Finalizada em: 25/01/2015

PRÓLOGO

Às vezes o mundo se consome em escuridão e meus olhos não se adaptam, então eu os deixo fechados para não sentir medo.
Na guerra entre o céu e o inferno, quem sofre são os inocentes. Então, faça como eu, junte-se ao lado que vencer, se arrisque a viver do jeito que sua mente aconselha, sem hesitar e perder seu precioso tempo nessa curta vida moribunda.
Sujeite-se às suas próprias ordens, faça parte do bando noturno, não tenha medo de gostar.
Às vezes é preciso um demônio para te salvar do inferno.


01.

Suddenly the moment's here, I embrace all my fears.

Ela acordou e encarou os filetes de madeira do teto de seu quarto. Virou-se na cama, sentindo o macio do lençol branco escorregando pelo alvo da curva de sua cintura, fechando os olhos enquanto suspirava. Quando tornou a abri-los, encarou o branco infinito que se mostrava por sua janela sem cortinas; levantou-se sem muita vontade, sentindo a regata preta escorregar até metade de suas coxas caminhou até o divã posto exatamente na altura do batente branco e espalmou as mãos no vidro, encarando o branco devastador que a neve causava naquela temporada em sua cidade.
Naquele bairro sem muitas casas, ela podia acompanhar o infinito branco se perder até além do horizonte, subindo pela floresta de bordos e carvalhos que contornava o leste da cidade que morava.
Quando respirou fundo e virou levemente o pescoço para a porta de sua suíte, escutou uma louça de porcelana cair no chão e a gritaria ter seu início naquele começo de manhã. Seus ouvidos cansados não sabiam mais diferenciar as vozes de seus pais naquela competição de quem falava mais alto, de quem xingava pior, de quem conseguia ser mais desagradável um com o outro.
Ela fechou seus olhos, como sempre, e seguiu para o banheiro, se trancando ali. Encarou a ponta das unhas dos pés pintadas de preto e subiu lentamente os olhos azuis cristalinos até seu reflexo deplorável no espelho.
Havia semanas que ela se encontrava daquela forma, estranhamente desarrumada. Seus cabelos negros sempre tão bonitos, com ondas fartas e grossas, estavam de um opaco tom feio de preto azulado; seus olhos claros como o anil do céu de uma primavera, estavam escuros, sem vida, e as bolsas roxas que se aglomeravam em olheiras profundas deixavam claro suas noites mal dormidas.
Ela levou uma das mãos para o ombro, tocando o gélido tecido de sua regata velha usada como pijama, e empurrou sua alça para baixo, começando a mostrar o início de suas cicatrizes curadas pelo tempo, soando riscos cristalinos sob sua pele pálida.
Ela se recordava perfeitamente daquele próximo de seu ombro, no osso da clavícula. Fora seu primeiro. Sempre que perguntavam, ela dizia ter sido um machucado. Foi quando seu pai saiu de casa pela primeira vez, dizendo que não suportaria mais um segundo ao lado daquela desprezível mulher que era sua mãe. Eles gritaram tanto que os vizinhos acharam melhor chamar a polícia, mas, quando chegaram, era tarde demais. Ele já havia ido, já estava longe.
estava cansada das dores que os outros causavam nela, sentia raiva de não conseguir controlar seus sentimentos.
Tudo começou quando, sentada na carteira rabiscada da escola pública onde — fingia — estudar, encostou o pulso na ponta da madeira lascada e sentiu uma pontada de dor, seguida pelo ardor delicioso da farpa adentrando por sua pele fina. Uma única gota de sangue caiu dali, tão pequena e invisível que ninguém além dela notou. Mais tarde, quando voltou para casa, testou algo maior. Pegou uma gilete e, nervosa e lentamente, a pressionou sob a clavícula, sentindo a dor aumentar ou diminuir conforme ela desejava. O sangue que escorreu de sua pele caiu no chão, ficando mais claro, reluzindo sob aquele mesmo mármore que hoje ela se via em pé, recordando-se de como seu vício começou.
A partir dali, sempre que se sentia raivosa por não controlar algo, ou aprofundava cortes antigos, ou criava novos. Hoje, se via pares brilhantes em seu pulso esquerdo, outros poucos mais acima no antebraço.
Sempre que saía, tratava de escondê-los para não escutar perguntas. Podia sair com o pulso à mostra, esfregando-o na cara de seus pais, que eles não notariam.
Ela prendeu os cabelos com pontas secas em um coque apertado no topo de sua cabeça e seguiu para a banheira, abrindo o registro quente, escutando aquele jato forte bater contra a porcelana, de forma que os gritos de seus pais não soassem tão altos na acústica do banheiro. Ela se encarou no espelho novamente enquanto fazia sua higiene matinal, perguntando-se quando todo aquele inferno começou — ou, ao menos, os dias que ele não acontecia.
Mas não conseguiu.
vivia em um inferno, rodeada de pessoas das quais ela não gostava, sendo obrigada a viver em locais que a desagradava. Nem sua família, nem seus poucos amigos, nem mesmo sua cidade pareciam agradáveis aos seus olhos cansados de tanta hipocrisia, de tanta gente maldosa, de tanto veneno impregnado no ar.

Sempre que se arrastava por entre os corredores daquela escola, sentia como se o ar fosse substituído por navalhas, que entravam em seus pulmões e os rasgavam em todos os mínimos centímetros, fazendo-a sangrar. Sentia pares de olhos enojados em suas costas, em seus cabelos, em suas roupas e livros. Ali não era diferente de sua casa — as pessoas eram igualmente malucas, igualmente nojentas e desagradáveis.
não fazia mínimo esforço para ser gentil, simpática, esbanjar um sorriso sequer. Ficava calada, rabiscando em sua mesa até o horário do intervalo — e, quando acontecia, rolava os olhos e se punha de pé, seguindo pelo mesmo caminho de mais cedo na manhã, sentando na arquibancada da quadra de baseball da escola. Mesmo nos dias frios, como hoje, ela ia ali fumar um cigarro, olhar o céu, ficar em silêncio ou com fones de ouvidos no máximo — o que, às vezes, a fazia perder o tempo, se esquecendo de voltar e assistir mais uma hora e meia de depressivos coitados falando sobre matérias que não interessavam nenhuma alma viva que perambulava naquela escola.
estava parada próxima a porta com batente vermelho da lanchonete, na ponta dos pés, com as mãos espalmadas na pequena janelinha retangular. Seus olhos passeavam pelas pessoas que comiam, conversavam, se isolavam, mas não encontraram quem queria.
Blaine era o que ela poderia chamar, com certa repulsa, de melhor amigo. Ele a fazia rir de vez em quando, embora, por muitas vezes, o máximo que fazia era irritá-la com seu gênio exagerado e extrovertido, até um pouco gay demais.
Ele era aquele tipo de gente que todo mundo quer ser amigo, que todo mundo conhece, pelo menos, por nome; que te ama demais, te abraça demais, te beija demais, te cutuca demais. Aquele tipo de pessoa que não se consegue passar mais de dez horas por dia, porque você pode ser acusado de assassinato. Mas era um amor; um gay louco adorável.
Ela se virou nos calcanhares, seguindo pelo corredor olhando para baixo, para a ponta preta de seus tênis. Atravessou o pátio principal, de granito, e foi até a área oeste do colégio, onde, coberto por neve, estava a quadra de baseball. O zelador estava com uma pá de cavar neve e resmungava sozinho enquanto tentava inutilmente tirar todo aquele gelo branco de cima da grama, porque, afinal, os garotos do time não podiam passar mais de duas semanas sem treinar para o campeonato mensal — um que eles nunca ganharam desde que o antigo treinador morreu, o senhor Collins.
tateou o bolso lateral de sua bolsa e retirou dali uma cartela de cigarros pretos, tomando um nos lábios segundos antes de acendê-lo e tragá-lo com vontade, expelindo aquele véu translúcido que se desdobrava para o céu esbranquiçado. Caminhou lentamente por cima da neve, olhando para baixo, levando o cigarro à boca de segundo em segundo, sem ao menos desintoxicar seus pulmões da primeira tragada.
Normalmente — ainda mais nos dias de frio — nenhum aluno ficava do lado de fora da escola, pelo menos não nos primeiros momentos do intervalo, quando estavam todos aglomerados na lanchonete, comendo aquele embrulho nojento que a cozinheira fazia, mas, estranhamente, naquele dia, ela se sentia sendo observada.
Arqueou os olhos do chão e mirou o zelador, que já havia sumido — ele era um velho esquizofrênico, com cabelos grisalhos bagunçados como os de um louco. Ninguém gostava dele. O som rouco de sua voz sumiu do ar, então tudo que conseguia escutar era sua própria respiração. Seu corpo inteiro queimava e um medo peculiar começou a infortunar seu peitoral, fazendo seu coração, aos poucos, bater mais forte. Ela deixou o cigarro fora dos lábios pelo segundo que franzia o cenho e virava-se levemente, encarando seus lados, esperando ver alguém.
Mas não havia nada além de neve e árvores secas.
Ela rolou seus olhos, tornando a tragar. Era idiota sentir-se incomodada quando pensava que alguém a observava. Isso acontecia o tempo todo naquelas paredes de tijolos marrons.
tornou a caminhar pelo mesmo caminho de todos os dias, virando os olhos para encarar as janelas do refeitório, acompanhando a silhueta escura dos alunos que se enfurnavam lá dentro, escondendo-se do frio.
Ela apreciava a ponta gelada de seus dedos e de seu nariz; gostava da sensação de respirar e seu vapor quente ser exalado por suas narinas, junto da fumaça do baseado que também saía por seus lábios rosados.
Quando chegou próximo o bastante da arquibancada, sentiu cheiro de ferrugem e desviou os olhos de alguém para olhar novamente para o chão.
Ela conhecia aquela imagem. O sangue vermelho ficava muito mais brilhante e chamativo quando esparramado no branco da neve, molhando-a nas extremidades, contornando os pequenos amontoados de gelo que se formavam quando muito frio.
O corpo do zelador estava caído de bruços, os braços esticados para os lados como se ele houvesse sido empurrado; seus olhos acinzentados estavam avermelhados, furados em pontos pretos, como se tivessem sido queimados ou explodidos. Havia um rasgo gigantesco em seu pescoço, que corria de um lado para o outro, como se, quem ou o quê que quisesse matá-lo, tivesse a intenção de degolá-lo. O sangue escorria de seu corte e encharcava a neve branca, quase tocando os pés de .
Ela levou o cigarro até a boca e franziu o cenho, inclinando suavemente a cabeça, como um cachorro confuso. Seu coração batia levemente acelerado contra seus tímpanos, mas ela ficou curiosa.
Ele estava em pé, ali, cantando como um doce maluco há poucos segundos. mal viu quem o atacou, mal o ouviu gritar.
O zelador simplesmente caiu morto, com o pescoço cortado e os olhos queimados.
levantou seus olhos para a floresta de bordos e carvalhos, encarando seus compridos troncos. Ali, no meio do nevoeiro, ela conseguiu ver a silhueta de um homem musculoso, com os punhos fechados. Ele caminhava em sua direção e parecia estar desnudo, então, subitamente, parou.
Ela deu um passo para trás de maneira instintiva, com certa repulsa. O perigo a atraía, a fazia sentir-se viva, mas algo a fazia querer recuar. Quando chegou próximo o bastante da luz, passou seus olhos no corpo daquele homem misterioso, que ainda tinha o rosto meio recoberto pelas sombras daquela manhã sem sol. Era musculoso, rijo e definido. Os punhos eram grossos, como seus dedos, e conseguia perceber os nós de seus dedos a ponto de explodirem de tão contraídos.
Ele estava com raiva.
achou melhor se virar e se afastar, mas ainda podia senti-lo observá-la com interesse e ódio.
Seus passos, aos poucos, se tornaram uma corrida. Ela empurrou a porta da escola com força, deixando seu cigarro cair no chão, e hesitou em gritar que o zelador estava morto.
Qualquer um ali pensaria que ela o matara, estúpidos como eram.
As pessoas que já estavam no corredor de entrada a encararam com uma curiosidade enojada. Entortavam suas bocas e seus olhos e riam, sentindo pena dela, de sua respiração descompassada e seu visível choque no olhar. Pareciam poder farejar seu medo, o barulho acelerado de seu coração.
mordeu os lábios, sem saber o que fazer. Virou-se novamente nos calcanhares e colocou-se na ponta dos pés, espalmando as mãos geladas no vidro, tentando voltar a ver o local que o zelador estava caído morto.
Mas tudo que acompanhou foi aquele mesmo corpo rijo puxando os calcanhares do zelador, criando um caminho de sangue na neve antes impecavelmente branca.

não conseguiu tirar aquela imagem das pálpebras pelo restante do dia. Ficou sentada, estática, durante maior parte de seu período escolar.
Estranha e pateticamente, ela estava com medo de sair, de ver aquele mesmo rastro de sangue ou de encontrar novamente aquele mesmo maníaco que matou o zelador e o levou para a floresta sabe-se lá para quê.
Ela se sentia ridícula por sentir medo.
Quando o sinal bateu, ela se colocou de pé em um pulo, puxando sua bolsa para correr até o lado de fora; ver se aquele rastro ainda estava ali, adentrar, quem sabe, a floresta em busca daquele homem. O máximo que poderia acontecer com ela, era morrer. Mas ela não se importava, não tinha nada a perder, ninguém ali sentiria sua falta.
Engoliu o medo e partiu, esbarrando nas pessoas, até o mesmo local que vira o zelador pela última vez. O rastro havia se tornado rosado pela água do gelo, até um pouco apagado pela chuva que teve minutos atrás. O cheiro ainda estava fresco, o vento empurrava seus cabelos para frente, para a floresta.
Ela subiu os olhos por aquele labirinto de árvores, hesitando, mordendo os lábios, segurando com força a alça de sua bolsa. Então, como um tapa em seu rosto, ela engoliu o medo e começou a caminhar.
Conseguia escutar, na beira de seu ouvido, o barulho das conversas paralelas que vinham de longe, do começo da escola. Mesmo sendo a poucos metros, pareciam milhas. Ela tinha os olhos fixos nos cantos, nervosa, esperando que um maníaco nu aparecesse para cortar seu pescoço, mas, ali dentro, tudo parecia estranhamente quieto. O estalido de seu tênis e sua respiração descompassada era tudo que soava em seus ouvidos, quando ignorava as conversas paralelas.
! — era Blaine. — , minha gostosa, o quê você está fazendo aí?
Ela se virou, tornando a correr para fora daquelas árvores. Atravessou o rastro de sangue e foi até seu amigo, que a encarava com os olhos piedosos, cansado de tentar entendê-la.
sorriu quando chegou próxima o bastante para sentir o calor que seu amigo exalava.
— Eu queria... — gesticulou com as mãos.
— Não interessa — ele sorriu, colocando a mão em seu ombro, puxando-a para um abraço lateral. — Sabe aquele enrustido que joga no time? — disse ele, encarando-a nos olhos. assentiu, sem menor interesse. — Ele vai dar uma festa hoje no apartamento dele.
— E daí? — o encarou com tédio, puxando as mangas do casaco para cobrir os dedos nus.
— Ele me chamou — Blaine rolou os olhos. — Você tem que ir comigo — choramingou, inclinando o lábio inferior para frente quando riu irônica, negando veemente com a cabeça.
— Você sabe que eu não vou nesse tipo deplorável de festa ver garotas se prostituindo por álcool — ela rolou os olhos.
— Mas eu vou estar lá! — protestou Blaine, batendo o pé. — Por favor, , você pode fazer uma coisa que eu te peça; só uma? Você nunca sai de casa e lá não tem nada de interessante para fazer numa sexta à noite — ela não podia negar que era verdade.
Por um segundo pensou em aceitar.
— Mas eu odeio essas pessoas e essas festas... — disse ela, se encolhendo no corpo do amigo, abraçando-o o peitoral, encostando a lateral do corpo em seu suéter listrado.
— Você odeia tudo, daí fica difícil te ver sorrir — ele falou sério, apertando-a em seu corpo. — Por favor... — choramingou de novo, fazendo-a rir nasalada.
— Tá — rolou os olhos. — Tudo bem, eu vou.

A noite invadiu seus pensamentos, recheando seus olhos com um tom mais escuro pela falta de claridade. Ela estava sentada a frente de sua penteadeira, terminando de esfumar os olhos em um preto puro e opaco. Levantou-se e, como sempre que queria fugir daquele lugar, abriu sua janela e pulou o batente, pisando no telhado, guiando-se para a árvore que crescia na parte de trás da casa de seus pais — eles, como sempre, estavam trancados um em cada cômodo e só tornariam a se ver quando fossem dormir; isso é, se fossem dormir juntos naquela noite.
Quando pisou seu coturno no piso de cimento da rua, sentiu o vento frio cortar sua pele em pequenas agulhadas, fazendo-a apertar as extremidades da costela para tentar se esquentar. Enterrou os dedos no suéter de lã preto, sentindo frio nas pernas cobertas apenas pelo fino tecido de uma calça jeans escura.
— Ideia idiota — resmungou para si mesma, começando a caminhar sozinha pela rua mal iluminada. — Blaine idiota — o amaldiçoou, rolando os olhos.
Ela não havia posto suas pulseiras hoje, tendo certeza que não tiraria seu suéter do corpo por momento algum, porque, por baixo, estava apenas uma regata justa e preta, de algodão frio.
Blaine havia combinado de buscá-la no parquinho de seu bairro, mas a rua estava deserta. Faltavam apenas dez minutos para as dez, o horário combinado, e sentia que poderia morrer de frio se ficasse muito tempo parada.
Ela acompanhou o brilho da lua iluminar o parquinho com quatro balanços e uma gangorra. Caminhou encolhida e sentou-se em um dos bancos, cruzando os braços e as pernas, sentindo o cabelo preto roçando na pele de seu busto, a pequena parte que ficava descoberta pelos últimos botões de seu suéter. Ela encarou as pedrinhas de cascalho e as empurrou com a ponta de seu coturno preto, escutando-as rolarem, chocando-se umas com as outras.
E, novamente, sentiu a mesma sensação de mais cedo, a de estar sendo observada. Arqueou a cabeça, olhando para frente com o cenho franzido. Quando percebeu um pequeno movimento, um vulto, ela se colocou de pé. As pedras rolaram ao seu lado, então ela se virou, alarmada.
— Quem está aí? — perguntou para a escuridão, sentindo-se patética enquanto gritava.
Rolaram outra vez, agora atrás de seu corpo.
Ela sentiu o coração palpitar forte contra o peito, mordendo os lábios, apertando as mãos.
Era uma figura ridícula, de fato. Uma garota alta e magra, apavorada por estar ficando alucinada com barulhos de pedra de cascalho.
— Que porra — ela tateou o bolso traseiro da calça e tomou seu celular em mãos, começando a digitar uma mensagem para Blaine, dizendo que não iria caso ele não aparecesse em menos de dois segundos.
Outra vez o barulho das pedras a fez levantar a cabeça, encarando o escuro. Seu corpo estava arrepiado de medo e a manga de seu suéter escorregou por seu pulso, fazendo suas cicatrizes se exporem.
— Elas são lindas — uma voz grossa sussurrou em seu ouvido, fazendo-a dar um pulo para trás quando sentiu o hálito quente daquela pessoa sobrar em sua nuca.
Com o baque, seu celular caiu no chão sem que ela conseguisse mandar a mensagem.
Quando passou seus olhos no homem, percebeu como era alto, como seus ombros eram largos, seu corpo inteiro rijo. Estava com poucas roupas para uma noite tão fria — uma blusa preta e uma calça jeans comum — e a encarava com certo interesse, fitando-a profundamente com os olhos azuis escurecidos por causa da falta de claridade.
Ele tinha uma beleza angelical que a fez perder parte do fôlego, tanto pelo medo quanto pela peculiar excitação que sentiu pelo susto.
O homem riu, deixando um sorriso irônico nos lábios finos e vermelhos que pareciam brilhar no escuro, assim como seus olhos.
se perdeu naqueles olhos, completamente hipnotizada, sem conseguir se mover.
— Suas cicatrizes — ele tornou a repetir, apontando com os olhos para o pulso descoberto dela. , em um momento de lucidez, puxou as barras das mangas até esconder a palma de sua mão. — Ficam cristalinas sob o brilho da lua — ele sorriu novamente. — Perdoe-me caso te assustei — disse, dando um passo para frente. permaneceu estática, com o coração batendo forte no peito.
Ele soltou uma risada nasalada quando farejou seu medo, abaixando os olhos para seu celular aceso, jogado no chão. Ele apontou com o indicador — e então conseguiu ouvir algo que não fosse a batida de seu coração ou o som alto de sua respiração.
— Está tocando — disse ele, tornando a encará-la. — Você não vai atender?
recuperou a sanidade por um segundo, dando um passo para trás enquanto molhava os lábios e se abaixava para pegar o aparelho e ler o nome de seu amigo piscando no visor.
Durante o tempo que se abaixou, sentiu o homem a encarar com extremo interesse, delineando suas curvas com os olhos, saboreando os pedaços de pele que apareciam enquanto ela se esticava por aquele segundo.
Onde você está? — indagou Blaine, com a voz abafada pela música e pelos gritos.
— Onde você está? — corrigiu , franzindo o cenho.
O homem fechou seus olhos e sorriu para a noite quando a escutou falar; o calor correu por seu corpo.
Estou na festa, ! — ele gritou. O homem conseguiu escutá-lo e soltou outra risada, fazendo a garota se virar para encará-lo. — Por que você ainda não está aqui?
— Porque nós combinamos que você me buscaria aqui em casa! — ela rolou os olhos, fechando-os quando travou o maxilar. — Eu não acredito que você não se lembrou, Blaine — ela tornou a abrir seus olhos, colocando a mão esquerda na cintura.
Sério? — ele riu. — Bem, eu posso ir aí e...
— Não — ela respirou fundo. — Eu não vou mais nessa merda de festa. Eu não quero mais ir.
Ah, ... — cantarolou e depois riu. — Não seja mal-humorada...
— Eu sou — ela rosnou. — E muito. Boa noite — e desligou.
O homem permanecia parado, encarando-a com interesse. Quando ela se virou para ele, abriu um sorriso debochado e se virou nos calcanhares para voltar para casa, mas ele a segurou no pulso, fazendo-a parar.
O toque a fez ficar quente, com medo, esperando seu próximo passo. Virou o pescoço e encarou aqueles olhos demoníacos, franzindo suavemente o cenho.
— Caso você queira — começou baixo, molhando os lábios, ainda segurando-a — eu posso te levar. Estou indo para a mesma festa que você.


02.

I don't know what you did boy, but you had it.

— Eu não te conheço — a garota olhou incrédula para o homem que continuava a segurar seu fino braço. — E eu nem sei o seu nome. Também não faço a mínima questão de ir a essa festa estúpida.
— Meu nome é — ele sussurrou, libertando o braço de . — Confie em mim, essa vai ser a melhor festa da sua vida — ele cerrou os olhos com um sorriso sujo brotando no canto de seus lábios, ergueu sua mão esperando alguma reação de .
não queria ir, mas alguma coisa naquele homem a deixava curiosa. Mas era como se um ímã tivesse em suas mãos que a fez segurar as de . Ela sabia que poderia ser estuprada ou assassinada, mas ela simplesmente adorava a adrenalina que corria em suas veias por conta do perigo.
guiou até o pequeno caminho entre a praça e seu carro. se impressionou quando viu aquele homem, aparentemente normal, destrancar as portas de um carro luxuoso que ela não conseguiu identificar o tipo. Nunca ligou para automóveis, mas aquele era de tirar o fôlego de qualquer um. Ela mesma abriu a porta, sem esperar que ele o fizesse para ela. O interior do carro era todo feito de um tipo de couro bege, que a fazia deslizar quando passava suas mãos alvas sobre o tecido.
— Está com fome, ? — perguntou inocentemente, tentando quebrar o silêncio matador do ambiente. Nem o ronco do motor se ouvia.
— Como você sabe o meu nome? — Ela franziu a testa, relembrando toda a pequena conversa que teve com ele, sem se recordar de ter dito seu nome.
— Seu amigo disse no telefone — ele respondeu sem tirar os olhos da estrada, molhando os lábios sentindo o olhar fixo de em seu rosto despreocupado.
— Não estou com fome — respondeu finalmente, tirando seus olhos do rosto de e encarando o caminho até a festa.
O silêncio era contínuo, percebeu que ele não era um estuprador quando parou seu carro em frente à casa onde visivelmente acontecia uma festa. A porta estava aberta e pelas janelas ela via silhuetas dançantes, junto com a música altíssima. franziu a sobrancelha, se perguntando milhares de vezes o por quê de ter aceitado o convite.
— Você não gosta de festas? — perguntou, percebendo o desconforto da garota.
— Não é o meu tipo de festa — ela suspirou. — Obrigada pela carona, de qualquer forma.
— Não tem de quê.
abriu a porta do carro com sua mão deslizante até o bolso de trás de sua calça jeans escura, a procura de seu celular. Ela entrou na casa onde vários adolescentes bêbados se divertiam irritantemente digitando uma mensagem para Blaine.
”Cheguei. Onde você está?” Ela esperou por uma resposta sentada no banco de couro barato que se encontrava no canto da sala, onde pessoas dançavam e se beijavam sem a mínima vergonha ao lado dela. ”No quarto dos pais do Alo, sobe rápido!” Ela rolou os olhos e bufou, atravessando a festa e avistando entrar e cumprimentar os amigos. Ela ignorou, vendo que ele não a notaria e subiu as escadas desviando das pessoas.
— Olha quem está aqui! — Blaine abriu os braços. Ele estava rodeado de outros garotos e garotas, alguns sentados no chão, outros em pé e ele sentado em cima da cama de casal junto com outros amigos. — Decidiu vir por quê?
— Porque me disseram que seria legal — ela caminhou até a cama, podendo agora ver o que estavam fazendo. Dois sacos grandes ainda fechados e recheados de ervas verdes estavam sobre a cama branca, uma caixa de isopor completamente cheia de cerveja estava apoiada ao lado de um dos garotos; cetamina, cocaína, heroína, maconha, êxtase... Todos os tipos de droga estavam espalhadas por cima da cama.
— Sirva-se — um garoto pequeno dos olhos azuis abriu a caixa e jogou uma cerveja para a garota, que a pegou facilmente.
abriu a latinha e tomou um gole longo, sentindo o gelado da bebida percorrer toda a sua garganta, até chegar no estômago. Ela observou mais um pouquinho o que estava em cima da cama e deixou que um pequeno sorriso brotasse no canto de seus lábios.
— O que estamos fumando? — Ela se sentou com as pernas cruzadas ao lado de Blaine, que pousou sua mão no ombro da garota, dando um beijo gelado e estalado na bochecha alva dela.
— Tudo o que você quiser, gostosa — ele sorriu, completamente bêbado. — Me beija agora.
— Opa, sexo errado — gargalhou, tratando de tirar as mãos de Blaine dela, se afastando até que achasse uma distância segura. Ela deu outro gole, enquanto pensava no que fumar primeiro.
pegou o saco onde continha ervas, o abriu com cuidado enquanto sentia o cheiro dominar suas narinas. Logo tratou de fazer o seu próprio baseado, o que não demorou muito, já que já tinha experiência em fazê-los. Aliviada, ela finalmente pode acender o pequeno tubo branco, inspirando toda aquela erva que a fazia se sentir tão bem. Ela sentiu a fumaça percorrer as paredes de sua garganta, fazendo cócegas, atiçando-a a sorrir. Ela soltou a fumaça cinza escura, vendo Blaine e seus amigos sorrirem, vendo que não se tratava de uma amadora.
— Quem é o próximo? — perguntou, com a voz diferente, mais grave que o normal.
Blaine pegou o pequeno objeto de sua mão e repetiu o que a garota fez, passando para o resto da roda soltando uma fumaça branca que invadia o ambiente. Enquanto seu cigarro milimetricamente bem feito não chegava em seus lábios novamente, ela abria o pequeno saco que continha uma espécie de pó branco. Ela molhou seu dedo indicador em sua língua e prensou seu dedo contra o pó de cocaína e voltou a ponta de seu dedo branco para a sua boca, sentindo o gosto delicioso daquilo dentro de si e o que tal coisa fazia a seu organismo.
Cuidadosamente, ela procurou uma superfície plana, pegando seu baseado de volta.
— Façam os de vocês — ela reclamou, o segurando entre os dedos e saindo da cama. Procurando com os olhos algum lugar em que possa apoiar-se, encontrou uma cabeceira de madeira, onde deixou que derramasse uma quantidade considerável daquele pó branco. Ela olhou para os garotos e devolveu o resto a eles. — Todo seu.
Ela espalhou a cocaína pela mesa, e com sua carteira de identidade, começou a fazer pequenas carreiras que cresciam aos poucos. Cuidadosamente, ela tampou uma de suas narinas e começou a sugar o pó, duas carreiras de uma vez. Ela sentiu seu nariz queimar por dentro e seguindo por sua garganta, e seu cérebro delirar. Ela sorriu com a sensação incrível que aquilo lhe dava e tragou mais um pouco do seu cigarro, sentindo todo o seu organismo ir à loucura. Ela gargalhou, sentindo seus olhos se esbugalharem.
— Alguém trouxe o colírio? — Ela se virou para a cama, sorrindo para os garotos que nem sequer sabia o nome.
— Jack trouxe — Blaine apontou para um moreno que se deliciava em sua cetamina.
aliviou; pelo menos ela não teria de andar por aí literalmente estampando em sua cara que havia tido uma ótima noite.
Ela voltou para suas carreiras, seu beck e sua cerveja até que todos estivessem acabado. Ela se sentia feliz, mas não feliz o suficiente. Ela era forte, e para ficar completamente pirada, demoraria muitos cigarros e mais alguns saquinhos de cocaína, sem contar as doses de vodca.
— Vamos jogar verdade ou consequência! — Ela gritou, gargalhando. Se não estava feliz o suficiente, pelo menos fingiria que sim.
— Já tenho a garrafa! — Jack gritou de volta, saindo da cama e segurando uma garrafa de vidro em uma das mãos.
Os cinco garotos saíram da cama, se sentando em um círculo mal feito no chão, deixando espaço para , que se sentou logo que Jack começou a rodar a garrafa.
Blaine.
— Verdade ou consequência, Blaine? — Jack sorriu, esperando uma resposta rápida.
— Hmm... — O garoto pensou por alguns instantes, deixando vários dos garotos impaciente. — Consequência!
— Eu te desafio a me beijar — ele cerrou os olhos. — Aqui e agora.
Blaine não hesitou, simplesmente atravessou a roda engatinhando até onde Jack estava, selando seus lábios masculinos de uma maneira violenta. , mesmo sem admitir para si mesma, gostou de tal cena. Ela sorriu e bateu palma, dando início a uma grande sessão de gritos masculinos.
Blaine voltou para o seu lugar e rodou a garrafa. .
— Verdade ou conse...
— Verdade — ela sibilou.
Blaine refletiu por alguns longos momentos. observou um sorriso sujo nascer nos lábios do amigo, não gostando nada disso, já sabia o que estava por vir...
— ele suspirou, rindo —, você gosta de um tapa gostoso na hora da transa?
— Blaine! — a garota o olhou, incrédula.
A porta se abriu e todos olharam para identificar quem interrompera um momento tão crucial. Era , com uma cerveja em mãos, sentindo o cheiro delicioso de vários tipos de drogas diferentes de uma vez só já no andar de baixo.
! E aí, cara — os garotos cumprimentaram o amigo, que sorriu e acenou com a cabeça, mais interessado no que estavam fazendo.
— Estão jogando verdade ou consequência? — Ele zombou, como se já não soubesse.
— Junte-se a nós — sussurrou, encarando o rosto mais alto de , que não tirava os olhos dela.
— Cala a boca, você não vai se safar — Blaine interrompeu. — Você gosta ou não de uma boa porrada na hora da transa? — Ele perguntou impaciente, fazendo ficar completamente vermelha.
— Eu... — Ela gaguejou, olhando para Blaine. — Eu... Adoro.
Todos riram, não conseguiu conter todos os pensamentos sujos que invadiram sua mente no momento em que pronunciou tais palavras. Ele simplesmente deixou sua imaginação fluir, sem se importar com nada, até o momento em que percebeu que sua excitação estaria à mostra em poucos minutos se ele não se conseguisse se conter.
— John, beije o Mike — a voz despreocupada de soou na mente de , que já havia se perdido completamente.
Os garotos começaram a se beijar repetidamente, deixando desconfortável desta vez, quando Blaine beijou Jack involuntariamente, e ela odiou aquela pequena orgia que o jogo tinha virado.
— Eu vou tomar um ar — ela disse baixo, tendo certeza que nenhum deles a ouviriam mesmo se gritasse.
Ela se levantou, caminhando em passos rápidos para fora do quarto, sem olhar para . Ele sabia as intenções dela.
a seguiu a casa inteira, até que ela conseguiu finalmente achar o jardim e respirar um ar puro de cecê e adolescentes excitados.
— Achou? — sussurrou atrás da garota, que fingia não saber que ele estava a seguindo o tempo todo.
Ela sorriu ao sentir a respiração daquele homem pouco mais alto contra sua pele nua da nuca.
— O quê? — Ela se virou, encarando o rosto de tão perigosamente perto dela.
— Um lugar onde podemos ficar a sós — ele sorriu de forma suja, tirando uma mecha do rosto pálido de com a ponta do indicador. — Eu, particularmente, prefiro o quarto.
— Eu não sou esse tipo de garota — disse, sendo contrariada pelo sorriso teimoso que insistiu em aparecer em seus lábios. Era como se ele soltasse veneno pelos poros, entorpecendo-a em interesse.
— Não disse que seria — , sentindo os arrepios de , ouvindo seu coração acelerar a cada toque dele, deixou que suas mãos deslizassem pela cintura da garota, roçando seus corpos e a mantendo o mais perto possível. — Está esperando o que para me deixar te dar aquela porrada que você tanto gosta?
— Quanta ousadia! — o repudiou, mesmo que, quando imaginava aquelas mãos grossas apertando e arranhando com força seu corpo suado, ela era inteira tomada pelo tesão. — Você não acha que está sendo um pouco grosseiro demais? — ela o encarou com uma das sobrancelhas arqueadas, tentando relutar, vendo-o, em resposta, sorrir e negar com a cabeça. E ela também não ia admitir que aquela forma direta com que ele a abordou só a deixou mais interessada ainda.
— Você gosta. Ou estou errado? — podia sentir o cheiro da excitação de , que o entorpecia como o gosto de sangue em seus lábios finos. Ele adorava deixar mulheres belas como ela daquele jeito, quando não estava fazendo-as sentir assim a força.
não disse mais nada, deixou que tomasse conta de seus lábios, deixou que sua língua macia brincasse com a dela, deixou os braços dele passearem pelas suas costas, e se permitiu que suas mãos fossem diretamente para a nuca do homem. Ele podia sentir o gosto doce dela, mas não apenas o gosto físico, ele conseguia sentir o gosto amargo de sua alma. Já ela, sentia apenas o físico dele, um pouco amargo pela cerveja e naturalmente gelado.
— Eu tenho um lugar — ele quebrou aquele beijo tão crucial. — Venha comigo.
entrelaçou seus dedos nos de , ele não sentia necessidade daquilo, mas sabia que era o que elas gostavam.
Eles atravessaram a casa mais uma vez, subiram as escadas desviando dos adolescentes e seguiram pelo corredor agora estranhamente vazio. segurou contra a parede e tomou seus lábios novamente, pressionando seu corpo contra o dela, agarrando as pontas do suéter inconveniente da garota. Ele, sem pensar duas vezes, o levantou e passou pela cabeça dela, jogando-o no chão e revelando todas as cicatrizes escondidas. Ele segurou os pulsos de contra a parede e deixou que seu beijo se estendesse pelo pescoço dela, dando leves chupões pela área macia do corpo alvo da morena, fazendo-a se arrepiar. Tomando seus lábios novamente, soltou as mãos de , a deixando livre para tocar cada canto irritantemente coberto do corpo dele.
abriu a porta do quarto com um chute, ainda com os lábios presos nos de , beijando-a com tamanha intensidade que a tirava o ar em menos de um segundo. Ela arfava contra seus lábios, apertando os bíceps enquanto sentia-se ser violentamente puxada contra o corpo excitado e extremamente quente dele.
Adentraram o quarto e não abriram os olhos para encará-lo. pressionou o corpo dela contra uma parede, passando as mãos pela lateral de seu curvilíneo corpo até chegar às suas coxas, onde as puxou para cima de modo que seus quadris estivessem presos no mesmo nível. Quando não conseguiu mais suportar o ardor em seus pulmões, desgrudou suas bocas e empurrou o pescoço para cima enquanto arranhava os ombros descobertos dele, que passou a beijar ferozmente seu pescoço, mordendo-o de forma a machucar — uma dor que a fazia delirar de prazer. Os gemidos que saíam de seus lábios opacos e palpitantes eram tão saborosos aos ouvidos dele que o cegava em pura luxúria, despertando seu lado animal.
soltou um gemido impaciente quando sentiu o membro palpitar, o deleite crescendo em uma linha por seu corpo, eriçando os pelos. Apertou com força as coxas dela, pressionando seus quadris, fazendo-a gemer quando sentiu o volume dele roçando em sua intimidade úmida, quente, que derretia desejo.
Entrelaçando suas pernas na cintura de , permitiu que ele desse alguns passos para trás e a jogasse em cima da cama. Ela abriu seus olhos azuis pelo segundo que o via deitando-se entre suas pernas, beijando suas clavículas, mordendo seu busto. Ele tinha as mãos espalmadas no lençol preto abaixo de seus corpos e, conforme seus lábios e dentes baixavam pelo corpo dela, ele levou uma das mãos para sua regata, puxando-a de seu corpo e jogando-a no chão com certa brutalidade. Não durou um segundo para que tornasse a beijar, agora, a curva de seu seio encoberto pelo sutiã, mordendo-o e chupando-o enquanto passava o áspero da palma da mão na pele aveludada e alva dela, arranhando-a com suas unhas curtas, descendo até o cós de sua calça jeans.
nunca se sentiu tão excitada em toda sua vida. Nunca havia delirado tanto com os toques de alguém como delirava com os dele, como simples movimentos de seus lábios, dentes e língua contra a fina camada de nervos em sua pele. Os gemidos que saíam de seus lábios eram tão incontroláveis quanto o deleite que crescia no alto de sua intimidade e jorrava endorfina para o mínimo de seus músculos, fazendo-a ansiar pelo próximo passo dele, fazendo-a enlouquecer pelos poucos segundos que se estendiam até que ele o fizesse.
segurou as extremidades das costelas de e a puxou para cima de seu colo, fazendo-a sentar-se ali. Movimentando as mãos para suas costas, desatou o fecho de seu sutiã e tornou a beijar seu pescoço, sentindo o fluxo forte do sangue dela correndo pela pele de seus lábios quentes. Ele a mordeu, arranhando seus dentes, ofegando contra sua pele. Passou a ponta dos dedos pelo mesmo primeiro trajeto, até chegar ao volume perfeito por cima do preto daquele bojo rendado; acariciou-os, descendo a boca para seus ombros, beijando-os, mordiscando a alça para puxá-la, acompanhando-a escorregar até metade de seu bíceps; tocando-a com a ponta dos dedos, a puxou, liberando o seio duro e excitado. O encarou por certo tempo, deleitando-se com o arrepiado de seu mamilo, então aproximou o rosto e o tomou nos lábios, sentindo-a rebolar por cima de seu membro duro apenas para torturá-lo.
Aquilo o fez sorrir, soprando uma risada no úmido de sua pele. Ela apertou as unhas na pele nua de suas costas, arranhando-a com força até entrelaçá-los nos cabelos de sua nuca, puxando-o o rosto para que seus rostos estivessem nivelados e suas bocas pudessem se tomar em uma só.
Quando encarou o rosto dele, notou pequenos caminhos de veias roxas saltadas abaixo de seus cílios inferiores, criando caminhos disformes. O azul cristalino de seus olhos se tornou ainda mais felino e mais demoníaco quando ele a olhava, quando ele baixava o rosto para podê-la ver semi-nua por cima dele, rebolando contra seu membro para vê-lo ainda mais excitado, querendo satisfazê-lo.
Ela não sentiu medo quando seus olhos se encontraram em um pequeno contato visual. Pelo contrário, sentiu algo explodir dentro dela, algo deliciosamente perigoso que a excitava a um ponto impossível.
impulsionou seus lábios novamente, segurando a nuca para que ela não a levasse para trás com a força que suas bocas foram pressionadas; ele a beijava com intensidade, arrancando o ar dela. Suas línguas travavam uma batalha tão infinita quanto o céu e o inferno; seus lábios eram mordiscados com força, arranhados por dentes; suas mãos se pressionavam nos corpos, puxando-os para perto, atiçando-os em pontos impossíveis, fazendo o calor brotar em seus poros, criando suor em suas têmporas.
O quarto estava infernalmente quente.
deitou-se suavemente quando o sentiu impulsionar seu corpo para trás. Desgrudou seus lábios quando ele desejou, sentindo-o descê-los pelo meio de seu corpo, mordendo-o e sugando-o a fim de sentir seu gosto. Ele passou novamente pelos seios, deleitando-se ali — passou a mão em seu volume, arranhando-o; segurou as extremidades dos fechos e desgrudou sua língua dali apenas pelo segundo que o jogava para longe de seus corpos. Quando baixou os lábios por toda a pele de sua barriga, encontrou o cós de sua calça. O abriu com tamanha ferocidade, fazendo-a arquear o quadril para ajudá-lo a retirar as duas últimas peças que o impedia de ver o que, realmente, ele causou nela.
A intimidade palpitava avermelhada e úmida. Ele passou os olhos por ali, aquele simples pedaço de carne, e sorriu por um segundo, antes de também abocanhá-la. Movimentava sua língua de forma extremamente rápida, pressionando seu clitóris, e, subindo as mãos pelo interior de sua coxa, a tocou com a ponta dos dedos, penetrando-a em rápidos movimentos de vai-e-vem.
tinha os cabelos ondulados estirados como um leque para o lado, sentindo os fios grudarem-se a pele de seu ombro conforme ela sentia o corpo ser impulsionado para cima em um choque de prazer. Soltava gemidos puros, incontroláveis, deliciosos para os ouvidos de , que não cessava seus movimentos, tanto com a língua quanto com os dedos, por um segundo sequer. Sempre que ela sentia a respiração dele chocando-se com a pele quente dela, era como se aquele ar se convertesse para raios, fazendo-a sentir a deliciosa dor da excitação que ele causava nela. Ele movia seus dedos para cima e para baixo quando dentro dela, atiçando-a pontos inimagináveis; movia a língua, mordiscava seu clitóris com certa delicadeza bruta, chupando-o pelos segundos seguintes. Com a mão livre, ele segurou novamente seu seio farto, deleitando-se com o movimento que ele fazia, para cima e para baixo, acompanhando a respiração descompassada dela.
praticamente virou seus olhos em prazer quando impulsionou o torso para cima e o pescoço para trás, soltando um alto gemido com o orgasmo que se prolongou, forte e intenso de uma forma que ela nunca sentira antes. Subia em espirais, elevando-a, começando na sola dos pés até o mínimo fio de seu cabelo, arrepiando seu corpo, explodindo suas células em pura endorfina.
conseguia senti-la palpitando, contraindo a intimidade em espasmos incontroláveis. Ele sorriu, subindo novamente o corpo pelo dela, roçando seu peitoral em seus mamilos duros, sentindo-se ainda mais excitado quando, com os rostos novamente na mesma altura, ele encarou seu deleite transbordar nos olhos. Impulsionou sua boca contra a dela novamente em algo animalesco, roçando seus narizes, fazendo-a encaixar as pernas em torno de seu quadril para pressioná-lo sob sua intimidade sensível, sentindo-o roçar o membro duro ali, em um único movimento de vai-e-vem, fazendo-a rebolar. O áspero da calça jeans dele contra sua pele a fazia arrepiar.
Ela impulsionou o corpo por cima do dele, fazendo-o deitar de barriga para cima, com as mãos espalmadas em suas coxas; ela baixou o tronco para beijá-lo novamente, agora com as mãos mais livres para tocá-lo aonde quisesse — desceu-as por todo seu abdome rijo, tocando o zíper de sua calça jeans. Libertando-a com certa dificuldade — o que os fez rir —, tocou o membro rígido por cima do tecido preto de sua boxer, acariciando-o até o períneo, subindo com a mesma pressão até o topo da glande, sentindo-o impulsionar o quadril para cima.
mordeu o lábio inferior de com extrema força quando sentiu a excitação palpitar novamente. Então, subitamente, sentiu o gosto de sangue na boca.
Aquilo o deixou completamente alucinado. Apertou com força a pele da coxa dela, sentindo-a tremer em dor, e chupou seu lábio inferior com o intuito de sugar seu sangue, passando a língua por cima do machucado, gemendo com aquele sabor.
puxou o rosto, mordendo seu lábio, encarando-o com os lábios vermelhos e molhados.
impulsionou o corpo para cima novamente e segurou as extremidades de seu pescoço, por cima do cabelo, beijando-a novamente, de forma um pouco mais suave.
Ela não conseguiu se controlar quando sentiu a intimidade palpitar em ansiedade. Tornou a tatear o cós preto de sua boxer e a puxou com força, arranhando sua pele, enquanto liberava seu membro duro, sentindo-o roçando no interior de sua coxa. A superfície lisa e quente escorregava naquela área, indo para cima e para baixo enquanto ele se movimentava suavemente, completamente extasiado com o gosto de sangue daquele beijo. Passava a língua em seu lábio cortado, o chupava, o mordiscava, ouvindo-a gemer em um misto de medo e prazer, imenso prazer.
tocou novamente a superfície de seu membro, mas agora para fazê-lo penetrá-la. Sentiu-o escorregar pelo úmido de sua intimidade de forma extremamente torturante, fazendo-a arfar. Quando sentiu-o completamente dentro dela, impulsionou o quadril para baixo e para cima, sentindo-a, deleitando-se. Ela rebolava e, conforme ele investia, ela acompanhava, sincronizando seus movimentos para que se tornassem ainda mais intensos e fundos.
Conforme aquele curto minuto se estendeu, eles já se viam ansiados por mais. apertou os fios negros dos cabelos de e a empurrou para trás, fazendo-a ficar com as pernas apertadas em sua lombar.
Agora, no controle, baixou as mãos pelos braços dela, segurando seus pulsos, trazendo-os para cima de sua cabeça com extrema agilidade e brutalidade, apertando seus dedos ali. Continuou beijando seus lábios, sentindo-a levar o rosto para trás, afundando-o no travesseiro, graças a força que ele investia em seus lábios. Quando movimentou-se por dentro dela, sentiu o choque de seus corpos, de seus quadris, acompanhando-a ir para cima, escorregando pelo lençol. Então repetiu, ainda mais fundo, ainda mais forte, com ainda mais vontade. Ele a sentia movimentando os pulsos, com vontade de tirá-los dali para poder arranhar a pele de suas costas, mas não permitia que se movessem. Ela gemeu com força quando sentiu o corpo inteiro se consumindo de prazer, desgrudando suas bocas para poder respirar. desceu seus lábios pelo maxilar dela, mordendo-o e chupando-o até chegar a base de sua orelha, deixando-se ofegar ali, respirando ali, sentindo o doce cheiro que seu corpo exalava quando excitado. Se movimentava de forma rápida, sentindo-a cada vez mais fundo, mais consumida pelo êxtase, derretida pelo veneno da luxúria nas entranhas. Aquela dor pelo seu tamanho dentro dela a deixava deliciosamente dolorida em sua intimidade, que a partir de certas investidas, a liberou de tal dor. Ela gostava daquela dor.
Quando a libertou os pulsos, tocou-a na costela e a posicionou por cima dele, sentindo-a, segundos após, se movimentar com rapidez em seu colo, roçando seus seios no peitoral úmido dele. movia seu quadril para frente e para trás, sentindo-o acompanhá-la, segurando sua cintura com força para puxá-la quando se afastava, roçando suas peles suadas, ameaçando criar faísca com aquele forte contato. Quando rebolava, sentia-o soltar o ar com mais força, transformando-o em um gemido, e não conseguia controlar a vontade de ter suas bocas grudadas novamente em algo animalesco.
, com uma das mãos, a segurava na cintura, acompanhando seus movimentos, enquanto a outra se encaixava em seus cabelos, com o polegar próximo de sua mandíbula, segurando-a nos cabelos para que seus rostos não se separassem.
Quando a sentiu contrair a intimidade novamente, apertando seu membro, ele abriu os olhos para acompanhá-la morder os lábios com força e franzir suavemente o cenho enquanto gemia, movimentando-se com mais força em cima dele, apertando-o os cabelos da nuca.
Ele sentiu aquele corte de prazer em sua barriga, deleitando-se com o orgasmo dela.
abriu um sorriso sujo quando ela o encarou, arfando. Ele segurou seus cabelos, suas coxas, e a posicionou de quatro. Encarou a curva de seu quadril, de sua cintura, e não hesitou em passar a mão ali, subindo-a pela parte interna de sua coxa, roçando a lateral dos dedos em sua intimidade vermelha, pulsante, até encontrar com as costas.
olhou para trás, mordendo os lábios, e fechou os olhos com força quando ele deu sua primeira investida, gemendo alto, ainda sensível por aquele segundo orgasmo intenso. subiu a mão esquerda até encontrar seus cabelos compridos, ondulados e úmidos, entrelaçando seus dedos ali, puxando-a para que ficasse com o rosto arqueado, acompanhando com os olhos o rebolado dela contra seu membro duro; com a mão direita, a arranhou a lateral de seu corpo e tomou seu seio duro com a mão, acariciando seu mamilo excitado com a ponta dos dedos. Permaneceu movendo-se com força, chocando seus corpos, arfando e franzindo o cenho conforme sentia o corpo exalando endorfina e excitação, fazendo o suor nascer em sua pele, escorregando lentamente por sua têmpora. Ele sentia que aquela bomba logo explodiria dentro dele, entorpecendo-o e extasiando-o.
impulsionou o quadril para trás com mais força, sentindo a mão dele apertando sua costela, arranhando a pele abaixo de seu seio, fazendo-a arder. Ela sorriu entorpecida, deliciando-se com a dor. puxou os cabelos de , fazendo-a gemer enquanto arfava, obrigando-a a esticar os dedos para continuar com as mãos apoiadas no colchão. Ela impulsionou o peito para cima de modo que encostasse o alto de suas costas no peitoral dele, empinando o quadril para que ele continuasse investindo com força, sem separar suas excitações. tocou, com a ponta dos dedos, seu maxilar, soltando seus cabelos para segurar com força em sua cintura, arranhando-a e apertando-a conforme sentia os espasmos correrem por suas veias. Soltando o ar pela boca, ele encaixou o rosto no pescoço dela, respirando seu cheiro, mordendo sua pele. espalmou uma das mãos na lombar dele, empurrando-o sempre que o sentia se afastar para penetrá-la novamente; ela impulsionou sua cabeça para trás, encostando-a no ombro dele, sentindo-a beijá-la.
Quando abriu os olhos e virou suavemente o queixo para encará-lo, percebeu os caminhos disformes das veias saltadas abaixo de seus olhos, as pupilas aumentando, consumindo seus olhos.
Quando tentou gritar, soltou um gemido alto, sentindo os dedos dele em movimentos circulares em cima de seu clitóris. Impulsionou o quadril contra o dele, sentindo sua lombar arder em dor de ficar daquela forma; apertou os cabelos dela de novo, empurrando-a para que ficasse de quatro novamente. Guiou-se para o lado da cama, ficando em pé, absorvendo todos os mínimos espaços de pele do corpo curvilíneo arrepiado e excitado de , que respirava com dificuldade, encarando-o deleitada em sua própria dor — nos locais que antes se encontraram com os dedos dele, com suas unhas ou até mesmo seus lábios.
Ela o encarou excitado, suado, respirando com a boca vermelha entreaberta. Encarou as veias abaixo de seus olhos, o brilho demoníaco de seu olhar. E tudo que deveria assustá-la a deixava ainda mais excitada.
Ela se colocou ajoelhada na cama, arrastando a pele por cima do lençol enquanto se aproximava dele, sem baixar os olhos daquela veias roxas, vacilando entre encará-las ou perder-se no vermelho escuro de seus olhos, no rijo de seu corpo, no palpitante de sua excitação.
Quando próxima o bastante para tocá-lo, ela pousou as unhas nos ilíacos saltados da pele dele, arranhando-o enquanto guiava as mãos para seu membro, sentindo-o úmido e quente; ela iniciou movimentos para cima e para baixo, aplicando pressão, usando as duas mãos, descendo-as até seu períneo, acariciando-o a pele das coxas, escutando-o ofegar baixo contra seus lábios, roçando seus narizes. Ele fechou seus olhos, jogando a cabeça para trás, fazendo-a encostar os lábios no pescoço dele, mordendo-o com força enquanto criava um caminho pecaminoso por cima de sua pele, descendo os dentes e os lábios até sua virilha.
De quatro, com o quadril empinado, sentindo as mãos dele em seu pescoço, ela não conseguia se ver de forma mais pecaminosamente sedutora. Ela adorava a sensação que pairava em suas veias quando enlouquecia um homem.
Com a respiração tocando a pele dele, guiou os lábios para o topo da glande de seu membro rígido, sugando-a, passando a língua em toda sua superfície, sentindo-a lisa e palpitante em seus lábios vermelhos. Com um movimento forte com a mão, ela encostou a lateral dos dedos na boca e acompanhou-a descendo, sugando todo seu membro de uma única vez. Ela o ouviu soltar um gemido baixo, mordendo seus lábios, olhando-a enquanto ela se movimentava, tanto com o corpo quanto com a boca e as mãos. Sentia ele a acariciando as costas, arranhando-a quando sentia um espasmo de prazer beirando suas veias, ameaçando explodi-las. acompanhava os movimentos dela, segurando-a nos cabelos com uma das mãos, movendo o quadril para intensificar seus movimentos, tornando-se mais profundos.
não se importava se ele a guiava; o importante era satisfazê-lo da forma que ele quisesse.
Quando abriu os olhos, acompanhou as curvas que o corpo daquela garota submissa a ele, rendendo-se aos seus deliciosos pecados. Acompanhou-a se mover, sentiu o doce quente de seus lábios escorregando por seu membro, subindo, beijando sua glande, acariciando seu períneo com a ponta das unhas quadradas, pressionando-o com a palma de sua mão, a ponta de seus dedos, tudo para causar as mais diversas sensações enquanto o sugava em um ritmado movimento de vai-e-vem.
Quando o sentiu palpitar mais forte, retirou a boca, roçando seus lábios antes de começar a masturbá-lo com ainda mais pressão e rapidez, fazendo movimentos circulares com a palma da mão. mordeu os lábios com força, franzindo o cenho, segurando-a ainda no pescoço, na nuca, nos ombros.
Aquele pico começou a crescer em seu corpo, elevando-o a altitudes gigantescas, descontrolando seus sentidos, entorpecendo o olhar, cegando-o em luxúria. Cresceu e cresceu, até que, em certo ponto impossivelmente alto, explodiu. Jorrou endorfina em um jato por seu corpo, expelindo-o para a pele dos seios de — ele abriu seus olhos, acompanhando-o escorrer pela pele brilhante e suada dela — e, quando aconteceu de novo, ele sentiu-se ainda mais extasiado. O arrepio correu por seu corpo, elevando-o novamente em espirais que o consumiam de um deleite único. Ele mordeu os lábios, jogando o pescoço para trás quando, lentamente, soltava o ar pela boca molhada, afrouxando os dedos nos fios úmidos e quentes da garota que se sentava nos calcanhares, respirando com dificuldade, sentindo as veias palpitarem, deixando-a com as bochechas coradas e os olhos brilhantes em satisfação.
passou os olhos pelo corpo vulnerável daquela menina, inclinando o rosto enquanto respirava com a boca entreaberta, sentindo o vento da noite tocar sua pele quente, suada.
Com ela daquela forma, nua, ele conseguia ver outras cicatrizes que não notara antes. Havia as brilhantes e sedutoras em seu pulso, uma única na altura da clavícula, outro par no baixo de seu ilíaco — e, agora, seu preferido: o que inchava seu lábio inferior, deixando-o visivelmente machucado, avermelhado e saboroso.
Ele soltou uma risada nasalada quando ela, já voltando a sentir dor, colocou a ponta dos dedos no lábio inferior.
— Me desculpe por isso — disse ele, com a voz rouca arrastando na garganta. — Não foi minha intenção te machucar — ela percebeu a ironia beirando seus lábios.
— Não se preocupe — disse ela, inclinando o corpo para trás, se afastando dele. — Preciso voltar para casa.
Ele a acompanhou se levantando, deliciando-se com as marcas que causou no corpo dela.
— Por que tão cedo? — indagou, virando-se de costas, procurando sua calça jeans. Um cigarro cairia bem agora. — A madrugada mal começou, ainda temos muitas bebidas, muitos cigarros.
— Eu preciso ir — disse, respirando fundo quando se virou e o viu nu, de perfil, acendendo um cigarro. — Isso foi uma maluquice. Nós estamos bêbados e... — ela parou subitamente quando o escutou rir.
— Eu não estou — ele a encarou, exalando a fumaça. — Nem você — ele sorriu, piscando. — Você fez o que quis e como quis. E gostou.
Ela o encarou, estática. Rolou os olhos, negando com a cabeça quando se abaixava para vestir sua calcinha e sua calça jeans.
— Você tem certeza que quer ir embora? — indagou. conseguiu sentir o calor do corpo dela próximo do seu novamente e, quando levantou os olhos das barras de sua calça, encarou um par de panturrilhas bem à sua frente.
— Tenho — ela murmurou indecisa. Não queria ir.
— Quer carona? — ele riu, percebendo-a vulnerável novamente enquanto se levantava com pressa e fechava seu sutiã. — A noite é perigosa...
— Eu sei me cuidar — virou-se, colocando sua regata.
— Parece que sabe, — ele riu, tragando novamente.
o encarou uma última vez, pegando seu casaco, antes de abrir a porta e sair de volta para o ar acinzentado daquela festa.
Ela ainda podia sentir o roçar da pele dele contra a sua, podia sentir sua respiração, seus movimentos, sua pressão, seus arranhões. Podia senti-lo observando-a se afastar, mesmo sabendo que ele permanecia dentro do quarto, fumando.
Aquele homem despertou um lado adormecido de , algo que ela não se recordava da existência. Era um demônio adormecido, algo que ansiava por mais, algo que gostava da dor do prazer.
E, agora que despertou, ele não ansiaria seu sono novamente. Não tão cedo.


