Última atualização: 11/01/2022

Capítulo Único

Eu não queria estar ali, mas já que estava, ia tentar aproveitar. Abri a porta sentindo o vapor quente de do verão que se aproximava contrastar com o ar condicionado do carro da minha mãe. O céu estava cor de rosa e era um dos pôr do sol mais bonito que tivemos nos últimos dias.
— Me liga quando for embora. — Minha mãe gritou de dentro do carro e só revirei os olhos ao pendurar a mochila nos meus ombros.
— Ok! — Sorri e fechei a porta. Não esperei que ela arrancasse para encarar o portão na minha frente.
Quando André me convidou para aquela festa, parecia uma boa ideia. Domingo pós Enem, ninguém queria ir para escola no dia seguinte, muito menos pensar no que seria do ano que vem. O abismo da dúvida sobre o futuro pairava na cabeça de todo mundo. Agora, olhando para aquele portão já escutando a música que tocava no quintal daquela casa, repensava minha escolha.
Poderia estar em casa dormindo, maratonando Friends pela décima vez ou até mesmo ter deixado meus pais me convencerem a sair para “comemorar mais uma etapa vencida”. Não sei se eu estava afim de ver meus colegas naquele dia, mas agora que eu estava ali, não poderia simplesmente ir embora.
Toquei a campainha rezando para meus amigos já terem chegado. Heitor sempre era o primeiro a chegar nas festas e sem dúvidas Luisa estaria com ele. Os dois não se desgrudam nunca. Mas também sabia que Luisa era sempre a última a sair da prova e Heitor não iria sem ela.
O portão foi aberto sem que alguém me perguntasse quem era. Entrei segurando minha mochila, tirando a franja da testa. Segui na direção da música e das conversas que aconteciam na beirada da piscina. Então eu o vi.
Deveria ser proibido alguém ser tão bonito assim. O cabelo castanho, jogado de lado, cobrindo seus olhos verdes. O sorriso que parecia esconder mil palavras. Henrique estava com o violão nas mãos para completar. Eu tinha crush nesse garoto desde o primeiro ano e fazia poucas semanas que eu tinha descoberto seu nome.
— Fecha a boca para não babar, Anelise.
— Mas que merda, garoto! — Heitor me deu um susto chegando ao meu lado.
— Fala sério, Lise. Você baba nesse garoto desde sempre e até hoje nunca nem conversou com ele. — Luisa estava de mãos dadas com o namorado, as mãos na cintura e o seu olhar desafiador. — Sabe, você deveria ir falar com ele.
— Nem inventa, Lu. — Bufei.
— Por que não? Sabe qual a chance de vocês passarem para mesma faculdade?
Nenhuma. Eu ia cursar letras e ele engenharia mecânica. Isso se a banda dele não conseguisse um contrato com uma gravadora. Ele estava se mudando para São Paulo em janeiro e eu sabia que ele só faria os vestibulares paulistas. E eu não tinha dúvida de que ele passaria enquanto eu estava planejando continuar nessa cidade. Não estava pronta para sair da casa dos meus pais.
— Exatamente! — Lu levantou a mão para mim como se fosse a coisa mais óbvia. — É hoje ou nunca, Lise.
— Nós não sabemos se ele está solteiro.
— Hm, isso é fácil de descobrir— Heitor falou e saiu andando para cumprimentar André. Eu e Luisa seguimos o garoto, correndo para acompanhar seus passos.
Eu não fazia ideia do que Heitor estava pensando, mas envolver André com certeza seria algo que me tiraria totalmente da zona de conforto. André era a pessoa mais extrovertida que eu conhecia e ele parecia achar que todo mundo era que nem ele. Eu era o total oposto. Gostava de ficar com meus amigos, mas era a que menos conversava.
E quando o assunto era Henrique, eu ficava ainda mais tímida. Como se isso fosse possível.
— Dré, escuta aqui. — Heitor passou o braço nos ombros do amigo. — Nossa querida Anelise aqui gosta de um garoto há um bom tempo, mas ela nunca falou com ele.
