Capítulo Único
sunflower: the yellow flower represents friendship. Sunflowers are also beautiful symbols of loyalty, strength and adoration. And yellow brings you the warmth of the sun. And it brings you happiness. It makes you wanna hold on to that.
Eu tamborilava os pés de forma quase incômoda, mas ainda no ritmo da música. Era um hábito que simplesmente não conseguia largar. O dia estava relativamente quente, por um milagre, e o céu azul contrastava com o verde das árvores que rodeavam o bairro mais ao fim da rua. A vista ridiculamente perfeita daquela janela tirava facilmente o fôlego de qualquer um. Eu, que morava ali naquele mesmo apartamento há cinco anos, ainda não havia me acostumado. Ali, em uma das ruas mais altas, tinha-se uma visão particularmente privilegiada da cidade. Era simplesmente impossível ver São Francisco em todas aquelas cores e não derreter um pouquinho por dentro.
Janis alcançava mais uma das notas irritantemente perfeitas em Cry Baby. Levei os olhos até o vinil que eu preservava com tanto carinho e cantei o último verso junto dela, rindo da minha incrível falta de habilidade com a música. O disco havia sido um presente de despedida da minha irmã, assim como todo o meu amor por Janis Joplin, desenvolvido por culpa dela. O simples fato de eu estar ali naquela cidade era culpa dela e eu não podia nem mais ligar para dizer o quanto sentia a sua falta, não podia mais ouvir sua voz cantando desajeitada junto comigo as nossas músicas preferidas. Fazia dois meses desde que o acidente de carro mais estúpido da face da Terra havia tirado o melhor pedacinho de mim. Simples assim, como se arranca uma flor da terra.
Sequei algumas lágrimas que escorreram e soltei a fumaça, observando-a se dissipar lentamente através da fresta da janela, em direção ao céu. Fechei os olhos e imaginei que ela levava junto de si uma oração silenciosa.
Aos poucos senti meu corpo começar a relaxar e me acomodei melhor na cadeira, apagando a pequena ponta do cigarro no cinzeiro que esperava paciente na mesinha ao lado. Deixei a cabeça pender levemente para trás e meus olhos pesaram, mas tentei me manter acordada. Sabia que se dormisse seria difícil voltar. Estava bem ciente de que comecei a me perder facilmente nas últimas semanas, depois de tudo o que acontecera. Eu perdia o sono, meus compromissos, e todas as entrevistas de emprego. Perdia-me aos poucos. Não conseguia mais dar respostas ou desculpas plausíveis para meus pais, nem mesmo para minha mãe, que era uma pessoa cheia de resiliência e paciente demais. Eu sabia que eventualmente ela compreenderia o acidente como algo que simplesmente não havia como mudar, que deveria ficar no passado, mas a dor não. A minha nunca ficaria no passado. Pelo contrário, a dor que a perda de Lizzie me causara parecia aumentar cada vez mais e, em insistentes ligações, minha mãe tentou me ajudar de alguma forma. Tudo isso nas três primeiras semanas, mas depois simplesmente parei de atender e também não quis voltar pra casa. Eu não conseguia nem me sentir egoísta por não estar ao lado deles, só sabia que ficar lá, naquele mesmo ambiente, sem ela não me ajudaria em nada.
Freedom's just another word for nothin' left to lose
Liberdade é só outra palavra para nada a perder
Nothin', don't mean nothin' hon' if it ain't free, no no
Nada não significa nada, querido, se não é livre
Eu cantava baixinho e minha voz parecia muito distante dali, quase como se pertencesse a outra pessoa. Merda. Se continuasse naquele ritmo acabaria caindo no sono e só tinha mais duas horas até a próxima entrevista. Eu não pretendia, não podia perder mais aquela. Não depois que meio mundo parecia ter se movimentado pra me ajudar.
Ultimamente eu tinha a impressão de que havia entrado para algum tipo de programa de ajuda à inválidos, só que, naquele caso, eu era a inválida.
Ouvi a campainha tocar, como numa melodia muito longe, e tentei levantar a cabeça, sem sucesso. Bufei com a derrota e massageei as têmporas. Conseguia sentir uma dor de cabeça se aproximando. O som irritante soou mais uma vez pelo apartamento.
– Já vai, caralho! – gritei e me levantei de uma vez, juntando todas as minhas forças.
Senti-me um pouco tonta e segurei na parede mais próxima. Respirei fundo e fixei a porta com o olhar, dando três passos largos até ela. Segurei a maçaneta com firmeza, me xingando mentalmente pela milionésima vez por não ter escolhido um apartamento com uma merda de olho mágico na porta. Tinha bem certeza de que qualquer dia acabaria dando de cara com um maníaco qualquer, ainda não entendia como os porteiros simplesmente deixavam algumas pessoas subirem. Aquele parecia ser o único lugar na cidade em que uma insanidade daquelas acontecia.
Passei a mão pelos cabelos rapidamente, mas senti-os enroscarem em algum nó e xinguei baixinho pela tentativa fracassada de me mostrar um pouco mais apresentável para quem quer que fosse. Puxei o ar mais uma vez e então abri a porta.
Não.
Não, não, não, não. Era tudo o que meu cérebro parecia repetir.
Conseguia sentir minha boca seca e meu coração acelerado, como se tentasse expulsar as costelas do peito. Meus lábios se moveram uma, duas vezes, mas nenhum som foi ouvido. Eles observavam de cima a baixo o ser parado na minha frente, o cabelo cheio de cachos bagunçados, a camisa florida com alguns botões abertos, deixando à mostra o crucifixo sobre o peito, as tatuagens evidentes que cobriam a extensão de seus braços e uma parte descoberta do peito, a mão apoiada contra o batente da porta. Perto demais, quase onde a minha foi parar.
– My sunflower! – um único sorriso de lado.
Minha mão livre segurou com força na madeira da porta, pisquei rapidamente e tentei abrir um sorriso, mas então senti minhas pernas ficarem mais fracas e o ambiente mais escuro. A última coisa que vi foram dois olhos profundamente verdes me encarando. Ele estava ali. Harry Styles estava bem na minha frente.
– . – Senti um cutucão leve na bochecha.
Abri os olhos lentamente, torcendo para que a visão que ainda me atormentava tivesse sido provocada pelo baseado. Não. Aparentemente não. Ele parecia bem real. Seu rosto bem próximo do meu e os olhos me observando de forma preocupada. Levei um dedo à boca, mordendo-o talvez com força demais, sentindo meu coração acelerar novamente.
– Ai. Já achei que ia precisar chamar uma ambulância. – Harry levantou minha cabeça, sentou no sofá e deitou-a em seu colo. – Acho que a sua pressão baixou, . – Ele me olhava com um sorriso brincando nos lábios e acariciava meus cabelos.
– Harry. – Seu nome saiu completamente seco por entre meus lábios – O que... – Levantei de seu colo rapidamente, me jogando no canto oposto ao seu do sofá e encolhi as pernas.
Eu ainda não estava completamente certa de que ele estava ali. Poderia muito bem estar alucinando, o que seria ótimo. Mais um problema pra adicionar à minha lista. Harry me observou com um olhar curioso.
– Eu sei. Faz muito tempo, né? – Ele sorriu, culpado - Desculpa chegar assim, mas é que eu não tinha mais o seu número e sua mãe achou que se avisasse que eu viria você não ia me deixar entrar. – Óbvio? – Ainda bem que eu vim, de qualquer forma. – Ele soltou uma gargalhada e manteve o sorriso bem grande – Consegui te segurar antes que você batesse a cabeça no chão. Teria sido bem ruim acordar sozinha aqui, né?
– Sim. – Ainda tentava encontrar alguma explicação minimamente decente pra tê-lo ali no meu sofá. – Harry, você... Está fazendo o que aqui?
– Eu vou te explicar tudo, pode ser? Você quer ir para algum lugar? Talvez a gente possa conversar com mais calma.
– Acho que sim. – Mordi o lábio e me perdi por meio segundo em seus olhos. – Eu só vou tomar um banho. – Então me lembrei do motivo pelo qual deveria realmente tomar banho. – MERDA! – Levantei do sofá em um pulo e Harry me acompanhou – Que horas são?
Visualizei meu celular ao lado do cinzeiro e fui até ele, torcendo para que não fosse tarde demais. Faltavam cinco minutos para as cinco horas de tarde, o que significava que eu já estava no mínimo vinte minutos atrasada. Como duas horas tinham passado tão rápido?
– Merda! – Passei a mão pelos cabelos e olhei para Harry, que continuava parado ao lado do sofá. – Merda, merda, merda. Que merda!
– , fica calma! – Ele veio até mim e colocou uma mão em meu ombro.
– Eu tinha uma entrevista de emprego, Harry! Do outro lado da cidade! – Senti lágrimas acumuladas nos meus olhos. – Eu não podia perder mais essa. – Desabei no sofá e ele sentou pacientemente ao meu lado. – Não podia.
– Shh. – Harry passou a mão pelos meus cabelos. – A gente vai resolver isso, tá? Eu prometo! Vai ficar tudo bem. Ei, olha pra mim. Respira fundo! – Encarei seus olhos e obedeci. – Isso. Vai tomar aquele banho agora. Eu vou esperar bem aqui.
Harry abriu mais um sorriso e se ajeitou no sofá. Eu sorri de volta, levantei e fui até meu quarto. Peguei uma toalha no guarda-roupa, uma calcinha e o vestido mais soltinho que tinha. Sentia meu corpo inteiro tremer enquanto caminhava até o banheiro no final do corredor. Tinha a impressão de que poderia desmaiar mais uma vez a qualquer momento, mas dessa vez o motivo estava instalado no sofá da minha sala. Bem ali, como se fizesse parte da mobília.
Encarei meu reflexo no espelho enquanto esperava a água esquentar e, por um segundo, quase senti pena de Harry. Eu estava péssima que, na verdade, era uma palavra muito bondosa. Tinha pedacinhos de rímel grudados nas bochechas e meu cabelo parecia ter sido vítima de um ataque de pássaros furiosos. Minha roupa não estava em melhores condições.
Assim que entrei debaixo do chuveiro me senti instantaneamente melhor. Deixei que a água relaxasse meus músculos enquanto tentava clarear a mente. Havia perdido mais um emprego, isso era fato. Continuava sendo apenas uma decepção gigante para todos à minha volta e ele estava ali. Harry Styles estava no sofá da minha sala.
Harry fucking Styles, o músico mundialmente famoso. Harry Styles, meu melhor amigo de infância. Harry Styles, meu ex-namorado.
Bom, para resumir a história até aqui, preciso explicar como é que o garoto de cabelos castanhos, estupidamente lindo e com os olhos mais verdes do mundo veio parar na minha vida. Ou talvez seja melhor dizer que não me lembro de um único dia, nos meus 26 anos vivendo nesse planeta, em que ele não estivesse presente.
Eu e Harry nos conhecemos aos 4 anos de idade, da forma menos amigável possível. Ele afirma até hoje que tentei atropelá-lo com minha bicicleta amarela de rodinhas, mas eu tenho plena certeza de que Styles praticamente se jogou na minha frente enquanto Nuvens, seu pequeno cachorro descontrolado, o arrastava pelo parque. Seja como for, meu futuro melhor amigo se encontrava no chão com alguns arranhões enquanto eu, em choque, segurava minha mão, que sangrava com um corte ridículo que desde então se tornou minha cicatriz preferida.
Depois daquele dia, nossas mães não se desgrudaram mais. A amizade entre nossas famílias foi apenas crescendo e, no dia em que a casa ao lado da nossa foi colocada à venda, Harry Meu Melhor Amigo também se tornou Harry Meu Vizinho. Eu passava todas as tardes das quais consigo me lembrar na casa dele, que era ridiculamente maior que a nossa e, enquanto Harry crescia e ficava cada dia mais lindo, eu era apenas , nada muito especial, como eu costumava dizer. Meus pais eram advogados, o que sempre nos proporcionou uma vida relativamente confortável, eu não podia reclamar. De qualquer forma, aquela era a nossa vida. Eu, Harry, Nuvens, e nossos dias gastos em brincadeiras sem fim.
Foi assim durante todo o ensino fundamental e médio, dividindo experiências e crescendo. Sempre lado a lado. Sempre eu e ele. Harry foi minha primeira paixão, meu primeiro beijo e, pouco tempo depois, meu primeiro namorado. E ali do meu mundinho, eu acompanhei as épocas mais loucas da vida dele: do X Factor à formação da One Direction. Todas aquelas fãs, aquela fama e a insanidade que só uma carreira que decola rápido como a dele poderia acarretar. Assim nós terminamos nosso ciclo. Nosso pequeno universo não sobreviveu – e qual sobreviveria? – ao mundo novo que se apresentou a ele, mas terminamos em bons termos, eu diria. Em 2012 eu decidi deixar nossa cidade de vez. Precisava de uma vida nova, então simplesmente convenci meus pais que mudar de continente seria a melhor ideia. Talvez um pouco radical, mas ainda assim o que eu precisava. Minha irmã foi a primeira a concordar com tudo. Seria São Francisco, sem dúvidas.
A cidade cheia de vida e cultura abraçou a mim e à , minha melhor amiga. E ali, tão longe de casa, eu cursei a faculdade de Teatro enquanto via Harry crescer cada vez mais em beleza e talento. Eu formei e trabalhei como professora por algum tempo em uma companhia pequena, mas com potencial, tive dois relacionamentos fracassados e minha primeira demissão. Eu não tinha mais tempo para as ligações corridas, as palavras distantes embora carinhosas com Harry e, assim, nos afastamos completamente. Durante os últimos anos o contato mais próximo que eu tinha com ele se dava através de fotos em sites de fofocas. Novas namoradas, novas músicas, o fim da banda. O início da carreira solo.
E assim eu era jogada de um emprego para outro enquanto já trabalhava em uma empresa relativamente grande de marketing digital no centro da cidade e minha irmã, lá longe, havia se tornado psicóloga infantil e namorava caras que não a faziam feliz. E foi por causa de um deles que ela havia se enfiado em seu carro completamente embriagada em uma noite fria. voltou para São Francisco comigo na manhã seguinte ao enterro e aquela era a minha rotina desde então. Eu dormia pouco e fumava muito, muito mais do que gostaria de admitir, mas estava aos poucos e com a ajuda de Sheila, minha psicóloga, cuidando de todas aquelas questões. Então tudo isso basicamente me levava até ali, naquela tarde quente.
Desliguei o chuveiro, sem ter noção de quanto tempo havia passado ali dentro do banheiro. Perguntei-me se Harry ainda estaria na sala. Teria sido muito rude deixar Harry Styles tomando chá de cadeira? Provavelmente. Teria sido muito rude deixar meu ex-namorado, do qual eu não tinha notícias decentes há mais de sete anos e que havia brotado na minha casa sem aviso prévio tomando chá de cadeira? Nem um pouco. Dei de ombros e desembacei o espelho do banheiro, observando com calma o meu rosto. Sorri satisfeita ao notar que já estava muito melhor. Sequei-me e me vesti, enrolando a toalha na cabeça em seguida. Ouvi meu estômago roncar e me lembrei do almoço miserável de algumas horas atrás. Talvez nós pudéssemos sair para comer alguma coisa ali perto. Bom, na verdade eu não sabia exatamente se ele poderia sair, não sabia como as coisas funcionavam quando se é um super astro do pop com fãs enlouquecidas e câmeras te seguindo vinte e quatro horas por dia. Talvez ele não pudesse simplesmente ir comigo até o café da esquina.
Passei pelo corredor cantarolando alguma melodia aleatória e entrei no quarto, dando de cara com Harry sentado na cama.
– Olha só! – Ele sorriu de lado e seu olhar se demorou em mim por mais tempo que o normal. – Nem parece a sobrevivente do Woodstock que eu encontrei lá na sala.
Sorri e me aproximei da cama, meio sem jeito. Eu queria expulsá-lo dali, mas como? Não estava conseguindo nem reagir direito, quanto mais arrumar palavras para mandá-lo embora. Eu queria dizer que não era um bom momento, que minha vida estava uma merda e a culpa de eu ter perdido a entrevista era, em parte, dele. Sim, porque tenho bem certeza de que vê-lo parado na minha porta, depois de tanto tempo, havia ajudado meu corpo a falhar miseravelmente na missão de me manter consciente.
Sem ver outra saída mais fácil, sentei-me ao seu lado e cruzei as pernas, só então reparando que ele segurava um prato com um sanduíche. Então ele também já conhecia a minha cozinha?
– Ah. – Ele notou meu olhar e sorriu. – Eu tomei a liberdade de preparar alguma coisa pra você comer. Levei algum tempo para encontrar tudo naquela bagunça, mas acho que me saí bem! – Ele virou para a mesinha de cabeceira e pegou um copo que eu também não tinha visto. – E trouxe suco! – Ele sorriu de novo. Puta sorriso gostoso do caralho!
– Hmm. Obrigada... eu acho. – Sorri sem mostrar os dentes e tirei o prato de suas mãos.
Dei uma grande mordida no sanduíche, mastiguei rapidamente e engoli, sentindo meu estômago agradecer. Podia sentir seus olhos em mim enquanto comia e entendia sua curiosidade, afinal, eu também estava. Queria saber o que ele estava fazendo ali no meu pequeno apartamento insultando minha cozinha e me fazendo sanduíche. E queria saber, acima de tudo, como e quando diabos ele tinha ficado tão gostoso. Acho que perdi esse parágrafo na matéria da última revista.
– Então... – Ele acabou com o silêncio que, estranhamente, não era tão desconfortável. – Vamos começar pela parte onde você decidiu se jogar de cabeça numa tentativa de reviver os anos 60 ou pelo momento onde você começou a ignorar a sua mãe? – Ele sorriu e se ajeitou melhor na cama. Pronto. Então era daquilo que se tratava a visita inesperada. Eu deveria ter imaginado.
Levei alguns segundos para escolher a melhor resposta e tomei um grande gole do suco antes de continuar.
– Harry, minha mãe te mandou para cá, né? Quem mais sabe disso? A ? – perguntei, finalmente percebendo que, pelo horário, minha amiga já deveria estar em casa.
Tirei a toalha do cabelo, jogando-a numa cadeira ao lado da cama e comecei a desembaraçar os fios com os dedos. Encarei Harry mais uma vez, incisivamente.
– , me escuta. – Ele suspirou longamente e passou a mão pelos cabelos, empurrando-os para trás – Eu sei que provavelmente não sou a melhor pessoa para estar fazendo isso ou, pelo menos, não a que você queria ver agora. Também sei que não faz muito sentido eu estar aqui depois de tanto tempo. – Ele levantou um pouco os ombros. – A sua mãe me ligou há umas duas semanas e parecia muito, muito preocupada com você. Aí eu aproveitei que estava passando o final de semana em casa e fui até lá falar com ela. Nós conversamos muito, ela se abriu comigo e... – Harry olhou para as próprias mãos. – falou sobre toda a barra que você estava passando. Eu me senti tão mal, .
Harry levantou os olhos para mim, mas eu continuei em silêncio, apenas ouvindo o que ele tinha a dizer.
– Nós nunca deveríamos ter nos afastado como aconteceu, e a Lizzie, ela... ela também estava passando por uns problemas, né? Acho que eu a vi pela última vez há uns dois anos. Ela estava sempre com o consultório super cheio, realmente parecia uma profissional maravilhosa. A sua mãe disse... – A voz dele ficou embargada e eu também senti um nó na garganta. – Ela disse que as crianças a adoravam. – Harry sorriu e segurou minha mão.
Eu larguei o prato e o copo vazios no chão, ao lado da cama. Respirei fundo a fim de conter as lágrimas e sorri de volta.
– Elas adoravam, sim. – Minha voz tremeu levemente. - Está sendo tão difícil, Harry. Tão difícil sem ela. Eu não a via há mais de um ano! Sabia dos problemas que estava enfrentando com aquele babaca, chamei-a para cá mais vezes do que posso contar, mas ela estava sempre estava muito ocupada, sempre dando mais atenção para os outros do que para si mesma. E agora eu não posso fazer mais nada. – Olhei para cima e inspirei o ar profundamente, tentando me acalmar.
– Hey! – Ele acariciou as costas da minha mão com o polegar. – Não tinha nada que você pudesse fazer, . Eu sei que é foda, mas você não precisa e nem pode parar sua vida por isso. Ela iria querer te ver bem, eu tenho certeza! Ela tinha tanto orgulho de você!
– Orgulho de que, Harry? Não tem muito em mim para se orgulhar. – Puxei minha mão de volta. – Eu não consigo nem arrumar a bosta de um emprego.
– ... – Ele revirou os olhos e riu – Eu conversei com a sobre isso. – Oi? – Você tem que parar de procurar emprego em escolas de teatro beirando à falência, garota! O teu talento sempre foi estar sob os holofotes. Atuar! E não faz essa cara porque você sabe disso tão bem quanto eu! Ou será que eu vou precisar te lembrar de todas as vezes que paguei ingressos para assistir àquelas peças tuas?
E então eu ri pela primeira vez naquele dia.
– Que bom que você confia o futuro da minha carreira às peças de teatro que apresentei aos doze anos, já é muito mais do que eu estou fazendo por mim. – Harry me observava com um brilho diferente nos olhos. – Que foi?
– Tinha esquecido como é bom te ver sorrindo.
– E eu tinha me esquecido de como era bom sorrir. – Era a mais pura verdade. Os últimos meses foram tão pesados que só aquelas horas com ele já pareciam preencher um vazio de anos e agora eu me pegava, verdadeiramente e pela primeira vez em muito tempo, querendo sentir essa energia.
– Vem aqui. – Harry me puxou para mais perto.
Eu me ajeitei um pouco mais, meio desajeitada, e encostei a cabeça em seu peito. E aconchegada ali, me deixei ser atingida por uma mistura de sentimentos. Envolvi meus braços ao seu redor e me perguntei quanto do Harry que eu conheci ainda estava ali naquele homem tão diferente, tão cheio de sucesso. Seu perfume não era mais o mesmo do qual eu me lembrava, mas era ainda melhor, eu precisava admitir. O cabelo havia crescido e as roupas certamente haviam mudado.
Mesmo assim, Harry Styles, meu amigo e primeiro namorado, ainda estava em algum lugar no brilho dos seus olhos sempre tão verdes e nas covinhas daquele sorriso desgraçadamente desconcertante. Eu nunca mais havia pensado na possibilidade de voltar para aquele abraço tão conhecido, mas estar nele parecia algo muito maior do que eu merecia e muito melhor do que havia sonhado que ainda pudesse me acontecer.
Afastei-me um pouquinho e vi que Harry sorria abertamente. Deixou seus braços soltos ao lado do corpo e eu peguei uma de suas mãos entre as minhas.
– Para que tantos anéis? – Segurei uma das joias entre meus dedos e ele soltou uma breve risada nasalada.
– Tem que combinar com todo o resto desse estilo meio...
– Anos 70? – Completei.
– Tipo isso. – Ele piscou um olho, de forma marota.
– Eu gostei. – Sorri sinceramente. Já estava gostando de muitas coisas sobre ele.
Ele sorriu de volta e desviou o olhar para o local logo abaixo da minha mão. Passou a pontinha do indicador ali, de forma bem leve, me causando um arrepio gostoso. Ele observava a pequena tatuagem de girassol no meu pulso esquerdo.
– Eu fiz logo depois que voltei de lá. Depois... do funeral – respondi a pergunta antes que ele a manifestasse. – Para guardar ela em mim, de alguma forma.
– , ela é linda. – Sua voz tremeu levemente, mas ele sorria.
– Você lembra como tudo isso começou? – Nós rimos juntos. – Ela colocou o apelido em mim e uma semana depois...
– Todos os nossos amigos te chamavam de sunflower. – Harry sorriu de lado. – É uma lembrança muito linda.
Sorri de volta e suspirei. Falar sobre a Lizzie com ele era muito mais fácil, leve e bom.
– Então... Joplin, huh? – Ele mudou de assunto diante do meu silêncio.
– Mais uma lembrança dela. – Dei de ombros e ri. – Sempre foi nossa cantora preferida.
Levantei da cama e puxei Harry pela mão. Caminhamos até a sala.
– Eu gostei bastante do que você fez aqui. – Ele olhou em volta. - Quantas cores têm? – E franziu o cenho.
– Oito. – Levantei os ombros e sorri, observando as paredes pintadas com manchas aleatórias coloridas. – Não achou demais?
– Ah sim. Certamente é demais. – Cruzei os braços e levantei uma sobrancelha. Harry riu e caminhou até o aparelho de som. – Mas não para a irmã de Lizzie , a maior fã da Janis Joplin que já conheci. Achei que combinou bastante. Na verdade... – Ele parou por um momento e sorriu de lado. – Se você não tivesse desmaiado bem na minha frente eu já ia fazer uma piada sobre você estar fumando e ouvindo Janis Joplin nessa sala colorida, . Ah, e em São Francisco! Você, minha querida, virou um clichê ambulante.
– Cala a boca, Styles! – Ri e dei um soco em seu braço. – Você também não está muito longe disso. Queria saber o que suas fãs de 13 anos acham desse visual de vô.
– Hey! Nem todas têm 13 anos! E elas gostam, tudo bem? Fim de discussão. – Ele riu e tirou um disco da estante. Cheap Thrills, de 1968. – Posso?
Eu assenti, sorrindo, e ele posicionou o objeto com cuidado sobre o aparelho, soltando a agulha em um ponto específico, um ponto que eu conhecia bem demais. Uma de nossas músicas preferidas.
Play Piece of My Heart
Abri um sorriso quando as primeiras notas de Piece of My Heart se espalharam pelo ambiente. Harry sorriu e começou uma dança estranha.
– C'mon! – Ele acompanhou Janis e me puxou pela mão, me fazendo rir.
Ao juntar nossos corpos, senti meu coração batendo bem perto do seu e me permiti relaxar por um momento. Seu perfume me fazia querer passar horas ali.
Didn't I make you feel like you were the only man? Yeah
Eu não te fiz sentir como se você fosse o único homem? Sim!
And didn't I give you nearly everything that a woman possibly can?
Eu não te dei quase tudo que uma mulher possivelmente possa dar?
Honey, you know I did
Querido, você sabe que sim!
And each time I tell myself that I, well I think I've had enough
E a cada vez digo a mim mesma que eu, bem, acho que tive o bastante
But I'm gonna show you, baby, that a woman can be tough
Mas eu vou te mostrar, baby, que uma mulher pode ser durona
Movimentamos os pés em uma espécie de valsa esquisita demais e senti os dedos dele escorregarem para a minha cintura, onde fizeram uma leve pressão. Cantamos o refrão juntos, gritando a plenos pulmões e juntando nossas risadas em seguida. Meu coração estava leve ali com ele, leve demais. Era quase como se todos os problemas do mundo tivessem sumido.
You're out on the streets looking good
Você está fora, nas ruas, parecendo bem
And baby, deep down in your heart, I guess you know that it ain't right
E baby, bem dentro do seu coração, eu acho que você sabe que isso não é correto
Never, never, never, never, never, never hear me when I cry at night
Nunca, nunca, nunca, nunca, nunca me ouve quando eu choro à noite
Babe, and I cry all the time
Babe, e eu choro o tempo todo
But each time I tell myself that I, well I can't stand the pain
E a cada vez digo a mim mesma que eu, bem, não consigo suportar a dor
But when you hold me in your arms, I'll sing it once again
Mas quando você me segurar em seus braços, vou cantar mais uma vez
Harry me fez girar no mesmo lugar e me trouxe para perto de seu peito mais uma vez. Olhei em seus olhos e vi que eles diziam muitas coisas que ainda não haviam sido pronunciadas, e soube que talvez nem fosse necessário. O silêncio havia sido simplesmente estabelecido, como perdão pelos anos em que ficamos distantes. Não tínhamos mais feridas abertas, nem ressentimentos, o que havia pela frente era só muito tempo a ser recuperado e eu sabia que, de alguma forma, nós devíamos aquilo um ao outro.
Durante o solo, me permiti encostar a cabeça na curva do seu pescoço e senti seu perfume me inebriar completamente. Era melhor do que qualquer droga que eu pudesse sequer sonhar em provar. Fechei meus olhos e me lembrei de tudo o que vivemos juntos durante tantos anos, enquanto éramos apenas nós dois dançando ao som daquela mesma música na cozinha da sua casa, tanto tempo atrás. Imaginei como tudo teria sido se nunca tivéssemos nos separado, se nunca tivéssemos deixado de nos falar. Eu sabia que deveria ter sido assim.
Só agora eu conseguia sentir com clareza a falta que ele me fizera durante todos aqueles anos e seus olhos me disseram a mesma coisa quando me afastei levemente, observando seu semblante calmo. Eu vi oito anos refletidos naquelas íris brilhantes, oito longos anos de uma espera que só ali, naquele momento, parecia gritar entre nós. Nós tínhamos tanto para pôr em dia, eu tinha tanto para viver e também tive a certeza de que deveria e queria fazer aquilo. Por mim e por ela. Eu seguiria em frente pela chance que foi tirada de minha irmã.
Take it
Leve-o!
Take another little piece of my heart now, baby (whoa, break it)
Leve outro pedacinho do meu coração agora, baby!
Break another little bit of my heart, now darling, yeah, yeah, yeah, yeah (whoa, have a)
Quebre outro pedacinho do meu coração, agora querido, sim, sim, sim, sim
Have another little piece of my heart now, baby, hey
Possua outro pedacinho do meu coração agora, baby, hey
You know you got it, child, if it makes you feel good
Você sabe que pode, criança, se isso te faz sentir-se bem
Assim que as últimas notas tocaram, Harry me abraçou mais forte e então caímos no sofá. Um soluço fraquinho saiu do fundo da minha garganta, seguido de algumas lágrimas. O que eu sentia não era mais tristeza, era alívio. E como sentia meu peito muito mais leve, pude sorrir.
– Melhor agora? – Harry sorriu e secou as lágrimas com seus polegares.
– Muito melhor! – Ri e relaxei a cabeça no sofá – Eu senti falta disso – disse de olhos fechados.
– De mim? – Ele disse e me fez abrir um dos olhos só para vê-lo ostentando um sorriso convencido. – Eu sei que estou gostoso, vai. Pode admitir.
– Não cresceu só em tamanho não, né, Styles! – Eu ri. – Porque essa autoestima está poderosa! – Ele deu de ombros e sorriu.
– Que horas são? – ele disse e tirou o celular do bolso. – Deus, já são quase oito e meia! Ainda bem que hoje eu estou de folga. Falei para aquele povo todo nem me ligar, eu precisava de um tempo a sós com uma pessoinha muito especial. – Harry sorria com os lábios fechados e eu cheguei mais perto dele.
– Obrigada – disse simplesmente e olhei em seus olhos. – Não é todo mundo que tem esse poder de me tirar do fundo do poço. – Harry apenas sorriu em resposta e fez um carinho gostoso em minha bochecha.
Dez segundos depois a porta do apartamento foi escancarada e uma com os cabelos completamente desajeitados passou por ela. Seu olhar ia de Harry para mim várias vezes e então ela largou as sacolas no chão e uma grande caixa de pizza na mesinha de centro da sala.
– Harry Fucking Styles. – Sua boca formava um grande O. – Por um momento eu achei que você não fosse conseguir.
– ! – Ele se afastou um pouquinho de mim antes de levantar do sofá. – Você sabe que esse meu segundo nome aí está um pouco errado. – Abriu os braços para a minha amiga, que se aconchegou neles. – Obrigada por me dar esse tempo, deu tudo certo. – Harry olhou em minha direção e sorriu.
Eu apenas observava a cena em silêncio e então levantei, também abraçando .
– Quer dizer que eu estava certa, hein? Foi tudo um planinho de vocês dois. – Harry deu de ombros e sorriu, admitindo a culpa.
– Foi mesmo. E vi que funcionou, né? – revirou os olhos e riu. – Achei que nunca mais iria ver vocês dois juntinhos assim. Se ao menos a... – seu silêncio caiu como um tijolo sobre nós. – Bom, que bom que estamos aqui, né? – Ela sorriu de forma a consertar o erro. Eu me perguntava quando é que minha irmã deixaria de ser um tópico delicado.
– , eu fiquei imaginando... – Harry pegou as sacolas do chão e foi na direção da cozinha. Nós o seguimos. - Se tivesse sido você ao invés de mim a abrir a porta hoje e ver a desmaiar. – Ele riu e me olhou com as duas sobrancelhas bem levantadas. - Sei que você não é muito boa com primeiros socorros.
– Nem se preocupa. – Dei de ombros, olhando para a minha amiga. – Só mais um episódio envolvendo maconha e pressão baixa. Ou o almoço.
– Caralho, ! Eu já falei para você começar a comer direito. Garanto que terminou com aquela gororoba que sobrou do seu – Fez aspas gigantes no ar. – almoço de ontem, né? – Revirei os olhos e Harry riu.
– Estou viva, não estou? Me deixa ir melhorando aos poucos, poxa! – Olhei para Harry e trocamos um sorriso cúmplice. Tinha a impressão de que ambos sabíamos a importância que aquela tarde teria dali pra frente. – E também, olha só você me alimentando com pizza de novo. Não tá muito em posição de julgar, né?
riu e abriu o armário, pegando três pratos.
– Vai ficar para a pizza, né, Harry? – Fez sua melhor cara de cachorrinho perdido.
– Vou, mas não muito. Agora que a mocinha aqui está em pé e aparentemente em boas mãos – Riu e recebeu um dedo do meio de . – Eu posso ir para o hotel descansar e me preparar para amanhã.
– Se liga, meu anjo! Eu cuidei dessa garota por sete... oito anos. "Tu chegou" atrasado na festa e já quer ditar regra? – Ela riu, mas o silêncio que se seguiu foi constrangedor demais.
Harry trocou o peso do corpo de um pé para o outro e ajeitou a postura, olhando diretamente para mim.
– Fiquem frias você duas, não planejo sair da vida da nunca mais. – Harry sorriu, convencido e pude ver arregalar os olhos e segurar uma risada.
– Hmm – Pigarreei, tentando disfarçar a estranheza do momento. – O que tem amanhã, Harry? – Olhei para ele e levantei uma sobrancelha.
– Você não cont... – virou para Harry, mas foi interrompida por um olhar muito significativo vindo dele e então deu de ombros. Eu estava perdida naquela conversa. – Bom, a pizza vai esfriar. , as taças. Precisamos tomar pelo menos um vinho.
Enquanto eu pegava as taças, Harry encontrou a garrafa de vinho no local indicado por e a seguiu até a sala. Não pude deixar de sorrir um pouquinho ao ver os dois ali juntos. Sentia como se um pedacinho do meu passado estivesse se encaixando nessa minha vida que era tão diferente. E a sensação do encaixe era quentinha e confortável.
Parei perto do sofá onde Harry já estava sentado tranquilamente. Sorriu ao me ver e deu dois tapinhas no assento. Ocupei o lugar ao seu lado e ele pousou a mão sobre a minha, fazendo um carinho rápido e delicado. Agora já não era mais tão estranho ter ele ali. Por mais que eu ainda tentasse assimilar como eu tinha começado aquele dia sem grandes expectativas e agora estava ali naquela situação. Eu me sentia quase como uma vítima de uma experiência de gosto muito peculiar. Como se a vida estivesse testando novos cenários pra ver como eu me adaptava a eles. Naquele momento, o cenário era aquele. Harry Styles ali no meu sofá com um ar super despreocupado. Sua mão que tocava a minha de uma forma tão despreocupada e ao mesmo tempo tão íntima. Um toque ínfimo de pele que fazia meu coração disparar vergonhosamente.
estava ajoelhada sobre o tapete felpudo, abrindo a caixa de pizza. Ajudei Harry a servir as três taças e em pouco tempo estávamos abocanhando pedaços enormes de pizza cheia de queijo.
– Espera! – Harry disse antes que alguém bebesse. – Se é para ser assim, vamos brindar, né? - ele olhou para mim e sorriu. – Ao retorno de ao mundo dos vivos, e que ela tenha uma doce vida. – Retribuí seu sorriso e meu coração errou uma batida. E eu nem tinha começado a beber.
– À Lizzie, porque ela adoraria estar aqui – eu disse rápido, antes que pudesse ser interrompida por mim mesma. Harry e trocaram um olhar e sorriram em seguida. Concluímos o brinde.