03.

So tired for defending her life, she could have died, fighting for the life of her child.

Quando passou pela lateral de sua casa para tornar a subir pelo mesmo local horas antes, percebeu que a gritaria que vinha da janela da cozinha era perturbadoramente mais alta. A luz estava acesa, a silhueta descontrolada de seus pais era preta quando vista de fora. Ela parou subitamente, franzindo o cenho, respirando com dificuldade pela longa caminhada que tivera naquele final de madrugada.
VOCÊ FODEU COM A MINHA VIDA! — era a voz de sua mãe, a sombra menor, com cabelos ondulados compridos e mãos que voavam no ar, expressando sua raiva. — EU TE ODEIO TANTO QUE PODERIA TE MATAR, GEORGE, EU JURO QUE PODERIA!
ENTÃO FAÇA! CUMPRA A SUA PALAVRA PELO MENOS UMA VEZ NESSA VIDA, MAYA, PELO MENOS UMA VEZ FAÇA O QUE DIZ!
sentiu um arrepio peculiar na nuca quando viu a mãe se virar de costas e passar as mãos nos cabelos. O pai tornou a gritar coisas que ela não se dava ao trabalho de tentar entender, e conforme o tempo passava era previsto que eles não terminariam aquela briga tão cedo.
Não tinha motivos para se grudar em um galho grosso de árvore e fazer força com as pernas e braços cansados. Se ela adentrasse pela porta da frente, era bem capaz de nenhum dos dois sequer virar seu rosto para encará-la.
Ela caminhou pela escuridão, parando afrente do tapete de boas-vindas e sorriu com ironia ao ler aquela frase clichê. Ninguém era feliz naquela casa. se agachou, arqueando a extremidade superior direita do tapete, pegando a chave reserva, virando-a na maçaneta, escutando a porta destrancar.
Os gritos ali dentro eram ainda mais altos.
— EU ODEIO VOCÊ, EU ODEIO VOCÊ! — sua mãe gritou, atiçando os olhos para encará-la descontrolada.
O que viu a fez perder parte do ar. George segurava os pulsos de Maya de forma que ela não podia se mover, com ambos na altura de seu rosto avermelhado; ele a apertava com tanta força que era possível ver a ponta branca de seus dedos grossos, e a escura cor do sangue que começava a acumular nas mãos curvadas de sua mãe. Ela tinha os olhos arregalados, a respiração descompassada, e encarava diretamente os olhos de seu marido, que, em um piscar de olhos, a jogou para o lado, fazendo-a cair de lado no chão.
— Agora você vai me bater? — ela soltou uma risada debochada, mas, no fundo, percebeu-a trêmula. — Seu covarde de merda! Que diabos eu fiz para te merecer, porra? Que pecado eu cometi para te ter na minha vida? Você nunca ligou para mim, George, e ainda acha que está no direito de me bater? — ela berrava de forma que as veias de seu pescoço se sobressaíssem em sua pele rosada. Maya tinha o queixo arqueado e as mãos espalmadas no chão. — Você acha que eu sou IMBECIL? Acha que eu nunca percebi que você me traía com aquelas suas PUTAS das suas alunas? DESDE O COMEÇO EU SABIA, GEORGE, DESDE O COMEÇO! E por isso — ela abriu um sorriso, fazendo as lágrimas de seus olhos brilharem com a amarelada luz da cozinha — eu nunca hesitei em te trair também, seu velho broxante — proferiu as palavras com nojo, com ódio em cada mínima sílaba. — E quer saber? — ela soltou outra risada debochada. — Você nunca me deu prazer. Eu nunca senti nada, além de nojo, com você. Você só me dá asco, George, nada além de asco. Tudo que eu senti de bom nessa vida foi com gente qualquer. Qualquer um é melhor na cama que você. Você-é-broxante.
Então tudo aconteceu rápido demais.
Primeiro George moveu a perna de forma que o bico preto de seu sapato tocasse o alto do quadril de Maya, fazendo-a escorregar sob a madeira, chocando-se com os balcões que suportavam a pia. Ela gritou de dor, então ele se ajoelhou, virou-a de frente para ele e a socou o alto do supercílio.
não piscou uma segunda vez antes de ver seu pai matar sua mãe. O ódio em seu olhar era tão assustador quanto os olhos da besta que assombrava seus sonhos.
Ela correu até onde eles estavam, vendo-o apertar os polegares na garganta de sua mãe. o empurrou com força, fazendo-o tombar para o lado; quando não sentiu mais as mãos de George em seu pescoço, Maya tossiu e tentou ficar de pé.
— Não se meta nisso, ! — ele gritou, virando-se para ela, tornando a se pôr ajoelhado no chão. — Por que você não volta para a porra do seu quarto e se tranca lá como sempre fez quando nos ouve gritar? Esse assunto não é para crianças! — ele a empurrou, tirando-a da frente de Maya, que ainda tossia e tentava recuperar o ar roubado.
— EU VOU CHAMAR A POLÍCIA, SEU PSICOPATA FILHO DA PUTA! EU NÃO TE QUERO MAIS NA MINHA CASA, EU NÃO TE QUERO MAIS NA MINHA VIDA, EU NÃO QUERO MAIS TER QUE OLHAR PRA PORRA DA SUA CARA! SAI DAQUI, GEORGE, SAI DAQUI! — Maya se colocou de pé enquanto gritava, apontando com o indicador para a porta da frente que ainda estava berta.
George riu — o som mais pavoroso daquela noite, para os ouvidos perturbados de . Ela ainda se encontrava no chão, perto dos joelhos da mãe, chocada e assustada demais para sequer tentar falar alguma coisa.
— ESSA CASA É TANTO MINHA QUANTO SUA!
Maya começou a rir alto e debochada, fazendo-o se calar e trancar os pulsos; o sangue subiu para seus olhos, fazendo as órbitas quererem saltar. O negro de sua íris ficava assombroso.
— VOCÊ GASTA TODO O SEU DINHEIRO BEBENDO, SEU PEDAÇO DE BOSTA! VOCÊ NÃO TEM DIREITO NENHUM SOB ESSE TETO! EU TE QUERO FORA DA MINHA VIDA!
Quando percebeu que George caminhava novamente para bater em Maya, esticou as pernas e chutou os joelhos do pai, vendo-o vacilar e cair no chão, em cima dela. Ele a encarou com tanto ódio que ela previu sua morte, apertando seus próprios olhos na esperança de não sentir o tato forte de seu soco contra sua pele.
E quando veio, fora bruto o bastante para fazê-la ficar sem ar. Fora apenas um soco no meio de seu pescoço, fazendo-a virar-se encolhida, tossindo e puxando o ar como um doente, com dificuldade.
Maya gritou, empurrando e chutando os ombros de George. Quando ele ficou de barriga para cima, ela se encaixou em seu tronco e pressionou os joelhos perto de seus braços, estapeando-o e unhando-o o rosto.
— COMO VOCÊ OUSA TOCAR NA MINHA FILHA, SEU DESGRAÇADO? COMO VOCÊ OUSA? — ela o arranhou as bochechas e o pescoço, pressionando as unhas sob sua pele com mais força a cada palavra que proferia.
George desvencilhou os braços dos joelhos de Maya e segurou-a com força os pulsos, novamente, e a empurrou para o lado, fazendo-a bater a cabeça na madeira do balcão.
não conseguia mais se mover, com extrema dificuldade em respirar. Ela queria poder colocar-se de pé e empurrar o pai, puxar alguma tesoura ou faca daquelas gavetas e perfurá-lo o olho, mas simplesmente não conseguia.
Aquele soco despertou um nó que há tempos ela não sentia, encurralando as paredes de sua garganta, impedindo-a de respirar. Quando puxava o oxigênio, ele entalava naquele nó e não passava nem se ela fizesse força, de forma que nem arfar surgisse efeito. Ela tossia com os olhos direcionados para o chão, puxando o ar com força.
— Você é uma PUTA, Maya, uma puta VELHA e DESPREZÍVEL. Eu não entendo o motivo de termos passado tanto tempo juntos, porque eu simplesmente TE ODEIO. Eu ODEIO você, eu SEMPRE odiei. Se EU sou broxante, você, então, é O QUÊ? Você é VELHA, Maya, você é horrível. Você NUNCA vai chegar aos pés das garotas que eu comia, das garotas que GRITAVAM meu nome e DELIRAVAM em prazer quando me sentiam dentro delas...
Maya gargalhou, se colocando de pé. Esticou a mão por cima do mármore branco e sentiu a ponta fria de uma faca. se sentiu enojada com as palavras de seu pai.
— Se elas gritavam, meu amor, não era de prazer, pode ter certeza. Você é nojento e se não sair da minha casa AGORA eu JURO que chamo a polícia — ela virou o rosto quando ouviu arfar com força, ajoelhando-se ao lado da filha, tocando-a com delicadeza, com medo de machucá-la ainda mais. — Meu anjinho... — ela sentiu as lágrimas escaparem de seu rosto, as que estavam presas desde o começo daquela interminável discussão. — Meu amor... O que esse desgraçado fez com você, meu anjo? Eu vou... — ela soluçou, tateando com pressa e força o bolso da calça jeans — Eu vou chamar uma ambulância. Você não está respirando, não está conseguindo. Eu devia ter feito isso antes — ela chorava e tremia, encontrando imensa dificuldade em conseguir acertar os botões. — SE ALGO ACONTECER COM A MINHA FILHA, SEU PUTO, EU JURO QUE...
Mas sua frase se perdeu no ar quando ela virou o pescoço em sua direção e o viu com a faca recém-afiada apontada em sua direção. Os olhos negros estavam perturbados e a pele avermelhada o deixava idêntico ao Diabo.
— Você nunca mais vai precisar olhar para a minha cara, mesmo, sua puta velha, porque eu vou te matar. Você e essa bastarda imunda — ele apontou para , que começava a perder a lucidez, puxando o ar com força, movendo as costelas magras com extrema rapidez.
— NÃO ENCOSTA MAIS NELA! — ela gritou, se colocando de pé, com o telefone grudado a orelha. — Eu vou chamar a polícia, George... — ela chorou mais, começando a se desesperar quando o encarava nos olhos. — Você vai passar o resto da vida na cadeia e nunca mais vai me ferir, nunca mais vai encostar na minha filha... Ela nunca fez nada a você — ela chorou, escutando a atendente do outro lado da linha. — Por favor, não o meu pequeno anjo... Não faça nada a ela, eu imploro... — ela abaixou a cabeça, soltando o celular no chão.
George, da mesma forma que se descontrolou, tornou a cair na realidade. Viu suas mãos apertadas contra o plástico protetor daquela faca apontada na direção de sua filha, desacordada no chão por algo que ele fez a ela. Por ter batido nela. Por tê-la tirado o ar com a força de um golpe só. E sua mulher, aquela com quem já viveu momentos tão bons, estava chorando, debulhando-se em lágrimas sem conseguir se controlar ou ao menos arrumar espaços de tempo para respirar, arfando, soluçando, fungando enquanto praticamente se contorcia em direção a ele. Mas ele não sentia mínima compaixão, apenas culpa. Culpa por ter perdido o controle, deixando que seus demônios se sobressaíssem.
Ele largou a faca, soando como um estrondo no chão e no silêncio do choro de Maya, na falta de sentidos de .
Qual é sua emergência? Alô? Senhora, está me ouvindo?
George se virou, caminhando com pressa para fora de casa, fugindo para a escuridão.
E tão rápido como começou, terminou. Maya estava lá, ajoelhada sobre o corpo desmaiado de sua filha, sem poder acreditar que o culpado de tudo aquilo era o homem que ela escolheu para passar o resto de sua vida. Mas não. Ela nunca mais aceitaria ele em sua vida de novo, nunca mais.
Maya desligara o telefone há pouco e esperava impacientemente pela ambulância. Ela procurava em sua cabeça algo que poderia fazer para ajudar, então, com certa dificuldade, tentou carregar a filha até a porta que fora deixada aberta. A dor de seu rosto inchado e quente era palpitante, ela mal conseguira andar com sua coxa tão dolorida — conseguia sentir seus batimentos pulsando no local onde havia sido abusada.
Mas mesmo assim, isso não a impediu. Ela foi até a geladeira e pegou uma forma de gelo, colocando os pequenos cubos em uma sacola, embalando-a com um pano de prato, amarrando-a. Maya havia se arrastado e arrastado a filha até a varanda, para os médicos não perderem tempo levando a maca até dentro de casa. Maya deitou parte do corpo de no seu, deixando-a entre as pernas e segurando o saco de gelo em seu pescoço incrivelmente inchado.
Em minutos — que pareceram horas entre os soluços de uma mãe aos prantos —, luzes vermelhas e sirenes puderam ser ouvidas no final da rua, fazendo o coração aflito de Maya acelerar.
Logo, a ambulância estava parada à frente a casa dos Burwell, médicos apressados tiravam uma maca de dentro do local, corriam em direção à mãe com a filha no braço e pediam licença, checando a pulsação e fazendo os procedimentos necessários de primeiros socorros.
— A senhora também precisará de ajuda médica — um deles falou.
— Também precisará depor — um policial, segurando o seu cinto, comentou.
— Eu não posso fazer isso depois? — Maya segurava a mão da filha, e a outra mantida em seu próprio coração. Ela já não chorava mais.
— Claro, conversaremos com os vizinhos e estaremos no hospital assim que pudermos — ele respondeu e, sem esperar por uma resposta, já caminhava para o gramado do vizinho.
Maya acompanhou a maca onde o corpo débil de estava até dentro da ambulância. Assim que entrou, as portas se fecharam e estavam correndo ao caminho do hospital, observando ser medicada, medirem a pressão dela, colocarem um aparelho de respiração, tudo que os paramédicos julgaram necessário, mas sem tirar sua mão da de momento algum.
— Vá o mais rápido possível, ela está com falta de ar — uma enfermeira disse ao motorista.
— Por quê? Ela vai morrer? — Maya perguntava desesperada, apertando a mão da filha mais forte a cada segundo.
— Ela está desacordada, pode me dizer o que fez com que seu pescoço inchasse deste jeito? — a enfermeira um tanto serena conversava com Maya sem parar o seu serviço.
— O pai dela a socou — a voz de Maya vacilou, fazendo-a engolir o choro por relembrar o fim daquela noite tão horrível.
— Bom, a garganta dela inchou muito, impedindo que o ar passasse por ela. Faremos alguns exames, não temos como dizer exatamente o que é agora. Você só terá algo intacto no hospital — ela disse rapidamente. — Nós a encaminharemos para cuidar dos seus machucados também.
Maya agradeceu, sentindo a ambulância parar aos poucos. Finalmente haviam chegado. Finalmente salvariam sua filha.
Ela foi direcionada para uma sala pequena onde uma enfermeira simpática cuidou de todos os seus machucados; teve que tirar suas roupas completamente sujas e substituí-las por uma camisola do hospital. Maya não se importava consigo, ela só queria saber onde estava sua filha.
— Com licença — um médico grisalho bateu na porta onde ela descansava e tomava um café.
— Olá, você sabe algo sobre a minha filha? — Maya perguntou de prontidão.
— Sou o doutor Cornelius e estou cuidando de — ele sorriu um pouco simpático, mostrando-a suas rugas nas bochechas e olhos, adentrando o quarto e se aproximando da cama onde se encontrava aquela mãe aflita. — A sua filha sofreu uma grave lesão na garganta, como os paramédicos já lhe informaram, que a fez sufocar. Nós já cuidamos do inchaço e ela já respira com mais facilidade, mas queríamos deixá-la por observação durante a noite, aqui, no hospital — ele molhou os lábios, encarando-a diretamente nos olhos.
— Mas se ela está bem, qual o motivo de deixá-la aqui? — indagou Maya, tentando sorrir, tentando sentir alívio, mas ainda estava nervosa, angustiada. — Doutor... — ela sentiu aquele incômodo ardor em seu nariz.
teve uma convulsão — disse suavemente. — Mas nós a controlamos — assegurou, dizendo rápido. Maya começou a chorar. — Fizemos uma R.M. de emergência e não encontramos nada de diferente no...
— R.M.? — ela o encarou com os olhos inchados e a boca trêmula.
— Ressonância Magnética — explicou, desculpando-se com o olhar. — Nós não encontramos nenhuma causa para aquela convulsão até eu olhar o exame de sangue dela — ele parou subitamente e Maya ficou ainda mais angustiada.
— O quê , doutor? — ela quase gritou. — O que minha filha tem?
— Ela teve uma overdose — disse.
— Mas a minha filha... — ela perdeu as palavras no ar, sentindo dor ao respirar.
— Eu sei que é um choque quando os pais descobrem que seus filhos são dependentes de drogas. Temos psicólogos aqui, podemos chamar algum para conversar com a senhora, tentar acalmá-la.
— Minha filha não é dependente — disse Maya, olhando-o com certa raiva. — Ela nem sai de casa, ela...
— Senhora, temos o resultado do exame de sangue dela. Encontramos cocaína, cetamina, maconha, altos níveis de álcool...
— Ela vai ficar bem? — indagou novamente, colocando a mão na boca.
— Podemos colocá-la num programa de reabilitação e já fizemos lavagem estomacal, mas nada disso vai causar efeito caso ela não queira ser curad...
— Ela vai ficar bem, doutor? — sua voz se tornou áspera.
Ele suspirou, assentindo.
— Vai.

Maya, completamente impaciente, andava de um lado para o outro onde fora medicada e seus machucados foram devidamente cuidados. Ela não conseguia entender o porquê de tudo aquilo ter acontecido, se olhava no espelho e observava os machucados cobertos por gazes e se perguntava o porquê de ter se casado com aquele homem; não se lembrava de mais nada.
Mas ela não se arrependia. Gostava de ter tido a filha com ele, porque, se não fosse com ele, não teria sido sua .
Então, finalmente, conseguiu encontrar um lado bom desde que se casou: sua filha.
Que... Usava drogas?
Maya também não conseguia imaginar a sua pequena grande garota naquele mundo podre.
Era aquele pai, aquela casa — que havia se tornado um inferno —, aquela escola que sua filha tanto odiava, aquela cidade... Tudo que odiava e Maya sabia disso. Então ela se perguntava por que mantinha sua filha em um lugar onde ela não queria. E tudo se voltou novamente a George. Ele prendia as duas naquela cidade, naquela casa, na merda daquela cidade. Se não fosse por ele, não estaria se drogando. Se não fosse por ele, elas não estariam tendo a pior noite de suas vidas.
Maya se achou burra quando a solução veio à sua cabeça; como ela não havia pensado naquilo antes?
Essa era a solução mais óbvia de todas.
— A senhora já pode visitar a sua filha — uma enfermeira jovem comunicou com a porta entreaberta.
O coração de Maya disparou.
Finalmente.
Ela pegou sua bolsa esparramada no banco e correu para a porta, seguindo a jovem que a levaria até o quarto de . Paredes beges desbotadas e portas cor de caramelo passaram por ela, até que a enfermeira parou de frente a uma em especial. Ela não disse nada, só olhou para Maya, permitindo-a a entrar sozinha e ter privacidade com sua filha.
Maya girou a maçaneta com cuidado, sem querer fazer muito barulho. Abriu uma pequena fresta e deixou que somente sua cabeça entrasse no quarto completamente branco, observando o corpo de pousado sobre aquela cama larga.
Entre o suporte para soro e a parede de botões para arrumar a cama e chamar uma enfermeira, lá estava o rosto fino e cansado de sua filha, com as pálpebras entreabertas.
Ao avistar a mãe, a ponta de seus lábios secos subiu quase que imperceptivelmente, enquanto Maya alargava cada vez mais o seu próprio sorriso. Deixou que o seu corpo inteiro entrasse no quarto, e sorrateiramente, sem querer fazer nenhum barulho, sentou-se em uma pequena poltrona banca de veludo posta ao lado da cama, beijando a testa fria de enquanto segurava sua mão.
— Como você se sente? — Maya indagou, franzindo o cenho e com um sorriso medroso nos lábios, com medo da resposta.
— Um pouco cansada — a voz fraca e rouca de respondeu, tentando ao máximo forçar um sorriso torto. Virou sua cabeça levemente para poder olhar a mãe.
... — começou, murchando seu sorriso e uma face preocupada e séria tomou conta de seu rosto. — Eu preciso falar com você... Sei que não é a hora e que você está cansada, mas isso não pode ser adiado.
Maya suspirou. ficou em silêncio.
— George voltará, tenho certeza disso. Ele jamais entregaria a casa tão facilmente para nós — ela odiava ter que entrar naquele assunto, mas era preciso. Apertou cada vez mais a mão de sua filha. — Então eu decidi fazer o que deveria ter feito há muito tempo... — suspirou mais uma vez. — Vamos nos mudar, , vamos deixar o seu pai e esta cidade de vez.
— Ótimo — abriu um sorriso alegre entre seus lábios trincados. Ela realmente estava feliz, não só por ela, mas por sua mãe, que finalmente poderia viver. As duas juntas. — Eu não quero ficar perto dele... Quero ir para longe, muito longe.
— Estive procurando alguns lugares enquanto você estava dormindo... Manhattan é um dos lugares com maior chance de sermos felizes — sorriu novamente, mais feliz ainda por sua filha ter aceitado a ideia tão facilmente. — Vamos nos mudar o mais rápido possível. Enquanto você fica por aqui, eu arrumo algumas coisas nossas, o suficiente para alguns poucos meses. Lá teremos oportunidades realmente ótimas, meu pequeno anjo, e poderemos ter uma vida completamente diferente.
— Você vai fazer tudo isso sozinha? — se sentia inútil por não poder ajudá-la.
— Eu peço ajuda a alguns amigos — Maya sorriu, assentindo, dando um longo e quente beijo na testa da filha.
não parou de pensar no quanto sua vida melhoraria daquele momento em diante. Para toda melhora, existe um sacrifício. Se para se livrar daquela vida ela teve que passar por aquela noite horrível, valia à pena.
Ela passaria por aquela noite quantas vezes fossem preciso, se fosse para uma melhora.
teria que passar mais uma noite no hospital, apenas para que os médicos tivessem a certeza que estava tudo certo com seu organismo, com sua cabeça.
Poucos segundos depois que fechou seus olhos, escutou o estalido dos saltos da mesma enfermeira, que injetava em suas veias seu remédio para dormir.
Entorpecida, não durou um segundo para que um sonho a consumisse.

Ele abriu a grande janela do segundo andar daquele hospital, onde o cheiro doce de era mais forte. Adentrou aquele quarto frio como uma raposa e, passando os olhos pelo local, acompanhou a figura adormecida de uma mulher mais velha — em torno de seus quarenta e poucos anos —, repousada no sofá, com a aparência cansada e o casaco amassado. Quando virou suavemente o rosto para sua esquerda, a encontrou. Ela estava deitada, com os olhos fechados, a pele branca iluminada pelas frestas da persiana branca posta nas duas extremidades daquele quarto desconfortável, os cabelos escuros estirados para a direita de seu corpo como um leque negro que reluzia brilho.
caminhou lentamente, mal escutando seus passos, até ficar próximo o bastante dela. estava adormecida, completamente dopada, com o antebraço esticado para cima — onde, com extrema perfeição e facilidade, encontrou os caminhos azulados de suas veias; escutou sua pulsação correndo, indo e vindo naquele curvilíneo corpo que sonhava —, onde uma agulha de soro a mantinha daquela forma.
Ele esticou o indicador para tocar o aveludado de sua pele, contornando-a até o alto do antebraço, seguindo o caminho de uma veia.
Mesmo adormecida, ela se arrepiava com o toque dele.
Vê-la com os pelos eriçados fez um pequeno sorriso aparecer nos lábios vermelhos de .
Continuando seu trajeto, sem ao menos pensar, ele tocou seu rosto, sua bochecha, contornando seus lábios. Sentiu o leve inchaço que seus próprios dentes causaram naquela parte tão sensível daquela adorável garota, lembrando-se subitamente do motivo de estar ali.
Ele trouxe a outra mão para o alto da lombar, descendo-a até encontrar o bolso traseiro de sua calça jeans; ali, adentando dois dedos no tecido grosso, puxou um cordão de prata onde o pingente era um frasco redondo, achatado, com uma tampa minúscula de madeira.
achara aquele colar nos pertences de algum familiar, guardando-o quando descobriu o segredo dos amaldiçoados, sabendo que um dia iria usá-lo.
Alguns demônios não percebem o sangue de um amaldiçoado da primeira vez que o experimenta; como o gosto lhe agrada, sugam seu maravilhoso líquido de uma vez só, matando-o em frações de segundos. A força que se sente quando se prova o sangue de um mortal amaldiçoado é tamanha que o demônio se torna invencível por alguns meses, enquanto aquele veneno ainda corre por dentro de seu corpo.
O demônio que se alimentou do sangue amaldiçoado não consegue se alimentar de outro para adquirir a mesma força, por mais que sugue todas as pessoas vivas no planeta. É um sangue raro de se encontrar e ninguém sabe ao certo como achá-lo.
Você simplesmente... Acha.
A pessoa amaldiçoada não brilha, não é irresistivelmente atraente, não tem nenhum poder especial e também não atrai demônio nenhum.
É uma pessoa qualquer, de aparência qualquer, de qualquer lugar, mas com o sangue diferente para as criaturas noturnas.
encarou o pingente balançando de um lado para o outro quando o puxou para próximo do rosto. Encarou novamente a garota adormecida, se perdendo por um segundo ou mais no contorno de seu rosto, na serenidade de sua respiração, na pulsação tranquila que passeava por seu corpo, mantendo-o quente, com aquele cheiro tão singular que ela exalava.
Ele puxou seu pulso para próximo da boca, encarando as linhas horizontais e verticais das cicatrizes de seus cortes. Ele afiou os caninos, roçando-os suavemente por cima de sua pele, arranhando-a até que a partisse em um vão.
Uma gota escarlate brilhou sob a luz da lua.
Quando tornou a encarar , ela tinha o cenho levemente franzido e gemeu baixo, entorpecida demais para abrir os olhos.
Ele abriu a pequena tampa do pingente de diamante, encaixando-o sob a pele dela, encarando as gotas caírem tão lentamente.
Enquanto o frasco não se enchia, ele tornou a observá-la. Passou os olhos por aqueles lábios tão saborosos, tão doces, e se perguntou quando os provaria novamente. Desceu por seu pescoço, acompanhando sua pulsação, encarando seu busto descoberto pela camisola frouxa; encarou o volume de seus seios e conseguiu encará-los por baixo daquele tecido grosso que tampava suas pernas, lembrando-os excitados e avermelhados.
Ele sorriu, lembrando-se dela, de como ela se movia, de como ela falava, de como ela respirava, de como ela gemia. Lembrou-se do grau máximo de seu êxtase, de como ela se arrepiou com o que ele fez nela, de como ela adorava o que o fazia excitar.
O frasco estava cheio. Ele soltou delicadamente o pulso dela por cima da cama, deixando-o virado para cima, acompanhando o risco vermelho ficar gordo de sangue uma segunda vez. Tampou o pingente e colocou o cordão em volta do pescoço, sentindo-o próximo do coração, escondendo-o com o suéter preto.
tornou a pegar o pulso de , passando seus lábios pelo sangue que ainda aparecia lentamente, lambendo-o e sugando-o, sentindo-o preencher os milímetros de sua boca, arrepiando seus pelos e entorpecendo seus sentidos.
Quando o sangue parou de correr, ele sentiu vontade de afiar os dentes novamente e sugar mais. Quis poder encaixar o quadril em cima do dela e beijar seu pescoço, encontrando o calor de sua artéria, mordendo-a e sugando-a como se fosse um carrapato. Queria poder vê-la acordada, encarar o tom anil de seus olhos grandes e redondos, e poder repetir o que fizera antes enquanto chupa seu sangue. Queria ter os dois prazeres ali, agora, com ela.
Mas o estalido de saltos o fez despertar.
Ele não seria fraco a ponto de chupá-la por inteiro. Agora que tinha seu sangue e conhecia o mortal amaldiçoado, não seria fraco o bastante para deixá-lo escapar, livre para outros demônios.
Não.
, agora, pertencia a ele.
escondeu o pulso cortado de em baixo do edredom, virando-se enquanto limpava o canto da boca, encarando uma magra enfermeira adentrando o quarto com uma seringa e um medicamente líquido.
— O senhor não pode estar aqui — sussurrou, vendo que Maya ainda dormia. — Como conseguiu entrar? Não estamos no horário de visitas e por enquanto só estamos recebendo familiares.
— Eu sou da família — disse, também sussurrando. — Sou o namorado dela — ele encarou aquela ruiva parada à sua frente com a intensidade nos olhos. E, por sua experiência, ela não acreditara nas palavras dele.
— Qual é o seu nome, meu jovem? — ela adentrou o quarto e fechou a porta, arrumando o edredom nos pés de enquanto se direcionava para o soro dela, aplicando uma quantidade razoável de um líquido amarelado. suspirou.
Ele a amaldiçoou por chamá-lo de jovem, desgostando, sabendo que era milênios mais velho que ela. Mais velho que aquela cidade inteira junta.
... — respondeu, coçando a nuca.
— Mesmo assim, , me desculpe, mas você não pode estar aqui.
— Desculpa — ele assentiu, dando um passo para a saída. — Eu já estava de saída, de qualquer forma. Obrigado — ele sorriu, saindo pela porta, correndo pelos corredores vazios daquele lugar que fedia a sangue e morte.


04.

Oh mother, don't look back 'cause he'll never hurt us again.

Ele caminhou com as pupilas dilatadas pelo frio cortante daquela noite em Bristol. A lua cheia cobria o céu com sua brilhante luz, deixando as árvores com uma penumbra agradável para os olhos humanos dos moradores daquela deplorável cidadezinha da Inglaterra.
Ele atravessou os bordos, apoiando a palma de sua mão no tronco grosso daquelas árvores, encarando mais além, avistando o bairro mais aparentemente pacato — uma paisagem patética das famílias inglesas que fingiam sua felicidade, com um exemplo perfeito dos Burwell — da noite. As luzes das casas estavam quase todas apagadas, as trancas fechadas e as janelas cobertas por cortinas.
Ele, então, parou de andar. O silêncio da madrugada era tão forte que sua respiração pareciam sopros de furacões.
Sentiu o peso do sangue da garota em seu pescoço, sentindo seu cheiro entorpecendo suas narinas. Lembrou-se de seu gosto agridoce, a coloração perfeita de um sangue que sofria, que era exposto ao mundo deprimente onde o corpo que o protegia estava submetido a viver.
Suas gengivas doeram quando os caninos quiseram se expor. Sentiu sua pupila maior ainda, contornando suas íris azuis com o preto felino da noite. Seus pelos se eriçaram e, quando percebeu, suas mãos estavam em forma de garra.
Ele estava com fome.
Como um raio, partiu pela floresta, correndo em direção ao bairro onde morava.
A voz que soprava em sua cabeça dizia: como ela foi gerada por duas pessoas diferentes, parte de seu sangue pertence a essas pessoas; então, provavelmente, o gosto seria semelhante, a força que ele o dá seria, no mínimo, parecida.
Ele esperava que sim.
Sua garganta tremia, ansiosa pelo líquido escarlate que desceria por ali, repondo as energias que somente a carne humana o oferecia.
Quando gerado, o Deus do submundo optou por deixá-lo sentir os pecados de um ser humano qualquer; o deixou com o corpo semelhante, mas com a aparência de um anjo caído, de forma que atrair suas presas é muito mais fácil do que caçá-las. É uma tarefa simples, afinal, ser um demônio. Caçar almas e rechear o inferno com pessoas que não valem tanto à pena enquanto se alimenta da carne doce daquele ser infeliz.
Quando chegou à rua, parou subitamente e ergueu as costas, esticando o pescoço para trás com os olhos fechados. Sentiu o brilho da lua em seu rosto pálido, iluminando-o, enquanto respirava fundo, caçando o cheiro do sangue dos Burwell. Tornando a abrir seus olhos, encolheu as pupilas novamente, deixando-os tomados em seu tom natural mais claro graças ao brilho do céu.
Ele encontrou.
Estava parcialmente próximo, para o leste. O cheiro do sangue que farejou não era tão forte e nem de longe tão saboroso quanto o de , mas poderia ser parecido. Se proporcionasse o que o sangue dela proporcionou, ele caçaria todos os familiares de até não sobrar nenhum vivo.
Então, ajustando a postura, encolhendo — com certa dificuldade e dor — os caninos e esticando os dedos, caminhou pela rua até outra próxima, como se fosse uma pequena cidade em um condomínio, com um pequeno mercado de frutas e legumes, uma padaria, uma lanchonete, uma peixaria e, claro, um bar.
E não tão difícil de farejar seu cheiro, mais fácil ainda fora encontrá-lo sentado próximo do balcão, com o rosto direcionado para baixo e a aparência tão deplorável quanto um animal que agoniza a morte.
George estava com os antebraços apoiados na madeira do balcão que corria de uma extremidade do bar até a outra. Estava quase vazio, com quatro ou cinco dependentes alcóolicos e dois atendentes entediados que fumavam seus cigarros e bebiam cervejas, sentados nos cantos, esperando alguém chamá-los para outra dose.
Para sua infelicidade, não havia nenhuma mulher bonita para ocupar a outra metade do seu tempo.
caminhou os poucos metros que o separavam daquele bar, então entrou, sentou-se ao lado do velho e, com um sorriso tentador nos lábios vermelhos, pediu uma dose tripla do melhor whisky.
George fedia. O cheiro de sua pulsação não era nem de longe tão agradável quanto a de . Era velha e estava carregada de álcool.
Quando o homem velho e gordo, com barba por fazer e cabelos pretos ralos na cabeça calva deixou o copo de posto à sua frente, George virou suavemente o queixo para encará-lo quando, finalmente, notou a movimentação.
conseguiu perceber suas pupilas extremamente dilatadas, sua boca seca e seus olhos cansados.
Desde que horas ele estava ali se embebedando?
— Eu quero outra — disse George. Sua voz embolava na garganta, completamente embaralhada. riu, atraindo-o a atenção. Quando sentiu os olhos pretos do homem em seu pescoço, ele tomou as doses de sua bebida em um gole só.
— Eu também quero — ele virou para o velho e, com um sorriso nos lábios, o cumprimentou.
— Vai com calma, George. Por que você não volta para casa? — o mesmo gordo de antes retornou, mas sem nenhuma garrafa nas mãos com dedos grossos.
— Eu não tenho mais casa — respondeu George, com os olhos trêmulos. — Eu não tenho mais família... Eu nunca tive, na verdade, elas nunca gostaram de mim — ele fungou. franziu o cenho e controlou uma risada, abaixando os olhos para o líquido âmbar que bailava nas beiradas do copo. O gordo rolou os olhos e caminhou para longe.
Quantos papos de bêbado ele tinha que aturar por noite? E quantos papos de bêbado vindos de George, sempre a mesma história, ele tinha que aturar por dia?
gargalhava por dentro.
Como essa vida é patética.
— Na sua idade, eu era a pessoa que quis ser para o resto da vida, rapaz — George se voltou para , olhando-o com as bochechas vermelhas e molhadas tanto de suor quanto de lágrimas. — Eu tinha uma namorada gostosa e não me importava nem um pouco com ela porque podia escolher a dedo as garotas que eu comeria. Hoje em dia... — ele franziu o rosto em uma careta de choro. — Hoje em dia eu sou casado com uma velha histérica e horrorosa, tenho uma filha problemática, depressiva e drogada que me odeia...
— Sua vida é mesmo uma bosta, cara... — disse , sem encará-lo, tomando um gole de whisky. George concordou.
— E piorou ainda mais. Elas vão colocar a polícia atrás de mim.
— E deveriam mesmo — murmurou . George o encarou e ele sorriu sem mostrar os dentes. — O que aconteceu? — se fez de prestativo, inclinando suavemente o rosto. George não notou suas intenções.
— Eu perdi o controle — ele assentiu, segurando seu copo vazio com as duas mãos. — Nós estávamos discutindo e eu bati nela, mas... Que homem nunca levantou a mão para uma mulher? — ele tentou rir, chorando um pouco mais. — Elas fazem a gente enlouquecer, cara, elas... — ele soluçou.
— Acho que você precisa de um ar — disse , assentindo enquanto tomava seu último gole e se levantava, respirando fundo. George o encarou com o cenho franzido e depois negou veemente com a cabeça.
— Eu preciso morrer — ele olhou para baixo novamente. — Elas nunca vão me perdoar e a vida que era horrível vai ficar pior ainda...
— Eu posso te ajudar — disse . O velho o encarou de novo. — Vamos conversar lá fora.
— Você é um daqueles vendedores filhos da puta que vai tentar me vender alguma coisa inútil dizendo que vai mudar minha vida? — ele riu embolado. abriu um sorriso sem humor.
— Não. Eu sou outro tipo de pessoa...
— Põe na conta, Joel. Amanhã eu volto.

caminhou pacientemente ao lado de George, ajudando-o a ficar de pé enquanto seguiam pelo longo caminho de volta para a casa dos Burwell.
Durante todo o trajeto o mais velho não calou sua boca durante um segundo, dizendo e repetindo que queria morrer, que sua vida era uma desgraça, que sua filha e sua mulher nunca mais o olhariam na cara por nojo pelas besteiras que ele cometera naquela noite maldita.
perdeu a paciência no segundo que pisaram fora do bar.
— Eu sei que não deveria ter feito o que fiz, mas ela estava enchendo tanto o meu saco. Reclamava de tudo, sabe? Desde a tampa da privada em pé até a conta que eu me esqueci de pagar porque estava preocupado com alguma coisa minha. Ela pensa que eu parei de viver a minha vida por causa dela? Ela é idiota. Eu nunca deixaria de viver a minha vida por causa de outra pessoa, sabe? Ser dependente. Mas eu sinto a falta da Maya, cara, eu não queria que tivesse terminado dessa forma. Eu sei que nosso casamento estava uma bosta, mas poderia melhorar caso da imbecil da não tivesse nascido e...
o empurrou no chão, quando estavam distantes o bastante. O empurrou com força, escutando o estalo pesado do corpo dele no asfalto da rua deserta.
— Mas que porra...? — George respirou com dificuldade, tentando apoiar as mãos no chão para se colocar de pé. — Você é doido, cara?
— Sou — assentiu, molhando os lábios, encarando o sangue vermelho aparecendo aos poucos pelo pequeno machucado que surgiu no cotovelo do mais velho. — Eu sou completamente insano.
— Sai de perto de mim — disse o mais velho, virando-se de lado, espalmando as mãos, tentando puxar os joelhos. Ele não tinha equilíbrio. O mundo girava mais rápido do que ele era capaz de acompanhar. Seus olhos tremiam, sua fala embolava, seu sangue estava pesado demais.
— Eu já fiz muitas coisas ruins nessa minha longa vida, George... — começou , caminhando lentamente para frente do homem, colocando o pé no alto do osso de seu quadril, chutando-o para que ficasse deitado de barriga para cima. Aquela fina camada de papel rasgou, quebrando, estalando alto. George deu um grito de dor que ecoou na floresta inabitável. Estavam longe demais para que alguém o escutasse. — Mas eu nunca, nunca, maltratei uma mulher.
— O que você quer de mim? — ele gritou novamente, começando a chorar de medo. finalmente permitiu que aquela risada que prendia sua garganta fosse liberada para o vento noturno. George gemeu e tentou se afastar, mas a dor em seu quadril era tanta que ele não conseguia nem ao menos pensar em algo racional. O álcool então, só tornou a sensação ainda mais pavorosa.
— Eu tenho que admitir que o gosto do sangue de uma donzela é muito mais saboroso que de um velho como você, mas me parte o coração vê-las sofrendo, agonizando, pedindo para que eu as mate de uma vez... — ele soprou um tom ressentido, quase fazendo um bico com o lábio inferior. — Então eu dou um único golpe certeiro no coração — ele piscou, colocando as mãos no peito. Depois, gargalhou. — O quão patético isso soa para você, George? Um demônio que tem compaixão por mulheres humanas? O Diabo sugaria minha alma. Mas... Como posso ser fiel ao que fui feito, se tenho os pecados humanos correndo nesse corpo? Qual é o seu preferido? — ele olhou diretamente nos olhos do velho que ainda tentava se afastar, com a boca entreaberta e os olhos arregalados. — Ira? — expulsou os dentes e sentiu suas pupilas tomando sua íris, abaixando-se de uma vez só para morder e puxar o músculo do ombro de George, mastigando-o uma ou duas vezes antes de engolir sua carne.
Encarou o buraco vermelho que havia feito naquele homem, escutando seus gritos de pavor. Encaixou-se por cima do quadril quebrado dele, colocando os joelhos nos pulsos de George de forma que ele não conseguisse se mover. Com uma de suas mãos, guiou os dedos até o alto da traqueia dele, apertando-o, vendo-o sufocar.
— Como você descreve essa sensação, de estar sem ar? Agora, imagine que eu sou seu pai. Aquele escroto imbecil que não raciocinou quando decidiu deixar sua mulher gerar um ser tão desprezível quanto você, George — ele rosnou, franzindo o cenho, pronunciando as palavras com ódio. Abaixou-se novamente, mordendo-o próximo da orelha, sugando seu sangue, mastigando sua pele e seu músculo.
Ele sentiu raiva por o gosto não ser igual. Sentiu ódio por não ocorrer aquela explosão de sentimentos bons como quando ele provou o sangue de pela primeira vez.
rosnou de raiva.
— Pelo amor de Deus! Pare com isso! Por favor! — ele gritou, esticando o pescoço, completamente desesperado. O sangue que escorria das mordidas de queimava quando jorrava para fora de seu corpo. o observou agonizar.
Deus não existe — ele franziu o rosto, atacando-o novamente, mais fundo, sugando o sangue que começara a jorrar de sua artéria. Conforme mordia, inseria sua língua e puxava com força sua carne, mastigando-a uma vez antes de engolir e pegar outro pedaço, beber mais um pouco. Mordia e puxava sua pele enquanto segurava com as duas mãos seu rosto para que ficasse inclinado, sentindo seus olhos úmidos e sua boca aberta. Conforme ele gritava, sua veia ficara rígida, mas a pulsação era forte e constante.
Soltando um último grito, ele morreu com os olhos e boca abertos. levantou o tronco para vê-lo perfurado, com buracos grandes e fundos onde sua língua, dente e lábios o comeu. Sentiu o gosto parecido com aquele que estava bem guardado em um frasco em seu pescoço, guardado como um símbolo sagrado que o ajudaria nos momentos de desespero.
O sangue de era diferente. Era mágico. Proporcionava forças inacreditáveis no corpo daquele demônio. Era um sangue sofrido, um sangue com gosto mais doce que os outros.
E não era parecido com aquele que pingava de seus caninos afiados, de seu queixo ensanguentado, de seu pescoço e blusa sujos. Aquele sangue tinha um gosto mais amargo que o daquela garota, era mais claro, mais denso. Estava poluído pelo vício, embora mais saboroso pelos pecados e pela dor do arrependimento que sentia quando o provou.
Puxando as mãos do rosto do velho, encaixou-as nas extremidades de suas costelas e as puxou com força, quebrando-as, abrindo um pequeno vão de pele no meio da barriga de George. Enfiando os dedos ali, rasgou-a como um pedaço de papel de seda, expondo o interior de seu corpo.
Ele escolheu o coração como seu primeiro aperitivo.
Puxou-o e o arrancou de suas ligações, mordendo-o com tamanho desejo e fome, saboreando-o como se fosse o mais gostoso do mundo.
Não seria nem de longe um dos melhores que ele já comeu, mas era suficiente para repor suas energias por um par de dias.
Encarou o sangue caindo por uma poça ao lado do corpo velho daquele homem morto, vendo-o brilhar e reluzir em um tom escurecido pela lua que pouco a pouco se afastava, sumindo no céu, sendo recoberta por nuvens de chuva. Ele passou os dedos no asfalto ensanguentado, chupando-os para sugar o sangue que conseguiu pegar, depois se debruçou novamente e encaixou seus lábios e língua no local certo, tomando como se fosse um refresco em um dia quente de verão.
Ele olhou para cima, começando a sentir-se cheio quando metade do segundo pulmão escorregava por sua garganta. A luz iluminou o sangue molhado em seu rosto, o brilho pálido de sua pele, o corpo aberto e devorado do homem debaixo de seu quadril.
se colocou de pé e lambeu os lábios, passando o polegar ao lado da boca para pegar o resto de sangue que se encontrava ali; depois, juntou os pedaços restantes de George e o embrulhou como um saco de carne — e não era exatamente o que ele representava agora? —, seguindo com ele para a floresta. Jogando-o em cima de uma pedra, encarou os braços e as pernas caindo para as extremidades como uma coisa podre.
Nada melhor do que o cheiro de uma carne nova exposta ao sol.
Os lobos dariam conta daquele resto. As criaturas noturnas se comunicavam entre si.
virou o rosto para a direção de um labirinto nevoado, abaixando-se novamente para tomar outros goles de sangue, chupando-o com os lábios e língua, segurando-o com os dentes que palpitavam com aquela nova recarga de energia.
Aos poucos, ouviu as quatro patas de seus irmãos noturnos caminhando até onde o corpo de George estava.
Normalmente, caso estivesse com muita fome, atacaria aqueles lobos.
Mas naquela noite, não. Já estava satisfeito o bastante para deixar seu resto para os preguiçosos.
Sentia-se como um leão rodeado de hienas. Tão poderoso quanto, tão invencível quanto.
Ele sorriu, aproximando-se de um lobo grande, com pelos negros e olhos claros. Ele estava com os caninos à mostra, com raiva, rosnando. riu, molhando os lábios, ficando próximo o bastante para o lobo atacar.
Bastou apenas um mínimo movimento com seu corpo, um único soco na garganta do animal, que ele caiu para a lateral com um grunhido de dor. Os outros lobos se afastaram.
— Nós não devíamos brigar, irmão — sussurrou, agachando-se para perto do lobo levemente machucado. Ele o acariciou como se fosse um animal de estimação. — A carne é sua. Trouxe um banquete... Aproveite.
Os outros lobos, como se entendessem o que disse — e provavelmente entendiam —, atacaram de uma vez só o corpo destroçado de George, cada um puxando uma perna, um braço, a fim de esquartejá-lo e deixá-lo ainda pior para quem o fosse encontrar.
acariciou o meio dos olhos do lobo que ele antes machucara, percebendo-o com dor.
— Me desculpe — sussurrou, vendo-o colocar-se de pé e rosnar de novo. riu. — Criaturas da noite são todas iguais — afirmou ele, rosnando também, mostrando seus caninos tantas vezes maiores que o daquele lobo.
O lobo ansiou atacar novamente, mas deu um pulo para trás, se afastando o bastante para não matar aquele animal irracional irritante.
— Animal desprezível — rolou os olhos. — Preguiçoso — disse enquanto o animal se guiava para a matilha, comendo o meio do corpo de George, que estava de maior e fácil acesso.
, dando um último olhar para George, virou-se e caminhou pela escuridão, tirando sua blusa suja e enterrando-a em seu cemitério particular, onde, além do corpo do zelador e futuramente o de George, outros restos de ossos se encontravam enterrados e esquecidos.
As pessoas que ele matava para se alimentar, em geral, não causariam euforia no resto da população da cidade. Era raro quando ele encontrava algum sangue que realmente valesse o sacrifício da busca, da perturbação, da confusão que se instalaria na cidade onde mora no exato momento.
Uma morte qualquer é uma morte qualquer, mas uma morte barulhenta tem consequências irritantes das quais ele não estava disposto — ou com paciência — de passar novamente.
Já se foi o século onde o que ele mais queria era a atenção das pessoas para uma criatura que os leigos admitem ser mística — um demônio.
Demônios existem e não era o único solto pelo mundo. Qualquer alma perdida é um demônio a ser criado; qualquer alma sofrida está na linha da eternidade sentindo os mesmos pecados, se afogando nas mesmas próprias amarguras.
Mas ele não trocaria sua divindade do inferno por outra coisa que alguém pudesse oferecer. Ser uma criatura noturna era a melhor das dádivas. Ser uma criatura noturna estava tatuado em sua alma desde o segundo que nasceu, séculos e séculos atrás, eras e eras distantes do momento em que partisse, daqui a mais de milênios.
Ele veria e reveria a humanidade ser extinta e, querendo ou não, adoraria participar da carnificina.

já conseguia ficar sem o apoio em seu pescoço quando recebeu alta. Ficou feliz por não ter que sair daquele jeito de Bristol; sentia como se fosse um novo começo — novos começos não combinam com curativos ou colares de algodão para segurar o pescoço quieto.
Pouco antes de sair, ela arrumava os últimos detalhes de sua pequena mala que Maya havia trago para o hospital. A enfermeira dava a ela os últimos procedimentos sobre o que fazer quando chegar em casa enquanto sua mãe chamava um táxi.
— Sabe, seu namorado esteve aqui — disse ela, interrompendo-se no meio de uma frase.
— Meu namorado? — franziu o cenho, com Blaine em mente.
— Sim... — ela sorriu inocentemente, mesmo sabendo que a pergunta de havia respondido todas às suas suspeitas.
— Ah, sim... Que bom... Pena que eu não estava acordada — ela sorriu de volta, tentando não demonstrar a preocupação que gritava em seus olhos.
O que diabos fazia ali?, ela se perguntava, enquanto a enfermeira saía do quarto para atender outros pacientes. O sorriso de murchou assim que ela se virou de costas e na mente dela milhares de perguntas se formulavam.
Enquanto colocava suas pulseiras de seu dia-a-dia, percebeu um pequeno corte no pulso. Um diferente, mais recente... E, mesmo que sem querer, pensou em . Ele adorava suas cicatrizes.
Talvez tenha vindo para marcar sua própria.
Ela riu com o pensamento tão idiota e voltou a se perguntar o que ele fazia ali de verdade, sem encontrar uma resposta.
— Vamos, ! Você é muito lenta — sua mãe a chamava, esperando-a praticamente arrastar-se até o táxi.
riu, apressando-se, ainda um pouco sonolenta.
nunca percebera o lado divertido de sua mãe. Elas mal se falavam, na verdade — a maioria das vezes Maya estava ocupada demais brigando com George, fazendo acreditar que casamento se resumia àquilo: brigas intermináveis e constrangimento em meio às pessoas normais.
Ela estava redondamente enganada; sua mãe era uma parceira que ela contaria muito no futuro, disso tinha certeza.

Caminhando para o novo amanhã, teve longas horas de viagem até chegar a New York.
Nova cidade, nova casa, novo sotaque, novas pessoas, nova vida. Vida tal aquela que ela começaria a aproveitar. Assim que embarcou naquele avião, ela prometeu para si mesma que nunca mais olharia para trás e daquele momento em diante ela seria feliz. Também fez com que sua mãe prometesse nunca mais olhar para trás.
Chegando naquela cidade, ficou completamente maravilhada. Era como nos filmes: os prédios antigos e bonitos, as ruas cheias, os táxis amarelos que enfeitavam a cidade, os letreiros que pareciam magia. Realmente era um sonho.
— Lar, doce e novo lar — Maya sussurrou com um sorriso tímido nos lábios, encarando o prédio à sua frente e o caminhão de mudanças atrás.
— Qual andar? — perguntou, sem tirar os olhos do prédio.
— Terceiro andar, 2C — ela respondeu sem mover um outro músculo.
correu como uma criança, adentrando aquele prédio lindo aos seus olhos, subindo as escadas energeticamente, passando por todos os apartamentos até chegar ao seu, que estava com a porta aberta.
Era um lugar pequeno, mas bonito e aconchegante. Ficaria ainda mais quando pronto e decorado como uma casa de verdade.
Se resumia à uma sala pequena, separada por um balcão americano de cozinha, que continha armários bege claro suspensos próximos do teto branco encardido, o fogão e a geladeira brancos que pareciam velhos, do antigo dono. Ela seguiu pelo corredor, em direção ao banheiro. Era pequeno também, com uma banheira linda de porcelana. Não era como o antigo banheiro de sua casa, mas ainda assim era perfeito e maravilhoso.
Seguiu para a segunda porta do corredor, achando seu quarto. Era pequeno, também, com uma janela, sem cortinas, sem nada. Ela imaginou sua cama no meio, a televisão, seus pôsteres e sua coleção interminável de CDs estampados em estantes que ela colocaria.
Sorriu.
Seguiu mais uma vez, até o último quarto, que era o da sua mãe. Era mais bonito e maior, com uma varanda de frente à rua.
Era grande, com grades de metal preto, contorcido e enfeitado com simples desenhos de flores. Ao lado, não muito distante, havia uma escada de incêndio.
conseguiu ver a movimentação da rua e da avenida; os sons de buzinas e conversas paralelas eram como o canto dos anjos.
Ela conseguiu imaginar algo ainda melhor para aquele quarto: cortinas brancas de renda tocariam o chão, uma cama de casal bem no meio, um guarda-roupas bem à frente, com espaço para a televisão e estantes também, repletas de livros, estátuas e porta-retratos. A suíte, como a outra, a confortaria nas manhãs antes de ir para a escola. Ela acordaria encarando o sol refletir em seu teto branco, sorriria, se despreguiçaria, abriria as cortinas e observaria a movimentação da rua em seus trajes de noite. Ela caminharia até o banheiro e faria sua higiene, trocaria de roupa, sairia do quarto e tomaria café no balcão americano com sua mãe. Pegaria seu material, se despediria dela e seguiria para sua escola que ela não odiaria.
Ela conseguia se imaginar perfeitamente bem ali.
— Gostou? — Maya apareceu na porta do quarto, apoiada no batente, enquanto se perdia em seus pensamentos.
— Eu amei, mãe — ela respondeu, sentada exatamente no meio do quarto. — Eu sei que esse deveria ser o seu quarto, mas eu gostei tanto... Eu me imagino perfeitamente aqui... Me deixa ficar com ele? — ela sorriu, implorando com os olhos.
Maya pensou um pouco. Ela não precisava de tanto espaço, ela não iria gostar do barulho do trânsito e do vento, ou da claridade daquela pequena varanda.
— Eu não iria gostar mesmo — respondeu, dando de ombros, saindo do quarto sem deixar que a respondesse.
, então, ficou ainda feliz, deitou-se nos filetes de madeira escura e fechou os olhos, imaginando tudo imensamente diferente do que era antes.

No final no dia, os empregados da mudança já haviam terminado de montar tudo, e, de noite, Maya decorava a sala em seus últimos ajustes enquanto assistia televisão com um frio na barriga pela excitação da expectativa.
Levantou-se e foi até a varanda pela milésima vez naquele dia — de noite, tudo parecia muito mais bonito.
As luzes da cidade refletiam na pista molhada pela chuva, movimentada pelos carros, pelo espírito da noite no centro de Manhattan; ninguém ali parecia dormir. As boates que a vista alcançava estavam com filas, os restaurantes estavam lotados, as mulheres caminhavam acima de seus saltos e riam, conversando com seus namorados, amigos, irmãos noturnos, casos de última hora.
Aquilo era o paraíso.
Com os olhos perdidos na movimentação, ela fazia planos. Primeiro, visitaria os pontos turísticos, depois se informaria sobre seu próprio bairro e, em poucos dias, teria aquela nova cidade na palma quadrada de sua mão.
Era possível tanta felicidade caber em uma pessoa só?
Toda aquela névoa de Bristol havia sido espantada pelo calor humano de Manhattan.
O barulho da televisão cessou subitamente, como um raio que cortava o barulho noturno de um coração Nova Iorquino. A luz que brilhava acima de sua cabeça pareceu explodir, com um estalo, desligando. O breu se implantou entre seu corpo, o frio lentamente consumiu sua pele, fazendo-a virar-se alertada, com o coração martelando forte.
Por favor, que a casa não seja assombrada — sussurrou para si mesma, fechando os olhos. O único brilho que adentrava aquela casa era o que a rua fornecia, deixando tudo encoberto por sombras, silhuetas.
O barulho da risada de Maya cortou seus tímpanos, fazendo-a molhar os lábios, tentando respirar.
Só estamos sem luz! — a voz de Maya, abafada pela parede, gritou da sala.
— Você não pagou a primeira conta? — se guiou pelo corredor estreito, tateando a parede lisa com a ponta dos dedos, com medo de tropeçar em alguma caixa de mudança. Ela conseguiu ver a silhueta de sua mãe se mover na escuridão. Aos poucos, suas pupilas se acostumaram pela falta de luz, deixando-a perceber alguns poucos móveis.
— Eu gastei toda a nossa poupança na mudança, querida. Me esqueci de pagar as contas... — ela riu sem graça. rolou os olhos, permitindo-se rir também.
— Isso significa banho frio? — ela gemeu em antecipação, franzindo as sobrancelhas.
— São só alguns dias. Vou procurar emprego amanhã bem cedo e logo teremos bastante dinheiro para começar nossa vida do melhor jeito possível. Além do mais, está tarde, devíamos dormir. Teremos um dia cheio.
molhou os lábios e assentiu, tornando a virar nos calcanhares para seguir de volta para seu perfeito quarto.
— Boa noite, querida — murmurou Maya para a escuridão. Quando virou o pescoço para trás, encarou sua silhueta próxima ao batente da porta, com a lateral do corpo apoiada ali.
— Boa noite, mãe.
— Eu te amo...
— Eu também te amo.


