouviu com atenção, como sempre, anotando várias coisas enquanto a garota falava.
— Fico feliz que você tenha conseguido resistir, . É muito importante para nós que você continue sóbria. É um projeto maior. — O doutor observou, depois um longo monólogo da paciente. — Mas, veja, eu tive uma ideia para esse seu problema de memória… — levantou-se, enquanto o olhava com atenção.

•••

Depois da sua consulta com o doutor Marcus, a garota se sentia muito melhor, tinha entendido seu episódio e estava orgulhosa de não ter seguido em frente na busca dos comprimidos. Tinha acordado naquela manhã decidida a andar de cabeça erguida, pois estava cansada de sentir pena de si mesma. Ela queria mostrar para as pessoas que ela tinha mudado e se tornado outra mulher, então precisava fazer isso da melhor maneira: impondo-se. Ela era a , rainha daquele Império, e precisava voltar a agir como tal! Dessa vez, muito mais madura e certa do que queria, além de usar seus talentos ao seu favor, ao invés de se autossabotar. A inconsequente, que não se importava em fazer mal para ela mesma e consequentemente acabar machucando os outros, tinha morrido.
Foi com esse pensamento, que a garota caminhou com passos decididos até a escola naquela segunda-feira. Ela já estava acostumada com todos a sua volta a encarando. Desde que tinha voltado para Cambridge, era só isso que as pessoas faziam: encaravam e cochichavam. Alguns faziam comentários curiosos, outros eram apenas maldosos... mas quando a garota desceu do carro e caminhou pelos portões, os olhares direcionados a ela foram diferentes.
Alguns estavam realmente surpresos, outros chocados. Algumas meninas riram e alguns meninos olharam com admiração. Todos pelo mesmo motivo: ela tinha voltado com os fios mais claros e alongou seus cabelos no salão no dia anterior — o que não podia ter deixado Emma mais feliz! Sua mãe estava convicta de que ela ganharia o concurso Miss Cambridge daquele ano, seguindo a tradição da família. E para tanto, obviamente, ela precisava estar com a aparência impecável.
Apesar de estar relutante com a “mudança”, com medo de passar a impressão errada, justamente por querer provar que estava mudada e não de volta ao passado, estava feliz. Ela amava seus cabelos claros e longos, e sabia que não era um cabelo que a faria ser a pessoa de antes. Mas, mesmo assim, ela se sentia reconectada com si mesma.
passou por todos como se fosse um dia normal na sua vida, pelo canto do olho, conseguiu ver Meredith cochichando com outra garota da torcida, mas não deu atenção. Ela era a última pessoa com quem perderia tempo.
Caminhou decidida até a aula de trigonometria, a primeira do dia. Estava tranquila, pois fazia aquela aula sem a presença dos antigos amigos, não precisaria se preocupar com a fuzilando com os olhos ou com o olhar de pesar misturado com ódio de . Ela estava bem. E continuaria.

, e chegaram juntos na escola naquela manhã. Ainda estavam estranhos um com o outro, mas a situação definitivamente estava melhorando. A mais nova estava ansiosa para ver como ia se comportar, queria saber se o amigo faria valer a aposta ou se colocaria a amizade deles em segundo plano novamente, e estava do mesmo jeito que todos os dias, em constante dor e tristeza, mas parecia mais feliz com os amigos do seu lado. Tinha até se arrumado melhor, por insistência de : estava com os cabelos, acostumados a serem rebeldes, penteados para trás, seu uniforme perfeitamente alinhado no corpo e seus tênis favoritos no pé. Ele era um garoto bonito e costumava ser mais preocupado com sua aparência física no passado, mas agora não fazia tanta questão. A amiga do seu lado era totalmente o contrário: apesar do estilo próprio com as vestes da escola completamente customizadas, sempre estava impecável.
— Ora, ora, ! — , um ex-companheiro do time de futebol, que caminhava próximo a eles, comentou. — Resolveu tomar banho hoje?
— Sim! — respondeu prontamente, sorrindo. — Sua mãe fez questão de lavar meus cabelos.
e riram da reação do garoto, que fechou a cara e saiu andando. Provavelmente queria procurar briga, mas viu a diretora os observando e preferiu não arriscar uma suspensão.
— Você não deveria falar assim da senhorita ... — o repreendeu, apesar de ter achado a piada engraçada.
— O babaca mereceu. — rolou os olhos. — E eu odeio que agora ele seja capitão! — Disse com raiva. — Você precisa voltar pro time, .
— Boa sorte com isso, campeão. Eu estou fora.
No passado, era o artilheiro do time, mas ele tinha sido banido após aparecer bêbado e drogado para jogar, destruindo o legado da família . Mas ele não se importava. Não era como se alguém ainda estivesse vivo para repreendê-lo.
não respondeu, sabia que não devia insistir no assunto, mas, ainda assim, queria que o amigo considerasse a ideia. Os dois juntos eram imbatíveis.
Os três caminharam juntos até a sala de aula da professora Thompson, que lecionava física. Era mais uma das matérias em que estava com a corda no pescoço, por isso, o mesmo resistiu à ideia tentadora de matar o primeiro tempo para fumar um cigarro.

— Bom dia, turminha! — A senhora Donovan entrou animada na sala.
A senhora era baixinha e gordinha, suas bochechas tinham um tom rosa além do normal, pois ela exagerava no blush e suas roupas eram extremamente estampadas. O sorriso dela era enorme, como todos os dias. Ela era uma professora bem querida no colégio, mesmo que tivesse muitas ideias malucas e um parafuso ou outro a menos.
Era a única aula que todos faziam juntos.
estava sentada o mais distante possível de , e , que estavam juntos no canto inferior esquerdo da sala de aula, que continha pelo menos uns trinta alunos. Nenhum dos três olhou para ela quando a menina entrou apressada na sala de aula, nem mesmo , mas já era de se imaginar. Ela era como uma praga para eles.
— Como vocês já sabem… — senhora Donovan continuou. — É tradição da Cambridge High School que os alunos do último ano atuem em uma peça! — Sorriu vitoriosa, quando ouviu gritinhos animados de alguns alunos, ignorando os gemidos temerosos de outros. — E o melhor ainda: é obrigatório! — Bateu palmas e o burburinho se iniciou, mas a professora logo cortou as reclamações com um alto assobio. Ela era ótima naquilo. — Me poupem das reclamações de vocês! No final, tenho certeza que me agradecerão por isso, naturalmente! — Deu uma piscadela.
— E qual é o tema da peça, senhora Donovan? — Claire, uma menina loira e baixinha, que se sentava na frente, perguntou.
— “A Época da Inocência” de Edith Wharton! — A professora novamente bateu palmas, animada.
Era um livro conhecido dos alunos, a maioria já tinha feito um trabalho sobre ele.
estava feliz, em todos os anos ela encenava ou ajudava em alguma peça da escola. Era o prazer dela participar de tudo que Cambridge oferecia e seus pais a encorajavam, já que acreditavam que as atividades extras a ajudariam a ficar longe das drogas, além de dar créditos para faculdade.
— Eu poupei vocês dos testes e escolhi o papel de cada um, visto que conheço vocês há muito tempo... — Donovan continuou, ela tinha o dom de fazer todos os alunos prestarem muita atenção nela, até mesmo os menos interessados, como e . — Veja bem: o senhor ... — deu uma piscadela para o garoto, que não conseguiu conter o sorriso e mandou beijos para a professora, fazendo ela e a turma inteira rirem.
Ele estava de bom humor naquele dia, pensou, observando sutilmente o garoto.
— É perfeito para ser o senhor Archer!
Nesse momento, um frio correu pela espinha de , que passou a temer qual personagem a professora escolheria para ela. De repente, não se sentiu mais tão interessada na peça.
— Enquanto você, Julian… — ela apontou para um garoto encrenqueiro, que mal frequentava as aulas. — É claramente o senhor Beaufort, visto que até o nome é igual. — Ela riu, a risada dela parecia um pio de passarinho e depois sempre levava uma tosse junto, o que contagiava algumas pessoas da sala.
Ao se recuperar, a professora continuou:
— Eu fiz uma lista dos nomes de vocês e seus respectivos papéis, está colado no quadro de avisos e não, eu não aceito trocas! Os ensaios começam na semana que vem! — Bateu palmas novamente e antes de dar chance para alguém reclamar, ela iniciou efetivamente aula.

Quando o sinal que denunciava o fim da aula tocou, foi uma das primeiras a deixar a sala: primeiro, porque ela estava ansiosa para saber qual seria sua personagem, e segundo, porque não queria correr o risco de esbarrar com seus antigos amigos. Ela ainda não sabia o que eles estavam pensando sobre ela e o incidente na amostra dos fundadores, e também não estava curiosa para saber. A única coisa que a importava, era que ninguém estava comentando sobre ela, já que a garota estava bem longe da cena do crime. Estava aliviada de não estar sendo associada a outro assassinato.
Caminhou rapidamente até o quadro de avisos, onde algumas pessoas que estavam volta davam espaço para ela passar, todos a olhavam com uma feição que misturava preocupação e expectativa, e a garota só entendeu, quando viu o nome da sua personagem no papel: condessa Ellen Olenska, a verdadeira paixão de Newland Archer, o personagem que interpretaria.

— Eu não vou fazer isso. — A voz do garoto sentado na cadeira de frente para o diretor .
— Não é como se você tivesse opção. Seu pai foi bem claro. — O diretor estava calmo, sentado com as mãos juntas em cima de sua mesa.
Ele parecia bastante com o filho, , mas tinha seus cabelos perfeitamente alinhados, ao contrário do filho.
— Você sabe o inferno que seria para sua escola, não sabe? E meu pai… — o garoto sorriu perversamente. — Ele nem se deu ao trabalho de vir aqui!
— Eu tenho minhas convicções que o senhor vai se comportar muito bem na minha escola. Visto que essa é sua segunda chance. E não se recusam as segundas chances. Talvez faça bem pra você, te coloque no caminho certo.
— No caminho certo igual ao seu filhinho perfeito, senhor ?
— Exatamente. — O diretor sorriu impassível. — Eu creio que seria uma ótima influência para você.
O garoto bufou, desacreditado, e encarou Thomas. Ele parecia irredutível e estava seguindo ordens de seu pai como um cachorro.
— Tudo bem, senhor diretor. — O garoto bateu continência.
Sabia que não tinha saída. Seu pai havia arranjado aquilo e ele sabia que tinha algum motivo para Richard subitamente começar a se importar com seu diploma.
— Espero que o senhor seja mais condescendente com as suspensões dessa vez. — Sorriu malicioso e sem dar tempo do diretor se manifestar, levantou da cadeira, pegando sua mochila. — Agora, se o senhor me dá licença, preciso ir para aula. Não quero me atrasar no primeiro dia de aula. — Deu uma piscadela e bateu continência para o senhor , que permanecia com a feição calma, mas parecia incomodado.
— Cuidado, senhor Lockwood. — Limitou-se a dizer isso e Damien saiu da sala com um sorriso imbatível estampado no rosto cicatrizado.
Ele estava de volta na Cambridge High School.

resolveu almoçar do lado de fora do refeitório naquele dia, estava querendo se livrar dos olhares das pessoas e também respirar um pouco de ar fresco depois das aulas da manhã. Não estava sendo difícil pegar o ritmo da Cambridge, porque as aulas no internato eram no mesmo formato da escola, mas ela estava cansada.
Sentou-se embaixo de uma árvore e abriu o pacote onde estava seu almoço: sanduíche natural e um suco de laranja. Não estava com tanta fome assim, mas comeria por amor a Joanne.
A garota não percebeu a silhueta masculina que se aproximava dela, pois estava distraída demais escolhendo uma música no seu iPod, portanto, tomou um susto quando percebeu a sombra do garoto que estava em pé, bem perto dela.
— Quer me matar de susto, inferno? — Perguntou nervosa para a cabeleira plantada na sua frente.
— Desculpa... — sussurrou. — , eu não tenho muito tempo. Não posso ser visto falando com você.
A garota tentou fingir que aquilo não tinha a magoado, então sua expressão permaneceu inalterada, após o susto.
— Posso ir à sua casa hoje à noite? Precisamos conversar.
se limitou a balançar a cabeça, sem entender muito bem, mas não iria negar.
— Tudo bem, então. — sorriu encantador e saiu correndo, olhando para os lados para checar se não tinha sido visto.
Pelo canto do olho, viu que Meredith a observava, mas deu de ombros, ela não era uma ameaça.
O que será que queria falar com ela? Por que ele tinha se dado ao trabalho de se esgueirar correndo o risco de ou verem? Ela não era boba, sabia que conversar com ela não agradava os outros dois e de forma alguma se colocaria entre eles. Eles eram os melhores amigos de , não ela. Pelo menos, não mais.

— SURPRESA! — ouviu as vozes distantes gritarem, enquanto ela tentava focalizar seus olhos nos quatro pontos diante dela.
?
— Não acredito nisso! — Ela ouviu o sibilo raivoso de , mas não conseguiu responder.
Estava completamente drogada. Era seu aniversário de dezesseis anos e ela estava se entupindo de drogas, desde o momento em que pulou o muro da escola, junto de Damien, até receber o telefonema de , chamando-a para ir para casa dela.
Ela ainda não tinha recebido nenhum “feliz aniversário” dele e nem dos amigos. Apenas de seus pais, da empregada e do mordomo de sua casa — e agora ela tinha percebido o porquê: após algumas sacudidas da melhor amiga, conseguiu enxergar uma grande faixa escrita “Happy 16th, !” e um bolo rosa com uma vela.
Ela tinha ganhado uma festa surpresa. E não estava em condições de nem saber seu nome completo.

estremeceu ao lembrar daquele dia. Ela odiava a pessoa que ela tinha sido no passado. Lembrava-se que naquele dia a tinha colocado na água fria para um banho, enquanto e tiravam a decoração e Lily-Anne chorava encostada no batente da porta do banheiro.
No outro dia, todos a acolheram quando ela chorou pedindo desculpas — era sempre assim depois de uma recaída.
Os pais dela não sabiam ou se faziam de cegos, mas sempre dava um jeito de se safar deles, para que não a colocassem em uma reabilitação. Ela os fazia acreditar que tinha controle de si mesma e que tinha parado. Sabia que os amigos não traíram sua confiança a delatando, porque sabiam que talvez seria pior para ela. Mas eles estavam cansados de limpar a bagunça que deixava. Agora ela tinha consciência disso.

Ei, ! — Ouviu Meredith gritar seu nome. — Vai se atrasar pro treino! Hoje temos seleção para as reservas! Vamos! — A garota saiu rebolando e revirou os olhos, ela odiava os dias de seleção, mas era obrigada a estar lá, pois era uma das líderes do time.
Sempre odiava as seleções, porque as pessoas que sempre sonhavam em entrar para a torcida, mas não tinham jeito nenhum para coisa, adoravam ir para lá para se humilhar. Costumava ser o passatempo favorito da ex-melhor amiga de , e a mais nova logo percebeu que estava lá, sentada nas arquibancadas com fones de ouvido e uma feição feliz no rosto. Ela adorava ver as pessoas pagarem mico.
sentiu uma ponta de tristeza, pois sentia tanta saudade da amiga, sabia que tinha deixado cicatrizes irreparáveis nela e só queria uma chance de se desculpar por tudo, mas sabia que era praticamente impossível que desse abertura.
— Temos muitas garotas hoje e precisamos liberar o campo para o time de futebol, então vamos começar logo! — Meredith estava um poço de irritação. Não era os dias preferidos dela também.
A mesa de juradas era composta por , Meredith e Caroline, uma garota alta, que tinha vindo de Bolton. A mesa estava bem no meio do campo de futebol e as candidatas para os testes estavam enfileiradas perto do gol. Cada uma delas deveria ir para um pouco à frente da marca do pênalti e fazer a coreografia que Caroline ensinou. Era uma coisa simples, que qualquer uma que queria ser torcedora deveria saber. De todas as garotas, cinco seriam selecionadas.
respirou fundo e se sentou, sabendo que seria uma longa tarde.

estava decidido a fazer com que voltasse ao time de futebol e esse era o dia perfeito: o time iria selecionar novos jogadores e o garoto já tinha dado um jeito — com uma pequena ajudinha do pai, que era o diretor — de convencer ao treinador de aceitar de volta ao time. Todos sabiam que ele era o melhor camisa 10 que aquele colégio já teve, talvez até melhor que o seu pai, que tinha seu nome estampado em grande parte dos troféus da escola.
O futebol era uma entidade na Cambridge.
estava animado e sabia que era uma coisa que precisava, apesar de tudo que tinha acontecido no passado. Todos entendiam que o momento era propício para que o garoto saísse dos eixos.
— Achei que ia te encontrar aqui... — sorriu para , que semicerrou os olhos e soprou a fumaça de seu cigarro para cima. — Eu sei que você já deu esse assunto por encerrado… — o garoto mexeu nos cabelos desconfortavelmente e o amigo rolou os olhos, já sabendo o que viria a seguir. — Mas hoje temos testes para o time e… nós precisamos de você, ! Você sabe que é o melhor.
— Sem chance. — deu mais uma tragada e balançou a cabeça negativamente.
— Futebol era a sua vida, !
Era. Morreu! — respondeu secamente e baixou os olhos, com as mãos nos bolsos. Não sabia o que dizer para convencer o amigo.
— Talvez você só tenha perdido o jeito... — reconheceu a voz ácida atrás de si e se levantou num pulo para encarar Damien Lockwood.
— O que você está fazendo aqui? — perguntou entredentes, enquanto pisava na bituca de cigarro para se juntar ao amigo.
— Eu decidi voltar e trazer um pouco de diversão para Cambridge. — O garoto da cicatriz sorriu. — Talvez eu tente entrar pro time, eu sou um bom goleiro... — Damien alargou o sorriso. — Mas você, … — disse o nome de com desprezo. — Você sempre me pareceu meia-boca… — sabia que ferir o ego de era um bom negócio, o garoto, apesar de tudo que tinha acontecido, ainda tinha um pouco de dignidade e autoconfiança. — Você está com medo? Ou é porque não quer ver a torcendo para você? Ela até que fica bem gostosinha com aquele uniforme, não é mesmo? — Damien passou a língua nos lábios, como se saboreasse a imagem de , o que deixou enojado.
— Cala a boca, Lockwood! — Fez que ia avançar em cima do mais velho, mas o segurou pelo braço.
— De qualquer forma... — Damien continuou, sem se abalar com . — Você deve ser barrado no antidoping. — Riu, entregou um baseado para e simplesmente saiu andando dali com as mãos nos bolsos.
assistiu incrédulo pegar o cigarro de maconha e colocar na mochila.
— Você é inacreditável. — Rolou os olhos e deixou sozinho.
sabia que magoava os amigos com aquela atitude, mas ele sabia se controlar, não era igual a do passado. Tinha dado algum trabalho depois da morte da irmã, mas agora ele estava entrando nos eixos novamente. Ele sabia que no fundo uma das coisas que ele mais sentia falta era da adrenalina dos jogos de futebol e da sensação de fazer um gol em uma partida importante, mas ele não queria reviver aquilo, principalmente agora que estava na escola e no time das líderes de torcida. Ele não estava afim de repetir a história antiga. Mas também sabia que isso agradaria seus amigos. E talvez seus pais e sua irmã, onde é que eles estivessem.
pegou o baseado que Damien o entregou e jogou na lata de lixo mais próxima, após isso, caminhou a passos largos para o campo de futebol.
— Foi fácil. — Damien sussurrou de onde estava observando o garoto.
Sorrindo, ele continuou seu caminho até sua próxima aula. Ainda não era hora de aparecer no campo.

Para o alívio de , os testes estavam quase acabando, faltavam agora apenas duas meninas.
Olhando de relance, viu que o time de futebol já chegava no campo com um monte de meninos atrás, pois também fariam seus testes hoje.
Ela estava exausta e morrendo de fome, tinham passado a tarde toda ali e encontrado apenas três meninas que realmente valeriam a pena assistir.
ainda estava ali, dessa vez estava deitada na arquibancada, ainda com os fones no ouvido. Em alguns momentos dos testes, a olhava, a garota ria e batia palmas como costumava fazer quando estava se divertindo. Em uma dessas, deixou um sorriso escapar ao mesmo tempo em que a ex-amiga a olhou de relance. desviou o olhar na hora e abaixou a cabeça.

— Bom, foi pior que eu imaginava! — Caroline suspirou derrotada, depois de dispensarem a última garota e concordou com a cabeça, só queria ir pra casa. — Pelo menos agora vamos limpar os olhos com o treino dos meninos. — Ela sorriu marota.
— Eu vou dispensar e ir pra casa. — sorriu cansada.
— A tem o só pra ela, não precisa acompanhar os treinos... — Meredith disse, fuzilando com os olhos.
— Não sei do que você está falando, Meredith. — rolou os olhos, decidindo fingir de desentendida.
— Sortuda, o garoto é um gato! — Caroline piscou para , ela sabia bem que Brown só queria provocar a menina.
se despediu das garotas e caminhou em direção ao portão da escola, para tanto, ela precisava passar por onde os garotos do time estavam. Entre eles, ela reconheceu os cabelos loiros de , ele parecia estar inquieto, como se não tivesse certeza se queria estar ali ou não. esperava que ele voltasse para o time de futebol, torcia muito por ele e sabia do potencial do ex-namorado. Estar no time era uma das coisas que ele mais amava na vida e ela também tinha tirado isso dele. Agora, ela esperava que ele recuperasse pelo menos uma parte da sua alegria jogando, e ela ficaria feliz em torcer por ele de longe.
Quando chegou no portão, o motorista da família, William, já estava a esperando do lado da porta. Ela não iria mentir, gostava de ter um motorista que a levasse onde quisesse, já que odiava dirigir, embora tivesse ganhado um carro aos dezesseis anos, mas também se sentia controlada o tempo todo por Emma por conta disso. Onde ia, tinha o motorista para vigiá-la. William era um homem muito simpático, educado e solícito, mas também era um tanto quanto fofoqueiro.
— Como foi a aula, senhorita? — Sorriu para a garota, enquanto abria a porta do sedã para que ela entrasse.
— Ótima! — Sorriu e entrou no carro.
Ela estava feliz de ter sobrevivido até ali sem maiores emoções na escola. Esperava que continuasse assim e ela pudesse resolver, a longo prazo, as pendências que tinha.

nunca tinha se sentido tão vivo como estava se sentindo agora. Tinha acabado de fazer um teste espetacular! Não estava nem de longe na sua melhor forma, mas tinha jogado excepcionalmente bem e carimbado sua vaga no time.
Saiu do campo para o vestiário empapado de suor e com os pulmões e garganta queimando pelo esforço, ia ser um trabalho enorme conciliar o futebol com o cigarro.
— Eu sabia! Vamos ser imbatíveis nesta temporada! — parecia uma criança de cinco anos do seu lado, pulava e sorria empolgado.
O futebol também era uma grande paixão dele e ele amava o entrosamento dele e em campo.
e correram para que Rooney e Cristiano Ronaldo pudessem andar! — O garoto riu da própria piada e o acompanhou.
Aquele, com certeza, estava sendo o melhor dia do ano.
Os dois amigos entraram no banho, a fim de irem logo para casa.

Quando chegaram, já estava lá, como se a casa fosse dela, cozinhando na cozinha e cantando distraída. Os amigos aproveitaram para lhe dar um susto.
— Eu odeio vocês mais que tudo, filhotes de demônio! — latiu para os dois garotos, que quase morriam de rir na cozinha. — Posso saber o porquê do estardalhaço?
— Você está olhando para o mais antigo-novo camisa 10 do time da Cambridge High School! — disse, após de se recuperar da crise de riso, sendo golpeado por um abraço apertado da melhor amiga.
— Essa é a melhor notícia que eu poderia ter recebido hoje! — A garota abraçou o amigo apertado, estava tão feliz, que poderia explodir a qualquer momento. — Estou cozinhando enchiladas de frango!
— Eu acho que quero me casar com você... — abriu um enorme sorriso e beijou a bochecha da garota.
estava radiante, mas uma parte dele queria muito que os pais e a irmã estivessem ali. Ele nunca parecia estar feliz e bem o suficiente, sempre parecia que estava faltando uma parte. Era um vazio que nunca era preenchido.

estava há uma hora e meia ininterrupta ouvindo sua mãe tagarelar sobre o próximo evento da cidade: A Dança dos Anos 50. Era um evento promovido pela escola, obrigatório para todos os alunos e que o conselho dos pais fundadores organizava — e é claro que Emma era chefe do conselho. Ela estava radiante e já tinha comprado as roupas que ela e a família usariam para a festa que seria dali três semanas.
fingia que ouvia tudo, mas ela só queria ir para cama, já passava das dez e ela não estava se sentindo bem, estava ansiosa, porque tinha dito que iria vê-la para falar sabe-se lá Deus o quê e ainda não tinha dado sinal de vida.
Talvez tivesse esquecido ou então, uma vozinha disse na cabeça da garota, lembrou que ele deveria odiá-la e não dar explicações.
— Tudo bem, mamãe! — Disse com certo desespero. — Mal posso esperar! Mas estou muito cansada, posso ir pra cama? — Tentou sorrir de forma convincente.
Emma a olhou um pouco decepcionada, mas não fez caso.
— Boa noite, durma bem! — Deu um beijo na testa da filha, que já se levantava. — Seu pai deve te buscar na escola amanhã, ele vai pegar o voo de volta pra casa por volta das seis horas! — Informou e sorriu, estava com saudades do pai, que tinha novamente viajado para negócios.
A garota subiu para o quarto e resolveu tomar um banho, já tinha tomado um ao chegar do colégio, mas agora precisava relaxar para conseguir dormir bem. Nunca pensou que estaria inquieta e atormentada por causa de , mas ela estava curiosa sobre o que o garoto precisava falar com ela.
se sentiu melhor depois do banho quente, penteou seus cabelos em um rabo de cavalo e passou hidratante pós-banho após vestir seu pijama — um simples baby-doll azul. Ao sair do banheiro, ouviu um barulho na sua janela e foi olhar o que era: estava lá embaixo, jogando pedrinhas em sua janela. riu baixinho sobre a ironia daquela cena, parecia que ela estava em uma cena de filme.
Ela abriu a janela e esperou, em uma distância segura, que pulasse a janela. Ele pulou sem maiores dificuldades e sorriu para , estava com os cabelos bagunçados como sempre e um olhar triste, apesar do sorriso no rosto.
— Você sabe que tem uma porta da frente? — sussurrou.
— Por aqui é mais divertido. Posso me sentar? Acho que estou tonto... — admitiu e quando a garota assentiu, ele se sentou em uma poltrona que havia no quarto enorme da garota.
Não tinha estado muitas vezes ali, mas era o quarto dos sonhos de qualquer menina.
— Então… — incentivou, depois de um tempo em silêncio.
Ela estava muito inquieta para se sentar, então cruzou os braços sem jeito e ficou em pé. De frente para ele, não tão perto e nem tão longe.
… Depois do acidente no sábado, eu quis muito vir ver você, mas e … eles…
— Eu entendo! — A garota o interrompeu. — Eles me odeiam e com razão, , e, sinceramente, não sei como você não sente o mesmo.
— Eu não consigo achar que você é culpada como eles acham, . — admitiu, baixinho. Ele parecia ter uma luta interna.
Aquelas palavras comoveram a garota de uma forma muito grande, de repente, um nó se formou em sua garganta e ela sentia que a qualquer momento poderia começar a chorar. Ela não estava esperando aquilo.
— E eu não queria… não queria ter que me esgueirar para falar com você, mas e , eu não posso decepcioná-los…
— Eu entendo, de verdade! — se forçou a falar, limpando a garganta. E ela realmente entendia, parecia estar sendo sincero e ela nem imaginava como era difícil estar naquela situação
— Mas eu também entendo que eu não devo virar as costas para você, . — Ele vomitou as palavras, com medo que não tivesse mais coragem de dizê-las. — Eu pensei, pensei…
— Em…? — o encorajou, mudando o peso de uma perna para o outro.
— Pensei em me esgueirar por aqui, de vez em quando, para saber como você estava… e… na escola também, e… nós podemos conversar por mensagem… — ele sugeria desajeitado as opções escassas que eles tinham. — Eu não quero que você se sinta mal por isso, mas… me parece o único jeito.
— Por que você se importa? — sussurrou, estava feliz com a preocupação dele, mas ela não entendia muito bem por que ele estava fazendo aquilo. — Você não me deve nada…
— Acredite, ... — se levantou, aproximando-se da garota e tocando levemente seu braço com a ponta dos dedos. — Eu não quero deixar você sozinha. — Sussurrou a última parte, pegando as mãos de e colocando sobre seu peito.
A garota respirava com dificuldade, não estava entendendo onde ele queria chegar

I love it when our hands touch, knowing that i’m near... — Ele cantarolou Little Joanna, a música que há poucos dias ele tinha admitido que havia escrito para ela.
respirou fundo e tentou juntar as palavras certas para dizer, aquilo era errado, ela sabia que era. Não sabia por que o garoto estava agindo daquela forma, mas não negava que estava sentida com aquilo, ela sempre se sentia imersa naquele ódio e ressentimento, e parecia verdadeiramente se importar com ela.
, eu não… — mas antes que terminasse, sentiu as mãos do garoto na sua nuca, e antes que pudesse protestar ou reagir, ele encostou os lábios nos dela, beijando-a suavemente.



Capítulo 8

Quando o jovem Newland Archer entrou no camarote do clube, a cortina acabava de abrir-se sobre a cena do jardim. Não havia motivo para ele não ter chegado mais cedo, pois jantara às sete, só com a mãe e a irmã, e depois se demorara com um charuto na biblioteca gótica de luzidias estantes de nogueira negra e cadeiras com encosto entalhado, que era o único cômodo da casa onde mrs. Archer permitia que se fumasse… SENHOR ! — A professora Donovan interrompeu tão alto a leitura da peça, que todos que estavam no auditório se assustaram. — NÃO É PARA ACENDER O CHARUTO DE VERDADE! — Exclamou e riu baixinho.
Ele tinha feito isso para provocá-la.
— Desça já daí, acabamos por hoje! — Ela balançou a cabeça negativamente, enquanto o garoto descia do palco. — Onde está a ? — Rodeou os olhos pelo auditório, mas não estava ali.
Ela tinha se atrasado para a escola, porque não tinha conseguido pregar o olho à noite depois do beijo de … que tinha terminado tão abruptamente como começou. O garoto simplesmente se afastou e disse rapidamente antes de pular a janela de volta: “te vejo amanhã!”. não teve tempo de ter qualquer reação, e por isso, ficou matutando a situação e o que faria no dia seguinte até três da manhã, quando finalmente foi vencida pelo cansaço. Por causa disso, a menina corria para o auditório, a fim de conseguir pegar pelo menos metade da aula de literatura. Os ensaios começariam naquela manhã e ela tinha certeza que a senhora Donovan ficaria irritada com ela.
Os corredores não estavam tão cheios, já que o primeiro sinal já havia tocado há vinte minutos, mas, ainda assim, em sua correria desatenta, acabou esbarrando em uma pessoa e caindo no chão.
— Oh, oh, me desculpe! — Disse, desconcertada, tentando pegar seus livros ao mesmo tempo que viu a mão do garoto estendida para ajudá-la a levantar. Mas quando viu quem era, recuou e se encolheu.
Era Damien.
— Ora, … foi você que esbarrou em mim, estou sendo gentil aqui! — Lockwood sorriu, mas seus olhos não acompanhavam a boca. Seu olhar ainda era frio.
— Não preciso da sua ajuda. — murmurou baixo e juntou seus livros, agora caminhando atordoada para o auditório.
Não se importava mais com a aula. Só queria saber o que aquele garoto estava fazendo ali. Será que ele tinha voltado para a escola? Por quê?
não percebeu que as lágrimas desciam pelo seu rosto e que ela tremia, estava atordoada demais para perceber as reações de seu próprio corpo. Por isso, acabou tropeçando de novo em alguém. Quando olhou para cima, não podia acreditar no seu azar.
— Desculpe. — Sussurrou para , que balançou a cabeça positivamente sem olhá-la, e seguiu seu caminho.
É claro que ele tinha percebido que ela estava chorando e tremendo, mas não nem pensou na possibilidade de ampará-la. Ele não tinha nada a ver com a garota mais. Tinha decidido simplesmente ignorar que ela existia ou que tinha voltado para escola. Então, a melhor forma de ficar bem, era ignorando-a e tentando se comprometer o máximo possível com o futebol, que era uma coisa que gastava energia e o impedia de ficar pensando o tempo todo na garota que lhe provocava tanto ressentimento.