— Hm. — André tomou um gole da cerveja olhando para mim.
— E a gente estava pensando que essa seria a última chance da nossa amiga conseguir pegar o boy.
— Esse garoto por um acaso seria o Henrique? — André olhou para Heitor e eu fiquei boquiaberta.
— Como…
— Linda, você é mais transparente do que imagina. — Foi a vez de André vir até mim e passar o braço nos meus ombros. — E porque você fica vermelha toda vez que ele entra na sala.
Oh merda, se André sabia, a chance de Henrique já ter notado era bem grande. E eu iludida achando que sabia esconder meus sentimentos.
— Você não precisa fazer nada Dré, sério.
— Ah, e qual seria a graça de uma festa sem um pouco de adrenalina?
Ele piscou pra mim e se afastou da gente. Mordi meu lábio já sabendo que eu não iria gostar do que viria a seguir. Luisa me entregou um copo de refri e nós três procuramos um canto para nos sentarmos e falar da prova. Por mais que eu tentasse concentrar na conversa com meus amigos, eu só conseguia observar André andando de um lado para o outro e ficar nervosa toda vez que ele chegava perto do Henrique.
Três horas depois e tudo que eu queria era ir embora. Já tinha escurecido, metade das pessoas estavam muito bêbadas e eu parecia ser a única que não estava me divertindo. Luisa e Heitor já tinham me deixado para irem se pegar em algum canto e eu estava sentada em uma espreguiçadeira lendo um livro no celular, o mais distante possível do palco improvisado que a banda do Henrique tinha montado.
Normalmente eu estaria ali no meio. Eu gostava de shows de escola, especialmente quando tocavam todas as minhas músicas favoritas. Mas eu não iria sozinha. Não fazia ideia do que André tinha falado com Henrique e não sabia se estava pronta para descobrir. Voltei meu olhar para o celular.
Eu estava cansada, com calor, com fome porque não tinha comida direito e tudo que eu queria era ir embora. Mas depois de negar o programa dos meus pais, eu precisava ficar ali pelo menos até nove da noite.
— Sabe, você está muito desanimada para uma festa. — Olhei para cima e ele estava ali. Os olhos verdes, o cabelo castanho. Forcei um sorriso quando na verdade meu estômago estava lotado de borboletas que não pareciam saber o seu lugar.
— Oi!
— Por que você não está curtindo o show? — Ele sentou na minha frente e deu aquele sorriso de parar o trânsito. As pessoas ainda usavam essa expressão?
— Estou! Vocês são muito bons.
— Obrigado. — Ele abaixou o olhar e foi impossível não ver o orgulho em seu sorriso. — Sabe, eu odeio ver garotas bonitas tristes. Então vim aqui te perguntar se você não quer chegar um pouco mais perto. Posso te oferecer uma cerveja?
Ele esticou a mão e a segurei. Onde esse garoto fosse eu iria dizer sim. Três anos depois eu não tinha nem opção. Guardei meu celular no bolso de trás e deixei que Henrique me conduzisse até a mesa ao lado do palco. Os garotos estavam conversando com um grupo de pessoas enquanto uma música eletrônica tocava no som.
— A gente fez uma pausa, mas já vamos voltar. Tem algum pedido? — Henrique me falou entregando uma latinha de cerveja.
Eu nunca tinha bebido. Nunca tive curiosidade de saber que gosto tinha cerveja, mas também não queria dizer não a ele. Tomei um gole minúsculo, me segurando para não fazer careta quando senti o amargor descer minha garganta.
— Alguma do Jão? — Soava mais como uma pergunta do que um pedido.
— Hm, é algo bem diferente do que estamos acostumados a tocar. Escolhe outra.
Me incomodou um pouco essa atitude. Se ele pediu para eu escolher, não deveria ter dito não. Ou, pelo menos, me desse opções dentre as quais eu pudesse escolher. Eu sabia que eles tocavam rock internacional, mas também tinham um repertório de música nacional.