05.

I just can't control myself. They want more, well, I'll give them more.

Já havia se passado vários dias desde que e sua mãe conseguiram se estabelecer em Manhattan — conseguiram um apartamento fixo, com as contas pagas, uma lanchonete de confiança e alguns furos de emprego que duravam, no máximo, quatro dias. Maya estava com dificuldades em se manter fixa em um por causa de sua idade e sua pouca experiência, já que nunca fora obrigada a trabalhar graças ao gordo salário de George — mas agora tudo era diferente; ela não o queria ver nunca mais, nem a metros de distância.
decidira trancar os estudos pelo tempo que ajudava sua mãe — de princípio, Maya surtou e disse que não aceitaria que sua filha não completasse o último ano do ensino médio, sabendo de sua capacidade perfeita de conseguir ser o que quisesse na vida; mas, depois, quando a primeira conta do apartamento chegou, insistiu com relutância em recusar a oferta da filha, mas acabou cedendo. Combinaram que ela trabalharia apenas meio período, ocupando-se com estudos na outra metade de tempo que lhe sobrasse — mas no exato segundo que Maya se punha para fora, caminhando para seu emprego deplorável, seguia à procura de algo melhor. O máximo que conseguira naqueles dias todos fora uma vaga em uma cafeteria, de garçonete. O salário era tão ridículo que ela mal conseguia comprar alguma comida melhor que as que vinham em caixas, ou em sacolas de fast food.
Quando pensaram em fugir, sabiam das dificuldades, mas não pensaram que se expandiriam por mais de um mês.
Durante uma noite fria, enquanto as ruas da cidade eram lavadas por uma forte chuva, duas garotas adentraram a cafeteria onde trabalhava e se sentaram, rindo, em uma das várias mesas vagas. O som de suas gargalhadas cortou o silêncio mórbido daquele lugar triste e atiçou a curiosidade da morena que terminava de arrumar algumas xícaras em seu devido lugar. Ela acompanhou com os olhos enquanto Bryan — o segundo atendente da parte noturna — se guiava — um pouco mais animado que sempre — para a mesa das garotas, perguntando o que poderia fazer para ajudá-las. Uma delas — provavelmente a mais velha — o encarou com tanta luxúria que quis desviar o olhar por vergonha, mas simplesmente não conseguiu. Ela era alta, magra, loira, tatuada e tinha olhos escuros como os de uma raposa; as roupas que usavam se contradiziam com o que seu rosto mostrava — uma calça jeans folgada e um suéter verde-escuro. A outra garota era um pouco mais baixa, tinha negros cabelos cacheados e olhos tão dóceis e redondos como os de um bebê.
Bryan se virou corado — e sorrindo — enquanto caminhava de volta para o balcão e entregava o pedido nas mãos pálidas de , que ainda encarava fixamente as duas garotas — que também a encaravam. Estavam curiosas, assim como a garota, em saber o que a outra mostrava, o motivo de seu interesse.
Quando molhou os lábios e se preparava para quebrar aquela conexão, a mais velha sorriu de forma íntima, como se estivesse tentando compartilhar algum segredo com ela. Preparou seus expressos em xícaras grandes e colocou-as em cima da bandeja marrom-escura, pronta para se virar para Bryan e avisar que o pedido estava feito. Quando se virou para entregar a bandeja nas mãos calejadas dele, percebeu que a loira estava ali, com seu perfume doce impregnando nas paredes de suas narinas.
— Qual é o seu nome? — a loira tinha uma voz firme, um pouco grave. Era forte, quase como de uma mãe que dá ordens.
— respondeu a garota, sem conseguir desviar os olhos claros dos escuros dela. A mulher abriu um sorriso perverso.
— Meu nome é Alysha... — disse, pegando nas extremidades da bandeja — E eu percebi o seu interesse em mim e em minha amiga...
— Ah — ela arfou, rindo, negando com a cabeça. — Me perdoe, não é isso que você está pensando, eu só... — Alysha riu mais uma vez, fazendo se calar. Suas bochechas ficaram ruborizadas.
— Quantos anos você tem, ? — ela molhou seus lábios, apoiando os cotovelos no balcão de vidro enquanto olhava fixamente para as pupilas da menor, que começava a se incomodar.
— D-dezenove — gaguejou. Naquele momento, a outra garota, de aparência inocente, apareceu ao lado de Alysha.
— O que você está fazendo, irmã? — indagou a menor, com a voz extremamente doce. Ela tinha feições de criança, além dos olhos. Tinha a boca fina, o nariz arrebitado, a pele tão clara e tão macia quanto a de um anjo.
— Conhecendo nossa amiga curiosa — disse Alysha, virando-se para a menor. — O que você acha dela, Angel? Acha que Richard gostaria?
molhou e mordeu os lábios, desentendendo do que elas estavam falando.
— Ele está desesperado por pessoas novas, eu sei, mas não acredito que seja a tal ponto — Angel, que contradizia completamente com o nome e aparência, tinha um tom enojado e encarava da mesma forma.
— Como se você conhecesse os gostos dele... — Alysha rolou os olhos e se voltou para . Ela encarou aquela lanchonete repugnante uma última vez antes de dizer: — Você estaria interessada em uma oferta de emprego onde você ganha, por hora, muito mais do que ganharia aqui, por mês?
E foi assim que aconteceu. Assim que arrumou uma milésima entrevista de emprego; mas, esta, sem dúvida, seria completamente diferente das demais que já tivera até tal hora da manhã.
O sol daquela estação estava em seu pico, queimando o céu anil e o deixando livre de quaisquer nuvens e pássaros; nada além de arranha-céus gigantescos e uma enorme bola com brilho e luz branca.
Caminhando com seus fones de ouvido quase no máximo, parou subitamente quando percebera o nome daquele local no letreiro vermelho apagado, que parecia brilhar ainda mais sob aquela parede impecavelmente preta. As portas eram altas, de vidro fosco, e ela conseguia imaginar com perfeição dois seguranças em cada extremidade daquela boate aparentemente inocente.
Burlesque.
tirou os fones de ouvido e, com os olhos encolhidos, direcionou o queixo para cima para ver o grande letreiro. Leu e releu aquelas letras, hesitando em entrar, em prolongar com aquela ideia insana.
Ela nunca havia se insinuado daquela forma para alguém, nunca sequer havia pensado em um dia fazer tal coisa. Mas precisava. Por ela e por sua mãe.
Trancando os pensamentos, deu os passos que a separavam do beco que se guiava até a porta preta dos fundos, de metal barato. Ela bateu algumas vezes, até que o som do estalido de saltos fez seu coração palpitar. Baixou os olhos para a ponta branca de seus tênis, sentindo-se patética.
Não deveria estar ali. Fora loucura Alysha dizer que ela poderia fazer parte daquela boate, que ela se encaixava no que o tal Richard estava procurando.
A porta se abriu.
Quando tornou a subir os olhos pela porta, acompanhou cada mínimo espaço de pele branca da mulher seminua que a atendeu.
Era Angel.
Ela não tinha as curvas que pensava que teria. Era reta, sem muito peito, e aquele espartilho rosa que esmagava seus ossos só deixava aquilo mais aparente. Angel estava com os grandes cachos bagunçados jogados para um dos lados do rosto limpo de maquiagens e sorria como uma leoa que conseguira sua presa, perversamente.
tentou sorrir, mas o modo que a garota a encarava a fez hesitar.
— Você veio, então — ela disse com aquela temível voz de anjo. — Pensei que não teria coragem.
Eu também.
— Não custa nada tentar... — respondeu , molhando os lábios secos e dando de ombros. Angel assentiu.
— Venha, entre. Estamos fazendo a prova de roupas.
O soco do ar frio daquele local fez respirar fundo, sentindo a garganta gelar. A Burlesque era uma boate bonita, com piso brilhante de porcelanato preto e paredes carmim. As luzes eram bem direcionadas e brincavam no ar, em seu diário teste, junto com a música eletrônica que soava nas caixas de som. O balcão era central, junto com o bar, e era vasto, de vidro e espelhos, onde se encontravam quatro postes de metal de pole-dance.
Haviam mesas redondas cobertas por um tecido escarlate que escondia os joelhos de quem se sentasse ali — percebeu que nas paredes não havia janelas. Havia também um segundo andar, onde era fácil ver dois corredores nas extremidades das paredes, onde, provavelmente, aconteciam as danças privativas e serviços especiais. No centro, havia uma cúpula preta. Parecia uma sala de observação de cirurgias.
Alysha comentara brevemente sobre aquelas coisas, na noite passada, apelidando-as como “efeito colateral”, dependendo do cliente.
As garotas que se espalhavam por aquele lugar bem iluminado — a luz que adentrava pela enorme porta de vidro era suficiente para grande parte da boate; o resto era encarregado por luzes normais, brancas, que brilhavam no chão — estavam extremamente confortáveis em mostrar sua própria pele pouco coberta pelos tecidos rendados e extremamente finos das lingeries que usavam.
— Então... — começou Angel, virando-se de frente para , que ainda tinha os olhos perdidos nos móveis de couro preto daquele lugar. Devia ser caro. — Você já trabalhou com isso antes ou é sua primeira vez? — indagou com os olhos enjoados e as sobrancelhas arqueadas, as mãos na cintura.
— É minha primeira vez — disse, molhando os lábios de novo. Angel rolou os olhos e respirou fundo.
— Alysha enlouqueceu — afirmou. — Está completamente louca.
— Você acha? — era a voz da mulher. Alysha estava usando roupas comuns, uma blusa branca e um short jeans azul marinho. — Obrigada — ela sorriu áspera.
— Você acha mesmo que uma virgem vai nos ajudar? Estamos quase falindo, Alysha! — ela quase gritou, soltando os braços e arregalando suavemente os olhos. — Estamos quebrados!
inclinou o rosto e reolhou aquele lugar. Parecia ser tão sofisticado... Por que estavam falindo?
— Eu cuido dela, querida, vá procurar algo para fazer — Alysha apontou com o polegar por cima do ombro, fechando os olhos. Angel bufou e marchou seus saltos para a área das escadas. — Ela está assim porque está enciumada — sorriu fraco, soltando uma risada nasalada. — Você é carne nova. Os clientes gostam, mas as meninas odeiam — a garota assentiu, segurando a alça de sua bolsa. Alysha pareceu sentir o cheiro de seu nervosismo, então soltou outra risada. — Não precisa se preocupar, . Todos começam de alguma forma, em algum lugar.
— É que eu nunca nem pensei em fazer isso e...
— Falando nisso, como você quer ser chamada? — Alysha começou a caminhar, virando-se para a mala de lingeries reviradas. a seguiu.
— Quê? — ela indagou confusa.
— Você não pode dançar aqui e ser chamada de , — disse, parecendo óbvio. Se agachou e procurou alguma coisa que lhe parecesse útil. — Precisa de um nome mais... Artístico — ela sorriu para os tecidos, virando o pescoço para encarar a menor. — Você tem cara de Scarlet. Scarlet Bellan. Você tem descendência italiana?
— Meu pai... — ela sentiu nojo a lembrar-se dele, o que, estranhamente, a fez se sentir um pouco mais confiante. — Ele nasceu em Milão.
— Ah... — Alysha puxou uma cinta liga vermelha. — Qual tamanho você usa?
— Quarenta e quatro no peito e M no bumbum.
— Bumbum — repetiu Alysha, quase gargalhando. — Você vai divertir Richard, pelo menos.
mordeu o interior do lábio inferior.
— Ele chega daqui a alguns minutos — disse, consultando seu relógio dourado de pulso. — Gosta de aprovar as roupas antes de qualquer outro homem. Você é bem branca — reparou, suspirando enquanto se colocava de pé com uma renda minúscula na mão — Acho que preto fica ótimo em você — e sorriu, estendendo-lhe a peça.
segurou com certo repúdio, pensando em quantas vezes um homem ejaculou próximo daquele tecido.
— Nós somos limpos — apressou-se Alysha, rindo, notando o asco nos olhos de . — Nossas roupas são impecáveis.
assentiu rapidamente, sentindo-se patética novamente. Guiou o corpo para próximo de uma mesa e colocou sua bolsa ali, começando a se despir. Sentiu o farfalhar de suas pulseiras quando o tecido roxo de sua blusa roçou ali, sentindo certo arrepio na espinha quando retirou aquela peça.
Alguém a observava.
Quando virou o pescoço para trás, viu os delicados olhos azuis de Angel, que comentava algo com outra dançarina, de peitos grandes e cabelo ondulado vermelho.
suspirou, tirando o short, chutando o tênis, ficando com as meias cinzas. Tirou a calcinha, com extrema vergonha, e vestiu a renda fio-dental que expunha mais do que cobria. A parte da frente era transparente, mostrando o nu de sua pele branca, e a parte de trás simplesmente não existia; o sutiã, não muito diferente, deixava visível o arrepiado de seus mamilos.
Ela cruzou os braços, a fim de escondê-los, quando se virou de fronte.
— Ele está quase chegando, meninas. Façam a fila — disse Alysha, que terminava de abotoar seu sutiã com bojo rosa bebê.
As garotas todas se enfileiraram na frente do balcão central, de fronte para a porta alta de vidro. O piso brilhava e estalava com seus saltos altos — algo que ninguém havia oferecido para . Ela, então, caminhou com a ponta dos dedos das mãos escondidos em suas palmas, com cuidado para não escorregar, para o final da fila, ao lado de Alysha.
— Eu estou me sentindo em uma exposição de animais — sussurrou , fazendo Alysha sorrir.
— Você vai se sentir pior à noite, querida, acredite em mim.
A porta dos fundos se abriu no silêncio do baixo da música eletrônica. O estalido de um sapato ecoou nas paredes e, aos poucos, a sombra de um homem alto e robusto aparecia no brilho do chão. controlou a imensa vontade de ficar na ponta dos pés e esticar a cabeça para frente para encará-lo adentrar como um cafetão de luxo aquela boate e olhar com nojo para as meninas.
O passo parou, então ela teve certeza que ele começara a julgá-las.
imaginou como ele seria. Velho, provavelmente, e talvez careca. Usaria óculos escuros de noite e ternos brancos com gravatas cor-de-rosa. Ou teria o estilo daqueles que passeavam nos calçadões, com blusas de seda com estampas horrorosas. Teria os dentes amarelados por tabaco, com certeza, porque seria viciado em nicotina e whisky. Ele a chamaria de “princesa” ou “gatinha”, qualquer coisa que a fizesse sentir nojo. Teria uma protegida, claro, e provavelmente seria Angel, aquela bastarda metida e imunda.
sorriu, baixando os olhos para a ponta de seus pés unidos.
Ela mal havia conseguido o emprego e já havia desavenças entre uma de suas colegas de trabalho.
— Por que está rindo? — Richard, parado à sua frente, indagou.
Quando subiu o olhar novamente, sentiu como se tomasse um soco no estômago.
Richard era diferente de como imaginava. Tinha olhos verdes como olivas e cabelos tão negros quanto a noite mais escura de um inverno; sua pele era branca como porcelana, perfeita e sem sardas, com a barba por fazer. Tinha o corpo robusto e rijo coberto por uma blusa social preta, com as mangas dobradas até a altura de seus cotovelos e os dois primeiros botões abertos — a calça e os sapatos eram igualmente pretos.
— Eu... — tentou ela, encarando-o nos lábios, procurando um sorriso. Tinham um tom diferente de alaranjado e aparência levemente rachada, áspera.
Quem é você, aliás? — ele franziu as grossas sobrancelhas negras, olhando para Alysha.
— É a garota que comentei — respondeu. — .
— Ah... — ele assentiu, arqueando a sobrancelha direita.
Com as mãos para trás, ele a encarou dos pés até a cabeça. sentiu agonia por estar sendo avaliada daquela forma.
Ele passou aqueles olhos tão verdes pelo cinza de suas meias, por suas panturrilhas, pelo torneado leve de suas coxas, pela curva de sua cintura e o osso do ilíaco, pelo volume significante em seus seios e o rosado de seus mamilos, o saltado de suas clavículas, os cabelos negros que caíam como uma cascata por suas costas até o final das costelas, o macio vermelho de seus lábios, o arrebitado de seu nariz, o grosso de seus cílios, o azul cristalino de seus olhos e o delineado perfeito de suas sobrancelhas.
Encarou-a por inteiro, sem deixar escapar um mínimo centímetro.
— Você tem alguma tatuagem escondida, ? — ele indagou, sua voz grossa cortando-a a pele. Era impossível esconder alguma coisa naquelas roupas.
— Não — disse, tentando desviar o olhar dos olhos dele. Era como se Richard conseguisse ver sua alma.
— Você sabe dançar? — lambeu o lábio inferior, abrindo a boca para falar. — Já trabalhou nisto antes?
— Não, mas...
— Você não serve — ele disse, virando-se novamente.
franziu o cenho, fechando a boca enquanto escutava um risinho malvado partindo de Angel e da ruiva. Ela deu um passo para frente, percebendo todos os olhares caindo em seu corpo.
— Você não me deixou falar, eu posso...
— Eu preciso de alguém com experiência — Richard respondeu alto, fazendo todas se calarem, especialmente . — Você está vendo essas garotas? — ele apontou para as sete meninas enfileiradas, sem encará-las. Seus olhos estavam fixos nos de . — Eram doze antes. A maioria que se começou aqui preferiu procurar um lugar que pagasse mais pelo seu erotismo. Eu não gosto de iniciantes, isso aqui não é uma escola — ele se virou novamente. o seguiu, engolindo a vergonha e esquecendo que todos ali acompanhavam aquela humilhação.
— Eu aprendo rápido — disse, tentando tocá-lo. Richard se virou como um gato, dando um passo para ficar distante o bastante dela. franziu o cenho, encarando-o também. Ele tinha uma pequena cicatriz cintilante no final do pescoço. Se parecia com a dela, só que bem menor. — Eu sei dançar. Já trabalhei como garçonete. Posso aprender rápido como as coisas funcionam aqui e eu prometo, Richard, que não te decepcionarei — ele a encarou novamente, franzindo o cenho. — Só uma chance... — mordeu os lábios.
— Quem te deu essa bosta de sutiã? Tire-o. Troque — disse, dando outro passo para trás, minutos depois que o silêncio tomou a boate novamente. — Você só tem uma chance de me provar o quanto é boa, . Só uma.

A noite adentrou novamente a vista de , fazendo seu coração acelerar enquanto batia o salto no porcelanato, escutando a música alta invadir seus tímpanos.
— Você está pronta, Scarlet? — indagou Alysha, parando ao lado dela enquanto mascava um chiclete. a encarou dos pés a cabeça; ela usava um conjunto com bordados vermelhos e tecido transparente.
— Você sabe se está? — indagou de volta, passando a ponta dos dedos na coxa descoberta, subindo por sua lateral até a fina alça de sua calcinha de renda.
— Às vezes — Alysha deu de ombros, fazendo sorrir para a porta de vidro fosco, onde conseguia ver certa movimentação. — Se lembre do que eu te disse: imagine-o como seu maior fetiche que tudo ocorrerá perfeitamente bem. E está vendo aquela cúpula na frente dos quartos, no segundo andar?
assentiu, sem virar-se para trás, sentindo a textura fria do vidro do balcão central no baixo de sua lombar. Era uma sala com vidros blindados e com película extremamente preta, quase tão pequena quanto a cabine de um DJ.
— É ali onde Richard fica na maioria dos dias que vem para cá.
— Devo fazer alguma coisa especial enquanto o encaro? — se virou para Alysha, que abriu um sorriso sujo.
— Imagine-o como seu maior fetiche.
Então as portas se abriram, fazendo Alysha, em um pulo, agarrar-se no poste de pole-dance, subindo no balcão. a encarou por um segundo, sentindo os cabelos soltos roçarem em suas costas.
As conversas paralelas logo tomaram conta do lugar. Homens dos diversos tipos adentravam a Burlesque como se fosse a melhor boate da cidade. E poderia ser.
— Suba aqui comigo — disse Alysha, ajoelhada no balcão de espelho. — Vou te arrumar algum cliente.
não hesitou; apoiou-se de quatro em uma das cadeiras giratórias e subiu no balcão, segurando a mão de Alysha enquanto fazia de tudo para parecer vulgar, empinando a bunda quando ficou de pé. A loira abriu um sorriso, soltando uma risada nasalada.
— Não quero parecer tão idiota — disse , respirando fundo.
— Deixe as coisas fluírem naturalmente, querida... — disse ela, fechando os olhos enquanto jogava a cabeça para trás e começava a dançar leve e lentamente. — Você tem que prestar atenção no quanto esses homens estão dispostos a pagar para te ter — disse ela, molhando os lábios enquanto encarava os poucos homens que começavam a se sentar nas cadeiras do balcão. — Ofereça os serviços privativos para os que te derem mais — e assim se afastou, deixando-a sozinha naquele lugar tão exposto. Outras duas garotas se ocupavam com os outros postes de pole-dance.
— Olá — disse um homem de cabelos grisalhos que se sentou na cadeira à frente de . Ela sorriu do modo mais vulgar que conseguiu, agachando-se para ficar próxima o bastante até ver a nota que ele a oferecia. Era de cem. — Eu nunca te vi por aqui...
— Sou nova — disse ela, estalando a língua enquanto esticava o indicador e o médio para pegar a nota e colocá-la entre os peitos.
— Eu gosto das novas — ele sorriu para ela, encarando a renda transparente de sua calcinha fio-dental.
levantou os olhos e encarou seu redor. Os homens que estavam ali, em sua maioria, eram velhos casados e entediados com suas vidas tristes, ou punheteiros com dinheiro para gastar com filmes eróticos ao vivo. Eles encaravam as meninas que dançavam de uma forma tão vulgar quanto o modo que as tratavam, as apelidavam. Mas era um olhar tão recheado de tesão, de admiração, de excitação, que até o mais asqueroso entre eles se tornava um pouco interessante — e os interessantes, em especial, se tornavam os melhores.
A garota sorriu, mordendo os lábios enquanto se colocava de pé, virando-se de costas, encarando a cúpula negra onde Richard a observava. Ela passou as mãos na lateral do corpo enquanto rebolava, movendo o quadril, empinando-o para trás com as pernas suavemente abertas. Ela mordeu os lábios e, lentamente, puxou o cabelo para trás, sentindo a música em suas veias, conduzindo-a a dançar daquela forma. Seu corpo quente a deixava rosada, as luzes vermelhas iluminavam seus cabelos, criando reflexos.
— Eu também gosto de ser a novata — ela sussurrou, encostando o queixo no ombro, olhando-o encarar fixamente sua bunda. Ele queria poder estapeá-la. o fez. Passou a mão lentamente pela pele macia de sua nádega esquerda e a estapeou uma vez, fazendo-a estalar. O homem sorriu; seus olhos acinzentados faiscaram.
— Qual é o seu nome? — ele indagou, pegando seu copo de vodca com gelo.
— Scarlet — ela mordeu os lábios, tornando a virar-se para frente, dançando para ele.
— Prazer te conhecer, Scarlet — ele ergueu a vodca para ela, brindando.
— O prazer é todo meu.

A madrugada encobriu aquela boate parcialmente lotada. Não havia garotas suficientes para terem muitos clientes. Os que sobravam se deliciavam bêbados com as garotas de outros caras. Dançando naquele espaço, ainda restavam Alysha, a ruiva de Angel e , que já começava a sentir os pés doerem encolhidos naqueles scarpins pretos. Ela sabia que estavam quase terminando a jornada daquela noite, mas os minutos que sobravam pareciam eternidades.
— Como está indo? — indagou Alysha, caminhando pelo balcão até o lado de . Ela, que estava olhando para seu reflexo no espelho, subiu os olhos borrados de preto por sua maquiagem para o rosto impecável de sua colega mais próxima.
— Acho que bem — respondeu com sinceridade, sentindo as notas pinicarem seu seio. — Ganhei uma boa grana — ela sorriu, movendo apenas o quadril e os pulsos. Parecia uma bêbada cansada. Alysha já não dançava mais.
— Eu disse que você ganharia bem caso trabalhasse comigo — ela piscou, sorrindo e mordendo o canto inferior do lábio. — Ainda estamos pegando leve com você.
— Acha que Richard vai me deixar ficar? — perguntou com certo medo na voz.
— Quanto você ganhou, exatamente?
— Umas seiscentas pratas — ela sorriu com orgulho.
— Só com danças? — Alysha franziu o cenho. — Você fez algum serviço especial?
— Um cara quis, mas Angel o roubou de mim — rolou os olhos, agachando-se e sentando-se no balcão. O barman encarava fixamente o fecho preto de seu sutiã.
Quando Alysha abriu a boca para responder, a porta de vidro se escancarou novamente e um homem adentrou. Ele tinha cabelos castanhos e olhos de um azul tão escuro quanto a água de um oceano profundo e sombrio. Ele vestia uma blusa preta, com um mínimo decote em V, e suas calças também eram escuras. Seus olhos passearam por aquela boate e, quando se encontraram com os de , um sorriso brotou em seus lábios finos — o sorriso mais malicioso que ela ganhara na noite.
— Quem é o cara? — sussurrou Alysha, comendo-o com os olhos, estalando a língua enquanto assentia. — Ele é bem gostoso, diferente dos que eu atendi hoje.
— Eu o conheço — disse , colocando os saltos no estofado preto do banco giratório. — Ele morava em Bristol — franziu o cenho. — O que está fazendo aqui?
— Por que você não vai lá por si só e pergunta, gata? Não te custa nada... Pelo contrário — ela sorriu felina, dando uma cotovelada nas costelas de , que riu e a encarou. — Mas quem é ele?
— disse ela, encarando-o de volta. — O nome dele é .


06.

Sticks and stones may break my bones, but chains and whips excite me.

se acomodou em uma das mesas vagas, com os olhos fixos no corpo descoberto de . Ele migrou os olhos para os lábios dela, lembrando-se, subitamente, do gosto de seu sangue, do macio aveludado de suas peles se roçando com o deslize suave proporcionado pelo suor. Encarou-a rebolando suavemente, tentando provocá-lo com sua malícia — e aquilo o fez sorrir.
Uma garota tão bonita...
Uma garçonete com roupas eróticas e coleira se postou em seu campo de visão, excluindo . Ele passou os olhos por ela, notando sua tatuagem de cruz no meio dos volumosos seios cobertos apenas pelo tecido fino e transparente de um sutiã descartável.
— Eu posso te servir alguma bebida, senhor? — ela indagou com seu usual tom vulgar, inclinando-se na direção dele. — A noite está no fim, mas ainda não terminou — ela sorriu.
— Com certeza — ele assentiu, arqueando uma das sobrancelhas enquanto lambia os lábios. — Whisky. Dose tripla e sem gelo — a mulher assentiu, piscando.
Quando ela se afastou, ele se colocou de pé, caminhando até próximo do balcão de vidro, encarando o rosto de com a sombra de um sorriso nos lábios.
— Você poderia dançar para mim? — ele indagou, acompanhando-a se agachar e sentar a parte traseira das coxas nos tornozelos, encarando-o com os olhos luxuriosos.
— Me ajuda a descer? — ela esticou a mão, esperando que ele a tocasse. Quando o fez, um choque quente passou por seu corpo.
Seus olhos foram consumidos pelas imagens daquela primeira noite que passara com ele, na brutalidade de seus dedos, na forma animalesca que ele beijava seus lábios.
desceu com um pequeno pulo, fazendo-o soltar uma risada nasalada. Com os saltos, ela ficava um centímetro ou menos mais alta que ele, fazendo seus olhos entrarem em perfeita conexão, bastando virar o queixo.
tornou a se sentar na mesma mesa de antes, com as pernas abertas e as mãos relaxadas no espaldar preto daquele sofá que emoldurava a mesa de metal frio. se meteu entre ele e a mesa, sentando-se ali, com os pés apoiados ao lado de seus joelhos, com as pernas abertas e as mãos espalmadas atrás de seu quadril. Ela jogou a cabeça para trás, empinando os peitos, sentindo os olhos dele ali.
A música começou a soar em sua cabeça.
Passou a mão pela lateral do corpo, espalmando-as nos peitos, acariciando-os enquanto tornava a encará-lo nos olhos, diretamente. Puxou as pernas, colocando-as de lado, e se ajoelhou, ficando de quatro, sentindo o frio do poste de pole-dance entre suas pernas, no vale de sua intimidade. Ela abaixou o tronco, ficando próxima dele, conseguindo sentir seu hálito quente, seu cheiro completamente entorpecente. Fechou seus olhos e, sem querer, gemeu baixo, mordendo os lábios. Tornando a ficar ajoelhada, segurou-se no poste e puxou o corpo com as mãos, ficando de pé. Rodou uma vez naquele bastão, sustentando seus olhares, acariciando-o como se estivesse com seu membro em mãos, indo e vindo lentamente. Quando tornou a ficar novamente parada à frente de , migrou os olhos para o meio de suas calças.
Não havia volume nenhum ali.
Ela sorriu novamente, virando-se de costas. Juntou as pernas e moveu o quadril, indo de um lado para o outro lentamente, rebolando; acariciou a lateral de seu corpo e jogou o cabelo para cima de um dos ombros, enquanto apoiava o queixo no outro, encarando-o. Subiu as mãos por suas costas e tocou o fecho do sutiã, desatando-o com facilidade; sentiu as alças escorregando por seus ombros e bíceps até o antebraço, então o abaixou de repente, lentamente, escutando-o cair na mesa. a encarou e, suavemente, abriu um sorriso mínimo no canto de sua boca. se virou para ele novamente, com os cabelos para trás, os seios livres de qualquer tecido.
A garçonete apareceu com uma bandeja de plástico transparente com o copo de whisky de . Ele se virou para ela, sorrindo de modo mais vulgar e malicioso quando a encarou seminua oferecendo-o aquela bebida.
sentiu o corpo ficar quente, um arrepio de raiva passar em sua espinha.
— Obrigado, querida — ele deu um gole, tateando sua carteira em busca de uma nota de cinquenta. Colocando-a gentilmente em cima da bandeja, a viu sorrir e se virar, acompanhando o movimento singular que suas nádegas faziam sempre que ela movia uma das pernas. Ele chegou a entortar o pescoço para ver mais além.
pigarreou.
— Quer que eu a chame para dançar para você? — indagou . Quando se voltou para ela, seus braços estavam cruzados.
— Você fica linda enciumada — ele riu, dando outro gole.
— O que você está fazendo em Manhattan? — indagou ela.
— Não estou te pagando para conversarmos — seu tom era seco; o sorriso havia sumido de sua boca.
bufou, virando-se de costas, rebolando no poste de pole-dance, com as mãos acima da cabeça. encarou o movimento de sua lombar, lembrando-se de como ela se movimentava quando por cima dele.
Aquilo o causou um arrepio peculiar na barriga, de excitação.
Quando se voltou para ele novamente, molhou seus lábios e ficou de quatro na mesa, se aproximando o máximo que podia do rosto dele. Sentiu seus olhos escuros pela falta de luz passeando nos detalhes de seus olhos e lábios, a luxúria consumindo-o tão lentamente quanto a morte.
— Quais são os serviços especiais? — ele indagou, molhando os lábios antes de tomar outro gole de sua bebida. sorriu, soprando uma risada.
— Depende do que o senhor quer.
— Sexo — ele fora direto, fazendo-a soltar outra risada nasalada.
— Eu não sou prostituta...
— Então eu não te pago. Você faz por vontade própria — ele sorriu sem mostrar os dentes, acompanhando-a se afastar para sentar-se novamente nos calcanhares, com as mãos espalmadas nas coxas alvas. Os olhos de estavam direcionados para os peitos dela. — Qual o nome que você usa aqui, ? — ele subiu os olhos para os dela. — Britney? Lauren? — ele respirou fundo, apoiando os cotovelos nos joelhos, se aproximando dela por uma segunda vez.
— Meu nome é Scarlet — ela sorriu docemente para ele, aproximando-se também — E eu estaria feliz em realizar todos os seus desejos.

Ela não conseguia acreditar que já estava subindo aquelas escadas no seu primeiro dia. Quando chegaram ao segundo andar, sem se tocarem, virou os olhos para a cúpula e arqueou uma das sobrancelhas, sabendo que Richard estava ali, que ele a observara durante toda a noite.
A partir daquele momento, ela não sentia mais mínima vergonha. Estava gostando da sensação. Durante toda a noite, ansiava pelo momento que pudesse, enfim, deitar em uma cama, e, agora que acontecia, ela não poderia estar mais satisfeita em ver quem adentrava aquela porta vermelha em sua companhia.
O quarto era mais simples que o resto do lugar. Havia uma segunda porta que dava para outro corredor, o que os levaria para uma pequena sex shop e o banheiro. As paredes eram carmins, como o resto do lugar, o chão era de carpete macio e preto. A cama era redonda, coberta por um tecido que parecia couro vermelho. As luzes eram espalhadas pelos quatro cantos, deixando-o em uma penumbra confortável com a ajuda de algumas velas aromáticas suaves. A música era facilmente ignorada e não se ouvia nenhum mínimo gemido dos vizinhos.
— Quais produtos vocês oferecem nessa sex shop? — indagou com a voz grossa, arranhando as paredes de sua garganta. , que até agora se encontrava observando a cama, virou-se para ele subitamente.
— Vibradores — ela disse, fazendo-o rir. — Lubrificantes, anéis penianos, calcinhas comestíveis, óleos pa...
— Eu quis dizer produtos interessantes — ele se virou para ela, encarando-a com os olhos sugestivos.
— Mordaças — ela molhou os lábios, juntando as mãos e as pernas. Parecia uma moça comportada, tirando a roupa que vestia. soltou uma risada nasalada quando a viu daquela forma, se virando completamente para ela. — Algemas. Chicotes. Mas você paga uma taxa extra — avisou logo, lembrando-se. — E não pode ser usado em mim.
— Por que não? — ele inclinou o rosto e arqueou uma das sobrancelhas.
— Normas da casa — ela levantou um dos ombros, começando a sentir as mãos ásperas dele tocando o nu da curva de sua cintura. Quando ele tocou os lábios, roçando sua barba por fazer no pescoço dela, se arrepiou e fechou os olhos de maneira tão suave que mal pôde perceber.
— Você não poderia abrir uma exceção para mim? — ele soprou, mordendo-a, puxando sua pele.
passou a palma da mão no algodão preto da camisa dele, sentindo um cordão pendurado em seu pescoço. Ela abriu os olhos, franzindo o cenho enquanto puxava, discretamente, aquele cordão de prata. Acompanhou com as pupilas curiosas enquanto o volume do pingente caminhava pelo peitoral dele.
Quando estava próximo o bastante da gola, segurou seus dedos.
— Você pode abrir uma exceção para mim, ? — disse mais firme, olhando fundo em seus olhos.
— Meu nome é Scarlet — ela gemeu com o impacto quando ele a beijou novamente, sugando seu pescoço com força, mordendo o osso de sua mandíbula.
— Eu sei que você quer ver como eu as uso — ele soprou uma risada, roçando seus lábios úmidos na pele avermelhada de seu pescoço, lambendo o contorno de seu maxilar a caminho do queixo, subindo discretamente para seu lábio inferior. Abocanhou-o por apenas um segundo, chupando-o para vê-lo vermelho e brilhante na pouca luz.
Ele conseguia sentir o fluxo sanguíneo dela no local onde a chupava. Conseguia sentir o cheiro de seu sangue, conseguia senti-la arfando, querendo-o tanto quanto ele a queria naquele momento.
— Talvez eu poderia...
— Quero algemas, uma mordaça e uma venda — ele disse rápido, se afastando dela, ficando de costas, avaliando uma das velas. sentiu frio e, ainda um pouco zonza pelos toques dele, assentiu e mordeu o interior do lábio inferior, caminhando em seus saltos altos até a porta que a levava para o corredor escuro.
Ela seguiu por aquele lugar, como Alysha havia explicado — sem muita fé — horas antes, e adentrou a loja com porta de missangas pretas. Com paredes forradas de estofado vermelho e o chão de porcelanato preto, o estalido lento de seus saltos entregava a curiosidade de seus olhos, que passeavam pelas infinitas prateleiras com os mais diversos brinquedos sexuais em extrema condição de limpeza.
A câmera era grande e evidente, apontada para a porta e para os quatro cantos da pequena loja improvisada.
Ela foi direto para os sadomasoquistas, escondidos na última prateleira, no finalzinho da sala.
passou os olhos pelos mais diferentes — e até inusitados demais — e fechou as pernas trêmulas em excitação em um V contorcido. Apoiou a mão na prateleira preta e buscou com os olhos algo que não fosse extremamente humilhante — dentro daquela extensa lista, havia máscaras com apenas dois minúsculos furos para as narinas e um zíper para a boca; roupas sem furos para respiração, com apenas um rasgo no meio das pernas; aparelhos de tortura que abriam dentro do corpo de uma pessoa; eletrochoques fortíssimos; mordaças extremamente humilhantes e chicotes com pequenos plásticos pontiagudos que, dependendo da intensidade, poderiam perfurar a pele de alguém.
Ela franziu o cenho, sentando-se nos calcanhares, esticando-se para pegar uma algema quase inocente comparada às outras, forrada com veludo, uma venda qualquer dentre as tantas expostas e um chicote de couro preto parecido com os que usavam em cavalos.
Sem conseguir se controlar, ela encaixou o brinquedo no pulso e, em um único movimento um tanto quanto forte, chicoteou a própria coxa.
O estalo fora alto o bastante para criar eco naquela loja pequena e fria pelo ar condicionado. Ardeu, machucou, e soltou um grunhido pela dor, mordendo os lábios. Uma linha reta e extremamente vermelha havia se formado em cima de sua pele branca.
— Merda — murmurou, colocando-se de pé enquanto virava-se para a saída.
Ela quase soltou um grito quando encarou parado, encarando-a com os olhos risonhos e um sorriso malicioso nos lábios. Ele estava com a lateral esquerda do corpo recostado no batente, com as missangas por detrás de seus ombros, e a mão direita apoiada na outra extremidade — tampava sua passagem.
— Já peguei — disse ela, sorrindo sem mostrar os dentes. — Podemos voltar para o quarto agora.
— Tem bastante coisa aqui — disse ele, passeando os olhos pela prateleira escondida.
— Você não pode estar aqui, isso é...
— Contra as regras? — ele riu, tirando a mão do batente, negando com a cabeça. — Você nunca pareceu uma menina que gostasse de seguir regras, , não sei por que está fazendo isso aqui.
Ele se virou, caminhando pelo corredor, tornando a adentrar o quarto enquanto permanecia parada.
Ela ouviu o som de outra porta ser destrancada.
— Porra — sussurrou, se apressando pelo corredor, correndo até o quarto. — Você não quer mais? — ela indagou, mordendo os lábios. Ele ainda estava parado na porta e não se virou para mostrar o sorriso de sua risada.
— Acho que poderíamos deixa para outr...
— Eu quero que você use essas coisas em mim — disse, fazendo-o virar-se para encará-la. — Fodam-se as regras.
Ele assentiu apenas uma vez, arqueando as sobrancelhas enquanto tornava a fechar a porta.
— Nós vamos brincar com as minhas regras, então — ele molhou os lábios. — Eu vou fazer o que quiser com você, porque hoje você é minha putinha, e, se caso você mover um músculo, eu te chicoteio, bato em você. Quero que fique quietinha...
riu, sem se controlar, depois mordeu a boca e assentiu. apenas arqueou uma das sobrancelhas, deixando um resquício de sorriso malicioso beirando em seu lábio inferior. Fechou a porta com cautela, sem fazer barulho, e indicou com a cabeça para que ela se deitasse na cama. Ela o fez, sentindo o coração bater forte em ansiedade e a palpitação em suas entranhas derreter cada mínimo milímetro de sanidade em suas células cerebrais.
Ela acomodou os brinquedos ao lado de seu corpo e acompanhou enquanto ele, parado no final da cama, no caminho do meio de suas pernas, tocava a gola da camisa preta pela nuca e a arrancava do corpo, jogando-a no chão.
O cordão que a chamou a atenção antes era de vidro e continha um líquido vermelho dentro, mas, agora, tudo que os olhos de conseguiam enxergar era o quão definido era e o quão excitada ela poderia ficar de apenas observá-lo se despir.
Ele desabotoou sua calça jeans, deixando-a semiaberta quando, de quatro, caminhava por entre o corpo de , se posicionando entre suas pernas, encarando seu corpo branco adquirir uma tonalidade rosada pela cor do quarto.
aproximou o rosto do dela, roçando sua barba por fazer no osso de seu maxilar e, suavemente, passar a língua pelo lóbulo de sua orelha, caminhando a mão pela lateral de seu corpo, arranhando-o com suavidade, aumentando a pressão conforme chegava próximo das costelas. , em um movimento quase involuntário, começou a apertar as pernas em torno da cintura dele. No momento em que suas peles se tocaram, ele desviou em uma rapidez incrível e deu um tapa com extrema força no meio de sua coxa.
Ela gemeu, franzindo o cenho.
— Eu mandei você ficar quieta, porra. Qual parte você não entendeu? — ele disse sério e baixo, olhando-a no fundo dos olhos. Quando ela abriu a boca para responder, ele deu outro tapa, dessa vez com mais força. A marca de sua mão já estava ali e o som ecoava nas paredes. — Eu não quero ouvir a sua voz hoje.
juntou os lábios em uma linha.
sorriu com extrema malícia, tornando a deitar seu tórax por cima do dela, beijando o pescoço e o busto dela, tateando o colchão até encontrar as algemas. Sentou-se nos calcanhares, prendendo os pulsos dela com extrema força na cabeceira da cama, deixando-os tão justos que ela mal conseguia movê-los.
— Arqueie o tronco — mandou. jogou suavemente a cabeça para trás e o fez, sentindo as mãos dele em suas costas, abrindo o fecho do sutiã. Desatou as alças removíveis e os libertou, mostrando-os tão excitados quanto vermelhos.
acompanhou com os olhos enquanto descia o rosto para o busto dela novamente, partindo direto para os seios agora expostos. Ele mordeu os mamilos eretos e duros com certa força, chupando-os e excitando-os com a língua. mordeu a boca e encolheu os dedos dos pés para não soltar um ruído sequer, com medo do que ele poderia fazer. Conforme sua palpitação crescia, ele baixou os dentes e a língua para o caminho de sua barriga, passando por seu umbigo, chegando na beira da calcinha. Sem encará-la, ele puxou-a com certa brutalidade, empurrando-a para o chão. Abraçou as coxas dela, puxando-a para cima, ficando sentado em seus calcanhares, então abocanhou seu clitóris e o chupou com extrema intensidade, fazendo movimentos circulares com a língua, arranhando os dentes com certa pressão, roçando os lábios e o nariz em sua vulva. contorcia os dedos das mãos, controlando-se ao máximo para não gemer — quando não suportou o prazer, abriu a boca e soltou uma lufada de ar, recebendo uma mordida no interior da coxa, próximo à virilha, em consequência.
passou a respirar com a boca entreaberta, deixando que seus sopros tocassem a pele úmida e vermelha da intimidade extremamente excitada e sensível de . Ele desceu a mão por seu próprio corpo e libertou seu membro rígido, começando a se masturbar. Quando tornou a sugar seu clitóris, fez ainda com mais pressão, dando atenção única para aquela terminação nervosa.
franziu as sobrancelhas e abriu a boca, começando a sentir o quadril esquentar. Com aquela série de sucções em seu clitóris, ela sabia que o orgasmo seria rápido e extremamente intenso. O movimento que o corpo de fazia conforme ele se masturbava e o barulho de sua própria respiração, soprada contra sua intimidade, rapidamente a fazia delirar em graus altíssimos. O quadril de se contraiu involuntariamente quando o orgasmo começou a surgir, fazendo-a ir e vir, arrepiando ainda mais seus mamilos, fazendo um ofego parcialmente alto aparecer em sua garganta. Ela abriu os olhos e impulsionou o corpo para cima, recebendo os olhos maldosos de em cima daqueles vários movimentos. Ela mordeu com força os lábios e apertou os olhos, contraindo os dedos das mãos e dos pés.
soltou seu quadril, fazendo-o tombar como um pedaço de carne crua no couro. Com as pernas abertas e a respiração um pouco descompassada, começava a ficar com a pele brilhante pelo suor.
O primeiro item havia sido usado.
Ele se esticou por cima dela novamente, pegando a venda. Ela quase temeu pelo que vinha, mas o sentimento de prazer e curiosidade crescia e se sobrepunha a todos os outros.
— Traga o rosto para cima — ordenou com a voz grossa. obedeceu, sentindo os cabelos pregarem suavemente na nuca quando ela os desgrudou do couro.
a vendou. Agora seus outros sentidos estavam muito mais sensíveis.
— Eu não quero que você veja; eu quero que sinta — ele soprou uma risada contra seu ouvido, fazendo-a arrepiar.
Depois, ele se afastou. não sentia nada além do veludo das algemas em seus punhos.
Em um segundo, as mãos dele tocaram sua cintura; ele a virou de quatro, tocando o interior de suas coxas para que ficassem separadas e bem posicionadas, afastadas do apoio mínimo de suas mãos de forma que sua lombar ficasse levemente para baixo e a bunda empinada. , primeiro, com delicadeza, acariciou sua nádega esquerda, e, depois, deu um tapa tão forte e alto que as paredes cantaram. Ela contraiu o rosto, mas gostou, sorrindo com malícia. Depois, a mão dele se posicionou nos cabelos de sua nuca, puxando-os até que seu pescoço ficasse ereto; a outra mão se guiou até o pescoço, apertando-o na pressão ideal, com o polegar e o indicador nos ossos da mandíbula.
— Você é uma garota que consegue controlar os instintos, ? — ele indagou para ela, que permaneceu com a boca calada. O membro dele roçou em sua intimidade extremamente molhada, adentrando apenas a glande. — Nós esperamos que sim — ele riu.
Então começou a se movimentar com tanta força e intensidade que sentia a nuca arder, conforme aquele era o único modo dele controlar o movimento de seu corpo. Ele a puxava de volta sempre que seu corpo ia para frente, apertando também seu pescoço. Estocava com tanta força que sua cabeça foi impulsionada para trás, seus olhos fechados, sua boca entreaberta. Ele puxou o ar entredentes, mordendo o lábio inferior, soltando-o úmido e vermelho enquanto soltava o pescoço dela para segurar sua cintura extremamente maravilhosa posta naquela posição. Apertou-a com tamanha força que a marca de seus dedos ficou tatuada ali com extrema facilidade.
A boca de estava aberta e ela realmente fazia força para não começar a gemer de tanto prazer. Seu deleite era tamanho que ela sentia o nariz arder e os olhos umedecerem. Ela apertava as unhas nas palmas das mãos para tentar se controlar, mas nem mesmo isso era suficiente para que ofegos não saíssem de seus lábios entreabertos, que puxavam lufadas de ar para encobrir seus gemidos.
Quando ele gemeu, trazendo com tanta força o corpo dela para ele, ela sentiu que explodiria. Puxou a cabeça para baixo, sentindo os cabelos serem pressionados pelos dedos dele, recebendo um tapa forte na nádega por isso — mas aquela sensação foi tão gostosa que ela quis outra vez. Impulsionou o corpo para trás, recebendo ajuda da cabeceira, e rebolou contra a cintura dele — apertou as unhas contra a pele de seus ilíacos, quase perfurando-as.
finalmente liberou aquele delicioso gemido que perfurava as paredes de sua garganta.
Agora começou a mover-se com mais intensidade, querendo apanhar. Ajudava-o sempre que seu corpo ia para frente, chocando-os com mais força, sentindo cada vez mais o deleite entorpecer sua cabeça, consumindo-a em espirais de êxtase.
Ela gemeu o nome dele, implorando mais. Seu prazer era tão grande que ela pensou que choraria, com as sobrancelhas encolhidas e o nariz ardendo conforme o clitóris ficava cada vez mais inchado e sensível. As estocadas do corpo dele, em movimentos surreais, fazia com que o orgasmo parecesse acumular com vários outros.
riu em meio ao deleite e ao êxtase, sentindo o suor descendo em gotas por sua têmpora. Ele subiu as mãos em forma de garra pelas costas dela, começando do baixo da lombar até o meio das costelas, descendo até os seios. Sentiu os mamilos tão duros quanto rochas e brincou com eles, apertando-os e excitando-os, massageando-os conforme não parava de se mover com a mesma intensidade de antes.
Quase como um humano, ele começou a sentir os músculos queimarem por não pararem de se mover por um segundo sequer.
gemeu alto quando o segundo orgasmo a atingiu. Veio como uma bomba, um tiro de canhão. Desconcertou-a completamente, fazendo-a encolher os dedos dos pés e das mãos, encurvar as costas, gemer alto e quase chorar, chamando o nome dele, quase pedindo que ele parasse por um segundo, para deixá-la se recuperar. Mas mesmo enquanto o orgasmo continuava, ele não parou de se mover — parecia ter um estímulo a mais, indo com ainda mais força, segurando-a com mais brutalidade. Quando parecia terminar, outro começava, indo e vindo em ondas cada vez mais intensas que percorriam cada mínimo espaço de pele de seu corpo, arrepiando e excitando até os cabelos.
a segurou pelos seios e a virou de barriga para cima, torcendo seus braços. O rosto de estava vermelho e suado, completamente tomado pelo tesão. Ela respirava com a boca aberta e, por detrás daquela venda, ele podia facilmente ver seus olhos marejados, graças às sobrancelhas ainda encolhidas, que mostravam certo receio pelo que estava por vir.
Ele abriu suas pernas pelos joelhos, metendo-se em seio meio. Agora sua respiração rápida batia nos lábios dela e suas unhas ficavam cravadas na pele de sua coxa, arranhando-a, ficando-se ali para puxá-la sempre que um pico de prazer crescia em seu corpo.
Ele tinha liberdade para passar os olhos no movimento que o corpo dela fazia quando os dois se chocavam, liberando aquele delicioso som para as paredes daquele puteiro. Ele riu de forma nasalada quando sentiu a intimidade dela palpitar em outro orgasmo, assistindo-a jogar a cabeça para trás e clamar aos céus.
— Você realmente quer que eu pare? — ele perguntou em um sussurro, passando a barba por fazer no pescoço dela e, depois, a língua no suor que descia por trás de sua orelha. — Quer, ? — ela negou com a cabeça e ele a chicoteou na barriga. franziu o rosto e o jogou para cima novamente, tendo outro orgasmo. Ele riu dela.
se moveu com mais força, trazendo-a para perto, deixando-a com o tronco levemente inclinado. Ele a abraçava pela lombar, respirando em sua boca, mordendo-a e chupando-a sempre que tinha vontade, gemendo próximo de seu ouvido, mordendo seu pescoço e chupando sua pele. Quando um pico de prazer crescia no meio de sua barriga, ele a apertava com mais força, fazendo-a ofegar com mais intensidade, recebendo outra chicoteada.
Pouco a pouco ele começou a prever seu orgasmo. Ele se moveu com mais força, sem parar por um segundo, colocando e tirando seu membro inteiro dela, vendo-o reluzir por causa da excitação evidente de . Colocava-o todo, depois o tirava, tudo numa velocidade incrível. O pico crescia no começo de seu membro e ia até o final de seu estômago, subindo e descendo em uma montanha russa de excitação. Quando chegou na descida mais alta, ele jogou sua cabeça para trás e soltou um gemido rouco enquanto jorrava seu líquido dentro dela, sentindo todos os pelos de seu corpo se eriçarem. Ele abaixou a cabeça para vê-lo entrar e sair mais algumas vezes, depois o tirou por inteiro e se masturbou roçando-o na barriga vermelha de chicotes de , subindo-o até seus seios, metendo-o no meio, juntando-os para que ela o masturbasse algumas poucas vezes antes de chupar a glande e engolir o restante de seu gozo, lambendo-o inteiro.
respirou fundo e passou a mão nos cabelos molhados, levando o corpo para trás enquanto sentava-se nos calcanhares, sentindo todos os músculos queimarem. Ele encarou submissa mais uma vez, completamente apática do que ele estava fazendo agora. Viu-a de boca aberta, vermelha como uma cereja, a intimidade aberta, úmida e brilhante, e o corpo cheio de marcas de chicotes, unhadas e palmadas.
Ele negou com a cabeça, esticando-se para libertá-la apenas das algemas, deixando que o resto ela fizesse sozinha.
Colocou-se de pé e buscou suas roupas, começando a se vestir. o acompanhou com os olhos, sem conseguir reagir a absolutamente nada.
Nunca sofrera orgasmos tão intensos em toda a sua vida.
— Você já vai? — fora a primeira indagação que passou em sua cabeça, e, consequentemente, a primeira que falou em voz alta. Ele a olhou com um quê de ironia nas pupilas.
— Por que eu ficaria aqui? — ele elevou as sobrancelhas por um segundo, depois se abaixou para vestir as calças.
Ela não respondeu, ficando de pé. Colocou a venda como se fosse uma tiara e cruzou os braços.
— Você vai querer ficar com o chicote, as al...
— Pode jogar essas porras no lixo — respondeu rígido, enquanto desvirava a blusa. O pingente reluziu sob a luz das velas.
— O que tem dentro do pingente? — ela franziu o cenho, dando um passo para frente.
— Não interessa — ele lançou um olhar gélido para ela, vestindo a camisa. Ela rolou os olhos, se sentou no colchão e desatou os sapatos, colocando-os entrededos quando tornou a ficar de pé.
— Preciso que assine um documento dizendo que comprou os...
— Pega o dinheiro e cala a boca. A regra ainda está valendo enquanto estivermos dentro dessa espelunca — ele jogou um bolo de notas de cem em cima do colchão ao lado dela.
franziu o cenho.
— Qual é a porra do seu problema, ? — ela se colocou de pé, falando um pouco mais alto. — Pega essa merda de dinheiro e enfia no cu, porque eu não vou aceitar. Eu não sou puta.
Ah — ele riu, negando com a cabeça. — Não é isso que parece, trabalhando aqui, .
Ela preferiu não responder. Apenas caminhou até a porta e a escancarou.
— Vá embora daqui e não volta mais, nunca mais — ela não o encarou, mas pôde vê-lo sorrir.
— Com o prazer ainda me cercando, Scarlet.
E assim que ele pisou fora do quarto, bateu a porta com toda a força que ainda lhe restava.


07.

I see it. He looks good. He’s been feeding on the blood of the virgins again.