Passamos a próxima hora mais jogando conversa fora do que qualquer outra coisa. Harry falou sobre a nova tour e sobre como o segundo álbum estava incrível. Quase morri de vergonha por admitir que não tinha acompanhado absolutamente nada sobre nenhum dos dois e contou, depois de duas taças de vinho e muita insistência da parte de Harry, ter ouvido todas as músicas, por muito tempo, longe de mim. Para não criar o caos, segundo ela. Tudo bem, eu estava ciente de que todos os nossos amigos mais próximos, incluindo a minha família, ainda mantinham contato com ele em um círculo relativamente próximo. Eu havia sido a única a me afastar completamente do mundinho Harry Styles. Então, sim, eu entendia o fato de estar sentada ali perto dele como uma grande fã e não apenas como amiga, o olhar que ela tinha sobre ele era de total admiração. Eu ficava quieta na maior parte do tempo, apenas ouvindo os comentários que ela fazia sobre uma ou outra música enquanto Harry ria satisfeito. Ao final daquelas horas, eu já estava muito curiosa e ansiosa para começar a descobrir tudo o que havia perdido.
– E é por isso... – Harry concluiu depois de um longo discurso sobre os motivos pelos quais eu deveria ouvir seu novo álbum e o anterior, diga-se de passagem. – que você vai ter a honra de escutá-lo pela primeira vez e ao vivo, querida . – Ele sorriu, orgulhoso, ajeitou a postura e bebeu o resto do vinho em sua taça. deu gritinhos animados no chão e pegou outro pedaço de pizza.
– Oi? – Eu olhei pra ele, sem entender nada. Creditei ao vinho minha súbita lerdeza.
– Ô, garota lerda! – Minha amiga revirou os olhos e deu uma mordida na pizza. – Ele vai te levar para o show. – Levantou um dedo no ar e estreitou os olhos, engolindo a pizza e continuando. – Correção, nos levar ao show.
– Ahh. – Deixei meu queixo cair levemente enquanto assimilava a informação. Olhei para os lados e dei um gole exagerado no vinho, fazendo minha cara sumir atrás da taça. Harry parou com seu pedaço de pizza a meio caminho da boca e me olhou, franzindo o cenho.
– ! – gritou, nos fazendo olhar pra ela. – Eu realmente espero que você tenha uma resposta melhor que essa!
– Harry... – Olhei pra ele e engoli em seco. – É que eu não sei. Realmente não sei nenhuma música. – Ele gargalhou.
– Mas é exatamente por isso que eu faço questão que você vá! E vocês vão. Já organizei tudo com a minha equipe. – Harry segurou meu antebraço, seus olhos pareciam tentar enxergar alguma coisa bem no fundo da minha alma. – , é sério. É mais fácil eu mesmo faltar no show do que você.
– Ah, é – eu disse, me sentindo instantaneamente nua sob o seu olhar – E aí eu vou cantar, mas tenho quase certeza de que, se isso acontecer, suas fãs vão ter que se contentar com alguns covers da Janis. Não posso fazer muito mais que isso. – Fiz um gesto displicente com a mão, ouvindo minha risada mais alta que o normal.
– Tenho certeza de que seria algo lindo de se ver, , mas amanhã você vai me ouvir cantar. Não tem desculpa. – Harry sorriu de lado e eu me perdi por alguns segundos naquela cena.
Ouvi pigarrear baixinho e puxei, meio sem jeito, meu braço que Harry ainda segurava. Seu celular vibrou sobre a mesinha de centro, esmagando o momento estranho como um martelo faria a um cubinho de gelo.
– Ah. – Harry guardou o celular no bolso e esfregou uma mão contra a outra rapidamente. – Tom está quase chegando aqui. – E Tom deveria ser seu... motorista? – Amanhã cedo eu passo melhor as informações sobre tudo o que vocês devem fazer pra chegar tranquilamente ao local do show. Ah, a propósito, informação importante... – Harry riu e levou uma mão à testa. – O show será em San Jose. Rápido, fácil e seguro. – Sorriu, olhando pra mim. – , você vai amar.
– Tenho certeza que sim - eu disse e levantei as sobrancelhas em seguida, percebendo o que havia dito. gargalhou. Uma resposta rápida assim? Óbvia demais, . Óbvia demais.
Harry sorriu e balançou a cabeça rapidamente, levantando do sofá. Repeti seu ato, puxando um pouco o vestido para baixo e passando a mão no cabelo, rapidamente. Não sabia muito bem para onde olhar ou o que fazer.
– Styles, foi ótimo te ver. – também já estava em pé e tinha estendido uma mão de forma muito solene e teatral para Harry. Ele terminou o cumprimento, me fazendo rir. – E, de novo, muito obrigada pelo convite. Só Deus sabe quando é que a gente teria dinheiro pra pagar um ingresso caríssimo daqueles. – Ela deu de ombros e Harry riu, sem jeito. Minha amiga sabia ser sincera demais quando bebia.
– Ah, vem cá, ! – ele disse seu apelido de infância e a puxou para um abraço bem apertado. – Eu sei que você me ama, apesar desses comentários ingratos.
– Amo – ela disse, dando de ombros – Agora eu vou... – Olhou fixamente pra mim – Lá para o meu quarto – disse simplesmente e sumiu corredor adentro.
E então eu estava parada ali na frente dele, sentindo os últimos efeitos do vinho. Tinha uma lista de mil coisas para dizer, mas não conseguia decidir qual seria a melhor naquele momento. Queria agradecer a ele por ter ido até ali e ter me poupado de outra tarde melancólica ou – talvez – outra entrevista fracassada. Queria agradecer mais uma vez pelo sanduíche e por todos os abraços que me deu, pela dança desajeitada na sala e por me permitir ser eu mesma de uma forma tão leve. E talvez, num mundo infinito de palavras que eu poderia usar para descrever a forma como me sentia, nenhuma delas fosse suficientemente boa.
Harry me observava, sorrindo de lado, com os dedos enfiados nos bolsos de trás da calça e se balançando devagarzinho para frente e para trás.
– Vamos, eu te levo até lá embaixo – eu disse e me encaminhei para a porta rapidamente.
Harry me seguiu em silêncio e chamou o elevador quando chegamos ao final do corredor. T, 1, 2. Eu encarava o visor que contava os andares e sentia seus olhos em mim. 3, 4, 5. Não sabia porque não conseguia olhar para ele e o silêncio entre nós agora era espesso, palpável, quase ridículo. 6, 7, 8. Suspirei aliviada quando a porta abriu e Harry sorriu, fazendo um gesto para que eu entrasse antes dele. Encostei-me à parede espelhada enquanto ele entrava e a porta fechava, nos deixando a sós ali dentro.
– . – Harry quebrou o silêncio monstruoso e se aproximou de mim. Estava simplesmente perto demais.
Deixei meu olhar percorrer o curto caminho entre sua boca e olhos, torcendo para que minhas pernas não me abandonassem naquele momento. Seu perfume parecia ter tomado conta da caixa retangular que momentaneamente nos aprisionava e meu foco parecia ir e voltar. Harry pegou uma de minhas mãos, que estavam soltas ao lado do corpo, e sorriu de lábios fechados.
– Obrigada por hoje – falamos juntos em um timing tão perfeito que, se tivesse sido ensaiado mil vezes, não teria ficado melhor. E rimos.
Quando percebi, estava envolta em seus braços, em um abraço gostoso demais. A porta do elevador abriu e nos separamos, meio sem jeito. Segurei a mão de Harry e atravessamos a pequena portaria já vazia àquela hora. Enquanto eu abria a porta de vidro, ele checava o celular.
– Tom disse que está preso no trânsito a umas cinco quadras, isso significa que tenho mais uns minutinhos aqui. – Ele me puxou para perto e passou a mão pelo meu cabelo, colocando uma mecha atrás da orelha. – Eu tenho uma... surpresa para você.
– Harry! – Eu sorri e dei um pulinho. – E o que é? – Ele arregalou os olhos e, em seguida, deu uma risada alta.
– , a ideia de surpresa é... você não saber do que se trata! – Ele me abraçou mais uma vez e beijou o topo da minha cabeça. – Espera o show.
Bufei e o apertei com mais força. Odiava surpresas, mas naquele momento estava feliz demais para contestar. Afastei-me e olhei em seus olhos, segurei suas mãos e abri minha boca uma, duas vezes. Eu não tinha mais nada pra dizer. Harry mordeu os lábios bem rápido, em um gesto quase imperceptível. Eu realmente não teria visto se não estivesse tão perto e me peguei querendo beijá-lo. Queria saber se meu coração ainda iria disparar da mesma forma boba que costumava fazer, se seus lábios ainda tinham o mesmo gosto e se ele ainda dava selinhos ao final do beijo, mas também sabia que não era certo. Não ali, não naquele momento. Eu nem sabia se ele tinha alguém ou se estava solteiro.
Sorri internamente ao perceber que o tópico "relacionamentos" não havia sido mencionado durante as horas que passamos juntos. Talvez fosse melhor daquela forma, nós ainda tínhamos muito para conhecer e reconhecer um no outro antes de tomar qualquer atitude. Por hora, era bom simplesmente já tê-lo de volta na minha vida. Só aquilo já era bom demais.
– Harry... – Fiz um carinho em seus dedos longos e quentes, entre minhas mãos. - Eu... – Olhei para os meus próprios pés, como se dali fosse sair alguma coisa inteligente para dizer.
– Eu sei – ele disse simplesmente. – Vamos deixar você ir melhorando aos poucos, lembra? – Sorriu e levantou uma sobrancelha.
Olhei para um ponto atrás dele e vi um homem alto de terno olhando em nossa direção, com um sorriso engraçado.
– Presumo que aquele seja o Tom. – Apontei, fazendo Harry olhar na mesma direção.
– E você está certa, senhorita. – Harry disse, levantando um dedo em uma imitação bem ruim de professor. Eu revirei os olhos e ri.
– Bom, boa noite, então! – eu disse e abri meus braços, me preparando para mais um abraço.
Harry, ao contrário, se aproximou e depositou um beijo em minha bochecha. Agradeci a pouca falta de luz ali ou ele teria visto meu rosto subir alguns tons na escala de vermelho.
– Boa noite, pequena ! – Ele sorriu ao se afastar.
Observei Harry descer as escadas e acenar para Tom, sumindo entre os arbustos na entrada do prédio. Depois que o carro se afastou fiquei mais alguns segundos observando a rua quase vazia. No final das contas, todas as horas que passamos juntos tinham sido até convenientes demais, provavelmente havíamos evitado muitos olhares curiosos. Sorte a minha. A última coisa que eu precisava era da minha cara estampada em algum jornal levantando especulações.
Quando voltei para o apartamento encontrei de pijama e toalha na cabeça, muito bem estabelecida no sofá. Ela abriu a boca, mas antes que falasse qualquer coisa levei um dedo até meus lábios, pedindo que ficasse quieta. Sentei-me ao seu lado, cruzando as pernas sobre o sofá e cobri meu rosto com as mãos.
– Que porra foi essa? – Finalmente olhei para ela, que explodiu em uma risada – Ah tá, ri mesmo, vai me ajudar muito a entender tudo o que aconteceu.
– Mas, ! – Ela abanava as mãos em frente ao rosto e secava algumas lágrimas, tentando parar de rir – Não tem nada para entender, o Harry veio até aqui porque eu e a sua mãe conversamos com ele sobre tudo o que estava acontecendo. Bom, na real ela falou e pediu ajuda. Eu só concordei. – Olhei pra ela, desconfiada. - É sério! Amiga, a gente achou que ele era a única solução depois que ela já tinha tentado de tudo... E olha, a gente meio que tava certa, né? Você está aí toda trelelê, saltitando.
– Primeiro, eu não estou saltitando. – Levantei um dedo para contar e revirou os olhos. – Segundo, vocês não deveriam ter feito isso pelas minhas costas, eu não estava preparada pra encontrar o Harry assim, do nada, e puta merda, ainda desmaiei na frente dele! E terceiro, por causa dessa mentirada eu perdi mais uma entrevista de emprego.
– Amiga! – Ela agarrou meus três dedos levantados no ar e baixou com força no sofá. – Nem me faça começar com essa história de emprego de novo. Se aconteceu assim, não era a hora certa. Relaxa, tá? Você tem que se dar um tempo agora, para se curar, amiga! E eu sinto que ter o Harry de novo por perto só vai fazer bem, você vai ver! Você sabe que se eu não pensasse que sim, nem estaria te falando isso. – Sorriu bem de leve. – Olha, vamos no show amanhã, tá? Vamos aproveitar esse final de semana e tirar dele o melhor proveito possível. Depois as coisas se resolvem. Sabe que eu vou estar sempre aqui para você, para sempre. – E segurou minhas mãos entre as suas. – Gostou de ter ele aqui?
– Demais! – Ri e apoiei minha testa em seu ombro. Eu nem precisava discutir sobre todo o resto, tinha esse poder incrível de me desarmar em segundos e deixar bem explícita toda a minha verdade. Era inútil tentar esconder alguma coisa dela. – Gostei demais.
riu e soltou um "eu sabia". Olhei pra ela, que tinha as duas sobrancelhas levantadas e balançava a cabeça rapidinho, incentivando-me a continuar.
– Ah. – Dei de ombros. – Foi um pouco estranho também, sei lá. Ver ele depois de tantos anos e meio assim, do nada, mas foi um choque de realidade. Eu sinto que me acordou, sabe? Para o tempo que perdi não só com ele, mas comigo mesma. E foi uma conversa tão curta, por um lado. Tivemos pouco tempo.
– Curta por quê? – franziu o cenho e deixou o queixo cair em seguida – Vocês se pegaram, né? Eu sabiaaaaaaa!
– Não! – Dei um tapa em sua cabeça e ela fez uma careta. – Não, nem pense nisso! Não rolou nada, sua doida, e nem tinha como, né? Nós somos como dois estranhos agora.
– Ah, me engana que eu gosto, ! – virou a cabeça um pouco de lado e fez uma cara de puro deboche. – Vocês podem até não saber mais sobre a vida um do outro, mas tiveram uma história, cresceram juntos e... na-mo-ra-ram!
– Aham. Em outra vida.
– Shiu! – Ela tapou minha boca com uma mão e eu revirei os olhos. – Me deixa terminar. , o Harry está solteiro, sabia? E até onde eu sei, você também. A não ser que meu novo cunhado seja um fantasma ou você esteja saindo escondida pela janela durante a noite. – riu, mas eu só tinha assimilado um pedaço do que ela havia dito.
– Ele está solteiro? – perguntei, encarando a parede atrás dela e senti um pequeno sorriso se formar em meus lábios. Merda.
– AH HÁ! – ela gritou e eu me assustei, voltando a encará-la. Senti meu rosto esquentando de vergonha. – Eu sabia! Ai, , , tão óbvios. Eu estava quase ficando sufocada com a tensão sexual que rolou nessa sala.
– Ah, , vá se foder! – eu disse e me levantei do sofá. – Não teve tensão sexual nenhuma, tá? – Estalei meus dedos da mão rapidamente - Bom... Porra! Eu não vou negar que ele está gato, caralho. – Pisquei os olhos e respirei fundo, me lembrando das cenas de mais cedo. – Muito gato, mas isso não me dá o direito de sair agarrando o garoto igual uma desesperada. Não é hora ainda. Minha vida tá meio confusa, se você não percebeu.
– Tá, diga o que quiser para se sentir melhor, mas eu acho que Harry Styles voltou para sua vida para ficar e você deveria começar a agradecer a mim e sua mãe por ter facilitado esse reencontro. Se não fosse por nós, vocês dois iam passar a vida inteira igual duas velhas teimosas fingindo que não lembram uma da outra. – Ela riu e me olhou, cruzando os braços. – E você está em pé por que, afinal de contas? Só fica em pé assim quando está discutindo, ! E a gente não vai brigar agora, não se preocupe!
Nós rimos e eu voltei para o sofá, deitando com a cabeça em seu colo. começou a fazer um cafuné e eu fechei os olhos, era muito bom tê-la ali comigo. Desde que perdemos Lizzie, ela fazia cada vez mais questão de estar ao meu lado em cada segundo quando não estava no trabalho ou em outro lugar. Eu nunca conseguiria agradecer o suficiente por tudo o que ela, praticamente sozinha, estava fazendo por mim.
– A gente vai ficar bem, tá? – Ela parou o carinho e eu abri meus olhos, vendo os seus brilhando. – Nem que eu tenha que rodar essa cidade todinha montando um palquinho para você se apresentar, vai atuar do jeitinho que sempre sonhou, . Você vai voltar a trabalhar e eu não vou te deixar na mão de jeito nenhum, estou dando conta das despesas agora e seus pais já disseram que não se importam em continuar mandando dinheiro. Você nunca, nunca vai ser um peso para ninguém, você ilumina a nossa vida, sunflower, a gente te ama demais. – Ela secou uma lágrima que eu nem tinha visto cair. – Demais, mesmo.
Puxei uma de suas mãos até meus lábios e dei um beijo curtinho, muda sob o peso das suas palavras. Meu coração estava calmo e eu sorri diante da verdade simples que se estabelecia entre nós. Ter escolhido estar ali, naquele momento, havia sido uma das minhas decisões mais acertadas. Eu queria que aquele fosse meu momento de cura e ficar entre as pessoas que me queriam bem era uma ótima forma de começar o processo. Era como ter um cobertor quentinho em um dia muito frio, era básico. Mesmo que não estivesse perto dos meus pais, eu ainda tinha minha melhor amiga e, afinal de contas, sabia que em algum momento acabaria voltando a Holmes Chapel. Eu só precisava de tempo.
– Ai, ai. Você me fez até chorar, sua praga! – Ela riu e me empurrou levemente pelos ombros. Sentei-me, ajeitando os cabelos. – Que sexta-feira tristinha, hein? Vamos ver um filme, pelo menos? Podemos matar uma garrafa de vinho! – abriu um sorriso enorme e deu um gritinho em seguida. – MEU DEUS, A GENTE VAI VER O HARRY STYLES AMANHÃ! – Deu mais um gritinho. – Se anima, caralho! Já pensou em qual roupa vai usar? Espero que aquele garoto não demore muito para passar as informações que a gente precisa para amanhã. – Levou um dedo à boca, franzindo a sobrancelha. – Eu só sei que o show é à noite e em San Jose, espero que ele não ache que a gente vai ficar rodando a cidade até encontrar o local porque se não mato ele. Meu Deus, eu estou nervosa. – Ri, olhando pra ela. – QUE FOI?
– Calma, criatura! Ele disse que ia falar com a gente amanhã, não disse? Então se acalma – falei mais para mim mesma que para ela. Precisava admitir que começava a realmente amar a ideia de ir ao show. – E não, ainda não pensei no que vou vestir, mas se tem uma coisa que a gente sabe é sobreviver em show, né, amiga? Conforto acima de tudo, o look perfeito é só um plus. – Estendi a mão e fizemos um high five. Aquele sempre havia sido nosso lema.
Levantei do sofá e estiquei os braços e as pernas, dando um longo bocejo e chequei o celular. Havia três mensagens de um número desconhecido.
– Hmm. Vai escolhendo o filme, está meio cedo ainda, né? Quase uma da manhã. – Revirei os olhos e riu. – Vou fazer uma pipoca, você quer?
– Sempre! – Ela bateu palmas, duas vezes. – Vai já!
Corri na direção da cozinha e desbloqueei a tela.
"queria ter mais tempo com você hoje" – 11PM
"meu Deus, é o Harry. Esqueci de avisar. A me passou seu número, não briga com ela ;)" – 11:01PM
"achei bem melhor, assim posso me comunicar direto com você" – 11:01PM
Mordi o lábio, ponderando sobre qual mensagem responder primeiro. Sentia meu coração bater meio descompassado.
– Pretty Woman? – Ouvi perguntar da sala.
– Uhum! – respondi de volta, sem prestar muita atenção.
"não vou brigar com ela, pode deixar!" – 11:05PM
"tudo bem, vou estar ansiosa esperando!" – 11:05PM
Escolhi simplesmente não responder a primeira mensagem, sabia que meu cérebro com sono tinha uma tendência absurda a me fazer falar merda. "Vou estar ansiosa esperando"? Merda. Bom, pelo menos agora ele sabia.
– CADÊ A PORRA DA PIPOCA, ?
– Me distraí! Desculpa! – Ri e larguei o celular sobre o balcão da cozinha, batendo com a mão na testa. – Já faço!
– É bom mesmo, ou eu vou assistir o close nas pernas da Julia Roberts pela milésima vez sozinha!
Preparei a pipoca rapidamente e com perfeição, enchi um balde grande e corri até a sala.
– Nunca mais me deixe esperando quando te chamar para ver minha crush – disse, pegando um punhado de pipoca e dando play no filme.
– Nossa crush. – A corrigi e então ficamos em silêncio.
Já tinha perdido as contas de quantas vezes havíamos assistido àquele filme, mas uma a mais era sempre bem-vinda. Fazer o quê? Obras-primas devem ser exaltadas.
Passei mais da metade do filme dividindo minha atenção entre as cenas e a mensagem de Harry que não saía da minha cabeça. Eu também desejava que tivéssemos mais tempo juntos, mas ter aquilo comprovado por suas palavras era muito mais gostoso. Sorri e me aconcheguei mais ao sofá, enroscando minhas pernas às de . Eu esperava ter algum tempo antes ou depois do show para que pudéssemos conversamos pelo menos mais um pouquinho, Harry tinha uma energia tão forte e contagiante que poucas horas perto dele já me deixaram desejando por muitas mais.
Desliguei a televisão quando o filme terminou, tentando me mexer o mínimo possível. Em algum momento, tinha deitado a cabeça em meu colo e parecia dormir tão tranquilamente que eu não queria acordá-la. Tirei alguns fios de cabelo de seu rosto, então ela piscou algumas vezes e sorriu, abrindo os olhos.
– Ah, eu não queria te acordar! Você estava dormindo tão bonitinha.
– Agora já era, vai ter que me carregar até a minha cama. – Ela sorriu, convencida e cruzou os braços.
– Amiga, acho que vou seguir o exemplo da Vivian. – levantou uma sobrancelha, me olhando bem séria. – Deu certo para ela, né?
– Que parte deu certo? – Ela riu e virou um pouco a cabeça no meu colo. – Você quer vender esse corpinho? Ou achar um Richard Gere? Se for isso, eu posso ser o seu Richard Gere. Na verdade eu já sou, né? Tirando a parte do relacionamento amoroso, eu te sustento quase cem por cento. – Ela riu e eu dei um tapa em seu braço. – Bom, tirando a parte do sexo, na verdade, né? Porque amar, você já me ama.
– Cala a boca, ! Eu estou falando sério. – Cruzei os braços e seu sorriso foi sumindo aos poucos.
– Ah, amiga. Nossa, eu não sei nem o que dizer. – Ela levou uma das mãos à boca, mordendo a lateral nervosamente. – Você sabe que eu vou te apoiar sempre, acho uma escolha um pouco radical, mas vou te apoiar. – Segurou minha mão, que estava apoiada em sua barriga.
Eu não aguentei segurar mais o riso e joguei a cabeça pra trás, gargalhando.
– Que foi? Você estava me zoando, né? – se soltou das minhas mãos e levantou do meu colo bem rápido. – Ah, , que merda! Eu estava aqui toda assustada já, tentando te entender! – Jogou uma almofada bem na minha cara, me fazendo rir mais ainda.
– Calma, meu Deus! Volta aqui! – Puxei uma de suas mãos e ela sentou no sofá. – Foi bonitinho, vai. – Eu ri e ela me empurrou um pouco para o lado, revirando os olhos.
– Vamos dormir, eu estou morta. – Esfreguei os olhos e então me lembrei de um detalhe não tão pequeno. – ... – Ela olhou pra mim, à contragosto. – Como é que a gente vai até lá amanhã?
– Já resolvi essa parte. – Ela sorriu de lado e jogou os cabelos pra trás. – No fim das contas, foi bom ter mantido contato com o Carlos.
– Carlos? Aquele...? – Seu sorriso cresceu um pouco mais. – Nossa, amiga.
– Quê? – Ela riu. – Ele não é um poço de beleza, mas tem carro. – Deu de ombros.
– Beleza? Se fosse só a falta de beleza. Nem acredito que você conseguiu sair mais de duas vezes com ele.
– Ai, , me deixa! Eu também sei que ele não presta, mas e aí? Não pretendo ter mais nada com ele, só precisamos do carro amanhã, depois eu dou tchau. – Ela jogou um beijinho no ar, na direção da parede. – Ele emprestou de muito bom grado, vai até trazer aqui amanhã!
– Genial! – Ri e me levantei do sofá. – Vou começar a te incentivar a comprar um carro.
me seguiu até o banheiro e parou no batente da porta.
– Privacidade? – Levantei uma sobrancelha e ela riu.
– Já estou indo, chata. Dorme bem! – Ela pareceu se lembrar de algo. – Ah, eu passei o seu número pro Harry. – Fez uma cara culpada.
– Eu sei. – Dei de ombros enquanto pegava a escova de dente e ela arregalou os olhos.
– Ele já te mandou nude? Ou você mandou? – Sorriu de forma pervertida.
– Ele vai falar comigo amanhã cedo, só isso! – pareceu um pouco decepcionada e eu ri. – Agora sai daqui!
– Boa noite, ingrata! – Ela mostrou a língua e fechou a porta.
Depois de escovar os dentes e lavar o rosto, fui até o quarto, me jogando na cama. Sentia como se tivesse vivido um mês inteiro em um dia, meus olhos estavam pesados por conta do sono e as cenas passavam como flashes muito rápidos em minha cabeça, Harry parado na porta do apartamento, ele me acordando no sofá e... – virei um pouco para o lado, encarando o cantinho vazio na colcha floral. – Harry sentado bem ali, na minha cama, com um sorriso todo educadinho, segurando o sanduíche. Agora que estava finalmente sozinha eu conseguia sentir com ainda mais intensidade a falta que ele já fazia e era ridículo me sentir assim de uma hora para a outra, mas já estava ansiosa demais para vê-lo no dia seguinte e ouvi-lo cantando. Como eu sentia falta!
Eu sabia muito bem que com o passar do tempo, depois de deixar a cidade onde crescemos juntos, acabaria enterrando bem no fundo do cérebro todas as lembranças com ele, aquelas que continham sua voz rouca cantando minhas músicas preferidas, mas que agora pareciam fantasmas deitados ao meu lado. Peguei meu celular e decidi enviar uma mensagem para a minha mãe, só queria dizer que Harry tinha ido até ali, mas nós poderíamos talvez conversar melhor na manhã seguinte. Duvidava que, de qualquer forma, conseguisse trocar mais que três palavras com ela. Eu estava muito cansada.
Troquei o vestido por uma camiseta larga, puxei as cobertas e me enfiei rapidinho ali embaixo, esperando que meu corpo aquecesse. Busquei o nome de minha mãe entre a lista de conversas e, no meio do caminho, encontrei a pequena foto de perfil de Harry. Ele sorria e olhava pra baixo, fazendo várias ruguinhas se formarem debaixo dos seus olhos, bem como as duas covinhas no sorriso. Ampliei a foto, passei o dedo por ela devagarzinho e ri, me sentindo extremamente boba. Voltei até a conversa com minha mãe.
"mãe" – 3:30AM
"preciso falar com você" – 3:31AM
Bloqueei o aparelho, largando-o no outro canto da cama, e estiquei a mão com esforço até o interruptor, deixando o quarto completamente escuro. E apaguei.
***
– ! – Acordei com o grito da minha mãe.
Pisquei algumas vezes até identificar os elementos presentes na cena. estava deitada ao meu lado, segurando meu celular que mostrava minha mãe descabelada.
– Está vendo, tia? Ela estava dormindo toooooda despreocupada aqui, sem nem pensar em como você estava.
Apoiei-me em um cotovelo e esfreguei os olhos, sem saber para quem olhar.
– Hmm, bom dia? – Encarei , que tinha um olhar de falsa inocência. – Bom dia, mãe! – Olhei para o celular. – Que lugar é esse?
– Oi, filha! Como assim "que lugar é esse"? – Ela mexeu o celular, se ajeitando na frente de uma parede branca com alguns quadros com motivos praianos. – É a nossa casa.
– Nossa casa não tem quadros assim, mãe. – Revirei os olhos.
– Eu comprei, ontem. – Ela sorriu e deu de ombros, encerrando o assunto. – Por que não respondeu minhas mensagens? Fiquei preocupada, era tão tarde. – Ela parecia um pouco triste e meu peito pesou, cheio de culpa.
– Ai! Perdão, mãe, eu estava super cansada. Acabei dormindo cinco segundos depois que te enviei as mensagens.
– Tudo bem, a foi aí te acordar e viu que eu estava te ligando. – Sorri, finalmente compreendendo a confusão.
– Bom, eu só queria te contar que o Harry ve...
– OI, FILHA! – Meu pai surgiu na tela e empurrou minha mãe um pouco para o lado, que reclamou.
Eu troquei um olhar com e começamos a rir.
– Estou com tantas saudades de vocês dois! – eu disse ao ver meu pai abraçar minha mãe de lado. Senti lágrimas se acumularem nos meus olhos.
– Também estamos, filha! Morrendo de saudad... Ai, ai, homem, vai mais pra lá! – Minha mãe empurrou meu pai e ele riu, dando um beijo em sua bochecha. – O que você ia dizer? Que o Harry foi até aí? – Ela abriu um grande sorriso.
– Sim! Ele veio, mãe! Graças a vocês duas tramando pelas minhas costas. – Olhei de minha mãe para , que me mostrou a língua. – Foi bem legal passar um tempo com ele. – Sorri mais para mim mesma do que para qualquer um dos três que me olhavam.
– Sei. – Minha mãe fez uma cara de quem entendia muito mais do que estava revelando – Vocês duas vão ao show hoje?
– Vamos. Você já sabia que a gente ia?
– Hmm, já. – Ela sorriu, culpada. – Nós tivemos a ideia quando Harry veio aqui em casa. Conversamos sobre todo o tempo em que vocês passaram longe. Ele está tão bonito, né, filha? – Meu pai, que estava bem quietinho, abriu um sorriso mínimo. – Eu vejo aquele garoto sempre que ele vem visitar a Anne, mas sempre me parece mais bonito e mais alto. – Olhou para o lado, com um ar pensativo, e eu ri.
– Vocês deveriam casar – meu pai disse e minha mãe deu um pulo ao seu lado, o olhando surpresa. – É verdade! Eles deveriam ter ficado juntos, não ter se separado! Que coisa mais burra. – Minha mãe tinha um ar perplexo.
– Pai! – Eu comecei a rir, mas sentia minhas bochechas quentes e já gargalhava do meu lado. – Espero que você não tenha compartilhado essas ideias com o Harry, sinceramente! – Balancei a cabeça em desaprovação e meu pai deu de ombros, rindo brevemente.
– Filha, a gente tem que ir agora – minha mãe disse, olhando para o lado vagamente. – Ainda temos que arrumar algumas coisas para... – Recebeu um cutucão do meu pai nas costelas. – Enfim! Foi muito bom falar com você. – Ela sorriu. – Eu quero tanto que você comece a melhorar agora, filha! Nós sentimos falta da Lizzie todo dia, isso é algo que nunca vai passar, mas a dor a gente consegue ir administrando, né?
– Sim – eu disse, simplesmente, querendo tornar o assunto o mais curto possível. – Eu vou ficar melhor, mãe, prometo! E se cuidem, vocês dois. Te amo, paizinho!
Meu pai sorriu e abraçou mais minha mãe.
– Tchau, filha. Tchau, ! – minha mãe disse.
– Tchau! – mandou um beijo para os dois e eu acenei, encerrando a chamada em seguida. Deitei de novo sobre o travesseiro e levei as mãos ao rosto.
– Pronta pra começar o dia? – perguntou e levantou da cama. – Eu fui até a esquina e comprei uns croissants, só falta passar o café. – Ela me olhou e sorriu em expectativa.
– Tá booom, eu passo o café! – Levantei da cama enquanto ela batia palmas e corria em direção da cozinha.
Fui até o banheiro só para lavar o rosto e fazer xixi, deixaria o banho para mais tarde. Antes de ir até a cozinha, passei pelo quarto e peguei meu celular, que estava em cima da cama. Tinha uma mensagem nova de Harry.
"bom dia, girassol amarelo" – 9:35AM
"bom dia, Styles!" – 9:47AM
estava sentada à mesa da cozinha, olhando distraidamente para o celular. Peguei todas as coisas para preparar o café enquanto cantarolava e fiz uma dancinha, ajeitando tudo sobre a pia. Quando virei, vi que ela me olhava, sorrindo.
– Que foi? – Peguei a chaleira sobre o fogão. – Obrigada por esquentar a água.
– Você está aí toda boba, garanto que o motivo da felicidade começa com Harry e termina com Gostoso – olhei pra ela e rimos juntas. –, que é sinônimo de Styles. – deu de ombros.
– Não é só ele. – Me escorei na pia, observando o café ser filtrado. – Só acordei me sentindo melhor hoje. E tem o show, eu falei com meus pais... – Olhei novamente para – Falando nisso, eles não estavam meio estranhos?
– Quê? – Ela se ajeitou na cadeira. – Não, não achei.
Dei de ombros e fechei a garrafa térmica com o café, indo até a mesa. Mordi o croissant que estava no prato à minha frente e serviu nossas xícaras com café.
– Merda! – Limpei o chocolate que escorreu pelo canto da minha boca.
– Harry já falou com você? Eu preciso saber que horas vamos sair daqui – perguntou e tomou um gole de café. –, mas acho que o Carlos vem antes, de qualquer forma.
– Hmm. É, estou falando com ele agora. – Chequei o celular. Nenhuma mensagem nova.
– Vai me avisando, então.
terminou seu café e disse que precisava ir até o quarto fazer alguma coisa na qual não prestei muita atenção. Esperei ela sair da cozinha e mandei uma mensagem para Harry.
"e então?" – 10:45AM
"e então o quê?" – 10:46AM
"brincadeira! Já falo contigo." – 10:47AM
Terminei meu croissant e estava levando as coisas para a pia quando ouvi meu celular vibrando, o nome de Harry sobre a sua foto na tela.
– ! – Gritei e ela apareceu em dois segundos na porta da cozinha.
– Que foi? – Veio até a mesa, assustada.
– O Harry está ligando! – eu disse, ainda encarando o celular.
– Atende então, meu Deus! – Ela gargalhou e pegou meu celular na mão.
"Alô?" – Ela atendeu e deixou no viva-voz. Dei um tapa em seu braço.
"? Cadê a ?" – Harry parecia confuso.
"Tá desmaiada aqui do lado. Foi muita emoção e..."
"QUÊ?"
– Cala a boca, garota! – Dei mais um tapa na cabeça dela e arranquei o celular da sua mão. fez uma careta e me mostrou o dedo do meio, sentando em uma das cadeiras da cozinha. Fui para meu quarto e me joguei na cama.
"Fala, Harry."
", oi! Que confusão. – Ouvi sua risada rouca do outro lado da linha. – Você está bem?"
"Eu? Ah! Estou, sim, e você?" – Não pude evitar abrir um sorriso.
"Estou bem. Consegui descansar um pouco, mas em uma hora já estamos na estrada. Você tem que anotar direitinho tudo o que eu te falar, tá?"
"Tá!" – disse e abri uma agenda velha que tinha ao lado da cama.
"Então, o show vai ser no SAP Center, é super fácil de achar, mas qualquer coisa vocês buscam o endereço depois. Não vamos começar antes das nove, mas eu liberei a entrada para vocês a qualquer horário. Agora que vai ser um pouquinho mais complicado: vocês vão entrar por trás e precisa ser de carro. Tem uma entrada, anota aí..."
Harry me passou o resto das informações e eu já estava achando mais fácil ficar em casa do que ter que passar pelo mar de fãs enlouquecidas que estaria do lado de fora do estádio, segundo ele. Comecei a ficar bem nervosa com a ideia de tentar entrar sem ser vista e nem sabia o porquê, afinal, para aquele período da vida de Harry Styles, eu era uma completa desconhecida.
", tenta chegar um pouco mais cedo, tá? Por favor. – Parou por um segundo – Vocês vêm como?"
Eu sorri e brinquei com um fio solto da colcha, enrolando-o em meu dedo.
"Tá bom, vamos tentar chegar até as seis. Nós vamos pegar emprestado o carro de um amigo da . Se é que eu posso chamar de amigo". – Revirei os olhos e ouvi Harry rir.
"Tudo bem... Se cuidem."
Fiquei em silêncio, sem saber muito bem o que responder. Uma parte de mim desejava que ele falasse qualquer outra coisa só pra prolongar um pouquinho a conversa.
"..." – Mordi os lábios para não soltar um “yay”.
"Oi."
"Já estou ansioso para te ver."
Senti as borboletas no meu estômago fazerem uma festa.
"Também estou, Styles." – Sorri.
Desliguei o telefone e passei uns cinco segundos encarando a parede, os músculos do meu rosto teimando em formar um sorrisinho besta. Fui até o quarto de e entrei sem bater na porta, nós tínhamos essa liberdade.
