Capítulo Único
A neve caía com grande velocidade em Borough of Islingto, subúrbio de Londres, fazendo com que a rua fosse rapidamente tomada por um espesso tapete branco gelado. A temperatura congelante evidenciada por esses pequenos flocos, porém, não era sequer percebida pelos ocupantes de uma singela e escondida residência localizada no número 12 do Largo Grimmauld, que servia como sede para a recém reestabelecida organização Ordem da Fênix.
Contrastando com o deprimente clima inglês, dentro do recinto havia uma calorosa comemoração. Risadas altas eram ouvidas de todos os lados, copos de cerveja amanteigada eram esvaziados com poucos goles para serem, em seguida, magicamente completados, algumas vozes se destacavam em conversas pelos seus tons um tanto mais altos do que o necessário, e encantamentos esporádicos faziam com que objetos ganhassem vida e flutuassem de um lado a outro da sala.
— Feliz Natal. – Gritou um gnomo de plástico vestido de Papai Noel depois de ser atingido por um feitiço de Fred Weasley. – FELIZ NATAL! FELIZ NATAL! FELIZ NATAL! FELIZ NATAL!
— Finite Incantatem! – Bradou a Sra. Weasley calando o boneco de vez, mas sustentando ainda um sorriso no rosto. O seu bom humor perdurara desde que soubera, naquela tarde, da melhora considerável no estado de saúde do Sr. Weasley depois do ataque eu sofreu no Ministério da Magia alguns dias antes, quando estava patrulhando corredores à serviço da Ordem da Fênix.
Não havia sequer um rosto infeliz no lugar e a ceia de Natal nunca tinha sido tão boa. Eram tempos sombrios, difíceis, mas com respiros de paz entre as estações que faziam com que aquilo que de verdade importava pudesse ser valorizado por cada bruxa e bruxo. A guerra era dura, mas naquele momento ela estava longe do consciente de todos. Tudo estava bem.
— Acho que vou me retirar. – Comentou a Sra. Weasley um tempo depois. – Não, não, vocês fiquem, não se preocupem comigo. A festa pode continuar sem mim! Comemorem.
Sra. Weasley acenou sua varinha disparando alguns feitiços, arrumando um pouco a sala, e preparou-se para sair. Caminhou devagar a cada um dos seus filhos, beijando-os na cabeça e deixando-lhes votos de boa noite, passou por Sirius e não se conteve em abraçá-lo também apesar dos desentendimentos que pudessem ter, e, por fim, chegou a Harry e Hermione, que conversavam animados no parapeito da porta.
— Obrigada você, Sra. Weasley. Eu nunca passei um Natal assim. Foi o melhor que já tive. – Disse Harry sincero, arrancando lágrimas de canto de olho da mulher.
— Ah, querido, não diga essas coisas para mim agora. Ainda estou sentimental! – Brincou e virou-se para a menina em sua frente.
— Boa noite Hermione, querida. Fico feliz que tenha vindo se unir a nós, você sabe que é da família. – Agarrou a menina em um abraço forte e deixou um beijo em sua bochecha antes de sair da sala.
Pouco a pouco os demais ocupantes foram deixando a festa para trás, primeiro Fred e Jorge, que alegavam precisar dormir para que pudessem acordar no dia seguinte com tempo suficiente para desenvolver novos produtos de sua loja antes que sua mãe os flagrasse. Depois Gina, que parecia alegre demais para conseguir aguentar mais uma hora em pé, e, por fim, Harry e Sirius, que se retiraram em conjunto aparentemente envoltos em algum assunto mais sério.
Rony olhou o ambiente a sua volta e se jogou num sofá de aparência bem antiga no meio da sala, ele estava cansado, era bem verdade, e depois de dias de angústia com o estado de saúde do seu pai, o melhor que podia fazer era tirar esse tempo para pensar em simplesmente nada.
— Parece que somos os inimigos do fim. Foi um bom Natal, a comida estava boa. – Ele comentou casualmente, vendo Hermione concordar com um sorriso de canto de rosto. – Você não vai deitar?
— Er... sim, vou daqui a pouco. – Ela respondeu olhando para o menino antes de iniciar uma caminhada pela sala. Seu olhar rapidamente encontrou o pacote que havia deixado parcialmente escondido atrás das portas de vidro de um armário, pegando-o em seguida.
— O que você tem aí? – Rony perguntou curioso e Hermione rolou os olhos achando graça.
— Por que quer saber? – Ele deu de ombros e, diante do silêncio da amiga, mudou de assunto.
— Hermione, obrigada por ter vindo para o Natal. Você tinha planos com seus pais e parecia animada com a possibilidade de andar na neve com aquelas madeiras, que nem falou.
— Esquiar. – Ela interrompeu-o para lembrar o nome. Rony não entendia como o esqui funcionava e achava maluquice que os trouxas descessem as montanhas nevadas com pranchas nos pés.
— Isso, isso aí. Bom, obrigada. Sei que não é fácil para você ficar tanto tempo assim sem voltar pra casa, você realmente não precisava e...
— Eu não poderia deixar de vir, não é? – Ela disse sorrindo fraco e sentou-se no sofá ao seu lado. — Seu pai estava machucado, todo mundo da Ordem ficou apavorado, vocês voltaram para casa fugidos de Hogwarts no meio da noite e eu não conseguia informações de como Harry e você estavam. Não tinha outro lugar que eu pudesse passar o Natal se não aqui.
Rony sorriu em resposta à menina. Ele sabia que ela falava sério, mas ele sabia também que Hermione não tinha obrigação de se preocupar com sua família, ela fazia por puro carinho. Sentiu seu coração aquecer ao pensar nisso e ao constatar que, para ele, o Natal pareceria incompleto se ela não tivesse por ali.
— Inclusive, já que mencionou, como foi o dia seguinte ao que viemos para cá? Aquela sapa velha da Umbridge deve ter explodido de raiva. Já consigo ver a cara dela se contorcendo quando percebeu que tínhamos escapado bem debaixo de seu nariz. – Rony sustentou uma expressão de prazer imaginando a cena enquanto Hermione o assistia achando graça.