— Ora, ora, senhor … — ouviu uma voz feminina conhecida e girou os calcanhares para encaminhar à senhora Gilbert. — Venho esperando sua visita há muito tempo. — Sorriu e deu uma piscadela para , que mudou o peso de um pé para o outro, envergonhado.
A mulher alta e loira era a psicóloga do colégio, que tinha ajudado a sua irmã mais nova, quando ela teve problemas alimentares.
— Não tive tempo, senhora Gilbert. — murmurou.
Ele andava fugindo da psicóloga desde a morte da irmã. Não gostava de se sentir vulnerável e muito menos admitir que precisava de ajuda.
— Bom, eu creio que você tem um tempinho agora, antes de sua próxima aula, huh? — Ela sorriu, sabia muito bem como ser persuasiva. E não teve outra escolha senão caminhar lado a lado com a psicóloga para sua sala.

— O que ele está fazendo de volta na escola? — O garoto de moletom vermelho rosnou para o mais velho, que o encarava divertido.
— Eu precisei colocá-lo lá de volta, para poder monitorar de perto. — A voz dele era grave, perigosa; capaz de causar arrepios em quem estava de volta.
— Ele me assusta! — A garota que estava sentada à direita do menino se pronunciou pela primeira vez.
— Não quero saber o que vocês pensam… eu chamei vocês aqui por outro motivo. Quero notícias da . Precisamos ficar na cola dela. — O mais velho disse, sua voz grave se espalhava pela sala pequena como um trovão.
— Ela continua de bico fechado?
— Quantas vezes eu preciso repetir? — A garota disse, impaciente. — Ela não se lembra! É uma tapada!
— QUANTAS VEZES FOR NECESSÁRIO! Você não entende, sua estúpida? Se ela se lembrar, TUDO vai por água abaixo. E você, Meredith Brown, será a primeira a cair do cavalo.

estava sentada na pia do banheiro do segundo andar. Não tinha entrado no auditório para justificar o atraso para a senhora Donovan. Não tinha soltado seus livros. Não tinha parado sequer um minuto de chorar.
Ela já devia ter se acostumado com a presença de Damien, já era a terceira vez que ela o via desde que tinha voltado, tinha ido até a casa dele! Mas, ainda assim, a energia que ele lhe passava era muito pesada. dividia a culpa de tudo que tinha acontecido entre ela e Damien. Ele a tinha colocado naquele caminho sem volta. Ele a tinha oferecido o primeiro baseado, o primeiro comprimido. Era tudo culpa dele.
A garota estava tão entorpecida, que não ouviu o barulho da porta indicar que alguém entrava. Era . Ela estava maravilhosa, como sempre. Seus cabelos longos estavam presos em um rabo de cavalo e ela usava meias até na canela com um coturno preto. Uma das únicas pessoas da escola que conseguia ficar estilosa com aquele uniforme horrível.
a encarou por um minuto, mas não via muita coisa, as lágrimas embaçavam sua visão.
— Quando é que você vai parar com essa pose de coitada? — exclamou, assustando a garota.
— Como é?
— Não se faça de sonsa, … eu não acredito nesse teu teatro.
— Não estou fazendo nada para que você acredite em mim, ! — se irritou, estava cansada daquilo tudo, cansada de olhares a acusando. — Você me vê rastejando atrás de você? Não! Me vê indo chorar na sua frente? Também não! Você entrou aqui, eu não fui atrás de você! Você não precisa falar comigo, eu sei que você me odeia, sei que nada que eu disser será suficiente para você, mas você não precisa entrar aqui e vir me acusar e apontar dedo na minha cara! — Cuspiu as palavras e viu a encarar boquiaberta, havia choque no seu rosto, mas seus olhos eram tristes.
Ela abriu e fechou a boca várias vezes, tentando encontrar uma resposta, mas não conseguiu.
— Eu não matei Lily-Anne. — sussurrou e a ex-amiga estremeceu ao ouvir a voz da irmã de . — Eu juro que não. Não fui eu.
— Prove. — sussurrou quase inaudivelmente e saiu do banheiro, batendo a porta e continuou ali, reunindo forças para ir pra próxima aula.
Ela não estava feliz com aquela situação e por ter explodido com . Se fosse ao contrário, provavelmente ela teria a mesma reação da ex-melhor amiga ou até mesmo pior. não devia nada a ela, mas estava cansada de ser apontada. Todos haviam presumido que ela tinha sido culpada, mesmo que não tivessem provas e ninguém lhe deu uma segunda chance. Ninguém lhe deu a chance de explicar. Ninguém acreditava nela. E, para piorar, ela não se lembrava de praticamente nada daquela noite. Estava sozinha. E não tinha ideia de como provar para as pessoas que ela amava que ela não tinha sido culpada. Mas teria que arrumar um jeito.
— Não vou carregar essa culpa pra sempre. — Sussurrou para si mesma e desceu da pia, pronta para lavar o rosto e retocar sua maquiagem para a próxima aula. A mais temida: Cálculo II com a senhora . A aula que ela fazia com .

Depois da conversa que teve com a senhora Gilbert, teve certeza que só conseguiria suportar a aula de Cálculo II se ele estivesse chapado. Muito chapado. Ele ainda não tinha encarado a senhora depois do último escândalo na aula dela, mas sabia que a professora estava brava e ao mesmo tempo assustada com ele. O garoto sabia que devia um pedido de desculpas a ela, como a senhora Gilbert tinha reforçado, mas também conhecia a professora o suficiente para saber que ela lhe daria uma lição de moral na frente da turma inteira. Ela era mestre nisso.
Mas ele também queria ficar chapado, porque não queria sentir o ódio que sentiu da última vez que entrou naquela sala de aula. As lembranças estavam borradas — lembrou-se que mal enxergava em meio às lágrimas. Aquela filha da puta.
A psicóloga tinha o ajudado a analisar a situação com frieza e agora ele não tinha tanta certeza que ela tinha mandado a mensagem (para além disso, ainda não tinha conseguido rastrear o número e muito menos recebido outro texto). Ele não duvidava que tinha dedo dela nisso, mas Gilbert tinha levantado um bom ponto, quando observou que não seria burra de tentar convencê-lo que não tinha matado sua irmã por meio de um caralho de mensagem de texto. Ela tinha insistido para desse uma chance de ouvi-la, mas o garoto sentia tanto ódio e rancor, que essa possibilidade não lhe passava pela cabeça, nem com a psicóloga tentando dissuadi-lo.
Toda vez que ele pensava nisso, só conseguia lembrar de Lily morta na calçada. Na calçada da última pessoa que esteve com ela: .
A teoria de era que a ex-namorada tinha forçado sua irmãzinha a usar drogas com ela, não era tão difícil de acreditar nisso! E como Lily não era forte ou sequer acostumada com o veneno quanto , uma boa dose seria suficiente para que a mais nova tivesse uma overdose. E foi isso que aconteceu. O laudo médico era claro: overdose por abuso de substâncias químicas.
não tinha forças para confrontar . Não tinha vontade de vê-la ou ouvir sua voz. Mas sabia que em algum momento ela tentaria falar com ele e no fundo, o garoto sabia que ela lhe devia explicações e que ele devia ao menos ouvir, mesmo que não acreditasse em nenhuma das palavras que saísse da boca dela.
Ele terminou o segundo baseado, esperou um pouco para que a leveza da maconha o alcançasse e seguiu para a sala de aula. Estava atrasado.
caminhou lentamente e quando entrou, não se esforçou muito para olhar em volta, sabia que ela estava lá.
— Bom dia, senhora ! — Falou lentamente, não muito perto da professora para que ela não sentisse seu cheiro.
Ela era uma mulher bonita, no máximo quarenta anos, tinha olhos muito verdes e uma feição brava, mas era uma ótima professora. Seu filho, , estudava com eles desde quando se mudaram para a cidade, quando o menino ainda era criança.
— Bom dia, senhor . — Ela respondeu sem sorrir, com um olhar enigmático. — Eu espero que tenha se recuperado do seu… episódio.
— Sim, professora. E eu quero te pedir desculpas por aquilo. — disse, de má vontade. — Foi imperdoável.
— Acontece! Só mantenha sua cabeça no lugar, . E eu vou fingir que não estou sentindo o cheiro de maconha daqui. — Deu uma piscadela, um sorriso seco para o adolescente e abanou a mão para que ele se sentasse.
riu e balançou a cabeça negativamente, indo se sentar no seu lugar.
— Bom dia, pessoal! — Senhora prendeu a atenção de todos os alunos. — Como as notas de vocês estão péssimas… eu resolvi fazer uma pequena mudança na aula de hoje: teste surpresa! — A fala da professora foi acompanhada por inúmeras reclamações e vaias dos alunos que sentavam no fundo da sala.
— Como você quer que nossas notas melhorem com um teste surpresa? Não faz o menor sentido! — Caroline protestou e a professora agitou as mãos para que todos se calassem.
— Vai ser um teste valendo pontos extras para aqueles que precisam de notas mais altas, como você, senhorita Forbes, que devia saber que quem está com a corda no pescoço deve sempre estar preparado para um teste. — Seus olhos cintilavam para Caroline, que baixou a cabeça. — Vocês farão em duplas para poderem se ajudar e se eu pegar qualquer um de vocês tentando colar, vou dar nota zero para a turma inteira! — Dito isso, as pessoas começaram a se organizar em duplas.
permaneceu parado, encarando o quadro em branco, que pareceu extremamente interessante e só foi cair em si, quando a professora parou ao seu lado e abaixou para sussurrar:
— Senhor , sua dupla habitual não achou importante vir à aula hoje... — ela se referiu a , que ainda não tinha aparecido na escola. — E temos uma pessoa que também está sem dupla, você faria uma grande coisa em ter como sua dupla ou pode fazer o favor de conviver com a garota apenas para o teste? — Ela estava muito séria e pronunciou as palavras com muito cuidado.
olhou para cima e depois direcionou o olhar para o lugar que sentava, ela não olhava para ele, mas ele viu os dedos da garota tamborilam e as pernas se mexendo irritantemente, ela estava nervosa.
respirou fundo muitas vezes antes de responder, quando finalmente disse:
— Tanto faz! — Mas se arrependeu logo em seguida quando viu a senhora fazer o movimento com a mão chamando e a garota se levantar, levando sua mesa e cadeira com cuidado.
A turma inteira parou de sussurrar para observar a cena, as pessoas olhavam incrédulas e algumas com expectativa de que surtasse novamente, mas ele apenas abaixou a cabeça.
— Voltem suas atenções para o teste! — A professora ralhou e a sala voltou para os sussurros das duplas conversando.
se sentou e reparou que ela estava tremendo. Ele ainda não tinha decidido se ia falar com ela ou não, estava difícil pensar. Então ficou calado.
— É só um teste. — Sussurrou, quando a garota pegou a caneta, mas deixou cair logo em seguida.
— Você não é assim!
Ele a ouviu sussurrar para si mesma e franziu a testa, mas decidiu não falar nada.
Assistiu a garota escrever seus nomes no teste com uma caligrafia impecável e depois ela começou a fazer, sem nenhuma dificuldade. sabia que se estivesse fazendo a prova sozinho, provavelmente levaria um zero bem redondo. Cálculo não era sua praia, o garoto era totalmente das humanas e do esporte. Dessa forma, ele continuou calado, fingindo que estava observando a garota fazer o teste, enquanto estava se concentrando ao máximo para não se perder no cheiro dele: o perfume habitual misturado com um cheiro que ela não tinha costume de sentir vindo de — maconha.
Ela não o encarou por nenhuma vez, com medo de que os olhos azuis do ex-namorado se voltassem com ódio para ela como da última vez.
terminou mais rápido do que esperado, já que tinha visto a matéria no internato, não teve dificuldades em finalizar o teste sem ajuda. Depois de ponderar por uns bons minutos, ela resolveu se arriscar. Primeiro, respirou fundo duas vezes, depois forçou sua mente a não chorar, seja qual fosse a resposta e reação do garoto, mas seu queixo caiu um pouco quando ela disse:
— Quer conferir? — Arrastando a prova para ele e o garoto respondeu com a voz arrastada:
— Não posso dizer que confio em você, mas não temos outra escolha. Então…
— Ok… — se levantou e entregou o teste para a professora, que a encarou com aqueles olhos enigmáticos, mas não disse nada.
A garota voltou calmamente para o lugar, pegou a mesa e a cadeira e colocou de volta no lugar de origem, juntou suas coisas e saiu da sala. Um nó enorme já se formava na sua garganta, mas ela estava se recusando a chorar. Já tinha chorado demais por um dia.
Antes de virar o corredor à esquerda, sentiu seu braço ser puxado e por um segundo antes de ver quem era, a garota pensou que era Damien e seu coração saltou, mas era muito pior: era . O garoto estava vermelho e sua pupila estava dilatada.
— O que… — ele parecia estar tendo uma luta interna muito grande, mas respirou fundo e terminou: — O que aconteceu naquele dia?
ficou um pouco chocada com a pergunta que nunca tinha sido feita. Desde o acontecido, só tinha a xingado e acusado (com razão), mas nunca a tinha perguntando o que realmente tinha acontecido. E foi por isso que ficou tão nervosa.
— Eu… eu não me lembro. Só tenho alguns flashes na minha cabeça e… ... — ela disse o nome dele e logo se arrependeu, pois percebeu que o garoto ficou nervoso.
As narinas de inflaram e o garoto ficou mais vermelho ainda.
— Mentira!
— EU NÃO ESTOU MENTINDO! — explodiu, assim como tinha feito com no banheiro e viu arregalar os olhos por um segundo. — Você NÃO estava lá, você NÃO sabe. Eu não me lembro, porque eu estava DROGADA, . Você é estúpido? Eu estava DROGADA e não há um dia que eu não me arrependa do que tenha acontecido! — Agora, o nó na garganta tinha se transformado em lágrimas, que caiam do rosto de , enquanto ela estava completamente vermelha.
também não estava muito diferente, sua cabeça doía e o efeito da maconha já tinha passado.
— Por que eu deveria acreditar em você?
— Eu não sei. — sussurrou e caminhou para o lado oposto dela.
Ele queria gritar. Berrar até não poder mais. Não estava aguentando mais.
— Lily morreu, . Lily morreu. Minha irmã. Minha irmãzinha mais nova. — Ele chorava copiosamente agora, acuado, encarando , que também chorava com seus braços cruzados, abraçando a si mesma. — Eu não posso. Eu não consigo nem olhar para sua cara. Não posso.
No corredor, só se ouvia os soluços dos dois. Não havia ninguém por perto. Só os dois, completamente machucados e perdidos.
, por favor! tomou coragem e estendeu o braço com a mão aberta, para que ele pegasse sua mão, mas o garoto balançou a cabeça negativamente, violentamente, andando alguns passos pra trás.
— Eu não posso, não consigo. — O garoto forçou suas pernas para longe de .
Ao vê-la vulnerável daquela forma, parte dele queria abraçá-la, acreditar nela, acreditar que tudo tinha sido um mal entendido, mas ele não conseguia. A dor e o rancor eram grandes demais. Não havia nada que pudesse fazer para consertar isso. não se lembrava mais de como era amar .

passou o resto do dia escondida atrás do palco do grande auditório onde as peças eram encenadas. Estava tudo escuro e a garota chorava abraçando as próprias pernas, sentindo-se inteiramente acuada. Chorou e soluçou tanto, que quando as lágrimas se secaram, ela não tinha mais forças, estava fraca e cansada.
A garota sentia quase uma dor física ao lembrar do momento que teve com . Ele a odiava. E ela ainda o amava. Amava mais do que tudo no mundo e sentia ódio de si mesma por ter estragado tudo.
— Você precisa se lembrar! Precisa se lembrar! — Ela batia na própria testa e puxava seus próprios cabelos, sentindo um misto de raiva, medo e tristeza.

— Faça uma lista de tudo que você se lembra daquele dia. — O psicólogo era paciente e observava a menina com serenidade.
— Eu não me lembro de nada…
— Se esforce!
— Eu me lembro de ir até Damien…
— Escreva, .
— Eu me lembro de, de… um guarda-roupas…
— E o que mais?
— Mais nada.
— Tem certeza?
— Tenho.
— Ótimo.

? — A garota saiu do devaneio, quando ouviu uma voz conhecida chamá-la.
— Como me achou aqui? — A garota perguntou para o garoto cabeludo, que sorriu e se sentou ao lado dela.
— Segui minha intuição. — Estava escuro demais para que eles se vissem com clareza, mas se sentou ao seu lado e acariciou o que ele achava que fosse a perna da menina.
… nós precisamos...
— Conversar, eu sei! Não devia ter te beijado daquela forma, foi imperdoável. Mas não posso dizer que me arrependo, .
— Por que você gosta de mim? — A garota perguntou com a voz falha.
Era uma pergunta muito sincera. Ela não entendia o sentimento do garoto por ela e muito menos achava que merecia.
— Por que eu não gostaria? — devolveu com outra pergunta e ficou sem resposta, apenas fitando os olhos verdes do garoto, que eram iluminados pelo único feixe de luz que entrava pela janela do auditório. — Eu não vou mais fingir que não sinto… isso. — disse as palavras cuidadosamente. — E também não vou esperar que você sinta o mesmo, mas… espero que eu possa te conquistar aos poucos, … eu sempre quis que você soubesse, que você me desse uma chance…
, eu não… eu não consigo ver você dessa forma! Sempre foi ! — conseguiu exclamar com seu coração doendo.
Ela sabia que seria mais fácil se ela conseguisse ser recíproca com . Era bom se sentir amada, era bom ter um abraço e um colo. Mas ela não podia se aproveitar disso, podia?
— Eu posso ser bom pra você, . — sussurrou. A mão que estava na perna da garota subiu para o seu rosto em um carinho encantador. — Me deixa ser bom pra você?
não respondeu, mas pegou a mão de e depositou um beijo suave. O que fez o garoto dar um sorriso maior que a cara. Ela não sabia se o que estava fazendo era certo, mas não estava em condições de recusar carinho naquele momento.
Patético. — Sussurrou a voz que os observava ali no escuro, sem que os dois o percebessem.



Capítulo 9

As semanas passaram voando depois dos últimos acontecimentos. não sabia muito bem o que estava acontecendo entre ela e , mas o garoto se esgueirava por sua janela quase todas as noites e lhe fazia companhia, além dos olhares furtivos que os dois trocavam quando se encontravam nos corredores ou se esbarravam durante o treino das líderes de torcida e do time de futebol. Até então, ninguém parecia desconfiar de nada e a garota estava feliz de poder contar com a presença dele, mesmo que soubesse que ele sentia mais por ela do que apenas amizade.
Não tinham se beijado de novo, apesar das insinuações de , mas não podia negar que estava passando a vê-lo de forma diferente agora. Ele era realmente um garoto bonito, apesar de toda aquela cabeleira desengonçada, seus olhos eram verdes e se fechavam quando ele sorria, além do belo corpo. Mas, ainda assim, ele não era nada em comparação a , de quem se lembrava o tempo todo.
Ela pensava nele e no momento que tiveram no corredor todos os dias. Estavam tão perto e mesmo assim tão afastados. A garota nunca imaginou que pudessem chegar naquele ponto. Apesar de tudo, sempre sonhou em se casar e ter uma família com . O garoto era o amor da vida dela. Mas agora tudo parecia arruinado, quebrado. Ela sabia que mesmo com a remota chance de ser perdoada por , eles possivelmente nunca mais voltariam a ficar juntos.
Os dois não se viram na escola além das aulas de Literatura, Cálculo e nos treinos. Faziam o possível para evitar o caminho e o olhar um do outro, o que deixava profundamente infeliz. Talvez por isso ela estava aproveitando tanto os momentos com . Ela não queria usá-lo, mas o garoto funcionava como uma espécie de anestésico. Quando estava com ele, as coisas não eram tão ruins.
Era nisso que ela estava pensando, enquanto caminhava distraída para mais um ensaio da peça. Estes iam de mal a pior: a atuação e o roteiro da peça estavam um desastre! O que forçou a senhora Donovan, com o aval do diretor , a contratar um diretor da Broadway para coordenar a peça do seu lado. É claro que isso a tinha deixado uma pilha de nervos, que estavam sendo descontados nos alunos.
jamais entenderia as prioridades daquela escola, estava fora da alçada dela, mas era totalmente previsível: Cambridge era um colégio de elite, as famílias queriam um espetáculo e era isso que elas teriam. O diretor não media esforços para manter os pais, principalmente os das famílias fundadoras, satisfeitos com o desempenho dos filhos na escola e as peças e eventos promovidos pela Cambridge High School sempre gozavam de muito luxo, o que explicava o preço abusivo da mensalidade.
— Vocês não conhecem uma coisa chamada horário? — O tal diretor da Broadway, Jean-Marc Natel, ralhou com os alunos, que assim como , entravam apressados no elegante auditório.
O homem estava vestido da cabeça aos pés no tom mais chamativo de verde e forçava um falso sotaque francês.
— Era só o que me faltava! Adolescentes… — ele apalpou um lenço (verde) em sua testa suada, enquanto senhora Donovan mantinha um sorriso amarelo no rosto, tentando não o desagradar mais ainda. — Eu espero que vocês conheçam o mínimo de arte… — começou a andar de um lado para o outro no palco, enquanto alguns alunos ainda se acomodavam nas cadeiras. — E tenham tido pelo menos a decência de ler o livro. — Olhou para cada um deles por cima do ombro e pareceu demorar seu olhar sobre , ou pelo menos essa foi a impressão que a garota teve. — Então…! — Bateu sua bengala no palco, fazendo algumas pessoas pularem de susto. — Quem é o meu senhor Archer? — Perguntou e se levantou timidamente, levantando o braço esquerdo. — Hmm, beau… — suspirou em francês e seus olhos pareceram pular de alegria ao observar o menino.
“Eu entendo a sensação”, pensou consigo mesma. era um cara difícil de resistir com aquele par de olhos azuis e etc.
— Perfeito! — O diretor acenou para que se sentasse e correu os olhos por toda a turma, novamente demorando seu olhar sobre , que se remexeu incomodada na cadeira.
O que ele queria com ela?
— Como eu suponho que vocês saibam… — Jean-Marc finalmente tirou os olhos da garota e continuou andando pelo palco. — A peça começa em uma ópera…

— Não acredito que conseguiu um atestado de “pânico de palco agudo”! — balançou a cabeça com raiva, enquanto saía do auditório acompanhada por . — E o pai dele é o diretor, pelo amor de Deus! — Ela estava indignada, enquanto o amigo a ouvia calado.
estava irritada com aquilo, mas não podia culpar o melhor amigo. O episódio com havia sido intenso demais para o garoto, que não tinha parado sóbrio durante a semana. Ela estava muito preocupada com ele e não queria que ele voltasse à estaca zero novamente.
— Ei! — Ela deu um peteleco na cabeça dele. — Que tal fazermos alguma coisa juntos hoje, huh? Um cinema? — Sugeriu e viu sorrir verdadeiramente pela primeira vez naqueles dias.
— Você sempre sabe o que eu preciso.... — deu um beijo no rosto da amiga e entrelaçou seu braço no dela.
— Ei! Me esperem! Eu também quero um beijinho. — Ouviram a voz de , que veio correndo atrás deles.
— Não! Traidor! — exclamou e deixou o queixo cair, ruborizando quando os amigos começaram a rir. — Você nos abandonou para fazermos papéis de bobos sozinhos na peça, ! — A garota explicou. — Seu crime só será perdoado quando você pagar as pipocas pra gente hoje à noite no cinema.
— Hoje à noite? — O garoto perguntou, coçando a cabeça, preocupado.
— Sim, por quê? Você tem algum compromisso? — perguntou, desconfiada.
— Não, não! — O amigo desconversou. — Eu encontro com vocês lá! — depositou um beijo no rosto de e um peteleco em , e saiu correndo em direção à sua próxima aula.
— Garoto estranho... — comentou, balançando a cabeça negativamente e observando o amigo sumir das suas vistas, enquanto ela e continuavam caminhando tranquilamente até a aula de Biologia.

Depois do estranho momento na aula de Literatura, não conseguia tirar o tal diretor da Broadway da cabeça. Sabia que estava agindo como louca, será que ela estava imaginando coisas e aquele era só o jeito dele, ou ele realmente a estava encarando mais do que o necessário? Aquilo a estava incomodando profundamente, precisava colocar para fora e conversar com alguém sobre o acontecido, mas só veria à noite, quando ele fosse para sua casa.
Os dois não se arriscavam conversar na escola, pois sabiam que ali as paredes tinham ouvidos. Então, passou o dia e a aulas completamente agoniada, até que chegou a hora de ir para casa.
saiu calmamente pelos portões, olhando para os lados procurando seu motorista, mas foi seu pai que ela encontrou! Ele não tinha voltado da viagem na outra semana, como prometido, mas agora estava ali, parado, encostado no seu carro esportivo com um enorme sorriso no rosto.
Joe era um cara muito bonito, sua aparência nunca denunciava que ele tinha quarenta e cinco anos e ele parecia um verdadeiro modelo. Seus cabelos grisalhos lhe davam um charme imenso, além dos belíssimos pares de olhos verdes que não tinha herdado.
— Papai! Que saudades! — A garota o abraçou apertado e foi retribuída.
Joe sabia que precisava ser mais presente pra filha.
— Fico feliz que você perdeu a vergonha de me abraçar na frente da escola, cricket! — Ele sorriu e abriu a porta para a garota entrar. — Vamos comer alguma coisa juntos? Quero te contar tudo sobre Tóquio! — Comentou e franziu a testa.
Ela amava seu pai mais que tudo, mas o conhecia tempo o suficiente para saber que ele só a levava para comer no seu restaurante favorito quando ele tinha más notícias para contar. Mas ela não ia se prender a isso, estava feliz demais com a presença do seu pai e sabia que resolveriam tudo, independente da notícia. Joe nunca vinha a ela com um problema sem solução.
Os dois optaram por ir à um McDonald’s, que ficava perto de sua casa, fizeram seus pedidos e se sentaram na mesa.
— Então, papai, qual é a má notícia? — resolveu tirar o band-aid rápido, senão sabia que Joe ficaria dando voltas tentando distraí-la.
— Você me conhece bem, né? — O pai da garota suspirou, parecia querer não tocar naquele assunto. — Você não tem nada a ver com a história, mas eu sinto que você gostaria de saber… sobre o acidente que aconteceu no dia da amostra dos fundadores. Eles fecharam o caso.
O coração de começou a palpitar loucamente e suas mãos ficaram geladas, ela sabia que tinha que se controlar para não acabar desmaiando de novo, mas suas lembranças vagaram para o jovem de olhos verdes que a abordou naquele dia e depois foi encontrado morto com um tiro no coração.
— O garoto se chamava Nicholas Martin. Ele era viciado em heroína e opioides… — Joe falava com muito cuidado, com medo da reação da filha. — Ele se suicidou, . Foi esse o veredicto da polícia. Ninguém sabe como ele chegou lá, ele não é conhecido na cidade, não vem de nenhuma família fundadora…
Suicídio? repetiu, confusa e assustada.
Para ela, não fazia sentido que ele a abordasse desesperado para lhe contar algo e logo em seguida cometesse suicídio, a não ser que ele fosse louco. E ele não parecia nada louco, estava desesperado, com um olhar urgente…
sentiu seu estômago embrulhar e sua cabeça doer. E se ele estivesse tentando avisar alguma coisa para ele e ela entendeu tudo errado? Mas ela não podia comentar aquilo com o pai dela, não tinha contado para ninguém que o garoto falou com ela antes de morrer.
— Filha? — Joe percebeu que estava pálida e apalpou a mão da filha, procurando trazê-la pra realidade novamente. — Não é culpa sua… essas pessoas, quando não têm ajuda, elas simplesmente…— mas ele não conseguiu achar as palavras certas. — Vem aqui! — Deu batidinhas no espaço ao seu lado e obedeceu, indo para os braços do pai, sem conseguir conter as lágrimas.
E se ela tivesse sido indiretamente responsável por outra morte?

•••

— Uau! — exclamou, quando entrou em seu carro. — Posso levar essa gatinha pra um encontro? — Piscou de um olho só para a amiga, que o olhou com desdém e desviou o rosto, mas depois voltou a olhá-lo e antes de dar partida, exclamou:
— Você é INACREDITÁVEL! — Berrou e socou o braço do melhor amigo. — Pra ir ao CINEMA, ?
— Eu estava me sentindo mal, ok? Cala a boca e coloca o cinto. — deu de ombros, o que deixou magoada, mas ela decidiu não revidar.
Os dois foram calados o caminho inteiro.

Quando chegaram ao shopping da cidade, que era uma piada comparada aos outros, a garota saiu andando na frente, após bater a porta do Corolla. Ele sabia que aquela raiva era momentânea, mas não deixou de se sentir mal. fazia de tudo por ele, era sua vida e ele a irritava daquela forma. Sabia o tanto que ela tinha sofrido com , na época que elas eram amigas, e o quanto a machucava repetindo os mesmos erros de . Mas ele sabia que tinha controle. Sabia que não faria nada para se machucar ou machucar outra pessoa. Ele só se sentia melhor quando estava chapado, era só isso.
Quando ele a alcançou, já estava com , os dois estavam na fila da pipoca, rindo e conversando animados.
— Me desculpe, ok? — Beijou o topo da cabeça da amiga, que fez um muxoxo com a boca, mas aceitou as desculpas, porque não queria estragar o momento.
franziu a testa, confuso, mas apenas abanou as mãos para que o amigo não se preocupasse.
— Olha só! — sorriu e mostrou uma mensagem no celular, que os amigos inutilmente conseguiram ler. — Alguém roubou as chaves da piscina da escola. — Riu — Estão nos chamando…
— Desde quando nos chamam para esse tipo de coisa? — franziu a testa para .
Desde que Lily tinha morrido, os dois não estavam mais no topo da pirâmide social da escola. Antes, eram um dos melhores anfitriões de festas e presença garantida em qualquer uma. Mas agora as coisas não eram assim mais.
— Desde que o papai voltou, né? — deu de ombros, sorrindo. Ele realmente era muito popular em Cambridge High School. — Vamos lá! Vocês dois estão precisando de alguma diversão... — ele sacudiu os ombros dos amigos.
Estava tão animado, que eles não tiveram coragem de negar. Saíram da fila do cinema e seguiram para a tal pool party.