A manhã estava nascendo. O sol deixava o céu entre os tons de salmão e cor de rosa; as nuvens ainda estavam disformes, caminhando lentamente por aquela brincadeira, subindo, elevando-se para, mais tarde, tomarem suas formas gordas e marfins.
A cabeça de pesava uma tonelada. Aquela pouca luminosidade fazia sua pele queimar, deixando-a quente. A roupa que cobria suas pernas e seus braços parecia estar com o dobro de seu peso, conforme andar aqueles poucos quarteirões que a separava de seu apartamento se tornava uma jornada torturante.
Os carros passavam lentos; os táxis procuravam clientes, indo de um lado da cidade ao outro. Manhattan ainda despertava enquanto se preparava para outro período com os mesmos homens barrigudos, casados e infelizes com suas miseráveis vidas — só que, dessa vez, eles pediriam cafés e salgados com cheiro de queijo.
O estômago de embrulhou. Ela fez uma careta para a aurora, amaldiçoando o dia.
Ainda com o pescoço jogado para trás e os olhos fechados, ela respirou fundo e mordeu os lábios, sentindo-os arderem.
era um puto maldito.
Da próxima vez que se vissem — se voltassem a se ver, depois do que ele dissera a ela na noite passada —, ela socaria o estômago dele caso ousasse morder sua boca novamente.
Todos os incômodos roxos em seu corpo haviam sido causados por ele e aquela porra de chicote ou as algemas horrorosas.
Ela sentiu a bolsa em seu ombro pesar. Pelo menos a quantia que ele lhe dera fora suficiente para ser contratada por Richard — que, de fato, ficou espantado e até um pouco feliz com aquele tanto de dinheiro. A parte que recebera naquela primeira noite era realmente grande. Alysha estava certa: os efeitos colaterais são mínimos quando aquelas notas verdes estão brincando entre seus dedos.
Sua mãe que ficaria feliz.
Quando avistou o prédio onde morava, ela sorriu para o vento frio do início de manhã, aliviada. Subiu aqueles poucos degraus e, sem nem olhar para o porteiro, subiu os três lances de escada até o andar de seu apartamento. Com a respiração ofegante, ela tateou o bolso fronteiro de sua bolsa e sentiu o molho de chaveiros que sustentava apenas uma pequena chave prateada. Encaixando-a na fechadura, girou três vezes até a tranca cantar. Empurrou a porta e encarou o piso de madeira escura, o tapete pequeno da entrada e, ao lado do batente branco, os sapatos ortopédicos com um pequeno salto que sua mãe usava para procurar emprego.
Ela subiu os olhos azuis cansados pela saleta, encarando os cabelos pretos compridos de sua mãe bailando no chão, caindo pelo apoio de braço do sofá. O sol da manhã iluminava a pele branca adormecida de Maya, deixando-a cintilante de tão branca. Sua boca rosada estava até um pouco pálida.
, cuidadosa, fechou a porta e tirou sua bolsa, colocando-a em cima do balcão americano na cozinha, deixando ali, também, suas chaves.
O barulho pareceu um estrondo. Maya pulou, abrindo os olhos, sentando-se com as pernas esticadas para frente. Com os olhos arregalados e bolsas aparentes abaixo do escuro de suas íris, ela molhou os lábios e soltou um suspiro quando avistou o corpo magro de sua filha.
Fechou os olhos suavemente, passando a mão no rosto, querendo arrancar o sono para longe do corpo. Ela molhou os lábios, dando-os cor e brilho, virando-se novamente para a garota.
— Como foi no trabalho? — indagou rouca, elevando as sobrancelhas para ficar com os olhos cansados bem abertos.
— Foi ótimo — sorriu, colocando a mão por dentro da parte de trás de sua calça jeans, pegando algumas notas de dentro de sua calcinha. — Ganhei muitas gorjetas. Muitas — ela abriu um sorriso de criança que mostra sua primeira mesada. O dinheiro todo ainda estava atrás de sua lombar.
Maya assentiu, suspirando enquanto bocejava e fungava.
— Você precisa pegar alguns livros na biblioteca. Lembra-se do que combinamos? Trabalhar, mas estudar.
— Claro — sorriu falsa, olhando para baixo.
Escutou o estalido dos passos nus de Maya pelo chão de madeira, trancando-se em seu quarto. Sentiu a textura áspera das notas na ponta de seus dedos, então molhou os lábios e entornou o rosto para o lado da mãe. Seguiu pelo mesmo corredor, trancando-se em seu próprio quarto.
passou os olhos pelo vidro da porta de sua varanda, encarando a rua. Ela deu dois passos para trás, tocando os pulsos na fria madeira, fechando a porta sob suas costas. Encarou sua cama box, o lençol preto e o edredom com dizeres japoneses. Seguiu para ali, levantando-o com certa dificuldade por ser tão pesado.
, então, escondeu o bolo de notas, arrumando o edredom e o lençol antes de soltar um suspiro, arrumando a coluna ereta.
Ela tornou a passar seus olhos pelo quarto, encarando sua mesinha de canto que ainda parecia tão nua comparada ao que era antes.
Em seu antigo quarto, um livro de cabeceira, um abajur com cúpula quadrada e uma gilete sempre estavam ali, prontos para os dedos afoitos que não dormiam ou achavam paz quando o véu da noite caía sob a cidade.
Ali, em Manhattan, ainda não tinha sobrevivido uma noite daquelas. Tem ocupado tanto a cabeça com outros problemas que nem se lembrou de seus próprios.
Mas, agora, com tempo para lembrar, tornavam-se tão nítidos...
Ela teve o vislumbre, talvez a alucinação, de ver seu pai correndo escadaria abaixo para responder gritando os insultos de Maya.
O fantasma dele ainda estava ali, pairando vivo, andando de um lado para o outro em sua cabeça.
Ela fechou os olhos, reprimindo as imagens. Lembrou-se de estar distante, lembrou-se de que nunca mais iria vê-lo. Lembrou-se do silêncio, do canto dos anjos que atravessava o vidro, vindo do coração daquele refúgio que ela e Maya tinham em comum, agora, longe da Inglaterra, longe de Bristol, longe de George e suas maldições.
Estavam distantes, estavam se refugiando num paraíso. E viveriam ali para sempre.
Não havia motivo para temer, não havia motivo para se recordar.
Quando tornou a abrir os olhos, encolhidos pela claridade, encarou uma caixinha de veludo vermelho em cima de seu travesseiro.
Ela franziu seu cenho, olhando novamente para a varanda, encarando-a trancada.
Talvez Maya tenha encontrado algo de bom gosto, por mais que estivesse economizando para as contas de final de mês.
caminhou até tal local, sentando-se no alto de sua cama, pegando a caixinha entre os dedos. Puxou o pequeno laço cintilante que brilhava sob a luz da janela, deixando-o cair por cima do edredom grosso. Puxando o fecho dourado, liberou aquele presente de seu esconderijo.
Seus olhos brilharam com tamanha perfeição. Era uma pedra gigantesca e brilhante de safira. O anel era de ouro branco e brilhava como o sol. Contornando e segurando a safira, folhas desenhadas e detalhadas com diamantes brancos reluziam o brilho singelo daquela manhã.
perdeu o ar enquanto encarava aquele anel.
Quando tornou a encarar seu travesseiro, vislumbrou um pequeno cartão grosso, com as letras itálicas, grosseiras e firmes, traçadas de um preto extremamente forte que parecia se projetar para fora do cartão bege.
Ali, junto com um cheiro peculiar, estava a mensagem de quem havia lhe dado aquele presente:
“Não era minha intenção te ofender.”

E a assinatura embaralhada de logo abaixo.

O final da tarde anunciava seu tempo chuvoso.
olhou para a montanha distante que cortava o horizonte em uma silhueta disforme que subia e descia em rodamoinhos esverdeados. O cheiro do tabaco que vinha da fumaça translúcida de seu cigarro fazia seu nariz arder, mas aquele era o melhor vício que ele poderia ter — pelo menos naquele século.
Ele, enquanto procurava algum presente para a garota, subitamente deparou-se com seu passado, com os milênios que se passaram até que o tempo se encontrasse no presente.
Não fora bem uma onda de nostalgia, de melancolia. Foram apenas memórias gloriosas.
Quando encontrou a folha perdida do diário de Lilith, sua mãe, ele se clareou com aquela pequena confissão. Lembrou-se, como um raio, de todos os momentos que passou até que se encontrasse ali, em Manhattan, perseguindo uma garota com sangue amaldiçoado.
Lilith buscava, nas várias cidades em que morou durante sua imortal vida, mortais amaldiçoados. Seu plano era ser o demônio mais poderoso que o mundo já acolheu, já que nem o céu e nem o inferno aceitavam tal criatura, para conseguir vingança com aqueles que lhe traíram.
Quando abandonado por ela, depois que o hospedeiro de Samael se degenerou, se viu livre — e sozinho — em um mundo onde não podia existir ser mais soberano que ele. Abençoado com poderes inimagináveis, mais forte e prendado que qualquer outro demônio, executando com extrema destreza os golpes de um gladiador — já que durante quase vinte anos mortais de sua vida precisou se alimentar das carnes de guerreiros frustrados e fracos, divertindo romanos nos tempos antigos. Conheceu cada simples pedaço de terra que boiava por cima da lava do inferno, fodeu cada tipo de mulher, experimentou cada tipo de sangue, comeu cada tipo de carne. Viveu por séculos gozando de sua espécie, um demônio tão cheio de poder, tão invencível, comparado tantas vezes com um deus grego que sentia sede de sangue — algo que, literalmente, não era mais que uma simples verdade.
Ser filho de Lilith lhe trouxe habilidades que demônios comuns não têm. Ele era mais forte, mais atraente e sentia mais fome, era mais agressivo e impulsivo. Infantil, até, e um pouco mimado.
Quando começou a procurar em suas coisas mais lembranças do primeiro demônio em forma de mulher, encontrara coisas das quais nem se recordava.
Como aquele anel de safira.
Fora uma lembrança que Lilith deixara com Samael — queria que sempre que ele encarasse aquela pedra se recordasse dos olhos daquele que a traiu e, com isso, também se lembrasse das coisas que ela fazia com os que traíam a ela.
A insistência de Lilith em permanecer com aquela vingança era realmente inspirador, de modo que, quando se completasse, a história nunca mais seria a mesma.
E havia herdado isso dela, quando gerado dentro de seu corpo. Quando punha em sua mente que conseguiria algo, matava tudo ao seu redor até que não sobrasse nada, além dele, como opção.
De Lúcifer, havia herdado as habilidades, a modéstia, os piores pecados, a falta de paciência, a falsidade e a facilidade em manipular, a total destreza na arte de mentir. Como ele, era capaz de ter quem quisesse, de conquistar territórios, de matar pessoas sem remorso, de ser egoísta e egocêntrico.
Desde a eternidade, ele se achava mais parecido com o pai do que com qualquer pessoa.
Juntar uma alma humana dentro do corpo de um demônio gera um primogênito perfeito, com as piores — ou melhores — qualidade dos que cederam seus corpos.
Quem não conhecia seu pai?
Tão bem conhecido por querer mais do que poderia. Expulso das alturas, obrigado a cair para o caos. Mas ele se regenerou mais forte do que acreditavam. Construiu um império poderoso e teve um filho tão forte que poderia com facilidade herdar seu paraíso consumido em chamas e almas condenadas, perdidas, amaldiçoadas.
E com o sangue de , seria capaz de fazer tudo o que bem desejasse.
Era de vital importância fazê-la desejá-lo mais que o impossível.
Ele sorriu para o sol que se punha atrás das montanhas, exalando a fumaça acinzentada para a brisa contrária a seu corpo, sem vê-la dançar para longe.
Sua mãe teria orgulho do demônio que aquela pequena alma se tornou.

estava terminando de amarrar seu espartilho quando a porta atrás de seu corpo cantou, estralando, liberando o corpo de Richard. Ela, assustada, virou metade do corpo para encará-lo, com os olhos arregalados e o coração batendo forte na artéria do pescoço. Ainda com as mãos no último laço vermelho daquele conjunto preto, ela escutou o som divertido da gargalhada dele, que caminhava lentamente por cima do piso brilhante para trás dela, ajudando-a no último retoque.
Quando sentiu a ponta quente dos dedos de Richard bordando os seus, frios, ela deixou que os olhos caíssem para a ponta arredondada de sua sandália de saltos altíssimos.
— Hoje é a noite que mais temos clientes — disse ele, soprando baixo contra a nuca dela.
tinha os compridos fios presos em um rabo de cavalo frouxo que soltava mechas onduladas pela lateral de seu rosto bem maquiado; as íris azuis pareciam pular de suas órbitas, tão claras e cintilantes.
Richard deu o último laço em sua lingerie, segurando a curva fina de sua cintura para fazê-la virar-se de frente para ele, encarando seu queixo, sua barba por fazer. Mirá-lo nos olhos sempre trazia algum pequeno desconforto em , principalmente quando ela se lembrava de que ele era... bem, seu cafetão.
— Alysha comentou mesmo que a noite temática é a que mais interessa os homens — ela sorriu tímida, dando dois passos para trás, encarando-se no reflexo do espelho de corpo inteiro.
A meia-calça preta e o short apertado e justo de couro preto deixava o vermelho das listras de seu espartilho ainda mais cintilantes sob a fraca luz daquele quartinho; a tiara de chifres de demônio ficava perfeita acima de suas largas e gordas ondas naturais, presas com um elástico também vermelho. As unhas estavam pintadas de preto, tanto as da mão quanto as do pé, e o vermelho natural de seus lábios estava ainda mais realçado graças ao brilho rosado que usava.
Quando subiu os olhos para trás dos ombros, pelo reflexo, notou que Richard a analisava com um interesse maior que nos outros dias, quando ela fazia a prova diária de lingeries.
— Que... — ele começou, puxando o ar, franzindo o cenho. — Que perfume você está usando? — ele encarou seus olhos pelo reflexo, cruzando um dos braços sob o peitoral coberto pela camisa social preta. Os olhos olivas de Richard faiscavam.
— O mesmo de sempre... — disse ela, com um sorriso, virando-se nos calcanhares para ficar de frente para ele. Richard franziu o cenho e negou com a cabeça.
— Não é. Você está com um cheiro peculiar...
— Um cheiro bom? — ela tentou, colocando uma das mãos na cintura. Ele a encarou de relance, puxando o lábio inferior com o indicador e o polegar.
— Me lembra de uma mulher que conheci há bastante tempo... É doce, mas ainda assim amargo. Bom para as papilas — ele abriu um sorriso minúsculo para o chão. Quando tornou a encará-la, sentiu uma onda de calor passar pelo interior de suas coxas. — Enfim — ele estalou a língua, soltando os braços do corpo e se guiando novamente para a porta do quarto. — Se já está pronta, pegue seu lugar na pista de dança e me arrume muito dinheiro.

A música soava alta e ecoava nas paredes escuras da Burlesque. As garotas dançavam inspiradas, provocando aqueles mortais como se fosse o último dia de suas vidas.
não se separava dessa maioria. Tocava seu corpo, suava as têmporas e excitava todos os olhos que tocavam nas curvas sinuosas de seu corpo coberto por poucos tecidos.
Quando a porta se escancarou pela milionésima vez naquela madrugada, os olhos de faiscaram em excitação quando avistaram o corpo dele.
Estava coberto por uma jaqueta de couro preta e uma calça jeans igualmente escura; os pés escondidos por tênis escuros e sem cadarços estavam frios pela chuva que ensopava as ruas de Manhattan. Quando adentrou aquele cômodo, ele passou seus olhos escuros como a noite por todos os mínimos corpos expostos, sorrindo com perversão ao encará-la ali, posicionada no meio do balcão de vidro, dançando com extrema malícia.
se excitou apenas pelas roupas que ela estava usando.
O chifre vermelho reluzia na pouca claridade, seus olhos brilhavam como uma onça que se move lentamente pelo chão à caminho de sua presa.
Mas, subitamente, ela se lembrou das palavras que ele proferiu na noite passada. O bolso traseiro de seu estreito short pesou, fazendo-a recordar-se também do anel que ele havia dado. As perguntas da manhã invadiram sua cabeça novamente: onde ele conseguiu? Por que deu a ela? Ele não espera que ela use, espera?
Com um sorriso maligno nos lábios, ela se virou de costas para ele e roçou a lombar e a bunda empinada no poste de pole dance, passando as mãos no cabelo.
Ao seu lado, Angel, em um clichê absurdo, se vestia de anjo. A lingerie rosa era transparente, as asas brancas com plumas macias e aveludadas estavam tão bem presa às suas costas que até pareciam reais. As duas, ali, lado a lado, atraiam a maioria dos olhares famintos daqueles lobos solitários e infelizes.
caminhou pelas pessoas que estavam ali como se elas não existissem. Seus olhos estavam vidrados na figura demoníaca de , naquele sorriso perverso que beirava o canto de seus lábios, no movimento singular de seu quadril, no modo delicioso que suas mãos percorriam aquela pele quente, úmida, excitada... A pele que ele almejava sentir novamente.
Ele se sentou no único banco vago do balcão de vidro, onde do lado esquerdo de seu corpo o salto de batia sempre que ela se movia de um lado para o outro.
Ela se abaixou, ficando de quatro, com o rosto próximo o bastante dele para que seu cheiro entorpecesse os sentidos dele, fazendo-o sentir saudade do toque de sua boca.
— Como posso te ajudar hoje, senhor? — ela indagou, encarando o mínimo vão de pele que sobressaía entre os três primeiros botões abertos da blusa social preta dele.
— Eu quero que você dance para mim de novo.
— Hoje eu não posso... — choramingou ela, falsa, fazendo um biquinho com o lábio inferior. — Hoje minha carne pertence a todos esses homens... — ela riu perversa, tornando a ficar de pé, dançando com malícia, rebolando proposital e extremamente próxima dele.
mordeu seus lábios, apoiando os pulsos no vidro, indo com a cabeça um pouco para trás. Ele encarou a saliência no bolso do short de couro dela, lembrando-se subitamente do presente que ele lhe dera mais cedo.
Não estava em nenhum de seus dedos.
— Você gostou do presente que eu te dei? — indagou, fazendo-a apoiar o queixo no ombro e abaixar os olhos para olhá-lo no rosto.
— Eu fiquei curiosa para saber de onde você roubou — ela riu, mordendo os lábios, tornando a virar-se de frente para ele, sentando-se no balcão. As extremidades dos joelhos dela estavam encaixadas com as palmas das mãos de . Ele, então, começou a acariciá-la sem mover os braços, em um carinho simples e minúsculo, circular com a ponta dos dedos.
arqueou o quadril e puxou o anel dali, deixando-o na palma da mão.
— Eu não vou usar isso — ela encarou a pedra preciosa brilhando.
— Por que não? Combina com você — ele encarou fixamente os olhos dela, querendo penetrar sua alma. molhou os lábios, percebendo outro par de olhos em seu corpo.
Quando virou o rosto para cima, percebeu os olhos olivas de Richard fuzilando-a.
Ela, então, desceu do balcão e empurrou a cadeira de para o meio da pista. Algumas meninas gritaram, aplaudindo, enquanto soltava uma risada divertida da garganta.
sorriu maliciosa, engolindo sua vergonha. Virou-se de costas e, ouvindo a música ser trocada, começou a rebolar, passando a mão na lateral do corpo, puxando suavemente os laços de seu espartilho que lhe apertava os seios para cima. Empinando a bunda para trás, sentiu os olhos dele ali, clamando por proximidade. E ela o fez, dando apenas um passo para trás para que suas peles estivessem em contato novamente. As mãos dele tocavam o interior de suas coxas, controlando-se para não ir além e ser expulso por ir contra as regras daquele lugar.
Quando se virou novamente, deitou-se por cima dele, com os peitos próximos o bastante de sua boca para que ele enlouquecesse com o pensamento de abocanhá-los.
O cheiro dela era tão bom...
— Eu não vou usar — disse , roçando o anel na nuca de — Porque, no fundo, você está certo. Aqui você é meu cliente e lá fora você não é nada além de um desconhecido.
— Você faria o que fez comigo naquela primeira noite com um cara desconhecido? — ele sorriu com malícia, soprando uma risada no pescoço dela. tornou a ficar de pé, indo para trás de , passando as mãos pelas costas enquanto deitava o tronco, ficando com as pernas esticadas e a virilha livre para os olhos de curiosos. — Eu deveria ter cruzado com você antes, então...
Ela, mesmo sem querer, riu baixo.
— Eu não aceito presentes, só dinheiro. E como você entrou na minha casa? — ela sussurrou na orelha dele, mordendo seu lóbulo.
— Eu tenho meus métodos — ele fechou os olhos, jogando a cabeça para trás. passava as mãos por seu peitoral, arranhando-o enquanto, lentamente, desabotoava sua blusa para tocar sua pele quente, sentindo suas texturas se fundirem em uma só.
Quando o tocou, sentiu uma onda de calor passando por seu corpo. As veias abaixo de seus olhos pareceram saltar e, conforme sua cabeça ainda se encontrava estirada para trás, o perfume e a pulsação de ficavam próximos demais de seu nariz, de seus dentes... A mão dela passeava em carinhos torturantes por seu peitoral, agora, nu, e as unhas compridas deixavam três rastros avermelhados que logo desapareciam. Ela começou a beijar lentamente a linha do maxilar dele, arranhando-o com os dentes, chupando-o a base da clavícula.
rolou os olhos por baixo das pálpebras.
— Eu daria minha vida para te ver usando apenas esse anel. Nua, excitada, com cor nenhuma exceto essa safira — ela sorriu, voltando-se para frente dele, sentando-se em seu colo, rebolando em seu quadril. Ela, delicadamente, segurou os pulsos dele e os colocou para trás da lombar, deixando-os unidos, segurando-o com seus dedos.
Ele sorriu, excitando-se ainda mais com as recordações da noite passada.
O movimento pequeno de vai-e-vem do quadril dela sob o dele causava delírio. Era um pecado não poder arrancar sua roupa e comê-la de quatro no chão da Burlesque naquele exato segundo.
suspirou, molhando os lábios quando arqueou o quadril e apoiou as mãos espalmadas nos ombros dele, respirando baixo contra a pele de sua bochecha, os lábios úmidos e quentes roçando em sua pele. Quando chegaram próximos o bastante de sua boca, ela hesitou, parando. Tornou a sentar-se em seu quadril excitado, encaixando os dedos em seu cabelo, indo para frente e para trás com um pouco mais de força.
De repente, as pessoas ao seu redor sumiram. Ela queria que hoje eles pudessem subir novamente aquele lance de escadas e ficarem sozinhos em um quarto para que pudessem repetir aqueles mesmos movimentos sem nenhum tecido escondendo suas excitações.
Como despertando de um sonho bom, se afastou de e acompanhou enquanto ele, lentamente, abria seus olhos, fitando-a com luxúria. Ela se virou de costas, desatando o nó de seu espartilho de forma que todos os outros afrouxassem de uma única vez, como um ponto solto de linha. Frouxo, aquele tecido pesado e grosso escorregou pela curva de sua cintura e suas coxas sinuosas, caindo em um baque no chão. Quando se virou novamente, mostrou as duas tiras pretas em formato de X nos mamilos excitados.
quis arrancá-los com os dentes e depois beijá-la até que sua pele ficasse roxa.
— Quem sabe em um outro dia você possa me foder usando apenas aquele anel, senhor... — ela sorriu pelo canto dos lábios, mordendo-os enquanto espalmava as mãos nas coxas dele, encarando-o com os olhos para cima. Ela se ajoelhou no chão, aproximando a boca do volume entre suas pernas. riu em antecipação, delirando em prazer e luxúria.
Ele a queria mais que o inferno. Queria agora.
— Mas hoje — ela inclinou a cabeça, tornando a ficar de pé em um estalo — eu não pertenço a ninguém.
E ela virou de costas para ele, rebolando de volta para o posto alto no balcão de vidro, subindo com a ajuda de Alysha.

“Certa vez um anjo me disse no Éden para tomar cuidado com meus desejos e pensamentos, ou eles poderiam me trair. E ter cautela principalmente com aquele que caiu, traz venenos nas palavras e é traiçoeiro como uma víbora. Sempre achei que os anjos exageravam muito com teu zelo pegajoso, seguindo à risca tudo que o criador os ordenava, sem sequer questionar o porquê... Mas de forma trágica, para meu completo e desastroso infortúnio, aquele anjo estava correto.
Joguei-me nas entranhas da escuridão por minha vontade própria e ganhei muito poder depois disso. Quando me uni aos demônios lhes oferecendo minha carne, casei-me com Lúcifer em troca de teu conhecimento e poder. Mas cheia de lascívia me deixei levar pelas palavras doces e mentirosas do primeiro anjo caído. Lúcifer seduziu Eva somente para que a própria desse a luz a Caim e tentou ludibriar-me da mesma maneira, induzindo-me a raptar-te, minha pequena e negra alma de criança roubada do mundo. Possuí-te como meu, criado em meu útero e expelido por meu corpo, alimentada por meus seios para que fosse então o primeiro herdeiro do mundo subterrâneo, e o único vindo da primeira linhagem de demônios do universo.
E logo após alcançar teu objetivo, quando minha pequena alma negra não passava de um recém-nascido, Lúcifer o quis roubar de mim para criar teus próprios planos de vingança contra aquele que o derrubou. Queria conquistar o mundo, destruindo-o, envenenando-o, e queria que minha pequena alma fizesse isso, criada como teu anticristo, a praga que devastaria a Terra.
Mas eu não o permitiria tratar-te como uma marionete. Lilith tem a alma orgulhosa, algo que almejo ter passado para tua carne. Ninguém, nunca, terá o poder de nos confrontar, nos fazer abaixar a cabeça e aceitar sem ao menos tentar nos impor. Não nascemos e não fomos criados para assistir filmes, minha criança. Somos demônios, e você é meu filho. Meu único filho. Meu pequeno satã.
Entreguei-te a Samael, meu pequeno e fiel escravo, que consumiu o corpo de um humano qualquer para submeter-se às minhas ordens de te criar da melhor maneira possível; da maneira que eu faria. O mantive distante o bastante do hades, para longe de meu rei, distante de tuas criaturas e teus planos.
Levando dentro de si, meu filho, meu doce legado, meu veneno, um vírus contagioso e agressivo que se encontra acima de teu velho pai, para vencê-lo na escuridão e vingar tua amada mãe.
Com a marca do animal negro, com a marca de Lilith; a primeira mulher de Adão.”

caminhou para fora daquele ambiente segurando firme seu colar em mãos. Ele teria de se contentar com outra pessoa naquela noite, mesmo sabendo que nada se compararia à , ao seu gosto doce, ao seus movimentos, seu suor, sua pele roçando na dele...
Ele saberia muito bem como manejar aquela cujo sangue é amaldiçoado graças aos ensinamentos mudos de sua mãe.
Certas vezes, quando a situação pede, Lilith sussurra em seu ouvido.
Há certo tempo aquela doce voz demoníaca nunca aparecera nas paredes de seu cérebro, mas, em certa ocasião, a voz o comandou estratégias de batalhas demoníacas das quais ele, mesmo com experiência, não conhecia — eram medievais.
Depois, sozinho, ele tentou ouvir aquela voz novamente. Fez força, fechou os olhos, se concentrou ao máximo, mas nada além do canto do vento soou em seus ouvidos.
Ele estava sentado em um morro, com a lua contornando sua silhueta de criatura noturna como um lobo uivante. O vento frio daquele outono empurrava suas vestes para trás de forma até um pouco agradável, refrescante em seu sangue quente.
Quando parou de tentar, a voz soou. Fora apenas um sussurro, talvez uma pegadinha de sua mente, uma alucinação. Mas fora tão viva, tão nítida. Ele precisou virar para os lados para ter certeza de que estava sozinho.
A voz disse para ele seguir para o extremo norte da cidade, onde mansões abandonadas ainda se encontravam aos poucos passos de serem demolidas ou consumidas por morcegos e vermes.
Refugiada no mundo, escondida dos anjos negros de Lúcifer, Lilith tinha uma morada em cada cidade de cada país existente. Naquela em especial, fora a que mais passou meses, podendo criar uma peculiar raiz.
Ele, como um bom filho obediente, seguiu a voz e caiu em um dos bairros que, antigamente, se encontrava entre os mais caros, os mais bonitos — entretanto, as casas que ainda sobreviveram ao tempo estavam sobre entulhos de granito, madeira e mato. Ele escutava os passos das ratazanas, o canto das corujas, a sinfonia do vento nas árvores de eucalipto no bosque pequeno que se estendia naquela extremidade da cidade.
A casa que a voz o mandou ver era a maior, com um grande portão entreaberto que rangia com a brisa, cantando junto. Eram dois pilares como uma igreja, ambos apontados para o céu cinza. Era de um cimento comido pelo tempo, com manchas pretas. Gárgulas de demônios com chifres se encontravam nas quatro extremidades como Cérbero, o cão de guarda o hades.
O jardim que talvez em uma era fosse verde com a luz do sol, hoje se encontrava em montes de terra suja e um aglomerado de entulho; as janelas grandes, protegidas com grades de ferro preto, estavam com as vidraças azuis quebradas, mofadas, empoeiradas. A porta alta de madeira estava quebrada no meio, como se uma criatura forte o bastante tivesse dado um único chute para parti-la ao meio e expelir quaisquer demônio que estivesse se escondendo naquela adorável mansão.
caminhou por cima das pedras de cascalho e subiu os quatro degraus que separavam o jardim da varanda. Desconfiado, olhou para um lado e para o outro, sem detectar uma vida sequer, além dos animais asquerosos que rondavam aquela rua.
"Vamos, minha prole, adentre a casa...", a voz sussurrou em uma ordem quase doce, fazendo entrar naquele mesmo instante, sem nem hesitar, atravessando o grande buraco feito na porta.
A casa, por dentro, estava em tamanha má condição quanto o lado de fora, mas os olhos de conseguiam entender perfeitamente aquele arquiteto, vendo, por sua pupila, o que antes era aquele aglomerado de teias de aranha e poeira.
Os filetes de madeira podre que pisava antes eram de um tom escuro próximo do preto; à sua frente, uma grande escadaria de marfim com o corrimão coberto por veludo vermelho. O lustre posto acima de sua cabeça era contemporâneo, de cristal, com pequenos pontos de luz amarelada que brilhava perfeitamente, reluzindo as estatuetas que eram postas na prateleira da extrema esquerda, que hoje se encontrava com um dos lados caído no chão, coberto por pó amarronzado. Seguindo pela direta, encontrava um corredor com paredes de madeira e quadros que Lilith pintava. Eram figuras de sua memória: lugares, pessoas, animais, criaturas.
Lilith era apaixonada por jaguares pretos. preferia os lobos.
De alguma forma, estavam conectados até a era atual. A voz que soprava em sua cabeça era de Lilith e ele sabia disso.
Alguns quadros, ainda que consumidos pelo tempo, tinham figuras que os olhos podiam compreender. passou a ponta dos dedos pela tela machucada, arranhada e partida, puxando as extremidades para que ficasse plana novamente. Era um bebê. Tinha grandes olhos azuis e um sorriso vermelho, com os caninos compridos demais para alguém da sua idade. Os cabelos ralos que cresciam no topo de sua cabeça eram negros como a noite e contradiziam com o tom marfim de sua pele aveludada. trouxe o rosto para a lateral, reconhecendo-se.
Lilith apenas o abandonara para protegê-lo de Lúcifer, não que o desgostaste. Estando com ela, ele correria risco de vida, porque Lúcifer ainda a perseguia por ter roubado seu anticristo. Se ainda estivesse viva, com absoluta certeza se escondia.
Ele virou o corpo para trás, escutando a madeira ranger.
Passando para o outro cômodo, reconheceu uma sala de jantar. A mesa de banquete servia lugares para mais de doze pessoas. Era de madeira de lei escura, com detalhes traçados a mão, com desenhos de chamas, representando o inferno. As cadeiras estavam quebradas, jogadas nos cantos, destruídas como o segundo lustre que se postava no meio da sala. Com três batentes de mesma cor que as paredes de madeira escura, a cozinha tinha o chão de porcelanato branco imundo. Os balcões de mármore preto e os eletrodomésticos de madeira estavam revirados, consumidos de insetos e roedores.
Ele se virou novamente, seguindo pela escadaria, indo para o segundo andar. Atravessou o corredor central e se deparou com um hall com quatro entradas. A primeira era um quarto de hóspedes, pequeno e com cheiro de mofo. O segundo, um banheiro grande o bastante para um time de futebol americano. O terceiro, um quarto de bebê.
hesitou em adentrar aquele local e reviver coisas das quais não se lembrava e não queria se lembrar. Ele se virou para a última porta, entrando no quarto de Lilith. Ali, uma grande cama dossel estava com a cortina de veludo vermelho rasgada. O edredom, os travesseiros e as roupas do armário já haviam sido devorados por traças. A porta da suíte estava escancarada e a primeira coisa que ele viu quando virou seus olhos fora seu próprio reflexo no espelho de corpo inteiro.
Ele não havia notado antes que estava em uma posição defensiva. Os dedos estavam em garras, os dentes estavam expostos, o cenho estava franzido e a coluna, encurvava para frente.
Se algum barulho o alertasse, ele saltaria como um animal.
relaxou, arrumando a postura, ficando ereto. Voltou-se para o quarto e seguiu para a mesinha de cabeceira com um pé quebrado, torta para a direita. Abriu a primeira gaveta, puxando a mão quando percebeu a movimentação de baratas. Ele franziu o cenho, pegando com extremo cuidado um papel amarelado pelo tempo, com as bordas remoídas e o borro de tinta preta em pontos específicos, onde a caneta falhara e tornara a cair com o dobro de tinta necessária.
Ele pegou aquela carta em mãos e seguiu lendo pelo mesmo caminho que fizera momentos antes. Desceu as escadas e seguiu pelo lado contrário, indo para a extrema esquerda. Ele parou de ler para ver a segunda parte da mansão.
Era apenas um corredor pequeno, com uma porta de aço gigante que ainda permanecia bem trancada, a única coisa na casa que não tinha sido completamente destruída.
Estava trancada com um cadeado com um buraco para dedo.
franziu o cenho e, sem nem hesitar, encaixou seu dedo ali. Ele tentou puxá-lo pela dor quando o sentiu ser perfurado, imaginando que algum roedor ou algum inseto o havia mordido, mas, depois, quando a porta pareceu destrancar como uma tumba, soprando poeira e desgrudando-se dos batentes, ele percebeu que era acionado pelo sangue da família Giansanti.
A porta se moveu com extrema dificuldade, indo lenta demais, de modo que antes de totalmente aberta ele pudesse por sua cabeça para dentro.
Ali, o cheiro de carne podre fez seu nariz arder e seu olho encolher. Era pior que qualquer lembrança que ele pudesse ter. Era um cheiro ardido de morte. Ele não sabia dizer há quanto tempo aquela carne apodrecia ali. Quando tentou entrar, seu corpo travou. O cheiro passava por sua traqueia e a irritava, fazendo-o tossir. Nem mesmo um demônio suportava tão mau cheiro. Ele tampou o nariz e, tateando a porta, encontrou um receptor de luz. Ele abaixou o pino em uma falha e minúscula esperança que algo iluminasse, mas fora estupidez acreditar naquilo. Havia uma pequena janela posta ao seu lado, onde a luz acinzentada entrava rala e iluminava apenas parte de seu próprio rosto, insuficiente para alcançar o chão. Ele, então, consumiu suas pupilas para o olho inteiro, deixando-o completamente preto, permitindo-o enxergar aquele porão.
Corpos estavam amontoados, com os pulsos presos por correntes enferrujadas. Havia uma prateleira com vidros com conteúdos vermelhos, cujo cheiro não deixava mentir que era sangue. Os corpos postos ali estavam quase que completamente transformados em ossos quebrados, mas algo os fez durar mais que um humano qualquer conseguiria aguentar. Havia uma pequena cozinha, pratos e tigelas de água.
Ele tornou a trazer a carta para perto dos olhos, começando a ler.

“O zelo de uma mãe é a maior dádiva que uma criatura pode receber. Nenhum poder é forte o bastante, nenhuma raiva é tamanha para sobreviver às trevas sem os conselhos maternais daquela que se jogou no fogo por tua pequena e doce alma.
Talvez na era que te encontra agora esse segredo tenha vindo à tona como a existência de um ser superior, mas terei minha consciência limpa caso te ensine os métodos que aprendi em meus milênios de existência.
Meu filho, meu doce demônio, ninguém será mais poderoso que tu. Nunca, em qualquer eternidade, alguém poderá te vencer. Ser o filho de Lilith te prega um veneno especial no sangue, que te eleva a patamares tão mais agudos que as outras criaturas noturnas. Mas não te consuma dessa afirmação, meu pequeno, pois a força de um demônio pode facilmente ser igualada com a ajuda de um simples líquido.
Um sangue amaldiçoado.
Alguns humanos têm o sangue especial. Não há como defini-los, achando-os com facilidade — se neste milênio são escassos, imagino que nos dias atuais que tu vives estejam praticamente extintos.
Mas não desista, meu pequeno anticristo. A força que tu herdaste de mim é tamanha para conquistar o mundo das trevas e me salvar de teu maldito pai, que me persegue por ódio, por eu ter te envenenado com meu sangue, roubando-o de teus maliciosos planos.
Se tu, meu querido, encontrar algum amaldiçoado, tua língua ferverá. Tua garganta começará a tremer e teu corpo ficará tão quente que a alucinação do inferno ocupará teus olhos, circulando êxtase nas veias. O gosto é inimaginável e indescritível, proporciona um prazer imediato que não se encontra na energia dispersa em um ato sexual nem em mil anos. Tu te alimentas dessa forma, se desprende de um universo tão sujo e imprestável de forma que tuas asas sejam expostas em uma fração de tempo, deixando-te fora de si, enlouquecendo-te lentamente... É uma droga da qual qualquer demônio venderia tua negra alma para possuir.
Não seja apressado. Não o mate de uma vez. Não o machuque, não o afugente, não o compartilhe. Esconda-o, alimente-o, alucine-o para que seja teu escravo. Algumas gotas, como todos os litros, proporcionam a mesma força pelo mesmo número de tempo. Tu deverá se alimentar dos mortais não-especiais da mesma frequência que fazia antes de encontrar teu amaldiçoado.
Tu deves ser esperto, meu doce filho.
Quando ainda me refugiava nesta cidade, tive a oportunidade de fazer uma pequena coleção. Em pequenos potes, eu guardava teus sangues. Eu me alimentava, os saciava o estômago, tomava teu veneno e os mantinha presos como reféns.
Quando os agentes de Lúcifer, teu pai, me encontraram, eu os abandonei com a chave que está circulando em tuas artérias. Somente tu, meu primogênito, poderá abrir aquele calabouço e seguir a coleção de tua mãe.
Não cometa o mesmo erro que eu. Não desfoque de tua mente teu objetivo principal: poder e força.
Eu quero vingança, meu amado filho.
Quero que me vingue e conquiste Lúcifer e teu mundo inferior. Estou cansada de fugir, cansada de me esconder nas entranhas desse mundo.
O que fiz, fiz por amor.
Eu te amaldiçoo, minha astuta criatura, com a força da esperteza que tu herdou de tua mãe.”


despertou de seu pequeno transe, escutando a voz de sua mãe martelando em sua cabeça nas palavras que escrevera naquela carta, séculos antes do qual ele se encontrava agora.
Estava escuro, o céu tinha um tom estranho de roxo, as luzes amareladas refletiam seu brilho na rua molhada. Algumas mulheres usavam roupas tão pequenas e apertadas que sentia vergonha de encará-las. Elas estavam recostadas nos muros, olhando o chão, a ponta fina e de seus saltos altos. O som de uma boate ecoava conforme ele se aproximava de uma delas, a com melhor cheiro, de aparência mais jovial e inocente.
Ela fumava um cigarro, olhando para o chão, com a jaqueta de couro preta tocando alto de sua cintura reta e fina. A saia jeans escura batia quase um palmo e meio acima dos joelhos ossudos, da perna magra de cor pouco bronzeada. A blusa com decote grande deixava exposto os pelos louros e arrepiados de seu corpo.
Quando notou que alguém parara de andar próximo o bastante dela, a garota elevou seus castanhos olhos maquiados de preto para ele. Seu cabelo comprido e escuro dançou em seus ombros, caindo para frente em ondas tão perfeitas que causavam o pecado da inveja em quem as encarasse por muito tempo.
A garota abriu um sorriso pelo canto do lábio, soltando o braço que se encontrava cruzado abaixo do seio, procurando algum modo de se esquentar do frio.
— Eu sou cara, vou logo avisando — disse ela, encarando-o com os olhos luxuriosos. — Mas para você eu fazia até de graça — ele riu, escutando o tom dela.
Por seu cheiro, ele percebia que era seu primeiro trabalho. Sua primeira noite, seu primeiro homem, sua primeira relação...
Ela não devia ter mais de dezesseis anos.
— E fará mesmo — ele sorriu, esticando a mão para que tocasse a cintura fina da garota, caminhando com ela para a rua, esticando-a até o beco onde estacionara seu Camaro.
A garota sorriu, virando o rosto para ele antes de apressar um pouco o passo acima daqueles gigantescos saltos para espalmar as mãos no capô reluzente daquele carro, esticando as pernas e empinando a bunda. Bastou um centímetro para que ela estivesse completamente deitada ali, deleitando-se antes do tempo.
Virgens...
— É um carro muito legal — disse ela, assentindo, colocando-se ereta novamente.
— Faz alguns anos que o tenho — disse , sem muita paciência. Atravessou na frente do automóvel e destravou as portas, abrindo a do motorista e sentando-se ali, escorregando pelo couro preto.
A garota não hesitou um segundo sequer. Abriu a porta e deslizou pelo banco, cruzando as pernas enquanto sorria e tinha os olhos faiscando em empolgação.
Quando ele deu a partida e o motor roncou, ele sentiu o cheiro da excitação dela e abriu um sorriso pervertido nos lábios vermelhos.
Ela, sem ao menos pensar, aproximou-se dele e começou a beijar a linha de seu maxilar, acariciando a barba por fazer com as unhas, com a mão direita. Roçou seu nariz arrebitado no pescoço dele, mordiscando a pele enquanto abaixava a mão lentamente por seu peitoral, alcançando seu membro. Ela começou a acariciá-lo, passando os dedos em suas extremidades, contornando-o.
acelerou, fazendo-a soprar uma risada contra sua pele.
Ela, então, desceu os lábios diretamente para sua coxa, acomodando-se no banco enquanto abaixava o zíper de sua calça e desabotoava seu par de botões. Liberou a boxer cinza escura, começando a traçar um caminho de beijos por cima do membro de .
Ele, passando ao lado da agitada Burlesque, lembrou-se subitamente de , começando a imaginá-la.
Lembrou-se do modo que ela o tratou quando devolveu o anel — passando a mão em seu peitoral, mordendo seu pescoço, respirando seu cheiro. Lembrou-se do som de seus gemidos, de seus corpos colidindo com força, do grau máximo de êxtase quando ela sussurrava, completamente amaldiçoada, seu nome em meio ao orgasmo mais poderoso de sua vida.
A menina continuava acariciando seu membro, e, agora, pensando em , sentiu-o enrijecendo, tomando forma, aumentando de tamanho.
A garota pareceu sorrir, passando a mão por dentro do tecido quando sentiu os dedos dele entrelaçados em seus cabelos, empurrando-a levemente para sua excitação. Ela liberou o membro, passando a língua por toda sua extensão, sentindo sua nuca ser pressionada para que ela não o torturasse.
mordeu os lábios, pensando em , fechando seus olhos por apenas um segundo quando o sinal ficou vermelho. Ele abaixou o queixo, encarando a menina movimentar sua cabeça, sentindo sua língua indo e vindo em movimentos tão prazerosos como alguém que já tinha certa experiência. Sua mão a auxiliava, acompanhando seus movimentos para cima e para baixo com a pressão ideal. Suas unhas curtas arranhavam suavemente seus testículos, arrepiando-o, entorpecendo-o. Ela baixou a língua até a proximidade do períneo, lambendo-o, pressionando-o com a língua, então tornou a sugá-lo com força, relaxando a garganta para que fosse o mais fundo que conseguisse. Fechou seus olhos com força, franzindo o cenho, chupando-o e estimulando-o com a mão.
empurrou sua cabeça mais para fundo, sentindo seu membro roçando nas paredes da bochecha dela, seus dedos se juntando quando sentiam o suave macio dos lábios em sua parte lateral, chocando-se nos movimentos.
O sinal tornou a abrir e pisou fundo no acelerador, fazendo a garota rir em meio ao sexo. Tornou a subir a cabeça, trabalhando somente na glande, masturbando-o com força e pressa enquanto sentia sua nuca ser pressionada para baixo.
imaginou os olhos de . Seu corpo suado exalando seu perfume doce, os caminhos vermelhos que as unhas dele causariam em sua pele, o sorriso pervertido e os olhos felinos de alguém que se encontra completamente entorpecido em meio ao prazer do ato carnal. Imaginou-a gemendo seu nome, chupando-o como aquela garota desconhecida fazia. Imaginou seus lábios, seus doces lábios, o delicioso mover de sua língua, as pecaminosas mordidas de seus dentes, o encaixe perfeito de seus sexos e o deleite mútuo pela dor do prazer.
Ele, sem querer, soltou um gemido baixo, mordendo os lábios enquanto girava os olhos por baixo das pálpebras.
— Porra, ... — ele gemeu.
Lembrou-se dos movimentos que ela fazia quando por cima dele, e, instintivamente, começou a mover o quadril para cima, instigando a garota a sugá-lo ainda mais. Ele molhou os lábios e abaixou a cabeça para acompanhar os movimentos dela, descendo as mãos de seus cabelos cacheados para a cintura, arranhando-a com força as costas, vendo-a ficar vermelha — o sangue virgem palpitando naqueles vergões.
A garota soltou um gemido de dor, franzindo o cenho. Quando tentou retirar a boca, ele a pressionou para que continuasse.
— Não para — ordenou ele. A garota prosseguiu, mesmo com dor nos caminhos vermelhos. — Nós já estamos chegando aonde eu quero.
sentiu seu membro palpitante enquanto, em meio a atenção na rua e o entorpecido lado dos pensamentos presos em , imaginava que era ela quem estava ali, sugando o seu membro, roçando os lábios e o nariz em sua pele.
Virando em uma esquina, adentraram um beco sem saída, escuro e consumido de escadas de incêndio. Quando o carro parou, ele desligou os motores e apagou o farol, podendo dedicar ambas as mãos a pressionar a cabeça da menina para que ela não parasse de sugá-lo por momento algum, nem quando gozasse.
Ele se lembrou do choque entre seu quadril e a bunda de . Lembrou-se de como ela era quente e úmida por dentro, de como sua mão escorregava perfeitamente por aquelas costas suadas. Lembrou-se de seus pelos eriçados, do som de sua pulsação, do gosto de seu sangue...
Ele simplesmente não conseguiu segurar mais.
Apertou o pescoço da garota com os dedos, puxando-a com força para cima enquanto abocanhava seu busto, arrancando sua pele. Quando ela abriu a boca para gritar de dor, ele grudou seus dentes em seus lábios e os puxou, engolindo-os em meio de um segundo. Com a mão livre, continuou masturbando-se enquanto tomava a artéria do pescoço dela em uma mordida só, arrancando sua pele, seu músculo e seus nervos.
Ela, já morta, não fazia mais mínimo barulho.
Ele moveu o quadril para cima com força quando o orgasmo deus seus primeiros indícios. O pavio começou a queimar, elevando-o.
Ele sugava o sangue da virgem com extrema força, sem ao menos deixar intervalos para poder deleitar-se com seu doce e inocente sabor. Mordeu-a novamente, de forma que arrancasse outra metade de seu pescoço, quase desgrudando a cabeça do corpo. Ele a chupou e soltou vários gemidos seguintes enquanto apressava o movimento da mão, estreitando os dedos, indo com sua força demoníaca, sua rapidez sobrenatural. Ele sentiu seu quadril explodir em prazer, bombeando endorfina para suas veias renovadas.
Seus dentes palpitavam, sua respiração estava completamente ofegante e seus olhos só conseguiam enxergar .
A garota caiu morta acima de seu colo úmido de branco quando ele se saciou, respirando com a boca aberta. Passou o polegar no canto do lábio, puxando os vestígios de sangue para poder lambê-lo, sugá-lo até o mínimo.
Encarando-se no retrovisor, percebeu suas veias dos olhos saltadas. As rugas dos milênios de idade foram desaparecendo lentamente; os cabelos escuros ganharam um tom mais brilhante, assim como as íris, a pele marfim. Ele sentia o sangue circular mais rápido, renovado tanto pela nova carne quanto pelo sangue virgem, que o trazia juventude.
Ele sorriu, jogando a cabeça para trás, sentindo a bochecha intacta quente da garota tocando em seu membro ainda sensível. Ele fechou seus olhos, tendo em imaginação o rosto da garota consumida em deleite, delirando naquele pecado.
Empurrando a garota para o lado, puxou a boxer e a calça para ficar devidamente vestido. Virou suavemente o rosto para encará-la, sentindo pena por ser tão nova.
Seus olhos dóceis como os de um filhote estavam vidrados, com lágrimas.
Talvez de ânsia por seu tamanho.
Ele riu novamente, ligando o carro e seguindo para o extremo norte da cidade, largando o corpo para suas criaturas de estimação.
Ele sorriu para o grande lobo, largando a prostituta virgem no chão para que sua matilha pudesse começar a comê-la e desfazer quaisquer vestígios de que fora atacada por algo que não fosse um animal.
agachou-se no chão e passou a mão na cabeça do lobo de pelo negro e olhos claros, que olhava diretamente para ele, como se conseguisse entendê-lo.
— Nós somos amigos, não somos? — indagou , inclinando o rosto, deixando os lábios entreabertos. — Eu sei que sim. Você gosta de mim — ele sorriu, soltando uma risada nasalada. Quando se colocou de pé, o lobo seguiu para o monte de carne sem sangue. — Até amanhã, criatura.


08.

You start to freeze as horror looks you right between the eyes; you’re paralyzed.

Não havia se passado muito tempo desde que o turno de havia chegado ao seu fim. Ela já tinha posto suas próprias roupas enquanto caminhava pelo salão vazio a caminho da porta, contando as gorjetas que havia ganhado naquela noite.
, pode vir aqui, por favor? — a grossa voz de Richard ecoou em uma Burlesque desabitada, fazendo-a cessar seus passos no mesmo segundo, virando-se para a escada com o queixo para cima, encarando a metade do corpo dele coberto por preto que se encontrava postado para fora da cabine onde passava a maioria das noites.
Alysha soltou uma pequena risada maliciosa, fazendo virar-se para ela com o cenho, suavemente, franzido em confusão e curiosidade. A loira, que já se encaminhava para os fundos da boate, voltou estalando seus saltos no piso de porcelanato, parando bem à frente da amiga.
— Dê o melhor de si — ela disse, piscando. Quando abriu a boca para tornar a fazer perguntas à amiga, ouviu o pigarreio de Richard. Ela assentiu e apressou o passo para o segundo andar.
Sentado escorregadio na cadeira reclinável de couro, ele tinha as pernas abertas e os antebraços apoiados na mesa de vidro preto. Com um ar superior, virou apenas o queixo para encará-la parada na porta, com as mãos unidas na altura da cintura, os dedos entrelaçados e os lábios vermelhos e palpitantes por serem tão mordiscados em curiosidade.
A cabine, por dentro, era toda revestida de preto. O vidro que dava uma perfeita visão de toda a Burlesque era escuro, e, à frente do corpo pálido de Richard, havia uma gigantesca mesa de escritório com um notebook acinzentado e enfeites pontiagudos como chifres, de ouro maciço.
Ele girou a cadeira, chamando-a com a cabeça, mandando-a, silenciosamente, fechar a porta. Quando o fez, percebeu o quão escuro era aquele cubículo preto extremamente gelado.
A música soava tão baixa que não passava de um zunindo, algo que poderia facilmente ser ignorado. Os únicos sons que predominavam ali era sua respiração e a pulsação acelerada na artéria de seu pescoço.
— Como está indo no trabalho? — Richard indagou, endireitando a postura enquanto olhava fixamente para a garota.
— Estou indo bem... — respondeu, desconfiada das intenções dele. Suas vozes soavam como trovões naquele silêncio quase perturbador. — Por quê? Alguma reclamação? — ela franziu o cenho, logo mordendo os lábios.
— Não, nenhuma — ele disse em prontidão, negando com a cabeça enquanto desviava seus olhos olivas dos dela, azuis, e olhava diretamente para a ponta branca de seus dedos com unhas curtas. — O movimento aumentou; eles adoram carne nova. É só que... — Richard se levantou, fazendo enrijecer, prendendo a respiração. — Eu não posso colocar alguém assim no mercado sem saber se é de qualidade ou não.
— Se não estiver agradando, eu faço o possível para melhorar. Sempre — encarou os olhos olivas de Richard, que esboçou um pequeno sorriso lateral no canto da boca.
— Eu preciso aprovar pessoalmente — explicou, soando sugestivo.
Richard segurou a cintura de e, com a mão pesada, puxou-a contra seu corpo duro feito mármore, fazendo-a soltar um pequeno grunhido pelo susto e o baque. Ele inclinou seu rosto para o dela, tomando seus lábios em um beijo que já começara intenso e frio; os deixou fechados, apenas sentindo a textura macia da boca dele contra a sua, negando-se a se entregar; espalmou as mãos no peitoril dele, empurrando-o com toda sua força — que, comparada a dele, era completamente mínima. O corpo de Richard estava prensando o dela contra a porta, fazendo, além de tudo, a maçaneta pressionar sua lombar.
— Vamos, , não seja irritante — Richard sussurrou contra os lábios dela, que não parava de resistir.
Richard segurou os ombros de e a puxou para sua mesa, pressionando-a sobre o vidro de forma que seu tronco ficasse inclinado por cima dela. Desceu as mãos pela lateral de seu corpo, moldando os dedos em suas curvas, pressionando-a para atiçá-la a querê-lo também. Deslizou sua língua pelo pescoço dela, arranhando-a com os dentes, chupando a pele da clavícula.
, por mais que tentasse resistir, não conseguia não sentir um arrepio de excitação percorrendo seu corpo enquanto ele a beijava daquela forma. Ela sentia sua sobriedade se esvaindo no ar conforme ele a apertava nos pontos certos, pressionando-a com aquele corpo tão duro e bonito.
E ela também não podia negar que, sim, se sentia atraída por seu chefe. Aqueles grandes e redondos olhos verdes como oliveiras.
Richard tocou a palma áspera da mão na pele branca e fina da cintura de , contornando as curvas enquanto, consequentemente, subia sua blusa, expondo rapidamente toda a pele que recobria suas veias.
Quando tocou uma de suas grandes mãos no seio dela, arfou, jogando a cabeça para trás enquanto mordia os lábios.
— Isso é errado, meu Deus — ela gemeu, molhando os lábios, ofegando enquanto soltava baixos gemidos conforme a língua dele baixava de seu colo para a barra preta de seu sutiã, mordiscando-o, puxando-o para baixo. Tomou seu mamilo rosado com os dentes, mordiscando-o enquanto, com a outra mão, acariciava e apertava o seio oposto.
— Você, melhor que ninguém, sabe que tudo que é errado é melhor, ... — ele riu contra a pele avermelhada de seu seio, fazendo-a arrepiar.
se entregou. Segurou com força os cabelos da nuca de Richard e os puxou de forma que a boca dele desgrudasse de seu seio e voasse para seus lábios, abocanhando-a com tanta fome que poderia destruí-la em segundos. Seus narizes se roçavam e seus lábios começavam a perder o brilho, tornando-se opacos.
espalmou suas mãos na mesa que prensava seu corpo contra o de Richard e escorregou-a pelo vidro, fazendo aquele singular ruído que o fez separar seus lábios para sorrir. Ela, escorregando um pouco mais, enquanto tomava impulso com as pernas e as encaixava em torno da cintura dele — sentindo suas grossas mãos percorrendo sua coxa, acariciando-a e apertando-a —, sentiu algo pontiagudo em seu pulso. Quando ele movimentou o quadril para que suas excitações se roçassem em um ato malicioso, o corpo dela foi para trás e aquela ponta perfurou sua pele, fazendo-a gemer de dor e puxar o pulso, desencostando suas bocas, cortando o beijo.
Richard, ainda com as mãos bem presas nas coxas dela, franziu o cenho e encarou a gota escarlate que começava a ganhar volume, brilhando sob o alvo da pele de .
— O que há de errado com o seu pulso? — ele indagou sem conseguir tirar os olhos da gota vermelha. , ainda meio perturbada pelas pontadas de dor, com o furo escondido pelas pulseiras, segurou o braço e o puxou para perto do peito, analisando-o.
— É só um furinho por causa dessas... — ela se virou, encarando aquela pequena estátua. Era um touro com os chifres bem afiados. — Coisas que você tem em cima da sua mesa — ela se voltou para ele com um sorriso brincalhão nos lábios, percebendo-o concentrado demais naquele pedaço de seu corpo. — Mas não é nada... Já vi cortes piores.
— Deixe-me dar uma olhada — ele pediu e, antes mesmo que pudesse negar e dizer novamente que estava tudo bem, Richard já havia agarrado sua mão e a aproximado o bastante de seu rosto.
O cheiro doce daquele sangue atiçou seus sentidos. Fora como se uma onda de nostalgia passasse por suas veias, consumindo-o em uma vontade animalesca de prová-la uma única vez, o suficiente para sugar apenas aquela mísera gota, só para matar seu início de vontade.
— Dizem que saliva ajuda na hora de conter um sangramento — Richard não a olhou ao dizer aquelas palavras, como sempre fazia.
— Só quando o corte é muito ralo — disse , enojando tal ideia. Ele não chuparia seu ferimento só para ajudar na coagulação.
Mas Richard ficou com os ouvidos surdos. Os olhos estavam focalizados no tom escarlate daquela gota que já começava a escorrer por seu braço e pressentiu que algo ruim iria acontecer. Ela tentou puxar seu braço de volta, mas Richard já o tinha nos lábios.
Passou a língua lentamente pelo caminho vermelho, assistindo enquanto o sangue se espalhava pelos mínimos cantos de sua língua, fazendo-a clamar por mais.
O gosto do sangue dela era diferente dos quais já havia provado. De repente, ele sentiu como se um soco de energia fosse golpeado em sua nuca. Seus músculos começaram a tremer, sua garganta esquentou e seus caninos afiaram, tornando-se quatro vezes maiores, mais afiados e palpitantes. A língua se tornou áspera e, quando tornou a tocar na pele de , ela arrepiou de medo.
Seu coração bateu mais forte quando percebeu que ele estava arrancando suas pulseiras com os dentes como se fossem feitas de papel, deixando-as cair no chão em um baque que era tão surdo para ele quanto para ela. Quando tentou puxar novamente a mão, ele a segurou com força, afundando os dedos em sua pele, deixando-a com relevos.
— A porra lenda é real — ele rosnou com a voz muito mais grossa que o normal.
Quando ele levantou a cabeça para encará-la — tão lenta e assustadoramente como em seus piores pesadelos —, notou que suas pupilas haviam tomado os olhos, tornando-os inteiramente negros. Os dentes outrora tão brancos estavam avermelhados; a língua áspera, fina e repartida como a de uma cobra estava esticada para fora, pingando sangue.
Ela gritou para ele parar, tentando de todas as formas tirá-lo do meio de suas pernas, empurrando-o com os joelhos ou com os calcanhares, mas ele estava petrificado, sorrindo para ela, abocanhando seu pulso como se fosse ouro.
Seus dentes extremamente afiados roçaram na pele dela, arranhando-a e perfurando-a em um corte maior, mais fundo, que liberava mais sangue amaldiçoado.
Ela sentia a excitação dele aumentar no meio de suas pernas.
estava apavorada, recuando para trás, para o vidro blindado que a impedia de se afastar mais daquele monstro.
Sua garganta ardia pelo tanto que gritava, mas a Burlesque estava vazia. Todos os empregados haviam ido embora.
Ninguém caminhava naquela rua a tal hora da madrugada. Estava vazia, deserta; ali existiam somente eles dois.
Aquilo aterrorizou .
Ela puxou o joelho para a barriga de Richard, empurrando-o com o máximo de força que conseguia, sentindo o vidro espremendo suas costas. Com o pulso livre, empurrava-o, enquanto, com o outro, o puxava.
sentia que podia quebrar seus ossos sem que ele movesse um centímetro.
Ela começou a chorar, gritando, desesperada. Pedia por Deus que ele parasse com aquilo, que ele a deixasse viver, mas, com absoluta certeza, Richard não pararia.
Ele desgrudou a língua e os lábios do pulso dela, encarando-a uma última vez, deliciando-se com aquele imenso pavor. Tocou de uma forma quase delicada a pele molhada de sua bochecha, sentindo-a pressioná-la para esquivar-se, e sorriu com aquele desespero.
Aproximando os dentes do pescoço dela, o abocanhou apenas uma vez, no local exato. Sentiu o medo dela expelindo seu sangue com mais facilidade, o choro e a agonia dela exalando aquela pequena cabine com o cheiro do medo.
Aquele sangue fez modificações em seu corpo.
Richard se sentia invencível. Ele sorria e, quando a mordia de novo e sugava um pouco mais, sentia o prazer fortalecendo seus ossos.
Por mais que tentasse ao máximo se esquivar daquele monstro, todas as suas tentativas se convertiam em falhas vergonhosas e mais dor para sua pele aberta. Ela tinha os dedos entrelaçados nos pulsos dele, tentando, sem parar, afastá-lo dali, mas não conseguia. Ele era forte demais.
Ela ainda chorava, com os olhos trêmulos, e começou a pedir que a morte chegasse logo e não fosse tão dolorosa como aqueles primeiros momentos.
Ela sabia que iria morrer. Ele era forte demais, monstruoso demais e estava faminto demais.
fechou seus olhos, franzindo o cenho e enrugando os lábios, sentindo o coração perder força enquanto ele a sugava com tamanha velocidade, arrancando sua vida.