— Ela ficou transtornada. Vi a Professora McGonagall discutindo com ela depois do café da manhã do dia seguinte, bom, a escola inteira viu. Elas estavam aos berros praticamente. Umbridge disse que era inadmissível que vocês tivessem saído de lá sem a sua permissão, avisou que o Ministério ia intervir e que iria trazer todos vocês de volta. Foi bem uma ameaça mas a McGonagall não deixou barato, ela respondeu que gostaria de vê-la tentar, disse que se estivesse insatisfeita que fosse pessoalmente até o St. Mungus para ver o estado do seu pai antes que abrisse a boca para reclamar de novo.
— Essa mulher é uma... eu nem sei o que dizer! Meu pai quase morreu. O que ela esperava que a gente fizesse? Tomasse café da manhã felizes e esperasse o dia do Expresso de Hogwarts nos trazer para cá? Ela é maluca.
Hermione concordou com um aceno de cabeça e suspirou alto, mudando a direção do seu olhar para a parede da sala. Muito embora eles tivessem passado as férias anteriores limpando o ambiente, parecia que a sujeira tinha sido aplicada propositalmente com cola nas superfícies (o que não deixava de ser uma opção, afinal, Sirius odiava a casa e odiava seus pais), deixando uma aparência não muito agradável no local.
— Ela me chamou em sua sala logo depois, a Umbridge. – Rony endireitou suas costas que antes estavam relaxadas e arqueou a sobrancelha. Não falou nada, mas seus olhos fixaram-se no rosto da menina como se pudessem ler a verdade de algum jeito. – Queria saber sobre vocês, o que tinha acontecido, como souberam do seu pai. Eu não consegui responder muito porque a Professora McGonagall me disse em sigilo do sonho e de como foram retirados de lá por uma chave de portal, então apenas falei que não sabia. Eu nunca a vi tão brava, Rony. Ela apontou sua varinha para mim e disse que tiraria as palavras da minha boca nem que precisasse arrancá-las.
— Hermione... – Ele falou aproximando-se e pegando nas mãos da menina, que começavam a dar sinais de desconforto ao lembrar do ocorrido.
— Está tudo bem, nada aconteceu. – Ela balançou a cabeça devagar e apertou as mãos de Rony em solidariedade, sorrindo fraco. – A Professora McGonagall chegou logo depois. Abriu a porta sem nem bater e já com a varinha empunhada, parecia furiosa também. Me puxou para trás e falou com a Umbridge num sussurro tão baixo que eu precisei me esforçar muito para entender. Disse que iria chamar o Dumbledore se eu não fosse liberada para as minhas tarefas imediatamente, a Umbridge não gostou, é claro, falou que sabia que eu estava em contato com vocês, que viria para cá nas férias de Natal.
— E então? Você veio, ela estava certa. Se ela descobrir....
— A Professora Minerva respondeu que eu estava dormindo quando tudo aconteceu e que eu encontraria meus pais, não que fosse da conta da Umbridge. Enfim, saí de lá logo depois, não as vi mais, e quando o Expresso de Hogwarts voltou eu avisei meus pais que tinha ficado na escola para estudar e vim diretamente para cá.
— Eu pensei que as coisas poderiam se complicar para você, mas não achei que aquela mulher iria tentar arrancar informações à força. – Rony disse um pouco revoltado.
— Bom, ela tentou, mas isso já está no passado. – Hermione balançou a cabeça de um lado para o outro como se pudesse tirar os pensamentos dali assim. — Não há nada que possamos fazer de qualquer maneira, e quando retornarmos à escola ela não precisa saber que eu na verdade nunca voltei para casa.
— Acho que sim. Se ao menos pudéssemos lançar uns feitiços que aprendemos na Armada de Dumbledore nela... – Ele disse pensativo. Hermione rolou os olhos, mas tinha uma feição divertida no rosto.
— Não seja bobo Rony, você seria expulso antes de conseguir tentar aparatar – isso se fosse possível em Hogwarts, claro, e se você soubesse como fazer. – O garoto deu de ombros ainda imaginando a cena. – De qualquer maneira não quero falar sobre a Umbrigde, já temos o suficiente dela na escola. Eu, na verdade, bem, primeiro, Feliz Natal.
Rony franziu a testa e parou para prestar mais atenção, um pouco confuso.
— Feliz Natal, Hermione. Achei que tinha dito mais cedo já. — Ele coçou a cabeça e sorriu.
— Você disse, me cumprimentou junto com todo mundo.
— Ah, então sim, ainda bem. – Hermione mexeu no pacote que tinha em suas mãos e atraiu o olhar de Rony para lá. – O que é que você tem aí, hein?
— Eu comprei um presente para você. De Natal, digo. Um presente de Natal. Outro. – Ela falou rapidamente com o rosto virado para a parede, sem coragem de olhar para o amigo. Sabia que Rony ia replicar que já havia ganhado uma lembrança dela como todo mundo, e sentiu um calor tomar conta de si com a certeza de que tinha corado.
Rony continuou olhando para Hermione, esperando que ela continuasse falando ou que entregasse o embrulho em sua direção.
– É simples, eu achei que fosse precisar, achei que fosse gostar. Enfim, feliz Natal, de novo. – Ela repetiu e estendeu o braço na direção dele, que rapidamente recebeu o objeto.
Rony abriu o pacote com calma, alternando a visão entre o rosto de Hermione e o que tinha em suas mãos. Não demorou muito para perceber que era um par de luvas de couro de dragão novinho em folha. Sua boca abriu com o choque e ele viu de canto de olho que sua amiga sorria um pouco encabulada. As luvas eram uma mistura de vermelha escura e preta, a costura era impecável e o menino sabia que tinha custado um bom dinheiro. Ele nunca tinha tido um par de luvas de dragão, quem dirá um par novinho em folha.
— Hermione! Você não devia ter feito isso... – Disse ainda chocado. – Você gastou uma fortuna nisso, eu tenho certeza. Você já tinha me dado a agenda...