– Urgh, eu não aguento mais! – Ela tirou um vestido vermelho e atirou sobre a cama, em uma pilha de roupas.
– Não aguenta o quê? – Sentei na cama, empurrando a pilha de roupas para o lado.
– Não tenho roupa para ir ao show. – Ela tirou outro vestido do armário e o vestiu, se virando de frente para mim.
– Gostou desse? – Deu uma voltinha e se olhou no espelho.
– Amiga, você está linda. Já provou todos esses?
– O que você acha? – Ela revirou os olhos e sentou sobre o pequeno tapete azul, no chão – Vou ter que comprar alguma coisa e nem adianta fazer cara feia. Eu posso conhecer pessoas muito importantes essa noite!
– Eu não ia dizer nada, mas sério? – Apontei para a pilha de roupas. – Nenhum desses? – Ela negou com a cabeça, fazendo um biquinho. - Então vai, né. Só tenta ir em um brechó dessa vez, pode ser? Tem aquele lá que eu te falei.
– ! Eu super apoio e acho muito fofa essa tua ideia eco friendly, social e parara, mas algumas vezes eu prefiro roupas novas, pode ser? – Ela riu, levantando do tapete, e eu dei de ombros. – Não fica assim, você sabe que eu estou tentando mudar, tem me ensinado bastante já.
Respirei fundo, optando por apenas abrir um pequeno sorriso. Há muito tempo eu sabia da tendência consumista de e, sempre que possível, nós conversávamos sobre a problemática. Ela já estava bem consciente sobre a questão da exploração trabalhista envolvida em muitas empresas, mas eu sempre batia mais algumas vezes naquela tecla.
– O que eu faço com você, hein, dona ? – Ela riu e veio até a cama, me abraçando. – Só vou dar uma volta e ver se encontro alguma coisa que realmente valha a pena, se não eu volto, tá?
– Isso! Já é um bom começo. – Ri e levantei da cama. – Bom, por outro lado, eu ainda não pensei no que vou vestir. – Joguei os braços para cima e riu, pegando a bolsa sobre a cômoda. – Você vai almoçar na rua mesmo?
– Acho que sim. Não quer ir junto mesmo? – Ela fez um biquinho.
– Não, eu estou com preguiça. – A segui para fora do quarto. – E acho que vou esperar, caso o Carlos traga o carro. Ah, eu disse para o Harry que a gente ia chegar até as seis, então não enrola!
-Tá. O Carlos vai me mandar mensagem quando estiver chegando, então não precisa se preocupar. – abriu a porta e se virou de frente para mim. – Eu vou trazer o almoço para a gente.
– Anja! – Sorri e ela mandou um beijo no ar antes de fechar a porta.
Ok, ainda tínhamos umas seis horas até o momento de sair de casa, então voltei para o meu quarto, decidida a encontrar de vez alguma roupa para usar no show. Talvez eu devesse ter saído com . Tinha que admitir que minhas minhas também não estavam super novas. Afastei o pensamento da cabeça e abri o guarda-roupa, analisando rapidamente as possibilidades. Queria alguma coisa leve e confortável, mas que também fosse... Sexy. Sim, eu veria meu ex super famoso cantando para milhares de pessoas, então parecia o tipo de evento para o qual eu gostaria de me vestir com um pouco mais de empenho. Não que normalmente eu me vestisse de qualquer forma, mas geralmente apenas não ligava muito para o assunto, o que costumava gerar comentários bem engraçados de .
Tirei uma saia do guarda-roupa e segurei bem em frente ao meu rosto. Eu gostava bastante dela, era longa, com listras coloridas e transparência que deixava minhas pernas mais à mostra. Sorri, era isso! Larguei a saia sobre a cama e o resto decidiria depois. Adorava a forma como eu, no fim das contas, sempre decidia rapidamente o que vestir.
Suspirei e retirei a camiseta preta e larga que usava desde a noite anterior, observando meu corpo no espelho, aquele corpo que era só meu e que já havia passado por tanta coisa, o corpo que eu aprendera a amar. Depois de dois relacionamentos bem fracassados onde ele tinha sido o problema, eu havia aprendido a olhá-lo de outra forma. Para minhas pernas finas e cheias de estrias, meus peitos pequenos e minha cintura quase inexistente. Era o corpo que eu tinha, que me carregava de um lado para o outro, que lutava todos os dias para me manter viva. Por que não amar? Passei as mãos lentamente pelo comprimento dos meus braços, subindo por pelos ombros e parando em minha nuca. Fechei os olhos e puxei o ar profundamente. Olhei novamente para o espelho e sorri. A terapia, de alguma forma, também estava me ensinando a olhar com mais carinho para mim mesma.
Ainda só de calcinha, fui até o banheiro e liguei o chuveiro, aguardando enquanto a água esquentava. Eu não deveria e não queria admitir, mas tinha mil expectativas para o show e queria muito ver Harry novamente. Muito mesmo. Não apenas porque eu tinha amado seu estilo novo, a camisa florida, a quantidade absurda de anéis, o corte de cabelo e o perfume que parecia ter sido fixado com pregos na minha memória. E a risada, a voz rouca, mas também por todos esses motivos. Eu tinha provado apenas uma pequena dose desse novo Harry Styles, uma droga muito, muito gostosa. E, depois de ter esse gostinho, já estava disposta a ter muito mais.
Entrei no banho e senti a água quentinha relaxar meu corpo. Tentei deixar minha mente vazia de qualquer pensamento e lavei os cabelos com calma, me ensaboando em seguida. Tentava não pensar no que me esperaria, mas ele não saia da minha mente, parecia que quanto mais próximo nosso reencontro ficava, mais eu ansiava em vê-lo. Ri de mim mesma enquanto desligava o chuveiro e ouvi um barulho vindo do lado de fora do banheiro. Imaginei que tivesse voltado, então me sequei e me enrolei na toalha, abrindo a porta para o corredor. O barulho ficou mais alto e eu ouvi... duas risadas? Merda. Corri para o quarto antes que alguém me visse naquela situação e fechei a porta. Vesti um shorts velhinho e uma camiseta, enrolando a toalha nos cabelos, pronta para conferir o que quer que fosse a fonte do problema.
– ? – chamei no corredor e não obtive resposta.
Encaminhei-me com cuidado para a cozinha, pronta para encontrar qualquer tipo de cena, e chamei seu nome mais uma vez.
– ... – Parei na porta, ao ver minha amiga tentando sair de trás de uma pessoa bem alta que aparentemente tinha as duas mãos na sua bunda.
– , amiga, desculpa! – Ela ficou na minha frente e deu um leve empurrão em quem eu então reconheci ser Carlos. – O Carlos veio hmm... Trazer o carro. – Carlos sorriu, acenando rapidinho. Cruzei os braços e levantei uma sobrancelha em resposta. – E já estava indo embora, né?
– Eu estava, eu acho. – Carlos pareceu meio desapontado e só então eu notei que estava meio ofegante.
– Estava sim. – sorriu para ele e puxou-o pela mão.
Os dois passaram por mim e foram em direção à sala. Parei bem ao lado da porta da cozinha e espiei o outro cômodo. Carlos puxou pela mão e ajeitou uma mecha do seu cabelo.
– Tchau, gata. – E então a beijou.
Senti-me um pouco culpada por estar olhando e voltei até a mesa, puxando uma cadeira e me sentando. Segundos depois ouvi a porta da frente ser batida e então passos apressados se aproximando.
– Ai. Que. Raiva. – apareceu, ajeitando os cabelos. Eu me segurava para não rir – Pode rir, vai.
– Amiga – eu ri brevemente e ela fez uma careta, escorando-se na pia. –, eu achei que você tivesse dito que não tinha mais nada com ele.
– E eu não tinha! – Ela bateu com as mãos na pedra de mármore e revirou os olhos. – Mas ele é tão...
– Gostoso?
– É. – abriu um sorriso sofrido.
– Então não tem problema, eu acho. Só tenta ter certeza do que você está fazendo. Lembra do que você mesma me disse: Onde você bota a boca, não bota o coração. Deixa o título de corna para mim. – Ri e levantei os braços, apontando os indicadores para a minha cabeça.
– Enfim. – Ela passou as mãos no rosto e me olhou sorrindo. – O carro já está lá embaixo, ele nem disse quando é para devolver, e eu comprei um macacão, depois te mostro. Ah! – Pegou uma sacola sobre o balcão, ao seu lado. – Trouxe yakisoba. Vegetariano para você, que é meu amorzinho.
Como se estivesse escutando a conversa, meu estômago roncou e dei um beijo na bochecha de quando ela sentou ao meu lado, me entregando uma caixinha.
– Te amo – disse.
– Eu sei. – Ela sorriu e começou a comer.
Depois que terminamos de almoçar, fui até meu quarto determinada a tirar uma soneca. Joguei-me na cama e acendi o resto de um baseado que tinha guardado ali ao lado. Fumei calmamente até o final e, conforme fui sentindo meu corpo relaxar, acabei adormecendo. Tive um sonho estranho com um cachorro cor-de-rosa que me seguia por uma praia deserta e acordei com me chacoalhando de um lado para o outro.
– Meu anjo, se mexe! São quase quatro e meia! – Ela me empurrou mais uma vez e eu sentei na cama, em um pulo. – Por que você parecia tão agitada dormindo?
– Provavelmente foi o cachorro. – Esfreguei os olhos.
– Oi?
– Nada – disse simplesmente e levantei da cama. – Vai tomar banho? Eu já tomei.
– Eu também já, enquanto você dormia. – Ela abriu um sorriso enorme e deu um grito. – NÃO ACREDITO QUE EU VOU VER UM SHOW DO HARRY! – Ri e dei um empurrão nela. Sempre achei graça nas explosões de felicidade repentinas de . Comecei a me despir e peguei a saia listrada que estava sobre a cama.
– O que acha dessa?
– Mais tua cara, impossível! – sorriu. – E o All Star, né?
– Sempre. – Vesti a saia e fui até o guarda roupa para escolher uma camiseta. – Essa.
Vesti a camiseta branca que havia me dado como presente de aniversário. Na época, eu cortei um pouco a barra, transformando-a em um cropped, o que quase a fez infartar. Um drama desnecessário em minha opinião, a peça continuava linda.
– Perfeita. – me olhava com as mãos na cintura e sorria. – Eu te odeio, sabia? Você poderia vestir um saco de batatas e continuaria linda.
– Tonta! – Ri. – Também te amo. Vai buscar o macacão, me deixa ver!
saiu do quarto e voltou alguns minutos depois, vestindo um macacão laranja com um decote fundo em V. Ela estava linda. Terminamos de nos arrumar e organizei mais algumas coisas em uma nécessaire que coloquei dentro da bolsa, junto de uma muda de roupas limpas. Aconselhei a fazer o mesmo, caso não voltássemos logo depois do show.
– , eu não sei você, mas eu pretendo voltar e dormir na minha cama. Vou levar mais roupa só porque você está insistindo. – Ela disse enquanto enfiava em sua bolsa a calça jeans e camiseta que eu tirei de seu guarda-roupa.
– Só faz o que eu estou mandando, você deveria agradecer por ter uma amiga prevenida como eu, ao invés de ficar reclamando – falei, a observando pelo espelho enquanto tentava desamassar um cantinho da minha camiseta.
– Obrigada! – Ela riu e revirou os olhos. – Mas quem vai dormir na cama do Harry hoje é você.
– ! – Fui até ela e a empurrei, rindo. – De onde é que você tira essas ideias? Ninguém vai dormir na cama dele, só estou levando mais roupa para o caso de algum acidente acontecer.
– Aham. Do tipo ele rasgar a que você está usando agora, né? – Mostrei o dedo do meio e ela colocou uma mão no meu ombro. – , eu posso cair dura lá no meio de todo mundo se ele não der um jeito de passar mais umas horas com você.
– Cala a boca antes que eu te tranque no banheiro e vá sozinha.
Ela riu e foi até o espelho, analisando o rosto bem de pertinho, e então começou a calçar os tênis.
– Ok. Está pronta? Acho que já organizamos tudo. – Ela olhou rapidamente o conteúdo da bolsa.
– Sim! Vamos logo antes que eu tenha um treco. Acho que não vamos chegar no horário previsto. – Olhei o celular e vi que ainda tínhamos algum tempo de sobra. – Ou sim.
Conferimos mais uma vez todas as coisas e fomos até a sala. parou bem na minha frente e sorriu.
– Vai ser impossível o Harry não derreter todinho quando te vir – ela disse, ajeitando com cuidado umas mechas do meu cabelo, que caía repicado pelos ombros. – Você é perfeita. – Me empurrou de leve e bufou.
– Vamos logoooo! – Ri e a empurrei porta afora. – Você também está linda.
Fomos até o carro, que estava bem em frente ao prédio, e eu sorri. O céu estava bem azul e apenas um ventinho mais gelado bagunçava nossos cabelos. Deixei a bolsa e minha jaqueta jeans no banco de trás, ao lado das coisas de , e me acomodei no banco do passageiro.
– Já agradeceu hoje por ter uma motorista tão linda? – disse, baixando o espelho e ajeitando o cabelo.
– Estou agradecendo. – Apertei sua bochecha e ela fez uma careta. – E estou agradecendo mentalmente ao Carlos pelo carro. Agora dirige!
Enquanto íamos em direção à estrada principal, abaixei o vidro e coloquei meus óculos de sol preferidos, redondinhos como os de Janis, o modelo preferido da minha irmã.
– Você acha que a Lizzie estaria indo com a gente hoje? – perguntou, como se estivesse lendo meus pensamentos.
– Não só acho que ela iria como também acho que teria esfolado o Styles por só nos avisar um dia antes. – Rimos juntas. – Bom, me avisar, né, porque ela provavelmente teria feito parte do plano secreto de vocês.
E com esse comentário, ficamos em silêncio. Suspirei e encostei minha cabeça no banco, olhando pela janela. Eu não podia deixar de pensar em todas as coisas legais como aquela, que minha irmã não viveria, em todos esses momentos lindos nos quais ela não estaria ao meu lado, mas Harry estava certo. Não só ele, como todas as pessoas ao meu redor. Como eu sabia que Lizzie agora vivia dentro de mim, a carregaria para todos os lados. Eu estava disposta a viver minha vida da forma mais plena e por nós duas.
Passamos mais um tempo sem trocar nenhuma palavra e eu sabia que estava apenas respeitando meu espaço. Ela olhava concentrada para a estrada e então sorriu ao perceber que eu a observava. Coloquei minha mão sobre a sua, que descansava sobre a coxa, enquanto passávamos por um trecho mais calmo.
– Obrigada por isso, por estar sempre do meu lado. – Ela sorriu em resposta, apertou levemente minha mão e ligou o rádio.
Assim que chegamos à parte mais aberta da highway, se virou para mim, baixando rapidamente os óculos de sol e eu vi suas intenções bem explícitas no sorriso que se espalhava por todo o rosto. Era o nosso trecho preferido da estrada e, naquele momento, particularmente, o movimento estava bem baixo. Aumentei mais o volume bem quando a playlist aleatória de começou a tocar Welcome To The Jungle, do Guns. Nós trocamos um olhar rápido e eu me preparei para passar para a próxima música.
– NÃO! – gritou. – Você não pode pular esse hino! Se eu tenho que te aguentar cantando Janis Joplin todo santo dia, você pode me deixar ouvir meu Axl gostoso em paz.
– . – Revirei os olhos. – Ele nem é mais gostoso. – Larguei as mãos ao lado do corpo, desistindo.
– Mas já foi! – Deu de ombros e acelerou mais, gritando o refrão, completamente desafinada.
Eu ri conforme o vento desajeitava completamente os nossos cabelos e tornava o barulho no carro insuportável.
– CLICHÊ PRA CARALHO! – Gritei em seu ouvido e ela riu mais ainda.
– Falou o clichê ambulante. – Ela diminuiu o volume e franziu o cenho. – Já imaginou o Harry fazendo um show só de cueca?
– Meu Deus, dá para ser mais aleatória? – Ri, mas não pude deixar de imaginar a cena, que ficou completamente bizarra na minha cabeça. – Acho que só funcionava com o Axl, amiga, e provavelmente porque ele não tinha muita noção do que estava fazendo. O público de Harry é meio... Novo, né? Em parte.
– Sim, faz sentido. – Ela riu e balançou a cabeça, como se tentasse afastar a imagem. – Mas ele tem umas músicas beeeeem... Digamos que vão meio contra a maré family friendly.
– Quê? – Virei meu corpo completamente para ela.
– É. Ele não gravou nenhuma oficialmente por motivos óbvios. – abriu um sorriso de lado. – Ah, amiga, estou achando que o senhor Styles ainda vai te surpreender muito.
Eu dei uma risada curta e voltou a concentração totalmente para a estrada. Em silêncio, fiquei imaginando que tipo de músicas Harry estaria cantando agora e minha curiosidade só aumentou. Começava a achar que deveria ter trapaceado e escutado algumas antes de sair de casa.
Em mais dez minutos, nos aproximávamos do estádio e o movimento já começava a mudar. achou melhor que fechássemos os vidros do carro, uma vez que ficaríamos mais expostas ao entrar no estádio. Fiz o que ela pediu enquanto via vários grupinhos de pessoas correndo. Eram pessoas com sorrisos enormes, garotas com camisetas estampadas com o nome de Harry, a cara dele e cartazes com os mais variados tipos de frase. Algumas bem sugestivas.
Instantaneamente fui jogada alguns anos no passado, durante o curto tempo em que acompanhei os garotos nos primeiros shows. A vibe ainda era a mesma, completamente contagiante, do tipo que dá vontade de sair correndo e abraçando todo mundo simplesmente porque o sentimento compartilhado é o mesmo. A única diferença era que agora Harry conseguia tudo aquilo sozinho e eu não pude deixar de sentir um tipo de orgulho enorme pelo que ele havia alcançado.
Quando viramos na rua que o GPS indicava, e na qual Harry havia me informado estar a entrada para o estádio, minha ficha pareceu finalmente cair. Senti meu estômago embrulhar e minha boca secar, parecia que toda a minha segurança tinha saído correndo pela janela do carro e eu desejei, por um momento, também sair correndo. notou minha inquietação e levou uma mão até meu braço.
– Ei! Vai ficar tudo bem! – Olhei para ela e dei um sorriso nervoso, assentindo com a cabeça. – Agora me ajuda aqui ou eu vou acabar atropelando alguma dessas garotas desesperadas.
Eu ri e ela baixou um pouco a janela, colocando a cabeça para fora a fim de enxergar melhor o que acontecia. Nos aproximamos do grande portão, que estava fechado, e soltou um "merda" baixinho. A aglomeração ali ainda era bem grande, o que complicava ainda mais nossa passagem.
– Psiu, aqui! – Uma mulher loira, de óculos escuros e vestida toda de preto, acenava em nossa direção. – ? – Ela perguntou e minha amiga fez sinal positivo. – Venham!
me olhou e eu apenas dei de ombros, já que meu cérebro parecia ter travado. Seguimos até uma vaga que ela indicou em um estacionamento improvisado e, assim que paramos, ela veio até nós e parou na janela do lado de .
– Oi, meninas! – Abriu um sorriso cordial. – Eu sou a Sam, estou responsável pela segurança hoje. Vou levar vocês até lá.
Estiquei-me um pouco para alcançar minha jaqueta no banco de trás enquanto descia do carro. Depois que entreguei suas coisas, ela acionou o alarme e seguimos Sam, que ia bem animada um pouco mais à frente.
– Você deve ser a , né? – Ela olhou para mim e eu achei que fosse desmaiar. Ser reconhecida claramente não estava no topo da minha lista de costumes. – O Harry não parou de falar em você desde que chegou aqui. – Quê?
Forcei um sorriso que mais deve ter parecido uma careta gerada por uma crise de dor de barriga e olhou para mim, sussurrando um "viu só?". Aproximávamos-nos de uma estrutura gigantesca composta pelo palco e pelo backstage e, conforme seguia Sam, tive certeza de que se não fosse pelo som dos meus passos somado ao barulho de conversas e risadas que aumentava, meus batimentos cardíacos vergonhosamente altos poderiam ser ouvidos. Andamos por quase dez minutos e então viramos em um pequeno corredor. Sam virou para nós e sorriu.
Parei e segurei firme no braço de , certa de que iria desmaiar a qualquer segundo, simplesmente odiava me sentir nervosa daquela forma. Olhei rapidamente para os lados na esperança de ver outra porta ou alguma rota de fuga, mas o único caminho possível era o mesmo por onde viemos e eu não ia passar aquela vergonha. Sam levantou a mão, pronta para bater à porta, e nós três nos assustamos quando ela abriu sem que o gesto fosse necessário. A cabeça de Harry surgiu pela fresta e um sorriso brotou em rosto assim que seus olhos pousaram em mim.
– ! – Engoli em seco e me senti pregada no chão, mas então ele nos deu espaço para passar. – Obrigada por trazê-las, Sam! – Ele agradeceu a loira e nós também sorrimos antes que ela desse meia volta e desaparecesse no corredor.
cutucou discretamente minhas costas e eu obriguei meus pés a se mexerem. Assim que entrei no camarim, Harry me puxou pela mão e me envolveu em um abraço apertado, colando meus braços ao lado do corpo e me levantando um pouco do chão. Ouvi rir brevemente atrás de nós.
– Ops. – Ele afrouxou um pouco o abraço e eu consegui passar os meus decentemente ao seu redor. – Me desculpa, eu estava com saudades. – Ele me soltou e eu olhei para meus pés, desejando que um buraco se abrisse bem ali e me engolisse. Minhas habilidades sociais pareciam ter sido completamente destruídas.
Ouvi um pigarro atrás de mim e então percebi que ainda não havia cumprimentado Harry. Nenhum de nós dois parecia ter notado isso, visto que ele continuava me olhando.
– Oi, ! – Ele abraçou e ela riu.
– Caralho, achei que tinha ficado esquecida no churrasco. Da próxima vez que resolver engolir minha amiga com os olhos, me avisa. – Ela disse, dando um tapinha no ombro de Harry e ele arregalou os olhos, coçou a nuca e deu as costas para nós, parecendo achar a parede oposta muito interessante. Lancei um olhar assassino para e ela deu de ombros.
– Harry, cadê os goles desse lugar? – ela perguntou, sentando bem largada em um sofá próximo. - Eu estou louca por uma cerveja.
– Ali. – Harry riu e apontou para uma porta que eu ainda não tinha notado. – Depois do corredor, primeira porta à esquerda, no frigobar. Não sei porque ainda não trouxeram para cá. – Me olhou e deu de ombros. – Fique à vontade! – ele disse quando já sumia na porta.
Harry então se virou para mim e eu senti alguma coisa diferente na forma como ele me olhava, algo que me deixava ligeiramente desconfortável. Sorri sem mostrar os dentes e ocupei o lugar de no sofá enquanto ele continuava em pé, sustentando o mesmo sorriso torto e ridiculamente perfeito.
– Que foi? – Revirei os olhos e apertei a jaqueta em minhas mãos.
– Você está linda. – Ele disse como se estivesse me informando que ia ao mercado comprar batatas.
Harry claramente não tinha noção da guerra que meus órgãos travavam naquele momento para se manterem quietinhos dentro do corpo.
– Você também. – Tentei sorrir de forma educada e Harry gargalhou, jogando a cabeça pra trás.
– , por favor! – Ele deu uma voltinha no lugar e passou as mãos pela lateral do corpo. – Eu sei.
– Idiota. – Dei risada, pega de surpresa pela resposta inesperada.
Harry estava usando uma camiseta branca, bermuda preta e chinelos. Ele não estava... lindo e sabia daquilo. Estava confortável, nada demais, mas eu não precisava de muito mais que aquilo para me sentir hipnotizada e as reações ridículas do meu corpo a cada movimento que ele fazia, claramente concordavam.
Só notei que já tinha passado muito tempo analisando os fios de cabelo que caíam desajeitados pela lateral do seu rosto quando ele abriu a boca para falar alguma coisa e foi interrompido.
– PUTA. MERDA. – gritou de algum lugar e Harry levou a mão à testa, sussurrando alguma coisa que não compreendi.
Levantei-me para conferir o que acontecia, mas ele avançou, segurando meu braço no mesmo momento em que passou pela porta, sendo seguida por... minha mãe?
– ! – Eu não tive oportunidade de dizer qualquer coisa e, no segundo seguinte, estava sendo jogada de volta no sofá.
Minha mãe me abraçava e distribuía beijos por todo o meu rosto enquanto apertava meus braços. Escutei e Harry rindo ao fundo.
– Mãe. Mãe. – Eu ri um pouco e ela saiu de cima de mim, sentando desajeitada no sofá. Ajeitei-me melhor e levei as duas mãos à boca, tentando reprimir um soluço, mas sem sucesso. No segundo seguinte estava chorando igual a uma criança e sendo amparada por seus braços enquanto ela dizia palavras carinhosas em meus ouvidos.
– Filha! – Ah, não.
Olhei para a porta e consegui definir apenas o contorno do corpo do meu pai através dos meus olhos embaçados. Agora eu tinha dois pares de braços ao meu redor e meus soluços só tinham aumentado. Depois do que me pareceram horas, os dois se afastaram, secando as lágrimas.
– , a ideia mais inteligente que você teve hoje foi ter escolhido maquiagem à prova d'água. – comentou e Harry concordou com a cabeça, rindo.
Olhei para os dois parados em minha frente e, em seguida para meus pais, que tinham sorrisinhos em seus rostos agora que tinham parado de chorar.
– Quem foi o responsável por isso? – Tentei soar séria e levantei do sofá, cruzando os braços.
Harry levantou uma mão, se acusando e abrindo um sorrisinho mínimo.
– Em minha defesa, nem era pra vocês terem se encontrado agora. A os encontrou e estragou meu plano. – Harry deu um sorrisinho irônico para minha amiga e sentou no sofá em frente ao que meus pais estavam.
– Entendi. – Apoiei uma mão no queixo e olhei para ele, reprimindo minha própria risada. – Explique-se.
Mas foi meu pai quem falou.
– O Harry convidou a gente também, ué. Está achando que é só você, alecrim dourado? – Ele riu e eu revirei os olhos. – , filha, a gente não se via desde... Desde aquilo tudo. Estávamos morrendo de saudades e o Harry achou uma ótima oportunidade nos reunir assim. Você não está feliz?
– Claro que eu estou, porra! – Recebi um olhar feio de minha mãe. – Desculpa! – Sorri. – Eu estou feliz demais. – Me virei de frente para Harry. – E você... Está me devendo uma.
Harry assentiu e sorriu de lado, mordendo o cantinho do lábio e me observando calmamente. Eu podia sentir o olhar de meus pais e observando a cena como três velhas fofoqueiras assistindo a uma novela.
– Fico feliz que tenha gostado da surpresa. Ou de parte dela.
– Harry... – Apertei meus lábios um contra o outro. – Você sabe que eu não aguento mais uma dessas, né? Serão três vezes em dois dias, você vai acabar me matando desse jeito.
Ele riu pelo nariz e deu de ombros.
– Você é uma das pessoas mais fortes que já conheci, pode aguentar qualquer coisa. – Me olhou de baixo a cima até seus olhos encontrarem os meus. Senti minhas bochechas esquentarem. Ouvi alguém tossir e então quebramos o contato visual.
– Bom... – Harry disse, olhando para cima. – Eu acho que vou indo lá para outra sala para vestir o figurino, fazer a maquiagem e tal. Deve estar quase na hora. – Ele riu e revirou os olhos. – Aí deixo vocês conversando mais à vontade.
– Harry... – Uma mulher com o cabelo cacheado mais lindo que eu já tinha visto apareceu à porta.
– Viu? Eu disse! – Ele riu e a abraçou de lado. – Gente, essa é a Leah, responsável por me embelezar. – Ela sorriu abertamente e acenou. – Já vou lá, me dá só um minuto – disse e ela sussurrou "só um!", apontando o dedo bem na cara dele e nós rimos. – , vem cá um pouquinho? – Ele me chamou assim que Leah saiu e eu levantei do sofá, seguindo-o até o corredor.
Senti os olhos de em minhas costas e meu estômago deu uma cambalhota. Perguntei-me o que ele poderia querer falar comigo.
– Hmm... Como a gente não vai ter mais tempo para conversar até o fim do show... – Ele segurou minhas mãos e seus olhos verdes se encontraram com os meus. – Eu só queria dizer que estou realmente muito feliz por você ter vindo. Significa muito para mim.
– Harry, você trouxe os meus pais para cá. Não sei se tem noção do quanto isso significa pra mim. – Eu sorri e meu olhar seguiu até a sua boca. – Hmm... Bom, vai pra lá, então. – Fiz um gesto displicente para disfarçar e o ouvi rir baixinho. – Quero ver o quão lindo você consegue ficar, Styles. – O olhei de forma desafiadora e ele mordeu os lábios.
– Você vai ver, senhorita . – Ele piscou antes de dar as costas e eu fiquei observando enquanto ele se afastava, até sumir em outro corredor.
Voltei para a sala onde meus pais conversavam animadamente com , me juntei a eles e, depois de muita insistência, finalmente aceitou que não ia contar o que Harry havia me falado. Passamos uns dez minutos apenas colocando meus pais a par dos últimos acontecimentos em nossa vida.
– Mãe... – eu disse quando finalmente me dei conta de um detalhe. – Então aquela parede e a história dos quadros... – Ela riu e escondeu os olhos com a mão.
– Hotel.
– Sua danada! – Dei um tapinha em seu braço e então nós quatro olhamos para a porta ao ver um ser humano parado ali.
– Oi. – Ele sorriu extremamente cordial, como o resto das pessoas que tinham falado conosco. – Eu sou o Jeff, empresário do Harry, melhor amigo e babá nas horas vagas. – Ele revirou os olhos e nós rimos. – Não acredito que ele deixou vocês aqui sozinhos.
– Não tem problema. – Eu sorri e levantei, apertando sua mão. – Nós estamos bem confortáveis.
– Você deve ser a , né? O Harry já falou pelo menos um milhão de vezes de como você era bonita, mas minhas expectativas foram todas superadas. Com todo o respeito. – Ele sorriu de novo.
Vontade de enfiar a cabeça num buraco: 10, : 0. Como assim Harry ficava falando de mim por aí?
– Obrigada. – Consegui formar um sorriso.
– Bom, então eu vou deixar vocês à vontade, estamos a mais ou menos uma hora do início do show. Já sabem onde fica a cerveja? – fez um joinha e ele riu. – Perfeito. Ah, vocês têm a opção de assistir ao show da lateral do palco ou lá da frente, em uma área mais reservada. Já sabem onde querem ficar?
Eu e trocamos um olhar rápido e ela respondeu por nós.
– Palco! – Olhou para meus pais, que assentiram sorrindo.
– Tudo bem. – Bateu palmas uma vez. – Um pouco antes do início alguém da equipe vem chamar vocês.
– Azzof! – Alguém o chamou em outra sala e ele bufou, jogando os braços para o alto.
– Deve ser aquela criança dando problema. – Ele riu e acenou rapidamente para nós, mas virou antes de sair pela porta. – Temos muito que conversar depois do show, . Aproveitem tudo, viu? O Harry sabe me dar dor de cabeça, mas os shows dele são uma experiência única, vai se acostumando. – Ele piscou para mim e sorriu divertido.
– Uuuuh. Vai se acostumando! – imitou Jeff e deu uma risadinha idiota quando ficamos os quatro sozinhos de novo. – Já está fazendo parte da equipe! – Dei um soco em seu braço e ela fez uma careta. – Nossa, você é péssima. Vou pegar mais cerveja para nós quatro. – Ela disse e saiu pela mesma porta.
Eu ri e sentei entre meus pais no sofá. Minha mãe me abraçou de lado e me olhou com um sorriso tristonho.
– Filha, a gente vai pegar o voo de volta logo depois do show. – Senti meu estômago afundar e um nó se formar em minha garganta. – Temos muitas coisas para resolver lá em casa. Deixamos o escritório com vários casos. – Me obriguei a abrir um sorriso, por mais que me doesse deixá-los ir tão rápido. Sempre admirei a forma como meus pais se dedicavam ao trabalho.
– Mas mãe...
– Não fica triste, filha! – meu pai disse e sorriu. – Eu sinto que a gente vai voltar a se encontrar antes do que você imagina e o Harry já deu essa oportunidade incrível para nós. Ele é realmente um garoto maravilhoso. – Olhou para minha mãe, que sorriu concordando. – Vamos só aproveitar essas horas que temos juntos.
– Está certo! – Suspirei e abracei mais minha mãe, me sentindo instantaneamente muito mais leve.
Meu pai sempre teve um dom incrível de me fazer enxergar as coisas de maneira muito simples, sempre fazia eu me sentir mais segura.
– Prontinho! – surgiu na porta, segurando quatro garrafas long neck e ostentava um sorriso enorme.
Começamos a beber e conversar e logo já estávamos rindo alto até demais. As poucas vezes em que o nome de Lizzie foi mencionado, o mesmo trocado por outro assunto e não parecia estranho ou errado fazer aquilo, parecia simplesmente um acordo feito entre nós para aquele momento. Para mim, minha irmã estava ali conosco, eu podia senti-la ao nosso lado e a sensação que eu tinha era de paz. Quase uma hora depois, já me encontrava levemente alterada e meus pais riam de alguma coisa enquanto abraçavam . Leah apareceu na porta e pareceu achar graça da cena quando nos viu.
– Gente! – Ela atraiu nossos olhares em sua direção. – Me sigam, por favor. O show vai começar em dez minutos.
deu uns gritinhos e correu em minha direção, agarrando meu braço enquanto eu ria. Seguimos Leah em silêncio e eu podia ouvir meus pais conversando atrás de nós. Ela nos levou até a área lateral do palco, onde havia um espaço reservado com muitos fios e equipamentos, mas também uma mesa com mais bebidas e algumas cadeiras. Sorri satisfeita ao perceber que teríamos uma visão muito boa dali.
– Podem ficar aqui. Precisam de mais alguma coisa? – Nós quatro balançamos a cabeça em negação e ela sorriu. – Perfeito, aproveitem! – disse e saiu correndo ao ser chamada por alguém.
– Coitada da moça. – meu pai disse, se sentando em uma das cadeiras e abrindo uma cerveja. – Imagino como eles devem ter uma vida corrida.
– Nem me fale, pai. – Me sentei ao lado dele, rindo ao ver espiar o outro lado do palco como se Harry fosse surgir a qualquer momento, como fumaça. Estava tão acostumada a ter ela junto conosco que às vezes me esquecia de que realmente era uma fã.
Simplesmente não notei os minutos seguintes passando, fosse por culpa da cerveja ou porque meu coração parecia não querer mais parar dentro do peito. Quando dei por mim, cada nervo no meu corpo parecia ser despertado por uma explosão de gritos ensurdecedores. As luzes do estádio se apagaram por um segundo e então se acenderam novamente, em uma explosão de cores.
– , olha! – Senti as unhas de se afundarem em meu braço. – Olha! – Ela apontava para um ponto do palco e então eu finalmente pude vê-lo.
Harry surgia por entre a banda e os gritos aumentavam cada vez mais. Perguntei-me se era possível que aquelas garotas saíssem vivas de shows como aquele. Harry tinha um sorriso gigante no rosto e estava simplesmente lindo naquelas roupas completamente coloridas e extravagantes que ficariam ridículas em qualquer outra pessoa, mas que pareciam apenas exaltar sua beleza de maneira absurda. Eu observava atentamente cada um de seus movimentos. Notei seus olhos percorrendo rapidamente o local onde estávamos até parar em mim. Ele sorriu de lado e piscou, então segurou o microfone e uniu os primeiros versos da música ao som dos instrumentos da banda. Milhares de vozes cantando muito alto e em coro, com único objetivo. Todas estavam ali por ele, só para ele.
----
Mais de metade do show já havia passado e eu estava sentada, tentando me recuperar da explosão de energia da última música. Tinha que admitir que seu trabalho todo era muito melhor do que havia esperado e era óbvio demais o porquê do sucesso e fama gigantescos. Harry fazia todas as coisas com tanto apreço e carinho que era simplesmente impossível não amar cada verso e palavra das músicas. Era fácil sentir como elas eram reais e como ele se entregava completamente ao momento. A energia no estádio se tornara tão grande e palpável que era quase possível ouvir os corações batendo, ver as lágrimas de felicidade escorrendo e ouvir os gritos, ensurdecedores e que só aumentavam cada vez mais, à medida que o tempo passava e ele abria a boca para dizer qualquer coisa ou fazer alguma piadinha. Harry tinha seu público rendido e na palma das mãos.