começou a se sentir inquieto. Ele franziu o cenho para a noite e farejou o ar, procurando algo que o deixasse daquela forma. Alguma criatura noturna da qual ele sentia afeição, por exemplo, poderia estar sentindo essa agonia, essa dor, fazendo-o sentir também.
, por ser filho legítimo de Lilith, sente-se mais conectado com criaturas noturnas que a maioria dos demônios. Ele pode sentir sua fome, sua sede, sua raiva, sua dor. Por isso elas também se sentem atraídas por ele, obedecendo-o, sendo um exército tão poderoso quanto a própria natureza.
Em tese, essa conexão deveria ser boa, mas, sempre que um animal está à beira da morte, consegue pressenti-la. Normalmente ele se guia até o local onde a criatura agoniza, então assiste, pacientemente, enquanto aquele manto negro da morte envolve sua alma e a suga de volta para as profundezas do subterrâneo.
Assistir, às vezes, torna-se menos doloroso que esperar com os olhos fechados. No escuro o medo fica mais aflorado, os instintos ficam mais sensíveis. Assistir enquanto a morte chega, então, é um ótimo método para não temê-la.
Mas , por ser um demônio, não tinha medo da morte, não tinha medo do inferno, não tinha medo de seu pai, não tinha medo de briga. Não tinha medo de nada. Mas, obviamente, desgostava de algumas qualidades que tinha por ser o herdeiro.
Se conectar profundamente com aquelas criaturas era uma das várias coisas que ele passara a odiar com o decorrer dos milênios de sua existência.
Seu coração começou a bater mais forte e ele se colocou de pé naquela pedra, olhando para o horizonte da cidade, sentindo o vento cantando na beirada de sua blusa preta, fazendo-a balançar para os lados, assim como os fios escuros de seus cabelos.
Ele sentiu o peito inteiro queimar em medo.
Olhou para trás, com os caninos expostos e as unhas em garra. Ele franziu o cenho, olhando para baixo.
Mas que porra...?
Então, como um sussurro distante, abafado pelo vento e pela chuva, ele a escutou chamar seu nome.
franziu ainda mais o cenho, parando de respirar, desejando que o vento parasse de soprar para ter certeza que a voz de realmente soara em seu ouvido ou se fora outra brincadeira de sua mente.
Mas então ela a chamou — e, dessa vez, com mais força.
Então ele percebeu que sua criatura noturna era, na verdade, . Ela quem estava sentindo aquela aflição e aquela dor.
A pontada de agonia cresceu dentro o peito dele, fazendo-o querer gritar com força, mas ainda assim sentir aquilo.
Era imensurável. Esmagava seus ossos e comprimia seu ar de forma que um nó se formasse em sua garganta, apertando-a ao máximo, impedindo-o de engolir.
saltou aquele morro como um puma, esticando as pernas e os braços. Previu sua queda e flexionou os joelhos quando os pés tocaram o solo rochoso. Com o olhar possuído por suas pupilas demoníacas, ele correu pela noite, o mais rápido que conseguia. O vento frio cortava sua pele quente, que exalava o vapor daquele contato como se fosse um asfalto quente refrescado por chuva.
Ele tinha os dentes expostos e as costas ardiam — as asas negras e compridas querendo saltar, expondo-se para o mundo. Mas ele seria mais rápido com os pés. E conforme se aproximava, maior era sua aflição e dor. Ele sentiu os olhos arderem, sentiu vontade de começar a gritar e implorar para o inferno que aquela sensação passasse.
Ele se controlou para não puxar os cabelos e ceder os joelhos ao chão.
Atravessou uma rua quase deserta e já estava no meio da cidade. As pessoas e placas que passavam por ele só viam um pequeno vulto negro que exalava vapor quente — já não via nada além de borrões difusos.
Quando se aproximou da rua da Burlesque, sua audição captou gritos fracos. Gritos que eram tão dóceis quanto o som de uma sinfonia infernal, o barulho de anjos cantando.
Ele parou subitamente, respirando ofegante, com a boca aberta e o lábio enrugado para cima, mostrando suas presas afiadas e gigantescas. Ele chutou a porta de vidro, quebrando-a em mil pedaços minúsculos.
Uma luz vermelha soou, piscando, enquanto uma sirene alta o bastante o irritava os tímpanos.
Quando olhou para cima, percebeu uma leve movimentação na cabine posta no segundo andar. Correndo, ele subiu as escadas em uma velocidade sobrenatural.
Ali, na visão nítida de seus piores pesadelos, ele encarou uma pálida, com os lábios sem cor e os olhos quase opacos, a respiração tão fraca que não passava de um singelo sopro. O pulso arrebentado, o pescoço mordiscado, os cabelos bagunçados e o corpo que pertencia a ele desnudo, tocado, violentado.
Quando encarou o desgraçado que havia feito tal coisa com sua amaldiçoada, conseguiu, de prontidão, reconhecer aquele maldito demônio em sua forma original. Com chifres negros na testa, os olhos escuros como a noite, a pele pálida brilhante e dura como mármore, impenetrável para qualquer arma humana; todos os dentes estavam afiados como os de lobos, os caninos cresciam para baixo, em quase três vezes maiores e mais afiados que o de humanos.
o encarou e, como um feixe de luz, pareceu sorrir em meio ao seu transe, como se tivesse acabado de ver um anjo.
primeiro a encarou jogada no chão, entre a vida e a morte, então encarou novamente o demônio que se alimentava com o um carrapato da sua humana amaldiçoada.
Foi o bastante para ele perder o controle.
A raiva era tamanha, de uma forma que ele jamais havia sentido.
Seu corpo tomou conta de sua mente e a transformou em um vácuo negro, sugando todos seus sentidos sóbrios, convertendo-os em ira e ódio. Em apenas um segundo, seus dentes cresceram ainda mais em sua gengiva, rasgando-a, fazendo-a sangrar; suas asas negras foram expelidas com tamanha força que encurvaram sua coluna para frente e rasgaram sua blusa, deixando-o côncavo enquanto o som de ossos estralando tomava conta daquela cabine; seus olhos foram tomados por vermelho puro, de um tom escarlate brilhante que só pertencia ao herdeiro de Lilith; seus chifres negros e disformes cresceram em sua testa, firmes como diamantes. Seu sangue correu com mais força nas veias, deixando-as saltadas e brilhantes sob sua pele extremamente branca e dura.
Em um milésimo, ele havia se tornado outra pessoa. Um monstro possuído pela ira.
— ELA É MINHA! — urrou com a voz completamente irreconhecível, grossa como nunca havia sido antes. Ele franziu o cenho, pulando no pescoço daquele outro demônio.
Suas unhas ficaram maiores, afiadas como garras negras, e penetraram com certa facilidade a pele do pescoço de Richard. Suas asas se eriçaram como espinhos, as penas outrora aveludadas se tornaram ásperas e afiadas, negras como o manto da morte, apontadas na direção de Richard, deitado no chão, encarando com ódio os olhos vermelhos do filho de Lilith. Ele tentava, inutilmente, socar e perfurar o tórax de , mas sua pele era muito mais dura que um demônio comum. Os chifres de cresceram um pouco mais, rasgando a pele de sua testa, e, conforme ele arranhava os ombros e o colo do demônio mais fraco, um urro de ódio nascia e saía por sua garganta, ecoando nas paredes daquele local.
Ele segurou o pescoço de Richard e o elevou, virando-o e jogando-o contra o vidro blindado, vendo-o quebrar em milhões de fragmentos. O chão tremeu e o teto fraquejou. pulou em cima do demônio mais novo novamente, sentindo-o arranhar com força a lateral de sua cintura para rasgá-la, socando-a para quebrar seus ossos. Richard rosnava, mostrando os dentes, e, mesmo com o pescoço preso pelo antebraço de , ele ainda tentava mordê-lo o pescoço e arrancar sua artéria.
A brisa noturna invadia aquele cômodo; o cheiro de chuva e sangue impregnava as paredes de suas narinas.
O ódio consumiu enquanto ele sentia a dor de palpitando seus músculos.
Bastou virar, suavemente, o pescoço para ver se se recuperava, que Richard abriu as pernas e chutou a lateral da costela de , fazendo-o cair de lado. Deitando-se por cima do herdeiro de Lilith, o mais novo o golpeou com um soco no alto de seu chifre, a fim que quebrá-lo para usá-lo como arma contra o peitoral de .
Duro com um diamante e inquebrável como tal, aquele soco só causou um pequeno desconforto; rosnou, subindo a nuca para abocanhar a frente do pescoço de Richard. Arrancou sua pele, cuspindo-a para o lado, e, quando teve a oportunidade, afundou suas unhas ali, puxando o osso da garganta do demônio mais novo.
Richard recuou antes de ter mais ossos quebrados. Deu um pulo para trás, ficando agachado no batente da janela quebrada, segurando com a mão ensanguentada um vidro estilhaçado. Seus dedos grossos estavam pintados com o sangue amaldiçoado da garota que tinha os olhos rodando agonizados pelo teto, deitada com as pernas abertas e o corpo machucado; os lábios pálidos estavam entreabertos em uma tentativa falha de puxar mais ar para seus pulmões fracos.
— O filho de Lilith vive... — ele rosnou, mostrando suas presas, mas os olhos demonstravam seu choque. Depois olhou novamente para . — E vemos que ele tem uma pequena protegida... — ele riu; um som amargo e rouco.
rosnou novamente, em alto e raivoso som, saltando para cima de Richard, agarrando seu pescoço enquanto caíam daquela altura. O baque das costas de Richard no chão da Burlesque fez com que alguns cacos de vidro saltassem.
começou a socar o rosto de Richard, a fim de desfigurá-lo. Socava com força, a ponto de sua mão ficar avermelhada. Mas a pele do desgraçado, graças ao sangue da sua amaldiçoada, estava mais dura, mais firme, mais forte. Assim como seus ossos, seus golpes, seus sentidos.
sentiu ainda mais raiva, urrando quando virou o queixo de Richard. O estalo fora alto o bastante, como uma madeira quebrando, mas ainda assim não fora suficiente para matá-lo.
Richard tornou a empurrar , que voou para a parede, segurando-se ali, com as garras negras fincadas no gesso em cinco buracos profundos.
As veias de seus olhos estavam saltadas, vermelhas e roxas. Os dentes estavam palpitando, as feições se convertiam em puro ódio e repulsa. As asas ainda estavam apontadas para frente, envolvendo seu corpo coberto apenas por uma calça jeans como se fosse uma cúpula afiada e eriçada, que reluzia branco e grafite. Suas penas pareciam pequenas adagas.
estava possuído por ódio. Completamente possuído.
Antes de liberar suas próprias asas — visivelmente menores e com menos penas que as de —, Richard o olhou e sorriu.
— Eu sei onde está sua amaldiçoada e não irei descansar até que ela inteira esteja dentro de mim — proferiu, voando como um raio quando ouviu outro urro de raiva saindo de .
Ele tomou impulso da parede e voou atrás de Richard, seguindo-o para a escuridão acinzentada de um céu com nuvens carregadas com água e raios. Seguia um pouco distante, sentindo a água congelada molhar seus cabelos, cortar sua pele.
Estava movido à raiva, acompanhando o bater rápido das asas do infeliz que tentara matar .
Então, subitamente, lembrou-se dela, parando de voar. Olhou para baixo, ouvindo os trovões, e não viu nada além de pontos brilhantes e arranha-céus escuros pela madrugada.
Ele mergulhou na escuridão e esticou as asas para o vento cortá-las ao seu favor, atravessando como se fosse um pedaço de aço plano. Conforme o chão de aproximava, ele abriu as asas e as bateu apenas uma vez, indo o mais rápido que conseguia para a Burlesque, onde, postados à frente da porta de vidro quebrada, quatro viaturas de polícia estavam estacionadas.
as amaldiçoou.
Ele voou para um beco, descendo o mais rápido que conseguia, controlando-se ao máximo para que as asas fossem recolhidas e os olhos amenizados, os chifres encolhidos e os dentes normalizados. Encontrando-se sem blusa, pouco se fodeu para o resto de sua aparência, correndo de volta para a entrada, acompanhando o exato momento que tiravam , já desacordada, deitada em uma maca, de dentro daquele pequeno inferno particular.
Um policial parou ao lado dele, encarando seu peitoral.
tinha a respiração descompassada e o supercílio cortado — onde Richard tentara quebrar seu chifre para cortar seu peitoral e arrancar seu coração. Os cabelos estavam molhados, assim como a calça jeans e os tênis.
— Você estava aqui quando o ataque aconteceu? — o policial indagou em uma voz distante.
só conseguia encarar os olhos fechados de , o pescoço enfaixado e mobilizado por aquela coleira amarela. Os pulsos estavam sangrando e sujavam sua pele tão branca, deixando-a manchada.
Ele deveria gostar daquilo. Deveria gostar de sangue, do cheiro, do sabor, da aparência. Deveria gostar de tê-la desacordada, em um modo muito mais fácil de ser persuadida que se caso estivesse consciente.
não pensou quando começou a caminhar para a ambulância.
Sentiu uma mão quente em seu peitoral, o impedindo de andar, e, quando o olhou, lançou um olhar de ódio.
— Você não pode ir com a garota a não ser que seja algum parente e me comprove isso — disse o senhor robusto, com uma barba por fazer. hesitou, mordendo o interior das bochechas enquanto travava o maxilar, acompanhando a ambulância fechar suas portas e começar a correr pelas ruas desertas. — Eu vou perguntar mais uma vez — disse o policial, colocando a mão em seu cinto. — Você estava aqui quando o ataque aconteceu?
— Não — ele respondeu seco, com ódio. Não sentia nada, além disso: ódio. — Eu moro aqui perto e escutei o barulho; só quis ver o que estava acontecendo — o policial assentiu.
— Você machucou sua testa — disse, apontando para tal lugar. levou a ponta dos dedos e sentiu o úmido do sangue, vendo-o manchar a ponta de seus dedos palpitantes.
— Devo ter batido em algum lugar — ele ainda estava ríspido demais.
— Vamos, entre na viatura. Eu te levo para o hospital.
— Eu não quero. Não preciso — ele negou, dando um passo para trás.
— Isso pode infeccionar; está fundo — tentou de novo.
— Eu não preciso, caralho! — ele gritou, franzindo o cenho. O policial o encarou com os olhos arregalados em desdém e as sobrancelhas erguidas.
— Tem certeza que não estava aqui na hora do acidente?
— Eu não sou imbecil; é óbvio que eu sei onde estava na hora que essa merda aconteceu.
— Garoto, eu acho melhor você controlar o seu tom de voz porque...
— Eu não estou me sentindo bem — disse , colocando a mão no machucado. — Essa porra está ardendo... — murmurou, mentindo. O policial engoliu e assentiu, virando-se para seu colega. Quando de costas para , este tirou a mão da cabeça e correu o mais rápido que pôde na direção que a ambulância seguiu.

Depois de quase três horas e meia, finalmente estava sozinha no quarto de hospital. estava esperando do lado de fora, com as asas expostas e os pés paralelos ao teto daquele lugar. Ele sentiu apenas o cheiro de sua garota, então recolheu sua figura original e pulou para o batente da janela dela, em um estalo tão silencioso que mais parecia uma folha seca se partindo.
Com imensa facilidade, destravou os fechos da janela e a abriu, adentrando o quarto com os pés nus e o corpo gelado pelo vento, frívolo pelo ódio.
Ele encarou sua pequena amaldiçoada com os olhos fechados e um curativo branco enrolando seu pescoço. O pulso enfaixado, a mesma agulha de soro com medicamentos que ele não queria saber o nome.
Esticou seu polegar e o tocou suavemente na bochecha da garota que, em um pulo, arregalou os olhos e puxou o pescoço para longe, sentindo-o palpitar.
Quando seus olhos azuis se focalizaram na figura de , ela quis gritar. Seus olhos se encheram de lágrimas novamente e ela sentiu o corpo tremer. Ela o encarava por trás de uma grossa cortina de água salgada. O nó em sua garganta tornou a crescer, e quando ela trouxe a mão machucada para tampar os lábios, lembrou-se da dor das dentadas daquele monstro.
Lembrou-se de seus olhos, de sua língua, e relacionou tudo ao homem que estava parado à sua frente.
Quando ele tentou aproximar novamente a mão dela, gemeu e encolheu as pernas, fechando os olhos com força, chorando mais do que já chorara em toda sua vida. Seus dedos tremiam, seu corpo ardia, o medo a possuía lentamente.
— Não. Toca. Em. Mim — chorou ela, implorando. Quando abriu os olhos cristalinos novamente, o encarou com os seus levemente arregalados.
E sentiu medo. Uma avalanche de sentimentos que ela possuía dentro de si, todos convertidos em dor e pavor.
, me deixa explicar. Me deixa ao menos... — ele tentou novamente, fazendo-a gritar um pouco mais alto. Ele deu um passo para trás, travando o maxilar. — Pelo Diabo, larga de ser tão medrosa, porra! — ele rosnou, rolando os olhos.
A garota tremeu, mordendo os lábios com força. Seu rosto estava molhado, sua mente possuída por aquelas imagens, aquele demônio.
— Sai daqui — pediu ela, sussurrando.
, eu...
Sai daqui! — ela gritou, empurrando o cobertor enquanto impulsionava o tronco para frente, franzindo o cenho, reunindo coragem para se aproximar daquela coisa.
Ele molhou os lábios e assentiu, estalando a língua, enquanto ouvia passos apressados de enfermeiras.
— Da próxima vez — ele esticou o indicador no rosto dela — eu não penso em salvar a porra da sua pele de um demônio que não tem autocontrole.
E então partiu, com a mesma facilidade que adentrou aquele quarto.
Quando a enfermeira abriu a porta, nada além do choro aflito da garota e o canto do vento habitavam aquele quarto.

gritou de ódio enquanto arremessava uma mesa de madeira no chão, vendo-a estraçalhar em mil pedaços. Seus olhos estavam possuídos de vermelho, seus dentes estavam afiados, seus chifres estavam apontados para o céu e suas veias saltavam em roxo e vermelho.
— PORRA! — ele gritou, chutando a parede da sala da casa de sua mãe. Ali, abriu-se um caminho para ratazanas, onde alguns poucos insetos ainda sobreviventes correram pelo piso de madeira. — ! — ele gritou seu nome com a força que o diabo havia lhe dado, arranhando sangue nas paredes de sua garganta.
Ele urrou mais uma vez, empurrando um armário de louças para o chão, escutando todas as porcelanas quebrarem. correu para o corredor da extrema esquerda, ainda ofegando em ódio, quase espumando, e esmurrou a porta de aço com o máximo de sua força. Chutava e socava, gritando, pensando em Richard, pensando em .
Odiava mais aquela filha da puta do que a situação em si. Odiava aquela porra de mente humana tão pequena e irritante que temia o que era subterrâneo. Temia o demônio às avessas que a salvou da morte. A salvou do caralho da morte! E ela ainda tinha medo? Ela o recusava?
Ele rosnou, batendo na porta com as duas mãos, vendo-a afundar em seus pulsos.
Fechou os olhos, mordendo e rasgando o próprio lábio inferior, franzindo o cenho quando se lembrava do modo que ela o olhou...
Estava completamente apavorada. Sentia asco, sentia repulsa. Repulsa por quem teve cuidado com ela! Por quem não havia pensado em matá-la sequer duas vezes, como aquele bastardo havia feito! Ele a salvara, inferno!
— COMO ELA OUSA?! — ele urrou. — COMO ESSA FILHA DA PUTA OUSA?!
Ele rosnou novamente antes de enfiar seu dedo com ódio no pequeno botão que o furaria em uma pequena bolha. Quando a porta abriu um pequeno vão, ele já correra para as garrafas da coleção de sua mãe.
Puxou as correntes que ainda prendiam os pulsos esqueléticos daqueles antigos amaldiçoados, destroçando seus ossos, quebrando-os em mil partículas infinitas. Ele chutou a parede de pedras, vendo-a abrir um buraco.
Virando-se com os dentes expostos para as garrafas, ele capturou uma nas mãos e bateu o gargalo no próprio braço, vendo o sangue colorir sua pele pálida. Ele passou a língua ali, sentindo aquele prazer e aquela força instantânea que o sangue de um amaldiçoado carrega. Ele encaixou o vidro quebrado nos lábios, sentindo o ardor do corte, sentindo o quente do sangue escorrendo por sua garganta.
Tomou aquele conteúdo em um gole só, jogando a garrafa no chão assim que estava terminada.
Partiu para outra, mordendo o vidro do gargalo, engolindo-o junto com o sangue, misturando-se com seu próprio, das gengivas e da língua.
Ele estava se fodendo para a dor. Ele estava se fodendo para aquela porra de coleção. Ele estava se fodendo para aquela maldita casa. Ele estava se fodendo para a filha da puta medrosa de .
Sentia ódio dela. Sentia ódio de si por tê-la salvado. Sentia ódio. Apenas ódio.
Quando a segunda garrafa terminou, ele partiu para outra. E outra, e mais outra. Até que todo o sangue amaldiçoado que restava naquela casa estivesse dentro dele.
Com a boca ensanguentada e os olhos vermelhos como o inferno, ele respirava com dificuldade enquanto olhava encurvado para a porta.
Já tinha mais força por ser o único filho de Lilith, então, agora, com diversos sangues amaldiçoados no sistema, poderia destruir Richard.
Poderia fazê-lo ser um pedaço de merda no chão. Poderia fazê-lo engolir seu próprio corpo, comendo-o esquartejado, engolindo suas tripas.
Ele sorriu com aquela visão, sentindo uma gota de sangue cair no chão. Olhando para baixo, apoiou o peso no corpo nas mãos e nos joelhos, encurvando as costas quando as asas negras saíram como duas navalhas de suas costas, eriçadas e abertas em quase quatro metros de largura além de seu corpo.
Quando se colocou de pé e olhou para o teto, pronto para destruí-lo com o baque de seu corpo, ele escutou a voz de sua mãe como o zunindo de um mosquito.
Moveu o queixo com rapidez, estalando o pescoço para trás. Fechou os olhos, gemendo que ela parasse.
Mas Lilith era orgulhosa e inquieta. Ela continuou soprando no ouvido de seu filho até que ele começasse a gritar de aflição, ajoelhado no chão, com as mãos no ouvido, tampando-os.
PARA COM ISSO! — ele gritou, encolhendo o corpo, encostando a testa no chão. — PARA! PARA! PARA! — ele gritou o mais alto que pôde, escutando um trovão quebrar bem acima de sua cabeça. — SAI DA MINHA MENTE, PORRA! — ele socou o chão.
A chuva caiu como canhões, quebrando o chão, inundando tudo à sua volta.
arqueou a cabeça, olhando com a boca entreaberta para o vão da porta.
Ali, em meio à sua confusão e seu ódio, ele conseguiu ter o vislumbre de uma mulher com um vestido comprido e cabelos gigantescos que tinham um brilho vermelho.
Sua boca ensanguentada, agora, estava entreaberta de confusão.
— Mãe? — ele sussurrou. — Mãe, é a senhora?
Ele se colocou de pé, apoiando os dedos no chão para tomar impulso, batendo as asas eriçadas nas paredes enquanto subia as escadas com os joelhos bambos.
Quando chegou ao seu topo, encarou as unhas compridas dos pés nus de sua mãe, o branco cristalino de sua pele. Tentando tocá-los, ela deu um passo para trás, recuando. estava ajoelhado diante da figura de Lilith, encarando-a por baixo, sem conseguir ver seu rosto sombreado.
— Eu não tinha a intenção... — ele disse, abaixando a cabeça, reverenciando-a. Tentou beijar seu pé esquerdo, mas ela deu outro passo para trás.
Quando tornou a levantar a cabeça, Lilith estava distante demais para que ele pudesse tocá-la.
— Não — pediu ele. — Não vai embora. Eu posso caçá-los para você — disse, referindo-se aos amaldiçoados. — Eu posso pressenti-los.
— Você não pode — respondeu ela, a voz somente em sua cabeça. A ruiva de vestido à sua frente não moveu os lábios. — Ninguém pode. Nem mesmo eu posso.
— Me perdoe, mãe, me perdoe.
— Você não tem controle — a ruiva rosnou, mostrando seus dentes. sentiu-se envergonhado, ajoelhado no chão, e abaixou a cabeça novamente. — Você é uma criança estúpida.
— Não... — ele gemeu, começando a chorar. — Eu não sou — fechou os olhos, sentindo o corpo inteiro arder em arrependimento.
— Eu te enojo.
Quando levantou a cabeça, a mulher havia sumido. Os vislumbres desapareceram, a chuva se tornou mais forte. Ele olhou para o lado, procurando-a, mas não a encontrou. Levantou-se com dificuldade, com o corpo e a boca molhados de sangue, e seguiu pela sala que havia pagado para que pudesse ser habitada novamente.
Encarou os móveis revirados, sentiu o ódio perambulando pelas paredes.
O sussurro de Lilith voltou.
“Mas você é meu filho. E é de vital importância que eu te ajude, e não te repulse.”


09.

My favorite inside source; i’ll kiss your open sores. You’re gonna stink and burn.

Richard pousou no chão como se tivesse sido arremessado, rolando uma ou duas vezes antes de se chocar com uma parede de tijolos vermelhos, deixando um rastro preto e gosmento no chão — seu sangue. Ele respirava de boca aberta, sentindo dor, com o cenho franzido e o pescoço quase deslocado. Os cortes causados pelo filho de Lilith ainda estavam aparentes e sua recuperação demoraria tempo demais, caso ele não arrumasse um sangue forte o bastante para fazê-lo cumprir com sua palavra de vingança.
Ele arregalou os olhos para o breu da madrugada, deixando-os com um brilho insano quando a recordação sussurrou em seus ouvidos.
“A prole de Lilith vive. A lenda é viva.”
O demônio fincou as garras na parede para se pôr de pé. Fez força nas asas trêmulas e nas coxas com músculos rígidos, sujos de sangue preto, que mais parecia graxa, e seguiu pela rua até sua esquina. Ali, pulou e voou pelos céus.

O hospital mais evidente ficava próximo de onde Richard havia sido arremessado, por falta de fôlego para continuar voando — para sua total sorte. Ajoelhando-se no chão quando tentou pousar novamente, amaldiçoou o filho de Lilith pelos machucados que causou em seus ossos, em sua pele e em seus músculos; mas percebeu que, graças ao sangue de , a recuperação estava caminhando bem.
Ele precisava encontrá-la o mais rápido possível.
A parte dos fundos do hospital estava vazia, com cigarros apagados no asfalto da rua. Richard puxou as asas, escondendo-as nas costas, inclinando o pescoço, machucando enquanto as costelas estalavam em dor, alargando-se. Passou a mão nos rasgos de suas roupas, limpando superficialmente o sangue que ainda escorria, agora em menor quantidade. Virou-se, ainda um pouco manco, e empurrou a porta do hospital até que a tranca quebrasse em um estalo alto para seus ouvidos sensíveis — ele entortou o rosto em raiva e dor, franzindo ainda mais o cenho.
Seus olhos estavam extremamente negros.
Richard caminhou pelo corredor branco, escuro pela hora da madrugada, entrou no vestiário dos enfermeiros e tomou um banho quente, limpando todo o resto de sangue preto impregnado em sua pele extremamente branca.
Os espelhos ficaram cobertos de vapor, enquanto o chão parecia sujo de lama.
Richard roubou o uniforme de um dos enfermeiros e, com os cabelos negros molhados e bagunçados, seguiu pelo corredor a caminho do cheiro de . Ele sorria amigável para todos que passavam e o encaravam com certa dúvida, amaldiçoando-o, marcando seu rosto, sentindo a garganta coçar e os dentes doerem sempre que imaginava o gosto de sua carne.
Ele virou os corredores, passou por quatro quartos, até chegar onde seu cheiro era mais forte. Parou à frente da porta de vidro coberto por persianas brancas fechadas por apenas um segundo, antes de encaixar seus dedos na maçaneta de metal frio e começar a abrir a porta.
— Enfermeiro? Oi, meu nome é Maya e eu sou a mãe de Burwell. Aconteceu alguma coisa? — a mulher que falava rápido tinha o cheiro semelhante, graças ao casaco que usava. Richard se virou lentamente, com os olhos quase esbugalhados. Os caninos afiados palpitaram em ódio e fome. O machucado do pescoço doeu tanto que ele quis quebrá-lo e jogá-lo longe.
— Senhorita Burwell — respondeu Richard, seco e rígido, mal piscando. Maya estava preocupada, com o cenho levemente franzido e a boca entreaberta. Ele notou que suas unhas estavam roídas e úmidas. — Só vou trocar o medicamento — ela olhou suas mãos vazias.
— Vai aplicar o quê? — indagou ela, encolhendo os olhos, inclinando o rosto. — Qual é seu nome?
— James Chapman — ele fechou a boca. — Senhora, por que não me acompanha? Parece estressada — ele abriu um temível sorriso de canto. Maya relaxou as feições por um segundo.
— Tenho que ficar aqui — ela apontou com a mão espalmada para cima para a porta. — Para caso ela acorde, precise de alguma coisa...
— Meu turno já está acabando — disse ele, com outro sorriso infernalmente maravilhoso, olhando para o lado, depois para ela —, temo que não nos veremos mais hoje, senhorita Burwell... Sei que não vai ficar aqui mais tempo — ele olhou em seus olhos.
— Não vai — ela assentiu, com um sorriso tranquilizado. — Ficou traumatizada por causa da briga de bar que teve...
— Briga de bar? — ele franziu o cenho. — Não soube dos detalhes... — ele se mostrou preocupado, cruzando os braços, separando um pouco mais as pernas. Maya sorriu com o olhar dele. — Sei que não deveria estar fazendo isso, senhorita Burwell, mas será que...
— Por favor, me chame de Maya — ela esticou a mão espalmada para ele. Richard sorriu e assentiu.
— Será que você, Maya — ele arqueou uma das sobrancelhas —, não gostaria de me contar essa temível história que aconteceu com a sua filha hoje, tomando um café? — ele sorriu amigável. Maya olhou para o chão com um sorriso tímido.
— Eu não acho que isso seja certo, senhor Chapman...
— Não é justo que não me chame de James — ele riu de uma forma adorável. Maya encarou seus perfeitos lábios, depois, seus olhos incrivelmente negros. — Venha me ver, Maya, daqui a meia hora — ele falou pausadamente, sem ao menos piscar. — Estou curioso sobre você. E, obviamente, sobre sua filha. Um café não mata ninguém — ele riu com aquilo. Maya sorriu junto e cruzou os braços também.
— Só um café, porque realmente preciso de um.

Depois de exatos trinta minutos, lá estava Maya, sentada em uma das cadeiras de uma cafeteria fora do hospital, do outro lado da rua, próxima de uma esquina.
Richard disse que, como funcionário do hospital, não aguentava mais o café daquela lanchonete, que a cafeteria do outro lado da rua tinha panquecas com muito mais recheio. Maya riu e concordou, contanto que estivessem lá, no máximo, dez minutos depois. Richard respondeu que cinco bastavam.
Eles realmente chegaram a tomar um café e Maya comeu um bolo de queijo com recheio de patê de presunto, depois foram caminhar pela rua, conversando sobre como foi horrível para ela descobrir que a filha estava praticamente se prostituindo para ajudar nas despesas de casa.
— Eu me senti culpada quando descobri, porque se não tivesse casado com um homem tão horrível quanto o pai dela não estaríamos em condições tão desagradáveis hoje em dia — a voz esganiçada de Maya denunciava que ela logo choraria. Richard, frio e irritado, se poupou de passar o braço pelos ombros da mulher e puxá-la para um abraço lateral de consolo.
— A culpa não foi sua — repetiu pela décima vez, com os olhos direcionados para o chão. Passariam pelo beco pela quarta vez, e aquela parecia a perfeita para empurrá-la ali, delicadamente, já que estava tão distraída contando seus problemas.
Ele não sabia como os médicos aguentavam.
— Foi, sim, James! — respondeu, com os olhos marejados, olhando para ele. — Gastei todo o dinheiro que tínhamos comprando aquela casa idiota e praticamente a obriguei a... — ela gesticulou com as mãos, começando a chorar.
Richard olhou para o lado, encheu as bochechas de ar e rolou os olhos. Ele mordeu o interior do lábio com força, a ponto de sangrar, apertou os pulsos e, quando passaram pelo vão, em um movimento rápido demais para olhos humanos, segurou os ombros de Maya e a prensou contra a parede, mordendo com força seu pescoço, tampando sua boca para impedi-la de gritar.
— James! — ela sussurrou, tentando empurrá-lo. — O que está fazendo?! — ele mordeu de novo e, dessa vez, conseguiu perfurar sua pele, fazendo o sangue jorrar.
— Meu nome não é James, Maya, e eu não sou um enfermeiro — ele olhou em seus olhos a proferir, sorrindo com os lábios sujos de sangue, rindo a ouvi-la começar a gritar.
Ele tampou novamente sua boca, pressionando-a com tanta força que seu grito apavorado não parecia nada além de um miado. Sugou seu sangue com força enquanto mordia seu pescoço, mastigando sua carne, engolindo-a de qualquer jeito, comendo-a como se fosse um animal irracional. Logo Maya morreu, perdendo a força nas pernas e o brilho dos olhos. Ela escorregou no chão, de forma que ele precisasse se ajoelhar para continuar se alimentando. Puxou-a pelos pulsos para o canto mais escuro daquele beco, atrás de uma pilha de lixos.
Richard percebeu que, por mais que a semelhança fosse pouca, Maya tinha um quê de maldição em seu sangue.
Com a boca, o queixo e o pescoço sujo de sangue, ele se sentiu regenerar. Torceu a cabeça, sorrindo para o céu daquele início de manhã. Então abaixou-se novamente, tornando a comer a carne da mãe da protegida do filho de Lilith, começando, assim, sua vingança.

acordou com uma sensação estranha. Procurou com os olhos encolhidos sua mãe pelo quarto, mas ela não estava ali. Molhando os lábios, ela apoiou as mãos espalmadas atrás do quadril para se posicionar sentada na cama, começando a acompanhar o movimento do lado de fora do quarto.
Próximo da recepção, um grupo de médicos e enfermeira conversava sério, olhando, de relance, para o quarto da garota.
se alarmou, empurrando os edredons de seu corpo, ficando de pé, caminhando rápida até a porta, abrindo-a com um empurrão que chamou a atenção de quase todos que estavam ali.
— Onde está minha mãe? — fora a primeira coisa que perguntou, com a voz ainda rouca de sono. Ela olhou para a sala de espera, com os sofás de veludo e as poltronas de couro preto. — Mãe? — ela gritou, andando para um dos corredores que levaria à cafeteria. — Mãe!
! — um dos médicos a chamou, correndo até ela. se virou com os olhos cheios de lágrimas; seu coração batia forte.
— Cadê ela? — sua voz se tornou mais rouca. O médico suspirou, olhando para o chão. — CADÊ ELA? — o médico a encarou.
— Sua mãe desapareceu durante o final da madrugada. Algumas enfermeiras disseram que ela saiu com um homem, com um enfermeiro — ele molhou seus lábios. — Ela havia comentado com Anabelle, a médica que estava cuidando de você no primeiro turno da noite, que sairia para tomar um café e...
— Onde-ela-está? — não conseguia vê-lo, graças às suas lágrimas. O ar parecia navalha quando passava por sua garganta.
— O dono da cafeteria foi jogar o lixo fora, ... E a encontrou esquartejada. Eu sinto muito. Sua mãe está morta.


10.

Poi faire se laisser reprendre? C’est une embuscade.

Escute!

“Esta é a última carta que escrevo.
Há certo tempo acreditei que a esperança poderia me salvar; acreditei que o mundo poderia ser um lugar melhor caso fugíssemos de nossos problemas — mas como sou ingênua e infantil a ponto de acreditar que eles não estão em mim, mas sim nas pessoas que me rondam?
Durante os dias em que estive aqui, o sol raiou, mas hoje fez frio e a chuva esconde qualquer resquício de felicidade, de que um dia chegamos a acreditar que algo poderia dar certo.
Mais idiotice maior fora a minha, em me prender à tamanha bola de lixo só por causa dela, da minha mãe, sabendo que nessa vida estúpida tudo tende a terminar, que nem mesmo o oxigênio é eterno — então melhor que terminemos nós mesmos, a deixar que ela nos machuque, sumindo com tudo de repente, certo?
Ser egoísta nos livra da dor que estou sentindo agora, essa coisa patética que parece não sair de dentro de mim de jeito nenhum — e, sinceramente, preferia que qualquer outro filho da puta estivesse no meu lugar.
Eu não quero mais viver — na verdade, eu nunca quis. Eu não quero ser salva e não quero abrir os olhos nessa vida. Não quero mais sentir ódio e sentir dor.
Só me deixe em paz.

deslizou o corpo ardido pela estreita banheira de porcelana branca, sentindo os cabelos negros ensopados moldando seus ombros como um véu negro. Com a ponta dos joelhos para fora, ela sentia frio em partes impossíveis do corpo.
A água que banhava por entre sua pele era rosada e tinha um forte cheiro de ferrugem. A parede branca, ao seu lado esquerdo, estava suja de sangue.
Os lábios vermelhos e volumosos daquela garota estavam quase pálidos, sem vida.
Seus olhos vagavam pelo teto e ela os abaixou para abaixo das mãos, nos pulsos, e encarou suas veias arroxeadas ainda conectadas.
Suas pupilas estavam tão cristalinas quanto o Mediterrâneo. Ela não tinha mais forças para deixar que lágrimas escapassem por suas órbitas e criassem um caminho quente por sua pele fria. simplesmente balançava o pescoço, apoiando a bochecha no ombro, vislumbrando o vestido de sua mãe enquanto ela arrumava alguma coisa na sala.
Maya ria e, quando se colocava de pé, seus longos cabelos acajus balançavam, brilhando com a luz fraca daquelas lâmpadas velhas.
sorriu para aquela imagem tão real — um simples arquear de lábios, tão suave que mal parecia ser um sorriso.
Ela puxou a mão por debaixo d’água, sentindo todos os cortes — nas coxas, cintura, barriga e braços — arderem com aquele simples movimento. Encaixou suavemente a lâmina no canto externo esquerdo de seu pulso esquerdo e segurou a ponta da lâmina sobre sua pulsação quase imperceptível.
Primeiro, a afundou vagarosamente, sentindo cada milímetro da dor. Afundou o máximo que podia, então a deitou, escorregando-a até a outra extremidade da pele. Quando tirou os olhos por um momento de sua mãe, que ainda sorria, e olhou para sua pele, viu o mar vermelho de sangue subindo pela água, contaminando-a com um cheiro forte e enjoado; com a ponta dos dedos extremamente frios, ela segurou a lâmina com a mão ferida e repetiu o mesmo movimento, tão lentamente quanto, no outro pulso.
Então, suavemente, abriu um sorriso pelo canto dos lábios e fechou os olhos, soltando um suspiro enquanto escorregava um pouco mais na porcelana, afundando até que a água avermelhada estivesse tocando na ponta de seu nariz arrebitado. Quando respirava, tão fraca e pausadamente, sentia aquele forte cheiro invadindo seu sistema, mas não incomodava; parecia cheiroso.
Ouviu o canto de sua mãe. Uma música que ela gostava, algo em francês, da Carla Bruni. Ela cantarolava e valsava sozinha na sala, com uma mão esticada para o lado e outra no alto do estômago, dançando sozinha, rindo. O vestido bailava nos joelhos, os cabelos não acompanhavam o vento, indo de um lado para o outro. E seu sorriso... tão puro e verdadeiro, como uma criança que ri pela primeira vez. As covinhas suaves no meio de suas bochechas coradas e o volume encantador em seus lábios sempre rosados por batom a deixava com um ar angelical.
nunca se esqueceria.

O sonho que a fez despertar tão cansada fora turbulento e bastante turvo. Quando abriu bem lentamente os olhos, deparou-se com uma infinidade de branco. Paredes, piso, teto, paisagem.
Em seu sonho, homens de preto amarraram seus pulsos em dois pedaços de aço e os esquentaram até que sua pele derretesse; costuraram seus lábios para que ela não gritasse e a mantiveram sentada de frente para um espelho para que pudesse acompanhar enquanto sua pele se desfazia como se fosse chocolate derretido.
Agora, desperta, ela não entendia o porquê de não conseguir se sentar. Abaixo de seu corpo coberto por um fino tecido branco, ela sentia o conforto de plumas.
Com o cenho franzido, ela se perguntou se estava no Paraíso... Mas era diferente de como sempre imaginou. Talvez fosse uma memória infantil, que o Paraíso fosse um lindo campo primaveril que se estendia até o infinito com pássaros cantarolando, coelhos, a grama bem verde, com flores extremamente coloridas e cheirosas e árvores mais velhas que a própria eternidade, uma mais linda que a outra — aquele Paraíso parecia uma caixa forrada de hospício: branco, frio e solitário.
Ela tentou se levantar novamente, mas seu corpo pesou mais do que se lembrava. Levantando apenas a cabeça, com muito custo, vislumbrou sua mãe.
Estava quase tão bonita quanto no dia que se casou.
Usava um vestido suave, rodado, de renda branca pura e mangas japonesas, com um pequeno decote de princesa; os cabelos estavam soltos, ondulados e continham nuances tão vermelhos como quando ela se posta abaixo do sol quente de verão; os lábios rosas e volumosos sorriam para a filha e os olhos cristalinos como os de estavam marejados em emoção de rever a filha.
tentou falar; chamá-la para perto, para poder tocá-la como desejava, mas Maya se afastou subitamente, dando dois passos para trás, quando um trovão alto ecoou naquela caixa branca, fazendo as luzes piscarem uma ou duas vezes.
O sorriso de sua mãe se foi.
“A garota está perdendo a pulsação, porra!” Um anjo irritado sussurrou com força, de longe. “Faça alguma coisa! Ela não pode m...”
sentiu o corpo flutuar; as plumas abaixo de seu corpo estavam se movimentando como se o vento fosse capaz de erguê-la e carregá-la para onde bem quisesse.
tentou resistir, tentando se mexer para sair de cima daquele acolchoado de plumas. Ela se debateu, indo primeiro para a direita, depois para a esquerda e, quando aumentou a força, despencou para o chão, caindo de costas.
Outro trovão, outro piscar de luzes.
Maya correu, se ajoelhando ao lado de filha, tocando suavemente a pele queimada dos pulsos. Segurou-a com cuidado, tentando colocá-la de pé, mas simplesmente não tinha forças para se mover.
Sentia raiva por isso. Estava ali, com sua mãe. Queria seguir com ela. Queria poder se levantar e correr com ela para longe daquela tempestade.
“Afastar!”
Outro trovão, outro piscar de luzes.
Maya pareceu dar um pulo para trás. O teto branco se desfez como se fosse de papel quando uma chuva forte começou a cair. A roupa de Maya grudou em seu corpo e seus cabelos ficaram ensopados, perdendo o brilho. Sua boca se contorceu para baixo e suas lágrimas se confundiram com as gotas da chuva.
“Afastar!”
quis gritar para que aquele anjo parasse com aquela chuva, com aqueles trovões. As gotas caíam diretamente em seus olhos e sua respiração pouco a pouco se tornava mais densa, fazendo-a respirar com a boca aberta.
Quando levantou a cabeça novamente, Maya estava distante e sua figura começava a ficar turva.
— Não... — ela conseguiu sussurrar.
Franziu o cenho para aquele céu amaldiçoado e reuniu todas as poucas forças de seu corpo frio e machucado, colocando-se sentada. Quando o fez, olhou diretamente para Maya e a viu ficar mais nítida, dando um passo em sua direção.
Quanto mais ela se aproximava, mais a chuva dava tréguas, ameaçando parar. Os trovões foram ficando cada vez mais fracos, assim como os clarões. Quando chegou próxima o bastante, Maya tocou o rosto molhado da filha, fazendo-a sentir seu calor arrepiar seus mínimos pelos.
sorriu, esticando a mão para tocar a mãe. Fechou os olhos, respirando com mais suavidade.
Então a chuva parou. Os trovões se afastaram tanto que pareciam zunidos.
As duas se abraçaram, então permitiu que um sorriso ganhasse seu rosto e uma lágrima de felicidade escorresse por sua bochecha pálida.


11.

Look at the red changes in the sky.