Já fazia horas que estava sentada em seu quarto, olhando para o teto. As lágrimas já estavam secas, mas seu coração ainda doía com a notícia que tinha recebido. Ela se sentia culpada pela morte de Nicholas. Sentia-se responsável. Talvez se ela tivesse parado para ouvi-lo, poderia ajudá-lo. Mas agora não havia mais jeito, ela o tinha negligenciado e agora ele estava morto.
Só havia uma pessoa na qual ela queria falar naquele momento, mas não havia aparecido ainda. O relógio marcava quase onze da noite, quando a garota simplesmente desistiu e se levantou da cama, a fim de tomar um banho e se preparar para dormir.
Antes disso, pegou seu celular, onde Caroline, a amiga da torcida, tinha mandado uma foto com a seguinte mensagem: “Só falta você”. Ela estava na piscina do colégio. Como tinha conseguido entrar ali, à noite, ela não sabia, mas tinham várias pessoas no fundo da foto, inclusive quem ela queria saber o paradeiro: .
No mesmo instante, se levantou da cama, decidida a ir à tal festa e encarar , não importava quem estivesse perto. Ela decidiu que seria o momento perfeito para o retorno triunfal da rainha: ninguém era páreo para em festas.
Depois de um rápido banho, já estava vestida com um biquíni branco por baixo da saia jeans e uma blusinha simples, seus cabelos presos em um rabo de cavalo alto e sua maquiagem simples: blush e gloss na boca. Saiu de fininho, descendo as escadas devagar para não acordar ninguém e encontrou com seu motorista na cozinha, ele estava tomando um café.
— Me leve sem fofocar para Emma e eu não conto para ela do seu caso com Joanne. — A garota barganhou e viu William enrubescer.
A garota segurou o riso e seguiu o motorista, que prontamente se levantou e a guiou silenciosamente para o carro.

— Não vá se meter em encrenca, ein, dona ?! — Ele sussurrou quando a deixou na porta da escola.
Ele adorava a garota desde quando ela era pequena e não queria que nada de ruim acontecesse. Embora ela tivesse aquele jeito doido, ele sabia que era uma boa pessoa.
— Pode me ligar se precisar que eu te busque. — Piscou para a garota, que devolveu o cumprimento e encontrou com Caroline, que a estava esperando no portão da escola.
— Quem pegou a chave? — sussurrou para a amiga, que deu de ombros, sem responder à pergunta.
A festa estava acontecendo no interior da escola, não tinham muitos alunos, apenas os jogadores de futebol, as líderes de torcida e surpreendentemente, e . Os dois estavam sentados na borda da piscina, ao lado de e , e riam de alguma piada que contava. No momento que viram , os dois primeiros desviaram o olhar rapidamente, trocando rápidas palavras entre si, enquanto demorou um pouco o olhar sobre .
Ela o encarou e ergueu as sobrancelhas, o que foi suficiente para desviar a cara, envergonhado por ter dado bolo na garota.
— Vem, ! — A música estava alta, mas ouviu Cassie, outra garota das líderes de torcida, a chamar do trampolim.
Queriam que ela fizesse um salto.
fez questão de desfilar até o trampolim, despindo-se de suas roupas devagar, o que atraiu a atenção de todos. Em seguida, a garota fez um salto espetacular na piscina, que atraiu gritos e palmas de todos. Menos, é claro, do trio de ex-melhores amigos dela.
— Ficou cheio demais... — resmungou para . — Acho que vou embora.
— Nada disso, ! — A amiga fechou a cara. Ela estava feliz de poder viver aquele momento, fazia tempo que não se divertia. — Essa... — apontou levemente com a cabeça para . — É a nossa realidade agora. Ela está aqui e vai continuar. — Sabia que estava sendo dura, mas ela precisava fazer acordar para vida. Além disso, a “conversa” com a ex-amiga no banheiro havia mexido com ela.
nunca tinha parado realmente para ouvir a versão de da história, não tinha dado segunda chance para a garota se defender, então ela estava tentando abaixar um pouco a guarda, mas estava com medo da reação de .
— Ei, pessoal! — Henry, lateral-direito do time de futebol, exclamou. — Vamos tirar algumas fotos!! — O garoto fez com que todos se juntassem e tirou uma selfie juntos, depois correu pela piscina inteira tirando várias fotos: dos casais, das amigas, de , e fazendo caretas e assim seguiram.

— Ei, … — conseguiu atrair a atenção da garota quando ela se distanciou um pouco para pegar um refrigerante. — Por favor, fale comigo… Me desculpa, me chamou para sair com ela e , e eu não consegui te avisar…
— Você não tem celular? — questionou e viu o garoto abrir e fechar a boca duas vezes, sem conseguir responder, então resolveu continuar: — Olha, eu não tenho o direito de te cobrar nada, mas foi você que veio cheio de declarações para mim e… eu realmente achei que fosse sério, ok? E pense então como eu me senti idiota esperando que você chegasse e… HENRY, CUIDADO! interrompeu sua fala, quando viu a tragédia que ia acontecer: Henry estava brincando com Caroline, tirando fotos da garota, mas tropeçou e acabou batendo a cabeça no poste que ficava a poucos metros da piscina, caindo imóvel na água logo em seguida.
Foram dez segundos de choque e silêncio, até que todos se deram conta do que tinha acontecido e a confusão se instalasse: uns corriam, tentando se safar, enquanto dois grandalhões do time pularam na piscina para tirar o garoto, que parecia desacordado.
— Vamos embora, … vem… — tentava puxá-la, mas estava imóvel.
— Temos que ajudá-lo! — Ela conseguiu gritar.
— Você já tem problemas demais na sua ficha!
Não interessa! — A garota correu para onde deitaram Henry, que permanecia desacordado e não teve outra alternativa a não ser segui-la. Enquanto e ligavam para pedir socorro.

•••

— Eu conheço todos vocês há muito tempo... — o diretor andava de um lado para o outro no grande auditório da escola. — Alguns de vocês a vida inteira. — Demorou seu olhar sobre o próprio filho, que permanecia com a cabeça abaixada. — E eu sei dos impulsos de vocês para fazerem festas, se relacionarem… mas uma pessoa se machucou seriamente naquela piscina… — seu tom era calmo, no entanto, muito ameaçador. — Um de vocês quase morreu! Henry está no hospital, bem, por um milagre! — Exclamou. — Vocês tiveram sorte. Nada mais do que isso. Sorte. — Ele parou por um momento, observando os quinze jovens que estavam em silêncio, com a cabeça abaixada.
Todos eles haviam sido convocados para o auditório, já que na noite do acidente, o celular de Henry havia ficado na piscina, dessa forma, todas as fotos daquela noite foram parar direto nas mãos do diretor, a identificação de todos tinha sido fácil como tirar doce da boca de criança.
— Então eu espero que, no mínimo, quem foi o responsável por roubar a chave da escola e da piscina, se entregue. Vou esperar até o fim do dia na minha sala. Se não houver um culpado, providências serão tomadas. — O diretor saiu a passos duros do auditório, deixando os jovens sozinhos.
Todos ficaram em um silêncio desconfortável por alguns minutos, até que Caroline se levantou e murmurou:
— Pacto de silêncio, certo? — Procurando confirmação de todos, que balançaram a cabeça positivamente.
Era comum, desde quando eram crianças, que quando fizessem algo de errado, eles se juntassem em um pacto de silêncio para que ninguém fosse penalizado. Na maior parte do tempo sempre dava certo e eles foram aperfeiçoando isso ao longo do tempo. A maioria ali eram filhos das famílias fundadoras, sabiam que tinham poder e que a escola provavelmente receberia doações ou algo do tipo para abafar qualquer confusão, mas, dessa vez, o buraco era mais embaixo, visto que um deles tinha se machucado. De qualquer forma, ninguém entregaria ninguém. Até porque, não se sabia ao certo quem tinha roubado a chave.
— Ei, pessoal... — se manifestou, trazendo atenção de todos para si, menos de , que continuava olhando para baixo. — Vou visitar o Henry no hospital mais tarde, acho que seria legal se todos passarem por lá… a mãe dele só pediu para que fossemos em grupos pequenos, porque ele ainda está muito cansado. — Avisou e viu todos murmurem, concordando.
Depois, todos foram se dispersando e saindo do auditório, menos ela e , que dispensou os amigos dizendo que ficaria ali para fazer dever de casa. e saíram em direção à aula e ele ficou, na esperança de conseguir conversar com .
— Ei… — ele chegou perto da garota, que mexia em alguma coisa no celular. — Podemos conversar agora? — Perguntou e assistiu dar de ombros.
Ela ainda estava brava e mais chateada ainda pelo garoto ter cogitado a abandonar Henry naquele estado.
— Eu te devo desculpas, … eu devia ter te avisado, mas juro que não foi por mal, eu entrei em pânico com a possibilidade de…
— De e descobrirem sobre nós? Por quanto tempo você acha que vai conseguir esconder?
— Primeiro que não existe nós, ! — exclamou, ficando com raiva. — Você já deixou bem claro que eu e você não vamos acontecer e eu ainda estou aqui, passo todos os meus dias ansioso para passar um tempo sozinho com você, fico corroído por dentro por não poder conversar com você na escola, por não poder te tocar, te abraçar… você não tem noção do quão ruim é! — O garoto desabafou tudo que estava guardando durante os últimos dias.
Sabia que não tinha culpa de não ser recíproca, mas ele estava magoado e triste com aquela situação. Não queria ter se enfiado naquilo.
— Então você pode, por favor, me desculpar? — Perguntou, num tom mais calmo do que antes, para a garota que ainda o encarava boquiaberta.
estava num misto de confusão, felicidade por ele se importar tanto com ela e em choque também. Por isso, as ações da garota foram totalmente impensadas: encurtou a distância entre ela e o garoto, que primeiro a olhou confuso, mas depois de perceber o que ela faria, um sorriso maroto escapou por entre seus lábios, antes que suas bocas se chocassem em um beijo. Um beijo real dessa vez. Recíproco. Lento e incrivelmente gostoso.
— Eu… — disse ao se soltarem, totalmente vermelha. Tinha caído a ficha do que ela tinha feito. — Eu… eu não sei por que eu fiz isso. — Admitiu.
Sabia que precisava ser totalmente verdadeira com , que era o único que parecia verdadeiramente disposto a lhe dar um voto de confiança.
— Você se arrependeu? — O garoto perguntou envergonhado, coçando a cabeça.
— Não, não! Só é confuso… e eu acho que prefiro ir devagar nisso tudo… — murmurou, tentando encontrar as palavras certas para que não ficasse chateado com ela.
Mas a atenção do garoto foi levada para um movimento suspeito que ele viu atrás das cortinas e logo ele saiu correndo em direção ao palco, afim de pegar quem estava espionando os dois.
— Ei, volta aqui! — exclamou e conseguiu puxar a menina pelo braço, com em seu alcance.
Era Meredith Brown. Exibindo um sorriso vitorioso no rosto e o celular em outra.
— Eu tenho pessoas que vão adorar saber do casinho de vocês! Que feio, ein, ? Pegando a ex do melhor amigo! — A garota riu, não parecia preocupada em ter sido pega.
Mas a feição de era desesperada, não podia saber de jeito nenhum daquele beijo.
Sem soltar o braço de Meredith, o garoto se virou para , que parecia estranhamente calma para aquela situação. As pessoas saberem dos dois não era bom para ela também. Por que ela estava tão calma?
— Você pareceu esquecer do nosso acordo, Mer-Mer... — disse, sua feição era muito diferente da qual estava acostumado.
Ela parecia quase… ameaçadora.
— Você não tem tanto poder quanto imagina, … — Meredith tentou falar no mesmo tom que , mas sua voz a traiu e fraquejou.
— Será mesmo? — franziu as sobrancelhas e encarou a colega de time nos olhos. — Quem você acha que tem mais a perder? — Sussurrou, enquanto olhava assustado para as duas.
Meredith finalmente vacilou e entregou o celular nas mãos de , que sorriu vitoriosa e disse:
— Vou ficar com isso. Mais tarde eu peço a meu motorista para levar um novo para sua casa.
— NÃO! — Brown pareceu estar desesperada com a possibilidade de perder seu aparelho, mas estava decidida.
— É pegar ou largar, Mer-Mer.
Meredith não teve outra escolha, a não ser engolir em seco e finalmente ter seu braço liberado por , que ainda estava confuso com aquela situação. A morena saiu do auditório pisando duro, enquanto guardava o celular em segurança em sua bolsa.
— O que ela esconde que foi suficiente para perder o telefone? — O garoto perguntou, curioso.
— Se eu te contar, vou ter que te matar. — sussurrou e estalou um beijo na bochecha de , antes de sair pela outra porta. — Te vejo mais tarde? — Virou-se antes de sair por completo e viu o garoto concordar com a cabeça, totalmente abobado.
Esse era o efeito que ela causava nele.

Nuffield Health Cambridge Hospital ficava bem perto da escola, portanto, dispensou seu motorista e seguiu a pé, afim de visitar Henry. Os dois não eram tão próximos, mas a garota tinha realmente ficado preocupada com ele, desacordado daquela forma. Sentia-se culpada, mesmo sabendo que tinha sido um acidente.
Ela caminhava calmamente, murmurando a canção da Taylor Swift que tocava em seus fones de ouvido, o que foi suficiente para a garota não notar que estava sendo seguida ao longo dos quarteirões. O mini-cooper preto tinha vidros escuros e não se destacava no meio dos carros, mas ele a seguia devagar. Os homens dentro dele seguiam os passos da garota de vez em quando, para se certificarem que não perderiam nenhum movimento suspeito. Então, quando ela entrou no hospital, ficou claro para eles que ela apenas visitaria o garoto acidentado, então foram embora.
É claro que eles sabiam do acidente de Henry. Eles sabiam de tudo. Ou quase tudo.
Quando entrou no quarto em que Henry estava internado, a mãe dele a olhou com uma péssima cara. É claro que ela culpava todos eles pelo acidente com o filho — e com razão! Mas, de qualquer forma, sorriu para ela antes de se direcionar para o colega.
— Como você está?
— Melhor impossível! — Ele sorriu largo, estava claro que estava dopado de remédios e estava adorando aquilo.
Henry fazia parte do grupinho que adorava os remedinhos de Damien.
— Fico feliz, nós te devemos desculpas! — disse com sinceridade.
— Ei, não foram vocês que me empurraram! Foi só um acidente. — O garoto a tranquilizou e sorriu, acariciando a mão do garoto de leve.
Os dois conversaram por mais um tempo, a garota contou sobre a bronca do diretor e o colega confessou que também não sabia quem tinha pego a chave em primeiro lugar, mas que também faria voto de silêncio.
O tempo foi passando e, após a mãe de Henry quase expulsar do quarto, a garota prometeu que voltaria e se dirigiu para fora do quarto, mas antes de pegar seu celular para ligar para William, foi o de Meredith que tocou em sua bolsa.
ponderou por um minuto com sua moralidade para decidir se era certo ou não atender, mas optou por ser desonesta: sacou o celular da bolsa e atendeu o número restrito.
Conseguiu o que eu te pedi? — A voz do outro lado era grave e causou um grande arrepio na espinha da garota.
— Er… quem está falando?
Brown? É você? — O homem pareceu estar desconfiado.
bateu na própria testa, brava com a própria burrice.
Meredith?
— Não é a Meredith, mas você pode deixar um recado. — tentou deixar sua voz mais grave, sem sucesso.
Não, gatinha, receio que só possa ser com ela. Onde ela está?
— Eu não sei. Ela deixou o celular dela comigo.
E quem é você?
— Uma amiga. — respondeu.
Sei, uma amiga… Certo, então, diga a ela para retornar!
— Como alguém retorna um número restrito? — A garota perguntou, desconfiada.
Ela vai saber… — a voz agora pareceu estar impaciente com ela. Como se tivesse se cansado de jogar. — Até mais, .
— Como você… — mas o homem desligou antes que a garota pudesse perguntar.
Como ele sabia o nome dela?



Capítulo 10

“Ah...”, Caroline, que interpretava a mrs. Manson, murmurou e permaneceu sentada na cadeira do cenário, abrindo e fechando o leque de marfim entre os dedos enluvados; de repente, porém, ergueu a cabeça e apurou os ouvidos — Senhora Donovan narrou, enquanto todos observavam a cena em silêncio.
“Aí vem ela!”, Caroline sussurrou e apontou para o buquê no sofá próximo a . “Devo entender que o senhor prefere isso? Afinal, casamento é casamento… e minha sobrinha ainda é uma mulher casada…”
“O que é que vocês dois estão tramando?”, , a célebre Madame Olenska, entrou em cena e perguntou ao entrar no cenário.
Deveria estar vestida como se fosse à um baile, mas no ensaio estava com seu uniforme normal, no entanto, caminhava graciosamente, como se estivesse com um longo vestido.
“Estávamos dizendo que você vai ter uma linda surpresa.”, Caroline se levantou e indicou as flores, segurando o riso.
então olhou para o buquê com uma expressão vazia, como mandava no livro, e exclamou:
“Ah! Quem terá sido tão ridículo a ponto de mandar um buquê? Por que um buquê? E por que justamente hoje? Eu não vou a nenhum baile; não estou noiva. Mas algumas pessoas são sempre ridículas!”, exclamou de forma afetada, enquanto ainda não tinha a olhado.
— CORTA! — Jean-Marc, o diretor, que hoje estava dos pés à cabeça de roxo, exclamou de forma irritada. — RIDÍCULA É SUA ATUAÇÃO, SENHORITA ! Quem colocou essa garota como Condessa Olenska? — Murmurou, olhando para com desdém.
A garota se limitou a abaixar a cabeça e não responder, mesmo que quisesse mandar o diretor para o inferno. Aquela não era nem de longe sua melhor atuação, mas sua cabeça estava na ligação do dia anterior. Quem era no telefone? Como ele sabia seu nome?
— Ei, ei! Não está me ouvindo?
voltou a si, quando escutou a voz insuportável de Jean-Marc a chamando, todos a estavam olhando, inclusive a senhora Donovan com aquele olhar urgente. A mulher morria de medo do diretor.
— Vamos, do início!

— Aquela idiota ainda não devolveu meu telefone. — Meredith exclamou, enquanto caminhava rapidamente pelos corredores vazios.
— Pegue de volta. Ela atendeu ontem. Você é estúpida? Vai acabar morta assim! — O garoto ao seu lado sussurrava e olhava para todos os lados, com medo de que fosse visto falando com Brown.
— Você deveria cuidar disso! — Ela deu de ombros. — Eu já tenho outros problemas.
— Como a chave que você pegou da piscina? O prazo do diretor está acabando, o que você vai fazer?
— Eu tenho um plano. — Meredith sorriu e saiu rebolando, deixando o garoto parado sozinho no corredor.
Como tinham feito o pacto de silêncio, até onde sabiam, ninguém tinha ido até a sala do diretor de Cambridge se entregar ou entregar o culpado. O prazo já havia expirado, mas Thomas ainda não tinha tomado nenhuma decisão. Esse era o menor dos problemas de todos. Os alunos pareciam estar muito mais preocupados com outras coisas, inclusive com o Baile dos Anos 50, que era promovido pela escola e seria no final de semana.
Caroline não podia estar mais animada, ela não parava de tagarelar, enquanto andava ao seu lado sem realmente ouvi-la. Ela tinha tanta coisa na cabeça, não sabia como iria descobrir quem era no telefone, estava triste pelo acontecido no teatro e também com um pouco de raiva. Quem Jean-Marc achava que era para fazer aquilo com a garota? Ele podia ser o diretor de Broadway que fosse, mas ela não merecia ser tratada como lixo, já não bastava as pessoas que já faziam isso. E, além disso, ainda tinha a cena que faria com nos próximos ensaios, que seria a mais difícil até então, já que o garoto não se dava ao trabalho nem mesmo de olhá-la.
— Devolva meu telefone agora, . — Ela deu de cara com Meredith e quase trombou na garota alta.
decidiu que não faria jogo duro, queria sacar qual era a da Meredith, mas não podia fazê-lo de forma direta, senão ela desconfiaria.
— Aqui está, cherry. — sorriu com desdém. — Eu apaguei de tudo e ainda fiz backup, pra não ter nem a chance! — Ameaçou e viu Brown rolar os olhos e desaparecer da sua frente.
— O que foi isso? — Caroline perguntou, curiosa.
Ela até poderia contar, ficaria feliz de ter pelo menos uma amiga com quem dividir os segredos que tinha, além de poder comentar com alguém sobre , mas Forbes era um tanto quanto fofoqueira e sabia que no dia seguinte toda a escola saberia, então apenas respondeu:
— Não é nada, vamos! A gente vai se atrasar. — Caroline fez uma careta a contragosto, mas seguiu . — Ei, Carol… ahn, eu vou precisar ir no banheiro, mas você pode ir sem mim. — pareceu mudar de ideia no meio do caminho e agora, precisava se livrar da amiga.
— Tudo bem. Você é tão estranha, … — reclamou e seguiu sozinha para aula de Cálculo, enquanto ia atrás de Meredith.
Ela tinha certeza que a garota estava aprontando e precisava descobrir o que era.
Ela não estava longe, caminhava despreocupada pelo corredor contrário à aula. a seguia de longe, para ter a opção de se esconder caso ela olhasse para trás, mas Meredith continuou seguindo em frente, virando-se apenas para abrir a porta da escada de incêndio que desencadeava no terraço.
esperou por um momento, antes de abrir a porta e tentou subir silenciosamente. Ela conseguia ouvir a voz de Meredith conversando com alguém no ponto mais alto da escada.
— Não acredito que você me meteu nisso, Mer! — reconheceu a voz de , jogador no time e filho da professora de Cálculo.
— Sua mãe é professora no colégio, ! Ele não vai te expulsar! — Meredith disse.
conhecia aquele tom persuasivo. A garota era traiçoeira.
— Não sei, não…
— Bom, nós dois sabemos que eu não posso ter nenhuma mancha na matrícula, não é? Não vejo outra opção! — Meredith disse com a voz afetada.
Do que os dois estavam falando?
subiu mais um pouco nas escadas, agora ela conseguia ver os dois de relance, no mesmo momento, viu a garota negra entregar a chave para . A chave da escola e da piscina. Ela tinha pegado e estava tentando fazer o garoto levar a culpa em seu lugar.
Como ela conseguia ser tão baixa?
Em meio a sua indignação, perdeu o equilíbrio e caiu sentada.
— Ai! — Exclamou.
Era claro que o barulho foi suficiente para que Brown e ouvissem e descessem rapidamente, a fim de saber quem estava os espionando.
— É claro que é você! — Meredith exclamou com desprezo.
— Você não vai escapar dessa. — ameaçou, sabia muito bem que Mer entenderia.
Ela tentou se levantar rapidamente, mas a garota a puxou pelos cabelos, fazendo com que gritasse de dor.
— Eu já estou ficando cansada de você, ! — Meredith murmurou entredentes e continuou a puxar o cabelo de , descendo pelas escadas.
até pensou em separá-las, mas ele amava uma briga feminina.
— ME SOLTA, SUA IDIOTA! — gritava com raiva e dor.
Num momento de adrenalina, conseguiu se soltar e mordeu a mão de Meredith, que deu um grito afetado e uma bofetada na cara de , que cambaleou e com o impacto abriu a porta da escada, caindo no corredor. Brown partiu para cima dela, afim de pegá-la ainda no chão, mas foi mais rápida e puxou o cabelo da inimiga, levando-a para o chão também.
— LUA! — A garota ouviu a voz de e em seguida foi puxada pelo garoto, desvencilhando-se de Brown, que era segurada por .
— Por que você deixou elas brigarem, você é imbecil? — perguntou incrédulo para , que seguia sorrindo, sem se preocupar.
— Por que está se metendo, ? Por que não cuida da sua vida? — provocou e empurrou , que não era muito conhecido por controle.
Ele soltou Meredith e partiu para cima de , acertando-o um soco no olho, o que obrigou soltar e ir separar os companheiros de time.
— Mas o que é que está acontecendo aqui? — Ouviram a voz do diretor e imediatamente pararam de brigar. — Vocês estão achando que estão onde? Todos para minha sala AGORA! AGORA! — A voz dele era tão firme, que ninguém sequer abriu a boca, seguiram todos para a sala do diretor calados.
— Quem vai começar falando? — Thomas perguntou, quando chegaram e se acomodaram, e todos ficaram calados por um momento, até Meredith abrir a boca:
— Tudo começou quando a , enxerida, foi me bisbilhotar e tentar me incriminar por um crime que eu não cometi! — Exclamou e a olhou, incrédula.
— Você é tão cara de pau assim, garota? — respondeu e já ia partir para cima de Meredith novamente, mas a deteve.
— JÁ CHEGA! — Thomas berrou e as garotas se sentaram novamente.
— Foi ela quem pegou a chave, diretor. — Meredith disse com convicção e todos se viraram para chocados, inclusive ela mesma.
— MENTIRA! — exclamou no mesmo momento. — Eu vi ela entregando a chave para na escada, foi ela! Ela estava tentando fazer ele levar a culpa, diz para ele, !
— Ela não estava tentando me convencer de nada, . — O garoto mentiu descaradamente.
— Você é um mentiroso do caralho! — exclamou.
— Você beija sua mãe com essa boca, senhorita ? — Thomas perguntou com uma feição muito séria, mas comprimiu os lábios, achando tudo muito engraçado.
O diretor cruzou os braços e olhou fixamente para , que se remexeu incomodada na cadeira.
— Eu não peguei nada! — disse com convicção, cruzando os braços com raiva.
Aquilo era simplesmente um absurdo.
— Então não vai se importar se ele checar sua bolsa, vai? — Os olhos de Meredith cintilavam de expectativa, mas estava com muita raiva para entender o que estava acontecendo ali.
— Claro que não! Fique à vontade — entregou sua bolsa de bom grado ao diretor, sem temer nada, mas seu queixo caiu quando Thomas retirou a chave pequena da bolsa da garota.
Meredith a tinha emboscado.
— É óbvio que ela colocou na minha bolsa, isso é ridículo, eu não fiz nada! — se levantou, indignada.
— As provas e, devo dizer, seu histórico, estão contra você, senhorita . — O diretor suspirou, exasperado.
— Isso não é justo, pai! — finalmente se pronunciou, fazendo o olhar incrédulo.
Ele, mais do que ninguém ali, sabia que era perfeitamente capaz de roubar a chave, visto que no passado ela tinha feito coisas bem piores.
— Você não passa de um vaga… — se dirigiu a Meredith, que tinha um sorriso vitorioso no rosto, mas foi novamente contida por .
— Já chega, senhorita . Você já deu seu show por hoje! — O diretor bateu na mesa. — Eu já estou cansado disso! Para acabar logo com essa confusão, você, , está em detenção a partir de hoje. Vai ajudar as garotas na decoração do baile e após isso, duas semanas de detenção! Tenha em sua cabeça que isso é uma colher de chá pelo seu bom comportamento desde que voltou, pois essa atitude era digna de expulsão! — fez menção de responder, mas o diretor continuou no embalo. — Sou eu quem falo agora. — Sibilou e a garota ficou quieta. — Senhor , esses não são os modos esperados de um cavalheiro na Cambridge High School, suas chances estão se esgotando nesta escola. Você também ajudará na decoração e ficará três semanas na detenção. Nós não gostamos de valentões aqui. E você, senhor , sua mãe também saberá do seu comportamento. Vá, por favor, à enfermaria limpar este olho que está simplesmente nojento. — Ele apontou para o olho de , que estava inchado devido ao soco que ele tinha levado. — E você ficará uma semana na detenção. No mais, todos vocês estão suspensos do restante das aulas de hoje e eu pessoalmente farei questão que todos os professores retirem pontos de vocês. Espero que essa conduta jamais se repita no meu colégio, senão todos vocês serão expulsos, inclusive você, . Você também ficará na detenção por uma semana. Agora, saiam todos da minha frente e eu não quero ouvir nem um pio. — O diretor terminou a longa fala e todos saíram derrotados da direção, menos, é claro, Meredith Brown, que tinha saído ilesa de toda aquela situação.
— Bom castigo, miss , espero que você aprenda bons modos! — Mer mandou beijinhos para e saiu rebolando ao lado de , enquanto foi impedida de avançar nela por .
ainda olhava estranho para os dois, mas não disse nada. pareceu perceber, então soltou a garota e ficou um tanto quanto vermelho. Era uma situação, no mínimo, esquisita. Os três ali, parados, em silêncio, que foi quebrado pelo som do terceiro sinal, que denunciava o intervalo.
— Erm, eu vou para casa… — disse, sem jeito, e deu um soquinho no ombro de , antes de virar as costas, porém, pensou na conversa que teve com sua psicóloga e decidiu arriscar: — . — Murmurou seguido de um aceno de cabeça e virou as costas, deixando boquiaberta.
O que foi isso? — Sibilou para , que também estava bastante surpreso com aquilo, mas o garoto apenas balançou a cabeça, incrédulo. — Vou pegar minhas coisas para ir embora, quer me deixar em casa? — Mudou de assunto de repente e sorriu encantadora para o garoto.
Os dois ainda não tinham tido muito tempo juntos e ela queria dar-lhe mais atenção, já que ele estava sendo tão cavalheiro com ela. Depois do último beijo, os dois ainda não tinham tido a chance de conversar sobre o que eles eram ou queriam ser, só estavam empurrando com a barriga e curtindo.
— Claro que sim. — O garoto sorriu, todo bobo. Ele ainda ficava muito nervoso quando a garota o olhava daquela forma. — Só preciso pegar minhas coisas, você me espera?
apenas balançou a cabeça, concordando, e antes que pudesse perguntar “o que” ou “por que” ela não podia ir junto, desapareceu pelos corredores, deixando-a sozinha.
As pessoas já estavam se dissipando, indo para o almoço, o que fez a garota lembrar que ela estava morrendo de fome, já que não tinha comido nada ainda. Talvez Joanne pudesse fazer algo para os dois almoçarem, ela ficaria feliz de ver lá, já que sofria vendo tão solitária e se sentindo tão culpada.
Depois de algum tempo esperando, a garota, insegura como era, começou a pensar que tinha desistido dela e achado melhor ir para casa.
Quanto tempo demorava só para pegar as coisas no armário?
“Sua boba”, ela disse para si mesma e balançou a cabeça negativamente. Mas, após mais dez minutos de espera, a garota voltou para os corredores, a fim de ver onde ele tinha se metido. Foi preciso subir apenas um andar para encontrá-lo, mas não estava sozinho, estava parado, de costas para ela, conversando com alguém que ela não conseguia ver, mas pelo modo com que gesticulavam, pareciam estar discutindo.
A garota não queria interromper, mas estava curiosa, então começou a caminhar mais rápido. Porém, antes que chegasse perto, o murmúrio parou e quem quer que estivesse conversando com o garoto virou as costas e saiu andando.
se virou calmamente para trás com uma enorme cara de paisagem.
— Desculpa te deixar esperando, linda! — Disse, como se escolhesse bem as palavras. — Era um cara do time, estamos tendo problemas... — antecipou a pergunta de , que franziu a testa, mas decidiu que fazia sentido.
Não tinha por que o mentir para ela, tinha?
— Vamos?
— Sim! — Sorriu e os dois andaram lado a lado, parando só para trocarem um beijo rápido e um sorriso.
Estavam felizes um com o outro.

— Não aguento mais ter que ficar com você escondido. — fez um muxoxo com a boca, que recebeu um selinho.
— Não podemos nos arriscar, bobinho. — Meredith sussurrou e o abraçou.
Os dois estavam escondidos em um dos armários de serviços da escola. Sempre ficavam ali e aqui, temendo serem vistos.
— O que você fez hoje… você estava simplesmente gostosa arrastando a pelos cabelos! — O garoto de olhos esmeralda riu e puxou a namorada pela cintura, fazendo a garota arfar, antes de se beijarem novamente.
— O vai pagar pelo o que fez com você. — Meredith fechou a cara ao ver o rosto do namorado machucado pelo soco de .
— Ele não perde por esperar. — prometeu.