– Eu vou ter um filho, . – olhava para o palco sem piscar. – Eu não achei que fosse possível engravidar de uma música, mas aconteceu. Eu vou ter um filho.
Eu ri e levantei novamente assim que a música terminou.
– San Jose, eu tenho que confessar uma coisa. – Harry disse e mais uma onda gritos foi ouvida. – Eu tive um sonho. Um sonho muito, muito estranho. – Mais gritos e risadas. – Eu tive esse sonho durante uma viagem, quando começava a gravar o disco. Eu sonhei com... – seus olhos se fixaram em mim e ele abriu um sorriso tímido. Meu estômago embrulhou e deu pulinhos animados ao meu lado. – Uma pessoa incrível e muito especial para mim e que eu não via há muitos anos. Mas vocês sabem que muitas vezes os sonhos não fazem sentido e aquele sonho com certeza não fazia sentido nenhum. – Harry olhou para baixo e riu. – Mas ele despertou alguma coisa dentro de mim e desse sonho nasceu uma música. – Ele fez silêncio e os gritos aumentaram quando as notas da música começaram a tocar. – Essa é Sunflower, Vol. 6.
Play Sunflower, Vol. 6.
O show poderia muito bem ter acabado ali, se dependesse de mim. Senti minhas pernas tremerem e me sentei de novo no banco enquanto ouvia não cantar, mas gritar a música. Me esforcei para compreender alguns versos, pois só uma coisa parecia ocupar meu cérebro naquele momento: Harry tinha feito uma música para mim. Depois de tantos anos, ele não tinha esquecido. Ele não tinha me esquecido. Não tinha esquecido a promessa. Puxei com força pelo braço e ela fez uma careta.
– Você sabia disso? – perguntei e ela respondeu com um sorrisinho.
– Eu ouvi o álbum, amiga. – Deu de ombros, voltando a olhar para o palco.
Eu não sabia como reagir, queria rir e chorar ao mesmo tempo, invadir o palco e o fazer engolir o microfone com pedestal e tudo por fazer aquilo comigo, por me fazer sentir todas aquelas coisas em apenas dois dias, por me fazer sentir tão importante e querida, por me resgatar de um lugar muito escuro e profundo e me trazer de volta para a luz. Uma luz quente, amarela e feliz, produzida em um dia quente de verão há muito tempo atrás.
-flashback-
– , vem logo! – Lizzie corria um pouco mais à frente, indo em direção à pequena sorveteria. Harry e eu andávamos lado a lado, com as mãos entrelaçadas, e eu me sentia muito feliz.
– Espera. – Harry parou de repente e me puxou para trás.
Estávamos em frente a uma pequena floricultura na qual eu não havia reparado quando passamos. Uma mulher, na casa de seus quarenta anos, ajeitava um grande vaso de girassóis sob uma mesinha na calçada. Ela olhou para nós e sorriu.
– Querem levar um buquê, queridos?
As bochechas de Harry ficaram muito vermelhas e ele abriu um sorrisinho encabulado.
– Ah, não. Nós não temos dinheiro para tanto.
– Não seja por isso. – Ela riu e puxou um único girassol do vaso. – Levem esse. É um presente! Para combinar com o vestido amarelo dessa mocinha!
– Ah! – Harry pegou o girassol, meio sem jeito. – Muito obrigado. Mesmo!
Ela sorriu e eu acenei, também agradecendo. Harry ainda segurava o girassol quando nos afastamos da loja. Lizzie já tinha sumido de vista há uns bons minutos e ainda estávamos a três quadras da sorveteria. Ele olhou para mim e sorriu.
– Toma. – Me entregou o girassol e eu sorri. – Sunflower. É uma bela palavra, né? Sempre achei que combinava com você. – Eu continuava em silêncio, sem saber muito bem o que dizer. – Eu vou escrever uma música, .
– O quê? – Eu ri, sem entender a mudança brusca de assunto.
– Sim. Um dia, quando eu for um cantor famoso, vou escrever uma música sobre você. – Ele sorriu, virando o rosto para mim e estreitando um pouco os olhos, por causa do sol. – E ela vai se chamar Sunflower. Vai ser uma música muito feliz para combinar com você e com esse seu vestido que é muito amarelo.
– Amo você, Harry – eu disse, simplesmente, e apertei mais sua mão entre a minha.
– Amo você, sunflower.
-fim do flashback-
A música terminou e eu olhei na direção de Harry, secando algumas lágrimas. Ele agradecia várias vezes às pessoas presentes e sorria. A julgar pela barulheira indefinida que tomava conta do estádio, não era só eu que sentia... coisas... com aquela música. Uma sensação muito estranha tomava conta do meu corpo. A volta daquela lembrança que eu não acessava há tanto tempo, vê-lo ali cantando pequenos pedacinhos da nossa história para todas aquelas pessoas, e meus pais junto de mim, sendo testemunhas daquele momento. A música tinha uma letra engraçadinha e alguns trechos eram bem sugestivos, o que fez eu me sentir um pouco envergonhada. Eu realmente queria invadir o palco, mas para arrancar Harry de lá e fazer ele me explicar aquela história toda. Eu estava eufórica.
– Amiga, volta para a Terra! – gritou no meu ouvido e eu percebi que uma nova música já havia iniciado.
Senti um cutucão nas minhas costas e virei. Meu pai deu uma piscadela e me estendeu uma garrafa de cerveja, que eu agradeci e peguei sem pestanejar, estava mais do que nunca precisando beber. Três músicas depois, Harry agradeceu a presença de todos e se despediu. Eu ainda sentia meu corpo meio anestesiado. Tive que lutar para sair do lugar enquanto me empurrava em direção às escadas que davam acesso ao corredor. Começamos a fazer o caminho de volta para a sala e eu cutucava nervosamente o cantinho de uma das unhas. Meus olhos buscavam por ele.
– E aí? O que você achou? – me empurrou de leve com o ombro e sorriu. – Perfeito, né? Eu achei que você ia cair dura no chão quando ele cantou a sua música. – Quase caí. – respondi vagamente e entrei na sala, indo direto para o sofá.
Meus pais entraram logo depois e tomaram lugar em duas cadeiras ao lado.
– ! – Jeff entrou com um sorriso enorme e os cabelos bagunçados e olhou na direção dos meus pais. – Me desculpem por vir assim rápido, mas é que vocês pediram para nós avisarmos, então o Lewis está só aguardando para levar vocês até o aeroporto. – Olhou para mim do novo. – Você fica. Ordens do Harry.
Oi? Como assim, "ordens do Harry"?
– Não, eu não posso ficar. – Eu ri e levantei do sofá. – Tenho que ir com eles.
– Não tem não, senhorita! – Meu pai também levantou, seguido de minha mãe, que bocejou e alongou um pouco as pernas. – Não tem necessidade nenhuma. – Abri a boca para protestar e minha mãe levantou a mão.
– Não, ! Seu pai está certo! – Ela veio até mim e me abraçou. – Vai ser super rápido depois que chegarmos ao aeroporto. Se você for junto só vai ter mais problema para voltar.
– Mãe... – Minha voz estava chorosa e eu afundei meu rosto na curva do seu pescoço.
Ela segurou meu rosto entre as mãos e meu pai parou ao nosso lado. estava quieta, um pouco mais atrás.
– Foi ótimo passar essa noite com você, meu bebê. Não fica triste, logo a gente se vê – minha mãe disse.
– Promete? – Olhei dela para meu pai e os dois assentiram, sorrindo.
– Prometemos. – Me abraçaram.
Caminhei com eles até o estacionamento e ia ao meu lado, com uma mão sobre o meu ombro. Quando chegamos perto do carro, Lewis acenou e ficou parado bem ao lado da porta.
– Filha, vem aqui um pouquinho. – Minha mãe me puxou pela mão e nos afastamos de meu pai e , que conversavam animadamente.
Ela sorriu e colocou uma mecha do meu cabelo atrás da orelha, passando o dedão duas vezes na minha bochecha, exatamente como fazia quando eu e Lizzie éramos crianças. Fechei os olhos, sentindo o gostinho doce da lembrança.
– Aproveite bem, filha. – Abri os olhos e segurei em suas mãos. - Aproveita essa chance nova que a vida está te dando. – Olhei para ela sem entender, minha cabeça claramente já dava sinais de cansaço. – Estou falando do Harry, caso você não tenha entendido. – Ela riu e revirou os olhos.
– Ah, não, mãe. – Eu ri, nervosamente. – O Harry...
– Gosta muito de você. – Ela disse pontual e prática, como sempre era. – Ele gosta muito de você, filha. Eu não vou entrar em detalhes sobre a conversa que nós tivemos lá em casa porque envolve coisas pessoais. Se um dia ele quiser te contar, ele conta, mas eu posso te garantir uma coisa... – olhou diretamente nos meus olhos – o Harry passou todos esses anos guardando esse sentimento dentro dele, nutrindo essa coisa muito bonita que sente por você. Não é um grande mistério, né? Ele escreveu até uma música! – Ela riu e eu acompanhei. – É um privilégio! Então o que eu quero dizer é: dá uma chance. Vocês já deram o primeiro passo para reconstruir ou continuar a história que tiveram, agora cabe a você decidir se quer continuar ou não.
– E nós vamos estar sempre do seu lado, filha, sempre te apoiando, independente de qual for a sua decisão. – Meu pai tinha aparecido atrás de nós e sorria. – Mas eu ia gostar muito. Você sabe que eu sempre fui team Harry.
Nós rimos e minha mãe o chamou com a mão, abraçando-o de lado. Provavelmente eles já haviam tido aquela conversa antes de falar comigo. Meus pais sempre conseguiram ser sinceros comigo e com Lizzie, era uma das minhas coisas preferidas em sua forma de agir. Sem meio-termo, sem passar muito a mão na cabeça. O que tivesse de ser dito, seria. Simples assim.
– Vai nos mantendo informados da situação, filha – meu pai disse e me abraçou enquanto caminhávamos em direção ao carro.
virou e acenou para Harry, que se aproximava de nós já com outra roupa. Ele abriu um sorriso e parou bem ao meu lado. Pude sentir um cheirinho de roupa fresca e perfume, constatando que ele havia tomado banho. Minha mãe sorriu e o abraçou.
– Obrigada pelo convite, Harry, e por tudo, basicamente. Você é importante demais para nós e o show foi incrível.
– Muito obrigada mesmo, mas sou eu quem precisa agradecer por ter vocês na minha vida. - Harry se afastou um pouquinho de minha mãe e olhou na minha direção. – Agora mais do que nunca.
Meu pai, que estava esperando ao lado bem quietinho, se adiantou e também abraçou Harry. Eu realmente já estava toda boba em ver a relação de carinho que existia entre os três. Depois de mais alguns abraços e chororô de despedida, meus pais entraram no carro, acenando para nós. Ficamos os três parados, observando eles se afastarem. Eu sentia meu coração na palma da mão, tão pequeno que poderia muito bem sumir e eu não iria nem perceber. Harry então se virou para nós e sorriu, com as mãos na cintura.
– E então? Gostaram do show?
– Styles, você sabe que eu amaria qualquer coisa que você fizesse. – Ela bufou e Harry riu. – Mas pergunta para a . Tenho certeza que ela tem muita coisa para falar. Rolaram até lágrimas e tal.
– ! – Dei um tapa em seu braço e Harry levantou uma sobrancelha, intrigado. – A gente fala sobre isso depois.
– Sobre isso... Bom, vamos entrando – ele disse e deu empurrõezinhos em nossas costas, mas parou e olhou para mim.
– Amiga, na verdade... – Ela torceu as mãos uma na outra e me deu um olhar que eu conhecia muito bem. O olhar com consciência pesada. – Carlos me mandou mensagem enquanto você estava falando com a sua mãe. – Ela deu uma risadinha sem graça – Ele está aqui na cidade, acredita? E até me chamou para jantar.
– Oi? – Eu não queria acreditar no que estava ouvindo. – , eu achei que a gente fosse voltar juntas para casa. – Frisei a última palavra, prevendo a dimensão do problema.
– Ai, Harry! – Ela bufou e bateu um pé no chão. – Me ajuda! Fala logo pra ela.
– Falar o quê? – Olhei de um para o outro, com os braços cruzados.
– Eu quero que você vá comigo para o hotel, . – Ele riu e coçou a nuca. – Não era bem assim que eu esperava convidar, mas...
– O quê? Harry, eu não posso.
– Espera! – ele disse rapidamente, percebendo o que tinha dito. – Você entendeu errado. Vai todo mundo para lá, para relaxar e tal. A gente sempre dá uma festinha depois dos shows. – Piscou. – Bom, na verdade geralmente eu só chego e apago na cama, mas se você for junto eu posso abrir uma exceção.
– Bom, nesse caso... – Analisei rapidamente minhas alternativas, que se resumiam a zero. Tinha sido abandonada por minha melhor amiga e Harry me oferecia uma noite com pessoas desconhecidas que poderiam provavelmente aniquilar o resto da minha autoconfiança. O que eu tinha a perder, não é mesmo? – Eu... acho que vou com você. – Dei de ombros e Harry sorriu ainda mais.
– Harry! Eu estava te procurando a um tempão! – Jeff apareceu e tinha uma cara de poucos amigos, mas sorriu quando me viu. – Oi, , gostou do show? Seus pais já foram? – ele disse, olhando para os lados meio atordoado e eu ri. – Queria ter me despedido deles.
– Estava tudo perfeito, Jeff! Sinceramente, não sei o que seria do Harry sem você!
– EI! Conhece ele há cinco minutos e já está dando essa confiança toda? – Harry cruzou os braços e fez uma cara ofendida.
– O que eu posso fazer? Já disse que sou muito melhor que você, Styles! – Jeff sorriu convencido. – Obrigada, ! Então, vai com a gente para o hotel? Você dorme lá e nós damos um jeito de te mandar de volta para casa amanhã mesmo, no horário que preferir. – Sorri, aliviada por saber que teria como voltar, mas preocupada com uma coisa. Onde exatamente eu dormiria?
– Eu vou sim. Deixa só eu ir até o carro pegar as minhas coisas.
– Ok. Te encontramos aqui fora de novo em dez minutos no máximo. – Ele sorriu e segurou Harry pela camiseta, o levando de volta para o backstage.
Fui com até o carro e notei que ela evitava olhar para mim. Em silêncio, abriu a porta de trás e entregou minha bolsa. Ela estava com medo pela forma como eu reagiria por ter sido trocada agora que estávamos a sós. Resolvi brincar.
– Não vou esquecer esse vacilo tão fácil, ok? – Fiz um biquinho e ela revirou os olhos, rindo.
– Ah, vá! Vai dizer que não está toda derretida pelo convite do Harry? – Eu ri nervosamente e ajeitei a bolsa no ombro. – Viu? Eu sabia. Essa carinha boba não me engana. Agora, pelo amor de Deus, se cuida e me conta se rolar alguma coisa. Qualquer coisa, mesmo que seja um beijo ou uma lambida na bochecha. – Fiz uma careta.
– Você é nojenta, , mas pode deixar que eu conto, sim. – Puxei-a para um abraço. – Se cuida você também, não faça nada que eu não faria. Isso inclui transar com o Carlos, mas aí já sei que não posso contar com você.
– Não pode mesmo. – ela riu, se soltando, e mostrou a língua.
Então entrou no carro, colocou o cinto e baixou o vidro.
– Você vai encontrar com ele em algum lugar? – perguntei.
– Uhum. Num restaurante aqui pertinho. – Ela sorriu. – E quem sabe depois ele vire a sobremesa.
– Detalhes demais. – Coloquei as mãos sobre os ouvidos. – Detalhes demais. Falo contigo amanhã cedo, antes de voltar.
Enfim eu estava sozinha e me permiti soltar um grito baixinho. Depois de tantas emoções em um único dia, ter um momento só pra mim já estava me fazendo muita falta. Olhei para os lados e fiquei em dúvida se deveria voltar e procurar por Harry ou esperar ali mesmo como Jeff havia dito, mas então senti duas mãos em minha cintura.
– Finalmente você é só minha. – Harry disse bem perto do meu ouvido. Perto demais. Fechei os olhos, sentindo todos os pelinhos da minha nuca se arrepiarem. Virei-me e o encontrei me olhando com um sorriso divertido.
– Harry... – Resolvi dizer logo o que me preocupava. – Tem cama sobrando para mim lá? – Ele riu e eu me senti muito idiota. Era óbvio que tinha.
– Sim, . Você não precisa dormir comigo. – Sorriu de lado. – Se não quiser...
– Harry!
– Eu estou brincando. Calma! – Ele gargalhou e eu dei um tapa em seu braço.
Então Jeff apareceu, seguido por um grupo de pessoas com caras que misturavam cansaço e animação.
– , nossa estrela da noite! Essa é a banda, ou eu deveria dizer, bando de loucos que segue o Harry para todo lado. – Ele riu e ouvi vozes e cochichos zoando a péssima piada, mas Jeff não se deixou abalar. – Mas você vai ter tempo para conhecer todo mundo depois.
Ainda um pouco abalada por ser chamada de estrela, deixei que as mãos de Harry me guiassem pelas costas até um grande carro preto que estava encostado logo ao lado.
– Eles vão na van, que é maior. – Ele sorriu quando viu que eu olhava para fora do carro, preocupada com o destino do resto das pessoas presentes.
Eu estava no banco de trás com Harry e ia Jeff no banco da frente ao lado de Tom, o motorista. Em poucos minutos já seguíamos pelas ruas movimentadas e então minha cabeça encostou-se ao banco, fechando os olhos. Senti a mão quente de Harry sobre a minha e tombei a cabeça um pouquinho para o lado, abrindo apenas um olho. Observei seu rosto com calma. Eu tinha decidido ser muito cautelosa com a forma como iria interpretar suas atitudes pelo resto da noite, apenas por precaução. Ele sorriu cansado, mas sustentou meu olhar.
– . – Jeff me chamou e Harry puxou um pouquinho a mão, mas nossos dedos continuavam em contato. Minha pele formigava no ponto do encontro. – O Harry disse que você é formada em Teatro na melhor universidade da cidade. – Ele se virou no banco para poder me olhar e sorriu. – E disse que você é ótima no que faz.
– O final eu deixo por conta do Harry, mas o resto é verdade, sim. – Ri e olhei para Harry, levantando uma sobrancelha. Ele deu um sorriso divertido e apenas moveu os lábios, dizendo "mas é verdade".
– Eu acredito que nesse ponto ele esteja certo. – Jeff disse simplesmente e assumiu um tom mais formal. – Eu conheço várias pessoas influentes em San Francisco, , tenho vários contatos na cidade. Pessoas ligadas ao teatro, ao cinema. Acho que adorariam te conhecer.
Senti minha boca secar e Harry olhou para mim. Dessa vez sua mão envolveu a minha por completo, segurando-a firmemente. Ele queria me passar confiança. Confiança essa que eu nem sabia mais se existia em mim ou se poderia simplesmente recuperar algum dia.
– Jeff, eu não sei nem o que dizer. Significaria muito pra mim, mesmo. – O ouvi rir brevemente.
– Não precisa dizer nada, , tenho certeza de que se você tem o talento que Harry diz ter, muitas portas vão se abrir para você – ele disse de forma muito séria e eu me senti corar.
Busquei o olhar de Harry novamente e ele sorriu de forma doce e calma. Suspirei e olhei pela janela, observando as luzes que passavam rápidas e que, naquele momento, me pareceram muito mais brilhantes.
----
Em mais alguns minutos, chegamos ao hotel e o carro seguiu direto para a garagem. Passamos por um pequeno grupo de garotas que olhavam curiosas para o veículo, provavelmente tentando se certificar de que um de seus ocupantes era Harry Styles. Eu já estava achando muito estranha aquela movimentação toda só para conseguir chegar em segurança até o quarto. Eram esses momentos que me faziam realmente refletir sobre o preço que muitas vezes a fama pode cobrar. Abuso de drogas, depressão, noites em claro, assédio sem fim... Harry tinha sorte de ter tantas pessoas boas ao seu lado, determinadas a dar o seu máximo para vê-lo bem.
Descemos do carro e então eu vi a van chegando logo atrás de nós. Harry, Jeff e eu seguimos para um elevador que era grande demais para um elevador. Harry deve ter visto a minha cara espantada e riu brevemente.
– Ele dá acesso direto à cobertura. – Explicou, simplesmente, e eu soltei um "ah", concordando com a cabeça.
Quando chegamos ao último andar a porta se abriu, revelando uma sala bem grande e iluminada que já devia ter umas... dez pessoas? Como ou quando elas haviam chegado ali, eu não fazia ideia. Fiquei parada um pouco mais para o lado, torcendo para que uma parede me engolisse. Observei Harry ser atacado por mãos, abraços e sorrisos – alguns já bem bêbados – e Jeff se aproximou.
– Se você for mais para trás, vai sumir na parede. - Sorri culpada e ele riu. – Me deixa levar as suas coisas lá para o quarto. Na verdade... fica à vontade se quiser trocar de roupa ou algo do tipo. Vem, eu te mostro onde é. – Ele estendeu a mão e eu entreguei a bolsa e a jaqueta, ficando apenas com meu celular.
Segui Jeff por um corredor que era pelo menos duas vezes maior que o do meu apartamento. Passamos por três portas fechadas, parando na seguinte. O quarto não era muito grande, mas a cama me pareceu extremamente confortável e eu não tinha chegado nem perto. Oi, cansaço. Jeff largou minha bolsa e a jaqueta sobre uma cômoda e indicou uma porta.
– Banheiro. – Sorriu e eu assenti em silêncio, tomando consciência da minha bexiga apertada. – Depois volta lá com a gente. Não vale dormir agora, hein! Garanto que o Harry vem para cá e te arrasta de volta.
– Não duvido nada. – Nós rimos e eu fiz um sinal positivo. – Pode deixar que eu já vou.
Jeff assentiu e saiu do quarto, fechando a porta atrás de si. Respirei fundo, sentindo meus músculos reclamarem com a exaustão, e fui até o banheiro. Fiz xixi calmamente, agradecendo por estar em um ambiente em que, por alguns segundos, não precisava interagir com ninguém. Lavei as mãos e verifiquei meu estado no espelho, arrumando um pouquinho o cabelo com as mãos. Saí do quarto decidida a tentar interagir com quem quer que fosse.
Sem sinal de Harry e ainda me sentindo completamente deslocada, comecei a procurar um lugar para sentar. De repente ouvi mais um auê e a porta do elevador abriu novamente. Cinco seres humanos saíram de dentro dele.
– Eu não acredito que ele deixou a gente para voltar naquela van de novo! – O homem que eu havia identificado como o guitarrista falou. Seu nome era Mitch, se eu bem tinha ouvido Harry dizendo em algum momento.
– Estou com ódio, só preciso beber. – Uma morena revirou os olhos, as outras duas que a acompanhavam concordaram e então seus olhos caíram sobre mim. – ! – Ela disse e as três vieram até mim, cheias de sorrisos. – Famosa . Eu sou Sarah, baterista e cansada.
Eu ri e ela apresentou as outras duas. Em poucos minutos já estávamos fazendo comentários sobre as músicas e o show e eu me sentia muito mais à vontade. Fiquei maravilhada em perceber como todas as pessoas envolvidas com o trabalho de Harry realmente estavam sempre na mesma vibe que ele, de total dedicação a cada passo que davam, cada coisa que faziam. Tudo envolvia amor e cuidado ao extremo.
– . – ouvi primeiro a voz rouca, em seguida senti o metal gelado dos anéis de Harry contra a pele da minha cintura e arrepiei. De novo. Vi as três trocarem olhares rápidos e notei sorrisinhos brotando em seus lábios. – Esse é o momento em que eu roubo você para mim. – Ele ficou ao meu lado e sorriu para elas, uma das mãos ainda em minha cintura. – Desculpa. Vão achar outra para incomodar.
As três reviraram os olhos e mostraram os dedos do meio para Harry em uma sincronia perfeita, rindo em seguida. Recebi uma piscadinha de Sarah e tentei não levar muito a sério. Tinha a impressão de que elas sabiam muito mais do que demonstravam. Harry sorriu para mim e entregou um copo com um conteúdo que, à primeira vista, não me agradou.
– Bebe whisky? Posso pegar outra coisa se você preferir. – Ele segurou minha mão e me guiou entre as pessoas. Não pude deixar de notar que algumas me observavam de maneira curiosa enquanto outras cochichavam. Muito cedo para desejar mais uma vez que o chão me engolisse?
– Se você abre uma exceção, eu abro uma exceção. – Sorri, me lembrando do que ele havia dito mais cedo e o ouvi rir.
Havíamos chegado ao lado de fora, que consistia em uma grande área aberta com alguns banquinhos e mesas, além de uma vista incrível para a cidade. Parei de prestar atenção em Harry e continuei caminhando até o parapeito. Apoiei as mãos na beirada e olhei pra baixo. Era alto. Muito alto. Me perdi observando o movimento nas ruas distantes até que ouvi a respiração de Harry bem pertinho, atrás de mim, e então me virei. Seu rosto estava a centímetros do meu. Ele sorriu e se afastou pro lado, bebendo um gole do seu whisky. Copiei seu gesto e fiz uma careta.
– Então... – Ele começou e soltou o copo numa mesa ao lado. – Porra, eu não via a hora de poder ficar sozinho com você de novo. – Ele riu brevemente e eu sorri sem mostrar os dentes. Estava berrando por dentro. – O que você achou do show? Por favor, me conte tudo. Eu sou capaz de mudar os próximos ou cancelar a tour dependendo do que você disser. – Passou o indicador devagarzinho pelo pescoço, em um gesto dramático.
– Harry... – Eu ri e revirei os olhos. – Creio que tal atitude drástica não vá ser necessária. – Virei um pouco a cabeça e suspirei, olhando em seus olhos. – O show estava perfeito. – Ele abriu um sorriso enorme. – E sim, eu adorei as músicas. Todas elas. Toda aquela energia... As pessoas te amam demais, garoto! Estou muito orgulhosa, de verdade. – Sorri e contornei com o indicador a borda do copo.
– Olha só... Muito obrigada! – Ele fez uma pose pomposa. – É um elogio enorme vindo de você.
– Cala a boca. – Dei um soquinho em seu braço.
– Mas assim... Todas as músicas? – ele disse, ficando mais sério de repente. O momento pelo qual eu temia.
– Todas, Harry. – Levantei uma sobrancelha e ele virou bem de frente para mim. Percebi que ele esperava que eu continuasse. – Sério, eu... não estava esperando. Não sei nem explicar como eu terminei o show em pé, para falar a verdade. – Eu ri e levei a mão à testa, mordendo um pouquinho o lábio inferior. Harry me observava atentamente. – Harry, aquela história do sonho... É verdade? – Ele jogou a cabeça pra trás, gargalhando, e se aproximou mais um pouco.
– É verdade, sim. – E então deu um sorriso safado. – Foi um sonho meio errado.
– HARRY! – Senti minhas bochechas queimarem e ele riu ainda mais. – Mas você não me via há anos. Como...
– Eu não sei! – Ele deu de ombros. – Quem apareceu no meu subconsciente fazendo propostas indecentes foi você. E foi assim. – Ele estalou os dedos. – Foi o necessário para que eu me lembrasse da promessa que fiz e aí a música foi nascendo aos poucos. Foi como se... As coisas fossem simplesmente se encaixando.
– Eu não acredito nisso – eu disse e olhei pra baixo, dando mais um golinho no whisky. – Nossa, é muita informação para processar.
– No dia seguinte eu quis até voltar a falar com você, mas não te encontrei em nenhuma rede social. E procurei ontem também. – Ele revirou os olhos e eu ri brevemente.
– Eu me desfiz de todas elas tem um tempo já. Não sei se tenho interesse em voltar tão cedo.
– Está certo. Eu sou a pessoa famosa e você é quem se esconde. – Harry riu e deu um gole em seu copo. Eu sorri e dei de ombros. – ... – Ele me olhou sério e se aproximou um pouco mais, brincando com uma mecha do meu cabelo. – Eu preciso que você saiba que eu não parei de pensar em você desde o dia em que tive aquele sonho. E ele também não foi o último. Eu... Era como se a vida estivesse me mandando sinais, dizendo para correr atrás de você e recuperar o tempo perdido, sabe? Essa... – fez um movimento de pêndulo com o dedo – Coisa que a gente tem. – Eu sorri. Coisa era uma palavra que definia muito bem, inclusive todos os meus sentimentos completamente confusos. – Então depois do que aconteceu com a Lizzie... Aquilo foi a gota d'água. Eu entendi de uma vez que precisava estar do teu lado de novo. Independente de como fosse acontecer.
Eu olhava pra Harry e aos poucos deixava de prestar atenção em suas palavras, meu copo estava quase vazio e meus pensamentos pareciam um pouquinho mais embaçados, assim como os lábios de Harry pareciam muito mais interessantes. Quase conseguia sentir sua respiração batendo contra minha pele e seus olhos pareciam ter um brilho muito intenso sob toda aquela luz da cidade. Eu queria dizer muitas coisas, mas parecia não encontrar as palavras certas. Meus dedos tamborilavam nervosamente contra o vidro do copo e eu me sentia quase nua sob o seu olhar atento e silencioso enquanto ele aguardava uma resposta.
Fiz então a única coisa que me pareceu certa naquele momento. Sim, porque se eu estivesse mais sóbria com certeza teria agido de maneira diferente, mas estando ali, completamente cercada por sua energia, meu cérebro resolveu apenas descartar todas as outras milhões de possibilidades do universo e então me vi dando mais um passo a frente, praticamente colando nossos corpos. Ao contrário do que eu esperava, Harry não recuou ou desviou o rosto um centímetro sequer. Pelo contrário, seus olhos observavam em mim a mesma coisa que os meus buscavam nele: os lábios.
– Obrigada por sonhar comigo, pela música e... por voltar – disse bem baixinho, quase em um sussurro e bem próximo à sua boca. Tão próximo que, em um movimento pequeno demais que eu não soube se tinha sido meu ou dele, sua pele tocou a minha.
Senti a carne macia de seus lábios em contato com a região bem ao lado da minha boca e inspirei o ar profundamente. Meu coração batia com força contra as costelas, provavelmente me odiando por fazê-lo trabalhar de forma tão dura para me manter viva durante aqueles segundos. Fechei os olhos e senti o hálito quente de Harry se espalhar com leveza, quase dançando em minha pele, então subi lentamente uma de minhas mãos até seu rosto. Nossas bocas brincavam naquele espaço ínfimo, desejosas, provocando-se numa espécie de tortura gostosa demais. Mas então meio segundo se passou e Harry se rendeu, encerrando a batalha nos meus lábios. Pega de surpresa segurei-me em sua nuca e ouvi meu copo se estilhaçando entre nossos pés, meus dedos atrapalhados tinham se livrado do objeto que os impedia de tocar o ser à minha frente. Senti-o sorrir e se afastar um pouco.
– Alguém vai pagar por isso. – Ele disse contra meus lábios, com a respiração entrecortada.
– Eu vou fazer você pagar. – Respondi e ele abriu os olhos, me observando de maneira curiosa. – Muito caro. – Sorri de lado e juntei nossas bocas mais uma vez.
Harry virou nossos corpos com uma eficiência cirúrgica, deixando-me presa entre ele e o parapeito. Uma de suas mãos passeava com calma e cuidado pela extensão do meu braço, subindo e descendo. A outra segurava em minha nuca e puxava alguns fios de cabelo. Eu sentia pequenas descargas elétricas se movendo por todo o meu corpo, como se tentando me unir a ele para sempre. Nosso beijo não tinha pressa, mas tinha desejo, curiosidade. E buscava afoito por informações, vestígios, qualquer coisa que fosse de um passado muito distante, tentando encontrar qualquer resquício de Harry Styles e , ex-namorados. E eu sabia que eles estavam ali, pequenos, escondidos sob pilhas e pilhas de muita história para contar, loucos para saírem juntos pelo mundo, correndo livres como havia sido nas longas tardes perdidas em Holmes Chapel. Dois seres completamente necessitados um do outro.
Necessidade. A mão de Harry, que antes estava em meu braço, tinha descido um pouquinho mais e brincava com a barra da minha camiseta. Eu sentia a ponta de seus dedos intensificando o calor em minha pele. O whisky nos ajudava a queimar, tinha se tornado combustível puro para nossa chama reprimida. Mas era só um beijo e, como tal, deveria acabar. E assim, Harry se afastou lentamente. Os olhos sorrindo mais que a boca.
– E se eu disser... – Ele parecia não conseguir decidir entre olhar para meus olhos ou minha boca. Sua respiração ofegante se misturava à minha. – Que realmente não tem uma cama para você? – Riu eu revirei os olhos.
– Cala a boca, Styles. Eu não vou dormir com você hoje! – Olhei para seus lábios, mordendo os meus, completamente consciente de que não confiava na força de minhas próprias palavras.
Ele sorriu e eu me virei contra o parapeito, olhando para o horizonte iluminado. Harry me abraçou por trás e apoiou seu queixo em meu ombro.
– Nem se for só para fazer conchinha? – Ele pediu manhoso e eu ri.
– Eu nem te conheço direito. – Fingi uma voz séria. – Que indecente.
– Me deixa te conhecer então. – Harry disse.
– Eu estava brincando, Harry. – Fiz um carinho leve em seu braço.
– Eu estou falando sério! – Ele apertou mais seu corpo contra o meu e eu agradeci mentalmente, imaginando minha jaqueta quentinha e abandonada no quarto. – Quanto tempo nós ficamos longe? Sete, oito anos?
– É. Por aí... – Respondi, sem entender onde ele queria chegar com aquilo.
– Então a gente tem muita coisa para botar em dia. Vamos precisar de vários encontros.
– Está me chamando para sair, Styles? – eu disse e senti-o rir contra minha nuca.
– Estou, . Se você quiser.
Eu observava os carros que passavam lá embaixo como estrelas brilhando num céu muito escuro. Imaginei um mundo onde eu e Harry realmente pudéssemos fazer aquilo, sair como dois velhos amigos que dividem memórias e histórias novas e antigas. Sim, eu queria muito.
– E começamos quando? – Sorri ainda olhando os carros.
– Amanhã mesmo. É só não ir embora. – Ele respondeu e eu senti um pouquinho da minha alegria escorrer pela boca e pular pelo parapeito, se espatifando na rua lá embaixo.
Eu não podia não ir embora. Ou podia? Desde quanto a parte sã da vida me permitiria abrir mão para viver uma aparente loucura, por mais rápida que ela fosse?
– Oito encontros, . Nós precisamos de oito encontros. – Ele continuou, diante do meu silêncio.
– Oito? – Perguntei, mas então a resposta ficou óbvia no mesmo instante. – Para oito anos. – Sorri e me virei para Harry.
Suas mãos permaneciam em minha cintura enquanto seus olhos perscrutavam os meus em busca de algum sinal de que ele havia sido abandonado sozinho com seu plano. Sustentei seu olhar, tranquila com o fato de que ele não encontraria nenhum.
– E depois? – Perguntei simplesmente, só porque poderia perguntar, mesmo sabendo o tamanho da injustiça que era esperar por respostas impossíveis.
– Depois... – Ele parou por um momento, mordendo os lábios e fechando os olhos, então os abriu de novo e sorriu. – Depois eu te levo para outra floricultura e consigo mais um girassol. – Ri diante da solução boba que ele havia encontrado.
Não era nem de perto algo que deveria me fazer sentir segura. Por outro lado, eu também não me sentia tão em paz e tão certa do que queria até vê-lo parado na porta do meu apartamento. Minha vida tinha dado uma volta gigante e completamente inesperada em um período de pouco mais de vinte e quatro horas. O que eu tinha em mãos agora me dizia que esperar por soluções mágicas era imbecil demais.
Não. Eu já tinha muita sorte de estar ali sentindo os braços de Harry ao meu redor e, naquele momento, não desejava ter outra coisa ou estar em outro lugar. Eu também não sabia o que o dia seguinte reservava para nós dois, mas me permitiria sentir o frio na barriga que aquela pequena incerteza gerava.
Olhei mais uma vez em seus olhos. Ridiculamente, escandalosamente, covardemente verdes. Olhei para seus lábios rosados e todas as manchinhas reunidas na sua pele, formando um conjunto perfeito. Deixei as pontas de meus dedos contornarem delicadamente seus traços e abri minha boca, sorrindo antes de dizer qualquer coisa.
– Tudo bem, Styles, acho que podemos trabalhar com oito encontros.