abriu os olhos lentamente, depois de dormir nos braços de sua mãe. Diferente do local onde adormecera, o céu não era azul turquesa e não havia um mar infinito tocando a beira de seus dedos dos pés.
Ela estava embalada como um bebê por um edredom grosso e caramelo, dos pés até as orelhas. Os pulsos ardiam como nunca, palpitando sempre que ela pensava em se mover. Sua cabeça doía como se houvesse um aparelho de tortura comprimindo suas extremidades para esmagá-lo como um inseto.
franziu o cenho, sentindo um cheiro e um vento estranho no nariz. Olhando para o lado, viu botões; para o outro, uma janela com persianas brancas fechadas. Uma poltrona de veludo azul claro. Uma janela de observação grande o bastante como se aquele lugar onde se encontrava agora fosse uma jaula em um show de horrores.
— Mãe? — ela sussurrou com a voz rouca e grossa pela falta de uso.
Ela não sabia por quanto tempo tinha dormido. Talvez sua mãe tenha uma casa naquela praia paradisíaca pela qual caminharam pela maior parte do dia anterior; Maya acordara mais cedo que a filha, então a levou nos braços até uma cabana, ou uma casa, ou um aposento...
— Você acordou — falou uma voz estranhamente conhecida. virou suavemente a cabeça para encarar aquela pessoa e quase soltou um grito agudo quando viu os negros olhos de .
Que porra aconteceu?, uma voz gritou na cabeça de .
Ela estava em um hospital. Naquele mesmo hospital que estava internada dias antes, por causa daquela briga na Burlesque onde...
Você é um monstro — disse , começando a sentir vontade de chorar. Ela engoliu toda a dor que sentia nos pulsos e se colocou sentada, empurrando os edredons para fora do corpo.
Encarou todos os diversos curativos onde, antes, continha um alto relevo com um traço ensanguentado no meio. Seus olhos estavam arregalados quando puxou os pulsos para a altura da vista.
Estavam costurados. As extremidades das veias estavam juntas novamente.
começou a chorar, empurrando a unha por dentro daquela costura. Puxou a pele, rasgando o curativo, vendo o sangue sair e pingar no lençol branco. Quando guiou o dedo indicador da mão esquerda para o pulso direito, soluçando de tanto chorar de ódio, a segurou, sentando-se ao seu lado.
Ela tentou se esquivar, mas ele era muito mais forte que ela.
Por que você fez isso? — ela gemeu entre os soluços, com os olhos encolhidos, a visão completamente marejada. O rosto estava vermelho e ela se sentia quente, com calor e muita raiva.
afrouxou suavemente as mãos dos pulsos ensanguentados de , tocando o canto do lábio.
Ela deu um pulo para trás, quase caindo da cama. O suporte para soro balançou e vacilou cair.
— Não toca em mim — ela o amaldiçoou, molhando os lábios. Tentou se colocar de pé para se afastar dele, mas sentia-se debilmente fraca. — Enfermeira! — ela tentou gritar, mas sua voz era rouca como se tivesse passado uma noite inteira em uma competição de quem gritava mais alto.
— Suas memórias são incríveis — disse , estranhamente sereno, mal se incomodando com o pavor de . — Obrigado por compartilhar comigo.
— Eu não compartilhei nada com você, porra! No inferno não te ensinaram a ler? — ela se lembrou do ataque de Richard e seu corpo inteiro estremeceu. Instintivamente, encolheu as pernas, balançando a cabeça para afastar aqueles pensamentos. — Eu pedi que não me salvassem!
— Eu não podia te deixar morrer — ele praticamente franziu as sobrancelhas. Era premeditada sua falsidade. sentiu medo dele. Sentiu pavor. Seu coração bateu mais forte e o aparelho acusou aquilo. desviou seus olhos cristalinos dos dela para o aparelho, então abriu um sorriso debochado pelo canto dos lábios.
— O que você quer de mim? O que você está fazendo aqui? — ela chorou um pouco mais, apertando os pulsos doloridos. Assim que se visse sozinha novamente, arrumaria um jeito de se matar. Injetaria insulina na veia, cortaria a artéria do pescoço com um bisturi, se eletrocutaria. Oportunidades não faltariam.
— Só queria saber se você ia sobreviver — respondeu com um quê de sinceridade na voz. — Agora que sei que está bem, vou embora. Tenho assuntos mal resolvidos por aí, com umas pessoas.
Ela não queria que aquela conversa se prolongasse, por isso virou o rosto e esperou que ele fosse embora. Assim que escutou seus passos se perderem no silêncio daquela madrugada, puxou a agulha de soro de sua veia e empurrou os edredons para o chão. Levantou-se ainda meio cambaleante e, pelo canto do quarto, com os dedos arrastando na parede, caminhou para o corredor, indo para o lado contrário que seguira.
Olhava para trás de segundo em segundo, para ter certeza que não a seguiam, caminhando na ponta dos pés.
O corredor era largo e de porcelanato branco, impecavelmente limpo; as paredes eram azuis e o ar condicionado deixava tudo muito frio. No final do corredor, havia uma parede feita de vidro — na falta de cortinas, o brilho da noite adentrava o hospital e iluminava parte do chão, deixando tudo com um aspecto assustador.
Ela seguiu até o final, olhando para aquele labirinto: de um lado, mais quartos; do outro, uma escadaria e um elevador.
Ela optou pela escada. Subiu um degrau de cada vez, olhando pela janela o chão se afastar gradativamente. Girou quatro ou cinco andares, até que a escadaria acabasse no último andar. Ali, com o chão de cimento queimado, havia uma porta vermelha de incêndio e, do outro lado, um corredor onde passos podiam facilmente ser ouvidos.
empurrou a barra branca da porta vermelha e sentiu o vento gelado da noite empurrar seus cabelos para trás. O metal bateu atrás de seu corpo, trancando-se por dentro.
O céu estava em um tom arroxeado, sem nuvens, e a lua cheia brilhava intensamente. Adiante da floresta, uma alta montanha contornava sua silhueta negra no céu como se fosse uma pintura. caminhou pelo chão frio com as mãos soltas ao lado do corpo, olhando diretamente para o céu. O furo que havia feito em seu pulso com a unha logo pararia de sangrar, sendo apenas uma mancha vermelha que escorria por sua camisola branca.
Ela se aproximou da beirada do teto, onde havia uma estúpida proteção — parecia mais um degrau que convidava a subir, analisando a altura antes de se jogar em um salto perfeito.
Ela não hesitou. Subiu um pé, depois o outro. O vento chicoteou mais forte, fazendo-a fechar os olhos e respirar fundo, jogando a cabeça para trás.
Não iria dar a chance de ser salva novamente. Esticou um pé para frente e deu um passo em falso, começando a cair.
Caiu como uma pedra, em uma rapidez incrível. Apertou os olhos quando pressentiu o chão, mas ele parecia chegar.
Ao invés disso, mãos quentes seguraram na parte traseira de seus joelhos e a lateral de seu pescoço, espalmada na mandíbula e na bochecha. O vento continuava chocando-se com força em seu corpo, mas agora a chicoteava de frente, não de baixo. Ela abriu os olhos e enxergou as árvores se transformarem em borrões pretos no ar. Olhou para cima e viu o rosto contraído de . gritou e começou a se debater, movendo as pernas e os braços, socando o peitoral.
rosnou, largando-a no chão, continuando a correr floresta adentro.
respirava descompassadamente, abaixando os olhos para as pernas e braços sujos de terra úmida. As árvores cobriam o céu, tornando aquele local escuro e assustador.
Ela ouviu passos rápidos que logo se tornaram uma corrida. O uivo de um lobo e o canto de uma coruja.
chorou, mordendo os lábios, se colocando de pé, mancando para o vão entre duas árvores, onde havia uma pequena fresta de luz. Ali havia uma pedra pontiaguda suja de sangue seco — o cheiro de carne podre fazia seu nariz pinicar e sua garganta fechar. Ela encolheu os olhos, franzindo as sobrancelhas em medo. Virou-se quando ouviu os passos próximos, então notou olhos amarelados brilhando no escuro.
Sua mente, já completamente apavorada, a fez lembrar-se de um filme de exorcismo onde o demônio tinha olhos que brilhavam no escuro.
Ela gemeu, dando alguns passos para trás. Seu calcanhar arranhou na pedra acinzentada, que, sob a luz da lua, parecia azul.
O animal/demônio/assassino se aproximou, mostrando-se na luz.
Era um lobo; um lobo gigantesco, talvez o maior que ela já tivesse visto em toda a sua vida.
Não era ridiculamente enorme, como os de ficção, mas tinha quase um metro e meio de altura, o pelo negro como a escuridão e garras tão afiadas e amarelas quanto unhas de mortos.
O lobo rosnou, mostrando seus dentes afiados e brancos. Atrás dele, outros nove apareceram, tão gigantescos e irritados quanto o que se mostrava na frente. E todos estavam em posição de ataque.
pensou em sua mãe. Previu a dor que sentiria nos próximos segundos, morrendo da mesma forma que ela — mastigada, servindo de alimento para um animal momentaneamente mais forte —, mas tentou se tranquilizar quando se lembrou de que era aquilo que queria: morrer.
Com os dedos gélidos trêmulos, pegou uma pedra no chão e jogou na direção dos caninos.
Aquele fora o tiro para que eles atacassem.
Eles correram todos de uma vez para cima de , que se encolheu e fechou os olhos. A primeira mordida fora na perna, depois sentiu as patas e unhas de um deles em seu braço, pulando para alcançar seu pescoço.
Eles rosnavam, então de repente começaram a chorar como filhotes.
Um urro mais alto cortou as árvores, fazendo estremecer e tombar no chão. Sua perna palpitava e seus olhos ainda estavam fechados. De repente, uma lufada de ar empurrou seus cabelos para frente. Ouviu-se algo ser brutalmente jogado contra uma árvore, fazendo-a estremecer e o animal chorar.
Outro urro, um rosnado, uma abocanhada — o som fora tão alto que ela pensou ter sido bem ao lado de seu tímpano.
gemeu de medo, encolhendo-se ainda mais. Sentia-se completamente despida, com as roupas rasgadas e o corpo encolhido, mostrando mais do que queria, mas não se importava com a quase nudez. Realmente não se importava.
Segundos depois, ouviu os mesmos passos se afastando. Quando nada além de duas respirações descompassadas tomavam aquele ar, ela permitiu que seus olhos abrissem lentamente, encarando seu próprio sangue na pedra.
— VOCÊ É IMBECIL? — gritou parado à sua frente. Ela se encolheu novamente. — Qual é a desgraça do seu problema, ?!
— VOCÊ É! — ela também gritou, com toda a força que ainda lhe restava, e postou-se de pé, ainda trêmula. Quando o encarou, seu corpo ficou gelado e toda sua coragem escorregou por suas entranhas.
Ele estava com seus chifres expostos, os caninos afiados, os olhos vermelhos, as veias exaltadas, as asas abertas e o corpo machucado, sangrando preto. Ele tinha o rosto contorcido em pura raiva e ódio e o cenho tão franzido que parecia machucar.
O fôlego de escapou por sua boca e ela tentou dar um passo para trás.
— O que... — ela tentou, tremendo, gaguejando. — O que você...
— O que parece, ? — ele falou alto. Sua voz estava mais grossa e quando ele gritava, ecoava na floresta. — Você não é burra. Não é burra — seus chifres encolheram lentamente, escondendo-se na testa.
estremeceu em agonia.
Os olhos dele lentamente tornaram com o tom natural e os dentes encolheram, ficando pouco maiores que o natural de um humano. As asas bateram e ele não se deu ao trabalho de guardá-las.
se perdeu em suas brilhantes e, aparentemente, aveludadas penas negras por mais de um segundo. Era uma envergadura de quase quatro metros e meio. Subiam dois metros para cima, além de seus mais de 1,83.
Quando as asas se moveram, ela tornou a olhar para o rosto daquele que a salvara mais de duas vezes em apenas cinco horas.
— O que você quer de mim? — ela disse de uma vez, com a voz baixa como um miado. a rodeou, fazendo-a morder os lábios e contrair as coxas completamente nuas.
A camisola do hospital tinha uma pequena fenda na lateral de seu corpo, que estava rasgada até metade do seio direito, deixando-o quase à mostra. A barra estava acidentalmente dobrada e amassada, deixando-a com as coxas completamente expostas. Os cabelos bagunçados, o pulso ensanguentado, o olhar amedrontado e os lábios trêmulos.
estava patética e riu disso. Riu de seu medo.
— É ofensivo que sinta medo de mim — disse ele, em seu tom normal. Ainda era estrondosamente alto para o silêncio da floresta. — Eu salvei a sua vida.
— Por quê? — ela miou.
— Porque eu preciso do seu sangue — ele finalmente disse, parando de andar quando ficou atrás de . Ela sentiu um arrepio na espinha. — Preciso de você viva.
— Quem é você?
Giansanti.
— Quem realmente é você? — ela corrigiu, adquirindo um tom raivoso. abriu um sorriso sarcástico.
— Sou da prole de Lúcifer e Lilith, o único herdeiro do inferno — ela fechou os olhos, sentindo os dedos tremerem. — Sou o anticristo — ele praticamente esbanjou o prazer que sentia a proferir aquilo.
— Por que precisa do meu sangue?
— Porque ele é amaldiçoado — ela franziu o cenho, virando o rosto para ele. Teve medo de olhar em seus olhos. — Ele é especial para minha espécie.
— Sua... espécie?
— Você sabe que eu não sou o único — ele rolou os olhos. O canto inferior direito de sua asa se moveu e os olhos de se prenderam ali. — Você não é burra — repetiu ele.
— Richard... — deveria ser uma afirmação, mas soou como uma pergunta.
— E muitos outros — ele parecia entediado. — Demônios correm soltos pela Terra e vocês, humanos, mal nos percebem — ela tremeu novamente com aquela palavra. — Por que você está com tanto medo? — ele perguntou sério, parando de frente para ela com os braços cruzados. percebeu que o ferimento em seu peitoral havia sumido. — Você acredita em Deus, não acredita?
Ela não respondeu; mal respirou. Não sabia mais no que acreditava.
— Então por que não acredita em demônios? — ele praticamente contorceu o rosto em uma confusão sarcástica. mordeu os lábios e respirou fundo, tentando se controlar. — Se existe um Paraíso, por que não existe um inferno? E um Diabo? Se existe um...
— Tá — ela disse alto, abrindo subitamente os olhos. — Eu já entendi — ele sorriu novamente. — Richard queria me matar — lembrou-se ela, controlando o tremor —, por que você não quer?
— Porque eu sou mais esperto que ele — disse rápido, de forma óbvia. — Minha mãe me ensinou que precisamos guardar seu sangue como se fosse uma preciosidade, tomando de pouco em pouco.
Ela não sabia como reagir. percebeu que ela prendia o ar, então soltou uma gargalhada que mostrou seus dentes um pouco afiados.
... — ele cantarolou, se aproximando dela. — Você fica tão adorável com medo... — ele esticou os dedos sujos de sangue para tocar o rosto dela; acompanhou apenas com os olhos enquanto ele se aproximava, sentindo o calor do toque entre suas peles.
— O que tem de errado com o meu sangue? — perguntou, desviando o rosto para que ele parasse de tocá-la. continuou com a mão parada, olhando fixamente para os olhos perdidos dela.
— Nada de errado — ele disse, abaixando a mão. As asas balançaram. — Ele é especial. É melhor, mais forte. Se existirem dez como você no mundo, é muito — ele se virou.
passou os olhos pelos músculos de suas costas, acompanhando o trajeto que suas asas faziam. Iam desde as omoplatas até os rins em um V de cabeça para baixo.
Ele se virou. Ela desviou o olhar.
— Por que você precisa dele?
— Porque me deixa mais forte — ele sorriu. Seus olhos adquiriram um brilho insano. — Por ser o herdeiro, já tenho privilégio sob os outros demônios, mas, com o seu sangue, eu me torno quase invencível.
— Você quer dominar o mundo? — havia um quê de riso em sua voz. apreciou; ela estava voltando a ser a que ele conhecia e gostava.
Ele negou com a cabeça.
— Não importa o motivo — ele molhou os lábios, vendo os músculos das coxas de ficarem menos rígidos conforme ela ficava menos tensa. — Você está se lembrando de quem eu sou.
— Um demônio maníaco que quer meu sangue — ela assentiu. Quando falou em voz alta, sentiu uma pontada de medo.
— Sou aquele cara que te deixa louca — ele sorriu. O medo de deu espaço para uma pontada de calor.
— Você disse que os que têm o meu sangue são poucos — desconversou ela. — Por quê?
— Maldições não são como pragas — ele se virou, encarando a escuridão. — Os amaldiçoados são especiais e só se é especial caso seja raro.
O lobo de pelos negros tornou a aparecer. deu um passo para trás, alarmada.
deu um passo para frente e trouxe as mãos para o rosto, cobrindo os olhos. Não queria ver um animal ser esquartejado, por mais que aquele mesmo animal tivesse a atacado minutos antes.
Ela não conseguiu. Abriu um vão entre o dedo indicador e o médio, espiando.
estava ajoelhado no chão, acariciando o lobo.
franziu o cenho.
— Criaturas noturnas nunca deveriam brigar — disse ele, mais para o lobo que para . — Mas existem limites de sanidade — ele se colocou de pé novamente. O lobo se sentou como se fosse um cachorro. a olhou. — Eu sou filho de Lúcifer — disse sem emoção —, o primeiro anjo expulso do céu. Primeiramente, ele ficou na Terra. Ficou vagando, procriando com humanas, instigando-os a pecarem mais — havia um quê de nojo em sua voz —, criando metade-humanos metade-demônios que contaminaram esses solos. Eles, sim, cresceram como se fossem uma praga — a encarou no fundo dos olhos, lendo sua alma. — Destruíam tudo em seu caminho, se alimentavam dos humanos e pouco a pouco conquistaram territórios. Foram enviados anjos guardiões para proteger a criação de Deus — agora seu tom era realmente entediado e ele se recostou ao tronco de uma árvore — e a Terra se tornou um campo de batalha entre anjos e demônios. Poucos meses se passaram e praticamente tudo estava destruído; a Terra era uma bola de rocha que ocupava espaço no universo, sendo habitado por criaturas que não raciocinavam. Isso tudo era um deserto — ela olhou à sua volta. Era difícil imaginar que aquele planeta todo era uma bola de terra amarela, um deserto gigantesco. — Os humanos eram poucos, e, os que sobreviveram, morriam de doenças, de fome, de sede, de delírio. Mesmo mortos por três, quatro semanas, ainda eram um banquete para qualquer demônio esfomeado — o estômago dela embrulhou e abriu um sorriso sombrio. — Toda a América do Norte estava deserta. A Europa e a África estavam à beira da extinção. As populações que sobravam se protegiam com a ajuda dos anjos, mas não era grande coisa — deu de ombros com desdém. — Então um anjo chamado Tadeu teve a brilhante ideia — aquilo transbordava ironia — de pedir ajuda para outro tipo de criatura. Uma criatura que não é nem noturna, nem divina — ele se calou, como um professor, esperando que respondesse. Quando seus olhos se encontraram, por menos de um segundo, ela os notou extremamente escuros. Estavam tão negros que ela não conseguia diferenciar o que era íris e o que era pupila.
— O quê? — ele riu.
— Bruxas — ela quase gemeu um “ahhh” e subiu as sobrancelhas. — Tadeu pediu ajuda às bruxas. Disse que os demônios estavam devastando a natureza, queimando florestas, matando animais, consumindo sangue sem necessidade. O mundo estava em desequilíbrio e era obrigação delas devolver sua ordem.
— O que isso tem a ver com o meu sangue? — o lobo rosnou e gargalhou novamente. — Ele age como um cachorro — pensou alto, fazendo uma careta.
— Eugine McGully — ele disse, atraindo a atenção dela de volta para seu rosto.
— Quê?
— Esse era o nome da virgem que precisou ser sacrificada para que a maldição das bruxas se concretizasse — o sangue de ficou frio e os pelos de sua nuca se eriçaram. — Elas a amarraram em uma mesa de granito preto, nua, na primeira sexta feira de lua cheia do ano. As pernas e os braços estavam amarrados nas extremidades; fizeram um feitiço para que ela não pudesse reagir. A garota ficou lá, parada, olhando para o céu, chorando, enquanto aquelas velhas malucas sussurravam em latim e queimavam folhas de eucalipto por cima do peito dela.
tentou se imaginar no lugar de Eugine. Seu corpo inteiro ficou arrepiado e uma brisa fria cortou sua pele, fazendo-a estremecer. não se importou; estava deliciado com aquelas lembranças.
— Elas pegaram um pedaço de madeira, afiaram e cortaram o peito de um demônio capturado e devidamente alimentado com sangue de uma criatura noturna, como um lobo — ele acariciou a cabeça do canino. — Ele gritou, girou a cabeça, as amaldiçoou. Como se fosse ajudar em alguma coisa quando o assunto é bruxas — ele rolou os olhos, com pena da ignorância daquela criatura desesperada. — Depois, pegaram a mesma madeira e cortaram todas as veias principais do corpo da virgem — ele a olhou. — Os pulsos, o quadril, a virilha, o pescoço. Cortaram o peito dela até o final do umbigo, quebrando as costelas, fazendo uma tigela — ele sorriu com malícia, depois riu. — Despejaram parte do sangue do demônio dentro da virgem e deixaram-na aberta, com sangue escorrendo, quando a lua estava em seu pico máximo. Disseram que os olhos da virgem viraram completamente enquanto um som horrível saía da boca dela — ele sorriu mais — e, mesmo com o feitiço, ela se debateu; o sangue escorreu um pouco para o chão e começou, de baixo para cima, a ficar uma tonalidade muito mais clara que o sangue de uma pessoa normal. O cheiro era doce e foi exalado para a atmosfera como a doença do vento... —aspirando o ar com os olhos fechados, jogou a cabeça para trás. O lobo o olhou, depois olhou para ; ficou de pé. — Todos os demônios sentiram aquele cheiro diferente e quiseram saber o que era. Quando chegaram ao local do sacrifício, só havia o pequeno litro que caíra no chão. Eles se jogaram no chão — ele começou a rir — como um bando de animais e ficaram lambendo aquela rocha como se não houvesse mais alimento no universo, só aquele resquício de sangue modificado por bruxas — o som se tornou mais alto, mais psicótico. deu um passo para trás. Em um segundo, estava por trás dela, segurando-a nos cotovelos, com a boca bem próxima de seu ouvido. — Eles nunca provaram algo igual — ele a beijou suavemente, roçando os dentes no lóbulo de sua orelha. se odiou por ter gostado daquilo. A dor em sua perna, agora, era quase imperceptível — Perderam noites e dias caçando, sem descansar, até que foram ficando fracos e completamente vulneráveis para os anjos — ele sussurrava; os joelhos dela tremeram. — Até que, na lua cheia seguinte, Eugine foi posta para o sacrifício novamente. As bruxas deixaram que a garota mostrasse o que estava sentindo, porque o medo enobrece qualquer ato de um demônio, o alimenta de uma energia quase tão saborosa quanto o gosto de um sangue podre — ele riu contra o ouvido dela, afastando-se subitamente.
cambaleou um pouco zonza, sentindo o aveludado toque da asa de em sua coxa nua. A mordida do lobo sangrou mais, palpitando e ardendo.
mal se importou com aquele ferimento.
— Levaram-na para um ponto alto, no meio do deserto consumido em fogo e morte que os demônios criaram — ele tornou a dizer, agora, na frente dela. Suas asas envolviam seus corpos como se fosse uma cúpula, tocando a parte traseira do corpo de . — Deixaram-na usando um vestido branco, símbolo de virgindade, e soltaram um sinal nos céus para que todos os demônios ainda existentes se reunissem como um exército, exalando o cheiro dela em uma fumaça vermelha. No total eram mais de dois milhões — ele sussurrou deleitoso, afastando-se novamente, tornando a ficar recostado na árvore, acariciando as costas do lobo de pelos negros, sentado ereto. — Todos eles pareciam zumbis enlouquecidos. Estavam imundos, fediam, não saíam de sua forma original nem por um segundo e estavam completamente esfomeados por aquele sangue novo, que fazia os outros parecerem esgoto. Boatos bons correm depressa — ele piscou, abrindo um sorriso lateral enquanto levantava suave e sugestivamente a sobrancelha direita. — Tadeu pegou uma adaga de prata e a refletiu no sol, rasgou o pescoço da virgem e deixou que a cabeça dela rolasse pelo penhasco. Os demônios atacaram como se fosse a única comida que existia — ele molhou os lábios, lambendo-os. — Quando um deles enfim reconheceu que aquela era a humana dotada de tal portentoso sangue, voou para cima de Tadeu e arrancou a menina de seus braços. Subiu para os céus e todos os outros o seguiram, como um bando de gaivotas que lutam por um único alimento. Não sobrou nem os ossos dela. Um demônio se machucou; foi mordido por acidente. O que o mordeu, percebeu que o gosto era semelhante, o gosto da menina estava dentro do sistema dele; o sangue dela circulava por dentro dele por mais ou menos duas horas. Todos que se alimentaram dela foram devorados, e assim, sobrou menos de mil. Aqueles ficaram loucos, procurando mais sangues amaldiçoados, mas as bruxas não haviam preparado tantos assim.
— Mas isso faria com que eles matassem todos os humanos restantes em busca dos que tinham sangue amaldiçoado — disse , com os braços cruzados de frio. assentiu.
— Mas meu pai abriu as portas do inferno — lembrou-se. — Minha mãe estava ao seu lado e eu estava começando a ser planejado a existir...
— Espera — ela o cortou, esticando o indicador. — Quantos anos você tem?
sorriu.
— Isso é nojento — ela se arrepiou e fez uma careta. — Muito nojento.
Ele gargalhou alto.
— Com os portões do inferno abertos, todos os demônios foram sugados. Os que mataram humanos foram severamente castigados por meu pai. Ele os matou como moscas. Arrancou primeiro as asas, pena por pena, depois as unhas, os dedos, os pés, as panturrilhas, as coxas, rasgou o corpo ao meio, os antebraços, os bíceps... — ele ia enumerando nos dedos. — E deixava a cabeça lá por alguns dias, junto ao que restava do corpo.
— Isso é cruel — disse sem pensar.
— Depois de quase quatro dias, meu pai próprio ia à torre onde ele os mantinha prisioneiros, e os arrancava as cabeças.
— Mas por que ele quer que a humanidade exista? — ela franziu o cenho.
— Ele quer dominar os três mundos.
— Os três mundos? — franziu o cenho.
— Já disse demais — ele molhou os lábios e desencostou da árvore, caminhando até ela. — Melhor te levar de volta para o hospital para eles cuidarem dessa mordida — ele olhou para a panturrilha trêmula de , e só então ela pareceu se recordar que o frio fazia a dor aumentar, palpitando, queimando e ardendo muito mais que normalmente seria.
assentiu, mas só porque seus dentes começaram a bater de tanto frio. Ela deixou que ele se aproximasse o bastante para tocar suas mãos em sua cintura, pegando-a no colo como se fosse uma boneca de pano. Então, de uma só vez, suas asas começaram a se movimentar e ele avançou pelo céu negro em uma velocidade incrível.
fechou seus olhos, com medo e muito frio. O corpo de era extremamente quente e ela se sentia acolhida em seus braços, mas se castigava por saber quem ele realmente era e o que ele queria dela.
Não se aproximou com intenções naturais; ele, sempre, só desejou seu sangue. E ele era um demônio. Que tipo de pessoa se sente segura nos braços de um demônio?
Tão rápido quanto começou, terminou. pousou no telhado lateral do hospital, em uma penumbra tão escura que mal era possível enxergar suas asas — o que, por um lado, era um alívio.
, se não soubesse do que se tratava, não ia gostar de ver um cara forte e seminu de quase um metro e noventa com asas sobrenaturais gigantescas coladas nas costas.
— E, ah — ele disse, antes de se virar de costas para ela, abrindo a janela do quarto onde ela deveria estar. Ninguém notara sua falta.
Hospital de merda, ela pensou.
— Não tente se matar novamente — ele a encarou pelo canto dos olhos. — Eu vou acabar sabendo.
— Romântico — disse ela, com ironia. — Tenho um anjo da guarda — riu, virando-se de costas enquanto batia as asas e sumia na escuridão.
olhou para baixo — era uma altura considerável. Olhou para os pulsos, depois para a lua. Pensou em Eugine, em seu sacrifício. Em sua mãe...
Caminhou até a beirada do telhado e viu a ponta dos pés balançando no ar.
sorriu em deboche, dando um passo para trás enquanto negava com a cabeça e se encolhia para passar pelos batentes da janela, mancando para baixo do edredom.

chegou em casa pouco antes do sol nascer. Ainda estava escuro e, graças à chuva, o dia seria frio e assombroso. Ele soltou um suspiro e olhou, pelo canto dos olhos, para o corredor.
Havia outra pessoa ali. Ele sentia seu cheiro. Era outro demônio.
Ele expulsou os dentes, as garras e os chifres. Dando apenas um pulo, batendo as asas, deixando-as direcionadas para frente como os pelos eriçados de um gato preste a atacar, ele fincou as unhas na parede, quase tocando o teto, quase ficando de cabeça para baixo. Caminhou, assim, silenciosamente pelas paredes até onde o cheiro era mais forte: em seu quarto, no segundo andar. Seguiu pelo corredor com os olhos e ouvidos atentos, com os dentes expostos e as penas afiadas como adagas — bastava um golpe certo no pescoço que aquele demônio morreria.
odiava intrometidos.
Quando chegou próximo o bastante do batente da porta, conseguiu escutar que o demônio revirava suas coisas.
Seu cheiro não era ruim; era doce como flores de cerejeiras. Ele ficou curioso e, antes mesmo de pensar, botou a cabeça por dentro do quarto, encarando uma fêmea virada de costas.
Seus cabelos eram compridos e ondulados, em um tom cobre vivo, forte e brilhante. A luz que adentrava aquele cômodo pelas janelas foscas era suficiente para iluminar o vestido de seda rosada que aquela mulher usava. Sua pele era branca como porcelana e, conforme ela revirava a gaveta de , ele conseguia notar que não era manchada por nenhuma única pinta.
Quando a mulher parou e ergueu a cabeça, virando-se suavemente de perfil, pôde ver alguns detalhes de seu rosto: cílios longos e expressos, negros como a noite, tal como seus olhos; um nariz pequeno e arrebitado; lábios finos e bem delineados, contornados em formato de coração.
A mulher ficou de pé quando permitiu que seu corpo ficasse postado na porta. Os dentes expelidos, os chifres palpitando, os olhos ardendo pela claridade, o cenho extremamente franzido e a boca entreaberta, por onde o ar entrava e saía.
A mulher se virou, mostrando-se completamente curvilínea e atraente. O quadril tinha uma leve curva que se acentuava com aquele vestido reto e fora ali que os olhos de se vidraram no momento que ela se pôs de frente. Subiu, lentamente, pela barriga reta e os seios voluptuosos, até chegar ao rosto.
Os olhos eram negros e adquiriram um brilho carmim quando ela abriu um delicado sorriso quase angelical.
perdeu o fôlego e se colocou de joelhos, reverenciando-a.
A mulher caminhou, lentamente, descalça, com as mãos unidas na altura do estômago, a barra do vestido comprido bailando em seus tornozelos finos. Ela, lentamente, esticou a mão na direção dos cabelos bagunçados e molhados de e, conforme sua mão se aproximava, ela se ajoelhava; tocou suavemente o rosto de , dando permissão que ele a olhasse nos olhos.
E ele o fez.
Estava petrificado.
A mulher sorriu.
— Tu estás lindo, meu filho.


12.

I was born of the womb of a poisonous man, beaten and broken and chased from the land.

Lilith estava sentada com as pernas cruzadas no sofá, lendo seu diário. Estava perdida em pensamentos, aparentemente concentrada apenas naquelas linhas de sua própria letra, mas a pressentia por perto, tentando ler seus pensamentos. Ele estava na cozinha, preparando algo para comer — preferiu carne crua, temperada com limão e sal; colocou tudo em um prato, pegou um copo com gelo, colocou whisky e caminhou de volta para a sala, vestindo apenas um jeans escuro.
Sentou-se do lado da mãe, acompanhando-a desviar os olhos pretos com uma auréola escarlate do livro com páginas amareladas para encarar seu filho.
Estava diferente desde a última vez que o vira. Havia virado um homem másculo, um guerreiro nato, mas tinha muito de anjo, herdado da aparência de seu pai.
Demônios se alimentavam de virgens para manter-se com a aparência jovem — independente de sua aparência, têm sempre o mesmo nível de vitalidade, quando bem alimentados e descansados. Aquela era a ação mais fútil que um demônio podia fazer — e, julgando pela perfeita aparência de Lilith, ela já havia se alimentado de muitas virgens só na noite passada.
A maçã de suas bochechas tinha um tom rosado e, quando ela se virou para o filho, tocou com a mão fria a pele quente de seu rosto.
— Eu não quero parecer rude com a senhora, minha mãe — começou ele, molhando os lábios, olhando para seus pedaços crus de carne. — Mas por que está aqui?
Lilith o encarou com certo desdém, elevou milimetricamente as sobrancelhas e travou o maxilar, entortando suavemente o lábio.
abaixou a cabeça, como um cachorro, e se arrependeu de ter feito a pergunta.
— Quero ficar perto de meu herdeiro por motivos que não lhe parecem óbvios? — disse ela, levantando-se e caminhando para a cozinha, preparando uma xícara de chá com ervas-cidreiras encontradas nos fundos da casa. — Estou cansada de fugir — ele a ouviu bater a xícara com força na pia. Colocou o prato e o copo na mesa de centro e seguiu o mesmo trajeto que a mais velha, parando no batente da porta, encostando a lateral do corpo ali.
— Revirei os seus diários e peço perdão pela intromissão — foi sincero, por isso Lilith assentiu, ereta, sem encará-lo. — Mas nunca encontrei a verdadeira razão por ter se refugiado, minha mãe. Ter me roubado de meu pai para criar-me sozinha não a faz uma criminosa. Ele poderia ter outro filho com outra fêmea. Por que essa adoração por mim? — ele franziu o cenho como uma criança confusa e viu um sorriso frio nos lábios de Lilith quando ela se virou para ele. Ele ficou ereto, abaixando o braço.
— Meu filho... — ela sussurrou, com a voz melodiosa, dando passos curtos e lentos enquanto se aproximava dele. — Não importa quantos bastardos Lúcifer tenha tido, nenhum deles será tão poderoso quanto tu és — ela esticou a mão livre, que não segurava a xícara quente, para tocar o rosto do filho, acariciando-o as bochechas.
— Mas por que fugiu por tanto tempo e só resolveu aparecer agora? — tornou a indagar, inquieto, quando a mãe passou por seu corpo para tornar para a sala. , dessa vez, não a acompanhou.
— Porque antes tu eras uma criança e eu não podia dar-me ao privilégio de ver-te crescer pondo tua vida em perigo. Eu não podia entregar-te de volta nas garras podres de teu pai só para ter-te perto de mim e criar-te da forma que achava melhor.
— Eu já tenho milênios de vida, podia ter vindo séculos antes — ele tinha adotado um tom quase ofendido. Lilith, de costas para ele, riu silenciosamente.
— Tens passado muitos anos na companhia de humanos e estás começando a agir como eles, meu filho — ela se virou e mostrou seu sorriso felino. — Não é natural de um demônio sentir saudade daquela que lhe cuspiu para o mundo, e somente isso que fiz a ti: te cuspi para o mundo. Deixei-te nas mãos de Samael e vejo que aquele verme imundo criou-te como uma rapariga humana afeminada e, pelo visto, frouxa — ela fez uma careta de nojo e virou-se novamente, sentando-se com as pernas cruzadas. — Digo-lhe o porquê de ter-te caçado para ficar junto de ti — ela o olhou por apenas um segundo. — Quero tua ajuda para livrar-me de teu pai — ela fora fria, sua voz cortava a pele de como se fosse navalha. Tinham motivo para temê-la tanto.
— Se livrar de Lúcifer? — ele quase riu. — Como? — molhou os lábios, se controlando quando ela o encarou ainda mais fria.
— Sabes dos amaldiçoados — não fora uma pergunta. — Conhece a dádiva de teu sangue e entende como devemos criá-los — ela ficou de pé, encarando no fundo dos olhos negros. Ele assentiu. — Não podemos nos apegar a eles como se fossem bichos de estimação — ela adotou um veneno na língua, as palavras ardiam. abaixou a cabeça. — Eu estou nos teus pensamentos, meu filho. Eu sinto o que tu sentes, eu vejo o que tu vês, eu desejo o que tu desejas e sei o que tu pensas. Só que não consigo ver nem ouvir — ela enrijeceu como uma estátua de mármore. a olhou. — Tu estás me bloqueando — ela o fuzilou com o olhar. — Não quer que tua mãe saiba de teus pensamentos? — ela franziu o cenho. Os olhos ficaram mais vermelhos, assim como os cabelos.
— Não estou te bloqueando — disse ele, com sinceridade. — Se estou, não sei como faço.
Ela arqueou o queixo, questionando se acreditava ou não. Por fim, molhou os lábios e virou-se novamente.
— Tua pergunta — disse ela, ainda de costas. — Por que a fazes?
— Quero entender. Se quer minha ajuda, não pode me esconder nada — ele disse firme, mas o som da risada debochada de sua mãe o fez perder toda a postura.
— Tu estás tentando me obrigar a compartilhar meus pensamentos contigo? — ela se virou novamente. — Tu não me ordenas a nada, criança!
— É um pedido — disse ele. — Por favor, conte-me meu passado. Gostaria de entender.
Ela se sentou.
— Se é um pedido, concedo — assentiu apenas uma vez. — O que desejas saber?
— Por que você me roubou? Por que não deixou que Lúcifer fizesse comigo o que planejava?
Ela respirou fundo, sentada ereta, com as mãos no meio dos joelhos, segurando a xícara intocada de chá. Lilith olhou para o meio da sala, então mordeu o interior do lábio. Quando subiu os olhos novamente para o filho, estavam vermelhos como brasa.
— Teu pai é um traidor — cuspiu, franzindo o cenho em raiva. — Disse que me queria ao teu lado para reinar no mundo subterrâneo, mas estava apenas usando-me. Por ser a primeira fêmea a existir, só eu podia dar-lhe o anticristo, nenhuma outra fêmea poderia ter meus genes. Teu plano inicial era procriar um anticristo e ensinar-lhe as artes de ser o mal reencarnado. Queria que tu, meu filho, subisse para a Terra e comandasse os humanos para que fosse um exército, assim, teu pai teria comando de dois mundos, e poderia facilmente conquistar o terceiro e expulsar aquele que o derrubou. Eu o compreendi — ela sorriu amarga —, o acolhi, o aceitei, e ele me usou. Depois que tu nasceste, ele me expulsou de tua morada, disse-me que meus serviços foram-lhe úteis, mas que já haviam terminado. Mal sabia ele que estava lidando com Lilith... — ela sorriu, negando com a cabeça. — Decidi que tu, como meu filho, deveria também seguir ordens, não poderia simplesmente ser uma marionete de teu insano pai, então resolvi roubar-te para mim. Quando soube, Lúcifer jogou seus anjos vingadores à minha busca, caçando-me nas entranhas do mundo como se eu fosse um animal... Pedi então que meu servo Samael te criasse no mundo como se fosse prole dele, pedi que encobrisse teu cheiro, afastasse os anjos vingadores e se refugiasse nas profundezas da escuridão sempre que imaginasse que tu estavas em perigo. Levou-te para a Roma Antiga, ensinou-te as leis de um gladiador, fez com que tu te alimentasses de teus servos e tivesse assim a vitalidade do herdeiro de Lilith. Fez com que tu conhecesses as regras certas para a sobrevivência astuta em um mundo onde só os espertos atravessam milênios — ela apontou para a têmpora, sorrindo pelo canto dos lábios. — Refugiei-me distante o bastante de ti, atraindo os anjos para longe de teu corpo, possuía corpos de humanos nojentos... — ela fez uma cara de extremo nojo, fechando os olhos e balançando a cabeça para se esquecer daquelas lembranças. — Tive que fazer muitas coisas para não ver Lúcifer triunfar.
Ela se colocou de pé, caminhando até onde estava sentado — no apoio para braço do sofá. Ele não a encarou, ficou fitando o chão, absorvendo tudo aquilo.
— Fui projetado — disse ele. — Precisavam de um anticristo naquele momento, sem condição ser adiado.
— Sim — ela assentiu, tocando suavemente os ombros do filho. — Mas sinto certa afeição por ti. Vejo muito potencial — ele virou o queixo para poder encará-la. — Sei que tu, no fundo, és esperto, minha amada criação. Sei que juntos, poderíamos derrubar teu odiado pai do trono do inferno e tomá-lo para nós. Poderíamos nos ver livres desse mundo asqueroso, dessas pessoas abjetas, desse cheiro... — ela entortou o nariz. — Desse cheiro de fraqueza... — virou os olhos.
O sotaque inglês medieval, conforme Lilith ficava mais enojada, ficava mais forte.
— Amaldiçoados se repelem — continuou, pigarreando. — Mas, colocados em cativeiro, têm necessidades humanas de criarem laços afetivos. Aquela linha tênue entre o ódio e o amor... — ela riu diabolicamente. — Conheci um filósofo eras antes de ver-te por uma vez, que estudava o comportamento humano quando em situações extremas — seus olhos brilharam com a lembrança. — Era sobre-humano o modo com que aquela criatura tratava aqueles ratos de laboratório. Trancava-os em uma jaula de vidro, com tudo que uma morada necessita, e estudava o modo com que se comportavam. Não sabiam do estudo — ela o olhou. — Ele tinha ligação com bruxas, uma das originais, que estavam presentes no dia do Sacrifício; ela reconheceu tuas próprias criações e deixou-as hipnotizadas para acreditarem que o Apocalipse havia se concretizado — ela riu, divertindo-se da ingenuidade daqueles humanos. também sorriu, mesmo sem muita vontade. — Então eles procriaram — ela sorriu, empolgada. — Um demônio crescia dentro da barriga da mulher, eu podia sentir o mal irradiando pelas paredes que aquele homem construiu. Era forte, meu filho, muito forte. Era capaz de destruir Lúcifer. Cresceu tão rápido e fez tão mal ao organismo da mãe que ela morreu quatro dias depois da criança se instalar em sua barriga. Ele a comeu de dentro para fora — Lilith abriu um sorriso sombrio. — Depois de expelido, se alimentou dos restos do corpo da mãe, depois, se alimentou do pai. Destruiu completamente a morada, a floresta. Era uma besta incontrolável que ameaçava quebrar as paredes que separavam a ficção da realidade — ela assentiu com respeito. — Temi por minha vida. Senti que a besta era forte o bastante para me vencer. Veja se isso um dia seria possível — assentiu.
— Como você quer que...
— Não, ainda não terminei — ele se calou quando ela mirou aqueles olhos em sua direção. — Seis dias depois de vivo, morreu. Apodreceu diante do sol e sua carne se deteriorou em menos de quarenta minutos. Entramos, eu e o filósofo, dentro dos aposentos dos humanos. O cheiro, meu filho, era encantador — ela molhou os lábios. — Lembre-se do cheiro de um sangue amaldiçoado, junte-o com quatro, cinco gerações diferentes, agora, saboreie sua carne predileta, crua, passando por sua língua. Sinta o cheiro da morte — imaginou, fechando os olhos. Sua boca salivou. Quando abriu os olhos, Lilith o encarava de perto, com um sorriso macabro, e assentiu. — Exato, minha prole, exato... E quando me alimentei daquela besta, senti como se tivesse sugado todos os amaldiçoados de todo o universo.
— Meu pai queria ser dono dos três mundos — repetiu , Lilith assentiu. — Por que não seguir com os planos dele, e depois, então, derrubá-lo? — ela negou.
— Estaria forte demais. Consumiria a energia que rondam os três mundos, os uniria em um só e se tornaria o dono da morte. Teria servos a cada extremidade. Não conseguiríamos ao menos nos aproximar.
— E se seguíssemos com o plano dele? — repetiu. — Eu desceria até o inferno e me apresentaria como o anticristo, então ele me acolheria e diria o que tenho que fazer para tomar a Terra.
Lilith, primeiro, o olhou profundamente, depois, começou a gargalhar. Dobrou-se para frente e colocou a mão na barriga, deixando que os cabelos fizessem uma cortina vermelha no rosto. se contorceu, rolando os olhos enquanto respirava fundo.
— Teu pai não te aceitaria! — gritou ela. — Tu não o conheces, ! Não sabes como aquela criatura é! Tens que seguir com meu plano, meu filho, e não podes desviar tua cabeça com devaneios terrestres, sentimentos e coisas que demônios são proibidos de sentir!
— Então por que sentimos? — Lilith o olhou com nojo.
— Podemos bloqueá-los da mesma forma que bloqueia minha penetração em tua mente, criança burra! Tu estás permitido a sentir prazer e desfrutar dos pecados que os demônios devem espalhar, mas sentimentos puros? Compaixão? Amizade? Use teu cérebro para raciocinar! — ela riu exagerada. — Não me envergonhe, .
— Sabe alguma coisa sobre o que aconteceria caso eu, herdeiro de Lilith, procriasse com uma humana? — ele franziu o cenho. Lilith negou com a cabeça.
— Nada. Terias um bastardo, nada além de um bastardo.
— E se eu procriasse com uma amaldiçoada?

estava sentada na beirada do degrau que separava o telhado do hospital de uma queda generosa, entre seus dedos, brincava um cigarro por sua metade. Ela vestia uma calça jeans justa e azul escura, meias pretas, um suéter de lã igualmente preto e seus cabelos voavam com a brisa fria que a cortava a pele nua de maquiagens. O ferimento em sua perna ainda palpitava, os arranhões de seus diversos cortes propositais e os não-intencionais ardiam como o inferno, principalmente o de seus pulsos.
Ela, por um segundo, olhou para o céu daquele início de manhã com os olhos encolhidos.
O tom salmão rosado e as poucas nuvens que mais pareciam véus translúcidos brincavam e combinavam perfeitamente com a cor de outono das árvores dos bosques ao norte do hospital.
Ela ouviu um bater de asas e, em seguida, um par de pés pisando próximos dela, mas não se virou.
Não tinha curiosidade em vê-lo, ou ver quem quer que fosse.
— Agora que descobriu este lugar, não vai mais parar de vir aqui, vai? — ela sorriu sombria, negando com a cabeça. A voz dele queimou-a como uma chama, esquentando sua nuca.
sentou-se ao seu lado, mostrando sua calça jeans preta e suas botas também pretas. Seus cabelos estavam bagunçados pelo voo e seus ombros estavam cobertos por um casaco grafite.
deu a última tragada, jogando o cigarro por além de seus pés.
— Você é mesmo um demônio? — falou, olhando para o horizonte ainda com os olhos encolhidos pela claridade. — Porque, quer dizer, eu nunca pensei que eles fossem tão normais. Imaginava aquelas coisas monstruosas, tipo O Exorcista.
A risada de fez seus pelos se eriçarem.
— Desculpe te desapontar — ele permaneceu com o sorriso no rosto e esticou a mão perto do cotovelo dela. pegou sua cartela de cigarros e despejou um na palma pálida e áspera dele. Talvez cuspisse fogo ou estalasse os dedos e naturalmente formasse uma chama, por isso ela não o entregou seu isqueiro roxo preferido junto com o Marlboro.
A falta de pavor dela em relação a ele — um demônio, filho de Lúcifer, o primeiro anjo caído, a figura existente do Diabo — a deixava uma sensação estranha.
— Você só começou a falar comigo porque meu sangue te deixa mais forte — falou, recordando-se da noite passada. — ...E agora virou meu anjo da guarda porque não quer que eu morra e continua produzindo esse sangue.
tragou o cigarro e expeliu a fumaça contra o vento; suas pupilas negras estavam extremamente minúsculas, fazendo com que suas íris ficassem em um tom cintilante. Como , ele encolhia seus olhos e mantinha o rosto franzido enquanto balançava os pés quando o vento tocava seu corpo e o esfriava lentamente. Logo, estaria soltando vapor quente pelos lábios.
— Bom que você é uma garota esperta — sua voz soou roca e inexpressiva. o encarou de perfil. se virou para fitá-la também.
— Eu não vou deixar que você me use — avisou.
— Não pedi sua autorização — ele sorriu em deboche, tragando novamente. Ela sorriu com ironia e falsidade, sem mostrar os dentes, puxando as pernas e pegando impulso com os braços para se pôr de pé e seguir pelo mesmo caminho de horas antes, voltando para o quarto.
Quando estava próxima da porta, correu em sua direção, bloqueando sua passagem. o fuzilou com os olhos, indo um passo para a esquerda; ele a seguiu. Foi para a direita e ele a seguiu de novo.
— Você já vive por quinhentos milênios e ainda é tão infantil? — ela gritou, empurrando-o o peitoral.
— Dizem que os garotos demoram a amadurecer — ele riu, segurando-a nos pulsos quando ela se preparava para bater nele novamente. Ele sorriu quando ela olhou em seus olhos. — Meu doce anjo negro... — ele cantarolou, amenizando as feições, parecendo perigosamente inofensivo. — Vamos nos dar bem... Por que você não me trata como antes? Por que não experimentamos umas posições novas aqui em cima? — ele piscou. puxou os pulsos, sentindo dor.
— Você é nojento — o repugnou, encarando-o com asco.
— Mas não tenho ideias ruins — ele riu novamente, dando passagem.
atravessou o corredor e desceu as escadas com ódio, pisando duro. a acompanhou com o olhar até onde pôde e, ainda rindo, negou com a cabeça e seguiu para o parapeito. Olhou para o céu, respirou fundo, sorriu e se jogou.


13.

My body needs a hero, come and save me. I’ve been feelin’ weird…

se acomodou na poltrona de veludo verde-musgo e cruzou as pernas, colocando as mãos entre seu meio, a fim de esquentá-las. Encarou a mesa arrumada da Dra. Stevens, cuja fechava a porta e suspirava como se dissesse “vamos lá!”, se guiando para a cadeira de couro branco, também cruzando as pernas e sorrindo de um modo amigável, mas ainda assim extremamente profissional.
Claire Stevens era a psiquiatra do hospital onde estaria interna durante uma semana, sobre cuidados médicos e psiquiátricos; depois, seria encaminhada à reabilitação, onde passaria mais ou menos seis meses, dependendo de seu comportamento.
Aquela doutora era diferente das demais que já atenderam em toda sua vida. Tinha algo de... estranho nela. Talvez a cor de seus olhos: um azul marinho profundo, quase como o fundo do Pacífico congelado; os cabelos louros tinham um toque avermelhado e o dedo indicador teimava em tremer sempre que ela se movia, indo para cima e para baixo em um bater frenético na mesa de vidro que cobria sua saia grafite e sua blusa de seda rosa.
— Então... — começou ela, pegando um bloquinho de anotações com uma caneta com um pompom rosa de plumas em sua ponta. — Como você está se sentindo hoje, ?
a encarou com os olhos turbulentos. Sentia sono, raiva e muito tédio. Não queria estar ali, e, em sua mente, já tinha imaginado quatro formas diferentes de fugir e esquartejar a Dra. Stevens.
— Eu gostaria de te conhecer um pouco melhor — tentou novamente, adotando um tom mais casual, mas que, para , era extremamente falso. — Sei que você tem dezenove anos e se mudou há pouco tempo para New York. Como está lidando com a mudança?
virou o rosto, encarando aquele escritório.
Era infantil e ridículo.
As paredes eram brancas, assim como os móveis e pequenos detalhes, mas todo o resto era rosa ou lilás. Não havia nenhum vestígio da vida pessoal da Dra. Stevens, nenhuma foto de seu marido ou filhos — se é que ela tinha, já que não aparentava ser sete anos mais velha que — ou celulares expostos; apenas seu MacBook Pro com a tela desligada. Os bloquinhos de anotação — também rosas — estavam nus, mostrando que ela tinha adquirido aquele escritório há poucos meses. Talvez, fosse uma de suas primeiras pacientes.
— Você não quer conversar comigo? — só então voltou a encará-la, retomando à sua presença. — Tem alguma coisa de errada, anjo?
esticou um pouco seu pescoço para trás, hesitando em franzir o cenho e contrair o maxilar.
— Desculpe — se apressou a Dra. Stevens. — Só queria criar alguma intimidade com você, fazer você se sentir um pouco mais à vontade — ela sorriu sem interesse. cruzou os braços. — Sei que deve ser difícil para você lidar com a morte de sua mãe, mas estou aqui para te ajudar — franzindo as sobrancelhas louras, aquela mulher até parecia sincera. Se seus olhos não vacilassem e fossem tão hostis, além de seu indicador, que não se quietava, poderia até acreditar. — Se não quer falar sobre o acontecido recente, tocaremos mais ao fundo, então — ela se recostou à cadeira de couro branco; seus cabelos acobreados dançaram em seu ombro, caindo por cima dos seios fartos e volumosos, que pareciam ainda maiores com o decote redondo da blusa. — Como era sua vida em Bristol? Tinha muitos amigos? Um namorado, talvez? — olhando em seus olhos, viu uma faísca vermelha cortar a íris de um lado ao outro. Primeiro no olho esquerdo, depois no direito. Seu dedo ficou mais inquieto e ela respirou fundo, desviando o olhar. — Tenho na sua ficha uma notificação da polícia dizendo que você estava metida num assalto em uma boate chamada Burlesque, que tem uma reputação terrível e é conhecida como um “inferno particular”, se é que me entende — ela soltou outra risada sem humor. — No boletim de ocorrência, Richard William Nathaniel, o proprietário da boate, relatou que Giansanti era frequente naquela boate, onde você trabalhava, e vivia arrumando confusão por causa de você — ela a encarou novamente, adotando aquele irritante tom hostil. franziu suavemente o cenho. — Qual a sua relação com Giansanti, ? Vocês dois são namorados? — ela apoiou os cotovelos na mesa, parecendo uma policial. Seus olhos estavam mais escuros.
abriu um sorriso lateral tão irônico que chegava doer. Os olhos ficaram felinos e pouco a pouco sua postura relaxou. Ela puxou o ar para os pulmões, ameaçando falar, se aproximando cautelosamente da Dra. Stevens como se fosse lhe contar um segredo.
— Temo lhe informar, doutora — disse , sussurrando —, mas acho que nosso tempo se esgotou.
E, segundos depois de terminar a frase, o relógio tocou quatro vezes — um som estridente e irritante.
O barulho das pernas da poltrona se arrastando no chão fora como um tiro no meio do deserto, ecoando pelas paredes brancas. Claire ficou sentada, com os pulsos apoiados na mesa, encarando se põr de pé com o ódio estampado no rosto tão angelical. Quando se colocou de costas, encaixou os dedos na maçaneta redonda e prateada da porta do consultório da Dra. Stevens e, um segundo antes de girar, sentiu as mãos frias daquela mulher contornando seu pescoço, seu hálito quente batendo rente à sua mandíbula.
— Você podia ter cooperado comigo — disse Claire, com o tom de voz muito mais rouco e grosso que o que usava antes.
Uma onda de pavor cortou os músculos de , fazendo-a vacilar enquanto seu coração batia muito mais rápido que o normal. Ela tentava respirar, mas sempre que puxava o ar ele entalava em sua garganta, formando um nó cada vez mais apertado pelos dedos — que, agora, ganhavam a textura áspera de uma pele rugosa e desidratada, com cor acinzentada; as veias saltadas como se sugadas em vácuo — da mulher atrás de seu corpo.
Claire não devia ter mais de um e setenta de altura, mas, agora, parecia ter dois metros e dez. A respiração antes em sua mandíbula, agora batia no alto de sua cabeça, balançando seus cabelos. Em poucos segundos, os pés de não tocavam mais o chão e ela era brutalmente jogada contra uma parede, derrubando um abajur de pluma rosa.
Mas que porra? gritou, tossindo enquanto tentava recuperar o fôlego, olhando para baixo, com a mão posta suavemente no pescoço, contornando os locais que palpitavam enquanto recuperavam sangue.
Quando subiu os olhos novamente para Claire, ela estava completamente mudada. Seus olhos estavam completamente negros, mais escuros que o fundo do universo, seus cabelos haviam sumido, dando espaço a uma cabeça com aparência desidratada, rugosa e cinzenta, assim como todo o resto de seu corpo; asas pontudas que lembravam às de morcegos estavam apontadas em sua direção, como adagas afiadas e nuas de qualquer proteção. Todos os dentes estavam afiados e expostos em uma boca maior e sem lábios, onde o nariz estava enrugado com seu rosnado; em seu pescoço, uma gigantesca cicatriz profunda cortava uma extremidade até a outra, morrendo nas orelhas. Os lábios estavam eriçados, raivosos, quase como quando rosnava de ódio.
Agora você fala? — Claire, ou qual quer que fosse o nome daquela criatura, urrou, pulando em direção à .
As pontas afiadas de suas asas de morcego perfuraram os ombros de , elevando-a até o teto, fazendo-a bater a cabeça com força. Ela gemeu e se perguntou se ninguém no hospital estava ouvindo aquela bagunça no consultório daquela suposta doutora.
Quem é você? — disse , começando a se debater. Seus ossos foram perfurados, fazendo-a sangrar. O líquido vermelho escorria pela asa de Claire e chegava próximo de seu ombro.
imaginou que, como Richard, ela só estava interessada em seu sangue e, diferente de , ela não teria a inteligência — ou a piedade — de fazê-la sua refém, consumindo-a de pouco em pouco, dia após dia.
Mas Claire mal virou seu rosto para encarar a maldição de , que sentia o corpo inteiro queimar em dor, como se o contato da pele cinzenta de Claire fizesse com que um veneno ardido penetrasse em suas veias.
Ela gritou de dor, franzindo o rosto, chorando.
— Não adianta gritar — disse Claire, quase sorrindo. — Ninguém pode te ouvir.
— O que você quer de mim? — implorou .
— Preciso do seu coração em uma bandeja — disse Claire, inclinando o rosto com ingenuidade. — Peço perdão por isso — disse, molhando os lábios desidratados, rugosos e roxos, com a língua de cobra.
Quase deixando um segundo de compaixão sair por seus poros dilatados, Claire soltou uma gargalhada tão alta que fez se contorcer entre pavor e desespero. Mesmo sabendo que ninguém a escutaria, ela gritou ainda mais alto e bateu os pés na parede.
Claire esticou a mão com unhas afiadas como garras negras até o peito de , que subia e descia em uma velocidade sobrenatural. Conforme ela se aproximava, mais se apavorava, implorando para que ela parasse.
As unhas, lentamente, tocaram seu suéter preto, rasgando-o com uma facilidade incrível; depois, junto com a blusa, caiu no chão, deixando-a apenas com o sutiã preto com fecho fronteiro. Quanto as garras tocaram e afundaram em sua pele, a porta se escancarou e asas pretas invadiram os olhos de , fazendo-a ver apenas negro.
Claire mostrou os dentes e puxou as asas de morcego dos ombros de , deixando-a desabar no chão. Ela não conseguia se mover de tanta dor, apenas chorava e tinha uma crise de pânico, sem conseguir respirar direito.
saltou no pescoço de Claire e cravou suas unhas ali, puxando-a para arrancar sua cabeça. Com os ossos tão duros quanto os dele, ela parecia não sentir dor. Cravou os espinhos de suas asas no estômago de , golpeando-o com a mão na nuca, fazendo-o cair de joelhos; puxou suas asas e o jogou contra a parede, arrancando vários pares de penas. Os olhos escarlates dele faiscaram de ódio e seus dentes afiados se mostraram ainda maiores quando ele rosnou e se colocou em posição de ataque, com os joelhos flexionados e os dedos em garras. Ele saltou para cima de Claire, iniciando um vulto de socos e mordidas que os olhos mortais de não conseguiam acompanhar.
Tudo que ela ouvia eram rosnados e, depois de um tempo, nem isso. Virou-se deitada no chão, de barriga para cima, e encarou o teto, tentando, ainda, controlar a respiração. O sangue ainda jorrava de seus ferimentos; pouco a pouco, sua visão enturvecia.
O veneno ainda penetrava, correndo por dentro de seu corpo, sendo bombeado por seu coração acelerado.