— Não foi nada, Rony. Fico feliz que tenha gostado. – Ele balançou a cabeça afirmativamente e sorriu. — Agora que você é o goleiro do time de Quadribol vai precisar de uma dessas, o Harry disse que você não tinha...
— O Harry ajudou nisso? – Perguntou um pouco desapontado.
— Ah não. Quer dizer, eu perguntei pra ele o que te dar de Natal, mas como dei a agenda para os dois eu acredito que ele não tenha pensado que eu tinha seguido com a ideia da luva. – Hermione parou de falar e acrescentou já um pouco vermelha. Sabia que ao falar que tinha mantido tudo em segredo ela estava, indiretamente, mostrando ao menino que dava mais atenção a ele do que a qualquer outro, e ela esperava que dessa forma Rony entendesse a extensão dos sentimentos que nutria. – Eu não disse para ninguém, pensei que deveria ser uma coisa entre a gente só.
— Obrigada, Mione, de verdade. Eu não esperava. – Rony falou também corado. Então ele tinha sido o único que tinha ganhado algo da Hermione... deveria significar algo, não deveria? Ele esperava com tudo em si que si, mas não se atrevia a perguntar.
— Espero que possa usar para ajudar a Grifinória. – Ela disse simplesmente e Rony sentiu o estômago embrulhar.
— Bom, pior do que sou jogando é impossível. Ah, não me olhe assim, você sabe que não sou nenhum Wood no gol, mas presumo que com um par de luvas novas eu possa realmente me aventurar a umas defesas. – Ele piscou de brincadeira e ela riu.
Ficaram em silêncio por alguns segundos e, sentindo que as coisas não sairiam dali naquele momento, Hermione decidiu levantar. Antes que se endireitasse, porém, Rony colocou sua mão no antebraço dela, chamando a sua atenção.
— Você já vai? – Ele perguntou baixinho, como se o tom da voz fosse deixar a pergunta menos significativa.
— Eu acho que sim. Está tarde e...
— Espera um pouco, er... daqui a pouco a gente vai. – Ela concordou em silêncio e sentou-se de novo. – Eu não tenho um presente de volta para você.
— O que? Ah, não, Rony, eu não estava esperando que tivesse! Não foi com essa intenção que te dei as luvas. – Hermione disse um pouquinho na defensiva pela possibilidade dessa ideia ter passado pela cabeça do amigo.
— Eu sei que não. – Ele sorriu. – Mas agora você me deixou com essa missão de retribuir o presente de alguma maneira.
— Se você ajudar o time nesse campeonato eu já vou me sentir devidamente presenteada. Faça aqueles gritos de “Weasley é nosso rei” da Sonserina serem calados. – Ela falou confiante e Ron deu uma risadinha baixa.
— Certo, vou focar nisso então.
— É melhor você tentar mesmo, Ronald.
Eles ficaram juntos naquele sofá conversando por mais de uma hora, madrugada adentro. Entre os dois o assunto fluía naturalmente e o clima era leve, apesar da gravidade de determinadas situações.
Falaram sobre a escola, sobre os NOMs, sobre a família e sobre Harry, que estava enfrentando um período muitíssimo difícil. Falaram sobre a Ordem e o Voldemort, fizeram planos de ação para o futuro, planejaram seus próximos passos.
E, nesse vai e vem de conversas, eles não soltaram as mãos por um segundo sequer, e nem perceberam que em todos os projetos a presença deles juntos era basicamente assegurada.
O retorno à Hogwarts após as férias de final de ano foi tranquilo na medida do possível. O stress do quinto ano combinado com a volta de Voldemort e os sonhos de Harry faziam com que o dia a dia dele, de Rony e Hermione fosse imprevisível e, muitas vezes, caótico.
No entanto, em meio às incertezas do mundo real, a vida acadêmica dos três precisava continuar, e isso significava que as aulas, as tarefas de casa, a Armada de Dumbledore, o Quadribol e as obrigações de monitores precisavam também de várias horas de dedicação semanal.
A continuação do campeonato de Quadribol elevou em muito os tons das conversas entre os alunos da escola, fazendo com que lados fossem tomados em favor de suas casas em assuntos que não tinham nem mesmo relação com o esporte.
Harry tinha sido suspenso permanentemente do time, o que pareceu o fim de qualquer esperança dos grifinórios da conquista do campeonato por um longo período de tempo. No entanto, num aparente milagre, Ron parecia ter tomado para si a liderança moral do time, e surpreendeu a todos quando foi o responsável por realizar defesas impensáveis no jogo de final de temporada. Seus colegas de casa mal podiam acreditar, mas ele sabia, em seu íntimo, que tinha uma razão específica para o sucesso.
— Ron, você checou a última sala de aula pela qual passamos? – Hermione perguntou séria enquanto vasculhava os corredores à procura de alunos que estivessem fora da cama.
— Eu olhei sim, não tinha nenhum barulho lá. – Ele respondeu com a varinha empunhada e magicamente acesa.
— É claro que não teria nenhum barulho, Ronald! Você tem que olhar dentro dos lugares, não basta só esperar por algum grito ou conversas abafadas. – Ela o repreendeu e continuo com seu discurso. – O seu papel como monitor é o de pensar como os alunos que estão fazendo o que não deviam, e o de garantir que eles cumpram as regras.
— Mas eu penso como eles! – Defendeu-se rapidamente. — Eu sou um deles, nós somos na verdade. Ninguém ignorou tantas regras nessa escola como nós, Mione, sejamos sinceros.
Hermione mordeu o lábio e segurou uma risada, ela sabia que Rony tinha razão e que ela e os amigos eram, de fato, grandes quebradores de regras.
— Homenum Revelio! – Ela lançou o feitiço dentro de uma sala vazia e não recebeu nenhuma indicação de presença no lugar. – Certo, certo. Mas da próxima vez que fizermos a ronda noturna você precisa se certificar que está fazendo tudo o possível para garantir que nossos deveres de monitoria sejam feitos.
— Por que que eu vou me preocupar com me certificar de forma dupla se você sempre checa tudo no final? – Ele perguntou dando de ombros e Hermione rolou os olhos. – Tudo bem, eu vou fazer.