Eu tamborilava os pés de forma quase incômoda, mas ainda no ritmo da música. Era um hábito que simplesmente não conseguia largar. O dia estava relativamente quente, por um milagre, e o céu azul contrastava com o verde das árvores que rodeavam o bairro mais ao fim da rua. A vista ridiculamente perfeita daquela janela tirava facilmente o fôlego de qualquer um. Eu, que morava ali naquele mesmo apartamento há cinco anos, ainda não havia me acostumado. Ali, em uma das ruas mais altas, tinha-se uma visão particularmente privilegiada da cidade. Era simplesmente impossível ver São Francisco em todas aquelas cores e não derreter um pouquinho por dentro.
Janis alcançava mais uma das notas irritantemente perfeitas em Cry Baby. Levei os olhos até o vinil que eu preservava com tanto carinho e cantei o último verso junto dela, rindo da minha incrível falta de habilidade com a música. O disco havia sido um presente de despedida da minha irmã, assim como todo o meu amor por Janis Joplin, desenvolvido por culpa dela. O simples fato de eu estar ali naquela cidade era culpa dela e eu não podia nem mais ligar para dizer o quanto sentia a sua falta, não podia mais ouvir sua voz cantando desajeitada junto comigo as nossas músicas preferidas. Fazia dois meses desde que o acidente de carro mais estúpido da face da Terra havia tirado o melhor pedacinho de mim. Simples assim, como se arranca uma flor da terra.
Sequei algumas lágrimas que escorreram e soltei a fumaça, observando-a se dissipar lentamente através da fresta da janela, em direção ao céu. Fechei os olhos e imaginei que ela levava junto de si uma oração silenciosa.
Aos poucos senti meu corpo começar a relaxar e me acomodei melhor na cadeira, apagando a pequena ponta do cigarro no cinzeiro que esperava paciente na mesinha ao lado. Deixei a cabeça pender levemente para trás e meus olhos pesaram, mas tentei me manter acordada. Sabia que se dormisse seria difícil voltar. Estava bem ciente de que comecei a me perder facilmente nas últimas semanas, depois de tudo o que acontecera. Eu perdia o sono, meus compromissos, e todas as entrevistas de emprego. Perdia-me aos poucos. Não conseguia mais dar respostas ou desculpas plausíveis para meus pais, nem mesmo para minha mãe, que era uma pessoa cheia de resiliência e paciente demais. Eu sabia que eventualmente ela compreenderia o acidente como algo que simplesmente não havia como mudar, que deveria ficar no passado, mas a dor não. A minha nunca ficaria no passado. Pelo contrário, a dor que a perda de Lizzie me causara parecia aumentar cada vez mais e, em insistentes ligações, minha mãe tentou me ajudar de alguma forma. Tudo isso nas três primeiras semanas, mas depois simplesmente parei de atender e também não quis voltar pra casa. Eu não conseguia nem me sentir egoísta por não estar ao lado deles, só sabia que ficar lá, naquele mesmo ambiente, sem ela não me ajudaria em nada.
Freedom's just another word for nothin' left to lose
Liberdade é só outra palavra para nada a perder
Nothin', don't mean nothin' hon' if it ain't free, no no
Nada não significa nada, querido, se não é livre
Me and Bobby McGee - Janis Joplin
Eu cantava baixinho e minha voz parecia muito distante dali, quase como se pertencesse a outra pessoa. Merda. Se continuasse naquele ritmo acabaria caindo no sono e só tinha mais duas horas até a próxima entrevista. Eu não pretendia, não podia perder mais aquela. Não depois que meio mundo parecia ter se movimentado pra me ajudar.
Ultimamente eu tinha a impressão de que havia entrado para algum tipo de programa de ajuda à inválidos, só que, naquele caso, eu era a inválida.
Ouvi a campainha tocar, como numa melodia muito longe, e tentei levantar a cabeça, sem sucesso. Bufei com a derrota e massageei as têmporas. Conseguia sentir uma dor de cabeça se aproximando. O som irritante soou mais uma vez pelo apartamento.
– Já vai, caralho! – gritei e me levantei de uma vez, juntando todas as minhas forças.
Senti-me um pouco tonta e segurei na parede mais próxima. Respirei fundo e fixei a porta com o olhar, dando três passos largos até ela. Segurei a maçaneta com firmeza, me xingando mentalmente pela milionésima vez por não ter escolhido um apartamento com uma merda de olho mágico na porta. Tinha bem certeza de que qualquer dia acabaria dando de cara com um maníaco qualquer, ainda não entendia como os porteiros simplesmente deixavam algumas pessoas subirem. Aquele parecia ser o único lugar na cidade em que uma insanidade daquelas acontecia.
Passei a mão pelos cabelos rapidamente, mas senti-os enroscarem em algum nó e xinguei baixinho pela tentativa fracassada de me mostrar um pouco mais apresentável para quem quer que fosse. Puxei o ar mais uma vez e então abri a porta.
Não.
Não, não, não, não. Era tudo o que meu cérebro parecia repetir.
Conseguia sentir minha boca seca e meu coração acelerado, como se tentasse expulsar as costelas do peito. Meus lábios se moveram uma, duas vezes, mas nenhum som foi ouvido. Eles observavam de cima a baixo o ser parado na minha frente, o cabelo cheio de cachos bagunçados, a camisa florida com alguns botões abertos, deixando à mostra o crucifixo sobre o peito, as tatuagens evidentes que cobriam a extensão de seus braços e uma parte descoberta do peito, a mão apoiada contra o batente da porta. Perto demais, quase onde a minha foi parar.
– My sunflower! – um único sorriso de lado.
Minha mão livre segurou com força na madeira da porta, pisquei rapidamente e tentei abrir um sorriso, mas então senti minhas pernas ficarem mais fracas e o ambiente mais escuro. A última coisa que vi foram dois olhos profundamente verdes me encarando. Ele estava ali. Harry Styles estava bem na minha frente.
– . – Senti um cutucão leve na bochecha.
Abri os olhos lentamente, torcendo para que a visão que ainda me atormentava tivesse sido provocada pelo baseado. Não. Aparentemente não. Ele parecia bem real. Seu rosto bem próximo do meu e os olhos me observando de forma preocupada. Levei um dedo à boca, mordendo-o talvez com força demais, sentindo meu coração acelerar novamente.
– Ai. Já achei que ia precisar chamar uma ambulância. – Harry levantou minha cabeça, sentou no sofá e deitou-a em seu colo. – Acho que a sua pressão baixou, . – Ele me olhava com um sorriso brincando nos lábios e acariciava meus cabelos.
– Harry. – Seu nome saiu completamente seco por entre meus lábios – O que... – Levantei de seu colo rapidamente, me jogando no canto oposto ao seu do sofá e encolhi as pernas.
Eu ainda não estava completamente certa de que ele estava ali. Poderia muito bem estar alucinando, o que seria ótimo. Mais um problema pra adicionar à minha lista. Harry me observou com um olhar curioso.
– Eu sei. Faz muito tempo, né? – Ele sorriu, culpado - Desculpa chegar assim, mas é que eu não tinha mais o seu número e sua mãe achou que se avisasse que eu viria você não ia me deixar entrar. – Óbvio? – Ainda bem que eu vim, de qualquer forma. – Ele soltou uma gargalhada e manteve o sorriso bem grande – Consegui te segurar antes que você batesse a cabeça no chão. Teria sido bem ruim acordar sozinha aqui, né?
– Sim. – Ainda tentava encontrar alguma explicação minimamente decente pra tê-lo ali no meu sofá. – Harry, você... Está fazendo o que aqui?
– Eu vou te explicar tudo, pode ser? Você quer ir para algum lugar? Talvez a gente possa conversar com mais calma.
– Acho que sim. – Mordi o lábio e me perdi por meio segundo em seus olhos. – Eu só vou tomar um banho. – Então me lembrei do motivo pelo qual deveria realmente tomar banho. – MERDA! – Levantei do sofá em um pulo e Harry me acompanhou – Que horas são?
Visualizei meu celular ao lado do cinzeiro e fui até ele, torcendo para que não fosse tarde demais. Faltavam cinco minutos para as cinco horas de tarde, o que significava que eu já estava no mínimo vinte minutos atrasada. Como duas horas tinham passado tão rápido?
– Merda! – Passei a mão pelos cabelos e olhei para Harry, que continuava parado ao lado do sofá. – Merda, merda, merda. Que merda!
– , fica calma! – Ele veio até mim e colocou uma mão em meu ombro.
– Eu tinha uma entrevista de emprego, Harry! Do outro lado da cidade! – Senti lágrimas acumuladas nos meus olhos. – Eu não podia perder mais essa. – Desabei no sofá e ele sentou pacientemente ao meu lado. – Não podia.
– Shh. – Harry passou a mão pelos meus cabelos. – A gente vai resolver isso, tá? Eu prometo! Vai ficar tudo bem. Ei, olha pra mim. Respira fundo! – Encarei seus olhos e obedeci. – Isso. Vai tomar aquele banho agora. Eu vou esperar bem aqui.
Harry abriu mais um sorriso e se ajeitou no sofá. Eu sorri de volta, levantei e fui até meu quarto. Peguei uma toalha no guarda-roupa, uma calcinha e o vestido mais soltinho que tinha. Sentia meu corpo inteiro tremer enquanto caminhava até o banheiro no final do corredor. Tinha a impressão de que poderia desmaiar mais uma vez a qualquer momento, mas dessa vez o motivo estava instalado no sofá da minha sala. Bem ali, como se fizesse parte da mobília.
Encarei meu reflexo no espelho enquanto esperava a água esquentar e, por um segundo, quase senti pena de Harry. Eu estava péssima que, na verdade, era uma palavra muito bondosa. Tinha pedacinhos de rímel grudados nas bochechas e meu cabelo parecia ter sido vítima de um ataque de pássaros furiosos. Minha roupa não estava em melhores condições.
Assim que entrei debaixo do chuveiro me senti instantaneamente melhor. Deixei que a água relaxasse meus músculos enquanto tentava clarear a mente. Havia perdido mais um emprego, isso era fato. Continuava sendo apenas uma decepção gigante para todos à minha volta e ele estava ali. Harry Styles estava no sofá da minha sala.
Harry fucking Styles, o músico mundialmente famoso. Harry Styles, meu melhor amigo de infância. Harry Styles, meu ex-namorado.
Bom, para resumir a história até aqui, preciso explicar como é que o garoto de cabelos castanhos, estupidamente lindo e com os olhos mais verdes do mundo veio parar na minha vida. Ou talvez seja melhor dizer que não me lembro de um único dia, nos meus 26 anos vivendo nesse planeta, em que ele não estivesse presente.
Eu e Harry nos conhecemos aos 4 anos de idade, da forma menos amigável possível. Ele afirma até hoje que tentei atropelá-lo com minha bicicleta amarela de rodinhas, mas eu tenho plena certeza de que Styles praticamente se jogou na minha frente enquanto Nuvens, seu pequeno cachorro descontrolado, o arrastava pelo parque. Seja como for, meu futuro melhor amigo se encontrava no chão com alguns arranhões enquanto eu, em choque, segurava minha mão, que sangrava com um corte ridículo que desde então se tornou minha cicatriz preferida.
Depois daquele dia, nossas mães não se desgrudaram mais. A amizade entre nossas famílias foi apenas crescendo e, no dia em que a casa ao lado da nossa foi colocada à venda, Harry Meu Melhor Amigo também se tornou Harry Meu Vizinho. Eu passava todas as tardes das quais consigo me lembrar na casa dele, que era ridiculamente maior que a nossa e, enquanto Harry crescia e ficava cada dia mais lindo, eu era apenas , nada muito especial, como eu costumava dizer. Meus pais eram advogados, o que sempre nos proporcionou uma vida relativamente confortável, eu não podia reclamar. De qualquer forma, aquela era a nossa vida. Eu, Harry, Nuvens, e nossos dias gastos em brincadeiras sem fim.
Foi assim durante todo o ensino fundamental e médio, dividindo experiências e crescendo. Sempre lado a lado. Sempre eu e ele. Harry foi minha primeira paixão, meu primeiro beijo e, pouco tempo depois, meu primeiro namorado. E ali do meu mundinho, eu acompanhei as épocas mais loucas da vida dele: do X Factor à formação da One Direction. Todas aquelas fãs, aquela fama e a insanidade que só uma carreira que decola rápido como a dele poderia acarretar. Assim nós terminamos nosso ciclo. Nosso pequeno universo não sobreviveu – e qual sobreviveria? – ao mundo novo que se apresentou a ele, mas terminamos em bons termos, eu diria. Em 2012 eu decidi deixar nossa cidade de vez. Precisava de uma vida nova, então simplesmente convenci meus pais que mudar de continente seria a melhor ideia. Talvez um pouco radical, mas ainda assim o que eu precisava. Minha irmã foi a primeira a concordar com tudo. Seria São Francisco, sem dúvidas.
A cidade cheia de vida e cultura abraçou a mim e à , minha melhor amiga. E ali, tão longe de casa, eu cursei a faculdade de Teatro enquanto via Harry crescer cada vez mais em beleza e talento. Eu formei e trabalhei como professora por algum tempo em uma companhia pequena, mas com potencial, tive dois relacionamentos fracassados e minha primeira demissão. Eu não tinha mais tempo para as ligações corridas, as palavras distantes embora carinhosas com Harry e, assim, nos afastamos completamente. Durante os últimos anos o contato mais próximo que eu tinha com ele se dava através de fotos em sites de fofocas. Novas namoradas, novas músicas, o fim da banda. O início da carreira solo.
E assim eu era jogada de um emprego para outro enquanto já trabalhava em uma empresa relativamente grande de marketing digital no centro da cidade e minha irmã, lá longe, havia se tornado psicóloga infantil e namorava caras que não a faziam feliz. E foi por causa de um deles que ela havia se enfiado em seu carro completamente embriagada em uma noite fria. voltou para São Francisco comigo na manhã seguinte ao enterro e aquela era a minha rotina desde então. Eu dormia pouco e fumava muito, muito mais do que gostaria de admitir, mas estava aos poucos e com a ajuda de Sheila, minha psicóloga, cuidando de todas aquelas questões. Então tudo isso basicamente me levava até ali, naquela tarde quente.
Desliguei o chuveiro, sem ter noção de quanto tempo havia passado ali dentro do banheiro. Perguntei-me se Harry ainda estaria na sala. Teria sido muito rude deixar Harry Styles tomando chá de cadeira? Provavelmente. Teria sido muito rude deixar meu ex-namorado, do qual eu não tinha notícias decentes há mais de sete anos e que havia brotado na minha casa sem aviso prévio tomando chá de cadeira? Nem um pouco. Dei de ombros e desembacei o espelho do banheiro, observando com calma o meu rosto. Sorri satisfeita ao notar que já estava muito melhor. Sequei-me e me vesti, enrolando a toalha na cabeça em seguida. Ouvi meu estômago roncar e me lembrei do almoço miserável de algumas horas atrás. Talvez nós pudéssemos sair para comer alguma coisa ali perto. Bom, na verdade eu não sabia exatamente se ele poderia sair, não sabia como as coisas funcionavam quando se é um super astro do pop com fãs enlouquecidas e câmeras te seguindo vinte e quatro horas por dia. Talvez ele não pudesse simplesmente ir comigo até o café da esquina.
Passei pelo corredor cantarolando alguma melodia aleatória e entrei no quarto, dando de cara com Harry sentado na cama.
– Olha só! – Ele sorriu de lado e seu olhar se demorou em mim por mais tempo que o normal. – Nem parece a sobrevivente do Woodstock que eu encontrei lá na sala.
Sorri e me aproximei da cama, meio sem jeito. Eu queria expulsá-lo dali, mas como? Não estava conseguindo nem reagir direito, quanto mais arrumar palavras para mandá-lo embora. Eu queria dizer que não era um bom momento, que minha vida estava uma merda e a culpa de eu ter perdido a entrevista era, em parte, dele. Sim, porque tenho bem certeza de que vê-lo parado na minha porta, depois de tanto tempo, havia ajudado meu corpo a falhar miseravelmente na missão de me manter consciente.
Sem ver outra saída mais fácil, sentei-me ao seu lado e cruzei as pernas, só então reparando que ele segurava um prato com um sanduíche. Então ele também já conhecia a minha cozinha?
– Ah. – Ele notou meu olhar e sorriu. – Eu tomei a liberdade de preparar alguma coisa pra você comer. Levei algum tempo para encontrar tudo naquela bagunça, mas acho que me saí bem! – Ele virou para a mesinha de cabeceira e pegou um copo que eu também não tinha visto. – E trouxe suco! – Ele sorriu de novo. Puta sorriso gostoso do caralho!
– Hmm. Obrigada... eu acho. – Sorri sem mostrar os dentes e tirei o prato de suas mãos.
Dei uma grande mordida no sanduíche, mastiguei rapidamente e engoli, sentindo meu estômago agradecer. Podia sentir seus olhos em mim enquanto comia e entendia sua curiosidade, afinal, eu também estava. Queria saber o que ele estava fazendo ali no meu pequeno apartamento insultando minha cozinha e me fazendo sanduíche. E queria saber, acima de tudo, como e quando diabos ele tinha ficado tão gostoso. Acho que perdi esse parágrafo na matéria da última revista.
– Então... – Ele acabou com o silêncio que, estranhamente, não era tão desconfortável. – Vamos começar pela parte onde você decidiu se jogar de cabeça numa tentativa de reviver os anos 60 ou pelo momento onde você começou a ignorar a sua mãe? – Ele sorriu e se ajeitou melhor na cama. Pronto. Então era daquilo que se tratava a visita inesperada. Eu deveria ter imaginado.
Levei alguns segundos para escolher a melhor resposta e tomei um grande gole do suco antes de continuar.
– Harry, minha mãe te mandou para cá, né? Quem mais sabe disso? A ? – perguntei, finalmente percebendo que, pelo horário, minha amiga já deveria estar em casa.
Tirei a toalha do cabelo, jogando-a numa cadeira ao lado da cama e comecei a desembaraçar os fios com os dedos. Encarei Harry mais uma vez, incisivamente.
– , me escuta. – Ele suspirou longamente e passou a mão pelos cabelos, empurrando-os para trás – Eu sei que provavelmente não sou a melhor pessoa para estar fazendo isso ou, pelo menos, não a que você queria ver agora. Também sei que não faz muito sentido eu estar aqui depois de tanto tempo. – Ele levantou um pouco os ombros. – A sua mãe me ligou há umas duas semanas e parecia muito, muito preocupada com você. Aí eu aproveitei que estava passando o final de semana em casa e fui até lá falar com ela. Nós conversamos muito, ela se abriu comigo e... – Harry olhou para as próprias mãos. – falou sobre toda a barra que você estava passando. Eu me senti tão mal, .
Harry levantou os olhos para mim, mas eu continuei em silêncio, apenas ouvindo o que ele tinha a dizer.
– Nós nunca deveríamos ter nos afastado como aconteceu, e a Lizzie, ela... ela também estava passando por uns problemas, né? Acho que eu a vi pela última vez há uns dois anos. Ela estava sempre com o consultório super cheio, realmente parecia uma profissional maravilhosa. A sua mãe disse... – A voz dele ficou embargada e eu também senti um nó na garganta. – Ela disse que as crianças a adoravam. – Harry sorriu e segurou minha mão.
Eu larguei o prato e o copo vazios no chão, ao lado da cama. Respirei fundo a fim de conter as lágrimas e sorri de volta.
– Elas adoravam, sim. – Minha voz tremeu levemente. - Está sendo tão difícil, Harry. Tão difícil sem ela. Eu não a via há mais de um ano! Sabia dos problemas que estava enfrentando com aquele babaca, chamei-a para cá mais vezes do que posso contar, mas ela estava sempre estava muito ocupada, sempre dando mais atenção para os outros do que para si mesma. E agora eu não posso fazer mais nada. – Olhei para cima e inspirei o ar profundamente, tentando me acalmar.
– Hey! – Ele acariciou as costas da minha mão com o polegar. – Não tinha nada que você pudesse fazer, . Eu sei que é foda, mas você não precisa e nem pode parar sua vida por isso. Ela iria querer te ver bem, eu tenho certeza! Ela tinha tanto orgulho de você!
– Orgulho de que, Harry? Não tem muito em mim para se orgulhar. – Puxei minha mão de volta. – Eu não consigo nem arrumar a bosta de um emprego.
– ... – Ele revirou os olhos e riu – Eu conversei com a sobre isso. – Oi? – Você tem que parar de procurar emprego em escolas de teatro beirando à falência, garota! O teu talento sempre foi estar sob os holofotes. Atuar! E não faz essa cara porque você sabe disso tão bem quanto eu! Ou será que eu vou precisar te lembrar de todas as vezes que paguei ingressos para assistir àquelas peças tuas?
E então eu ri pela primeira vez naquele dia.
– Que bom que você confia o futuro da minha carreira às peças de teatro que apresentei aos doze anos, já é muito mais do que eu estou fazendo por mim. – Harry me observava com um brilho diferente nos olhos. – Que foi?
– Tinha esquecido como é bom te ver sorrindo.
– E eu tinha me esquecido de como era bom sorrir. – Era a mais pura verdade. Os últimos meses foram tão pesados que só aquelas horas com ele já pareciam preencher um vazio de anos e agora eu me pegava, verdadeiramente e pela primeira vez em muito tempo, querendo sentir essa energia.
– Vem aqui. – Harry me puxou para mais perto.
Eu me ajeitei um pouco mais, meio desajeitada, e encostei a cabeça em seu peito. E aconchegada ali, me deixei ser atingida por uma mistura de sentimentos. Envolvi meus braços ao seu redor e me perguntei quanto do Harry que eu conheci ainda estava ali naquele homem tão diferente, tão cheio de sucesso. Seu perfume não era mais o mesmo do qual eu me lembrava, mas era ainda melhor, eu precisava admitir. O cabelo havia crescido e as roupas certamente haviam mudado.
Mesmo assim, Harry Styles, meu amigo e primeiro namorado, ainda estava em algum lugar no brilho dos seus olhos sempre tão verdes e nas covinhas daquele sorriso desgraçadamente desconcertante. Eu nunca mais havia pensado na possibilidade de voltar para aquele abraço tão conhecido, mas estar nele parecia algo muito maior do que eu merecia e muito melhor do que havia sonhado que ainda pudesse me acontecer.
Afastei-me um pouquinho e vi que Harry sorria abertamente. Deixou seus braços soltos ao lado do corpo e eu peguei uma de suas mãos entre as minhas.
– Para que tantos anéis? – Segurei uma das joias entre meus dedos e ele soltou uma breve risada nasalada.
– Tem que combinar com todo o resto desse estilo meio...
– Anos 70? – Completei.
– Tipo isso. – Ele piscou um olho, de forma marota.
– Eu gostei. – Sorri sinceramente. Já estava gostando de muitas coisas sobre ele.
Ele sorriu de volta e desviou o olhar para o local logo abaixo da minha mão. Passou a pontinha do indicador ali, de forma bem leve, me causando um arrepio gostoso. Ele observava a pequena tatuagem de girassol no meu pulso esquerdo.
– Eu fiz logo depois que voltei de lá. Depois... do funeral – respondi a pergunta antes que ele a manifestasse. – Para guardar ela em mim, de alguma forma.
– , ela é linda. – Sua voz tremeu levemente, mas ele sorria.
– Você lembra como tudo isso começou? – Nós rimos juntos. – Ela colocou o apelido em mim e uma semana depois...
– Todos os nossos amigos te chamavam de sunflower. – Harry sorriu de lado. – É uma lembrança muito linda.
Sorri de volta e suspirei. Falar sobre a Lizzie com ele era muito mais fácil, leve e bom.
– Então... Joplin, huh? – Ele mudou de assunto diante do meu silêncio.
– Mais uma lembrança dela. – Dei de ombros e ri. – Sempre foi nossa cantora preferida.
Levantei da cama e puxei Harry pela mão. Caminhamos até a sala.
– Eu gostei bastante do que você fez aqui. – Ele olhou em volta. - Quantas cores têm? – E franziu o cenho.
– Oito. – Levantei os ombros e sorri, observando as paredes pintadas com manchas aleatórias coloridas. – Não achou demais?
– Ah sim. Certamente é demais. – Cruzei os braços e levantei uma sobrancelha. Harry riu e caminhou até o aparelho de som. – Mas não para a irmã de Lizzie , a maior fã da Janis Joplin que já conheci. Achei que combinou bastante. Na verdade... – Ele parou por um momento e sorriu de lado. – Se você não tivesse desmaiado bem na minha frente eu já ia fazer uma piada sobre você estar fumando e ouvindo Janis Joplin nessa sala colorida, . Ah, e em São Francisco! Você, minha querida, virou um clichê ambulante.
– Cala a boca, Styles! – Ri e dei um soco em seu braço. – Você também não está muito longe disso. Queria saber o que suas fãs de 13 anos acham desse visual de vô.
– Hey! Nem todas têm 13 anos! E elas gostam, tudo bem? Fim de discussão. – Ele riu e tirou um disco da estante. Cheap Thrills, de 1968. – Posso?
Eu assenti, sorrindo, e ele posicionou o objeto com cuidado sobre o aparelho, soltando a agulha em um ponto específico, um ponto que eu conhecia bem demais. Uma de nossas músicas preferidas.
Abri um sorriso quando as primeiras notas de Piece of My Heart se espalharam pelo ambiente. Harry sorriu e começou uma dança estranha.
– C'mon! – Ele acompanhou Janis e me puxou pela mão, me fazendo rir.
Ao juntar nossos corpos, senti meu coração batendo bem perto do seu e me permiti relaxar por um momento. Seu perfume me fazia querer passar horas ali.
Didn't I make you feel like you were the only man? Yeah
Eu não te fiz sentir como se você fosse o único homem? Sim!
And didn't I give you nearly everything that a woman possibly can?
Eu não te dei quase tudo que uma mulher possivelmente possa dar?
Honey, you know I did
Querido, você sabe que sim!
And each time I tell myself that I, well I think I've had enough
E a cada vez digo a mim mesma que eu, bem, acho que tive o bastante
But I'm gonna show you, baby, that a woman can be tough
Mas eu vou te mostrar, baby, que uma mulher pode ser durona
Movimentamos os pés em uma espécie de valsa esquisita demais e senti os dedos dele escorregarem para a minha cintura, onde fizeram uma leve pressão. Cantamos o refrão juntos, gritando a plenos pulmões e juntando nossas risadas em seguida. Meu coração estava leve ali com ele, leve demais. Era quase como se todos os problemas do mundo tivessem sumido.
You're out on the streets looking good
Você está fora, nas ruas, parecendo bem
And baby, deep down in your heart, I guess you know that it ain't right
E baby, bem dentro do seu coração, eu acho que você sabe que isso não é correto
Never, never, never, never, never, never hear me when I cry at night
Nunca, nunca, nunca, nunca, nunca me ouve quando eu choro à noite
Babe, and I cry all the time
Babe, e eu choro o tempo todo
But each time I tell myself that I, well I can't stand the pain
E a cada vez digo a mim mesma que eu, bem, não consigo suportar a dor
But when you hold me in your arms, I'll sing it once again
Mas quando você me segurar em seus braços, vou cantar mais uma vez
Harry me fez girar no mesmo lugar e me trouxe para perto de seu peito mais uma vez. Olhei em seus olhos e vi que eles diziam muitas coisas que ainda não haviam sido pronunciadas, e soube que talvez nem fosse necessário. O silêncio havia sido simplesmente estabelecido, como perdão pelos anos em que ficamos distantes. Não tínhamos mais feridas abertas, nem ressentimentos, o que havia pela frente era só muito tempo a ser recuperado e eu sabia que, de alguma forma, nós devíamos aquilo um ao outro.
Durante o solo, me permiti encostar a cabeça na curva do seu pescoço e senti seu perfume me inebriar completamente. Era melhor do que qualquer droga que eu pudesse sequer sonhar em provar. Fechei meus olhos e me lembrei de tudo o que vivemos juntos durante tantos anos, enquanto éramos apenas nós dois dançando ao som daquela mesma música na cozinha da sua casa, tanto tempo atrás. Imaginei como tudo teria sido se nunca tivéssemos nos separado, se nunca tivéssemos deixado de nos falar. Eu sabia que deveria ter sido assim.
Só agora eu conseguia sentir com clareza a falta que ele me fizera durante todos aqueles anos e seus olhos me disseram a mesma coisa quando me afastei levemente, observando seu semblante calmo. Eu vi oito anos refletidos naquelas íris brilhantes, oito longos anos de uma espera que só ali, naquele momento, parecia gritar entre nós. Nós tínhamos tanto para pôr em dia, eu tinha tanto para viver e também tive a certeza de que deveria e queria fazer aquilo. Por mim e por ela. Eu seguiria em frente pela chance que foi tirada de minha irmã.
Take it
Leve-o!
Take another little piece of my heart now, baby (whoa, break it)
Leve outro pedacinho do meu coração agora, baby!
Break another little bit of my heart, now darling, yeah, yeah, yeah, yeah (whoa, have a)
Quebre outro pedacinho do meu coração, agora querido, sim, sim, sim, sim
Have another little piece of my heart now, baby, hey
Possua outro pedacinho do meu coração agora, baby, hey
You know you got it, child, if it makes you feel good
Você sabe que pode, criança, se isso te faz sentir-se bem
Assim que as últimas notas tocaram, Harry me abraçou mais forte e então caímos no sofá. Um soluço fraquinho saiu do fundo da minha garganta, seguido de algumas lágrimas. O que eu sentia não era mais tristeza, era alívio. E como sentia meu peito muito mais leve, pude sorrir.
– Melhor agora? – Harry sorriu e secou as lágrimas com seus polegares.
– Muito melhor! – Ri e relaxei a cabeça no sofá – Eu senti falta disso – disse de olhos fechados.
– De mim? – Ele disse e me fez abrir um dos olhos só para vê-lo ostentando um sorriso convencido. – Eu sei que estou gostoso, vai. Pode admitir.
– Não cresceu só em tamanho não, né, Styles! – Eu ri. – Porque essa autoestima está poderosa! – Ele deu de ombros e sorriu.
– Que horas são? – ele disse e tirou o celular do bolso. – Deus, já são quase oito e meia! Ainda bem que hoje eu estou de folga. Falei para aquele povo todo nem me ligar, eu precisava de um tempo a sós com uma pessoinha muito especial. – Harry sorria com os lábios fechados e eu cheguei mais perto dele.
– Obrigada – disse simplesmente e olhei em seus olhos. – Não é todo mundo que tem esse poder de me tirar do fundo do poço. – Harry apenas sorriu em resposta e fez um carinho gostoso em minha bochecha.
Dez segundos depois a porta do apartamento foi escancarada e uma com os cabelos completamente desajeitados passou por ela. Seu olhar ia de Harry para mim várias vezes e então ela largou as sacolas no chão e uma grande caixa de pizza na mesinha de centro da sala.
– Harry Fucking Styles. – Sua boca formava um grande O. – Por um momento eu achei que você não fosse conseguir.
– ! – Ele se afastou um pouquinho de mim antes de levantar do sofá. – Você sabe que esse meu segundo nome aí está um pouco errado. – Abriu os braços para a minha amiga, que se aconchegou neles. – Obrigada por me dar esse tempo, deu tudo certo. – Harry olhou em minha direção e sorriu.
Eu apenas observava a cena em silêncio e então levantei, também abraçando .
– Quer dizer que eu estava certa, hein? Foi tudo um planinho de vocês dois. – Harry deu de ombros e sorriu, admitindo a culpa.
– Foi mesmo. E vi que funcionou, né? – revirou os olhos e riu. – Achei que nunca mais iria ver vocês dois juntinhos assim. Se ao menos a... – seu silêncio caiu como um tijolo sobre nós. – Bom, que bom que estamos aqui, né? – Ela sorriu de forma a consertar o erro. Eu me perguntava quando é que minha irmã deixaria de ser um tópico delicado.
– , eu fiquei imaginando... – Harry pegou as sacolas do chão e foi na direção da cozinha. Nós o seguimos. - Se tivesse sido você ao invés de mim a abrir a porta hoje e ver a desmaiar. – Ele riu e me olhou com as duas sobrancelhas bem levantadas. - Sei que você não é muito boa com primeiros socorros.
– Nem se preocupa. – Dei de ombros, olhando para a minha amiga. – Só mais um episódio envolvendo maconha e pressão baixa. Ou o almoço.
– Caralho, ! Eu já falei para você começar a comer direito. Garanto que terminou com aquela gororoba que sobrou do seu – Fez aspas gigantes no ar. – almoço de ontem, né? – Revirei os olhos e Harry riu.
– Estou viva, não estou? Me deixa ir melhorando aos poucos, poxa! – Olhei para Harry e trocamos um sorriso cúmplice. Tinha a impressão de que ambos sabíamos a importância que aquela tarde teria dali pra frente. – E também, olha só você me alimentando com pizza de novo. Não tá muito em posição de julgar, né?
riu e abriu o armário, pegando três pratos.
– Vai ficar para a pizza, né, Harry? – Fez sua melhor cara de cachorrinho perdido.
– Vou, mas não muito. Agora que a mocinha aqui está em pé e aparentemente em boas mãos – Riu e recebeu um dedo do meio de . – Eu posso ir para o hotel descansar e me preparar para amanhã.
– Se liga, meu anjo! Eu cuidei dessa garota por sete... oito anos. "Tu chegou" atrasado na festa e já quer ditar regra? – Ela riu, mas o silêncio que se seguiu foi constrangedor demais.
Harry trocou o peso do corpo de um pé para o outro e ajeitou a postura, olhando diretamente para mim.
– Fiquem frias você duas, não planejo sair da vida da nunca mais. – Harry sorriu, convencido e pude ver arregalar os olhos e segurar uma risada.
– Hmm – Pigarreei, tentando disfarçar a estranheza do momento. – O que tem amanhã, Harry? – Olhei para ele e levantei uma sobrancelha.
– Você não cont... – virou para Harry, mas foi interrompida por um olhar muito significativo vindo dele e então deu de ombros. Eu estava perdida naquela conversa. – Bom, a pizza vai esfriar. , as taças. Precisamos tomar pelo menos um vinho.
Enquanto eu pegava as taças, Harry encontrou a garrafa de vinho no local indicado por e a seguiu até a sala. Não pude deixar de sorrir um pouquinho ao ver os dois ali juntos. Sentia como se um pedacinho do meu passado estivesse se encaixando nessa minha vida que era tão diferente. E a sensação do encaixe era quentinha e confortável.
Parei perto do sofá onde Harry já estava sentado tranquilamente. Sorriu ao me ver e deu dois tapinhas no assento. Ocupei o lugar ao seu lado e ele pousou a mão sobre a minha, fazendo um carinho rápido e delicado. Agora já não era mais tão estranho ter ele ali. Por mais que eu ainda tentasse assimilar como eu tinha começado aquele dia sem grandes expectativas e agora estava ali naquela situação. Eu me sentia quase como uma vítima de uma experiência de gosto muito peculiar. Como se a vida estivesse testando novos cenários pra ver como eu me adaptava a eles. Naquele momento, o cenário era aquele. Harry Styles ali no meu sofá com um ar super despreocupado. Sua mão que tocava a minha de uma forma tão despreocupada e ao mesmo tempo tão íntima. Um toque ínfimo de pele que fazia meu coração disparar vergonhosamente.
estava ajoelhada sobre o tapete felpudo, abrindo a caixa de pizza. Ajudei Harry a servir as três taças e em pouco tempo estávamos abocanhando pedaços enormes de pizza cheia de queijo.
– Espera! – Harry disse antes que alguém bebesse. – Se é para ser assim, vamos brindar, né? - ele olhou para mim e sorriu. – Ao retorno de ao mundo dos vivos, e que ela tenha uma doce vida. – Retribuí seu sorriso e meu coração errou uma batida. E eu nem tinha começado a beber.
– À Lizzie, porque ela adoraria estar aqui – eu disse rápido, antes que pudesse ser interrompida por mim mesma. Harry e trocaram um olhar e sorriram em seguida. Concluímos o brinde.
Passamos a próxima hora mais jogando conversa fora do que qualquer outra coisa. Harry falou sobre a nova tour e sobre como o segundo álbum estava incrível. Quase morri de vergonha por admitir que não tinha acompanhado absolutamente nada sobre nenhum dos dois e contou, depois de duas taças de vinho e muita insistência da parte de Harry, ter ouvido todas as músicas, por muito tempo, longe de mim. Para não criar o caos, segundo ela. Tudo bem, eu estava ciente de que todos os nossos amigos mais próximos, incluindo a minha família, ainda mantinham contato com ele em um círculo relativamente próximo. Eu havia sido a única a me afastar completamente do mundinho Harry Styles. Então, sim, eu entendia o fato de estar sentada ali perto dele como uma grande fã e não apenas como amiga, o olhar que ela tinha sobre ele era de total admiração. Eu ficava quieta na maior parte do tempo, apenas ouvindo os comentários que ela fazia sobre uma ou outra música enquanto Harry ria satisfeito. Ao final daquelas horas, eu já estava muito curiosa e ansiosa para começar a descobrir tudo o que havia perdido.