— Não é justo! — exclamou ao ver roubar a décima batata frita do seu prato.
Os dois estavam sentados na parte externa da casa, em uma das três mesas que ficavam na área de churrasco descoberta (tinha outra coberta). Na frente deles, a piscina olímpica dos refletia o sol que fazia naquela tarde. O tempo na Inglaterra estava um tanto quanto doido naquele ano.
O casal almoçava tranquilamente, ainda de uniforme escolar, rindo e brincando. constantemente repreendendo por roubar suas batatas e ele se controlando o tempo inteiro para não beijar a menina, já que a mãe dela fingia que lia uma revista na sala com parede de vidro, mas ele sabia que ela o estava observando.
— Sua mãe não para de olhar pra cá... — comentou com .
— Emma é fofoqueira, mas não tem nada contra você. Provavelmente está tentando descobrir se estamos namorando ou não. — A menina deu de ombros.
— E estamos? — sorriu e colocou uma mecha de cabelo de atrás da orelha.
— Não sei, estamos? — Ela devolveu com outra pergunta e seus olhos cintilaram para .
Antes que ele pudesse pensar em outra resposta, ela se levantou.
— Vou pedir sobremesa à Joanne. — E saiu, simples assim.
tinha certa dificuldade de acompanhar o ritmo de , várias vezes em suas conversas a garota simplesmente mudava de assunto ou saía andando e ele ficava quase sempre confuso. Sempre sentia que era um furacão e ele uma mera casa, prestes a ser levada pelo tornado. Mas gostava de estar com ela. Sempre quis ter esse momento, sempre quis ser beijado por ela, sempre quis ser a pessoa que ela olhava, tocava. E agora finalmente tinha conseguido.
Ele não era idiota, sabia que ela não o amava, mas sabia que estava a conquistando aos poucos e conseguiria. Sua única preocupação era conciliar o relacionamento com sua amizade com e . Ele não sabia até que ponto poderia levar o segredo e quando chegasse o momento, provavelmente perderia os dois. Não estava pronto para aquilo, mas, definitivamente, não estava pronto para abrir mão da garota que ele sempre tinha sido apaixonado.
— O que você está pensando? — voltou com uma bandeja com duas xícaras lotadas de sorvete com calda e colocou em cima da mesa, logo em seguida se servindo com a sua.
— Em você. — sorriu e se inclinou para beijar a bochecha dela.
— Você sempre me deixa sem graça. — respondeu, sendo sincera.
Já tinha desacostumado a ser tratada daquela forma, com todo aquele carinho, e a olhava como se ela fosse a coisa mais bonita do mundo.
— Só quero que você seja mais confiante... — arrastou sua cadeira para mais perto da garota, a fim de abraçá-la pelo ombro. — Você está sempre nos meus pensamentos. — Beijou novamente a bochecha de , que continuou calada.
Ela ainda não sabia muito bem como reagir aos carinhos de , mesmo sabendo que ele tinha consciência que ela não gostava dele na mesma intensidade, se sentia culpada. Ela queria se sentir da mesma forma. Se forçaria a amar , porque ele era bom para ela. Ela precisava disso.
— Seu sorvete está derretendo. — Foi idiota, é claro!
assistiu suspirar e pegar sua xícara, mas ele não parecia bravo. Ela então o puxou pelo queixo e depositou um beijo leve nos seus lábios.
— Obrigada. — Soprou e o beijou novamente, dessa vez com mais vontade, fazendo sua língua dançar em sincronia com a de , lento e gostoso, como deveria ser.
Sentiu colocar as duas xícaras novamente na mesa e depois depositar as mãos em sua cintura, puxando-a para mais perto, enquanto suas mãos se preocupavam com o pescoço e cabelo dele. Mas, abruptamente, o garoto os afastou.
Sua mãe. — Sibilou, sem fôlego.
espiou por cima do ombro e viu Emma na mesma posição na sala, mas dessa vez ela realmente parecia estar interessada na revista, mas seu rosto vermelho denunciava que ela tinha visto a pequena cena.
— Vem! — Puxou pelo braço e entraram em casa, antes de subirem, se virou para a mãe.
— Estamos indo para meu quarto, mamãe.
— Porta aberta, . — Emma a olhou por cima das hastes dos óculos
— Fechada, Emma. — desafiou e viu o queixo de Emma tremer.
Ela não sabia por que a mãe estava fazendo aquele show, sabia que não era nenhuma flor intocável.
— Divirtam-se! — Emma pareceu se dar conta do personagem ridículo que estava tentando sustentar e deu de ombros, fazendo os adolescentes segurarem o riso.
subiu primeiro com o sinal de .
Psiu! — Emma sussurrou apenas para a filha ouvir e a garota se virou, achando que ouviria um sermão. — Muito bem feito, sempre achei ele mais bonito. — Piscou para a filha, que rolou os olhos e subiu as escadas atrás de .
A porta mal se fechou e o garoto já puxou pela cintura, e a garota envolveu suas mãos no pescoço dele. Os dois se beijaram com mais urgência dessa vez, a vontade transparecendo em cada movimento.
Não demorou para que os dois estivessem na cama, as mãos de deslizavam pelas costas de , que se preocupava em morder a orelha e o pescoço do garoto, esporadicamente.
As mãos de logo encontraram o sutiã de , mas ele não o tirou, o que fez a garota parar o que estava fazendo para olhá-lo.
— Não quero fazer isso assim. — Confessou e deixou seu queixo cair, enquanto ainda estava em cima do garoto.
— Você é virgem? — Perguntou, incrédula.
— Claro que não, ! — respondeu com raiva, enquanto a garota deixou seu corpo cair na cama, enquanto dava gargalhadas. — Para! — Dessa vez ele ficou por cima dela e a se forçou a parar de rir. — Eu só quero que isso seja especial! — Ele beijou o nariz dela, que ficou séria. — Quero que seja épico. — Beijou novamente os lábios dela, dessa vez mais suavemente. — O que foi, ? Está chorando? — O garoto enxugou as lágrimas que caíam livremente do rosto dela. — Você não…
Shhh! o calou com um selinho. — Estou chorando, porque estou feliz.
— Linda. — depositou vários beijos pelo rosto da garota, que sorriu e o abraçou e ali ficaram. Abraçados. — Eu ficaria aqui pra sempre... — ele disse, com o rosto na curva do pescoço dela. — Mas…
—Você tem que ir. — suspirou, fazendo carinho no cabelo dele. — Eu também preciso estar de volta na escola hoje à noite. Para a decoração do baile. — Rolou os olhos, lembrando-se da detenção e de Meredith se safando.
— Te vejo só amanhã, então? — fez um biquinho, que foi beijado pela garota, que assentiu logo em seguida. — Você será a mais bonita daquele baile.
— E você o garotão mais gato. — Os dois riram e se levantou num pulo, à contragosto.
Não queria deixá-la.
Olhou para com ternura, era o momento oportuno para um “eu te amo”, mas sabia que isso a assustaria. Os dois ainda não estavam nesse patamar. Ela não o amava e ele sabia disso.
— Já estou com saudades. — Beijou o topo da cabeça de e saiu do quarto, descendo as escadas e acenando para Emma. — Tchau, tia Emma. — Sorriu e ela também.
Ela era grande amiga de sua mãe e o tinha visto crescer junto com , sabia que ela o adorava.
— Foi rápido, em? — Deu pitaco, quando ouviu a filha descer as escadas, fazendo dar uma gargalhada.
— MÃE! Você é muito inconveniente! — A garota latiu e se deitou no colo da mãe. — Eu acho que ele realmente gosta de mim. — Franziu a testa para Emma.
— E isso não é bom? — A mãe acariciou seus cabelos.
— Sim, faz dele um suspeito a menos. — respondeu séria e sua mãe assentiu uma vez, concordando com a filha.
Depois de colocar a mãe a par dos acontecimentos na escola — deixando de lado a parte da briga com a Meredith e a detenção —, se levantou para se arrumar para voltar à Cambridge High School. Ela teria que se juntar ao comitê de organização do baile, que era composto por pais e alunos. Era mais uma das bobagens de Cambridge, na visão dela, mas iria.
A garota gostava mais dessas coisas antes de todo o acidente acontecer. Sua mãe a obrigava a participar de quase todos os comitês, mas ela se divertia muito com e Caroline, que era a maior neurótica da cidade. Todos os eventos passavam por ela e tudo saía perfeito, a garota tinha talento para aquilo.
Mas, agora, ela via aquilo tudo exatamente como tinha sido proposto pelo diretor: um castigo. E seria mais ainda, porque estaria lá para ajudar também.
Ela não sabia mais como encará-lo. Já era difícil por causa de toda a situação com Lily-Anne e agora, como se não bastasse, ela estava com . Tinha medo do que faria se descobrisse e não queria magoá-lo mais ainda. Ela sabia que ele não ficaria magoado pelo amigo estar com sua ex-namorada, tinha total consciência que não a amava mais, que tudo que ele sentia por ela era repulsa e rancor, e, por causa disso, não admitiria que seu melhor amigo estivesse com ela. Apenas por isso. Mas havia uma pontinha de esperança na cabeça dela, que tinha sido um pouco acendida hoje após aquele cumprimento. Foi apenas um aceno de cabeça, mas significou demais para a garota, visto que a queria ver morta.
Talvez, só talvez, os dois ainda tivessem jeito.
— Você está com agora. — Sussurrou para si mesma e entrou no banho, a fim de se livrar dos pensamentos, mas é claro que foi em vão. Nada tirava da sua cabeça.

— Até que enfim vocês chegaram! — Caroline exclamou.
Seus cabelos loiros estavam presos num rabo de cavalo e sua feição denunciava que ela estava com os nervos à flor da pele.
— Tem um milhão de balões para vocês encherem! — Ralhou com e Owen, um garoto que fazia Literatura com eles. — E você, ! Está atrasada! Vá ajudar a Bonnie com as mesas! — Exclamou com , que chegava correndo.
Tinha pensado tanto no banho, que se atrasou. a ignorou totalmente dessa vez e focou seus olhos azuis na Forbes.
— Carol… — sorriu de um jeito encantador. — Encher balões, eu? Você tem certeza…? — fez sinal de um cigarro imaginário entre os dedos e viu a loira apertar os olhos para ele.
— Primeiro, eu não caio no seu charminho, ! Seu nojento! — Ela disse brava e riu.
Quando eram crianças, antes de chegar na cidade, a garotinha costumava ser sua melhor amiga e apesar de terem se afastado, tinham um carinho enorme um pelo outro.
— E se você tem fôlego para jogar futebol, tem para encher alguns balões. Agora SUMA da minha frente. — Piscou para o garoto e saiu do seu campo de visão para gritar com outra pessoa.
— Louca. — Sussurrou para Owen e os dois seguiram para o canto esquerdo da quadra de basquete, que seria onde aconteceria o baile.
estava de bom humor, porque tinha fumado dois baseados naquela tarde e comido tudo que tinha dentro da sua geladeira. Era a única maneira de não surtar. Ele estava se sentindo muito mal pelo o que tinha acontecido naquela manhã. Tinha perdido o controle por algo que ele nem estava envolvido e ainda tinha machucado uma pessoa. Não estava tão chateado assim por ter sido , que era um completo imbecil, mas não queria perder o controle daquela forma. Ele não era assim. Não queria se tornar aquele tipo de pessoa.
No passado, era o que se chamaria de coração mole: era amado por todos, feliz, gentil com as pessoas, além de ser um garoto extremamente sensível. Mas os últimos acontecimentos, as constantes mortes na sua família e o pesar, deixaram-no completamente temperamental. Ao mesmo tempo em que ele estava tranquilo, ele queria brigar ou socar alguém.
Aquilo tinha o afastado de muitas pessoas, inclusive Caroline e alguns amigos do time. Ninguém gostava de valentões. Era uma coisa que ele estava buscando melhorar em suas sessões secretas com a senhora Gilbert, mas era mais complicado do que parecia. E é claro que a psicóloga não sabia que ele estava usando a maconha para ajudá-lo nisso.

— Até que vocês não são péssimos. — Caroline sorriu para a equipe, quando estava tudo pronto.
A quadra estava repleta de balões amarelo, rosa e branco, junto com várias estrelas e fitas de prata penduradas no teto. Além disso, atrás da mesa do DJ, havia um grande painel, onde passariam clipes dos anos 50. No fundo da quadra encontravam-se as mesas, algumas com cadeiras, outras que iam conter os ponches e as comidas encomendadas pela escola. No centro, seria a pista de dança, com um grande globo colorido pendente no teto.
— Podemos ir para casa agora, Forbes? — suspirou, estava completamente exausta e já ligando para seu motorista independentemente da resposta da amiga.
— Sim! Descansem e voltem lindos amanhã! — A loira bateu palmas e todos foram se dispersando para irem para casa, já passava das onze da noite.
caminhou até o portão, à espera de seu motorista, que já estava a caminho, e observou que estava indo em direção à rua, mas não viu seu carro em lugar nenhum.
— Ei, ! — Falou sem pensar e se arrependeu no segundo em que o garoto se virou para olhá-la. — Erm, é… você… precisa de uma carona? — Franziu a testa, completamente desconfortável e assistiu olhar para ela incrédulo.
A boca do garoto fechou e abriu várias vezes, como se ele pensasse muito bem nas palavras antes de respondê-la.
— Não… — falou, por fim, e deixou seus ombros caírem.
Ela não sabia se estava aliviada ou com vergonha.
— Obrigado. — Ele completou e deu um jeito de sair bem rapidinho dali, deixando a garota sozinha.
O que foi isso? — Ela repetiu baixinho para si mesma.
Seria mais uma coisa para atormentar seus pensamentos naquela noite.

•••

Para o pesadelo de todos, que esperavam ansiosamente a Dança dos Anos 50 de Cambridge High School: o dia amanheceu chuvoso e frio, digno de ficar na cama. E foi como permaneceu, até sua mãe começar a berrar que elas iriam se atrasar.
Emma parecia uma adolescente, toda animada para a festa, mesmo que os pais fossem convidados mais para serem monitores e evitar que os adolescentes consumirem bebida alcoólica do que qualquer outra coisa.
sabia que a mãe nunca tinha superado a adolescência: ela tinha sido a rainha de Cambridge e trabalhava incansavelmente para que a filha seguisse os mesmos passos do Império , que ao contrário do que se imaginava, vinha da mãe. Joe também tinha uma boa vida, mas o sucesso das indústrias era segredo da família de Emma.
E por falar no pai, novamente, estava viajando a trabalho e perderia a festa. Joe passava muito tempo fora, cuidando da expansão dos negócios da família. sabia que um dos motivos da mãe ser tão neurótica era isso: ela se sentia, no fundo, sozinha.
Isobel , essa é a última vez que vou te chamar. Vou deixar William te deixar para trás! — Emma exclamou novamente, batendo na porta da filha, que não teve outra escolha senão levantar e ir tomar banho para finalmente se arrumar.
Tomou um banho quentinho e gostoso, mas que ao mesmo tempo a despertou. Escovou os cabelos e se sentou na penteadeira para se maquiar. Quarenta minutos depois, estava pronta: seu vestido era vermelho com bolinhas brancas e a saia era rodada, como mandava o figurino. também usava uma tiara branca nos cabelos e uma meia-calça por baixo do vestido, além disso, seus saltos azuis chamavam atenção para o look.
— Oh, meu Deus, está linda, minha filhinha! — Emma secou as lágrimas que caíram do seu rosto ao ver a filha vestida daquela forma.
Ela também estava a caráter, usando uma calça jeans midi bem justa, uma blusa social azul com uma fita rosa amarrada no meio, além de também estar com uma tiara branca nos cabelos armados.
— Não precisa chorar, Emma… — rolou os olhos ao descer as escadas, mas beijou o rosto da mãe em agradecimento. — Vamos, então?
— Ah! — Emma sorriu de orelha a orelha e a filha a olhou com uma interrogação no rosto. — Eu vou com o William, seu carro já está te esperando lá fora.
— Como assim, meu carro? — Perguntou sem entender, mas a mãe já a empurrava para fora de casa.
Chegando no hall, pode entender o que a mãe dizia: diante de seus olhos, estava uma limusine branca e no teto solar, sorria maroto, vestido com uma simples blusa branca e uma jaqueta de couro. A única diferença é que seus cabelos estavam penteados para trás ao invés da habitual bagunça.
— Posso te levar ao baile, gatinha? — Sorriu daquele jeito adorável, que os olhos dele se fechavam junto e quase derreteu.
Ela se despediu da mãe e caminhou até a limusine onde a esperava com a porta aberta. Depositou um leve selinho em seus lábios e depois os dois entraram.
— As pessoas vão ver a gente chegando junto, cara. — pareceu cair na real e pensar que ninguém sabia que ela e estavam juntos, e, naquele momento, queria que tudo continuasse assim.
Sabia que Emma não abriria o bico, então o segredo dos dois estava seguro com ela, mas quanto ao resto…
— Não pensei que você fosse se preocupar com isso logo agora, . — murchou e escondeu o que guardava no bolso da calça.
automaticamente se sentiu mal, percebendo que tinha ignorado o champagne e as rosas no interior da limusine por algo tão fútil, mas ela estava realmente preocupada.
— Me desculpe, mas é… você sabe os problemas que isso causaria agora! — Ela não mudou de opinião.
As pessoas não podiam saber que os dois estavam juntos. Não agora.
— O que você acha que e fariam, hein? Você já está disposto a perder os dois? Porque é isso que vai acontecer, você sabe disso.
— Eu sei. — se afastou um pouco da garota, completamente contrariado.
Ele sabia que ela estava certa, mas tinha feito a surpresa de todo coração, esperando que ela esquecesse de tudo e focasse apenas nos dois, mas é claro que ela não pensaria como ele.
— Ei, Jay! Pare! — Exclamou para o motorista, que prontamente parou a limusine. — Só estamos a algumas quadras da escola, eu vou andando. A gente se vê. — Abriu a porta do carro, sem dar tempo de detê-lo e saiu.
Seu coração apertou completamente, quando o carro deu partida e ele ficou sozinho na calçada.
— Ela nem se preocupou em insistir... — sussurrou para si mesmo e chutou uma pedra no chão, com raiva.
Ele sabia que ela estava certa. Mas estava disposto a abrir mão de tudo, por que ela não?

A decoração do baile caía ainda melhor com as pessoas vestidas à caráter lá dentro. Caroline estava extasiada com o sucesso de mais uma produção sua e quase surtou ao ver chegando, mas viu que a amiga não estava com a melhor das caras.
! Você acabou de sair de uma limusine e está com cara de quem matou alguém! — Exclamou, completamente contrariada.
— Não estou no clima, Carol... — suspirou, arrumando a tiara na cabeça.
Estava profundamente chateada com a reação de , mas ela não abriria mão do segredo, não estava pronta.
— Pois trate de ficar, minha filha! Vem cá, temos ponches batizados! — Sorriu travessa para e a puxou para dentro do baile, que tocava Long Tall Sally nas caixas de som.
pôde ver vários pais das famílias fundadoras, além das garotas da torcida e do time, todos estavam muito bonitos e vestidos à caráter. As festas em Cambridge eram levadas extremamente a sério.
— Teremos a velha hoje? — Owen, que estava servindo os ponches, perguntou à ao entregá-la um copo.
— Eu espero que não! — respondeu com sinceridade, mas tomou um gole da bebida batizada.
Estava autorizada a beber um ou dois copos pelo seu psicólogo, nada mais que isso. Ele ainda achava perigoso que ela se embriagasse, mas ela não precisava ficar totalmente sem álcool.
Owen rolou os olhos, decepcionado. Todos sentiam falta de que festejava, pois o carinho deles era preenchido de interesse.

Com o passar das horas, a festa foi acontecendo e foi se soltando mais, ainda tomando cuidado com a bebida, mas a garota se permitiu dançar e se divertir com as colegas líderes de torcida. Tinha visto conversando com os garotos do time de futebol em um canto e ainda não tinha visto nem , muito menos — provavelmente os dois nem tinham ido. Mas ela não estava se importando, queria se divertir como há muito tempo não fazia.
As músicas tinham sido escolhidas a dedo pelo DJ e embora fossem antigas, esse detalhe não estava fazendo a menor diferença! Todos os alunos estavam se acabando na pista de dança.
Foi quando os primeiros acordes de I've Got You Under My Skin começaram, que sentiu seu braço ser puxado. Antes que ela se desesperasse, percebeu que era a puxando para o vestiário da quadra.
, me… — ela começou a dizer, mas ele a atropelou.
— Antes que você se preocupe, e não estão aqui... — ele respondeu, ríspido. — E eu te trouxe aqui para não sermos vistos! Viu? Ninguém! — Bateu a mão em um dos armários do vestiário, mas o barulho não foi abafado pela música.
— Me desculpe, ok? Mas eu não mudei minha opinião, . De verdade, eu gosto de você, realmente quero ficar com você, mas não é hora de todos ficarem sabendo, por favor, você precisa me entender! — implorou, pegando o rosto do garoto com as mãos.
Ele tentou desviar o olhar, mas ela o segurou firmemente.
— Olha pra mim, por favor. Nós vamos nos assumir para todos, eu prometo, mas no momento certo. Não está bom assim? — Ela deu selinhos na boca dele suavemente.
Ele ainda estava travado, tentando decidir se continuava com raiva ou não, mas não conseguia resistir aos encantos da garota.
— Você me deixa louco, ! — Ele sorriu, consequentemente fazendo a mais nova sorrir aliviada também.
Tinha conseguido.
— Temos uma limusine esperando pela gente atrás da escola. — Ele ergueu as chaves para e sorriu maroto, como uma criança quando faz algo de errado.
— O que estamos esperando? — correspondeu ao sorriso travesso do garoto e os dois partiram sem serem vistos, saindo pelo portão do colégio, indo em direção à rua deserta atrás da escola, onde a limusine estava estacionada.
Antes de se aconchegarem direito dentro do carro, já estava beijando a garota urgentemente, puxando seus cabelos, enquanto a mesma apertava sua nuca. parou o beijo para tirar os sapatos da gentilmente e aproveitar para tirar os seus também.
A garota removeu sua tiara, que já a estava incomodando, enquanto os dois aproveitaram para trocar de posição no espaçoso banco do carro. Agora ela estava por cima, distribuindo beijos pelo pescoço do garoto, enquanto ele tentava abaixar a meia-calça dela. Quando finalmente conseguiu, nem viu onde jogou.
Ele apertava a cintura de com vontade, enquanto a garota explorava seu pescoço e sua orelha. agora tinha as coxas da garota livre e apertava suavemente.
Ele a puxou novamente para um beijo, dessa vez tentando mostrar o quão apaixonado estava por ela. Era um beijo com ternura.
— Você… — ela insinuou, quando se separaram.
Sua feição não escondia o que ela queria.
— É um dia especial, com uma pessoa especial... — sorriu de lado e selou mais um beijo, antes de tirar a calcinha da garota delicadamente.



Capítulo 11
Dia dos Namorados no Baile dos Amargos.

N/A: Atenção, pessoinhas! Esse capítulo 11 é especial, porque foi escrito para a Atualização Temática do site: O Dia dos Namorados!

estava acostumada com as coisas na sua vida acontecendo exatamente na contramão do que deveriam. Mas, com certeza, naquele momento, tudo parecia estar seguindo por um caminho que certamente não foi planejado. Ela tinha voltado para Cambridge para acertar sua vida: ser a boa filha, aluna e pessoa que tinha deixado a desejar desde o acidente de Lily e, além disso, é claro, tentar mostrar para todos de uma vez por todas de que, de todas as coisas pelas quais ela era acusada, assassina não era uma delas. Mas lá estava ela, mudando totalmente o rumo de seus planos por uma coisa que não estava completamente calculada: um par de olhos verdes e o cabelo bagunçado. tinha entrado no seu caminho. E era um belo empecilho.
— Então nós estamos namorando? — Ele ergueu uma das sobrancelhas para ela, enquanto acariciava seu rosto.
Estavam deitados no chão do quarto da garota, depois de terem estendido a ação na limusine para o quarto.
— Algo assim... — respondeu simplesmente.
— E não vamos contar para ninguém?
— Você quer contar para que está namorando Isobel ? — A garota encarou no fundo dos olhos, o que fez a feição do garoto se desmanchar em preocupação. — Foi o que eu pensei! — Beijou a bochecha dele e depois o nariz. — Não ache que eu goste da situação, mas… não há como ele ou receberem bem essa notícia.
— Você gosta dele ainda? — perguntou de repente, o que fez arregalar os olhos de surpresa, como se tivesse sido pega com as calças nas mãos.
Antes que a garota formulasse uma resposta, o toque de celular de a salvou.
— Preciso ir. — Ele gemeu ao ver o visor, mas não deu espaço para que a namorada visse quem era. — Te vejo amanhã. — Deu um selinho rápido em e saiu às pressas pela janela, sem dar chances para a garota se explicar ou até mesmo perguntar de quem era o telefonema desesperado.
A garota se deitou na cama dessa vez, pensativa sobre a pergunta “você gosta dele ainda?”. É claro que ela gostava. Não tinha como esquecer toda a história dela com , tudo que passaram juntos, tudo que construíram — e que ela tinha destruído. era a pessoa que a garota mais amou em toda sua vida, desde crianças os dois pareciam ser destinados.
O caminho para o romance na adolescência foi natural, orgânico e até mesmo um pouco clichê: ele, o jogador de futebol, e ela, a líder de torcida. e : o casal modelo de Cambridge.

, pra onde você está me levando, seu louco? — ria, enquanto o namorado a puxava pela mão na escuridão.
Já passava da meia-noite, os dois estavam juntos depois de sua primeira noite maravilhosa. Pareceu perfeito para a garota perder sua virgindade com o melhor namorado do mundo, no Dia dos Namorados. sabia que sua vida, diversas vezes, sempre quando estava no meio, parecia um filme.
Hoje o dia tinha sido perfeito para os dois, ela estava feliz e sóbria, os dois tinham selado o relacionamento e não podiam estar mais felizes. Mas faltava uma coisa.
! — A garota exclamou, quando eles chegaram na porta dos fundos do parque de diversão que estava na cidade. — Como você conseguiu a chave?
— Eu paguei um cara. — sorriu.
Ele não podia estar mais feliz. Era o cara mais sortudo do mundo: tinha conquistado a camisa 10 do time de futebol da escola e tinha uma namorada perfeita ao seu lado. Não podia pedir mais do que isso.
— Você sempre disse que uma noite perfeita seria a que a gente se beijasse no topo de uma roda gigante, então estou aqui para realizar um dos seus sonhos... — ele a guiou pelo parque até a roda gigante, o único brinquedo do parque que estava aceso. — Ei, Jorge! — cumprimentou o um cara mais velho que estava sentado perto dos controles do brinquedo, mostrando-se totalmente entediado. Claramente estava ali só porque tinha sido pago.
— Quinze minutos, . Senão terei problemas. — Ele murmurou e assentiu, puxando a namorada para dentro de uma das cabines.
Ela estava tão emocionada que mal podia falar.
— Eu preparei uma coisa... — o garoto começou a dizer quando o brinquedo começou a rodar e tirou das costas o violão que ele carregava.
sabia o que estava por vir, já que o namorado tinha ficado a semana inteira se esgueirando pelos cantos da escola com violão e papel. Era óbvio que ele tinha escrito uma música para ela. não estava satisfeito em ser apenas o melhor jogador de futebol da escola: ele também cantava.
— Não sabia como mostrar para você o quanto eu te amo, então escrevi uma música... Shut the door, turn the light off, I wanna be with you, I wanna feel you love, I wanna lay beside you… I can not hide this, even though I try... — a voz de era suave e ele cantava olhando no fundo dos olhos de , como se quisesse passar tudo que estava sentindo para a namorada, que o olhava encantado. — Hearts beats harder, time escapes me, trembling hands touch skin, it makes this harder and the tears stream down my face…

If we could only have this life for one more day, if we could only turn back time... — com a mente de volta à realidade, se lembrou exatamente do trecho da música que mais encaixava em sua vida agora.
Tudo que ela queria era voltar no tempo, voltar no exato momento em que cantava para ela naquela roda gigante. Antes da vida deles terem tomado um rumo totalmente trágico.

You know I’ll be your life, your voice, your reason to be my love, my heart is breathing for this, moments in time, I’ll find the words to say, before you leave me today...
se assustou com essa parte da música, então seu pequeno transe nos olhos azuis de se perdeu um pouco no momento em que as palavras “before you leave me today” saíram da boca dele, mas o namorado riu e continuou:
You know I’ll be your life, your voice, your reason to be my love, my heart is breathing for this, moments in time, I’ll find the words to say… one day, will you marry me?
… — não conseguia dizer mais nada, as lágrimas já inundavam seu rosto e ela sorria mais do que nunca.
— Esse é meu primeiro pedido de casamento, mas não o oficial. Não ainda. — Ele beijou o rosto da garota, limpando as lágrimas logo em seguida. — Mas eu quero passar o resto da minha vida com você.
Even if I die… I’ll never forget you. cantarolou no ouvido do namorado e o beijou.
tinha realizado todos os sonhos dela naquela noite.

A realidade acertou como nunca antes. Ela tinha tudo. Tinha o namorado perfeito, sabia que teria um futuro maravilhoso com e tinha jogado tudo fora por causa de comprimidos, míseros comprimidos que traziam uma sensação mínima de paz. Nada comparado ao que ela sentia com ele.
— Burra! Burra! Burra! — A garota se enfureceu, jogando todos os seus travesseiros no chão do quarto, além de todas as coisas que estavam em cima de sua penteadeira.
Antes que pudesse se conter, soltou um grito que estava preso em sua garganta há dias, em meio às lágrimas que já caíam sobre seu rosto.
! Filha! O que é isso? — Emma entrou correndo no quarto da filha, horrorizada com a cena diante de seus olhos.
Sua filhinha estava agora jogada no chão do quarto, puxando os próprios cabelos e chorando copiosamente.
— Eu estraguei tudo, mamãe. Eu o amava. Eu o amava! — A garota conseguiu dizer em meio ao choro de desespero e Emma correu para abraçá-la no chão, apertando-a contra seu peito.
— Eu sei, meu amor… shiiii, respire! — Tentou acalmá-la, mas tudo que se ouvia era o choro desesperado de .
A garota tremia e soluçava nos seus braços.
— Eu pensei que as coisas estavam bem com , querida.
— Você não entende, mãe? Eu nunca vou amar como eu amo . Nunca amarei ninguém como eu o amo e eu o perdi mãe, eu o perdi pra sempre. — Após exteriorizar essas palavras, o choro que saiu de foi ainda mais doloroso.
Cada parte de seu corpo doía. Seu sofrimento causava dor física. Emma não sabia o que responder, não sabia como confortar sua própria filha e, por isso, grossas lágrimas também caíam silenciosamente pelo seu rosto.
Do lado de fora, na sacada do quarto de , também não sabia o que fazer. Ele tinha voltado, porque tinha esquecido a carteira e também queria pedir desculpas à garota por ter sido tão ríspido, mas ao ouvir a conversa da amada com a mãe, ele ficou paralisado. Agora estava claro que ele nunca esteve errado. nunca o amaria e nunca deixaria de amar .