— Ótimo, agora vamos, acho que não tem ninguém fora da cama. Vamos voltar para a Sala Comunal. – Hermione deu as costas e iniciou uma caminhada lenta, ainda atenta ao seu redor.
Quando chegaram no corredor do retrato que daria acesso ao local, porém, Rony pegou em sua mão e segurou para trás de forma delicada num pedido silencioso para que ela esperasse.
— Er, Hermione, um minuto. – Ele falou um pouco encabulado.
— O que foi? – Ele perguntou olhando para todos os ângulos, como se pudesse achar algo de errado por lá.— Quem é?
— Não tem ninguém ali. – Rony coçou a cabeça. – Eu acho.
— O que é então, Rony? – Hermione perguntou olhando em seus olhos.
— Eu queria te dar um negócio. – O menino sentiu seu rosto esquentar e soube instantaneamente que estava corando. Agradeceu por estar noite e pela iluminação do corredor ser precária o suficiente para que essa reação passasse despercebida.
— Oh. – Respondeu Hermione parecendo curiosa e confusa.
Rony colocou as mãos dentro das vestes e pareceu procurar algum objeto dentro delas. A amiga acompanhou com o olhar os gestos dele, esperando que achasse o que quer que fosse.
— Aqui está. – Ele estendeu um broche de ouro com o símbolo da Grifinória a ela e sorriu fraco. – Para você.
Hermione examinou o objeto de boca aberta. Era lindo, e parecia ser uma peça rara. Ela não fazia ideia de onde e como Rony tinha conseguido o broche, e, mais ainda, o por que dele estar dando-o a ela.
— O que é isso? É lindo. – Disse confusa, devolvendo-o para o amigo. – Eu não posso aceitar.
— Você pode sim! – Rony reclamou. – Eu ganhei da professora McGonagall depois das minhas defesas no último jogo da Grifinória. Ela me agradeceu por ter feito a Umbridge engolir do próprio veneno e me disse que gostaria que eu ficasse com o broche como presente. Acho que era dela ou algo assim.
— Rony, eu... eu realmente não posso aceitar! Você ganhou isso, é seu! – Choramingou, mas deixou a voz permanecer firme. Ela sabia que o ato de Rony de dar um objeto de ouro a ela, qualquer que fosse a origem desse, era um grande acontecimento. Sendo o mais novo de muitos irmãos, o menino sempre herdava suas relíquias do restante da família, e certamente poderia contar nos dedos quantas vezes tinha recebido um presente de tanto valor que pudesse chamar de seu.
— Mione, eu quero que você fique com ele. É meu presente para você. – Ele disse empurrando as mãos da amiga para longe enquanto sorria a ela. – Você me deu as luvas de Natal, e eu realmente só consegui ganhar o jogo por auxílio delas.
— Isso não é verdade. – Hermione respondeu sinceramente.
— Você não estava lá, não tinha como saber. – Rony retrucou sabendo que, de fato, a amiga e Harry tinham sido levados à floresta proibida por Hagrid bem no momento em que o jogo acontecia, sendo impossibilitados de ver a partida.
— Mesmo assim! Você não ganhou só pelas luvas!
— Talvez não, mas mesmo assim, poderia ser por elas sim. Nunca vamos saber.– O menino respondeu sorrindo antes de sair andando apressado em direção ao retrato. Hermione continuou com o pequeno objeto em suas mãos. — O broche é seu e não se fala mais nisso.
Sabendo que não adiantava recusar a lembrança, ela suspirou e chamou o nome de Rony antes que ele pudesse alcançar a entrada da Sala Comunal. Ele olhou pra trás e se dirigiu mais uma vez para o lugar em que estavam conversando antes, já pronto para contra argumentar caso a amiga decidisse achar uma outra desculpa para não ficar com o presente, mas se surpreendeu ao sentir braços sendo jogados ao redor de seu pescoço.
— Obrigada, Rony. – Hermione sussurrou perto de seu ouvido, fazendo os dois estremecerem com a proximidade.
Afastaram-se um pouco encabulados, sem muita coragem de reestabelecerem qualquer contato visual. Hermione pegou o broche e prendeu-o às suas vestes, arrancando um sorriso tímido do garoto à sua frente.
— Ele ficou bom em você. – Rony comentou num tom falsamente desinteressado e ela sorriu também. Deixou seu olhar vagar pelo corredor que estavam e olhou para cima surpreendendo-se com o que encontrou quase na mesma direção de suas cabeças.
— Um visco... – Hermione comentou baixinho, mas foi o suficiente para Rony escutar. Ele levantou os olhos e viu as folhinhas crescerem devagar.
— Ele não estava aí agora há pouco. – Disse também baixinho.
Os dois fixaram os olhares um no outro, em silêncio, esperando por algum sinal para agir. Mas, eles deveriam? Os segundos passados nessa conexão direta pareceram horas para cada um deles, que apenas conseguiam sentir o coração palpitar.
— Crescem como mágica. – Hermione finalmente comentou, sem desviar o olhar do rosto de Rony.
— Sim, como mágica... – Ele respondeu desviando o rosto o suficiente para quebrar o contato visual de forma sutil. Se permanecesse ali, olhando tão de perto para a garota, poderia acabar fazendo uma besteira e talvez não fosse o momento ainda de colocar tudo à prova.
— Acho que devemos ir... entrar. – Ela disse um pouco incerta, mas quando viu a cabeça do amigo concordar comprovou para si mesma que nenhum deles tinha, ainda, coragem de dizer em voz alta o que só conseguiram mostrar com uma troca de presentes.
Iniciaram uma caminhada conjunta lenta até o retrato da mulher gorda e, ao ultrapassarem, encontraram a Sala Comunal vazia. Murmuraram um “boa noite” fraco antes de cada um entrar no quarto que lhes cabia, mas nenhum deles caiu no sono rapidamente apesar do silêncio nos dormitórios.
O visco tinha aparecido como mágica e ambos sabiam. Muito provavelmente tinha sido formado por uma daquelas magias involuntárias, que acontecem quando o sentimento ultrapassa os limites do controle do bruxo e precisa se manifestar ao redor. A dúvida, porém, antes que pudessem pegar no sono, era quem tinha sido o responsável pela mágica. Secretamente, cada um acreditava em si, esperando, porém, que estivessem errados.