– E é por isso... – Harry concluiu depois de um longo discurso sobre os motivos pelos quais eu deveria ouvir seu novo álbum e o anterior, diga-se de passagem. – que você vai ter a honra de escutá-lo pela primeira vez e ao vivo, querida . – Ele sorriu, orgulhoso, ajeitou a postura e bebeu o resto do vinho em sua taça. deu gritinhos animados no chão e pegou outro pedaço de pizza.
– Oi? – Eu olhei pra ele, sem entender nada. Creditei ao vinho minha súbita lerdeza.
– Ô, garota lerda! – Minha amiga revirou os olhos e deu uma mordida na pizza. – Ele vai te levar para o show. – Levantou um dedo no ar e estreitou os olhos, engolindo a pizza e continuando. – Correção, nos levar ao show.
– Ahh. – Deixei meu queixo cair levemente enquanto assimilava a informação. Olhei para os lados e dei um gole exagerado no vinho, fazendo minha cara sumir atrás da taça. Harry parou com seu pedaço de pizza a meio caminho da boca e me olhou, franzindo o cenho.
– ! – gritou, nos fazendo olhar pra ela. – Eu realmente espero que você tenha uma resposta melhor que essa!
– Harry... – Olhei pra ele e engoli em seco. – É que eu não sei. Realmente não sei nenhuma música. – Ele gargalhou.
– Mas é exatamente por isso que eu faço questão que você vá! E vocês vão. Já organizei tudo com a minha equipe. – Harry segurou meu antebraço, seus olhos pareciam tentar enxergar alguma coisa bem no fundo da minha alma. – , é sério. É mais fácil eu mesmo faltar no show do que você.
– Ah, é – eu disse, me sentindo instantaneamente nua sob o seu olhar – E aí eu vou cantar, mas tenho quase certeza de que, se isso acontecer, suas fãs vão ter que se contentar com alguns covers da Janis. Não posso fazer muito mais que isso. – Fiz um gesto displicente com a mão, ouvindo minha risada mais alta que o normal.
– Tenho certeza de que seria algo lindo de se ver, , mas amanhã você vai me ouvir cantar. Não tem desculpa. – Harry sorriu de lado e eu me perdi por alguns segundos naquela cena.
Ouvi pigarrear baixinho e puxei, meio sem jeito, meu braço que Harry ainda segurava. Seu celular vibrou sobre a mesinha de centro, esmagando o momento estranho como um martelo faria a um cubinho de gelo.
– Ah. – Harry guardou o celular no bolso e esfregou uma mão contra a outra rapidamente. – Tom está quase chegando aqui. – E Tom deveria ser seu... motorista? – Amanhã cedo eu passo melhor as informações sobre tudo o que vocês devem fazer pra chegar tranquilamente ao local do show. Ah, a propósito, informação importante... – Harry riu e levou uma mão à testa. – O show será em San Jose. Rápido, fácil e seguro. – Sorriu, olhando pra mim. – , você vai amar.
– Tenho certeza que sim - eu disse e levantei as sobrancelhas em seguida, percebendo o que havia dito. gargalhou. Uma resposta rápida assim? Óbvia demais, . Óbvia demais.
Harry sorriu e balançou a cabeça rapidamente, levantando do sofá. Repeti seu ato, puxando um pouco o vestido para baixo e passando a mão no cabelo, rapidamente. Não sabia muito bem para onde olhar ou o que fazer.
– Styles, foi ótimo te ver. – também já estava em pé e tinha estendido uma mão de forma muito solene e teatral para Harry. Ele terminou o cumprimento, me fazendo rir. – E, de novo, muito obrigada pelo convite. Só Deus sabe quando é que a gente teria dinheiro pra pagar um ingresso caríssimo daqueles. – Ela deu de ombros e Harry riu, sem jeito. Minha amiga sabia ser sincera demais quando bebia.
– Ah, vem cá, ! – ele disse seu apelido de infância e a puxou para um abraço bem apertado. – Eu sei que você me ama, apesar desses comentários ingratos.
– Amo – ela disse, dando de ombros – Agora eu vou... – Olhou fixamente pra mim – Lá para o meu quarto – disse simplesmente e sumiu corredor adentro.
E então eu estava parada ali na frente dele, sentindo os últimos efeitos do vinho. Tinha uma lista de mil coisas para dizer, mas não conseguia decidir qual seria a melhor naquele momento. Queria agradecer a ele por ter ido até ali e ter me poupado de outra tarde melancólica ou – talvez – outra entrevista fracassada. Queria agradecer mais uma vez pelo sanduíche e por todos os abraços que me deu, pela dança desajeitada na sala e por me permitir ser eu mesma de uma forma tão leve. E talvez, num mundo infinito de palavras que eu poderia usar para descrever a forma como me sentia, nenhuma delas fosse suficientemente boa.
Harry me observava, sorrindo de lado, com os dedos enfiados nos bolsos de trás da calça e se balançando devagarzinho para frente e para trás.
– Vamos, eu te levo até lá embaixo – eu disse e me encaminhei para a porta rapidamente.
Harry me seguiu em silêncio e chamou o elevador quando chegamos ao final do corredor. T, 1, 2. Eu encarava o visor que contava os andares e sentia seus olhos em mim. 3, 4, 5. Não sabia porque não conseguia olhar para ele e o silêncio entre nós agora era espesso, palpável, quase ridículo. 6, 7, 8. Suspirei aliviada quando a porta abriu e Harry sorriu, fazendo um gesto para que eu entrasse antes dele. Encostei-me à parede espelhada enquanto ele entrava e a porta fechava, nos deixando a sós ali dentro.
– . – Harry quebrou o silêncio monstruoso e se aproximou de mim. Estava simplesmente perto demais.
Deixei meu olhar percorrer o curto caminho entre sua boca e olhos, torcendo para que minhas pernas não me abandonassem naquele momento. Seu perfume parecia ter tomado conta da caixa retangular que momentaneamente nos aprisionava e meu foco parecia ir e voltar. Harry pegou uma de minhas mãos, que estavam soltas ao lado do corpo, e sorriu de lábios fechados.
– Obrigada por hoje – falamos juntos em um timing tão perfeito que, se tivesse sido ensaiado mil vezes, não teria ficado melhor. E rimos.
Quando percebi, estava envolta em seus braços, em um abraço gostoso demais. A porta do elevador abriu e nos separamos, meio sem jeito. Segurei a mão de Harry e atravessamos a pequena portaria já vazia àquela hora. Enquanto eu abria a porta de vidro, ele checava o celular.
– Tom disse que está preso no trânsito a umas cinco quadras, isso significa que tenho mais uns minutinhos aqui. – Ele me puxou para perto e passou a mão pelo meu cabelo, colocando uma mecha atrás da orelha. – Eu tenho uma... surpresa para você.
– Harry! – Eu sorri e dei um pulinho. – E o que é? – Ele arregalou os olhos e, em seguida, deu uma risada alta.
– , a ideia de surpresa é... você não saber do que se trata! – Ele me abraçou mais uma vez e beijou o topo da minha cabeça. – Espera o show.
Bufei e o apertei com mais força. Odiava surpresas, mas naquele momento estava feliz demais para contestar. Afastei-me e olhei em seus olhos, segurei suas mãos e abri minha boca uma, duas vezes. Eu não tinha mais nada pra dizer. Harry mordeu os lábios bem rápido, em um gesto quase imperceptível. Eu realmente não teria visto se não estivesse tão perto e me peguei querendo beijá-lo. Queria saber se meu coração ainda iria disparar da mesma forma boba que costumava fazer, se seus lábios ainda tinham o mesmo gosto e se ele ainda dava selinhos ao final do beijo, mas também sabia que não era certo. Não ali, não naquele momento. Eu nem sabia se ele tinha alguém ou se estava solteiro.
Sorri internamente ao perceber que o tópico "relacionamentos" não havia sido mencionado durante as horas que passamos juntos. Talvez fosse melhor daquela forma, nós ainda tínhamos muito para conhecer e reconhecer um no outro antes de tomar qualquer atitude. Por hora, era bom simplesmente já tê-lo de volta na minha vida. Só aquilo já era bom demais.
– Harry... – Fiz um carinho em seus dedos longos e quentes, entre minhas mãos. - Eu... – Olhei para os meus próprios pés, como se dali fosse sair alguma coisa inteligente para dizer.
– Eu sei – ele disse simplesmente. – Vamos deixar você ir melhorando aos poucos, lembra? – Sorriu e levantou uma sobrancelha.
Olhei para um ponto atrás dele e vi um homem alto de terno olhando em nossa direção, com um sorriso engraçado.
– Presumo que aquele seja o Tom. – Apontei, fazendo Harry olhar na mesma direção.
– E você está certa, senhorita. – Harry disse, levantando um dedo em uma imitação bem ruim de professor. Eu revirei os olhos e ri.
– Bom, boa noite, então! – eu disse e abri meus braços, me preparando para mais um abraço.
Harry, ao contrário, se aproximou e depositou um beijo em minha bochecha. Agradeci a pouca falta de luz ali ou ele teria visto meu rosto subir alguns tons na escala de vermelho.
– Boa noite, pequena ! – Ele sorriu ao se afastar.
Observei Harry descer as escadas e acenar para Tom, sumindo entre os arbustos na entrada do prédio. Depois que o carro se afastou fiquei mais alguns segundos observando a rua quase vazia. No final das contas, todas as horas que passamos juntos tinham sido até convenientes demais, provavelmente havíamos evitado muitos olhares curiosos. Sorte a minha. A última coisa que eu precisava era da minha cara estampada em algum jornal levantando especulações.
Quando voltei para o apartamento encontrei de pijama e toalha na cabeça, muito bem estabelecida no sofá. Ela abriu a boca, mas antes que falasse qualquer coisa levei um dedo até meus lábios, pedindo que ficasse quieta. Sentei-me ao seu lado, cruzando as pernas sobre o sofá e cobri meu rosto com as mãos.
– Que porra foi essa? – Finalmente olhei para ela, que explodiu em uma risada – Ah tá, ri mesmo, vai me ajudar muito a entender tudo o que aconteceu.
– Mas, ! – Ela abanava as mãos em frente ao rosto e secava algumas lágrimas, tentando parar de rir – Não tem nada para entender, o Harry veio até aqui porque eu e a sua mãe conversamos com ele sobre tudo o que estava acontecendo. Bom, na real ela falou e pediu ajuda. Eu só concordei. – Olhei pra ela, desconfiada. - É sério! Amiga, a gente achou que ele era a única solução depois que ela já tinha tentado de tudo... E olha, a gente meio que tava certa, né? Você está aí toda trelelê, saltitando.
– Primeiro, eu não estou saltitando. – Levantei um dedo para contar e revirou os olhos. – Segundo, vocês não deveriam ter feito isso pelas minhas costas, eu não estava preparada pra encontrar o Harry assim, do nada, e puta merda, ainda desmaiei na frente dele! E terceiro, por causa dessa mentirada eu perdi mais uma entrevista de emprego.
– Amiga! – Ela agarrou meus três dedos levantados no ar e baixou com força no sofá. – Nem me faça começar com essa história de emprego de novo. Se aconteceu assim, não era a hora certa. Relaxa, tá? Você tem que se dar um tempo agora, para se curar, amiga! E eu sinto que ter o Harry de novo por perto só vai fazer bem, você vai ver! Você sabe que se eu não pensasse que sim, nem estaria te falando isso. – Sorriu bem de leve. – Olha, vamos no show amanhã, tá? Vamos aproveitar esse final de semana e tirar dele o melhor proveito possível. Depois as coisas se resolvem. Sabe que eu vou estar sempre aqui para você, para sempre. – E segurou minhas mãos entre as suas. – Gostou de ter ele aqui?
– Demais! – Ri e apoiei minha testa em seu ombro. Eu nem precisava discutir sobre todo o resto, tinha esse poder incrível de me desarmar em segundos e deixar bem explícita toda a minha verdade. Era inútil tentar esconder alguma coisa dela. – Gostei demais.
riu e soltou um "eu sabia". Olhei pra ela, que tinha as duas sobrancelhas levantadas e balançava a cabeça rapidinho, incentivando-me a continuar.
– Ah. – Dei de ombros. – Foi um pouco estranho também, sei lá. Ver ele depois de tantos anos e meio assim, do nada, mas foi um choque de realidade. Eu sinto que me acordou, sabe? Para o tempo que perdi não só com ele, mas comigo mesma. E foi uma conversa tão curta, por um lado. Tivemos pouco tempo.
– Curta por quê? – franziu o cenho e deixou o queixo cair em seguida – Vocês se pegaram, né? Eu sabiaaaaaaa!
– Não! – Dei um tapa em sua cabeça e ela fez uma careta. – Não, nem pense nisso! Não rolou nada, sua doida, e nem tinha como, né? Nós somos como dois estranhos agora.
– Ah, me engana que eu gosto, ! – virou a cabeça um pouco de lado e fez uma cara de puro deboche. – Vocês podem até não saber mais sobre a vida um do outro, mas tiveram uma história, cresceram juntos e... na-mo-ra-ram!
– Aham. Em outra vida.
– Shiu! – Ela tapou minha boca com uma mão e eu revirei os olhos. – Me deixa terminar. , o Harry está solteiro, sabia? E até onde eu sei, você também. A não ser que meu novo cunhado seja um fantasma ou você esteja saindo escondida pela janela durante a noite. – riu, mas eu só tinha assimilado um pedaço do que ela havia dito.
– Ele está solteiro? – perguntei, encarando a parede atrás dela e senti um pequeno sorriso se formar em meus lábios. Merda.
– AH HÁ! – ela gritou e eu me assustei, voltando a encará-la. Senti meu rosto esquentando de vergonha. – Eu sabia! Ai, , , tão óbvios. Eu estava quase ficando sufocada com a tensão sexual que rolou nessa sala.
– Ah, , vá se foder! – eu disse e me levantei do sofá. – Não teve tensão sexual nenhuma, tá? – Estalei meus dedos da mão rapidamente - Bom... Porra! Eu não vou negar que ele está gato, caralho. – Pisquei os olhos e respirei fundo, me lembrando das cenas de mais cedo. – Muito gato, mas isso não me dá o direito de sair agarrando o garoto igual uma desesperada. Não é hora ainda. Minha vida tá meio confusa, se você não percebeu.
– Tá, diga o que quiser para se sentir melhor, mas eu acho que Harry Styles voltou para sua vida para ficar e você deveria começar a agradecer a mim e sua mãe por ter facilitado esse reencontro. Se não fosse por nós, vocês dois iam passar a vida inteira igual duas velhas teimosas fingindo que não lembram uma da outra. – Ela riu e me olhou, cruzando os braços. – E você está em pé por que, afinal de contas? Só fica em pé assim quando está discutindo, ! E a gente não vai brigar agora, não se preocupe!
Nós rimos e eu voltei para o sofá, deitando com a cabeça em seu colo. começou a fazer um cafuné e eu fechei os olhos, era muito bom tê-la ali comigo. Desde que perdemos Lizzie, ela fazia cada vez mais questão de estar ao meu lado em cada segundo quando não estava no trabalho ou em outro lugar. Eu nunca conseguiria agradecer o suficiente por tudo o que ela, praticamente sozinha, estava fazendo por mim.
– A gente vai ficar bem, tá? – Ela parou o carinho e eu abri meus olhos, vendo os seus brilhando. – Nem que eu tenha que rodar essa cidade todinha montando um palquinho para você se apresentar, vai atuar do jeitinho que sempre sonhou, . Você vai voltar a trabalhar e eu não vou te deixar na mão de jeito nenhum, estou dando conta das despesas agora e seus pais já disseram que não se importam em continuar mandando dinheiro. Você nunca, nunca vai ser um peso para ninguém, você ilumina a nossa vida, sunflower, a gente te ama demais. – Ela secou uma lágrima que eu nem tinha visto cair. – Demais, mesmo.
Puxei uma de suas mãos até meus lábios e dei um beijo curtinho, muda sob o peso das suas palavras. Meu coração estava calmo e eu sorri diante da verdade simples que se estabelecia entre nós. Ter escolhido estar ali, naquele momento, havia sido uma das minhas decisões mais acertadas. Eu queria que aquele fosse meu momento de cura e ficar entre as pessoas que me queriam bem era uma ótima forma de começar o processo. Era como ter um cobertor quentinho em um dia muito frio, era básico. Mesmo que não estivesse perto dos meus pais, eu ainda tinha minha melhor amiga e, afinal de contas, sabia que em algum momento acabaria voltando a Holmes Chapel. Eu só precisava de tempo.
– Ai, ai. Você me fez até chorar, sua praga! – Ela riu e me empurrou levemente pelos ombros. Sentei-me, ajeitando os cabelos. – Que sexta-feira tristinha, hein? Vamos ver um filme, pelo menos? Podemos matar uma garrafa de vinho! – abriu um sorriso enorme e deu um gritinho em seguida. – MEU DEUS, A GENTE VAI VER O HARRY STYLES AMANHÃ! – Deu mais um gritinho. – Se anima, caralho! Já pensou em qual roupa vai usar? Espero que aquele garoto não demore muito para passar as informações que a gente precisa para amanhã. – Levou um dedo à boca, franzindo a sobrancelha. – Eu só sei que o show é à noite e em San Jose, espero que ele não ache que a gente vai ficar rodando a cidade até encontrar o local porque se não mato ele. Meu Deus, eu estou nervosa. – Ri, olhando pra ela. – QUE FOI?
– Calma, criatura! Ele disse que ia falar com a gente amanhã, não disse? Então se acalma – falei mais para mim mesma que para ela. Precisava admitir que começava a realmente amar a ideia de ir ao show. – E não, ainda não pensei no que vou vestir, mas se tem uma coisa que a gente sabe é sobreviver em show, né, amiga? Conforto acima de tudo, o look perfeito é só um plus. – Estendi a mão e fizemos um high five. Aquele sempre havia sido nosso lema.
Levantei do sofá e estiquei os braços e as pernas, dando um longo bocejo e chequei o celular. Havia três mensagens de um número desconhecido.
– Hmm. Vai escolhendo o filme, está meio cedo ainda, né? Quase uma da manhã. – Revirei os olhos e riu. – Vou fazer uma pipoca, você quer?
– Sempre! – Ela bateu palmas, duas vezes. – Vai já!
Corri na direção da cozinha e desbloqueei a tela.
"queria ter mais tempo com você hoje" – 11PM
"meu Deus, é o Harry. Esqueci de avisar. A me passou seu número, não briga com ela ;)" – 11:01PM
"achei bem melhor, assim posso me comunicar direto com você" – 11:01PM
Mordi o lábio, ponderando sobre qual mensagem responder primeiro. Sentia meu coração bater meio descompassado.
– Pretty Woman? – Ouvi perguntar da sala.
– Uhum! – respondi de volta, sem prestar muita atenção.
"não vou brigar com ela, pode deixar!" – 11:05PM
"tudo bem, vou estar ansiosa esperando!" – 11:05PM
Escolhi simplesmente não responder a primeira mensagem, sabia que meu cérebro com sono tinha uma tendência absurda a me fazer falar merda. "Vou estar ansiosa esperando"? Merda. Bom, pelo menos agora ele sabia.
– CADÊ A PORRA DA PIPOCA, ?
– Me distraí! Desculpa! – Ri e larguei o celular sobre o balcão da cozinha, batendo com a mão na testa. – Já faço!
– É bom mesmo, ou eu vou assistir o close nas pernas da Julia Roberts pela milésima vez sozinha!
Preparei a pipoca rapidamente e com perfeição, enchi um balde grande e corri até a sala.
– Nunca mais me deixe esperando quando te chamar para ver minha crush – disse, pegando um punhado de pipoca e dando play no filme.
– Nossa crush. – A corrigi e então ficamos em silêncio.
Já tinha perdido as contas de quantas vezes havíamos assistido àquele filme, mas uma a mais era sempre bem-vinda. Fazer o quê? Obras-primas devem ser exaltadas.
Passei mais da metade do filme dividindo minha atenção entre as cenas e a mensagem de Harry que não saía da minha cabeça. Eu também desejava que tivéssemos mais tempo juntos, mas ter aquilo comprovado por suas palavras era muito mais gostoso. Sorri e me aconcheguei mais ao sofá, enroscando minhas pernas às de . Eu esperava ter algum tempo antes ou depois do show para que pudéssemos conversamos pelo menos mais um pouquinho, Harry tinha uma energia tão forte e contagiante que poucas horas perto dele já me deixaram desejando por muitas mais.
Desliguei a televisão quando o filme terminou, tentando me mexer o mínimo possível. Em algum momento, tinha deitado a cabeça em meu colo e parecia dormir tão tranquilamente que eu não queria acordá-la. Tirei alguns fios de cabelo de seu rosto, então ela piscou algumas vezes e sorriu, abrindo os olhos.
– Ah, eu não queria te acordar! Você estava dormindo tão bonitinha.
– Agora já era, vai ter que me carregar até a minha cama. – Ela sorriu, convencida e cruzou os braços.
– Amiga, acho que vou seguir o exemplo da Vivian. – levantou uma sobrancelha, me olhando bem séria. – Deu certo para ela, né?
– Que parte deu certo? – Ela riu e virou um pouco a cabeça no meu colo. – Você quer vender esse corpinho? Ou achar um Richard Gere? Se for isso, eu posso ser o seu Richard Gere. Na verdade eu já sou, né? Tirando a parte do relacionamento amoroso, eu te sustento quase cem por cento. – Ela riu e eu dei um tapa em seu braço. – Bom, tirando a parte do sexo, na verdade, né? Porque amar, você já me ama.
– Cala a boca, ! Eu estou falando sério. – Cruzei os braços e seu sorriso foi sumindo aos poucos.
– Ah, amiga. Nossa, eu não sei nem o que dizer. – Ela levou uma das mãos à boca, mordendo a lateral nervosamente. – Você sabe que eu vou te apoiar sempre, acho uma escolha um pouco radical, mas vou te apoiar. – Segurou minha mão, que estava apoiada em sua barriga.
Eu não aguentei segurar mais o riso e joguei a cabeça pra trás, gargalhando.
– Que foi? Você estava me zoando, né? – se soltou das minhas mãos e levantou do meu colo bem rápido. – Ah, , que merda! Eu estava aqui toda assustada já, tentando te entender! – Jogou uma almofada bem na minha cara, me fazendo rir mais ainda.
– Calma, meu Deus! Volta aqui! – Puxei uma de suas mãos e ela sentou no sofá. – Foi bonitinho, vai. – Eu ri e ela me empurrou um pouco para o lado, revirando os olhos.
– Vamos dormir, eu estou morta. – Esfreguei os olhos e então me lembrei de um detalhe não tão pequeno. – ... – Ela olhou pra mim, à contragosto. – Como é que a gente vai até lá amanhã?
– Já resolvi essa parte. – Ela sorriu de lado e jogou os cabelos pra trás. – No fim das contas, foi bom ter mantido contato com o Carlos.
– Carlos? Aquele...? – Seu sorriso cresceu um pouco mais. – Nossa, amiga.
– Quê? – Ela riu. – Ele não é um poço de beleza, mas tem carro. – Deu de ombros.
– Beleza? Se fosse só a falta de beleza. Nem acredito que você conseguiu sair mais de duas vezes com ele.
– Ai, , me deixa! Eu também sei que ele não presta, mas e aí? Não pretendo ter mais nada com ele, só precisamos do carro amanhã, depois eu dou tchau. – Ela jogou um beijinho no ar, na direção da parede. – Ele emprestou de muito bom grado, vai até trazer aqui amanhã!
– Genial! – Ri e me levantei do sofá. – Vou começar a te incentivar a comprar um carro.
me seguiu até o banheiro e parou no batente da porta.
– Privacidade? – Levantei uma sobrancelha e ela riu.
– Já estou indo, chata. Dorme bem! – Ela pareceu se lembrar de algo. – Ah, eu passei o seu número pro Harry. – Fez uma cara culpada.
– Eu sei. – Dei de ombros enquanto pegava a escova de dente e ela arregalou os olhos.
– Ele já te mandou nude? Ou você mandou? – Sorriu de forma pervertida.
– Ele vai falar comigo amanhã cedo, só isso! – pareceu um pouco decepcionada e eu ri. – Agora sai daqui!
– Boa noite, ingrata! – Ela mostrou a língua e fechou a porta.
Depois de escovar os dentes e lavar o rosto, fui até o quarto, me jogando na cama. Sentia como se tivesse vivido um mês inteiro em um dia, meus olhos estavam pesados por conta do sono e as cenas passavam como flashes muito rápidos em minha cabeça, Harry parado na porta do apartamento, ele me acordando no sofá e... – virei um pouco para o lado, encarando o cantinho vazio na colcha floral. – Harry sentado bem ali, na minha cama, com um sorriso todo educadinho, segurando o sanduíche. Agora que estava finalmente sozinha eu conseguia sentir com ainda mais intensidade a falta que ele já fazia e era ridículo me sentir assim de uma hora para a outra, mas já estava ansiosa demais para vê-lo no dia seguinte e ouvi-lo cantando. Como eu sentia falta!
Eu sabia muito bem que com o passar do tempo, depois de deixar a cidade onde crescemos juntos, acabaria enterrando bem no fundo do cérebro todas as lembranças com ele, aquelas que continham sua voz rouca cantando minhas músicas preferidas, mas que agora pareciam fantasmas deitados ao meu lado. Peguei meu celular e decidi enviar uma mensagem para a minha mãe, só queria dizer que Harry tinha ido até ali, mas nós poderíamos talvez conversar melhor na manhã seguinte. Duvidava que, de qualquer forma, conseguisse trocar mais que três palavras com ela. Eu estava muito cansada.
Troquei o vestido por uma camiseta larga, puxei as cobertas e me enfiei rapidinho ali embaixo, esperando que meu corpo aquecesse. Busquei o nome de minha mãe entre a lista de conversas e, no meio do caminho, encontrei a pequena foto de perfil de Harry. Ele sorria e olhava pra baixo, fazendo várias ruguinhas se formarem debaixo dos seus olhos, bem como as duas covinhas no sorriso. Ampliei a foto, passei o dedo por ela devagarzinho e ri, me sentindo extremamente boba. Voltei até a conversa com minha mãe.
"mãe" – 3:30AM
"preciso falar com você" – 3:31AM
Bloqueei o aparelho, largando-o no outro canto da cama, e estiquei a mão com esforço até o interruptor, deixando o quarto completamente escuro. E apaguei.
– ! – Acordei com o grito da minha mãe.
Pisquei algumas vezes até identificar os elementos presentes na cena. estava deitada ao meu lado, segurando meu celular que mostrava minha mãe descabelada.
– Está vendo, tia? Ela estava dormindo toooooda despreocupada aqui, sem nem pensar em como você estava.
Apoiei-me em um cotovelo e esfreguei os olhos, sem saber para quem olhar.
– Hmm, bom dia? – Encarei , que tinha um olhar de falsa inocência. – Bom dia, mãe! – Olhei para o celular. – Que lugar é esse?
– Oi, filha! Como assim "que lugar é esse"? – Ela mexeu o celular, se ajeitando na frente de uma parede branca com alguns quadros com motivos praianos. – É a nossa casa.
– Nossa casa não tem quadros assim, mãe. – Revirei os olhos.
– Eu comprei, ontem. – Ela sorriu e deu de ombros, encerrando o assunto. – Por que não respondeu minhas mensagens? Fiquei preocupada, era tão tarde. – Ela parecia um pouco triste e meu peito pesou, cheio de culpa.
– Ai! Perdão, mãe, eu estava super cansada. Acabei dormindo cinco segundos depois que te enviei as mensagens.
– Tudo bem, a foi aí te acordar e viu que eu estava te ligando. – Sorri, finalmente compreendendo a confusão.
– Bom, eu só queria te contar que o Harry ve...
– OI, FILHA! – Meu pai surgiu na tela e empurrou minha mãe um pouco para o lado, que reclamou.
Eu troquei um olhar com e começamos a rir.
– Estou com tantas saudades de vocês dois! – eu disse ao ver meu pai abraçar minha mãe de lado. Senti lágrimas se acumularem nos meus olhos.
– Também estamos, filha! Morrendo de saudad... Ai, ai, homem, vai mais pra lá! – Minha mãe empurrou meu pai e ele riu, dando um beijo em sua bochecha. – O que você ia dizer? Que o Harry foi até aí? – Ela abriu um grande sorriso.
– Sim! Ele veio, mãe! Graças a vocês duas tramando pelas minhas costas. – Olhei de minha mãe para , que me mostrou a língua. – Foi bem legal passar um tempo com ele. – Sorri mais para mim mesma do que para qualquer um dos três que me olhavam.
– Sei. – Minha mãe fez uma cara de quem entendia muito mais do que estava revelando – Vocês duas vão ao show hoje?
– Vamos. Você já sabia que a gente ia?
– Hmm, já. – Ela sorriu, culpada. – Nós tivemos a ideia quando Harry veio aqui em casa. Conversamos sobre todo o tempo em que vocês passaram longe. Ele está tão bonito, né, filha? – Meu pai, que estava bem quietinho, abriu um sorriso mínimo. – Eu vejo aquele garoto sempre que ele vem visitar a Anne, mas sempre me parece mais bonito e mais alto. – Olhou para o lado, com um ar pensativo, e eu ri.
– Vocês deveriam casar – meu pai disse e minha mãe deu um pulo ao seu lado, o olhando surpresa. – É verdade! Eles deveriam ter ficado juntos, não ter se separado! Que coisa mais burra. – Minha mãe tinha um ar perplexo.
– Pai! – Eu comecei a rir, mas sentia minhas bochechas quentes e já gargalhava do meu lado. – Espero que você não tenha compartilhado essas ideias com o Harry, sinceramente! – Balancei a cabeça em desaprovação e meu pai deu de ombros, rindo brevemente.
– Filha, a gente tem que ir agora – minha mãe disse, olhando para o lado vagamente. – Ainda temos que arrumar algumas coisas para... – Recebeu um cutucão do meu pai nas costelas. – Enfim! Foi muito bom falar com você. – Ela sorriu. – Eu quero tanto que você comece a melhorar agora, filha! Nós sentimos falta da Lizzie todo dia, isso é algo que nunca vai passar, mas a dor a gente consegue ir administrando, né?
– Sim – eu disse, simplesmente, querendo tornar o assunto o mais curto possível. – Eu vou ficar melhor, mãe, prometo! E se cuidem, vocês dois. Te amo, paizinho!
Meu pai sorriu e abraçou mais minha mãe.
– Tchau, filha. Tchau, ! – minha mãe disse.
– Tchau! – mandou um beijo para os dois e eu acenei, encerrando a chamada em seguida. Deitei de novo sobre o travesseiro e levei as mãos ao rosto.
– Pronta pra começar o dia? – perguntou e levantou da cama. – Eu fui até a esquina e comprei uns croissants, só falta passar o café. – Ela me olhou e sorriu em expectativa.
– Tá booom, eu passo o café! – Levantei da cama enquanto ela batia palmas e corria em direção da cozinha.
Fui até o banheiro só para lavar o rosto e fazer xixi, deixaria o banho para mais tarde. Antes de ir até a cozinha, passei pelo quarto e peguei meu celular, que estava em cima da cama. Tinha uma mensagem nova de Harry.
"bom dia, girassol amarelo" – 9:35AM
"bom dia, Styles!" – 9:47AM
estava sentada à mesa da cozinha, olhando distraidamente para o celular. Peguei todas as coisas para preparar o café enquanto cantarolava e fiz uma dancinha, ajeitando tudo sobre a pia. Quando virei, vi que ela me olhava, sorrindo.
– Que foi? – Peguei a chaleira sobre o fogão. – Obrigada por esquentar a água.
– Você está aí toda boba, garanto que o motivo da felicidade começa com Harry e termina com Gostoso – olhei pra ela e rimos juntas. –, que é sinônimo de Styles. – deu de ombros.
– Não é só ele. – Me escorei na pia, observando o café ser filtrado. – Só acordei me sentindo melhor hoje. E tem o show, eu falei com meus pais... – Olhei novamente para – Falando nisso, eles não estavam meio estranhos?
– Quê? – Ela se ajeitou na cadeira. – Não, não achei.
Dei de ombros e fechei a garrafa térmica com o café, indo até a mesa. Mordi o croissant que estava no prato à minha frente e serviu nossas xícaras com café.
– Merda! – Limpei o chocolate que escorreu pelo canto da minha boca.
– Harry já falou com você? Eu preciso saber que horas vamos sair daqui – perguntou e tomou um gole de café. –, mas acho que o Carlos vem antes, de qualquer forma.
– Hmm. É, estou falando com ele agora. – Chequei o celular. Nenhuma mensagem nova.
– Vai me avisando, então.
terminou seu café e disse que precisava ir até o quarto fazer alguma coisa na qual não prestei muita atenção. Esperei ela sair da cozinha e mandei uma mensagem para Harry.
"e então?" – 10:45AM
"e então o quê?" – 10:46AM
"brincadeira! Já falo contigo." – 10:47AM
Terminei meu croissant e estava levando as coisas para a pia quando ouvi meu celular vibrando, o nome de Harry sobre a sua foto na tela.
– ! – Gritei e ela apareceu em dois segundos na porta da cozinha.
– Que foi? – Veio até a mesa, assustada.
– O Harry está ligando! – eu disse, ainda encarando o celular.
– Atende então, meu Deus! – Ela gargalhou e pegou meu celular na mão.
"Alô?" – Ela atendeu e deixou no viva-voz. Dei um tapa em seu braço.
"? Cadê a ?" – Harry parecia confuso.
"Tá desmaiada aqui do lado. Foi muita emoção e..."
"QUÊ?"
– Cala a boca, garota! – Dei mais um tapa na cabeça dela e arranquei o celular da sua mão. fez uma careta e me mostrou o dedo do meio, sentando em uma das cadeiras da cozinha. Fui para meu quarto e me joguei na cama.
"Fala, Harry."
", oi! Que confusão. – Ouvi sua risada rouca do outro lado da linha. – Você está bem?"
"Eu? Ah! Estou, sim, e você?" – Não pude evitar abrir um sorriso.
"Estou bem. Consegui descansar um pouco, mas em uma hora já estamos na estrada. Você tem que anotar direitinho tudo o que eu te falar, tá?"
"Tá!" – disse e abri uma agenda velha que tinha ao lado da cama.
"Então, o show vai ser no SAP Center, é super fácil de achar, mas qualquer coisa vocês buscam o endereço depois. Não vamos começar antes das nove, mas eu liberei a entrada para vocês a qualquer horário. Agora que vai ser um pouquinho mais complicado: vocês vão entrar por trás e precisa ser de carro. Tem uma entrada, anota aí..."
Harry me passou o resto das informações e eu já estava achando mais fácil ficar em casa do que ter que passar pelo mar de fãs enlouquecidas que estaria do lado de fora do estádio, segundo ele. Comecei a ficar bem nervosa com a ideia de tentar entrar sem ser vista e nem sabia o porquê, afinal, para aquele período da vida de Harry Styles, eu era uma completa desconhecida.
", tenta chegar um pouco mais cedo, tá? Por favor. – Parou por um segundo – Vocês vêm como?"
Eu sorri e brinquei com um fio solto da colcha, enrolando-o em meu dedo.
"Tá bom, vamos tentar chegar até as seis. Nós vamos pegar emprestado o carro de um amigo da . Se é que eu posso chamar de amigo". – Revirei os olhos e ouvi Harry rir.
"Tudo bem... Se cuidem."
Fiquei em silêncio, sem saber muito bem o que responder. Uma parte de mim desejava que ele falasse qualquer outra coisa só pra prolongar um pouquinho a conversa.
"..." – Mordi os lábios para não soltar um “yay”.
"Oi."
"Já estou ansioso para te ver."
Senti as borboletas no meu estômago fazerem uma festa.
"Também estou, Styles." – Sorri.
Desliguei o telefone e passei uns cinco segundos encarando a parede, os músculos do meu rosto teimando em formar um sorrisinho besta. Fui até o quarto de e entrei sem bater na porta, nós tínhamos essa liberdade.
– Urgh, eu não aguento mais! – Ela tirou um vestido vermelho e atirou sobre a cama, em uma pilha de roupas.
– Não aguenta o quê? – Sentei na cama, empurrando a pilha de roupas para o lado.
– Não tenho roupa para ir ao show. – Ela tirou outro vestido do armário e o vestiu, se virando de frente para mim.