***


abriu os olhos como se tivesse emergido à água depois de quase três minutos sem respirar. Puxou o ar com força e, em meio ao escuro, não reconheceu onde estava. A única coisa que reconhecia era o cheiro: um cheiro peculiar, de perfume amadeirado.
Abaixo de seu corpo já menos dolorido, ela sentia a textura inconfundível de seda egípcia; sob seus tornozelos, lã pura de ovelhas.
Os ossos quebrados e os cortes profundos pareciam curados, porque ela podia se mover sem que uma pontada de dor a fizesse rolar os olhos e tremer, se encolhendo, com o corpo arrepiado.
Lembrou-se de Claire e o pavor correu seu corpo em um calafrio, fazendo-a estremecer. Quando o vento cantou lá fora, tão forte quanto um furacão, ela se cobriu com a lã e respirou fundo o cheiro que conhecia de algum lugar.
Permaneceu assim até o segundo trovão soar e um clarão tomar o quarto, deixando-a perceber alguns poucos detalhes.
As paredes eram forradas com um desenho cor de esmeralda, com detalhes preciosos folheados a ouro; acima da cama Dossel, havia um gigantesco lustre clássico de palácios, com milhões de luzes e cristais que reluzia brilho em todos os ângulos possíveis e imagináveis.
Ela respirou fundo, fechando os olhos. Ainda encolhida, contou até cinquenta antes de jogar o cobertor para o chão, se colocando de pé, sentindo a textura fria da madeira contra a sola de seus pés nus.
Cruzando os braços para se esquentar, sentiu seus cabelos soltos e uma roupa desconhecida, com o cheiro que ela ainda não se lembrava. Caminhou no escuro, até chegar próxima da parede forrada; ali, hesitante em tocar em algo que não devia, achou o interruptor e acendeu o lustre, encolhendo os olhos com a claridade ofuscante e amarelada.
O quarto era muito mais bonito do que ela poderia imaginar. Era, de fato, digno de um palácio de conto de fadas, com um toque gótico e sobrenatural.
Quando olhou para seu próprio corpo, percebeu que usava uma blusa social preta, onde as mangas batiam muito além de seus pulsos e a barra atravessava o início de suas coxas, parando no final das nádegas. Os cabelos negros estavam embaraçados, os olhos azuis estavam assustados, mas com uma mínima sensação de proteção.
Ela se guiou pelo quarto, indo para o armário. Quando tocou na maçaneta de ouro e puxou, viu que estava trancado. Molhando e mordendo o lábio inferior, virou-se e seguiu para a escrivaninha. Sentou-se no banquinho forrado com veludo vermelho e abriu a primeira gaveta, encontrando uma escova de prata com cerdas macias de crina de cavalo.
Penteou os cabelos, deixando-os juntos por cima de um dos ombros, de lado, e depois se guiou para a outra gaveta. Ali, um pequeno caderno estava amarrotado de folhas amareladas, sujas e de aparência muito velha.
o pegou, desabotoando o único fecho que trancava aquelas anotações.
Quando virou a capa de couro preto, várias folhas despencaram no chão.
Xingando baixo, ela se ajoelhou e catou uma por uma, colocando-a na ordem que parecia certo.
Eram desenhos de moças. E cada uma era mais bonita do que a outra.
franziu o cenho e sentou-se em seus calcanhares, ficando confortável. Pegou o caderno e o apoiou no chão, abrindo as outras páginas.
Só havia desenhos soltos, nomes de mulheres em uma lista e datas ao lado.
A primeira se chamava Amelia Alianore Blanch, e a data que se punha ao canto interno e inferior direito do desenho era 19 de abril da primeira década. Depois, Frances Lucie Bellan, 2 de março da primeira década. Phillippa Katheryn Gordon, 28 de junho da primeira década.
Atrás de algumas fotos, havia nomes, também. E as datas que haviam sido desenhadas.
Marcie Agnes Ellory, Amphelice Fontaine, Audrey Rose Owner, Dionisia Collys Benet, Valentina Muriel Toscano, Aimée Giorgia Bertholdi, Julian Isabelle Larsen.
Nenhum garoto.
O cenho de se franziu mais.
As meninas, em todos os desenhos, tinham a aparência tão angelical que pareciam crianças inocentes. Tinham os olhos direcionados para baixo, às vezes os cabelos cobriam seus rostos, e os lábios sempre ocultavam um sorriso malicioso que não deixava transparecer timidez. O corpo sempre muito bem coberto, na maioria das vezes por vestidos claros, que pareciam brancos, nenhum colar, brincos ou braceletes.
A porta atrás de seu corpo abriu como um baque, fazendo-a pular e deixar todas as pinturas caírem no chão novamente. Ela se exaltou, se colocando de pé, esbarrando na escrivaninha, derrubando a caixinha de joias.
O sorriso de se alargou.
Ele a encarou de pé, passando os olhos por todos os mínimos espaços de pele nua.
— Sua mãe não te ensinou que é feio bisbilhotar nas coisas que não são suas? — ele indagou em um tom tranquilo, ainda que estivesse sombreado por irritação. Sem blusa, conseguiu ver, quando ele se virou, que o local onde suas asas saíam estava avermelhado, como se ele tivesse coçado muito, até que ferissem superficialmente.
— Ela morreu antes — ela sorriu sem humor, abaixando-se para juntar as fotos. — Desculpe — murmurou. — Não queria ser intrometida — mordeu o lábio inferior, guardando as fotos de qualquer jeito.
— Não queria? — ele riu baixo. respirou fundo.
— Obrigada por me salvar daquela... coisa — ela se colocou de pé. — O que era, afinal?
— Uma pessoa possuída — disse, sem emoção, ainda de costas. — Aquele demônio não tem forma humana, por isso precisa possuir corpos para viver nesse mundo — o corpo de estremeceu e se virou, sorrindo pelo canto dos lábios.
— Por que ele não queria meu sangue, como todos querem? — ela abaixou os olhos para as fotos, colocando-as de volta na agenda.
As mãos de se moldaram com as dela, impedindo-a de continuar. Quando olhou para cima, viu seu próprio reflexo nos olhos vermelhos de . Ela franziu o cenho e desviou os olhos; ele sorriu, deliciando-se.
— Não sei — sussurrou ele, aproximando sua boca da pele dela.
... — soprou , sem saber se queria ou não deixar que ele se aproximasse mais. Ele parou. — Quem... — ela tentou recuperar o fôlego, entorpecida pelo cheiro dele. alargou seu sorriso. — Quem são essas mulheres? — ele abaixou os olhos para a agenda entre suas mãos ainda uma por cima da outra, o pálido se contrastando com o cristalino.
— Apenas mulheres — disse, dando um passo para trás. sentiu frio.
— Então por que você as desenhou? E por que os nomes delas estão aqui? E que datas são essas?
— Está com ciúme? — ele riu. rolou os olhos. — Se não quer saber as respostas, anjo, por que pergunta? — ele arqueou uma das sobrancelhas. passou a língua no lábio inferior, que, irritantemente, ficou seco de repente. Ela não soube responder. — Demônios não envelhecem como humanos — disse ele, com a mesma expressão interessada na reação dela — Nossa vitalidade é imortal, independente de nossa idade, teremos sempre a mesma força, a mesma velocidade e a mesma inteligência. O que muda é nossa aparência. Para nos mantermos com aparência jovem, precisamos nos alimentar — ele parou, olhando fixamente para o rosto dela — de virgens. Qualquer coisa que não tenha provado a luxúria, mas já tenha pensado nela.
— Você se alimentou de todas essas mulheres? — o rosto de transbordava pavor. Ela negou com a cabeça, jogando a agenda no chão. — Eu vou embora.
Passando ao lado dele, conseguiu ouvir o sopro de sua risada. Aquilo fez com que seu sangue borbulhasse.
... — ele a chamou, cantarolando, fazendo-a virar com os olhos tenebrosos em tédio. Quando o encarou, ele mantinha aquele sorriso debochado nos lábios. — Você não vai embora vestindo minha camisa, vai? Eu gosto dela — ele alargou seu sorriso.
sentiu as bochechas ficarem roborizadas de tanto ódio. Ela desabotoou os vários botões, se enrolando em alguns — fazendo-o rir —, e então a jogou no chão, ficando apenas com sua calcinha de algodão branco e seu sutiã de fecho fronteiro preto.
— Engole essa porra — cuspiu ela, virando-se novamente.
Quando estava preste a sair do quarto, ele tampou seu caminho novamente. Os dentes expostos, os olhos vermelhos. Ela o empurrou; o rosto contorcido em raiva.
— Sai da minha frente — rosnou ela.
Ele a segurou nos cotovelos, colocando-a suavemente para cima. Encaixou os lábios em seu pescoço, roçando-os suavemente, beijando-o e chupando-o de leve, sentindo seu arrepio.
— Nós, demônios, temos um olfato muito, muito aguçado — falou, sussurrando contra a pele dela, mordendo a pele de seu maxilar, lambendo o lóbulo de sua orelha. — Eu posso sentir o cheiro da sua excitação, — ele sorriu contra o ouvido dela, mordiscando suavemente sua pele. — Posso sentir que você também quer o que eu quero.
— Mentira — ela tentou dar um passo para trás. — Eu prefiro morrer a...
— Ao quê? — desafiou, encarando-a nos olhos.
não conseguiu responder. Ao invés disso, deixou que ele se aproximasse de seu rosto, acompanhando com os olhos suas bocas se aproximando, entreabrindo milimetricamente à sua em antecedência, fechando os olhos e relaxando o pescoço na palma da mão dele, que já havia subido até ali.
Vendo-a assim, esperando por ele, o fez sorrir segundos antes de beijá-la com força, segurando a cabeça para que não fosse para trás.
O corpo de agradeceu quando suas línguas se encontraram, o choque de calor entre seus corpos faiscava, fazendo-a sentir-se elevada.
empurrou suavemente seu corpo para a esquerda, em direção à parede, e encostou as costas de ali, deixando-a presa. Com uma das mãos entrelaçada em seus cabelos e a outra na altura de sua cintura, ele sentiu a coxa de passando pela lateral de seu corpo, indo em direção ao seu quadril, para se entrelaçar ali. Sorrindo em meio ao beijo, quando percebeu que ela quase perdera todo o fôlego, respirando com a boca aberta, ele segurou sua coxa e a virou de costas, fazendo-a encostar a bochecha na parede.
sentiu um arrepio de êxtase cortar sua pele, eriçando seus pelos. respirou o cheiro de seu cabelo misturado com a excitação, sorrindo com aquilo.
— Você disse — sussurrou , à beirada de seu ouvido — que preferia morrer a quê, ? — ela gemeu em impaciência quando sentiu a mão que prendia sua coxa soltá-la lentamente, guiando-se para o meio de suas pernas, tocando o quente entre aquele vão.
Ele puxou sua calcinha, arrebentando-a como se fosse de papel de seda. Jogou-a no chão, de modo que só conseguisse escutar seu estalo. Ele passou a mão pelos lábios úmidos de sua intimidade, penetrando-a com dois de seus dedos, começando com movimentos rápidos e precisos em um vai-e-vem ritmado e forte.
mordeu os lábios, franzindo suavemente o cenho para não começar a gemer logo que ele começou com aqueles simples movimentos.
Era ridículo o prazer que ele proporcionava nela.
A respiração de bateu em sua nuca quando, lentamente, ele tirou seus cabelos dali e beijou sua pele.
— Responde, — ele tirou um dedo, diminuindo a pressão. — Ou eu paro.
— Você não far... — ele parou, fazendo-a gemer em ódio, tentando se virar para , mas ele a segurou com ainda mais força, machucando seu braço.
— Você disse que...?
— Que eu preferia morrer a te tocar novamente — ela murmurou com ódio, com a bunda empinada e as pernas abertas. Ele passou a mão em sua nádega esquerda, acariciando-a enquanto descia lentamente até o mesmo local de antes.
— Eu posso fazer com que você morra — soprou ele, massageando suavemente a parte externa de sua intimidade, tocando de leve em seu clitóris, em minúsculos movimentos circulares. — Mas seria uma pena não ver sua pele corada — ele tocou com os lábios as bochechas dela —, seus lábios vermelhos — mordeu seu lábio inferior, sugando-o por um segundo, soltando-o molhado e mais vermelho.
Então, sem aviso prévio, retirou seu próprio membro da boxer e a penetrou com força, fazendo com que o corpo dela se chocasse com mais força na parede. Ela gemeu com a surpresa, fechando os olhos, estremecendo em tanto prazer. Quando soltou suas mãos, as apoiou na parede, próxima de seu ombro, sentindo as mãos dele, ásperas e quentes, em sua cintura, puxando e empurrando conforme seus movimentos, para que se tornassem mais profundos, mais fortes e deliciosos.
impulsionou o abdome por cima do tronco dela, tocando os lábios em seu ombro, beijando-o e arranhando-o com os dentes afiados — e, com os olhos abertos, viu os pelos dela se eriçarem. Sorrindo com malícia, virou suavemente o pescoço e apoiou a bochecha na pele aveludada da garota, ofegando contra seu ouvido.
franziu o cenho, apertando os lábios, reprimindo-se a gemer, controlando-se para não mostrar o quão satisfeita estava por finalmente estar tocando nele outra vez.
Ela liberou os dentes dos lábios quando soltou o ar, misturando-o com um gemido. Fechou os dedos, escondendo-os nas palmas das mãos, tentando equilibrar-se nos próprios pés conforme ele investia em sem quadril, chocando seus corpos, fazendo apenas o barulho de seu contato exalar em meio àquele silêncio excitante.
cravou suas unhas na cintura de , trazendo o corpo para trás de modo que seu membro saísse completamente de , fazendo-a, finalmente, gemer em impaciência. Virou-a com brutalidade e a empurrou contra a parede, fazendo o estrondo soar alto. Ela, com as pupilas dilatadas e os lábios ainda mais vermelhos, fez com que sorrisse em um momento sem controle, com os lábios curvados para cima de maneira tão diabolicamente sedutora que a fez sentir as pernas tremerem. Inclinando com bestialidade seu rosto para o dela, sugou-a os lábios e os mordiscou, puxando-os para si, lembrando-se da primeira noite que tiveram juntos. Juntaram seus corpos ainda mais e, em meio ao calor, gotículas de suor começaram a nascer em seus folículos capilares. colocou as duas mãos na nuca de e entrelaçou seus dedos em seus cabelos escuros, puxando-os, empurrando seu rosto para mais próximo do seu, beijando-o com toda a força que existia dentro de seu corpo; impulsionou as pernas para cima em um pulo, encaixando-as na cintura dele. As mãos grandes e quentes de se direcionaram para a bunda de , e, acomodando-a no local certo, sentiu-a indo para cima e para baixo, apertando seu corpo. Com apenas um passo, ele deixou as costas dela encostadas à parede, dando um apoio melhor. Segurou sua bunda e sua coxa com mais força e começou com movimentos rápidos e fortes dentro dela, em um ir e vir tão rápido que os olhos quase não conseguiam acompanhar.
não conseguiu continuar o beijo. Ela abriu a boca e jogou a cabeça para trás enquanto arfava, cravando suas unhas na pele da nuca de por falta de controle, sem mais ter como expressar o prazer que sentia. Os gemidos baixos e incontroláveis que saíam de sua boca já não eram páreo para explicar.
acompanhava as feições dela com os olhos demoníacos abertos, ofegando e sorrindo maliciosamente conforme a acompanhava perder o controle, sentindo-a cada segundo mais próxima de alcançar seu êxtase. As pernas em torno de seu quadril foram perdendo a força, fazendo-o rir.
abriu os olhos e encarou o teto, soltando o gemido alto quando um arrepio correu por seu corpo e contraiu todos os seus músculos, fazendo-a jogar o peito para frente, deixando seus mamilos arrepiados nos lábios de . Ele os abocanhou, beijando-os, sugando-os e mordendo-os, intensificando o orgasmo dela.
tremeu, sentindo as mãos de no alto de sua lombar, caminhando com ela até o batente da janela, deixando-a sentada ali. Com um local para se apoiar, abriu mais as pernas e puxou pelos ombros, beijando-o com violência, mordendo seu lábio inferior. Ele segurou suas coxas, acariciando-as desde o exterior do joelho até o alto da nádega, indo para o interior quando chegou próximo da virilha.
Partindo o beijo, passou os lábios e os dentes pelo pescoço dela, fazendo-a jogar o pescoço para trás e sentir o vento frio da noite balançar seus cabelos para a esquerda.
Com a mão direita, acariciou os lábios úmidos da intimidade de , de modo que a deixasse completamente excitada pelo que viria a seguir; com a esquerda, direcionou-a até a janela a e empurrou, fazendo com que o vidro que encostava às costas de saísse do contato quente de sua pele, deixando a janela aberta e o vento adentrando àquele quarto.
, com o canto dos olhos, encarou a altura que estavam. Eram quase dez metros. Aquilo fez com que um arrepio cortasse sua barriga, algo que a deixou ainda mais excitada.
Ela riu e deixou o riso no rosto quando se virou para encarar novamente , que estava quase inteiro em sua figura demoníaca — faltavam apenas os chifres, as veias e as gigantescas asas negras.
Ele estava sério, encarando-a com um quê de admiração. Passou os olhos vermelhos — que não se moviam — por todo o rosto avermelhado dela, o escuro molhado de seus cabelos que caíam como uma cascata para além de suas costas, dançando com o vento. Baixou os olhos para seu colo, seus seios, sua respiração ofegante e sua mão entre o vão de suas pernas, a intimidade rosada que clamava por atenção, por carinho, por brutalidade.
tocou o rosto de e o puxou para beijá-lo, gemendo quando ele enfiou o dedo médio e o anelar dentro de sua intimidade, estimulando seu ponto G com força, fazendo seu corpo inteiro ir para cima e para baixo. Sua própria mão, antes delicada, acariciando a mandíbula travada do rosto áspero dele, agora arranhava seu pescoço e descia rumo aos ombros, a fim de puxá-lo para próximo, para que ela pudesse transmitir aquele prazer bestial para ele.
sorriu em meio ao beijo, fazendo-a morder seu lábio inferior com força, com raiva. Não queria parar de beijá-lo, mesmo que morresse sem ar. Ele baixou os lábios para seu colo, sem parar com os movimentos com os dedos, arranhando seus dentes por todo o comprimento de pele pálida até o alto da intimidade rosada. Retirou o dedo anelar, sentindo a respiração descompassada dela ficar ainda mais descontrolada quando previu o que ele faria. agarrou o batente da janela com força, sentindo os dedos arderem, fechou os olhos e mordeu com força os lábios.
, bem devagar, passou a língua desde o períneo até o alto do clitóris duro. Depois, abriu os grandes lábios e o pressionou com mais força, arranhando-o com os dentes. arfou, gemendo baixo, apertando a madeira do batente. riu, e o sopro de seu riso tocou a pele úmida dela, fazendo-a virar os olhos com o calafrio prazeroso que cortou suas células ao meio.
Ele, então, começou a sugar seu clitóris com força, beijando-o e passando a língua em movimentos circulares, sem cessar um segundo sequer. Penetrando-a com o dedo médio e indicador, começou com movimentos rápidos de vai-e-vem. Com a mão esquerda, masturbava-se rapidamente, sentindo o corpo inteiro clamar por mais contato com ela.
Era como se o sangue de ainda estivesse dentro de , mesmo que aquilo fosse impossível. Era como se o sangue dela não fosse apenas mais forte, ou mais saboroso, mas também permanente. Uma vez dentro do sistema do demônio, ficaria ali para sempre. Talvez estivesse relacionado ao fato dele ser o herdeiro de Lilith, mas desconhecia sua própria lenda.
Sua mente desviou de si próprio quando ela gemeu alto — bem mais alto que nas outras vezes — e sua intimidade contraiu várias vezes em seu dedo, sua lubrificação sendo duplicada, brilhando quando a luz batia ali. Ela jogou o peito para cima, de modo que ele também sentisse uma explosão forte crescendo dentro dele, e os cabelos dançaram em meio à escuridão.
retirou seu dedo, segurou seu membro e o encaixou dentro dela novamente, puxando-a pelo pescoço para que suas bocas se tocassem como animais. Beijavam-se com tanta força que seus lábios ficariam roxos e suas línguas, dormentes. Ora o rosto de ia para trás, ora o de . Ele a penetrava com tanta força que o barulho do choque de seus corpos era alto demais, em sincronização com seus gemidos entorpecidos, seus ofegos e arfadas descontroladas. Quando sentiam a cabeça ficar mais leve pela falta de ar, desgrudavam suas bocas e as deixavam abertas, sugando seus peitorais, seus pescoços, seus ombros. jogou a cabeça para trás, com o cenho franzido, segurando com força a cintura de , puxando-a com força, sentindo seu membro extremamente encaixado dentro dela. Ela colocou as mãos espalmadas atrás do corpo, deixando-o inclinado para trás, apertando com força o tijolo que forrava as paredes pelo lado de fora da casa.
Os dentes de dobraram ainda mais de tamanho e ele sentiu, sem sua ordem e fora de seu controle, suas asas aparecendo lentamente. Seus chifres foram expelidos, crescendo quase meio metro em sua testa, maiores do que normalmente eram.
O pico elevou-se dentro de seu corpo, crescendo como nunca crescera antes. Em sua forma original, poderia concentrar-se apenas em seu prazer, e não em sua imagem. As asas, ainda doloridas pela luta que tivera mais cedo com aquele demônio sem corpo, arderam de forma que ele rosnasse com a dor, apertando com mais força a cintura de , puxando-a com mais violência para próximo dele. Eriçadas como pelos negros de gatos, elas apontavam na direção da escuridão, como uma concha que protegia e , contornando-os em uma bolha negra.
abriu os olhos no exato segundo que tudo à sua volta era negro. Olhando para , viu-o em sua forma de demônio e sentiu um poder sobrenatural correndo por suas veias, lembrando-se de que ela era extremamente importante para que ele fosse invencível.
Ela ergueu o tronco e segurou o maxilar dele, apertando as pernas em torno de seu quadril, movendo-se de acordo com ele, roçando seus mamilos duros no peitoral extremamente quente de . Juntou seus lábios da mesma forma bruta de sempre, beijando-o com toda a força que ainda restava em seu corpo. Respirando descompassada, gemia de extremo prazer e sentia os músculos queimando, pedindo por descanso.
afundou as unhas em garras na pele de , fazendo-a morder seu lábio inferior com força enquanto franzia o cenho e sentia o sangue escorrer em dez furos retos. Quando olhou para o lábio dele, viu o sangue sair vermelho, diferente de quanto brigou com os lobos, naquela outra noite.
Antes que pudesse pensar em qualquer outra coisa, ele se moveu com tanta força que outro orgasmo a atingiu no mesmo momento que ele jogava seu pescoço para trás e jorrava seu líquido quente para dentro dela, muito mais longo e prazeroso que das outras vezes.
Ele continuou penetrando-a até que aquela explosão cessasse, então, com a respiração completamente descontrolada, abriu lentamente os olhos e puxou as asas para dentro de seu corpo, franzindo o cenho com o mesmo ardor de quando as expeliu sem ordem.
, suada, tinha o cenho franzido e lentamente tirou as mãos do rosto de , tocando nos machucados de sua cintura, afundando o dedo indicador em um dos vários furos.
Não sentia dor ali. Quando tocava nas feridas abertas e quentes, lembrava-se da intensidade do contato de , excitando-se novamente. Quando olhou para ele, encarou olhos tão azuis quanto uma paisagem gelada.
Ele se aproximou de seu pescoço, beijando-o e mordendo-o até chegar próximo à orelha e, com os olhos fechados, sussurrou:
— É incrível o modo que você faz eu me sentir, sendo apenas uma humana mortal — o calafrio na pele de aumentou e ela tocou suavemente na lombar dele, sentindo-o contornar as feridas em sua cintura com os dedos, agora, aveludados. — Você faz com que eu perca meu controle, — suavemente, ele mordeu seu pescoço, arranhando com extrema leveza seus dentes extremamente afiados, ainda gigantescos. Ela tocou a ferida em suas asas. — Por que você faz isso? — ele perguntou para si próprio, com a voz rouca, e se afastou rapidamente, sumindo de repente.
, desnorteada e com os olhos fechados, sentiu frio quando não o tinha mais por perto. Abriu os olhos, encarando-o nu a poucos passos de seu corpo, fitando-a com a malícia no azul gélido dos olhos.
Ela se levantou, ainda cambaleante, e foi até ele, tocando seu ombro esquerdo com uma mão, e, com a ponta dos dedos, o rosto áspero.
Os olhos dele vagaram de um lado para o outro, e, suavemente, seu cenho se franziu. Ele deu um passo para trás, segurou ambas suas mãos e olhou para baixo, sério. Puxou sua calça, virou-se e permaneceu de costas.
— O que aconteceu com suas a...
— Por ser filho de quem sou, deveria ser completamente desprovido de todo e qualquer tipo de sentimento — interrompeu ele, virando o rosto, ainda olhando para baixo. — Mas, por alguma razão que não sei explicar, eles foram intensificados — virou-se para ela, que, com o frio, segurava, com a mão esquerda, o cotovelo do braço direito. — Sinto no tato mais do que qualquer outra criatura noturna; às vezes, meu desejo me descontrola — ele inclinou a cabeça, franzindo o cenho com raiva. apertou os lábios. — Sinto tanta sede — ele adotou um tom sombrio — que mataria milhões sem sentir remorso algum — ele sorriu com desdém. Suas costas tinham adquirido um relevo onde as asas ficavam, deixando claro que ele se controlava ao máximo para não expeli-las, de modo que o machucasse respirar. — A alma de meu pai, mesmo quando anjo, sempre fora fria — pouco a pouco, os olhos de foram adotando uma tonalidade mais escura. — Ele devia apontar os erros dos outros, mostrar seus pecados para que assim fossem castigados; ganhar credibilidade vendo as almas mortais serem castigadas. Quando caiu, aquela frieza se espalhou e petrificou. Já minha mãe, quando se juntou a ele, pediu que sua alma mortal, inicialmente pura, fosse arrancada e queimada para que não sobrasse vestígios de que uma dia servira outro ser senão Lúcifer ou ela mesma — mordeu os lábios suavemente quando a encarou de novo, com os olhos incrivelmente negros. — Já a minha, é uma montagem sobrenatural única. E sabe o que me deixa puto, ? — ele a olhou com ódio, inclinando suavemente o rosto. — O mundo acredita que eu sou uma porra de uma lenda, um mito, um nada — ele rosnou alto, ecoando nas paredes daquela casa, fazendo se encolher milimetricamente. — Mas agora que sabem da sua existência — continuou, virando o rosto —, é bom que se sinta constantemente ameaçada. Nem todos serão espertos como eu. Na verdade, ninguém será — ele franziu o cenho e sentiu ódio de si por apreciar aquela raiva dele, aquela brutalidade com que ele expelia as palavras. — Minha mãe é a única criatura que conheço que fez dos amaldiçoados seus reféns; os outros os devoram assim que percebem sua diferenciação. Acho que deveria ficar próxima de mim para que meus olhos não te percam de vista — soava raivoso e extremamente ditador; era uma ordem. Mesmo se não quisesse, ela teria que ficar, mas não por sua proteção, e sim porque ele a queria por perto.
, enfim, entendeu o motivo de toda aquela conversa sobre aquelas garotas e o cheiro de sua excitação — que, pensando melhor, talvez nem fosse tão forte assim, naquele momento, não passando de uma tosca atração pelo perigo que ele exala quando respira.
Ela bufou, soltando os braços, franzindo o cenho e virando-se para pegar suas roupas, vestindo-se com pressa e raiva. Lembrou-se da primeira noite que estivera com , da mesma forma que se vestia apressada e irritada.
— Você só me quer por perto por causa dessa porra de sangue que eu tenho — rosnou ela, tendo dificuldade em acertar o fecho arrombado do sutiã. — Por que você não sai caçando mais uma puta desocupada que tenha essa mesma desgraça que eu e me deixa em paz? Ou você acha que eu vou ficar aqui por livre e espontânea vontade enquanto você me chupa como se fosse um carrapato, me fodendo quando sente vontade de dar uma trepada? — ela elevou o tom de voz e ele subiu os lábios, sorrindo com aqueles gigantescos dentes afiados. rolou os olhos e bufou outra vez, enquanto passava por ele, empurrando seu ombro.
— Você é uma raça rara e...
FODA-SE! — ela gritou, virando-se para ele com as veias do pescoço saltada e os olhos avermelhados. — EU NÃO QUERO TE VER NA MINHA FRENTE, SEU ESCROTO FILHO DA PUTA! PROCURA OUTRA VAGABUNDA QUE ESTEJA A FIM DE SERVIR DE BOLSA DE SANGUE PRA VOCÊ!
Pisando duro e quase correndo, atravessou o corredor e colocou a mão no corrimão de veludo da escada central. Ouviu os passos de atrás de si, mas não se virou para ver sua proximidade; ficou olhando para o chão, para a ponta preta de suas unhas ou o vermelho brilhante do chão.
Quando pisou no último degrau, levantou o olhar e deparou-se com uma mulher de cabelos vermelhos e olhos negros, com uma única auréola escarlate. Com o cenho franzido e o rosto angelical afogado em imensurável raiva, ela rosnou e mostrou seus dentes extremamente afiados.


14.

With the lights out it’s less dangerous.

abriu os olhos, mas não tinha certeza se estava acordada. Tudo ao seu redor era um breu infinito com cheiro de sangue e mofo; o piso gélido que tocava sua pele desnuda de tecido era grudento e, por trás do silencioso sopro de sua respiração afobada, ela ouvia o ruído de ratos correndo rápido pelos filetes de madeira que sustentavam o teto daquele porão sujo. Deixando-a presa no chão, correntes grossas estavam apertadas em seus pulsos, esticados para cima de sua cabeça, e em seus tornozelos, encolhidos próximos da parte traseira de sua coxa. Quando tentava movê-los para ficar mais confortável, o barulho dos metais roçando fazia sua cabeça doer.
Ela encolheu seus olhos, mordendo o interior de seu lábio inferior. Gemeu aflita, de medo, com o coração batendo alto nos tímpanos. Os pelos eriçados de suas coxas deixavam seu tato ainda mais sensível, tornando a brisa noturna ainda mais gélida e assustadora.
O cantarolar suave de uma voz angelical acima de sua cabeça a fez ficar ainda mais alerta, encolhida, com o nariz frio recostado sobre o bíceps úmido de lágrimas amedrontadas. Mesmo que tentasse ficar silenciosa, seu medo a fazia gemer, encolhendo os dedos dos pés e segurando firme a corrente em seus pulsos.
O vento frio que soprou sua pele era diferente do que adentrava aquele porão pelo vão entre os vidros quebrados da janela; o cantarolar tornou-se mais alto, próximo de seu ouvido. A porta de metal no alto da escada posto à direita de seu corpo arrastou-se pelo chão com um peso de toneladas, onde um único feixe prateado de luz iluminou metade de uma suja.
Seus olhos cristalinos brilharam com a luminosidade, mostrando-se intensamente assustados. Suas bochechas marfim estavam sujas de vermelho-sangue, assim como o chão que sustentava seu corpo quase nu. Seus cabelos compridos estavam embaralhados, tampando a metade do rosto que não conseguia ver.
Sem blusa, mostrando que exibiu suas asas há pouco, ele desceu os degraus com a respiração tranquila e os olhos presos na figura deplorável daquela garota. Quando chegou próximo o bastante, se agachou, colocando os antebraços nos joelhos.
A linha que se estendeu entre ambos os olhares fora profunda o bastante para perceber vestígios do demônio que era quando longe de sua mãe.
Quando perto de Lilith, ele parecia se esforçar para mostrar o quão cruel poderia ser; enquanto, longe dela, ele não se odiava tanto quando deixava escapar resquício de que havia, sim, alguma humanidade que poderia prevalecer entre toda aquela lava demoníaca no lugar de seu sangue. Afinal, a alma de um dia fora pura, antes de possuída por demônios.
Ele, diferente de seus pais, não havia escolhido se tornar o que é, ou, como outros demônios, não havia nascido do mal. Ele fora conduzido a isso; sua alma roubada, sua mente modificada, seus conceitos trocados. era uma experiência fracassada de Lúcifer.
temia em acreditar que, por mais que fosse um demônio, ele poderia sentir algum afeto por ela. Talvez não afeto, mas uma atração forte o bastante para sacrificar sua sanidade, se existente, de modo que ele colocasse seus propósitos em perigo apenas para salvar uma humana amaldiçoada. Por mais que quase extintos, raros, específicos, o diabo que seja, não é da natureza sobrenatural se sacrificar o mínimo para o bem da humanidade — e ela não deveria ser a única amaldiçoada sobrevivente em um mundo tão gigantesco quanto a Terra.
e deveriam ter alguma ligação sobrenatural para explicar tamanha atração, a qual nenhum dos dois poderia se livrar.
— Você não deveria ser tão malcriada — disse ele, tão suave e silencioso que se perguntou se eram sopros de sua imaginação.
— Eu não mudo por homem nenhum — respondeu, tentando esconder seu tremor. Suas pernas não poderiam estar mais encolhidas e as unhas fincadas nas palmas de suas mãos logo abririam pequenos vãos de carne, escorrendo gotículas vermelhas de sangue.
— Minha mãe ficou curiosa por você quando soube o seu nome — ele molhou os lábios, atraindo a atenção de até ali.
Quando virou o rosto, ela pode notar o tom negro de seus olhos. Era um azul escuro quase tão profundo quanto o oceano, com algumas auréolas externas de um escarlate vivo e intenso.
Ela se perdeu em seu perfil.
Ele era tão impossivelmente perfeito...
— Ela quer falar com você — ele tornou a dizer, virando-se para ela, passeando os olhos escuros por todos os detalhes de seu machucado no rosto.
parou de sentir, parando também de respirar.
assentiu e abriu um sorriso falso, de canto de lábio, colocando-se de pé. Ficou parado com as pernas abertas à frente de e tocou com a ponta dos dedos as correntes entre seus pulsos. Como se fossem de papel manteiga, as quebrou, fazendo os braços da garota despencarem como duas pedras. Depois, agachou-se de novo e libertou seus tornozelos. Quando tocou sua pele, notou-a fria como gelo.
parou, escutando a respiração falhada de , que contornava os pulsos com o polegar e o indicador, massageando-os.
— Ela vai me matar, não vai? — sussurrou, com a foz falha. Quando tornou a sentir, notou que seu nariz ardia e seus olhos marejavam. Ela olhou para baixo quando notou a analisando.
Ele franziu o cenho, enrugando o nariz, então se colocou de pé e a puxou pelo cotovelo até a sala.

Ali estava muito mais claro que o porão, e a luz negra que irradiava de Lilith parecia neblina congelada. Ela estava sentada de costas para a escada, bebendo uma xícara de sangue virgem, de fronte para a lareira acesa, onde o fogo lambia as rochas que contornavam a parede até o teto. Quando as porcelanas se tocaram, ela descruzou suas pernas, sentindo a deliciosa seda deslizando pela pele cintilante de suas coxas, tocando o nu de seus pés no veludo vermelho do tapete. Lambeu os lábios ainda mais vermelhos, sentindo a juventude brilhando em suas veias.
estava de joelhos, sem forças para ficar ao lado de — ele, com os cabelos bagunçados e os olhos perturbados, correndo-os pelas paredes da sala como se procurassem alguma válvula de escape.
A garota de cabelos negros subiu o queixo para ver, deixando os lábios entreabertos, e encarou enquanto Lilith se punha de pé, parecendo flutuar, ainda de costas, repousando o conjunto de chá na mesinha ao lado do sofá.
O vestido que ela usava brilhava assim como seus cabelos vermelhos, agora crespos, soltos até a altura do final das costelas. Lilith virou seu rosto de perfil, deixando que o fogo formasse uma silhueta perfeita. Então sorriu.
— Sinta o cheiro desta carne, minha prole — disse ela, ainda sorrindo. Quando abria a boca, tão suave quanto uma carícia, podia perceber o quão afiado seus caninos eram. Muito mais do que os de ou de Richard. — É tão mais doce que os outros amaldiçoados que não posso simplesmente tratá-la como se não fosse especial.
— Sinto não compreender o que fala, minha mãe — o rosto angelical, outrora sereno, de Lilith, se transformou em uma figura horrenda de puro ódio. Ela se virou em uma fração de segundo, trazendo consigo a neblina gélida que empurrou os cabelos de para trás.
Por que és tão estúpido, ? Por que não sabes de apenas uma lenda que tua mãe não tenha que te contar como se fosse uma criança recém-nascida?! — ela gritou, arregalando os olhos.
De fronte, o ar não passou pela garganta de . Quando seus olhos azuis se encontraram com o negro profundo nos de Lilith, ela sentiu apenas medo. Lágrimas pretas escorreram por suas bochechas pálidas e seu rosto tombou para o chão, assim como o resto de seu corpo, e de repente ela não tinha mais forças para respirar. Seus olhos viraram e seu coração martelou com uma força que não lhe cabia, parecendo explodir, machucando seus ossos sempre que teimava em mover-se.
Os olhos de se perderam naquela cena inédita. Nenhuma outra criatura agonizara daquela forma por apenas pôr os olhos em sua mãe.
Os dedos de encolheram, tanto os da mão quanto os do pé, e as veias de seu pescoço saltaram quando ela tentou puxar o ar novamente. Ela abriu a boca, trazendo os joelhos para perto do peito.
— Isto comprova o que eu estava imaginando — murmurou Lilith, aproximando-se da garota. Ela se agachou, tocando suavemente o rosto de , retirando alguns fios embaraçados de seu rosto pálido.
não respirava e começava a convulsionar.
Seu corpo começava a ficar arroxeado; seus olhos perderam o brilho, virados para dentro; as veias de seu pescoço estavam extremamente saltadas, como todas as outras de seu corpo, e começavam a adquirir uma tonalidade preta.
A cabeça de Lilith se virou levemente para o lado.
Os olhos de , virados para dentro, normalmente brancos, também começaram a ficar pretos. Suas gengivas e seus dentes, acinzentados.
— Corte a pele dela — ordenou Lilith.
não hesitou. Abaixou a cabeça, tocando a nuca de , e a puxou para perto, mordendo com força seu pescoço. A pele estava dura, mas o dente a perfurou. O sangue escorreu como se um cano tivesse sido estourado, jorrando muito mais que o normal em um tom quase arroxeado no rosto dele.
— Fascinante — disse Lilith, com os olhos brilhando, mas sem muita emoção.
— O que está acontecendo? — perguntou , com o cenho franzido, limpando a boca e a bochecha. — O sangue dela tem o gosto horrível — Lilith o olhou com os lábios entreabertos e riu.
— Acredito que Burwell seja descendente de alguma linhagem especial — ela se colocou de pé, virando-se de costas. — Alguém relacionado à bruxa, ou aos amaldiçoados originais, seguindo a herança de Eugine McGully — ela cruzou os braços magros, franzindo a pele de porcelana. se ajoelhou, tocando o rosto de . Mesmo com a distância de Lilith, ela ainda não respirava. — Ela é cheia de demônios covardes dentro desse corpo magro e fraco. Humana repulsiva — a enojou, torcendo o nariz, olhando-a de perfil.
— Isso a torna mais especial — disse rápido, quase sem pensar —, então por que a estamos deixando morrer? — ele a encarou. Lilith parou de andar, então fechou os olhos e se amaldiçoou.
— Tu aprecias a presença dessa garota, meu filho? — gemeu de dor, impulsionando o peito para cima como se quisesse quebrar a coluna, como se estivesse possuída. Lilith riu um som perturbadoramente assustador. — Gosta de como a carne fraca e humana dela roça com a tua, demoníaca, deliciosamente mais poderosa e quente? Aprecia o gosto da língua dela, em contato com a tua? — ela riu novamente, descruzando os braços, soando sugestiva. — Aprecia o som da risada dela, meu amado? Aprecia uma humana?
— Eu aprecio o sangue dela — respondeu seco.
— NÃO MINTA PARA MIM! — gritou, esticando os braços para os lados do corpo, arregalando os olhos. — Não admito que tu mintas para tua única mãe, teu verme imprestável e repugnante! Tu aprecias esta humana deplorável? E POR QUÊ? Pelo prazer que esta carne frouxa te dá? Tu és um demônio, ! Um demônio! Filho de Lilith! — ela ergueu o indicador para o céu, com os olhos ainda arregalados. O fogo atrás de seu corpo esguio tornou-se mais forte, como se o inferno aplaudisse o tom fervoroso de sua voz, o arregalar doentio de seus olhos.
— Você vai deixá-la morrer? — ele também elevou seu tom de voz, colocando-se de pé. — Vai largá-la no inferno para que qualquer demônio sugue seu sangue, como um carrapato estúpido? Como você mesma disse, mãe — daquela vez, o tom de sua voz fora extremamente irônico —, ela tem o sangue ainda mais especial que os outros amaldiçoados que você já conheceu.
Lilith ficou em silêncio por um segundo, apenas. Depois, elevou sua mão até acima de sua cabeça e deu um tapa extremamente forte no alto da bochecha de .
O rosto dele virou, ficando direcionado para o chão.
O fogo saiu da lareira, como se quisesse tocar o corpo de Lilith. Os cabelos dela se eriçaram como um gato com ódio; seus olhos se tornaram ainda mais escuros, como se fossem um espelho sujo de graxa. Todos seus dentes ficaram extremamente afiados, então ela soltou o rosnado mais raivoso que aquela casa um dia ecoou.
não a olhou novamente.
SER REPUGNANTE! — ela urrou com voz de demônio, grossa e raivosa.
As mãos de se fecharam em punhos e ele controlou as asas, que queriam saltar e atacar Lilith. Seus dentes já estavam afiados, assim como o urro de resposta entalado em sua garganta.
Ela flutuou até a garota que não respirava, de aparência morta, mas que ainda convulsionava, torcia a coluna, entortava os dedos e tinha todas as veias do corpo saltadas e pintadas de preto. Cravou as unhas afiadas em seu pescoço e a ergueu até sua boca, sugando o medo de suas descendências.
O medo fortalece qualquer demônio e um amaldiçoado tem uma linhagem repleta de genes sobrenaturais, sobretudo demoníacos. Sendo descendente de uma raça especial, ainda amaldiçoada, o medo de , somado aos de seus antepassados, por Lilith, fez daqueles demônios fortes, consumindo seu corpo em pavor, sugando sua vitalidade, transformando-a em um saco de medo.
Cada ancestral de , sendo amaldiçoado, bruxo, demônio ou anjo, cultivava medo, respeito ou ódio por Lilith. Aqueles sentimentos, quando juntos no corpo de uma humana ignorante de todas aquelas dimensões, sem controle de suas próprias emoções e sentidos, explodiram em uma fração de milésimo quando expostos à verdade de sua criação.
Embora já tivesse explicado as dimensões que o mundo se dividia, os demônios de ainda não tinham sido expostos à sua verdadeira prova que ela estava mais próxima do que pensava do olho do furacão, da origem de toda a guerra interminável entre o céu e o inferno.
Lilith sugou o medo de seus ancestrais, restando apenas o que ela própria poderia sentir como humana. Singularizou seus sentimentos para que eles fossem apenas seus, individualizando cada demônio amaldiçoado, cada ser existente dentro dela, cada pensamento, cada confusão e confissão em sua cabeça para que nada mais fosse um nó perdido em tantos outros. Esticou cada linha, separou cada pessoa dela própria para que assim pudesse estudar e entender o quão poderosa poderia ser estando ao seu lado na guerra contra Lúcifer, para que então pudesse fundi-los em um gene só, o de , ao invés de deixá-los soltos em um caos de heranças sobrenaturais.
Cada ser humano carrega dentro de seu corpo uma pequena parte de seus ancestrais, e assim não era diferente com — apenas que quase todos seus ancestrais tinham alguma ligação com o sobrenatural. Lilith formou uma árvore genealógica sanguínea, retirando todas e quaisquer impurezas que estivessem presentes em sua genética, tornando-a uma amaldiçoada completamente pura — mas Lilith era incapaz de saber quais eram seus ancestrais, de modo que a impedisse de saber o quão poderoso seu sangue era, mesmo quando agora puro.
Quanto mais próximo da linhagem de Eugine McGully, mais puro o amaldiçoado se tornava, e, portanto, mais raro e precioso.
Depois de um segundo, largou a garota ensanguentada no chão, com furos na nuca e no pescoço — branca pálida, com os cabelos mais negros que antes, e os olhos ainda mais claros e cristalinos, agora vidrados no fogo, havia se tornado ela mesma, sem nenhum empecilho genético que a vinculasse com seu passado, com suas lembranças ou com sua família.

Ele estava sentado em seu habitual morro, no início da manhã. As nuvens ainda eram volumosas e o sol ainda não era forte, de modo que o frio ainda rondasse seu corpo extremamente quente. O vapor que saía de sua boca era o inferno se dissolvendo, seu sangue fervendo em ódio por sua mãe e prazer pela virgem morta, caída ao seu lado.
Ela tinha belos e longos fios loiros e uma pinta vulgar acima do fino lábio superior. Fora fácil atraí-la para fora de casa, com aqueles olhos negros e aquele sorriso falsário, infernalmente sedutor.
O sangue inacabado dela, que formava uma poça, pingando de seu pescoço degolado, começava a atrair lobos, que uivavam e corriam — logo eles estariam ali.
As asas de ficavam perturbadas com a presença de Lilith, como se, de alguma forma, informassem que ele precisava estar sempre em alerta, pronto para fugir. Suas costas ardiam quando guardadas e, quando expostas, as penas ficavam eriçadas e pontiagudas como navalhas, apontadas para frente.
Sentado com as pernas soltas no ar, ele se fechava em uma cúpula, protegido pelas negras penas. Olhava para baixo, com a boca e os dedos sujos de sangue. Ouviu o passo e o arranhar afiado dos lobos, então olhou para trás e ficou de pé, molhando o lábio inferior. Acompanhou com as pupilas tão negras quanto o resto de seus olhos um deles, o de pelos cinza e patas sujas de barro, mordiscar até timidamente o pulso da virgem, puxando-a, agora, com brutalidade, quando outro mordiscou seu ombro, e outro seu tornozelo, outro sua cintura, outro o resto de seu pescoço, até começarem a brigar e rosnar.
sorriu. Era uma cena linda, a cadeia alimentar. E era ainda mais delicioso se ver no topo, acima de tudo e todos, sem enxergar absolutamente nada acima de sua cabeça.


15.

And I need one more touch, another taste a heavenly rush.

Quando voltou para a casa, estava sentada no sofá — suas mãos estavam entrelaçadas no meio dos joelhos e ela olhava fixamente, embora perdidamente confusa, para a lareira apagada. Sua pele pálida reluzia sob a luz acinzentada que adentrava a sala pelas gigantescas janelas, o cabelo tão mais negro atiçava um arrepio na nuca de — um arrepio singular que ele conhecia com perfeição.
A madeira rangeu quando ele pisou. , sobressaltada, elevou uma das sobrancelhas e virou suavemente o queixo, subindo os olhos cristalinos pelo corpo sujo de vermelho do demônio.
Ela tornou a olhar para frente, para baixo, e virou o pulso para cima. Na pele mais branca, suas cicatrizes platinadas ficavam mais fortes e brilhantes; as mais recentes, quase em um vermelho vivo. Era quase como se ela pudesse ver o sangue fluindo por aquele pedaço mais fino de pele. Suavemente, passou a ponta do indicador por cima da mais grossa, na parte superior direita de seu pulso esquerdo. Seu cenho franziu — as sobrancelhas escuras embelezando o rosto sem resquício de rubor.
se sentou ao seu lado no sofá; o peso de seu corpo fazendo-o gemer, fazendo-a mover-se junto de seus fios ondulados por ficarem presos. Ela moveu os olhos da pele para ele, somente para contemplar sua perfeição ainda mais óbvia.
Após o sangue virgem, era impossível alguém mais bonito que Giansanti.
— Como está se sentindo? — indagou ele, com a voz grave e rouca por sussurrar. Seus olhos estavam turquesas, mostrando que Lilith estava longe o bastante.
— Desde quando isso te interessa? — respondeu grosseira, encarando-o apenas uma vez. Ela ainda usava a mesma regata rasgada da noite passada, que mal cobria metade de suas coxas. Ainda sentia dores no pescoço e ainda sentia latejar onde Lilith a perfurou. A cabeça pesava com tantos pensamentos confusos.
riu, direcionando os olhos para o pulso dela.
— Por que seus olhos mudam de cor conforme a presença de Lilith?
— Minha alma está ligada com a de meus pais, porque fui planejado em função deles, à mercê deles. Quando estou perto de minha mãe, é como se ela desaparecesse, porque ela não tem alma; quando ela está longe, fico mais ligado ao meu pai, já que todo o propósito da minha existência está interligado com ele. E, como você deve saber, meu pai costumava ser um anjo — ele molhou os lábios, deslizando a calça jeans justa pelo estofado, apoiando o cotovelo para ficar mais à vontade. Seus olhos não desgrudavam dos cortes de . — O anjo da luz — ele riu irônico. — A cor dos olhos dos anjos realmente simboliza o que eles representam. A cor dos olhos dele é como o contraste entre um iceberg e o céu — a olhou. Era exatamente assim que os dele soavam agora. Ela não desviou o olhar, mas ele o fez antes que ela pudesse piscar, olhando para o teto. — Quando ele caiu, era lógico que algo aconteceria com sua alma. Ele a deveria queimar, mas a congelou. Congelou em sua forma original porque — ele fez uma pausa dramática, com a boca aberta. Puxou ar, olhou para e sorriu —, adivinhe — alargou seu sorriso. Ela rolou os olhos.
— Eu não vou adivinhar.
— Ah, , vamos lá. Não seja tão estúpida. Eu sei que você é boa de chutes — ele piscou, fazendo-a rolar os olhos novamente. — Tente apenas uma vez.
— Não — ele bufou.
— Idiota — fora sua vez de rolar os olhos, que ficavam, lentamente, mais escuros. — Congelou em sua forma intacta porque um demônio desalmado é incapaz de possuir outros corpos ou assumir sua forma original; ele praticamente deixa de ser um demônio. É desonroso ter sua alma arrancada. A não ser que este demônio seja minha mãe — ele franziu o cenho, dando de ombros. — Ela é capaz de fazer coisas que eu não entendo, por causa da ligação que tem com as bruxas.
— Vou descer — ela se levantou, caminhando com os braços soltos ao lado do corpo. virou o pescoço para ver o movimento de suas nádegas nuas e suas coxas. Quando ela se virou, tocando a porta de aço, o encarou com um sorriso malicioso nos lábios antes de começar a descer os primeiros degraus.
O arrepio na nuca dele se tornou mais evidente, começando a descer pela espinha, ousando passar a frente de sua cintura.
Ele riu, caminhando para o mesmo lugar que ela.
O porão estava um pouco mais escuro que o resto da casa, iluminado apenas pela janela quebrada e suja de poeira. estava de costas, avaliando as novas pontas extremamente pretas. parou no meio da escada, avaliando o corpo dela. A curva de sua cintura, as pernas compridas e as coxas redondas, brancas, que logo ficariam vermelhas com o toque de suas mãos.
virou suavemente o rosto, tocando o queixo no ombro. Com a mão direita, tocou a alça da regata preta e rasgada no ombro esquerdo, descendo-a até metade do bíceps. acompanhou com os olhos azuis escuros, com os braços cruzados. Folgada, a regata escorregou por sua pele até tocar o cotovelo. sorriu com malícia quando subiu os olhos para encará-lo.
Ela se virou, segurando a regata com os antebraços — se os abaixasse, expunha todo seu corpo nu, já que tudo que restava tirar era uma calcinha de lycra preta, que rasgaria com facilidade, com os dentes.
Ele desceu os degraus lentamente, mantendo o contato visual com ela. Sorriu pelo canto dos lábios quando se encontraram no mesmo piso, e adorou quando ela ergueu seu queixo e esticou seus cabelos para poder continuar olhando-o com certa superioridade, com o nariz empinado. , com uma das mãos, agarrou a cintura magra de e a puxou com brutalidade para perto, enquanto, com a outra, entrelaçava seus cabelos e puxava sua nuca para baixo, de forma que seu pescoço ficasse completamente ereto. Aquela primeira e pequena ardência de dor fez com que um riso soprasse nos lábios vermelhos dela, que fechou os olhos e sentiu, com a intimidade palpitando em prazer, a barba por fazer dele roçando na pele de seu pescoço e, logo em seguida, o quente úmido de sua língua lambendo o caminho de seu maxilar até o lóbulo de sua orelha.
A mão que segurava sua cintura desceu pela coxa até a virilha, tocando a calcinha, escorregando as unhas pelo tecido preto. Em um pequeno movimento torturante, ele pressionou o indicador e o médio em seu clitóris, movendo-o para a esquerda e para a direita, depois para cima e para baixo; desceu até seu vão, fazendo movimentos circulares, sentindo o quão excitada ela já estava, sem ao menos terem começado direito.
riu contra o ouvido dela, fazendo-a fincar suas unhas nos ombros largos e nus dele. Os dentes dele mordiscaram a orelha dela, soprando sua respiração ali enquanto empurrava seu corpo magro para a parede, prensando-a, pressionando seus corpos para que ela pudesse sentir seu calor. passou uma das pernas pela cintura dele, puxando-a para que pudesse sentir suas excitações próximas.
A mão de adentrou sua calcinha e ele arranhou os dentes em seu pescoço, descendo até a altura dos ombros, caminhando pelas clavículas até o colo. Beijou-o e mordeu-o até alcançar os seios excitados, com a regata já no meio da barriga. Ele contornou a pinta no mamilo direito com a língua, antes de abocanhá-lo e chupá-lo ao mesmo instante em que começava com movimentos circulatórios intensos no clitóris, descendo para umedecer os dedos, voltando para torturá-la em movimentos tão bruscos e fortes que o deleite era imensurável.
mordeu os lábios e franziu o cenho para evitar gemer logo em seus primeiros atos. Afundou as unhas na pele dele, sentindo-o sorrir, soprando uma risada em seu mamilo úmido, tornando a lambê-lo e chupá-lo com ainda mais fervor e vontade, vendo como ela ficava perfeita quando vulnerável. Ela jogou sua cabeça para trás, sentindo a parede roçar seus cabelos para cima e para baixo, até que um gemido se confundiu com sua respiração.
parou com os movimentos, recebendo um arranhão no pescoço de reprovação, que desceu para o meio de seu peito, fechando-se em um punho ali — ele franziu o nariz, sorrindo com aquilo, subindo os lábios e os dentes para o pescoço dela, chupando-o com força, sentindo o gosto do sangue dela em sua língua. As pupilas dele dilataram.
Quando tirou o rosto de seu pescoço, não se olharam antes de começarem um beijo tão violento que chegava a machucar seus lábios. Ele empurrava seus rostos, provando seu sabor até o máximo que podia, com saudade de seu calor singular. subiu uma de suas mãos pela lombar dele, arranhando com força toda a extensão de suas costas até chegar ao ombro, onde buscou apoio para entrelaçar a outra perna e ficar mais alta que ele, de modo que fosse obrigado a elevar seu pescoço para continuar com aquele beijo — e ele o fez.
Com as mãos livres, ele pode desabotoar sua calça e arrancar a calcinha dela. mordeu com força o lábio inferior de , sugando-o para si, sentindo gosto amargo de sangue demoníaco. Ela sorriu, conectando seus olhos por apenas um segundo. Ele puxou seu lábio de volta, lambendo-o antes de assisti-la escorregar pela parede, empurrando-o com as mãos espalmadas em seu peitoral já vermelho por suas unhas.
ficou de joelhos e olhou para enquanto acariciava seu membro, desde a cabeça até a base, em movimentos circulatórios e lentos. Tocou os testículos, descendo até o períneo, estimulando-o com o dedo médio quando tocou a ponta da língua esticada para fora da boca, contornando toda a glande. Depois, sem aviso prévio, enfiou-o todo na boca e o sugou até a base em movimentos rápidos. virou os olhos com a surpresa, abrindo um sorriso embriagado; tocou os cabelos de , segurando-os na altura média de sua cabeça, controlando seus movimentos. Ela, enquanto sugava com força, arranhava com uma das mãos a coxa dele, estimulando os testículos com a outra.
tirou a boca do membro de e ficou encarando-o enquanto o masturbava com maior pressão e velocidade de antes, sentada nos calcanhares.
mordeu os lábios e jogou a cabeça para trás, fechando os olhos. Ele impulsionou o quadril para frente uma vez e, quando sentiu os lábios úmidos e quentes dela próximos de sua glande novamente, empurrou sua cabeça para que o sugasse novamente, sem torturas. o fez sem pestanejar, cravando as unhas nas nádegas dele, empurrando-o para que seu membro inteiro entrasse em sua boca.
Ela relaxou a garganta e afrouxou os lábios para que não o tocasse, respirando. pareceu se contorcer, fazendo-a sorrir, olhando-o novamente.
o lambeu delicadamente, chupando a glande, e lambeu os lábios.
— Você não é diferente dos outros — provocou.
— Como é? — ele respondeu, acompanhando-a ficar de pé.
— Você é fraco como todos eles — franziu o cenho, mostrando aquele lado que ela adorava. A intimidade de palpitou forte e ela sentiu que suas entranhas derreteriam se ela não o sentisse logo.
— Fraco? — ele arqueou uma das sobrancelhas, estalando a língua. assentiu com o olhar malicioso. — Você me acha fraco? — ela encolheu os olhos e, delicada e lentamente, respondeu:
— Acho.
a atacou como um animal. Segurou sua cintura e a virou contra a parede como se fosse, de fato, devorá-la. Empurrou seu cabelo e pressionou sua bochecha contra a parede de pedra, respirando contra seu maxilar. Segurou seu antebraço na altura de sua lombar, deixando a mão bem presa na parede, machucando. sorriu, mordendo os lábios. Sentia o membro duro dele roçando entre o vão de suas pernas e, sempre que ela se movia para os lados, era como se o deleite explodisse em suas veias e entorpecesse sua sanidade.
Ele sequer se deu ao trabalho de responder. Penetrou-a com tamanha força que o quadril dela se chocou com a parede, fazendo um barulho alto. O gemido de sua boca, de dor e de prazer, foi o melhor para . E fez de novo, de novo, de novo e de novo. Com mais força, cada vez mais rápido. Ela impulsionou seu quadril, deixando a bunda arrebitada, e segurava o corpo com a força das coxas sempre que eles se batiam.
molhou o lábio inferior e o mordeu com força, soltando-o quando não controlou um gemido. Ele começou a diminuir a intensidade. Ela franziu o cenho, abrindo os olhos deliciosamente fechados.
— Vamos ver quem é a fraca aqui — sussurrou ele, próximo de seu ombro, antes de mordê-lo com força, vendo sangue brotar. passou a língua ali, sentindo o poder irradiar suas veias, intensificando seus sentidos. Suas pupilas ficaram maiores e a força com que ele a segurou fora maior, mas os movimentos com seu quadril eram quase mínimos.
Por mais que ela impulsionasse seu próprio corpo para trás, não era suficiente para que a pressão fosse bastante ou sequer gostosa.
Ele passou a língua novamente nas novas gotas de sangue e, com os lábios vermelhos, sussurrou:
— Pede para eu ir mais forte... — ele beijou seu sangue, chupando-o. Lentamente, soltou seu braço de sua lombar. logo o apoiou na parede, rolando os olhos. — Ou melhor... Implora para mim.
negou com a cabeça, tentando se virar. Ele a segurou com mais força, fazendo-a gemer. encostou a boca suja atrás de sua orelha; lentamente, lambeu desde o lóbulo até seu meio, sorrindo com o arrepio aparente em sua pele.
rebolou. Ele também se arrepiou, sentindo um calafrio intenso de excitação passar pelo meio de seu estômago até a ponta de seu membro, encaixada dentro de .
... — ela gemeu, jogando a cabeça para trás, deitando-a no ombro dele; ele sorriu. — Volta para o inferno — ele riu, apertando-a.
impulsionou as mãos na parede de forma que suas costas empurrassem de seu encontro. Ele deu um passo para trás, vendo-a apoiar um dos pés na parede, colocando as mãos atrás da lombar, na parede. Jogou o cabelo do rosto e sorriu maliciosamente. Quando caminhou para ele, não desconectou seus olhares, que ficavam cada vez de cores mais diferentes.
Ela o empurrou com força para o chão, pelos ombros. O deixou sentado e, quando se sentou por cima e sentiu seu corpo tombando para trás, relutou e riu de uma forma quase brincalhona, que o fez sorrir.
segurou sua cintura e não relutou uma segunda vez quando ela começou a se mover com intensidade em cima de seu quadril — por enquanto. Ele inclinou um pouco seu tronco para trás, acompanhando o movimento de entrada e saída de seu próprio membro nela. Ora rebolava, ora ia para frente e para trás, ora subia e descia, mas não havia um segundo que estivesse parada.
Logo seu quadril começou a esquentar de forma que ela não conseguisse controlar. Queria mais, maior brutalidade. Empurrou o tronco para trás e o puxou para cima de seu corpo.
moveu seu quadril com tanta força que o primeiro choque entre suas peles fez com que o orgasmo explodisse nela, impulsionando seu peito para cima, seu pescoço para trás; o gemido sincero que saiu de seus lábios fez seu cenho se franzir e sua respiração descompassar. O quadril queimou e as células explodiram em endorfina, em um espiral que ia desde os folículos capilares até o final da unha do pé, indo e vindo em ondas que não pareciam terminar. Quando um perdia intensidade, se movia por cima dela como um animal, reforçando o deleite entre seus corpos. Era tão forte que ela sentia o nariz arder, os olhos marejando quando ele estocava outra vez.
A sensibilidade no tato de o fez retomar seus sentidos quando uma gota vermelha caiu de sua boca para o meio do seio de . Ele parou de se movimentar, ficando de joelhos e, parecendo ler seus pensamentos, ficou de quatro.
A mordida e o sangue ainda estavam ali, em quantidade ainda maior por passar certo tempo sem ser limpo. Ele, assim que tornou a penetrá-la, entrelaçou os dedos no cabelo da nuca de , puxando-a com força para que a mordida ficasse próxima de sua boca. Com uma das mãos, segurou sua cintura, intensificando os movimentos de seu quadril, escutando o delicioso som de suas estocadas se confundirem com os gemidos dela e os ofegos de sua própria boca, enquanto com a outra acariciava e apertava seu seio, sentindo a mão dela por cima da sua.
chupou o sangue que saía em gotas do ombro de , lambendo-o e beijando-o, gemendo e mordendo os lábios conforme sentia tudo dentro de si se intensificando.
jogou sua cabeça para trás e, quando sentiu a mão dele descendo de sua cintura para, novamente, seu clitóris, em movimentos circulares brutos, se preparou para outro orgasmo explosivo. O prazer era tanto que ela sentia a lucidez deixando seu corpo, franzindo o cenho e mordendo o lábio, sentindo o interior das pálpebras molhadas. Com a nuca apoiada no ombro dele, ela empurrou seus cabelos molhados para trás, gemendo alto quando começou tudo de novo, empurrando o quadril para trás, apertando a mão dele em seu seio.
se moveu com mais força, começando, pela primeira vez, a sentir dor nos músculos por simplesmente não parar de movê-los. Moveu com mais força os dedos no clitóris de , vendo-a gemer em imenso prazer, e intensificou também os movimentos do próprio quadril. Ele não conseguia respirar caso continuasse a chupar seu sangue. franziu seu cenho e deixou os lábios extremamente vermelhos de sangue entreabertos, abaixando os olhos para a bunda de , para o contato entre seus corpos, o vai-e-vem de seu membro.
O suor e o calor entorpeciam suas mentes, extasiando seus corpos e deleitando seus mínimos espaços de pele.
Então o pico se elevou ao máximo, até que seu corpo despencasse de uma vez em uma queda livre de mil metros. O jorro de seu orgasmo dentro de fez com que um gemido rouco nascesse no fundo de sua garganta, arrepiando seus pelos, crescendo cada vez mais em seu corpo. Ele não parou de se mover, até que sua sanidade fosse completamente recuperada.
se afastou dele e encostou, ereta, o tronco na parede de pedras, puxando os cabelos úmidos para trás das orelhas, com os olhos fechados. Respirando com a boca aberta, ela jogou o queixo para cima e tentava, inutilmente, controlar seu corpo. Ela ouviu o barulho que o corpo de fez quando ele se levantou, então abriu os olhos para vê-lo nu. Ele se aproximava dela, olhando diretamente para sua boca vermelha.
— Você tem que subir — disse ela, quase sem fôlego, passando a mão no rosto suado e avermelhado. Ficou de quatro, puxando sua regata e sua calcinha estourada, avaliando se ainda poderiam ser utilizados. soltou uma risada nasalada e negou com a cabeça.
— Não vou; tenho fôlego e vontade para mais. Você me descontrola, tira minha lucidez. Eu nunca senti isso com outra mortal e quero sentir o tempo todo.
— Não seja irracional — ela o lançou um olhar que transbordava ódio, com o cenho franzido. vestiu a regata preta, empurrando os cabelos para trás dos ombros. — Sua mãe está chegando — gargalhou, agachando-se ao lado dela, colocando um dos antebraços acima do joelho. Seus olhos ficaram na mesma linha; os dela, tão cristalinos quanto o mar, enquanto os dele, escuros como graxa.
— Isso soou tão...
Sua frase ficou no ar quando a porta acima de suas cabeças bateu. Eles levantaram seus queixos e olharam o teto de madeira. Silenciosos, escutaram os passos nus de Lilith. riu, notando certo desconforto em . Ele se colocou de pé e virou de costas, vestindo sua calça com pressa; empurrou os cabelos úmidos para trás e subiu as escadas de dois em dois degraus, deixando-a sozinha, sentada com os joelhos próximos do peito, os pés separados e a respiração já um pouco controlada.
Ela inclinou a cabeça, abaixando os olhos. Preferiu ficar surda a ouvir novas discussões familiares, agora de uma classe superior — ou seriam inferiores? Ela fechou seus olhos e lambeu o lábio inferior, sentindo o gosto da boca de — e, naquele segundo, uma explosão de imagens se formou em sua cabeça. Lembrou-se da primeira noite com , de sua fúria, de sua própria ingenuidade; lembrou-se do quão intenso ele sempre era e do rosto que fazia quando estava preste a gozar; lembrou-se de como ele apertava com mais força a pele de sua cintura quando um calafrio mais forte percorria seu corpo.
Ela sorriu pelo canto dos lábios, tombando o corpo para o lado, deitando-se no chão. Passeou a ponta dos dedos pelo meio de seu corpo, tocando os caminhos ainda quentes, ainda úmidos, ainda deliciosamente marcados pelos dentes e lábios do demônio que a assombrava naquele deleite ímpar.
manteve seus olhos fechados quando ouviu novos passos na escada de madeira.
— Acorde-a! — Lilith ordenou, com a voz já alta, a . Ele, sem responder ou proferir qualquer outro ruído, apenas caminhou até ela e esperou que abrisse seus olhos. Quando ela o fez, os perdeu no abdome rijo dele e o volume em sua calça, sem vergonha de mostrar aquilo. — Por que sempre estás nua quando ponho meus olhos em ti? — virou o rosto e encarou o de Lilith, tão perfeitamente sereno. Ela negou com a cabeça com ingenuidade. — Ponha-se de pé — ela se virou. — Sairemos.
— Não posso sair assim — respondeu , apenas se sentando, sem mostrar emoção nenhuma na voz. Lilith parou de se mover, ficando de costas. enrijeceu.
— Como...? — Lilith soltou uma risada nasalada. — Como falastes, humana? — ela virou o rosto de perfil, olhando para baixo, com as mãos unidas na altura da cintura, para frente do corpo.
— Disse que, no mundo de hoje, não é normal que uma pessoa saia pelada na rua — Lilith respirou fundo, virando o corpo com um sorriso frio nos lábios.
— Não é do meu interesse como o mundo se encontra nos dias atuais — seus olhos penetraram na alma da garota. — Ponha-se de pé e siga-me! — gritou, franzindo o cenho em raiva.
engoliu em seco, ficando de pé; Lilith sorriu fria novamente.
— Preciso de roupas — disse novamente, um pouco mais baixo. As duas auréolas nos olhos de Lilith se tornaram mais vermelhas. — Tenho um apartamento aqui na cidade onde posso pegar minhas coisas.
— Tu não necessitas de nada além de tua pele para sobreviver aos tratos que te darei para o resto de tua moribunda vida! Por que acreditas que teria privilégios a outros amaldiçoados que já cultivei aqui, séculos antes? — ela arqueou uma das sobrancelhas.
— Porque o meu sangue não é como o deles — disse , certa daquilo. — Você não tem certeza dos poderes que pode conseguir se utilizá-lo da forma certa — Lilith olhou para , pelo canto dos olhos.
— Quando tu tens uma ave rara — disse ela, tornando a olhar profundamente nos olhos de —, não deves deixá-la voando livre pelos ares do mundo. , siga-a até sua vivenda e traga-a de volta para mim daqui a uma hora. Veremos Pandora ao entardecer.