Contrastando com o deprimente clima inglês, dentro do recinto havia uma calorosa comemoração. Risadas altas eram ouvidas de todos os lados, copos de cerveja amanteigada eram esvaziados com poucos goles para serem, em seguida, magicamente completados, algumas vozes se destacavam em conversas pelos seus tons um tanto mais altos do que o necessário, e encantamentos esporádicos faziam com que objetos ganhassem vida e flutuassem de um lado a outro da sala.
— Feliz Natal. – Gritou um gnomo de plástico vestido de Papai Noel depois de ser atingido por um feitiço de Fred Weasley. – FELIZ NATAL! FELIZ NATAL! FELIZ NATAL! FELIZ NATAL!
— Finite Incantatem! – Bradou a Sra. Weasley calando o boneco de vez, mas sustentando ainda um sorriso no rosto. O seu bom humor perdurara desde que soubera, naquela tarde, da melhora considerável no estado de saúde do Sr. Weasley depois do ataque eu sofreu no Ministério da Magia alguns dias antes, quando estava patrulhando corredores à serviço da Ordem da Fênix.
Não havia sequer um rosto infeliz no lugar e a ceia de Natal nunca tinha sido tão boa. Eram tempos sombrios, difíceis, mas com respiros de paz entre as estações que faziam com que aquilo que de verdade importava pudesse ser valorizado por cada bruxa e bruxo. A guerra era dura, mas naquele momento ela estava longe do consciente de todos. Tudo estava bem.
— Acho que vou me retirar. – Comentou a Sra. Weasley um tempo depois. – Não, não, vocês fiquem, não se preocupem comigo. A festa pode continuar sem mim! Comemorem.
Sra. Weasley acenou sua varinha disparando alguns feitiços, arrumando um pouco a sala, e preparou-se para sair. Caminhou devagar a cada um dos seus filhos, beijando-os na cabeça e deixando-lhes votos de boa noite, passou por Sirius e não se conteve em abraçá-lo também apesar dos desentendimentos que pudessem ter, e, por fim, chegou a Harry e Hermione, que conversavam animados no parapeito da porta.
— Obrigada você, Sra. Weasley. Eu nunca passei um Natal assim. Foi o melhor que já tive. – Disse Harry sincero, arrancando lágrimas de canto de olho da mulher.
— Ah, querido, não diga essas coisas para mim agora. Ainda estou sentimental! – Brincou e virou-se para a menina em sua frente.
— Boa noite Hermione, querida. Fico feliz que tenha vindo se unir a nós, você sabe que é da família. – Agarrou a menina em um abraço forte e deixou um beijo em sua bochecha antes de sair da sala.
Pouco a pouco os demais ocupantes foram deixando a festa para trás, primeiro Fred e Jorge, que alegavam precisar dormir para que pudessem acordar no dia seguinte com tempo suficiente para desenvolver novos produtos de sua loja antes que sua mãe os flagrasse. Depois Gina, que parecia alegre demais para conseguir aguentar mais uma hora em pé, e, por fim, Harry e Sirius, que se retiraram em conjunto aparentemente envoltos em algum assunto mais sério.
Rony olhou o ambiente a sua volta e se jogou num sofá de aparência bem antiga no meio da sala, ele estava cansado, era bem verdade, e depois de dias de angústia com o estado de saúde do seu pai, o melhor que podia fazer era tirar esse tempo para pensar em simplesmente nada.
— Parece que somos os inimigos do fim. Foi um bom Natal, a comida estava boa. – Ele comentou casualmente, vendo Hermione concordar com um sorriso de canto de rosto. – Você não vai deitar?
— Er... sim, vou daqui a pouco. – Ela respondeu olhando para o menino antes de iniciar uma caminhada pela sala. Seu olhar rapidamente encontrou o pacote que havia deixado parcialmente escondido atrás das portas de vidro de um armário, pegando-o em seguida.
— O que você tem aí? – Rony perguntou curioso e Hermione rolou os olhos achando graça.
— Por que quer saber? – Ele deu de ombros e, diante do silêncio da amiga, mudou de assunto.
— Hermione, obrigada por ter vindo para o Natal. Você tinha planos com seus pais e parecia animada com a possibilidade de andar na neve com aquelas madeiras, que nem falou.
— Esquiar. – Ela interrompeu-o para lembrar o nome. Rony não entendia como o esqui funcionava e achava maluquice que os trouxas descessem as montanhas nevadas com pranchas nos pés.
— Isso, isso aí. Bom, obrigada. Sei que não é fácil para você ficar tanto tempo assim sem voltar pra casa, você realmente não precisava e...
— Eu não poderia deixar de vir, não é? – Ela disse sorrindo fraco e sentou-se no sofá ao seu lado. — Seu pai estava machucado, todo mundo da Ordem ficou apavorado, vocês voltaram para casa fugidos de Hogwarts no meio da noite e eu não conseguia informações de como Harry e você estavam. Não tinha outro lugar que eu pudesse passar o Natal se não aqui.
Rony sorriu em resposta à menina. Ele sabia que ela falava sério, mas ele sabia também que Hermione não tinha obrigação de se preocupar com sua família, ela fazia por puro carinho. Sentiu seu coração aquecer ao pensar nisso e ao constatar que, para ele, o Natal pareceria incompleto se ela não tivesse por ali.
— Inclusive, já que mencionou, como foi o dia seguinte ao que viemos para cá? Aquela sapa velha da Umbridge deve ter explodido de raiva. Já consigo ver a cara dela se contorcendo quando percebeu que tínhamos escapado bem debaixo de seu nariz. – Rony sustentou uma expressão de prazer imaginando a cena enquanto Hermione o assistia achando graça.