– Gostou desse? – Deu uma voltinha e se olhou no espelho.
– Amiga, você está linda. Já provou todos esses?
– O que você acha? – Ela revirou os olhos e sentou sobre o pequeno tapete azul, no chão – Vou ter que comprar alguma coisa e nem adianta fazer cara feia. Eu posso conhecer pessoas muito importantes essa noite!
– Eu não ia dizer nada, mas sério? – Apontei para a pilha de roupas. – Nenhum desses? – Ela negou com a cabeça, fazendo um biquinho. - Então vai, né. Só tenta ir em um brechó dessa vez, pode ser? Tem aquele lá que eu te falei.
– ! Eu super apoio e acho muito fofa essa tua ideia eco friendly, social e parara, mas algumas vezes eu prefiro roupas novas, pode ser? – Ela riu, levantando do tapete, e eu dei de ombros. – Não fica assim, você sabe que eu estou tentando mudar, tem me ensinado bastante já.
Respirei fundo, optando por apenas abrir um pequeno sorriso. Há muito tempo eu sabia da tendência consumista de e, sempre que possível, nós conversávamos sobre a problemática. Ela já estava bem consciente sobre a questão da exploração trabalhista envolvida em muitas empresas, mas eu sempre batia mais algumas vezes naquela tecla.
– O que eu faço com você, hein, dona ? – Ela riu e veio até a cama, me abraçando. – Só vou dar uma volta e ver se encontro alguma coisa que realmente valha a pena, se não eu volto, tá?
– Isso! Já é um bom começo. – Ri e levantei da cama. – Bom, por outro lado, eu ainda não pensei no que vou vestir. – Joguei os braços para cima e riu, pegando a bolsa sobre a cômoda. – Você vai almoçar na rua mesmo?
– Acho que sim. Não quer ir junto mesmo? – Ela fez um biquinho.
– Não, eu estou com preguiça. – A segui para fora do quarto. – E acho que vou esperar, caso o Carlos traga o carro. Ah, eu disse para o Harry que a gente ia chegar até as seis, então não enrola!
-Tá. O Carlos vai me mandar mensagem quando estiver chegando, então não precisa se preocupar. – abriu a porta e se virou de frente para mim. – Eu vou trazer o almoço para a gente.
– Anja! – Sorri e ela mandou um beijo no ar antes de fechar a porta.
Ok, ainda tínhamos umas seis horas até o momento de sair de casa, então voltei para o meu quarto, decidida a encontrar de vez alguma roupa para usar no show. Talvez eu devesse ter saído com . Tinha que admitir que minhas minhas também não estavam super novas. Afastei o pensamento da cabeça e abri o guarda-roupa, analisando rapidamente as possibilidades. Queria alguma coisa leve e confortável, mas que também fosse... Sexy. Sim, eu veria meu ex super famoso cantando para milhares de pessoas, então parecia o tipo de evento para o qual eu gostaria de me vestir com um pouco mais de empenho. Não que normalmente eu me vestisse de qualquer forma, mas geralmente apenas não ligava muito para o assunto, o que costumava gerar comentários bem engraçados de .
Tirei uma saia do guarda-roupa e segurei bem em frente ao meu rosto. Eu gostava bastante dela, era longa, com listras coloridas e transparência que deixava minhas pernas mais à mostra. Sorri, era isso! Larguei a saia sobre a cama e o resto decidiria depois. Adorava a forma como eu, no fim das contas, sempre decidia rapidamente o que vestir.
Suspirei e retirei a camiseta preta e larga que usava desde a noite anterior, observando meu corpo no espelho, aquele corpo que era só meu e que já havia passado por tanta coisa, o corpo que eu aprendera a amar. Depois de dois relacionamentos bem fracassados onde ele tinha sido o problema, eu havia aprendido a olhá-lo de outra forma. Para minhas pernas finas e cheias de estrias, meus peitos pequenos e minha cintura quase inexistente. Era o corpo que eu tinha, que me carregava de um lado para o outro, que lutava todos os dias para me manter viva. Por que não amar? Passei as mãos lentamente pelo comprimento dos meus braços, subindo por pelos ombros e parando em minha nuca. Fechei os olhos e puxei o ar profundamente. Olhei novamente para o espelho e sorri. A terapia, de alguma forma, também estava me ensinando a olhar com mais carinho para mim mesma.
Ainda só de calcinha, fui até o banheiro e liguei o chuveiro, aguardando enquanto a água esquentava. Eu não deveria e não queria admitir, mas tinha mil expectativas para o show e queria muito ver Harry novamente. Muito mesmo. Não apenas porque eu tinha amado seu estilo novo, a camisa florida, a quantidade absurda de anéis, o corte de cabelo e o perfume que parecia ter sido fixado com pregos na minha memória. E a risada, a voz rouca, mas também por todos esses motivos. Eu tinha provado apenas uma pequena dose desse novo Harry Styles, uma droga muito, muito gostosa. E, depois de ter esse gostinho, já estava disposta a ter muito mais.
Entrei no banho e senti a água quentinha relaxar meu corpo. Tentei deixar minha mente vazia de qualquer pensamento e lavei os cabelos com calma, me ensaboando em seguida. Tentava não pensar no que me esperaria, mas ele não saia da minha mente, parecia que quanto mais próximo nosso reencontro ficava, mais eu ansiava em vê-lo. Ri de mim mesma enquanto desligava o chuveiro e ouvi um barulho vindo do lado de fora do banheiro. Imaginei que tivesse voltado, então me sequei e me enrolei na toalha, abrindo a porta para o corredor. O barulho ficou mais alto e eu ouvi... duas risadas? Merda. Corri para o quarto antes que alguém me visse naquela situação e fechei a porta. Vesti um shorts velhinho e uma camiseta, enrolando a toalha nos cabelos, pronta para conferir o que quer que fosse a fonte do problema.
– ? – chamei no corredor e não obtive resposta.
Encaminhei-me com cuidado para a cozinha, pronta para encontrar qualquer tipo de cena, e chamei seu nome mais uma vez.
– ... – Parei na porta, ao ver minha amiga tentando sair de trás de uma pessoa bem alta que aparentemente tinha as duas mãos na sua bunda.
– , amiga, desculpa! – Ela ficou na minha frente e deu um leve empurrão em quem eu então reconheci ser Carlos. – O Carlos veio hmm... Trazer o carro. – Carlos sorriu, acenando rapidinho. Cruzei os braços e levantei uma sobrancelha em resposta. – E já estava indo embora, né?
– Eu estava, eu acho. – Carlos pareceu meio desapontado e só então eu notei que estava meio ofegante.
– Estava sim. – sorriu para ele e puxou-o pela mão.
Os dois passaram por mim e foram em direção à sala. Parei bem ao lado da porta da cozinha e espiei o outro cômodo. Carlos puxou pela mão e ajeitou uma mecha do seu cabelo.
– Tchau, gata. – E então a beijou.
Senti-me um pouco culpada por estar olhando e voltei até a mesa, puxando uma cadeira e me sentando. Segundos depois ouvi a porta da frente ser batida e então passos apressados se aproximando.
– Ai. Que. Raiva. – apareceu, ajeitando os cabelos. Eu me segurava para não rir – Pode rir, vai.
– Amiga – eu ri brevemente e ela fez uma careta, escorando-se na pia. –, eu achei que você tivesse dito que não tinha mais nada com ele.
– E eu não tinha! – Ela bateu com as mãos na pedra de mármore e revirou os olhos. – Mas ele é tão...
– Gostoso?
– É. – abriu um sorriso sofrido.
– Então não tem problema, eu acho. Só tenta ter certeza do que você está fazendo. Lembra do que você mesma me disse: Onde você bota a boca, não bota o coração. Deixa o título de corna para mim. – Ri e levantei os braços, apontando os indicadores para a minha cabeça.
– Enfim. – Ela passou as mãos no rosto e me olhou sorrindo. – O carro já está lá embaixo, ele nem disse quando é para devolver, e eu comprei um macacão, depois te mostro. Ah! – Pegou uma sacola sobre o balcão, ao seu lado. – Trouxe yakisoba. Vegetariano para você, que é meu amorzinho.
Como se estivesse escutando a conversa, meu estômago roncou e dei um beijo na bochecha de quando ela sentou ao meu lado, me entregando uma caixinha.
– Te amo – disse.
– Eu sei. – Ela sorriu e começou a comer.
Depois que terminamos de almoçar, fui até meu quarto determinada a tirar uma soneca. Joguei-me na cama e acendi o resto de um baseado que tinha guardado ali ao lado. Fumei calmamente até o final e, conforme fui sentindo meu corpo relaxar, acabei adormecendo. Tive um sonho estranho com um cachorro cor-de-rosa que me seguia por uma praia deserta e acordei com me chacoalhando de um lado para o outro.
– Meu anjo, se mexe! São quase quatro e meia! – Ela me empurrou mais uma vez e eu sentei na cama, em um pulo. – Por que você parecia tão agitada dormindo?
– Provavelmente foi o cachorro. – Esfreguei os olhos.
– Oi?
– Nada – disse simplesmente e levantei da cama. – Vai tomar banho? Eu já tomei.
– Eu também já, enquanto você dormia. – Ela abriu um sorriso enorme e deu um grito. – NÃO ACREDITO QUE EU VOU VER UM SHOW DO HARRY! – Ri e dei um empurrão nela. Sempre achei graça nas explosões de felicidade repentinas de . Comecei a me despir e peguei a saia listrada que estava sobre a cama.
– O que acha dessa?
– Mais tua cara, impossível! – sorriu. – E o All Star, né?
– Sempre. – Vesti a saia e fui até o guarda roupa para escolher uma camiseta. – Essa.
Vesti a camiseta branca que havia me dado como presente de aniversário. Na época, eu cortei um pouco a barra, transformando-a em um cropped, o que quase a fez infartar. Um drama desnecessário em minha opinião, a peça continuava linda.
– Perfeita. – me olhava com as mãos na cintura e sorria. – Eu te odeio, sabia? Você poderia vestir um saco de batatas e continuaria linda.
– Tonta! – Ri. – Também te amo. Vai buscar o macacão, me deixa ver!
saiu do quarto e voltou alguns minutos depois, vestindo um macacão laranja com um decote fundo em V. Ela estava linda. Terminamos de nos arrumar e organizei mais algumas coisas em uma nécessaire que coloquei dentro da bolsa, junto de uma muda de roupas limpas. Aconselhei a fazer o mesmo, caso não voltássemos logo depois do show.
– , eu não sei você, mas eu pretendo voltar e dormir na minha cama. Vou levar mais roupa só porque você está insistindo. – Ela disse enquanto enfiava em sua bolsa a calça jeans e camiseta que eu tirei de seu guarda-roupa.
– Só faz o que eu estou mandando, você deveria agradecer por ter uma amiga prevenida como eu, ao invés de ficar reclamando – falei, a observando pelo espelho enquanto tentava desamassar um cantinho da minha camiseta.
– Obrigada! – Ela riu e revirou os olhos. – Mas quem vai dormir na cama do Harry hoje é você.
– ! – Fui até ela e a empurrei, rindo. – De onde é que você tira essas ideias? Ninguém vai dormir na cama dele, só estou levando mais roupa para o caso de algum acidente acontecer.
– Aham. Do tipo ele rasgar a que você está usando agora, né? – Mostrei o dedo do meio e ela colocou uma mão no meu ombro. – , eu posso cair dura lá no meio de todo mundo se ele não der um jeito de passar mais umas horas com você.
– Cala a boca antes que eu te tranque no banheiro e vá sozinha.
Ela riu e foi até o espelho, analisando o rosto bem de pertinho, e então começou a calçar os tênis.
– Ok. Está pronta? Acho que já organizamos tudo. – Ela olhou rapidamente o conteúdo da bolsa.
– Sim! Vamos logo antes que eu tenha um treco. Acho que não vamos chegar no horário previsto. – Olhei o celular e vi que ainda tínhamos algum tempo de sobra. – Ou sim.
Conferimos mais uma vez todas as coisas e fomos até a sala. parou bem na minha frente e sorriu.
– Vai ser impossível o Harry não derreter todinho quando te vir – ela disse, ajeitando com cuidado umas mechas do meu cabelo, que caía repicado pelos ombros. – Você é perfeita. – Me empurrou de leve e bufou.
– Vamos logoooo! – Ri e a empurrei porta afora. – Você também está linda.
Fomos até o carro, que estava bem em frente ao prédio, e eu sorri. O céu estava bem azul e apenas um ventinho mais gelado bagunçava nossos cabelos. Deixei a bolsa e minha jaqueta jeans no banco de trás, ao lado das coisas de , e me acomodei no banco do passageiro.
– Já agradeceu hoje por ter uma motorista tão linda? – disse, baixando o espelho e ajeitando o cabelo.
– Estou agradecendo. – Apertei sua bochecha e ela fez uma careta. – E estou agradecendo mentalmente ao Carlos pelo carro. Agora dirige!
Enquanto íamos em direção à estrada principal, abaixei o vidro e coloquei meus óculos de sol preferidos, redondinhos como os de Janis, o modelo preferido da minha irmã.
– Você acha que a Lizzie estaria indo com a gente hoje? – perguntou, como se estivesse lendo meus pensamentos.
– Não só acho que ela iria como também acho que teria esfolado o Styles por só nos avisar um dia antes. – Rimos juntas. – Bom, me avisar, né, porque ela provavelmente teria feito parte do plano secreto de vocês.
E com esse comentário, ficamos em silêncio. Suspirei e encostei minha cabeça no banco, olhando pela janela. Eu não podia deixar de pensar em todas as coisas legais como aquela, que minha irmã não viveria, em todos esses momentos lindos nos quais ela não estaria ao meu lado, mas Harry estava certo. Não só ele, como todas as pessoas ao meu redor. Como eu sabia que Lizzie agora vivia dentro de mim, a carregaria para todos os lados. Eu estava disposta a viver minha vida da forma mais plena e por nós duas.
Passamos mais um tempo sem trocar nenhuma palavra e eu sabia que estava apenas respeitando meu espaço. Ela olhava concentrada para a estrada e então sorriu ao perceber que eu a observava. Coloquei minha mão sobre a sua, que descansava sobre a coxa, enquanto passávamos por um trecho mais calmo.
– Obrigada por isso, por estar sempre do meu lado. – Ela sorriu em resposta, apertou levemente minha mão e ligou o rádio.
Assim que chegamos à parte mais aberta da highway, se virou para mim, baixando rapidamente os óculos de sol e eu vi suas intenções bem explícitas no sorriso que se espalhava por todo o rosto. Era o nosso trecho preferido da estrada e, naquele momento, particularmente, o movimento estava bem baixo. Aumentei mais o volume bem quando a playlist aleatória de começou a tocar Welcome To The Jungle, do Guns. Nós trocamos um olhar rápido e eu me preparei para passar para a próxima música.
– NÃO! – gritou. – Você não pode pular esse hino! Se eu tenho que te aguentar cantando Janis Joplin todo santo dia, você pode me deixar ouvir meu Axl gostoso em paz.
– . – Revirei os olhos. – Ele nem é mais gostoso. – Larguei as mãos ao lado do corpo, desistindo.
– Mas já foi! – Deu de ombros e acelerou mais, gritando o refrão, completamente desafinada.
Eu ri conforme o vento desajeitava completamente os nossos cabelos e tornava o barulho no carro insuportável.
– CLICHÊ PRA CARALHO! – Gritei em seu ouvido e ela riu mais ainda.
– Falou o clichê ambulante. – Ela diminuiu o volume e franziu o cenho. – Já imaginou o Harry fazendo um show só de cueca?
– Meu Deus, dá para ser mais aleatória? – Ri, mas não pude deixar de imaginar a cena, que ficou completamente bizarra na minha cabeça. – Acho que só funcionava com o Axl, amiga, e provavelmente porque ele não tinha muita noção do que estava fazendo. O público de Harry é meio... Novo, né? Em parte.
– Sim, faz sentido. – Ela riu e balançou a cabeça, como se tentasse afastar a imagem. – Mas ele tem umas músicas beeeeem... Digamos que vão meio contra a maré family friendly.
– Quê? – Virei meu corpo completamente para ela.
– É. Ele não gravou nenhuma oficialmente por motivos óbvios. – abriu um sorriso de lado. – Ah, amiga, estou achando que o senhor Styles ainda vai te surpreender muito.
Eu dei uma risada curta e voltou a concentração totalmente para a estrada. Em silêncio, fiquei imaginando que tipo de músicas Harry estaria cantando agora e minha curiosidade só aumentou. Começava a achar que deveria ter trapaceado e escutado algumas antes de sair de casa.
Em mais dez minutos, nos aproximávamos do estádio e o movimento já começava a mudar. achou melhor que fechássemos os vidros do carro, uma vez que ficaríamos mais expostas ao entrar no estádio. Fiz o que ela pediu enquanto via vários grupinhos de pessoas correndo. Eram pessoas com sorrisos enormes, garotas com camisetas estampadas com o nome de Harry, a cara dele e cartazes com os mais variados tipos de frase. Algumas bem sugestivas.
Instantaneamente fui jogada alguns anos no passado, durante o curto tempo em que acompanhei os garotos nos primeiros shows. A vibe ainda era a mesma, completamente contagiante, do tipo que dá vontade de sair correndo e abraçando todo mundo simplesmente porque o sentimento compartilhado é o mesmo. A única diferença era que agora Harry conseguia tudo aquilo sozinho e eu não pude deixar de sentir um tipo de orgulho enorme pelo que ele havia alcançado.
Quando viramos na rua que o GPS indicava, e na qual Harry havia me informado estar a entrada para o estádio, minha ficha pareceu finalmente cair. Senti meu estômago embrulhar e minha boca secar, parecia que toda a minha segurança tinha saído correndo pela janela do carro e eu desejei, por um momento, também sair correndo. notou minha inquietação e levou uma mão até meu braço.
– Ei! Vai ficar tudo bem! – Olhei para ela e dei um sorriso nervoso, assentindo com a cabeça. – Agora me ajuda aqui ou eu vou acabar atropelando alguma dessas garotas desesperadas.
Eu ri e ela baixou um pouco a janela, colocando a cabeça para fora a fim de enxergar melhor o que acontecia. Nos aproximamos do grande portão, que estava fechado, e soltou um "merda" baixinho. A aglomeração ali ainda era bem grande, o que complicava ainda mais nossa passagem.
– Psiu, aqui! – Uma mulher loira, de óculos escuros e vestida toda de preto, acenava em nossa direção. – ? – Ela perguntou e minha amiga fez sinal positivo. – Venham!
me olhou e eu apenas dei de ombros, já que meu cérebro parecia ter travado. Seguimos até uma vaga que ela indicou em um estacionamento improvisado e, assim que paramos, ela veio até nós e parou na janela do lado de .
– Oi, meninas! – Abriu um sorriso cordial. – Eu sou a Sam, estou responsável pela segurança hoje. Vou levar vocês até lá.
Estiquei-me um pouco para alcançar minha jaqueta no banco de trás enquanto descia do carro. Depois que entreguei suas coisas, ela acionou o alarme e seguimos Sam, que ia bem animada um pouco mais à frente.
– Você deve ser a , né? – Ela olhou para mim e eu achei que fosse desmaiar. Ser reconhecida claramente não estava no topo da minha lista de costumes. – O Harry não parou de falar em você desde que chegou aqui. – Quê?
Forcei um sorriso que mais deve ter parecido uma careta gerada por uma crise de dor de barriga e olhou para mim, sussurrando um "viu só?". Aproximávamos-nos de uma estrutura gigantesca composta pelo palco e pelo backstage e, conforme seguia Sam, tive certeza de que se não fosse pelo som dos meus passos somado ao barulho de conversas e risadas que aumentava, meus batimentos cardíacos vergonhosamente altos poderiam ser ouvidos. Andamos por quase dez minutos e então viramos em um pequeno corredor. Sam virou para nós e sorriu.
Parei e segurei firme no braço de , certa de que iria desmaiar a qualquer segundo, simplesmente odiava me sentir nervosa daquela forma. Olhei rapidamente para os lados na esperança de ver outra porta ou alguma rota de fuga, mas o único caminho possível era o mesmo por onde viemos e eu não ia passar aquela vergonha. Sam levantou a mão, pronta para bater à porta, e nós três nos assustamos quando ela abriu sem que o gesto fosse necessário. A cabeça de Harry surgiu pela fresta e um sorriso brotou em rosto assim que seus olhos pousaram em mim.
– ! – Engoli em seco e me senti pregada no chão, mas então ele nos deu espaço para passar. – Obrigada por trazê-las, Sam! – Ele agradeceu a loira e nós também sorrimos antes que ela desse meia volta e desaparecesse no corredor.
cutucou discretamente minhas costas e eu obriguei meus pés a se mexerem. Assim que entrei no camarim, Harry me puxou pela mão e me envolveu em um abraço apertado, colando meus braços ao lado do corpo e me levantando um pouco do chão. Ouvi rir brevemente atrás de nós.
– Ops. – Ele afrouxou um pouco o abraço e eu consegui passar os meus decentemente ao seu redor. – Me desculpa, eu estava com saudades. – Ele me soltou e eu olhei para meus pés, desejando que um buraco se abrisse bem ali e me engolisse. Minhas habilidades sociais pareciam ter sido completamente destruídas.
Ouvi um pigarro atrás de mim e então percebi que ainda não havia cumprimentado Harry. Nenhum de nós dois parecia ter notado isso, visto que ele continuava me olhando.
– Oi, ! – Ele abraçou e ela riu.
– Caralho, achei que tinha ficado esquecida no churrasco. Da próxima vez que resolver engolir minha amiga com os olhos, me avisa. – Ela disse, dando um tapinha no ombro de Harry e ele arregalou os olhos, coçou a nuca e deu as costas para nós, parecendo achar a parede oposta muito interessante. Lancei um olhar assassino para e ela deu de ombros.
– Harry, cadê os goles desse lugar? – ela perguntou, sentando bem largada em um sofá próximo. - Eu estou louca por uma cerveja.
– Ali. – Harry riu e apontou para uma porta que eu ainda não tinha notado. – Depois do corredor, primeira porta à esquerda, no frigobar. Não sei porque ainda não trouxeram para cá. – Me olhou e deu de ombros. – Fique à vontade! – ele disse quando já sumia na porta.
Harry então se virou para mim e eu senti alguma coisa diferente na forma como ele me olhava, algo que me deixava ligeiramente desconfortável. Sorri sem mostrar os dentes e ocupei o lugar de no sofá enquanto ele continuava em pé, sustentando o mesmo sorriso torto e ridiculamente perfeito.
– Que foi? – Revirei os olhos e apertei a jaqueta em minhas mãos.
– Você está linda. – Ele disse como se estivesse me informando que ia ao mercado comprar batatas.
Harry claramente não tinha noção da guerra que meus órgãos travavam naquele momento para se manterem quietinhos dentro do corpo.
– Você também. – Tentei sorrir de forma educada e Harry gargalhou, jogando a cabeça pra trás.
– , por favor! – Ele deu uma voltinha no lugar e passou as mãos pela lateral do corpo. – Eu sei.
– Idiota. – Dei risada, pega de surpresa pela resposta inesperada.
Harry estava usando uma camiseta branca, bermuda preta e chinelos. Ele não estava... lindo e sabia daquilo. Estava confortável, nada demais, mas eu não precisava de muito mais que aquilo para me sentir hipnotizada e as reações ridículas do meu corpo a cada movimento que ele fazia, claramente concordavam.
Só notei que já tinha passado muito tempo analisando os fios de cabelo que caíam desajeitados pela lateral do seu rosto quando ele abriu a boca para falar alguma coisa e foi interrompido.
– PUTA. MERDA. – gritou de algum lugar e Harry levou a mão à testa, sussurrando alguma coisa que não compreendi.
Levantei-me para conferir o que acontecia, mas ele avançou, segurando meu braço no mesmo momento em que passou pela porta, sendo seguida por... minha mãe?
– ! – Eu não tive oportunidade de dizer qualquer coisa e, no segundo seguinte, estava sendo jogada de volta no sofá.
Minha mãe me abraçava e distribuía beijos por todo o meu rosto enquanto apertava meus braços. Escutei e Harry rindo ao fundo.
– Mãe. Mãe. – Eu ri um pouco e ela saiu de cima de mim, sentando desajeitada no sofá. Ajeitei-me melhor e levei as duas mãos à boca, tentando reprimir um soluço, mas sem sucesso. No segundo seguinte estava chorando igual a uma criança e sendo amparada por seus braços enquanto ela dizia palavras carinhosas em meus ouvidos.
– Filha! – Ah, não.
Olhei para a porta e consegui definir apenas o contorno do corpo do meu pai através dos meus olhos embaçados. Agora eu tinha dois pares de braços ao meu redor e meus soluços só tinham aumentado. Depois do que me pareceram horas, os dois se afastaram, secando as lágrimas.
– , a ideia mais inteligente que você teve hoje foi ter escolhido maquiagem à prova d'água. – comentou e Harry concordou com a cabeça, rindo.
Olhei para os dois parados em minha frente e, em seguida para meus pais, que tinham sorrisinhos em seus rostos agora que tinham parado de chorar.
– Quem foi o responsável por isso? – Tentei soar séria e levantei do sofá, cruzando os braços.
Harry levantou uma mão, se acusando e abrindo um sorrisinho mínimo.
– Em minha defesa, nem era pra vocês terem se encontrado agora. A os encontrou e estragou meu plano. – Harry deu um sorrisinho irônico para minha amiga e sentou no sofá em frente ao que meus pais estavam.
– Entendi. – Apoiei uma mão no queixo e olhei para ele, reprimindo minha própria risada. – Explique-se.
Mas foi meu pai quem falou.
– O Harry convidou a gente também, ué. Está achando que é só você, alecrim dourado? – Ele riu e eu revirei os olhos. – , filha, a gente não se via desde... Desde aquilo tudo. Estávamos morrendo de saudades e o Harry achou uma ótima oportunidade nos reunir assim. Você não está feliz?
– Claro que eu estou, porra! – Recebi um olhar feio de minha mãe. – Desculpa! – Sorri. – Eu estou feliz demais. – Me virei de frente para Harry. – E você... Está me devendo uma.
Harry assentiu e sorriu de lado, mordendo o cantinho do lábio e me observando calmamente. Eu podia sentir o olhar de meus pais e observando a cena como três velhas fofoqueiras assistindo a uma novela.
– Fico feliz que tenha gostado da surpresa. Ou de parte dela.
– Harry... – Apertei meus lábios um contra o outro. – Você sabe que eu não aguento mais uma dessas, né? Serão três vezes em dois dias, você vai acabar me matando desse jeito.
Ele riu pelo nariz e deu de ombros.
– Você é uma das pessoas mais fortes que já conheci, pode aguentar qualquer coisa. – Me olhou de baixo a cima até seus olhos encontrarem os meus. Senti minhas bochechas esquentarem. Ouvi alguém tossir e então quebramos o contato visual.
– Bom... – Harry disse, olhando para cima. – Eu acho que vou indo lá para outra sala para vestir o figurino, fazer a maquiagem e tal. Deve estar quase na hora. – Ele riu e revirou os olhos. – Aí deixo vocês conversando mais à vontade.
– Harry... – Uma mulher com o cabelo cacheado mais lindo que eu já tinha visto apareceu à porta.
– Viu? Eu disse! – Ele riu e a abraçou de lado. – Gente, essa é a Leah, responsável por me embelezar. – Ela sorriu abertamente e acenou. – Já vou lá, me dá só um minuto – disse e ela sussurrou "só um!", apontando o dedo bem na cara dele e nós rimos. – , vem cá um pouquinho? – Ele me chamou assim que Leah saiu e eu levantei do sofá, seguindo-o até o corredor.
Senti os olhos de em minhas costas e meu estômago deu uma cambalhota. Perguntei-me o que ele poderia querer falar comigo.
– Hmm... Como a gente não vai ter mais tempo para conversar até o fim do show... – Ele segurou minhas mãos e seus olhos verdes se encontraram com os meus. – Eu só queria dizer que estou realmente muito feliz por você ter vindo. Significa muito para mim.
– Harry, você trouxe os meus pais para cá. Não sei se tem noção do quanto isso significa pra mim. – Eu sorri e meu olhar seguiu até a sua boca. – Hmm... Bom, vai pra lá, então. – Fiz um gesto displicente para disfarçar e o ouvi rir baixinho. – Quero ver o quão lindo você consegue ficar, Styles. – O olhei de forma desafiadora e ele mordeu os lábios.
– Você vai ver, senhorita . – Ele piscou antes de dar as costas e eu fiquei observando enquanto ele se afastava, até sumir em outro corredor.
Voltei para a sala onde meus pais conversavam animadamente com , me juntei a eles e, depois de muita insistência, finalmente aceitou que não ia contar o que Harry havia me falado. Passamos uns dez minutos apenas colocando meus pais a par dos últimos acontecimentos em nossa vida.
– Mãe... – eu disse quando finalmente me dei conta de um detalhe. – Então aquela parede e a história dos quadros... – Ela riu e escondeu os olhos com a mão.
– Hotel.
– Sua danada! – Dei um tapinha em seu braço e então nós quatro olhamos para a porta ao ver um ser humano parado ali.
– Oi. – Ele sorriu extremamente cordial, como o resto das pessoas que tinham falado conosco. – Eu sou o Jeff, empresário do Harry, melhor amigo e babá nas horas vagas. – Ele revirou os olhos e nós rimos. – Não acredito que ele deixou vocês aqui sozinhos.
– Não tem problema. – Eu sorri e levantei, apertando sua mão. – Nós estamos bem confortáveis.
– Você deve ser a , né? O Harry já falou pelo menos um milhão de vezes de como você era bonita, mas minhas expectativas foram todas superadas. Com todo o respeito. – Ele sorriu de novo.
Vontade de enfiar a cabeça num buraco: 10, : 0. Como assim Harry ficava falando de mim por aí?
– Obrigada. – Consegui formar um sorriso.
– Bom, então eu vou deixar vocês à vontade, estamos a mais ou menos uma hora do início do show. Já sabem onde fica a cerveja? – fez um joinha e ele riu. – Perfeito. Ah, vocês têm a opção de assistir ao show da lateral do palco ou lá da frente, em uma área mais reservada. Já sabem onde querem ficar?
Eu e trocamos um olhar rápido e ela respondeu por nós.
– Palco! – Olhou para meus pais, que assentiram sorrindo.
– Tudo bem. – Bateu palmas uma vez. – Um pouco antes do início alguém da equipe vem chamar vocês.
– Azzof! – Alguém o chamou em outra sala e ele bufou, jogando os braços para o alto.
– Deve ser aquela criança dando problema. – Ele riu e acenou rapidamente para nós, mas virou antes de sair pela porta. – Temos muito que conversar depois do show, . Aproveitem tudo, viu? O Harry sabe me dar dor de cabeça, mas os shows dele são uma experiência única, vai se acostumando. – Ele piscou para mim e sorriu divertido.
– Uuuuh. Vai se acostumando! – imitou Jeff e deu uma risadinha idiota quando ficamos os quatro sozinhos de novo. – Já está fazendo parte da equipe! – Dei um soco em seu braço e ela fez uma careta. – Nossa, você é péssima. Vou pegar mais cerveja para nós quatro. – Ela disse e saiu pela mesma porta.
Eu ri e sentei entre meus pais no sofá. Minha mãe me abraçou de lado e me olhou com um sorriso tristonho.
– Filha, a gente vai pegar o voo de volta logo depois do show. – Senti meu estômago afundar e um nó se formar em minha garganta. – Temos muitas coisas para resolver lá em casa. Deixamos o escritório com vários casos. – Me obriguei a abrir um sorriso, por mais que me doesse deixá-los ir tão rápido. Sempre admirei a forma como meus pais se dedicavam ao trabalho.
– Mas mãe...
– Não fica triste, filha! – meu pai disse e sorriu. – Eu sinto que a gente vai voltar a se encontrar antes do que você imagina e o Harry já deu essa oportunidade incrível para nós. Ele é realmente um garoto maravilhoso. – Olhou para minha mãe, que sorriu concordando. – Vamos só aproveitar essas horas que temos juntos.
– Está certo! – Suspirei e abracei mais minha mãe, me sentindo instantaneamente muito mais leve.
Meu pai sempre teve um dom incrível de me fazer enxergar as coisas de maneira muito simples, sempre fazia eu me sentir mais segura.
– Prontinho! – surgiu na porta, segurando quatro garrafas long neck e ostentava um sorriso enorme.
Começamos a beber e conversar e logo já estávamos rindo alto até demais. As poucas vezes em que o nome de Lizzie foi mencionado, o mesmo trocado por outro assunto e não parecia estranho ou errado fazer aquilo, parecia simplesmente um acordo feito entre nós para aquele momento. Para mim, minha irmã estava ali conosco, eu podia senti-la ao nosso lado e a sensação que eu tinha era de paz. Quase uma hora depois, já me encontrava levemente alterada e meus pais riam de alguma coisa enquanto abraçavam . Leah apareceu na porta e pareceu achar graça da cena quando nos viu.
– Gente! – Ela atraiu nossos olhares em sua direção. – Me sigam, por favor. O show vai começar em dez minutos.
deu uns gritinhos e correu em minha direção, agarrando meu braço enquanto eu ria. Seguimos Leah em silêncio e eu podia ouvir meus pais conversando atrás de nós. Ela nos levou até a área lateral do palco, onde havia um espaço reservado com muitos fios e equipamentos, mas também uma mesa com mais bebidas e algumas cadeiras. Sorri satisfeita ao perceber que teríamos uma visão muito boa dali.
– Podem ficar aqui. Precisam de mais alguma coisa? – Nós quatro balançamos a cabeça em negação e ela sorriu. – Perfeito, aproveitem! – disse e saiu correndo ao ser chamada por alguém.
– Coitada da moça. – meu pai disse, se sentando em uma das cadeiras e abrindo uma cerveja. – Imagino como eles devem ter uma vida corrida.
– Nem me fale, pai. – Me sentei ao lado dele, rindo ao ver espiar o outro lado do palco como se Harry fosse surgir a qualquer momento, como fumaça. Estava tão acostumada a ter ela junto conosco que às vezes me esquecia de que realmente era uma fã.
Simplesmente não notei os minutos seguintes passando, fosse por culpa da cerveja ou porque meu coração parecia não querer mais parar dentro do peito. Quando dei por mim, cada nervo no meu corpo parecia ser despertado por uma explosão de gritos ensurdecedores. As luzes do estádio se apagaram por um segundo e então se acenderam novamente, em uma explosão de cores.
– , olha! – Senti as unhas de se afundarem em meu braço. – Olha! – Ela apontava para um ponto do palco e então eu finalmente pude vê-lo.
Harry surgia por entre a banda e os gritos aumentavam cada vez mais. Perguntei-me se era possível que aquelas garotas saíssem vivas de shows como aquele. Harry tinha um sorriso gigante no rosto e estava simplesmente lindo naquelas roupas completamente coloridas e extravagantes que ficariam ridículas em qualquer outra pessoa, mas que pareciam apenas exaltar sua beleza de maneira absurda. Eu observava atentamente cada um de seus movimentos. Notei seus olhos percorrendo rapidamente o local onde estávamos até parar em mim. Ele sorriu de lado e piscou, então segurou o microfone e uniu os primeiros versos da música ao som dos instrumentos da banda. Milhares de vozes cantando muito alto e em coro, com único objetivo. Todas estavam ali por ele, só para ele.
Mais de metade do show já havia passado e eu estava sentada, tentando me recuperar da explosão de energia da última música. Tinha que admitir que seu trabalho todo era muito melhor do que havia esperado e era óbvio demais o porquê do sucesso e fama gigantescos. Harry fazia todas as coisas com tanto apreço e carinho que era simplesmente impossível não amar cada verso e palavra das músicas. Era fácil sentir como elas eram reais e como ele se entregava completamente ao momento. A energia no estádio se tornara tão grande e palpável que era quase possível ouvir os corações batendo, ver as lágrimas de felicidade escorrendo e ouvir os gritos, ensurdecedores e que só aumentavam cada vez mais, à medida que o tempo passava e ele abria a boca para dizer qualquer coisa ou fazer alguma piadinha. Harry tinha seu público rendido e na palma das mãos.
– Eu vou ter um filho, . – olhava para o palco sem piscar. – Eu não achei que fosse possível engravidar de uma música, mas aconteceu. Eu vou ter um filho.
Eu ri e levantei novamente assim que a música terminou.