— Guns and Roses? — Eu odiava rock clássico e citei a primeira banda que me veio na cabeça. Por algum motivo, me senti estranha tentando impressionar aquele garoto. Três anos depois e finalmente estava falando com Henrique, e não parecia nada do que eu imaginei.
Não que eu tivesse alguma ideia do que eu poderia falar com ele.
— Boa! Vou falar com os caras e em breve voltamos para o palco.
Ele se afastou para o grupinho que conversava, sem me incluir, e fiquei ali apenas olhando. Não fazia ideia do porque tinha aceitado ir até ali. Não sabia porque eu tinha ficado tanto tempo fissurada em Henrique quando ele era apenas mais um adolescente normal que não fazia sentido.
Deixei a cerveja em cima da mesa sem tomar um segundo gole. Procurei Luisa e Heitor, mas eles não estavam em nenhum lugar a ser visto. Resolvi que iria embora mesmo ainda sendo cedo. Aquela festa já tinha me esgotado o suficiente.
Voltei para a casa principal, ainda morrendo de vergonha, procurando alguém para abrir o portão pra mim. Mas não tinha ninguém ali. Parecia que os pais do André tinham saído e não tinha ninguém que eu pudesse pedir para abrir o portão.
— Ei, tá tudo bem? — André se aproximou quando eu estava pensando se voltava para a festa ou me aventurava a achar o interfone sozinha.
— Não sei. — Dei e ombros. — Estou cansada, acho que vou embora.
— E o Henrique? — Ele me perguntou quase me abraçando. Eu sabia que André tinha bebido, mas ele não parecia bêbado. Ou pelo menos bem menos do que Henrique e qualquer um dos seus amigos.
— Ele não era quem eu pensava. — Dei de ombros de novo.
— Ei, o que aconteceu?
— Nada. Só… sei lá. Não era o que imaginei.
— Vocês ficaram? — Ele arregalou os olhos.
— Nãaoo! Ele me chamou para ver o show, mas então voltou para perto dos amigos me deixando sozinha. E nem tinham voltado para o palco. Luisa e Heitor sumiram, então resolvi ir embora.
— É, eu acho que Lu e Heitor foram procurar um quarto. — André tocou a nuca, parecendo um pouco sem graça.
— Ah, típico. — Ri colocando meu cabelo atrás da orelha.
— Lise, se você quer mesmo ir embora, posso ficar com você até o uber chegar. Mas não acho que você deva ir embora agora.
— Não vou ficar sozinha na festa, Dré. Todo mundo está se divertindo e eu só estou sendo a esquisita que fica lendo sozinha. Sério, obrigada pelo convite, mas acho que já sai o suficiente da minha zona de conforto por um dia e
E então ele me beijou. Primeiro senti seus lábios nos meus, depois sua mão na minha cintura e por último na minha nuca. Nunca pensei em André dessa forma, mas me permiti seguir o beijo. Fechei os olhos e tudo que eu conseguia pensar era que André estava me beijando. Aquele garoto popular, com quem eu cresci na mesma turma, o oposto de tudo que eu tinha sido e, de repente, ele estava me beijando.
Ele quis me beijar. Ele queria que eu ficasse ali. Ele se afastou apenas o suficiente para olhar em meus olhos, sem tirar os braços da minha cintura.
— Lise se você quiser ir embora, não vou te impedir. Mas, por favor, é a nossa última festa da escola, você merece sair da sua zona de conforto. E você não está sozinha, eu estou aqui. Eu sempre estive aqui.
E isso eu não poderia negar. Dré sempre esteve ali, mesmo que às vezes distante. E, como eu, ele também iria ficar na cidade para a faculdade. O puxei para outro beijo, dessa vez sem pressa nenhuma que aquele acabasse. Talvez, fosse a hora de eu permitir que alguém me tirasse da zona de conforto.


FIM



Nota da autora: Sem Nota.






Em andamento:
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Malfeito Refeito (Livros +16/Harry Potter - Marotos)
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I Found Peace in Your Violence (Livros/Short - Drarry)
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