•••

— Dia dos Namorados no Baile dos Amargos! — Caroline afirmou animada para e a entregou o flyer da festa que aconteceria no campus da faculdade de Cambridge.
As duas estavam caminhando para o treino da torcida naquela segunda-feira.
— Ainda fazem isso? — franziu a testa, observando o panfleto que convidava todos os solteiros da região a se juntarem s eles para curar as dores de um coração partido.
— Sempre há solteiros na cidade, ... — Forbes rolou os olhos, o que fez rir. — E qual é a desses óculos de sol?
— Acordei com os olhos inchados. — respondeu rapidamente.
Seus olhos realmente estavam do tamanho de uma bola de tênis por ela ter passado a noite inteira chorando nos braços de Emma.
— Não sei se tenho animação para essas festas mais, Carol. — Mudou de assunto rapidamente, antes que a amiga a enchesse de perguntas.
recusando uma festa? — a loira arregalou os olhos inicialmente, mas depois passou a analisar a amiga com mais cuidado. — você está saindo com alguém?
— Não! É claro que não! — tentou ao máximo manter a naturalidade, enquanto sentia os olhos de Caroline pesando sobre ela, tentando captar qualquer traço de mentira. — Só não estou animada, Forbes. Vamos logo, Meredith vai matar a gente! — Puxou a loira pelo braço e as duas correram em direção ao campo, onde todas as esperavam.
Meredith estava com sua habitual cara de nojo para . A relação das duas estava ainda pior depois da confusão na sala do diretor, o que refletia diretamente nos treinos: tudo que fazia era motivo para ser criticada e humilhada pela capitã na frente de todas as torcedoras. Mas, especialmente naquele dia, não estava com nenhum humor para aguentar os desaforos de Brown. Seu namorado não tinha dado nenhum sinal de vida durante o resto do final de semana, não tinha atendido suas ligações e nem respondido suas mensagens. Além disso, Emma estava pisando em ovos com ela novamente, provavelmente temendo que ela tivesse uma recaída e, para piorar, ela ainda tinha que ir para a detenção ao final das aulas. Com . . O mesmo pelo qual ela tinha chorado na noite passada, após uma noite maravilhosa com seu atual.
Ela estava se sentindo a pior pessoa do mundo.
— Ao menos um colírio para os olhos. — Olive, uma das torcedoras murmurou, apontando com a cabeça para os meninos do time de futebol, que estavam entrando no campo correndo para se aquecer.
se virou no mesmo instante para procurar por , quando o achou, viu que ele estava com uma cara pior do que a dela ainda, parecia estar enfrentando uma ressaca horrível. Ao seu lado, conversando com ele, estava , com suas habituais olheiras e o rosto contrariado, como sempre. Nenhum dos dois olhou para ela.
— Ei, não está no horário de vocês! — Meredith exclamou, a voz irritante perfurando os tímpanos de todos.
— Relaxa, Mer-Mer, só precisamos de dez minutos. — deu uma piscadela para a garota e no mesmo instante, alguns garotos do time tiraram os casacos do time que vestiam, exibindo blusas de corações e letras que formavam a frase “eu te amo”.
Os três formaram uma fila na linha do meio de campo, enquanto todas as garotas os olhavam desacreditadas, algumas deixaram escapar risadinhas.
You are my fire... — o primeiro, Josh, começou a cantar e apontou para William, que continuou.
The one desire... — E apontou para Julian, que continuou.
Believe when I say, I want it that way...
TELL MY WHY! — Os três exclamaram juntos, fazendo todas a volta rirem, quando Tyler surgiu de trás dos três com um cartaz enorme escrito “Kimmie, quer namorar comigo?”.
A torcedora deu um gritinho ensurdecedor, enquanto todos à volta batiam palmas e assobiavam, e uivava de tanto rir no gramado.
— Mais um Dia dos Namorados normal em Cambridge High School... — Caroline comentou rindo, quando Kimmie e Tyler se beijaram para selar o pedido, e riu concordando.
De relance, olhou para seu próprio namorado, que estava ocupado caçoando de Tyler.
— Kimmie tem sorte... — murmurou e rolou os olhos. Não estava com nenhum humor para treinar. — Hey, lembrei que tenho que terminar um dever. Você me dá cobertura com a Meredith? — Pediu à amiga, que concordou confusa com a cabeça e não deixou sair antes de falar:
— Você vai à festa, né?
— Sim, Caroline Forbes, não se preocupe. Não é como se tivéssemos aula amanhã nem nada, né? — Conseguiu sorrir para a loira, que gargalhou.
Ninguém se preocupava com isso em Cambridge em dias de festa.
Quando se tratavam de datas comemorativas, desde o dia dos fundadores até o Dia dos Namorados, as garotas da decoração se superavam: os corredores estavam lotados de corações nas cores rosa e vermelho, além de balões de corações. Algumas garotas do grêmio e do clube de teatro andavam pelos corredores entregando corações, recados, chocolates. Enquanto alguns armários estavam decorados também.
passava por tudo aquilo sem conseguir achar graça.
Quando namorava , o garoto fazia questão de lhe dar flores e lhe entregar cartões durante todas as aulas, além dele mesmo decorar seu armário. riu sozinha ao se lembrar da declaração no campo. Aquilo com certeza seria uma coisa que faria por ela no passado.
— Pare de pensar nele! — Sussurrou para si mesma ao chegar no seu armário, abrindo-o com um soco.
— Pensar em quem? — Tomou um susto ao ouvir a voz de .
O garoto parou ao lado do seu armário, encostando-se.
— Oi! Bom dia, tudo bem? — Agora ela estava brava. — Como foi o seu final de semana, já que você não se importou em dar sinal de vida?
— Estava ocupado com algumas coisas... — respondeu rispidamente. — Pensar em quem?
— Por que você está me tratando dessa forma? — perguntou. — Você nem consegue olhar para mim, ! — Ela reclamou e ele levantou os olhos verdes para olhá-la.
— Tem razão, eu sou um idiota. Me desculpe. — As palavras saíram de sua boca, mas ele não parecia estar sendo sincero e não convenceu , mas ela não estava com humor para brigar. — Posso te compensar hoje à noite? — Perguntou com os olhos esperançosos, dando seu melhor sorriso.
— Tenho uma festa para ir... — respondeu, mais para provocá-lo que tudo.
Nesse momento, o dia dos amargos lhe pareceu muito oportuno. Vendo a cara de confusão dele, a garota lhe entregou o panfleto da festa. arqueou a sobrancelhas e riu sarcasticamente.
— Bem, talvez a gente se encontre lá, então, como solteiros. — Frisou e viu com a satisfação a expressão de vacilar por alguns segundos, mas ela logo se recuperou.
— Como quiser. Agora tenho que ir. — Empurrou-o de lado e tentou fazer uma saída dramática, mas foi puxada pelo braço e o garoto colou seu corpo no dela, fazendo-a arfar.
— Você não vai a lugar nenhum, ! — Deu um sorriso safado ao ver a expressão da garota.
Naquela altura, não tinha ninguém pelos corredores, então com uma breve olhada pelos corredores, a puxou ainda para mais perto e colou seus lábios nos dela, beijando-a suavemente. Sua mão logo foi para a nuca da namorada, puxando-a levemente. concentrou as suas no cabelo macio de , que arfou com o contato.
O garoto cessou o beijo, depositando selinhos na bochecha, queixo e pescoço de , causando arrepios na garota.
— Me desculpe por ter sumido… não farei isso mais, fui um idiota com você. — Suplicou.
— Vou… pensar… no seu… caso... — ela respondeu com dificuldade, enquanto o garoto distribuía beijos pelo seu pescoço. — Para… vão nos pegar! — Conseguiu terminar a frase e ele a soltou com um sorriso satisfeito no rosto.
— Te vejo na festa, gatinha! — Deu-lhe o último selinho e a deixou ali, parada no corredor, tentando controlar a respiração.
Ao virar à esquerda para se dirigir à sua próxima aula, ouviu uma voz conhecida dizer:
— Está ficando desleixado, .
— Vá para o inferno. — Respondeu simplesmente e continuou seu caminho, embora um frio tenha corrido pela sua espinha.

— Você é péssimo, ! — ouviu a voz da melhor amiga na arquibancada e se virou apenas para exibir seu belíssimo dedo do meio para ela.
Era a quinta batida de falta que ele errava naquele dia. Estava péssimo. Não tinha conseguido dormir no final de semana e seu dinheiro para comprar o que o ajudaria tinha acabado, já que o tio John ainda não tinha depositado seu cheque. Era ele quem cuidava das finanças do garoto, que claramente não precisava se preocupar, já que as Indústrias lhe davam um bom patrimônio.
— Você não tem nada melhor para fazer, além de encher meu saco, ? — Perguntou para a amiga, que vestia seu uniforme customizado e estava com os cabelos longos presos em um rabo de cavalo.
— Eu vim te convidar para se divertir hoje. Sei que estou em dívida com você, meu caro amigo! — Ela se levantou da arquibancada e foi em direção ao melhor amigo, que a abraçou de lado. — Senti sua falta esse final de semana! Acabou que minha mãe me prendeu em casa e eu nem foi à festa, senhor está uma fera comigo... — deu de ombros e riu.
Era difícil achar uma pessoa com quem o diretor não estava uma fera nesses últimos tempos.
— Temos o Baile dos Amargos hoje! — comentou com a amiga. — O nome é propício para nós dois, você sabe! — Sorriu e o empurrou.
Claramente a festa era perfeita para as duas pessoas mais comprometidas emocionalmente daquela cidade. odiava seu primeiro amor e não estava nem perto de ter uma vida amorosa bem resolvida.
— Tem visto o ? — arriscou perguntar e viu o rosto da amiga enrubescer e ela mudar o peso de um pé para o outro.
Claramente aquele assunto a deixava desconfortável.
— Não. — Respondeu simplesmente e mudou de assunto, como sempre. — Vista algo bonito, ! — Beijou o rosto do amigo e girou os calcanhares para sair do campo.
Seu estômago já começava a revirar e as lágrimas a brotar dos seus olhos. Essa era a reação que ela tinha toda vez que se lembrava de seu ex-namorado. Odiava que seu corpo ainda tivesse essa reação mesmo com uma pequena menção ao , mas era isso que a dependência emocional fazia com ela.
correu para chegar no banheiro a tempo de botar todo seu café da manhã para fora no vaso da primeira cabine. Ela vomitou duas vezes, até se sentar encostada na divisória do banheiro, limpando o suor da testa com a barra da blusa.

, onde você está? Por que está demorando tanto? — estava se sentindo a garota mais idiota do mundo plantada naquele restaurante, deixou o vigésimo recado para o namorado, já que o celular dele estava caindo na caixa-postal.
O garoto já estava uma hora atrasado. O garçom já tinha vindo à sua mesa três vezes para liberar a mesa, encarando a menina e a grande caixa que estava em uma das cadeiras — o presente que ela tinha passado o mês inteiro fazendo.
e estavam juntos e ela não queria estragar a noite deles, que ela tinha ajudado a organizar, inclusive. Então só restava uma pessoa com quem ela podia desabafar.
— Moça, me desculpe. Mas o restaurante está lotado, só posso segurar sua mesa por mais dez minutos. — O garçom novamente veio até a garota, que dessa vez não o impediu.
— Caso apareça pedindo essa mesa, entregue isto a ele... — entregou a grande caixa ao garçom, que franziu a testa, mas não fez objeção. — E diga que está tudo acabado. — Levantou-se, puxando sua bolsa e saiu do restaurante com lágrimas nos olhos.
Não podia acreditar no seu azar. Em pleno Dia dos Namorados ser tratada daquela forma. Não era justo. Era a última chance que tinha tido com ela e jogado fora, mais uma vez.
A garota dirigiu com as lágrimas caindo pelo seu rosto e nem se deu conta quando estacionou na porta da grande casa dos . Bateu na porta, na esperança que o amigo atendesse e não estivesse em qualquer festa enchendo a cara. Suas preces foram atendidas quando abriu a porta, ele estava com o rosto confuso e com o cabelo bagunçado, como sempre.
? O que aconteceu? Você está bem? — Perguntou preocupado e puxou a amiga para dentro.
Estavam sozinhos, pois seus pais tinham saído para comemorar o Dia dos Namorados em Londres.
me deixou esperando no restaurante... — a amiga respondeu aos prantos e a sentou no sofá, correndo na cozinha e voltando em alguns segundos com um copo de água.
A garota tomou um gole e respirou fundo, as lágrimas ainda caíam pelos seus olhos.
— Foi a última chance que eu dei a ele, . Eu juro.
— Ele é um babaca! — puxou a amiga para seu abraço. — Você não merece chorar por ele. — Beijou a testa de , que fungou e limpou as lágrimas.
Seria a última vez que ela choraria por .
— Você tem bebida em casa? — Perguntou subitamente, o que fez dar uma gargalhada.

se lembrou daquele dia, enquanto tentava recuperar o fôlego e perder o enjoo. Aquela não tinha sido nem de longe a última vez que chorou por e nem a última chance que tinha dado a ele, os dois só foram se separar em definitivo há poucos meses, quando a garota finalmente deu um basta na relação amorosa. Eles ainda se falavam de tempos em tempos, mas ela não procurava saber dele com tanta frequência. Exceto por essa manhã.
? — Ouviu a voz de e olhou para cima para ver seu amigo entrando no banheiro feminino. — Você está bem? Jéssica viu você aqui e me chamou... — mentiu, para não dizer que foi que viu e preferiu lhe mandar uma mensagem, ao invés de acolher , já que seria a última pessoa que ela queria ver.
— Só tem gente fofoqueira nessa escola... — a mais nova resmungou.
— Ei, que mal humor é esse? É Dia dos Namorados, baby! — O cabeludo riu e viu rolar os olhos.
Ela tentou se levantar, mas sua cabeça girou novamente e ela desistiu. a observou preocupado e se sentou de frente para ela.
— O que você tomou de café da manhã, ? — Perguntou, sentindo o cheiro, ainda que ela tivesse dado descarga três vezes.
— Vodka com biscoitos! — Riu e a olhou preocupado.
Sabia que era uma data difícil e significativa para a amiga, mas achou que ela estivesse bem.
— Não se preocupe comigo. — Ela tratou de dizer, antes que pudesse se manifestar. — Sabemos bem onde isso nos levou no passado.

, já chega, já bebemos demais… — advertiu a amiga, que dançava em cima do sofá caro de Melanie .
— Relaxa, , seus pais não vão voltar hoje! Eles estão transando, ao contrário da gente… eu fui abandonada pelo meu namorado e você… eu não sei por que você não está com ninguém! — Ela falava com dificuldade, ainda dançando com o ritmo da música.
desistiu de descer a amiga do sofá e se sentou onde as pernas e braços dela não o alcançavam, tomando um gole de sua cerveja. A garota que ele amava estava com o melhor amigo dele, por isso ele estava sozinho e deprimido em casa.
— Você é um cara bonito… olhos verdes… só esse seu cabelo que você deveria arrumar melhor, mas tirando isso! — dessa vez desceu do sofá e se enroscou entre as pernas do amigo, que se endireitou no mesmo momento. — Você até que é bonito… — riu e se jogou no colo de .
, o que você está fazendo… você namora e nós… somos…
A garota começou a beijar o pescoço de , passando a mão pela barriga do menino por baixo da blusa, até chegar na base da calça dele.
— Amigos…
era um cara legal. Jamais se aproveitaria da amiga, ainda mais ela bêbada, mas ele também era homem.
— Eu sei o que eu estou fazendo. — Ela sussurrou no ouvido dele, causando um arrepio involuntário no garoto, que instintivamente colocou as mãos na cintura dela, puxando-a para mais perto.
gostou disso e riu, dando um selinho no amigo.
— Ninguém jamais saberá disso. — Sussurrou novamente e colou seus lábios nos de , que correspondeu a puxando para mais perto.

— Agora você não está bêbada. — concluiu.
A mente dos dois tinha voado naquele dia. Os dois fingiam que nunca tinha acontecido, o que aconteceu na sala e posteriormente no quarto era assunto enterrado para os amigos.
— E eu jamais faria isso de novo, ugh! Só de pensar está me dando vontade de vomitar de novo!
— Assim você me ofende, ... — riu e deu um peteleco na amiga. — Vou te levar para a enfermaria.
— Não! — Ela gemeu. — Já estou bem, não quero perder a festa hoje à noite!
— Baile dos amargos? — Ele ergueu uma das sobrancelhas e amiga assentiu, sorrindo. — vai?
— Sim, por quê? — franziu as sobrancelhas. — A não ser que ele tenha resolvido reatar com a , sim... — brincou e deu uma risada forçada para acompanhar a amiga, ajudando-a a levantar.
— Parece que vamos todos à festa. — Os dois garotos que estavam na porta do banheiro ouvindo toda a conversa riram e bateram as mãos em um high five, girando os calcanhares para saírem dali antes de serem vistos.

A decoração do Baile dos Amargos era um espetáculo à parte: o campus da Cambridge High School estava completamente enfeitado com corações partidos e frases motivacionais para os solteiros da cidade. Estava abarrotado não só de alunos da Cambridge High School, mas também de outras escolas e até mesmo os veteranos da faculdade, que costumavam promover as melhores festas da região, quase sempre exclusivas aos universitários. Então, quando faziam eventos abertos, todos os alunos ficavam animados para participar.
estava vestindo um vestido preto tubinho, bem colado no corpo, acompanhada de uma bota coturno da mesma cor. A bolsa branca pendia no braço da menina, que transitava entre as pessoas cumprimentando um ou outro conhecido. Não tinha sido fácil pular a janela com aquele vestido, mas a garota, ainda assim, estava estonteante. Ela tinha optado por pular, porque sabia que Emma faria caso dela estar saindo em uma segunda-feira, então preferiu evitar.
A garota olhava para todos os lados, ansiosa para achar , mas acabou esbarrando nas duas pessoas que ela andava evitando: e . A primeira estava vestida com um cropped azul e uma saia jeans preta bem curta, acompanhada de um tênis vans old skool, enquanto se vestia do mesmo jeito de sempre: calça preta e blusa branca, com um dos seus air max no pé e os cabelos penteados para trás.
— Desculpe. — murmurou e abaixou a cabeça, deixando-os para trás e seguindo seu caminho.
e se entreolharam e a mais nova franziu a testa:
— Será que nós somos os monstros, ? — Perguntou receosa.
Desde o dia que discutiu com no banheiro, a menina estava se perguntando se estava sendo injusta com a ex-melhor amiga, mas ainda não tinha tomado nenhuma decisão.
— Ela matou minha irmã, . — rolou os olhos. — Vem, vamos pegar uma bebida. — Indicou com a cabeça para as mesas onde as bebidas estavam sendo servidas e os dois giraram os calcanhares para irem, mas depois de poucos passos, o corpo da mais nova se chocou contra o de outra pessoa.
Quando ergueu os olhos para pedir desculpas, o ar se perdeu dos pulmões e suas pernas pareciam gelatina.
— Poxa, eu sempre soube que esse seria um Dia dos Namorados perfeito... — exclamou com um sorriso no rosto.
— Me dá licença. — conseguiu recobrar os sentidos e disse entredentes, mas a ignorou totalmente.
— O que é, ? Vamos conversar, pelos velhos tempos… — pediu com ternura, colocando uma mecha de cabelo no ouvido da garota.
— Não quero falar com você… — ela pediu chorosa e , que até então apenas observava a situação, entrou no meio para intervir.
— Acho que você entendeu o recado, não é, dude? — entrou na frente da amiga, ficando cara a cara com .
, … sempre se intrometendo. — murmurou, cerrando os punhos.
— Quer apanhar de novo? — ameaçou.
Todos se lembravam da briga em que os garotos tinham se metido da última vez que aprontou com . não deixava barato para quem magoava sua amiga.
— Saiba que eu deixei passar a última vez, mas fique esperto, … sua hora está chegando. — ameaçou e fez questão de esbarrar nos ombros de , antes de sair andando na direção oposta a eles.
No mesmo instante, o loiro se virou para a melhor amiga, que estava pálida e tinha lágrimas nos olhos.
— Ei, ei… respira fundo, ok? Vou te levar para longe daqui! — pegou nas mãos de e a guiou para longe da multidão.

não conseguia encontrar de jeito nenhum, já tinha visto metade dos amigos da escola, inclusive os únicos que ela não queria esbarrar, menos o garoto. Foi quando ela sentiu as mãos firmes na sua cintura e sorriu. Finalmente! Mas quando se virou, o sorriso sumiu aos poucos do rosto de . Não era quem a segurava firmemente e, sim, Damien.
— Me solta agora. — disse com a voz trêmula, mas o garoto riu e tirou as mãos dela.
Ele estava com o semblante assustador de sempre e vestia uma touca tampando os cabelos castanhos.
— Isso é jeito de me recepcionar, cricket? Estou chateado… — Lockwood colocou as mãos no coração e fechou os olhos brevemente, como se estivesse realmente tocado. — Você não se lembra do nosso último Dia dos Namorados juntos?

— Dia dos namorados uma ova! — murmurou e acendeu o baseado, dando uma longa tragada seguida de uma tosse, enquanto Damien aumentava o som para que Locked Out Of Heaven do Bruno Mars estourasse nas caixas de som de sua casa.
Havia latinhas de cervejas espalhadas pelo chão, além do fedor imenso de maconha espalhado pelo ar. estava jogada no sofá do garoto saboreando o cigarro.
— Essa música combina muito com você, ... — o garoto, que ainda não tinha a cicatriz no rosto, sorriu para , que o olhou confusa. — ‘Cause you make me feel like I’ve been locked out of heaven… — Lockwood cantarolou junto com a música e fez dar uma gargalhada.
Realmente, a música era a cara dela. Ela trazia todos para o próprio inferno pessoal.
— Realmente, Damien-boy… você está disposto a ir para o inferno comigo? — A garota se levantou em direção a Damien, cambaleando um pouco.
Os dois estavam desde cedo usando drogas e bebendo para comemorar a data que os dois mais achavam ridícula: o Dia dos Namorados. estava desiludida com o amor depois do último namorado e Lockwood sofria por um amor não recíproco.
— Não brinque comigo, ! — O garoto engoliu em seco, quando chegou perto o suficiente para que suas respirações se confundissem.
Os dois estavam tão perto, que pareciam um só.
— Não seja estupido, Lockwood. Eu jamais ficaria com você. — riu e tragou fortemente seu baseado, extinguindo a distância entra ela e o garoto Lockwood.

— Você foi uma garota má, ! — Lockwood os tirou do mar de lembranças que ele e entraram.
Aquele foi o último Dia dos Namorados que ela teve antes de conhecer e sua vida mudar completamente. Ela estava perdida naquele tempo.
— Mas devo admitir que você era mais divertida naquele tempo.
— Por que você não me deixa em paz? — perguntou, seus olhos encheram de água ao se lembrar daquele dia.
Damien sempre despertava o pior nela, ele se parecia com um diabinho na orelha dela, sempre pronto para vê-la ruir.
— Que graça minha vida teria? — Damien riu e beijou a bochecha da garota, antes de desaparecer na multidão, ao mesmo tempo que chegava para ampará-la.
— Onde você esteve? Te procurei por toda parte, o que ele fez com você? — Perguntou preocupado, depositando as mãos no rosto da namorada.
— Nada! Eu estou bem! — tentou responder, mas sua voz embargada e as lágrimas no rosto denunciaram o oposto.
— Vem, vamos para um lugar mais calmo. — a pegou pelas mãos e os dois se distanciaram da multidão, indo para o estacionamento da faculdade, onde com certeza estariam a sós e ele poderia pegar a surpresa no carro também. — Veja… — beijou a bochecha de antes de continuar. — Eu estive pensando e… não fiz um pedido de namoro decente para você e tenho sido um idiota nesses últimos dias, então só queria que você soubesse que… escrevi outra música para me redimir. — Ele a olhou esperançoso. Esperava que isso a distraísse do que tinha acontecido anteriormente.
sorriu com a ironia daquele momento, mas não deixou transparecer que estava pensando em outra pessoa. Apenas assentiu para que continuasse.
— O nome é Love is Easy. — O cabeludo sorriu e continuou. — Eu acho que ela combina perfeitamente com o Dia dos Namorados e eu fiz para que você se lembre desse dia. Estamos longe de ser o casal perfeito e eu sei de tudo que você está passando, sei que vai ser sempre o cara que você amou primeiro, mas eu estou disposto a passar por cima disso. — terminou e se sentia incapaz de falar.
Será que ela o merecia?
O garoto pegou o violão no banco de trás de seu carro. No mesmo instante, entendeu por que ele a tinha levado para o estacionamento.
Today, I’m laughing the clouds away, I hear what the flowers say and drink every drop of rain… and I see, places that I have been, in ways that i’ve never seen, my side of the grass is green… cantava suavemente, enquanto se balançava ao som da melodia do violão, fazendo rir em meio às lágrimas de emoção que saiam dos seus olhos. — Oh, I can’t believe that it’s so simple, it feels so natural to me. If this is love, then love is easy, it’s the easiest thing to do; if this is love, then love completes me, ‘cause it feels like I’ve been missing you... fez uma dancinha ridícula, o que fez pender a cabeça para trás para rir do namorado. — A simple equation, with no complications to leave you confused. If this love, love, love… oh, it’s the easiest thing to do… do! do! doo! riu e terminou a música com um último acorde no violão.
Antes que ele pudesse falar qualquer coisa, pulou em seu colo, quase o derrubando. O garoto a abraçou com a mão livre e quando se soltaram, deram o beijo mais apaixonado até então. Finalmente suas línguas pareciam realmente se encaixar, como se tudo parecesse certo e nada mais importasse. Nem , nem e nem ninguém. O mundo era deles.
— Aqui, no Baile dos Amargos, no Dia dos Namorados… você quer ser minha namorada, agora oficialmente? — sussurrou no ouvido de , que decidiu dizer “sim” com um beijo.
A partir dali, ela era dele.
Oh, nada mal! — Os dois ouviram barulho de palmas e se viraram para ver quem tinha estragado o momento, dando de cara com Damien.
O garoto estava parado no meio do estacionamento, distante dos dois. Mas, ainda assim, podia ser ouvido.
— Por que você simplesmente não dá um tempo, Lockwood? — perguntou, enfurecendo-se, e ia caminhar em direção ao garoto da cicatriz, mas colocou a mão no seu peito.
— Vamos embora, huh? Ele não merece nosso tempo. — Pediu desesperada.
Tinha medo que os dois começassem a brigar. a olhou com ternura e decidiu ouvi-la, virando-se para entrar no banco do motorista.
— Não acredito que está deixando uma garota mandar em você, ! — Damien, em um gesto desesperado, provocou mais uma vez. — Ainda mais uma vadia como a . Você realmente acha que uma musiquinha vai fazer ela te amar? já fez isso há um ano, cara. Você devia ser mais original! — Riu e se preparou para brigar, quando não conseguiu se conter com a provocação e saiu marchando em direção ao Lockwood, com em seu alcanço tentando impedi-lo.
Foi nesse momento em que tudo aconteceu em câmera lenta: ao mesmo tempo em que acertou um soco em cheio no rosto de Damien, que estranhamente não revidou, e tentava tirá-lo de cima para que ele não acertasse um segundo, o barulho ensurdecedor da explosão e as chamas os jogaram para longe.
O carro de tinha explodido. O mesmo carro que ele e entrariam, se Damien não o tivesse chamado para briga.
Feliz Dia dos Namorados. — Damien murmurou, antes de desmaiar ao lado do casal, que também estava ferido no chão.



Capítulo 12

N/A: Oi, pessoal, só um aviso antes da leitura para vocês não ficarem confusxs: o capítulo inteiro é um flashback!

Sexta-feira, 10 de outubro de 2014:

— Polícia de Cambridge, qual sua emergência?
— Por favor, preciso de ajuda. Eu acabei de causar uma explosão. — A voz feminina na linha do celular era assustada, mas não chorava.
— Qual seu nome? Onde você está? Está ferida? — O atendente da polícia fez as três perguntas devagar.
— Não estou ferida, mas meu amigo sim, venham rápido, por favor, estou na Madingley Ave. — A garota respondeu rapidamente e um estrondo foi ouvido do outro lado da linha. — E meu nome é .

18 horas antes...

O tempo nublado e frio de Cambridge foi suficiente para manter na cama até que ela estivesse devidamente atrasada para ir à escola, mas ela não estava se importando. Levantou-se calmamente, ainda sonolenta, e se dirigiu ao banheiro para tomar um banho e se arrumar para o colégio. Após o banho quente, vestiu-se com o uniforme das líderes de torcida, o qual ela tinha mandado bordar “”, para que ficasse diferente das demais, fez uma maquiagem leve e pegou suas coisas, descendo as escadas da grande mansão, que estava silenciosa. Seus pais tinham saído de madrugada para viajar para Los Angeles para abrir uma nova franquia das Indústrias , agora longe da terra da Rainha.
— Bom dia, senhorita ! — William apareceu vindo da cozinha com uma xícara de café nas mãos. — Está atrasada. — Observou o óbvio e a garota rolou os olhos.
— Bom dia, William. Já ouviu a Rainha dizer que não é ela quem se atrasa, mas, sim, que todos os outros estão adiantados? — Sorriu para o motorista que a acompanhou, estendendo o braço para guiá-la até o carro.
— Não vai tomar café, ? — Joanne apareceu na porta da cozinha e balançou a cabeça negativamente.
Não tinha fome pela manhã.
— Eu como alguma coisa na escola. Beijos, Joa! — Mandou dois beijinhos com a boca e se deixou ser guiada por William até o carro, entrando no banco de trás e puxando os fones de ouvido para que o motorista não puxasse papo com ela, já que não estava com humor para um papinho matinal, apesar de amar William.
Sua noite não tinha sido das melhores, tinha tido uma briga com sua mãe, mais uma vez, e ela tinha ido viajar brigada com ela, sem se despedir.
Não viu o tempo passar, enquanto olhava pela janela do carro, as ruas pelas quais ela passava todos os dias, era tudo sempre a mesma coisa. Sempre a mesma rotina. Todos os dias o mesmo caminho, as mesmas pessoas na escola, os mesmos professores. Tudo sempre o mesmo. E ela estava ficando cansada daquilo tudo há tempos.
só percebeu que tinha chegado, quando escutou o barulho, por cima da música, de sua melhor amiga espancando o vidro do carro.
— Tchau, William! — Murmurou e saiu do veículo, batendo a porta e encarando , em seguida, com a testa franzida.
— O que foi? — Ela percebeu que a cara da amiga não estava das melhores, porque nem tentava disfarçar, e já logo presumiu que tinha acontecido alguma coisa.
— Nada. Bom dia pra você também, . — respondeu secamente e a amiga rolou os olhos, já estava acostumada com o coice quando estava de mau-humor.
— Seu estado de espírito não vai me abalar hoje, . — resmungou e saiu andando na frente da amiga, sem dar chance para que a segurasse ou chamasse para se desculpar.
Estava ansiosa para contar as novidades da noite passada, mas a vontade tinha sumido no mesmo momento em que tinha sido estúpida com ela. Era sempre assim: se a garota tinha um problema, automaticamente todos tinham que sucumbir ao mal humor e falta de educação dela. Era um grande defeito de ser tão mimada e egocêntrica, mas todos tentavam lidar o melhor possível com ela, já que evitavam a qualquer custo qualquer confusão com a menina.
Ela, no entanto, continuou caminhando, alterando a música na playlist para algo mais calmo, esperando que isso melhorasse seu humor. Ela não gostava de ser grossa e não conseguir disfarçar suas emoções, aquilo tudo era um muro para que ela não desmoronasse. Sua relação com Emma estava de mal a pior, todos os dias era uma briga diferente, nada estava bom o suficiente para sua mãe e tudo que ela fazia era motivo para que ela a criticasse. Estava simplesmente cansada daquilo tudo.
Distraída com a playlist, nem percebeu alguém se aproximando, o que foi suficiente para que os corpos se chocassem e ela fosse parar no chão junto com o celular e os fones de ouvido. A música foi substituída pelas risadas escandalosas de e . Ela tinha se chocado com e obviamente o peso dele foi suficiente para derrubá-la.
— Pare de rir e me ajude, idiota! — Exclamou e a puxou pelas mãos.
olhou feio para os dois amigos, que estavam vermelhos de tanto rir.
— Vocês são imbecis!
Ei, ei, ei, por que tanta raiva? Não são nem nove da manhã, amor! — franziu o cenho e olhou nos olhos de , fazendo um carinho na sua bochecha, o que foi suficiente para que os cabelos da nuca da garota se arrepiassem. — O que aconteceu?
— Nada! Todo mundo tirou o dia pra me encher o saco hoje, hein? — Ela explodiu exageradamente para que não insistisse.
Ela sabia que se abriria com ele, porque ele era o que sempre conseguia fazer com que ela fosse ela mesma e não a garota geniosa e forte que ela tentava sustentar como personagem. extraía tudo de mais verdadeiro nela, era óbvio que ela era completamente apaixonada por ele. O mais sutil dos toques, como aquele na bochecha, era suficiente para que as borboletas fizessem um carnaval no estômago dela. Mas ela não deixava que a relação avançasse, mesmo que fosse explícito a reciprocidade do garoto.
Os dois eram amigos e se gostavam desde crianças, primeiro um amor inocente e que depois se transformou em um enorme desejo da parte dos dois, mas não sentia que era boa para ele. era bom, gentil com as pessoas, estava sempre de bom humor e as pessoas gostavam dele pelo o que ele era. A garota, por outro lado, sustentava um personagem de patricinha egoísta e egocêntrica, já que as pessoas só se aproximavam dela por interesse.
Mas os problemas de eram muito mais profundos, ela simplesmente não se encontrava, não sabia quem ela era, não sabia o que realmente queria e isso desencadeou uma cobrança enorme dela para com ela mesma, além da cobrança da mãe para que ela fosse perfeita, como Emma era.
não merecia a bagagem dela e, por isso, ela o afastava sempre que conseguia, outras vezes ela não conseguia resistir a atração que ele causava nela. Só de pensar novamente nos olhos preocupados dele, ele a chamando de “amor”, sentiu suas pernas bambas e seu coração bater acelerado.
Antes de entrar na sala de aula, sacou seu telefone e mandou uma mensagem:

» : Preciso de adrenalina hoje. Me dê o que você tem de melhor.