— Ela ficou transtornada. Vi a Professora McGonagall discutindo com ela depois do café da manhã do dia seguinte, bom, a escola inteira viu. Elas estavam aos berros praticamente. Umbridge disse que era inadmissível que vocês tivessem saído de lá sem a sua permissão, avisou que o Ministério ia intervir e que iria trazer todos vocês de volta. Foi bem uma ameaça mas a McGonagall não deixou barato, ela respondeu que gostaria de vê-la tentar, disse que se estivesse insatisfeita que fosse pessoalmente até o St. Mungus para ver o estado do seu pai antes que abrisse a boca para reclamar de novo.
— Essa mulher é uma... eu nem sei o que dizer! Meu pai quase morreu. O que ela esperava que a gente fizesse? Tomasse café da manhã felizes e esperasse o dia do Expresso de Hogwarts nos trazer para cá? Ela é maluca.
Hermione concordou com um aceno de cabeça e suspirou alto, mudando a direção do seu olhar para a parede da sala. Muito embora eles tivessem passado as férias anteriores limpando o ambiente, parecia que a sujeira tinha sido aplicada propositalmente com cola nas superfícies (o que não deixava de ser uma opção, afinal, Sirius odiava a casa e odiava seus pais), deixando uma aparência não muito agradável no local.
— Ela me chamou em sua sala logo depois, a Umbridge. – Rony endireitou suas costas que antes estavam relaxadas e arqueou a sobrancelha. Não falou nada, mas seus olhos fixaram-se no rosto da menina como se pudessem ler a verdade de algum jeito. – Queria saber sobre vocês, o que tinha acontecido, como souberam do seu pai. Eu não consegui responder muito porque a Professora McGonagall me disse em sigilo do sonho e de como foram retirados de lá por uma chave de portal, então apenas falei que não sabia. Eu nunca a vi tão brava, Rony. Ela apontou sua varinha para mim e disse que tiraria as palavras da minha boca nem que precisasse arrancá-las.
— Hermione... – Ele falou aproximando-se e pegando nas mãos da menina, que começavam a dar sinais de desconforto ao lembrar do ocorrido.
— Está tudo bem, nada aconteceu. – Ela balançou a cabeça devagar e apertou as mãos de Rony em solidariedade, sorrindo fraco. – A Professora McGonagall chegou logo depois. Abriu a porta sem nem bater e já com a varinha empunhada, parecia furiosa também. Me puxou para trás e falou com a Umbridge num sussurro tão baixo que eu precisei me esforçar muito para entender. Disse que iria chamar o Dumbledore se eu não fosse liberada para as minhas tarefas imediatamente, a Umbridge não gostou, é claro, falou que sabia que eu estava em contato com vocês, que viria para cá nas férias de Natal.
— E então? Você veio, ela estava certa. Se ela descobrir....
— A Professora Minerva respondeu que eu estava dormindo quando tudo aconteceu e que eu encontraria meus pais, não que fosse da conta da Umbridge. Enfim, saí de lá logo depois, não as vi mais, e quando o Expresso de Hogwarts voltou eu avisei meus pais que tinha ficado na escola para estudar e vim diretamente para cá.
— Eu pensei que as coisas poderiam se complicar para você, mas não achei que aquela mulher iria tentar arrancar informações à força. – Rony disse um pouco revoltado.
— Bom, ela tentou, mas isso já está no passado. – Hermione balançou a cabeça de um lado para o outro como se pudesse tirar os pensamentos dali assim. — Não há nada que possamos fazer de qualquer maneira, e quando retornarmos à escola ela não precisa saber que eu na verdade nunca voltei para casa.
— Acho que sim. Se ao menos pudéssemos lançar uns feitiços que aprendemos na Armada de Dumbledore nela... – Ele disse pensativo. Hermione rolou os olhos, mas tinha uma feição divertida no rosto.
— Não seja bobo Rony, você seria expulso antes de conseguir tentar aparatar – isso se fosse possível em Hogwarts, claro, e se você soubesse como fazer. – O garoto deu de ombros ainda imaginando a cena. – De qualquer maneira não quero falar sobre a Umbrigde, já temos o suficiente dela na escola. Eu, na verdade, bem, primeiro, Feliz Natal.
Rony franziu a testa e parou para prestar mais atenção, um pouco confuso.
— Feliz Natal, Hermione. Achei que tinha dito mais cedo já. — Ele coçou a cabeça e sorriu.
— Você disse, me cumprimentou junto com todo mundo.
— Ah, então sim, ainda bem. – Hermione mexeu no pacote que tinha em suas mãos e atraiu o olhar de Rony para lá. – O que é que você tem aí, hein?
— Eu comprei um presente para você. De Natal, digo. Um presente de Natal. Outro. – Ela falou rapidamente com o rosto virado para a parede, sem coragem de olhar para o amigo. Sabia que Rony ia replicar que já havia ganhado uma lembrança dela como todo mundo, e sentiu um calor tomar conta de si com a certeza de que tinha corado.
Rony continuou olhando para Hermione, esperando que ela continuasse falando ou que entregasse o embrulho em sua direção.
– É simples, eu achei que fosse precisar, achei que fosse gostar. Enfim, feliz Natal, de novo. – Ela repetiu e estendeu o braço na direção dele, que rapidamente recebeu o objeto.
Rony abriu o pacote com calma, alternando a visão entre o rosto de Hermione e o que tinha em suas mãos. Não demorou muito para perceber que era um par de luvas de couro de dragão novinho em folha. Sua boca abriu com o choque e ele viu de canto de olho que sua amiga sorria um pouco encabulada. As luvas eram uma mistura de vermelha escura e preta, a costura era impecável e o menino sabia que tinha custado um bom dinheiro. Ele nunca tinha tido um par de luvas de dragão, quem dirá um par novinho em folha.
— Hermione! Você não devia ter feito isso... – Disse ainda chocado. – Você gastou uma fortuna nisso, eu tenho certeza. Você já tinha me dado a agenda...
— Não foi nada, Rony. Fico feliz que tenha gostado. – Ele balançou a cabeça afirmativamente e sorriu. — Agora que você é o goleiro do time de Quadribol vai precisar de uma dessas, o Harry disse que você não tinha...
— O Harry ajudou nisso? – Perguntou um pouco desapontado.