– San Jose, eu tenho que confessar uma coisa. – Harry disse e mais uma onda gritos foi ouvida. – Eu tive um sonho. Um sonho muito, muito estranho. – Mais gritos e risadas. – Eu tive esse sonho durante uma viagem, quando começava a gravar o disco. Eu sonhei com... – seus olhos se fixaram em mim e ele abriu um sorriso tímido. Meu estômago embrulhou e deu pulinhos animados ao meu lado. – Uma pessoa incrível e muito especial para mim e que eu não via há muitos anos. Mas vocês sabem que muitas vezes os sonhos não fazem sentido e aquele sonho com certeza não fazia sentido nenhum. – Harry olhou para baixo e riu. – Mas ele despertou alguma coisa dentro de mim e desse sonho nasceu uma música. – Ele fez silêncio e os gritos aumentaram quando as notas da música começaram a tocar. – Essa é Sunflower, Vol. 6.
O show poderia muito bem ter acabado ali, se dependesse de mim. Senti minhas pernas tremerem e me sentei de novo no banco enquanto ouvia não cantar, mas gritar a música. Me esforcei para compreender alguns versos, pois só uma coisa parecia ocupar meu cérebro naquele momento: Harry tinha feito uma música para mim. Depois de tantos anos, ele não tinha esquecido. Ele não tinha me esquecido. Não tinha esquecido a promessa. Puxei com força pelo braço e ela fez uma careta.
– Você sabia disso? – perguntei e ela respondeu com um sorrisinho.
– Eu ouvi o álbum, amiga. – Deu de ombros, voltando a olhar para o palco.
Eu não sabia como reagir, queria rir e chorar ao mesmo tempo, invadir o palco e o fazer engolir o microfone com pedestal e tudo por fazer aquilo comigo, por me fazer sentir todas aquelas coisas em apenas dois dias, por me fazer sentir tão importante e querida, por me resgatar de um lugar muito escuro e profundo e me trazer de volta para a luz. Uma luz quente, amarela e feliz, produzida em um dia quente de verão há muito tempo atrás.
-flashback-
– , vem logo! – Lizzie corria um pouco mais à frente, indo em direção à pequena sorveteria. Harry e eu andávamos lado a lado, com as mãos entrelaçadas, e eu me sentia muito feliz.
– Espera. – Harry parou de repente e me puxou para trás.
Estávamos em frente a uma pequena floricultura na qual eu não havia reparado quando passamos. Uma mulher, na casa de seus quarenta anos, ajeitava um grande vaso de girassóis sob uma mesinha na calçada. Ela olhou para nós e sorriu.
– Querem levar um buquê, queridos?
As bochechas de Harry ficaram muito vermelhas e ele abriu um sorrisinho encabulado.
– Ah, não. Nós não temos dinheiro para tanto.
– Não seja por isso. – Ela riu e puxou um único girassol do vaso. – Levem esse. É um presente! Para combinar com o vestido amarelo dessa mocinha!
– Ah! – Harry pegou o girassol, meio sem jeito. – Muito obrigado. Mesmo!
Ela sorriu e eu acenei, também agradecendo. Harry ainda segurava o girassol quando nos afastamos da loja. Lizzie já tinha sumido de vista há uns bons minutos e ainda estávamos a três quadras da sorveteria. Ele olhou para mim e sorriu.
– Toma. – Me entregou o girassol e eu sorri. – Sunflower. É uma bela palavra, né? Sempre achei que combinava com você. – Eu continuava em silêncio, sem saber muito bem o que dizer. – Eu vou escrever uma música, .
– O quê? – Eu ri, sem entender a mudança brusca de assunto.
– Sim. Um dia, quando eu for um cantor famoso, vou escrever uma música sobre você. – Ele sorriu, virando o rosto para mim e estreitando um pouco os olhos, por causa do sol. – E ela vai se chamar Sunflower. Vai ser uma música muito feliz para combinar com você e com esse seu vestido que é muito amarelo.
– Amo você, Harry – eu disse, simplesmente, e apertei mais sua mão entre a minha.
– Amo você, sunflower.
-fim do flashback-
A música terminou e eu olhei na direção de Harry, secando algumas lágrimas. Ele agradecia várias vezes às pessoas presentes e sorria. A julgar pela barulheira indefinida que tomava conta do estádio, não era só eu que sentia... coisas... com aquela música. Uma sensação muito estranha tomava conta do meu corpo. A volta daquela lembrança que eu não acessava há tanto tempo, vê-lo ali cantando pequenos pedacinhos da nossa história para todas aquelas pessoas, e meus pais junto de mim, sendo testemunhas daquele momento. A música tinha uma letra engraçadinha e alguns trechos eram bem sugestivos, o que fez eu me sentir um pouco envergonhada. Eu realmente queria invadir o palco, mas para arrancar Harry de lá e fazer ele me explicar aquela história toda. Eu estava eufórica.
– Amiga, volta para a Terra! – gritou no meu ouvido e eu percebi que uma nova música já havia iniciado.
Senti um cutucão nas minhas costas e virei. Meu pai deu uma piscadela e me estendeu uma garrafa de cerveja, que eu agradeci e peguei sem pestanejar, estava mais do que nunca precisando beber. Três músicas depois, Harry agradeceu a presença de todos e se despediu. Eu ainda sentia meu corpo meio anestesiado. Tive que lutar para sair do lugar enquanto me empurrava em direção às escadas que davam acesso ao corredor. Começamos a fazer o caminho de volta para a sala e eu cutucava nervosamente o cantinho de uma das unhas. Meus olhos buscavam por ele.
– E aí? O que você achou? – me empurrou de leve com o ombro e sorriu. – Perfeito, né? Eu achei que você ia cair dura no chão quando ele cantou a sua música. – Quase caí. – respondi vagamente e entrei na sala, indo direto para o sofá.
Meus pais entraram logo depois e tomaram lugar em duas cadeiras ao lado.
– ! – Jeff entrou com um sorriso enorme e os cabelos bagunçados e olhou na direção dos meus pais. – Me desculpem por vir assim rápido, mas é que vocês pediram para nós avisarmos, então o Lewis está só aguardando para levar vocês até o aeroporto. – Olhou para mim do novo. – Você fica. Ordens do Harry.
Oi? Como assim, "ordens do Harry"?
– Não, eu não posso ficar. – Eu ri e levantei do sofá. – Tenho que ir com eles.
– Não tem não, senhorita! – Meu pai também levantou, seguido de minha mãe, que bocejou e alongou um pouco as pernas. – Não tem necessidade nenhuma. – Abri a boca para protestar e minha mãe levantou a mão.
– Não, ! Seu pai está certo! – Ela veio até mim e me abraçou. – Vai ser super rápido depois que chegarmos ao aeroporto. Se você for junto só vai ter mais problema para voltar.
– Mãe... – Minha voz estava chorosa e eu afundei meu rosto na curva do seu pescoço.
Ela segurou meu rosto entre as mãos e meu pai parou ao nosso lado. estava quieta, um pouco mais atrás.
– Foi ótimo passar essa noite com você, meu bebê. Não fica triste, logo a gente se vê – minha mãe disse.
– Promete? – Olhei dela para meu pai e os dois assentiram, sorrindo.
– Prometemos. – Me abraçaram.
Caminhei com eles até o estacionamento e ia ao meu lado, com uma mão sobre o meu ombro. Quando chegamos perto do carro, Lewis acenou e ficou parado bem ao lado da porta.
– Filha, vem aqui um pouquinho. – Minha mãe me puxou pela mão e nos afastamos de meu pai e , que conversavam animadamente.
Ela sorriu e colocou uma mecha do meu cabelo atrás da orelha, passando o dedão duas vezes na minha bochecha, exatamente como fazia quando eu e Lizzie éramos crianças. Fechei os olhos, sentindo o gostinho doce da lembrança.
– Aproveite bem, filha. – Abri os olhos e segurei em suas mãos. - Aproveita essa chance nova que a vida está te dando. – Olhei para ela sem entender, minha cabeça claramente já dava sinais de cansaço. – Estou falando do Harry, caso você não tenha entendido. – Ela riu e revirou os olhos.
– Ah, não, mãe. – Eu ri, nervosamente. – O Harry...
– Gosta muito de você. – Ela disse pontual e prática, como sempre era. – Ele gosta muito de você, filha. Eu não vou entrar em detalhes sobre a conversa que nós tivemos lá em casa porque envolve coisas pessoais. Se um dia ele quiser te contar, ele conta, mas eu posso te garantir uma coisa... – olhou diretamente nos meus olhos – o Harry passou todos esses anos guardando esse sentimento dentro dele, nutrindo essa coisa muito bonita que sente por você. Não é um grande mistério, né? Ele escreveu até uma música! – Ela riu e eu acompanhei. – É um privilégio! Então o que eu quero dizer é: dá uma chance. Vocês já deram o primeiro passo para reconstruir ou continuar a história que tiveram, agora cabe a você decidir se quer continuar ou não.
– E nós vamos estar sempre do seu lado, filha, sempre te apoiando, independente de qual for a sua decisão. – Meu pai tinha aparecido atrás de nós e sorria. – Mas eu ia gostar muito. Você sabe que eu sempre fui team Harry.
Nós rimos e minha mãe o chamou com a mão, abraçando-o de lado. Provavelmente eles já haviam tido aquela conversa antes de falar comigo. Meus pais sempre conseguiram ser sinceros comigo e com Lizzie, era uma das minhas coisas preferidas em sua forma de agir. Sem meio-termo, sem passar muito a mão na cabeça. O que tivesse de ser dito, seria. Simples assim.
– Vai nos mantendo informados da situação, filha – meu pai disse e me abraçou enquanto caminhávamos em direção ao carro.
virou e acenou para Harry, que se aproximava de nós já com outra roupa. Ele abriu um sorriso e parou bem ao meu lado. Pude sentir um cheirinho de roupa fresca e perfume, constatando que ele havia tomado banho. Minha mãe sorriu e o abraçou.
– Obrigada pelo convite, Harry, e por tudo, basicamente. Você é importante demais para nós e o show foi incrível.
– Muito obrigada mesmo, mas sou eu quem precisa agradecer por ter vocês na minha vida. - Harry se afastou um pouquinho de minha mãe e olhou na minha direção. – Agora mais do que nunca.
Meu pai, que estava esperando ao lado bem quietinho, se adiantou e também abraçou Harry. Eu realmente já estava toda boba em ver a relação de carinho que existia entre os três. Depois de mais alguns abraços e chororô de despedida, meus pais entraram no carro, acenando para nós. Ficamos os três parados, observando eles se afastarem. Eu sentia meu coração na palma da mão, tão pequeno que poderia muito bem sumir e eu não iria nem perceber. Harry então se virou para nós e sorriu, com as mãos na cintura.
– E então? Gostaram do show?
– Styles, você sabe que eu amaria qualquer coisa que você fizesse. – Ela bufou e Harry riu. – Mas pergunta para a . Tenho certeza que ela tem muita coisa para falar. Rolaram até lágrimas e tal.
– ! – Dei um tapa em seu braço e Harry levantou uma sobrancelha, intrigado. – A gente fala sobre isso depois.
– Sobre isso... Bom, vamos entrando – ele disse e deu empurrõezinhos em nossas costas, mas parou e olhou para mim.
– Amiga, na verdade... – Ela torceu as mãos uma na outra e me deu um olhar que eu conhecia muito bem. O olhar com consciência pesada. – Carlos me mandou mensagem enquanto você estava falando com a sua mãe. – Ela deu uma risadinha sem graça – Ele está aqui na cidade, acredita? E até me chamou para jantar.
– Oi? – Eu não queria acreditar no que estava ouvindo. – , eu achei que a gente fosse voltar juntas para casa. – Frisei a última palavra, prevendo a dimensão do problema.
– Ai, Harry! – Ela bufou e bateu um pé no chão. – Me ajuda! Fala logo pra ela.
– Falar o quê? – Olhei de um para o outro, com os braços cruzados.
– Eu quero que você vá comigo para o hotel, . – Ele riu e coçou a nuca. – Não era bem assim que eu esperava convidar, mas...
– O quê? Harry, eu não posso.
– Espera! – ele disse rapidamente, percebendo o que tinha dito. – Você entendeu errado. Vai todo mundo para lá, para relaxar e tal. A gente sempre dá uma festinha depois dos shows. – Piscou. – Bom, na verdade geralmente eu só chego e apago na cama, mas se você for junto eu posso abrir uma exceção.
– Bom, nesse caso... – Analisei rapidamente minhas alternativas, que se resumiam a zero. Tinha sido abandonada por minha melhor amiga e Harry me oferecia uma noite com pessoas desconhecidas que poderiam provavelmente aniquilar o resto da minha autoconfiança. O que eu tinha a perder, não é mesmo? – Eu... acho que vou com você. – Dei de ombros e Harry sorriu ainda mais.
– Harry! Eu estava te procurando a um tempão! – Jeff apareceu e tinha uma cara de poucos amigos, mas sorriu quando me viu. – Oi, , gostou do show? Seus pais já foram? – ele disse, olhando para os lados meio atordoado e eu ri. – Queria ter me despedido deles.
– Estava tudo perfeito, Jeff! Sinceramente, não sei o que seria do Harry sem você!
– EI! Conhece ele há cinco minutos e já está dando essa confiança toda? – Harry cruzou os braços e fez uma cara ofendida.
– O que eu posso fazer? Já disse que sou muito melhor que você, Styles! – Jeff sorriu convencido. – Obrigada, ! Então, vai com a gente para o hotel? Você dorme lá e nós damos um jeito de te mandar de volta para casa amanhã mesmo, no horário que preferir. – Sorri, aliviada por saber que teria como voltar, mas preocupada com uma coisa. Onde exatamente eu dormiria?
– Eu vou sim. Deixa só eu ir até o carro pegar as minhas coisas.
– Ok. Te encontramos aqui fora de novo em dez minutos no máximo. – Ele sorriu e segurou Harry pela camiseta, o levando de volta para o backstage.
Fui com até o carro e notei que ela evitava olhar para mim. Em silêncio, abriu a porta de trás e entregou minha bolsa. Ela estava com medo pela forma como eu reagiria por ter sido trocada agora que estávamos a sós. Resolvi brincar.
– Não vou esquecer esse vacilo tão fácil, ok? – Fiz um biquinho e ela revirou os olhos, rindo.
– Ah, vá! Vai dizer que não está toda derretida pelo convite do Harry? – Eu ri nervosamente e ajeitei a bolsa no ombro. – Viu? Eu sabia. Essa carinha boba não me engana. Agora, pelo amor de Deus, se cuida e me conta se rolar alguma coisa. Qualquer coisa, mesmo que seja um beijo ou uma lambida na bochecha. – Fiz uma careta.
– Você é nojenta, , mas pode deixar que eu conto, sim. – Puxei-a para um abraço. – Se cuida você também, não faça nada que eu não faria. Isso inclui transar com o Carlos, mas aí já sei que não posso contar com você.
– Não pode mesmo. – ela riu, se soltando, e mostrou a língua.
Então entrou no carro, colocou o cinto e baixou o vidro.
– Você vai encontrar com ele em algum lugar? – perguntei.
– Uhum. Num restaurante aqui pertinho. – Ela sorriu. – E quem sabe depois ele vire a sobremesa.
– Detalhes demais. – Coloquei as mãos sobre os ouvidos. – Detalhes demais. Falo contigo amanhã cedo, antes de voltar.
Enfim eu estava sozinha e me permiti soltar um grito baixinho. Depois de tantas emoções em um único dia, ter um momento só pra mim já estava me fazendo muita falta. Olhei para os lados e fiquei em dúvida se deveria voltar e procurar por Harry ou esperar ali mesmo como Jeff havia dito, mas então senti duas mãos em minha cintura.
– Finalmente você é só minha. – Harry disse bem perto do meu ouvido. Perto demais. Fechei os olhos, sentindo todos os pelinhos da minha nuca se arrepiarem. Virei-me e o encontrei me olhando com um sorriso divertido.
– Harry... – Resolvi dizer logo o que me preocupava. – Tem cama sobrando para mim lá? – Ele riu e eu me senti muito idiota. Era óbvio que tinha.
– Sim, . Você não precisa dormir comigo. – Sorriu de lado. – Se não quiser...
– Harry!
– Eu estou brincando. Calma! – Ele gargalhou e eu dei um tapa em seu braço.
Então Jeff apareceu, seguido por um grupo de pessoas com caras que misturavam cansaço e animação.
– , nossa estrela da noite! Essa é a banda, ou eu deveria dizer, bando de loucos que segue o Harry para todo lado. – Ele riu e ouvi vozes e cochichos zoando a péssima piada, mas Jeff não se deixou abalar. – Mas você vai ter tempo para conhecer todo mundo depois.
Ainda um pouco abalada por ser chamada de estrela, deixei que as mãos de Harry me guiassem pelas costas até um grande carro preto que estava encostado logo ao lado.
– Eles vão na van, que é maior. – Ele sorriu quando viu que eu olhava para fora do carro, preocupada com o destino do resto das pessoas presentes.
Eu estava no banco de trás com Harry e ia Jeff no banco da frente ao lado de Tom, o motorista. Em poucos minutos já seguíamos pelas ruas movimentadas e então minha cabeça encostou-se ao banco, fechando os olhos. Senti a mão quente de Harry sobre a minha e tombei a cabeça um pouquinho para o lado, abrindo apenas um olho. Observei seu rosto com calma. Eu tinha decidido ser muito cautelosa com a forma como iria interpretar suas atitudes pelo resto da noite, apenas por precaução. Ele sorriu cansado, mas sustentou meu olhar.
– . – Jeff me chamou e Harry puxou um pouquinho a mão, mas nossos dedos continuavam em contato. Minha pele formigava no ponto do encontro. – O Harry disse que você é formada em Teatro na melhor universidade da cidade. – Ele se virou no banco para poder me olhar e sorriu. – E disse que você é ótima no que faz.
– O final eu deixo por conta do Harry, mas o resto é verdade, sim. – Ri e olhei para Harry, levantando uma sobrancelha. Ele deu um sorriso divertido e apenas moveu os lábios, dizendo "mas é verdade".
– Eu acredito que nesse ponto ele esteja certo. – Jeff disse simplesmente e assumiu um tom mais formal. – Eu conheço várias pessoas influentes em San Francisco, , tenho vários contatos na cidade. Pessoas ligadas ao teatro, ao cinema. Acho que adorariam te conhecer.
Senti minha boca secar e Harry olhou para mim. Dessa vez sua mão envolveu a minha por completo, segurando-a firmemente. Ele queria me passar confiança. Confiança essa que eu nem sabia mais se existia em mim ou se poderia simplesmente recuperar algum dia.
– Jeff, eu não sei nem o que dizer. Significaria muito pra mim, mesmo. – O ouvi rir brevemente.
– Não precisa dizer nada, , tenho certeza de que se você tem o talento que Harry diz ter, muitas portas vão se abrir para você – ele disse de forma muito séria e eu me senti corar.
Busquei o olhar de Harry novamente e ele sorriu de forma doce e calma. Suspirei e olhei pela janela, observando as luzes que passavam rápidas e que, naquele momento, me pareceram muito mais brilhantes.
Em mais alguns minutos, chegamos ao hotel e o carro seguiu direto para a garagem. Passamos por um pequeno grupo de garotas que olhavam curiosas para o veículo, provavelmente tentando se certificar de que um de seus ocupantes era Harry Styles. Eu já estava achando muito estranha aquela movimentação toda só para conseguir chegar em segurança até o quarto. Eram esses momentos que me faziam realmente refletir sobre o preço que muitas vezes a fama pode cobrar. Abuso de drogas, depressão, noites em claro, assédio sem fim... Harry tinha sorte de ter tantas pessoas boas ao seu lado, determinadas a dar o seu máximo para vê-lo bem.
Descemos do carro e então eu vi a van chegando logo atrás de nós. Harry, Jeff e eu seguimos para um elevador que era grande demais para um elevador. Harry deve ter visto a minha cara espantada e riu brevemente.
– Ele dá acesso direto à cobertura. – Explicou, simplesmente, e eu soltei um "ah", concordando com a cabeça.
Quando chegamos ao último andar a porta se abriu, revelando uma sala bem grande e iluminada que já devia ter umas... dez pessoas? Como ou quando elas haviam chegado ali, eu não fazia ideia. Fiquei parada um pouco mais para o lado, torcendo para que uma parede me engolisse. Observei Harry ser atacado por mãos, abraços e sorrisos – alguns já bem bêbados – e Jeff se aproximou.
– Se você for mais para trás, vai sumir na parede. - Sorri culpada e ele riu. – Me deixa levar as suas coisas lá para o quarto. Na verdade... fica à vontade se quiser trocar de roupa ou algo do tipo. Vem, eu te mostro onde é. – Ele estendeu a mão e eu entreguei a bolsa e a jaqueta, ficando apenas com meu celular.
Segui Jeff por um corredor que era pelo menos duas vezes maior que o do meu apartamento. Passamos por três portas fechadas, parando na seguinte. O quarto não era muito grande, mas a cama me pareceu extremamente confortável e eu não tinha chegado nem perto. Oi, cansaço. Jeff largou minha bolsa e a jaqueta sobre uma cômoda e indicou uma porta.
– Banheiro. – Sorriu e eu assenti em silêncio, tomando consciência da minha bexiga apertada. – Depois volta lá com a gente. Não vale dormir agora, hein! Garanto que o Harry vem para cá e te arrasta de volta.
– Não duvido nada. – Nós rimos e eu fiz um sinal positivo. – Pode deixar que eu já vou.
Jeff assentiu e saiu do quarto, fechando a porta atrás de si. Respirei fundo, sentindo meus músculos reclamarem com a exaustão, e fui até o banheiro. Fiz xixi calmamente, agradecendo por estar em um ambiente em que, por alguns segundos, não precisava interagir com ninguém. Lavei as mãos e verifiquei meu estado no espelho, arrumando um pouquinho o cabelo com as mãos. Saí do quarto decidida a tentar interagir com quem quer que fosse.
Sem sinal de Harry e ainda me sentindo completamente deslocada, comecei a procurar um lugar para sentar. De repente ouvi mais um auê e a porta do elevador abriu novamente. Cinco seres humanos saíram de dentro dele.
– Eu não acredito que ele deixou a gente para voltar naquela van de novo! – O homem que eu havia identificado como o guitarrista falou. Seu nome era Mitch, se eu bem tinha ouvido Harry dizendo em algum momento.
– Estou com ódio, só preciso beber. – Uma morena revirou os olhos, as outras duas que a acompanhavam concordaram e então seus olhos caíram sobre mim. – ! – Ela disse e as três vieram até mim, cheias de sorrisos. – Famosa . Eu sou Sarah, baterista e cansada.
Eu ri e ela apresentou as outras duas. Em poucos minutos já estávamos fazendo comentários sobre as músicas e o show e eu me sentia muito mais à vontade. Fiquei maravilhada em perceber como todas as pessoas envolvidas com o trabalho de Harry realmente estavam sempre na mesma vibe que ele, de total dedicação a cada passo que davam, cada coisa que faziam. Tudo envolvia amor e cuidado ao extremo.
– . – ouvi primeiro a voz rouca, em seguida senti o metal gelado dos anéis de Harry contra a pele da minha cintura e arrepiei. De novo. Vi as três trocarem olhares rápidos e notei sorrisinhos brotando em seus lábios. – Esse é o momento em que eu roubo você para mim. – Ele ficou ao meu lado e sorriu para elas, uma das mãos ainda em minha cintura. – Desculpa. Vão achar outra para incomodar.
As três reviraram os olhos e mostraram os dedos do meio para Harry em uma sincronia perfeita, rindo em seguida. Recebi uma piscadinha de Sarah e tentei não levar muito a sério. Tinha a impressão de que elas sabiam muito mais do que demonstravam. Harry sorriu para mim e entregou um copo com um conteúdo que, à primeira vista, não me agradou.
– Bebe whisky? Posso pegar outra coisa se você preferir. – Ele segurou minha mão e me guiou entre as pessoas. Não pude deixar de notar que algumas me observavam de maneira curiosa enquanto outras cochichavam. Muito cedo para desejar mais uma vez que o chão me engolisse?
– Se você abre uma exceção, eu abro uma exceção. – Sorri, me lembrando do que ele havia dito mais cedo e o ouvi rir.
Havíamos chegado ao lado de fora, que consistia em uma grande área aberta com alguns banquinhos e mesas, além de uma vista incrível para a cidade. Parei de prestar atenção em Harry e continuei caminhando até o parapeito. Apoiei as mãos na beirada e olhei pra baixo. Era alto. Muito alto. Me perdi observando o movimento nas ruas distantes até que ouvi a respiração de Harry bem pertinho, atrás de mim, e então me virei. Seu rosto estava a centímetros do meu. Ele sorriu e se afastou pro lado, bebendo um gole do seu whisky. Copiei seu gesto e fiz uma careta.
– Então... – Ele começou e soltou o copo numa mesa ao lado. – Porra, eu não via a hora de poder ficar sozinho com você de novo. – Ele riu brevemente e eu sorri sem mostrar os dentes. Estava berrando por dentro. – O que você achou do show? Por favor, me conte tudo. Eu sou capaz de mudar os próximos ou cancelar a tour dependendo do que você disser. – Passou o indicador devagarzinho pelo pescoço, em um gesto dramático.
– Harry... – Eu ri e revirei os olhos. – Creio que tal atitude drástica não vá ser necessária. – Virei um pouco a cabeça e suspirei, olhando em seus olhos. – O show estava perfeito. – Ele abriu um sorriso enorme. – E sim, eu adorei as músicas. Todas elas. Toda aquela energia... As pessoas te amam demais, garoto! Estou muito orgulhosa, de verdade. – Sorri e contornei com o indicador a borda do copo.
– Olha só... Muito obrigada! – Ele fez uma pose pomposa. – É um elogio enorme vindo de você.
– Cala a boca. – Dei um soquinho em seu braço.
– Mas assim... Todas as músicas? – ele disse, ficando mais sério de repente. O momento pelo qual eu temia.
– Todas, Harry. – Levantei uma sobrancelha e ele virou bem de frente para mim. Percebi que ele esperava que eu continuasse. – Sério, eu... não estava esperando. Não sei nem explicar como eu terminei o show em pé, para falar a verdade. – Eu ri e levei a mão à testa, mordendo um pouquinho o lábio inferior. Harry me observava atentamente. – Harry, aquela história do sonho... É verdade? – Ele jogou a cabeça pra trás, gargalhando, e se aproximou mais um pouco.
– É verdade, sim. – E então deu um sorriso safado. – Foi um sonho meio errado.
– HARRY! – Senti minhas bochechas queimarem e ele riu ainda mais. – Mas você não me via há anos. Como...
– Eu não sei! – Ele deu de ombros. – Quem apareceu no meu subconsciente fazendo propostas indecentes foi você. E foi assim. – Ele estalou os dedos. – Foi o necessário para que eu me lembrasse da promessa que fiz e aí a música foi nascendo aos poucos. Foi como se... As coisas fossem simplesmente se encaixando.
– Eu não acredito nisso – eu disse e olhei pra baixo, dando mais um golinho no whisky. – Nossa, é muita informação para processar.
– No dia seguinte eu quis até voltar a falar com você, mas não te encontrei em nenhuma rede social. E procurei ontem também. – Ele revirou os olhos e eu ri brevemente.
– Eu me desfiz de todas elas tem um tempo já. Não sei se tenho interesse em voltar tão cedo.
– Está certo. Eu sou a pessoa famosa e você é quem se esconde. – Harry riu e deu um gole em seu copo. Eu sorri e dei de ombros. – ... – Ele me olhou sério e se aproximou um pouco mais, brincando com uma mecha do meu cabelo. – Eu preciso que você saiba que eu não parei de pensar em você desde o dia em que tive aquele sonho. E ele também não foi o último. Eu... Era como se a vida estivesse me mandando sinais, dizendo para correr atrás de você e recuperar o tempo perdido, sabe? Essa... – fez um movimento de pêndulo com o dedo – Coisa que a gente tem. – Eu sorri. Coisa era uma palavra que definia muito bem, inclusive todos os meus sentimentos completamente confusos. – Então depois do que aconteceu com a Lizzie... Aquilo foi a gota d'água. Eu entendi de uma vez que precisava estar do teu lado de novo. Independente de como fosse acontecer.
Eu olhava pra Harry e aos poucos deixava de prestar atenção em suas palavras, meu copo estava quase vazio e meus pensamentos pareciam um pouquinho mais embaçados, assim como os lábios de Harry pareciam muito mais interessantes. Quase conseguia sentir sua respiração batendo contra minha pele e seus olhos pareciam ter um brilho muito intenso sob toda aquela luz da cidade. Eu queria dizer muitas coisas, mas parecia não encontrar as palavras certas. Meus dedos tamborilavam nervosamente contra o vidro do copo e eu me sentia quase nua sob o seu olhar atento e silencioso enquanto ele aguardava uma resposta.
Fiz então a única coisa que me pareceu certa naquele momento. Sim, porque se eu estivesse mais sóbria com certeza teria agido de maneira diferente, mas estando ali, completamente cercada por sua energia, meu cérebro resolveu apenas descartar todas as outras milhões de possibilidades do universo e então me vi dando mais um passo a frente, praticamente colando nossos corpos. Ao contrário do que eu esperava, Harry não recuou ou desviou o rosto um centímetro sequer. Pelo contrário, seus olhos observavam em mim a mesma coisa que os meus buscavam nele: os lábios.
– Obrigada por sonhar comigo, pela música e... por voltar – disse bem baixinho, quase em um sussurro e bem próximo à sua boca. Tão próximo que, em um movimento pequeno demais que eu não soube se tinha sido meu ou dele, sua pele tocou a minha.
Senti a carne macia de seus lábios em contato com a região bem ao lado da minha boca e inspirei o ar profundamente. Meu coração batia com força contra as costelas, provavelmente me odiando por fazê-lo trabalhar de forma tão dura para me manter viva durante aqueles segundos. Fechei os olhos e senti o hálito quente de Harry se espalhar com leveza, quase dançando em minha pele, então subi lentamente uma de minhas mãos até seu rosto. Nossas bocas brincavam naquele espaço ínfimo, desejosas, provocando-se numa espécie de tortura gostosa demais. Mas então meio segundo se passou e Harry se rendeu, encerrando a batalha nos meus lábios. Pega de surpresa segurei-me em sua nuca e ouvi meu copo se estilhaçando entre nossos pés, meus dedos atrapalhados tinham se livrado do objeto que os impedia de tocar o ser à minha frente. Senti-o sorrir e se afastar um pouco.
– Alguém vai pagar por isso. – Ele disse contra meus lábios, com a respiração entrecortada.
– Eu vou fazer você pagar. – Respondi e ele abriu os olhos, me observando de maneira curiosa. – Muito caro. – Sorri de lado e juntei nossas bocas mais uma vez.
Harry virou nossos corpos com uma eficiência cirúrgica, deixando-me presa entre ele e o parapeito. Uma de suas mãos passeava com calma e cuidado pela extensão do meu braço, subindo e descendo. A outra segurava em minha nuca e puxava alguns fios de cabelo. Eu sentia pequenas descargas elétricas se movendo por todo o meu corpo, como se tentando me unir a ele para sempre. Nosso beijo não tinha pressa, mas tinha desejo, curiosidade. E buscava afoito por informações, vestígios, qualquer coisa que fosse de um passado muito distante, tentando encontrar qualquer resquício de Harry Styles e , ex-namorados. E eu sabia que eles estavam ali, pequenos, escondidos sob pilhas e pilhas de muita história para contar, loucos para saírem juntos pelo mundo, correndo livres como havia sido nas longas tardes perdidas em Holmes Chapel. Dois seres completamente necessitados um do outro.
Necessidade. A mão de Harry, que antes estava em meu braço, tinha descido um pouquinho mais e brincava com a barra da minha camiseta. Eu sentia a ponta de seus dedos intensificando o calor em minha pele. O whisky nos ajudava a queimar, tinha se tornado combustível puro para nossa chama reprimida. Mas era só um beijo e, como tal, deveria acabar. E assim, Harry se afastou lentamente. Os olhos sorrindo mais que a boca.
– E se eu disser... – Ele parecia não conseguir decidir entre olhar para meus olhos ou minha boca. Sua respiração ofegante se misturava à minha. – Que realmente não tem uma cama para você? – Riu eu revirei os olhos.
– Cala a boca, Styles. Eu não vou dormir com você hoje! – Olhei para seus lábios, mordendo os meus, completamente consciente de que não confiava na força de minhas próprias palavras.
Ele sorriu e eu me virei contra o parapeito, olhando para o horizonte iluminado. Harry me abraçou por trás e apoiou seu queixo em meu ombro.
– Nem se for só para fazer conchinha? – Ele pediu manhoso e eu ri.
– Eu nem te conheço direito. – Fingi uma voz séria. – Que indecente.
– Me deixa te conhecer então. – Harry disse.
– Eu estava brincando, Harry. – Fiz um carinho leve em seu braço.
– Eu estou falando sério! – Ele apertou mais seu corpo contra o meu e eu agradeci mentalmente, imaginando minha jaqueta quentinha e abandonada no quarto. – Quanto tempo nós ficamos longe? Sete, oito anos?
– É. Por aí... – Respondi, sem entender onde ele queria chegar com aquilo.
– Então a gente tem muita coisa para botar em dia. Vamos precisar de vários encontros.
– Está me chamando para sair, Styles? – eu disse e senti-o rir contra minha nuca.
– Estou, . Se você quiser.
Eu observava os carros que passavam lá embaixo como estrelas brilhando num céu muito escuro. Imaginei um mundo onde eu e Harry realmente pudéssemos fazer aquilo, sair como dois velhos amigos que dividem memórias e histórias novas e antigas. Sim, eu queria muito.
– E começamos quando? – Sorri ainda olhando os carros.
– Amanhã mesmo. É só não ir embora. – Ele respondeu e eu senti um pouquinho da minha alegria escorrer pela boca e pular pelo parapeito, se espatifando na rua lá embaixo.
Eu não podia não ir embora. Ou podia? Desde quanto a parte sã da vida me permitiria abrir mão para viver uma aparente loucura, por mais rápida que ela fosse?
– Oito encontros, . Nós precisamos de oito encontros. – Ele continuou, diante do meu silêncio.
– Oito? – Perguntei, mas então a resposta ficou óbvia no mesmo instante. – Para oito anos. – Sorri e me virei para Harry.
Suas mãos permaneciam em minha cintura enquanto seus olhos perscrutavam os meus em busca de algum sinal de que ele havia sido abandonado sozinho com seu plano. Sustentei seu olhar, tranquila com o fato de que ele não encontraria nenhum.
– E depois? – Perguntei simplesmente, só porque poderia perguntar, mesmo sabendo o tamanho da injustiça que era esperar por respostas impossíveis.
– Depois... – Ele parou por um momento, mordendo os lábios e fechando os olhos, então os abriu de novo e sorriu. – Depois eu te levo para outra floricultura e consigo mais um girassol. – Ri diante da solução boba que ele havia encontrado.
Não era nem de perto algo que deveria me fazer sentir segura. Por outro lado, eu também não me sentia tão em paz e tão certa do que queria até vê-lo parado na porta do meu apartamento. Minha vida tinha dado uma volta gigante e completamente inesperada em um período de pouco mais de vinte e quatro horas. O que eu tinha em mãos agora me dizia que esperar por soluções mágicas era imbecil demais.
Não. Eu já tinha muita sorte de estar ali sentindo os braços de Harry ao meu redor e, naquele momento, não desejava ter outra coisa ou estar em outro lugar. Eu também não sabia o que o dia seguinte reservava para nós dois, mas me permitiria sentir o frio na barriga que aquela pequena incerteza gerava.
Olhei mais uma vez em seus olhos. Ridiculamente, escandalosamente, covardemente verdes. Olhei para seus lábios rosados e todas as manchinhas reunidas na sua pele, formando um conjunto perfeito. Deixei as pontas de meus dedos contornarem delicadamente seus traços e abri minha boca, sorrindo antes de dizer qualquer coisa.
– Tudo bem, Styles, acho que podemos trabalhar com oito encontros.
FIM!
Nota da autora: Oi, você! Obrigada por dar uma chance a essa história! Espero que tenha gostado tanto quanto eu, porque estou declaradamente apaixonada! Ela começou com apenas umas pequenas cenas na minha cabeça, então eu só fui escrevendo, mas agora já tenho toda uma continuação planejadinha hahahaha :') depende do alcance... quem sabe.
Outras Fanfics:
All Of My Reasons [Restritas - Originais - Em Andamento]
The Green In His Eyes [One Direction - Shortfic]
Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.
Outras Fanfics:
All Of My Reasons [Restritas - Originais - Em Andamento]
The Green In His Eyes [One Direction - Shortfic]