Guardou o celular na mochila e entrou na classe da Senhora Dylan, de História. Nenhum de seus amigos mais próximos fazia essa aula com ela, respirou aliviada por não precisar se explicar para ninguém, pelo menos até a hora do almoço, onde ela tinha certeza de que , e a encurralariam.
— Oi, cricket! — beijou a testa de e sentou de frente para a amiga no refeitório. — Que cara é essa? — Ele franziu a testa e observou a menina, que estava com um bico e as bochechas vermelhas, denunciando que ela estava com raiva.
Antes que ela respondesse, chegou jogando sua bandeja na mesa e pulando ao lado dela, dando-lhe um beijo na bochecha e, em seguida, um peteleco na testa, que logo foi devolvido, fazendo os três rirem.
— Cadê a ? — Perguntou olhando para os lados, percebendo que só faltava ela na mesa.
— Essa serve? — , ainda mal-humorada, apareceu atrás do garoto cabeludo, que corou levemente ao ter sua bochecha beijada pela loira, que em seguida se sentou ao seu lado, evitando olhar para nos olhos.
— Achei que você tinha ido matar aula, junto com a alegria que você também matou. — apertou os lábios em um sorriso sarcástico e os garotos se entreolharam, preocupados.
— Qual o seu problema comigo hoje, ? — estava cansada dos chiliques da melhor amiga.
Seja qual fosse o problema dela, ela não era saco de pancadas para aguentar.
— Meu problema é que você está tão ocupada olhando para o próprio umbigo pra perceber que pelo menos uma vez sua amiga deve estar precisando de você! — se cansou da discussão e levantou, pegando sua mochila e dando as costas para os amigos, pisando duro até eles a perderem de vista.
apenas rolou os olhos e descascou as unhas.
— É claro que ela precisava dessa saída dramática... — encarou os amigos, que assistiram à cena atônitos.
, você… — tentou iniciar uma argumentação.
Não era a primeira vez que ficava chateada com a amiga por causa das crises de ego de .
— Nem comece! — A garota estendeu a mão para impedir o amigo e se levantou, também puxando sua bolsa.
Não estava com humor para ouvir sermão de ninguém.
Caminhou rapidamente até o esconderijo que eles usavam para matar aula e se sentou em um tronco de árvore, encarando o chão. Demorou alguns segundos para ouvir os passos atrás dela, mas logo entrou em seu campo de visão.
E lá vamos nós…, pensou.
suspirou e continuou calada, e ouviu a risadinha do garoto.
— Qual a graça? — Murmurou e encarou nos olhos.
Ele se sentou ao lado dela, antes de responder:
— Você. Fica tão bonitinha quando está brava... — riu de novo e não pode deixar de acompanhar.
Ele tinha esse poder sobre ela.
— Sabe… você vacilou com a . — arriscou e a garota instantemente fechou a cara novamente.
— Meu Deus! Vocês realmente tiraram o dia, não é? Todos estão preocupadíssimos com os sentimentos da , mas ninguém parou para pensar que eu posso estar passando por algo? Que eu também estou chateada com alguma coisa? Que inferno! Minha mãe ontem praticamente disse na minha cara que eu sou o maior erro da vida dela, ok? Me desculpe se eu não posso ser a melhor amiga do mundo hoje, . — sentiu as lágrimas descendo pelo seu rosto e as limpou rapidamente, levantando-se para sair dali.
Odiava ser vulnerável, odiava ficar daquela forma na frente dos outros, principalmente pela forma com que a estava olhando agora, como se quisesse protegê-la.
O garoto se levantou também, mas quando deu dois passos em direção a ela, balançou a cabeça negativamente e se afastou:
— Não… só… não! — Ela balançou as mãos para afastá-lo e pegou suas coisas para sair logo dali.
Num timing perfeito, seu celular acusou uma mensagem:

» Damien: Já estão prontos para você. Venha até minha casa.

— Não posso fazer isso agora, ok? — Guardou o celular na mochila e passou por para pular o muro.
… você vai acabar perdendo as pessoas assim. — balançou a cabeça e saiu andando cabisbaixo.
colocou as palavras dele em segundo plano. A única coisa que lhe interessava agora eram os comprimidos que Damien tinha para ela. Pegou um táxi até a casa do garoto, mandando uma mensagem para o seu motorista avisando que não precisava buscá-la na escola.
A casa de Lockwood não era longe da escola. Era, na verdade, a antiga casa da família fundadora. O pai dele era o prefeito da cidade, mas Damien tinha ido por um caminho diferente da família. Ele, obviamente, não precisava do dinheiro, mas se divertia vendendo drogas. Morava sozinho na antiga propriedade, enquanto seus pais viviam em uma outra mansão do outro lado da cidade, o mais longe possível do próprio filho.
Não demorou para que ele abrisse a porta, logo após a garota tocar a campainha. Damien abriu um largo sorriso para a loira, que apenas suspirou, ela não caía no personagem de garoto simpático dele.
Ele era um cara bonito, mas não fazia o tipo dela. Era o clássico playboy babaca.
… o que acha de nos divertimos hoje? — Abriu a porta para que a garota visse a mesa de centro da sala lotada de bebidas e as mais variadas drogas ilícitas.
Sentados no sofá estavam Henry e Jonathan, dois garotos da escola que também eram adeptos aos comprimidos de Damien.
Deu de ombros e pensou: “por que não?”

10 horas depois...

abriu a porta de casa correndo, tinha acabado de sair do banho e vestido a primeira coisa que apareceu na sua frente, seus cabelos estavam molhados e seus olhos vermelhos, mas ela não chorava. Estava chocada demais para entender o que estava acontecendo.
estava parada próxima à porta da frente, parecia que estava prestes a bater quando ela abriu. Estava um caco. Os olhos vermelhos e inchados, tinha um corte na testa, esfoliações por todo o corpo e suas mãos tremiam como vara. Estava em choque. E suas pupilas estavam dilatadas.
logo percebeu que apesar do efeito maior ter passado, ela ainda estava drogada.
— Ele está no carro. Não sei o que fazer, . Me desculpe por hoje, eu sou uma péssima amiga, me perdoe, por favor! — Logo o choro se transformou em uma tempestade e correu para abraçar a melhor amiga, que ainda tremia em seus braços.
Levantou o olhar para ver dentro do carro e estava lá, sentado no banco do carona. Ele a encarava, mas não parecia realmente vê-la. Seus olhos estavam vazios, enquanto uma lágrima solitária caía pelo seu rosto vermelho.

10 horas antes...

— Que seja! — deu de ombros e entrou na casa de Damien, aos aplausos de Henry e Jonathan, felizes por ela ter juntado à festa.
A julgar pelos narizes vermelhos e as pupilas dilatadas, os dois já estavam ali há um tempo. Parecia um mundo particular deles: enquanto todos ainda estavam na escola, assistindo às aulas entediantes pós-almoço, eles estavam em sua festinha seleta.
sabia que estava fazendo errado, que deveria estar com seus amigos na escola, que deveria ser diferente do que esperavam dela, mas ela não conseguia. Ela era muito melhor fugindo dos problemas e os afogando na bebida e nas drogas.
Pegou um baseado que Damien lhe ofereceu e o garoto lhe serviu um uísque com um sorriso. O líquido desceu queimando por sua garganta, mas ela gostou da sensação.
Ela sabia apreciar um bom Bourbon.
Riu, lembrando das vezes que pegou um escondido da coleção de seu pai e depois preencheu com refrigerante. Até hoje não tinha sido descoberta e esperava que continuasse dessa forma, senão seria expulsa de casa.
— No que está pensando? — Damien soprou a fumaça do cigarro branco dele no rosto dela, tirando-a dos pensamentos.
— Aposto que é no ! — Henry riu, ele estava completamente acelerado.
— Você sabe que é muita areia pro caminhão dele, né? — Damien murmurou, subitamente incomodado com o rumo do assunto.
— Eu não vejo como isso é da conta de vocês... — tentou não corar e desconversar.
Para ela, era óbvio que era bom demais pra ela e não o contrário.
— Somos amigos. — Completou, desnecessariamente, e os garotos apenas trocaram um olhar cúmplice, mas não insistiram no assunto. — Ei, Lockwood! — Ela aproveitou a deixa para mudar de assunto. — Você me prometeu ação e adrenalina, e até agora eu só estou aqui sentada com três babacas… com todo respeito! — Sorriu sem os dentes para os três garotos.
De alguma forma aquele grupinho disfuncional também eram seus amigos, eles também tinham crescido junto com ela e, apesar de não serem tão próximos como , e , também gostavam de e se achavam mais parecidos com ela do que os outros três. era uma menina com um grupo de amigos totalmente dicotômicos: os que a tentavam tirar do fundo do poço e os que a arrastavam para lá junto com eles.
— Você não perde por esperar! — Damien sorriu novamente, mas, dessa vez, seu sorriso era perigoso e com expectativa.

Já tinha escurecido, quando resolveram sair para a tal aventura que Damien tinha inventado. Antes de entrarem, divididos em dois carros, cada um engoliu uma pílula, que Lockwood prometeu que os deixariam elétricos e cheios de adrenalina. já não estava mais sóbria, tinha tomado boas doses de uísque e fumado incontáveis baseados, enquanto dançava com os garotos, mas ainda estava longe de atingir seu ápice. Contava com os comprimidos de Damien para isso.
Dirigiram até o limite da cidade com a vizinha e, enfim, avistaram um grupo de mais ou menos dez pessoas, todas com carros esportivos como o de Damien e Henry. Ouviam música alta e tinham cervejas nas mãos. Alguns ali eram conhecidos de , outros não. Mas ela sabia que eram pessoas que mexiam com todo tipo de coisa ilegal.
— Você me trouxe pra um racha? — A voz de falhou um pouco no final, mas quando viu Damien virar para ela, voltou com sua habitual pose.
— Você não disse que queria adrenalina? — Perguntou inocentemente e depois sorriu.
Damien era o mais lúcido dos quatro, mas nada disso o fazia o mais responsável, pelo contrário.
respirou fundo e decidiu que iria aproveitar. Ele estava certo, não? Ela queria e ele a trouxe!
Já estava sentindo os efeitos da bala começarem, então logo suas preocupações sumiriam. Após baterem papo com o grupo que os esperava, todos começaram a se preparar para a corrida clandestina. Todos tinham que pagar cinquenta libras para participar, valor que foi pago inteiramente por Lockwood, além do dinheiro das apostas que fariam.
— Quem vai dirigir? — Um cara de músculos gigantes e olhos verdes perguntou, sem se importar nem um pouco com a idade de cada um ali.
— A loirinha! — Damien indicou com os dedos e os olhos da garota se arregalaram.
Nunca tinha participado de um racha na vida, mal fazia aulas de direção com seu pai na rua de casa. Mas não iria se acovardar na frente de todo mundo.
O grandalhão pareceu perceber o desespero dela, mas deu de ombros com uma risadinha.
— É seu dinheiro. — Riu novamente e pegou o dinheiro de Damien, colocando o nome dele na lista. — Você será a quarta a participar. — Avisou , que foi puxada por Lockwood para se sentarem no acostamento, enquanto os primeiros “corredores” se preparavam.
O circuito não era muito longo. A regra era uma só: correrem com a máxima velocidade e quem ganhasse, levava a grana.
— Vocês já conhecem as regras. Boa sorte a todos. E Deus abençoe os carros velozes! — O grandalhão fez uma referência à Velozes e Furiosos e uma garota ruiva se posicionou entre os dois carros para dar largada.
Em uma piscada de , os carros já tinham partido em um barulho ensurdecedor de pneu cantando.
— Incrível! — Sussurrou para Damien com os olhos arregalados, observando os carros sumirem de vista.
Ele se perdeu olhando para ela, a boca levemente aberta, impressionada, os olhos brilhando de animação e as maçãs do rosto perfeitamente desenhadas. Como ela podia ser tão bonita? E tão inalcançável?
— O que foi? — perguntou para o garoto, que o encarava como um bobo.
— Nada! — Damien corou e abaixou a cabeça, uma atitude incomum dele.
franziu a testa, mas não perguntou novamente.
Os dois ficaram sentados em silêncio, assistindo os outros correrem. Henry perdeu feio, mal conseguiu acelerar o carro de tão drogado. E Jonathan tinha sumido com a ruiva que estava dando a largada.
Com o passar do tempo, a garota ficou mais eufórica, sentindo o efeito da bala chegar em seu ápice. Seu coração estava batendo forte, tanto pelo efeito, quanto pela animação de dirigir um carro em alta velocidade. Quando chegou sua vez, ela praticamente correu até o carro com Damien em seu alcance, ele jamais a deixaria ir sozinha.
— Afivele o cinto. — Mandou e deu de ombros, quem precisava de cinto de segurança?
— Não preciso disso! — Quicou um pouco no assento, ajeitando-se.
— Não discuta, ! — Damien se jogou sobre ela e afivelou o cinto na garota, recebendo uma vaia da mesma em seu ouvido, mas não se importou, em seguida, se prendeu com segurança.
Ao ser autorizada a acelerar, soltou um grito ensurdecedor e logo acelerou o carro em sua velocidade máxima. A folhagem do lado de fora do carro passava como um vulto e o vento que entrava dentro do carro lhe tapava os ouvidos. Ela nunca tinha se sentido tão viva em toda sua vida, ela não queria parar nunca. Não sabia onde sua oponente estava, mas ela não queria parar. Queria dirigir para sempre.
, volte! Volte! Você vai perder! — Damien gritou por cima do vento, mas ela não ligou.
Não ligava para a corrida estúpida, só queria correr, correr e correr. Já tinham saído da cidade, estavam na rodovia que não era mais utilizada, por isso, não tinha nenhum carro além do deles. Nenhum limite de velocidade a ser respeitado. Nada que a impedisse de acelerar.
— DIMINUA, ! — A voz de Damien, embora ele estivesse gritando, era apenas um ruído nos ouvidos da garota.
Ela estava em transe. Hipnotizada pela sensação que a velocidade a estava proporcionando.
! VAMOS BATER! — Damien se agarrou no assento do carro, certo de que iriam capotar o carro a qualquer momento.
Sabia que estava em um transe maldito e nada a faria sair dele, a não ser que ele girasse o volante, mas isso também os faria bater. De repente, ouviram uma buzina ensurdecedora de um caminhão que vinha da pista contrária, que foi capaz de acordar a garota, mas também a assustou e a fez perder o controle.
O caminhão passou reto por eles, provavelmente era de carga e passava por ali para evitar o tráfego da cidade, mas o carro deles ia desgovernado pelo acostamento, enquanto a garota tentava retomar o controle a todo momento, até que foram salvos (ou quase isso) por um poste. Já tinham diminuído drasticamente a velocidade até que bateram, talvez por isso o impacto não os matou.
O cinto de segurança e os airbags inflaram no rosto dos dois, que chacoalharam o corpo para trás. O silêncio após isso foi brutal.
...? — Depois de alguns minutos em choque, Damien sussurrou. Estava tentando encontrar sua voz.
— Estou bem. — respondeu com a voz rouca e olhou para Damien, que sem perceber, tinha lágrimas nos olhos.
Os dois tinham se salvado por pouco.
— Temos que sair! Está ouvindo? Sentindo o cheiro? A gasolina está vazando. — Lockwood acordou do transe e forçou o branco para trás, para que ele tivesse espaço para sair do carro.
Ele estava bem. Suas pernas estavam intactas e ele não sentia nenhuma dor. tinha um corte na testa, mas nada além disso.
Ele abriu a porta do motorista e a ajudou a sair, ela também parecia intacta do pescoço para baixo. Não podiam falar o mesmo do carro: a frente tinha sido totalmente amassada pelo impacto.
— Não sei como escapamos da morte. — Damien observou o óbvio, enquanto os dois se afastavam rapidamente do carro, que já começava a pegar fogo.
— Você é um pouco exagerad… — não conseguiu terminar a frase, que foi interrompida por um clarão e um barulho absurdo.
O carro tinha explodido.
Os dois voaram para longe, caiu nos matos que cercavam a rodovia, mas Damien estava estirado no asfalto. A garota gritou seu nome, mas ele não respondeu, apenas abanou uma das mãos como se quisesse mostrar que não estava morto.
observou seus braços e pernas, estavam esfolados, mas não tinha se machucado seriamente. Escapou da morte pela segunda vez na noite.
Tateou seu bolso em busca de seu celular, que ainda estava em seu bolso. Uma maré de sorte sem precedentes, pensou. Estava com a tela quebrada, mas ela ainda conseguia discar.
— Polícia de Cambridge, qual sua emergência?
— Por favor, preciso de ajuda. Eu acabei de causar uma explosão. — A voz feminina na linha do celular era assustada, mas não chorava.
— Qual seu nome? Onde você está? Está ferida? — O atendente da polícia fez as três perguntas devagar.
— Não estou ferida, mas meu amigo sim, venham rápido, por favor, estou na Madingley Ave. — A garota respondeu rapidamente e um estrondo foi ouvido do outro lado da linha. — E meu nome é .

Depois do carro de bombeiros conter o fogo no carro, conseguiu colocar a cabeça para fora da ambulância que fazia os primeiros socorros nela e em Damien, que estava bem, mas tinha adquirido um enorme corte no rosto, que, consequentemente, lhe daria uma enorme cicatriz e, por isso, não conseguia olhar nos olhos dele. Ela tinha causado aquilo.
— Por que toda vez que essa cidade tem problemas, vocês dois estão envolvidos, senhorita ? — Shawn, o delegado da cidade, passou a mão pelos cabelos ralos e entrou no campo de visão de , que se sentiu incapaz de responder.
Ele bufou e deu as costas, provavelmente não conseguiria resolver nenhum mistério naquela noite, já que os dois ainda tinham que ir ao hospital.
A ambulância levou-os rapidamente para o hospital da cidade, Damien ia precisar ficar internado pelo menos um dia e eles insistiram para que fosse fazer alguns exames, mas ela estava bem. Só queria ir para casa e esquecer o que ela tinha causado.
Mais uma vez tinha manchado o nome da família e sabia que ficaria de castigo pelo menos por um ano, isso se não fosse presa!
Mas ao descer da ambulância, depois de se recusar a se deitar em uma maca, já dentro da enfermaria, tomou um susto ao ver sentado em uma maca. Seus olhos estavam vermelhos e ele tremia muito. Ele não a viu, mas a garota correu até ele.
? O que aconteceu? Você está bem? Está ferido? — Vomitou as perguntas em cima do garoto, ela ainda estava acelerada por causa da bala. Mas tinha perdido completamente o rumo ao vê-lo daquela forma.
…? — Ele parecia confuso e em choque, mal podia ver a garota por causa do véu de lágrimas que tampava seus olhos.
… o que aconteceu?
— Meus pais.
— O que tem seus pais?
— Eles… — respirou fundo e olhou para cima, tentando conter as lágrimas, sem sucesso. — Estão mortos. — Cuspiu as palavras e voltou a chorar copiosamente, agora se agarrando à amiga, que arregalou os olhos e o abraçou de volta. Incapaz de proferir sequer uma palavra.
— Alô? — atendeu o telefone pelo viva voz, já que estava usando-o para ouvir música no banho.
, a me ligou… ela está com no hospital… e está indo para sua casa agora. falou no telefone assim que ela atendeu.
— Do que você está falando? Hospital? O que aconteceu, ? Você está louco? — Instintivamente ela desligou o chuveiro, preparando-se para sair.
e estão indo para sua casa. disse mais lentamente, mas sua voz estava trêmula. — Eles estavam no hospital, porque os pais de sofreram um acidente de carro e... Tio James e tia Pearl… eles…. não conseguiu terminar a frase, mas entendeu.
Ele não precisava terminar.
, fique em casa. Assim que eles chegarem aqui eu vou te buscar, ok? — Esperou a confirmação do amigo, mas ele só chorava. — ! Por favor, fique comigo. Ok? Vai ficar tudo bem. Respire fundo.
Ok. respondeu em um sussurro, ao mesmo tempo que a garota ouviu o barulho inconfundível de um carro parando em sua entrada.
abriu a porta de casa correndo, tinha acabado de sair do banho e vestido a primeira coisa que apareceu na sua frente, seus cabelos estavam molhados e seus olhos vermelhos, mas ela não chorava. Estava chocada demais para entender o que estava acontecendo.
estava parada próxima à porta da frente, parecia que estava prestes a bater quando ela abriu. Estava um caco. Os olhos vermelhos e inchados, tinha um corte na testa, esfoliações por todo o corpo e suas mãos tremiam como vara. Estava em choque. E suas pupilas estavam dilatadas.
logo percebeu que apesar do efeito maior ter passado, ela ainda estava drogada.
— Ele está no carro. Não sei o que fazer, . Me desculpe por hoje, eu sou uma péssima amiga, me perdoe, por favor! — Logo o choro se transformou em uma tempestade e correu para abraçar a melhor amiga, que ainda tremia em seus braços.
Levantou o olhar para ver dentro do carro e estava lá, sentado no banco do carona. Ele a encarava, mas não parecia realmente vê-la. Seus olhos estavam vazios, enquanto uma lágrima solitária caía pelo seu rosto vermelho.
— O carro deles explodiu e eles estão mortos. Os pais de . Estão mortos. O carro explodiu.


Capítulo 13

O cheiro de fumaça e o fogo que emanava do carro que tinha acabado de explodir levaram para aquela noite em que ela tinha causado o acidente com Damien, a mesma noite em que os pais de tinham morrido, coincidentemente em um acidente de carro. A garota piscou algumas vezes, tentando recuperar seus sentidos. Seu corpo inteiro doía e sua cabeça parecia ter sido golpeada. Ergueu um pouco o tronco para ver se conseguia ver alguém e viu estirado ao seu lado, ele estava sangrando e desacordado. Ela não via Damien em lugar nenhum.
— Oh, meu Deus! — escutou uma voz abafada, que ela reconheceu ser de . — Ligue pra ambulância! — Foi a última coisa que ouviu, antes de desmaiar novamente.

Quando acordou, a primeira coisa que viu foi luz, uma luz forte em seus olhos. Fechou e piscou algumas vezes, tentando se acostumar. Além disso, ouvia um bip-bip-bip insistente nos seus ouvidos, além de sentir dor por todo o corpo.
Outch! — Reclamou ao sentir sua cabeça latejando e uma de suas mãos ardendo.
Ergueu um pouco a cabeça para olhar e viu sua mão esquerda completamente esfolada, provavelmente pelo impacto com o chão. Automaticamente, seus olhos correram pelo o que parecia ser a enfermaria do hospital, procurando por . Lembrou-se da cena do namorado estirado no chão e se desesperou, mas logo um senhor entrou em seu campo de visão.
— Ei, calma… devagar. Bem vinda de volta, ! — Falou calmamente e com a voz doce.
— O que… — perguntou, confusa, e fechou os olhos, sua cabeça doía muito.
— Vocês sofreram um acidente, o carro explodiu por causa de uma peça solta… escaparam por pouco. — O doutor explicou rapidamente, ajudando-a a se ajeitar na cama.
— Onde está ?
— Bem ali... — o doutor apontou para o garoto, que dormia há duas macas dela.
Parecia estar bem pior, seu rosto estava machucado e um dos braços enfaixado. Ao vê-lo naquela situação, os olhos de encheram de lágrimas.
— Ele está bem! — O senhor tratou de acalmá-la. — Só se machucou um pouco mais que vocês... — o médico percebeu que a garota não iria se acalmar tão fácil, então mudou de assunto. — Os pais de vocês já estão chegando, vai ficar tudo bem, querida. — Sussurrou, antes de aumentar um pouco a dose do remédio que a faria dormir novamente.
Lentamente, a garota foi fechando os olhos, até não ver mais nada.

A chuva caía forte do lado de fora da mansão, tinha sido um dia relativamente quente, mas agora o temporal trazia ventos fortes, o que fez a garota de vermelho se arrepiar e abraçar a si mesma, enquanto o namorado andava de um lado para o outro na sala escura. O som do telefone tocando foi alto o suficiente para assustar os dois, que se entreolharam antes da garota atender:
— A-alô. — Gaguejou.
— Soube que houve uma explosão... — a voz do outro lado da linha estranhamente paciente, ao contrário do que os dois jovens esperavam.
— Sim. — A menina afirmou.
— Já percebi que terei que aparecer por Cambridge... — a voz suspirou depois de um longo período de silêncio, o que fez a garota estremecer.
— Qua-quando?
— Você saberá. — O homem voltou ao seu tom normal. — Continue de olho em tudo. — Mandou e desligou o telefone antes que a garota pudesse contestar algo.
— O que ele disse? — O garoto, que até então estava calado, perguntou ansioso, aproximando-se da namorada.
— Disse que virá em breve.

Quando acordou novamente, escutou a voz baixa de algumas pessoas e sentiu uma mão segurando a sua. Quando abriu os olhos, viu que seus pais estavam ali: Emma chorava segurando sua mão, enquanto seu pai a tentava consolar.
— Veja quem acordou! — Joe sussurrou e sorriu para a filha, que automaticamente se sentiu melhor de ver o pai ali, o que resultou nos seus olhos enchendo de lágrimas novamente. — Não chore, querida, está tudo bem agora. — Passou a mão delicadamente pelos cabelos da filha, já que seu rosto estava machucado.
Ela olhou em volta para procurar por , mas já não estava mais na enfermaria. Tinha sido transferida para um quarto.
já acordou? — Perguntou com a voz rouca, percebendo que sua garganta estava seca.
Emma logo se levantou para buscar água, colocando o canudo em sua boca logo em seguida.
— Sim, acabamos de passar pelo quarto dele. Ele está acordado, conversando com os pais... — Emma respondeu amorosamente, beijando a mão da filha.
Seus olhos estavam inchados e desconfiava que a mãe estava chorando desde que recebeu a notícia da explosão.
— Eu estou bem, Emma! — A garota sussurrou gentilmente, mas suas palavras fizeram com que as lágrimas gordas voltassem a cair dos olhos da mãe, o que fez a garota olhar em desespero para Joe.
— Vamos tomar um café, querida... — o homem deu um beijo na testa da filha e guiou a esposa para fora do quarto, fazendo suspirar e olhar para o teto.
Ela odiava toda aquela situação, parecia um filme repetido em sua cabeça.

Depois de finalmente conseguir fazer com que dormisse um pouco, se levantou da cama e tomou um banho rápido. Seus machucados arderam um pouco, mas ela não pareceu se importar. A garota aproveitou para lavar os cabelos e após enxaguar, os amarrou, ainda molhados, em um rabo de cavalo.
Trocou-se rapidamente após o banho e deixou um bilhete para o garoto: “Eu já volto. Beijos, .” e caminhou rapidamente para a porta de entrada, discando o número de seu motorista. Enquanto esperava, passou os olhos rapidamente pelas chamadas perdidas e mensagens. Tinha um recado de sua mãe.
Isobel , eu sei que você está na casa do e não vou brigar com você por causa disso, sei que você está apoiando seu amigo. Deus sabe o quanto ele precisa disso agora. Mas quando as coisas melhorarem, eu e você vamos ter uma conversa séria. Você tem noção do que podia ter acontecido com você, mocinha?
Para quem iria respeitar o momento, Emma se alongou muito no monólogo, o que fez a garota ignorar o resto do recado. A última coisa que a importava agora era o sermão e o castigo que iria receber. Ela só precisava ver Damien e saber que ele estava bem. Estava se sentindo a pior pessoa do mundo.

suspirou ao se lembrar da noite do acidente novamente. Era um dos dias que ela mais se arrependia, além do dia da morte de Lily. Balançou a cabeça negativamente para evitar que seus pensamentos a levassem de volta para aquele dia, o que a fez olhar para a porta. abriu um pouco a boca, chocada por estar vendo parada ali. Ela a olhava cuidadosamente, mas parecia estar fazendo um esforço enorme para não sair correndo.
engoliu em seco. Deveria falar alguma coisa?
— Você está bem? — quebrou o silêncio em voz baixa.
— Sim, estou! — respondeu, tentando conter o meio sorriso que se formava em seu rosto. — Obrigada por perguntar.
pediu pra que eu checasse você, então… — mudou o peso de uma perna para a outra, claramente desconfortável e assentiu.
Realmente fazia mais sentido ela ter vindo a pedido do namorado do que por conta própria, mas a mais nova estava feliz mesmo assim.
— E o Damien? — A garota tentou se sentar na cama, mas seu corpo ainda doía para que ela se movesse muito.
— Ele está bem também, está com um olho inchado e alguns machucados… ninguém da família veio vê-lo. — contou em voz baixa. — Por que vocês três estavam no estacionamento? — Cruzou os braços e encarou a loira com seriedade.
Sabia que gostava dela e por isso tinha aceitado ir ao quarto de , visto que ele parecia estar cumprindo o trato deles de ficar o mais longe possível da garota, mas ainda não tinha encaixado a peça do porquê de os dois estarem juntos no momento da explosão.
se sentiu encurralada por alguns momentos, ela obviamente não podia dizer a verdade, mas sua mente não funcionava como deveria, então resolveu contar uma meia verdade:
— Eu estava indo para o estacionamento para tomar um ar e Damien me fechou, ficou me importunando e dizendo coisas… então apareceu do nada e tentou me ajudar… só me lembro disso. — A garota gaguejou um pouco e desviou os olhos.
era um tanto quanto desconfiada, então ela sabia que era difícil que a morena comprasse a história.
— Você é boa em esquecer as coisas, huh? — murmurou mais para si mesma do que para ouvir, então a loira fingiu que não escutou a alfinetada. — Bom, que bom que… que o pior não aconteceu. — A garota fechou seus lábios em uma linha e deu um meio sorriso.
— Obrigada, e obrigada por passar por aqui… sei que é repulsivo para você olhar na minha cara. — Soltou sem pensar muito e acabou arrancando uma risada sem humor da ex-melhor amiga.
— Eu gostaria que as coisas fossem diferentes... — admitiu, sem olhar para .
— É, eu também. — suspirou, seus olhos se enchendo de água novamente.
Se dependesse dela, ela levantaria daquela maca correndo para abraçar a garota.
— Ei, ! Que bom te ver por aqui! — A voz embargada de Emma ganhou um novo tom e seu rosto se iluminou ao ver , que sorriu envergonhada ao ver Emma.
Consequentemente, com a morte de Lily, a garota perdeu qualquer contato com a família de , só tinha visto os pais dela nas festas dos fundadores, onde ela passava o mais longe possível do radar deles.
— É um bom momento para vocês se reconciliarem, hein? — Emma aproveitou a deixa e arregalou os olhos como um sinal para que ela parasse.
Joe cutucou os ombros da esposa, mas ela não pareceu se importar.
— A vida é curta! Vimos isso hoje! — Exclamou e deu uma risadinha irônica, antes de responder e sair pela porta:
— Sua filha sabe bem disso, ela acabou com a vida de uma criança. — O silêncio se instalou no quarto depois da saída da morena, enquanto uma lágrima solitária caía do rosto de .