— Ah não. Quer dizer, eu perguntei pra ele o que te dar de Natal, mas como dei a agenda para os dois eu acredito que ele não tenha pensado que eu tinha seguido com a ideia da luva. – Hermione parou de falar e acrescentou já um pouco vermelha. Sabia que ao falar que tinha mantido tudo em segredo ela estava, indiretamente, mostrando ao menino que dava mais atenção a ele do que a qualquer outro, e ela esperava que dessa forma Rony entendesse a extensão dos sentimentos que nutria. – Eu não disse para ninguém, pensei que deveria ser uma coisa entre a gente só.
— Obrigada, Mione, de verdade. Eu não esperava. – Rony falou também corado. Então ele tinha sido o único que tinha ganhado algo da Hermione... deveria significar algo, não deveria? Ele esperava com tudo em si que si, mas não se atrevia a perguntar.
— Espero que possa usar para ajudar a Grifinória. – Ela disse simplesmente e Rony sentiu o estômago embrulhar.
— Bom, pior do que sou jogando é impossível. Ah, não me olhe assim, você sabe que não sou nenhum Wood no gol, mas presumo que com um par de luvas novas eu possa realmente me aventurar a umas defesas. – Ele piscou de brincadeira e ela riu.
Ficaram em silêncio por alguns segundos e, sentindo que as coisas não sairiam dali naquele momento, Hermione decidiu levantar. Antes que se endireitasse, porém, Rony colocou sua mão no antebraço dela, chamando a sua atenção.
— Você já vai? – Ele perguntou baixinho, como se o tom da voz fosse deixar a pergunta menos significativa.
— Eu acho que sim. Está tarde e...
— Espera um pouco, er... daqui a pouco a gente vai. – Ela concordou em silêncio e sentou-se de novo. – Eu não tenho um presente de volta para você.
— O que? Ah, não, Rony, eu não estava esperando que tivesse! Não foi com essa intenção que te dei as luvas. – Hermione disse um pouquinho na defensiva pela possibilidade dessa ideia ter passado pela cabeça do amigo.
— Eu sei que não. – Ele sorriu. – Mas agora você me deixou com essa missão de retribuir o presente de alguma maneira.
— Se você ajudar o time nesse campeonato eu já vou me sentir devidamente presenteada. Faça aqueles gritos de “Weasley é nosso rei” da Sonserina serem calados. – Ela falou confiante e Ron deu uma risadinha baixa.
— Certo, vou focar nisso então.
— É melhor você tentar mesmo, Ronald.
Eles ficaram juntos naquele sofá conversando por mais de uma hora, madrugada adentro. Entre os dois o assunto fluía naturalmente e o clima era leve, apesar da gravidade de determinadas situações.
Falaram sobre a escola, sobre os NOMs, sobre a família e sobre Harry, que estava enfrentando um período muitíssimo difícil. Falaram sobre a Ordem e o Voldemort, fizeram planos de ação para o futuro, planejaram seus próximos passos.
E, nesse vai e vem de conversas, eles não soltaram as mãos por um segundo sequer, e nem perceberam que em todos os projetos a presença deles juntos era basicamente assegurada.
O retorno à Hogwarts após as férias de final de ano foi tranquilo na medida do possível. O stress do quinto ano combinado com a volta de Voldemort e os sonhos de Harry faziam com que o dia a dia dele, de Rony e Hermione fosse imprevisível e, muitas vezes, caótico.
No entanto, em meio às incertezas do mundo real, a vida acadêmica dos três precisava continuar, e isso significava que as aulas, as tarefas de casa, a Armada de Dumbledore, o Quadribol e as obrigações de monitores precisavam também de várias horas de dedicação semanal.
A continuação do campeonato de Quadribol elevou em muito os tons das conversas entre os alunos da escola, fazendo com que lados fossem tomados em favor de suas casas em assuntos que não tinham nem mesmo relação com o esporte.
Harry tinha sido suspenso permanentemente do time, o que pareceu o fim de qualquer esperança dos grifinórios da conquista do campeonato por um longo período de tempo. No entanto, num aparente milagre, Ron parecia ter tomado para si a liderança moral do time, e surpreendeu a todos quando foi o responsável por realizar defesas impensáveis no jogo de final de temporada. Seus colegas de casa mal podiam acreditar, mas ele sabia, em seu íntimo, que tinha uma razão específica para o sucesso.
— Ron, você checou a última sala de aula pela qual passamos? – Hermione perguntou séria enquanto vasculhava os corredores à procura de alunos que estivessem fora da cama.
— Eu olhei sim, não tinha nenhum barulho lá. – Ele respondeu com a varinha empunhada e magicamente acesa.
— É claro que não teria nenhum barulho, Ronald! Você tem que olhar dentro dos lugares, não basta só esperar por algum grito ou conversas abafadas. – Ela o repreendeu e continuo com seu discurso. – O seu papel como monitor é o de pensar como os alunos que estão fazendo o que não deviam, e o de garantir que eles cumpram as regras.
— Mas eu penso como eles! – Defendeu-se rapidamente. — Eu sou um deles, nós somos na verdade. Ninguém ignorou tantas regras nessa escola como nós, Mione, sejamos sinceros.
Hermione mordeu o lábio e segurou uma risada, ela sabia que Rony tinha razão e que ela e os amigos eram, de fato, grandes quebradores de regras.
— Homenum Revelio! – Ela lançou o feitiço dentro de uma sala vazia e não recebeu nenhuma indicação de presença no lugar. – Certo, certo. Mas da próxima vez que fizermos a ronda noturna você precisa se certificar que está fazendo tudo o possível para garantir que nossos deveres de monitoria sejam feitos.
— Por que que eu vou me preocupar com me certificar de forma dupla se você sempre checa tudo no final? – Ele perguntou dando de ombros e Hermione rolou os olhos. – Tudo bem, eu vou fazer.
— Ótimo, agora vamos, acho que não tem ninguém fora da cama. Vamos voltar para a Sala Comunal. – Hermione deu as costas e iniciou uma caminhada lenta, ainda atenta ao seu redor.