16.

We’re building it up to break it back down.

estacionou o Camaro do outro lado da rua e ficou com as mãos no volante, com os olhos presos no horizonte de prédios enquanto abria a porta e se chocava com o frio do início da tarde. Os comerciantes que reabriam suas lojas pararam, olhando as pernas nuas da garota pálida que saía do carro, cujo motorista abria um sorriso sujo no canto dos lábios suavemente rachados.
correu e adentrou o prédio, subindo as escadas, segurando a barra da regata para esconder o máximo de pele que conseguia. Respirando ofegante, foi até o extintor de incêndio posto ao lado da porta de seu apartamento e o puxou com força, soltando um gemido pelo peso, pegando a chave reserva e enfiando na fechadura.
O cheiro que invadiu suas narinas a fez sentir certo nojo em uma onda de nostalgia — acompanhada de um arrepio peculiar de medo na nuca.
A casa estava toda revirada. Todos os móveis quebrados, todos os armários escancarados.
fechou a porta e ficou com as mãos espalmadas atrás da lombar, com o cenho franzido e a boca entreaberta. Andou na ponta dos pés, fazendo o mínimo de barulho, ainda sobressaltada para caso alguém — ou algo — aparecesse e a atacasse.
Olhando para o chão, ela viu dois rastros de sangue — um demoníaco e outro humano, provavelmente dela. A janela da varanda da sala estava quebrada e o vento que balançava as cortinas, além de frio, tinha um cantarolar assustador.
Quando seu pé esbarrou em um caco de vidro, ela puxou o ar, se assustando, olhando para o chão, dando um pulo para trás. Abaixou o corpo, pegando aquele caco grande e grosso em uma das mãos, pensando que se protegeria daquela forma. Molhou o lábio inferior e o mordeu com força, apertando as unhas nas palmas das mãos, tornando a caminhar pelo corredor até seu quarto, com os olhos e ouvidos atentos.
A porta estava arrombada, com a madeira quebrada como se fosse feita de papel. No batente, era possível ver a marca de dedos vermelhos — puxou o ar e abriu a boca, piscando algumas vezes quando imaginou se aquele seria o sangue de sua mãe, depois que Richard a matou.
Ela tocou com suavidade o mesmo local que o demônio, pondo a cabeça para dentro do quarto. A cama estava revirada, o armário caído e tudo rasgado, com penas espalhadas por todo o chão — tanto pretas quanto brancas, que vinham das almofadas e travesseiros. Adentrando o quarto, ainda cautelosa, segurando o caco grosso de vidro de forma tão leve que quase o queixava cair, ainda passava a outra mão na parede, seguindo o mesmo caminho antes feito por Richard. Olhou para o chão, sentindo os cabelos cobrirem sua visão periférica, e colocou o pé na lateral do armário para abrir sua porta. Ali dentro, algumas poucas roupas ainda estavam intactas, enquanto várias outras haviam sido roubadas — coincidentemente, as que ela mais usava, como sutiãs, calcinhas, regatas pretas e cardigãs.
se virou lentamente, ainda olhando para o chão. Permaneceu com os dentes fincados no lábio inferior e seguiu pelo corredor até o quarto seguinte: o seu. Tão caótico quanto o de Maya, a única diferença era que a porta do armário estava aberta e a impedia de ver se alguém estava escondido ali atrás.
Ela prendeu a respiração, tornando a apertar o caco de vidro entre os dedos — quando o afrouxou, deixou que uma ponta afiada adentrasse sua pele em um pequeno furo; tão pequeno que ela mal o sentiu, mas qualquer demônio podia sentir o cheiro da gota do seu sangue.
No primeiro passo que deu, uma brisa adentrou o quarto pela janela estilhaçada da varanda e seus olhos humanos não captaram tão rápido movimento: um vulto negro passou ao seu lado, no corredor, e a porta do banheiro bateu com uma altura estrondosa para o silêncio que ela tentava fazer. deu um pulo para trás, deixando o vidro cair ensanguentado no chão. Uma das portas do armário também bateu — uma lufada de ar saiu da boca dela quando seus olhos se arregalaram.
O vulto negro tornou a correr novamente pela casa, passando bem ao lado dela, ficando parado, grudando de cabeça para baixo na extremidade do teto. Quando o olhou, não o reconheceu — estava envolto por uma espécie de manto preto que o deixava apenas com os olhos vermelhos de fora. Quando ele rosnou, mostrou os dentes tão afiados quanto os de Lilith.
quis gritar, mas simplesmente correu para o corredor, quase tropeçando em seus próprios pés. Quando deu seu primeiro passo, caiu em uma poça pegajosa e pesada, com cheiro de ferrugem e gosto de sangue. Submersa naquela mistura quase líquida onde antes se encontrava o corredor, ela não sentia o chão nos pés, e quando tentava levantar o braço para ficar com a cabeça para fora para poder respirar, sentia os braços pesarem, tamanha era a rigidez daquele líquido vermelho escuro.
Com os cabelos sujos e esticados para baixo, levantou o queixo, sentindo o coração bater insanamente forte contra seu peito — o demônio passava bem acima de sua cabeça, indo para a extremidade do corredor que ficava às suas costas.
Ela soltou um grunhido de agonia, tentando se mover naquele líquido nojento, mas parecia que seus tornozelos estavam presos por ligas de plástico que apertavam cada vez mais sem que ela pensasse em se mover, puxando para baixo. Dali a alguns segundos, ela já não conseguiria respirar. Quando elevou novamente a cabeça, viu que o demônio sorria com seu desespero. As paredes começaram a derreter sangue demoníaco, preto, e o demônio encapuzado desceu fincado às lágrimas de graxa, caminhando lentamente em direção à .
Então ela gritou, sentindo o líquido descer por sua garganta.
Era sangue velho.
balançou os cabelos e tentou não perder a lucidez. Olhou de um lado para o outro, batendo com força as mãos e os pés para manter sua cabeça imersa daquela piscina de sangue, respirando descompassada com a boca aberta, tentando ignorar aquele gosto impregnado em sua língua.
O demônio se aproximava cada vez mais e, quando estava próximo o bastante, ela fez força com a mão, jogando uma boa quantidade de sangue no rosto dele; bateu as pernas com toda a força que lhe restava e puxou, fazendo barulho, o ar em sua volta, fechando os olhos quando mergulhou no sangue.
Submersa, o silêncio de milésimos era aterrorizante. Mal mergulhou e o barulho das garras do demônio caçando seu corpo, batendo no sangue, empurrando-o para os lados, já assombrou seus ouvidos, fazendo-a soltar o ar para gemer de medo — o gosto de sangue entrou por suas narinas e papilas, fazendo-a tossir. O gosto parou em sua garganta, grudando ali. Ela precisava subir para tomar ar, mas o demônio estava logo acima de sua cabeça.
bateu mais as pernas, mesmo sentindo que não saía do lugar com o peso daquele líquido, esticando as mãos para frente com esperança de encontrar uma parede.
Ela emergiu a cabeça, puxando o ar com força, abrindo os olhos, tateando o rosto para tirar todo o sangue do rosto. Tossiu enquanto se arrastava por seu pior pesadelo, olhando para os lados em busca daquela figura negra de olhos vermelhos. Mas ele havia sumido; não estava mais em lugar nenhum.
Tudo ficou silencioso demais.
ficou olhando para trás, para cima e para os lados, nadando lenta e cuidadosa no sangue, com a cabeça um pouco afundada.
Um segundo depois, sentiu dedos contornando seus tornozelos e puxando-os para baixo. Ela só teve tempo de soltar um agudo e curto grito antes de ser submersa por completo de novo. batia as pernas, chutava e tentava agarrar qualquer coisa em qualquer ângulo, mas ninguém parecia segurá-la. Aquilo tudo parecia ser uma alucinação. Ela prendia o fôlego porque não queria que sangue entrasse em sua garganta e permanecia com os olhos fechados porque não queria ver morte. O demônio tornou a apertar seu tornozelo, jogando-a em uma extremidade da parede que ainda sangrava preto, tirando-a do líquido por apenas um segundo. arregalou os olhos, puxando uma lufada de ar, fechando-os novamente quando pressentiu que cairia novamente.
Mas não caiu. O chão voltou a ser chão.
Ela caiu de barriga para cima, sem ar, com medo. Ouviu a risada do demônio e o barulho de seu corpo atravessando o vento, depois todas as portas, todas as gavetas e todos os armários abriram de uma vez, como se um grito cortasse aquele silêncio horrível daquele apartamento.
gritou de ódio e de medo, ouvindo uma gargalhada cortar seus ouvidos. Ela correu até a porta da frente, encolhendo as sobrancelhas quando olhou a seu redor. Tudo estava caoticamente infernal, assombrosamente assustador. Ela girou a maçaneta e tentou abrir a porta diversas vezes, mas tudo que escutava era o som da madeira batendo no batente. Estava trancada por fora.
— Merda! — ela gritou, virando para a janela escancarada.
Ela apoiou as mãos espalmadas na grade de proteção, já começando a colocar um dos tornozelos machucados pelo demônio no ar, pronta para pular, quando ele a agarrou novamente — pelo antebraço e pela boca, tapando-a.
gritou descontroladamente, tentando de todas as formas se livrar daquele verme infernal. Ela o cotovelou as costelas, tentando morder seus dedos, balançando o queixo de um lado para o outro enquanto tentava se esgueirar por entre seus braços, pisando em seu pé e chutando seu quadril. Ele a apertava com mais força, roçando os dentes extremamente afiados pela pele sensível de sua nuca. gritou com mais força, o batendo também com muito mais força. Sacudiu-se, cotovelou-o, arranhou-o, socou-o o máximo que conseguia, dando uma cabeçada em seu queixo, sentindo-o dar uma trégua mínima em seu antebraço, deixando-a que escapasse por um milésimo de segundo, saindo do aperto de suas mãos como uma cobra. Ela correu de volta para a sacada, respirando com dificuldade, começando a franzir o cenho quando sua lucidez voltou e ela o escutou gargalhar.
Mas era uma risada conhecida.
Era a risada de .
Ela, ofegante, deixou a boca aberta quando o viu se contorcer para frente, com os olhos marejados de tanto rir.
colocou uma das mãos na cintura e a outra usou para pentear os fios pretos da testa para trás da cabeça. Ela estralou a língua, sentindo o ódio tomar conta do seu medo.
— Me explica uma coisa — disse ele, esticando o corpo enquanto ainda ria, limpando uma lágrima com o dedo indicador —, como você pretendia se proteger de um demônio com um caco de vidro? — ele gargalhou ainda mais alto.
abriu um sorriso falso e irônico, sem mostrar os dentes.
— Você é um babaca infantil, escroto do cacete — disse ela, com ódio. Ele riu mais ainda, tendo que apoiar a mão em no destroço do sofá para poder se controlar. Seu rosto estava vermelho e, sempre que olhava para ela, outra crise de riso começava.
fechou o punho que sangrava e tornou a entrar na sala, esbarrando propositalmente nele enquanto voltava para o quarto principal da casa. Ela respirou fundo e tornou a mexer nos cabelos mais escuros enquanto empurrava com força a porta do armário, sentindo algo aveludado roçar em seu tornozelo. Quando olhou para baixo, viu uma pena inteira preta, pequena e espetada, pegando-a nos dedos.
Não tornou a dizer, ainda com resquício de riso na voz. rolou os olhos e bufou. — E a parte mais engraçada foi quando você cogitou a ideia de se jogar da sacada para “se salvar” — ele riu, adentrando o quarto. — E aí, pegou suas coisas? — ele fungou, soltando outro riso curto, cruzando os braços enquanto apoiava o corpo na parede.
— Não, velhote — ela esticou a pena para ele. — Mas tem uma loja de produtos agropecuários aqui nesse bairro; podemos procurar algo para piolhos em aves — ela sorriu sem mostrar os dentes, se agachando para abrir o compartimento secreto do armário. Ali, quatro bolos de dinheiro e a caixinha com a safira estavam guardados. entortou o pescoço, mas para olhar a bunda nua de .
Quando ela se levantou, ele tornou a olhar a pena, depois de fitá-la os olhos e rir sujo. Ela rolou os olhos e pegou algumas roupas, colocando-as no antebraço.
— Essa pena não é minha — disse ele, de forma óbvia. o olhou. — É de outro demônio. E eu também não fiz essa merda na sua casa, como você bem deve imaginar — ele olhou à sua volta. — Eu não me daria ao trabalho.
— É — ela fechou a porta com força. — Você também estava ocupado — ela o olhou com tédio e passou por ele, seguindo para o banheiro. riu.
Ele a seguiu, tocando-a suavemente no cotovelo. Quando suas peles se chocaram, se virou em um baque e esticou o punho para o rosto dele, mas desviou. Ele riu com malícia, segurando seu pulso e a puxando com brutalidade, beijando-a a força. Ela subiu o joelho para sua barriga, mas ele também o segurou, encaixando-o em sua cintura, prensando seu corpo contra a parede. gemeu, mas de raiva, e virou o rosto, sentindo-o beijar e pressionar a boca em seu maxilar e pescoço.
— Sua mamãezinha não está com pressa? — indagou com ironia.
— Cala a boca — ordenou, mordendo a pele acima de sua clavícula.
— Você não tem medo que ela brigue com você por causa disso, ? Não quer que ela te veja como o filho perfeito? Não quer ser o filho perfeito? — naquele momento, soltou seu joelho e seu pulso, fechando seu punho e socando a parede.
— EU MANDEI CALAR A BOCA, PORRA! — ele gritou, virando-se enquanto caminhava com raiva para fora do apartamento, batendo a porta com força.
soprou uma risada e ficou com a boca entreaberta, passando a mão no pescoço antes de estalar a língua e se virar novamente, adentrando o banheiro pintado de uma nova cor: sangue seco.
O cheiro apodrecido de ferrugem fez seu nariz arder. Ela caminhou lentamente e segurou sua carta, vendo a letra rápida, suja de sangue, escrita com pressa e sem muita vontade ou inspiração. Encarou o chão com incontáveis cigarros inacabados e, no meio de tantos, um intocado, ainda em condições de uso. O tomou em dedos e procurou, no compartimento do espelho, um isqueiro. Ela colocou o cigarro nos lábios e o acendeu, olhando para o chão, tragando apenas uma vez, pegando sua carta para lê-la.
Quando terminou, riu, com vergonha de sua idiotice.
Agora que estava com seus próprios sentimentos, sendo praticamente uma experiência científica, ela não entendia mais o que sentia por Maya. Sabia que era sua mãe, mas não entendia quais eram seus sentimentos por ela.
Antes, os ancestrais de viviam dentro dela, um pedaço da alma deles dentro de um gene no corpo pequeno de uma humana ignorante; Lilith fez com que todos se fundissem em um só, transformando-a em quem deveria ser desde o início, antes daquela bagunça genética: uma nova raça.
— Eu acho que não amo ninguém — sussurrou , enquanto liberava a fumaça e amassava sua carta de suicídio, achando a ideia de se matar porque alguém morreu extremamente patética.

estacionou o Camaro em uma rodovia para que pudessem seguir a pé por uma floresta deserta por quase quarenta minutos. O céu acima de suas cabeças estava quase tão escuro quanto tudo à sua volta e os trovões a leste de sua cabeça anunciavam que a chuva logo cairia.
A casa de Pandora era diferente de como imaginou.
Era uma construção de pedras escuras consumidas por trepadeiras verdes, com uma chaminé alta que exalava fumaça preta. O gramado fora substituído por terra sem vida, escura, e a escadaria parecia tão podre que tinha receio de pisar em seus degraus, que rangiam sempre com o toque suave dos pés descalços de Lilith.
Quando chegou próxima da porta, Lilith parou. O vento gélido balançou seus cabelos, fazendo-a erguer o queixo, impaciente. Segundos depois, a madeira rangeu e a porta se abriu.
virou o rosto para poder vê-la.
Pandora parecia uma figura de deusa grega retirada de um livro de artes: com as bochechas rubras, tinha os olhos pequenos, ovais, de cor caramelo bem claros; cabelos acobreados bem encaracolados, compridos até a altura de seu umbigo; os lábios não eram tão finos, com o formato de coração; a pele parecia porcelana, de tão branca. Pandora usava um vestido salmão de aparência romana e antiga, amarrado em apenas um dos ombros.
Elas duas pareciam irmãs. Quando se viram, ambas abriram um sorriso tão pequeno, mas extremamente simbólico.
— Querida amiga... — disse ela, com a voz rouca. Passou os olhos para , que se mantinha sério, com o cenho suavemente franzido. Não tinha mais falado com pelo restante do dia. — O filho de Lúcifer... — ela demonstrou seu respeito no tom de voz, abaixando suavemente o queixo, em sinal de pequena reverência. Quando seus olhos pousaram no corpo pálido de , ela os arregalou e fechou a boca.
— Tenho perguntas para ti, minha amada amiga — apressou-se Lilith. Pandora assentiu apenas uma vez, dando um passo para trás.
A casa por dentro era um pouco mais confortável e quente. Na extrema esquerda, iluminando toda a casa, havia uma gigantesca lareira acesa, onde, ao lado, havia um sofá onde um gato preto de gigantes olhos verdes repousava, acompanhando o movimento; do outro lado, uma cozinha minúscula, apenas com um fogão à lenha com um bule de chá com água para ferver.
Pandora encostou-se à parede de pedras e franziu o cenho enquanto adentravam em sua casa, acompanhando apenas , sem piscar enquanto a analisava. Juntou as mãos na altura da cintura, mantendo o contato visual quando a amaldiçoada a encarou de volta. Acompanhou o movimento do gato, também, quando ele se levantou e começou a roçar o pelo nas pernas da garota. Pandora levantou uma das sobrancelhas, caminhando lentamente até ela.
— Diga-me, querida — ela olhou fundo em seus olhos. — Qual é o seu nome?
— ela respondeu baixo, quase sussurrando.
— E você sabe a verdade por trás da sua pele? — ela sorriu pelo canto dos lábios, tão suave que mal parecia um sorriso. , lentamente, negou com a cabeça, como uma criança. — Sabe do que se consiste o sangue que circula na sua veia? Sabe por que esse ser tão poderoso — ela virou os olhos para Lilith — quer tanto sua presença perto dele?
— Eu não sei — sentiu o nariz arder. Pandora franziu as sobrancelhas e negou com a cabeça.
— Não chore por causa dessa dúvida... Deixe os olhos fechados — ela chegou mais perto, envolvendo-a em um abraço que mal tocava seus corpos. Era como se Pandora fosse uma visão. — Se você os fecha, não sente medo, mas também não entende ou sequer sabe o que se passa ao seu redor.
mordeu os lábios, deixando os olhos abertos. Quando Pandora se afastou, tocou as mãos nos maxilares da garota, puxando seu rosto para cima. Quando encarou suas órbitas, ela sorriu.
— Querida amiga — ela se voltou para Lilith —, o que está fazendo com seu herdeiro junto a ti?
— Quero assegurar parte de minhas armas na promessa de vingança contra o Pai da Mentira — disse de forma óbvia, acariciando o pelo negro de animal de seu casaco que ia até o nu de seus pés.
— Não respondeu minha pergunta.
Lilith ficou calada.
— Ele não é o anticristo que procura — respondeu Pandora, completamente serena. virou o rosto para e, em meio à sua postura rígida e congelada, o viu franzir o cenho em dúvida.
Lilith se colocou de pé e o fogo da lareira dobrou de tamanho. Os olhos dela ficaram mais felinos e os pelos de seu corpo se arrepiaram como navalhas.
— Venho aqui como tua amiga e joga-me mentiras nos ouvidos?! — gritou, ficando ainda mais furiosa quando Pandora soltou um riso. — Como tu ousas, Pandora?! — ela esticou o indicador na direção da bruxa.
— Responda-me: com quem Lúcifer selou o Pacto do Anticristo? — Pandora virou o queixo e arqueou suavemente uma das sobrancelhas. — Com ninguém... — ela sussurrou lentamente. — Pelo menos não com alguma bruxa forte o bastante para fazê-lo ser convicto.
— Estás completamente insana! — urrou Lilith. — Tu não tens direito de inventar mentiras sobre...
— Por que o defende tanto, Lilith? — Pandora indagou, franzindo o cenho. — Todos pensam que você o odeia, mas veja só como o defende quando digo que seu plano era uma patética e completa mentira? E repito que era! — ela também gritou, dando um passo para frente. estava ainda mais tenso e conseguia sentir isso. O gato eriçou seus pelos quando o fogo quase tocou os cabelos eriçados do demônio. — Não seja completamente estúpida, minha amiga! — Pandora franziu o rosto, enojando Lilith. — Se ainda pode vencer, agarre-se à oportunidade!
Vencer? — repetiu com ironia. — Como profere esta palavra depois de dizer-me que a criatura que carrego como um fardo é apenas um demônio qualquer? — ela apontou com nojo, com a mão espalmada, para . o olhou com pena, movendo apenas os olhos, apertando os lábios em uma linha. Já ele, não se moveu ou respirou.
— Ele não é um fardo — a voz de Pandora fora suave. Ela caminhou até , que olhava fixo para a janela à sua frente, e o acariciou o rosto com extrema delicadeza. — Ele é uma pedra preciosa da qual você, querida amiga, nunca deveria se queixar — Pandora sorriu, ainda o acariciando, tocando seu ombro, seu peitoral, olhando diretamente em seus olhos. — Veja dentro desses belíssimos olhos — ela virou o queixo para Lilith, que permanecia parada, com ódio. — Essa alma que muda conforme sua presença já fora alguma vez humana. Ela é roubada, como previ... — Pandora sorriu completamente extasiada.
— Tu previste algo? — Lilith franziu o cenho, duvidando da mais nova.
— Realmente me conhece, Lilith? — ela se virou, largando . Ela não respondeu, por ser uma pergunta óbvia. — Responda-me, então. Quem sou eu?
— Tu és Pandora, a bruxa mais poderosa já existente nas três dimensões — respondeu entediada, com a voz baixa. — Tu escreveste a profecia da guerra dos três mundos e a de minha criação... — de repente, Lilith se calou e arregalou os olhos. — Disseste que da terra se criaria o homem, então da terra se criaria a mulher; que ambos seriam iguais perante a Deus, mas que ele não se submeteria a tal comparação. Não submissa a Adão, de mesma carne e mesmo osso que eu, fugi e fui caçada, denominada então demônio por juntar-me ao primeiro anjo expulso do céu, de forma que a história se deu início. A profecia dizia: “o demônio voltará ao Éden mesmo depois de expulso”... Então me transformei em serpente à ordem de Lúcifer... — Lilith olhou para o chão, abaixando o tom de voz.
— Sabe quem sou — interrompeu Pandora.
— Qual foi a profecia que escreveste agora, minha amada, amada irmã? Diga-me, diga-me, por favor! — ela se aproximou rápida de Pandora, quase se ajoelhando no chão, implorando por respostas. O sorriso que Pandora abriu fora cruel. — Conta-me! Diga-me, Pandora, por favor!
Pandora se afastou de Lilith como uma pessoa se afasta de lixo, caminhando lentamente para o fogo. A silhueta de seu corpo magro se moldou preta, então sua voz rouca soou como uma história de ninar.
— Há certos séculos, conheci uma bruxa das trevas que proferiu a sentença da alma da criança perdida nessa sala — , novamente, encarou . — Ele não deveria ser o que é hoje; sua alma foi roubada por demônios ignorantes, para o consumo irracional de seres desesperados pelo poder. Lúcifer não calculou suas outras armas, ou sequer procurou se informar com uma bruxa que não estivesse consumida pela insanidade, quando resolveu seguir os conselhos daquela que já se foi há muitos e muitos anos. Ela dizia que — Pandora se virou, olhando diretamente para —, quando dois demônios pioneiros dispersam partes iguais de suas almas dentro de uma antes humana, agora consumida pelo mal em seu estado puro, o anticristo estará formado. Mas eles estavam tão profundamente errados — ela arqueou uma das sobrancelhas, negando uma vez com a cabeça. Lilith abaixou a cabeça para o chão de madeira preta. — Três metades de alma presa em um corpo modificado sobrenaturalmente: a alma de Lilith, a alma de Lúcifer e a alma de uma pequena criança cujo nome poderia não ser — ela esticou a mão para a prole de Lilith —, e se forma uma criança roubada, um sangue roubado — enfatizando a palavra, ela arqueou instintivamente uma das sobrancelhas.
Pandora caminhou novamente até , tocando-a os cabelos e o rosto.
— Enquanto a garota, essa belíssima forma jovial de dor e sofrimento — ela sorriu docemente —, é o mais puro e simples exemplo de sangue roubado. Um sangue amaldiçoado da primeira linhagem, sem nenhuma mínima vírgula, vinculada com Eugine McGully — ela riu com a ironia. — Em tantos séculos de vida, querida amiga, nunca imaginei que fosse capaz encontrar algum sobrevivente dessa tão escassa linhagem — ela olhou para Lilith, que tinha os olhos arregalados e marejados. Quando encarou , ele tinha saído de sua rigidez, encarando a garota. estava extremamente confusa.
Pandora soltou uma risada. Ela segurou a mão da amaldiçoada, puxando-a para o sofá, sentando-se ali. O gato logo pulou no colo dela, pedindo carinho, esfregando a cabeça em sua barriga.
— Veja como as criaturas anseiam pela sua atenção — disse Pandora, encarando o gato preto. — Como pioneira, Lilith tem poderes dos quais outros demônios desconhecem — começou ela, atraindo os olhos curiosos e confusos de para seu rosto. — Tanto como embaralhar, ela pode ajustar os pensamentos de qualquer criatura, fazendo-a ir ou vir para seu lado na batalha eterna contra Lúcifer. A fazer isso com você, pressentindo seu sangue especial, mesmo amaldiçoado, diferente dos demais que já provou, fez com que eu pudesse reconhecê-la.
— Como? — sussurrou, com a foz extremamente falha.
— O seu cheiro não engana uma bruxa sábia como eu — ela sorriu, segurando suas mãos. — Todos os seus ancestrais têm um gene familiar com Eugine McGully e, quando Lilith os agrupou, tornando uma linhagem genética inteira em uma pessoa só, você se tornou a única descendente viva de Eugine. Os outros amaldiçoados do mundo têm genéticas inferiores, minha querida, extremamente inferiores à sua, porque é como se o sangue deles estivesse contaminado com várias outras genéticas, sujo com tantos outros infinitos tipos sanguíneos, e mesmo que separássemos como fizemos contigo, não seriam iguais, porque as heranças de seus ancestrais não seriam as mesmas que você carrega. Já o seu, não. É tão puro quanto a água e é virgem, vindo de Eugine. Você é a primogênita da Profecia, o segundo sangue roubado. Um sangue roubado para o bem de um ser sobrenatural. Você consegue entender? — ela franziu o cenho, mostrando-se realmente preocupada com o bombardeio de informações naquela pequena garota. , com os lábios entreabertos, assentiu, tentando assimilar tudo em uma coisa só.
— E quanto a Profecia para o meu Anticristo? O meu precioso Anticristo? — indagou Lilith, se arrastando no chão para os pés de Pandora, que a lançou um olhar piedoso, ainda segurando as mãos de .
— A junção dos corpos de dois sangues roubados dá a origem de um mal que nenhuma criatura viva ou inexistente poderia sequer um dia imaginar. Um mal que você, minha amada amiga, poderia usar ao seu favor na guerra contra seu Deus das Trevas. É uma pequena criança, como a que você gerou, que só então quando completar um ano poderá servir-lhe para algo.
Ah! Amada, amada amiga! — Lilith beijou os pés nus de Pandora. — Como posso fazê-lo nascer? Como posso tomar a alma desses dois sangues roubados?
— Você terá que fazê-los se juntarem — disse de forma óbvia. virou o rosto. — Mas, como bem sabe, uma raça tão rara não se expande, ela apenas se extingue — Lilith lançou um olhar frio para , que sequer a olhou de volta. — Como um animal, o sistema da primogênita mata todo e qualquer corpo estranho que entra em contato com seu organismo, impedindo-a de reproduzir com qualquer tipo de ser existente, seja humano ou sobrenatural.
Como, então, irmã?! — ela gritou. franziu suavemente o cenho com a insanidade de sua mãe.
O gato miou e os olhos marejados de Lilith voaram até ele.
— Acredito que seu interesse por felinos continua intacto — disse ela, acompanhando com os olhos enquanto Lilith esticava os braços e pegava o gato preto no colo, acariciando-o como se fosse a única coisa viva no universo.
— Sim — ela assentiu doentia. — Sim, ainda os admiro como se fossem diamantes — o nariz de Lilith estava vermelho pelo choro, os cílios compridos molhados por lágrimas; ela estava sentada nos calcanhares. — Uma raça rara entra em extinção se não bem cuidada — repetiu ela, para si mesma. — Em extinção...
— Você sabe o que fazer — disse Pandora, ficando de pé. — Apenas trate-os como os animais que são, apenas para você. Trate-os como felinos, pelos quais, ao menos, sente admiração.
— Claro — Lilith assentiu. — Porque realmente isso que representam agora, até de mesmo organismo.
— Eu não entendi — grunhiu , tão baixo que mal sabia se a tinham escutado. Pandora se virou de Lilith e tornou a encará-la, tocando agora seu rosto pálido e confuso.
— Animais têm uma membrana protetora que os defende de qualquer corpo estranho, matando-o antes que possa entrar em contato com o resto de seu organismo, e você herdou isso deles, por ser uma raça especial e única. Em ti, é tão fina quanto uma teia de aranha, mas tão mais poderosa e útil do que em qualquer outro animal já existente no planeta — então ela tornou a olhar para Lilith. — Criar o primogênito do inferno não será tarefa fácil, mas a profecia foi escrita. A escolhida é única, extinta, de forma que tudo se torna ainda mais perigosamente complicado. A espera pode ser longa, diferente de sua paciência — o demônio assentiu calmamente, com os olhos quase arregalados e a boca entreaberta. — Sua prole deverá se esforçar, assim como a garota. O corpo e a natureza sentem seus desejos mais profundos e trabalham juntos ao seu favor, por isso, Lilith, minha amada amiga, deseje-o como nunca desejou algo em toda sua longa vida.
— Eu já o desejo, Pandora. Eu já o desejo.

Depois de mais quarenta minutos, e estavam do lado de fora da casa de Pandora, esperando que Lilith descesse as escadas para seguirem às cegas — ao menos ela estaria cega no meio da floresta — de volta para o Camaro, para o silêncio da casa de Manhattan.
No escuro da noite, soltou uma risada, encolhendo o brilho reluzente de seus olhos. virou o corpo e o encarou.
— Por que está rindo? Isso tudo é um pesadelo horrível.
— Vamos ter uma vida sexual de leões, — ele também a encarou. — O que tem de horrível nisso?


17.

The price of evil; it hurts to know that you belong here.

estava no final da fila, com os braços abertos e os olhos cegos no breu da noite. Ela tropeçava, se equilibrando quando a costela batia na ponta de uma pedra, ou a lateral do corpo nos troncos de árvores — se não fosse pelo brilho azul que reluzia nos olhos de sempre que ele se virava para se certificar que ela continuava ali (mesmo sem necessidade, já que seus passos faziam um barulho estrondoso quando unidos com seus gemidos de dor e seus xingamentos impacientes) ou o brilho da lua minguante que adentrava a floresta pelos vãos das folhas das mais altas árvores, ela não sabia como seguiria o caminho de volta para o Camaro.
Mas ela não queria ir. Não queria gerar o anticristo, não queria fazer parte do plano demoníaco de uma criatura completamente insana como Lilith.
Ela parou de andar, mordendo a boca. Ouviu os passos silenciosos dos demônios à sua frente e olhou para os lados, procurando uma saída.
Mas, mesmo se tentasse fugir, como escaparia dela? Lilith era completamente louca e a caçaria como nunca caçou algo na vida, porque era a chave principal para aquela profecia se cumprir.
Ela molhou os lábios, olhando para o chão com certo receio, tentando contar quantas vezes escorregou e caiu. Sentiu o coração bater mais rápido com a ansiedade da ideia, que aflorava em sua cabeça; levou o dedo indicador até a boca e o mordeu, tornando a subir os olhos pela escuridão, encarando os corpos levemente distantes, que até então não notaram tal silêncio.
, então, puxou o fôlego e correu como nunca havia corrido em toda a sua vida, seguindo para o leste.
A garota fugiu! pôde ouvir, mas não olhou para trás.
Continuou correndo com todo seu fôlego, pulando as raízes, rezando para não tropeçar e cair no chão. Ela fechou as mãos em punhos e sentia o vento frio da noite cortar sua pele, empurrando os cabelos para trás. Quando ouviu um bater de asas forte acima de suas cabeças, gemeu de medo e encolheu as sobrancelhas, virando em uma árvore, arranhando a mão no tronco áspero.
Quando olhou para o céu cinza escuro, viu as gigantescas asas de Lilith e sua figura demoníaca horrenda, escutando também o urro de seu ódio.
Respirando com dificuldade, sentindo o peito e a garganta doer, ela avançou às cegas, ouvindo passos atrás. tropeçou em uma pedra, soltando uma lufada de ar enquanto apoiava as mãos em um galho podre, ouvindo-o partir e cair no chão com o peso de seu corpo. Ofegante, ela olhou para trás e sentiu fios de seu cabelo grudarem em sua boca seca. Ela podia ver o brilho safira dos olhos dele a uma distância considerável, mas as batidas das asas de Lilith pareciam mais próximas a cada segundo que ela se encontrava completamente cega.
Escorregando nas pedrinhas da terra para se pôr de pé, ela arranhou as unhas no tronco seco da árvore e voltou a correr, sentindo dor ao fazê-lo. Seu rosto se contorcia em medo e, agora, ela olhava para trás, conferindo a proximidade de , olhando, depois, para cima, em busca de Lilith.
Quando esbarrou em outro tronco grosso de árvore, soltou um grito de medo. Ela mordeu seus lábios, começando a sentir que choraria. Olhou para os lados com pressa, procurando uma saída, e encontrou uma caverna estreita, onde poderia se esconder por alguns minutos, só o tempo necessário para recuperar o fôlego.
Ela correu e se jogou no chão, esfregando o corpo, se encolhendo o máximo para caber ali. Ela segurou as panturrilhas até que seu queixo estivesse colado aos joelhos, com os olhos arregalados e a boca aberta, sem conseguir respirar de outra maneira.
Quando não corria, tudo ficava estranhamente silencioso.
Sua sobrancelha se franziu de novo e seu nariz ardeu — o choro se aproximando cada vez mais. Ela estava com medo, estava completamente apavorada. Estava sendo caçada por demônios. E eles iriam achá-la. Era só uma questão de tempo.
ouviu passos se aproximando, fazendo-a puxar o ar e arregalar os olhos, petrificando-os no chão, captando todos os mínimos movimentos da terra. Os passos eram lentos, quase como se uma pessoa admirasse a vista. Depois, ela ouviu o som de uma risada nasalada.
Uma lágrima caiu de seu rosto e ela grunhiu, encolhendo-se ainda mais na estreita caverna, sentindo as pedras pontiagudas furarem seus ombros e sua lombar.
De longe, seu campo de visão captou um par de pernas compridas cobertas por calças pretas sujas de terra e pés descalços. As mãos do homem estavam postas dentro do bolso e ele parou de andar, olhando diretamente para a caverna.
O barulho das asas de Lilith voou por cima da caverna, mas ela pareceu não saber onde estava. Ela urrou com tanta força e ódio que as pedras do chão quicaram e alguns pássaros voaram assustados. Lilith rosnou com mais força, derrubando uma árvore.
olhou de um lado para o outro, apenas com os olhos, se perguntando por que estava fazendo aquilo, por que não estava ajudando sua mãe como sempre fazia, como deveria estar fazendo. Mas permaneceu encolhida, sem se mover, ainda respirando com a boca aberta, silenciosa, com as sobrancelhas encolhidas.
Ele começou a caminhar para a estreita caverna, arrastando os pés na terra fria, se aproximando da garota.
fechou os olhos, mordendo os lábios e unhando a calça jeans, com medo.
Ela nunca havia rezado, nem ao menos sabia como fazê-lo. Antes daquela bagunça inteira acontecer de repente em sua vida, ela sequer acreditava em Deus. Mas, agora, ele era a única coisa que lhe restava.
rezou baixo, sussurrando.
O demônio se abaixou, ficando agachado, com os antebraços apoiado nos joelhos, mostrando-se sem blusa. Então, sorriu, agarrando-a com tamanha brutalidade, puxando-a com tanta força que a rasgou a pele das costas, fazendo-a gemer de dor e arregalar os olhos.
gritou de pavor quando viu quem era, fazendo Lilith e , juntos, parados no alto de uma pedra, virarem o rosto para o som agudo que vinha do oeste.

Quando conseguiu abrir os olhos, se viu presa de cabeça para baixo. Tudo girava ao seu redor, suas têmporas palpitavam e seus olhos ardiam como se houvesse fogo próximo deles, fazendo-a deixá-los encolhidos. estava com os pulsos bem apertados na altura da lombar com um tipo de arame quente, virada de costas para a porta do cativeiro — ela conseguia sentir o vento tocando-a por inteiro, empurrando seus cabelos para frente, roçando-os em seu rosto e ombros descobertos. Ela estava sem blusa, usando apenas sutiã e calça jeans. A ferida em suas costas não sangrava, mas continuava úmida, quente, fazendo-a crer que alguém a lambia constantemente.
Ela virou o pescoço em busca do demônio que a sequestrou, mas ele parecia não estar em lugar nenhum. então se sacudiu, gemendo, ofegando, tentando se livrar da corda simples que prendia seus calcanhares próximos do teto, em uma queda de um metro e sessenta. Esticou as extremidades de seus cotovelos, tentando afrouxar o arame de seus pulsos — mas aquilo só a machucou mais, fazendo-a morder os lábios conforme aplicava mais força, para tentar controlar um grito de raiva e frustração.
— Não vai soltar — disse o demônio, atrás dela. tentou virar o pescoço, mas não conseguia vê-lo. Ela se sacudiu mais. — Preferia quando você estava desmaiada — afirmou, caminhando lentamente até ela, passando por seu lado.
Os cabelos pretos estavam um pouco maiores que a última vez que se viram, desfiados na altura da ponta do nariz. Os lábios estavam mais secos, avermelhados nas rachaduras de sangue amaldiçoado que ele roubava dela, sempre que voltava a sangrar. Os olhos olivas brilhavam com mais intensidade, mais fortes e brilhantes, assim como todo o resto de seu corpo e organismo.
o olhou com ódio, sentindo a respiração descompassada por suas tentativas frustradas de se livrar dele.
— Sabe... Eu juro que senti sua falta — ele sorriu pelo canto dos lábios, olhando para baixo enquanto tornava a se aproximar dela. Presa daquela forma, o rosto de ficava próximo do quadril de Richard. Ele se agachou para poder olhá-la próximo dos lábios, então tocou, com o polegar sujo, seu queixo, fazendo um pequeno carinho. tinha o cenho levemente franzido e as sobrancelhas encolhidas, porque sabia que ele não era esperto como e iria matá-la.
Richard subiu a mão pelo resto do rosto dela, contornando seus lábios, passando os olhos por todos os contornos de sua pele suja. Então, com uma velocidade que ela não conseguiu acompanhar, a estapeou com uma força que fez seu corpo inteiro se mover para trás e para frente.
Ela gemeu, fechando os olhos, ficando com o rosto palpitante vermelho.
Richard abriu um sorriso, segurando-a as bochechas com o polegar e o indicador. Puxou-a com brutalidade e juntou suas bocas em um beijo intenso, mordendo-a o lábio inferior com força, arranhando seus dentes afiados, sugando-o para si até que o sangue saísse. Ele sorriu com prazer, ainda apertando-a.
franziu o cenho com dor, puxando o rosto e a boca.
— Fiquei descontente com meu instinto de investigador — disse ele, limpando a boca com o dedo médio, puxando o lábio inferior. — Disseram que eu ficaria louco caso nunca mais te encontrasse e acho que realmente fiquei, talvez, um pouco insano — abriu um sorriso curto e macabro, sem mostrar os dentes. — Mas o mundo é muito pequeno... — ele riu, negando com a cabeça. — E você veio até mim.
Ele se levantou, indo para trás de , que já começava a sentir uma gota quente escorrer pelo corte superficial de sua lombar. Richard passou a mão na lateral de seu corpo, acariciando-a de um modo quase gentil, tocando-a e apertando os seios, puxando-a de encontro para seu corpo. Roçou a barba por fazer na pele de sua lombar, soltando sua respiração próxima do sangue; então, bem lentamente, esticou a língua quente e a tocou, lambendo aquela linha vermelha escura. sentiu as mãos dele apertando sua pele com mais intensidade quando um arrepio de prazer e força cortou seu corpo.
Ele subiu as mãos pelo mesmo caminho de antes, virando o rosto para encará-la o corpo.
— Quando te vi pela primeira vez na Burlesque, não pensei que fosse ser alguém tão importante — sussurrou, com o hálito mais quente tocando a lateral da coxa esquerda de . Ele ficava acariciando seu corpo, descendo até o cós de sua calça jeans, até que simplesmente a desabotoou e adentrou sua mão ali. A garota piscou os olhos e respirou fundo, olhando para o chão. Sua cabeça doía como nunca. — Na verdade, como sabe, te queria longe de mim, porque te achei sem graça. Mas você é tão teimosa e insistente — ele riu, descendo a mão novamente para o rosto dela, puxando-o para que seus olhos se encontrassem.
— É um defeito horrível; ninguém gosta — disse, puxando o queixo para que ele parasse de encará-la. Richard riu de novo.
— Não, anjo, não é. Acho que é sua melhor qualidade, a persistência — ele se agachou de novo, esticando o pescoço para a clavícula saltada dela. — Agora que percebo bem — sussurrou — o seu cheiro é tão bom...
— Lilith está me caçando — disse, virando o rosto rápido. — Ela vai te matar.
— Eu sei disso... que ela está te caçando — ele sorriu de novo, encarando-a nos olhos. — Eu a vi. E como a Mãe das Trevas é linda — ele encolheu os olhos, aproximando-se novamente dela, mordendo o alto do seio, sugando rápido seu sangue.
Depois de alguns segundos, se afastou com a boca suja, rindo, escondendo-a com as costas da mão.
— Isso é tão inacreditável — ele jogou a cabeça para trás.
viu seu sangue escorrer e pingar no chão. Sua cabeça rodou e ela sabia que morreria.
Quanto tempo mais demoraria até que chegasse?

Ela havia perdido o tempo. Sua vista estava turva e o ar pesava a passar por sua garganta. Richard, diferente, parecia cada segundo mais contente e animado. Ele havia saído para caçar e, quando voltou, carregava um pedaço de fígado cru em uma das mãos, com o peito ensanguentado. mal conseguiu virar o rosto, olhando fixamente para um ponto qualquer na parede, apenas esperando que a morte chegasse de uma vez.
Richard, que já havia terminado de comer aquela carne de animal, lambendo todo o sangue que escorria em maior quantidade de . Depois, enquanto novas carreiras se criavam, ele arrancou o arame de seus pulsos e arrebentou a corda, vendo-a cair no chão como um saco de carne podre.
Ela não se moveu ou sequer respirou.
— Acho que você está morrendo — disse ele, sem muito ressentimento.
Ele a virou, encarando sua boca pálida.
— Você é tão lin... — ela rolou os olhos.
— Por que não me mata de uma vez? — indagou, virando o rosto.
— Com imenso prazer, meu amor.
Ele se abaixou, mordendo sua boca, sugando o pouco sangue que saía dali. Depois, desceu para seu pescoço, mordendo-o em um local já aberto.
ficou com os olhos abertos, olhando para o teto, com os pulsos apontados para o céu. Ficou apenas esperando, sem que nada passasse por detrás de seus olhos. Quando virou o rosto, viu o cintilante de suas cicatrizes, então não conseguiu controlar as memórias.
Lembrou-se de , então instintivamente sorriu. Não com as lembranças que ele causava, mas o futuro que Richard teria.
Ah, Deus, Lilith o destroçaria com tanto gosto, com tanta maldade, que não poderia se perdoar por não estar viva para ver.
Quando ele mordeu em um lugar que ainda não estava perfurado, ela franziu o cenho e moveu os lábios em um “au”.
Richard colocou as pernas em torno da cintura de , colocando a mão em seus pulsos, tampando suas visões de como ele seria massacrado.
Um bater de asas fez com que ele parasse, olhando para o teto. sorriu fraco, maliciosa, com os olhos quase que completamente fechados.
Lilith adentrou o cativeiro e avançou em Richard como um animal, cravando suas unhas em seus ombros, tentando arrancar seus braços fora. Seus dentes extremamente afiados iam direto ao pescoço do demônio mais novo e, quando abocanharam o osso de sua garganta, puxaram com tanta força que pareciam feitos de plástico. Mas ele estava muito mais forte graças ao sangue da amaldiçoada que, agora, estava pura, na forma original da primogênita de Eugine, muito mais forte que antes.
Ela rosnou com tanta força que o cobre das paredes tremeu. Richard respondeu com mesma intensidade, empurrando-a, expelindo seus dentes, juntando suas pernas na cintura dela, tentando se colocar por cima. Ela retirou uma das mãos cravadas no ombro dele para socar seu rosto e, depois, unhá-lo, vendo sua pele regenerar em menos de um segundo depois.
Ela gritou de raiva.
Richard expeliu suas asas e as bateu, empurrando Lilith dez centímetros de seu corpo. Com isso, conseguiu se afastar mais, pegando impulso para poder atacá-la novamente, voando por cima de seu corpo, empurrando-a para fora do cativeiro, voando juntos para o céu negro. Richard tentava abocanhar o rosto de Lilith enquanto ela facilmente o afastava de seu rosto, com as pernas presas em sua cintura, as panturrilhas entrelaçadas de modo que ele não conseguisse movê-las.
— COMO TU, CRIATURA DO INFERNO, REPUGNANTE COMO O VERME QUE TE ABORTOU, TENS CORAGEM DE ENFRENTAR-ME COM A AUDÁCIA DE ACREDITAR QUE PODES ME VENCER?
Lilith voltou a voar por cima de Richard, afundando as garras no osso de sua garganta, sentindo-o na pele de seus dedos. Puxando-o, viu os olhos do demônio mais novo virarem enquanto seu voo se tornava falho, ambos caindo para o chão. O vento empurrou os cabelos dela para trás, enquanto seu rosto se afundava em tanto ódio. Ela urrava para a noite enquanto, com força, puxava o rosto dele, junto com as pernas em seu quadril, para quebrar o pescoço e a coluna juntos.
Quando estavam bem próximos do chão e Lilith viu que o osso quase se partia, ela rosnou e o soltou, empurrando-o, batendo suas asas. Depois, o viu sangrar, tremendo enquanto virava, tocando com a ponta dos dedos o rasgo gigantesco em sua garganta, do tamanho de seu pescoço.
encarava a luta parado na porta do cativeiro. estava desmaiada no chão, deitada aos pés dele.
Lilith, batendo as asas, parada no céu, olhou para a garota quase morta, depois para o demônio ainda vivo por causa do sangue dela. Ela quase enlouqueceu de ódio, olhando para cima quando soltou um grito agudo, puxando os cabelos, quase os arrancando do couro cabeludo. As veias de seu pescoço saltaram com a força de seu grito.
A terra inteira tremeu e o céu azul escuro adquiriu um tom avermelhado para Richard e . Os olhos dela se tornaram extremamente vermelhos e as veias de seu corpo saltaram, roxas. Sua língua de cobra saiu quase cinquenta centímetros de sua boca, tão afiada que poderia partir o couro de um búfalo com extrema facilidade; todos os seus dentes cresceram afiados como os de um dragão e os fios afiados e arrepiados de seus cabelos pareciam adagas, crescendo para os lados de seu corpo como se fossem fogo; sua boca aumentou e seu nariz franziu em ódio, contorcendo seu angelical rosto em uma figura medonha de pura, pura ira.
Tu — ela esticou a garra preta para Richard, que a encarava com os olhos arregalados em medo e respeito por aquela imagem. Uma áurea vermelha, como uma névoa de fogo, rondava o corpo de Lilith. Seus escravos do inferno estavam ali, prontos para torturar a alma de Richard pela eternidade — mereces muito mais que a morte.
Os cabelos dela ficaram eriçados e, quando começou a descer como uma bala em direção a Richard, ele esticou a mão e pediu que ela parasse.
Ela cravou as garras grossas no chão, ao lado do pescoço quase degolado dele e rosnou próximo de seu rosto antes de enfiar a língua dentro de sua garganta, começando a puxar sua alma, olhando diretamente em seus olhos. Ela colocou as pernas em torno de sua cintura, sorrindo com os olhos arregalados dele, com o pavor, com sua esperança indo embora.
Conforme a alma de Richard persistia a ficar em seu corpo, agarrada como um parasita, pouco a pouco as asas dele, que batiam como um pássaro preso e afoito, começaram a desintegrar, virando pó preto; seus chifres queimaram e derreteram como aço, pingando por suas têmporas da mesma cor de seus cabelos suados.
Richard negou com a cabeça. Lilith não parou, tornando a tocar em seu pescoço, que começava a curar. Ela perfurou sua carne, abrindo-a com os dedos indicadores. Richard gemeu de dor, pedindo que ela parasse.
Verme, ser repugnante, aborto da natureza — ela disse com nojo, enquanto a língua voltava para sua boca.
— Deixe-me juntar-me a ti — disse ele, rouco, consumido em dor e medo. Lilith rasgou mais sua garganta, arrancando sua pele até a nuca. Ela a segurou como se fosse papel, puxando-a para baixo de uma vez só, indo até a metade dos ombros. Richard gritou. — Por favor! Por favor! Deixe-me ajudá-la; conheço seres que podem lhe ser úteis! — implorou.
Os passos leves que seguiram ao seu lado eram de . Lilith não o olhou, mas Richard sim.
— Sua prole — disse ele, rápido, gaguejando. — Sua prole sabe do que falo, pergunte a ele! Pergunte, por favor! Eu lhe imploro, minha rainha! — ele tremeu quando ela puxou mais de sua pele, começando a tirá-la de seus braços. Desfez-se e ela a jogou na terra, apertando os joelhos na cintura dele quando sentiu outro tremor. Lilith olhou de relance para , que apenas negou com a cabeça.
— Tu sabes a desgraça que me causaria? Tu és tão ignorante, ser infeliz! — ela cuspiu ácido no rosto dele, vendo sua pele degenerar.
Quando Lilith abaixou o tronco para morder e drenar Richard, ele contraiu os músculos, fazendo-a rir, negando com a cabeça.
— Eu faço o que quiser! Eu serei teu escravo, minha rainha!
Tu já és! — ela gritou de volta, direto no rosto dele. — Todos são escravos meus!
— Serei escravo de tua prole, então! — ele quase chorou, virando o rosto para , que elevou uma das sobrancelhas. — Só não me mate, minha rainha! Não me mate!
Lilith parou por apenas um milésimo, depois negou com a cabeça.
— O que fizeste a mim selara sua desgraça. A morte não és suficiente para ti.
— Não! — ele gritou, sentindo as garras dela no músculo de seu bíceps, agarrando-o e amassando-o entre as mãos. — Não, rainha, piedade!
Lilith mordeu o pescoço dele, ouvindo-o gritar e continuar implorando.
virou o rosto, imaginando-o como seu escravo. Viu aquele amontoado de carne preta suja de sangue demoníaco e, junto dele, o sofrimento evidente do respeito proposto por pavor.
Ele sorriu, cruzando seus braços.
— Minha mãe... — começou ele, baixo, assistindo-a comê-lo, ainda, sem parar. — Se não fosse muito para ti, gostaria de pedir que concedesse esse pedido ao demônio — Lilith parou, virando lentamente o rosto para o filho. Seu queixo estava imundo de preto.
— Como disseste? — indagou, franzindo o cenho, incrédula. — Essa desgraça arruinaria meus planos para o bem de seu organismo e tu pedes que sobreviva?! — ela gritou. — Tu deverias morrer também! Por tamanha estupidez! Não te suporto mais, ! Esta humanidade que te cerca me enoja de uma forma que não consigo suportar! — ela levantou, limpando a boca com o antebraço. — Digo a ti — ela esticou o dedo sujo de preto na direção dele. —Tu não és filho meu. Não de ser! Não podemos compartilhar a mesma alma!
Ela se virou, pulou e bateu as asas, voando para longe de onde eles estavam.
a acompanhou com os olhos, elevando o queixo, depois tornou a olhar para Richard, que respirava de boca aberta, com a pele dos ombros e pescoço completamente arrancada — que não nasceria de volta, a não ser que ele se alimentasse de virgens em menos de duas horas.
— Obrigado — disse Richard, em um sussurro.
— Não me agradeça — respondeu . — Não é dela o deleite de te matar.


Clique aqui para continuar a leitura.