— A vista nos meus sonhos estava mais agradável... — Damien murmurou e riu, balançando a cabeça negativamente.
Ele estava sentado na poltrona, nem muito longe, nem muito perto da maca em que o garoto da cicatriz estava deitado. Tinha resolvido ficar lá até que ele acordasse. Não eram amigos nem nada, mas sabia que os pais dele não se dariam ao trabalho de vê-lo.
— Eu não acho que sobreviverei a mais uma explosão… — divagou, tentando se sentar na cama.
— O que houve? — perguntou em voz baixa e Damien ergueu as sobrancelhas para ele.
Mas esse mínimo esforço fez com que seu rosto e sua cabeça inteira doessem.
— Caralho! — O moreno sussurrou e franziu a testa, imaginando a dor. — Por que quer saber, ? Falando nisso, como está nossa garota? ? Ela está bem? Espero que o fanfarrão do esteja também! — Rolou os olhos, enojando-se ao lembrar de .
— Qual é a sua com a , hein? Por que você a persegue tanto? — Antes de se policiar, já tinha perguntado.
Damien sempre tinha o incomodado em relação à , desde quando eram só amigos até começarem a namorar, ele simplesmente não entendia a amizade dos dois e tampouco por que ele a perturbava tanto no presente.
— Por que você se importa? — Lockwood respondeu com outra pergunta.
— Não sei. — respondeu com sinceridade.
Ele realmente não sabia, mas não podia negar que ver Damien perturbando tanto a ex-namorada o intrigava.
— Por que está aqui, ? — Damien perguntou, por um segundo abandonando a feição irônica e dando lugar o que ele realmente era: apenas um adolescente.
— Vocês podiam ter morrido… está com os pais e a também… e então achei que… achei que ia ser legal se você tivesse alguém aqui quando acordasse. — respondeu sem jeito, coçando a nuca e Lockwood riu, lembrando-se de quando estava no mesmo hospital, mas alguns anos atrás.

Aquela era a pior dor que ele sentiu na vida. No momento do acidente não tinha se dado conta da extensão de seus ferimentos, mas agora no hospital, sem conseguir abrir os olhos direito e sentindo uma dor excruciante na cabeça, que Damien percebeu que estava realmente fodido.
— Inferno! — Resmungou, tentando se ajustar melhor na cama e abrir os olhos.
Conseguiu, mas se arrependeu logo em seguida devido a dor.
— Damien... — uma voz chorosa sussurrou e só nesse momento que o garoto percebeu a presença de no quarto. — Eu sinto muito. Me desculpe, eu sinto muito! — À medida que as palavras saíam da boca dela, ela chorava mais ainda.
— Está tudo bem! — Murmurou. — Foi um acidente. Não é sua culpa.
— Não! Eu não devia ter corrido tanto, eu… me desculpe! Olhe só pra você, meu Deus, eu sinto tanto… — deitou a cabeça sobre a cama de Lockwood, enquanto o garoto acariciava seus cabelos, tentando acalmá-la.
Foi nesse momento em que ele levantou a cabeça, vendo sua própria imagem no espelho que ficava embaixo da TV do quarto, que ele percebeu que realmente estava fodido: um machucado enorme cortava seu rosto. Estava inchado e cheio de pontos, o que ele sabia que deixaria uma cicatriz horrível. Ele nunca mais seria o mesmo.

— Obrigado, . — Respondeu gentilmente, afastando as lembranças do passado. — Mas você pode ir agora… eu vou ficar bem. — Deu um sorriso amarelo. — Não é como se eu pudesse ficar mais fodido... — riu da própria piada e o acompanhou, dando um soquinho leve em seu ombro e saindo do quarto, não sem antes dar um último aceno de cabeça para Damien.
Os boletins médicos dos três feridos estavam feitos: sofreu apenas escoriações pelo corpo e estava liberada para ir para casa, enquanto teria que ficar em observação por mais um dia, mas estava bem. Damien também sairia no dia seguinte.
Antes de ir para casa, passou no quarto do garoto para lhe desejar melhoras, mas ele estava dormindo. Então, ela preferiu não o acordar. Ali, indefeso e em um sono profundo, ele não parecia tão ruim. Sabia que, no fundo, Damien era uma pessoa legal, com todos os defeitos e o problema latente de se envolver com as coisas erradas. Ele era como ela, não podia negar.
Caminhou um pouco mais adiante pelo corredor para visitar o quarto de , tinha conseguido despistar seus pais e esperava que e não estivessem lá para que eles tivessem um momento a sós. Suas preces foram ouvidas e estava sozinho no quarto, acordado e olhando para o teto, pensativo.
— Ei, estranho! — Sorriu o máximo que pôde para o namorado, que tentou devolver na mesma medida. — Como você está? Fiquei tão preocupada! — Aproximou-se de e acariciou sua testa.
— Estou bem… mas meu braço está quebrado… o médico disse que provavelmente foi na queda, mas não me lembro de muita coisa. — Murmurou, tirando a mão de de sua testa e entrelaçando na sua. — Você está bem?
— Sim, estou. — respondeu. — Melhor agora que estou vendo você bem… — sussurrou e se aproximou do namorado para lhe dar um beijo na boca, mas desviou e o beijo pegou no rosto.
franziu a testa para o gesto, mas ele apenas balançou a cabeça negativamente.
— Não é seguro aqui... — justificou e a garota resolveu não protestar, embora soubesse que ele estava mentindo.
Não havia absolutamente ninguém no corredor que pudesse flagrá-los e os únicos no hospital inteiro que sabiam que eles estavam juntos eram seus pais e… Damien. Não sabia como faria para esconder o relacionamento por tanto tempo, uma hora ou outra seriam descobertos e teriam que lidar com as consequências.
— Melhor você ir para casa descansar, a gente se fala depois. — quebrou o silêncio que se instalou e assentiu, ainda que contrariada.
— Tchau. — Ela murmurou, depositando outro beijo em sua bochecha e sorriu.
Nesse momento, ela esqueceu de todas as preocupações.
— Eu não ligo se formos descobertos. — sorriu e beijou a boca dele antes que o garoto protestasse.
Ele não teve outra escolha, senão corresponder o beijo, mas o quebrou cedo demais.
— Tchau, linda! — Sussurrou entre um selinho e outro, e se deu por vencida, girando os calcanhares para ir embora ao encontro de seus pais.

•••

Os primeiros dias após o acidente foram um tanto quanto estranhos para . Ela e mal conversavam, mesmo depois dele ter saído do hospital no dia seguinte do dela, ainda não tinham se visto e nem ido à escola, já que tinham conseguido alguns dias de atestado. Damien, pelo que ela tinha ouvido, estava frequentando as aulas normalmente, mas não tinha aberto o bico sobre ela e . Todos na escola tinham ficado sabendo do acontecido, o que gerou alguns burburinhos, mas nada preocupante. estava ansiosa para voltar ao colégio e conversar melhor com o namorado, entender por que ele a estava evitando e se ela tinha feito algo.
O acidente tinha feito a garota refletir bastante sobre seus sentimentos por . Ela realmente gostava dele, talvez até o amasse. Nunca como amaria o , mas talvez fosse melhor assim. O amor dos dois não tinha terminado bem, então talvez fosse realmente a hora de dar chance de um novo amor dar certo. Ela precisava dar certo com .
A garota quase pulou da cama quando seu despertador tocou anunciando o horário de se arrumar para ir ao colégio, seus machucados estavam praticamente cicatrizados e não doíam mais, então estava cem por cento para voltar. Vestiu seu uniforme das líderes de torcida e se maquiou: queria estar bonita para reencontrá-lo. Além disso, puxou seus cabelos em um rabo de cavalo alto, sabia o quanto ele amava o cabelo dela assim.
Ao ser deixada por William na escola, percebeu que ainda estava cedo para ir até a sala de aula, então se sentou em uma das mesas que ficavam espalhadas pelo grande pátio. O dia estava bonito, tinham poucas nuvens no céu e uma brisa gostosa balançava as árvores e alguns fios do seu cabelo. Ela estava pronta para continuar relendo o livro da peça, já que sabia que o diretor pegaria no seu pé quando os ensaios voltassem, então queria estar afiada, foi quando ela o viu.
entrava pelo portão principal da Cambridge High School como se o mundo fosse dele. Ele estava com o uniforme tradicional da escola, mas ao invés do casaco com o emblema do colégio, estava com uma jaqueta de couro preta e óculos escuros. Seus cabelos estavam penteados para trás e mesmo sem estar perto o suficiente para sentir, sabia que ele estava com o melhor cheiro do mundo.
Ela o encarou até que ele exibisse o sorriso mais bonito do mundo, mas que não estava sendo dirigido para ela. Ele sorria para e , que vinham de encontro a ele.
estava vestida com uma calça skinny preta e a blusa social do uniforme, e também estava incrivelmente bonita. E estava com os cabelos bagunçados, como sempre, mas alinhado com a roupa social de Cambridge e com o gesso no braço esquerdo envolto por uma tala preta, para que ficasse mais discreto.
Sua atenção foi desviada por uma voz logo atrás de si, que lhe deu um susto:
— Aproveitando a vista, huh? — Damien murmurou.
tentou se recuperar do susto e não olhou em direção ao garoto, preferia ignorá-lo.
— Você nem passou para ver se eu estava bem no hospital, fiquei magoado! — Colocou a mão no coração ironicamente e a garota girou a cabeça devagar em direção a ele.
— Estou vendo agora que está... — respondeu e Damien deu de ombros, como se desse razão a ela.
— Fique tranquila, que seu segredinho está a salvo comigo… embora aquela cena toda tenha sido simplesmente patética, eu não tenho interesse nenhum em te expor mais ainda. — Ele disse, surpreendo a garota.
observou bem a postura de Damien, ele parecia estar sendo sincero, mas ela não confiava nele.
— E isso porque…? — Perguntou.
— Prefiro que vocês metam os pés pelas mãos sozinhos... — Lockwood sorriu, deixando sua feição ainda mais assustadora. — E, aliás, não é como se fosse durar mesmo! — Debochou e saiu andando, antes que pudesse responder, deixando-a sozinha e imersa em pensamentos novamente.

O dia passou extremamente devagar, principalmente porque não tinha tido nenhuma oportunidade de conversar com . Tinha mandado mensagem, mas ele não respondeu. E nas outras vezes que o viu, ele estava com e , tornando impossível que eles conversassem. Ela já estava começando a ficar infeliz com aquela situação toda, não sabia o porquê de ele estava agindo assim com ela, mas iria descobrir por bem ou por mal.
O momento perfeito surgiu no treino das líderes de torcida, que começaria logo após o de futebol. Como ele estava com o braço quebrado, não participaria, então seria a deixa perfeita para que ela o encontrasse sem .
Psiu! — Cutucou o ombro dele e se virou assustado.
Seu rosto não relaxou ao ver que era ela.
— Não gostou de me ver? — fez um muxoxo com a boca e desmanchou a careta, dando lugar a um meio sorriso.
— Claro que sim, linda. Só me assustei. — Explicou.
— Estava com saudades! — o puxou para um canto escondido, onde dificilmente eles seriam vistos ou ouvidos. — Você está me ignorando desde o acidente… eu fiz algo? Está chateado comigo?
— Não é isso… — tentou encontrar as palavras, mas não conseguiu, engoliu em seco antes de continuar, olhando para frente e não para a namorada. — É que essa explosão e tudo mais… me fez pensar, . Eu tinha acabado de te pedir em namoro, escondendo de todos que estávamos juntos…
— Estávamos? No passado? — sussurrou, interrompendo-o, mas a ignorou e continuou.
— Que estamos juntos, escondendo de … ele é meu melhor amigo, , cacete! E daí o carro simplesmente explode… e se foi o universo dizendo que isso é errado?
— Você está de sacanagem comigo, que acredita nessa baboseira de universo, né? — riu sarcasticamente, mas continuava sério. — Você jura que vai acreditar nessa baboseira de universo logo agora? — A voz de falhou nas últimas palavras, porque as lágrimas já começavam a empossar no canto dos seus olhos.
Ela as enxugou antes que caíssem.
— Não estou dizendo que não quero ficar com você… mas… acho melhor a gente se afastar um pouco, preciso colocara cabeça no lugar... — suspirou, sem olhar para a loira.
Ele não conseguia encará-la. Sabia que era o certo a se fazer para proteger os dois, além de e também, mas seu coração doía ao vê-la daquela forma.
Não. respondeu firme e, dessa vez, o garoto a olhou com os olhos arregalados de surpresa. — Você pode parar com esse discurso covarde e idiota, ! Nós não passamos por tudo isso, pra você simplesmente desistir agora. Você quer um tempo? Boa sorte com isso! — A garota juntou toda sua coragem em um monólogo só e observou com um meio sorriso a reação do menino.
Era óbvio que ele queria continuar junto dela, só estava com medo.
Aproximou-se um pouco mais dele, olhando-o nos olhos, e puxou seu rosto para que não desviasse o olhar, depositando um selinho rápido em sua boca. Antes de sair, sorriu e recebeu um belíssimo sorriso de volta, que a acompanhou até que ela se afastasse, antes de se fechar em uma linha reta, de preocupação.
— Você está brincando com a sorte, . — O garoto ouviu uma voz atrás de si e sua feição se fechou mais ainda, mas ele não se virou. — E eu não vou salvar sua pele de novo. — Avisou, deixando o garoto imerso em pensamentos, enquanto as lágrimas já embaçavam sua visão.



Capítulo 14

não sabia onde ele estava. Sua visão estava turva e embaçada, e sua cabeça doía com as repetidas pancadas que ele tinha levado. Ele sentia o gosto de sangue na boca e uma dor latente no estômago, onde tinha levado chutes. Conseguiu se arrastar para a parede do beco escuro e sujo onde ele tinha apanhado até desmaiar e encostou na parede molhada.
Até respirar doía.
Ele fechou os olhos, desejando que a morte o levasse naquele momento. Não tinha mais o que fazer ali. Seus pais estavam mortos, sua irmã mais nova também. Por que ele tinha que continuar sofrendo? Sendo machucado? Procurando brigas para descontar a raiva e frustração. Não era justo.
! — Ouviu a voz inconfundível dela.
Mas não sentiu ódio. Estava fraco demais até para isso. Só queria descansar. Fechar seus olhos e desligar a mente, para que a dor não o alcançasse.
! Acorda!
— Por que você fez isso comigo? — Conseguiu sussurrar, antes de desmaiar de novo.
Agora, nos braços de seu primeiro amor.

Um dia antes...

Apesar da resistência de contra o maldito tempo que tinha pedido, o garoto parecia estar agindo de acordo com a própria ideia, sem levar em questão o consentimento da garota. Com as provas se aproximando, além dos ensaios para a peça e os treinos para o próximo jogo, os dois não tinham se visto e nem se falando direito. fazia um esforço maior para tentar interceptá-lo entre as aulas ou ligar para ele, mas estava sempre se esquivando e a evitando. Isso a deixou extremamente angustiada e infeliz, o que estava sendo percebido por seus pais, que inevitavelmente se preocupavam com seu humor.
— Ei, querida! — Emma chamou a atenção da filha, que cutucava seus ovos no prato, sem vontade de comer. — Por que não chama para vir almoçar? Já passou da hora de vocês fazerem as pazes.
— Ele não vai querer vir... — sussurrou, derrotada.
Estava a um passo de desistir de vez e se entregar ao tempo que o garoto tinha pedido.
— É tão bom tê-lo aqui! Vale a pena tentar, você não acha? — Emma insistiu.
Ela sabia que era importante que a filha não desistisse de ter ao seu lado.
— Vou ligar pra ele.
Como esperado, a ligação caiu na caixa-postal, mas deixou uma mensagem para o namorado: “, venha almoçar na minha casa hoje. Precisamos conversar. Por favor.”
Esperou por alguns minutos, na esperança que ele a respondesse prontamente, mas não aconteceu.
suspirou e se jogou no sofá da sala. Estava exausta. Toda essa situação com só tinha deixado claro para ela os seus sentimentos: ela o queria. Precisava dele por perto. E estava decidida a fazer o que fosse necessário para tê-lo.
Ele iria responder, né? Se estivesse falando a verdade sobre seus sentimentos, não iria ignorá-la dessa forma. Ainda era cedo, ele podia estar dormindo.
Seu pensamento foi confirmado quando, alguns minutos depois, uma ligação pipocou na sua tela. Seu coração respondeu imediatamente, palpitando.
riu, nervosa.
Como uma ligação poderia mexer tanto assim com ela?
Oi, amor! Eu estava dormindo. — A voz de realmente denunciava que ele tinha acabado de acordar.
suspirou com o som da voz dele. “Amor”, ele ainda gostava dela…
— Oi, senti saudades... — admitiu, ajeitando-se no sofá. — Você viu minha mensagem?
Sim. respondeu e depois de uma pequena pausa, disse: — Sei que estou falhando com você, . Mas vamos resolver tudo. — Prometeu e a garota sentiu seu coração palpitar novamente.
— Te espero aqui, então. Beijo. — Despediram-se e desligaram.
A garota deu um pulo do sofá, animada. Estava certa que eles fariam as pazes de vez e voltariam a ser felizes, agora, do jeito certo.
Subiu as escadas correndo, a fim de tomar um banho e se arrumar. Queria estar bonita para quando ele chegasse.

O domingo de tinha começado da pior forma possível: as lembranças de um dos piores dias da sua vida indo e vindo na sua mente. Era sempre assim nesse dia. O dia que o pai dela a abandonou. Simplesmente foi embora sem nenhuma explicação, quando ela era apenas uma garotinha de doze anos. E, desde então, ela se sentia só.
Não havia nada que preenchesse o buraco que ele tinha deixado. Principalmente porque ele era um bom pai, nunca deixou de estar presente por ela e quase sempre fazia muito mais do que a mãe. Mas, ainda assim, o amor pela filha e pela esposa não o impediram de fugir sem nenhuma explicação.
sabia que sua mãe ainda não tinha se recuperado. Talvez por isso preenchesse sua vida com uma agenda cheia de viagens internacionais. Ela não culpava a stylist, mas sentia falta dela. Sentia falta do calor do abraço de sua mãe, que foi seu único colo na adolescência. Mas, essencialmente dia doze de junho, sentia uma dor imensa no peito e uma saudade imensurável de Andrew, seu pai.
Ela tinha preferido fingir que ele tinha morrido. Inexplicavelmente, era mais fácil lidar com esse tipo de dor do que pensar que ela tinha sido simplesmente abandonada. Por isso, também era tão difícil perdoar . Pensar nela doía também.
Quando Andrew foi embora, e se tornaram mais amigas do que nunca. a chamava todos os dias para dormir na casa dos , ela apertava fortemente a amiga, enquanto ela chorava com saudades do pai e, desde então, todo doze de junho elas mantinham a tradição de patinar no Cambridge Ice Arena. Mas, desde a morte de Lily, obviamente não tinham feito mais. Por isso, a garota estava decidida a passar o dia na cama, tomada pelo torpor da tristeza.
Planos estes, que foram imediatamente cancelados quando a campainha tocou e um animado passou pela porta.
o analisou por um momento, ao contrário dela, que estava um caco, estava perfeito: os olhos azuis em tons normais, o que denunciava que ele não tinha fumado maconha, banho tomado e cabelos penteados para trás, além de um sorriso torto no rosto. Tinha acordado de bom humor e disposto a animar a melhor amiga.
— Sei que estou sendo um bosta com toda essa coisa da , mas hoje é meu dia de cuidar de você! — Anunciou, abraçando forte a amiga, que imediatamente começou a chorar copiosamente. — Ei, está tudo bem, eu estou aqui. — Sussurrou em seu ouvido e depositou um beijo na sua orelha. — Agora vai tomar um banho, porque você está simplesmente… nojenta! — Exclamou, o que fez rir, limpando as lágrimas.
Talvez ela não estivesse tão abandonada assim...

estava sentindo que seu coração ia pular do peito a qualquer momento. Nunca tinha ficado tão ansiosa assim para ver . Além da saudade, estava louca para resolver as coisas e sentir o calor da relação dos dois novamente. Precisava disso.
Retocou sua maquiagem pela décima vez, certificando que nada estava fora do lugar, inclusive seu cabelo, que estava preso em um rabo de cavalo alto. Do jeito que ele gostava. Estava usando um vestido amarelo rodado, que batia um pouco acima do joelho. Era um dia de calor em Cambridge.
fez mais alguns retoques e, de repente, seus olhos se repousaram sobre uma foto dela com , quando elas tinham treze anos. Estavam abraçadas na frente do Cambridge Ice Arena. Estava fazendo um ano que o pai da amiga tinha ido embora e tinha criado a tradição de ir patinar para que a amiga recriasse suas memórias. Lembrar disso fez o coração da garota apertar. Ela sentia tanta falta da amiga, que doía.
Por vezes, seu pensamento parecia estar centrado em , mas era sua irmã, sua confidente. Ela realmente a amava com todo coração. Realmente a ama.
Pensou e repensou se mandava uma mensagem, depois do momento que tiveram no banheiro, a garota chegou a pensar que talvez conseguiria uma reaproximação, mas com o que houve no hospital, ela não achava que fosse possível. a odiava e nunca iria perdoá-la.
Balançou a cabeça para afastar as memórias. Seu psicólogo dizia que ela precisava lidar com uma coisa de cada vez. E era isso que ela faria. Primeiro lidaria com a recuperação de seu namoro com .
Foi só pensar no garoto, que a campainha de sua casa tocou e a garota respirou fundo, seu coração dando pulos em seu peito e as borboletas — ou o que quer que fossem — dando cambalhotas em seu estômago.
Olhou-se pela última vez no espelho e desceu as escadas a tempo de ver Emma abrindo a porta e dando um longo abraço em . Ele estava mais lindo do que nunca! Os cabelos bagunçados como sempre, uma blusa preta simples, uma correntinha pendendo em seu pescoço e bermuda jeans. Ele estava com as bochechas coradas e exibia um sorriso impecável para a mãe de .
Seus olhos pousaram na garota pela primeira vez e a loira sorriu de orelha a orelha, fazendo com que suas pernas ficassem moles e seu coração batesse descompassado. Ele era inevitavelmente apaixonado por ela. Desde sempre. E seria para sempre.
— Oi! — A voz de subiu uma oitava acima do normal e Emma a olhou, repreendendo.
— Oi, linda! — diminuiu a distância entre eles, deu um longo abraço na namorada e imediatamente se sentiu em casa.
Estava com tanta saudade dela que doía, tentou de toda forma se afastar, porque era certo e mais justo, mas simplesmente não podia mais dar as costas para seu sentimento.
— O almoço está servido, queridos... — Emma disse, emocionada com a cena.
Estava confiante de que os dois resolveriam os problemas. Precisava disso também.

— Você continua péssimo nisso! — se recuperou da crise de risos, que tinha tido ao ver cair pela décima vez na pista de patinação.
— Você tem que entender que eu jogo futebol e não hóquei... — rolou os olhos, tentando se equilibrar.
Já estava amaldiçoando a si mesmo por ter tido essa ideia estúpida.
Odiava patinar desde que eram crianças, e até tentaram arrastar ele e algumas vezes, mas não era a praia deles. Simplesmente achava impossível se equilibrar na merda dos patins.
— Tem falado com ? — Franziu a testa e viu a amiga fazer o mesmo.
Desde a explosão do carro, o garoto estava o mais reservado possível. Respondia as mensagens vagamente e mal apareceu na casa de . Estava suspeitando que o amigo estava escondendo alguma coisa e nada tirava da cabeça que era algo relacionado à . Sempre ela.
— Pensei em dizer que… — engoliu em seco, tinha pensado nisso algumas vezes, a ideia era indigesta, mas ele precisava do amigo perto dele. Amava o cara como um irmão. — Que… se ele quiser ser amigo de , não precisa se preocupar comigo. — Espiou a reação de choque de e esperou que ela o xingasse e o chamasse de louco, mas, como sempre, ela entendia.
— Faz sentido. Ele tem uma certa… conexão com ela, né? — escolheu muito bem as palavras.
Ela não era estúpida, sabia que era apaixonado por desde quando eram pré-adolescentes, mas tinha conquistado o coração da amiga primeiro.
— Mas você acha que vai conseguir lidar com isso?
— Não sei… — admitiu. — Mas estaria disposto, por ele. Ando pensando muito nessa coisa toda, ela jura que não teve nada a ver… e parece estar mudada, digo, em relação às drogas. — Pigarreou, desconfortável. — É só que nada se encaixa nessa história, eu só queria descobrir a verdade. — Seus olhos, novamente sem o controle dele, se encheram de lágrimas.
Não conseguia parar de pensar nesse assunto desde a última conversa com e também a conversa que teve com Damien no hospital.
— Faça o que o coração mandar. — sorriu ironicamente e partiu para cima dela para tentar derrubá-la.
Os dois sabiam o quanto odiavam aquela frase.
— Pelo menos sei que sempre vou ter você... — beijou a bochecha da amiga quando a alcançou, abraçando-a por trás.
fechou os olhos, tentando conter as lágrimas.
— Sempre nós dois.
Do lado de fora da arena, flores eram jogadas no lixo, enquanto um homem furioso caminhava para seu carro após ver a cena. Quem o loirinho achava que era para roubar sua namorada? As coisas não iam ficar assim!

— Seu coração tá acelerado... — deu um risinho e encarou , que ficou vermelha como um pimentão.
Os dois estavam deitados juntos nas espreguiçadeiras do quintal. Tinham acabado de comer a sobremesa deliciosa que Joanne tinha preparado, depois de se servirem duas vezes com o risoto que a moça tinha preparado para o almoço. E agora estavam curtindo a preguiça.
O garoto estava com a cabeça no peito de , enquanto a mesma acariciava seus cabelos.
— Sempre fica assim quando você está por perto. — Ela murmurou, puxando de leve a cabeleira macia dele.
riu novamente.
— Quando você está por perto, meu estômago se remexe... — desviou os olhos.
Geralmente, não tinha vergonha de admitir o efeito que ela causava nele, mas ainda estava confuso e sem saber o que fazer em relação a garota.
— E meu pau fica duro. — Concluiu, arrancando risadas da namorada.
— Não quero ficar longe de você... — ficou séria novamente, arrancando um suspiro de .
“Ela ia ser direta, então...”, ele pensou.
— Não sei se a explosão mudou seus pensamentos, mas o do estacionamento não parece ser o mesmo das últimas semanas.
— Algumas coisas mudaram. — A voz dele era quase um sussurro.
Sabia que o certo era terminarem e seguirem longe um do outro. Tudo estava diferente agora e ainda tinha . Estava cada vez mais difícil esconder o relacionamento e em algum momento ele e iriam descobrir e provavelmente nunca mais iam querer falar com ele.
Parecendo ler seus pensamentos, disse:
— A única coisa que mudou para mim é que eu não quero fazer mais nada escondido. Não me importo mais que as pessoas saibam de nós.
— Nem mesmo e ? — perguntou, descrente. — Olha, eu sei que você gosta do cara ainda… e eu não julgo, sempre soube e resolvi arriscar. Não me arrependo, juro para você. Mas vamos magoá-lo. De novo.
— Eu nunca vou negar meu amor por ... — não conseguiu esconder a dor na sua voz e um nó se formando em sua garganta, mas ela se forçou a falar. — Mas acabou. Ele me odeia. E provavelmente vai me odiar mais depois que souber. Mas eu cansei de viver assim, . Minha vida nunca vai para frente se eu ficar presa ao passado e eu preciso de você para mudar minha história. Estou disposta a enfrentar todos os problemas. Não podemos mais ficar levando isso adiante. Damien já sabe, não sei por que ele não espalhou ainda, mas duvido que demore a chegar nos ouvidos de Meredith ou alguém pior e…— o monólogo que ia se formando foi calado com um beijo cheio de significados: saudade, medo, amor.
Todos os medos se misturando, enquanto a língua dos dois dançava em sincronia.
“Ela me ama também”, era o pensamento que se passava na cabeça de , enquanto “ele precisa acreditar em mim”, rondava a cabeça de .
O garoto se ajeitou melhor e agora estava em cima dela, puxando seu pescoço de leve. A garota deixou um leve gemido escapar entre o beijo, o que foi o suficiente para deixar o menino duro como pedra, mas eles precisavam se controlar. Estavam na área externa da casa e a qualquer momento alguém podia aparecer.
E foi o que aconteceu.
No momento em que a mão de ameaçou chegar perto do botão da bermuda, os dois ouviram um pigarro e arregalaram os olhos diante de Joe em pé do lado da piscina.
— Boa tarde. — Murmurou, fuzilando com os olhos.
O garoto pulou rapidamente de cima de e se levantou, a namorada logo atrás, ajeitando as roupas, vermelha como um pimentão.
— Oi, senhor ... — o cumprimentou cordialmente e não recebeu nada menos que um aceno de cabeça e uma careta.
— Não sabia que você voltava hoje, pai! — , depois do susto inicial, parecia mais tranquila.
Sabia que o pai estava fazendo cena.
Correu e pulou em seus braços. Estava morrendo de saudades, de novo. Ultimamente, ele nunca parava em casa.
Você precisa disfarçar... — sussurrou no ouvido dele, enquanto os braços do pai a envolviam.
Ele também estava morrendo de saudades dela e se sentindo culpado por deixar ela e Emma tanto tempo sozinhas, mas a demanda das indústrias estavam crescendo mais do que nunca.
— Pra mim é mais difícil. Você sabe. — Ele murmurou de volta e a garota rolou os olhos, como sempre fazia. — Espero que você tenha tempo para seu velho hoje, vou voltar para Los Angeles na terça-feira. — Com pesar, viu baixar os ombros.
Ele nunca ficava tempo suficiente para matar a saudade.
— Eu já vou indo então, linda. — enfiou uma mão no bolso, sem jeito. — Te vejo amanhã na escola. — Beijou ela no rosto e apertou a mão do senhor , que fez questão de utilizar uma força exagerada na mão.

— Vai mesmo dizer ao que tudo bem ele conviver com ? — perguntou, dando mais uma mordida em seu Big Mac.
Depois que patinaram, os dois estavam mortos de fome e foram ao McDonald's. já estava em seu segundo hambúrguer.
— Acho que sim. — Deu de ombros, ainda não tinha se decidido, mas também achava que ou era isso, ou se afastariam mais ainda.
E era a última coisa que ele precisava.
Falando no diabo... fez uma careta e indicou com a cabeça.
olhou para trás e viu , Emma e Joe entrando, os três estavam rindo. Felizes.
sentiu que tudo que ele havia comido ia voltar. Em tempos bons, ele estaria ali no meio. Os tinham uma pequena tradição, logicamente atendendo aos caprichos de , de sempre comerem no McDonald’s quando iam comemorar algo — ou simplesmente quando Joe voltava de viagem. Já tinha participado diversas vezes das confraternizações deles e também.
— Acho que estou pronta para ir embora. — Ela murmurou.
Provavelmente estava sentindo o mesmo desconforto que .
Os dois juntaram o restante do lanche e saíram de cabeça baixa. A família não pareceu os ver, já que o restaurante estava cheio. Os dois respiraram aliviados quando se sentiram seguros no carro de .
— Na sua casa ou na minha, gatinha? — deu um sorriso maroto, que fez cair na gargalhada, antes de responder:
— Na sua. — Fez sua melhor pose sexy, que arrancou apenas risadas do melhor amigo. — Obrigada pelo dia. — Falou com sinceridade. — Se não fosse por você, eu passaria o dia inteiro na cama, chorando. — Riu sem humor.
— Somos amigos pra isso. — faz um carinho na cabeça da amiga, antes de dirigir para casa, ainda com o incômodo no estômago por ter visto a família que há muito tempo foi dele também.