Quando chegaram no corredor do retrato que daria acesso ao local, porém, Rony pegou em sua mão e segurou para trás de forma delicada num pedido silencioso para que ela esperasse.
— Er, Hermione, um minuto. – Ele falou um pouco encabulado.
— O que foi? – Ele perguntou olhando para todos os ângulos, como se pudesse achar algo de errado por lá.— Quem é?
— Não tem ninguém ali. – Rony coçou a cabeça. – Eu acho.
— O que é então, Rony? – Hermione perguntou olhando em seus olhos.
— Eu queria te dar um negócio. – O menino sentiu seu rosto esquentar e soube instantaneamente que estava corando. Agradeceu por estar noite e pela iluminação do corredor ser precária o suficiente para que essa reação passasse despercebida.
— Oh. – Respondeu Hermione parecendo curiosa e confusa.
Rony colocou as mãos dentro das vestes e pareceu procurar algum objeto dentro delas. A amiga acompanhou com o olhar os gestos dele, esperando que achasse o que quer que fosse.
— Aqui está. – Ele estendeu um broche de ouro com o símbolo da Grifinória a ela e sorriu fraco. – Para você.
Hermione examinou o objeto de boca aberta. Era lindo, e parecia ser uma peça rara. Ela não fazia ideia de onde e como Rony tinha conseguido o broche, e, mais ainda, o por que dele estar dando-o a ela.
— O que é isso? É lindo. – Disse confusa, devolvendo-o para o amigo. – Eu não posso aceitar.
— Você pode sim! – Rony reclamou. – Eu ganhei da professora McGonagall depois das minhas defesas no último jogo da Grifinória. Ela me agradeceu por ter feito a Umbridge engolir do próprio veneno e me disse que gostaria que eu ficasse com o broche como presente. Acho que era dela ou algo assim.
— Rony, eu... eu realmente não posso aceitar! Você ganhou isso, é seu! – Choramingou, mas deixou a voz permanecer firme. Ela sabia que o ato de Rony de dar um objeto de ouro a ela, qualquer que fosse a origem desse, era um grande acontecimento. Sendo o mais novo de muitos irmãos, o menino sempre herdava suas relíquias do restante da família, e certamente poderia contar nos dedos quantas vezes tinha recebido um presente de tanto valor que pudesse chamar de seu.
— Mione, eu quero que você fique com ele. É meu presente para você. – Ele disse empurrando as mãos da amiga para longe enquanto sorria a ela. – Você me deu as luvas de Natal, e eu realmente só consegui ganhar o jogo por auxílio delas.
— Isso não é verdade. – Hermione respondeu sinceramente.
— Você não estava lá, não tinha como saber. – Rony retrucou sabendo que, de fato, a amiga e Harry tinham sido levados à floresta proibida por Hagrid bem no momento em que o jogo acontecia, sendo impossibilitados de ver a partida.
— Mesmo assim! Você não ganhou só pelas luvas!
— Talvez não, mas mesmo assim, poderia ser por elas sim. Nunca vamos saber.– O menino respondeu sorrindo antes de sair andando apressado em direção ao retrato. Hermione continuou com o pequeno objeto em suas mãos. — O broche é seu e não se fala mais nisso.
Sabendo que não adiantava recusar a lembrança, ela suspirou e chamou o nome de Rony antes que ele pudesse alcançar a entrada da Sala Comunal. Ele olhou pra trás e se dirigiu mais uma vez para o lugar em que estavam conversando antes, já pronto para contra argumentar caso a amiga decidisse achar uma outra desculpa para não ficar com o presente, mas se surpreendeu ao sentir braços sendo jogados ao redor de seu pescoço.
— Obrigada, Rony. – Hermione sussurrou perto de seu ouvido, fazendo os dois estremecerem com a proximidade.
Afastaram-se um pouco encabulados, sem muita coragem de reestabelecerem qualquer contato visual. Hermione pegou o broche e prendeu-o às suas vestes, arrancando um sorriso tímido do garoto à sua frente.
— Ele ficou bom em você. – Rony comentou num tom falsamente desinteressado e ela sorriu também. Deixou seu olhar vagar pelo corredor que estavam e olhou para cima surpreendendo-se com o que encontrou quase na mesma direção de suas cabeças.
— Um visco... – Hermione comentou baixinho, mas foi o suficiente para Rony escutar. Ele levantou os olhos e viu as folhinhas crescerem devagar.
— Ele não estava aí agora há pouco. – Disse também baixinho.
Os dois fixaram os olhares um no outro, em silêncio, esperando por algum sinal para agir. Mas, eles deveriam? Os segundos passados nessa conexão direta pareceram horas para cada um deles, que apenas conseguiam sentir o coração palpitar.
— Crescem como mágica. – Hermione finalmente comentou, sem desviar o olhar do rosto de Rony.
— Sim, como mágica... – Ele respondeu desviando o rosto o suficiente para quebrar o contato visual de forma sutil. Se permanecesse ali, olhando tão de perto para a garota, poderia acabar fazendo uma besteira e talvez não fosse o momento ainda de colocar tudo à prova.
— Acho que devemos ir... entrar. – Ela disse um pouco incerta, mas quando viu a cabeça do amigo concordar comprovou para si mesma que nenhum deles tinha, ainda, coragem de dizer em voz alta o que só conseguiram mostrar com uma troca de presentes.
Iniciaram uma caminhada conjunta lenta até o retrato da mulher gorda e, ao ultrapassarem, encontraram a Sala Comunal vazia. Murmuraram um “boa noite” fraco antes de cada um entrar no quarto que lhes cabia, mas nenhum deles caiu no sono rapidamente apesar do silêncio nos dormitórios.
O visco tinha aparecido como mágica e ambos sabiam. Muito provavelmente tinha sido formado por uma daquelas magias involuntárias, que acontecem quando o sentimento ultrapassa os limites do controle do bruxo e precisa se manifestar ao redor. A dúvida, porém, antes que pudessem pegar no sono, era quem tinha sido o responsável pela mágica. Secretamente, cada um acreditava em si, esperando, porém, que estivessem errados.
Fim!
Nota da autora: sem nota
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