O dia de estava péssimo. Tinha acordado atrasada e perdido a primeira aula, não tinha conseguido lavar o cabelo, então estava com um coque desajeitado, sem maquiagem e para piorar: na pressa para tomar o café da manhã, acabou derrubando todo o leite no uniforme, o que a tinha obrigado a vestir o uniforme das líderes de torcida no único dia da semana que não tinha treino.
Era apenas segunda-feira e ela já se sentia exausta.
A aula de Filosofia estava mais entediante que o normal. Ela não estava realmente ouvindo o professor falar sobre o mito da caverna de Platão e é claro que quando foi perguntada sobre isso, respondeu errado, o que fez a turma inteira rir e o professor a olhar com a cara feia. Ótimo!
— Talvez na detenção você aprenda a ler o texto de apoio das aulas, ... — ele murmurou e a garota enterrou o rosto nas mãos.
Tinha esquecido completamente que hoje era o primeiro dia da detenção que tinha pegado por causa das chaves da piscina. Além de ter ajudado na decoração do baile, ainda teria que ficar duas semanas na detenção. Com , que tinha pego três, e , que injustamente tinha sido punido apenas com uma semana. Esperava que tivessem mais pessoas na sala, senão o clima seria tenso.
Uma batida na porta da sala cortou novamente o professor Ellis, que suspirou pesadamente, antes de abrir. “Ele também não estava com um bom humor hoje”, pensou.
— Entrega para . — Ouviu um garoto dizer e franziu a testa, sem entender.
Não tinha pedido nada.
— Vá em frente. — Mister Ellis rolou os olhos e arfou quando viu o garoto entrar com o buquê de rosas mais bonito que ela já tinha visto na vida.
As flores eram naturais e estavam com um brilho intenso de vermelho.
— Pra você. — O garoto parecia tão entediado quanto o professor, mas o resto da turma a olhava com curiosidade e algumas meninas com um “quê” de inveja.
Continuando! — O professor bateu palmas para chamar a atenção da turma de volta, mas não prestava atenção em mais nada, encantada com o buquê.
Ela procurou um cartão, mas não tinha, embora soubesse exatamente quem as tinha enviado: . Só podia ser.
Sacou o celular e mandou uma mensagem para o namorado:

» : Rosas, huh? Você sabe como conquistar uma garota.

Mas tudo o que recebeu de resposta foi uma carinha feliz, mas bastou para que ela sorrisse de orelha a orelha. Eles estavam bem e iriam tentar. E se tinha feito um grande gesto, ela também faria.

As horas até o intervalo pareceram uma eternidade, mas, finalmente, o sinal que os dispensava das aulas tocou e todos saíram para os corredores abarrotados.
Embora estivesse com o coração na boca e os dedos tamborilando de ansiedade, passou no seu armário antes para deixar suas coisas e pegar um casaco. O tempo tinha fechado de repente e o uniforme das líderes de torcida não seria suficiente para mantê-la aquecida. Ponderou sobre levar ou não o buquê para o refeitório, mas não era como se ela tivesse onde guardar e temia que se colocasse no armário, as flores murchassem. Então marchou para o refeitório abraçando o buquê, recebendo alguns olhares, mas não se importou. Nada mais importava agora.
Assim que passou pelas portas, avistou . Ele estava sentado em uma das mesas — e não na cadeira — do meio. sorriu com expectativa, antes de atravessar o refeitório quase correndo e tomar o garoto em seus braços, que arregalou os olhos de surpresa, mas não foi capaz de falar nada quando simplesmente segurou seu rosto com as mãos e o beijou. Na frente de todo mundo.
Não existiu uma só pessoa no lugar que não fez um “o” com a boca diante da cena. Todos estavam chocados. Alguns jogadores do time que estavam na mesa gritaram, houveram também alguns ruídos de desaprovação... mas, de repente, tudo ficou em silêncio e todas as cabeças, inclusive as de e , que terminaram o beijo sorrindo um para o outro, se viraram para só um ponto bem na porta do refeitório: encarava a cena com um olhar mortificado.



Capítulo 15

odiava aquele lugar. Já tinha meses que ele não frequentava. Mas depois da cena no refeitório, não havia nenhum outro lugar para ele.
A terra estava molhada e pegajosa, como sempre. O clima era horrível. Por sorte, por ser dia de semana, não estava cheio. Quem era que ia ao cemitério numa segunda-feira? Tinha visto apenas uma família se debruçando em cima de um caixão marrom, antes de ser enterrado. Desviou os olhos da cena, porque se lembraria do dia que enterrou os pais e sua irmã mais nova.
A lápide de Lily-Anne estava bem cuidada, embora não houvesse flores. se certificava de pagar um funcionário do cemitério para deixar a dela e a dos pais sempre limpas, mesmo que ele quase não visitasse.
Quando a morte da menininha ainda estava recente, ele ia todos os dias. Surpreendentemente era o único lugar em que seu coração se acalmava. Talvez o fantasma de Lily ainda estivesse por ali ou sei lá. Mas depois de um tempo, parou de ir. Estava se curando, sentindo-se melhor.
Até a voltar. Sempre ela.
cambaleou até a lápide e se sentou ao lado, com dificuldade. Tinha fumado dois baseados inteiros antes de dirigir até ali. Sua cabeça estava doendo pelas lágrimas que caíram sem permissão e agora desciam livremente pelo seu rosto.
— Lily-Anne. Filha amada, aluna exemplar e irmã favorita. — Recitou os escritos da lápide da irmãzinha num sussurro.
Sua boca parecia estar cheia de água.
— Eu não sei o que fazer… preciso que… você… Lily-Anne. — Enterrou o rosto nas mãos e permaneceu ali, soluçando.
Seus ombros sacudiam de tanto que ele chorava, seus olhos ardiam e seu estômago vazio parecia pedir socorro, repuxando-se a cada vez que ele puxava o ar para continuar chorando.
— Meu melhor amigo me traiu. Ele está com a , você acredita? A garota responsável pela sua morte. A porra do meu melhor amigo. — Chutou um montinho de terra à sua frente e balançou a cabeça, enxugando as lágrimas inutilmente. — Eu odeio os dois! — Seu olhar se tornou duro, além da tristeza.
estava se sentindo enganado, traído. E o pior de tudo: sozinho. Não tinha mais para onde ir e suspeitava que nem o salvaria. Como, especialmente , tinha tido coragem de fazer isso com ele? Não era idiota, claro, sabia que quando eram mais novos o amigo tinha uma quedinha por , mas quem não tinha? Ele sabia que era algo bobo que provavelmente superaria comendo outra garota. Mas jamais imaginaria que agora seu melhor amigo, seu irmão, está comendo a sua ex-namorada. A menina que matou a irmã dele.
— Filha da puta. — pegou o terceiro baseado no bolso e acendeu.
O efeito retardante da maconha não estava fazendo efeito. Ele estava com tanto ódio, que poderia explodir. sabia o quanto ele amava , o quanto sofreu nos primeiros anos. É claro que no instante em que viu sua irmã morta, a pessoa que ele mais odiava no mundo era a ex-namorada, mas o amor não tinha sido esquecido. Apenas enterrado no lugar bem fundo do seu coração, que jamais seria alcançado novamente.
Você a amou com todo seu coração, né? — A voz familiar fez com que o garoto pulasse.
— L-lily? — Apertou os olhos. Mas ela estava ali. A irmã dele estava ali.

— Vocês dois são os maiores filhos da puta do mundo! — esbravejou para e .
A garota estava de pé, andando de um lado para o outro na sala da casa de , enquanto estava abraçando a si mesma na ponta da escada, nervosa. E não conseguia encarar a amiga nos olhos.
— Eu não vou me meter nisso, de verdade. estava disposto a deixar de lado sua amizade com a , ! Estava disposto a abrir mão para preservar a irmandade de vocês, enquanto você estava comendo ela escondido. — Sua voz expressava sua profunda decepção, mas não ia deixar ela falar assim dela, como se ela fosse uma vagabunda qualquer.
— Não fizemos de propósito! — Murmurou.
continuava calado e aquilo incomodava. Ele não ia defendê-la?
— Não consigo nem olhar pra você agora. — rolou os olhos — Agora que a merda está feita, precisamos encontrar , porque eu tenho certeza de que ele está se entupindo de drogas nesse momento! — Passou a mão pelos cabelos nervosamente.
Estava sempre prevendo o pior. Conhecia como a palma da sua mão e, nos últimos anos, todas as válvulas de escape dele tinham sido as drogas e a bebida. Sabia que o amigo tinha se enfiado em algum lugar para acabar com si mesmo. E estava completamente exausta de estar sempre precisando limpar a bagunça dos outros. Não aguentava mais aquilo tudo!

causou uma cena no refeitório hoje. — O garoto de olhos verdes comentou, risonho.
— É, fiquei sabendo. — O de blusa vermelha não soou tão animado, dando de ombros, o que fez com que seu amigo franzisse a testa, mas preferiu não comentar sobre, ao invés disso, continuou a falar do acontecido do almoço:
— Imagino como o deve ter ficado… já pensou seu melhor amigo pegar sua ex-namorada? Cara! — Riu de novo, balançando a cabeça negativamente, mas sua fala só serviu para irritar o mais velho.
— Será que dá pra você calar a boca? — Rugiu, com raiva. — Você não entende o que isso pode causar, porra? Tudo está em risco agora.

e não trocaram uma palavra, enquanto rodavam com o carro do garoto pela cidade, à procura de . estava com os braços cruzados, olhando para todos os lugares em volta e ligando para o celular de repetidamente, é claro, sem sucesso. Enquanto batia a mão no volante, nervoso. Ele sabia que estava com raiva dele, sabia que não devia ter deixado que ela fizesse toda aquela cena na frente de todos e, acima de tudo, sabia que não se perdoaria se algo acontecesse com seu melhor amigo. Tudo aquilo tinha ido longe demais e era culpa dele.
tinha preferido ir sozinha. Precisava colocar a cabeça no lugar. Estava terrivelmente arrependida de ter sido passional e causado toda aquela cena no refeitório, tanto por causa de , quanto por como estava agindo. Estava profundamente magoada por ele não ter a defendido diante de . Ela precisava que ele estivesse com ela. Mas agora podia pensar apenas em . Sabia bem o que um episódio desse podia causar em um dependente químico, porque anos atrás, era ela no lugar dele.
Percorreu todos os lugares em que ela sabia que ele ia quando queria ficar sozinho, mas ele não estava em nenhum. Já passava das quatro da tarde e ela não tinha obtido nenhum sucesso. Parou o carro de frente para uma cafeteria, para se alimentar antes de continuar a busca. Sacou o celular e tinham mensagens de sua mãe e , respondeu Emma primeiro, dizendo que estava tudo bem e que estava com o namorado. Preferiu não contar o real motivo, porque sabia que se a mãe soubesse que estava desaparecido por causa dela, chamaria da polícia até a CNN para encontrá-lo. Não queria colocar ninguém no meio disso.

» : Ainda não o achamos.

Era a única mensagem de , que decidiu ignorar.
Pegou sua bolsa e saiu do carro, entrando no café. Fez seu pedido e se sentou para aguardar. Pensando nos prós e contras de tentar ligar para o ex-namorado. Por incrível que pareça, ainda não tinha tentado. Por que ele a atenderia? Provavelmente nem tinha seu número mais e nem sabia se o que ela tinha ainda era dele. Mas valia o risco, não valia?
Colocou o telefone no ouvido e só assim percebeu que estava tremendo. O celular tocou três vezes, antes de uma voz abafada responder.
O que você quer de mim?
! Onde você está? — Seus olhos se arregalaram.
A voz de denunciava que ele estava, no mínimo, bêbado.
Por que você quer saber? — Respondeu com grosseria. — Estou bebendo para esquecê-la, — ele a chamou pelo apelido, o que foi suficiente para que a garota sentisse uma dor aguda no estômago. Como se tivesse levado uma facada. — Lily disse que você foi meu grande amor... — foram as últimas palavras que ouviu, até o “tu tu tu” que encerrou a ligação, ao mesmo tempo que seu nome era chamado para pegar o mocca que ela tinha pedido.
A garota nem soube como estava de volta no carro. As lágrimas caíam agora sem aviso pelo seu rosto.
“Lily disse que você foi meu grande amor.”
Lily?
Uma chave pareceu virar na cabeça de , que secou as lágrimas e se forçou a se concentrar. Precisava achar . Nada mais importava agora.
Antes de arrancar o carro, enviou uma mensagem para :

» : Acho que sei onde ele pode estar. Não conte a , quero resolver isso sozinha.

Não esperou que ele respondesse e arrancou o carro com o coração acelerado e a palma das mãos geladas, mas nunca esteve tão determinada. Seguiu seu caminho com as palavras de ainda ecoando em sua mente.
“Lily disse que você foi meu grande amor.”

— L-Lily? — Apertou os olhos. Mas ela estava ali. A irmã dele estava ali.
Sim, seu bobo. Achou que eu não viria te ajudar? — Sorriu angelicalmente, com seus dentes tortos a mostra, o que fez com que as lágrimas caíssem mais rápido do rosto de .
Ele sabia que era um sonho ou uma alucinação causada pela maconha, mas não estava nem aí. Sua irmã estava ali.
— Eu não sei mais o que fazer. Por favor, me leve para ficar com você. — Suplicou, ajoelhando-se na terra molhada.
Lily balançou a cabeça negativamente e se recostou levemente na árvore. Ela estava vestindo sua roupa favorita: um vestido amarelo com bolinhas brancas, seu cabelo estava penteado em um rabo de cavalo impecável e as maçãs do rosto estavam vermelhas, seu rosto transmitia uma paz invejável.
Não é sua hora. — Ela sussurrou. — Mas você precisa ouvir seu coração. Precisa entender que só estará em paz quando aprender a perdoar.
— O que aconteceu naquele dia, Lily? Não posso perdoar se não souber. — Respondeu à irmã.
Por diversas vezes parecia que a garotinha era mais velha e mais madura que ele. Até mesmo em uma alucinação Lily-Anne conseguia ser mais forte que ele.
Como eu poderia te falar? Estou na sua cabeça, bobinho. — Sorriu e riu junto.
Estava triste, seu coração estava dilacerado e ao mesmo tempo estava em paz. Queria ficar ali para sempre.
— Eu sinto sua falta. — Murmurou, abraçando suas próprias pernas.
Eu também. Sinto muito que você esteja passando por isso. Mas você precisa começar a ouvir seu coração, bobinho. — Lily abraçou a si mesma, como que se quisesse se aproximar do irmão, mas não pudesse. E era óbvio que ela não podia.
, então, voltou para sua realidade: ela não estava ali. Lily-Anne estava morta debaixo da mesma terra molhada em que ele estava sentado. Ao mesmo tempo em que ele caiu na real, ela desapareceu como névoa. Ele estava sozinho de novo.
Levantou-se, batendo as mãos na calça para tirar a terra, sem sucesso. Até que deu de ombros e desistiu. Ignorou seu celular com as chamadas perdidas de e , não queria falar com ninguém agora. Olhou pela última vez à lápide vazia de Lily-Anne e saiu o mais rápido possível dali.
Mas ele não foi para casa. Deixou o carro na entrada do cemitério e partiu a pé. Não conhecia muito bem o bairro onde ficava, mas não estava se importando. Só queria achar um lugar para beber até perder a consciência.
Quando, enfim, achou uma espelunca escura perto de um beco qualquer, entrou em um rompante. Alguns caras estavam do lado de fora fumando maconha, o cheiro forte inflou as narinas dele. No interior do bar, a situação não era diferente: algumas pessoas fumavam maconha, outras utilizavam seringas para drogas injetáveis. No canto, podia ver uma ou duas pessoas cheirando cocaína.
O espaço era escuro e frio, tinha um balcão que cortava o bar ao meio e um homem, aparentemente sóbrio, estava do lado de dentro com uma feição enojada. Claramente ele odiava trabalhar ali.
— O que vai querer, garoto?
— Whisky duplo.
Ele tomou duas doses em menos de um segundo e sinalizou para que o homem fizesse mais, ele franziu a testa, mas não questionou. Enquanto esperava pelos próximos, recebeu a ligação que menos esperava: piscava na tela. Talvez fosse já o efeito do álcool ou da maconha, mas ele não hesitou em atender:
— O que você quer de mim?
! Onde você está? — A voz de era alarmada, preocupada.
— Por que você quer saber? — Respondeu com grosseria. — Estou bebendo para esquecê-la, … — ele a chamou pelo apelido sem nem perceber. — Lily disse que você foi meu grande amor... — suspirou e, em seguida, alguém tomou o telefone de suas mãos, desligando-o.
Antes que ele pudesse protestar, levou um soco tão forte no rosto, que sentiu como se todos seus dentes tivessem chacoalhado.

e já estavam sentados em silêncio por um bom tempo. Ele tinha recebido a mensagem de , mas não sabia se contava ou não para a amiga. Tinha consciência que a namorada tinha pedido para não contar, porque sabia que ela se sentia culpada e queria resolver sozinha. Mas estava inquieta e nervosa, estava completamente desesperada com o desaparecimento de . Ele conhecia bem essa sensação, porque vivenciaram isso diariamente com nos tempos passados. A garota sempre sumia e eles tinham que procurá-la sem contar para os pais, para que o alarde não fosse maior. E foi por isso que ele resolveu contar para a melhor amiga a situação. Deviam isso a ela mais do que tudo.
acha que sabe onde ele está. Pediu para resolver sozinha. — Disse baixinho.
estava com o rosto enterrado nas mãos e levantou, olhando para com a expressão de mais puro desgaste. Mas havia ali também uma centelha de alívio.
— Bom, ela arranjou essa bagunça. Deveria mesmo tentar consertar sozinha. — Suspirou. — Não aguento mais essa merda toda. — Admitiu, encostando derrotada no banco do carona. Estava tão cansada.
— Me desculpe. — sussurrou, realmente arrependido. Ele sentia que a todo momento só causava mais e mais confusão.
— Você não tem culpa de ser apaixonado pela desde criança. E só que… toda essa situação é uma merda. — fechou os olhos, querendo conter as lágrimas que ameaçavam cair do seu rosto. — Eu precisava de um tempo longe de tudo isso.
— Que tal se você tiver? — sugeriu. Ele também tinha muito o que pensar.
— Não podemos simplesmente largar tudo… não sabemos se a vai conseguir achar e… — a fala de foi interrompida pelo barulho de mensagem no celular de :

» : Acho que o encontrei. O carro dele está aqui no cemitério. Veio visitar Lily-Anne.

— Deixe-me falar com ela. — pediu e hesitou, mas, por fim, entregou o telefone nas mãos da amiga, que discou para . — Você acha que consegue lidar com isso? — Perguntou assim que atendeu o celular.
A garota do outro lado da linha demorou um pouco para responder, talvez surpresa que fosse no telefone e não o namorado. Mas respirou fundo e disse:
Posso lidar com isso. — Respondeu, por fim.
— É com você agora. — A voz de era quase um sussurro. — Por favor, não estrague isso. Traga ele de volta pra casa. Por favor. — Suplicou para , que sentiu seu coração apertar no peito.
Pode deixar. — Tentou confortar a ex-melhor amiga e as duas desligaram.
respirou fundo, com lágrimas nos olhos. Estava se sentindo a pessoa mais egoísta do mundo, mas simplesmente não suportava mais carregar aquele fardo. Estava cansada de ter que resolver os problemas que os outros criavam, de cuidar de todos e ninguém cuidar dela.
Foi com esse pensamento que o coração da garota acelerou e ela foi perdendo o ar dos pulmões.
, acho que estou tendo uma crise do pânico. — Conseguiu arfar e o garoto a encarou com os olhos arregalados, sem saber o que fazer.
Pegou as mãos da amiga e apertou forte, fazendo-a olhar nos olhos dele.
— Vou tirar você daqui, ok? Vai ficar tudo bem, confie em mim.

estava disposta a entrar naquele cemitério e arrastar pelos cabelos se fosse preciso para levá-lo para casa, mas quando ficou frente a frente com a lápide de Lily-Anne, seu coração acelerou e seu corpo não respondeu mais. Foi ali que sua ficha caiu. Lily estava morta e era sua culpa.
Com as circunstâncias da morte da garotinha, ela não teve o tempo necessário para sentir o luto e chorar da maneira correta. Tudo que ela sentia era culpa e nada mais. Mas a mais nova dos também era sua amiga, a entendia melhor que todos e não julgava quando ela dava seus “shows de .” A verdade era que Lily se inspirava nela. Queria ser líder de torcida como ela e sempre brincava que queria que ela fosse sua irmã. De certa forma, eram.

— Eu não acredito nisso! O que você está fazendo aqui? Já não basta tudo que você causou? — berrava em meio às lágrimas, enquanto o encarava com os olhos arregalados e a boca escancarada, incapaz de proferir alguma palavra. — Eu queria que você estivesse morta! Você devia ter morrido no lugar da minha irmã!
As pessoas que estavam no enterro olhavam alarmadas para a cena, mas ninguém era capaz de parar . Todos ali culpavam pelo que tinha acontecido, todos a repreendiam com o olhar e algumas outras pessoas cochichavam e apontavam. Ali, parada na frente de , incapaz de se defender, ela não era mais , amor da vida dele, ela era a problemática cheerleader, que havia levado a irmãzinha do namorado para a morte. Não era bem-vinda.
— Eu não quero ver você nunca mais! Eu espero que você morra! — Antes que fizesse algo que se arrependesse, lançou o último olhar de pesar para e puxou o amigo para longe dela.
ficou para trás apenas para dizer:
— Vai embora! Você já não causou dor demais?

As lágrimas já desciam sem aviso pelo rosto de , enquanto ela se lembrava da cena horrível que tinha acontecido no enterro.
— Me perdoe. Me desculpe por tudo, eu não queria que nada disso acontecesse... — mal conseguia se manter em pé, enquanto as lágrimas grossas acompanhadas por soluços desciam pelo seu rosto.
A garota se ajoelhou próximo ao túmulo, deixando ali as tulipas que ela havia comprado. Lily-Anne amava tulipas, ela dizia que rosas eram superestimadas e que as tulipas mereciam a verdadeira atenção — riu ao se lembrar disso, a garota era bem geniosa quando ela queria. Mas um detalhe no túmulo da mais nova a fez parar de sorrir instantaneamente. Haviam outras flores ali, frescas e bonitas, como se estivessem sido colhidas pela manhã e eram peônias.
Quem será que havia deixado aquelas flores ali?
Sabia que não tinha sido, no estado em que ele estava, duvidava que ele tivesse tempo para pensar em flores. E aquelas flores… buscou em sua mente alguma coisa que a fizesse lembrar de peônias. Seu cérebro parecia fritar, enquanto ela tentava se lembrar de onde tinha visto essas flores, mas não conseguia. Boa parte de sua memória ainda era prejudicada pelo uso excessivo de drogas e o estresse pós-traumático. E esse era um dos motivos pelos quais ela tinha voltado: recuperar suas raízes. Mas estava sendo impossível lembrar.
fitou novamente as flores, na esperança que pudesse visualizá-las em sua mente e se lembrar do momento exato em que…
— Ai, meu Deus! — Exclamou espantada, quando finalmente conseguiu fazer a ligação, mas seu momento de “eureca!” durou poucos segundos.
Seu coração pareceu parar, quando ela sentiu algo gelado colar no seu pescoço descoberto, a garota não ousou olhar para trás. Seus olhos estavam petrificados e sua boca seca. A arma não se mexeu, enquanto mãos firmes passearam pelo corpo da garota, mas ela não teve reação alguma.
— Você não deveria ter voltado, ! — A voz gélida ecoou pelos seus ouvidos e a garota sentiu naquele instante que era o seu fim.
Fechou os olhos em uma prece silenciosa e esperou o tiro, mas nada aconteceu. Uma risada alta ecoou pelo cemitério vazio e a garota abriu os olhos novamente, ainda sem se virar.
— Agora eu terei que tomar medidas drásticas… e eu conto com você para não abrir o bico. — A voz estava abafada, como se a pessoa tivesse colocado algo na boca, mas não precisava se virar para saber quem era. Ela podia reconhecer aquela voz a quilômetros de distância. — Se cuide. — A pessoa riu novamente e tirou as mãos da garota, que permaneceu petrificada no mesmo lugar, incapaz de se mover, incapaz de sentir qualquer coisa, apenas olhando para o vazio, enquanto as lágrimas escorriam pelo seu rosto e suas mãos tremiam como vara.

Pareceu uma eternidade até que ela conseguisse se recuperar novamente. Suas mãos ainda tremiam, quando ela pegou a sua bolsa que havia caído no chão. Mas ela precisava encontrar . Precisava consertar o que fez primeiro, antes de entender o que tinha acontecido ali. estremeceu só de lembrar do cano gelado da arma em seu pescoço. Realmente pensou que iria morrer ali.
Por que ele não tinha atirado? E que medidas ele tomaria?
Ela não podia pensar nisso agora, estava ficando tonta e com a boca seca. Simplesmente não podia esquecer seu objetivo.
. — Sussurrou para si mesma e girou os calcanhares para seguir em frente em busca do ex-namorado.
Sabia que ele devia estar enfiado em algum lugar sujo que vendia bebidas para menores de idade, saiu andando pelo bairro com as mãos firmes na bolsa. Sabia que aqueles arredores era barra-pesada, porque em seus outros tempos já tinha ido ali com Damien.
Óbvio.
teve um outro momento de claridade e seguiu por uma rua escura que desembocava em um beco e, antes de entrar na porta pequena que se abria para o bar, ouviu um gemido vindo do beco escuro.

não sabia onde ele estava. Sua visão estava turva e embaçada, e sua cabeça doía com as repetidas pancadas que ele tinha levado. Ele sentia o gosto de sangue na boca e uma dor latente no estômago, onde tinha levado chutes. Conseguiu se arrastar para a parede do beco escuro e sujo onde ele tinha apanhado até desmaiar e encostou na parede molhada.
Até respirar doía.
Ele fechou os olhos, desejando que a morte o levasse naquele momento. Não tinha mais o que fazer ali. Seus pais estavam mortos, sua irmã mais nova também. Por que ele tinha que continuar sofrendo? Sendo machucado? Procurando brigas para descontar a raiva e frustração. Não era justo.
! — Ouviu a voz inconfundível dela, mas não sentiu ódio.
Estava fraco demais até para isso. Só queria descansar. Fechar seus olhos e desligar a mente para que a dor não o alcançasse.
! Acorda!
— Por que você fez isso comigo? — Conseguiu sussurrar, antes de desmaiar de novo.
Agora nos braços de seu primeiro amor.
gritou desesperada por ajuda, mas todos que estavam em volta ou saíam do bar estavam drogados demais para entender o que estava acontecendo.
, por favor! Acorde! — Ela não enxergava mais nada a sua frente, as lágrimas embaçaram suas vistas.
saiu sem rumo para longe do beco escuro, gritando por ajuda, até que um senhor de meia-idade, dono de uma loja, saiu com os olhos arregalados para ajudá-la. Ela não tinha ideia se as palavras desconexas que tinha dito ao senhor tinham feito ele entender, mas o homem a ajudou a carregar para o carro dela. O garoto ainda estava desnorteado, transitando entre a consciência e inconsciência, murmurando frases sem sentido com a boca machucada.
— É melhor levá-lo ao hospital! — O senhor aconselhou, enquanto a garota prendia os cabelos e enxugava as lágrimas para dirigir.
— Eu cuido disso! — Exclamou. — Muito obrigada pela ajuda, de verdade!
— Cuidado, menina. — Foi apenas o que ele disse depois, dando um meio sorriso e acenando para , que acenou de volta antes de acelerar o carro.
— Quero ir para casa. — sussurrou com dificuldade.
— Estamos indo, amor, estamos indo para casa. — sussurrou novamente, pousando sua mão de leve na mão dele. Que por estar fraco demais, nem se importou em afastar.

— QUE PORRA VOCÊ FEZ? — A voz do homem de botas pretas era grossa como um trovão.
— O maldito estava de gracinha com minha namorada e eu resolvi dar o troco. Nada que esse mimado não merecesse. Apenas uma surrazinha… — riu, lembrando-se dos socos que deu na cara de .
— Você é o ser humano mais burro que eu já vi na vida. Patético. — A voz do homem transparecia desprezo. — E te digo mais: não é mais sua namorada, seu imbecil. Já faz anos que aquela insolente te largou!
sentiu o golpe, mas não deixaria transparecer. Ele e estavam passando por um momento difícil. Mas ela sempre seria dele. Sempre. E o loirinho não podia achar que o roubaria dele.
— O chefe ficou sabendo da sua gracinha hoje, . — Meredith riu, cruzando os braços. — Não que não tenha sido merecido, mas você foi bem burro. — Riu novamente, enquanto cerrava o punho.
Não suportava ter que conviver com a Brown. Se pudesse, tiraria aquele sorrisinho da cara dela, mas tinha que ficar quieto agora e baixar a guarda. As coisas já estavam ruins o suficiente para ele.

Enquanto dirigia de volta para casa, ela não conseguia parar de pensar nas peônias no caixão de Lily e o acontecido no cemitério. Agora tudo estava interligado.
. Está acordado? — Perguntou, agoniada.
— S-sim. — O garoto arfou, até pensar estava doendo.
— Quem fez isso com você?
. . — Mesmo com todas as dores, ele conseguiu rosnar o nome do cara com ódio. Ele iria pagar por aquilo.
gemeu ao ouvir aquele nome. Então, de repente, a lembrança que ela tanto lutou para lembrar invadiu sua mente:

— Onde está seu namorado, ? — perguntou, fitando a amiga com as sobrancelhas arqueadas.
Ela não fazia questão alguma de esconder o quanto odiava o garoto e não queria que ele estragasse a tarde deles. Mas é claro que a melhor amiga tinha que chamá-lo e é óbvio que ele estava atrasado, consequentemente atrasando a todos.
— Deve estar chegando... — a amiga respondeu, ignorando o sarcasmo de , ela já estava mais que acostumada com a rixa entre e seu namorado.
Não tinha ninguém que a amiga achasse que fosse suficiente. Os tinham fama de ser criteriosos.
— Falando no diabo… — murmurou, quando viu a sombra de na porta de entrada.
Ele também não era o maior fã do garoto. Não gostava de como tratava sua melhor amiga, tampouco como ela mudava perto dele.
— Oi, pessoal! — O mais velho sorriu para todos.
Era um cara bonito, apesar de ser estranho e ter toda aquela vibe de filho de pastor, com seu suéter perfeitamente alinhado e a calça cáqui perfeitamente ajustada no corpo. O jeito dele simplesmente irritava profundamente .
. — Cuspiu as palavras, direcionando um sorriso torto para a garota.
Ele a achava uma péssima influência para e não conseguia entender como a namorada conseguia ser amiga daquela garota problemática, mas aturava simplesmente pelo bem do seu próprio relacionamento.
— Deixe-me ver como ficou! — puxou o braço de para que todos pudessem ver a nova tatuagem do garoto.
— Uma tattoo, uh? Não era o senhor certinho? — perguntou, desconfiada.
costumava olhar torto para todas as suas tatuagens.
— Essa tem um significado especial... — deu de ombros, exibindo o pequeno ramo de peônias que ele tinha tatuado.

E, de repente, tudo se encaixou na cabeça de . Suas vistas se embaçaram e ela lutou para continuar dirigindo o carro com segurança. a fitou, confuso. Ele ainda sentia dor, mas estava mais relaxado sabendo que estava dentro de um carro indo para casa, mesmo que fosse com ela.
Foi ele. sussurrou.



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